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NTE Sfntese ISN 0037-6772 Cunsetho de Recayzo H.C. Lima Vaz ES fern, Hey = 2 A Enciclica Sverotirio de Redes HE Line Var “Rerum Novarum’”’ Gerento eS Jarge Leon Baad : inprassio Grafica Cervantes Editora Lids. f Rus 8. Joo Batista, 09 a 104 Botafogo - Rio de Jonsiro Adiministragio, Assin Correspondéncia Fovista “Sintese™ : Rua Bambina, 115 5 22251, Rio de Jancito, RJ, Brasil Fel. (624) 286-6522 Soe etelice “Rerum Novarum” é sem dtvide, o mais eblebre entre os documentos do chamacla magistério pontificio ordinéuia rec Gttimos Prezos pare 1981 Assineture ~ Brasil —— Cr 600,00 Exterior (vie aérea) — — US$ 20,00 j Nuraero avalso = Gr 200,00 BIN sua carta de prineipios, Toda a imensa literatura em torno do que $@ Gonvencionou chamar a “doutrina social” da lgreja reconhece na RN seu texto fundador e sua referéncia obrigatéria, Na verdade, essa blade dos ares fenseriebes ech ' grande enciclica, cujo nonagésimo aniversério comemoramos @ 15 de Gangs ie Petites desde que men (msio, pode reivinaicar uma importancia singuler @ moore Woe ce ee Aegistrado na DCOP/OPF, n? 1684 P. 208/73, reais gbroximagio a0 munde moderna e aos seus problemas qe arcu 0 primero decénio do pontiticado de Leo Xill. A liberdhde humana. @ sociedade, o Estado, a cultura e, finalmente, 0 trabalho; “Os artigos assinados so de response: “ria nem co eritério rs @ agin social dle! >, 0 de tori.ar-se objetive para si tcsmo e $9 reco- ec... Tancae auis erat, seipsam cognoscere mente” (3), Ads tando um conhecico versa de Virgilio, Hegel proclama: “Tao ener. me trabalho custou ao Espfrita o conhecer-se a si mesmo”, Se 0 tema da luta pelo reconhecimento ou da onosiggo do Senhor e de Escravo é tum veio que carre ao longo de:se trabathoso caminho, seu eflorar no solo do discurs3 hegelieno significe que a exiganeia Posta na histéria real por essa oposicda que o discurso dialética ecupera como figura de um dos seus momentos, somente serd atendida por uma socledade do universal reconhocimento ou do Consenso fundado numa razdo universal. Tal &, com efeito, 0 proje. to de sociedade politica que se desenha no horizonte da época his. ‘torica que assistit a tentativa hegoliana de “supressio” do mito do Senhor e do Escravo, tornando-0 momento do itinerdrio dialético Que conduz a Raz3e @ claridade do pleno eonhecimento de si mesma: 20 Saber absolute. A partir dai, desvelads a sua significa. $80 na histéria pensada, as figuras do Senhor e do Escvavo emigram do terreno do mito para o da ideologia - esse avatar do Saber absoluto -- onde s= mescaram com uma raotonalidade aparente para justificar sua continuidade ou 2 sua permanéncia numa historia real Impelida pela exigéncia do reconhecimento universal como Gnica efetivaco da sua razio ou do seu sentido. Na conclusdo tentarei mosirar brevemente as formas principais que a dialética do Senhor e do Escravo essume 2o longo da historia da cultura ocidental antes de inscraver-se no discurso hegeliano como momento de uma historia penszelz, que apenas revela (4) as exigén- cias da historia real que ¢ a nossa: a supressdo efetiva das relagdes de dominacdo e 2 instauraco da sociedade politica na sua esséncia Consensual como reino da liberdade realizada, Tscravo & desenvelvicla por Hegel no inicio da 28 parte (8) da Fenomenologia do Espirito de 1807, inti- tulada “A Conciéncia-de-si”, Esta segunda parte, por sua vez, com preende um Gnico capitulo (IV), que leva a titulo: “A Verdade da certeze de si mesmo". Depois de uma Vejamos, em primeiro lugar, como o momento da “conscién- cla-de-si” surge no intinerario dialético da Fenomenologia, Para tanto, importa compreender preliminarmente a significacdo dessa obra, por tan:os t/uslos arigiial e mesmo Gnice dentro do tradigéio Go escrito filksufica, © que assinaia em 1807 (o autor contava entéo 37 anos) » aparigdo de Hegel no primeiro plano ce cena filosifica ale’. Tondo publicado até entéio apenas artigas ou pequenos escii- tos mas tendo, por outro lado, amadurecide durante os anos do seu ensinarnento na Universidade de lena (1801-1806) as grandes linhas do :2u sistema no confronto com os grandes mesires do Idealismo alemfo, sobretudo Kant, Fichte e Schelling, Hegel pretende fazer da Fenamenotogie 0 pértico grandioso desse sisteina que so apresenta orguthosamente como Sistema da Ciéncia, No entanto, a erquitetura © & esoritura desse texto surpreendem, Nao é uma meditegdo no estilo cartesiano, nem uma construgio medida e rigorosa como a Critica do fiozi9 Pura, nem um tratedo didético com a Doutrine da Ciéacia de Fichte, Sendo tuclo isto, 6 sobretudo a descri¢do de um caminho que pods ser levada a cabo por quem chegou ao seu termo e é capar de rememorar os passos percorrides: 0 préprio filésofo na hora e no ugar da eseritura do texto filoséfico, Hegel no seu tempo historico e na lena de 1806. Esse caminho é um caminho de experiéncias @ o fio que as une € @ préprio discurso dialético que mostra a necessidade de se passar de ura estac&o a outra, até que o fim se alcance no desvela- mento total do sentido do eaminho ou ng recuperacéo dos seus pas sos na articulesiio de um saber que o funda ¢ justifica, Quem fala de experiéncia fala de sujeito e significaco, de sujeito ¢ objeto, A inten. 80 de Hegel na Fenomenologia ¢ articular com o fio de um discurso ientifico — ot cam a necessidade de uma légica — as figuras do su jelto ou da consciéncia que se desenham no horizonte do seu afronta- ‘mento com 0 mundo objetivo. “Ciéneia da experiéneia da conscién- cia”: esse foi o primeiro titulo escothide por Hegal para a sua obra Na verdade, esias figuras tem uma dupla face. Uma face histérica, Porque as expeiéncias aqui recolhidas so experiéncias de cultura, de uma cultura que se desenvolveu no tempo sob a injungao do pensar- se a sim mesme e de justificase ante o tribunal da Razdo. Uma face dietética, porque a sucesso das figuras da experiéncia ndo obedece 8 ordem cronolégica dos eventos mas & necessidade imposta ao discur- so de mostrar na sequéncia das experiéncias o desdobramento de uma fogica que deve conduzir a0 momento fundador da Ciéncia: 20 Sa. ber absoluto como adequagéo da carteza do sujeito com a verdade do objeto. No € fei] mostrar como se entrelagam Historica e Dielética no discurso da Fenamenalogia (5). Baste nos dizer aqui que o propo sito de Hegel deve ser entendide dentro da resposta original que a Fenomenologia pretende ser 3 grande aporia transmitida pela Critica da Razéo pura ao Idealismo aleméo, Esta aporia se formula como cisto entre a ciéncia do mundo como fendmeno, obra do Entendi- 10 i } mento, e ¢ conhech. “-9 de 2!~1yto ou ‘9 incondicionsdo — da coisi.omsi — que peiiwunec. como ideal da Razio. O absoluto s6 se apresents para Kant no dominio da Razio prética como postulado de uma liberdade transempirica, fora do aleance de ume ciéncia do mundo, Com a Fenomenclagia do Espirita Hegel pretende situar-se para além dos termos da aporia kantiane, designando-a coma momen- to abistrato de um processo histérico-dialético desencadeado pela pro ria situacéo de um sujeito que é fendmeno para si mesmo ou porte: dor de uma ciéncia que aparece a si mesma no proprio ato em que fez face ao aparecimento de umn objeto no horizonte do seu saber. Em outres palavras, Hegel intenta mostrar que é fundamentagéo absolute do saber é resultado de uma génese ou de ume historia cujas vicissi- tudes so assinaladas, no plano da aparicZo ou do fendmeno ao qual tem acesso o olhar do Filésofo (0 para-nds na terminologia hegelia- na) pels oposicdes sucessivas e dialeticamente articuladas entre 2 Serteza do sujeito e a verdade lo objeto. Anunciando a publicaczo do seu livro, Hegel diz: "Este volume expde o devir do saber (das wer- dende Wissen}. A Fenamenologia do Espirito deve substituir-se &s explicagdes psicolégicas ou &s discusses mais abstratas sobre 2 fun- damentagia do saber (6)". O sujeito eo fenameno kantianos s80 ri- gorosamente anhistéricos, Desde o ponto de vista de Hegel sf0, por- Tanto, abstratos, Na Fenomenologia,; Hegel quer mostrar que essa abstracio, na qual o mundo é 0 mundo sem histéria da mecanica newtoniana e é acolhido pelo sujeito 20 qual “aparece” nas formas acabadas das categorias do Entendimento, é apenas momento de um Proceso ou de uma génese que comeca com a “aparigao” do sujeito a si mesmo no simples “equi” e “agora” da certeza sensivel (primeiro capitulo da Fenomenologia), “apariedo" que mostra a dissolugo da verdade do abjeto na certeza com que o sujeito procura fixé-la. A partir daf, o movimento dialético da Fenamenologia prosseque como aprofundemento dessa situacdo hist6rico-dialética de um sujeito que € fendmeno para si mesmo no proprio ato em que constrsi o saber de um objeto que aparece no horizonte das suas experiéncias. Assim, Hegel iransfere para o préprio coracto do sujeito ~ para o seu sa. ber ~ a condieio de fendmeno que Kant cingira a esfera do objeto. Essa ¢ a originalidace da Fenomenolagia e € nessa perspectiva que ela Pode ser apresentada como proceso de “i ‘formagao" {cultura ou Bildung) do sujeito pare a ciéncia, E entende-se que a descri¢éo dase Processo deva referir-se necessariamente as experiénicias sign Ticativas daquela cultura que, segundo Hegel, fez da ciéneia ou da filosofia a forma rectrix ou a enteléquia da sus histéria: a cultura do Ocidente. il itinerario da Dois fios nos conduzem através do longo e diff " pomenvlogt. Um deles 6 2 linha des flouras que tees © proc=-o de form, flo €e sulaita para o saber, unins's disletice ate” se, rléneias da consciéncia que encontreis cxpressdes exernplares ne hie “orig de eullura ecidsntel. As figures delineiam portento, no deen volvimento ds Fenamenciogia, raievo de um tempo historico quo s2 ordenia segundo uma sucessde de paradigmas ¢ nfo seaunde acer, nologia einpitica dos eventos. Mas vimos como essa referéneia tiie, ‘6ria 6 ostencial para Hegel porque, sogundo ele, a Fenomenotogis somente paderia ter sido eserita no tempo histéries que era o cos c que assisira & revolugio kahtiana na filosofia e & revolucio frencase na politica, © segundo fio une entre si os momentos dema inane demenstin¢io ou exposieéo (7) da necessidade imposia & consoiéneis {8) de poreorrer a série des suas figuras — ow das experiéncias da sue “Formasio" ~ #46 atingir« altitude do Saher absoluto. Vale dizer que a ordem dos momentos descreve propriamente o movimento dialst co ou a I6giva ‘manente da Fenomenologia e fez com que 2 aparigas des figuras 80 3e reduza a uma taps6dia sam nexo mas s2 submate so rigor de urn dessnvolvimento necessério, Figuras e momentos tecem 9 trama des original discurso hegelieno, que pode ser considerad> a expresso da consciéncia histérica do fildsoto Hegel no momento ore gue a busca de uma funcamentacdo absoluta para 0 discurso filos, ico como suutoreconhecimento da RazSo instauradora de umn mundo histérieo ~ @ munda do Ocidente -- pode ser empreendida ndo como a delimitag#o das condigBes abstratas de possibilidade, tal como tentara Kant, mas como a remernoracio e recuperagio de um com? nha de cultiiza que desembceava nas terras do mundo pis-revolucia. hrio ond © £01 do Saber absolito ~ o imperativo tecricn e pratice «ie igualar w racional e o real ~ levantava-se implacavel no horisonte A Fenomentlogia apresente, pois, trés significagées fundamentals Uma signitiees#e propriamente filosdfica Getinida pela pergunta qué situa Hegel een face de Kant: 0 que significa para a consciéncia expe rinentar-se @ si mesme aeravés de sucesslvas formas do saber que tao assumides 1 julgades por essa forma suprema que chamamos eiénele ou filosofia? ume significaedo cultural definide pela interrogacto tue hhabita e imple © “espirito do tempo" na hora da refloxdia hegeliana: © que signific2, para o homem ocidental moderno, experimentar o seu destino ame tarefa de decifragdo do enigma de uma histeria que se empenha 74 futa pelo Sentido através da anarante som tanto doe conflitos, oy que vé florescer “a rosa da Razéo na cruz do presente?” {9}. Finaimor’, uma significando histérica, definida pela questo que assinala a originalidade do propésito hegeliano: o que significa pera 2 conscigncia # Recessidede de percorrer a historia da formagio do Seu mundo de culture camo caminho que dasigna os momentos & sex proprio formar-se para a Ciéncia? Teis serfo as significacoes qa iro entrecruzarse na dlialética do Senhor e do Escravo conteringe the 0 caréter paracignigtice que aqui queremos ressaltar. 3. 0 ponto de partida da Fenomenologia 6 dado pela forma meis elt Mentar que pode assumir © problema da insdequagsio da certeze sujeita cognoscente e da verdade do objeto conhecidlo, Esse proble ma surge da préaria situapgo do sujeito cognoscente enquant sujeito conscienie. Ou seja, surge do fato de que a certeza do sujei de possuir a verdade do objeto é, por sue vez, objeto de urna exper Encia na qual o sujeito aparece e si mesmo como instauraclor e porte dor da verdade do objeto, O lucar da verdade do objeto discurso. do sujeit que é também o hugar do automani do autoreconhever-se ~ da experiéncia, em suma—do proprio sujeite Néo besteré comparar a certeva “subjetiva’’ (em sentido vulgar) es verdade “objetiva” (igualmente em sentido vulgar), mas serd necss sitio submeter @ verdade do objeto a verdade origindria do sujet. ou & l6gica imanenie-do ‘sew discurso. Seré ‘nécessério, em oulra Balavras, conferir-lhe a objetividade superior do saber que ¢ ciéncia Essa, 6 8 estrutura dialética fundamental que iré desdobrar-se ea formas cade vez mais amples e complexas a0 longo da Fenomeno/s gia, medida em que a exposicgo que o sujeito faz a si mesmo de seu caminho para a cléncia incorpora — na rememoragdo histories @ na necessidade dialética — novas experineias, Trata-se, afinal, como diz Hegel na Mntroduefo (10), de aplicar ao sujeite que se experimenta no ato de saber alguma coisa a sua prépria medida (poit onde poderé buscar, sendo em si mesmo, uma madida que seja ner. ma constitutiva do seu saber?) e com ela medir, nas formas suiceseh vas de saber, a distancia que separa a certeza da verdade, até qu: essa distancia seja suprimida no saber em que a verdade da medica fevela @ sua plena adquagio 4 certoza da sujeita © & vardadle co ‘objeto: ii6 Seber absoluto. Os trés primeiros capitulos da Fenomenologia, que constituem a sua primeira parte (a), desenvolvem portanto esse esquema dialética a partir da sua forma mais elementar ou da situactio origindria do sujeita que conhece alguma coisa se experimenta na certezd da Posuir @ verdede do objetu conhecico ou, simplesmente, toma cons. ciéncia do seu saber. Tal situagio é definida pela presenca do sujeito No aqui € no agora do mundo exterior e o seber, nesse primeira Momento, no ¢ mais do que a simples indicapso'(11) do objeto nese agu/ © nesse agora, Esse primeiro saber ¢ denominado por a Hegel “eerteza sonsivel”. & © dominio onde se Move a consciéncia Mesae anienal (12), que pensa possui » verdade dle objeto @ do tema, (iieélo na sue aparigio no aqui e no agora do espaco £ do tempo do munde. A dissolupao da “eerters sensivel”, ou 0. Siinescer-se do “isto” pretensamente concreio eg experiéncia ime- Gista do mundo na “pereencdo” da “coisa” abtra (cep. 2), ou seja, tle objeto definido pela atribuiggo de rauitas Propriedades abstrata. mente univers i 3P cxattulo, a0 qual Hegel dé o titule “Forea @ Entendimento, a Tee citi: une® suprasensivel” @ que som ddvida, um dos ies dificeis da obra (13), retoma o problema Kantiano do Enten- cimenio (Verstand) e da constituigse ele Mundo como natureza au. rine cs leis, modelo ideal do sensivel, Aqui se ds 6 “invers&o" do {undo com relagzo a “coisa” da peroepedo ¢ ac 0" da certeza Plasde) 9 a mand® que Hegel denomina (numa reminiscancia de Platéo) 0 mundo “suprasensivel” 6 o ealyao roino das leis que regerm mde feeforoco das forcas (como na terveire let newtoniana do imotimanto) mas 2 sua verdade se rovela, finalmente, na imanéncia berisita da movimento em si mesmo, ov soja, na vide. A vida é a verdect: da natureza, e Hegel admite ums vineulagio muito mai come distinefio no saio do que 4 ia, vicla ~ desenha, desta s clescreve assim: "A consciénci: | da coisa é possivel unicamante tid) ee cee mas ainda que somente esta éa wecinne Saye (14). So @ primeira parte da Fonomonclont foc titulo ual a eanecscieta” 6 que ala designa o movimento diag eee a UrhULhLr———————CC ET sus “ . Usrgadle. Hegel, em sma, track in nevossitade dialética a necessie dade analiiica com «..: Kant urisica &, eategorias do Entendinenss oe cuigade ‘tanscendental da epercepedo, na Eu pensa, Nas figures Conscifncia a verdadc, enquanto distinta da certeza &, para a cone, Giensie, um outro, uma vez que é verdade de um mundo exterior seo Gunks do Dassou pare a verdade origindria e iundadora da propia Reng ieneia. “Com 9 consciéncia-desi, diz: Hegel, entramos pele no fing native da verdade (76)”. Trata-se, entéo, de acomparhar o auraimento das figures que irda marcar o itinerdrfo dialétioe ds coms, cléncia-de-si, Mas a originalidede do procedimenta hegeliano ca cont (ez2 Propria do caminha tenomenolégico tomam-se patontes nog Tieneegti® ltée compor a primeira figura da consciéncia-de-si ¢ na iregdo de seu movimento dialético. Gom efeito, « primeira figura da conseiéncia desi nfo 2 identidade Srzis do Eu penso ou a “imével tautologia” (16) do EusEu que, de Descartes @ Fichte, a filosofia moderna colocara no-centro’de sce TRaIge sopernicano da razio. Na verdade, a consciéneladeet & reflexo @ partir do ser do mundo sensivel 2 do munce de pereepetio que faz face a consciéncia, © sim como o ser que, para a consoltraie, esi, é marcado com 0 “cardter do negativo" (17) © cujo cma cee Ser cuPrimido para que se constitua a identidade concreta da cane cléncia consigo mesma, Para @ consciéneia que retorna a si pela supressio do seu objeto ou Delo evanescéncia do ser do abjeto na certeza da verdade que é agers se ercade de propria consciéncia, o cbjeto assume as caracteristioas cla vide ¢ @ Figure da consciéncia-de-si é o deseja. Para caracteriar objeto da consciéncia-de-si que perdeu a subsisténcia imedists vee coisas que compéem 0 mundo exterior, Hegel recorre ao concelta Gf id? tl como se constituira na tradiglo de pensamento que vei ce Espinoza = Schelling passando pelo Homantisma. A vida é sul D furro fluir ou a infinidade que suprime todas as difereneas e, no Heanor ¢ subsisténcia que descansa nessa absoluta inquietacdo, Nese sentido a vida aparece como objeto da consciéncia des! "ay como seu oposto (18) — na medida em que é para ela como seu Primeiro esnoco na exterioridade do mundo. A verdade do mundo 15 Bassou para 2 consciénciadesi ¢ ela caminha pera comprover essa Sue Verdade Tazen-lo no confronto com a vida a experiéncls de va Jace. Eis porque a consciénciadesi assume a figura do dessjo quie s@ cumpre na sua propria satisiacdo, ou que ¢ atividade esserotcl mente negecdora da independéncie do seu objeto. Mes @ preciso aio ebsourecer a dielética do desejo com interpretaySes alheias a0 propésito hegeliano {19}. G caminho deccrito pele Fens. aienologia acompenha os passos da formago do individwo para ¢ Gigneia Ou, s9 quisermos, do homem ociciental paraa Filosoia A essa altura do itinerério o resultado essencial surge 20 termo de novimento clielético que mostra @ consciéncia-de-si como verdade de consciéncia de mundo exterior. Trata-se, pois, de explicitar num ovo ciclo d= “igures © contetide desse resultaclo rigneia que a Glesejo surge ecmo primeira figura que @ consciéncia-de-s! assume to Ske covteza de ser a verdade do mundo. Com efeito, no desejo o arn sf So Obleto é negado pela sstisfagio © & esse movimento de negayso cue Gere. pare a consoiéncia a sua conversio a si mesme e tres o primeira figura da sua dranscandéneie sobre o objeto, Para Hegel rimelro passo que a consciéncia dé em diego & sua verdade cero Gonsciéncla-de dev ids snimel Passe para ¢ verdade do mundo nurmano, ou a vs Jade Ja natures Passe para a verdad da histéria. Nos termos de Hegel equivale dizer Que a consciéncia-de-si alcanga a sua satistagiio sommente numa outta consciéneia-dessi (22)". Num texto ve exemplar clareza didatica, Heyel desereve a cons- tituieio do coneeito de consciéncia-ce-si: “Somente nesses trés Momentos vem a completar-se © conceito de conscisncia-desi: 2) © Eu puro indiferenciada & seu primeiro objeto imedizto b) Es 1a imediatidade @ porém, ela mesma, obsoluta mediacdo, & ape. mas como supresséio clo objeto independiente, ou é dascjo. A sa- tisfagio do dessjo & veradeiramente & reflexo da consciéncia-cle-s] Mm si mesma ou a certeza tornada verdade. c) Mas a verdade dessa certeza 4, na realidade, uma dupla reflexdo, 2 duplicagio da conseién. Gla-desi, A consciéncia tem um objeto que anula em si mesmo o seu: ser-outra ou a diferenca e 6, assim, independente. A figura distinte que & apenas vivente suprime também no precesso da vida a sua inde, endéncie mas, juntamente corn a sua diferenge deixa de ser 0 aiue 6; mas 9 objeto da consciéncia-de-si é igualmente independente nesta Negatividade de si mesmo; e, portanto, ele 6 para si mesmo um s@nero (Gatiung), ¢ a fluidez universal na propriedade da sua part cularizecdo; ele & uma vivente consciénciade-si (23)". O objeto da Pulso vital € consumido na satisfacao ou -desaparece no fluxo da vida, @ no € capaz de permanecer em face do sujeito e exercer nessa Permanéncia @ funedo mediadora que faz passar o sujeito da identi. dade abstrata do Eu puro para @ identidade concreta do Eu que so PSe a si mesmo na diferenca co seu objeto. O sujeito humano se constitui téo somente no horizonte do mundo human e a dialética co deseja deve encontrar sua verdade na dialética do ceconhecimen- to. Aqui a consciéncia faz vardadeiramente a sua experiéncia come Consciéneiade-si porque o objeto que é mediador para o seu reco nhecerse @ si mesma ndo € 0 objeto indiferente do mundo mas ela mesma no seu ser-outro: é outra consciéncia-de-si (24), 4. Com a passagem da dialética do desejo para a dialética do reconhe- cimento 0 movimento da Fenomenalogia encontra cefinitivamente 2 direpdo do roteiro que Hegel trecard para essa sucesso de experién- clas que devem assinalar os psssos do homem ocivenital ng sou cami Hho hist6rico @ dialético para curmprir a injungio de pensar o seu tempo na hora pés-revolucionéria, ou para justificar o destino da sua civilizagao como civilizacdo da Razio, Cora efeito, o que aparece agora no horizonte do caminho para a ciéncia so as estruturas da ” é 0 pri infersubjerfticiade ou € 0 i ingedo a ecsertencan meh da Fenomenclogia. O camii ficapfo des iniciativas ievde-si, felta objeto 165 0 canesito da Espitito 6 a pedra an it-nes de que, com o desdobramento da conscidn, Feta si mesma, “o que jé astd presents aqui para 25)", Como ¢ sabido, o conceito de ‘gular do edificio do sistema hegeliano, a menos serra MO8 COMParé-lo cam sua fet ve consiruggo ou sua forma eatrutural. Na Fenomenotogia riencies da eonsciéncia a sity Se tule SextO, que refare as exes inioes Histrlcas efstivas, é denomit, por Hegel 0 Espirito”. No 1 Theet© em que @ conscitneia.de-si re fica a ser percorrido pela cones cia Sue € © Espitito, essa substincia ae ne independéncia da sua opo, as-dessi que so para-si, 6a unidede ue é Eu (28)”, Portanto, na sien, qnomento ca consciéncia-de-si 6 crane Hegel na continuagdo do “Ponta de intlexio”. 0 roteins sue ficou para Jonata 8 direcio do mundo dos objetos, percorria a ‘Sforida do aquém sansivel" ours: dominio da certeza “A Sielética. do reconhecimanto 6 cuidado, e essas paginas Feramenologia (28). Como oe termos da relagio da Sesenlace-ou na supe ra ‘More’ convém tefleti dialética 1080 da ri enhorio & a Servidio nao slo serio cc Go reconhecimento no seu primeics ren adico representada pela “lute de Hojatimente sobre 0 implicito qee subjaz 20 texto hegelieno e se explicita no tema do reconhecimento e na face Sramética. ‘da ‘sua sugereim as “intense de Hegel nao: i isa aa ce tera" como estadio de indivfduos, que deve cessar cor Ge eats S0cial © a con: i Uig! say eeledade civil, atende 2 um tip ‘ia origem da sociedade caractenie Consciéncia do objeto, OU 8888 historicizacio. “Ponto de inflexdo” caminho do homem, cle uma sociedade do saber cientitica, nhecimento como cexisténcia universal, ou da existéncia regida pela Rezo. Eis porque ‘© teria do reconhecimento dove inauqurar o ciclo de cansciéneiace-si ou do sujeito ne roteire da Fenomenologia, E necessério, com efeito, que 0 individue que se forma para a exisiéncia historice segundo 4 Razo — ou que se forma para a ciéncia — passe pelos estégios que assinalam a emergéncia da reflextio sobre a vida imediata, ou da reciprocidade do recanhecimento sobre a pulso do ciesejo. Somonte essa emergénefa torneré possivel a existéncia co individuo como exis ‘téncis segundo forma de universalidade do consenso recional ou, propriamente, existéncie politica. Essa é a forma de existéncia historica que filésofo deve justiffcar e cuja justificecto ele iré bus- car exatamente na necessidade, a um tempo dialétice e historiea, ue concluz a sueessia de experiéncias descritas pela Fenomenologia. O pritneiro momento da dialética do reconhesimento & denominado por Hegel ““o concsito puro do reconhecer’* (30) e exprime a identi- dade abstrata de consciéncia-de-si ou, simplesmente, a sua “duplice. ‘G0 ou 0 seu situar-se em face de outra consciéncia-de-si, Essa situa- 20 inicial trechue uma igualdade dle conseiéneta-de-si consigo mesma, jam a ser, fia sua relasfo com outta consciéniade-si, que se articula como movimento de uma mediacdo recfproca: 0 agir de cada um dos sujeitos tem a dupla significacéo de ser o agir dele mesmo e do outro. As consciéncias-desi “reconhecemse e si mesmas enquanto reconhe. cendose mutuamente” (31), No entanto, essa igualdade representa, do ponto de vista do movimento dialético, a mediagio que ainda nao se realizou concretamente, ou seja, uma igualdade imediata e, como ‘al, abstrata, Nela, cada termo é um simples ser-para-si na sua imedia- tidade singular , portanto, cada um aparece para © outro como um objeto ou © que esté simplesmente diante ~ marcado com o caréter do negativo {32}: 0 outro no se prova ainda como essenciel para que cada um se constitua como efetiva e concreta consciéncia-de-si, Hé Pols, egora, ume desigua/daca (33) entre os clois termos da ralac3o do Feconhecimento e esta desigualdade assinala a distancia que separa — historica e dialeticamente — 0 individu que é consciénciade-si mas sinda esté merguthado.na imediatez da vida (24) ¢ 0 individuo que se universalizaré pela forma mais alta do reconhecimento que é 0 ‘consenso racionel na sociedadle polftica.. Como percorrer essa distén- Gia e quais os pastos que iréo suprimir dialéticamente essa desigualda- de? Que eventos ou situagées exemplares na historia da cultura oci- dental se uferecem 2s regras de interpretagdo definidas pelo diseurso dialético, @ podem ser designados como estagdes do caminho que conduz ao saber demonstrativo da necessidade histérico-dialética do reconhecimento universal: 0 Saber absoluto? Essas as interrogagtes 20 ‘que comecam @ ser respondicias com a figura da “uta de vide ou de morte” e cam a dielética do Ssnhorio e da Servidéo. A “uta de vida ou de morte” na quel vemos empenhadas 2s conscién- ciasde-si, tem por fim elevar 8 verdade a certeza de que elas sf0 para si mesmas ou afirmar sua transondia sobre a imediatez da vida mos- irando-as, com o risco de vida, como fiberdade em face da propria vide. Nesse primeiro momento, no entanto, a desigualdade nfo pode ser suprimida pela morte de algum dos contendores que eliminaria qualquer possibilidade de fazer avancar a relacdo do recanhecimento, Terfamos, um diante do outro, o cadaver do vencido e o vencedor com sua inétil vitéria. Seria uma negacéo também absirata da iaual- dade abstrate inicial, e nfo uma negaego da consciéncia “que de tal modo suprime que mantém e conserva o que ¢ suprimido e, assim, sobrevive ao seu proprio ser-suprimido (35)". A instauragdo de uma igualcade conereta — de um reconhecimento efetivo — deverd seguir um caminho infinitamente mais longo, Com efeito, 0 tinico desen- lace da luta que guarda uma significendo para o problema do reconhe- cimento, mostra quo as corsciénciasde-si ultrapassam a figura ime- Giata da vide, mas de maneira ainda desigual: num dos termos da re- lego temos a consciéncia-ce-si como liberdade que se empenhou a fundo no risco da propria vida e surgiu vencedora da luta; noutra a consciéncia para @ qual a vida foi conservada'na forma da coisidade como graca de um outro disnte do qual recuou no risco total. Uma & a consciéncie-de-si na sua indepenciéneia, outra na sua depandéncia uma o Senhor, outra 0 Escravo (36). \Vé-se, por conseguinte, que a relacéio do Senhorio ¢ da Servicio é, Para Hegel, um primeiro esbogo de relaco propriamente humana, uma relagéo efetiva de reconhecimento que rompe a igualdade abstrata da consciéncia consigo mesma que surgira do movimento dialético que opés a consciéncia a um objeto exterior. O mundo exterior esté agora entre as duas consciéncias-de-st ou situa-se na distancia que separa @ consciéncia-de-si de si mesma na sua “dupli- cago”. A consciéncia-de-si afirmou a sua transcendéncia sobre o mundo no risco da “luta de vida ou de morte” e se constituiu: no ser-para-si da liberdade em face da vida imediata, objeto do dessjo, ‘Mas, essa transcendéncia se estabelece de modo desigual nos dois termos da relaviiv que surglu ap0s a luta. O Senhor é a consciéncia ue pararsi ou ¢ livre pela mediagZo de uma outra consciéncia que Fenuncia @ esse ser-para-si e transfere a sus independéncie para.um ser de coisa, para a cadeia que a prende ao Senhor. O Escravo, no outro termo da relagio 6, assim, @ con: a encadeada eo ser da coisa, mas nfo mais n= “lage clo ‘esejo que ide & satisfagio imedisia mes stile tipo ci sela,.o lumanizan. te da coisa por meio da qual ela é oferecida a livre satisfacto dio Senhor: na relacdo do trabalho (37), A relaco do Senhorio e da Servidio como desenlace da “luta de vida ou de morte” apresenta, desta sorta, a estrutura tipica de um silogls mo dialético que se caracteriza pelo intercimbio sucessivo da posicso dios extramos ¢ do meia-termo. O Senhor, o Escravo ¢ o mundo: els (95 trés termos que se entrelagam no jogo de mediagdes caracteristices dessa experiénzia fundamental, O Escravo e a coisa exercemn respect vamente a funeio mediadora que permite & consciéncia-de-si do Se. tihor afiemat-se na independéncia reconhecida do seu ser-parasi, A unilateralidade do reconhecimento reside aqui no fato de que 0 Se. nhor nfo reconhece 0 Escravo como outra consciéncia-de si mas como mediaclor de sua aco sobre 0 mundo, Ao Escravo cabo o tre batho exercido sobre a coisa, a0 Senhor a frui¢zo da coisa trabathada Gue passa elém da simples satisfaco animal do desejo. Enquanto tmediacors, @ consciéncia servi! passa a ser a verdade da conssencla independente (38) A articulaedo dos silogismos ou da dialética do Senhorio e da Servi fe do ponto de vista do Escravo iré reabrir © caminho pera o reco. nhecimento efetivo e recfproco que se mostra invidvel a partir da consciéneia ociasa do Senhor. Hegel dd as formas de mediagio que uinem disleticemente a consciéncia servil ao Senhor e ao mundo a denomingeiio geral de “ago de former-se" (das Formieren} ou cul. tura. O mundo trabalhado é, com efeito, mediador para o Escravo na sua relaco com o Senhor mas aqui trabalho, sob a forma social do servico, iré formar a consciéncia servil, pela retneio do desejo, para uma rela¢do verdadeiramente humana com o mundo, Iré, pois fazé-la retornar a si mesma como consciéncia-de-si. Tendo experimantado a temor eo tremor diante do Senhor absolute — ¢ Morte ~ e conservado, assim, o seu ser, a consciéncia servil entra ago. ‘a para a escola da sabedoria, "O temor do Senhor é 9 inicio da sabe doria’’ (Prow., 1.7), lembra Hegel, e através do trabalho e do servico a consciéneia servil se formaré para o reconhecimento pela mediacso go mundo humanizado pelo seu agir laborioso. Por sua vez, o Senhor E.matiador, através da disciplina e do sorvigo, para a relecin onto Escrevo € ¢ coisa; relacdo ativa de trabalho que confere & coisa traba- Inada a sua consisténcia como produto e leva a consciéncia trabalha. clora 8 intui¢o do seu préprio ser como independente, Confere lhe, €m suma, uma significago negativa com relaciio ao primeiro mo. mento do temor (39). 0 temor diente ca mete, a disciplina do servi 0 em face do Senhor @ a atividacle laboriosaxxercida sobre o mundo si, assim, para a conseiéncia servil o camaho da negasio soja do sereconhecicio unilateral do Senhor que #m agora 0 seu efetive ser-para-si num outro, seja do seu préprio wo-reconhecimento que & suprimido pele cultura, Este faz pessar osimples ser do Escravo {conservado no temor da morte € no serigo do Senhor) para o ser-pare-si independente que se constitui ped agir transformador do mundo (40). A dielética do Senhorio e da Servicio faz, dsta sorte, surgir a figura a liberdace da consciéncia-de-si como verade da certeza que ela tem de si mesma: uma verdade que passa desujeito ao mundo pela atividade da cultura. O que se alcanca poranto nessa dialética é a necessidade de se unir a liberdacle ou indepadéncia da consciéneia- -de-si que faz sua apariogo na figura do Senlar, e 0 processo da cul. tura ou formago do mundo humano como derenciacdo ou enrique. cimento da mesma consciéncia-de-si, que sedescobre na figura do Escravo. Para Hegel, Senhor e Escravo nao Zo personagens de uma espécie de situacdo arquetipal cla qual procebria a historia, Sao ape- nnas figuras de uma parabola com as quais degel pretende designar momentos dialéticas entrelecados rigorosazente no discurso que expe a formacio do individuo para o sabe. Esse saber deve apre- sentar-se como Tundamento para a exigénciatistérica de uma soci dade do reconhecimento universal. Por suavez, tal exigéncla est inscrita na propria historia da cultura ocidatal desde a sua aurora grega, quando fez do fogos ou da filosofia owia da sua alma, 0 set! paychagagés nos caminhos do tempo, 5. Parébola filoséfica (41) ou evocaeio, na‘orma de uma historia exemplar, do percurso dialético que vai da inadiata adesdo & vida do indivicluo submetido @ pulséo do desejo, a erdade do individuo que se universaliza pela reciprocidade do ansenso racional: eis a significag3o da figura do Senhorio e da Sevidao na estrutura da Fenomenoiogia. A partir da, 0 longo carina para o saber pros- segue com 0 momento da liberdade como qwra universalidade do Pensamento figuracia no Estoicismo antigo e we ird igualar abstrata- mente, nese espaco do /ogos universal, o Senlar ¢ o Servo, o Impera. dor @ 0 Escravo, Marco Auiélia @ Epiteta Senhorio @ Servidio ‘tecem, portanto, uma relagio que é interie ao individuo que se forma pare 0 Saber absoluto ~ ou para a fisofia — e, como tal, se faz presente no discurso do filésofo qu: rememora os pasos dessa formacdo (421. Nessa presenca, no enanto, emerge & super. a ficie de texto hogaliano 0 fio de uma cxperiéncia fundadora da isi-vit do Ocidente e que comega a se articular quando a busca da Uuniversalicide do /agos der, de slguma mansira, a palavra ao Escravo, rompendo assim 2 uniletaralidade d2 dominegéo do Senhor que so istalizara historicamente no despotisn:a oriental (43). E verdade que um longo caminho se estends entre a exigincia de recanhecimente universal que habita o fogas e a sua aparielio no pla- no social ¢ politico com a proclamacio da ilegitimidade juridica e da aborrago moral da escraviddo. O homem livre, o elatitheros na tradigfo grega, $ aquele que tem direito & palavra na assemblzia dos cidados. Mas @ polis abriga em sau seia o mudo trabalho co escra- vo, iguetado 8 condicéo do animal enire os bens do ofkes, da socie- dade doméstics.. Na esfera do politico a relagdo do reconhecimenta se efetiva historicamente. ne liberdade de palavra do cidadéo, Na esfera do trabalho a relapdo Senhor-Escravo permanece na estensio do servigo do aikas ao inteiro dominio da produgao dos bens, contia- daa condigdo servil Plato interioriza’a relago Senhor-Escravo quando mostra o corpo igetlo a5 cadeies do conhecimento umbratil que retem os prisionei- 108 no fundo da Caverna. © Senhor € aqui a alma intelectual, 0 nods, que se liberta pela diffeil subids para 2 contemplagaio lumi hosa de Idéia, Hegel recorda como o Estoicismo, no momento em que declina a liberdade politica @ se estandem a servidio e o temor nos impérios helenisticos (44), universaliza no /agos 2 figura da liberdade interior ¢ do senhorio ideal sobre a servidéo de corpo, liberdade na qual se encontram 0 Imperador € 0 Escravo. Entre @ mundo antigo ¢ ¢ mundo moderne tam lugar o aparecimento de um novo principio que, segundo Hegel (45), faré girar nos seus gonzos a historia do mundo: 0 antincio, pela pregacdo cristd, da Encarnerdo de Deus na historia. Aqui, uma inversio radical confere um sentido tamdém radicalmente novo a relagdio Senhor-Escravo, O Cristo, diz Sao Paulo, “sendo de condico divina, ndo reteve como uma conquista ser igual a Deus mas se reduziu a nada, tomendo a forma de escravo, feito & semelhanea dos homens e sendo encontra- do come um homem qualquer...”” (Fil. 2,6-7). Essa passagem do extremo do Senhorio para o extremo da Servidao sob o signo da liberdade divina instaura um novo espaco de reconhecimento para além do consenso racional na sociedatle politica. Um novo caminho de liberdade sevabre na histaria. Com efeito, Paulo proclama: “néo hé Judeu nem Grego, nem escravo nem homem livre, nem homem . + aii a oko : i + wae nem mulher: todos sois um no Cristo Jesus Gal., 3,28)", A supe- racZo da oposiczio do Senhor e do Escravo naetem lugar aqui pelo onge e laboriozo caminho da cultura da conseincia. Ela se cumpre ela fulgurante irrupg30 da agépe divina no coseo de uma histéria ditecerada pela divisio mais profunda (Efés. 214-18). A filosofia hegeliana terd diante de si como seu problema téez o mais profundo ¢ 0 seu risco talvez o mais grave, compreenderzo conceito o tempo de uma historia na qual se cruzam o trabathas caminhar do logos humano e © antincio do Logos divino feito carm:a Rlazio e a Graca, Helenismo e Cristianismo, Os tempos modernos pre-hegelianos assistem @:ransposicdo da rela so Senhor-Escravo para a esfera politica, no mamento em que tem Inicio 0 provesso de universalizagaio do trabaltzlivie'no capitalismo rnescente. Maquiavel e Hobbes traduzem com rier implacivel a nova figura da relagdo Senhor-Escravo nos comecos cesociedade moderne. Em Hobbes 0 pacto social pée fim ao “estado cénatureza’e a situa- Go da “lute de morte” mas surge, em seu iugr, o Estado-Leviatd camo novo Senhor ao qual todos devem entregr-se como escravos, a fim de que cada um tenha assegurado 0 reanhecimento da sua irvisoria liberdade, A originalidade de Hegel consiste em pensar o poblema do reconhe- cimento ou do edvento historico de uma saciedde fundada scbre 0 livre consenso ~ na qual tenha lugar a efetivasupresséo da relagdo Senhor-Escravo — como um problema cujos tamos se articulam e se explicitam ao longo ce todo o desenvolvinento historico da sociedade ocidental. Para Hegel, 0 método hipotético-dedutivo utilizado por Hobbes e pelos te6ricos do Direits Natural modemno é inadequado para capter toda a complexidad desse problema e, sobretudo, o seu desdabramento historico, A hitbria das sociedades ocidentais teve 0 seu comeco assinalaco pelo avento do logos da signcia, que rompe 2 unidade do ethos tradicional na cidade greaa. problema do reconhecimento se delineis, a patir de onto, como problema da instituico de formas histéricas dconsenso racional e, Portanto, livre, A revolucdo cristd da subjetivictde abre uma dimen- sio infinitamente mais profunda da liberdadge é ela que deverd compor-se com a razdo politica herdada da Gecia e de Rome, nos ensaios de sociedade que acompanham a histbriado Ocidente cristo. E esse 0 horizonte da reflexéo hegeliana, Nela,s tema do reconheci- mento apresenta-nos dues faces: a face fenanenoldgica e a face sistemética. A primeira, para_a qual nos voltmos nestas paginas, descreve o processo de formacdo historico-dialétia do individuo para 25 tomai-se sujeito de um Saber capaz de fundar o rec:~eciment Universal, A segunda, que encontia sua oxpiesséo meis wcaba.la na Filosofi ao Direito de 1820, perte desse Saber para desdobrar, na hecessidade imanents do concsiie, © contedde da vida segundo fazdo ou da liberdade realizada que Hegel denomina “Direlto” Ela tem suz forma mais alta ne existéncia politica como esfera do consenso plenamente racional e que € objeto da teoria do Estado, A partir da necessidade demonstreda — que se opée & cega necesst, dade do desejo — do sentido da Histéria como busca da eomunide Ge do livre consenso, a propria Histéria pode ser pensada como “progresso na consciéncia da liberdada (46)”. Vemos, assim, que a escritura do texto hegeliano, na pagina eélebre da Fenomenotogia que descreve a dialética do Senhorio e da Servi dio, repousa sobre um implicito néo-escrito que, para voltar 8 com. Paracdo inicial, pode ser designado como 0 veio que corre ao longo Ge toda a histéria do Ocidenta @ que aponta para a diresdo de um horizonte sempre perseguido, e no qual o seu destino s¢ 18 como Utopia de suprema grandeza ¢ do risco mais extremo: a instauracso de uma sociedade onde toda forma de dominac&o ceda lugar 20 livre reconhecimento de cada um, no consenso em torn de uma Raziio que é de todos. - ¥ F sent Q ? NOTAS * Texto reeserito ‘de uma palestra no Curso @ Extensio sobre “A Filosofia néo-escrita” promovido pelo Depetamento de Filo: sofia da FAFICH-UFMG © Sociedade Amigas ia Cultura, Be'o Horizonte, Setembro de 1880. A primeira versocom base na gra- vapdo da exposicgo oral deve-se a Professora Sdni Maria Viegas de Andrade, 1. O tema esté presente no pensamento de-tegel desde 0s es critos de juventude e ¢ explicitamente tratedo nesscritos do tempo de lena, sobretudo no System der Sittlichkeit e naredagées manus. critas das fig6es sobre 2 Filosofia do Espirito. Reparece na Prope. dettica Filosofica de Nurnberg (Werke, ed. Molthauer-Michel, 4, 119-121) © na Enciclopédia des Ciéncias Filosticas (1830), \\i B:, 1 sac. B {& 430 a & 436). Ver também Grusllinion der Philo- sophie des Rechts, & 87 (Werke, 7,p.122-127 cosas notas manus. critas de Hegel). Ver G.W.F, Hegel, Fenomenolaia dello Spirito, ‘Traduzione @ commento analitico di capitoli sefti a cura di M Faplinelli, Milano, Vita e Pensiero, 1977, II,p.59-60. 2. Ver Lima Vaz, H.C., Antropologia ¢ Bkeitos Humanos, ap. “Revista da Civilizacdo Brasileira’, 1,1978,23-8t 3. Vorlesungen ilber die Geschichte der Phifosphie \\\ (Werke, 200.455), _ 4. “O que 0 conceito ensina, a historia mosta necessariamen- te": Hegel, Grundlinien der Philosophie des RechtsVorrede (Werke, 7p.28). 5. Ver, por exemplo, Labarritre, J. P., Structuas et mouvement dialectique dans le Phénoménologie de I’Esprie 4e Hegel, Paris, Aubier, 1968,p.2 15-242, - 6. Texto em Hegel, col “Os Pensadioret” vol.&XX, Sio Paulo, Abril Cultural, 1974,p.80-81. 7. Darstellung: temo técnico da linguegem fits6fica de Hegel. Linguagem que procure exprimir 0 movimento dialéico como génese da coisa no conceito, Ver a 4? parte do Prefécio a Anomenologia dio Espirito, col. "Os Pensadores”, vol. XXX, p.28-45, 8. Ver Labarriére, J.P., Introduction 4 une fecure de la Phéno- ménologie de I'Esprit, Paris, Aubier, 1979,p.58-60,-0bre o conceita de “necessiclade” no desenvolvimento dialético da Faomenologia, 9. Grunulinien einer Phitosopie des Hechts, Forrede (Werke, 7,p.26). 10. Texto em Hegel, col. “Os Pensedores”, vol &XX, p.52-56. 11. Hegel usa 0 verbo meinen, literalmente, mpinar. Ver “Os Pensadores". vol. XXX p.61,n.1. 12. Hegel mostra, com efeito, que os animais também esto iniciados nessa saedoria das coisas senstveis. Ver Fenomenologia da Espirito, 0.4 (col. “Os Pensaciores”, vol XXX, p.67). 13, A exegese mals bem sucedisla dessas paginas parsce-nes ser a de Gadamer, H.-G., Hegel-Die verkehrte Welt, ap. Hegels Dialektik: fins hermeneutischen Studien, Tabingen, J.C.8.Mohr (Paul Siebeck), 197 1,p.31-47. 14, Phanomenologie des Geistes (sigla PhG) em Werke, 3, p.135. 18. PhG, Werke, 3,p.138. 16. PhG, Werke, 3.p.138. 17. PhG, Werke, 3.p.139. 18. PAG, Werke, 3.9.139. 19. Entre outras, as interpretacties vulgarizedas por alguns psica- nalistas recentes. 20. Ver Labarriére, J.P., Introduction a une lecture de la Phéno- ménologie de Esprit, p.123-124, 21. PAG, Werke, 39.143. 22. PAG, Werke, 3,p.144, 23. PAG, Werke, 3,9.144. 24. PAG, Werke, 3,p.144. 25. PAG, Werke, 3:p.145, 26. PAG, Werke, 3,p.145, 27. PAG, Werke, 3,p.145, 28. Ver Labarriére, J.P., Introduction é une lecture de la Phéno- ménologie de I’Esprit, p.150-158, para uma exaustiva andlise de dia- lética do reconhecimento; e sobre os textos de Hegel que passamos agora a considerar, ver @ exegese de exemplar clareza de Aquino, M.E. de, Estrutiras da Intersubjetividade, ap. “Revista Portuguesa de Filosofia", 34:1978,p.243-257; 35:1979, p.301-314. 29, Ver Enzylopadie (1840), & 433, Anm. (Werke, 10, p.222- 224}. A uta pelo reconhecimento ea sujeictio a um Senhor séo apresentados aqui como a manifestago na qual a vida em comum ios homens 2mergiu na forma do Estado. Emeraéncia dialética, néo ficgdo histérica como em Hobbes. Ela ndo explica a sociedade pol! tica. Apenas aponta o obstdcule que se opie a sua efetivagio hist6- rics como soziedade do livre consenso ou da razéo realizada. 30. PAG, Werke, 3,p.147. 31, PhG, Worke, 3,p.117. 32. PAG, Werke, 3,p.148, 33. PhG, Werke, 3,p.147. 34. PhG, Werke, 3,p. 149. 85. PhG, Werke, 3,p.150. 36. PG, Werke, 3,p.150. 28 87. PhG, We, 3,p.1 38. PAG, Werke, 3,p.151-152, 8°. PRG, Werke, 3,p.153-154. 40, PhG, Werke, 3,p.154-185, Ver Landuci, 8. Le figura del “servo”, ap. Hegel, fa coscienza @ la storia: apprasimazione alla Fe. nomenologia dello Spirito, Firenze, La Nuova Itab, 1976,p.73:99. ‘41. Ver Labarriére, Intraduction é une lecare de la Phénamé. nologie de S'Esprit, p.124, ‘42. Ver Rosen, Stanley, G.W.F, Hegel: an troduction to the Science of Wisdom, New Haven and London Yale Univ. Press, 1974,p.155. ‘43, Ver Landucci, S., Nota sulle relazionedgnoria-serviti, op, ft, p.101-105. 44, PAG, Werke, 3,p.157-18B. 45. Definiggo hegeliana da histéria universt: ver Voriasungen iiber die Philosophie der Geschichte, EINL., Werk, 12,p. 132.

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