ACT e ansiedade: analise contextual
de dois casos clinicos
Daniel Afonso Assaz
‘Amanda Rafia Ferreira
DOS TRANSTORNOS DE ANSIEDADE AOS PROCESSOS
TRANSDIAGNOSTICOS
Em sua versio mais recente, o Manual Diagndstico e Estatistico de Transtornos
‘Mentais (DSM-5) descreve onze condigGes classificadas como transtornos dean-
siedade (APA, 2014). Estudos que utilizaram a versio anterior do DSM estima-
ram que cerca de 7,3% da populacéo mundial preenche os critérios diagnésticos
para um ou mais transtornos de ansiedade (Baxter et al., 2013). A depender da
metodologia do estudo e do contexto analisado, esse niimero ¢ ainda maior, po-
dendo ser de quase 20% da populagio na Regio Metropolitana de So Paulo,
por exemplo (Andrade et a, 2012).
Entretanto, diversas criticas tém sido feitas ao modelo psiquitrico tradicional
(que fundamenta 0 DSM-5) a partir da constatag4o de anomalias nas categorias
nosolégicas atuais, Entre elas estdo: (1) altas taxas de comorbidades, sendo comum
que um individuo preencha os critérios diagnésticos para mais de um transtorno
(Kessler et al., 2005); (2) baixa validade, evidente pela arbitrariedade dos limites
entre normal e patol6gico, heterogeneidade de casos classificados dentro do mes-
‘mo transtorno ¢ pluralidade de casos intermedidrios, que nao preenchem adequa-
damente os critérios para nenhum diagnéstico (Lilienfeld & Treadway, 2016); (3)
baixa confiabilidade, de modo que dois avaliadores possuem pouica concordancia
sobre os diagndsticos atribuidos (Hyman, 2010); (4) baixa utilidade pragmatica
Para planejara intervengao e prever um progndstico a partir do diagnéstico (Fitst
et al, 2004); ¢ (5) evidéncias de que diferentes processos psicoldgicos podem cul-
a ne cee fee eum Ainico fator de risco pode contri-
Diane desses problemas, hé uma endéncla mecsgqee eee a
auisudores(mencionados a seguit)em seafastardee dre ene eben
a seguir) afastar dos diagnésticos psiquidtricos
192Capitulo 10 ACT e ansiedade: andlise contextual de dois casos clinicos. 133,
tradicionais e direcionar sua atengio e seus esforgos para os processos respons-
veis pelo surgimento e manutengio desses quadros clinicos. Porém, néo ha uma
uniformidade em como conceber esses processos.
Deum lado, o projeto Research Domain Criteria (RDoC) delimita cinco gran-
des sistemas relevantes para o funcionamento humano, cada um associado a cir-
cuiitos neurais especificos: valéncia positiva, valencia negativa, cognicao, social e
ativacio/regulacao (Sanistow et al, 2010). Entao, ele se prope a estudar os pro-
essos que compdem cada um dos sistemas a partir de diferentes niveis de andlise
(p. ex, genético, molecular, celular, fisiolégico, comportamental).
Em segundo lugar, outros autores tém defendido uma abordagem bem fami-
liar aos analistas do comportamento, enfatizando a anilise funcional, baseada na
identificagao de relagoes de dependéncia entre eventos ambientais e respostas
do individuo (Callaghan & Darrow, 2015). Esta pode ser puramente idiogrifica,
construida especificamente para cada cliente (cf. Haynes & O'Brien, 1990) ou em-
basada em padrées funcionais recorrentes na populacio e previamente identifi-
cados (cf. Hayes & Follette, 1992). A Terapia Baseada em Processos (TBP) adotou
essa tiltima op¢io, utilizando pesquisas de eficécia em psicoterapia que incluem
anilises de mediagao e moderagio para identificar variéveis cuja alteracio esta
relacionada a melhora clinica para diversos clientes (Hayes et al, 2019; Hofmann
‘& Hayes, 2019). Denominadas processos,essas varidveis orientam a conceituaglo
de caso eo planejamento de intervencio (cf. Capitulo 9). No restante do capitu-
Jo, a ansiedade sera abordada sob a perspectiva da andlise funcional baseada em
padres recorrentes.
PROCESSOS COMPORTAMENTAIS ENVOLVIDOS NA REACAO.
‘AO PERIGO
Em uma anélise funcional, a ansiedade se caracteriza como um padrio de
respostas do individuo que deve ser explicado a partir de suas relagdes funcio-
nais com eventos ambientais e outras respostas. Porém, parece ser dificil especi-
ficar e operacionalizar a ansiedade,distinguindo-a do conceito de medo (Friman,
2007); separando-a de suas origens etimol6gicas metaféricas e, portanto, pouco
precisas (Friman et al., 1998); e identificando as relagbes funcionais definidoras,
incluindo relagdes respondentes, operantes e o papel do comportamento verbal
(Coétho & Tourinho, 2008).
Parte dessa dificuldade advém dos niveis de complexidade do fendmeno. Tal
como a compreensio da depressao por Ferreira e Tourinho (2011), é possivel
tratar a ansiedade como um arranjo de contingéncias mais ou menos complexo
de acordo com a participagao de tipos diferentes de varidveis tendo em vista o
modelo causal de selegdo por consequéncias. Partindo da ideia de um continuum134 sertunie comportamentais anaice funcional e Prsten cnc
194 Terapias contextuais compo
4 participagio apenas de variaveis filo
xi fourinho, 2006), se hé pa varia
mae reno & menos complexo & ele se localizaria em um
ida que participam também variaveis onto-
dos extremos do continuum. A medi P Er
genéticas, o nivel de complexidade aumenta. Se além de variiveis Blogenétcas
¢ ontogenéticas esto presentes também variéveis eee a ansiedade, nesse