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HISTORIA/
Herôdotos /

Tradução do grego, Introdução e Notas de Mário da Gama Kury

URICAMP
BIBLIOTECA CENTRAL
BE:J Editora Universldade de Brasília
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. Impresso no Brasil
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Editora Universidade de Brasília


Carnpus Universitário - Asa Norte
70910 Brasília - Distrito Federal Sumário
Copyright©1985 by Editora Universidade de Brasília

Copyright ©da introdução e das notas by Mario da Gama Kury, 1985 - Introdução 7
- Notas à Introdução 15
Direitos exclusivos para esta edição: - Tabelas de equivalência de unidades monetárias, pesos e
Editora Universidade de Brasília medidas 17

Capa: LIVRO I - CLIO. Capítulos 1-5: Prefácio. Origens da discórdia entre a


Clarice Santos
Grécia e a Ásia (rapto de 10, Europa, Medéia e Helena). 6-94: História de
Ilustração da Capa:
Croisos. Seus antepassados: Candaules, 7-12; Giges, 13-14; Árdis, 15; Sadiates
Vestíbulo do Templo de Kom Ombo e Aliates, 16-25 (guerra contra Míletos, 17-22; Aríon e o delfim, 23-24); seu
reino: submissão dos gregos da Ásia Menor, 26-28; Croisos e Sôlon, 29-33;
Equipe Técnica: morte de Ãris, 34-45; Croisos contra a Pérsia, consulta aos oráculos, 46- 55;
Editores Croisos e a Grécia, 56-70 (os povos gregos, 56-58; Atenas, tirania de Peisístra-
Lucío Reiner tos, 59-64; Esparta, as leis de Lícurgos, 65; guerra contra Tegea, o esqueleto de
Maria Riza Baptista Dutra
Orestes, 66-68; Croisos se alia a Esparta, 69-70); Croisos ataca a Capadócia,
Supervisar Gráfico 71-78; cerco e captura de Sárdis por Ciros, 74-78; apelo de Croisos a Esparta
Elmano Rodrigues Pinheiro em guerra contra Argos, 82-84; Croisos na fogueira, 85-92; monumentos e
costumes dos' lídios, 93-94; emigração lídia para a Ômbria, 94. 95-216:
ISBN 85-230-0183-2 História de Ciros. Seus antepassados: Deioces, primeiro rei dos medos, 96-
101; Fraortes, 102; Ciáxaros, 103-106; Astiages: nascimento e infância de
Ficha Catalográfica Giros, 107-122; sua revolta, 123-130; costumes dos persas, 131-140; reino de
elaborada pela Biblioteca Central da Universidade de Brasília Ciros: Ciros contra a Ásia Menor, iônios e dórios, 141-148; eólios, 149-151;
seu apelo a Esparra, 152-153; Mazares contra os lídios, 154-161 (revolta da
Lídia e conselho de Croisos, 154-156; Pacties entregue aos persas, 157-161);
Herôdotos. Hárpagos submete a lônia, 162-171 (os foceus emigram para Cimos, depois
H559h História. Intr. e trad. de Mário da Gama Kury. Brasília, para Hiele, 163-167; os téios emigram para Ábdera, 168; a lônia submetida
Editora Universidade de Brasília, c 1985. pela segunda vez, conselhos de Bias e Tales, 169-170); os cários, cáunios e
lícios, 171-177; Giros contra a Assíria, descrição da Babilônia, 178-183;
613 p. (Coleção Biblioteca Clássica UnB, 8) Semíramis e Nítocris, 184-187; captura da Babilônia, 189-191; território e
costumes dos babilônios, 192-200; Ciros contra os massagetas, a região do mar
Original grego. ILTOP{AI 'Cáspio, 202-204; expedição e morte de Ciros, 204-214 (conselho de Croisos,
875-94 H559h 938 207-208; sonho de Ciros, 209-210); costumes dos massagetas, 215-216.
t
série LIVRO 11- EUTERPE. 1-182: o Egito. Cambises ataca o Egito, 1; antiguida-
de e invenções dos egípcios, 2-4 (experiência de Psaméticos, 2; calendário
.egfpcio, 4); descrição do Egito, o território, 5-18; o Nilo, cheia, 19-27;
História 3
Herôdoros
2

-34 (expedição dos nasamones, 32-33); costumes dos Pontos Êuxeinos, do Bôsporos, da Propontis e do Heléspontos, 85-86); os
nascentes e curso, 28 , '- 6 geras e Salmoxis, 93-96; a ponte sobre o rio Istros, 97 -98; dimensões da Cítia,
" dif rentes daqueles do resto do mundo, 35-36; religião, 37-7
e(gIP~lf~s.' 1 e8 48' Héracles 43-45; origem dos deuses gregos, 49-53; do 99-101; os aliados dos citas, 102-117 (história das amazonas, 110-117). Os
sacn lC10S, 3 - " , , 6 6 citas contra Dareios, 118-144 (presentes simbólicos enviados a Dareios, 131-
, 1
oracu o e d Dodona , 54-57' , as festas, 58-64; os arumars "sagrados, ,5-7);
77-96 (ritos fúnebres, 85-90; Perseus, 91; curiosidades, lótus e 133; retirada dos persas, papel de Histíaios de Míletos, 134-144). 145-205: os
costumes, do Ezi M' 99 N' ' persas contra a Líbia. Fundação de Cirene: os mínios em Espana, 145-146;
papiro, 92; peixes, 93; embarcações, 96); história o giro, ( lh~' ,~ lto.~~IS,
colonização de Tera, 147-149; de Plarea, 150-153; Batos funda Cirene, 154-
100' Môiris, 101; Sesóstris, 102-110; Feros, 111; Proteus a istorra ven ica
158. História de Cirene, 159-167. Os povos da Líbia, 168-199. Intervenção
de Helena), 112-120; Rampsinitos (o episódio dos ladrões de seus t~sou:os),
121-123' Quêops,.agrande pirâmide, 124-126; Quêfren, 127-128; Micerinos, dos persas, captura de Barce, 200-205.
129-135' (a cortesã Rodópis, 134-135); Asíquis, 136; Anísis e Sábacos, 137-
140; Sêron, 141; tentativa de cronologia, 142-146; a dodecarquia, 14:-150 (o LIVRO V- TERPSÍCORE 1-27: Dareios contra a Europa: submissão dos
labirinto, 148; o lago Môiris, 149-150); Psaméticos, 151-157 (o oraculo de períntios, 1-2; dos trácios, 3-10; dos peônios, 12-16, (todos por Megábazos).
Buto, 155; a ilha Quêmis, 156); Necos, 158-159; Psârnis, 160; Apries, 161- Missão persa à Macedônia e sua desaparição, 17-22. Histíaios de Míletos,
171 (revolta de Âmasis, 162-169; organização social do Egito, 164-167); recompensado por Dareios, é chamado a Susa, 23-25. Conquistas de Otanes,
26-27.28-126: revolta da Iônia. Acontecimentos em Naxos e Míletos; fracasso
Âmasis, 172-182,
de Aristagoras e da intervenção persa, 28-34. Revolta de Aristagoras,
LIVRO III - TALIA. 1-38: Reinado de Carnbises. Cambises contra o Egito, mensagem de Histíaios, 35-38; Arisragoras em Espana, 39-54 (história de
causas da expedição, 1-4; os árabes, 5-9; a guerra, batalha de Pelusa e captura Esparta: Cleomenes, 39-41; Dorieus na Líbia e na Sicília, 42-48; a estrada real
de Mênfis, 10-16; contra os etíopes e Carquédon, 17-25 (Mesa do Sol, 18; os de Susa, 49-54); em Atenas, 55-97 (história de Atenas, mO.Ite de Híparcos, 55-
espiões de Cambises na Etiópia, 19-24); fracasso no oásis de Amon, 26; 57; origem fenícia do alfabeto gregQ,--.2..8:6l; expulsão dos tir~glQ§.d,)<lpel dos
Cambises fere Ápis, 27-39; sua loucura e seus crimes, 30-38 (o hábito, "rei do alcmeônidas, intervenção de Espana, 62-65; refo!'.ill.as de Cleisrenes-ern
mundo", 38), 39-60: Na Grécia, os acontecimentos de Samos, História de Atenas e de seu avô em SicíOf!.L66-69; expulsão dos Malditos, i!lterYej1.Ç~
Polícrates, 39-45; Espana contra Samos, 46-47; Corinto contra Samos, 48-49; ESP;;t00-76;1~'i:~s'de-At~-;;-;s cont~a os beócios, os calcídios, os tebanos e os
Períandros e seu filho, 50-53; cerco de Samos, os banidos de Samos em Sifnos egfnetas, 77 -89; Espana propõe aos seus aliados o resrabelecirnento da tirania
e em Crera, 54-59; monumentos de Samos, 60, 61-159: Na Pérsia, assunção em Atenas; protesto do coríntio Sôcles, história dos tiranos de Corinto, 90-
de Dareios ao poder, Revolta de Smérdis, 61-63; morte de Cambises, 64-66; 93; luta de Atenas contra Mitilene, 94-95). Atenas rompe com a Pérsia, 96, e
reinado de Smêrdis, 67-68; a conspiração dos Sete, 68-83 (intervenção e socorre os revoltados, 97; expedição contra Sárdis, 99-102; alastramento da
suicídio de Préxaspes, 74-75; assassinato dos magos, 76-79; escolha de um revolta, 103-104; a cólera de Dareios, 105: Histíaios deixa Susa, 106-107.
governante, 80-83); Dareios se torna rei, 84-88, O império de Dareios: as Fracasso da revolta; Chipre vencida, 108-116; campanha dos comandantes
satrapias, 89-97; a Índia, 98-106 (o ouro das formigas, 102-105); a Arábia, persas na Ásia Menor, 117-123. Fim de Aristagoras, 124-126,
107-113; a Etiópia, 114; os confins do mundo ocidental, 115-116; a planície de
Aces, 117, Reinado de Dareios: execução de Intafernes, 118-119; de Oroites, LIVRO VI- ERATO 1-42: fim da revolta da Iônia, Histíaios na Iônia; suas
120-128 (Oroites contra Polícrates de Samos, 120-125; execução de Oroires, intrigas em Quios, Sárdis e Míletos, 1-5; batalha de Lade, captura de Míletos,
126-128), Dareios e os gregos: o médico Democedes;o papel de Atossa, 129- 6-21; êxodo dos sâmios para a Sicília, 22-25; morte de Histíaios, 26-30. A
134; os emissários de Dareios na Grécia, 135-138; captura de Samos, 139-149 Iônia novamente escravizada: submissão das ilhas, 31-32; do Heléspontos, 33;
(o manto de Siloson, 139-141; Maiândrios em Samos, 142-143; os persas em história de Miltiades no Quersonesos, 34-41; reorganização da Iônia, 42. 43-
Samos, 144-149), Revolta da Babilônia, 150-160 (ardil de Zópiros, 153-158; 140: Dareios contra a Grécia. Primeira expedição dos persas, contra Eretria e
captura da Babilônia, 158-159), Atenas; fracasso de Mardônios, 43-45. Ultimato de Dareios a Tasos, 46-47; à
Grécia, 48. Na Grécia: acontecimentos em Áigina, acusada por Atenas diante
LIVRO IV-MELPOMENE, 1-144: Dareios contra os citas. Os citas: os filhos
de Espana, 49-86 (em Espana; Cleomenes contra Dernáratos, 51-72; origem
de escravos, 1-4; origens dos citas: Targítaos e o ouro real, 5-7; Héracles e a
da duplicidade de reis, 52-55; privilégios dos reis, 56-58; milagre de Helena e
mulher-serpente, 8-10; invasão da Ciméria pelos citas, 11-13; Arisreas do
terceiro casamento de Arísron, 61-62; deposição de Dernáraros, 63-70; morte
Proconesos, 13-15; os povos citas e seus vizinhos, 16-36 (os argipeus, 23; os
de Cleomenes: sua loucura, seu sacrilégio contra Argos, 74-84; Atenas contra
hiperbóreos, 32-35); os mapas do mundo conhecido, 36-45; os rios da Cítia,
Áigina, 85-93 (apólogo de Glaucos, 86). Segunda expedição dos persas,
45-58; costumes dos citas, 59-82 (história de Anácarsis e de Ciles, 76-80).
Expedição de Dareios: Dareios passa para a Europa, 83~92 (dimensões do
comandada por Dátis e
Artafernes, 94-95; Naxos capturada, Delos respeitada,
4 Herôdoros História 5

96-98; captura de Caristos e da Ererria, 99-101; batalha de Maracona, 102-120 eunuco Hermôtimos, 97-107; decisões dos gregos e papel de Temíscocles,
(Miltiades, 103-104; apelo dos atenienses a Esparta, 105-106; sonho de 108-112; retirada de Xerxes e de suas tropas, 113-120; partilha dos despojos
Hípias, 107; a batalha, 108-120). Discussões sobre os alcmeônidas, 121-131 de guerra e distribuição das recompensas, 121-125. Os persas que ficaram na
(Aclmáion e o ouro de Croisos, 125; Cleistenes casa com sua filha, 126-131). Grécia. Artábazos captura Olintos e cerca Potídaia, 126-130; preparativos na
Depois de Maracona; fracasso de Miltiades em Paros, 132-136; seu sucesso primavera de 479 a. c.: os persas em Samos, os gregos em Delos, 130-132;
anterior em relação a Lemnos e aos pêlasgos, 137-140. Mardônios consulta os oráculos, 133-135; suas gestões junto a Atenas, através
de Alêxandros da Macedônia, origens dos reis da Macedônia, 136-140; recusa
LIVRO VII - POLÍMNIA 1-131: do lado persa. Preparativos para uma de Atenas, apesar da solicitação de Esparta, 141-144.
terceira expedição, I; Xerxes sucede a Dareios, 2-4. Decidida a invasão, 5-19
(conselhos de Mardônios e Artábanos, 5-11; sonhos de Xerxes, 12-19); LIVRO IX - CALÍOPE. 1-122: a derrota dos persas (continuação). Na
preparativos, o canal do monte Aros, 20-25. O exército chega a Sárdis, 26-31; Grécia, a batalha de Platéia, 1-89 (Mardônios ocupa Atenas, 1-5; apelo de
ultimato às cidades gregas, 32; as pontes sobre o estreito, 33-36; o exército Atenas a Esparra, 6-12; Mardônios na Boiotia, banquete de Atáginos, os
chega ao Heléspontos, 37-53 (diálogo entre Xerxes e Artábanos, 45-52). focídios no acampamento persa, 13-18; chegada das forças gregas e primeiros
Travessia do Heléspontos, 54-58; enumeração do exército, 59-88, e da frota, choques, 19-25; os gregos comam posição diante de Platéia; altercação entre
89-100; diálogo entre Xerxes e Dernáratos, 101-104; o exército chega a tegeatas e atenienses, 25-28; as forças gregas, 28-30; as forças persas, 31-32;
Terma, 105-131 (os anfitriões do rei, 118-120; a planície do Peneios, 128-130; adivinhos e sacrifícios, Teisamenes e Melâmpus, Hegesístraros, 33-38; as
regresso dos arautos de Xerxes às cidades gregas, 131. 132-178: do lado operações: os dez primeiros dias, 39-40; o undécimo dia, reunião dos coman-
grego: o juramento dos gregos, 132; Esparta expia o assassínio dos arautos de dantes persas, 41-43; Alêxandros da Macedônia adverte os gregos, 44-46; o
Dareios, 133-137. Papel de Atenas: oráculos anunciados aos atenienses; duodécimo dia, desafio de Mardônios, 47-49; movimento das forças gregas,
Temístocles, 138-144. As gestões dos gregos: reconciliação, 145; envio de apesar da oposição de Amonfárecos, 50-57; o décimo-terceiro, batalha e
espiões à Asia, 146-147; apelo a Argos, 148-152; a Gêlon, na Sicília, 153-167 captura do acampamenco persa, 58-75; depois da batalha, conduta nobilitanre
(origens do poder de Gêlon, 153-156; conflico entre Carquédon e a Sicília, de Pausânias, 76-79; os despojos de guerra, a tenda de Xerxes, 80-83; enterro
165-167); em Córcira, 168; em Crera, 169-171; na Tessália, retirada das forças de Mardônios e dos soldados gregos, 84-85; cerco de Tebas, 86-88' retirada de
gregas, 172-174. Posições escolhidas: as Termópilas e o Arrernísion, 175-178. Artábazos, 89). Na Ásia Menor, a batalha de Micale, 90-107 (Sa~os chama a
179-238: as operações. No mar, os primeiros choques, 179-195 (as forças frota grega, história do adivinho Euênios, 90-96; os persas em Micale, 96-97;
persas no Artemísion, 184-187; a tempestade, 188-192). Em terra, batalha das os gregos avançam contra eles, 98-99; a batalha; prodígios e coincidências,
Termópilas, 193-238 (Xerxes na Tessália, em AIos e em Traquis, 196-201; as 100-101; vitória dos gregos, 102-105; discussão sobre a sorte dos iônios, 106;
forças gregas e seu comandante Leônidas, 202-208; os primeiros choques, retorno dos persas a Sárdis, 107). Em Sárdis: um caso amoroso de Xerxes,
209-212; traição de Epialtes, 2137222; vitória dos persas, 223-225; epitáfios e 108-113; captura de Sescos e castigo de Artaíctes, 114-121. Sabedoria de
valor dos comandantes gregos, 226-233; encontro de Xerxes com Demáratos Ciros, 122.
e Aquemenes, 234-237). A mensagem de Demáracos, 239. - Notas 491

LIVRO VIII -URÂNIA 1-144: a derrota dos persas. No mar, a batalhado - Índice onornásrico 531
Artemísion, 1-22 (papel de Temístocles, 4-5; batalha e tempestade no
Arternísion, 6-18; recuo da frota grega, 19-22). Em terra, os persas na Grécia - Índice de assuntos selecionados 603
central, 23-39 (nas Termópilas, Xerxes manda ocultar seus mortos, 23-26; os
tessâlios, contra os focídios, comam-se guias dos persas, 27-31; os persas na
Dóris, Fócis e Boiotia, 31-34; milagre em Delfos, 35-39). No mar, a batalha de
Salamina, 40-125 (os gregos em Salamina, evacuação de Atenas, 40-41;
enumeração das forças gregas, 42-49; ocupação de Atenas, 50-55; reunião dos
comandantes gregos, intervenção de Temíscocles, 56-64; prodígio em Êleusis,
65; os persas em Salamina, reunião dos comandantes bárbaros, intervenção de
Arrernisia, 66-70; os peloponésios fortificam o Istmo, 71-74; em Salamina,
ardil de Temístocles, 74-78; intervenção de Aristeides, 79-82; a batalha, 83-
86; após a batalha, decisão de Xerxes, conselhos de Mardônios e Arrernisia, o
Introdução

1. O autor.

Herôdoros, autor da primeira obra em prosa da literatura grega preservada


até os nossos dias, nasceu em Halicarnassos, \~ Cária (atualmente Bodrum, na
Turquia), aproximadamente em ~~, cerca de quatro anos antes das
batalhas de Salamina, das Terrnópi as e de ~Platéia. Halicarnassos ficava,
próxima a Míletos, na Iônia, em sua época o centro mais florescente da cultura
helênica'. A Cária era uma das províncias do império persa, e portanto
Herôdotos nasceu súdito de Xerxes, então o rei dos persas. A rainha de sua
província no mesmo período era Artemisia, mencionada com entusiasmo pelo
historiador em sua obra.
Seu pai se chamava Lixes e sua família, influente em Halicarnassos,
opunha-se ao tirano da cidade, lígdamis, o segundo sucessor de Arternisia.
Herôdoros participava da vida política da cidade, apoiando seu tio Paníasis, um
dos opositores do tirano"; Paníasis foi morto numa tentativa para depor
Lígdarnis, e Herôdoros teve de retiràr-se para a ilha de Samos; ele teria voltado
à sua cidade natal aproximadamente em 454, após a deposição do tirano, mas
sua estada em Halicarnassos parece ter sido efêmera.
Como em 445 Herôdotos já estava em Atenas, onde teria lido em público
a sua obra (ou parte dela) C, as viagens durante as quais ele recolheu o
abundante material para a sua História, ou seja, o período de suas investigações
(historíai; daí o nome "história", tradicional mas inadequado, como se verá em
seguida, na parte desta Introdução relativa. à obra), devem datar dessa fase de
sua vida. Suas viagens na direção leste se estenderam à Ásia Menor - às
cidades costeiras colonizadas pelos gregos, à Lídia (inclusive Sárdis, sua
capital), ao interior da Anatólia (pelo menos até Tauros) -, à Babilônia, à
Assíria e à Pérsia (até Susa e talvez a Ecbátana). Na direção sul ele foi por mar a
Tiro e ao Egito, onde subiu o Nilo ao longo de cerca de mil quilômetros até
Elefanrina. Na costa da África ao longo do Mediterrâneo na direção oeste ele
visitou Cirene. Na direção norte Herôdotos percorreu o mar Negro e visitou
algumas das regiões adjacentes a ele - a Colquis, no leste; a atual Ucraína (em
linhas gerais a antiga Cítia), para o norte; e para o oeste os territórios dos
8 Herôdotos História 9

trácios e dos geras. Ele conheceu a bacia oriental do Mediterrâneo - as ilhas mente "busca, investigação, pesquisa"; então o historiador, do ponto de vista
do mar Egeu, a costa da Trácia e da Macedônia e as cidades da Grécia etimológico, é uma pessoa que se informa por si mesma da verdade, que viaja,
continental e do Peloponeso -; na bacia ocidental a Sicília e a Magna Grécia que interroga, em vez de limitar-se a transcrever dados à sua disposição e
parecem ter sido os limites de sua viagem (mais tarde ele chegaria a Túrioi - a repetir genealogias, cronologias e lendas, ou compilar registros relativos à
atual Torre Brodognato). fundação de cidades, tudo com o intuito exclusivo de satisfazer a curiosidade
ingênua de um público ainda pouco exigente, sem estabelecer a menor
Durante sua primeira estada em Atenas Herôdotos teria recebido um distinção entre acontecimentos reais ou relatos imaginários, entre fatos ou
prêmio de dez mil talentos (veja-se a relação de unidades monetárias antigas e peripécias fantásticas.
suas equivalências em seguida à introdução) após a leitura pública de sua obra.
Lá ele teria convivido com homens ilustres como Péricles, por quem Evidentemente houve progresso entre os próprios logógrafos com o
demonstra admiração na História, Anaxágoras, um dos maiores filósofos da passar do tempo e com as exigências maiores de um público mais esclarecido
época pré-socrática, Sófocles" e Eurípides .. pelos primeiros filósofos, e os predecessores imediatos de Herôdotos já se
distinguiam sensivelmente dos mais remotos; mesmo através dos escassos
Em 444/443, por iniciativa de Péricles, foram enviados colonos gregos à fragmentos remanescentes é possível aferir a evolução havida entre o primeiro
Itália para fundar uma cidade nova - Túrioi, na costa do atual golfo de logógrafo cujo nome conhecemos - Cadmos de Míletos - e Hecataios, quase
Taranto, no local onde existira Síbaris, destruída havia pouco por sua vizinha contemporâneo de nosso autor e significativamente logógrafo e geógrafo.
Crotona. Herôdotos juntou-se aos colonos e tornou-se cidadão de Túrioi, cuja Com efeito, os próprios títulos das obras de Hecataios, das quais nos restam
constituição teria sido elaborada por Protágoras de Ábdera, o primeiro dos fragmentos interessantes, são elucidativos: a mais antiga ter-se-ia chamado
grandes sofistas, que exerceu notória influência intelectual na Atenas do Genealogias, e a última Descrição da Terra (ou Volta ao Mundo), marcando uma
século V". Essa aproximação explica a existência na História de idéias nas quais evolução interna na própria obra de Hecataios", Outro dado importante é que
é visível pela primeira vez na literatura grega a influência dos sofistas, a Descrição da Terra teria sido acompanhada por um mapa-múndi - o segundo
principalmente nos capítulos 72 e 80 do livro Hl (vejam-se as notas 272 e aparecido na Grécia, de acordo com o geógrafo Eratósrenes (em Srrâbon,
274). Herôdotos teria vivido em Túrioi os últimos vinte anos de sua vida e lá Geografia, I, 11; o primeiro teria sido de autoria do filósofo Anaxímandros).
teria morrido, provavelmente em 425. Suas ligações com Túrioi levaram
Aristóteles e outros autores gregos a chamar o nosso autor de "Herôdoro de ';::;9 Mas o "pai da História" merece e~se título. ~a!s por haver d~d~ ~m grande
Túrioi" (para Aristóteles, veja-se a Retórica, 1409 a 28). passo à frente do que por haver criadodefinirivamente a história como a
concebemos hoje; essa glória caberia ao seu continuador, Tu ' ·des com sua
As influências mencionadas nos dois parágrafos anteriores foram obvia- História da Guerra do Peloponeso. De fato, nosso autor ainda tem muitos dos
mente tardias no caso de Herôdotos, pois sua educação na juventude deve ter hábitos que censurava em seus predecessores: a paixão pelas genealogias, pelo
sido a tradicional antes do advento dos sofistas, ou seja, a leitura dos poetas, maravilhoso, pelo lendário e até pelo puramente mírico', e um certo descaso
principalmente Hornero', que ele cita e até comenta (veja-se o capítulo 116 do pela cronologia, quando isso lhe serve para reforçar alguma concepção moral
livro 11). Além dos poetas ele faz alusões a Hecaraios e a Esopo entre os (por exemplo, o encontro e a conversa entre Croisos e Sôlon no livro I,
prosadores. capítulos 29-33 é cronologicamente impossível, mas serve aos propósitos de
Herôdoros foi naturalmente influenciado por seus predecessores - os 'Herôdoros: mostrar que a felicidade dos homens é efêmera). E talvez o autor
logógrafos iônios de que falaremos mais adiante -, especialmente por Heca- .da História tenha acrescentado a essas deficiências de seus predecessores
taios, mais próximo a ele no tempo, ao qual se atribui a expressão que o autor outras muito provavelmente suas: a credulidade fanática nos oráculos, cuja
da História tornou famosa: "o Egito é um presente do Nilo'w, validade ele insiste tanto em comprovar, uma religiosidade supersticiosa ao
extremo. e uma tendência irresistível às digressões, às vezes tão extensas e
2. A Obra. múltiplas que fazem esquecer o assunto principal', embora ele manifeste a
intenção de não ser prolixo (..... para não contar uma longa história .;" ; veja-se
o capítulo 61 do livro I). Mas, à exceção de sua credulidade relativamente aos
Herôdoros é chamado "pai da história" porque antes dele houve apenas
oráculos .e à sua religiosidade Herôdotos demonstra um certo cuidado em
logógrafos (literalmente "escritores em prosa", em contraste com os "escrito-
relação às suas informações, estabelecendo não somente uma distinção entre o
res em verso"; estes eram não somente os poetas propriamente ditos mas
que ele mesmo viu e o que apenas ouviu, mas fazendo ressalvas em relação às
também os filósofos, que até certa época usavam a forma poética). O nome de
narrações de testemunhas oculares e aos simples relatos'.
/ogôgraphos refletia apenas a qualidade de prosador, enquanto o de historiador
(historikôs) tem um significado mais definido, pois bistori« quer dizer originaria- Quanto às digressões, se por um lado elas se sucedem com uma freqüência
Herôdotos História 11
10

desconcertante devernos-lhes tantas informações interessantes, tantos casos ilustrar esse ponto: a discussão que nosso autor imagina entre três persas
pitorescos, tantos pequenos contos preciosos, que para alguns leitores elas importantes a respeito da melhor forma de governo (dizemos "imagina"
poderão parecer o melhor da História. porque segundo tudo indica se trata de um pretexto de Herôdotos, já
influenciado pelos primeiros sofistas, para expor suas próprias idéias, sem
Talvez o próprio plano da obra, cuja primeira parte (os quatro primeiros dúvida evoluídas para a época) nos capítulos 80-82 do livro III - a primeira
livros) é em grandes linhas uma enorme digressão, explique essa pecualiarida- manifestação da filosofia política na literatura grega -, e várias passagens dos
de. Realmente, o objetivo principal da História é a guerra entre o império livros V e VI que marcam o início da história constitucional, a propósito das
persa e a Hélade, entre o despotismo oriental baseado na vontade onipotente mudanças de formas de governo em algumas cidades-estados da Grécia.
dos tiranos e na sujeição cega dos povos dominados, e o governo fundado na
obediência às leis e na livre determinação dos povos no Ocidente. Há também na História algumas manifestações de realismo político
igualmente pioneiras (vejam-se os capítulos 50 do livro V e 30 do livro VIII), e
Para acentuar a importância da guerra Herôdotos quer mostrar primeiro o a primeira profissão de fé na democracia (no capítulo 78 do livro V).
poderio imenso do império persa, traçando as principais etapas de seu
crescimento até o apogeu. E como na Grécia havia um desconhecimento quase Mas desde o início da História Herôdotos expõe candidamente o seu
total a respeito desse enorme império, o nosso autor, à proporção que vai objetivo, completamente diferente daquele de seus dois sucessores mais
mencionando sucessivamente os povos dominados pelos medos e persas, entra ilustres na historiografia grega (separados um do outro por um grande lapso de
em todos os detalhes disponíveis sobre tais povos: os lídios, os egípcios, os tempo). De fato, escrevendo suas Histórias Tucídides e Políbios deixaram clara
medos e os persas, os etíopes, os líbios, as colônias helênicas da Ásia Menor, os a sua intenção, que era antes de tudo ser úteis; considerando imutáveis as leis
citas e os trácios. . que governam a conduta humana eles acharam que, pesquisando o passado, é
possível aprender a prever o futuro e a enfrentá-Io melhor. Esse ponto de vista
Mas, mesmo nos cinco livros restantes as digressões de toda ordem positivo e pragmático não é ainda o de Herôdotos, cujas primeiras palavras são
continuam, diluindo até certo ponto a consistência do assunto principal e para dizer que vai contar feitos maravilhosos e admiráveis dos helenos e dos
conseqüentemente a grandiosidade do tema. Entretanto, a arte de Herôdotos bárbaros, para que eles não deixem de ser lembrados.
salva afinal a História, de tal forma que é possível dizer, numa comparação
inevitável entre nosso autor e Tucídides, que em Herôdoros a grandeza da Ora: a motivação desses feitos na obra de nosso autor é mais de ordem
obra está mais nos próprios acontecimentos principais do que em sua moral e religiosa do que política. Herôdotos acredita na existência de uma lei I
exposição, enquanto em Tucídides essa grandeza está mais na exposição do que governa os acontecimentos, mas para ele essa lei também é mais ético-
que nos acontecimentos principais; no caso deste último, com efeito, a religiosa do que política, e já fora expressa repetidamente por Sôlon, Píndaros
importância da guerra do Peloponeso, embora considerável, era bem menor e Ésquilo: o homem é infeliz por natureza, e a vontade divina quer que ele
que a da guerra entre o império persa e toda a Hélade, na qual foi decidida a continue a sê-lo; se ele tentar sobrepor-se a essa lei pela arrogância e pela
predominância do Ocidente sobre o Oriente (pelo menos por alguns violência, o despeito divino o marcará; a cólera dos deuses (bjbris), o seu
milênios'). desprezo (kôros) e sua punição (Áte) o atingirão e aniquilarão fatalmente: a
Naturalmente a confiabilidade das incontáveis informações de Herôdotos Nêmesis (justiça divina) está sempre pendente sobre o homem.
tem sido objeto de severas críticas desde a Antiguidade, principalmente em Já no capítulo 5 do livro I Herôdoros alude a essa ação sobrenatural e fatal,
confronto com a de Tucídides e Políbios, que com nosso autor constituem a que torna instável a felicidade, a prosperidade e o poder dos homens, e no
extraordinária tríade da historiografia grega. A parte relativa à cronologia e à capítulo 10 do livro VII ele põe na boca de um persa, Artábanos, o enunciado
história mais antiga do Egito no livro 11, por exemplo, é considerada pelos dessa lei dos deuses: "... a divindade fulmina com seu raio os animais de grande
estudiosos modernos como absolutamente destituída de valor histórico. E porte, sem permitir que eles o ostentem, enquanto não faz qualquer mal aos
como essas, numerosas outras informações são contestáveis ou mesmo pequenos; ela atinge sempre com seus dardos as casas e as árvores mais altas;
inaceitáveis", Em algumas passagens da obra o próprio Herôdoros faz suas em verdade, a divindade se compraz em rebaixar tudo que se eleva."
ressalvas, como no capítulo 195 do livro V, onde ele diz: "não sei se isso é
verdade; escrevo o que se fala." Todas as faltas humanas atraem uma punição, mas principalmente a
arrogância, falta irreparável (livro III, 40, livro VIII, 77 etc.); nada escapa à
Não se pode dizer que a História de Herôdotos seja preponderantemente divindade (I, 91), e os próprios oráculos e presságios mal interpretados pelo
política, como a de Tucídides - muito ao contrário.. sob esse aspecto ela é culpado o enganam e o levam ao aniquilamento. Em suma, no âmbito das ações
sensivelmente inferior à de seu continuador -, mas seja como for ele é humanas tudo é conduzido pela vontade divina'(VIII, 13). A própria expressão
pioneiro também quanto a isso. Bastaria citar aqui dois tópicos da História para
- 12 Herôdoros História 13

"providência divina" é usada literalmente por Herôdotos nesse contexto (lU, época), ao mesmo tempo favorece a doçura e dificulta a veemência ~ a paixão,
108 etc.). Evidentemente se torna impossível sob essas leis um sistema de de tal forma que os críticos da Antiguidade, indecisos entre as qualidades dos
causalidade onde haja lugar para decisões responsáveis, políticas ou não, e se dois grandes historiadores tão diferentes um do outro, a~ribuem a Herô~otos
pode distinguir facilmente a diferença existente entre tal filosofia da história e o título de melhor modelo. do dialeto iônio, e a Tucídides a supremacia no
a de Tucídides, que não procura a lei fora dos fatos e tenta descobrir as causas dialeto ático.
na própria esfera de ação. dos homens.
A frase de Herôdoros é freqüentemente curta, composta de membros
Embora Herôdotos fale em preservar a memória dos feitos maravilhosos e jusraposros, com fórmulas introdutórias", de retom~da do. assu~to. principal
admiráveis ele se compraz muitíssimas vezes em registrar ações motivadas por após as inúmeras' digressões, que permitem aos 1~ltore.s (e pnnClpalmente
sentimentos que nada têm de admirável ou de maravilhoso; entre tais permitiam aos ouvintes nas leituras públicas) segurr faCllme.~~e ~ fluxo. das
sentimentos sobressai cO.mo mola mestra dos atos humanos a vingança, mas a idéias; para assegurar a clareza Herôdoros repete com freqiiência a mesma
vingança dos próprios homens (e muitas vezes mulheres) uns contra O.Soutros, palavra a curtos intervalos (tanto neste caso. quanto em .todas as O.~tras
e não a vingança da justiça divina. De fato, há ao longo da História menções características do estilo. de nosso autor, procuramos reproduzir na tradução as
incontáveis a vinganças, quase sempre terríveis, de uma crueldade bárbara e peculiaridades do. original).
.
descritas com uma dureza à altura dos próprios atos.
A forma atual da História - a sua distribuição em nove livros encabeçadO.s
Encontram-se igualmente na História fatos em que Herôdotos parece pelos nomes das nove Musas e em capítulos - parece datar da épO.ca
querer mostrar que de causas insignificantes podem resultar efeitos da maior alexandrina' a divisão. dos livros às vezes é arbitrária (por exemplo, entre O.S
importância - por exemplo, no. capítulo 134 do. livro III, onde uma conversa livros U e Hl), e sua subdivisão em capítulos O. é ainda mais.
de alcova, embora entre um rei e uma rainha, teria levado. esta última, instada
por um homem saudoso. de sua pátria, a conseguir que O.rei Dareios tomasse a 3. A tradução.
decisão. de atacar a Hélade.
Seguimos geralmente em nossa tradução. O.texto da ediçã~ crítica de H.
A propósito, a comparação. das versões de Herôdoros e de Tucídides" para Stein Herodoti Historiae (Berlin, 1869-1871). Valemo-nos frequentemente do.
um mesmo episódio, famoso nos anais da política ateniense - a motivação com:ntário de W. W. How e J. Wells (Oxford, 1912, 2 vols., reedição de
supostamente heróica de Harrnôdios e Aristogêiton para O.atentado. contra um 1928), e da Histoire de Ia Linérature Grecque por A. e M. Croiset para a
dos pisistrátidas (uma família de tiranos de Atenas) -, é muito. ilustrativa da introdução (voi. U por A. Croiset, Paris, 3" edição, reimpressãO."d~ 1.933}.
diferença entre o método dos dois historiadores (veja-se também O.tratamento. Consultamos também com proveito as traduções de A. Braguet, na Bibliothe-

I\
dado pelos dois historiadores ao episódio. da conspiração de Cílon: Herôdotos, que de Ia Pléiade" (Paris, 1964), de Ph.-E. Legrand (Paris, 1932 e seguintes, 11
V, 71 e Tucídides, I, 120-121). vols.), de George Rawlinson (reimpressão revista, Londres, 1935) e de A. D.
O estilo de Herôdotos era tão n9vo quanto a sua concepção de história no Godley (Londres e Cambridge/Mass., 1921 e seguintes, 4 vols.),
sentido. de investigação. Os logógrafos iônios precursores de nosso autor . Nosso critério, nesta tradução. como. nas anteriores, foi O. da máxima
repetiam-se igualmente em matéria de estilo, não diferindo uns dos outros fidelidade possível ao. original (inclusive ao estilo. peculiar de Herôdotos).
também sob esse aspecto'; contentavam-se todos com uma simplicidade clara,
com uma precisão tendendo para a aridez e uma ingenuidade às vezes graciosa. Não pretendemos ter sido. absolutamente coerentes na transcrição. dos
Segundo Dionísios de Halicarnassos (crítico do século I a.C)", viu-se pela nomes próprios (afinal são milhares ~e t,o~ônimos, gentílicos e a~tropôni~os);
primeira vez com Herôdotos o estilo apresentar uma originalidade realmente seguimos também nesse ponto o principio adotado nas traduçoes ante~l~res,
marcante, além de produzir uma impressão de beleza até então. desconhecida. de respeitar fielmente a forma original dos nomes gregos em vez de alatiná-los
Nosso autor, ainda segundo Dionísios de Halicarnassos (id., ib.), foi o primei- \ ou aportuguesã-los (note-se que nos nomes próprios transliterados o "c" e o
ro escritor a dar à Grécia a idéia de que uma bela frase em prosa pode "g" são. sempre duros, mesmo antes de "e" e "i"). Limitamos as exceções a
equivaler a um belo verso. Concluindo O mesmo capítulo Dionísios detalha nomes como Homero e Ésquilo, onde o uso reiterado, a exemplo. do. que
melhor os méritos peculiares ao estilo de Herôdotos: doçura insinuante, acontece com Plarão e poucos outros, justifica a adoção dessas formas. Nesse
encanto esquisito, todas as qualidades maiores e mais brilhantes à exceção das ponto fomos ainda mais longe do que em nossa tradução de Tucídides, e nos
convenientes às lides oratórias; ou seja: faltava-lhe apenas a veemência apaixo- sentimos em boa companhia nessa prática, pois ela vem sendo preferida cada
nada de Tucídides e de Demóstenes. Aliás, o dialeto. iônio, no qual o nosso vez mais nas traduções inglesas e francesas, para não falar nas alemãs. Afinal,
autor escreveu a sua obra (esse era o dialeto. usado em Halicarnassos na sua trata-se de nomes próprios estrangeiros e não nos parece haver razões mais
14 Herôdoros

fortes para fazê-Ios chegar ao português através de suas formas alatinadas (não
há por que perseverar nesse procedimento medieval, instituído numa época
em que a literatura grega era considerada subsidiária da latina no Ocidente
europeu). Para evitar eventuais dúvidas, damos no índice, entre parênteses, as
formas alatinadas tradicionais. .

Com o objetivo de facilitar a composição tipográfica as palavras gregas são


. transliteradas em caracteres latinos e aparecem em grifo.

Rio, novembro de 1983


Mário da Gama Kury

Notas à Introdução

(a) Hecaraios (fim do século VI - início do século V a.C), o mais ilustre dos logógrafos da geração
anterior à de Herôdotos, nascera e
vivia em Míletos, e lá a filosofia grega tinha dado os primeiros
passos no século VI com Tales, Anaxímandros (autor do primeiro mapa-múndi; Hecaraios
acrescentaria o segundo à sua Descrição da Terra duas gerações depois) e Anaximenes, da chamada
escola iônia. Herôdoros, cuja infância coincidira com os feitos heróicos dos helenos em sua guerra
contra os persas - ou seja, o tema inspirador da História -, certamente cresceu entre celebrações
faladas e escritas de tais feitos.

(b) Paníasis era um poeta famoso na época, elogiado ainda por Quintiliano mais de quinhentos anos
depois (Lnstituições Oratórias, X, I, 54); restam-nos poucos fragmentos da obra de Paníasis, em citações
de autores posteriores (páginas 5 a 12 da coletânea de Dübner, Paris, 1841).

(c) Segundo Suídas (ou Suda), Fôrios (Biblioteca § 60) e Marcelinos (§ 54), Tucídides, ainda
adolescente, teria ouvido essa leitura.

(d) Sófocles, o grande tragediógrafo e homem público ateniense, dedicou a Herôrodos um epigrama,
citado parcialmente por Plúrarcos em seu opúsculo Devem os Homens Idosos Participar do Governo? (cap.
III). Há pelo menos duas reminiscências claras da obra de Herôdoros nas tragédias de Sófocles:
Antígona, versos 904 e seguintes =
livro III, 119, e Édipo em Colonos, 337-341 =
II, 35; há outras
possíveis reminiscências no Édipo Rei, 1530 = 1,32, na Electra, 62-64 = IV, 95 e no Édipo em Colonos,
1225 e seguintes =I, 31 e VII, 46. O -helenista austríaco Theodor Gomperz escreveu um artigo
interessante, usando as relações entre Herôdotos e Sófocles como ponto de referência na cronologia
do primeiro; veja-se Mélanges Henri Weit, páginas 142-145, Paris, 1898.

(e) Essa influência foi tão grande que Prorágoras teria tido de fugir de Atenas para livrar-se de uma
condenação à morre, sob a acusação de ateísmo e de desrespeito às tradições.

(f) Ao longo de sua obra Herôdoros alude também a Hesíodos, Arquílocos, Sôlon (poeta e estadista),
Safo, Alcaios, Anacrêon, Simonides de Céos, Píndaros, Frínicos e Ésquilo.
(g) Veja-se o fragmento 279 de Hecaraios na coletânea de Míiller, Fragmenta Historicorum Graeeorum,
vol I (Paris, 1841, reimpressão de 1928); a expressão de Herôdotos ocorre no capítulo 5 do livro lI, e
o fragmento de Hecataios é uma citação de Arrianos, Expedição de Alexandre, V, 6.

(h) O exigente filósofo Herácleitos (segundo Diógenes Laêrrios, IX,·1) inclui Hecataios entre os
homens mais sábios da Hélade, juntamente com Hesíodos, Pitágoras e Xenofanes.

(i) Arisróreles chama Herôdoros de mytbôlogos (Da Geração dos Animais, 756 b 6).

(j) O próprio Herôdotos, com uma ingenuidade deliciosa, reconhece essa prática exagerada; veja-se o
capítulo 30 do livro IV.

(k) Vejam-se os capítulos 123 do livro II e 152 do livro VI~ para o critério de Herôdoros quanto à

16 Herôdoros

reprodução de informações de um modo geral.


Tabela de equivalência aproximada de unida~e~ monetárias,
(I) Temos entre nós um exemplo comparável, mantidas as proporções: a arte de Euclides da Cunha pesos e medidas mencionadas na Histõria.
transformou a história de um acontecimento secundário - o fanatismo e a rebeldia de Antônio
Conselheiro - numa obra-prima.
Unidades monetárias:
US$ 1.000,00
(m) Experiências recentes, todavia, dão razão ao nosso agradável contador de histórias. Por exemplo: Talento (= 6.000 dracmas ou 60 minas)
de um modo geral os comentadores de Herôdotos achavam impossível que Feidipides tivesse levado 17,00
Mina (= 100 dracmas)
apenas um dia e meio para ir corre rido de Atenas a Esparta (cerca de 250km), a fim de transmitir o 3,40
pedido de ajuda dos atenienses aos espartanos (veja-se o livro VI, capítulos 105-106); pois segundo Dárico
1,80
nota publicada na página 62 do The Economist de 24-9-1983, atletas da Real Força Aérea Inglesa, Estáter de ouro
0,40
desejosos de testar a veracidade de Herôdotos, repetiram a corrida pelo mesmo percurso acidentado e Estáter de prata
a realizaram em trinta e quatro horas e meia (o título da nota do The Economist é "Herodotus was 0,08
Dracma (coríntio), 0,17. Quarto (quiano)
Right").

(n) Vejam-se Herôdoros, V, 71, e Tucídides, I, 20 e VI, 54 e seguintes. Medidas de extensão:


1m776
Orgiiá (braça)
(o) Dionísios de Halicarnassos, Sobre Tucídides, capítulo 23. Om527
Côvado (egípcio e sâmio)
(p) Por exemplo: "A causa disso foi o seguinte ... ", "Depois disso aconteceu o seguinte ... ", "Isso se Om525 a Om532
Côvado real
passou da seguinte maneira ... ''. Om444
Côvado normal
Om296

Om222
Palmo
Om0185
Dedo
Medidas itinerârias
lOkm566
Escoino
5940m
Parassanga (medida persa, légua)
177m60
Estádio
29m60
Pletro
Om74
Passo
Medida agrária:
Árura (um quadrado de 100 côvados de lado)

Medidas de capacidade:
a) líquidos:
19 litros 44
Ânfora
O litros 27
Côtilo
O litros 045
Gato
b) sólidos:
55 litros 08
Árrabo (persa)
51 litros 84
Mêdimno
1 litro 08
Quênice
O litro 27
Côtilo
Medidas de peso:
30kg240
Talento babilônio
25kg920
. Talento normal
432g
Mina
4g32
Dracma
Livro I
CLIO

1. Os resultados das investigações de Herôdotos de Halicarnassos são


apresentados aqui, ~qJ!.e--ª_lll-~1Pór!a dos acontecimentos não se apague.
entre os homens com o passar do tempo, e para que feitos maravilhosos e
admiráveis dos helenos e dos bárbaros! não deixem de ser lembrados, inclusive
as razões pelas quais eles se guerrearam.

•• Os doutos dizem que os fenícios foram a causa da desavença. Os fenícios,


segundo afirmam os persas, chegaram ao nosso mar vindos do chamado mar
Erírraios" e, estabelecendo-se no território que até agora ocupam, começaram
imediatamente a empreender longas viagens. Entre outros lugares até onde
levaram mercadorias egípcias e assírias eles chegaram a Argos; naquela época.
Argos se destacava em tudo na região atualmente chamada Hélade. Então os
fenícios vieram até Argos e lá descarregaram suas mercadorias. No quinto ou
sexto dia após a sua chegada, quando sua carga já estava quase toda vendida,
veio à orla marítima, entre muitas outras mulheres, a própria filha do rei;k
'-.....acordo com os relatos tanto dos persas quanto
- -- .-
dos helenos, seu nome era 10, a
f1 a de Inacos. As mulheres ficaram nas proximidades da popa da nau, e
enquanto elas barganhavam os produtos que lhes interessavam, os fenícios se
animaram uns aos outros para a tentativa, e correram em sua direção com o
objetivo de agarrá-Ias. A maior parte das mulheres escapou, mas 10 e algumas
outras foram alcançadas; os fenícios as arrastaram para a nau e partiram no
rumo do Egito.
2. E assim 10 chegou ao Egito, segundo dizem os persas (mas não os
helenos), e esta, em sua opinião, foi a primeira ofensa cometida. Depois disso,
de acordo com sua versão, alguns helenos, cujos nomes eles não sabem dizer,
desembarcaram em Tiro, na Fenícia, e raptaram Europe, a filha do rei (esses
helenos 'deveriam ser cretenses). Até esse ponto as ofensas se compensavam,
mas depois disso, dizem eles, os helenos foram culpados pela segunda ofensa.
Eles navegaram em uma nau longa até Aia, na Colquis, e o rio Fásis': depois de
concluir os negócios para os quais tinham vindo eles raptaram Medéia, a filha
--- ., ... ---
do rei. Quando o rei dos colquídios mandou um arauto para pedir reparação
r
História 21
20 Herôdoros

pelo rapto e a restituição de sua filha, os helenos responderam que lhes tinha Paflagônia e deságua na direção do norte do mar chama~o Êuxeinos". Tanto
sido negada a reparação pelo rapto da argiva 10, e portanto nada concederiam quanto sabemos, esse Croisos foi o primeiro bárbaro a subjugar alg~Ans.helen~s
aos colquídios. e lhes impor tributos, além de conquistar a amizade de o~t~oS (os lOp1.0S estao
no primeiro caso, juntamente com os eólios e os d?nos da AS1a, e os
3. Então, dizem eles, na segunda geração depois desses fatos Alêxandros", lacedemônios estão no último). Antes do reinado de CrOlSOS todos o~ helenos
filho de Príamos, tendo ouvido essa história, teve a idéia de obter para si eram livres, pois as hordas cimérias que tinham invadid~ a !ônia antenorm:nte
mesmo uma esposa na Hélade mediante rapto, inteiramente convencido de à época de Croisos não havia subjugado as cidades, limitando-se a ataca-Ias
que, da mesma forma que os helenos não haviam oferecido reparação, ele para saqueá-Ias.
também não a ofereceria. Assim ele raptou Helena. Os helenos resolveram
7. A hegemonia, antes nas mãos dos herâclidas", passou à raça de Croisos
primeiro enviar mensageiros para pedir a restituição de Helena e uma
reparação pelo rapto; quando, porém, essa proposta foi feita, ouviram como _ os chamados mermnadas - da seguinte maneira: ~andaules: ch.amado
resposta que Medéia tinha sido raptada, e lhes foi dito ainda que eles, que Mírsilos pelos helenos, era o tirano de Sárdis; ele descendia de Alcaios f~lho de
agora pediam reparação a outros, não a tinham concedido nem devolvido a Heraclés; Ágron, filho de Ninos (o filho de Belos, que por sua :ez era f11~0 de
mulher raptada, apesar das reclamações dos ofendidos. Alcaios), foi o primeiro heráclida rei de Sárdis, e Candaules, filho de M1~SOS,
foi o último. Os reis dessa região antes de Agron eram descendentes d~ Lidos,
4. Até aí se tratava apenas de raptos de ambos os lados. Mas depois disso, filho de Átis, do qual todo o território lídio tirou o ~e~ nome (antes disso ele
segundo os persas, os grandes culpados foram os helenos; com efeito, eles era chamado "terra dos méios"). E destes os heráclidas, descendentes de
invadiram a Ásia antes dos persas terem atacado a Europa. Raptar mulheres, Heraclés e de uma escrava de Iárdanos, receberam o poder e o exerceram em
dizíam os persas, é uma injustiça dos homens, mas querer obstinadamente virtude de um oráculo; eles governaram durante vinte e duas geraç?es, ou
vingar o rapto é insensatez; os homens prudentes não dão importância alguma quinhentos e cinco anos, filho sucedendo a pai, até Candaules, filho de
a mulheres raptadas, pois obviamente elas nunca teriam sido raptadas se não
Mirsos".
quisessem. Os próprios asiáticos, dizíam.os persas, não se preocupam de modo
8. Esse Candaules, então, era apaixonado por sua própria mulher, a ponto
algum com o rapto de mulheres, mas os helenos, por causa de uma mulher
de em sua paixão pensar que ela fosse muito mais bela que to~as as ?utras;
lacedemônia, tinham organizado uma grande expedição, tinham vindo até a
convencido disso, ele falava com entusiasmo de sua beleza a Giges, f~lho de
Ásia e haviam destruído o poderio de Príamos. Depois disso eles passaram a
Dáscilos seu favorito entre os componentes de sua guarda pessoal, pois er~ a
considerar o mundo helênico seu inimigo. De fato, os persas pretendem que a
Giges q~e Candaules confiava seus segredos mais importantes. Não ~U1tO
Ásia inteira e todos os povos bárbaros seus habitantes lhes pertencem; a
Eur~pa e o mundo helênico são para eles uma região à parte.
tempo depois Candaules (ele estava fada?o ao infortúnio) dis~e o segumte a
Giges: "Penso, Giges, que não crês nas minhas palavras a re~pelto da beleza de
5. Essa é a versão dos persas quanto a tais acontecimentos; em sua opinião, minha mulher (os homens confiam menos em seus ouvidos que em seus
a captura de Tróia foi o início de sua desavença com os helenos. Mas os olhos); age então de maneira a vê-Ia- nua." A isso Giges respondeu elevan?o a
fenícios não estão de acordo com os persas a propósito de 10; eles dizem que voz: "Senhor! Que palavras nada limpas dizes, mandando-me ver a minha
não a levaram para o Egito à força; ela teve relações sexuais em Argos com o senhora nua! Na mesma hora que tira sua roupa uma m~lher se. des:a~ de seu
comandante da nau; depois, percebendo que estava grávida, ela envergonhou- pudor. Há muito tempo os homens estabeleceram ~rece1tos multo sábios, qu~
se pensando que seus pais iriam perceber o seu estado, e partiu espontanea- temos de aprender; um deles é que cada um de ~<:.sdeve o.lhar para o que e
mente com os fenícios para evitar a descoberta de seu erro. São essas as seu. Quanto a mim, estou convencido de sua cond1ç~0 d~ ~a1s bela e~tr; toda.~
- versões dos persas e dos fenícios t uanto a mim, não direi a respeito dessas as mulheres; suplico-te portanto que não me forces a pratica de atos rruquos.
coisas que elas aconteceram de um~aneiiã oü da outra, mas apontarei a-
pessoa que, em minha própria opinião, foi a primeira a ofender os helenos', e 9. Assim falando Giges tentava demover o rei de seu propósito, P?is
assim prosseguirei com minha história, falando igualmente das pequenas e receava qu e algum mal lhe viesse dele- ' mas .'a resposta deA'Candaules foi a
grandes cidades dos homens, pois muitas cidades outrora grandes agora são seguinte: "Tem coragem, e não temas que eu diga 1SS0p~ra ~or-te a prova, nem
pequenas, e as grandes no meu tempo eram outrora pequenas. Sabendo que minha mulher venha a' fazer-te algum mal. ~rranJ~re1 tudo de tal modo
portanto que a prosperidade humana jamais é estável, farei menção a ambas que ela jamais saberá que a tenhas visto. Introduz1r-te-e1 no quarto onde ~la e
igualmente. eu dormimos e te porei atrás da porta aberta; após a minha entrada minha
mulher também virá para o leito. Há uma cadeira colocada p~rto da en:rada do
6. Croisos era lídio de nascimento, filho de Aliares e tirano" de todos os quarto; nela minha mulher deixará cada peça de sua roupa a proporçao que a
povos habitantes a oeste do rio Hális', que vem do sul entre a Síria e a
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História 23
22 Herôdotos
rei. Mas a sacerdotisa pítia declarou ainda que os heráclidas deveriam vingar-se
for tirando, e terás oportunidade de contemplá-Ia calmamente. E quando ela dos descendentes de Giges na quinta geração; os lídios e seus reis não se
for da cadeira para o leito, ficando de costas para ti, sai com cuidado para que preocuparam todavia com essa profecia, até o dia de sua realização.
ela não te veja transpor a porta." .
·G14. Assim os mermnadas desporajaram os heráclidas do poder e passaram
10. Não havendo meios de fugir ao pedido, Giges concordou. Candaules, ./ a exercê-Ia. Assumindo o poder, Giges enviou não poucas oferendas a Delfos;
quando julgou chegada a hora de ir para o leito, introduziu Giges no quarto, e lá estão numerosas oferendas de prata mandadas por ele, e além da prata Giges
logo depois sua mulher apareceu; em seguida à sua entrada, e enquanto ela consagrou inúmeros objetos de ouro, entre os quais os mais dignos de ser
estava tirando a roupa, Giges contemplou-a, e no momento em que ela lhe lembrados são as crateras de ouro em número de seis. Elas pesam trinta
voltou as costas, encaminhando-se para o leito, ele saiu furtivamente do talentos" e estão guardadas no tesouro dos corínrios", embora na realidade se
quarto, mas a mulher o viu saindo. Ela percebeu o procedimento de seu trate do tesouro não do povo coríntio, mas de Cípselos!" filho de Aietíon. Esse
marido, mas embora sentisse vergonha não gritou nem deixou transparecer Giges foi o primeiro dos bárbaros (até. onde podemos saber) a mandar
que havia notado algo, pois tinha em mente punir Candaules (entre os lídios e oferendas a Delfos depois de Midas filho de Gordias, rei da Frígia.
quase todos os povos bárbaros considera-se motivo de grande vergonha o fato Efetivamente, Midas também enviou oferendas: o trono real onde ele se
de mesmo um homem ser visto nu). sentava para proferir sentenças, que é admirável: o trono está no mesmo local
das crateras de Giges. Esse ouro e essa prata oferecidos por Giges são
11. No momento ela nada demonstrou e se manteve tranqüila, mas no
chamados "Gigadas" por causa de seu doador.
início do dia verificou se seus serviçais mais fiéis estavam próximos e chamou
Giges; este, supondo que ela nada soubesse quanto ao seu ato, atendeu ao 15. Logo após assumir o poder ele também, como os outros reis, conduziu
chamado, pois estava sempre pronto a atender a qualquer chamado da rainha; à um exército até Míletos e Smirne e ocupou a cidade de Colofon; mas Giges
sua chegada a mulher lhe disse: "Agora, Giges, tens dois caminhos à tua frente; nada mais fez de notável em seu reinado de trinta e oito anos; nada mais direi
escolhe o que desejas seguir: deves matar Candàules e ficar comigo e com o dele, portanto, e falarei de Árdis filho de Giges, seu sucessor. Este capturou
trono 'da Lídia para ti, ou então serás morto imediatamente; isso te impedirá de' Priene e invadiu o território de Míleros, e foi durante o seu reinado em Sárdis
obedecer a todas as ordens de Candaules no futuro e de ver aquilo que não que os cimérios, expulsos de suas terras pelos citas nômades, foram para a Ásia
deves. Um dos dois deve morrer: ou ele, o autor do plano, ou tu que, vendo- e capturaram Sárdis, à exceção da cidadela.
me nua, agiste indecorosamente." Diante disso Giges ficou perplexo durante 16. Árdis reinou durante quarenta e nove anos e foi sucedido por seu filho
alguns instantes; em seguida, suplicou à rainha que não o compelisse a tal Sadiates, que reinou durante doze anos; depois de Sadiares veio Aliates, que
escolha; mas, como não conseguiu persuadi-Ia. e percebeu que teria fatalmente guerreou contra Ciaxares, descendente de Deioces, e contra os medos,
de matar o seu senhor ou ser morto por outros, escolheu sua própria vida. expulsou os cimérios da Ásia, capturou Smirne (colônia de Colofon) e invadiu
Então respondeu dizendo-lhe: "Se me compeles, contra a minha vontade, a o território de Clazomênai. Mas aqui ele não conseguiu o que desejava, e sim
matar o meu senhor, deixa-me ouvir ao menos como o mataremos." um grande desastre. Dos outros feitos em seu reinado os mais notáveis foràm
Replicando ela disse: "Chegarás até Candaules no mesmo lugar onde ele te os seguintes.
levou a ver-me nua; o ataque será feito enquanto ele estiver dormindo."
17. Ele continuou a guerra contra os milésios, iniciada por seu pai. Eis a
12. Quando o plano ficou pronto e a noite chegou (a rainha. não o deixou maneira pela qual Aliares atacou e sitiou Míletos: quando as searas estavam
sair. e não havia meio algum de escapar; ele ou Candaules deveria morrer), maduras, ele pôs em marcha o seu exército invasor, ao som de siringes, harpas
Giges seguiu a mulher até o seu quarto; ela lhe entregou um punhal e o e flautas graves e agudas; todas as vezes que entrava em território milésio ele
ocultou atrás da mesma porta; logo que Candaules adormeceu, Giges saiu de não demolia nem incendiava as casas, nem lhes forçava as portas, deixando-as
seu esconderijo e o matou, tornando-se assim o senhor de sua mulher e de seu inractas; quanto às árvores e searas da região, todavia, ele as destruía e depois
reino. Arquílocos de Paros, que viveu mais ou menos na mesma época, faz regressava ao lugar de onde viera, pois como os milésios tinham o domínio do
também menção a Giges em um verso rrímetro iârnbico". mar, seria inútil-para seu exército sitiar a cidade. Os lídios não destruíam as
13. Assim ele se apossou do poder supremo, no qual foi confirmado pelo casas para que os milésios tivessem lares a partir dos quais saíssem para plantar
oráculo délfico". Realmente, em face da grande indignação dos lídios diante e cultivar suas terras, pois assim haveria os frutos de seu trabalho para os
do infortúnio de Candaules os partidários de Giges e o resto do povo invasores destruírem.
chegaram a um acordo segundo o qual, se o oráculo determinasse que Giges
fosse rei dos lídios, então ele reinaria; se não determinasse, ele teria de 18. Ele conduziu a guerra dessa maneira durante onze anos, e nesse
restituir o trono .aos heráclidas. O oráculo determinou e assim Giges tornou-se
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História 25
24 Herôdotos

período os milésios sofreram dois grandes desastres, na batalha de Limenêion, contrário à sua expectativa, e assim os lídios e milésios puseram' fim à guerra e
em seu próprio território, e no vale do Máiandros. Ao longo de seis desses· concordaram em ser amigos e aliados; em seguida Aliates construiu não um,
onze anos Sadiates filho de Árdis ainda governava a Lídia, e foi ele que invadiu mas dois templos de Arena em Assesos, e se recuperou de sua doença. Foi esse
o território de Míletos, pois a guerra foi iniciativa sua; ao longo dos cinco anos o desfecho da guerra de Aliates contra Trasíbulos e os milésios.
seguintes a guerra foi conduzida por Aliates filho de Sadiates que, como expus
anteriormente, herdou a guerra de seu pai e a continuou vigorosamente. 23. Períandros, que revelou a Trasíbulos a resposta do oráculo, era filho
Nenhum dos iônios ajudou a aliviar os milésios do peso dessa guerra, à de Cípselos e tirano de Corinto. Dizem os corínzios (e os lésbios concordam
exceção apenas dos quianos; eles deram a sua ajuda por causa de um serviço com eles) que ocorreu o acontecimento mais maravilhoso em sua vida, ou seja,
semelhante que lhes fora prestado, pois em tempos passados os milésios a volta de Aríon de Mêtimna à terra em Táinaros, trazido do mar para lá por
haviam ajudado os quianos em sua guerra contra os eritreus. um delfim. Esse Aríon era um citaredo que não ficava em segundo lugar para
qualquer outro em seu tempo; ele foi o primeiro homem, até onde podemos
19. No duodécimo ano, quando o exército lídio estava incendiando as saber, a fazer ditirambos 16 e a dar-lhes esse nome, e depois ensinou em
searas, aconteceu o seguinte fato: o fogo ateado às searas e soprado por um Corinto a cornpô-los.
vento forte atingiu o templo de Arena chamada de Assesos", queimando-o
totalmente. No momento isso não foi levado em conta, mas em seguida, após o 24. Dizem então que esse Aríon viveu a maior parte de sua vida na corte
retorno do exército a Sárdis, Aliates adoeceu. Como sua doença se prolongava de Períandros; a certa altura ele concebeu o plano de viajar até a Itália e a
demasiadamente, ele mandou consultar o oráculo em Delfos, seja a conselho Sicília, de onde, após ganhar muito dinheiro, pretendia voltar a Corinto.
de alguém, seja por seu próprio desejo, para interrogar o deus a propósito de .Confiando nos homens dessa cidade mais que em quaisquer outros, Aríon I
sua doença; quando os mensageiros chegaram a Delfos a Pítia recusou-se a contratou uma nau coríntia para levá-lo de Taras 17. Mas quando estavam em
responder-lhes até que fosse restaurado o templo de Arena em Assesos, em alto-mar os tripulantes tramaram o lançamento de Aríon ao mar, para
território milésio, que os lídios haviam incendiado. apoderar-se de seu dinheiro. Descobrindo a trama, ele tentou persuadi-Ios a
20. Eu mesmo sei que as coisas se passaram assim, pois ouvi o relato dos desistir, oferecendo-lhes todo o seu dinheiro se poupassem apenas a sua vida;
próprios délfios. Os milésios acrescentam que Períandros filho de Cípselos, mas os marinheiros não lhe deram ouvidos; disseram-lhe que ele mesmo
sendo amigo íntimo de Trasíbulos, tirano de Míletos naquela ocasião, foi deveria matar-se, e se assim fizesse o sepultariam em terra, ou se assim não
informado da resposta dada pelo oráculo a Aliares e mandou um mensageiro fosse deveria lançar-se imediatamente ao mar. Diante desse dilema Aríon,
levar a notícia a Trasíbulos, para que dessa maneira seu amigo ficasse vendo que essa era a vontade deles, pediu-Ihes que lhe permitissem ficar de pé
na popa da nau, vestido com todos os seus paramentos de aedo; e prometeu-
prevenido e fizesse seus planos.
lhes que depois de cantar daria fim a si mesmo. Os marinheiros, encantados
21. Essa é a versão dos milésios. Então, quando a resposta do oráculo foi com a perspectiva de ouvir o melhor de todos os aedos, afastaram-se da popa e
transmitida a Aliates, este mandou imediatamente um arauto a Míleros, foram para o meio da nau; Aríon, pondo todos os seus paramentos e
prontificando-se a fazer uma trégua com Trasíbulos e os milésios enquanto apanhando a c~~, ficou de pé na popa e cantou o hino ôrtio"; quando acabou
reconstruía o templo. Assim o enviado partiu para Míleros. Mas Trasíbulos, ele se lançou ao mar sem mais demora, vestido em seus paramentos. A
exatamente informado de todo o assunto e sabendo o que Aliares pretendia tripulação continuou a viagem para Corinto, mas um delfim, segundo dizem,
fazer, concebeu o seguinte plano: mandou trazer para a ágora todos os gêneros recebeu Aríon em seu dorso e o levou para o cabo Táinaros. Lá desceu Aríon e
alimentícios da cidade, tanto seus quanto dos armazéns particulares, e ordenou foi para Corinro com seus trajes de cantor; ao chegar, ele relatou a todos o
a todos os milésios que bebessem e festejassem juntos quando ele desse o a~ontecimento. Períandros, não acreditando na história, deixou-o sob estrita
sinal. Vigilância, e ficou aguardando ansiosamente a chegada dos marinheiros. À sua
22. Ele fez e determinou aquilo para que, quando o arauto de Sárdis visse chegada eles foram chamados e lhes foram pedidas notícias de Aríon; então os
uma grande quantidade de gêneros alimentícios empilhados e visse os cidadãos tripulantes responderam que ele deveria estar em segurança lá para-os lados da
divertindo-se, pudesse levar essa informação a Aliares; e foi o que aconteceu. Itália, pois o haviam deixado em Taras em boas condições; subitamente Aríon
O arauto viu tudo aquilo, entregou a Trasíbulos a mensagem que o lídio o apareceu diante deles, exatamente como estava vestido quando se lançou da
encarregara de levar e voltou a Sárdis; tanto quanto posso saber, foi essa a nau; à vista disso eles ficaram perplexos e não puderam continuar negando as
causa única da reconciliação. Realmente, Aliares supunha que houvesse grande a~us~ções que lhes eram feitas. Essa é a história contada pelos coríntios e
penúria em Míletos e que o povo estivesse reduzido a uma miséria extrema; lésbios. Existe ainda um pequeno monumento de bronze no cabo Táinaros
entretanto, quando seu arauto regressou daquela cidade ele ouviu um relato representando um homem montado num delfim", '

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26 Herôdoros História 27

25. Terminada sua guerra contra os milésios, o lídio Aliares morreu d~~ois \ deu uma viagem para ver o mundo, segundo suas próprias palavras. Sôlon agiu
de reinar durante cinqüenta e sete anos. Ele foi o segundo de sua família a óJ assim com receio de ser compelido a repudiar qualquer de suas leis, pois os
enviar oferendas a Delfos, por ter-se recuperado de sua doença: trata-se de atenienses se haviam comprometido sob juramentos solenes a obedecer
uma cratera de prata sobre um suporte de ferro sold~do, a mais notáv~l .de durante dez anos às leis que Sôlon fizesse.
todas as oferendas existentes em Delfos, obra do quiano Glaucos, o UOlCO
30. Por essas razões, e para ver o mundo, Sôlon deixou a sua terra e foi
homem daquela época que sabia soldar o ferro.
para o Egito ao encontro de Âmasis e para Sárdis ao encontro de Croisos; à sua
26. Após a morte de Aliares, Croisos", seu filho, herdou o trono, tendo chegada, Croisos o recebeu em seu palácio. No terceiro ou quarto dia depois
então trinta e cinco anos de idade. Os primeiros helenos ~tacados yor e.le da chegada Croisos mandou seus serviçais levarem Sôlon para circular entre
foram os efésios. Estes, cercados por ele, dedicara~ sua CIdade a ,A~te2~ls, seus tesouros, e eles lhe mostraram tudo que havia lá, aquela grandeza e
estendendo um cabo a partir do templo da deusa, distante sete estadlO~ da prosperidade; tendo ele visto e examinado tudo, Croisos, quando se lhe
cidade velha, que estava sendo sitiada na ocasião, até as muralhas da CIdade ofereceu uma oportunidade, fez-lhe a seguinte pergunta: "Ouvimos muitas
propriamente dita. Os efésios foram então os primeiros helenos a.ser ata~~ad.os coisas a teu respeito, hóspede ateniense, em 'relação à tua sapiência e às tuas
por Croisos; depois ele levou a guerra sucessivamente a todas as CIdades 100l.as perambulações, e a quantas terras foste em busca de conhecimentos e para ver
e eólias, fazendo a cada uma delas acusações diferentes, graves quando podia, o mundo; agora, portanto, veio-me o desejo de perguntar-te se jamais viste
mas às vezes alegando razões ridículas. alguém mais feliz que todos os seus semelhantes." Foi esta a pergunta de
Croisos, que se julgava o mais feliz dos homens. Sôlon, todavia, não quis
27. Depois de haver subjugado e submetido ao pagamen.to de tributos
adulá-Io de modo algum, e lhe respondeu sinceramente: "É o ateniense Telos,
todos os helenos da Ásia continental, ele teve a idéia de construir naus e atacar
rei." Croisos se surpreendeu com essa resposta e perguntou incisivamente a
os helenos ilhéus; mas quando seus planos para a construção das naus estav~m
Sôlon: "Por que julgas que Telos é mais feliz?" Sôlon replicou: "A cidade de
prontos, Bias de Priene (ou Pítacos de Mitilene; a história é contada a resP:lto
Telos prosperava, ele era pai de filhos belos e excelentes, viu crianças nascidas
de ambos'") teria vindo a Sárdis e, respondendo a uma pergunta de Croisos
de todos eles e sua riqueza era sólida; além disso, tendo tanta riqueza quanto
quanto às novidades a respeito da Hélade, levou-o a desistir da const.rução de
um homem pode ter entre nós, ele terminou sua vida da maneira mais gloriosa:
naus dizendo-lhe o seguinte: "Os ilhéus, rei, estão comprando dez mil cavalos
numa batalha entre os atenienses e seus vizinhos em Êleusis ele atacou e
com o intuito de vir atacar-te em Sárdis." Croisos, julgando que ele dissera a
derrotou o inimigo e teve ali a mais bela das mortes; os arenienses lhe
verdade, falou: "Faço votos para que os deuses ponham na mente dos ~lhéus a
proporcionaram um funeral a expensas da cidade no local de sua morte e o
idéia de vir atacar a cavalo os filhos dos lídios!" Então o outro disse em
distinguiram grande mente. "
resposta: "Vejo, rei, que fazes preces seriamente, desejando enfrent~r em
terra firme os ilhéus a cavalo, e o que esperas é muito natural. Com efeito, os 31. Depois de Sôlon haver despertado a curiosidade de Croisos com sua
ilhéus ouviram dizer que estás construindo naus para ir aracá-los com elas; menção às muitas facetas da felicidade de Telos, o rei perguntou-lhe ainda
pensas que eles fazem preces por outra coisa a.lém da oportuni~ade de quem ele punha em segundo lugar depois de Telos, pensando que certamente
enfrentar os lídios no mar, e assim vingar-se de n por teres escravizado os obteria ao menos o segundo lugar. Sôlon respondeu: "Clêobis e Bíton. Eles
helenos habitantes do continente?" Croisos apreciou essa conclusão, pois lhe eram argivos, e além de riqueza suficiente eles tinham a força física que
pareceu que o homem falava sensatamente, e aceitou a ~pinião e desis~iu ,de descreverei a seguir. Ambos foram igualmente vencedores de competições
construir as naus. E assim ele concluiu um pacto de amizade com os ilhéus atléticas, e também se conta a seu respeito a seguinte história: havia uma festa
iônios. de Hera entre os argivos, e era imprescindível que sua mãe fosse levada ao
templo por uma parelha de bois; mas os bois não chegaram a tempo do campo
28. Com o passar do tempo Croisos subjugou quase todos os povos a oeste
e os jovens, premidos pela escassez de tempo, atrelaram-se ao jugo e puxaram
do Hális" e os manteve submissos, à exceção apenas dos cilícios e dos lícios; os
o carro em que sua mãe estava sentada; eles o puxaram ao longo de quarenta e
restantes - lídios, frígios, mísios, mariandinos, calibes, paflagônios, tínios e
cinco estádios" até chegarem ao templo. Isto feito, e sob as vistas da multidão
bítínios (estes eram trácios),cários,)5nios, dórios, eólios e panfílios - foram
presente, eles tiveram o mais belo dos fins, e o deus mostrou através deles até
subjugados e se tornaram súditos de Croisos à semelhança dos lídios.
que ponto a morte pode ser melhor do que a vida para o homem: os argivos os
29. Sárdis estava no auge de sua prosperidade, e todos os sábios da cercaram, felicitando-os por seu vigor, e as argivas fizeram o mesmo em
Hélade" vivos naquela época foram sucessivamente até lá. Entre eles estava relação à mãe deles por haver tido tais filhos. Ela, então, em sua alegria diante
Sôlon, o areniense; este, após dar leis aos atenienses a pedido deles mesmos, do que havia sido feito e dito, pôs-se de pé defronte da estátua da deusa e fez
deixou sua terra natal, de onde estaria ausente durante dez anos, e empreen- uma prece para que seus filhos Clêobis e Bíton, que lhe haviam proporcionado
28 Herôdoros História 29

aquela grande honra, tivessem a maior ventura possível para os homens. Após termo de cada coisa, e ver como ela findará, pois a muitas pessoas a divindade
a prece os jovens ofereceram sacrifícios e participaram do banquete; em dá um lampejo de ventura para depois aniquilá-Ias totalmen:.e."
seguida, foram dormir no próprio templo, e nunca mais se levantaram; lá
mesmo chegaram ao fim de suas vidas. Então os argivos fizeram e consagraram . 33. Falando assim, Sôlon não foi agradável a Croisos, que por isso não lhel
em Delfos estátuas dos dois, por haverem demonstrado a sua excelência." demonstrou estima alguma e o mandou embora, pois pensou que é uma tolice
desprezar a prosperidade e querer que se olhe para o termo de todas as coisas.
32. Sôlon lhes deu assim o segundo lugar em felicidade; mas Croisos,
irritado, disse: "Hóspede ateniense! Desprezas de tal maneira a nossa 34. Mas depois da partida de Sôlon a vin ança divina caiu esadamente
felicidade que nos comparas com homens comuns?" Sôlon respondeu o sobre Croisos em minha 9p'inião porque ek_~~gl~va
~ ---' - --- ~~ -- - -"- o mais venturoso de
-- --
.-
todo os homens. Logo após ele foi visitado enquanto dormia por um sonhã,
seguinte: "Conheço todo o poder dos deuses, Croisos, e seu ânimo vingativo, e
o quanto eles gostam de desconcertar-nos. E me interrogas sobre a sorte dos que lhe pressagiou veridicamente os males que atingiriam seu filho. Croisos
homens! No curso de uma longa vida podemos ver muitas coisas de que não tinha dois filhos, um dos quais era incapaz, por ser surdo-mudo; o outro,
gostamos, e também podemos sofrer muito. Calculo em setenta anos a duração porém, chamado Áris, era superior sob todos os aspectos a qualquer de seus
máxima da vida humana; esses setenta anos correspondem a vinte e cinco mil e coetâneos. O sonho mostrou então a Croisos que Atis seria atingido por uma
duzentos dias, sem contarmos os meses intercalares 25. Se a cada dois anos for ponta de ferro. Quando acordou e refletiu sobre o sonho, ele ficou muito
acrescentado mais um mês ao ano, de tal forma que as estações e o calendário inquieto, e começou por escolher uma mulher para seu filho; além disso,
possam sincronizar-se, então os meses intercalares serão trinta e cinco além embora Átis comandasse habitualmente o exército lídio, Croisos não admitiu
dos setenta anos e os dias desses meses serão mil e cinqüenta; logo, todos os sua saída em qualquer missão, ao mesmo tempo que transferia dos aposentos
dias dos setenta anos parecem ser vinte e seis mil e duzentos e cinqüenta, e dos homens para seus próprios depósitos os dardos, as lanças e todos os
podemos dizer perfeiramenre que nenhum desses dias é igual ao outro naquilo petrechos de guerra desse tipo, para evitar que algum deles pudesse cair dos
que nos traz Então, Croisos, o homem é a enas incertez . Pareces-me muito lugares em que estavam pendurados sobre seu filho.
rico e rei de murros omens, mas não poderei responder à tua pergunta antes 35. Enquanto Croisos estava ocupado com o casamento do filho, chegou a
de ouvir dizer que findaste bem a tua vida. Em verdade, o homem muito rico Sárdis um homem que havia sido vítima de uma fatalidade, e cujas mãos não
não é mais feliz do que aquele que tem apenas o suficiente para o dia de hoje, a estavam puras; tratava-se de um frígio de nascimento, e de sangue real.
não ser que a boa sorte lhe continue fiel até o fim de sua vida; proporcionando- Chegando ao palácio de Croisos ele pediu ao rei que o purificasse segundo os
lhe todas as boas coisas. Muitas homens com grandes riquezas são desventura- costumes de sua terra; então Croisos o purificou (a purificação dos lídios é
dos, e muitos que têm recursos moderados são venturosos. De fato, o homem mais ou menos a mesma dos helenos); após haver cumprido o ritual usual
muito rico mas apesar disso desventurado tem apenas duas vantagens sobre o Croisos perguntou ao frígio de onde ele viera e quem era ele: "Quem és tu,
venturoso com recursos moderados, mas este tem muitas vantagens sobre o amigo, e de que lugar da Frígia chegas para ser meu suplicante? E que homem
rico desventurado: o último dispõe de mais meios para realizar seus desejos e -ou mulher mataste?" O homem respondeu o seguinte: "Sou filho de Gordias
para enfrentar o golpe de uma grande calamidade,· mas as vantagens do filho de Midas, rei; chamo-me Ádrastos, matei meu próprio irmão sem querer
primeiro são que, embora ele não tenha tantos meios quanto o outro para e aqui estou, banido por meu pai e privado de tudo." Croisos respondeu:
enfrentar a calamidade e satisfazer os desejos, a calamidade e os desejos são "Descendes de gente amiga e estás aqui no meio de amigos, entre os quais
mantidos longe dele por sua boa sorte, e ele está livre de deformidades, nada te faltará como hóspede em meu palácio. Quanto ao teu infortúnio, será
doenças e todos os males, tem filhos belos e ele mesmo é belo. Ora: se esse mais proveitoso para ti suportá-lo com a maior despreocupação possível."
homem, além de tudo isso, ainda termina bem a sua vida, então ele é o homem
que procuras, e é digno de ser chamado venturoso; mas devemos esperar até '~ 36. Assim Ádrastos passou a viver no palácio de Croisos. Aproximada-
que ele esteja morto, e ainda não o chamaremos de venturoso, mas apenas de mente na ~esma ocasião apareceu no Monte Olimpos da Mísia um monstro-
homem de sorte. Ninguém que sej-a-apenas homem pode ter todas essas coisas um enorme javali. Ele descia daquela montanha para devastar as lavouras dos
juntas, da mesma forma que terra nenhuma é totalmente auto-suficiente mísios. Estes saíram muitas vezes para enfrentá-Io, mas nunca lhe fizeram
quanto aos seus produtos; algumas dão uma coisa, mas carecem de outra, e a qualquer mal (ao contrário, sofreram por causa dele). Finalmente eles
melhor terra é a que produz mais coisas; de maneira idêntica, pessoa alguma é mandaram mensageiros a Croisos, para dizer o seguinte: "Um monstro, um
auto-suficiente; algumas têm uma coisa, mais carecem de outra, mas o homem enorme javali, apareceu em nossas terras, rei, e destrói nossas lavouras; apesar
que se mantém na posse de mais coisas e afinal chega suavemente ao termo de de nossos esforços, não fomos capazes de eliminá-Io; agora suplicamos-te que
sua vida, tal homem, rei, eu julgo digno desse título. Devemos olhar para o envies conosco o teu filho, e jovens escolhidos e cães, para podermos livrar

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