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As Clausulas Gerais como Fatores de Mobilidade do Sistema Juridico Juorra: Marruns-Costa Professors de “Instituigies do Direito” na Universidade Federal do Rio Grande do Sul SUMARIO 1. Introduedo. 2. O perfil da cldusula geral, 2.1. — Cléu- sulas gerais ¢ principtos gerais de direito. 22. — Cldusulas gerats e concettos juridtcos indeterminados, 3. A idéta do Cédigo como “etzo central” do sistema furidtco, 21. — A flex! do Cédigo através do emprego das cléu- sulas gerats. 4. Conclusdo. 5. Bibiiografia. 1. Introdugao ‘A proposigéo ora apresentada diz respeito ao exame das cléusulas gerais como fatores de mobilidade do sistema juridico do tipo codificado, tais como se apresentam os sistemas integrantes do que RENE DAVID chamou de “familia romano-germanica de direito”*. Por isto mesmo, uo abordar a problemética dus cléusulas gerais ¢ preciso, desde logo, ter presente nogao de sistema juridico, e, bem assim, a trajetéria desta nogao, pelo menos em seus tragos mais largos. ‘Trata-se de versio, para o idioma portugués, de conferéncia apresentada em 12-4-91 no Seminario Internacional “Critica de los paradigmas de Ia teoria del derecho” realizado em Valencia, Espanha. 1 In Os Grandes Sistemas do Dtretto Contempordneo, trad. port. de Herminio ‘A, Carvalho, Lisboa, 2° ed. legist. Brasilia a. 28 on. 112 out./dex. 1991 13 Uma questio preliminar se impde: como sabido, a nogo de sistema no 6, nem mesmo no interior da ciét juridica, uma nogo untvoca *, derivando sua polissemia nao sé da ética particular do estudioso®, mas, principalmente, das particularidades de cada um dos perlodos hist6ricos da formacio do ordenamento que se tem em vista examinar. Por isso, a idéia que aqui se toma de “sistema” é, antes de mais nada, aquela deduzida do método comparativista, de “grupos de ordenamentos juridicos”, vale dizer, sistema enquanto estrufura particularizada pelo emprego de determinado vocabulério correspondente a certos conceitos, pelo agrupa- mento de regras em certas categorias, pela utilizagao de determinadas téc- nicas de interpretacdo, e por espectficas concepgdes da ordem social que determinam o modo de aplicagzo e a propria fungo do ordenamento jurfdico *. 2 Por sistema, em geral, tem-se “la distribucién de las diferentes partes de una forte o de uno clenola, en io que se austenten todas mutuamente y en la cual jas witimas se explican por las primeras”, cf. CONDILLAC, Traité des Systémes, clt, por A. Lalande, Vocabuldrio Téenico 'y Critico de la Filosofia, Buenas Aires, 1968, pp. 987 e 93, ou “orden de conocimientos sobre un punto de vista unitario”, of. COING H,, “Zur Geschichte des Privatrechteystems” opud FRADERA, Vera M. © Direito Privago como uma Geschlossenheit; 0 Direito Privado como um Sistema Aberto, Porto Alegre, 1988, p. 8 Veja-se também BOBBIO, N. Teoria Generat del Derecho, que examina a questiio especifica do sistema normativo em sus relago com o direlto, seu sentido, condigdes ¢ mites, analisando as varias acepgies do término, em especial o que se tem por “sistema dedutivo ou ldgico”, “claasificecio” —- de onde surge a Idéia de “relacdo juridica” — e enquanto “valldade do principio que exclui a incompatibilidade des notmes’, examinando pois @ questéo das antinomias, da coertncla e da totalidade do ordenamento (op. 115 8 20D. % Evidentemente nfio se quer, com este expressiio, recair em uma espécle de ‘voluntariamo ultrapassado, "A ética particular do estudioso” significa tho-s6 a. coneepedo de “sistema” que ele mesmo adotou para seu estudo: pode ser, pols, ou @ nogho de sistema do direito comparado, ou a comparacio geral do Direito, ou, ainda, 8 diferenciagSo estrutural e funcional de um tinico sistema, daf deri- vando as nopfes de sistema aberto e de sistema fechado. 4 Veja-se RENE DAVID, op. cit, $4 15 a 26. Nesta perspective também se mos- ‘tra impossivel a separagdo entre as idéias de “sistema juridico” e “sistema cultural”, intercambidvels nos aspectos de sua organicidade, possibllidade ¢ atualidade, que ‘Yo se Tefletir no conjunto de valores sociais em jogo: “la relazione necessaria con una, societa datts fa della cultura positiva un insieme struturatto organicamente; Ja relazione egualmente necessaria con il tipo di vista sociale fe dell'insieme organico della cultura positiva un sistema di valori”, atirmou ANGELO FALZEA, assinalando que, o que “forma Una communité gluridica ¢ il commune tipo di vita", pois “8 precisamente un sistema unitario di interessi oldche fa di una pluralité di uomini una communita gluridies”. Assim, a idéia de direito como sistema de interesses — interesses comuns, reais ¢ realizévels, que agregam 0 conjunto de individues como um grupo organic, caracterizado por seu tipo especifico de existéncla — configura-se dado que ha “una funzione metodologica imprescindible per In sclenza del diritto, e quind! un ufficlo no pid scientifico-tormale e acter titico-Ideale, ma sclentifico-sostanziale e sclentifico-reale”, na medida em que @ ciéncia juridica é uma ciéneia principalmente hermentutica que, em sua stuscéo, (Continua) 16 R. Inf. legiel, Brovitia a. 28 on, 192 our/dex. 1991 Assim, frente ao sistema ou “familia” juridica que mais de perto nos diz respeito — o sistema romano-germanico — caracterizado, entre outros aspectos, por sua metodologia fundada na lei escrita, na separagéo entre 0 Direito Puiblico e o Direito Privado, entre o direito material e 0 direito processual, e, no plano politico, pela observancia a tripartigao dos Poderes do Estado, tém evidente cabimento as intimeras discussdes travadas hé longo tempo pela doutrina acerca do seu caréter estrutural, se fechado ‘ou se aberto, isto é, se constitui uma totalidade expressa em um conjunto de conceitos e proposigées entre si logicamente concatenadas, “unidade imanente, perfeita e acabada”* que se auto-referencia de modo absoluto cujo modo de expresséio privilegiado € 0 Cédigo, ou se, a0 contratio, nesse sistema, 0 Direito pode ser pensado, aplicado e interpretado como ordem de referéncia apenas relativa, sensivel & interpenetragdo de fatos e valores externos, consubstanciando “permanente discussio de problemas coneretos”®, para cuja resolucio se mostra adequado nfo o pensamento légico, mas 0 problemitico, onde a base do raciocinio esté centrada na compreensio axiolégica ou teleoldgica dos principios gerais do Direito?. Nesse sentido é possivel afirmar que no inicio de sua formagio, por volta dos séculos XIJ e XIII, com a redescoberta, nas universidades entdo nascentes, do Corpus Juris justinianeu, o sistema juridico romano-germanico ‘Se apresenta como um “sistema aberto”, porquanto sensfvel A interpene- tragéo de imimeros outros estatutos (ou, como diriamos hoje, microssiste- mas) ¢ de valores (que em linguagem atual chamarfamos de metajuridicos) justamente porque se assenta, como bem observou FRANZ WIEACKER, em um triplice fundamento: o imperium, a Igreja Romana e a tradicao escolar da Antigiiidade tardia, “‘restos que os novos povos e tribos assentes no antigo corpo do impétio ¢ no centro da Europa receberam e acabaram Por se apropriar”’ ®. © sistema assim inicialmente formado, onde teve relevantissimo papel a interpretago das regras do Corpus Juris a cargo dos doctores — e ope- rada em especial através da dialética entre os bindmios mens-verba, verba- (Continues da nota 4) opera necessariamente com “I'idea di sistema gturidico e in concretto presupone sempre un'esperienza, sia pure intuitiva e sintetlea, della totalitd del sistema”, Mas € preciso néo esquecer que esse sistema “comme ogni sistema culturale, ha una struttura complessa", afastando-se, em conseqiiéncia, por sua insercfio no untverso do sistema cultural, a idéia de “plenitude légica”, antinémica e a de complexidade (Ver FALZEA, op. clt., pp. 14 a 26). 5 FRADERA, Vera. O Direito Privado como uma Geschossenheit; 0 Direito Privado como Sistema Aberto, Porto Alegre, 1988, p. 9. 6 VIEHWEG, Theodor, Tépica y Jurisprudéncia, Taurus, Madrid, 1964. 7 Neste sentido, Clovis do Couto e Silva, “O Direito Civil Brasileiro em Pers- pectiva Histérica e Visio do Puturo”, cit, bibliog. 8 WIEACKER, Franz, “Histéria do Direito Privado Moderno”, elt, bibliog, p. 16. R inf. legist, Brasilia oc. 28 mn. 112 out./dex, 1997 15 voluntas ¢ mens-aequitas® vai, todavia, progressivamente se fechando, por- quanto, em razio da necessidade de maior certeza ¢ seguranca, se mostra convenienie privilegiar determinadas fontes de produgio juridica. bam 5 que as imensas potencialidades operativas de tal interpretagio sce por conduzir a um “liberelismo juridico”, isto é, nas palavras de wanlo REIS MARQUES, a “uma plutalidade de posigées ¢ de solugdes para uma mesma questio” !, O recurso, jé no séc. XIV, a “comum opi- io dos doutores" # se mostra o meio hébil & fixegdo de um patamar de regras e princ{pios que visam alcangar a certeza e a seguranga na aplicagho do Direito, valendo o pensamento dos doutos, na auséncia de lei, como uma verdadeira norma juridica. Em contrapartida, tal recurso j4 importa em ‘uma relativa rigidez do sistema !. Nio se pensava ainda, na idéia de codificago, que s6 surgiré quatro séculos mais tarde com o apogeu da necessidade de certeza juridica. Na base dos c6digos esté, como sabemos, o pensamento jusracionelista pelo qual o Direito é visto e formulado como um sistema fechado de verdades da razio", derivando do conhecimento de verdades filoséficas, um sistema 9 Veja-se, em especial, Mario Rels Marques, op. cit, pp. 6 = 12. Assinala o do direito verdadeiros mi Juridicos sustentados por uma nova vida social de felefio urbana — superada, em termos pela atividede dos *, pela qual busca-se “face a uma Permanente movimento”, rigida, ampliou seu Ambito de splicac&o, “contribuindo para uma mator flexibilidade do ordenamento juridico” (pp. 6 7, em especial nota 2). 10 Idem, p. 12. Como conseqUéncie das opiniones quotidie mutandur se origi- nou, a partir do séc. XIV, o costume de apelar-se para a communis opinio doctorum através da qual a jurisprudéncia vai desenvolver como um todo e, como tal, fator do certeza e certificagSo do sistema. 11 Idem, ibidem. 12 Idem, p, 13, nota 14. 13 Voja-se KOSHACKER, Paul, Europa y Derecho Romano, olt., cap, XIV. WIEACKER, F., Histérla do Direito Privado Moderno, cit, cap. IV, VILLEY, M. Les Fondateurs de U'tcole du Droit Naturel Moderne au XVII Sciécle, A. D. P. 1961, THOMAN, M. Histoire de Tidéologie Juririque du XVII Sotécle: ou te Droit Prisionnier des’ Mots, APD, 1974, © Un Modéle de Rationalité Idéologique: le ‘rationalisme’ des Lumiéres, APD, 1978, MEREA, P. Escoldstica ¢ Jusnaturalismo — 0 Problema da Origem do Poder Civil em Suarez ¢ em Puffendor/ BPDUC, 1943, © Direito Romano, Direito Comum e Boa Rezo, BFDUC, ano XVI. 16 R. Inf. legisl, Brasilia a. 28 on. 112 out./dex. 1997 de regras que so o resultado de uma rigorosa construgdo légico-matemitica, a qual parte de regras gerais, deduzidas pelo raciocinio +. Tal pensamento se consubstancia, jf no séc, XVIII e, em especial no sec. XIX, nas grandes codificagdes européias. E embora no seu substrato mais profundo 0 fendmeno da codificagdo guarde alguma similitude com © ocorrido no séc, XIV — pois o que se visa obter, seja através da sedimentagéo da communis opinio, seja através da consagragao da lei em um corpus especifico é, na verdade, um pardmetro de cerieza e seguranca juridica — uma das grandes diferencas est que, no primeito caso, o Direito € ainda construido pelos juizes e juristas, envolvendo-se, em conseqiiéncia, intimamente com a pritica, para no segundo ser elaborado pelos profes- sores de modo que, s6 através da legislacdo, vale dizer, dos cédigos, vai poder influenciar na prética *, Os Cédigos representam a manifestagio maxima de um sistema do tipo fechado. Supdem, em especial na drea do direito privado, uma socie- dade unitéria e formaimente igualitéria * para a regulagdo de cujos inte- resses seria suficiente a perspectiva de unidade, totalidade ou plenitude que, filoséfica e metodologicamente adotam. 14 0 exemplo precursor deste tipo de codificacio esté na legtslacéo civil bavara do século XVIII do Principe Eleltor Max Joseph TIT, Na mesma regio surge, em 1812, 0 Cédigo Penal, “monumento do Jusnatitralismo critico pés-Kantiano”, na opiniso de Wlescker. Também diretamente conseqtiente 20 pensamento ilumt- nista, @ Cédigo da Prissia de 1786, J4 de cardter eminentemente “sistemético” assim como o ABGB (Allgemeines Birgerliches Gesetzbuch fiir dle deutschen Erblande) de 1811, Nenhum deles, todavia, superou # grandiosidade do Cédigo Napolednico, que, além de substituir os particularismos feudals por um direlto Beral dos cltoyens tranceses, baseado na razSo ¢ na ctenca jusnaturalista ne Jel, teve, como seu malor mérito, seu “cardter revolucionério”, carseteristiea que assegurou ao dito Cédigo, nas palavres de WIEACKER, “uma missio histérica, em todas as nagdes que comeraram a modelar-se de acorde com a imagem da francesa, especlalmente naqualas que viem af uma emancipaco em relacho a formas de opressio Interna ou externa” (pig. 391). Diferentemente 0 Cédigo Civ Alemflo (BGR) teve criacho positivista na plenitude e no rigor da estrutura coneeitual, afastando-se, pols, dos postulados jusractonalistas. 15 KOSCHAKER, op. cit. 16 A idéla de “socledade formalmente igualitéria” pode set observada sob uma dupla perspectiva. & impossivel a critica e eate tipo de flecéo sem o exame das yazées que conduziram & sus formulagSo. Na origem esté, efetivamente, a preo- cupagio dos pensadores dos séculos XVII e XVIL, com origem em HOBBES, Passando por Montesquieu! e Rousseau, em estabelecer na lel condigho de igual- dade, o valor “seguranga”. antes imprescindfvel como fator da limitagéo & voniade ‘srbitrétia do soberano. Portanto, veja-se, entre outros, BOBBIO, Estado, Governo € Socledade, Séo Paulo, 1987, ¢ SCARPELLI, “Dalla Lege al Cotice, dal Codice ai Princip, cit, A segunda corrente, onde 0 @ixo esté na palavra “formalmente”, 8 que se refere mals as conseqlléncias, a partir do século XIX, dessa idéia. Veja-se, a propdsito, também, RAYNAUD, Philippe, La Loi et la Jurisprudence, des Lumires @ 1a Revolution Frangaise, APD n° 30, p. 61 ¢ PRIEUR, Jean, Juris- prudence et Principe de Séparation det Pouvoirs, APD n° 90, p. 117. R. Inf. legist. Brasilia 0, 28m, 2 out./dez. 1991 7 Como conseqiiéncia desta perspectiva, também a atividade interpre- tativa se ressente, restando a jurisprudéncia remetida a estrita aplicagio da lei, ou seja, a idéia de que ao juiz cabe apenas a tarefa de aplicar a lei dentro da legalidade mais estrita: “que la loi soit claire, forme et précise: Vinterpréter, c’est presque toujours la corrompre”, afirmou ‘VOLTAIRE "' expressando com vigor a idéia de plenitude do império da lei. Como sabemos, tais concepgSes vao ser postas em causa jé no final do século XIX, lembrando WINIFRIED HASSEMER, KARL LARENZ ¢ JOSEPH ESSER, entre outros que, desde 0 inicio do século XX a Teoria do Direito, em especial na Alemanha, vem sendo compreendida como “‘o debate da polaridade da norma legal, de um ledo, ¢ da sentenca judicial, de outro*. Este debate introduz 0 que se convencionou chamar de “a crise da teoria das fontes”, a qual sesulta, basicamente, “da admissio de principios tradicionalmente considerados metajuridicos no campo de ciéncia do Di- reito” ® porquanto se passa a compreender que “um cédigo, por mais amplo que seja, nao esgota o Corpus Juris vigente” *°. Com efeito, na tarefa incessantemente exercida pela Ciéncia Juridica desde pelo menos o século XII, de edaptar o Direito ao dinamismo des relagdes sociais, se leva em conta, agora, que o sistema juridico deve considerar também, ao lado da norma de diteito escrito, principios, mé- ximas, regras da experiéncia, usos, diretivas reveladoras da cultura. O sistema juridico, assim considerado, volta a ser tido como um “sistema aberto”, porquanto a sujeiggo ao ordenamento jé nao mais se revela como mera servidio & lei, formalmente caracterizada: “o direito ‘positivado 6 apenas uma parte do conjunto, a sua parcela mais vistvel, mas nele convivem os principios gerais do Direito, os postulados do Direito Natural, o sentimento de justiga, a exigéncia de eqiiidade, vivenciados e sentidos pela sociedade na qual o juiz habita”™, afastando-se, por conse- qiéncia, a idéia de que o Direito possa ser aplicado, interpretado ¢ desen- volvido a partir de si mesmo — seja através das representages do legis- lador, seja por intermédio de um suposto “sentido imanente” =?. Por outro lado, é preciso atentar para o fato de que a extrema aber- tura do sistema néo conduza a sua propria desaparigao, porquanto tal 17 WIEACKER, Histéria..., p. 528. 18 Apud M. Reis Marques, op. cit. 19 Cf. ENGISH, op, cit: Ainds, HASSEMER. in O Sistema do Direita ¢ a Codt- dese pro- Heagdo: A Vincwlagdo do Juis d Let, elt., p. 189. Para a compreenstio Geavg, velucse, por todos, LARENZ, “Mefodologia, © ESSER, Principio y Norma, ‘bibliog. 20 COUTO E SILVA, Clovis, A Odrigagdo como Processo, ett., p. 74. 21 Idem, thidem. 22 AGUIAR JONIOR, R. interpretagto, cit, p. 18. 18 R. Inf, Fogisl. Brositia @. 28 nm. 112 out./dex. 1997 caminho levatia a um estado de incerteza juridica inconciliével com os proprios postulados da democracia: € preciso manter um determinado patamar de seguranga nas relagdes juridicas, seja na relagio dos privados entre si, seja na relago entre estes ¢ o Estado sob pena de ser instaurada a lei do mais forte, assentado que o principio da cerieza juridica & essencial as fungdes de tutela e garantia as quais o Direito se opde. Quais serdo, entio, os mecanismos do que a ordem juridica dispoe para que o sistema, devidamente flexibilizado, possa continuamente ajus- tar-se as novas realidades, as novas idéias, em busca da efetivagao de um direito justo? Como atuar para que, frente & lei, néo se permita o fetiche da Ie? Quais sero os pontos de referencia « permit tal neceséria pst a A resposta a tais indagacdes pode talvez ser obtida através do estudo das cléusulas gerais, que, em diferentes ordenamentos, tém se mosttado os meios hébeis a flexibilizagio dos sistemas que as adotaram. Para tanto, na primeira parte, se examinarg, com o auxilio do método comparativista, sua _utilizagao e seu alcance no dominio do direito civil. Seré preciso, to- dayia, também examinar quais as solugdes que tém sido encontradas em sistemas juridicos que carecem de tais mecanismos, para a obtengio de uma fungio andloga. 2. O perfil da cldusula geral No exame das normas, técnicas e institutos integrantes de determinado sistema juridico, uma atitude metodologicamente adequada € a que se volta ao exame de sua estrutura, para assim alcancar o perfil particularizado do tema que se tem como objeto da pesquisa. Integrando 0 corpo dos Cédigos, as cléusulas gerais apresentam, como primeira particularidade, o fato de néo possufrem qualquer estrutura pro- pria que as diferenciem dos conceitos juridicos indeterminados. Assim, parece imperioso verificar quais so as suas especificidades, apurando-se no que diferem das normas que tracam princfpios gerais e daquelas que contém os chamados conceitos indefinidos. 2.4. Cldusulas gerais e princtpios gerais de direito Principios juridicos so os pensamentos diretores de uma regulagio jurfdica existente ou posstvel, niio constitwindo, por si mesmos, regras sus- cetiveis de aplicagdo, embora possam transformar-se posteriormente em regras juridicas, por via de interpretagao ™. Enquanto “pensamentos diretores” ou “f6rmulas gerais”, os principios podem se encontrar expressamente manifestados na lei, ¢ em especial, no 23 LARENZ, Metodologta, clt., p. 168. R nf. legisl. Brasilia, 28 mn. 112 out./dex. 1997 Ww plano constitucional, nas normas que tutelam os direitos e garantias indi- viduais, como sio exemplos, no sistema brasileiro, 0 principio da igual- dade perante a lei (art. 5.°, caput, da Constituigéo Federal), o da liberdade do exercicio profissional (art. 5°, XIII) e o da fungao social da propriedade (art. 5°, XXIII). Muitos outros encontram-se dispersos pelo corpus cons titucional — como é 0 caso do principio da moralidade administrativa (art. 37, caput), ou ainda, pelos diversos estatutos infraconstitucionais, af se alinhando, por exemplo, o princfpio da liberdade de forma dos atos furfdicos de que trata o art. 129 do Cédigo Civil. No entanto, existem outros principios que se situam no plano pré positivo, vigindo “independentemente da existéncia de uma regra de direito nesse sentido” *, porquanto pertencem & categoria dos princfpios que s¢ colocam no ordenamento juridico antes mesmo, ott independentemente, de sua expressa adocdio por uma regra de direito positivo. E que se tem por assente, pelo menos desde a obra de JOSEPH ESSER (Princtpio e Norma na Elaboragdo Jurisprudencial do Direito) que a apli- cago desses principios, eficazes, como se viu, independentemente do texto legal, encontra sua justificagio na “natureza das coisas ou da ina respectiva” uma vez constituirem “uma pega funcionalmente necessdrias de toda a solug&o concreta”** que entre no circulo comum de problemas passiveis de serem enfrentados mediante o recurso aquele pensamento. E 0 que core ne di direito civil brasileiro com o princfpio da boa-fé. Nao temos, em nosso Cédigo Civil, uma disposi que o adote expressa- mente, como ocorre no direito alemio com 0 parégrato 242 do BGB, no direito francés com o art. 1 135, no direito espanhol com o art. 7.° I, no direito italiano com os arts. 1.337 © 1.366 ou ainda, no direito civil portu- gués, nos arts, 239 e 762, 2° Presente, todavia, sua indiscutivel importincia, conatural a prépria idéia de “Direito”, a boa-fé € entre nés positivamente considerada, funcio- nando como critério orientador para a solugio judicial de casos concretos*™*, dete derivando muitos outros “deveres anexos” ou “secundérios”, como 0 dever de informar com correco na publicidade comercial, por exemplo, ot %4 COUTO ¢ SILVA, Clovis. Principes Fondamentauz..., cit. p, 29. 35 ESSER, op. cit., p. 7. 26 Veja-se, em especial, CLOVIS DO COUTO E SILVA, in O Principio da Boa-Fé no Direito Brasileiro e Portugués, cit., de onde afirma-se que, niio obstante ‘seria quando se tem presente sua fungio lmitadora do exercicio sbusivo dos direitos Subjetivos”, Isto ocorre, mesmo se nfo h& um dispositive expresso, também pela razSo de sua apiicacio constituir “o resultado das necessidades étlcas exsenciais”. © autor rovonecr, ainda, que, quando nfo existe ume, depose, legis legislative “a percepeSo ou captacio de sua aplicag§o torna-se dificil, por nfo exits una In de referéocia que Possam os juires nela relaclonar sua, Gecisho", 2 R. Inf. Hegisl. Brasilia 0, 28 n, 112 out./des. 1991 © dever de atuar com lealdade no periodo anterior & efetiva contratagéo. Recentemente, assim se posicionou a 5." Cémara Civel do Tribunal de Justiga do Rio Grande do Sul, interpretando um contrato de compra © venda no qual a vendedora, apés a entrega da loja e das mercadorias — objeto da avenca — cancelou pedidos de mercadorias anterior mente feitos, ferindo a justa expectativa do comprador. Decidiu o Tribunal, por unanimidade, que “‘o principio da bosfé supde deveres anexos, de acordo com a natureza do negécio ¢ a finalidade pretendida pelas partes”, de modo que “entre eles, se encontra a obrigacao da vendedora de pequena Joja de vestudrios nao cancelar pedidos jé feitos, com o que inviabilizaria © negécio ¢ frustraria a justa expectativa do comprador”,*” baseando-se pois a decisio no venire contra factum propriunt, aplicével em razo do dever de lealdade que decorre da boa-fé. Todos os prinefpios, positivados ou néo, necessitam de concrego. As cléusulas gerais atuam instrumentalmente como meios para esta concresdo porquanto so elas elaboradas através da formulagio de hipétese legal que, em termos de grande generalidade, abrange e submete a tratamento jurtdico todo um dominio de casos ®*. Por esta via, idéias genéricas ¢ alheadas de uma elaboracio acabade e casufstica — como as de boa-fé, bons costumes, uso abusivo de direito, usos do tréfico juridico e outras similares, que sé produzem frutos quando animadas por problemas reais, passam a funcionar como “pontos de partida para a formagio concreta de normas juridicas” **. Tais cldusulas, pelas pecutiaridades de sua formulacdo legislativa, néo apenas consubstanciam princfpios, mas permitem a sua ¢fetiva insercao nos casos concretos. Cléusula geral, portanto, nfio é principio — é norma. Mas é norma especial A medida em que, por seu intermédio, um sistema jurfdico fundado na triparticio dos poderes do Estado e no direito escrito Permite ao juiz “a conformagio & norma, & luz de princfpios de valor nio codificados, e com vinculagao, controlada apenas pelos préprios tribunais, a critérios extralegais —- mas em todo o caso convencionais — de base ¢ de densidade empirica variéveis. Nao sio direito material posto pelo legis- lador, mas, simplesmente, standing poinis ou 1 pontos de apoio para a forma- gio judicial da norma no caso concreto” ®. ‘A grande diferenga entre princfpio e cléusulas gerais, do ponto de vista da atividade judicial, esté, pois, em que estes permitem a formaco 27D. Ap. Civ. n° 589073956, rel. Des. Ruy Rosado de Aguiar Jmior, 19-12-89. ‘Na fundamentagéo do voto 0 Des. Relator expressou que “o principio da bos-fé, com alcance geral, vigora no Brasil, apesar de nfo constar no nosso Cédigo Civil Gispositivo semelhante ao } 242 do BGB” (grifamos). 28 ENGISE, op. cit, p. 188. ‘2% ESSER, op. cit. p. 195. 30 Idem, pp. 198 e 194, R. Inf, logis! Brasilia a. 28 nm. 112 out./dex. 1991 21 da norma néo através da interpretagio do principio, mas pela criagio, através da sfntese judicial’, onde encontram como elemento de atuacfo fatos ou valores éticos, sociolégicos, histéricos, psicolégicos, ou até mes- mo solug6es advindas da andlise comparativista, atuando tais critérios tra- dicionalmente tidos como extralegais através das verdadeiras “janelas” consubstanciadas em tais cldusulas. 2.2. Cldusulas gerais e conceitos juridicos indeterminados Bem mais complexo € 0 disctime entre as cléusulas gerais ¢ os cha- mados conceitos jurfdicos indeterminados porquanto ambos, como bem assinalou KARL ENGISH, pertencem ao plano dos conceitos de direito eqiiitativo € n&o ao plano do direito estrito, contrapondo-se, pois, formal e ‘metodologicamente, & casu(stica **. Os conceitos indeterminados podem se reportar tanto a realidades vatorativas quanto a redlidades jéticas. Por sua vaguidade e ambigtidade slo muitas vezes polissémicos, daf permitindo razodvel dose de liberdade por parte do aplicador da lei no momento de sus aplicacio. Ocorre que tais conceitos integram, sempre, a descricio do “fato” que a norma pretende abranger. Embora permitam, por sua fluidez, uma abertura as mudancas de valoracio, a verdade é que, por integrarem a descrigdo do fato, a liberdade do aplicador se exaure na fixagfio da pre- tmissa. Assim, “uma vez estabelecida, in concreto, a coincidéncia ou a nao coincidéncia entre o acontecimento real eo modelo normativo, a solugio estaré, por assim dizer, predeterminada” **. Poderfamos portanto afirmar que hé uma diferenca de grau no que tange A abstragdo e & generalidade, distingo que ficaré mais clara se tomarmos, a titulo de comparagio, as disposig6es do art. 395, inciso III, do Cédigo Civil Brasileiro e a do pardgrafo 826 do Cédigo Civil Alemio. Ambas referem a expressio “bons costumes”, da seguinte forma: “art, 395. Perderé o pétrio poder 0 pei ou a mae: TI] — que praticar atos contrérios & moral e aos bons cos- tumes. (Cédigo Civil Brasileiro.) 31 Idem, p. 195. ounscreve particulares grupos de casos na sua especialidade propria” (op. cit. p. 188), Assim, no COdigo Civil Brasileiro, os arts. 1.122 (contrato de compra ‘Yenda), 802 (extincio do penhor), 493 (extinefio da posse), 1572 (a “saisine”), 390 (parenteaco), entre outros, 33 BARBOSA MOREIRA, J.C, Regras de Ezperiéncia e Conceitos Juridica- ‘mente Indeterminados, cit., p. 613. 22 R. Inf. legisl. Bresilia o. 28 m. 112 out./dex. 1997 § 826. Aquele que objetivou prejudicar alguém por meio de atitudes contrérias aos bons costumes obrigado a reparar o dano.” (Cédigo Civil Alemao.) ra, no primeito caso, esta referenciada a hipétese de perda do pftrio poder do pai cu da mie, por ato judicial. No caso concreto o juiz deveré valorar o que a sociedade onde vive tem para si como “imoralidade” ou “maus costumes”. Esta valoracdo ser sua premissa. Uma vez configu- rada, 0 caso é simplesmente de aplicar a norma, havendo como conse- qiiéncia juridica a perda do patrio poder. A solugao ao caso, pois, néo & “criada” pelo juiz, jé estando preconfigurada na lei. O que ocorrerd serd apenas um preenchimento do conceito pelo julgador, que, concretamente, o determinard. No segundo exemplo, o Cédigo Civil Alemo, ao referir que, aos que objetivam causat prejuizo a outrem, “por comportamentos contrérios aos bons costumes”, cabe o dever de reparat o dano, consigna, para além de um conceito indeterminado, verdadeira cldusula geral de reparaco de danos. A regra posta no referido dispositivo menciona apenas as condicdes necessdrias ao nascimento do dever teparatério, sem definir com exatidao, a nocao de prejuizo. Evidentemente, se tem af todo um dominio de casos compreendidos pela cléusula, ¢ néo apenas uma tinica hipdtese, como ocorre no citado ert, 395, ILE, do Cédigo Civil Brasileiro. Por outro lado, ao lado de valores, o juiz devera, tendo em vista as solugdes anteriormente conferidas pela jurisprudéncia e/ou aquelas apontadas doutrinariamente, criar a norma aplicdvel no caso concreto. Em ambos — conceitos indeterminados ¢ cléusulas gerais —~ haverd, por parte do juiz, uma stitude valorativa; em ambos, é certo, o legislador afastou a enumeragéo casuistica dos “atos contrérics aos bons costumes”. No primeiro, todavia, o grau de generalidade e abrangéncia é bem menor do que no segundo; neste, a atitude de subsungaa a hipétese legal, que ainda subsiste naquele, € substitufda pela atividade de criacio judicial, por meio da sintese, de forma a constituir processo de verdadeira concrecaio 3. A idéia do Cédigo como “eixo central” do sistema juridico A “idade da descodificagao” ™ se apresenta hé algum tempo como uma fascinante tentacio aos juristas. No entanto, € possivel pensar na possibilidade da convivéncia harmonica — e, por suposto, dialéti entre a permanéneia dos cédigos e um sistema juridico “aberto”. Tal linha de raciocinio leva em conta o alerta da doutrina e mesmo os reclamos da experiéncia prética, para o “efeito perverso” que consistiria, caso afas- 34 A expressio 6 de NATALINO IRTI, em “Eté della Decodificazione”, in Diretto e Socteta, 1918, pp. 623 ¢ seguintes R. Inf, legis, Brosilic a. 28 n. 112 out/dex, 1991 23 tados os cédigos, na prépria perda da nogSio de sistema enquanto mani- festagao de uma linha de continuidade histérica definida, no Direito, tam- bém em seu nivel interno. 3.1. A flexibilizagdo do Cédigo através do emprego das cléusulas gerais Como se sabe, num sistema juridico do tipo fechado a atividade judi- cial nfo 6 complexa. Na génese do espfrito codificador est 0 mos geome- tricus, a pretensio da plenitude, a estrutura piramidal, cocrente e completa das leis, segundo ordem de escalonamento hierérquico onde os principios prépositivados de nada contam, relegados que esto ao universo escuro do “nao-Direito”. Por muito tempo se acreditow na ilusio codificadora, mas neste século, tal iluséo caiu por terra. Sob o influxo das experiéncias vividas em outros sistemas jurfdicos, em especial o da common law, a questo da rfgida fide- lidade a lei e aos vinculos conceituais tipicos ao modeto de interpretagio axiomitica, ¢ afastada, permitindo-se hoje a admissio, também nos siste~ mas juridicos integrantes da “familia” romano-germfnica, da possibilidade da aplicagao judicial do Direito por via da concregaio *. E assente que, nos ordenamentos do sistema romano-germfnico, nfo € fungio priméria do juiz converter-se em fonte do direito. Todavia, bem alertou HELMUT COING para a circunstincia de que, inobstante “nio entre primariamente na missio do juiz converter-se em fonte do direito, esta € uma coisa que em todos os tempos acaba acontecendo” *°, Tal modelo de aplicagfo judicial do Direito, nos mostra a experiéncia de outros paises, nao ¢, por si s6, antag6nico & idéia de codificago. Mais do que isto, permite « visualizag&o de uma nova nopdo de sistema juridico. Se conseguirmos afastar de nosso raciocinio as armadilhas da ilusio codi- ficadora e admitirmos a possibilidade da convivéncia entre 0 cédigo, as variadas leis especiais e um modelo de interpretacio judicial que nfo dispense a utilizagio do raciocinio problemético de que tratou VIEWEG em sua Tépica, poderio os cédigos sobreviver como “‘eixos centrais” de cada sistema e subsistema individualmente considerados, entendidos estes, por dbvio, nfio mais & base da concepefo tfpica as ciéncias exatas, mas de um modo aberto. 35 Tain concepeSes surgem da aceitacho, no sistema codificado, da idéia de judicial’ “egislagho I" exposta por W. HOLMES na obra The Common Law (1938), que fot ente, na Alemanha. Veja-se, a propésito, JOLOWICZ, Jobn Anthony, ‘en Droit Anglais: sur la Régle du 38 In Grundzitge der Rechtsphilosophie, 1949, § 254, apud ESSER, op. cit., p. 30. ry R. Inf, legis, Brasilia a. 28 nm. 112 out./dex. 1997 Neste sentido, 0 cddigo, tido como “centro” do sistema, se apresen- tar como um modelo amplo e abrangente de valores metajuridicos, flexivel e sensfyel & dinamica social, em razfo, basicamente, de sua linguagem com- preensiva das “cléusulas gerais”, Estas tém, na verdade, papel decisivo a desempenhar, sendo notdvel, neste sentido, a experiéncia alemé, de continua leitura do texto expresso no pardgrafo 242 do Cédigo Civil, notadamente no que diz respeito & construgdo de um “direito justo em matéria con- tratual” **, ‘A questio que se propée € agora a de saber como a viabilizacio da ética contratual, ou do “direito justo” dos contratos se tornou possivel nos sistemas de tipo codificado, construidos sobre o dogma supremo da auto- nomia da yontade. Como se sabe, 6 estudo das cléusulas gerais nos ordenamentos inte- grantes da familia romano-germinica se deve, basicamente, & existéncia dos pardgrafos 138, 242 e 826 do Cédigo Civil Alemio, acentuando neste sentido JOHN DAWSON que, em conseqiiéncia dos citados textos, é a Alemanha o pafs que, entre todos aqueles em que a lei reside em um cédigo compacto, o que teve a mais completa experiéncia com o sistema de normas produzidas pelos juizes. A histéria dos trabalhos preparatérios do BGB demonstra nio ter esta- do na mens-legis de seus redatores conferir ao Poder Judiciério tais man- datos abertos de tantas e tio profundas potencialidades operativas. O fato € que, existentes, tais cléusulas se colocaram, no direito privado alemao, 37 A idéia de “direito justo” é tratads desde Aristoteles que, na Etica de Nicd- ‘maco escreveu péginas todavia atuais em nossos dias. Em Platéo, igualmente, ‘© tema dos contetides da justica ou ordenacho “Justa” da convivéncia humana 6 também uma questio central da ‘tlca. Modernamente, na ultrapassagem do ‘positivismo legalista, o tema fol retomado com vigor — é matéria recorrente dos estudos de MICHEL VILLEY, na Franca, assinalando, na Alemanha, KARL LARENZ que “eoncierne a los juristas, porque, si bien es cierto que los juristas ueden Imitarse a cumplir las normas de un cancreto Derecho positive, o las decisiones judiciales que en ese derecho positivo sean vinculantes, no pueden evitar que se les coloque Incesantemente ante el problema de saber si lo que hacen es 0 no ‘justo’, sobre todo cuando Ias relactones vitales cambian y los casos no se plantean ya de un modo igual” (in Derecho Jusio —- Fundamentos de Btica Juridica, cit., Proémio, p. 19). Essa novéio nfo esta restrita & civilistica, No diretto administrative 8 boa-fé — principio fundamental no tema de “direito justo” — tem, relevantissimas conseqtténcias, em especial no que concerne aos efeitos da nulldade de certos atos. O “direlto justo”, no diretto constitucional, conduziré as idéias de igualdade, proporcionalidade, raxoabilidade e controle; no direito Processual, levatd as nogées de imparcialidade do juiz. refictindo, einds, no amplo espaco reservado & tutela do contraditério; em matéria pensl condusiré & per- cepefio de que a pena deve ser recebida como justa no caso concreto, tluminando, pols, 0 antigo debate acerca da proporcionalidade das penas. Veja-se, ainda, REHBINDER, M. “Tl Senso del Giusto”, ct. R. Inf. Brasilia a. 28 n. 112 out./der. 1991 25

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