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Apocalipse Adiado - M. James Penton
Apocalipse Adiado - M. James Penton
Jeová
SEGUNDA EDIÇÃO
Desde 1876, as Testemunhas de Jeová têm acreditado que estão a viver nos
últimos dias do mundo actual. Charles T. Russell, o seu fundador, anunciou aos
seus seguidores que os membros da igreja de Cristo seriam arrebatados em
1878, e por volta de 1914 Cristo destruiria as nações e estabeleceria o seu
reino na terra. A primeira profecia não se cumpriu, mas o eclodir da Primeira
Guerra Mundial deu alguma credibilidade à segunda profecia. Desde esse
tempo, as Testemunhas de Jeová têm predito que o mundo acabará 'em
breve'. O seu número cresceu para muitos milhões em mais de duzentos
países. Elas distribuem um bilião de peças de literatura anualmente e
continuam a antecipar o fim do mundo.
M. James Penton
UNIVERSITY OF TORONTO PRESS
ISBN 0-8020-7973-3
Impresso em papel sem ácido
2nd ed.
Includes bibliographical references and index.
ISBN 0-8020-7973-3
--THOMAS CARLYLE
Índice
ILUSTRAÇÕES XI
TABELAS XII
PREFÁCIO XIII
Introdução 3
1 O Começo de um Movimento 13
Charles Russell: Os Anos Iniciais 13
George Storrs 15
Russell e o Objecto e Maneira da Volta de Cristo 17
Dr. Nelson H. Barbour e os Três Mundos 18
Cismas Iniciais: 1878 e 1881 22
O Ministério Independente de Russell 24
A Associação dos Estudantes da Bíblia 29
Russell como o Servo Fiel e Sábio 33
As Tribulações Maritais de Russell 35
O Cisma do Novo Pacto 40
Adversários Externos de Russell 42
Últimos Anos e Morte de Russell 44
Conclusão 303
NOTAS 337
BIBLIOGRAFIA 399
ÍNDICE 425
Ilustrações
A Tabela das Eras de Russell 28
Assistência dos Estudantes da Bíblia ao Memorial 1917-28 61
O Ano de Resgate de Jeová -- Um calendário proposto pelas
Testemunhas de Jeová 67
Auge de publicadores activos 1928-58 92
Auge de publicadores activos 1959-82 92
Assistência ao Memorial 1928-58 93
Assistência ao Memorial 1959-82 93
Anti-Catolicismo típico da Watch Tower Society 128
A perspectiva das Testemunhas sobre a sua perseguição na Europa
132
A perspectiva da Watch Tower sobre Franklin Roosevelt e o Novo Pacto
nos Estados Unidos 137
Uma 'conspiração' contra as Testemunhas de Jeová na questão da
saudação à bandeira 144
A ressurreição terrestre 200
O conceito da Sentinela sobre um ministro do evangelho 207
Vestimenta bem aprumada e boa apresentação beneficiam os ministros
cristãos 208
O diagrama idealizado da Sentinela sobre o governo teocrático das
Testemunhas de Jeová 212
A estrutura organizacional das Testemunhas de Jeová 213
Vias de mobilidade organizacional ascendente entre as Testemunhas de
Jeová 240
O Sagrado Matrimónio -- a conceito da The Golden Age sobre a
natureza do matrimónio 263
O trovador honesto -- o conceito da The Golden Age sobre a natureza
da música romântica 264
Imbecilidade -- a perspectiva da Watch Tower sobre a educação
superior 272
Média e auge de publicadores, 1986-95 308
Número de baptizados, 1986-95 309
Assistência ao Memorial, 1986-95 310
Percentagem de crescimento de publicadores activos em países
desenvolvidos e mundialmente, 1986-95 313
Tabelas
1. Crescimento mundial das Testemunhas de Jeová, 1942-77 84
2. Crescimento mundial das Testemunhas de Jeová, 1968-76 96
3. Rácio entre pioneiros e publicadores das congregações, 1950-80 292
4. Auge de publicadores e assistência ao Memorial, 1950-80 293
5. Percentagem de crescimento de publicadores em países desenvolvidos,
1986-95 312
6. Prefácio
7. M. James Penton
8.
O prefácio de um autor não devia ser uma apologia pro vita sua, mas
este tem de o ser, pelo menos em parte. O motivo é que há uns oito
anos eu escrevi o livro Jehovah's Witnesses in Canada: Champions of
Freedom and Worship [Testemunhas de Jeová no Canadá: Campeões
da Liberdade e da Adoração], uma obra que é muito diferente do
presente volume no tom. Consequentemente, é devida alguma
explicação àqueles leitores que se podem interrogar por que é que
nesse livro eu apresento uma visão muito favorável sobre as
Testemunhas e neste apresento uma visão muito mais crítica.
9. Os factos são os seguintes: O meu bisavô, Henry Penton, tornou-se num
Estudante da Bíblia, nome pelo qual as Testemunhas de Jeová eram
então conhecidas, por volta de 1900. Pouco tempo depois, a minha avó,
Margaret Thomas Penton, também se converteu; e depois, através dela,
todos os membros da minha família imediata se tornaram Testemunhas
de Jeová. Em resultado disso, os meus avós e pais sofreram muito
durante as duas guerras como membros de uma religião que, no
Canadá, estava sob restrição governamental durante a Primeira Guerra
Mundial e sob proscrição definitiva durante a Segunda Guerra Mundial.
Assim, cresci num lar de Testemunhas e senti pessoalmente muitos dos
eventos que descrevo em Jehovah's Witnesses in Canada e também no
presente estudo.
10. Ao longo dos anos, servi em muitas capacidades em congregações das
Testemunhas de Jeová nos Estados Unidos, Porto Rico e Canadá. Entre
1973 e 1979 fui ancião das Testemunhas na comunidade onde tenho
actualmente o meu lar, Lethbridge, Alberta [Canadá]. Portanto é muito
natural que eu decidisse escrever um livro sobre as Testemunhas no
Canadá e, em particular, sobre a sua longa luta pela liberdade religiosa
sob a lei canadiana.
11. Conforme penso ter demonstrado em Jehovah's Witnesses in Canada, a
comunidade das Testemunhas teve um impacto muito importante na lei
canadiana, facto também reconhecido por membros dos meios jurídicos
canadenses tão conhecidos como o falecido Jean-Charles Bonenfant,
Walter Tarnopolsky e Thomas Burger. No que diz respeito à sociedade
em geral, elas foram definitivamente 'campeões da liberdade de
expressão e de adoração'. Além disso, enquanto minoria oprimida, por
vezes elas estavam sinceramente preocupadas com as liberdades civis
e direitos de outros. Mas nesse estudo anterior, eu não discuti outra
faceta das Testemunhas de Jeová -- o facto de em muitos sentidos elas
se parecerem com os Puritanos Ingleses e da Nova Inglaterra do século
dezassete que, ao mesmo tempo que estavam dispostos a lutar contra
as tiranias de uma igreja estabelecida e de um rei despótico no nome da
liberdade cristã, estavam igualmente dispostos a ser tirânicos para com
dissidentes nas suas próprias fileiras.
12. A seguir à publicação de Jehovah's Witnesses in Canada, o Professor
Herbert Richardson do St Michael's College da University of Toronto
instou comigo para que realizasse um estudo que serviria como
perspectiva geral da história, doutrina e comunidade das Testemunhas.
Contudo, à medida que comecei a investigar a história do movimento
nos Estados Unidos de um modo que não tinha feito previamente, fiquei
com cada vez mais dúvidas sobre as alegações tradicionais das
Testemunhas no que diz respeito à autoridade espiritual. Além disso,
tomei conhecimento dos estudos que estavam sendo feitos por alguns
académicos Testemunhas, como Richard Rawe, de Salt Lake,
Washington; Jerry Bergman, de Bowling Green, Ohio; e Carl Olof
Jonsson, de Partille, Suécia. Todos eles estavam a descobrir
informações que tornavam certos aspectos da doutrina das
Testemunhas inacreditáveis para muitos de nós que trabalhávamos no
campo.
13. Ainda assim, tal como esses homens e muitos outros -- que,
praticamente sem excepção, foram excomungados ou renunciaram às
Testemunhas de Jeová -- eu estava muito relutante a deixar a
comunidade na qual fora criado. Com o passar do tempo não tive
alternativa. À medida que eu viajava por todo o Canadá e Estados
Unidos fazendo a minha investigação, fui-me apercebendo cada vez
mais das severas punições a que Testemunhas individuais estavam
sendo sujeitas em todo o lado pelos seus líderes quando diferiam de
algum modo das doutrinas ou políticas organizacionais oficiais, ou até
quando pessoalmente incorriam no desfavor de alguém em posição de
autoridade na organização. Em resultado disso, viajei para a sede
mundial das Testemunhas de Jeová em Brooklyn, Nova Iorque, no
Verão de 1979, simultaneamente para continuar a minha investigação e
para expressar um sentimento de preocupação e frustração sobre o que
estava a ocorrer no interior da comunidade das Testemunhas a
Raymond Franz, que nessa altura era membro do corpo governante das
Testemunhas de Jeová e homem que eu conhecera pela primeira vez e
aprendera a respeitar enquanto ensinava na University of Puerto Rico,
em 1959.
14. A minha deslocação a Brooklyn foi desoladora. Embora todos os que
encontrei na sede de Brooklyn fossem basicamente leais ao movimento,
havia muitos que, tal como eu, acreditavam que as Testemunhas de
Jeová precisavam de passar por uma reforma ou, no mínimo, uma
renovação espiritual. Porém, o corpo governante não parecia estar
preparado para escutar qualquer conselho do exterior. Raymond Franz
admitiu que tinha conhecimento de muitos dos problemas sérios que eu
descrevi, mas ele pediu-me para ser paciente. No entanto, isso era algo
que eu já não podia fazer de boa consciência. Consequentemente,
depois de regressar a casa, em Agosto de 1979, decidi expressar por
escrito para a liderança das Testemunhas como um todo as minhas
preocupações e críticas sobre o que estava a ocorrer na comunidade
das Testemunhas em geral -- decisão que, depois de um ano de grande
labuta pessoal, levou à minha desassociação pública ou excomunhão
das Testemunhas de Jeová, sob acusações equivalentes a heresia.
15. Estes acontecimentos levaram-me a parar a minha investigação e
escrita durante algum tempo. Além de achar necessário continuar a
minha própria reorientação espiritual em desenvolvimento e dar muito
tempo e atenção a muitos outros que foram forçados a deixar a
comunidade das Testemunhas quando ficaram comigo, senti que devia
deixar passar algum tempo antes de completar o presente trabalho.
Dessa forma, eu esperava poder recuperar alguma da objectividade que
inevitavelmente se perde durante um período de grande crise espiritual.
Com o passar do tempo, contudo, peguei na minha caneta e completei
Apocalypse Delayed: The Story of Jehovah's Witnesses [Apocalipse
Adiado: A História das Testemunhas de Jeová].
16. Os meus leitores decidirão se consegui ser justo e razoavelmente
objectivo na minha apresentação. No entanto, há alguns pontos que
gostaria de salientar. Ao apresentar a informação, tentei documentar as
minhas declarações escrupulosamente. Quando alguma informação
específica que apresento não é adequadamente documentada ou não é
do conhecimento público, tentei sempre classificá-la como rumor. No
que diz respeito ao tratamento das doutrinas das Testemunhas, evitei
tomar uma posição definitiva, excepto onde pode ser demonstrado que
estas doutrinas são certas ou erradas, historicamente, empiricamente ou
logicamente. Não é da responsabilidade de um historiador, que é o que
sou em primeiro lugar, argumentar a partir de uma posição doutrinal
particular. A questão de saber se as doutrinas das Testemunhas são
'ortodoxas' ou 'heterodoxas' de um ponto de vista religioso é pouco
relevante para um historiador enquanto tal. No entanto, também não
tenho que apresentar uma apologia devido ao facto de fazer o que
espero que sejam avaliações com conhecimento de causa derivado
tanto da minha própria experiência como da minha investigação. Isto
não é só o meu direito; é o meu dever.
17. É necessário dizer algumas palavras sobre a organização de Apocalipse
Adiado. Conforme se pode constatar, está dividido em três partes: a
primeira, histórica; a segunda, conceptual e doutrinal; a terceira,
sociológica e psicológica. Esta estrutura, é claro, foi adoptada com um
propósito especial. Estudos anteriores sobre as Testemunhas de Jeová
usaram os mesmos géneros académicos, mas geralmente misturaram-
nos de tal modo que é difícil distinguir a abordagem em qualquer
momento específico. Portanto, para evitar este problema, tentei separar
discretamente os vários géneros disciplinares que usei ao examinar as
Testemunhas de Jeová.
18. Naturalmente, tenho uma grande dívida para com aqueles que
estudaram as Testemunhas de Jeová antes de mim. Em particular,
aprendi muito da perspicácia de homens como William Cumberland,
Joseph Zygmunt, Alan Rogerson, James Beckford, Melvin Curry, Gérard
Hébert, Quirinus Munters, Bryan Wilson e muitos outros que
examinaram as Testemunhas de um ponto de vista académico, em vez
de apologético ou polémico. Acima e para além destes, porém, baseei-
me muito no excelente estudo de Timothy White, A People for His Name
[Um Povo para o Seu Nome].
19. Como todos os acima citados, excepto Cumberland, Hébert e White, são
sociólogos profissionais, baseei-me muito nos seus trabalhos,
especialmente nos capítulos 8 e 9, sobre organização e comunidade.
Embora tenha tentado desenvolver algumas perspectivas novas nesses
capítulos, baseado tanto em estudos académicos como no meu
conhecimento em primeira mão sobre as Testemunhas de Jeová, não
tentei criar quaisquer teorias sociológicas novas ou profundas. Penso
que isso deve ser feito -- se é que há de ser feito -- por alguém com
capacidades como cientista social muito maiores do que as que tenho
ou alguma vez terei. Ainda assim, espero que alguma da informação que
providenciei na terceira secção de Apocalipse Adiado possa ser útil a
cientistas sociais bem como a pessoas leigas interessadas.
20. Pela ajuda que me deram em obter informação nova e significativa, devo
muito a Richard Rawe, Jerry Bergman, Heather e Gary Botting, Jacques
Dupond, Edward Dunlap, Dwane Magnani, Carl Prosser, Willy Holiday e
James Parkinson. Contudo, a minha maior dívida de apreço neste
assunto é para com Carl Olof Jonsson e Raymond Franz, que foram
ambos muito generosos em providenciar informação que só eles
possuíam. Raymond Franz também me ajudou muito na leitura de uma
versão preliminar deste trabalho para verificar a exactidão, bem como
Peter Gregerson e John Poole. Os meus colegas James Tagg, Dean
Frease, e Reginald Bibby examinaram a versão preliminar de um ponto
de vista académico e o Professor Bibby em particular fez várias
sugestões importantes para ajudar a melhorá-la. Outros que merecem
menção pela sua ajuda são Herbert Richardson, Moses Crouse, James
Beverley, e Edward Orchard e Bahir Bilgin, que deram assistência
importante traduzindo materiais de línguas que não domino.
21. Recebi muita ajuda em obter materiais de pesquisa da University of
Lethbridge. Alguns anos atrás a universidade concedeu-me uma bolsa
que me permitiu comprar cerca de 1.800 dólares de fontes primárias
sobre os Adventistas, Estudantes da Bíblia e Testemunhas de Jeová.
Desde então, também tem providenciado outras bolsas pequenas mas
muito úteis e recentemente ajudou-me na obtenção uma bolsa do Social
Sciences and Humanities Research Council of Canada para a
preparação final do meu manuscrito. Mas não é só à universidade que
quero expressar os meus agradecimentos; várias pessoas de lá deram-
me ajuda especial na preparação do texto de Apocalipse Adiado. Estas
incluem Owen Holmes, Lawrence Hoye, Phil Connolly, Ian Newbould,
Ellie Boumans, Leanne Wehlage, Lana Cooke, Kerry Bullock e Stan
Devitt. Lisa Atkinson ajudou em editar, e a dactilografia final do
manuscrito foi feita por Charlene Sawatsky e Evelyn Harris.
22. Na University of Toronto Press, desejo agradecer a Virgil Duff pelo seu
apoio constante e Beverley Beetham-Endersby pelos muitos
melhoramentos editoriais que ela fez neste trabalho. Foi um prazer
trabalhar com ambos.
23. Também estou grato tanto ao Social Sciences and Humanities Research
Council of Canada como à Canadian Federation for the Humanities. Em
particular, agrada-me dizer que este livro foi publicado com a ajuda de
uma bolsa da Canadian Federation for the Humanities, usando fundos
providenciados pelo Sciences and Humanities Research Council of
Canada. Também recebi assistência do Publications Fund of the
University of Toronto Press.
24. Acima de tudo, estou em dívida para com o meu filho David, que me
ajudou com muitas sugestões sobre assuntos de estatística em várias
partes deste livro, e à minha amorosa esposa, Marilyn. Sem a sua ajuda
constante, Apocalipse Adiado nunca teria visto a luz do dia.
25. M. JAMES PENTON
The University of Lethbridge
Lethbridge, Alberta [Canadá]
Julho de 1984
26.
27. [imagem]
Nelson H. Barbour. Desenho a tinta por Otto Rapp, baseado num original do século XIX.
28. [imagem]
Charles T. Russell, aos 27 anos
The Watch Tower Reprints, vol. I (1919)
29.
Charles e Maria Russell, c. 1890
The Jerry Bergman collection
30. [imagem]
John Paton
The Jerry Bergman collection
31. [imagem]
J. F. Rutherford
The M. James Penton collection
32. [imagem]
Leo Greenlees, W. Glen How, Nathan H. Knorr, Percy Chapman -- Montreal 1947
The M. James Penton collection
33. [imagem]
Betel, Brooklyn, Nova Iorque
Postal da Torre de Vigia (1958)
34. [imagem]
A maior gráfica ou "fábrica" da Sociedade Torre de Vigia, Brooklyn, Nova Iorque
Postal da Torre de Vigia (1958)
35.
Frederick W. Franz
The Raymond V. Franz collection
36.
Raymond V. Franz
The Raymond V. Franz collection
37.
Uma perspectiva dissidente sobre um ataque a uma das principais doutrinas da Torre de Vigia
38.
39. APOCALIPSE ADIADO
40. Salvo indicação em contrário, todas as citações bíblicas são da
Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas
Introdução
M. James Penton
Nenhum outro movimento sectário cristão têm sido tão insistente em profetizar
o fim do mundo actual de um modo tão definitivo em datas tão específicas
como as Testemunhas de Jeová, pelo menos desde os Milleritas e os adeptos
do Segundo Adventismo do século XIX, que foram os predecessores
milenaristas directos das Testemunhas. Durante os anos iniciais da sua
história, eles encararam datas específicas -- 1874, 1878, 1881, 1910, 1914,
1918, 1920, 1925, e outras -- como tendo um significado escatológico definido.
Charles Taze Russell, o seu fundador, organizador e primeiro presidente da
Watch Tower Society (a sociedade legal primária deles), acreditava
originalmente que 1874 tinha marcado o início da 'presença invisível' de Cristo,
que 1878 e depois 1881 veriam a 'mudança' dos membros da igreja de corpos
carnais para corpos espirituais, e que 1910 presenciaria o início dos problemas
globais que levariam ao fim do mundo -- um evento que ocorreria em 1914.
Quando estas profecias falharam, tiveram de ser reinterpretadas,
espiritualizadas ou, em alguns casos, completamente abandonadas.4 Porém,
isto não dissuadiu Russell nem os seus seguidores de estabelecer novas
datas, ou de simplesmente proclamar que o fim deste mundo ou sistema de
coisas estava apenas a poucos anos ou talvez mesmo meses de distância.
Como Melvin Curry apropriadamente observa: 'A cronologia bíblica é a massa
de farinha dos milenaristas. Pode ser esticada para se adaptar a qualquer
tabela cronológica que se precise, ou pode ser reduzida a uma massa de datas
e números sem significado de modo que predições futuras possam ser
modeladas a partir da massa inicial.'5 Assim, durante mais de um século, o
tema constante dos Estudantes da Bíblia--Testemunhas de Jeová tem sido: 'O
fim está próximo; Cristo revelar-se-á em breve para trazer destruição sobre as
nações e sobre todos os que se opõem ao seu reino messiânico.'
Foi exactamente isto que aconteceu às Testemunhas de Jeová. Nos seus anos
formativos, o movimento dos Estudantes da Bíblia, como as Testemunhas
eram então chamadas, era bastante 'liberal' no sentido em que acreditava que
outros Cristãos -- em particular vários Protestantes -- eram parte da igreja de
Cristo e podiam ganhar a salvação. Todavia, com o passar do tempo, Russell e
os seus seguidores ficaram persuadidos de que ele tinha um papel especial:
ele é que era 'aquele servo' mencionado em Mateus 24:45-47, que devia
providenciar 'alimento no tempo apropriado' para a casa da fé.
Consequentemente, por volta da primeira década do século XX, ele começou a
encorajar o seu rebanho a realizar Estudos da Bíblia direccionados ou
Bereanos, em vez de um estudo livre da Bíblia, e em 1910 asseverou que os
seus Studies in the Scriptures [Estudos das Escrituras] eram praticamente a
Bíblia em forma de tópicos.6 No entanto, Russell tentava sempre persuadir os
seus seguidores em vez de os obrigar. Assim, ficou para o seu sucessor, o Juiz
Joseph F. Rutherford, a tarefa de metamorfosear os Estudantes da Bíblia,
governados congregacionalmente, nas Testemunhas de Jeová altamente
estruturadas, governadas 'teocraticamente', entre os anos 1917 e 1938. O que
Leon Trotsky declarou sobre o partido Comunista sob Lenin foi praticamente o
que aconteceu às Testemunhas sob Rutherford.7 Eles evoluíram de um
movimento com uma base de apoio bastante ampla, democraticamente
governado, para um movimento governado por um único homem, um ditador.
Por isso, não surpreende que pelo menos um estudioso das Testemunhas de
Jeová na era pós-Rutherford, Werner Cohn, as tenha comparado a vários
movimentos totalitários.
As páginas seguintes são, pois, uma tentativa de dar uma visão geral da
história, sistema doutrinal, e comunidade das Testemunhas de Jeová desde
que surgiram na segunda metade do século XIX e de demonstrar que, embora
o seu milenarismo essencialmente adventista tenha sido durante muito tempo a
base do seu crescimento e sucesso, também é a sua maior fraqueza. Como o
fim deste mundo tem sido adiado para elas durante mais de cem anos -- algo
que nunca esperaram que acontecesse -- elas não se têm podido ajustar
satisfatoriamente aos acontecimentos mundiais ou a um mundo que, na sua
perspectiva, continua 'gemendo'.
Notas
Quando é feita referência a 'WT reprints', essa designação indica que a citação
em questão é de Zion's Watch Tower and Herald of Christ's Presence ou de
The Watch Tower and Herald of Christ's Presence (Julho de 1879 até Junho de
1919) conforme editada e publicada em forma de volume em 1919. Visto que a
paginação é sequencial em volumes ou 'reprints', como são geralmente
chamados, os números das páginas são, é claro, muito diferentes daqueles
que apareceram nas edições originais da revista.
5 Curry, 183.
9 Ibid, p. 292.
Apesar do seu sucesso no mundo dos negócios, Russell continuou muito mais
interessado em assuntos religiosos. Enquanto rapaz ele tinha sido um
calvinista devoto que por vezes escrevia avisos tenebrosos acerca do fogo do
inferno em lugares públicos conspícuos para encorajar os trabalhadores a
emendar os seus caminhos iníquos.3 Contudo, ele ainda estava na
adolescência quando tanto ele como o pai começaram a tornar-se de certa
forma 'libertos' religiosamente. Charles juntou-se à igreja congregacionalista
local, que era menos austera do que a igreja presbiteriana, e Joseph começou
a mostrar interesse no Adventismo.4 Então, quando tinha apenas dezasseis
anos de idade, Charles Russell 'começou a ficar abalado na fé a respeito de
muitas doutrinas que aceitara há muito tempo.' De fato, tal como tantos jovens
sérios, ele 'caiu presa fácil da lógica da infidelidade.' Ao tentar converter um
'infiel', não foi capaz de defender com sucesso as suas crenças e perdeu a fé
na Bíblia. Ainda assim, ele continuou a orar a Deus e continuou a sua busca da
verdade.
O motivo por que o jovem piedoso ficou abalado não é difícil de perceber.
Conforme os seus escritos mais antigos mostram, ele foi poderosamente
influenciado pelo espírito racionalista da sua época e, da adolescência em
diante, nunca deixou de se interrogar sobre como um Deus amoroso podia
punir pecadores com os tormentos infinitos do inferno de fogo. Mas igualmente
importante, sem dúvida, foi o sentimento de Russell para com o Todo-
Poderoso. Para ele, Deus era seu pai num sentido preeminente, e como ele
tinha tido sempre um relacionamento tão caloroso e amoroso com o seu pai
humano, Joseph Russell, parece que ele nunca poderia conceber que o Senhor
Jeová fosse outra coisa senão uma deidade misericordiosa.
Algures em 1869, Jonas Wendell, um pregador do Advento Cristão, estava a
realizar um serviço num 'salão poeirento, pouco asseado', em Allegheny,
Pennsylvania. Russell deparou-se com a reunião, ficou e escutou. Em
resultado disso, a sua fé na Bíblia foi restaurada. Porém, ele não se tornou num
'Segundo Adventista' nesse tempo nem, do seu próprio ponto de vista, em
qualquer altura posterior. Quase imediatamente ele contactou vários amigos
que começaram a estudar as Escrituras com ele. Sob a sua liderança, foi
formada uma classe de estudo da Bíblia que haveria de evoluir gradualmente
até se tornar num movimento separado.
Ele indicou francamente a sua 'dívida para com os adventistas bem como
outras denominações' e mencionou duas pessoas, George Stetson e George
Storrs, que lhe tinham oferecido assistência espiritual. Falando sobre o período
de 1869 a 1872, ele disse: 'O estudo da Palavra de Deus com estes amados
irmãos levou-me, passo a passo, até esperanças mais verdejantes e brilhantes
para o mundo, embora não tenha sido senão em 1872 que eu obtive uma
imagem clara do trabalho do nosso Senhor como o nosso preço de resgate,
que descobri que a força e a fundação de toda a esperança de restituição
reside nessa doutrina.'6
Quem, pois, eram Stetson e Storrs, e quais foram as contribuições deles para o
pensamento de Russell? A resposta à primeira parte desta pergunta é que
ambos tinham longos antecedentes no 'Segundo Adventismo'. De fato, Stetson
era um ministro do Advento Cristão,7 enquanto Storrs8 tinha sido um dos
principais fundadores da Life and Advent Union [União da Vida e do Advento].
Contudo, ambos eram de mentalidade independente e pouco depois de Russell
e dos seus amigos terem começado o seu estudo da Bíblia, Storrs cortou todos
os laços com a União.
George Storrs
Destes dois homens que influenciaram Russell, George Storrs foi de longe o
mais importante. Nascido em 1796 em Lebanon, New Hampshire, ele, tal como
Russell, foi criado num austero ambiente calvinista. Mas aos vinte e nove anos
de idade tornou-se num convertido ao metodismo e mais tarde foi ordenado
ministro da Igreja Metodista Episcopal. A sua posição por fim tornou-se
insustentável quando na década de 1830 tornou-se num adversário aberto da
escravatura nos Estados Unidos. Em 1840 ele renunciou da igreja.
Mais importante foi o fato de em 1837 ele ter lido um tratado da autoria do
'Diácono' Henry Grew,9 um pastor de origem inglesa, ex-batista, de Filadélfia.
Devido ao tratado, Storrs passou a acreditar no que é chamado
'condicionalismo':10 a idéia de que o homem não tem uma alma imortal mas,
antes, ganha a vida eterna sob a condição de receber tal dádiva de Deus
através de Cristo. Depois disso, Storrs tornou-se no principal proponente
americano do condicionalismo, ou 'aniquilacionismo', 11 como era por vezes
chamado, e do ensino de que os mortos estão inconscientes ou dormindo até à
ressurreição. Em 1841 ele publicou An Inquiry: Are the Souls of the Wicked
Immortal? In Three Letters [Uma Pesquisa: Será Que as Almas dos Iníquos são
Imortais? Em Três Cartas], e no ano seguinte uma ampliação do mesmo tema
em An Inquiry: Are the Souls of the Wicked Immortal? In Six Sermons [Uma
Pesquisa: Será Que as Almas dos Iníquos são Imortais? Em Seis Sermões].
Significativamente, cerca de 200.000 cópias de Six Sermons estavam em
circulação nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha em 1880.12
Não se deve assumir que Russell e os seus associados durante os anos 1869
a 1875 estavam simplesmente a tomar as suas idéias de Storrs e de Stetson.
Russell era um estudante ávido e começou a desenvolver o seu próprio
sistema doutrinal baseado num exame meticuloso das Escrituras, de vários
comentários da Bíblia e de idéias comuns a muito do protestantismo americano
do século XIX. Por exemplo, ele seguiu o Dr. Joseph A. Seiss, um proeminente
pastor luterano de Filadélfia e editor do Prophetic Times [Tempos Proféticos]
(1863-1881), o principal jornal milenarista nos Estados Unidos durante a
segunda metade do século XIX, ao afirmar que Cristo fora ressuscitado no
espírito, não na carne.18 Além disso, depois de examinar a Emphatic Diaglott,
uma tradução interlinear da recensão de Griesbach do Novo Testamento de
Benjamin Wilson, um membro da Igreja de Deus (Fé de Abraão), ele notou que
a palavra grega parousia, traduzida 'vinda' na King James Version, muitas
vezes significa mais propriamente 'presença'. Assim ele passou a defender que
nos últimos dias, imediatamente antes da sua revelação em ira na batalha do
Armagedom, Cristo estaria invisivelmente presente. Nesse tempo, apenas os
seus seguidores fiéis sabiam esse fato. Assim, em meados da década de
1870,19 Russell imprimiu e publicou 50.000 cópias de um pequeno panfleto
intitulado The Object and Manner of Our Lord's Return [O Objeto e Maneira da
Volta de Nosso Senhor] para tornar conhecidas as suas idéias.
Algumas das idéias presentes em The Object and Manner eram comuns a
grande parte do protestantismo evangélico do século XIX. Por exemplo, Russell
tirou informação diretamente dos comentários bíblicos de Adam Clarke e de Sir
Isaac Newton,20 do qual tirou a interpretação historicista padrão 21 do livro de
Revelação. Muitos outros dos seus conceitos, tal como são apresentados no
panfleto, parecem ter sido obtidos diretamente de George Storrs e do
adventismo.
Mas as idéias principais em The Object and Manner não vieram das fontes
citadas por Russell. Num artigo em três partes publicado recentemente em The
Bible Examiner [O Examinador da Bíblia],22 Carl Olof Jonsson demonstra
claramente que existiram muitos outros tanto na Grã-Bretanha como na
América que acreditavam no que é chamado 'doutrina da vinda em duas
etapas', a idéia da presença invisível de Cristo antes da sua revelação no fim
do mundo atual e o ensino de um arrebatamento invisível dos santos durante a
sua presença ou parousia -- tudo idéias apresentadas em The Object and
Manner. De fato, Jonsson mostra de forma muito conclusiva que estes
conceitos foram originados em 1828 por Henry Drummond, um evangélico
inglês proeminente que, com Edward Irving, foi um co-fundador da Igreja
Católica Apostólica, ou Irvinguitas. Mais tarde, porém, muitas das idéias de
Drummond foram popularizadas e espalhadas por toda a Grã-Bretanha e
Estados Unidos por John Nelson Darby, da Irmandade de Plymouth (que tinha
estado em associação próxima com Drummond e Irving), pelo Reverendo
Robert Govett, um clérigo anglicano, e nas décadas de 1860 e 1870 pelo
Rainbow [Arco-íris], um importante jornal milenarista britânico que foi editado
em 1886 e 1887 pelo bem conhecido tradutor da Bíblia Joseph B. Rotherham.
Além disso, as doutrinas de Drummond foram adotadas pelo Dr. Joseph Seiss.
Portanto, conclui Jonsson, Russell com toda a probabilidade tomou
emprestadas as idéias centrais que aparecem em The Object and Manner of
Our Lord's Return destes predecessores milenaristas e, em particular, de Seiss.
Jonsson declara: 'É bastante óbvio que Russell não originou por si mesmo a
sua opinião sobre a vinda e presença invisível de Cristo, mas tomou-a de
outros, e embora isso não possa ser estabelecido com certeza absoluta, a
evidência disponível indica fortemente que ele plagiarizou as opiniões do Dr.
Seiss nesta matéria.'23
Para fortalecer ainda mais os seus argumentos, ele usou o que era conhecido
como o ciclo dos jubileus. Sob a lei mosaica, todo o qüinquagésimo ano era um
ano no qual as possessões, quer fossem pessoais ou ancestrais, deviam
reverter aos seus proprietários ou aos herdeiros dos seus proprietários. Os
escravos também deviam ser libertos. Por isso, Barbour viu no ano do jubileu
um tipo para o grande dia de restituição de Deus -- o milênio. Mas ele também
o viu como tendo significado para o início da era milenar. Segundo Barbour, se
os jubileus tivessem continuado a ser celebrados desde a era judaica até ao
seu próprio dia, um ano de jubileu teria ocorrido em 1875, começando (para ser
exato) em 6 de abril.33
De fato, foi John A. Brown quem primeiro explicou o que considerava ser a
chave para a duração desses tempos num livro chamado Even-Tide, publicado
em Londres em 1823. O que ele propôs foi que o típico reino de Judá tinha
caído sob domínio gentio em 604 a.C. Depois disso, não haveria governo de
Deus na terra até quatro grandes impérios -- o babilônico, o medo-persa, o
macedônio e o romano -- terem o seu domínio. Então Cristo, como herdeiro de
Davi, governaria em Jerusalém. Mas quanto tempo passaria antes que esses
impérios expirassem? Brown encontrou aquilo que era para ele a resposta no
quarto capítulo do livro de Daniel.
Para calcular os 'sete tempos' Brown raciocinou que estes eram sete anos de
360 dias proféticos cada. Usando o princípio ano-dia, ele simplesmente
multiplicou 360 dias por sete e chegou a um período de 2.520 anos.
Finalmente, contando 2.520 anos desde 604 a.C., chegou ao ano 1917 A.D.,
que designou como a data para o fim daqueles tempos.37
Barbour decidiu que Brown tinha marcado o início dos sete tempos -- que ele
encarava como os tempos dos gentios -- dois anos mais tarde. Ele defendia
que os tempos dos gentios tinham começado com aquilo que acreditava ter
sido a data da destruição de Jerusalém por Nabucodonosor. Assim, em vez de
usar 1917 como o término para esses tempos, calculando ligeiramente
diferente ele marcou-os como tendo a sua conclusão no outono de 1914. 38
Nesse ano, o reino de Cristo viria para assumir domínio completo sobre a terra,
e os judeus, como povo, seriam restaurados ao favor de Deus. Durante o
intervalo entre o tempo em que escreveu Three Worlds e 1914, Barbour
esperava que ocorressem muitas coisas. Além do arrebatamento dos santos,
ele acreditava que o mundo testemunharia um tempo de tribulação como nunca
antes vira.39
Barbour estava muito impressionado pelo seu próprio sistema. Ele declarou
que 'não estava disposto a admitir que o seu cálculo estivesse errado nem
sequer um ano'. Para ele havia 'esta quantidade de evidência':
Muitos dos argumentos, a maioria deles, de fato, não são baseados na teoria
ano-dia, e alguns deles, nem sequer são baseados na cronologia; e no entanto
existe harmonia entre todos eles. Se você resolveu um problema difícil em
matemática, pode muito bem duvidar se possivelmente não terá feito algum
erro de cálculo. Mas se resolveu esse problema de sete maneiras diferentes,
todas independentes umas das outras, e em cada um dos casos alcançou o
mesmo resultado, seria um louco se continuasse a duvidar da exatidão desse
resultado.40
Pouco tempo depois, Barbour, Russell e Paton estavam unidos para pregar e
publicitar as idéias delineadas em Three Worlds. Russell começou rapidamente
a fazer convertidos, incluindo A. D. Jones, um dos seus funcionários, e A. P.
Adams, um ministro metodista da Nova Inglaterra. Mas rapidamente surgiram
problemas. O pequeno bando de adventistas sem nome esperava, como Three
Worlds ensinava, que a primavera de 1878 os veria, como santos escolhidos
de Cristo, levados embora para o céu. Quando isso não aconteceu, ocorreu
desilusão e divisão.
Em 1881, dos cinco associados principais que tinham tomado uma posição a
favor das doutrinas delineadas em Three Worlds, só A. D. Jones continuou em
associação com Russell; e mesmo esse relacionamento não resistiu. Com a
bênção de Russell, Jones fundou um jornal chamado Zion's Day Star [Estrela
do Dia de Sião] na cidade de Nova Iorque. Dentro de um ano, também ele
negou a teoria do resgate de Russell e posteriormente haveria de repudiar a
própria Bíblia.49
Pode muito bem ser dito, portanto, que Russell, ainda um jovem com menos de
trinta anos de idade, assumiu a liderança daqueles que apoiavam os seus
ensinos, não tanto porque o desejasse fazer, mas antes porque se sentiu
compelido a manter uma defesa daquilo que considerava ser uma doutrina
cristã básica -- a teoria da expiação enquanto resgate ou, de fato, expiação
substitutiva. Além disso, ele estava determinado a apegar-se à cronologia de
Russell mesmo depois do próprio Barbour ter abandonado certos aspectos
dela. Portanto, embora ele pareça não ter tido idéias de grandeza específicas
nesse tempo, achava que Deus estava a guiá-lo e dirigi-lo de um modo muito
definido.
Que ele não tinha um desejo a longo prazo de se estabelecer a si próprio como
um novo profeta americano ou o fundador de uma nova religião, nos anos 1879
até 1881 pelo menos, é evidente a partir da sua escatologia de curto prazo.
Novamente baseando a sua conclusão na cronologia de Barbour, ele assumiu
que a 'chamada celestial' ou colheita dos supostos '144.000 santos eleitos' de
Revelação 7 e 14, terminaria em 1881. Escrevendo em maio de 1881, ele
declarou: 'o favor que termina este outono, é o de entrar na companhia da
Noiva [os 144.000]. Acreditamos que a porta de favor está agora aberta e
qualquer um que consagre tudo e dê tudo, pode vir ao casamento e tornar-se
membro da Noiva, mas neste ano a companhia será declarada completa e a
porta para essa chamada celestial (não a porta da misericórdia) será fechada
para sempre.'50
Melvin Curry escreve: 'O efeito desta predição a curto prazo foi duplo: serviu
para desviar a atenção dos Estudantes da Bíblia do desapontamento de 1878 e
forneceu um ímpeto para uma maior atividade evangelística'; 51 não obstante,
Russell estava sem dúvida sério em acreditar nessa predição. Pois ele também
predisse que em 1881 as igrejas (Babilônia) começariam a desmoronar-se e,
mais importante, ele esperava que o arrebatamento dos santos -- dos quais se
considerava a si próprio membro -- teria lugar nesse ano.52 Em vez de planear
empreender uma grande campanha evangélica para além das três décadas e
meia seguintes, ele esperava estar no céu com o seu Senhor.
De fato, em novembro de 1880, ele 'quase criou uma crise' entre os seus
seguidores ao sugerir que o arrebatamento ou 'mudança' seria 'invisível para os
seres carnais, tal como é Ele [Cristo], e os Anjos.'53 Na edição de dezembro da
Zion's Watch Tower [Torre de Vigia de Sião], ele escreveu a respeito da
mudança:
Por outras palavras, conforme ele prosseguiu explicando, eles seriam seres
espirituais materializados, como o Cristo ressuscitado que tinha aparecido
como homem.
Mais tarde, ele mudou novamente a sua posição tanto quanto à natureza como
quanto ao tempo do arrebatamento. Escrevendo em maio de 1881, ele disse:
'Quanto a quando a nossa mudança ocorrerá, só podemos dizer: Segundo o
nosso entendimento, ocorrerá em qualquer altura depois de 2 de outubro de
1881, mas não sabemos de nenhuma evidência das escrituras quanto a em
que tempo seremos mudados de naturais para espirituais, de mortais para
imortais.'55 Algumas vezes ele até fez declarações que à superfície parecem ser
falsidades descaradas. Por exemplo, na edição de maio de 1881 de Zion's
Watch Tower [Torre de Vigia de Sião] (na página 224 desse jornal conforme
reimpresso em forma de volume em 1919), ele declara: 'A TORRE DE VIGIA
nunca afirmou que o corpo de Cristo será mudado para seres espirituais neste
ano. Tal mudança ocorrerá algures. Nós não tentamos dizer quando, mas
dissemos repetidamente que isso não poderia ter lugar antes do outono de
1881.' No entanto, na edição de janeiro de 1881 da mesma revista, na página
180 das reimpressões, A. D. Jones, um 'contribuinte regular' para a Zion's
Watch Tower [Torre de Vigia de Sião], tinha escrito: 'No artigo a respeito da
nossa mudança, no jornal de dezembro [Zion's Watch Tower (Torre de Vigia de
Sião) de dezembro de 1880], nós expressamos a opinião de que isso estava
mais perto do que muitos supunham, e embora não tentássemos provar [que] a
nossa mudança [ocorreria] em qualquer tempo em particular, ainda assim
propomos olhar para algumas das evidencias que parecem mostrar a tradução
ou mudança da condição natural para a espiritual, a ocorrer nesta altura ou no
outono do nosso ano 1881.' E não pode haver qualquer dúvida que o próprio
Russell concordava com Jones. Na página 172 das reimpressões da edição de
1880, ele declara que 'a "chamada celestial" -- para ser a noiva -- o templo[,]
terminará no outono de 1881' e depois mais adiante, na mesma página, diz:
'Quando "o corpo", "a noiva", "o templo", ficar assim completo, todos terão sido
assim mudados.'
Como pode isto ser explicado? Temos de assumir que Russell foi
completamente desonesto? Provavelmente não. Parece, em vez disso, que ele
estava a racionalizar tanto para si como para os seus leitores e estava a
praticar auto-engano em grande escala. Embora as suas conjeturas
escatológicas e posteriores negações das mesmas possam parecer ultrajantes
para o leitor comum hoje, eram tão surpreendentemente contraditórias que a
explicação mais razoável é que o próprio Russell acreditasse nelas. 56 Ele era
evidentemente sincero ao acreditar que o seu ministério não duraria mais do
que uns poucos anos no máximo.
Ao longo dos anos seguintes, Russell tornou-se bem conhecido por todo o
mundo ocidental. Usando a sua riqueza pessoal, em 1886 publicou o volume I
de Millennial Dawn Series [Série da Aurora do Milênio] ou os Studies in the
Scriptures [Estudos das Escrituras]. Esse livro, que se tornou conhecido como
The Divine Plan of the Ages [O Plano Divino das Eras], teve larga circulação;
até à data da morte de Russell tinham sido distribuídas 4.817.000 cópias.67 Em
1889 ele produziu o volume II, The Time Is at hand [O Tempo É Iminente]; em
1891, o volume III, Thy Kingdom Come [Venha o Teu Reino]; em 1897, volume
IV, The Battle of Armageddon [A Batalha do Armagedom]; em 1899, o volume
V, At-one-ment between God and Man [Expiação entre Deus e o Homem]; e
em 1904, o volume VI, The New Creation [A Nova Criação]. Ao longo do
mesmo período, a Zion's Watch Tower [Torre de Vigia de Sião] foi distribuída
ainda mais extensamente, e numerosos colportores distribuíram livros, folhetos
e tratados da Watch Tower [Torre de Vigia] por toda a América e em outras
terras. Em 1881, já tinham sido enviados a Inglaterra dois missionários,68 e
poucos anos
A Tabela das Eras de Russell (retirado de The Divine Plan of the Ages [O Plano Divino das Eras])
Finalmente, nos últimos anos da sua vida, sob a sua direção a Watch Tower
Society [Sociedade Torre de Vigia] produziu o 'Photo-Drama of Creation' [Foto-
Drama da Criação], um programa que combinava slides pintados à mão e
imagens móveis, sincronizado com discos fonográficos que continham
discursos gravados e música. Só nos Estados Unidos, o 'Foto-Drama' foi visto
por cerca de dez milhões de pessoas durante os anos da Primeira Guerra
Mundial. Na tempo em que Russell morreu, ele tinha-se tornado Pastor e
principal porta-voz para um movimento internacional com milhares de
membros.
Em certa ocasião fui abordado por um ministro da igreja Reformada. Ele queria
saber como é que eu administrava a minha igreja. Eu disse-lhe: 'Irmão --, eu
não tenho igreja.' Ele disse: 'Sabe o que quero dizer.' Respondi: 'Também
quero que saiba o que quero dizer. Nós afirmamos que só há uma igreja. Se o
senhor pertence a essa igreja, pertence à nossa igreja.' Ele olhou-me com
surpresa. Depois disse: 'O senhor tem uma organização; quantos membros há
nela?' Respondi: 'Não sei dizer; nós não mantemos listas de membros.' 'Vocês
não mantêm qualquer lista dos membros?' 'Não. Nós não mantemos qualquer
lista; os nomes deles estão escritos no céu.' Ele perguntou: 'Como é que o
senhor tem a sua eleição?' Eu disse: 'Nós anunciamos uma eleição; e todo e
qualquer do povo de Deus, que seja consagrado e se costume reunir conosco
nesta companhia, ou congregação, pode ter o privilégio de expressar o seu
julgamento sobre quem seria a preferência do Senhor para anciãos e diáconos
na congregação.' 'Bem,' disse ele, 'isso é a própria simplicidade.' Eu
acrescentei: 'Nós não pagamos salários; não há nada para fazer as pessoas
disputar. Nós nunca fazemos coletas.' 'Como é que conseguem o dinheiro?',
perguntou ele. Respondi: 'Ora, Dr. --, se eu lhe disser a verdade mais simples o
senhor dificilmente conseguirá acreditar nela. Quando as pessoas se
interessam por este caminho, não encontram qualquer cesto colocado sob o
seu nariz. Mas elas vêem que há despesas. Elas dizem a si mesmas: "Este
salão custa algo, e vejo que é servido um almoço grátis entre as reuniões para
aqueles que vivem a alguma distância. Como é que posso dar algum dinheiro a
isto[?]"' Ele olhou-me como se pensasse: 'Por quem me toma -- por um
ingênuo?' Eu disse: 'Ora, Dr. --, estou a dizer-lhe a verdade nua e crua. Eles
fazem-me esta mesma pergunta: "Como é que posso dar algum dinheiro a esta
causa?" Quando uma pessoa recebe uma bênção e tem algum meio, ele quer
usá-lo para o Senhor. Se não tem meios, por que deveríamos picá-lo por isso?'
À medida que o tempo foi passando, Russell também teve tendência a impor
cada vez mais os seus próprios ensinos aos Estudantes da Bíblia. Isso não foi
porque ele estivesse sedento de poder, mas simplesmente porque acreditava
tão firmemente que tinha descoberto a 'verdade atual' e queria que outros a
conhecessem. Em 1895 ele sugeriu que as eclésias estudassem parágrafo por
parágrafo os seus volumes de Studies in the Scriptures [Estudos das
Escrituras] publicados até esse tempo.85 Em 1905 ele estabeleceu o que eram
conhecidos como Estudos Bereanos -- estudos direcionados em vários tópicos
escolhidos pelo próprio Russell para todo o movimento. Em resultado disso, o
estudo da Bíblia versículo por versículo foi substituído em praticamente todas
as congregações pelos Estudos Bereanos que, portanto, significavam que
Russell podia exercer maior controlo sobre as crenças dos seus seguidores. 86
Contudo, havia um grande perigo naquilo que Russell estava a fazer. Em The
Watch Tower [A Torre de Vigia] de Janeiro de 1913 ele escreveu: 'Nós não
paramos para perguntar o que o Irmão Calvino ou o Irmão Wesley ensinaram,
nem o que outros ensinaram antes ou depois deles. Nós recuamos até aos
ensinos de Cristo e dos apóstolos e profetas, e ignoramos todos os outros
ensinos. É verdade que todas as denominações alegam mais ou menos a
mesma coisa, mas eles estão mais ou menos impedidos de o fazer devido às
suas tradições e credos. Eles vêem através de lentes coloridas. Nós ignoramos
tudo isso e esforçamo-nos para ver as palavras de inspiração somente à luz do
contexto, ou à luz refletida de outras passagens das Escrituras.' 90 De fato, ele
estava a praticar auto-engano em grande escala, e os Estudantes da Bíblia,
tanto como quaisquer outros, estavam a olhar através de 'lentes coloridas'.
Conforme Timothy White diz: 'Os comentários dele tornaram-se para muitos
como os credos que ele tanto desprezava'.91
Russell como o Servo Fiel e Sábio
Uma das principais razões porque Russell se estava a enganar a si próprio era
que, apesar das suas boas intenções e falta de disposição para assumir o
papel de profeta, depois de 1895 ele detinha uma posição entre os Estudantes
da Bíblia que era mais do que apenas a do seu Pastor. O que aconteceu foi
que a Sra. Russell, que nesse tempo defendia vigorosamente o seu marido
contra os anteriores associados, inventou uma nova doutrina a respeito de
Mateus 24:45-47. Esse texto, na King James Version, diz: 'Quem é, então, o
servo fiel e sábio, a quem o seu senhor fez governante sobre os seus
domésticos, para lhes dar alimento na época devida? Abençoado é aquele
servo, a quem o seu senhor encontrar, quando vier, a fazer isso. Em verdade
vos digo, que ele o fará governante sobre todos os seus bens.' E Maria Russell
decidiu aplicar o termo 'servo fiel e sábio' da ilustração de Jesus ao seu marido.
Anteriormente, Russell tinha defendido que 'esse servo' era realmente uma
ilustração para a igreja -- o pequeno rebanho de 144.000 mencionados em
Revelação 7 e 14.92 Mas a sua esposa apontou para o fato de o 'servo' ser
singular, enquanto a igreja, os 'domésticos' [ou casa] da fé, ser plural. Além
disso, se a igreja era 'aquele servo' e também os 'domésticos', acabaria por se
estar a servir a si própria. Escrevendo em dezembro de 1895, Maria Russell
enfatizou fortemente o seu ponto a George Woolsey, um Estudante da Bíblia
de Nova Iorque:
Depois ela continuou argumentando que como Cristo estava presente e tinha
assumido o seu cargo de rei em 1878, a casa da fé estava sendo ricamente
aprovisionada com 'alimento no tempo apropriado' por um servo. 94 Ela não teve
de dizer especificamente a quem se referia.
Outro título que lhe foi dado pelos seus seguidores foi o 'Mensageiro
Laodicense'. Segundo Three Worlds, as sete igrejas da Ásia Menor
mencionadas nos primeiros três capítulos de Revelação representavam a igreja
de Cristo como um todo durante diferentes eras. A igreja laodicense era vista
como um tipo da 'última fase da igreja'.99 Consequentemente, como os
Estudantes da Bíblia acreditavam que a última fase tinha começado em 1874, e
Russell estava sendo usado como porta-voz escolhido de Jeová para a
exposição de 'novas verdades' para a igreja, ele era, por definição, o
'Mensageiro Laodicense'.100 Um terceiro título dado a Russell era 'o homem
com o tinteiro'. Em Ezequiel 9, o profeta teve uma visão de seis homens com
armas de matança nas suas mãos e um sétimo homem com um tinteiro de
escritor no seu lado. O sétimo homem devia colocar uma marca nas testas dos
habitantes de Jerusalém que estavam suspirando e chorando por causa das
abominações cometidas na cidade. Outros que não fossem marcados dessa
forma deviam ser mortos pelos seis homens com armas. Os Estudantes da
Bíblia acreditavam que esta visão teria um cumprimento antitípico durante a
segunda presença de Cristo, e Russell era portanto visto como aquele
marcando os que suspiravam e choravam devido às abominações cometidas
na antitípica Jerusalém, ou Cristandade.101
Mas as dificuldades sexuais não eram a causa direta da sua discórdia. Antes, a
causa era o desejo de Maria de um maior reconhecimento e autoridade, ligado
a uma disputa de família sobre assuntos de dinheiro. Pelo menos em 1894,
estava a começar a desenvolver-se entre os Russells uma séria tensão. Maria
estava a tornar-se profundamente ciumenta em relação a qualquer atenção que
o seu marido mostrasse para com outras mulheres, incluindo Rose Ball, uma
rapariga adolescente a quem os Russells encaravam quase como uma filha
adotiva.107 Além disso, Maria ressentiu-se daquilo que considerava ser a falta
de respeito de Russell por ela. Ela era uma pessoa com muito mais educação
do que ele. Não só se tinha graduado da escola secundária, como também
recebeu treino de professora na Pittsburgh Curry Normal School. Por isso ela
estava habilitada para ajudar o seu marido na redação da Zion's Watch Tower
[Torre de Vigia de Sião], escreveu numerosos artigos para esse jornal, e foi co-
autora dos primeiros quatro volumes de Studies in the Scriptures [Estudos das
Escrituras].108 Não obstante, talvez porque não havia um relacionamento íntimo
entre eles, ele mostrava pouco interesse por ela exceto como uma assistente
de redação e edição. Por isso ela passou a sentir que ele não tinha mais
consideração por ela do que por uma criada.109
Parte do problema era, claro, que Russell e a sua mulher tinham opiniões muito
diferentes sobre a natureza do papel de uma mulher no casamento. Ele era um
tradicionalista e, condizente com as atitudes comuns entre os cristãos
americanos do seu tempo, acreditava que as esposas tinham a obrigação de
estar subordinadas aos seus maridos. Ela, em contraste, estava a tornar-se de
certa forma uma feminista. Falando acerca dela em 1895 e pouco depois, ele
disse mais tarde: 'as idéias dos direitos das mulheres e a ambição pessoal
começaram a vir ao de cima, e eu percebi que a campanha ativa da Sra.
Russell em minha defesa, e a recepção muito cordial que lhe foi dada pelos
queridos amigos [...] fizeram-lhe mal por aumentarem o seu auto-apreço.'116
Deste ponto de vista, portanto, a desaprovação dele em relação às idéias e
comportamento dela não só era própria mas também, como cabeça cristão
dela, era um dever. Ela, claro, não via as coisas desse modo. Escrevendo em
1906 numa pequena apologia chamada The Twain One [O Par], ela
argumentou a favor da igualdade dos sexos e defendeu que as mulheres
deviam corretamente servir como instrutoras na igreja. Pensando com toda a
probabilidade no seu próprio casamento, ela declarou: 'Se alguém na igreja se
torna impulsivo, a igreja precisa de ter cuidado. Ou se o marido cristão,
desencaminhado pelo adversário através do orgulho, ou egoísmo, ou amor do
poder, pretender assim dominar a sua esposa e interferir com a suprema
aliança dela com Deus, então a esposa cristã tem de se acautelar, e não se
deixar encantar através de uma "humildade voluntária" que colocaria sob um
jugo de servidão ao pecado uma alma a quem Cristo fez livre.'117
Em 1896 Maria Russell enfrentou outro problema, de sua própria autoria. Se
Russell era o 'servo fiel e sábio' de Mateus 24:45-47 como ela tinha postulado,
como é que ela podia tomar uma atitude tão negativa em relação à autoridade
dele? A resposta é que ela rapidamente chegou à conclusão de que ele estava
a tornar-se o 'servo mau' descrito nos quatro versículos seguintes do mesmo
capítulo. O relato de Russell diz:
Russell respondeu que o testamento ofensivo tinha sido destruído algum tempo
antes para aplacar Emma e era por isso um assunto morto. Quanto à sua
suposta rudeza para com a esposa na reunião em questão, ele afirmou que
tinha pedido perdão cinco vezes anteriormente, e ela já o tinha perdoado cinco
vezes. Sem surpresas, o comitê inteiramente constituído por homens ficou do
lado do Pastor. Eles devem ter ficado desconcertados pelas respostas de
Russell às acusações contra ele, e um deles, W. E. Page, de Milwaukee,
Wisconsin, deve ter ficado mais do que um pouco perturbado por ter sido
trazido de centenas de milhas de distância para mediar aquilo que era pouco
mais do que uma disputa doméstica. Quanto à questão da exigência da Sra.
Russell de que lhe fosse permitido escrever o que desejasse na Zion's Watch
Tower [Torre de Vigia de Sião], eles 'disseram-lhe delicadamente mas muito
claramente que nem eles nem quaisquer outras pessoas no mundo tinham o
direito de interferir com a Administração da TORRE DE VIGIA pelo Irmão Russell:
que isso era apenas uma incumbência dele, e só ele era responsável pela sua
administração.'120
Ela viajou imediatamente para Chicago, onde tentou de novo lançar acusações
contra Russell perante aquela que era a segunda maior congregação de
Estudantes da Bíblia no mundo. Quando não conseguiu realizar nada ali, ela
propôs voltar para o seu marido. Mas ele recusou recebê-la, a menos que ela
concordasse com as suas condições. Em janeiro de 1899, ela regressou a
Allegheny para viver com a então viúva Emma Russell e para renovar os seus
ataques públicos ao Pastor. Quinze meses depois os Russells fizeram as
pazes novamente e Maria mudou-se para uma casa de hóspedes que era
propriedade de Russell, perto da casa da sua irmã. Embora recusasse apoiá-la
diretamente, ele forneceu-a de mobiliário e permitiu-lhe viver dos proveitos que
ela podia obter de vários hóspedes.
Russell ficou furioso, para dizer o mínimo, e decidiu punir a esposa pela sua
ação. Algures em meados de março de 1903, ele e vários associados da Casa
da Bíblia, a sede da Torre de Vigia, tomaram posse da casa dos hóspedes na
qual ela e quatro ou cinco hóspedes viviam, e removeu todos os pertences
pessoais deles. Russell até chegou ao ponto de tomar a bolsa da sua esposa
com todo o dinheiro de rendas que ela ainda tinha aí e quase se envolveu
numa luta de murros com um dos locatários quando este descobriu que as
suas propriedades e as do seu companheiro de quarto tinham sido removidas
dos seus quartos. Sem surpresas, Russell foi rapidamente posto em tribunal.
Dois hóspedes furiosos processaram-no por violar os seus contratos de
arrendamento, um deles acusou-o de assalto, e Maria processou-o para obter
um divórcio de comida e cama. Russell perdeu em todos os casos, exceto na
acusação de assalto, da qual foi absolvido.123
Maria Russell acabou por se tornar no opositor mais amargo do seu marido. No
seu julgamento para separação, ela tentou magoá-lo de um modo muito
incorreto declarando que ele tinha dito que 'ele era como uma medusa
flutuando, abraçando todos os que respondessem'. Embora esse testemunho
fosse proibido e ela admitisse mais tarde sob juramento que não pensava que
ele fosse culpado de adultério, a Sra. Russell foi bem sucedida em macular a
reputação do seu marido.124 Mais tarde, a batalha deles continuou sobre a
questão da recusa dele em pagar o apoio financeiro decidido pelo tribunal, e
novamente ela fez tudo o que era legalmente possível para fazê-lo parecer mal
aos olhos do mundo. Ele alegou que não tinha o dinheiro e de qualquer
maneira sem dúvida não queria dá-lo pois ela pretendia usar parte desse
dinheiro para imprimir e publicar ataques contra ele. 125 Embora ela sem dúvida
tivesse algumas queixas muito justificadas contra ele, é difícil não sentir que,
pelo menos de 1903 em diante, o comportamento dela em relação a ele foi
completamente vingativo. No entanto, ao longo dos anos, ao avaliar as
disputas amargas entre Charles e Maria Russell, os historiadores não
conseguiram chegar sequer perto de um consenso na questão de saber qual
dos dois tinha mais culpa.126
Em 1880 ele foi muito explícito sobre o Novo Pacto. Ele declarou
enfaticamente: 'Não deve ser interpretado como sendo o pacto de Deus
conosco -- "a semente", não [deve ser interpretado] que foi parte do pacto
abraâmico, e embora em harmonia um com o outro, não são o mesmo, nem é
o "novo pacto" feito com a igreja de modo nenhum.' 129 No entanto, visto que,
conforme já foi demonstrado, Russell certamente nem sempre era um
pensador claro, dentro de um ano, aparentemente muito inconscientemente,
ele reverteu para a opinião cristã tradicional segundo a qual a igreja estava sob
o Novo Pacto.130 Conforme Timothy White nota, ele parece ter estado
completamente confuso sobre o assunto.131 Não obstante, como a maioria dos
Estudantes da Bíblia vivendo na primeira década do século XX tinham-se
juntado ao movimento depois de 1880, nada sabiam sobre os seus
pensamentos anteriores. Consequentemente, quando Russell reafirmou o seu
ensino de 1880 com alguns embelezamentos, muitos dos Estudantes da Bíblia
mais qualificados ficaram chocados.
É claro que ninguém objetou a Russell tomar tal voto. No entanto, ele não
parou nesse ponto; ele começou a promover o voto para outros. Primeiro,
sugeriu que todos os peregrinos a tempo inteiro e parcial trabalhando sob os
auspícios da Sociedade Torre de Vigia, e todos os 'irmãos da família da Casa
da Bíblia' em Pittsburgh, também deviam fazer esse voto. Numa carta geral de
março de 1908, ele pediu que todo o peregrino e membro da família da Casa
da Bíblia se 'vinculasse com um voto para o Senhor' e que indicasse a Russell
por escrito que tinha feito isso.135
Em 1909 Henninges escreveu uma longa carta de protesto a Russell. 143 Pouco
depois foi posta em circulação uma 'carta aberta' dirigida 'a todos os
[Estudantes da Bíblia] que compreendem a necessidade de ficarem firmes para
o Senhor e a Sua Palavra no meio de tentações subtis e julgamentos deste
tempo presente: a todos os que apreciam Jesus como seu Mediador, e o Seu
sangue do Novo Pacto como a sua base de favor durante esta Era do
Evangelho.'144 A seguir à publicação desta carta, a maioria da congregação de
Melbourne, alguns americanos -- incluindo Williamson em Brooklyn -- e outros
Estudantes da Bíblia em todo o mundo saíram para formar os New Covenant
Believers [Crentes no Novo Pacto].145
Russell não queria que os Crentes no Novo Pacto saíssem e teria continuado
em associação com eles. O que ele parece não ter percebido é que a sua
posição como 'servo fiel e sábio', editor da Zion's Watch Tower [Torre de Vigia
de Sião], e Pastor eleito das congregações de Estudantes da Bíblia lhe dava
um papel proeminente como seu guia espiritual. Assim, era impossível opor-se
aos seus ensinos e continuar dentro da comunidade dos Estudantes da Bíblia,
e os Crentes no Novo Pacto recusaram-se a permanecer calados. Para eles a
doutrina tradicional do Novo Pacto era tão importante em 1909 como a doutrina
da expiação substitutiva tinha sido para Russell em 1878. Consequentemente,
várias centenas de um total de talvez 10.000 Estudantes da Bíblia separaram-
se.146 Russell parece não ter compreendido que tinha contribuído grandemente
para o sectarismo que tanto odiava.
Russell processou o Eagle mas perdeu. Ele foi evidentemente muito sincero
em vender o famoso grão mas foi mais entusiástico sobre as suas qualidades
do que devia. O Trigo Milagroso aparentemente nada mais era do que uma
estirpe mutante, uma 'sport'. Depressa perdeu a sua vitalidade fora do normal e
não era, como ele verdadeiramente acreditava, um sinal de que a terra seria
restaurada em breve a condições paradísicas.149
Durante os seus últimos anos, Russell era tratado com muito respeito pela
comunidade dos Estudantes da Bíblia, e os seus sermões eram publicados
tanto na América como na Europa, enquanto ele viajava extensamente de
comboio e barco a vapor. De muitas maneiras, a vida deve ter sido agradável
para ele. Nas viagens ele não poupava despesas para tornar as coisas muito
confortáveis para si e para os seus companheiros de viagem, que incluíam
médicos, generais aposentados, professores e juizes. Quando ele visitava as
suas congregações dispersas, era regularmente rodeado por homens e
mulheres que o adoravam. Afinal, não era ele o seu Pastor, 'aquele servo'?
Ainda assim, a sua vida estava longe de ser um mar de rosas. Esteve quase
constantemente envolvido em litígios entre 1903 e 1913, e durante esse
período foi severamente criticado tanto pelos eclesiásticos como por alguns
segmentos da imprensa. Também trabalhou arduamente, obrigando-se a
continuar quando a sua saúde começava a falhar. Finalmente, à medida que
1914 se aproximava, ele começou a ficar nervoso com a possibilidade da não
confirmação da profecia dos Tempos dos Gentios que tinha sido uma parte tão
proeminente dos seus ensinos desde antes da sua separação de Nelson
Barbour.
Muito mais sério para os Estudantes da Bíblia foi o fato de Russell ter morrido
em grande dor num comboio no sudoeste dos Estados Unidos em 31 de
outubro de 1916.157 Ele estava cansado e doente há algum tempo mas insistiu
em continuar os seus deveres de pregação e pastoreio para o seu rebanho
disperso mesmo até ao fim. Pois nos seus últimos anos de vida ele estava
convencido que a Primeira Guerra Mundial terminaria em 1918 na batalha do
Armagedom e no arrebatamento da igreja.158 Assim, embora a sua morte o
tenha salvo da desilusão que poderia ter sentido se tivesse vivido para ver a
guerra acabar e sem que as nações do mundo passassem para o
esquecimento, veio numa ocasião muito inoportuna para os seus seguidores.
Eles não tinham esperado ver o seu Pastor, 'aquele servo', morrer antes do fim
do mundo e não estavam psicologicamente preparados para continuar o seu
ministério e o deles no futuro. Mais significativo, eles haviam de ficar
grandemente perturbados pelo fato de a igreja mais uma vez não ter sido
'levada para casa' para o céu, os judeus não serem restaurados à Palestina, e
as nações do mundo não estarem quebradas em pedaços como Russell tinha
predito, quando a guerra acabou com o Tratado de Versailles em vez do
apocalipse. De fato, o movimento dos Estudantes da Bíblia quase desapareceu
em 1917 e 1918 devido a lutas entre os sucessores de Russell e devido à
perseguição de governos seculares e turbas que se lançaram sobre eles
depois de os Estados Unidos entrarem na guerra em abril de 1917. Embora
Russell tivesse feito alguns planos para a sua morte e a continuação do seu
trabalho depois disso, não podia ter imaginado o que estava para acontecer em
breve.
Notas
Russell admitiu em 1907 que tinha 'bens no valor de 60.000 dólares em 1879,
que incluíam duas lojas de roupas em Allegheny e três em Pittsburgh.' De fato,
ele provavelmente tinha muito mais do que isso. Numa carta a um tal Sr. J. H.
Brown, enviada aproximadamente em 1898, ele tinha escrito: 'Você conheceu-
me através dos negócios há 20 anos atrás, quando me vendeu mercadoria.
Você provavelmente sabia nesse tempo que eu tinha uma avaliação nas
agências comerciais de cerca de 150.000 dólares -- que eu tinha a maior loja
de vestuário para homem em Pittsburgh, além de várias sucursais mais
pequenas.' Transcrição do registro no caso Russell v. Russell em apelo no
Tribunal Superior de Pennsylvania (abril de 1907), pp. 23, 42, 43.
17É verdade que Storrs teve outra opinião sobre a matéria depois da Guerra
Civil Americana.
18Em The Last Times and Great Consumation [Os Últimos Tempos e a Grande
Consumação] (1863), Seiss ensina nas páginas 218-220 que depois das suas
ressurreições Cristo e os santos têm 'corpos espirituais glorificados'.
20C. T. Russell, The Object and Manner of Our Lord's Return [O Objeto e
Maneira da Volta de Nosso Senhor] (Rochester, NY: The Herald of the Morning,
1877), p. 45.
27A idéia, tirada de Números 14:33, 34 e Ezequiel 4:1-8, de que dias proféticos
como aqueles mencionados em Daniel e em Revelação em particular deviam
ser entendidos como representando anos, foi geralmente aceite por muitos
apocalípticos e milenaristas católicos e protestantes desde o tempo de Joaquim
de Flora até ao tempo de Russell, incluindo Wycliffe e muitos dos principais
reformadores.
29N. H. Barbour e C. T. Russell, Three Worlds and the Harvest of This World
[Três Mundos e a Colheita Deste Mundo] (Rochester, NY: The Herald of the
Morning, 1877), p. 42.
31 Ibid, p. 85-93.
32 Ibid, p. 68.
33 Ibid, p. 93-103.
34 Ibid, p. 158.
37 John A. Brown, The Even-Tide: or Last Triumph of the Blessed and Only
Potentate, the King of Kings, and Lord of Lords: Being a Development of the
Mysteries of Daniel and St. John [A Noite: ou Último Triunfo do Abençoado e
Único Potentado, o Rei dos Reis, e Senhor dos Senhores: Sendo um
Desenvolvimento dos Mistérios de Daniel e S. João] (Londres: J. Offor e outros
editores, 1823), vol. 2, pp. 130-152. Brown não se referiu aos 2.520 anos como
os Tempos dos Gentios de Lucas 21:24; isso foi feito por várias pessoas
incluindo William Miller, que seguiu a sua interpretação de Daniel 4.
40 Ibid, p. 84.
48 Ibid.
49 Ibid.
55 Ibid, p. 224.
56O compromisso de Russell com a cronologia de Barbour era tão completo
que ele tinha a certeza de que algo importante tinha de acontecer no outono de
1881. No entanto, ele tinha sido obrigado a espiritualizar o falhanço de 1878 e
parecia inseguro na sua própria mente sobre como a 'mudança' ocorreria em
1881. Por isso ele fez sugestões para ajustar os fatos à teoria numa base
quase mensal e, no seu zelo para o fazer, contradisse-se de uma maneira
extraordinária.
57James Parkinson, The Bible Student Movement in the Days of Pastor Russell
[O Movimento dos Estudantes da Bíblia nos Dias do Pastor Russell] (Los
Angeles: impressão privada, 1975), A-2.
59The Laodicean Messenger [O Mensageiro Laodicense], pp. 62, 63, 105, 106;
Divine Purpose [Propósito Divino], pp. 62, 63.
62 Ibid, 1884, reimpressões, pp. 584, 585; 1887, reimpressões, p. 918; 1887,
reimpressões, p. 1071; 1906, reimpressões, p. 3746.
67 Ibid.
76Ibid, pp. 100-102, 232; Russell, The New Creation [A Nova Criação], pp. 263,
264, 326-328.
78Ibid. Para uma excelente discussão de todo este assunto, veja White, pp.
115-117.
79Russell, The New Creation [A Nova Criação], pp. 326-328. Veja também WT,
1913, reimpressões, p. 5284.
82Para a atitude geral de Russell nesta matéria, veja a edição extra da WT,
abril de 1894, pp. 16, 17.
90 Reimpressões, p. 5156.
91 White, p. 137.
94 Ibid.
95 Ibid. Veja também WT, 1895, reimpressões, pp. 1796, 1797; e 1896,
reimpressões, p. 1946.
98 Reimpressões, p. 5998.
105 Ibid.
117-127.
111 Ibid.
112 Ibid.
119 Ibid.
120 Ibid.
122 Ibid.
124A 'História da Medusa' ainda é repetida por muitos críticos de Russell como
se tivesse substância real. De fato, a 'História da Medusa' reflete-se mais
negativamente sobre Maria Russell do que sobre Charles. Parece, a partir de
toda a evidência, que ela estava excessivamente amarga em relação a ele --
talvez com alguma justificação -- e queria simplesmente atacá-lo de qualquer
modo.
135 Ibid.
Veja 'What the Vow Signifies' [O Que Significa o Voto], reimpressões, pp.
136
4263-4266.
137 Ibid.
138 Ibid.
141 Ibid.
144 Ibid.
150 Para uma discussão completa deste caso, veja Penton, Apêndice A.
156 Ibid, p. 4.
Para detalhes sobre a sua morte, veja WT, 1916, reimpressões, pp. 5997-
157
6016.
Tal como Russell, Rutherford era um homem alto que, só pela sua presença,
impunha respeito. Ele tinha uma voz alta, estrondosa, e parecia mesmo um
senador americano de um Estado do Sul ou de perto das fronteiras. Ao lidar
com amigos ele podia ser despótico; ao lidar com inimigos, implacável. A
história oficial da Sociedade Torre de Vigia, Jehovah's Witnesses in the Divine
Purpose [As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino], descreve-o como 'um
tipo de pessoa enérgica e direta' com uma 'frontalidade na abordagem de
problemas ao lidar com os seus irmãos que fazia com que alguns ficassem
ofendidos.'3 De fato, ele era mal-humorado e por vezes brusco até ao ponto da
grosseria, tendo um temperamento explosivo que podia ocasionalmente exaltá-
lo até chegar à violência física. Também tinha um sentido de auto-justificação
que o levava a encarar qualquer pessoa que se lhe opusesse como sendo do
Diabo. Mais curioso ainda é o fato de apesar de em alguns aspectos ele ser um
Puritano dos Puritanos, em outros era completamente dissoluto. Usava
linguagem vulgar, sofria de alcoolismo, e foi certa vez acusado publicamente
por um dos seus associados mais próximos de ter assistido a um espetáculo
burlesco de nus, em companhia de dois anciãos e uma jovem mulher
Estudante da Bíblia numa noite de quarta-feira antes da celebração do
Memorial da Ceia do Senhor.4
No entanto, havia muito mais sobre ele do que esta descrição resumida, muito
pouco lisonjeira, indicaria. Rutherford entrou em contato com os Estudantes da
Bíblia pela primeira vez em 1894. Em 1906 ele foi batizado e pouco depois
tornou-se um peregrino. Depois de algum tempo, ele tornou-se bastante
popular entre os seus companheiros de crença porque, como advogado, travou
batalhas em tribunal para limpar o nome de Russell, debateu publicamente em
defesa das doutrinas dos Estudantes da Bíblia e, em 1915, escreveu uma
apologia em benefício de Russell, intitulada A Great Battle in the Ecclesiastical
Heavens [Uma Grande Batalha nos Céus Eclesiásticos].
De fato, Russell esperava que a sua posição como principal porta-voz para os
Estudantes da Bíblia fosse assumida por uma liderança coletiva. Segundo a
vontade dele, The Watch Tower [A Sentinela] devia estar sob a
superintendência de uma comissão editorial de cinco pessoas, e nenhum artigo
devia ser publicado sem o acordo de pelo menos três membros dessa
comissão.5 Curiosamente, Rutherford não foi nomeado para a comissão e foi
nomeado apenas como um de cinco membros alternativos possíveis. 6 Portanto,
embora Russell não tivesse tido qualquer intenção de passar a sua autoridade
ou papel intacto para qualquer sucessor individual, Rutherford tinha outras
idéias.
A história oficial das Testemunhas sugere que durante o curto período entre a
morte de Russell e a eleição de Rutherford como presidente da Torre de Vigia,
outros estavam conspirando para também alcançar esse cargo. São
mencionadas várias figuras entre os 'conspiradores', mas o arquivilão, segundo
este relato, era Paul S. L. Johnson. Assim, Johnson é descrito como sendo o
principal instigador daquilo que em breve se tornaria um grande cisma na
comunidade dos Estudantes da Bíblia durante o verão de 1917.
Resumidamente, o relato da Torre de Vigia diz o seguinte.
Mesmo a descrição básica dada nos relatos da Torre de Vigia não é exata. É
bem verdade que vários indivíduos viam-se a si mesmos como sucessores de
Russell em perspectiva em novembro e dezembro de 1916. Também é verdade
que Paul Johnson era uma pessoa estranha, errática, que causou muitos
problemas a Russell através dos seus maus conselhos e que tinha visões de
glória, para dizer o mínimo.23 Fora isso, a versão oficial [da Torre de Vigia]
sobre os eventos de 1917 é falsa história.
Não se deve inferir disto que os diretores demitidos estavam sem falhas; não
estavam. A eclésia de Nova Iorque dos Estudantes da Bíblia viu falhas em
ambos os lados das querelas no interior da Sociedade. 42 O Vice-Presidente
Pierson vacilou entre Rutherford e os seus adversários, mas no fim morreu em
associação com o presidente da Sociedade.43 No entanto, retrospectivamente,
o que Ritchie, Hirsh, Hoskins e Wright exigiam de Rutherford parece muito mais
razoável do que a Sociedade gostaria de admitir hoje. Talvez mesmo os
representantes da Sociedade saibam isso. Tão recentemente como em 1950,
quando William Cumberland, então trabalhando numa dissertação de
doutoramento na Universidade de Iowa, procurou examinar os documentos da
Sociedade relativos ao cisma de 1917, eles recusaram-se a deixá-lo vê-los. Ele
foi obrigado a obtê-los dos Dawn Bible Students [Estudantes da Bíblia da
Aurora], em muitos sentidos os herdeiros dos adversários de Rutherford. 44
A expulsão de Johnson e dos ex-diretores de Betel foi seguida por uma guerra
de panfletos, com as várias partes apresentando as suas versões da questão.
Os oponentes de Rutherford esperavam desalojá-lo na próxima reunião anual
dos detentores das ações da Sociedade, agendada para janeiro de 1918. Eles
sugeriram que Menta Sturgeon, o secretário privado de Russell e o homem que
estava com ele quando morreu, daria um bom presidente. 45 Mas Rutherford
puxou-lhes completamente o tapete debaixo dos pés. O juiz convocou uma
sondagem democrática entre os Estudantes da Bíblia em novembro de 1917.
Embora a sondagem não fosse vinculativa, lançou a base para a reeleição dele
e dos seus associados. Sem dúvida a comunidade dos Estudantes da Bíblia
olhava para a Sociedade como uma instituição sagrada porque esta tinha
estado associada tão de perto com Russell. Assim, como Rutherford controlava
a Sociedade durante o outono e inverno, ele obteve o apoio da maioria dos
Estudantes da Bíblia, embora uns poucos soubessem o que se estava a
passar.46
Reorganização no Pós-Guerra
Embora Rutherford não admitisse qualquer culpa real sobre o assunto nas
publicações da Sociedade, ele deu desculpas descaracterizadas em
congressos da IBSA. Evidentemente, ele também estava desgostoso. Num
discurso público dado na Austrália no início de 1975, o atual [1985] presidente
da Sociedade Torre de Vigia, Frederick W. Franz, declarou que o juiz tinha
admitido 'que fizera figura de asno em 1925'. No entanto, isto não o impediu de
continuar a proclamar que o fim do mundo estava 'iminente' e que poderia ser
esperado dentro de poucos anos ou até poucos meses. O fato de ele ter
profetizado falsamente também não lhe parece ter dado segundos
pensamentos sobre a campanha de pregação dos Estudantes da Bíblia, sobre
o seu ministério ou o seu desejo de manter e aumentar os seus poderes
pessoais. Mas como os acontecimentos acabariam por mostrar, muitos
Estudantes da Bíblia tinham um sentimento muito diferente: a débâcle de 1925,
junto com o crescente ressentimento contra o presidente da Torre de Vigia,
levaria muitos milhares a sair do movimento nos anos seguintes.
O Ministério de Rutherford
Congressos
Para realizar a primeira medida, ele publicou um artigo na The Watch Tower [A
Sentinela] de 1.º de maio de 1926, na qual desacreditou completamente o
termo 'desenvolvimento do caráter'. Curiosamente, se olharmos para esse
artigo e o compararmos com as declarações de Russell na matéria, veremos
que Rutherford estava a atacar um straw man [caricatura ou deturpação das
declarações de Russell]. No entanto, ao desacreditar o velho conceito dos
Estudantes da Bíblia da santificação como 'obra de retidão', ele pode,
paradoxalmente, colocar maior ênfase na obra do evangelismo.
O Novo Nome
Os argumentos que o Juiz usou eram uma obra prima de lógica falaciosa e má
exegese. Por exemplo, ele usou Isaías 62:1, 2 na tradução de Rotherham para
mostrar que o povo de Deus haveria de receber 'um novo nome'. Mas,
conforme Timothy White observa, se ele se tivesse dado ao trabalho de ler
mais dois versículos teria descoberto que o novo nome seria 'Hefzibá', e não
'Testemunhas de Jeová'.82 No entanto, a escolha do novo nome foi um
audacioso golpe de gênio da parte de Rutherford. Pois provavelmente mais do
que qualquer outra coisa, deu uma proeminência e singularidade aos apoiantes
da Torre de Vigia que nada mais poderia ter dado. Também serviu como uma
importante separação psicológica em relação a Russell e ao passado dos
Estudantes da Bíblia, e foi um passo importante na criação de um arranjo
'teocrático' altamente centralizado sob Rutherford e os seus sucessores
escolhidos a dedo. É claro que isso ofendeu alguns Estudantes da Bíblia que
antes tinham permanecido leais à Sociedade; de fato, isso representava a
adoção de um nome sectário em violação de um dos ensinos mais sentidos de
Russell. Mas Rutherford sem dúvida queria que tais pessoas se submetessem
ou abandonassem o movimento de qualquer maneira. Para o juiz, todos os que
não estavam completamente a favor dele, estavam contra ele -- e contra Jeová
também.
O juiz era demasiado prudente para simplesmente atacar os anciãos sem ter
outros para colocar no seu lugar. Durante os anos de 1919 a 1932, ele
aumentou gradualmente o seu controlo sobre congregações locais de
Estudantes da Bíblia através do desenvolvimento de novas atividades de
pregação dirigidas pela Sociedade, que foram colocadas sob a
superintendência dos diretores de serviço que tinham primeiro sido nomeados
para distribuir a The Golden Age [A Idade de Ouro] em 1919. Estas novas
atividades incluíam a circulação de várias resoluções adotadas em congressos
e, a partir de 1926, a distribuição de casa em casa de literatura da Torre de
Vigia. Consequentemente, o que Rutherford estava a fazer era construir em
cada congregação um corpo de diretores pregadores partidários da Sociedade.
Embora fossem nomeados localmente pelas eclésias, eram designados pela
Sociedade, e tendiam a ser leais a Rutherford e à Sociedade em todos os
assuntos.86
Evidência externa para isto pode residir no fato de ter havido lugar para
considerável criticismo dos anciãos em anos recentes, particularmente desde
1922. Chamados a servir, muitos deles provaram ser 'um espinho na carne' da
Sociedade, dos diretores, da organização de serviço e dos trabalhadores fiéis.
A eleição deles, supostamente expressando a 'Vontade do Senhor' pelo
espírito santo, freqüentemente resultou em oposição à 'mente do Senhor'
conforme manifestada através da Sociedade.
Será que a remoção do espírito santo não implica o fim do governo da igreja
das 'fileiras para cima', e a vinda do Rei ao seu templo não implica o governo
da igreja do 'trono para baixo'? E se é assim, não temos nós uma organização
dual, governada do 'trono para baixo' e das 'fileiras para cima'?
Vosso irmão,
O juiz por vezes também era uma pessoa austera e a austeridade tornou-se
um regra da vida das Testemunhas. Natal, festas de aniversário e outros
costumes populares foram descritos como sendo de origem pagã, anti-cristãos,
e consequentemente não deviam ser celebrados ou praticados. 97 Durante
algum tempo até foram proibidos os cânticos nas congregações.98 Barbas,
freqüentemente usadas por muitos Estudantes da Bíblia em imitação do Pastor
Russell, foram proibidas nos escritórios e tipografias da Torre de Vigia em todo
o mundo.99 A barba era encarada como um sinal de presunção, embora muitas
Testemunhas mais antigas ignorassem Rutherford neste assunto e
continuassem a usar barba.
[imagem]
O Ano de Resgate de Jeová (da The Golden Age [A Idade de Ouro] de 13 de março de 1935, p. 381)
O Ataque à Religião
Quando em meados da década de 1930 o juiz foi obrigado a sair das ondas de
rádio em resultado da pressão tanto da comunidade comercial como das
igrejas no Canadá e nos Estados Unidos,110 a Sociedade Torre de Vigia
produziu discos de fonógrafo com as suas denúncias tonitruantes, que eram
tocadas em fonógrafos portáteis levados de casa em casa por Testemunhas de
Jeová voluntárias. Noutros casos, essas mesmas Testemunhas tocavam os
discursos de Rutherford através de altifalantes para comunidades inteiras,
muitas vezes de católicos irados. Num caso, na província do Quebec, elas
chegaram ao extremo de construir um carro sonoro com proteções de chapa --
do qual ainda existem várias imagens -- a partir do qual podiam transmitir
condenações à Igreja de Roma para turbas hostis em duas línguas.
Embora as Testemunhas de Jeová tenham feito tudo o que era possível para
esconder relatos dos hábitos de bebida do juiz, estes são simplesmente
demasiado notórios para poderem ser negados. Ex-trabalhadores da sede da
Torre de Vigia em Nova Iorque contam histórias sobre os seus estados de
embriaguez. Outros contam histórias de como por vezes era difícil fazê-lo
chegar à tribuna para dar discursos nos congressos, devido à sua embriaguez.
Em San Diego, Califórnia, onde ele passou os verões desde 1930 até à sua
morte, uma senhora idosa ainda fala de como lhe vendeu grandes quantidades
de bebidas alcoólicas quando ele vinha comprar medicamentos à farmácia do
marido dela. Mas talvez o relato mais revelador dos hábitos de bebida de
Rutherford seja aquele que apareceu numa carta aberta que lhe foi dirigida
pelo anterior superintendente da filial da Torre de Vigia no Canadá, Walter
Salter.
Durante anos, Salter foi um amigo e confidente próximo do juiz, mas em 1936
ele afastou-se do juiz devido a divergências doutrinais e foi desassociado. Em
1 de abril de 1937 ele publicou a carta mencionada anteriormente, que era uma
violenta acusação pessoal contra Rutherford e que, nos seus contornos gerais,
é bastante exata. Assim, Salter afirmou que tinha comprado 'whisky a 60
dólares cada caixa' para o presidente da Torre de Vigia 'e caixas de aguardente
e outras bebidas alcoólicas, além de caixas de cerveja sem conta,' tudo com o
dinheiro da Sociedade. Para que ninguém pensasse que estas bebidas eram
para outros, o ex-superintendente da filial no Canadá declarou: 'Uma garrafa ou
duas de bebidas alcoólicas não chegava; era para o PRESIDENTE e nada era
demasiado bom para o PRESIDENTE.' Depois de descrever o estilo de vida
faustoso de Rutherford, Salter disse com amarga ironia: 'E, ó Senhor, ele
[Rutherford] é tão corajoso e a fé que tem em Vós é tão grande que se esconde
atrás de quatro paredes, ou rodeia-se literalmente de guarda-costas armados e
põe-se a clamar os seus sonhos ... e manda-nos de porta em porta para
enfrentar o inimigo enquanto ele vai de "bebida em bebida" e diz-nos que se
não formos de porta em porta seremos destruídos.'
Claro que isso não aconteceu. Quando funcionários do Condado de San Diego
finalmente recusaram autorização para que o Juiz Rutherford fosse enterrado
em Bete-Sarim, os seus restos mortais foram levados para Rossville, Nova
Iorque, e colocados ali,124 e foram rapidamente esquecidos por todos exceto
uns poucos amigos próximos. Os registos da tentativa de enterrá-lo em Bete-
Sarim mostram que nem os funcionários da Torre de Vigia nem a sua viúva e
filho, Malcolm, pareciam muito preocupados com a sua última morada, pois
eles foram notórios nas audições sobre o assunto pela sua ausência. Além
disso, como o próprio juiz tinha ensinado as Testemunhas a serem leais à
organização de Jeová, a teocracia, em vez de a qualquer homem, eles foram
rápidos em dar a sua completa lealdade aos seus sucessores no Betel de
Brooklyn. Assim, hoje apenas um punhado de Testemunhas, que têm cerca de
sessenta anos ou mais, sabem bastante sobre o homem que reformulou o seu
movimento, e são ainda menos as que sabem que Bete-Sarim e a cripta de
cimento inacabada de Rutherford ainda existem como monumentos a ele --
embora a Casa dos Príncipes já não seja mantida para todos os homens justos
desde Abel até João, o Batizador.
Notas
3 Página 68.
6 Ibid.
9Macmillan, pp. 75, 76. Anuário das Testemunhas de Jeová de 1974, pp. 101-
106.
15Macmillan, pp. 76, 77; Divine Purpose [Propósito Divino], p. 70; Anuário de
1976, p. 87.
22 Macmillan, p. 81.
27 Ibid, p. 16.
29O Testamento de Russell, conforme foi publicado pouco depois da sua morte,
pode ser visto na WT, 1916, reimpressões, pp. 5999, 6000.
32 Pierson et al., p. 4.
34 Cumberland, p. 131.
36 Ritchie et al., p. 5.
37 Ibid.
O relato de Macmillan diz: 'Eu disse "Guarda, estes homens não têm que estar
aqui. O lugar deles é na Columbia Heights, 124, e eles estão a perturbar o
nosso trabalho aqui. Eles recusaram sair quando lhes ordenamos que saíssem.
Agora apenas pensamos em chamar a lei."
Sejam quais forem os fatos do caso, Macmillan admite que não queria que os
diretores obtivessem um quorum para efetuarem negócios e estava decidido a
impedi-los de realizar uma reunião de negócios quando Rutherford estava
ausente. Macmillan estava por isso a mentir quando disse que os diretores
estavam a perturbar o trabalho das pessoas que estavam nos escritórios da rua
Hicks. Além disso, ele não menciona que os quatro estavam em Hicks St
Chapel quando ele chamou a polícia para os expulsar.
42'An Open Letter to People of the Lord Throughout the World' [Uma Carta
Aberta Para o Povo do Senhor em Todo o Mundo] e 'A Petition to Brother
Rutherford and the Four Deposed Directors of the W.T.B. and Tract Society'
[Uma Petição ao Irmão Rutherford e aos Quatro Diretores Depostos da
Sociedade T.V.B. e Tratados]. Ambos sem data, 1917.
44 Cumberland, p. 118.
45 Ritchie et al., p. 3.
46 WT, 1917, reimpressões, pp. 6184, 6185.
47 Rogerson, p. 39.
48Para uma discussão destes movimentos desde 1918, veja Alan Rogerson,
'Qui est schismatique?' [Quem é Cismático?], em Social Compass 24:1 (1977),
pp. 33-43; e J. Gordon Melton, The Encyclopedia of American Religion
(Wilmington, NC: McGrath Publishing Co., 1978), pp. 487-491.
53Divine Purpose, pp. 81-83; The Golden Age (29 de setembro de 1920),
passim.
61 Ibid, p. 96.
62 Penton, p. 84.
64 Ibid.
65 Ibid.
66Rutherford, Millions Now Living Will Never Die [Milhões Que Agora Vivem
Jamais Morrerão], p. 88 [pp. 110, 111 em português].
68 Páginas 214-236.
69 Página 57.
72Ibid. Veja também Divine Purpose, pp. 101-111; e o Anuário de 1976, pp.
135-139.
75WT, 1938, p. 185. Veja também White, pp. 186-188. Os outros membros da
comissão editorial -- W. E. Van Amburgh, J. Hemery, R. H. Barber e C. E.
Stewart -- eram todos partidários de Rutherford. Mas quando eles se opuseram
às idéias de Rutherford, ele achou que eles estavam a agir de forma contrária à
vontade do Senhor. Escrevendo em 1938 na edição da The Watchtower [A
Sentinela], citada acima, ele declarou: 'The Watchtower [A Sentinela] de 1.º de
março de 1925 publicou o artigo "Nascimento da Nação", significando que o
reino tinha começado a funcionar. Uma comissão editorial, providenciada
humanamente, nessa altura era suposta controlar a publicação de The
Watchtower [A Sentinela], e a maioria da comissão objetou energicamente à
publicação do artigo "O Nascimento da Nação", mas pela graça do Senhor, o
artigo foi publicado e isso realmente marcou o princípio do fim da comissão
editorial, indicando que o Senhor está ele mesmo a governar a organização.'
77 Página 7.
82 White, p. 260.
95Baseado no relato do meu pai, Levis B. Penton, que estava presente nessa
ocasião.
100White, p. 173. Uma idéia clara sobre as idéias de Woodworth só pode ser
obtida examinando a própria The Golden Age [A Idade de Ouro]. Embora White
descreva Woodworth como 'inteligente', temos de questionar a estabilidade
emocional dele ao publicar as muitas coisas que publicou.
When Pastor Russell Died [Quando o Pastor Russell Faleceu], pp. 24-30.
104
Melton, p. 491.
115 Ibid.
116The Golden Age [A Idade de Ouro] (19 de março de 1930), pp. 404-407;
Herbert H. Stroup, The Jehovah's Witnesses [As Testemunhas de Jeová] (Nova
Iorque: Columbia University Press, 1945), p. 42.
118 Ibid.
The Tribune-Sun (San Diego), 21 de janeiro de 1942, p. 12; The San Diego
121
pp. 3-16.
125 Ibid.
Conclusão
M. James Penton
Nenhuma religião no mundo moderno demonstra o tremendo poder das ideias
milenaristas de forma mais óbvia do que as Testemunhas de Jeová, mesmo no
que tem sido frequentemente chamado 'era secular'. Esta religião mostra a
predisposição de milhões de pessoas para confiar na autoridade profética de
certos indivíduos ou de um grupo, mesmo apesar do facto de as suas profecias
se terem revelado falsas vez após vez. Isso também indica como, usando uma
escatologia baseada em datas, que tem prometido desde há muito tempo
grandes recompensas -- tantos espirituais como materiais -- para a
comunidade dos Estudantes da Bíblia/Testemunhas, homens como Charles
Taze Russell, Joseph Franklin Rutherford e os seus sucessores passaram a
deter uma influência quase 'Orwelliana' sobre essa comunidade.
Mas ainda tem de se fazer a pergunta: Como é que isto pode acontecer? Ao
contrário de Tertuliano, as Testemunhas de Jeová não proclamam uma fé
baseada no absurdo; elas são racionalistas par excellence. Claro que muitas
Testemunhas comuns simplesmente desconhecem o fracasso das profecias
apocalípticas feitas pela Watch Tower Society no passado e as muitas
contradições lógicas que sempre estiveram presentes nos ensinos da
Sociedade. Poucas têm idade suficiente ou estiveram associadas com as
Testemunhas há tempo suficiente para estarem a par da sua história inicial, e
não são encorajadas a examinar o assunto. Quanto às doutrinas, a menos que
se faça um estudo concentrado delas, é difícil perceber mesmo um pequeno
número de incongruências, paradoxos e distorções flagrantes da verdade
histórica que têm estado e ainda estão presentes nelas. No entanto, a
ignorância não é o único factor que mantém as Testemunhas de Jeová leais à
Watch Tower Society. Tal como muitas seitas cristãs, as Testemunhas já há
muito tempo que acham que só elas são o 'Israel espiritual', sucessores do
Israel natural. Assim, embora as mais sofisticadas e bem informadas dentre
elas estejam a par de muitos dos sérios problemas doutrinais e organizacionais
criados, em última análise, pela escatologia baseada no estabelecimento de
datas da sua organização, elas muitas vezes argumentam que embora os seus
líderes possam ser 'iníquos', tal como muitos reis do antigo Israel e Judá, Deus
está de algum modo a guiar e a dirigir a sua comunidade, a sua 'nação', para
um propósito divino especial. Eles defendem que por fim Jeová limpará a sua
organização e removerá aqueles que os governaram com severidade e
injustiça. Tal como alguns dos trabalhadores do Betel de Brooklyn no Outono
de 1979, eles esperam que 'o Rei Saul morra'. A este respeito, é instrutivo
notar que enquanto alguns dos que foram classificados como 'apóstatas' pela
Watch Tower Society deixaram voluntariamente as Testemunhas de Jeová, a
esmagadora maioria foi afastada por importunação ou por excomunhão.
Isto não significa que eles não continuam a perder uma larga porção dos seus
membros tanto para a 'apostasia' como para a 'impureza moral'. Isso continua a
acontecer, e eles estão profundamente preocupados com isso.4 No entanto,
enquanto eles converterem mais pessoas do que as que perdem e o número
total de membros continuar a crescer, os seus líderes parecem estar
determinados a manter o rumo que, em geral, têm seguido desde que o Juiz
Rutherford criou 'a Teocracia' nas décadas de 1920 e 1930.5
Como seria de esperar, estes sucessos são usados pela Watch Tower Society
para afirmar que Jeová ainda está a abençoar as suas Testemunhas, e tudo
está essencialmente bem com a sua organização. Consequentemente, mesmo
algumas ex-Testemunhas como Raymond Franz esperam poucas mudanças
ou reformas no movimento. Franz acredita que aqueles que sucederão à actual
liderança da Watch Tower estão tão comprometidos com as actuais políticas
como estes; e acha que eles conseguirão inventar uma nova doutrina que lhes
permitirá abandonar o seu ensino que diz que o mundo tem de acabar antes
que morra a geração que tinha idade suficiente para testemunhar os eventos
de 1914.10
Também é muito pouco provável que a Watch Tower Society consiga manter o
alto nível de dedicação entre as Testemunhas fiéis durante qualquer período de
tempo sem estabelecer outra data apocalíptica iminente como objectivo pelo
qual se empenhar. Porém, fazer isso poderia ser muito perigoso. Por fim, é
difícil acreditar que a Sociedade conseguirá continuar o seu actual sistema de
coerção 'judicial', com todos os seus sérios efeitos pessoais, familiares,
organizacionais, e sociais sem incorrer em custos que são demasiado altos e
que não compensam. Por outras palavras, se a Sociedade for o objecto de
muito litígio ou interferência governamental directa, terá de suavizar ou abolir
as suas tácticas coercivas ou enfrentar sérias consequências legais de um tipo
que não pode suportar.
Notas
1 Página 30.
3Richard Hofstadter, The Paranoid Style in American Politics and Other Essays
[O Estilo Paranóico na Política Americana e Outros Ensaios] (Nova Iorque:
Alfred A. Knopf, 1965), pp. xii, 3, 5, 21, 22.
11 Página 17.
[Gráfico]
Figura 1: Média e auge de publicadores, 1986-1995
[Gráfico]
Figura 2: Número de baptizados, 1986-1995
que elas foram recentemente sujeitas a muita perseguição directa. Nesse país
elas foram ilegalizadas por recusarem serviço militar e por uma falta de
patriotismo geral, e têm sido detidas, colocadas na prisão e multadas por
realizarem reuniões ilegais. O advogado canadiano das Testemunhas, Glen
How, agiu recentemente em defesa delas na apelação dos seus casos para o
supremo tribunal de Singapura; contudo, o juiz presidente ridicularizou-o
abertamente nesses esforços e confirmou as sentenças originais contra os
irmãos de How em Singapura.6 Deve-se enfatizar, contudo, que em
comparação com os níveis de perseguição que as Testemunhas tiveram no
passado, as suas dificuldades em Singapura e no resto do mundo são bastante
reduzidas.
Porém, existe outro lado da situação, que a Watch Tower Society não anuncia.
Em primeiro lugar, basta dizer que embora os aumentos numéricos das
Testemunhas de Jeová nas repúblicas da ex-União Soviética, no Japão e na
maior parte do terceiro mundo não-muçulmano sejam bastante altos, a taxa de
crescimento nos países industrializados da Europa, da América do Norte e dos
Antípodas tem diminuído apreciavelmente.7 Em segundo lugar, ainda há um
grande número de indivíduos que são obrigados a sair do movimento ou que
saem voluntariamente. Segundo as próprias estatísticas da Sociedade,
aproximadamente 40.000 pessoas têm sido desassociadas anualmente da
comunidade mundial das Testemunhas,8 e muitos outros milhares dissociaram-
se formalmente das Testemunhas de Jeová ou isolaram-se simplesmente das
suas congregações.9 Em terceiro lugar, e talvez mais significativo, a Sociedade
está agora sob ataque de anteriores membros, num grau nunca antes visto, e
tanto a doutrina da Watch Tower como o movimento das Testemunhas estão
sendo estudados, avaliados e criticados como nunca antes. Assim, os líderes
da Watch Tower e a comunidade das Testemunhas como um todo manifestam
um sentimento cada vez maior de paranóia e de ódio aberto em relação aos
'apóstatas' e 'opositores'. Estes factores são discutidos adiante com mais
detalhe.
Andorra 98 137 40
Liechtenstein 43 60 40
[Gráfico]
Figura 4: Percentagem de crescimento de publicadores nos países desenvolvidos e no mundo inteiro, 1986-1995
Outro factor que pode ter grande importância é o corpo governante ter
suavizado a sua posição em relação à educação superior ou avançada.
Conforme indicado anteriormente, historicamente o movimento Watch Tower
tem-se oposto à educação superior, excepto em casos raros. Embora nunca
tenha existido uma proibição absoluta contra o ingresso na Universidade,
declarações negativas constantes nas publicações da Watch Tower e pressão
psicológica de anciãos, de superintendentes de circuito e de membros de
família fizeram com que muitas Testemunhas jovens não ingressassem em
instituições de ensino superior. No entanto, ao longo dos anos algumas
pessoas jovens deixaram o movimento das Testemunhas em vez de desistirem
da oportunidade de seguir estudos universitários, com o resultado de as
Testemunhas de Jeová perderem muitos dos seus membros mais brilhantes.
Assim, em anos recentes a Watch Tower Society apercebeu-se lentamente
que: (1) precisava de indivíduos altamente treinados, particularmente em áreas
como a contabilidade, a ciência computacional e o direito, para levar a cabo as
suas próprias actividades; e (2) em muitos países do mundo industrializado, a
educação superior estava a tornar-se um pré-requisito essencial para
empregos que oferecem remunerações adequadas para manter homens e
mulheres jovens e suas famílias. A Sociedade também se apercebeu que
muitos pioneiros estavam a desistir dos seus ministérios porque não
conseguiam obter empregos decentes. The Watchtower [A Sentinela] de 1.º de
Novembro de 1992 disse: 'Que situação se encontra hoje muitas vezes?
Relatou-se que, em alguns países, muitos jovens bem-intencionados
abandonaram a escola depois do período mínimo obrigatório, a fim de se
tornarem pioneiros. Não tinham nenhum ofício, nem qualificações seculares.
Os que não recebiam ajuda dos pais tiveram de achar um emprego por meio
período. Alguns tiveram de aceitar trabalhos que exigiram deles trabalhar
muitas horas para ganhar o suficiente para o sustento. Ficando fisicamente
esgotados, desistiram do ministério de pioneiro. O que podem esses fazer para
sustentarem a si mesmos e voltar ao serviço de pioneiro?' De forma muito
relutante, a revista oficial disse ainda: '... quando pais e jovens cristãos, hoje
em dia, depois de avaliar com cuidado e oração os prós e os contras, decidem
a favor ou contra estudos depois da escola secundária, outros na congregação
não devem criticá-los.'11
Isto não significa que a Sentinela estivesse a abandonar a sua aversão aberta
pela educação superior; a sua mudança de posição era claramente pragmática
e é acompanhada por uma declaração curiosa: 'Caso se façam cursos
adicionais, o motivo certamente não deve ser o de se destacar em erudição ou
de empenhar-se por uma prestigiosa carreira no mundo. Os cursos devem ser
escolhidos com cuidado. Esta revista tem colocado ênfase nos perigos da
educação superior, e isto é justificável, porque grande parte da educação
superior se opõe ao "ensino salutar" da Bíblia. (Tito 2:1; 1 Timóteo 6:20, 21)
Além disso, desde os anos 60, muitas escolas de ensino superior tornaram-se
berços de iniqüidade e de imoralidade. "O escravo fiel e discreto" tem
fortemente desestimulado ingressar em tal ambiente. (Mateus 24:12, 45) Deve-
se admitir, porém, que os jovens, atualmente, se confrontam com esses
mesmos perigos nas escolas secundárias e em escolas técnicas, e até mesmo
no lugar de trabalho. -- 1 João 5:19.'12
Mais recentemente a Watch Tower Society também adoptou uma atitude mais
positiva em relação à educação e aos educadores do ensino elementar e
secundário -- novamente devido a razões obviamente pragmáticas. Durante
anos a brochura da Watch Tower Society School and Jehovah's Witnesses [A
Escola e as Testemunhas de Jeová] tinha veiculado uma mensagem extrema
para os professores e administradores das escolas a respeito das coisas que
as crianças das Testemunhas não podiam fazer na escola. De facto, A Escola
e as Testemunhas de Jeová era praticamente insultuosa sobre muitos
programas escolares extracurriculares, e sobre estudantes não-Testemunhas,
que eram rotulados de 'associações impróprias'.13 Porém, talvez mais
significativo tenha sido o facto de pais não-Testemunhas e ex-Testemunhas
terem começado a usar a brochura em casos de tribunal envolvendo custódia
de crianças para provar que, se os seus filhos ficassem com os pais
Testemunhas, seriam privados de uma educação normal e de vidas
psicologicamente saudáveis.14 Assim, em 1995 a Watch Tower Society fez uma
brochura muito menos inflamatória, intitulada Jehovah's Witnesses and
Education [As Testemunhas de Jeová e a Educação]. Esta publicação, para
distribuição junto dos professores e administradores, concluía com a seguinte
declaração: 'As Testemunhas esforçam-se a encarar a vida de forma realística,
de modo que dão muita importância à educação. Por isso desejam colaborar o
máximo possível com os professores. As Testemunhas de Jeová, da sua parte,
no lar e nos seus lugares de adoração, em todo o mundo, continuarão a
incentivar os filhos a desempenharem o seu papel nesta colaboração
produtiva.'15
Durante anos a Watch Tower Society tinha proclamado que Cristo retornara
invisivelmente em 1914 e a geração que presenciara esse ano veria o 'fim
definitivo' do sistema de coisas. A seguir ao colapso de 1975, esta doutrina
começou a ser cada vez mais um embaraço. O livro The Gentile Times
Reconsidered [Os Tempos dos Gentios Reconsiderados], de Carl Olof
Jonsson, levantou sérias questões sobre a assim chamada cronologia bíblica,
da Sociedade, que é usada para apoiar a data 1914. A Sociedade
desconsiderou em grande medida esse trabalho, desassociando Jonsson e
ignorando os aspectos mais danosos trabalho dele numa área que é
demasiado complexa para a Testemunha de Jeová média compreender. No
entanto, à medida que os anos passavam e a geração de 1914 começou a
morrer, tornou-se óbvio que, se o Armagedom fosse adiado outra vez, tinha de
ser feita alguma coisa para evitar outra crise iminente nas datas estabelecidas
pelas Testemunhas. Consequentemente, a partir da edição de 15 de Fevereiro
de 1994 da revista The Watchtower [A Sentinela] a Sociedade começou a rever
a sua escatologia.
O que isto significa é que a Watch Tower Society, agindo pelo corpo
governante das Testemunhas de Jeová, criou uma situação através da qual
pode continuar a argumentar que Cristo veio invisivelmente em 1914 e que o
'fim definitivo' está muito próximo, mas a Sociedade pode dizer, com algum
equívoco, conforme se observa adiante, que já não prega nem sequer uma
data aproximada para os eventos apocalípticos da grande tribulação. Por isso
agora não é tão provável que as Testemunhas de Jeová sofram um
desapontamento se o velho sistema de coisas não for finalmente destruído
nem o milénio começar no ano 2000.
Uma mudança menos doutrinal mas importante na prática veio na edição de 1.º
de Maio de 1996 da The Watchtower [A Sentinela]. Durante décadas a
Sociedade tinha defendido que as Testemunhas de Jeová não devem realizar
serviço cívico alternativo em substituição do recrutamento para as forças
armadas de muitas nações onde esse recrutamento ainda existe. Em resultado
disso, muitos milhares de homens comuns das Testemunhas e algumas
mulheres sofreram encarceramento devido às suas crenças, em alguns casos
durante muitos anos. Por outro lado, quando algumas Testemunhas individuais
aceitaram designações de serviço cívico alternativo, foram tratadas como
espiritualmente fracas e foram-lhes negados muitos privilégios nas suas
congregações. Mas no artigo 'Paying Back Caesar's Things to Caesar'
[Pagamos a César as Coisas de César], The Watchtower [A Sentinela] de 1.º
de Maio de 1996 declarou que, se uma Testemunha de Jeová decidir realizar
serviço cívico nacional, isso é um assunto de 'consciência pessoal'. Disse
ainda: 'Essa é a sua decisão perante Jeová. Anciãos designados e outros
devem respeitar completamente a consciência do irmão e continuar a encará-lo
como um cristão de boa reputação.'23 [Tradução do inglês]
Seria errado assumir que todas as Testemunhas de Jeová têm esta atitude. De
cada vez que a Sociedade Torre de Vigia faz uma grande mudança doutrinal, e
às vezes até uma pequena mudança, perde muitos aderentes, entre os quais
estão frequentemente os mais inteligentes e por vezes as Testemunhas mais
activas. Está-se a tornar cada vez mais evidente para essas pessoas que
mesmo a escatologia milenar da Sociedade -- a força motriz por detrás do élan
e crescimento da comunidade -- está feita de modo a manter a organização
das Testemunhas sob o domínio do corpo governante. Conforme Ray Mattera
comentou em privado: 'As Testemunhas de Jeová têm pouca teologia,
cristologia e pneumatologia verdadeiramente sistemática. De facto, elas quase
não têm de todo um sistema doutrinal consistente, excepto num aspecto: elas
têm uma eclesiologia que enfatiza a lealdade à organização Torre de Vigia
sobre tudo o resto.' Portanto, quando a Sociedade anunciou a sua nova
doutrina sobre 'esta geração', em Novembro de 1995, muitos ministérios de ex-
Testemunhas dirigidos a Testemunhas de Jeová receberam muitas chamadas
telefónicas de publicadores comuns das Testemunhas, e até de muitos
anciãos, pedindo ajuda espiritual.25 Mais recentemente, tem havido algumas
saídas devido à mudança que foi feita a respeito do serviço cívico nacional.
Muitos indivíduos que foram forçados a ir para a prisão em vez de fazerem o
serviço cívico alternativo devido à legislação da Torre de Vigia interrogam-se
por que tiveram de sofrer o encarceramento se agora não há nada de mal com
esse serviço alternativo.
O artigo não diz ao leitor absolutamente nada quanto a qual tinha sido o
estatuto anterior, por que prevaleceu, ou como a mudança de estatuto surgiu.
Qualquer pessoa que lesse o artigo assumiria que a mudança do estatuto, com
os benefícios descritos, era algo que a organização sempre quis. Lendo o
artigo, suporíamos que era o governo do México ou as suas leis que até essa
altura tinham impedido as Testemunhas de orar nas reuniões ou de usar a
Bíblia na sua actividade de porta em porta. A revista nunca diz ao leitor que a
razão pela qual as Testemunhas mexicanas foram privadas destas coisas --
durante pelo menos meio século -- foi porque a sede da sua própria
organização escolheu que isso fosse desse modo, optou voluntariamente em
favor de outro estatuto. A revista não diz ao leitor que estas mudanças
'emocionantes' que trouxeram 'lágrimas de alegria' sempre tinham estado
disponíveis, durante muitas décadas, requerendo apenas uma decisão
organizacional de abandonar a sua pretensão de que a organização das
Testemunhas no México não era uma organização religiosa e sim 'cultural'. A
única razão porque as Testemunhas mexicanas não se tinham envolvido
nestas coisas antes era porque a organização da sede os instruiu a não o
fazer, para proteger o estatuto escolhido de organização 'cultural'. Estes são
factos conhecidos por aqueles em posições de responsabilidade na
organização mexicana das Testemunhas. Não são conhecidos pela vasta
maioria das Testemunhas no exterior desse país e a Watchtower [Sentinela] de
1.º de Janeiro de 1990 manteve-os na escuridão sobre este assunto.
Apresentou um imagem 'expurgada' da ocorrência, que era tão enganadora
como a prática anterior a 1989, de fingir que eram algo diferente de uma
organização religiosa, ao passo que sabiam muito bem que o eram.
Em primeiro lugar, está escrito num estilo que torna difícil reunir os vários
eventos cronologicamente ou no contexto. Certas ocorrências são discutidas
em sítios diferentes do livro em vez de o serem cronologicamente, e dessa
forma muitos factos embaraçosos são branqueados. Em segundo lugar, o livro
branqueia vários acontecimentos que a Sociedade ignorou durante muito
tempo até terem sido trazidos à luz em Apocalypse Delayed [Apocalipse
Adiado] e em outras publicações que não são da Torre de Vigia. Em terceiro
lugar, várias personagens e acontecimentos historicamente importantes são
completamente omitidos. Por exemplo, não há menção do ex-advogado da
Torre de Vigia, Olin Moyle, nem do seu bem sucedido processo judicial contra o
corpo de directores da Watch Tower Society of Pennsylvania e da Watchtower
Society of New York, por estes o terem difamado, apesar do facto de o caso
Moyle ter sido central para o estabelecimento das comissões de
desassociação, ou judiciais, da Torre de Vigia. É ainda mais curioso que
Raymond Franz nunca seja mencionado no livro quando é amplamente
conhecido que ele desempenhou um papel central no desenvolvimento do
actual corpo governante e foi membro desse grupo durante alguns anos.
Talvez não seja tão surpreendente que o livro Proclamadores nunca mencione
que dois membros do corpo governante -- Ewart Chitty e Leo Greenlees --
foram obrigados a sair desse concílio por práticas homossexuais continuadas
mas nunca foram desassociados.36 Em quarto lugar, o livro Proclamadores
repete várias falsidades flagrantes que se tornaram parte da mitologia da Torre
de Vigia. O livro argumenta, tal como fizeram muitas publicações da Torre de
Vigia no passado, que a razão pela qual o Juiz J. F. Rutherford despediu das
suas funções quatro directores da Watch Tower Society em 1917 foi por eles
se oporem à publicação do livro The Finished Mystery [O Mistério Consumado],
que ele tinha autorizado pessoalmente. De facto, isso é completamente
mentira, conforme é claramente mostrado pelas próprias declarações de
Rutherford feitas em tribunal, sob juramento, em 1918. 37 Igualmente mentirosa
é a declaração feita na página 78 do livro Proclamadores. É feito o comentário
de que depois de ter falhado a profecia da Sociedade que dizia que os
antepassados fiéis de Jesus seriam ressuscitados e o mundo acabaria em
1925, '... a vasta maioria dos Estudantes da Bíblia permaneceu fiel' à Torre de
Vigia.38 Ainda mais chocante, contudo, é o livro Proclamadores ainda ignorar o
facto de o segundo presidente da Sociedade ter tentado fazer o movimento das
Testemunhas cair nas boas graças de Adolf Hitler e dos Nazis em Junho de
1933.39
Ao longo dos anos, a Sociedade Torre de Vigia tinha conseguido fazer sair
muitas pessoas do movimento com pouco ou nenhum dano para si mesma. A
única grande excepção foi Olin Moyle. Depois de o seu caso contra os
directores da Sociedade ter terminado em 1944, os advogados da Torre de
Vigia conseguiram criar uma situação na qual era praticamente impossível
ganhar um processo judicial contra a Sociedade ou contra os seus funcionários
por difamação, desassociação imprópria, ou disciplina administrada a pessoas
consideradas dissidentes ou problemáticas. Quando a Sociedade e os seus
lugar-tenentes começaram a tomar acções duras contra várias pessoas hábeis
do meio das Testemunhas no fim da década de 1970 e início da década de
1980, desenvolveu-se uma situação inteiramente nova. Em vez de tentarem
obter reparação das ofensas primariamente através do sistema legal, muitos
destes indivíduos, a quem a Sociedade rotula de 'apóstatas', começaram a
levar os seus casos à imprensa pública e aos meios noticiosos. Vários deles
começaram a escrever e a publicar livros sobre as suas experiências e sobre
as práticas e doutrinas das Testemunhas de Jeová. Alguns formaram uma
variedade de ministérios direccionados a ajudar pessoas que deixavam o
movimento. Foram realizadas várias conferências e congressos de ex-
Testemunhas em toda a América do Norte e Europa, e noutras partes do
mundo. Alguns dos ministérios de ex-Testemunhas começaram a publicar
jornais [ou periódicos] e revistas. À medida que a Internet se tornou popular,
foram formados vários grupos de discussão, e vários sites da Internet foram
estabelecidos para avaliar criticamente cada aspecto das doutrinas e práticas
das Testemunhas de Jeová. Comentando estes factos, Ray Mattera diz: 'No
passado, os líderes das Testemunhas encorajavam a confrontação face-a-face
com oponentes. Porém, o devastador criticismo desencadeado contra a
Sociedade, especialmente desde 1980, não tem sido direccionado à sua
negação de doutrinas como a Trindade ou o inferno de fogo, em vez disso tem
sido direccionado ao coração do movimento: a sua eclesiologia. A história da
Torre de Vigia, de especulação com base em datas, alteração e mudança de
doutrinas, e a estratégia de ocultação de erros, tem sido exposta com o recurso
à própria literatura da Torre de Vigia. O efeito é minar a autoridade dos líderes
que, conforme argumentei, é o princípio central da religião das Testemunhas. O
criticismo é de tal ordem, que os líderes das Testemunhas não têm conseguido
responder adequadamente. Por essa razão, os representantes da Torre de
Vigia passaram a dizer que a Bíblia proíbe a leitura de matéria "apóstata", isto
é, anti-Testemunhas.'44
A Sociedade Torre de Vigia tem-se tornado histérica nos seus ataques aos
'apóstatas'. Na última versão do CD-ROM Watchtower Library, da Sociedade,
que inclui muitas das publicações do movimento desde 1950 até ao presente,
existem 575 referências a 'apóstatas', a maioria das quais se encontram em
publicações imprimidas depois de 1980. É perfeitamente evidente que os
líderes das Testemunhas têm um medo extremo do efeito que podem ter, e
estão de facto a ter, ex-membros críticos sobre a comunidade das
Testemunhas. Em resultado disso, a Sociedade fez tudo o que era possível
para isolar as Testemunhas de Jeová dos 'apóstatas'. Em vez de tentar refutar
as alegações que ex-Testemunhas fizeram contra as doutrinas e práticas da
Torre de Vigia, a Sociedade desencadeou uma campanha de ódio contra elas.
Sobre estes [pessoas que odeiam Jeová], o salmista disse: "Acaso não odeio
os que te odeiam intensamente, ó Jeová, e não tenho aversão aos que se
revoltam contra ti? Odeio-os com ódio consumado. Tornaram-se para mim
verdadeiros inimigos." (Salmo 139:21, 22) Foi por odiarem intensamente a
Jeová que Davi os encarava com repugnância. Os apóstatas estão incluídos
entre os que mostram seu ódio por Jeová por se revoltarem contra ele. A
apostasia é, na realidade, uma rebelião contra Jeová. Alguns apóstatas
professam conhecer e servir a Deus, mas rejeitam ensinos ou requisitos
delineados na Sua Palavra. Outros afirmam crer na Bíblia, mas rejeitam a
organização de Jeová e tentam ativamente obstaculizar a sua obra. Quando
eles deliberadamente escolhem tal maldade depois de conhecerem o que é
correto, quando o mal se torna tão entranhado que se torna parte inseparável
de sua constituição, o cristão precisa odiar (no sentido bíblico da palavra) os
que se agarraram inseparavelmente à maldade. Os cristãos verdadeiros
compartilham dos sentimentos de Jeová para com tais apóstatas; não são
curiosos a respeito das idéias dos apóstatas. Ao contrário, 'sentem aversão'
para com os que se fazem inimigos de Deus, mas deixam que Jeová execute a
vingança. -- Jó 13:16; Romanos 12:19; 2 João 9, 10.
Jesus disse: "Pelos seus frutos os reconhecereis." (Mateus 7:16) Então, quais
são os frutos dos apóstatas e das suas publicações? Há quatro coisas que
distinguem a sua propaganda. (1) Esperteza. Efésios 4:14 diz que eles usam
de "astúcia em maquinar o erro". (2) Inteligência arrogante. (3) Falta de amor.
(4) Diversas formas de desonestidade. Estes são justamente os mesmos
ingredientes do alimento existente na mesa dos demônios, todos destinados a
minar a fé do povo de Jeová.
Isto foi enfatizado na última Escola do Ministério do Reino para anciãos que foi
realizada há um ano... Foi ordenado aos anciãos que escrevessem isto no seu
livro 'Pay Attention' [Prestai Atenção]. Foi repetido duas vezes para se
certificarem de que toda a gente tinha compreendido palavra por palavra. Os
formulários S-77 e S-79 são os formulários que os anciãos usam para relatar
uma desassociação à Sociedade.
Seis expressões que não devem ser usadas nos formulários S-77 e S-79: (1)
Qualquer coisa que faça alusão a, ou mencione o nome de um dos advogados
da Sociedade, (2) qualquer menção do Departamento Legal [da Sociedade
Torre de Vigia], (3) quaisquer comentários que se refiram a uma orientação
recebida da Sociedade, (4) quaisquer comentários que mencionem alguém,
além da própria comissão, como possível influência sobre a decisão a que se
chegou, (5) qualquer comentário que sugira à alguém com olhos críticos que a
comissão não chegou sozinha a sua decisão, mas que, em vez disso, de
alguma forma cedeu a influência de alguém de fora, e (6) quaisquer
comentários que indiquem que os anciãos cuidaram erroneamente do caso ou
cometeram qualquer erro na investigação ou no processo da comissão
judicativa.'
Notas
5 Anuário de 1991, pp. 35-37. Veja também as páginas 102-103, 328 nota 20.
O U.S. News and World Report de 2 de Maio de 1996 relatou a recusa dos
apelos das Testemunhas de Singapura e observou que o juiz presidente Yong
Pung How 'criticou repetidamente os argumentos do advogado de defesa W.
Glen How, do Canadá.' U.S. News and World Report também declarou:
'Mostrando irritação crescente, Yong interrompeu How duas vezes com o
comentário: "Você está louco!" O juiz mais tarde perguntou ao canadiano:
"Você está medicamente bem, Sr. How? Você está a delirar."'
8WT, 1.º de Abril de 1994, pp. 16-17. É verdade que alguns dos desassociados
são readmitidos mais tarde.
12 Ibid.
15 Página 31.
23 Página 20.
27WT, 15 de Março de 1983, pp. 30-31. Deve notar-se que uma mudança em
relação à posição anterior da Sociedade sobre a porneia (fornicação) é que
mulheres casadas já não se podem divorciar dos seus esposos por se
envolverem em sexo oral ou anal com elas. Isto provavelmente explica porque
o assunto não tem sido tão importante como foi no passado.
31Comments from the Friends [Comentários dos Amigos] 9:3 (Verão de 1990),
pp. 3-4. [N. do T.: Suponho que deve haver aqui um engano na data da carta
de 21 de Fevereiro de 1990.]
32 22 de Fevereiro de 1990, p. 1.
33Comments from the Friends [Comentários dos Amigos] 9:3 (Verão de 1990),
p. 4.
36O Anuário das Testemunhas de Jeová de 1980 (p. 257) disse laconicamente
que 'No ano passado, Ewart C. Chitty deixou o cargo, de modo que atualmente
há 17 membros neste corpo' governante. Quando Leo Greenlees foi expulso do
cargo, não apareceu qualquer declaração nas publicações da Sociedade. O
nome de Greenlees simplesmente desapareceu das publicações da Torre de
Vigia depois de 1984. A única declaração da Torre de Vigia que pode ser
considerada uma alusão a homossexualidade da parte de membros do corpo
governante é um comentário breve que aparece na Watchtower [Sentinela] de
1.º de Janeiro de 1986 (p. 13) que diz: 'Embora seja chocante, mesmo alguns
que foram proeminentes na organização de Jeová sucumbiram a práticas
imorais, incluindo homossexualidade, troca de esposas e molestação de
crianças.' [Tradução do inglês] Ainda assim, os factos que rodeiam a expulsão
tanto de Chitty como de Greenlees são bem conhecidos entre anteriores
trabalhadores do Betel da sede da Watch Tower e entre muitos outros.
Greenlees contactou algumas ex-Testemunhas de Jeová pessoalmente depois
de ter sido exilado de Brooklyn.
41Para uma visão geral sobre as doutrinas da Watch Tower a respeito das
autoridades seculares, veja M. James Penton, 'Jehovah's Witnesses and the
Secular State: A Historical Analysis of Doctrine' [As Testemunhas de Jeová e o
Estado Secular: Uma Análise Histórica da Doutrina], Journal of Church and
State 21:1 (1979), pp. 55-72.
49 Páginas 479-488.
'Tal opinião só pode ser avançada por alguém que se equivoca completamente
quanto ao espírito e actividade da nossa Sociedade ou que, apesar de ter um
conhecimento melhor, distorce-o de forma malévola.
52 Página 103.
64 Ibid.
65Para uma discussão deste assunto, veja Ruth A. Tucker, 'From the Fringe to
the Fold', Christianity Today, 15 de Julho de 1996, pp. 26-32.
Igual a um homem que sonha que está a comer, mas acorda e a sua fome
continua; igual a um homem sedento que sonha que está a beber, mas acorda
abatido, com a sua sede por saciar. -- Isaías 29:8, New International Version.
A discussão anterior traz uma certa tristeza -- tristeza face a algo que prometia
tanto mas que ficou tão longe dessa promessa. O que aconteceu entre as
Testemunhas de Jeová lembra-me pensamentos expressos há algumas
décadas por um membro do parlamento Inglês.1 Explicando porque é que a sua
conclusão era que "a única categorização que realmente importa é aquela que
divide os homens entre os Servos do Espírito e os Prisioneiros da
Organização," ele demonstrou o modo como o espírito humano desenvolve
uma idéia e depois, com o objetivo de dar substância à idéia, é formada uma
organização. Quanto ao que acontece tão freqüentemente, ele observou:
Muitas vezes as pessoas ficam desiludidas pelo que acham ser hipocrisia entre
muitos líderes e membros das igrejas; estão confusas pelas numerosas
divisões denominacionais e pelo espírito sectário que contribui para essas
divisões. Estão preocupadas com o nacionalismo expresso, o registo de guerra
dentro da Cristandade, a história de opressão das minorias, e com o fato de
ação política ter sido freqüentemente necessária para estabelecer igualdade
racial dentro de comunidades "Cristãs."
O seu livro foi uma mudança refrescante em relação aos livros que atacam e
condenam as Testemunhas de Jeová, escritos por Testemunhas ressentidas.
Eu consigo compreender porque alguns estão ressentidos; eu própria combato
isso, tendo passado 20 anos na organização.
... Preciso desesperadamente de falar com alguém para ter apoio emocional
mas é tão difícil encontrar conselho equilibrado, não condenatório, de grupos
que parecem ter objetivos tão tendenciosos como as próprias Testemunhas....
Já tive uma mente fechada o tempo suficiente para durar muito tempo.
Estou sinceramente grato pelo fato de, como tem sido o caso de muitos outros,
ela me ter escrito esta carta principalmente porque sentiu que Crisis of
Conscience [Crise de Consciência] tinha um espírito diferente.
Digo a todos entre vós: não sejais presunçosos nem tenhais uma opinião muito
elevada de vós mesmos; mas fazei uma estimativa sóbria do vosso caminho
baseados na medida de fé que Deus deu a cada um de vós. -- Romanos 12:3,
New English Bible.
Muitos deles acreditam nisto, especialmente aqueles que, como era o meu
caso, nunca conheceram nada além da "Sociedade do Novo Mundo." Eles
passaram a ver tudo fora dessa sociedade, incluindo todas as outras
denominações religiosas, como largamente destituídas de genuínos princípios
morais e genuíno amor, ou pelo menos muito inferior aos padrões e níveis que
a sua própria organização diz que exemplifica. A frase seguinte, da Watchtower
de 15 de Março de 1986, página 20 [parágrafos 16 e 17], mostra até que ponto
eles vão neste assunto:
Os falsos profetas, pelos seus maus frutos, são expostos como tais. Mas Jesus
indicou que as árvores boas seriam identificadas pelos seus frutos excelentes.
(Mateus 7:15-20) E que frutos excelentes nós temos no paraíso espiritual!
Quase que em cada país há espantosos aumentos....
O Fruto da Fé
Pois fundação, ninguém pode lançar outra diferente daquela que já foi lançada,
isto é Jesus Cristo.... não existe nada acerca do qual nos devamos jactar
naquilo que é humano: Paulo, Apolo, Cefas, o mundo, a vida e a morte, o
presente e o futuro, todos são vossos servos; mas vós pertenceis a Cristo e
Cristo pertence a Deus.10
Quanto mais a fé de uma pessoa se centra num sistema humano, seja qual for
esse sistema, menos espiritual essa pessoa se torna. Existem homens muito
"religiosos" e que apesar disso são essencialmente não espirituais. Eles são
"homens da organização," não são homens de fé. As vidas deles podem estar
preenchidas com atividade que lhes traz a aprovação e apoio da organização,
e o poder que esse apoio permite. Se o apoio organizacional é retirado, a força
aparente que tinham desaparece.13 Não obstante o seu zelo por uma
organização religiosa e pelo crescimento desta, as suas vidas podem ainda
assim ser de fato "estéreis" naquelas coisas que trazem a aprovação de Deus
e a Sua força -- estéreis quanto aos frutos do Espírito em atos de amor, alegria,
paz, paciência, benignidade, bondade, fé, mansidão e autodomínio que sejam
espontâneos, internamente motivados, impelidos pela fé.14
Nada disto é dito num espírito condenatório nem com desprezo. Experiências
pessoais fizeram-me ver o efeito incapacitante que a fé numa organização
humana produz, o efeito enfraquecedor que a subserviência à autoridade
humana provoca, a facilidade com que a preocupação de não perder o favor
dessa autoridade se pode infiltrar no nosso pensamento. Não foi fácil libertar-
me desses efeitos. Estou contente por a coragem física não fornecer a força
que uma pessoa precisa. Existem pessoas que enfrentaram grande perigo às
mãos de opositores externos para serem leais à sua organização religiosa, até
mesmo arriscaram as suas vidas em território inimigo em benefício de
concrentes da religião.19 Mas essa coragem por si só não dá nenhuma proteção
garantida contra a covardia moral dentro dessa organização religiosa. Mais
importante, que significado ou mérito tem um homem que toma uma posição
intransigente num certo assunto, talvez até passando algum tempo num campo
de concentração por causa disso, e depois transige quando é confrontado com
um assunto paralelo dentro da sua religião? Que importância tem uma pessoa
recusar envolver-se em conduta que encara como uma idolatrização de um
Estado político, tendo fé nele e obedecendo-lhe cegamente, recusar-se a fazer
declarações que considera implicarem que a salvação está indissociavelmente
ligada a esse Estado, se essa pessoa depois se envolve em conduta que
reflete uma virtual idolatrização de um sistema religioso, tendo fé nele, e
dando-lhe uma obediência praticamente cega ao ponto de acreditar que a sua
salvação está inquestionavelmente ligada a esse sistema? Nem todas as
Testemunhas chegam a esse ponto. Mas um número incrivelmente grande fá-
lo, e a mensagem que recebem persistente e insistentemente condu-los nessa
direção.
Nenhum de nós tem motivo para se vangloriar na sua própria força ou na força
de um sistema humano.20 Era a fé em Deus, não a fé na organização nacional
de Israel ou em qualquer liderança humana, o que distinguia os homens
exemplares de tempos Bíblicos, cuja "fraqueza foi transformada em força." 21
Parece-me correto dizer que a grande maioria dos afiliados da Watch Tower
sabe como "mover-se junto com a multidão," mas acharia difícil funcionar
espiritualmente separados de um sistema humano. Separados dele, sentir-se-
iam sem rumo, desorientados, sem nenhum objetivo real e sem a força para
lutarem pela vida. Se eles tivessem uma fé não adulterada, centrada
unicamente em Deus em vez ser largamente centrada em homens, isso não
aconteceria.
Notas
4 Mateus 7:1-5.
5 Mateus 23:25-28.
9 1 Coríntios 13:13.
11 João 14:6.
12 Tradução NAB.
Bibliografia
M. James Penton
Obra de uma equipa de marido e mulher que foram criados como Testemunhas
de Jeová, The Orwellian World of Jehovah's Witnesses é uma crítica
devastadora ao totalitarismo da Watch Tower. Baseado em parte na
dissertação de doutoramento de Heather em antropologia na University of
Alberta, este livro útil e bem escrito está repleto de abundante informação
factual e ilustrações notáveis retiradas das publicações da Watch Tower. Se o
livro tem algum aspecto menos bom, é o facto de se focar de forma muito
artificial no ano 1984 como sendo outra suposta data apocalíptica da Watch
Tower. Não obstante, o seu tema principal está bem documentado e
fundamentado.
Ao contrário de Jehovah's Witnesses: The New World Society, este livro não foi
patrocinado pela Watch Tower Society e não teve uma grande circulação.
Porém, do ponto de vista do cientista social e do historiador, é um estudo muito
mais útil, pois apresenta uma imagem clara da natureza da sociedade das
Testemunhas na década de 1950. Enquanto crónica da forma como a
Testemunha comum via a vida na sua congregação, a sua fé, e o mundo,
Triumphant Kingdom é um trabalho importante, embora datado.
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King, Christine Elizabeth. The Nazi State and the New Religions: Five Case
Studies in Non-conformity [O Estado Nazi e as Novas Religiões: Conco
Casos de Estudo de Não-Conformidade]. Nova Iorque e Toronto: Edwin Mellon
Press, 1982.
No seu livro, King estuda cinco 'novas religiões' na Alemanha durante o período
Nazi: a Ciência Cristã, os Mórmons, os Adventistas do Sétimo Dia, a Nova
Igreja Apostólica e as Testemunhas de Jeová. Destes cinco, só as
Testemunhas de Jeová se opuseram aos nazis até à morte, enquanto os outros
movimentos geralmente tornaram-se mais pró-Nazis do que os próprios Nazis.
A coragem das Testemunhas ganhou a admiração de King, mas ela também
revela o facto de a liderança da Watch Tower ter tentado cair nas boas graças
de Hitler e do Estado Nazi em Junho de 1933. Só depois de os Nazis terem
rejeitado a sua tentativa é que o Juiz Rutherford exortou as Testemunhas a
ficarem firmes contra as exigências do Terceiro Reich.
Escrito como uma narrativa das relações das Testemunhas de Jeová com a
sociedade e governo canadianos, este livro não pretende ser uma história
completa da organização ou doutrina das Testemunhas. É, contudo, o primeiro
relato histórico geral sobre as Testemunhas de Jeová num país específico, e
também o primeiro baseado em grande medida em materiais disponíveis em
arquivos públicos. A sua qualidade deve ser determinada por outros.
Rogerson, Alan. Millions Now Living Will Never Die: A Study of Jehovah's
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Testemunhas de Jeová]. Londres: Constable, 1969.
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O Caso da Bíblia vs. A Bandeira]. Nova Iorque: Coward, McCann and
Geoghegan, 1973.
Este livro de White foi durante muito tempo a história mais completa das
Testemunhas de Jeová e a melhor em muitos sentidos. Um exame de A People
for His Name mostra que o seu autor fez uma espantosa quantidade de
pesquisa e tem uma compreensão rara tanto da história como das doutrinas
dos Estudantes da Bíblia e das Testemunhas de Jeová. Embora muitas
Testemunhas possam discordar de algumas das suas declarações, o que ele
diz não pode ser rejeitado sem hesitações. Ao mesmo tempo, os críticos
profissionais das Testemunhas de Jeová deviam notar que ele refuta muitos
argumentos tradicionais que são apresentados contra as Testemunhas e que
são baseados em pouco mais do que tagarelice e calúnias.
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Petições e Cartas
'A Petition to Bro. Rutherford and the Four Deposed Directors of the W.T.B. &
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Depostos da Sociedade T.V.B. & T.]. De 156 membros da Eclésia dos
Estudantes da Bíblia da Cidade de Nova Iorque, 1917
'An Open Letter to People of the Lord Throughout the World' [Uma Carta Aberta
para o Povo do Senhor em Todo o Mundo]. Da Eclésia dos Estudantes da
Bíblia da Cidade de Nova Iorque, sem data, mas publicada no Outono de 1917
Livros de Cânticos
Tratados
Fontes Dissidentes