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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ

CURSO DE DIREITO

DA USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL: MEDIDA DE


DESJUDICIALIZAÇÃO OU RETROCESSO DO PRINCÍPIO DA
EFICIÊNCIA NO REGISTRO DE IMÓVEIS?

XXXXXXXXXXXXXXXXXXX

NOVA IGUAÇU
2016/1
XXXXXXXXXXXXXXXXX

DA USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL: MEDIDA DE DESJUDICIALIZAÇÃO


OU RETROCESSO DO PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA NO REGISTRO DE
IMÓVEIS?

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado


como requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em DIREITO, do Curso de Direito da
Universidade Estácio de SÁ.

Professor Orientador (a): XXXXXXXXXX

NOVA IGUAÇU
2016/1
Dedico esse trabalho aos meus pais, meus irmãos
e meu marido. Obrigada por acreditarem em mim.
Agora vamos começar a colher o que, juntos,
plantamos. Amo vocês para sempre!
AGRADECIMENTO

Agradecer é um ato nobre, uma forma de reconhecer a bondade, o amor, a ajuda, o


incentivo e a força de quem me fez chegar até aqui e não me deixou desistir. Primeiro, sou
imensamente grata a Deus por me permitir concretizar essa etapa, Ele é perfeito e em nenhum
momento me desamparou nessa longa e difícil jornada. Muito obrigada, meu Deus.
Os meus pais foram peças fundamentais para todo o meu desenvolvimento e por isso
merecem todo agradecimento, todo apoio que eles deram, me impulsionou até aqui, eles
sofreram comigo com cada prova e sorriram comigo em cada aprovação, lutaram para que eu
pudesse estudar com tranquilidade, agarraram o meu sonho como se fosse o deles e se fizeram
presente me dando segurança para seguir em frente, sem eles com certeza seria impossível
concluir essa fase. Muito obrigada por tudo. Eu serei eternamente grata. Amo vocês
imensuravelmente.
Vale agradecer mil vezes ao meu amor, meu marido, que em todos os momentos,
desde o início da faculdade, não deixou de acreditar em mim, me incentivou em cada
semestre, apoiou, acolheu e animou de forma incansável, teve uma paciência admirável em
épocas de provas e sempre ouviu prontamente a apresentação do meu TCC pelo menos duas
vezes por dia, foi meu porto seguro, meu refúgio e minha fortaleza. Obrigada, vida, por ter
sido braços e pernas dessa trajetória, jamais me cansarei de agradecer. Amo você
eternamente.
Agradeço aos meus irmãos e meus amigos por toda paciência e por entender minha
ausência em alguns momentos por estar estudando e não poder dedicar meu tempo a vocês ou
a momentos especiais em suas vidas, mas quero que saibam que a força de vocês se fez
presente em cada prova. Obrigada por se manterem ao meu lado. Amo vocês!
Obrigada, coordenadora Tereza das Graças Renou, e meu orientador Sandro Gaspar,
por toda ajuda para o desenvolvimento desse difícil trabalho. Obrigada pela paciência e
incentivo, por me atender sempre que os solicitei e por não deixar que o cansaço me vencesse.
Obrigada ao coordenador do curso de Direito dessa instituição, Antônio Marcio Cossich, que
me atendeu em momentos de desespero e confiou em mim até mais do que eu. Obrigada,
Universidade Estácio de Sá por ter sido meu degrau.
5

DA USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL: MEDIDA DE DESJUDICIALIZAÇÃO


OU RETROCESSO DO PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA NO REGISTRO DE
IMÓVEIS?
XXXXXXXXXXXXXXXXX1

RESUMO
Diversos institutos já foram trazidos para o âmbito das atividades notarial e registral como
formas de desafogar o Poder Judiciário. Dentre os principais, temos o registro de propriedade,
a retificação, a legitimação da posse e o inventário e divórcio. Publicado em 17.03.2015 e
com vacatio legis2 de um ano a contar de sua publicação, o Novo Código de Processo Civil
introduziu na Lei de registros públicos (lei 6.015/73) o artigo 216-A 3, trazendo a usucapião ao
âmbito extrajudicial, como uma nova medida de desjudicialização, prejudicada, no entanto,
pelo requisito do parágrafo segundo do citado artigo, que flagrantemente vai na contramão
aos princípios da celeridade e eficiência.

Palavras chave: Usucapião. Extrajudicial. Desjudicialização. Eficiência.

SUMÁRIO
1. Introdução; 2. Origem histórica e conceito da usucapião; 3. Função da atividade notarial e
registral: delegação extrajudicial; 3.1. Registro de Imóveis; 4. Das medidas de
Desjudicialização de institutos jurídicos através de registro de imóveis; 4.1. Do registro de
propriedade (art. 26 da lei 6766/79); 4.2. Retificação extrajudicial (lei 10.931/04); 4.3.
Sucesso do inventário e divórcio extrajudicial (lei 11.441/07); 4.4. Legitimação da posse (lei
11.977/09); 5. Da usucapião extrajudicial como forma de Desjudicialização e sua trajetória no
registro de imóveis (lei 13.105/15); 6. Dos requisitos para o registro da Usucapião no registro
de imóveis e a flagrante violação aos princípios da celeridade e eficiência; 7. Conclusão; 8.
Referências.

1 INTRODUÇÃO

1
Aluna da UNESA do Campus de Nova Iguaçu, cursando o 10º período do curso de Direito e Escrevente
Auxiliar no Cartório de Registro de Imóveis do 3º Ofício de Justiça de Belford Roxo.
2
“Vacatio legis é um termo jurídico, de origem latina, que significa vacância da lei, ou seja, “a Lei Vaga”, que é
o período que decorre entre o dia da publicação de uma lei e o dia em que ela entra em vigor, ou seja, que tem
seu cumprimento obrigatório”.
3
Artigo 216-A da lei de Registro Público: Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de
reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de
imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado
por advogado, instruído com: (...)
6

Ao longo do século passado, ocorreu intenso processo de judicialização de conflitos


sociais, o que motivou progressos inestimáveis à cidadania, mas, também, acarretou imenso
volume de litígios, que, consequentemente, provocaram morosidade e ineficiência do Poder
Judiciário na solução das lides.
Nesse sentido, a desjudicialização é fundamental para a plena realização do Direito de
forma célere e eficaz, uma vez que concede às partes a faculdade de resolver seus conflitos
fora do âmbito judicial, desde que capazes e o direito seja disponível. A desjudicialização de
procedimentos ganhou destaque após o advento da Emenda Constitucional n°45, conhecida
como a Reforma do Judiciário.
O presente artigo tem por objetivo abordar a medida de desjudicialização do instituto
da usucapião e sua relação com o princípio da eficiência, uma vez que a reforma implantada
pela Lei 13.105/2015 (Novo Código de Processo Civil) acrescentou o artigo 216-A na Lei
6.015/1973 (Lei de Registros Públicos), que entrou em vigor um ano após a sua publicação,
trazendo a usucapião para a esfera extrajudicial como uma medida de desjudicilialização,
objetivando dar maior celeridade e eficiência, que antes não eram características do instituto
ora estudado.
Outros institutos já foram também desjudicializados com sucesso, como o registro de
propriedade (lei 6.766/79), a retificação (lei 10.931/2004), o inventário e divórcio (lei
11.441/2007) e a legitimação da posse (lei 11.977/2009). Em nenhum deles houve qualquer
retrocesso.
Entretanto, é com a usucapião que temos o mais intenso reboliço. Isto exatamente
porque, além de ser a usucapião um instituto muito antigo e de extrema importância para a
sociedade, as inovações legislativas, implementadas pela Lei 13.105/2015, trazem uma série
de exigências legais, dentre elas, especificadamente, a necessária anuência de titulares de
direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel
usucapiendo, prevista no art. 216-A, II, §2º da Lei 6.015/1973.
Essa negativa de anuências pode vir a ser um verdadeiro prejuízo à celeridade e
eficiência, dificultando, portanto, que seja operado o fenômeno da desjudicialização com
perfeição.
Desta forma, a usucapião extrajudicial que é uma realidade nas atividades notarial e
registral, que apesar de ser um marco na história desse instituto tão importante, não tem, ao
menos até novos debates doutrinários acerca da lei, ou mesmo modificações legislativas
7

posteriores, como ser vista como medida de desjudicialização efetiva em virtude do grande
retrocesso quanto à operacionalização dos princípios da celeridade e eficiência.
A metodologia aplicada neste trabalho é de cunho bibliográfico, haja vista focar na
legislação vigente referente ao tema da pesquisa, livros e artigos retirados da internet.

2 ORIGEM HISTÓRICA E CONCEITO DA USUCAPIÃO

O professor Guilherme Couto de Castro (Lições. 2009, p. 236) conceitua a usucapião


da seguinte forma: “O usucapião é modo de aquisição da propriedade e de outros direitos
reais, e não apenas da propriedade. Através dele, o possuidor pode adquirir outro direito real,
como a servidão, o domínio útil, o usufruto, etc.”4
Embora a palavra usucapião seja feminina em sua origem, uma vez que se trata da
aquisição, o já citado desembargador Federal junto ao TRF da 2ª Região, Guilherme Couto de
Castro, utiliza a forma masculina, assim como o Código Civil de 1916 a utilizou.
Neste trabalho, a forma feminina será adotada, principalmente pelo Novo Código Civil
assim a utilizar, prendendo-se à origem latina da palavra, que é formada pela aglutinação das
expressões latinas “usu” e “capio”, significando, em sua essência, “a captura pelo uso”.
Acerca de sua origem, pode-se dizer que a usucapião é um instituto muito antigo,
anterior à Lei das XII Tábuas, inclusive já prevista no velho testamento no Livro dos Juízes,
na passagem da “Tentativa de acordo”.
O direito romano, ao aprimorar a usucapião, instituiu o tempo como elemento
fundamental para a aquisição do domínio, já que a lei das XII tábuas, segundo Silvio de
Salvio Venosa (Direito Civil: direitos reais. 2003, p.191), “estabeleceu que quem possuísse
por dois anos um imóvel ou por um ano um móvel tornar-se-ia proprietário”5.
Mais tarde, surgiu no Direito clássico, a chamada “praescriptio6”, determinando que
quem “possuísse um terreno provincial por certo tempo poderia repelir qualquer ameaça a sua
propriedade pela longi temporis praescriptio” (Venosa, Silvio de Salvio. Op. Cit., 2003,
p.191).
4
CASTRO, Guilherme Couto de. Direito Civil: Lições- 3º edição / Guilherme Couto de Castro- Niterói, RJ:
Impetrus, 2009.
5
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direitos reais/ Silvio de Salvo Venosa – 3.ed.- São Paulo: Atlas, 2003.
– (Coleção direito civil; V. 5).
6
Praescriptio - Significa na língua portuguesa uma ordem.
8

Assim, no período clássico do direito romano, tanto o instituto do usucapio, como o da


praescriptio, conviveram, sendo o primeiro meio de aquisição da propriedade e o segundo
meio de defesa do réu na ação reivindicatória, e ambos fundamentados no tempo. Daí o
motivo pelo qual muitos chamam a usucapião de prescrição aquisitiva.
No entanto, apesar do fundamento de ambas serem um direito produzido pela inércia,
Guilherme Couto de Castro as diferencia da seguinte forma:

A prescrição extintiva indica o comprometimento de uma pretensão, em virtude da


inatividade do titular em exigir o seu direito no tempo previsto; já o usucapião se
traduz na aquisição da propriedade ou de outro direito real, em virtude do tempo
associado à posse qualificada. (CASTRO, Guilherme Couto de, Op. Cit., 2009, p.
236).

O professor César Fiuza também condena a utilização das expressões usucapião e


prescrição aquisitiva como se sinônimos fossem, no trecho abaixo destacado:

Emprega-se, com certa frequência, o termo “prescrição aquisitiva” como sinônimo


de usucapião. Na verdade, é impróprio o uso, traduzindo alguma má compreensão
do Direito Romano. A expressão foi amplamente utilizada no passado. Na
atualidade, contudo, não é do gosto da melhor doutrina” (FIUZA, César. Direito
civil: curso completo. 2013, p. 991).7

Nessa linha acerca da natureza jurídica da usucapião, o saudoso professor, Caio Mário
da Silva Pereira (Instituições de direito civil. 2009, p.118), conceitua o instituto como forma
derivada de aquisição, uma vez que, para ele, “é modalidade aquisitiva que pressupõe a perda
do domínio por outrem, em benefício do usucapiente.”8
No entanto, a questão chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF, RDA 73:160 e RTJ,
117:652) e prevaleceu o entendimento que a aquisição é originária, inocorrendo transmissão.
Em outras palavras, é originária porque não há qualquer vinculação com o dono anterior, e
nessa situação a propriedade será adquirida de forma plena, sem quaisquer restrições e ônus.
Além disso, sem alienante voluntário, não há transmissão. E sem transmissão, não há
cobrança de imposto de transmissão (ITBI) pelo ente público fazendário municipal, uma vez
que ausente o fato gerador.
Ademais, não basta que o possuidor exerça a posse por muito tempo, mas também lhe
é exigida a posse qualificada, ou seja, a posse que reúna elementos mínimos, como: posse sem
interrupção (contínua), posse sem oposição (mansa e pacífica) e posse (animus domini).

7
FIUZA, César. Direito Civil: curso completo/ César Fiuza. – 16º ed. Revista, atualizada e ampliada. – Belo
Horizonte: Del Rey, 2013.
8
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2009.
9

A justificativa da usucapião, para César Fiuza, funda-se em duas teorias: a subjetiva e


a objetiva. Assim, o professor leciona:

A primeira teoria, denominada subjetiva, encontra-se no intuito de eliminar a


incerteza em relações jurídicas fundamentais e tão relevantes, como a propriedade.
O domínio das coisas não pode ser incerto – ne rerum domínio in incerto essent.
Para uma segunda teoria, chamada de objetiva, o usucapião só se legitima se o
analisarmos sob a óptica da função social da propriedade: dono é quem explora o
imóvel; é quem o torna útil à sociedade (FIUZA, César. Op. Cit., 2013, p. 991).

Reunidos os requisitos acima citados, a usucapião é consumada, pois a posse


qualificada associada ao tempo gera a aquisição do domínio, independente da propositura de
qualquer ação, sendo, por isso, a sentença meramente declaratória.

3 FUNÇÃO DAS ATIVIDADES NOTARIAL E REGISTRAL: DELEGAÇÃO


EXTRAJUDICIAL

A Constituição da República Federativa do Brasil previu a função notarial e registral


como forma de delegação do Poder Público (art. 2369), rompendo com o regime anterior no
qual os cartórios integravam a administração direta.
Tal artigo constitucional, regulamentado pela Lei 8.935/94, determinou a
obrigatoriedade de concurso público de provas e títulos para o ingresso na atividade e
conferiu a fiscalização de seus atos ao Poder Judiciário.
Trata-se, assim, de serviço público em sua essência, o qual deve ser exercido em
obediência aos princípios da administração pública, como os explícitos, previstos no art. 37 da
Constituição Federal, quais sejam: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência.
Isto porque, mesmo exercida por meio de descentralização administrativa por
colaboração, à delegação dos serviços notariais e de registro deve ser aplicado o regime de
direito público.
O serviço público tem o dever de funcionar no interesse geral da sociedade e sob o
controle da Administração, e de que, por outro giro, o agente privado busca o lucro e o maior
aproveitamento financeiro possível, o que é vedado no âmbito da Administração Pública,
9
Artigo 236: Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do poder
público.
10

razão pela qual as delegações atuam sempre em prol do usuário, guiada pelos princípios
basilares da administração, principalmente, pelo princípio da eficiência.
O tabelião de protesto e Oficial de Registro, Emanoel Macabu Moraes, resume
posicionamento extraído de julgado do Supremo Tribunal Federal (ADIN 2.602/Minas
Gerais) no sentido de que:

Os serviços notariais e de registro são atividades próprias do poder público como


expresso na própria Lei Maior; que se cuida de atividades jurídicas do Estado, e não
de atividades simplesmente materiais, cuja prestação é transferida a empresários
particulares por conduto dos mecanismos da concessão ou da permissão; que o seu
estatuto decorre de lei, portanto, de regras unilateralmente impostas pelo Estado, e
não do contrato, o qual, conceitualmente, advém de acordo de vontades; que se está
a lidar com prestação estatal cujo exercício privado jaz sob a exclusiva fiscalização
do Poder Judiciário, e não sob órgão ou entidade do Poder Executivo, como se dá
com as empresas concessionárias ou permissionárias de serviços públicos; e,
finalmente, que as atividades notariais e de registro são remuneradas por
emolumentos, cuja tabela é fixada por lei e têm natureza equiparada à da taxa, e não
por tarifa ou preço público, tal qual ocorre com os concessionários e permissionários
(MORAES, Emanoel Macabu. Protesto notarial: títulos de crédito e documentos de
dívida. 2014, p. 33 e 34).

Assim, a delegação é outorgada à pessoa física do notário ou registrador, o que se


coaduna com a exigência da habilitação jurídica adequada para o exercício de tais papéis, tal
como prevê o artigo 14 da Lei 8.935/94.
A função notarial e de registro é pública, o que é privado é seu exercício. Cabe
ressalvar que tal exercício privado é praticado com total autonomia e independência jurídica
pelo profissional capacitado, sendo limitado apenas pela legalidade.
Com efeito, a legalidade da administração pública nada mais seria que o princípio da
competência, pela qual somente seria permitido fazer o que previsto como admitido em regras
de atribuição.
Desta forma, surge a necessidade de se buscar atribuir uma fórmula conceitual que se
aproxime de um teor racional próximo do que seja a legalidade administrativa em um Estado
Democrático de Direito, até mesmo para que se possa dimensionar o modo através da qual a
regulação da atividade estatal é desempenhada, bem assim, o controle de que dela resulta.

3.1 REGISTRO DE IMÓVEIS


11

A propriedade é considerada o direito real de primazia e basta olharmos os


dispositivos legais e concluir que é um dos direitos mais patrocinados no sistema jurídico
brasileiro. Assim o sistema registral imobiliário tem a função de proteger a propriedade
imóvel abrangendo todos os seus direitos e deveres inerentes a ela.
O serviço registral caracteriza-se pelo conjunto de serviços postos à disposição da
sociedade na intenção de dar publicidade, autenticidade e eficácia aos atos jurídicos e assim
garantir a segurança das relações jurídicas entre os indivíduos, conforme descreve a Lei de
registros públicos, Lei 6.015 de 197310, em seu art. 1º.
A preocupação da população em resguardar os seus direitos reais não é atual, tanto que
tem suas origens antes do advento da escrita, mas no Brasil a atividade do registro de imóveis
iniciou com o descobrimento, que foi quando teve o começo de toda trajetória da propriedade.
O grande doutrinador, Pontes de Miranda, aborda que "O Registro de Imóveis é o
ofício público, em que se dá publicidade a atos de transmissão dos bens imóveis e aos direitos
reais sobre imóveis ou a negócios jurídicos que a eles interessem. ”11
Então temos que, o registro de imóveis tem por escopo a aquisição da propriedade,
uma vez que o negócio jurídico, seja ele oneroso ou gratuito, só irá produzir os efeitos
obrigacionais ou pessoas, sendo de total importância o registro para que assim se reconheça o
direito real.
Com intenção de alcançar os objetivos e atender as expectativas do Direito, ele
acompanha princípios que são indispensáveis para o perfeito funcionamento do sistema e sua
correta e justa aplicação, os mais importante a seguir mais detalhadamente
A autenticidade é a qualidade de confirmação do ato praticado por autoridade, ou
declarações, concedendo presunção relativa de verdade. A eficácia, por sua vez, é a produção
dos efeitos jurídicos esperados pela parte.
A segurança jurídica é o principal objetivo do Registro de Imóveis. Para que alcance
seus fins, este sistema adota princípios norteadores, quais sejam: legalidade, inscrição,
prioridade ou preferência, especialidade, continuidade, territorialidade, instância ou da reserva
de iniciativa, princípio da publicidade, fé pública, obrigatoriedade, titularidade, tipicidade,
disponibilidade, e segurança jurídica.

10
Lei de Registro Público, publicada no Diário Oficial da União, de 31/12/1973. Republicada em 16/09/1975 e
retificada em 30/10/1975.
11
Kern, Marinho Dembinski. A lei 13.097/2015 adotou o princípio da fé pública registral? R evista de Direito
Imobiliário. Coordenação:Leonardo Brandelli. Publicação oficial Instituto de Registro Imobiliário do Brasil.
Thomson Reuters-Revista dos Tribunais .Ano 38. 78. Julho-Dezembro/2015.
12

A observância destes princípios junto com os demais dispositivos legais que


disciplinam os serviços concretizados pelo Registro de imóveis é de suma importância para
que os títulos levados a registro cumpram efetivamente sua função.
A Lei 6.015/73, a partir do artigo 182, disciplina o processo de registro, através do
qual o primeiro ato é a prenotação do título, que garantirá a prioridade do título, e a
preferência dos direitos reais.
Em seguida, o título passará pela qualificação, etapa na qual serão analisados os
requisitos necessários ao registro: existência, validade e eficácia do negócio jurídico. É nessa
fase que o registrador aplicará ao negócio os já informados princípios de direito registral e os
dispositivos legais pertinentes ao negócio e ao registro, emitindo um juízo de valor, decidindo
pelo registro ou não.
Esta função de valoração do título muito se aproxima à jurisdição. Emanoel Macabu
Moraes leciona que Antônio Augusto Firmo da Silva propôs que a atribuição de jurisdição
voluntária aos notários e registradores fosse denominada de “jurisdição notarial” (Op Cit.
2014, p. 40).
O Oficial do Registro de Imóveis, ao examinar o título e verificar que este não
preenche os requisitos para registro enunciará parecer por escrito, denominado exigência,
contendo as causas que impossibilitaram o registro. Se a parte divergir das exigências
formuladas pelo registrador, poderá suscitar dúvida.

4 DAS MEDIDAS DE DESJUDICIALIZAÇÃO DE INSTITUTOS JURÍDICOS


ATRAVÉS DO REGISTRO DE IMÓVEIS

Diversos institutos jurídicos já sofreram o fenômeno da desjudicialização, dentre eles


o registro de propriedade, retificação extrajudicial, inventário e divórcio extrajudicial e a
legitimação da posse.
A desjudicialização é uma forma de desafogar o Poder Judiciário, uma vez que o
instituto faculta às partes a solução dos conflitos sem o necessário ingresso em juízo, desde
que as partes sejam capazes e o interesse seja disponível.
Conforme destaca o ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski,
“precisamos de métodos alternativos para resolver antigos problemas. Na área criminal temos
13

a audiência de custódia, e na cível, temos mediação e conciliação. O Judiciário está se


inovando e apresentando soluções progressistas.”12
Assim, quando se traz institutos jurídicos para o Registro de Imóveis além de não
existir violação ao princípio do acesso à Justiça, já que a parte a qualquer hora poderá desistir
da via administrativa e dirigir-se ao Judiciário, há, via de regra, plena concretização dos
princípios da celeridade e eficiência.
Há, contudo, sempre uma exceção, como a usucapião administrativa e a necessária
anuência dos titulares de direitos reais e de outros registrados ou averbados na matrícula do
imóvel usucapiendo, que será abordada mais adiante.

4.1 DO REGISTRO DE PROPRIEDADE - ART. 26 DA LEI 6766/79

Incluído pela Lei 9.785/99, o registro de propriedade é uma forma de desjudicialização


da ação de adjudicação compulsória, uma vez que concede ao promitente comprador ou
cessionário o direito de registrar a propriedade quando já quitados os compromissos de
promessas ou cessões.
Art. 26. (...)
§ 6o Os compromissos de compra e venda, as cessões e as promessas de cessão
valerão como título para o registro da propriedade do lote adquirido, quando
acompanhados da respectiva prova de quitação. 

Este instituto, inclusive, pode ser entendido como uma adjudicação compulsória
extrajudicial, já que seus requisitos se assemelham à ação judicial, sendo, contudo,
fundamental, para o enquadramento do caso ao artigo 26, §6° da lei 6766/79, o registro da
promessa ou cessão no registro de imóveis competente.
Fato é que, embora a súmula 239 do Superior Tribunal de Justiça estabeleça que “o
direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e
venda no cartório de imóveis”, essa orientação, na verdade, parece ter sido superada pelo
artigo 1.417 do Código Civil: 
Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento,
celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro
de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.

12
ZAMPIER, Débora. Tribunais investem em desjudicialização e comemoram resultado. Disponível em
http://www.cnj.jus.br/notíricias/cnj/80389-tribunais-investem-em-desjudicializacao-e-comemoram-resultados.
Acesso em 28 de Abril de 2016.
14

Mas a questão nuclear é que a adjudicação compulsória é a obtenção do direito que o


promitente vendedor se escusou de conceder, tendo, por isso, o promitente comprador que
recorrer ao Poder Judiciário.
Assim, a desjudicialização do instituto da adjudicação compulsória através do registro
de propriedade facilita ainda mais a transmissão da propriedade, já que prescinde o
ajuizamento da ação.

4.2 RETIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL - LEI 10.931/2004

As retificações de registros imobiliários passaram a ser feitas no registro de Imóveis a


partir da Lei 10.931/2004, que alterou os artigos 212 e 213 da Lei 6.015/73, pelo próprio
registrador de imóveis, excetuando-se, por óbvio, aquelas situações nas quais não houvesse
acordo entre as partes ou perigo de grave lesão aos direitos dos confrontantes.
A alteração da forma de retificação do fólio real é de suma importância para a
necessidade de celeridade e segurança que a sociedade moderna exige.
O procedimento faz com que o registrador tenha maior responsabilidade, não só
porque em determinadas situações a retificação será feita ex officio, mas também porque
passou a existir procedimento administrativo que deverá ser conduzido pelo oficial.
Desta forma, os interessados podem consertar erros constantes na matrícula de seus
bens imóveis, independentemente da provocação do Poder Judiciário, desjudicializando o
procedimento.
Depois de mais de uma década de vigência da Lei 10.931, e milhares de
procedimentos de retificação já realizados no país perante o Registro de Imóveis, não houve,
pelas entidades de classe, qualquer conhecimento que congregam aos titulares registradores
imobiliários sequer uma notícia de processo judicial para fazer o cancelamento da retificação
feita extrajudicialmente, o que faz gerar forte segurança jurídica nos atos praticados, sendo
real a finalidade da desjudicialização.

4.3 SUCESSO DO INVENTÁRIO E DIVÓRCIO EXTRAJUDICIAL – LEI 11.441/2007


15

A lei 11.441/2007 alterou dispositivos do Código de Processo Civil (lei 5.8969/73) e


possibilitou a realização de inventário, partilha e divórcio consensual por via administrativa
nos serviços notariais.
Esta solução trazida pelo ordenamento jurídico pátrio torna ágil a realização dos
procedimentos desde que haja consenso entre as partes e presentes os requisitos legais.
O principal objetivo da lei 11.441/2007 foi desafogar o Poder Judiciário e liberá-lo
para a resolução de casos complexos, concedendo maior satisfação aos particulares de suas
pretensões em menor tempo e custo.
A eficácia da citada lei vem reforçando um processo que deverá ser contínuo na
desjudicialização e procedimentos de jurisdição voluntária. Este sucesso é evidente com a
crescente utilização da via extrajudicial para a solução das demandas compreendidas em sua
essência pelo Direito de família ou sucessões, demonstrando a habilidade de desafogar o
Judiciário.

4.4 LEGITIMAÇÃO DA POSSE - LEI 11.977/2009

O capítulo III da lei 11.977/2009 é o primeiro dispositivo legal a abordar a


regularização fundiária em áreas urbanas de forma abrangente, uma vez que:

Estabelece conceitos, cria instrumentos e define procedimentos, competências e


responsabilidades com o objetivo de agilizar e tornar efetivos os processos de
regularização fundiária de assentamentos urbanos, especialmente nos casos em que
esteja configurado o interesse social (Brasil: Ministério das Cidades. Regularização
Fundiária Urbana: como aplicar a Lei Federal n°11.977/2009 – Ministério das
Cidades Secretaria Nacional de Acessibilidade e Programas Urbanos e Secretaria
Nacional de Habitação. Brasília, 2013, p. 12)

Segundo o Instituto de Registro Imobiliário do Brasil - IRIB, o processo de


regularização fundiária:
É recentíssimo e sui generis na ordem jurídica do País, porque é a única hipótese,
fora da via judicial, de formação de um título de propriedade para imóveis, fundado
na posse prolongada, culminando com a aquisição da propriedade imobiliária por
meio do usucapião (IRIB. Regularização Fundiária de Interesse Social. 2012, p. 10).

Lamana Paiva conceitua a regularização fundiária como:


Um PROCESSO SOCIAL – JURÍDICO-ECONÔMICO DE TRANSFORMAÇÃO,
mediante a intervenção do Poder Público na propriedade privada ou pública em
decorrência de evidente interesse social, a fim de legalizar a permanência de
16

possuidores em áreas urbanas ocupadas em desconformidade com a lei, de forma a


promover o direito social à moradia, a função social da propriedade e da cidade
(PAIVA, Lamana. O papel do notário na regularização fundiária. Disponível em
http://registrodeimoveis1zona.com.br/?p=649. Acesso em 31/05/2015).

Assim, a lei 11.977/2009 veio colaborar com o fenômeno da desjudicialização.

5 DA USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL COMO FORMA DE DESJUDICIALIZAÇÃO


E SUA TRAJETÓRIA NO REGISTRO DE IMÓVEIS – LEI 13.105/2015

De forma opcional ao jurisdicionado, foi introduzido na norma jurídica brasileira o


instituto da usucapião extrajudicial, processada perante o registro de imóveis, com o
determinado objetivo de ter ampla abrangência em relação aos procedimentos aplicáveis à
concessão de todas as espécies da usucapião de direito material previstas na legislação
brasileira.
O novo Código de Processo Civil (lei 13.105/2015) disciplina em seu artigo 1.071
novo procedimento administrativo extrajudicial para a usucapião de bens imóveis,
generalizando o procedimento, sempre que provados seus requisitos legais e desde que não
haja litígio.
Com a alteração da lei de registros públicos (lei 6.015/73), e o acréscimo do artigo
216-A, que regula o procedimento da usucapião, este procedimento se inicia com o
requerimento pelo interessado, representado por advogado, instruído com ata notarial, planta e
memorial descritivo do imóvel, certidões negativas e outros documentos, além da
apresentação do pedido ao registro de imóveis na circunscrição cujo imóvel usucapiendo está
localizado, a quem compete conduzir o procedimento, onde será protocolado em obediência
ao princípio da reserva da instância ou iniciativa, autuado e realizadas todas as providências
necessárias ao reconhecimento da posse aquisitiva de tal propriedade imobiliária e seu
registro em nome do possuidor.
Diante da complexidade do ato postulatório, como já dito, a parte deverá ser assistida
por advogado, o qual elaborará petição que será instruída com prova pré-constituída de posse
contínua, ininterrupta, mansa e pacífica, além, é claro, da tão comentada ata notarial, como
instrumento legal com a finalidade de fazer um meio de prova documental de fatos que
estejam ocorrendo no imóvel usucapiendo e seja possível visualização e percepção pelo
17

notário e será elaborada pelo tabelião de notas de livre escolha da parte, podendo o
delegatário comparecer ao local do imóvel para verificar a exteriorização da posse, os indícios
de sua duração e demais circunstâncias relevantes, às expensas do requerente.
Note-se, no entanto, que ao tabelião de notas é vedado realizar diligências fora dos
limites territoriais do município de sua atuação, nos termos do art. 9º da Lei 8.935/1994. Não
sendo realizada diligência devem comparecer ao tabelionato de notas para a lavratura da ata
notarial tanto o solicitante a quem a posse mansa e pacífica pertence quanto às testemunhas do
fato da exteriorização da posse.
A ata notarial, prevista no artigo 384 do Novo Código de Processo Civil, foi definida
por Josefina Chinea Guevara, em La actividad del notario y los diversos tipos de actas, como:
Ata notarial será todo documento público autorizado por tabelião que não tenha a
forma de escritura. Portanto, não terão como conteúdo um ato jurídico; e sim, fatos,
atos ou circunstâncias de relevância jurídica dos quais se derivem ou declarem
direitos ou interesses legítimos para as pessoas, ou qualquer outro ato de declaração
lícita que por sua natureza não constitua ato jurídico (GUEVARA, Josefina Chinea
La actividad del notario y los diversos tipos de actas. Disponível em
http://www.atanotarial.org.br/ata_notarial.asp. Acesso em 01/06/201513).

Assim, frise-se, para lavrar a ata, o tabelião deverá ir até o imóvel e verificar a
exteriorização da posse, não obstante a possibilidade de a testemunha do requerente
comparecer ao tabelionato de notas para declarar seu conhecimento sobre a posse do
usucapiente.
Por óbvio, o requerimento também deverá vir acompanhado da planta do imóvel,
assim como já é feito na via judicial, bem como por memorial descritivo e Anotação de
Responsabilidade Técnica (ART). A planta, no entanto, deverá ser assinada pelos titulares de
direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel
usucapiendo, e nas matrículas dos imóveis confinantes, manifestando concordância ao pedido
a fim de que seja caracterizado o consenso. E é exatamente nessa norma legal que se encontra
o principal obstáculo à consumação da desjudicialização do instituto da usucapião.
Ora, se a usucapião tem natureza jurídica de aquisição originária da propriedade, como
já pacificado perante o Supremo Tribunal Federal e diversos doutrinadores renomados, não
haveria qualquer vínculo do possuidor do imóvel usucapiendo com o antigo dono, aquele
descrito no fólio real, pois inexistiria voluntariedade de transmissão. Logo, como poderia o

13
GUEVAVA, Josefina, Chinea. La atividade del notário y los diversos tipos de actos. Disponível em
http://www.atanotarial.org.br/atanotarial.asp. Acesso em 01.06.2015.
18

possuidor conseguir assinaturas dos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados
ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo, e nas matrículas dos imóveis confinantes?
A regra acima além de impossível de ser cumprida, caracterizando verdadeiro
retrocesso quanto aos avanços já obtidos pelos princípios da celeridade e eficiência, ainda vai
na contramão da característica originária de tal aquisição, uma vez que demanda a criação de
vínculo jurídico que o instituto não possui. Tornar-se-ia derivada a usucapião?
Caso essa etapa seja cumprida, recebida a petição, com os documentos já citados, o
procedimento irá ser desenvolvido sob a condução do Oficial de Registro de Imóveis, sendo
dispensada a fiscalização do Ministério Público ou a homologação judicial, sem deixar de
observar a cautela adotada na via judicial, sendo prenotado no livro de protocolos e assim se
iniciará a qualificação do título.
Ausente algum documento ou algum elemento essencial ao registro da usucapião, o
registrador formulará exigência, a qual deverá ser cumprida pela parte interessada para suprir
as lacunas que foram encontradas no procedimento e que não sendo cumpridas poderá ser
objeto de suscitação de dúvida, bem como notificará os interessados que não tenham assinado
a planta com o fito de se manifestarem. A fazenda pública também deverá ser notificada para
eventual impugnação de que o imóvel possa ser público e, portanto, não usucapível.
Além de tudo, deverá o oficial de registro publicar edital em jornal de grande
circulação para dar publicidade a terceiros, que poderão impugnar o pedido.
Todas as manifestações deverão ser elaboradas por escritura e protocoladas junto ao
cartório de registro de imóveis, que serão encaminhadas ao juízo competente para apreciação,
e o silêncio não importará anuência, como ocorre na retificação extrajudicial.
Vale observar que o maior obstáculo à efetividade do novo instituto poderá ser
exatamente a recusa do titular de direito real sobre o imóvel usucapiendo ou confrontante em
assinar a planta ou até mesmo sua não localização.
O registrador poderá, ainda, realizar diligências que julgar necessárias, para sanar
eventuais dúvidas. Tudo com a máxima cautela, priorizando a segurança jurídica.
No entanto, não ocorrendo qualquer manifestação contrária ao pedido ou ausente
manifestação expressa dos confrontantes ou exigência não cumprida, o registrador deverá
apreciar o requerimento da usucapião, e registrar caso a qualificação seja positiva.
Essa decisão não obsta o ajuizamento de ação, até porque isso seria uma violação ao
princípio do acesso à justiça.
19

Diante disso, a atribuição aos notários e aos registradores de soluções de questões sem
litígio as quais envolvam direitos disponíveis poderá vir a colaborar para desafogar a justiça
somente se houver manifestação expressa do antigo dono, inserindo, assim, a usucapião no
fenômeno da desjudicialização de forma ineficaz, retrocedendo para tornar o instituto
aquisição derivada, o que não se coaduna com o posicionamento do Supremo Tribunal
Federal.

6 DOS REQUISITOS PARA O REGISTRO E A FLAGRANTE VIOLAÇÃO AOS


PRINCÍPIOS DA CELERIDADE E EFICIÊNCIA

O art. 216-A traz o procedimento a ser seguido no Registro de Imóveis para a


Usucapião. Dentre os requisitos estabelecidos, como já abordado, está previsto no inciso II a
apresentação de planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente habilitado
com prova de anotação de responsabilidade técnica no respectivo conselho de fiscalização
profissional e pelos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou averbados na
matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes. A planta e o
memorial descritivo sempre foram requisitos para a usucapião, a jurisprudência até permitia
sua substituição por meros croquis em alguns casos específicos. Tal não ocorrerá na
usucapião extrajudicial, pois o Novo CPC fez questão de robustecer os requisitos, gerando
maior controle sob a atividade administrativa. A concordância dos confinantes e cônjuges
logo no memorial descritivo se mostra como requisito intransponível para a usucapião
extrajudicial, razão pela qual o §2º do mesmo artigo dispõe que se não for assinado
previamente, os confinantes serão notificados para declarar sua concordância, sendo o silêncio
entendido como discordância, impossibilitando o uso do instrumento.
Contrariamente ao disposto no art. 111 do Código Civil, bem como na contramão do
procedimento de retificação, previsto no art. 213, paragrafo quarto da lei 6015/73, o legislador
estabeleceu, no paragrafo segundo do art. 216-A da citada lei de registros, que o silêncio de
qualquer titular de direito real e de outros direitos registrados ou averbados na matrícula do
imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis confinantes não importará anuência.
Note-se que tal imposição legislativa configura retrocesso, uma vez que a
desjudicialização se torna inócua, já que o procedimento nesse caso terá que ser remetido ao
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Poder Judiciário, o que não se coaduna com os princípios da celeridade e eficiência, previstos
tanto para o Registro de Imóveis, como para qualquer medida de desjudicialização que se
preze.
Neste diapasão, José Lucas Rodrigues Olgado14 aborda:
Aliás, a presunção da discordância è que não parece estar em harmonia com os
valores de eticidade, socialidade e operabilidade que informam o Código Civil de
2002. Consoante esses valores, a discordância deve ser expressa e fundamentada,
pois se for vazia, sem motivos, configurará o abuso de direito previsto no art. 187 do
CC/2002. Assim, nada mais justo que, aquele que discordar do exercício de um
direito, tenha o ônus de apresentar seus fundamentos. Admitir o contrario possibilita
ao proprietário desidioso e eventuais vizinhos contendedores, impedirem o livre
exercício de um direito potestativo, legitimando a situação de abuso de direito

O texto do artigo 216-A, II, §2º nos parece inadequado ao objetivo proposto que seria
o da celeridade nos processos extrajudiciais, uma vez que a usucapião é um instituto que no
que concerne não é exigido, impreterivelmente, consenso ou concordância entre o requerente
e o requerido, tendo em vista que, mesmo que com ausência do consenso, mas cumprida as
condições legais impostas pelo usucapiente, este estaria com plenas possibilidades de adquirir
o imóvel usucapiendo.
Por conseguinte, pode-se estimar que tal procedimento só terá eficácia àqueles casos
em que houver um negócio anterior entre o usucapiente e o titular do domínio do imóvel, pois
assim haverá registro da matrícula do imóvel e sua anuência contribuirá para a eficiência da
usucapião extrajudicial. Ora, se o titular do domínio, em algum momento, pactuou com o
usucapiente, haveria relação jurídica e a aquisição, nesse caso, se daria de forma derivada,
com todas as características dos direitos reais, como direito de preferência e sequela, o que
não parece ser razoável já que esta não é a verdadeira natureza jurídica da usucapião.
Originar-se-á, entretanto, um problema de impossível solução na conjectura em que
haja o silêncio do titular do direito real sobre o imóvel, sem que isso signifique, propriamente,
em discordância com a realização do procedimento, mas representa indiferença às
decorrências de sua não manifestação expressamente, nada obstante que venha a ser a
hipótese mais ocasionada nos futuros procedimentos.
Em 12 de maio de 2016 saiu uma publicação oficial do Tribunal de Justiça do Estado
do Rio de Janeiro, as folhas 61/66 ano 08, nº 164/2016, caderno 01-Administrativo, com
Parecer firmado pela juíza auxiliar Ana Lucia Viera do Carmo e Provimento CGJ Nº 23/2016
14
OLGADO, José Lucas Rodrigues. O papel da ata notarial no procedimento extrajudicial de usucapião. Revista
de Direito Imobiliário. Coordenação:Leonardo Brandelli. Publicação oficial Instituto de Registro Imobiliário do
Brasil. Thomson Reuters-Revista dos Tribunais. Ano 38. 79. Julho-Dezembro/2015.
21

regulamentando a usucapião administrativa. No entanto, a colaboração não é substancial, uma


vez que para o caso da ausência de anuência dos titulares dos direitos e outros direitos
registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo, o impasse foi mantido já que
somente houve autorização para que a citada anuência fosse prestada pelos mesmos titulares
em ata notarial ou documentos apartados, público ou particular, com reconhecimento de
firma.
Ora, o que se depreende do abordado no parágrafo anterior é que a desembargadora
Maria Augusta Vaz Monteiro de Figueiredo, corregedora geral da justiça, que assinou o
provimento entendeu que para os casos em que houvesse, ao menos, um documento assinado
por aqueles titulares de direitos reais poderia haver o reconhecimento administrativo da
usucapião no registro de imóveis. Contudo, sabe-se que a usucapião na maior parte dos casos
deriva de posse prolongada, sem qualquer vinculação com proprietários descritos no fólio
real, até porque caso houvesse vinculação haveria título registrável, que mesmo que, fosse
necessária a sua prova na Justiça, como por exemplo, a adjudicação compulsória, a via cabível
nunca seria a usucapião, pois essa não pode ser utilizada para fugir do registro de títulos já
qualificados.
De qualquer forma, o provimento não pode ampliar o objetivo do legislador, se o
mesmo não quis que o procedimento fosse feito sem anuência daqueles titulares de direitos
reais. É como diz o brocardo jurídico: “não cabe ao intérprete distinguir se o legislador não o
fez”. Dessa forma para que o fenômeno da desjudicialização possa de fato ser operado de
forma eficaz sobre o instituto da usucapião é necessária nova modificação na lei de Registros
Públicos.
Temos assim que pouquíssimos casos poderão ser solucionados na via administrativa,
o que parece ser uma defesa absurda do direito de propriedade em detrimento ao direito de
moradia. Tem-se aí o legislador defendendo, a todo custo, a propriedade, e esvaziando por
completo o instituto da usucapião, que não tem característica de propriedade derivada, mas
sim originária, onde não há vínculo com o proprietário anterior.
Diante disso, vislumbra-se flagrante violação ao princípio da eficiência, já que toda
vez que houver silêncio dos titulares de direitos reais e de outros direitos registrados ou
averbados na matrícula do imóvel usucapiendo, e nas matrículas dos imóveis confinantes, ou
seja, das pessoas que deveriam assinar a planta, o procedimento não poderá ser realizado no
registro de imóveis, impedindo, assim, a concretização da medida de desjudicialização.
22

5 CONCLUSÃO

Conclui-se, diante de todo o exposto, que a usucapião extrajudicial como medida de


desjudicialização, embora tenha sido criada com o fito de desafogar o Poder Judiciário, ao
retirar parte do volume de processos que o sobrecarrega, liberando o magistrado para se
ocupar com questões que efetivamente justifiquem a atuação da autoridade judiciária
prolatora de decisões em caráter definitivo, talvez não surta o efeito desejado.
Como já explicitado, os institutos do registro de propriedade, retificação, legitimação
de posse já deram certo na via extrajudicial, sem falar no extraordinário sucesso do inventário
e divórcio, que satisfizeram milhares de pretensões dos particulares com menor custo e maior
rapidez, não necessitando que em algum momento do procedimento fosse remetido ao
judiciário, atendendo a essência da desjudicialização.
Ocorre que para que a usucapião possa ser reconhecida pelo oficial de registro, em
âmbito extrajudicial, todas as exigências legais descritas no art. 216-A da Lei 6.015/73
deverão ser cumpridas, no entanto o legislador não levou em consideração que se o imóvel
está sendo objeto da usucapião é porque não se tem a regularização do mesmo no registro de
imóveis, se o imóvel é de posse por certo não se encontrará os titulares de direitos reais e de
outros direitos registrados ou averbados na matrícula do imóvel usucapiendo e na matrícula
dos imóveis confinantes como é exigido no inciso II do citado artigo, o que na prática não
conseguirá ser efetivado, e ainda no §2º do mesmo artigo determina que o silêncio dessas
partes que não assinarem a planta importará em discordância, sendo assim o oficial do registro
de imóveis não poderá registrar a usucapião extrajudicial e irá suscitar dúvida, sendo o
procedimento remetido ao judiciário, frustrando a desjudicialização.
Por óbvio, não se registrará a usucapião sem a cautela necessária a qual é inerente à
função do registrador. Com certeza, a segurança jurídica se aliará à efetividade, sem que uma
desmereça a outra. No entanto, a situação prevista na Lei 6.015/73, que determina a
necessária anuência de todos os titulares de direitos reais e de todos os confrontantes, mostra-
se como um retrocesso.
Em suma, a desjudicialização das relações jurídicas sobre direitos patrimoniais ou
extrapatrimoniais, desde que disponíveis, é um verdadeiro avanço para institutos que antes
23

sofriam com a morosidade do Poder Judiciário. Todavia, não se pode introduzir um instituto
que vise agilizar a satisfação dos anseios da sociedade moderna, que necessita de soluções
dinâmicas para seus conflitos, sem que sejam garantidos os princípios da celeridade e
eficiência, sob pena de perder seu sentido, retrocedendo.

6 REFERÊNCIAS

CASTRO, Guilherme de Couto de. Direito Civil: Lições. 5º edição. Niterói, RJ. Impetrus.
2012.

FIUZA, César. Direito Civil: curso completo. 16º edição. Revista atualizada e ampliada.
Belo Horizonte. Del Rey. 2013.

GUEVAVA, Josefina Chinea. La atividade de notário y los diversos tipos de actos.


Disponível em http://www.atanotarial.org.br/atanotarial.asp. Acesso em 01.06.2016.

KEM, Marinho Dembinski. A lei 13.097/2015 adotou o princípio da fé pública registral?


Revista de Direito Imobiliário: coordenação Leonardo Brandelli. Publicação oficial Instituto
de Registro Imobiliário do Brasil. Thomson Ruters- Revista dos Tribunais. Ano 38.78. Julho
– Dezembro/2015.

OLGADO, José Lucas Rodrigues. O papel da ata notarial no procedimento extrajudicial de


usucapião. Revista de Direito Imobiliário: coordenação Leonardo Bradelli. Publicação oficial
Instituto de Registro Imobiliário do Brasil. Thomson Ruters- Revista dos Tribunais. Ano
38.79. Julho – Dezembro/2015.

PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro. Editora
Forense. 2012.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direitos reais. 5º edição. Coleção direito civil,
volume V. São Paulo. Atlas. 2013

ZAMPIER, Débora. Tribunais investem em desjudicialização e comemoram resultado.


Disponível em http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/80389-tribunais-investem-em-
desjudicialização-e-comemoram-resultado. Acesso em 28.04.2016.

Legislação:

LEI Nº 11.441, DE 4 DE JANEIRO DE 2007. Altera dispositivos da Lei no 5.869, de 11 de


janeiro de 1973 – Código de Processo Civil, possibilitando a realização de inventário,
partilha, separação consensual e divórcio consensual por via administrativa.
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LEI Nº 11.977, DE 7 DE JULHO DE 2009. Dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha
Vida – PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas;
altera o Decreto-Lei no 3.365, de 21 de junho de 1941, as Leis nos 4.380, de 21 de agosto de
1964, 6.015, de 31 de dezembro de 1973, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 10.257, de 10 de
julho de 2001, e a Medida Provisória no 2.197-43, de 24 de agosto de 2001; e dá outras
providências.

LEI Nº 13.105, DE 16 DE MARÇO DE 2015.


Código de Processo Civil.

LEI Nº 6.015, DE 31 DE DEZEMBRO DE 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá


outras providências.

LEI Nº 8.935, DE 18 DE NOVEMBRO DE 1994. Regulamenta o art. 236 da Constituição


Federal, dispondo sobre serviços notariais e de registro. (Lei dos cartórios)

LEI Nº 9.785, DE 29 DE JANEIRO DE 1999.


Altera o Decreto-Lei no 3.365, de 21 de junho de 1941 (desapropriação por utilidade pública)
e as Leis nos 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (registros públicos) e 6.766, de 19 de
dezembro de 1979 (parcelamento do solo urbano).

LEI No 10.931, DE 02 DE AGOSTO DE 2004. Dispõe sobre o patrimônio de afetação de


incorporações imobiliárias, Letra de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Imobiliário,
Cédula de Crédito Bancário, altera o Decreto-Lei no 911, de 1o de outubro de 1969, as Leis
no4.591, de 16 de dezembro de 1964, no 4.728, de 14 de julho de 1965, e no10.406, de 10 de
janeiro de 2002, e dá outras providências.

LEI No 6.766, DE 19 DE DEZEMBRO DE 1979.


Dispõe sobre o Parcelamento do Solo Urbano e dá outras Providências.

NICOLETTI, CÉSPEDES, CURIA, VADE MECUM, 19ªed atual.e amp- São Paulo. Saraiva,
2015.

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