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Aa Po oe JULES BOUCHER sk SUMUBOLIGA, IMLACOMIGA, Segundo as regras da simbélica esotérica e tradicional Pensamento ‘A SIMBOLICA MACONICA Jules Boucher Considerado um classico da literatura mag6nica, esta obra de Jules Boucher mostra que a Franco-Magonaria é uma socie- dade inicidtica cujo objetivo consiste, unicamente, em ajudar o homem e em dar-lhe acesso & Iniciagaéo, ao Conhecimento, de que, mais do que nunca, ele tem necessidade para conti- nuar a edificagaéo de seu Templo interior — isto é, para des- cobrir o seu “Eu” oculto — e para continuar a edificagao de seu Templo exterior — isto é, para preparar o advento de uma sociedade mais humana e mais esclarecida. O autor, magom exemplar, colaborador de varias revistas mac6nicas e autor de importantes obras sobre as ciéncias se- cretas, defende a opiniao de que os tao propalados segredos da Maconaria devem ser partilhados com os profanos. Segundo ele, com esse conhecimento, a Magonaria passard a ser enca- rada em sua verdadeira esséncia: a de uma associagao que ionais de ensinamentos o de conserva bem vivas certas formas tradi icidticos e que se baseia num tinico principi completa tolerancia em relagao a todas as correntes reli; e politicas existentes, por se situar acima e fora das rivalidades que as opdem entre si. ISBN 8S5-315-0625-5 EDITORA PENSAMENTO | 9"788531"506253) JULES BOUCHER (J.B.) A SIMBOLICA MACONICA OU A ARTE REAL REEDITADA E CORRIGIDA DE ACORDO COM AS REGRAS DA SIMBOLICA ESOTERICA E TRADICIONAL Hustrada com 125 figuras e XI pranchas por LuYs Ranur Traducao de FREDERICO OZANAM PESSOA DE BARROS EDITORA PENSAMENTO Sao Paulo Titulo do original: La Symbolique Magonnique Copyright © Dervy-Livres, Paris, 1948, 1979. Edigao (0 primeiro mimero& esquerda indica a edicdo. ou reedigio, desta Ano thre A primeira dezena d dirita indica 0 ano em que esta 7-B-9-10-11-12-13-14 glo om wooded publicoda, 00-01-02-03-04-05-06 Direitos reservados EDITORA PENSAMENTO LTDA. Rua Dr. Mario Vicente, 374 — 04270-000 — Sao Paulo, SP Fone: 272-1399 — Fax: 272-4770 E-mail: pensamento@cultrix.com.br http://www. pensamento-cultrix.com.br. Impresso em nossas oficinas grdficas. SUMARIO PREFACIO INTRODUGAO I. S{MBOLOS E SIMBOLISMO II. FORMA PARTICULAR DA INICIACGAO MAGONICA. Ill. VALOR TRADICIONAL E MISTICO DA INICIACAO MACONICA CAPITULO I OS INSTRUMENTOS ESQUADRO E COMPASSO MALHO E CINZEL PERPENDICULAR E NIVEL AREGUA E A ALAVANCA ATROLHA . QUADROS DE RECAPITULAGAO DO SIMBOLISMO DOS UTENSILIOS Aurore CAPITULO II O APRENDIZ 1, OGABINETE DE REFLEXAO O pio ea bilha de dgua O enxofre, o sal e o mercirio A bandeirola: “Vigilancia ¢ Perseveranga”” Os ossos, a caveira, a foice ¢ a ampulheta V.LT.R.1.0.L.(0) As trés perguntas O testamento - OS METAIS . PREPARACAO FISICA DO RECIPIENDARIO . AVENDA . AS TRES VIAGENS E OS QUATRO ELEMENTOS Saber, querer, ousar ¢ calar-se Nota sobre o tetramorfo 6. ATACA E A BEBIDA AMARGA Nota a respeito da “Tdbua de Esmeralda” Nota sobre a “‘cor verde” 7. OJURAMENTO wnen oy 14 1s 19 27 32. 35 37 38 44 44 46 47 48 48 48 49 50 52 56 60 61 65 67 68 68 8. AESPADA FLAMEJANTE 72 O arco de ago 15 9. OS TRES PONTOS 15 As abreviaturas 11 O alfabeto magénico 719 Os anagramas 81 10. AERA MACONICA 81 CAPITULO III A OFICINA 1, O TEMPLOE A LOJA 97 Os templos na Antiguidade 99 | A Loja de Sdo Jodo 100 ! 2. A ABOBADA ESTRELADA 102 3. O DELTA LUMINOSO E OS TRIANGULOS 104 4. O QUADRADO OBLONGO 110 5. OS TRES PILARES: SABEDORIA, FORGA E BELEZA 113 Nota sobre as Sephiroth 117 6. OS OFICIAIS E SEUS LUGARES 118 7. ACIRCULAGAO NO TEMPLO 125 8. OS CANDELABROS 129 9. AS FUMIGACOES 132 10. OLIVRO SOBRE O ALTAR 134 CAPITULO IV } © QUADRO DO APRENDIZ 1. O TEMPLO DE SALOMAO E AS DUAS COLUNAS 149 O Templo 149 | As duas colunas 152 Sachin e Boaz, os nomes das duas colunas 156 O lugar das colunas 156 As cores das colunas 158 2. AS ROMAS, OS LIRIOS E AS CORRENTES 160 As romas 160 Os lirios 161 As correntes 163 3. OS TRES DEGRAUS 164 4. O PISO MOSAICO 165 Nota sobre 0 jogo de xadrez 167 5. AS TRES JANELAS 171 » 2. 3. . APEDRA BRUTA, A PEDRA CUBICA E A PEDRA CUBICA. PONTIAGUDA A pedra bruta A pedra ciibica A pedra cibica pontiaguda Nota sobre os dados dos antigos Nota a respeito do “Machado” . ABORDA DENTADA E A CADEIA DE UNIAO . APRANCHA DE TRACAR Nota sobre os quadrados mégicos . AS DUAS LUMINARIAS: 0 SOL E A LUA . A PORTA DO TEMPLO CAPITULO V OS RITOS MACONICOS . OS RITOS E AS OBEDIENCIAS O Grande Oriente da Franga A Grande Loja da Franca A Grande Loja Mista: “O Direito Humano” A Grande Loja Nacional Independente . A HIERARQUIA Os graus do Escocismo e as cores . A REGULARIDADE MAGONICA . DEUS, O GRANDE ARQUITETO DO UNIVERSO CAPITULO VI O COMPANHEIRO . AS CORPORAC OES OBREIRAS E SEUS DIFERENTES RITOS As cores das corporagGes obreiras O bastdo dos companheiros Os brincos O “Tour de France” Estado atual das corporagées obreiras “Sumario das praticas impias, sacrflegas e supersticiosas que sdo executadas pelos companheiros seleiros, sapateiros, canteiros, cutelei- ros e chapeleiros, quando recebem os chamados Companheiros do Dever. OGRAU DE COMPANHEIRO A ESTRELA FLAMEJANTE O “Ankh” egipcio O nimero de ouro 173 173 174 179 182 183 185 190 190 192 196 205 205 206 207 207 208 212 215 217 223 226 226 227 227 227 230 235 239 240 242 aeons eperayesene opeere . ALETRA “G” A letra “E” do Templo de Delfos . O “QUADRO” DO COMPANHEIRO. CAPITULO VII O MESTRE . A ARTE REAL A LENDA DE HIRAM. A ACACIA A CAMARA DO MEIO HIRAM RESSUSCITA O “CHAPEU” DOS MESTRES OS “FILHOS DA VIOVA” . O“QUADRO” DO MESTRE . OGRAU DO MESTRE IDEAL CAPITULO VIII OS “ADORNOS” DO MACOM . OAVENTAL OS CORDOES AS JOIAS . AS LUVAS BRANCAS CAPITULO IX AS ATITUDES E OS GESTOS . AS MARCHAS OS SINAIS OS TOQUES AS ACOLADAS AS BATERIAS . ACADEIA DE UNIAO. CAPITULO X AS PALAVRAS . AS DIVISAS . AS ACLAMAGOES Liberdade, Eqilidade, Amizade 253 258 260 268 271 282 289 293 295 296 300 304 311 321 328 330 335 342 349 351 352 355 364 365 366 5. PALAVRAS SAGRADAS E PALAVRAS DE PASSE, 4, DICIONARIO DAS PALAVRAS SAGRADAS E DAS PALAVRAS DE PASSE APENDICE LENDA DOS TRES MAGOS QUE VISITARAM A GRANDE ABOBADA E DESCOBRIRAM O CENTRO DA IDEIA INDICES INDICE DOS AUTORES CITADOS E DE SUAS OBRAS. {NDICE DAS ILUSTRAGOES INDICE DAS PRANCHAS 369 370 379 385 395 400 PREFACIO Parece-me oportuno publicar um compéndio do Simbolismo Ma¢énico que, por um lado, seja util aos Magons e, por outro, seja acessivel aos profanos. As obras dos Léo Taxil, Paul Rosen, Marques-Riviére e de tutti quanti esforgaram-se por caluniar a Ordem MagOnica e conseguiram fixar no espirito do publico uma espécie de cliché que estd muito longe da verdade. Para os autores catélicos, a Magonaria continua a ser a “‘Sinagoga de Sata” e devemos ser gratos por ndo acusarem ainda os Magons de praticarem a evocagdo do anjo decaido! Para outros, a Magonaria é uma “‘maffia” que alimenta perigosos projetos politicos e ndo recua diante do assassinato, se isso for do interesse de seus designios. Para outros, ainda, a Maconaria ndo passa de uma cooperativa, uma “sociedade de socorros mutuos”. Os anti-semitas afirmam que ela é um instrumento nas mios de Israel, enquanto Max Doumic sustenta que ela é 0 6rgdo do imperialismo anglo- saxdo. Essas opinides diversas e contraditorias sdo todas igualmente falsas. A Franco-Magonaria é uma associagdo que guarda bem vivas certas formas tradicionais dos ensinamentos secretos inicidticos. O que nela domi- na € o princtpio de Tolerdncia: tolerancia em relagao as doutrinas religiosas € politicas, pois ela estd acima e fora das rivalidades que as dividem. A Maconaria abre o caminho a Iniciagdo — isto é, ao Conhecimento — € seus simbolos ddo ao Macom a possibilidade de acesso a ela. Na verdade, pode ocorrer que certos homens, depois de terem sido ados, continuem profanos; mas tais excegdes ndo devem fazer perder de vista o cardter transcendente da Magonaria. Tentamos divulgar e restabelecer o simbolismo magénico. Nao ini 9 pretendemos, de modo algum, dar uma interpretagdo definitiva e nisso ndv empenhamos nada a nao ser nossa responsabilidade. Nao se encontrard aqui 0 reflexo da doutrina desta ou daquela Obediéncia, mas apenas a opinido de um Macom de boa fé. Se nosso trabalho, agindo como um fermento, suscitar outros estudos, que 0 corrijam ou que o completem, ficaremos felizes com isso, e teremos entdo o sentimento de ter escrito uma obra util. Os Macons talvez nos critiquem por termos entregue nossos “‘segredos” aos profanos. Que eles se tranqiiilizem. Tais pretensos segredos j4 foram muitas vezes revelados, e aqueles que se divertiam com nossas “momices” serdo obrigados, se lerem este livro, a mudar de opinido. JB. INTRODUCGAO I. SIMBOLOS E SIMBOLISMO A palavra “simbolo” vem do grego sumbolon, sinal de reconheci- mento formado pelas duas metades de um objeto quebrado que tornam a se juntar; por extensdo, essa palavra significa uma representacdo analégica relacionada com 0 objeto considerado. A propésito, é bom fazer aqui uma distin¢4o entre as palavras alegoria, emblema e simbolo. A alegoria (do grego, allégoria) pode ser traduzida literalmente pelas palavras “falar” e ‘‘outro”, isto é “falar de outro modo”. Podemos citar como exemplos de alegorias 0 apdlogo (apo, sobre, e logos, discurso) uma alegoria moral e a paribola (parabolé, compara¢do) uma alegoria religiosa. O emblema (do latim emblema, omamento que se usa) é a represen- tacdo simples de uma idéia. O boi, por exemplo, é considerado o emblema da forga. O simbolo é mais amplo, mais extenso, e sua compreensdo relaciona- se intimamente com os conhecimentos j4 adquiridos por quem o estuda'. O padre Auber”, examinando o simbolo em sua aplicagdo especial a Sagrada Escritura, distingue quatro sentidos que podem estar ligados ao simbolo em geral: o sentido literal, 0 alegérico, o moral ou tropolégico e, enfim, 0 anagogico. O sentido tropolégico (tropos, mudanga; logos, discurso: mudar 0 tumo da conversa) distingue-se do sentido anagdgico (ana, no alto; ago, conduzir: elevar o espirito as coisas do alto) por ter o primeiro um sentido moral e o segundo um sentido mistico. O padre Auber, examinando o simbolo na aplicagao que dele faz a imaginacdo na interpretacdo simbélica faz as seguintes adverténcias: 11 19) Jamais usar o sentido acomodaticio® como algo dado por autores sagrados, mas como uma simples apropria¢do, feita por nds, da linguagem divina ao assunto que estamos tratando. 29) Nao alterar em nada, sob pre- texto algum, o sentido literal ou espiritual, que s6 poderia ser explicado pela Igreja e de acordo com a defini¢do do Concilio de Trento. 39) Enfim, sO usar interpretagdes acomodaticias quando ndo reprovadas pelos escritos dos doutores e dos mestres autorizados’ . O padre Bertaud®, por sua vez, pede que se respeitem as duas regras seguintes: 19) Que a coisa estudada comporte realmente um simbolismo. 29) Que, logo que nos encontremos diante de algo que de fato comporte um simbolismo, nos conformemos, para encontrar seu verdadeiro signifi- cado, com as regras da simbolica as quais tal coisa esta ligada e as quais o autor se sujeitou em sua composi¢do. Tais limitagdes no foram observadas, muito pelo contrario, pelos autores religiosos. Huysmans, em seu livro A Catedral, observa “que os simbolistas no se limitaram a converter em cursos de catecismo tratados de botanica, de mineralogia, de hist6ria natural, e de outras ciéncias; alguns, entre os quais Sio Militdo, acabaram aplicando seu processo de interpre- taco a tudo o que encontravam: uma citara transformou-se, para eles, no peito dos homens devotos; os membros do corpo humano se metamorfo- searam em emblemas: assim, a cabega significava 0 Cristo; os cabelos, os santos; 0 nariz, a discri¢do; as narinas, o espirito de fé; 0 olho, a contem- plagdo; a boca, a tentacdo; a saliva, a suavidade da vida interior; as orelhas, a obediéncia; os bragos, o amor de Jesus, etc.;e esses escritores estenderam seu estilo de exegese aos objetos mais usuais, aos utensilios, até aos instru- mentos que se encontravam ao alcance de qualquer um®”. Sdo precisamente os abusos do simbolismo que, desvalorizando-o, causaram a sua rejeicdo. Contudo, seu uso, de acordo com as regras tradi- cionais, parecer ser o Unico meio de explicar o inefavel. “O simbolo, diz Jean C..M. Travers’, é como um sensivel, com consisténcia propria, mas através do qual se pode perceber uma relagao de significagdo. Antes de significar, ele j4 possui, em seu poder, sua natureza propria. Ele se apresenta primeiro como um ser conhecido por ele mesmo, depois apenas como um ser que tem uma relacdo de significagdo em outro termo.” O mesmo autor cita estas palavras de Brunetiére: “O simbolo é imagem, é pensamento... Ele nos faz captar, entre o mundo e nés, algumas dessas afinidades secretas e dessas leis obscuras que podem muito bem ir além do alcance da ciéncia, mas que nem por isso s4o menos certas. Todo simbolo é, nesse sentido, uma espécie de revelacdo®”’. 12 O simbolismo é, com efeito, uma verdadeira ciéncia que tem suas regras precisas e cujos principios emanam do mundo dos Arquéticos”. Na Magonaria, o simbolo é constante e latente em todas as suas partes. E preciso, portanto, penetrar pacientemente seu significado. Somente pelo estudo dos simbolos é que se pode chegar ao esote- rismo"’. Apenas considerando 0 exoterismo dos simbolos, isto é, interpre- tando-os num sentido quase literal, é que chegaremos a julgar os Ritos fora de uso ou cafdos em desuso. Damos aqui uma explica¢do e uma interpretagdo do simbolismo mago- nico; mas ndo podemos ter a pretensdo de possuir a qualidade de “‘Iniciado”. Dirfamos até que € preciso desconfiar prudentemente de todo individuo que se gaba ou se vangloria de ser um “Iniciado”, ou, em outras palavras, de ser o unico a estar de posse do Conhecimento e da Verdade. “Iniciado” (de initium, comego) quer dizer simplesmente ‘‘colocado no caminho”, e 0 Magom sincero sabe, mesmo quando se tornou Compa- nheiro e Mestre, que ele continua a ser um Aprendiz. Henry Thiriet, lamentando a negligéncia na qual alguns deixavam o estudo do simbolismo, escrevia: “Ndo consigo entender, a ndo ser como uma enfermidade do espirito, que se possa negar seja o valor, seja a necessi- dade do simbolismo em nossa Ordem. Os que se obstinam nessa atitude ndo percebem que est%o negando, ao mesmo tempo, o cardter filosdfico’! da Franco-Maconaria e que, desse modo, privam-na de sua virtude essencial!?”. O estudo aprofundado dos simbolos e, sobretudo, dos simbolos magonicos pode levar muito longe. Nesta terra, tudo é simbolo; as proprias palavras, na realidade, ndo passam de simbolos das idéias. Na vida corrente, s4o muitos os simbolos de deferéncia, de amizade, de alegria, de luto, etc. O homem que satida tirando o chapéu ou inclinando a cabega simboliza com isso a deferéncia que ele quer manifestar 4 pessoa saudada; 0 aperto de mao — que se transformou numa cortesia banal — é um simbolo de afetividade, de cordialidade, de devotamento, de lealdade; sua recusa é simbolo de inimizade. O brinde é um simbolo de amizade e de espe- ranga em alguém ou em alguma coisa. Por que levantar a mao direita por ocasiao de um juramento sendo para simbolizar a sinceridade? O anel de casamento nao simboliza, acaso, a alianga indefectivel que deve unir os esposos? etc. Todo mundo compreende esses simbolos simples e banalizados. Mas existem outros simbolos menos freqiientes, mais ocultos: filoséficos, teligiosos, inicidticos. As vezes, sua casca é dura de ser quebrada, mas a semente, uma vez libertada, mostra-se tanto mais deliciosa! 13 II. FORMA PARTICULAR DA INICIACAO MACGONICA Cada “‘iniciagdo” tem suas formas particulares e a Iniciag&o Magonica, derivada das iniciagdes operativas e das associagGes de obreiros liga-se, por um lado, a arte de construir, e, por outro, com o mito de Hiram, aos “‘misté- tios antigos”. Certos autores, mais imaginosos do que criticos, afirmaram, sem provas vdlidas, que a Magonaria era a continuagdo da Ordem dos Templarios; outros disseram que ela havia sido instituida pela misteriosa Fraternidade dos Rosa-Cruzes (Fama Fraternitas); outros ainda quiseram fazer remontar sua origem a tempos imemoriais; alguns chegaram até Adao, por eles trans- formado no primeiro franco-macgom ! Existe certo parentesco entre os simbolos e os ritos magGnicos e os das associagdes de obreiros. Esses ultimos, por certo, sfo os primeiros, mas ndo se pode fixar, a ndo ser aproximadamente, a época em que a Franco- Magonaria, de operativa, tornou-se especulativa. Voltaremos a este assunto ao tratar das “‘associagdes de obreiros”’. A “Arte de construir” o Templo ideal: eis 0 objetivo proposto pela Maconaria. Esse Templo é, primeiro, o Homem, e, depois a Sociedade. Na iniciagdo magénica, o profano, ao “receber a luz”, torma-se aprendiz-magom; seu trabalho essencial consiste em “desbastar a pedra bruta” e para isso bastam-lhe dois utensilios: 0 Cinzel e o Malho. Quando sua habilidade se tiver desenvolvido, ele se tornard “companheiro” e aprenderd o uso de novos instrumentos. Mais tarde, terd acesso ao grau de “Mestre”, que lhe dard o direito e o dever de ensinar a Ciéncia Mag6nica aos Aprendizes e aos Companheiros. Nos dois primeiros graus, 0 Magom age sobre si mesmo: de “Pedra Bruta” ele se torna “Pedra Cubica” e pode, entdo, integrar-se em seu lugar no edificio, ou melhor, no Templo ideal. Esse trabalho é de realizagdo mais ou menos demorada; algumas pessoas jamais conseguirdo “desbastar a Pedra Bruta”, ndo por falta de capacidade, mas justamente porque ndo sentem necessidade disso. Estes, embora iniciados ritualmente, nado chegaram a receber verdadeiramente a luz. E sobre esses ““Magons”, que ndo so magons, que o publico forma seu julgamento e, por isso, a Franco-Magonaria, cuja verdadeira grandeza é desconhecida, é caluniada. A forma particular da Iniciagdo magonica é expressa pelos simbolos 14 do Esquadro e do Compasso, cujo simbolismo examinaremos adiante. Ragon, Oswald Wirth, Plantageneta, Bédarride, Marius Lepage, Mme. A. Gédalge, Ed. Gloton e muitos outros autores se esforgaram para fazer yoltar ao primeiro lugar o estudo do simbolismo magénico. Eles nos indi- caram o caminho e se, as vezes, nds os criticamos, nao desprezamos seus esforgos reais e os servicos por eles prestados 4 Magonaria. Ill. VALOR TRADICIONAL E MISTICO DA INICIACAO MACONICA A Iniciagdo Magonica é completa em si mesma, quando o Macom, depois de ter galgado sucessivamente os degraus do Aprendiz ¢ do Compa- nheiro, chega ao grau de Mestre. Mas o iniciado deve poder romper a casca mental, isto é, fugir do racionalismo esterilizante, para atingir a transcendéncia; somente depois de romper essa casca é que se torna possivel o acesso a verdadeira iniciagdo. Todos os simbolos abrem portas, sob a condigdo de ndo nos atermos apenas — como geralmente acontece — as definigdes morais. Sdo muitos os que se declaram “racionalistas” e que qualificam de “simbolistas” — com uma nuanga pejorativa — aqueles que tomaram cons- ciéncia do valor inicidtico da Maconaria. Convém analisar 0 vocdbulo “racionalismo” e examinar os limites por ele impostos. O racionalista (de ratio, razdo) recusa-se a levar em consi- deragdo tudo o que vai além dos limites de seu entendimento. Sua concep- ¢4o e seu conhecimento do mundo arriscam-se, por isso, a ser consideravel- mente amesquinhados, 4 medida de sua inteligéncia e de seu saber. E essa posi¢do intelectual prova ser realmente lamentavel. Tal atitude de limitagdo, para ser ldgica, suporia uma vasta cultura; desse modo, o racionalista comum 86 pode confiar naqueles que professam sua fé — pois existe uma fé — e que considera mais “‘sdbios” do que ele préprio. Ele pode, portanto, ater-se as leis fisicas e psicolégicas conhecidas e deve rejeitar — como manchado de erro — tudo o que vai além dessas leis. Estranho amesquinhamento de sua concep¢do do Universo! O racionalista faz alarde de ser “‘cientifico” e de que ndo passa de um “cientista”; ele admite que a “Ciéncia” faz conhecer as coisas tais como elas S40, que ela resolve todos os problemas e que ela basta para satisfazer todos 15 os desejos da inteligéncia humana. Para admitir um fato, a ciéncia exige que ele possa ser repetido 4 vontade; ela exige também que ele se enquadre em suas leis gerais. Ora, existe uma série de fendmenos que nao satisfaz essas condig6es e cuja realidade ndo é, absolutamente, objetiva. O racionalista fixa-se em sua concepcdo e dela faz um dogma, agindo assim como um fandtico, exatamente como os fiéis de ndo importa que religido, de nfo importa qual Igreja, para os quais ndo existe salvacdo fora dos dados teolégicos que lhes sdo préprios. A Ciéncia ndo passa de uma crenga que se apdia em hipoteses conti- nuamente renovadas; é inutil e ilusério pedir a ela o que ela ndo pode dar: o conhecimento espiritual. “O conhecimento ou a inteligéncia do divino, diz Jamblique (De mysteriis, Il, 11), ndo basta para unir os fiéis a Deus; se assim fosse os filé- sofos, por suas especulagées, realizariam a unifo com os deuses. E a execu- go perfeita e superior a inteligéncia de atos inefaveis, é a fora inexplicdvel dos simbolos que fomece o conhecimento das coisas divinas.” Ora, a Franco-Maconaria é uma verdadeira escola de iniciagao e nao, como a julgam comumente, uma associagdo fraterna com finalidades mais ou menos politicas. A iniciagdo, tal como a concebiam as antigas “Sociedades de Misté- tios” e tal como a praticam ainda as seitas mais ou menos evoluidas da Africa negra ou da Asia misteriosa, a iniciagdo ‘‘abre portas” até entdo proibidas ao recipienddrio. Além do mais, a transmissdo ininterrupta dos “poderes” integra o impetrante ao Egrégoro’* do grupo e o faz participar, apesar dele, da vida m{stica e profunda da prépria esséncia dos simbolos. Essa “iniciagdo” verdadeira é Una no tempo, no espago, nos ritos, embora os costumes sociais ou étnicos daqueles que a praticam sejam diferentes. A Iniciagdo Magonica toma palpdvel essa Unidade do Conheci- mento através das seitas e dos ritos. Sera possivel provar a filiagdo magénica inicidtica mediante fatos precisos? Serd possivel afirmar que essa filiagdo é inexistente? René Guénon é muito categérico a respeito: “Nao existem mais no mundo ocidental organiza¢Ges inicidticas capazes de reivindicar para si uma filiagdo tradicional auténtica sendo as Associagdes de Obreiros e a Mago- naria’*”, Contudo, ele nao fornece nenhum argumento, a ndo ser especula- tivo, para apoiar sua tese. Albert Lantoine, 0 erudito historiador da Magonaria, pouco suspeito de misticismo, diz a respeito da influéncia dos Rosa-Cruzes sobre a Mago- naria: “Para nos hd mais do que pontos de contacto: hd uma interpenetragdo 16 que fez da velha magonaria uma nova franco-magonaria. Alids, nfo podemos explicar por outro modo todo esse simbolismo mistico... Portanto — e esse ponto é extremamente importante para os decifradores de simbolos — nds yeriamos af a explicagdo muito natural, muito simples desse ritualismo que, em lugar de se ter transmitido por sucessivas associagdes misteriosas, teria sido implantado por inovadores curiosos de reminiscéncias inicidticas'*”. Seja como for, assim como o movimento se prova caminhando, a Maconaria prova seu valor inicidtico com todo esse aparato simbdlico que ela conserva e de que se utiliza. NOTAS A INTRODUCAO 1, A esse respeito, é dificil compreender a explicagdo dada pelo dicionario Larousse: “‘O simbolo é constante, o emblema é varidvel. O stmbolo é tido como de origem divina ou desconhecida; 0 emblema é inventado por alguém. O sim- bolo tem, com o objeto a que estd ligado, uma analogia facil de ser captada: assim, a tartaruga ¢ o simbolo da lentiddo; 0 emblema, pelo contrdrio, exige muitas vezes um esforco de inteligéncia para ser compreendido, porque, em geral, ele associa varias idéias diferentes: assim, uma pomba, fazendo seu ninho num capacete, é o emblema da paz que se segue & guerra. Existe aqui uma confusdo manifesta entre as palavras emblema e stmbolo; 0 que se diz de um reporta-se ao outro. 2. Histoire et théorie du symbolisme religieux, 1884, t. I, p. 50. 3. Chama-se acomodaticio o sentido simbélico dado tarde demais e acidentalmente a.um texto que ndo foi feito com vistas a essa aplicagio. 4. Op. cit. p. 55. 5. Etudes de symbolisme dans le culte de la Vierge, 1947, p. 11 ¢ segs. 6. Plon, 1928, pp. 386-387. 1. Valeur sociale de 1a liturgie d'aprés saint Thomas d'Aquin, 1946, p. 125. 8. Op. cit., p.127. 9. Arquétipo, do grego arché e tupos, protétipo ideal das coisas, idéia que serve de modelo com relagdo a outras. 10. Esoterismo opée-se a Exoterismo; podemos traduzir livremente esses dois termos por ensino secreto e ensino piblico. Hoje, alids de forma abusiva, a ten- déncia é fazer da palavra esoterismo sinénimo de ocultismo. 11. Dirfamos “inicidtico”. 12. Esquisse d’une Doctrine Positive de la Franc-Magonnerie, 1927, p. 64. 17 14. 15. Egrégoros (do grego egrégorein, vigiar) ; essa palavra designa, no Livro de Henoch, 0s anjos que haviam jurado vigiar sobre o monte Hermon e se traduz por os vigi- lantes. Chama-se de “egrégoro” uma entidade, um ser coletivo saido de uma assembléia. Cada Loja tem o seu egrégoro: cada Obediéncia tem o seu e a reu- nido de todos esses egrégoros forma a grande Egrégora Macénica. (Pensamos que © costume de escrever egrégoro com dois g é errado e ndo tem nada a ver com a etimologia.) Apercus sur Initiation, 1946, p. 103. La Franc-Magonnerie chez Elle, 1925, p. 92. OS INSTRUMENTOS 1, ESQUADRO E COMPASSO No simbolismo magénico, esses dois instrumentos' estdo sempre associados. O Esquadro (do latim exquadra e exquadrare, esquadrar) é um instrumento, diz Ragon*, “‘cuja propriedade é tomar os corpos quadrados; com ele seria impossi- vel fazer um corpo redondo. O Esquadro, pendurado no corddo do Veneravel, signi- fica que a vontade de um chefe de Loja sé pode ter um sentido, o dos estatutos da Ordem, e que ela sO deve agir de uma maneira: a do bem”. Sem duvida por assondncia, da-se geralmente ao Esquadro o sentido de eqiiidade. O Esquadro é formado pela reunido da horizontal e da vertical (fig. 1). Para Oswald Wirth®, ele simboliza o equilibrio resultante da unido do ativo com 0 passivo. Contudo, a dissimetria do Esquadro vai contra essa maneira de ver; oO Tau grego (fig. 2) corresponderia melhor a essa defini¢ado. O equilibrio é um estado estdtico; ora, o Esquadro, por sua falta de simetria — se supusermos seus bra¢os desiguais ou, Fig. 1. O Esquadro. Fig. 2. O Tau grego. ainda, se o fizermos repousar sobre um de seus lados — traduz, pelo contra- tio, um sentido ativo, dinamico. Oswald Wirth observa também* que a Cruz e 0 Quadrado podem ser considerados como formados por dois ou quatro Esquadros de bracos desiguais, que seriam reunidos por seus vértices ou por suas extremidades (fig. 3a e 3b). L ~ Fig. 3a. A Cruz formada por dois Esquadros Jean Kotska, em Lucifer oe Lae Fig. 3b. O Quadrado formado por quatro Esquadros. démasqué®, exclama, animado por uma extraordindria firia antimag6nica: “Sim, verdadeiramente o Esquadro é a sills les Fig. 4. Gammadia, Cruz formada por quatro Esquadros. bandeira do rei dos infernos que avanga. E o demonfaco Esquadro! E a Cruz quebrada, porque o Esquadro é a quarta parte da Cruz. Essa sigla infernal fala muito claro por si mesmo. Nos quatro pontos cardeais o deménio planta os quatro fragmentos da Cruz do Senhor que ele desmembrou (fig. 4). Eis 0 que quer dizer o famoso emblema da retiddo!” E interessante notar que na astrologia © Angulo de 90° (o Esquadro), entre dois planetas, chamado ‘“‘quadrado” ou “‘qua- dratura”, é€ considerado maléfico. O Esquadro refere-se, com efeito, a “‘Matéria” que ele simboliza, que ele retifica e ordena. A organizagao do Caos, do Tohu-Bohu nfo é feita sem dificul- dades, sem mal. E, por outro lado, o “quadrado” astrolégico, por mais “dissonante” que seja, estd longe de ter sempre um alcance maléfico; muitas vezes ele indica superatividade, uma ruptura de equilfbrio. 20 Num sentido, o Esquadro representa a ac¢éo do Homem sobre a Matéria; noutro sentido, representa a ago do Homem sobre si mesmo. Como esté ligado a Matéria, o Esquadro é passivo, enquanto o Com- asso, designando o Espirito, é ativo, como veremos adiante. O Venerdvel usa o Esquadro como uma joia pendurada em seu cord4o (fig. 5); nesse Esquadro, os dois bra- gos ndo sao iguais, estéo numa rela¢do de trés por quatro, como os dois lados do trian- gulo retangulo dos pi- tagéricos. Em_ geral, ele é adornado em seu anverso, o que implica um sentido bem definido. So- bre o peito do Venerdvel, o braco mais longo fica do lado direito; assinala-se assim a preponderancia do afivo (lado direito) sobre o passivo (lado esquerdo). A jéia dos Venerd- veis honordrios (anti- gos Venerdveis) é se- melhante, mas tem algo mais: pendurado entre os dois bragos do Esquadro, est a demonstragdo do teo- rema de Pitagoras® (fig. 6). Este simboli- za nitidamente a cién- cia magOnica que aque- le que o usa deve possuir. Porque o papel do Veneravel é criar Macons perfeitos é que ele usa 0 Esquadro, sinal de retiddo e instrumento indispensdvel para transformar a Pedra bruta em hexaedro perfeito (Pedra cubica). Os Macons, convenientemente formados, estardo depois aptos a parti- cipar da construgao do Templo ideal de que eles proprios serdo as pedras perfeitas. Eles serao assim, ao mesmo tempo, passivos e ativos, constitufdos € constituintes. Fig. 5. Esquadro do Venerdvel. Fig. 6. Esquadro do Venerdvel de Honra. 21 Observaremos, ainda, que o Esquadro é 0 gamma grego, de que fala- temos ao tratar da letra G (fig. 7). As cruzes, formadas de quatro “gamma” (fig. 4) eram chamadas de gammadiae e figuravam outrora nas vestes e ornamentos eclesiasticos. Na simbolica pitagdrica, o Esquadro é 0 signo do “gnomo””. Citaremos como exemplos, os gnomos formados pelos nimeros impares 3, 5, 7, etc., que resultam sucessivamente da seqiiéncia dos quadrados. Os gnomos podem ser triangulares, quadrados, pentagonais, hexagonais, etc., reportando-se entao aos nimeros de igual nome. Para o nosso estudo, basta lembrar que o tipo do gnomo é o Esquadro. Tais sdo os sentidos gerais do Esquadro, cujo Fig. 7. simbolismo nao tivemos, em absoluto, a pretenso Gamma grego. de ter esgotado® (fig. 8). * «oo O Compasso® é, por certo, um dos instrumentos que o homem inven- tou depois de ele ter adquirido a nogdo de circulo. O compasso serve ndo s6 para tragar circulos como também para tomar e transferir medidas". Ele se compée essencialmente de dois bragos articulados e ligados por um eixo (fig. 11). “Com o Compasso, diz Ragon'', descrevem- GG se circulos cujo centro ele WW AA indica Beane Se Ly |_| como os raios e o diame- JJ v tro. Intelectualmente, o La ele Compasso é a imagem do | ZB pensamento nos diversos circulos que ele percorre; © afastamento de seus bragos e sua aproximacdo representam os diferentes modos do raciocinio que, de acordo com as circunstancias, devem ser abun- dantes e amplos, ou precisos e estreitos, mas sempre claros e persuasivos.” Wirth, por sua vez, nota que o Compasso “dé a sensagdo de um infi- nito-tempo limitado no espago”. Para Wirth, o Compasso é 0 simbolo do Relativo, Wirth acrescenta que 0 Compasso, “lembrando uma figura humana, Fig. 8. Gnomos quadrados. 22 tem uma cabega e dois bragos, que se afastam 4 vontade. Em seu mais amplo afastamento, eles medem o dominio que o génio humano pode atingir, 0 conhecido, além do qual se estende a imensiddo misteriosa do inexplorado, provisoriamente incognoscivel'?””. Enfim, Gédalge'? explica que “o circulo centrado pelo ponto é a primeira figura que se pode tragar com a ajuda de um Compasso; essa figura, diz ela, é o emblema solar por exceléncia. Ela com- bina o Circulo (infinito) com o ponto (simbolo do inicio de toda manifesta- go)”. E Gédalge acrescenta: “‘o absoluto e o Relativo estdo, portanto, representa- dos pela agdo do Compasso, que é tam- bém a figura da dualidade (bragos) e da unido (a cabega do Compasso)”’. Fig. 9. Pentagrama. O Esquadro é um instrumento fixo enquanto o Compasso é um instru- mento mével. Portanto, em relagdo ao Esquadro, passivo, o Compasso é€ ativo. Na figura do Traité de l’Azoth, de Basile Valentin (fig. 12), é 0 brago direito que segura o Compasso, enquanto o esquerdo segura o Esquadro. Essa obra data de 1659; isto é, é anterior a data admitida como o da criagdo da Franco- Maconaria, data arbitrariamente fixada no ano de 1717'*. Fig. 10. Por suas pontas, 0 Compasso indica O VAU O RESCH __ sua ascendéncia sobre a matéria, enquanto hebraico hebraico —_ afastamento de seus bragos é inferior a 180° Chegando a esse afastamento, ele se toma uma linha reta e ndo tem mais nenhuma possibilidade efetiva. O Compasso, no grau de Mestre, deve ser aberto a 45°, isto é, a metade de um Angulo reto, a metade do angulo formado pelo Esquadro. Nesse grau de abertura, o Compasso é estavel e ndo corre 0 risco de se abrir 23 inopinadamente durante o tragado. E por isso que 0 simbolo do Compasso tem uma abertura de 60°, na joia do 59 grau (Rito Escocés) e uma abertura de 90° nas joias dos graus 149 e 189; enfim, encontramo-lo ainda associado ao Esquadro no grau 290"°. Fig. 11. © Compasso. Se admitirmos que a abertura do Compasso indica as possibilidades do “Conhecimento”, a abertura de 45° refe- re-se a0 89, a de 60° ao 69 e ade 90° a 1/4. A Magonaria, limitando a abertura do Compasso ao maximo de 90° indica, por esse modo, os limites que o homem ndo seria capaz de ultrapassar. O angulo de 90° reproduz o Esquadro. Ora, o Esquadro, como sabemos, é o simbolo da Matéria; o Compasso é 0 simbolo do Espirito e de seu poder sobre a Matéria. Aberto a 45°, o Compasso indica que a Matéria ndo esté completamente domi- nada, enquanto que a abertura a 90° tealiza integralmente o equilibrio entre as duas forgas; o Compasso transfor- ma-se num “Esquadro justo”. Por ora, nos limitaremos apenas ao simbolismo dos trés primeiros graus da Magonaria — graus primordiais e perfeitos — nos quais 0 Compasso € aberto a 45°. Na Loja, o Compasso e o Esquadro sfo colocados sobre o Altar'® de trés modos diferentes: No 19 grau, o Esquadro é colocado em cima do Compasso (fig. 16). No 29 grau, o Esquadro é entre- cruzado com o Compasso (fig. 17). No 39 grau, o Esquadro é colocado debaixo do Compasso (fig. 18). Plantageneta, falando dessa “antiga tradigfo”, diz'7: “No grau de Aprendiz, o Esquadro cobre os dois bragos do Com- passo, indicando que nesse grau ndo se pode exigir mais do neOfito além de sinceridade e confianga, conseqiiéncias naturais da eqiidade e da Fig. 12. O “Rebis" de Basile Valentin. setiddo; no grau de Companheiro, um brago do Compasso cobre o Esquadro, 0 que nos permite considerar que o Misto nZo cumpre sua tarefa as cegas e que a moral do simbolo é sinceridade e discernimento; no grau de Mestre, enfim, o Esquadro aparece debaixo do Compasso, 0 que nos permite esta- belecer como divisa do 39 grau discernimento e justica’”’. Fig. 13. Fig. 14. Fig. 15. Os setores do conhecimento. Como a maioria dos autores magOnicos, Plantageneta, propositada- mente ou nio, ndo se eleva até 0 absoluto dos simbolos; ele agarra-se a seu sentido moral, \imitando assim, vergonhosamente, as possibilidades meta- fisicas do simbolismo. O Compasso simboliza, repetimo-lo, o Espirito, e o Esquadro, a Maté- tia. Por conseqiiéncia, podemos dizer: no 19 grau, a Matéria domina o Espirito; no 29 grau, essas duas forgas se equilibram; enfim, no 39 grau, o Espirito sobrevoa a Matériae a transcende. Nao nos esquecamos de que o compasso aberto apenas a 45° indica que o dominio do Espirito sobre a Matéria é relativo. O Esquadro e o Compasso entrecruzados podem, em certo sentido, telacionar-se com o Selo de Salomao'®; mas este é uma figura fechada, enquanto que a nossa sigla é aberta, pois é formada por dois angulos e nao por dois triangulos (fig. 19), evocando assim, uma idéia do Infinito. Oe ok ok Fig. 16. O Esquadro Fig. 17. O Compasso eo Fig. 18. O Compasso sobre sobre 0 Compasso. Esquadro entrecruzados. o Esquadro. 25 O Espirito e a Matéria — esses dois “incognosciveis” — também séo representados por dois X ligados (fig. 20). Fig. 19. O Esquadro e 0 Compasso Fig. 20. “Selo de Salomao”. Os dois X ligados. E curioso e interessante comparar nosso simbolo com o imaginado pelos Sulpicianos no século XVII, que é, diz Mons. Barbier de Montault’®, “um M que sobrepde a um A, dando o nome de Maria, enquanto os dois tragos laterais encimados por um ponto formam as inioiais de Jesus e de José. A Sagrada Familia est4 toda aqui (fig. 21).” Alguns autores léem a palavra sagrada hindu “AUM” no monograma da Virgem, ® mas nds deixamos a eles a responsabilidade dessa interpretagio”°, No grau de Mestre, e mais geralmente por toda a Maconaria, o Compasso deve ser colocado em cima do Esquadro, e nao entrecruzado com ele. Podemos achar mais _ Fig. 21. O monograma da Vir- decorativa essa ultima posi¢do, mas 0 gosto gem e da Sagrada Familia, pelo decor no deve levar-nos a um contra-senso ou, pelo menos, a um sentido afastado da significacdo real do simbolo. Todavia, na Loja do Aprendiz —grau ao qual os trabalhos sao abertos mais freqiientemente — seria conveniente nao omitir essa colocagio do Esquadro sobre o Compasso. Observaremos, ainda, que o Compasso é utilizado por ocasiao dos titos de iniciagfo ao 19 grau. No momento em que pronuncia 0 juramento que o liga 4 Magonaria, o Recipienddrio apdia sobre o peito uma das pontas do Compasso que ele segura com a mao esquerda, o que Ragon explica do seguinte modo: “A ponta do Compasso sobre o peito nu, sede da cons- ciéncia, deve lembrar-lhe a vida passada, durante a qual seus objetivos e iniciativas nem sempre talvez se tenham regrado por esse simbolo de exa- tiddo que, dai por diante, deverd dirigir seus pensamentos e suas agGes””. Ora, nesse grau, o Recipiendario é tido como alguém que simbolica- 26 mente, ainda ignora o uso do Compasso; este, representando o Espirito, quer significar que, acima do sentimento (do coragdo) convém colocar, no a 1azdo, seca e fria, mas antes o Espirito inicidtico em toda a sua trans- Fig. 22. O Pentagrama no ‘Compasso e no Esquadro. 2. MALHO E CINZEL cendéncia. O raio definido pelo Compasso nio vai do centro para a periferia mas, ao contrd- rio, vai da periferia para terminar no cen- tro e “penetra” o Recipiendario”*. Podemos também “‘ver’’ o Pentagrama na associa¢éo do Esquadro e do Compas- so (fig. 22). Esse “signo” dinémico — se levarmos em conta os comentdrios que fizemos de seus constituintes — fala bas- tante por si mesmo, e no é preciso insis- tir mais nisso”?. Esses dois instrumentos, o Malho e o Cinzel, servem para o desbasta- mento da Pedra bruta. No plano analdgico, eles estao relacionados parti- cularmente com o grau de Aprendiz. O Malho é também a insignia essen- cial do Venerdvel e dos dois Vigilantes da Loja; deve, portanto, ser estudado tam- bém em fungdo dessa atribuigao. O Malho™ e o Cinzel”* represen- tam, como o Compasso e o Esquadro, 0 Ativo e o Passivo, “O Malho, diz Ragon,?6 emblema do trabalho e da forca material, ajuda a derrubar os obstdculos e a superar as difi- Fig. 23. O Malho e 0 Cinzel. culdades. O Cinzel € 0 emblema da escultura, da arquitetura e das belas- artes: seu uso seria quase nulo sem o concurso do Malho. Do ponto de vista intelectual, eles concorrem para um mesmo objetivo; porque o Malho, emblema da légica, sem a qual ndo podemos raciocinar corretamente, e que nfo pode ser dispensada por nenhuma ciéncia, precisa do Cinzel, que é a 27 imagem da causticidade dos argumentos com os quais conseguimos destruir os sofismas do erro; de onde resulta que esses simbolos representam as belas- artes e varias profissdes industriais; e a légica, elementos proprios para tomar o homem independente.” “O Malho, diz por sua vez Plantageneta?’, é o simbolo da inteligéncia que age € persevera, que dirige o pensamento e anima a meditagdo daquele que, no siléncio de sua consciéncia, procura a verdade. Visto sob esse angulo, ele é insepardvel do Cinzel, que representa o discemimento, sem cuja inter- ven¢do qualquer esforgo seria inttil, sendo perigoso.” A mediocridade dos comentarios de Ragon e de Plantageneta é por demais evidente e ndo pode deixar de ser percebida por quem quer que seja. Esses dois autores ndo sentiram tudo o que esses simbolos podiam conter dentro de si. Oswald Wirth é mais claro e se aproxima mais da verdade quando diz”®: “Dois instrumentos sdo insepardveis (para talhar a Pedra bruta). O primeiro representa as solugdes aprisionadas em nosso espirito: é o Cinzel de aco, que é aplicado sobre a Pedra, seguro pela mao esquerda, lado passivo, que corresponde 4 receptividade intelectual, ao discernimento especulativo. O outro representa a vontade que executa: é o Malho, insignia do comando, que a mAo direita, o lado ativo, brande, e estd relacionado com a energia que age e com a determinagao moral, cujo resultado é a realizagdo pratica”. Mais adiante, Oswald Wirth entrevé uma origem germanica para o Malho; com efeito, Wirth escreve: “A importancia que atribuimos ao Malho poderia estar ligada ao deus Donar, uma espécie de Jupiter tonante, de que todo chefe de familia se: tornava sacer- a dote no interior de sua casa, onde os Se” Titos familiares s6 se realizavam com a ajuda de um Martelo”®?”. Existe um deus, Sucellos®, prova- velmente de origem céltica, cujo atributo essencial é um Malho enorme. O nome desse deus parece ‘‘aquele que bate bem” ‘ou “‘aquele que tem um bom martelo”*!. Fig. 25. O signo de Jupiter Sabe-se também que o deus escan- © 0 relampago. dinavo Thér, o deus do raio, munia-se de um martelo. Thér é uma contragdo 29 de Thonar (v. all. Donar) e quer dizer Trovdo. Thér era tido como um deus benfazejo, protetor e amigo dos agricultores, pois atribuia-se & tempestade uma influéncia salutar sobre a fertilidade da terra®”. Sucellos e Thér podem ser comparados ao Zeus grego (0 Jupiter dos latinos) cujo signo hieroglifico é o ziguezague do relampago (fig. 25). A forma do Malho é a de um Tau grego. Costuma ser feito de buxo, madeira escolhida por causa de sua dureza. O padre Corblet observa que 0 buxo é o simbolo da firmeza e da perseveranca® . Fazem-se também malhos de marfim, para serem oferecidos aos Veneraveis em certas circunstancias. O marfim simboliza, geralmente, a pureza™, Muitas vezes os Malhos magénicos sdo pintados de preto e se asseme- lham, assim, ao ébano. Contudo o ébano — madeira fragil — nunca foi usado para fazer instrumentos®’. Por que no usar simplesmente martelos de buxo e deixar essa madeira em sua cor natural? Por ocasido da abertura dos Trabalhos de uma Loja, os dois Vigilantes circulam armados com o Malho. Este deve ser segurado com a mao direita e carregado sobre 0 ombro esquerdo, Nessa posigao, os vigilantes fazem “o sinal do Esquadro”. E um erro segurar 0 Martelo com a mao esquerda e apoid-lo no ombro esquerdo e fazer ao mesmo tempo o “‘sinal do aprendiz” com a mao direita®®. Observaremos que, na Loja, os Immaos devem colocar-se sucessiva- mente na Ordem, a medida que o Vigilante passa na frente deles, e ndo todos juntos, como comumente se faz. Os Irmos, nesse momento, devem estar voltados para o “Oriente” — para o Veneravel — e desse modo nao podem ver o sinal feito por alguém que esteja atras deles. Essa tradigdo permite identificar imediatamente qualquer profano que se tenha imiscufdo na assembléia, e com seu Malho, empunhado com a 30 mio direita, o Vigilante, se 0 julgasse util, poderia infligir-lhe imediatamente uma sangdo severa. E evidente que hoje isso nao passa de uma tradigdo; mas esta deveria ser integralmente respeitada. Se os Vigilantes se colocam eles préprios na Ordem do Aprendiz, eles mostram © sinal que deve ser feito e sua caminhada é absolutamente inutil. Do mesmo modo, se todos os Irm@os se colocam simultaneamente na Ordem, é evidente que um profano imitara facilmente o seu gesto. E por alteragGes desse tipo que os ritos, nado sendo mais observados, se transformaram em v4os simulacros. O Malho simboliza a vontade ativa do Aprendiz. Ndo é uma massa metilica, pesada e brutal, pois a vontade nao deve ser nem obstinagdo, nem teimosia: ela deve ser apenas firme e perseverante. Mas 0 homem nao pode agir diretamente sobre a Matéria; 0 Cinzel servira, entdo, de intermedidrio. Este deverd ser amolado freqiientemente: isto é, devera rever continuamente os conhecimentos adquiridos; ndo deixd-los embotar. Esses “‘conhecimentos adquiridos” (com o cinzel empunhado pela esquerda) devem ser usados, de outro modo a intelectualidade se torna passiva (cinzel em desuso). O Malho age de forma descontinua. Isso mostra que o esforgo nado pode ser perseguido sem interrupgdo e, por outro lado, que uma pressdo continua sobre o Cinzel tirar-lhe-ia toda a sua precisio. Achamos que, com o que dissemos, deixamos entrever suficiente- mente o simbolismo do Malho e do Cinzel. Entre as m4os do Venerdvel e dos dois Vigilantes, o Malho significa 0 seu poder. Serve para provocar ondas sonoras ritmicas®”. Observemos aqui que 0s dignitdrios sdo recebidos na Loja “‘ao bater dos Malhos”; isto é, sio dados golpes de martelo, sucessiva e alternativamente, pelo Veneravel, pelo primeiro e pelo segundo Vigilantes. Esse “ruido” monétono e regular realiza entao o “‘siléncio integral” pois abafa qualquer som adventicio. 31 3. PERPENDICULAR E NIVEL A Perpendicular® e 0 Nivel®? dao, respectivamente, a Vertical e a Horizontal. Encontramos ainda ai 0 Ativo e o Passivo, as duas polaridades universais, uma de movimento e de agdo e outra de inércia e de repouso; 0 Rajas e 0 Tamas dos hindus; os dois “opostos”, cujo jogo recfproco condiciona a vida do Universo, as alternancias da expiragdo e da inspiraggdo de Brahma, as duas sexualidades que fazem a vida. Fig. 26. A perpendicular. Fig. 27. O nivel. A Perpendicular é 0 fio de prumo, Na Magonaria, ele é representado fixado no centro de um arco de abébada. O Nivel do macom é um triangulo em cujo 4pice est4 amarrado um fio de prumo. Preferimos a designagdo “tradicional” de perpendicular a de fio de prumo. O Nivel, no simbolismo magénico, deve ser formado por um esquadro justo, isto é, um esquadro cujo Angulo, no dpice, deve ser de 90°. A Perpendicular é 0 atributo do segundo Vigilante, ao passo que o Nivel é 0 atributo do primeiro. Ragon explica que “o Mivel simboliza a igualdade social, base do direito natural; e que a Perpendicular significa que o Magom deve possuir uma retiddo de julgamento que nenhuma ligacdo de interesse ou de paren- tesco seja capaz de perturbar®”. Para Plantageneta*! “O Nivel é o simbolo da igualdade original; mas ele ndo implica, em nenhum sentido, o “‘nivelamento” dos valores: ele nos lembra que é preciso considerar todas as coisas com igual serenidade”’. Wirth, enfim, vé* na “forma do Nivel a evocagdo do signo alquimico 32 do Enxofre®, substancia cuja combustdo mantém o Fogo central de todo foco de atividade. O Primeiro Vigilante, diz ele, é 0 guardiao desse ardor Jaborioso, que ele estimula apenas percebe qualquer diminui¢do de inten- sidade”. E acrescenta: “O segundo Vigilante con- trasta com 0 primeiro por sua docura. Ele com- preende tudo e sabe desculpar o que é desculpd- vel. Constrangido a confessar um erro, 0 iniciante dirige-se a ele com confianga, adivinhando que qualquer erro pode ser reparado sob a égide da Perpendicular. Esse instramento determina a ver- tical, que incita 0 espfrito a descer e a subir. Aprofundando, descobrimos nossos préprios de- feitos e nos elevamos acima da platitude geral, desculpando os defeitos alheios”. Citaremos ainda Gédalge que, falando a respeito do Fio de Prumo, diz™: “Ele é o em- blema da busca —em profundidade — da verdade, do aprumo, do equilfbrio; ele parece mostrar 0 Fig. 28. O enxofre. caminho que leva 4 ‘Camara do Meio’. Com o Nivel e o Esquadro, ele permite a construcdo correta das muralhas do Templo. Pode-se ver a ‘Per- pendicular’, diz ela, esculpida debaixo do olho divino e acima do Demiurgo, Operdrio Ferreiro, Arquiteto dos deuses, Viswakarma, no Templo subter- réneo de Ellora (India). A primeira vista, podemos ser confundidos ao ver a Perpendicular (a Vertical, simbolo ativo) como um atributo do segundo Vigilante, e o Nivel (a Horizontal, simbolo passivo) como um atributo do primeiro Vigi- lante. Na realidade, o Nivel indica a Horizontal, mas ele proprio esté munido da Vertical: a Perpendicular. O Nivel é, portanto, um instrumento mais completo do que a Perpendicular sozinha, e este é o motivo pelo qual ele € a insignia do primeiro Vigilante, 0 tnico qualificado para tomar o lugar do Venerdvel em caso de auséncia deste. O Nivel nao é apenas a Horizontal, mas ainda a Cruz, reunido da Vertical com a Horizontal. 33 A Perpendicular da a direcdo do centro da Terra, enquanto 0 Nivel da a linha reta em Esquadro em relagdo a um ponto dado com a Perpendicular, A Perpendicular é 0 simbolo da profundidade do Conhecimento e de sua retiddo; ela previne qualquer desvio obliquo; 0 Nivel mostra que o Conhecimento deve relacionar-se com o “plano terrestre”, 0 tinico capaz de interessar diretamente a criatura humana. E partindo de fiadas sélidas e bem assentadas que o Macgom pode e deve trabalhar com vistas 4 propria elevacdo espiritual. Quanto A “Igualdade”, entidade abstrata, 4 qual ainda se quer ligar o Nivel, a Natureza inteira mostra que isso ndo passa de uma mistificagdo. Os homens no sao iguais nem fisica, nem intelectualmente. Nas citagdes que fizemos, Ragon fala em “igualdade social”, mas Plantageneta diz “que a igualdade ndo implica num nivelamento de valores”. Esse dltimo autor sentia muito bem o que havia de absurdo nessa nogdo demasiado absoluta de “igualdade”. Encontramos af ainda essa limitagao “moral” que se quer impor aos simbolos mag6nicos. Precisamos enxergar mais longe e mais alto. A moral é sempre relativa e particular; ela varia de acordo com os lugares, as épocas, os agrupamentos. O Conhecimento, proporcionado pela Iniciag4, que deve, na nossa opinido, tomar o lugar da moral, tende para o Absoluto. Pascal escreveu: “‘A verdadeira moral zomba da moral”. A Magonaria nao é uma escola de moral. Os verdadeiros Iniciados manifestam-se no plano profano e no na qualidade de Macons, mas por um comportamento que, de algum modo, é uma “reverberacdo”. Quando o Aprendiz se torna Companheiro, diz-se que ele passa da Perpendicular para o Nivel, isto é, que, tendo aprofundado suficientemente os elementos do Conhecimento, ele se torna capaz de visualizar estes em suas relag¢des com 0 Mundo, com o Cosmos. Essas relagGes sao indicadas pelo Triangulo** que constitui a armadura do Nivel. 34 4, A REGUA E A ALAVANCA A importancia do simbolismo da Régua é mais particularmente subli- nhado no Rito Escocés, onde ela é encontrada em trés das viagens do Reci- piendario, candidato ao grau de Companheiro. HA diferencas notaveis, entre os diferentes Ritos, a respeito da atribui- go dos Utensilios nas cinco viagens que a inicia¢do ao 29 grau comporta. Eis 0 quadro comparativo: | VIAGENS | RITO ESCOCES | RITOFRANCES | DIREITO HUMANO Primeira Malho Malho Malho Cinzel Cinzel Cinzel Segunda Régua Esquadro Esquadro Compasso Compasso Compasso Terceira Régua Régua Régua Alavanca Alavanca Nivel Quarta Régua Nivel Compasso Esquadro Livro%® Quinta Mios livres Trolha Mios livres A concordancia entre esses diversos Ritos s6 existe na primeira viagem, com o Malho e o Cinzel. Ragon, em seu Rituel du Compagnon, segue o Rito Escocés; Wirth faz 0 mesmo em seu Livre du Compagnon e nfo assinala as divergéncias dos Ritos Escocés e Francés. Parece, alids, que reina certa confusdo na iniciag@o ao grau de Compa- nheiro. Para o Rito Escocés, a Régua € que deve ser o atributo essencial do Companheiro. “A Régua, diz Ragon*” simboliza o aperfeigoamento; sem régua, a inddstria seria uma aventura, as artes seriam defeituosas, as ciéncias sé Ofereceriam sistemas incoerentes, a légica seria caprichosa e desordenada, a legislagdo seria arbitraria e opressiva, a misica seria discordante, a filosofia nao passaria de uma obscura metafisica e as ciéncias perderiam sua lucidez.” Gédalge define a Régua de seguinte modo® : “Simbolo da retiddo, do método da lei. O deus egipcio Phtah empunha uma régua com a qual mede a cheia do Nilo. O proprio Phtah é representado pelo Nilémetro e a Régua 35 aparece na m4o de um dos dois assistentes de Viswakarma (altar das grutas de Ellora, India). Na Maconaria, a Régua é bordada no avental do Experto, junto com o olho divino e a espada. O Aprendiz carrega-a ao ombro esquer- do quando se apresenta na Loja dos Companheiros. Unida ao Compasso, ela permite que se tracem todas as figuras da geometria; além do mais, podemos consideré-la como um simbolo do infinito (a reta sem comego nem fim); por ultimo, ela é sobretudo um simbolo da Moralidade e do Dever de que o Franco-Macom jamais se deve afastar”’. Com efeito, o Aprendiz apresenta-se com uma Régua lisa que carrega no ombro esquerdo (lado passivo); ao se tornar Companheiro, ele deveria carregar uma Régua graduada sobre 0 ombro direito (lado ativo). A Régua graduada esta dividida em vinte e quatro seg6es, ¢ é entao designada pelo nome de “‘Régua de vinte e quatro polegadas”’. Essas vinte e quatro divis6es estio relacionadas com as vinte e quatro horas do dia, que devem ser todas convenientemente empregadas. A Régua e o Esquadro permitem que se tracem apenas figuras retili- neas; a Régua e o Compasso, como Gédalge afirmou acima, criam a possibili- dade de construir quase todas as figuras geométricas. No Ritual de iniciagdo ao grau de Companheiro, parece que a teoria foi confundida com a pratica. Antes de construir um ediffcio, é preciso tracar-lhe os planos, e a iniciagdo ao segundo grau deveria, no nosso enten- der, ser conduzida da seguinte maneira: Na primeira viagem: Malho e Cinzel, lembrando ao Recipienddrio o seu aprendizado. Para o simbolismo do Malho e do Cinzel, seguimos os rituais geralmente em uso; mas Plantageneta observa? que o Malhoe o Cinzel ndo parecem pertencer ao grau do Aprendiz sendo na Franga e que, em qualquer outro lugar, o instrumento que estd ligado ao desbastamento da Pedra bruta € o buril, uma espécie de martelo com ponta, usado efetiva- mente pelos canteiros. Na segunda viagem: Régua e Compasso, simbolizando os conheci- mentos geométricos indispensdveis para 0 tragado dos planos dos edificios. Na terceira viagem: Régua, Nivel, Perpendicular e Alavanca, instrumen- tos necessdrios para colocar corretamente no lugar as pedras da constru¢ao. Na quarta viagem: Régua e Esquadro, instrumentos com que se veri- fica o trabalho realizado. Na quinta viagem: a Trolha, que da acabamento 4 obra. Assim, todos os Instrumentos simbdlicos retomariam seus lugares, seriam apresentados numa sucessdo légica e a iniciagdo ao segundo grau tomaria um sentido que deixou de possuir. 36 O Ritual do segundo grau deveria ser modificado; seria preciso fazer desaparecer sua incoeréncia e “primarismo”® . Terminadas as cinco viagens, entregar-se-ia ao Companheiro a Régua graduada, para simbolizar a medida e a precisfo que devem norted-lo em tudo. A Régua e a Alavanca sao andlogas, pois so formadas essencialmente pela linha reta. A Régua est ligada ao Espirito e a Alavanca & Matéria, A Alavanca, como o Cinzel, é um intermedidrio “passivo”. Ela sé se tora “ativa” pela forga daquele que a utiliza; por si mesmo, ela é “‘inerte”. Ela esta ligada, portanto, ao Conhecimento, que s6 se torna “‘inicidtico” quando aquele que o possui é, ele proprio, inicidvel, isto é, capaz de “com- preender”. A Alavanca transforma-se entdo na Forga fecunda... e perigosa, e esse é o motivo pelo qual essa Forga s6 se deve exteriorizar quando contro- lada pela Régua, o Nivel e a Perpendicular® . 5. A TROLHA Wirth, adepto das analogias morfologicas faceis, observa’? que a Trotha®* , 4 qual se di habitualmente uma forma triangular, corresponde ao ideograma alquimico do Enxofre™. No entanto, ele escreve: “Esse instru- mento serve para amassar a argamassa destinada a realizar a unidade quando as se cimentam as pedras do edificio. A SS Trolha retine, ela realiza a fusao, ela uni- fica. E portanto, essencialmente, o em- blema dos sentimentos de benevoléncia esclarecida, de fraternidade universal e de muita tolerancia, distintivos do ver- dadeiro Macom”’. “A Trotha, diz Plantageneta®®, é 0 simbolo do amor fraterno, que deve unir todos os Magons e que é 0 tinico cimento que os operdrios podem usar para a edificagdéo do Templo. Enquanto o Companheiro, mesmo Fig. 29. A trolha. 37 consciencioso, assfduo, zeloso, nado se aperceber disso sua obra nao estd acabada e ele nfo é digno de nenhum aumento de salério.” O Rito Francés, judiciosamente, ligou a Trolha a quinta viagem da iniciagdo ao grau de Companheiro, porque, com efeito, nunca podemos dar um trabalho como completamente terminado. E lamentavel que o Rito Escocés ndo possua esse simbolo em seu Ritual. Acrescentemos, ainda, que a expressdo “passar a Trolha” significa esquecer as injurias e as injusti¢as. 6. QUADROS DE RECAPITULAGAO DO SIMBOLISMO DOS UTENSILIOS Examinamos sumariamente os Utensflios em suas relag¢des com o simbolismo magénico. Resumimos de propésito: nossos comentarios em beneficio da clareza. A seguir, damos trés quadros que permitirdo que se tenha uma visdo de conjunto. I. Os utenstlios ativos e passivos ATIVOS PASSIVOS (Espirito) (Matéria) Compasso Esquadro Malho Cinzel Perpendicular Nivel Régua Alavanca Neutro Trolha 38 II. Sentidos gerais dos utenstlios UTENSILIOS SIGNIFICADO Medida na pesquisa. Retiddo na ago. Vontade na aplicacao. Discernimento na investigagdo. Profundidade na observacdo. Precisdo na execugao. Poder da vontade. Benevoléncia para com todos. Uso correto dos conhecimentos. IIL. Atributos dos trés graus e dos oficiais ATRIBUTOS DE GRAU GRAU Esquadro. ... . ins Venerivel. Esquadro sobre Compasso...... « Aprendiz. Esquadro cruzado com Compasso. . . Companheiro. Compasso sobre Esquadro . Mestre. Venerdvel. Malho. Primeiro Vigilante. Segundo Vigilante. Porpendiilars.) 2 532bahhbe tn abS sees Segundo Vigilante. Nivel yt Sate otic Rds Ria ate SAAN fe Primeiro Vigilante. Régua (com 0 olho eaespada)............. Experto. 39 NOTAS AO CAPITULO I 40 Palavra derivada do latim utensilia, utensilio, de uti, servir. Cours philosophique et interprétatif des Initiations anciennes et modernes. Edition sacrée, Nancy , 5842, p. 136. Le livre de l'Apprenti, 1931, p. 171-172. Le Symbolisme hermétique, 1931, p.37. 1895, p. 220. Jean Kotska ¢ 0 pseudénimo de Jules Doinel, que foi Macom e Patriarca da Igreja Gnéstica. Nessa obra, parece que ele se converteu de repente ao catolicismo; nela ele dd prova de um antimagonismo t4o pouco inteligente quanto o que é encontrado comumente por af. Sabemos que o teorema de Pitégoras consiste em demonstrar que o quadrado da hipotenusa de um tridngulo retingulo € igual 4 soma dos quadrados dos dois lados. Gnomon é uma palavra grega que tem sentidos muito diferentes. Como substan- tivo, significa: regulador ou régua, agulha do quadrante solar ou o préprio qua- drante. Como adjetivo, quer dizer: que conhece, que compreende. Notar-se-d que a palavra quadrante, que vem precisamente de quadrans, qua- drado, forma comum dos quadrantes solares, designa atualmente 0 crrculo graduado dos relégios, de bolso ou de parede. PARVUS, num artigo da revista Initiation (set. 1894, p. 256), intitulado: “Sobre © simbolismo do Esquadro na Franco-Maconaria”, pe na boca de Ragon o seguinte: “que o Pentagrama pode ser considerado como o misterioso e quin- tuplo esquadro”. Em nenhum lugar, na obra de Ragon, encontramos semelhante afirmacdo. Um exame, mesmo superficial, mostra a falsidade dessa alegagdo (fig. 9). Alids, 0 mesmo autor escreve: “Que ¢ o Esquadro, sendo uma dupla cruz?” Melhor seria dizer que a Cruz, como vimos, é que poderia ser um duplo Esquadro! E esse artigo era uma tese para a admissfo ao grau de bacharel na Ordem Kabbalistica da Rosa-Cruz (essa ordem, criada ¢ presidida por Stanislas de Guaita e da qual Papus era secretdrio geral, conferia trés graus com os titulos de bacharel, de licenciado e de doutor em Kabbala). Parvus, ainda, liga 0 Esquadro 4 letra hebraica vav. Ora, é evidente, conside- rando 0 alfabeto hebraico, que a letra resch seria mais adequada (fig. 10). Citamos esse exemplo porque ¢ tipico no tocante ds interpretagGes realmente ilégicas e fantasistas que certos autores podem dar do simbolismo magénico. E verdade que ndo poderfamos impor limites 4 exegese simbélica. Contudo, é prudente que nos apeguemos a um sentido légico e que nao nos afastemos dele. Caso contrario, acabaremos, forgosamente, nas elucubragdes que fazem com que os espiritos “légicos” rejeitem, e com razdo, qualquer dissertagdo sobre © simbolismo, Do latim compassare, medir com 0 passo; 0 verbo compassar e seu derivado compassamento, muito pouco usados, significam “tomar medidas com exa- ti

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