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A evolucio dos Estudos de Seguranga Internacional Barry Buzan Departamento de Relagées Internacionais London School of Economics and Political Science Lene Hansen Departamento de Ciéncia Politica Universidade de Copenbague ‘Tradusio Flivio Lira g@ editora unesp 0 DESAFIO DA SEGURANCA NACIONAL DURANTE A GUERRA FRI Este carfruto £ dedicado as abordagens que, de vé- rias maneiras, provocaram os Estudos Estratégicos. Tais abordagens possuiam um aspecto em comum, a saber: sua critica aos Estudos Estratégicos, mas também se di- ferenciavam muito em relagio as escolhas de conceitos analiticos e politicos essenciais, tanto que seria dificil apresenté-las como uma tinica abordagem ¢ movimenté- -la,respectivamente, por meio de uma forga motriz apés a ‘outra. Um desafio significativo aos Estudos Estratégicos (embora operasse,em parte, dentro deles ¢ em parte com raizes na Pesquisa da Paz) era o Controle de Armamen- tos, 0 qual enfatizava o risco coletivo a sobrevivencia que surgia da intersegio da rivalidade das superpoténcias dos armamentos nucleares.! No contexto do Controle de 1) Dadoqueo Conk de Armaments osu rane os Erdos Eatgicose te Png d ay fade co sete apne te montanes Epo no Capital 4 ti ompido + dca enqunt colct> no ‘Capita Sto wc de mibimiar 0 pote neo gul os gandes eee toe do Conte de Armumento foam consequent doe debts de Erdos Eartegce Eve note um pce pane obaants prs part sa capt separa asin simu ncaa eum das ater ‘lagi ee apt ngs 166, uo eas ae EMCO Armamentos o ramo Pesquisa da Paz oferecia uma visio de dissuasio ‘muito distinta, conduzida de maneira mais normativa e politica, do «que ados Estudos Estratégicos. Mas ainda era, de acordo com a lente das quatro questdes que estruturam os ESI e que foram delineadas, ‘no Capitulo 1, uma abordagem de seguranga que se focava nas di- _mens6es militares © em ameacas externas. ponto até o qual a maior parte dos pesquisadores da paz dentro do Controle de Armamentos considerava a bipolaridade uma estrutura que poderia ser acalmada, mas nfo erradicada,era surpreendente. A détente—alternativa politica para a contengao e a dissuasdo — era vista como uma “rivalidade com ‘menores riscos de guerra; nao um fim da guerra” propriamente dita (Buzan et al.,1990, p.9 ef. também Pastusiak, 1977; Schlotter, 1983). ‘Outras partes integrantes da Pesquisa da Paz assumniam uma abordagem mais radical, tanto analiticamente quanto politicamente, defendendo que os governos de ambos os lados da Cortina de Ferro ‘mantinham suas populagdes e o planeta ~ reféns do desastre nu- ‘lear. Isso constitufa a “humanidade" ou o individuo como o objeto de referencia, em vez do Estado, evocando, a partir dai, a longa tradigao liberal de realizar um escrutinioeritico das relagdes entre os cidadios €-as instituigdes de autoridade e soberania descritas no Capitulo 2. Os pesquisadores da paz, porém, nfo se imiscuiram no conceito de seguranga ao tecer suas criticas aos Estudos Estratégicos, mas sim no conceito oposto de “paz”, tanto paz positiva quanto negativa. A paz negativa era definida como a auséncia da guerra, da violencia fisica em larga escala ou violencia pessoal e abria uma agenda de pesquisa fem seguranca militar (Galtung, 1969, p.183). A paz positiva tinha iiltiplas conotagdes. Nos anos 1950 e 1960, la era definida como 1 “integragio da sociedade humana” (JPR, 1964, p.2), mas, ao fim da Guerra Fri, foi reformulada para incluir a “violéncia estrutural”, que cnfatizava a injustia social e a desigualdade (Galtung, 1969, p.168, 171, 175). Conceitos académicos bem-sucedidos geralmente devem sua popularidade a habilidade de encapsular um corpo de pesquisa cexistente ou prestes a florescer, a0 mesmo tempo que definem uma ans tag EOL BEAR 167 nova pesquisa de agenda conceitualmente enfocada. A violencia estru- tural se encaixava de modo perfeito nessa férmula. Ela fornecia uma Ancora para o trabalho em questoes de desenvolvimento, contlitos domésticos, tanto nas sociedades ocidentais quanto no Tereeiro Mun- do, recursos ambientais, dieitos humanos e explorago econdmica ‘Também incorporava parte de uma agenda marxista critica, embora indo endossasse a reivindicag’o marxista radical de uma revolugo violenta. Ainda assim, como que prevendo a ampliaglo dos debates de ESI no pés-Guerra Fria,a expansio da “paz” para além da auséncia de sguerra/conflit foi criticada, nfo apenas pelos Estudos Estratégicos, ‘mas também dentro da Pesquisa da Paz. ‘Do mesmo modo que os Estudos Estratégicos, nem o Controle de Armamentos nem a Pesquisa da Paz considerava a “seguranca’ em um primeito plano, mostrando, em vez disso, conceitos paralelos ¢ ‘opostos, por exemplo, détente, Controle de Armamentos, paz, violéncia estrutural, necessidades humanas bésicas e justia social. Em 1983, ‘Buzan (1983, 1984a) poderia, entdo, descrever seguranca como um “conceito subdesenvolvido”, mas, na medida que a década chegava 420 seu fim, a “seguranca” surgiu como um conceito que conectava as areas de Estudos Estratégicos e Pesquisa da Paz. O conceito de Seguransa Comum, cunhado pela Comissio Palme em 1982, igou 0 Controle de Armamentose as preocupagdes mais amplas 4 qualidade de vida mundo afora,tornando-se um conceito popular que conectava ‘© mundo das politicase as parcelascrticas dos ESI. Artigos que ex- pandiam a concepgio militar de seguranca para seguransa ambiental © econdmica comesaram a aparecer em destacados periédicos, por exemplo, o International Security (Ullman, 1983) e o International Organization (Buzan, 1984b). Por fim, duas novas perspectivas acadé- micas, o Pés-estruturalismo e o Feminismo, que haviam causado um impacto nas ciéncias sociaise humanas, partindo em geral da Pesquisa da Paz, firmaram-se como abordagens distintas. Quantitativamente, essa literatura era bem menor do que a do Controle de Armamentos eados Estudos Estratégicos; ainda assim, pelas mudancas trazidas & 168, ups eo cma MEN tona pelo fim da Guerra Fra, ela se mostrou significativa em relagdo maneira como os ESI se desenvolveram. Se nio houvesse uma pe~ ‘quena, porém crescente, preocupasio com conceitos mais amplos de seguranga nos anos 1980, € duvidoso que as abordagens mais amplas dos anos 1990 pudessem ter erescido da maneira como o fizeram 20 fim da Guerra Fria. Para lidar com as diferentes correntes de oposiglo aos Estudos Estratégicos,estruturamos 0 capitulo da seguinte maneira: a proxima segio pressupée que o leitor tena fresco na meméria o relato de Estudos Estratégicos e a maneira por meio da qual as cinco forcas ‘motrizes conduziram tal literatura, focando-se em como as duas forgas| ‘motrizes da politica das grandes poténcias e da tecnologia levaram a Pesquisa da Paz e o Controle de Armamentos a terem uma visio diferente de dissuasto e de tecnologia militar. Ja que a Pesquisa da Paz fancionava, em larga escala, como uma imagem/atacante de formato espelhado, estando, portanto, amplamente centrada no mesmo con- junto de eventos que os Estudos Estratégicos, ndo ha segdo especifica sobre essa forga motriz ‘A terceira sesio converge para conceitualizar a paz positiva como integragio,de modo a expandir a agenda de pesquisa, ato que implica tanto em um desafio da compreensio realista de seguranca internacio- nal quanto em uma compreensto mais precisa acerca da importancia da coesio doméstica. Analisando as forgas motrizes, esta pesquisa foi parcialmente induzida por uma combinagao de eventos, tais como a formasio da OTAN e da Comunidade Econémica Europeia, a crescente densidade da cobertura midiatica em massa e 0 impacto de movimentos pela paz e por direitos civis. Também foi conduzida por fatores académicos internos, na medida que a Pesquisa da Paz se

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