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O CEMITERIO DA PRAIA DE MANGUINHOS: NOTICIA SOBRE UM SITIO HISTORICO DE GUAXINDIBA, RJ Sheila MENDONCA DE SOUZA Alfredo MENDONCA DE SOUZA Adriana TAVARES UNIVERSIDADE ESTACIO DE SA IO DE JANEIRO | Historical Archaeology in Latin America Arqueologia Histérica en América Latina 3 Arqueologia Historica na América Latina 5 Restos Humanos & Arqueologia Historica: Uma: Questao de Etica Tania Andrade Lima O Cemitério da Praia de Manguinhos: Noticia Sobre um Sitio Histérico de Guaxindiba, RJ Sheila Mendonca de Souza Alfredo Mendonca de Souza Adriana Tavares Arqueologia de Superficie en Palermo, Buenos Aires Daniel Schévelzon A Series Fi ‘The Conference ded Through a Grant from on Historic Site Archaeology STANLEY SOUTH, Publisher ‘THE SOUTH CAROLINA INSTITUTE OF ARCHAEOLOGY AND ANTHROPOLOGY ‘The College of Humanities and Social Sciences THE UNIVERSITY OF SOUTH CAROLINA COLUMBIA USA SUMARIO Pagina Introdugaéo Escraviddéo e doenga: um pouco de historiografia © sitio cemitério da praia de Manguinhos: um pouco de arqueologia Descrigdo dos sepultamentos e osteobiografias consideragédes finais e propostas para investigacao Referéncias bibliograficas Notas ao texto Anexos 15 ar 31 34 37 39 ESTA PESQUISA, foi desenvolvida com apoio financeiro CNPq ~ Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnolégico, e UNESA ~ Universidade Estacio de sa. os AUTORES: Sheila MENDONCA DE SOUZA 6 Professora Titular no Departamento de Arqueologia e Museologia da UNESA e Pesquisadora Assistente da Escola Nacional de Saide Pablica, Fundagdo Oswaldo Cruz. Alfredo MENDONCA DE SOUZA 6 Professor Titular no Departamento de Arqueologia e Museologia da UNESA Adriana TAVARES, bolsista de Iniciagéo Cientifica do CNPq, é bacharelanda em arqueologia da UNESA. AGADECIMENTOS & equipe de arqueologia, representada por pesquisadores e estagiarios do Instituto Superior de Cultura Brasileira e da Universidade Estacio de Sa, que participaram das pesquisas de campo e laboratério, em especial a Cesar Lotufo, Carlos Xavier de Azevedo Neto, Marcus Vinicius, Vlademir José Luft, Francesco Palermo Neto, Marcus André Torres Sobrinho, Ménica Figueiredo e Marcia Amantino. Agradecimentos também ao Dr. Rogério Araripe Filho, do Hospital dos Servidores do Estado, e ao servicgo de radiologia do Hospital Evandro Chagas, que colaboraram para a realizagao de exames complementares. Finalmente, os nossos agradecimentos ao) moradores de Guaxindiba, que colaboraram com nosso trabalho. RESUMO © cemitério da praia de Manguinhos é um sitio arqueolégico histérico, utilizado provavelmente durante os séculos XVIII e XIX pela populagdo rural que ocupou uma fazenda de cana-de-acticar no litoral do Norte Fluminense, no atual municipio de Sao Joao da Barra, entre os rios Paraiba e Itabapoana. A escavagdo de um pequeno setor deste cemitério trouxe a luz sepultamentos de negros, provavelmente escravos, cujo estudo vem permitindo correlacao con a historiografia, e formulagao de hipéteses de trabalho que dizen respeito as condigées sécio-econémicas e A qualidade de vida da escravaria rural associada ao periodo canavieiro da regiao. 0 prosseguimento das pesquisas arqueolégicas e os estudos bioesqueletais, deverdo permitir ampliar conhecimentos sobre este periodo histérico, até agora pouco estudado pelos arqueélogos brasileiros. SUMMARY Manguinhos’ beach cemmetery is a historical archaeological site, probably used during the XVIII and XIX centuries, by the people that inhabited a sugar-cane farm in the Northern part of the country, at Rio de Janeiro state, between the rivers Paraiba and Itabapoana. The escavation of a small section of the cemetery exposed burials of blacks, probably slaves. The analysis of the skeletons permited to propose correlations with historical data, and to discuss hypothesis about the socio-economic pattern and quallity of life of those slaves living in the country during the sugar-cane ecconomic cicle. Future researches will permit to improve knowledge about this historical period, not studied yet by brasilian archaeologists. © CEMITERIO DA PRAIA DE MANGUINHOS: NOTICIA SOBRE UM SITIO HISTORICO DE GUAXINDIBA, RJ INTRODUGKO © estudo dos eventos econdmicos do periodo histérico é, certamente, um dos mais interessantes temas para investigacao arqueoldgica, permitindo o encontro de questées que dizem respeito tanto a mudangas culturais como biolégicas, e proporcionando a oportunidade de confrontar conhecimentos produzidos, de modo independente, pela antropologia biolégica, pela arqueologia e pela historia. Nessa linha, o estudo arqueolégico de um cemitério, em que pesem todas as questées éticas, reveste-se de interesse especial, por oferecer a oportunidade de verificagéo das proposigdes estabelecidas com base em documentos escritos, ou em outras evidéncias da cultura material, a partir da biologia humana, sendo elemento enriquecedor do conhecimento sobre o passado recente, e complementar a reconstituicao arqueolégica. A partir de abordagens bio-culturais, pode-se discutir © impacto de estratégias de subsisténcia, relagédes econémicas, mudangas de habitos ou de poder, traduzidos ‘em mudancas da constituicéo biolégica, flutuagdes demograéficas, ou variagées significativas da saide, a partir de estudos de remanescentes esqueletais. Assim sendo, se tal como propée Orser (1992), a arqueologia histérica na América deve ser entendida como o estudo arqueolégico dos aspectos materiais, em termos histéricos, culturais e sociais concretos, dos efeitos do mercantilismo e do capitalismo que foi trazido da Europa em fins do século xv e que continua em agdo ainda hoje, entao, a tem&tica de estudo dos cemitérios historicos do periodo escravista no Brasil, devera poder trazer contribuigédes 4 compreensdéo de uma etapa da historia que ainda hoje tem reflexos sobre a vida urbana e rural. Neste contexto € que se justifica a escavagéo extensiva do Cemitério de Manguinhos, um sitio historico cuja pesquisa deriva de um projeto maior, denominado Vila da Rainha. Este projeto pertence ao Programa Arqueolégico Norte Fluminense ~ PANF, que tem como proposta mapear (1:100.000), e progressivamente pesquisar, sitios arqueolégicos, na regiao formada por 12 municipios distribuidos 4 margem esquerda do Rio Paraiba do Sul, ao Norte do Estado do Rio de Janeiro |. © Projeto Vila da Rainha, foi concebido como um detalhamento do PANF, voltando-se para o estudo de remanescentes historicos do periodo canavieiro, com o objetivo principal de localizar o povoamento originério dessa regifo, a chamada Vila da 5 Rainha, local de implantacdo, no século XVI, do primeiro Engenho de cana-de-agticar da Capitania de Sao Tomé. Para este fim, o Projeto vem registrando e prospectando sitios arqueolégicos histéricos, localizados na faixa litoranea do Norte Fluminense, entre os rios Itabapoana e Paraiba do Sul. A etapa inicial desta pesquisa foi feita com recursos do Instituto Superior de Cultura Brasileira (ISCB), e as etapas seguintes foram realizadas com apoio da Universidade Estacio de Sa (UNESA), e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnolégico (CNPq), ambos contribuindo financeiramente para o trabalho. Além de evidéncias arqueolégicas que possam estar associadas as possiveis localizagées da historica Vila da Rainha, vem sendo realizado o levantamento documental pertinente, incluindo fontes primarias e secundérias, na forma de relatos, textos, cartas e antigos mapas da regido (Figuras 1, 2 e 3). A Vila da Rainha foi fundada por Pero de Gées da Silveira, fidalgo ilustre que, apés residir alguns anos na Capitania de Sdo Vicente, tornou-se donatario da capitania vizinha de Sao Tomé. Por volta de 1539, aquele portugués mudou-se con homens e material para um local do litoral, entre os rios Itabapoana e Paraiba do Sul, onde teria fundado uma pequena localidade, implantando um engenho e canaviais (CARTA DE..., 1861). © micleo de povoamento, formado por casas e uma capela de Santa Catarina, teria edificios j4 feitos de pedra e cal (Varnhagen, s/d). Apesar de trabalhar inicialmente com a colaboracgdo dos indios Goitaca *, acabou sofrendo com dissidéncias, e a Vila foi destruida e desocupada. A documentagao histérica refere também que Pero de Gées fez uma segunda tentativa, mudando-se mais para o Norte, para as margens do rio Itabapoana, onde fica hoje a chamada Vila de Limeira (Lamego, 1947; Amantino, 1993). Também ai nao obteve sucesso e, definitivamente, abandonou 0 projeto de colonizagao. outra tentativa mal sucedida de ocupagéo teria sido feita pelo filho de Pero de Gées, ainda na mesma regiao,a qual, depois, passou por m4os de outros donatarios e colonos até que, no final do século XVII, ali ja se havia instalado colonizacaéo permanente com engenhos, tornando-se a regido muito produtiva’. Embora haja varias possiveis localizagées para tais assentamentos iniciais, e provavelmente poucas evidencias arqueolégicas de sua construgéo, 0 achado, na praia de Manguinhos de duas antigas més de pedra, e ruinas, levou Casal (1976) e outros autores a acreditarem ter sido ali a primeira Vila da Rainha. As cartas originais de Pero de Gées a Martin Ferreira, e a D. Joao III, no entretanto, nada afirmam a esse respeito (CARTA DE +++, 1861). Por ocasiao dos primeiros trabalhos de campo do Projeto Vila da Rainha, foi localizado um sitio com sepultamentos humanos na praia de Manguinhos, préximo & foz do rio Guaxindiba, na 6 localidade de mesmo nome. 0 lendério local oferecia diversas interpretagdes para a presenga de ossadas humanas sepultadas nas areias da ‘praia, ora explicada como local de massacre, ora de enterramentos de escravos, ora como um cemitério indigena, ou cono un cemitério jesuitico. Por esta razdo, o cemitério da praia de Manguinhos, foi escolhido para uma escavacéo de sondagem, tendo por objetivo a verificagéo de uma hipdtese principal, a de ser este sitio um cemitério histérico antigo, contendo ‘remanescentes da Vila da Rainha de Pero de Gées. Foram ainda mantidas, como alternativas, as seguintes hipéteses secundérias: 1. Ser o sitio um cemitério, local de enterramentos pré- histéricos, 2. Ser o sitio um cemitério, local de enterramentos histéricos, mais recentes do que Vila da Rainha, 3. Ser o sitio um cemitério, local de enterramentos da populagéo atual, 4. Ndo ser o sitio um cemitério, mas sim local improvisado de enterramentos precarios (massacre, vala comum, etc.) © prosseguimento da pesquisa histérica, e a escavacdo arqueolégica levaram & exclusdo de algumas daquelas hipéteses, aceitando-se hoje ser este um cemitério histérico, cuja data remonta, muito provavelmente, ao século XVIII ou XIX, periodo de expansdo econémica e crescimento do povoamento na regiao. Embora as evidéncias iniciais tenham sugerido apenas a presenga de esqueletos de negros, provavelmente escravos, nao se exclui a possibilidade de que o prosseguimento dos trabalhos de campo permita evidenciar individuos pertencentes a diferentes grupos étnicos, inclusive segmentos sociais livres, dada a caracteristica muitas vezes mista de tais cemitérios, e a mengao por moradores locais de timulos com lapides, além dos sepultamentos simples j4 escavados. Por tais razées, ainda que o Cemitério de Manguinhos nao tenha preenchido os requisitos necessarios @ localizacdo de Vila da Rainha, sua escavagao nostrou ter o sitio um grande potencial para © estudo de aspectos sécio-econémicos do ciclo canavieiro, oferecendo material interessante e original de pesquisa. As informagdes arqueolégicas sobre tais ocupagées séo esparsas e, desse modo, a pesquisa de um cemitério como este, permitiria de imediato confrontar os modelos demograficos e médico-sanitarios existentes para a escravaria rural, com sua paleopatologia e paleodenografia. Ao ser aceita a hipétese de ser o cemitério de Manguinhos um sitio do ciclo canavieiro, com sepultamentos de escravos e ao se decidir aprofundar sua pesquisa, o levantamento histérico, bem como da tradig&o oral, foi dirigido também a questao da escravidio e suas conscqiiéncias demogréficas e¢ médico- 7) sanitaérias. Para atender a este objeto, vém sendo consultadas fontes do Instituto Histérico e Geograéfico Brasileiro, Biblioteca Nacional, Arquivo Histérico Ultramarino (na Biblioteca Nacional), Servigo de Documentagéo Geral da Marinha, entre outros. Admitindo como premissa teérica o potencial informativo das evidéncias funerarias e, considerando-se, com Goodman et al. (1988), que as analises osteobiograéficas, em perspectiva biocultural, podem auxiliar na verificagao de hipéteses acerca do dominio sécio-cultural, foi planejada a realizacao de uma escavagao sistemética, a qual, mesmo sendo de pequena’ extens4o, pudesse fornecer material para novas proposigées de trabalho. Assim, a partir das informagdes histéricas existentes sobre a vida nas fazendas coloniais, particularmente na regido acucareira de Campos, buscou-se estabelecer, paralelamente, um pano de fundo acerca da escravidio e das condicédes de vida dela decorrentes, em especial para o meio rural, tendo em vista o tipo de 4rea e processo econémico em estudo. No presente trabalho sao sintetizados os resultados iniciais da pesquisa, e as propostas para sua continuidade. ESCRAVIDAO E DOENGA: UM POUCO DE HISTORIOGRAFIA Embora haja muita controvérsia no que se refere a qualidade de vida dos escravos no Brasil, certamente diferentes modelos podem ser aplicados 4s varias modalidades ou momentos da escravidéo, seja ela rural ou urbana, do inicio ou do fim da colonia. A maior parte dos documentos, mesmo sendo de carater genérico, exemplificam um modelo ainda admitido por muitos como vAlido para as condigées sanitaérias decorrentes da modalidade de escraviddo aqui instituida, ou seja, de uma verdadeira maquina de consumir vidas humanas. Documentos sobre a area de Campos dos Goitacazes, referem condigdes precérias para os grupos escravizados, e embora a documentacdo priméria da Comarca de Campos ainda nao tenha sido completamente analisada, sabemos também que a regiao onde hoje situa-se o Estado do Rio de Janeiro, parece ter tido volumoso traéfico de escravos, desde muito ‘cedo, sendo um dos mais importantes nticleos de demanda por africanos do sudeste. Tal se deve, provavelmente, A instalacdo, desde o inicio da colonizacao, de um complexo agucareiro na area de influéncia de Campos. Alguns dados sobre o seu crescimento econémico, e conseqiiente demanda por escravos, podem ser assim sumarizadas: Seu acentuado crescimento pode ser comprovado pelo nimero de engenhos da regiao, que aumentou de 50 para 278 em pouco mais de 30 anos (1750-1783) chegando a 400 em 1810. Na virada do século XVIII o municipio possuia 328 Engenhos - 324 de agicar e 4 de aguardente, o que representava 53% do total de empresas desse tipo no agro fluminense. (...) De qualquer modo, o crescimento implicava no aumento de populagao escrava. Em fins do século XVIII, a vila Campista de sao Salvador, por exemplo, possuia o terceiro maior contingente de cativos da capitania (...) os 59% de escravos no total de seus habitantes, possivelmente conformavam a maior Porcentagem de escravos do Rio de Janeiro (Florentino, 1991). Quanto a regido do Norte Fluminense, tudo indica que a primeira leva de escravos entrou em Campos em 1545, quando Pero de Goes pediu a Martin Ferreira 60 escravos africanos da Guiné, 10 para a agricultura e 50 para os engenhos d/Agua, os quais foram trabalhar na segunda Vila da Rainha, no Itabapoana (Amantino, 1993). Por volta de 1648, Salvador Correa S4 e Benevides chegou também com imensa escravaria, assim sucedendo-se as remessas de m4o-de-obra. Dessa forma, j4 em 1779, a regiao contava com as maiores concentragées escravas localizadas nas Freguesias de Sao Goncgalo e Sao Salvador. Em 1827 0 nGmero de engenhos em Campos j4 teria chegado a& casa dos setecentos (Saint-Hilaire,1976; Lamego, 1947). Embora existam poucos dados especificos, nessa regido, de economia escravista em franco progresso, o tratamento dispensado ao escravo nado deve ter sido diferente do que ocorreu em outros locais. Muitas narrativas preocupam-se em relatar as condigées de satde e alimentagaéo dos escravos negros no Brasil, e nelas reafirma-se, continuamente, a precariedade de sua vida, dadas as m&s condigées de moradia, alimentagao, higiene, os maus tratos, a sobrecarga laborativa e, finalmente, as doengas de que eran portadores. Considerados como mercadoria, ou instrumento de trabalho, os escravos eram vistos como sopros de vida, destituidos de alma e, conseqiientemente, nao merecedores dos tratamentos dispensados a um ser humano. Estavam submetidos, principalmente no periodo colonial, a uma légica econémica de custo/beneficio que considerava desnecessaria a conservagéo de uma mercadoria tao barata, uma vez que éles restituiam ao proprietario o seu valor de compra, na forma de trabalho, em poucos meses. Por esta razéo, segundo Florentino (1991), ao contraério do que ocorreu na América do Norte, de um modo geral, o escravo nao era poupado, nem havia interesse dos senhores em estimular sua sobrevida, ou sua reprodugao, sendo mais prético e barato renovar seus plantéis. Diversos sao os fatores que poderiam explicar a doenga e a morte elevadas entre os escravos, iniciando-se pela captura, e os problemas decorrentes do transporte nos pordes dos navios negreiros. Sabe-se que no comego do trafico os navios eram pequenos e de péssima construgéo. 0 apinhamento, a precariedade da longa viagem maritima, causava doengas mesmo entre a marujada, e a desinsergéo social, aliada 4s doencas pré-existentes seriam determinantes na sua sobrevida'. Amontoados em infectos pordes, sem qualquer cuidado de higiene, alimentagéo precarissima e sem comida fresca, € ‘comum os africanos contrairem moléstias que se transformam em epidemias. Os doentes iam sendo jogados ao mar para néo contaminarem o resto da mercadoria. (..+) geralmente os negros contraem mal-de-luanda e muitos ficam tuberculosos, especialmente as criancas (..+) (Burlamaqui, citado por Chiavenato, 1987). Tais atitudes, talvez consideradas hoje como barbaras, expressavam a pratica das idéias da classe dominante, que permaneceriam sem contestagéo por um longo tempo. Eram legit imadas por todas as expressédes do poder, incluindo a Igreja Catélica, a qual € considerada por muitos como a grande ideéloga da escravidao no Brasil. A posigo da instituigao religiosa pode ser compreendida a partir de alguns relatos que descrevem, por exemplo, as atitudes esperadas nos proprietérios, em relacdo as suas pega: Haja acgoites, haja correntes e grilhdes, tudo a seu tempo e com regra e moderacao devida, e verais como em breve tempo fica domada a rebeldia dos escravos; porque as prisdes e agoites, mais que qualquer outro género de castigos, lhes abatem o orgulho e quebram os brios (Benci, 1977). Apés a longa viagem insalubre em que a mortalidade era elevada, fosse por acidentes, naufragios ou doenca, os escravos chegavam no Brasil em mas condigées fisicas. A partir de 1810, passaram a ser submetidos, por lei, a um tempo de quarentena para que, recuperando ou néo a satide, ndo apenas aumentassem seu valor comercial, como deixassem de ser ameaca aos demais. Além de méo de obra, o escravo era para o fazendeiro um investimento, sendo por isso explorado até o limite maximo de seu rendimento. Quando os engenhos ndo estavam moendo, os negros trabalhavam doze horas por dia no campo, com um pequeno intervalo para o almogo. Ainda eram explorados mais quatro ou seis horas, totalizando quatorze a dezoito horas de trabalho Gtil por dia. Esse proceso de exploragao maxima contribufa para liquidar fisicamente © escravo, cuja vida média esta estimada em torno de sete anos (Florentino, 1991), 10

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