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O uso estratégico do conhecimento JUAN IGNACIO POZO, CARLES MONEREO Mc INTRODUCAO: O PROBLEMA E QUANDO APRENDER Imagine o leitor que tem de enfrentar uma tarefa desagradavel, que continua ocupando ainda muitos alunos, como aprender a tabela dos elementos quimicos ou Tabela Periddica, da qual talvez o leitor guarde uma ma lem. branga de seus tempos de escola (ver Quadro 8.1). O que pode fazer para abordar a temida prova da proxima quarta-feira com maior pro babilidade de éxito? Sem diivida, a forma mais facil e imediata, a que rotineiramente pora em pratica a maioria desses alunos, sera repassar essa longa lista de nomes, simbolos e nuimeros algumas vezes seguidas, oralmente ou por es- crito, até conseguir reproduzi-la com exatidao. ‘Mas talvez a lista de simbolos e caracteristicas dos elementos seja muito longa para aprender pela simples repeticao. Nesse caso, sera neces- Sirio recorrer a algum truque ou sistema mne- ‘motécnico que permita elaborar o material de aprendizagem, relacionando os elementos en- We si mediante algum sistema externo pré- Pria tabela, como, por exemplo, formando pa- lavras (por ex., chalina para Ch, Li, Na; ou baconiano para B, C, N, 0) ou inclusive frases Com os simbolos quimicos, o que sem divida judara a recorda-los mais facilmente no mo- Trento da prova. Mas nao ¢ facil encontrar pa- ‘vrs para todos os simbolos, pelo menos res- Peltando a ordem da tabela, ou, mesmo que se (eeontrem, podem levar a erros ao recordar os depois de recordar baconiano, inne ° Pade nitrogénio era N ou Ni?). Desse to agg HOF Pode recorrer a um procedimen- ‘mais complexo, mas sem duvida mais (Pre (ONTSERRAT CASTELLO eficaz, para aprender a Tabela Periédica: bus- car as relagdes dentro da prépria tabela, isto é, tentar recordar os elementos a partir de sua propria organizacdo. Assim, poderia ver que todos os elementos da primeira coluna da Ta- bela Periddica tém uma estrutura cuja série (ndo aparece nesta tabela) acaba com um 1, todos os da segunda coluna tém uma estrutu- Ta cuja série acaba em um 2..., etc. Se sabe 0 que isso significa ~ que tm um tinico elétron em sua Ultima camada, dois no caso da se- gunda coluna, etc. ~ 0 ajudara a recordar melhor. De fato, a distribuicéo dos elementos na tabela nao ¢ aleat6ria, mas responde a sua organizagao interna. Organizar tais elemen- (05, ou tentar descobrir sua prépria organiza- cao, pode ser a forma mais eficaz de aprendé- los, ja que possivelmente produziré uma aprendizagem mais duradoura e transferivel dos tracos que devem definir toda boa apren- dizagem (Pozo, 1996). De fato, o leitor poderia fazer muitas coi- sas diferentes diante do problema de ter de aprender a Tabela Periddica. As que ilustramos ~repassar, elaborar e organizar ~ sao trés ma- neiras de abordé-lo que, se respondem a um propésito deliberado, intencional, por parte do leitor, supordo o uso de outras estratégias de aprendisagem da Tabela Periddica. Quando um aluno ou um aprendiz reconhece um proble- ma ou uma dificuldade de aprendizagem e pla- neja ou seleciona acdes ou procedimentos es- pecificos para enfrentar tal problema, podemos dizer que esta fazendo um uso estratégico de seus conhecimentos. Mas nem sempre é assim. De fato, com muita freqiéncia, os alunos limitam-se a se- | 4146 COLL, MARCHES!, PALACIOS & COLS. UADRO 8.1 Sistema de periodos dos elementos quimicos 8 ta 18 2 1914 18 16 17 [he | H | wr ia NB 8 18 1B WB Be alc] xyole elela s|fs||7|/s |e afsillelslolfa Mg] 3 4 5 6 7 8 8 10 1 12 ! 3 « ][ca]l self mI] v | or fmm f zn fal] ce f as If se |f Br If ke 3 | s9f 20 |] 21 |] 22 |] 29 | 24 |] 25 } 30 || 31 || 32 f 33 I] 34 || 35 | 36. | . c8]} tn |f sa] so xe ro || sr ]f ¥ || ze |f no }fmo]| te x 5 ||| 30 99] ao || at || 42 || 43 23] «91 so|| st m Tf || Bi |] Po fat |f an « [es] 2a |fcal [4 |f ta |] w]e wo][ 7 | Po ® | s5|| s6||57 72 || 73 || 74 |] 75 0 | 81 | 82|/ 83 || 64 f asf as rm |] 22] [5/2 sos a7 || 88 || 69} | 103 105] 106} 07 Lantana } & [cel] rf er |[tm|| vo l[ w 8 7o|| 74 50 || 59 63 | 6 || Actinideos , ve [anffpalf uno po am [en ak |f crf es lf Fl] at] No]f ur 40 || 91 | 92 || 92 | 94 || 2s |] 28 | 97 || 98 | 98 || 100101] 02109 guir certas rotinas de aprendizagem, certos habitos, seja porque as prdprias situagdes de aprendizagem ¢ ensino que enfrentam sio, em si mesmas, rotineiras, seja porque nao as per cebem como um problema, ou uma situacao ova, que mereca um tratamento estratégico, Assim, pode ser que muitos alunos, obrigados a recordar a Tabela Periddica completa, tal como aparece no Quadro 8.1, ou outros mate- riais de estudos similares, limitem-se a aplicar as rotinas habituais de repassar, sem estar cons- clientes de sua ineficdcia nessas condigdes. Isso ocorre, por exemplo, em uma situagao como a que se segue, Em uma aula de histéria con- Re temporanea, o professor, como costuma fazer, apesar de ser um bom conhecedor e um entu- siasta cle sua matéria, ou talvez por isso, apre- sentou a seus alunos uma explicagéo um tan- to quanto desordenada, em que as idéias apa- rentemente iam e vinham, misturando-se di- ferentes conceitos e aproximagées historio- grificas com a introdugao inesperada de al gum episddio anedético, que geralmente faz com que os alunos percam o fio condutor da igo. Depois da aula, Eduardo, Paloma © Daniel, trés alunos que em algum momento perderam esse fio, querem completar suas anotagées e, para isso, decidem cotejar 0 que i, | DESENVOLVIMENTO PSICOLOGICO E EDUCACAO, v2 147 uns e outros anotaram, dando margem ao se- guinte didlogo: Eduardo: Na verdade, eu tentei anotar quase tudo. Acho que & melhor fazer assim, dessa maneira tenho todo © material dado em aula e depois posso revisi-lo melhor. Daniel: Nao sei por que vocé anota tudo a0 pé da letra, nao tem sentido, pois o que cai- ra nas provas esta no livro-texto, Eu prefiro ano- tar coisas interessantes; por exemplo, escrevi basicamente aquilo que explicou sobre a aman- te de Hitler, que tinha um médico judeu. Que cinismo!, nao? Paloma: Sim 6 curioso, mas para mim é pouco importante do ponto de vista da materia em seu conjunto, no? Procurei captar a estru- tura da aula, isto é, os itens fundamentais do que explicava e algumas ideias que me parece- ram chave dentro desses itens. Depois, em casa como livro, posso completar meus esquemas. Eduardo: Olha, Paloma, eu nao consigo entender essas anotacdes esquemiticas que vocé faz. Vocé nao fica com medo de nao ano- tar alguma coisa importante? Além disso, nao da para anotar e pensar enquanto anota. E melhor por no “automatic” ¢ anotar tudo, depois “estudar” Paloma: Sim, claro, ¢ depois acontece que nem vocé, que nao lembra nada do que se dis. se na aula e nao entende muitas coisas que es- creve. Além disso, Iembra o que nos disse a Suzana, que fez esta matéria no ano passado: nem todas as perguntas que fazem na prova so de estudar muito, de ficar pensando, e do Jeito que € 0 professor, do jeito que gosta de discutir conosco algumas de suas teorias, nao estranharia nada de nada Daniel: Mas, Paloma, eu insisto que é ab- surdo anotar tanta informagao havendo um texto baisico. Além disso, as vezes as explica- $8es so tao confusas que nem vale a pena es- forgar-se tanto, Paloma: Olha, em primeiro lugar o livro- texto deve ser estudado e aprendido e eu, quan- do seleciono a informagao e anoto com minhas Préprias palavras, sinto que vou retendo, que entendo & medida que anoto, O esforco por dar uma certa ordem acho que compensa. E mais cedo ou mais tarde voces terao de fazer esse esforgo, porque sem esforco nao se apren- de! Mas é que, além disso, na prova costumam cair algumas quest6es que sé foram explicadas ha aula.. é uma coisa que o professor também repete sempre, A aprendizagem da Tabela Periddica re- quer uma aproximacao estratégica, porque a quantidade de informagao ea forma como deve ser recuperada para a prova de quarta-feira faz com que nao sejam suficientes os procedimen- tos habituais de repassar, e 0 aluno que nao perceber o problema pode pagar caro por seu erro. No caso dessa aula de histéria contem- Pordinea é o discurso, apaixonado mas um tan- to desordenado, do professor e sua possivel dis- tancia dos formatos da prova que torna a tare- fa de tomar notas em um problema, embora nem todos os alunos percebam isso (Monereo € outros, 2000). Assim, Eduardo limita-se a aplicar suas rotinas habituais, tomando notas literais € exaustivas sem se perguntar da utili- dade dessas notas para estudar a matéria. Daniel & mais seletivo, mas tem diivida se fez uma boa avaliacao do problema que enfrenta € antepde seus proprios interesses a uma das metas que deveriam orientar suas decisées: ter as maximas possibilidades de ser aprovado na prova. Paloma seria a que melhor compreen- deu o problema de aprendizagem que enfren- ta e, portanto, é a mais estratégica, com ano- tages seletivas e personalizadas em funcao do que sabe da prova e das caracteristicas estru- turantes da matéria. 0 éxito do ensino, a obtencio de uma aprendizagem mais eficaz nessas e muitas ou- tras situagdes depende, entre muitos outros fa- tores tratados em diferentes capitulos deste vo- lume, de como 0 aluno administra ou usa seus conhecimentos e suas habilidades para fazer anotagées melhores ou para lembrar melhor a estrutura da Tabela Periddica (ver Quadro 8.1). Esse uso deliberado e intencional dos préprios conhecimentos chamamos de estratégias de aprendizagem, nogao que j4 em principios do anos 1980 era definida por autores pioneiros como Nisbet e Shucksmith (1986) e Danserau (1985), considerando-as seqtiéncias integradas de procedimentos ou atividades que se elegem com 0 propésito deliberado de facilitar a aqui- sigdo, 0 armazenamento e a utilizagao da in- formagdo, == 148 COLL, MARCHES!, PALACIOS & COLS. Nos tiltimos anos, as estratégias de apren- dizagem assumiram uma importancia cada vez maior, tanto na pesquisa psicoldgica como na pratica educacional, devido a um triplo impul- 50 que veio transformar o aprender a aprender fem uma das metas fundamentais de qualquer projeco educacional (Pozo e Monereu, 1999). Por um lado, as reorias psicologicas da aprendi- zagem abandonaram progressivamente os mo- delos segundo os quais 0 sujeito era um mero receptor passivo de informacdo, e 0 seu conhe- ‘cimento uma simples réplica dos saberes que recebia, para aproximar-se de posicdes nas quais 0 aluno deve envolver-se ativamente na gestdo de seu proprio conhecimento, que sera gerido como conseqiiéncia do processamento da nova informacao a partir de outros conhe- cimentos anteriores. Embora tal fator seja mui- to importante para os que se dedicam 4 psicolo- gia - e de fato no proximo item analisaremos em detalhe como as posi¢ées evoluiram -, a sua influéncia teria sido minima se no hou- vesse coincidido um segundo fator, as novas exigéncias sociais de formacdo. Na sociedade da aprendizagem e do conhecimento na qual vi- vemos como conseqiiéncia das novas tecnolo- gias da informacao (Pozo, 1996), ha uma cres- cente exigéncia de capacidades de aprendiza gem nos alunos e futuros cidadaos, tal como prevé o chamado Informe Delors elaborado por especialistas de paises muito diversos para a Unesco (1996, p.95) com o titulo sugestivo de A educagao guarda um tesouro: 0 século XXI, que oferecerd recursos sem precedentes tanto para a circulacao e 0 ar- mazenamento de informacao como para a comunicacio, impord a educacao uma du- pla exigéncia que, primeira vista, pode parecer quase contraditéria: a educacao devera transmitir, de forma macica e efi- az, um volume cada vez maior de conhe- cimentos te6ricos e técnicos evolutivos, adaptados & civilizacao cognitiva, porque sio as bases das competéncias do futuro. Simultaneamente, devera descobrir e de- finir orientagdes que permitam nao dei xar-se submergir pelas correntes de infor- mages mais ou menos efémeras que in- vadem os espacos publicos e privados e manter 0 rumo em projetos de desenvol- vimento individuais e coletivos. Em certo sentido, a educagio se vé obrigada a ofe- i... "| recer as cartas nuticas de um mundo co Plexo e em perpérua agitacao e, 20 mer mo tempo, a bussola para poder navess, por ele. a As exigencias se concentram em um ter. ceiro fator, as mudancas educacionais que es, to tornando necesséria a renovacao dos con, tetidos das matérias escolares e a forma de ensind-las, entre as quais ocupa uma posicig cada vez mais relevance a necessidade de que os alunos aprendam nao apenas os conheci mentos que tradicionalmente constituiram 0 contetido dessas matérias, geralmente de na- tureza conceitual, mas também os processos mediante os quais esses conhecimentos sao ela- borados. Assim, 0 ensino nao deve ser dirigido a proporcionar conhecimentos e a assegurar certos produtos ou resultados de aprendizagem (por exemplo, 0 dominio da Tabela Periddica), mas deve fomentar também a andlise dos pro cessos mediante os quais esses produtos po- dem ser alcancados (ou seja, as estratégias de aprendizagem). Além disso, cada dia parece mais claro que os dois tipos de objetivos nao apenas sao compativeis, mas que se requerem murtuamente. Dificilmente se pode compreen- der a quimica sem uma série de habilidades ou Gestrezas no estudo, mas, ao mesmo tempo, a aplicacao das estratégias de aprendizagem mais complexas requer, para ser eficaz, um certo ni vel de conhecimentos especificos; nesse caso de conhecimentos quimicos. © impulso conjunto desses trés fatores transformou a pesquisa e 0 ensino em estraté gias de aprendizagem em uma area de estudo muito produtiva, cujas principais rendéncias tentaremos sintetizar nas proximas paginas. Para isso, comegaremos com uma breve excur sio histOrica, para que 0 leitor saiba como evo" luiu o estudo das estratégias de aprendizagem. Nessa evolucéo, ocupa um lugar fundament=! a forma como a psicologia evolutiva ¢ a cog tiva analisaram a influéncia dos processo® metacognitivos sobre 0 conheciment se aprendizagem e, por isso, trataremos espe? mente das relacdes entre metacognish® ” aprendizagem. Com tal bagagem conceitua © taremos em condigées de precisar Po a ‘mente em que consiste 0 uso estratesico nhecimento e como pode vincular-se 40°. tetidos do curriculo e, em suma, como" et a | DESENVOLVIMENTO PSICOLOGICO E EDUCAGAO, v2 149 tratégias podem ser ensinadas, assunto do pré- ximo capitulo. AS ESTRATEGIAS DE APRENDIZAGEM NA HISTORIA RECENTE DA PSICOLOGIA ‘A pesquisa psicolégica sobre como as pes- soas podem aprender a aprender esteve sujei- ta ao proprio devir histérico da psicologia. As- sim, no é estranho que, durante o longo pe- riodo daquilo que Herbert Simon chamou de “glaciagao behaviorista” em psicologia, as es- tratégias de aprendizagem ficaram encerradas na “caixa-preta” dos processos cognitivos, aque- Je quarto escuro a que objetivismo behavio- rista relegou tudo 0 que aparentemente era nao-observavel diretamente e que por ndo ver a luz tornou-se ainda menos observavel. Con- tudo, se 0 controle estratégico da aprendiza- gem nao podia entrar nos estreitos ambitos teo~ Ticos e metodol6gicos da pesquisa behavoriosta, isso nao impediu que durante varias décadas o behaviorismo € os prineipios da tecnologia do ensino baseados nas teorias de modificagio de condutas ampararam e proporcionaram uma auréola ao cientificismo e a sistematizagio a um conjunto de receitas dispersas para melho: Tara memorizacao e a aprendizagem de infor macao, Embora ja encontremos alguns desses truques mnemonicos nos escritos de filosofos gregos, como Simonides de Ceos, e desde en 10 as mnemotecnias tenham por tras de si uma longa historia cultural (Boorstin, 1983 Pozo, 1996), 0 behaviorismo as tornara pro: gramas de treinamento individualizado, deti- nidos por objetivos operativos, em que se en- sinava os alunos, sob a epigrate de téenicas € métodos de estudo, cadeias prescritas de ope- ragdes, basicamente motoras, como relet, re Petir, escrever resuimos, fazer esquemas, ete Tais programas podiam ser dados independen. temente do curriculo ou da escola, ¢ inclusi- Ye auto-administrarem-se mediante “livros Programados” que exercitavam os leitores na aplicagao repetida de cada uma das técnicas € a correspondente corregao, reforgadora (continue assim!”) ou reparadora (“tente de novo, fixando-se methor!"). Tratava-se de que esses algoritmos acabassem se automatizando € convertendo-se em auténticos habitos de estudo, Tais programas de técnicas de estudo, cujas Pentiltimas manifestagdes ainda podem ser vis- tas de vez em quando em nossas salas de aula, mostravam-se, porém, pouco eficazes, Entre as raz6es da pouca eficacia estaria, por um lado, sua pretensao de ensinar essas habilidades de modo descontextualizado, sem levar em conta a influéncia dos contetidos e dos contextos em que 0 aluno devia aplicd-las depois. Tratava- se, por exemplo, de ensinar a sublinhar urbi et orbe com a pretensio de que depois o aluno pudesse transferir a habilidade assim apreen- dida a qualquer novo contexto que enfrentas- se. Mas aluno dificilmente a transferia, jd que nao basta saber sublinhar, & preciso também saber 0 que assinalar e sobretudo para qué. Como veremos mais adiante, 0 uso estratégico do conhecimento nao pode realizar-se 4 mar- gem dos contetidos e dos contextos de apren- dizagem, Um segundo problema desses programas, nao menos serio, era a pretensio de reduzir sua aprendizagem ao dominio técnico de um conjunto de agées observaveis. O reducionismo behaviorista ~ os processos mentais, se é que existem, nao governam a conduta, mas 0 con- trario ~ tornava nao apenas desnecessério, como também impossivel, ocupar-se de como 0s aprendizes ou os estudantes podiam gerir ou controlar sua propria aprendizagem. Dessa forma, habilidades como analisar um texto eram reduzidas a sublinhar suas idéias princi- pais simplesmente sublinhando essas supostas idéias, deixando-se de lado o essencial, que é censinar a identificar as chaves textuais que per- mitem dizer quando uma ou varias proposi- Goes podem ser consideradas como “idéia prin- cipal”, Reduzidas ao observavel, as estratégias de aprendizagem acabavam se tornando um conjunto de receitas ou de habilidades prati- cas de utilidade duvidosa, Sera preciso esperar a chamada “revolu- 40 cognitiva” para que, em meados dos anos 1950, os processos cognitivos possam enfim sair do quarto escuro a que tinham sido relegados pelo behaviorismo. Isso, contudo, nao coloca- ré imediatamente as estratégias de aprendiza- gem na agenda de pesquisa da psicologia cog- nitiva, jd que a metéfora computacional que essa nova psicologia cognitiva adota desde o inicio implicaré uma maior continuidade com a corrente behaviorista do que se costuma su- a re rere 150 COLL, MARCHES!, PALACIOS & COLS. por, pelo menos no estudo dos processos de aprendizagem (Pozo, 1989). Assim, alguns pro- cessos cognitivos, como a percepcao, a lingua- geme sobretudo a meméria, sao estudados com paixao pela psicologia cognitiva do processa- mento da informacdo desde o primeiro momen- to. Outros processos, de natureza mais dind- mica, vinculados ao uso e 4 mudanca dessas representagées, € mais ainda ao uso conscien- te ou deliberado dos proprios recursos cog- nitivos, continuavam sendo desnecessérios na nova psicologia baseada na analogia entre o funcionamento cognitivo humano e o do com- putador. Como se sabe, se ha algo que dificil- mente os computadores fazem é aprender e se hd algo que definitivamente os computadores nao sabem fazer é aprender estrategicamente (sobre as raz6es dessas incapacidades, ver, por exemplo, Pozo, 1989). Por isso, nao é estranho que, em um pri meiro momento, a psicologia cognitiva nao se ocupasse de estudar a aprendizagem estraté. gica. Teve de esperar que a propria evolucao da pesquisa cognitiva tornasse necessdrio pos- tular certos conceitos para que o estudo do co- nhecimento estratégico fosse ganhando inte- resse. Um desses conceitos é a distingao estabelecida por Shiffrin e Schneider (1977) entre processamento automatico e controlado. Assim, haveria tarefas, geralmente simples (an- dar, falar, provavelmente dirigir ou fazer café) que podem ser realizadas quase sem consumir energia cognitiva, por meio de processos auto- mdticos, que consistem em “operagoes rotinei ras sobreaprendidas que se realizam sem con- ole voluntario do sujeito, nao utilizam recur- sos de atengao e, em geral, 0 sujeito nao tem consciéncia de sua realizagao” (de Vega, 1984, p.126). Em compensacao, outras tarefas, ha- bitualmente mais complexas (como ler este ca- pitulo, decidir como preparar a proxima prova de quimica ou convencer um cliente das virtu- des de um produto), requerem processos con- trolados, “operagées realizadas sob controle vo- luntario do sujeito, que requerem gasto de re- cursos de atengao e que o sujeito percebe sub- Jetivamente podendo dar conta deles” (de Veja, 1984, p. 126). O Quadro 8.2 destaca as princi. Pais diferencas entre os dois tipos de processa- mento, ___ Voltando aos alunos que deixamos discu- tindo, no inicio do capitulo, sobre tomar no- i”! tas, uma aproximacao mais estraté blema de areca: ou, eee ee 105 rtineiro, exigiré um maior controle Ewe do, que se limitava a tomar notas segundo suse rotinas habituais, agia essencialmente coms “piloto automatico” (como o behaviorismo ne. punha que todos sempre atuamos!). Jé Paloma tinha acendido a luz no quarto escuro dos pro. cessos cognitivos e exercia um maior controle consciente sobre as notas que tomava. Como veremos mais adiante, o interessante de tal dis. tingdo que permite entender as vantagens de cada um desses tipos de processamento em fun. Go das exigéncias da tarefa. Embora esteja. mos propondo a promocao de uma aprendiza- gem mais estratégica, sem diivida a automati- zacao de recursos tem importantes beneficios cognitivos para a aprendizagem, que de fato sem essa automatizacgao seria muito limitada (Poz0, 1996). Embora possivelmente sempre fique um vestigio de controle, e com ele o con- sumo de recursos, quanto mais automatizada esteja uma conduta menos dificil serd sua exe- cucdo ou sua recuperacao e, portanto, dentro de um sistema de recursos cognitivos limita dos como € 0 nosso, isso permitira dispor de recursos para executar outras tarefas. Paloma pode recordar a meta de suas anotacdes ao mesmo tempo em que regula sua execucdo, Porque automatizou outras acdes que sao ins- trumentais (por exemplo, decodificar a expli- cacao verbal de seu professor ou escrever). Em itens posteriores, voltaremos as relacdes entre o controle estratégico da aprendizagem e 0 uso de recursos técnicos automatizados. Juntamente com a discincao entre proces- samento automatico e controlado, outra con tribuigao relevante do enfoque do processa- mento da informacao ao estudo das estraté- gias de aprendizagem tem sua origem nas pes- quisas sobre os niveis de processamento (Craik e Tulving, 1975). Tentando ir além do enfoque estrutural que até entao havia predominado nas pesquisas sobre a memoria (ver, por exemplo, de Vega, 1984), os estudos se propunham a ado- tar um enfoque funcional, averiguando 0 que 0s sujeitos faziam efetivamente com a infor magao para lembrar-se dela e quais dessas ati vidades eram mais eficazes. A fim de controlar © que os sujeitos faziam, manipulava-se expe- rimentalmente 0 nivel em que se processav4 uma lista de palavras comuns (por exemple, SEE SE eee DESENVOLVIMENTO PSICOLOGICO E EDUCACAO, v2. 151 QUADRO 8.2 Diterengas entre os Schneider (197) Processos controlados + Consomem atencao. + N&o 880 rotinas aprendidas Sao Hlexiveis ¢ adagtam-se 2 diferentes tuagdes + Regui rem + Perdem eficacia em fazendo-os encontrar rimas entre essas pala- vras ou relacdes semanticas entre elas). Quan- do, posteriormente, se submetia os sujer uma prova de lembranca acidental, isto €, sem que fossem advertidos durante a fase de aqui: Sicdo que seriam submetidos a essa prova, ob- Servou-se que “as perguntas sobre o significa do das palavras produziam um rendimento Mnémico maior que as questées referentes a0 som das palavras ou as representacdes fisicas de sua impressao” (Craik e Tulving, 1975, p. 138 da trad. cast.). A eficacia da aprendizagem dependia da profundidade com que se tivesse processado a informacao, sendo os niveis mais profundos — mais prximos ao semantico - os que produ- ziam uma lembranga maior. Dessa forma, es- tabeleceu-se uma primeira classificacdo do us dos processos de codificacao que distinguia 0 Processamento superficial, centrado nos tracos fisicos ou estruturais dos estimulos, do proces- samento profundo, essencialmente dirigido a0 significado. Esse nivel de profundidade estaria relacionado com a quantidade de processamen- to € com o grau de elaboracao da codificacao. Embora os objetivos desses estudos nao fossem especificamente as estratégias de apren- dizagem, e sim os processos pelos quais 0s su- Jeitos codificam a informacao, serviram para mostrar que um mesmo material de aprendi- Zagem podia ser processado de diferentes ma- neiras em funcao das condi¢des e das metas da situacdo de aprendizagem. Ainda que nes- Se caso o controle do processamento fosse exer- ros a Processos controlados aulomaticos a partir de Shifrin € Processos automsticos Nao consomem atencéo. Aciquirem-se por aprenckizagem, Luma vez adquirds, modiicam-se com diiculdade. Nao requerem estorgo consciente, ulam-se eicazmente em condigbes adversas, i20 interlerem na execugdo de uma segunda tarefa, cido pelo experimentador, abria-se a possibil dade de que diferentes formas de Processar ou aprender a informacao conduzissem a tipos distintos de aprendizagem. De fato, a distin. ao entre enfoques de aprendizagem supert Ciais e profundos, em funcao da concepgaio que © proprio aluno tem da aprendizagem e, con- seqiientemente, das atividades que realiza para conseguir isso, subjaz a algumas das classifica- Goes mais habituais das estratégias de apren- dizagem (ver, a respeito, o Capitulo 11 deste volume). O enfoque superficial teria como ob- jeuvo um incremento no conhecimento e a Mmemorizagéo ou a repeticao literal da in- formacao. Em compensaco, 0 enfoque profun- do buscaria abstrair significados e, em tiltima instancia, compreender a realidade (p. ex., Entwistle, 1987; Marton e Booth, 1997), Juntamente com a importéncia concedi- da ao controle dos préprios processos cogni- tivos e ao estudo das diferentes formas de pro- cessar a informacao, uma terceira contribui- Ao relevante do enfoque cognitivo para o es- tudo das estratégias de aprendizagem provém de estudos mais recentes, estes jd dos anos 1980, sobre a forma distinta como as pessoas experientes e novatas enfrentam certas tarefas complexas. Nas primeiras décadas da revolucaio cognitiva predominou um enfoque generalista, continuista também com 0 behaviorismo, que sustentava ser 0 funcionamento cognitivo re- gido por processos gerais, independentes do contetido. Uma das obras fundamentais da psi- cologia cognitiva foi, de fato, o General Problem 152 COLL, MARCHES!, PALACIOS & COLS. Solving (“Solucionador Geral de Problemas’) Ge Newell e Simon (1972). Alguns anos mais tarde, porém, esses mesmos autores sustenta~ vam que, para que um sistema cognitivo resol- esse qualquer problema, incluidos os de apren- dizagem, precisava dispor de um amplo corpo Ge conhecimentos especificos no dominio a que correspondesse 0 problema, Os “solucionadores gerais de problemas”, com suas regras € suas Serratégias gerais, deram lugar aos especialis- tas, dotados de conhecimentos e de estratégias especificas (Chi, Glaser e Farr, 1988; Ericson, 1996). O novo enfoque mostrou que os especia- listas tem um conjunto de conhecimentos con- ceituais mais bem-estruturados e hierarquizados, além de habilidades automatizadas que Ihes per- mitem dar atengZo aos aspectos mais relevantes do problema, planejar e regular adequadamente sua conduta, tomar decisdes ajustadas as mu- dancas que se produzem em situagoes comple- xas e/ou ambiguas ou avaliar com maior pre- iso e realismo sua prdpria execucao Dessa forma, as pesquisas sobre 0 uso que sujeitos especialistas e novatos em um determi- nado dominio (a matematica, a leitura, a cién- cia, 0 xadrez ou 0 teatro) faziam de seus co- nhecimentos proporcionaram a pesquisa cm es: tratégias de aprendizagem nao apenas um for te componente disciplinar, mas também um in- teresse crescente pelos mecanismos de contro Ie, de supervisdo e de monitorizagao que a pro- pria psicologia cognitiva havia introduzido ja em seus modelos. Esses dois aspectos serao re- cuperados e em boa medida reformulados por um novo enfoque no estudo das estratégias de aprendizagem que predominaram na ultima década do século XX, 0 que poderiamos cha mar vagamente de enfoque construtivista, e que vai interpretar a aprendizagem e o ensino de tais estratégias em um conteato tedrico no qual se destacam trés componentes fundamentais 1. A importancia da metacognigao. 2. A influéncia dos conhecimentos es- pecificos, 3. A influencia social, essencialmente dos cendrios educacionais, na apren- dizagem e no uso dessas estratégias. Com relacdo 4 importancia dos proces- S0$ metacognitivos, as aproximagdes constru- tivistas acabaram com a tiltima ~ ou penulti- i, | ma? ~ proibicio behavioristae transformaram os processos de controle da psicologia cognit, em processos conscientes, de forma que o pa a da consciéncia e dos diversos tipos de cone, ncia, ou dos diferentes tipos de metacogni (termo cunhado por Flavell em 1970) i? dos tépicos que teve mais impacto, e continu tendo, na pesquisa e na intervencio psicope. dagégicas, € muito particularmente em rela. Gao as estratégias de aprendizagem, razao pela qual trataremos dele especificamente no pro. ximo item, Um dos debates essenciais sobre a influéncia dos processos metacognitivos sera novamente sua natureza geral ou especifica, Uma vez mais, as primeiras aproximacdes do estudo da metacognicdo sustentavam que se tratava de processos gerais, em boa medida in- dependentes de dominio. Aceitou-se posterior. mente, porém, que muitos desses processos metacognitivos, assim como os cognitivos, po- dem ser adquiridos e usados em Ambitos espe- cificos de conhecimento. Mas diante da “expertite” que acometeu boa parte da pesqui- sa institucional na dltima década do século XX, comecour-se a reclamar um maior equilibrio entre os processos gerais e os especificos. As- sim, questiona-se que os modelos de especia- listas possam ser diretamente utilizados pelos estudantes novatos, argumenta-se a existéncia de habilidades de carter geral (0 planejamento de ages mentais, a supervisdo da compreen: so, etc.) e se coloca a possibilidade de existir um conhecimento estratégico que mantenha certa independéncia em relago ao conheci- mento propriamente disciplinar, 0 que nos le varia a considerar a possibilidade de falar de principiantes inteligentes (Mateos, 1999) oues- tratégicos (Castello e Monereo, 1999) ‘Mas essa consciéncia dos préprios proces: sos de aprendizagem dificilmente pode ser explicada a partir do sistema cognitivo indivi: dual; além disso, requer a participagao de uma linguagem que permita, entre outras coisas, @ auto-referéncia, e essa linguagem, como qua: lidade de sistema arbitrario de signos, 6 pode ser adquirida em um ambiente social, em que exista uma comunidade de falantes. A const: deragdo das estratégias como sistemas cons: cientes de decisao mediados por instrumentos simbélicos nos aproxima indefectivelmenté #2 aceitacao de sua origem social e dos postula- dos de Vygotsky e da escola sovietica que 4° DESENVOLVIMENTO PSICOLOGICO E EDUCAGAO, V2 153 de 0s anos 1980 vivem um esplendoroso renascimento. O mediador, por meio da ces. so gradual de suas estratégias, isto é, das de- cisdes que lhe permite auto-regular o pré- prio proceso de resolucao ou de aprendiza. gem, favorece ao aluno a apropriacdo dessas decisoes em relacao a determinadas condices contextuais Ou, © que € 0 mesmo, facilita a aprendizagem de tais estratégias Esse principio de ensino, que se reflete em conceitos como o de zona de desenvolvi- mento proximal, “andaime”, aprendizagem guiada, etc., tem importantes conseqiiéncias para o planejamento de programas de ensino de estratégias, como se vera no préximo cai tulo, mas também € necessario para compre- ender a propria natureza cognitiva e metacog- nitiva das estratégias de aprendizagem, que é © objetivo concreto deste capitulo. Em razio disso nos centramos a seguir na analise dos diferentes significados da metacognicao, os quais, por meio dos diferentes enfoques desen- volvidos neste item, levam a conceitos diferen- tes do conhecimento estr: -gico. METACOGNICAO E ESTRATEGIAS DE APRENDIZAGEM Voltemos ao pobre aluno que tenta apren- der a Tabela Periddica repassando-a seguidas vezes. Como pode saber que ja sabe 0 simbolo quimico do lauréncio suficientemente bem para se lembrar na prova do dia seguinte? Ou como Paloma pode saber que captou bem a estruru- ra global da explicacao de seu professor de his- téria contemporanea? Ou, inclusive, qualquer de nés, quando procura recordar 0 que fez no dia 23 de fevereiro de 198) as 18h20min, como pode explicar o procedimento que seguiu para localizar tal dado em nossa meméria? E 0 que € mais surpreendente, se alguém dissesse a pa- lavra “traschoplijun”, 0 que nos indicaria de Maneira imediata que nao temos um significa- do preestabelecido para essa palavra? Ou, in- versamente, se alguém nos fala de “construti- vismo”, por que acreditamos saber 0 que é, Quando na realidade nao conseguiriamos explica-o? Certamente, as experiéncias que acaba- mos de apresentar podem nos parecer simples, visto que nos ocorrem continuamente, sem re- Parar nelas. Podemos, porém, imaginar 0 que Ocorreria se nao soubéssemos reconhecer que uma informacao ja existe entre nossos conhe- Cimentos prévios? Estariamos condenados a aprender continuamente os mesmos conteti- dose, muito provavelmente, a humanidade mal avancaria (e 0 aluno confrontado com a Tabe- la Periédica menos ainda). Todo esse conjunto de competéncias s6 pode ser explicado se re- Corremos a existéncia de algum mecanismo de cardter intrapsicolégico que nos permite ter consciéncia de alguns dos conhecimentos que anejamos e de alguns dos processos mentais, Que utilizamos para gerir tais conhecimentos. Esse mecanismo recebeu o nome de metacog- nico, isto é, “consciéncia da propria cognicao", © € um dos t6picos que teve maior atencdo nas duas iiltimas décadas do século XX, tanto da pesquisa em psicologia evolutiva quanto da psi- cologia cognitiva e, mais tardiamente, da psi- cologia educacional Este inusitado interesse pelo tema, entre- tanto, nao nos parece ter contribuido para es- recer sua natureza e para delimitar quais so exatamente suas funcdes; ao contrério, a propria polissemia do termo e a auséncia de uma teoria capaz de unificar a prolixa pesqui- sa que se produz em seu nome, como assinala- ram Marti [(1995) e no item 12 do Volume I], foram em boa medida responsaveis de que os limites conceituais que deveriam definir 0 t6- pico aparecam difusos e sumamente interpreta veis. Desse modo, dependendo da tradi da corrente a que nos filiemos, poderemos nos referir 4 metacognic4o como introspeccao re- flexiva (filosofia da mente), como habilidade de auto-observacao (procedimental-cognitivis- mo), como qualidade de controle executivo (processamento da informagao), como um tipo de reflexao em e sobre a propria ago (“pes- quisa na ago") ou como um processo de inter- nalizacao da regulagao interpsicolégica & intrapsicolégica (enfoque sociocultural), entre outros possiveis termos que invocam um fend- meno parecido. Uma breve revisao das dife- rentes posigdes que os paradigmas dominan- tes adotaram sobre o tema pode nos ajudar a esclarecer do que falamos quando menciona- mos a metacognicao. John Flavell (1970, 1987), discipulo de Piaget, foi um dos primeiros autores a interes- sar-se pela capacidade de que os seres huma- Fare ee ree | | 154 COLL, MARCHES!, PALACIOS & COLS. nos se vangloriam quando exercem um certo controle consciente sobre os proprios estados ¢ processos mentais. De fato, foi ele quem cu- hou pela primeira vez. 0 termo “metacogni- 20”. Para Flavell, a capacidade metacognitiva Jesenvolve-se por meio de duas fontes primor- diais: em primeiro lugar, mediante o conheci- mento adquirido sobre algumas varidveis de cardter pessoal (conhecimentos e crengas so- bre o proprio funcionamento cognitivo: “lem- bro-me melhor dos rostos que dos nomes”, “a matematica nao é meu forte”, etc.), relativas & facilidade ow A dificuldade das tarefas a reali- zar (novidades, requisitos necessarios, esfor- {os que demandam, etc.), € com relacao as es- tratégias de resolugao disponiveis (por exem- plo, para reter uma informacio: repetir, orde- nar por um atributo, classificar por categorias, etc.). A segunda fonte de desenvolvimento si as préprias experiéncias metacognitivas do su- jeito ao aplicar tais conhecimentos ¢ avaliar sua pertinéncia e sua eficacia. Um de seus colaboradores mais prdxi- ‘mos, Jenri Wellman (1990), dara mais um pas- so a0 atribuir a essa capacidade metacognitiva 0 fato de que os meninos e as meninas elabo- rem cada um suas teorias sobre 0 funciona- mento de sua mente a das dos outros; essas teorias da mente lhes permitirao distinguir aos quatro ou cinco anos, por exemplo, entre pen- sar, recordar, adivinhar, sonhar ou saber. Se- guindo essa mesma linha, desenvolveram-se 5 meticulosos trabalhos de Anne M. Melot (Melot e Nguyen, 1987) sobre os conhecimen- tos das criangas sobre seu funcionamento mental, chegando a uma conclusao: as crian- 68s, praticamente desde um ano de vida, tém um conhecimento implicito sobre caracteris- ticas, requisitos e limitagées de seu sis cognitive, conhecimento este utilizado para otimizar suas aprendizagens ¢ que aumenta progressivamente com a idade © Quadro 8.3 mostra alguns dos ambitos evolutivos que as criangas atingem em uma das areas de competéncia mais estudadas por tais autores: a metamemeéria. Apesar de seu inte- resse, esse enfoque parecia reduzir toda a me- ‘acognicéo a0 conhecimento sobre os préprios Processos cognitivos, em detrimento de outros componentes igualmente importantes da iprendizagem, como os contetidos ou os re. Sultados e as préprias condigdes em que tal (Pees eee = aprendizagem ocorre (Pozo, 1 essa concepcao da metacognic: ples e generalista, 4 que nao | contetidos das tarefas de aprei contexto em que ela ocorre, (1996), em seus estudos sob; da aprendizagem em crianca: trou que essas concepcées es ligadas ao contetido das tarefas que elas aprens dem (ler, contar, desenhar, etc.), de forma que ‘© metaconhecimento nao € apenas o conhect mento dos processos psicolégicos, mas também dos contetidos que devem ser assimilados ou aprendidos. Igualmente, Scheuer e outros (2000) mostraram que as criancas de quatro ¢ cinco anos tém modelos e teorias sobre como aprendem a desenhar que esto estreitamente conectados com as préprias dificuldades que 0 desenho, como sistema de representacao exter. na e contetido de aprendizagem, coloca as pré- prias criancas. Em suma, as criangas nao pen- sam sobre a aprendizagem, a memoria ou a atengao, mas em aprender a desenhar, a ler ou a contar, e 6 nessa atividade de aprender a de- senhar, ler ou contar que elaboram seus conhe- cimentos e teorias sobre a aprendizagem e, com elas, suas estratégias para aprender melhor, Além disso, a aproximacio tradicional da metacognigao passava por alto o conhecimen- to sobre as condigdes mais adequadas para a ativagao de diferentes processos. Nao se trata apenas de que os alunos vo adquirindo um conhecimento maior sobre o que devem fazer para aprender, mas também onde, quando, como e com quem devem fazer isso. O conheci- mento condicional foi definido como um dos tacos fundamentais da aprendizagem estra- tégica (Monereo, 1994). Em suma, 0 uso das estratégias de aprendizagem deve ser sempre um uso situaco em um determinado contexto, em funcéio das condicées reais de aprendiza- gem, dos recursos disponiveis e das metas estabelecidas. Diante do pressuposto, que via- mos na tradigéo behaviorista, de que um con junto de “receitas de aprendizagem” pode ser- vir urbi et orbe para enfrentar qualquer situa do, 0 enfoque da aprendizagem situada vai destacar a importancia da adequacao da esta tégia as condicoes efetivas da siruagao. Dess4 forma, como se verd no préximo item, 0 est do das estratégias nao poderd tampouco red zir-se a um treinamento “metacognitivo hase 996). De fato 40 € muito sim, leva em conta og ndizagem nemo Assim, Pramli Te as concepedes 's Pequenas, Mos- tao estreitamente ~— ae | OESENVOLVIMENTO PSICOLOGICO E EDUCAGAO, v2 155 quaono 8.3 Desenvolvimento da capacidade de metameméria Oe dade (anos) coueoen Exemplo 01 | imitagao dirota e imediata de agoes. Repetir sons que 0 cuidador realiza, 1-2 | Imitagao dilerida de agoes, lecordar um jogo e reproduzir gestos & sons pro- duzidos durante 0 jogo. ged | Uso de mnemotécnicas nao-verbais, ‘Onar ou assinalar onde esta escondido um objeto para nao esquecé-lo, Uso de indicios diretamente observaveis. Saber que na caixa com 0 desenho de um sapato eI40 08 sapatos 45 | Conhecimento da reacao entre quantidade de da- | Entre duas listas de ilens a reler, uma maior e outra dos ¢ elicacia da rolengao. manor, escolher a menor. 56 | Uso da repeligao diane de uma demanda, Uso de indicios nao-diretamente observa veis. Repatir varias vezes uma palavra para lembra-la posteriormente, quando Ihe pedem que faca. ‘Saber que na caixa do meio do armario estéo os sapalos, 6-7 | Conhecimento dos dad iados, Saber que possul 0 dado sobre qual é a capital da Franga, sem poder recorda-lo nesse exato momento. 8.9 | Conhecimento da lacilidade da eaprendizagem. | Saber que se retém com mais dificuldade uma nova lisia de elementos do que uma lista de elementos miliaces, 9:10} Retengao dos pontos-chave de um percurso ikar-se em que, chegando ao quiosque, é preciso irae & dita 10-11 | Uso da associagao de ideas. Lembrar-se do sobrenome Gomez porque 0 nanz esse senhor parece uma goma 11-12 | Conhecimento da pouca duracao da inlormagae | Evitar distai-se enquanto repete um dado até en- na Memnénia de Curto Prazo (MCP) 12..... | Auto-informes contiave processos que gerem mentalmente, sobre alguns produtos & conlrar um pedago de papel para anota-l. Explicar 0 que pensou e como e por que mudou seu pensamento, quando Ihe pedivem. ee do na tomada de consciéneia do aluno de seu préprio funcionamento cognitive, ja que mui- las vezes isso tampouco se traduz em uma Melhoria da agio diante de contetidos ¢ de contextos concretos. Como mencionamos, parte da dificuldade de transformar a metacognicao em cognigao — 0u se se preferir a metacognigao como uso es- tratégico do conhecimento — provém da pré- Pria identificagao da metacognicao (Marti, 1995, 1999; Schraw e Moshman, 1995). En- Quanto que, a partir da corrente que vinhamos analisando, tendia-se a interpretar a metacog- nigdio como aquilo que os “sujeitos dizem de sua propria cognicao”, para outros autores, mais proximos ao enfoque do processamento de informacao, a metacognicao corresponderia mais aos processos de controle e de regulacao, de forma que seria mais 0 que os “sujeitos fa- zem de sua propria cognicao”. Para retomar uma distingdo classica, e neste caso esclarece- dora, no primeiro sentido falariamos de uma metacogni¢do declarativa (a metacognicao é um tipo de discurso), enquanto que, no segundo, 156 COLL, MARCHESI, PALACIOS & COLS. estariamos diante de uma metacogni¢ao procedimental (a metacognigao é uma forma de acao).. Desta tiltima formulacdo, mais préxima do processamento classico de informacao, a metacogni¢ao como discurso cldssico € um epifendmeno, uma espécie de ilusdo que os se~ res humanos tém de poder chegar a processos que esto encapsulados e tém um funcionamen- to basicamente autdnomo e automatizado, im- penerravel a suas consciéncias, de modo que se a metacognicao existe é de fato um processo cognitivo mais do que explicito (Reder e Schunn, 1996). Diante dessa concepgio rebelou-se um outro grupo de especialistas que, sem negar a parcial falta de clareza do sistema cognitivo no que se refere aos processos cognitivos basicos, defendeu a possibilidade de sermos conscientes pelo menos do conteiido, das idéias que nossa mente gera no exato momento em que se esta- belecem trocas com o exterior. Em outras pala: vras, uma parte das representacdes ou dos mo- delos mentais que utilizamos a cada momento para responder as continuas demandas do con texto, e que estariam associadas 4 memoria de curto prazo, poderiam ser acessiveis a conscién- cia. Tal enfoque encontrou apoio parcialmente com o ressurgimento das idéias de Vygotsky € com o surgimento dos modelos de aprendiza- gem situada, defensores da indissolubilidade entre o que se aprende e o contexto em que se aprende. Trata-se, assim, de estabelecer uma aproximagao integradora entre os postulados cognitivos ¢ os socioculturais, por parte de au- tores como Brown, (1978), Pressley (1995) ou Bransford (Bransford e outros, 1990). Tais pro- postas, a maior parte originada em situacdes complexas de intervencao em contextos educa- ionais, apdiam-se em pelo menos trés principi- os comuns: 1. A conviegio de que, embora a re- presentagao dos problemas e das ta- refas enfrentados pelo aluno tenha uma natureza basicamente cogniti- vo-individual, os modos de interagir com eles ~ 0 input e o output ~ tem uma natureza eminentemente social e cultural e para sua correta com- preensao € necessario munir-se de nogdes como zona de desenvolvi- mento, “andaime”, negociagao de _,. significados ou emissa pedagdgicas, 8° aiudas 2. Uma decisiva aposta em analig regulacdo em tareas contextual? situadas, nas quais as concepedee me Vias, as demandas do ensino eos coy tetidos disciplinares tém um peso, pecifico, diante da idéia de une regulacdo geral e acontextua 3. Acerteza de que o acesso conscien. te anossas producdes mentais inclu tanto os produtos de nosso pensa, mento como alguns dos processos veiculados por tais conhecimentos, muito particularmente os que em pregam procedimentos de gestio ¢ de organizacio da informacao que foram aprendidos formalmente e conscientemente em seu dia, e de que, em suma, os dois tipos de meta cognicaio — como discursoe comore gulacao ~ constroem-se mutuamen- te, mas aceitando que essa aprendi zagem deve partir de cenarios con- cretos, das condigées praticas de cada situacdo de aprendizagem. Essa posicao, a nosso ver, caracteriza atualmente o que chamamos de aproximacao construtivista das estrarégias de aprendizagem e, de fato, supde um esforgo de integracéo dos principais tragos que, em diferentes enfoques, atribui-se ao uso estratégico do conhecimen to, entre os quais, como assinalamos, destaca- se a necessidade de que esse conhecimento te- nha um forte componente metacognitivo. 0 es- forgo de integragao se traduziria nao apenas em considerar simultaneamente a importan- cia de processes, contetidos e condi¢ées 40 por em pratica 0 conhecimento estratégico, mas também em entender que os aspectos da me racognigao que estamos desenvolvendo=0 ve 0s alunos sabem dizer e fazer sobre seus Pro” cessos cognitivos - esto estreitamente vince lados. Se queremos que os alunos adminis sua prépria aprendizagem, devemos auc a regula-la on line em contextos @ cenanios © tuados e com contetidos concretos. Mas se Qh remos que tal regulagdo se converta eft Of competéncia, em um conheciment eer i co, que possa ser transferido — ou transcO tualizado — a outros problemas de apr ee ee DESENVOLVIMENTO PSICOLOGICO EDUCACAO, v2 157 em, devemos ajudd-los a tomar consciéncia Se sua experiéncia, a explicitar como realizam essa regulacao; ou, se se preferir, utilizando a erminologia de Karmiloff-Smith (1992), a fa- ger uma redescrigdo representacional de seus proprios processos metacognitivos, de forma que, 0 que originalmente era uma regulacao mais implicita, possa tornar-se uma regulacao explicita sobre a qual o aluno pode refletir, em boa medida, como viamos no exemplo da to- mada de notas no inicio do capitulo, por meio da comunicacao e da troca social. Contar aos outros muitas vezes é também a primeira e a melhor forma de contar a nds mesmos. Em suma, a complementaridade entre es- sas duas formas de entender a metacognicao, sua necessidade miitua, ajuda-nos a ver que, de qualquer forma, 0 uso estiatégico do conheci- mento nunca € uma questdo de tudo ou nada mas uma questio de graus. Da mesma forma que a distincao entre conhecimento explicito € implicito, responde também a um continuo que deve ser analisado sempre em funcio das rela ‘cées entre o que se deve aprender (contetidos) como se aprende (processos) ¢ onde, quando, para que € com quem se aprende (condicses) De fato, alcancar o controle consciente de por exemplo, um procedimento, nao é uma ta: refa simples € muito menos imediata. Se nos atemos a modelos evolutivos como 0 que nos prope Karmilofi-Smith, unicamente a repeti: Gio com progressivo aumento de habilidade e éxito de um procedimento ~ 0 que ela chama de nivel de maestria procedimental ~ pode con- verté-lo em candidato para que produza sua redescricao representacional, isto €, sua repre- sentagio em um nivel superior de abstracao que lhe permita ser acessivel a consciencia Parece claro que ainda necessitamos de mais estudos para comprovar até que ponto a refle- x40 metacognitiva induzida por outros agen tes sociais (inclusive por sistemas simbélicos interativos como 0 computador) pode permi- tir saltos qualitativos desse continuo assinala do por Karmiloff-Smith. Uma proposta interes: Sante nessa linha € aquele feita por Gavriel Salomon (1992) quando se refere a uma du pla via para chegar a automatizagao de um pro- cedimento: = Por um lado, existiria uma aprendiza- gem por “via baixa” de um procedi mento, por meio de seu uso, baseado em uma regulamentagao implicita, em uacdes de aprendizagem, que leva ‘a.uma maestria procedimental de uma otica préxima a de Karmiloff-Smith, ou, se se preferir, a um dominio técni- co. A partir da prévia automatizagio do processo poderia iniciar-se um pro- cesso de tomada de consciéncia e gra- dual explicitagao do mesmo, que po- deria culminar, em condigdes favora- veis, com sua utilizacdo cada vez mais estratégica, isto é, deliberada e ajus- tada as condigdes de cada contexto. - Por outro lado, poderia produzir-se uma aprendizagem do procedimento por “via alta” por meio de uma anili- se consciente, desde o primeiro mo- mento, das varidveis e das condigdes que incidem em sua correta execucao, desse modo favorecendo-se um per- curso de regulacao mais explicita que acabe, pelo préprio efeito da pratica, conduzindo a uma regulacdo mais im- plicita, embora conservando sempre a possibilidade de redescrever ou de explicitar os conhecimentos que gui am essa execucdo. Nesse caso, é pre- ciso esperar que, quando 0 aluno en- contra alguma dificuldade na aplica- cao do procedimento, seja muito mais simples identificar o problema, elabo- rar um plano de solugao e executa-lo satisfatoriamente. Como assinalavamos, as duas vias de ace- so ao controle estratégico seriam de fato com- plementares, de forma que qualquer progra- ma de treinamento estratégico deveria tentar incentiva-las, mas sabendo sempre que a ‘via alta” produz resultados de aprendizagem mais duradouros ¢ transieriveis e, portanto, mais de- sejaveis, j4 que permite enfrentar com certas garantias de éxito novos problemas ou situa- Oes, enquanto que a maestria procedimental sé é eficaz em condicées rotineiras ou repet das. Devemos recordar, porém, que essa via alta s6 sera possivel pelo dominio de certas rotinas ou técnicas previamente automatizadas, Em suma, trata-se agora, para concluir este capi- tulo, de conhecer alguns critérios que nos per- mitam identificar um uso mais estratégico do 158 COLL, MARCHES!, PALACIOS & COLS. ra assim estar em condigoes cimento, pa ; one \drios educacionais. de promové-lo nos cen: DIMENSOES DO : CONHECIMENTO ESTRATEGICO Resumindo o que se viu no item anterior, podemos considerar que 0 uso de uma estraté- gia implica a ativacdo intencional e deliberada de conhecimentos (conceituais, procedimentais e/ou atitudinais) com o propésito de atingir certas metas de acordo com um plano estabe- lecido. Dessa forma, para por em pratica uma estratégia serd necessério que o sujeito contro- le 0 planejamento, a supervisdo e a avaliaco desse plano, Também vimos que esse controle pode, na realidade, ser mais ou menos explici- tou implicito, de forma que alguns componen- tes da estratégia possam estar automatizados ou regulados de forma implicita, De fato, este costuma ser 0 caso: costumamos por em pritica estratégias que fazem um uso intencional de téenicas ou de recursos cognitivos automati- zados. Pensemos no jogador de xadrez ou no treinador de uma equipe de basquetebol que traca um plano de aco apoiado em técnicas previamente dominadas e treinadas. O mesmo ‘ocorre com 0 professor que decide organizar um debate em aula para trabalhar certas atitu- des, ou com o aluno que se propée a fazer um esquema para comprovar que compreendeu adequadamente o contetido de um tema Portanto, desse ponto de vista, as estraté- gias, embora implicassem 0 uso de diversos ti- os de conhecimento (seguindo a classificagio em uso, tanto conceituais como procedimen- tais ou atitudinais), teriam um forte compo- ente procedimental & medida que consistem em um plano de aco para atingir certas me- tas. Do nosso ponto de vista, a distingao entre Procedimentos técnicos e estratégicos (subli- nhar é uma técnica ou uma estratégia? e fazer lum esquema? e organizar a classe em grupos Pequenos?) nao tem sentido, mas todo proce- dimento (seja ler, sublinhar, tomar notas ou or- ele gipcs de classe) pode ser usado de forma nad "NOS rotineira ou estratégica, wRaimeto caso, quando um procedimento é © uma mera técnica, nao existiria metacognicio de via alta ou explicita, seja por- ue a rotina estd totalmente automatizada | (como acorre com 0s especialistas, que jf ng necessitam planejar o que tantas yess B80 com éxito), seja porque o controle desse a extermo a0 sujeito que o executa (per a plo, 0 jogador de basquete que segue sn tagio de seu treinador apos um “tmegn 10%, ou 0 aluno que aplica certs procedin tos de céelo, como a proporcao inverse ya do 0 professor Ihe pede ou sugere). Porque mesma ago tem vérios componentes gn jamento, execugdo e avaliaio), & sempre pre sivel que alguns se apliquem tecnicamente outros, sob controle estratégico (por exemplo, 6 aluno decide um plano de agéo, mas depos, © executa de forma rotineira; ou a0 contritig langa-se diretamente & tarefa, sem planejéla, mas a medida que a realiza, supervisiona sua acao, detecta dificuldades e corrige a seqitén cia previamente estabelecida). Como se vera no proximo capitulo, uma seqiiéncia adequa- da para o ensino estratégico implica uma trans feréncia progressiva do controle da tarefa do professor/treinador ao aluno/jogador, de for. ma que este tenha cada vez mais autonomia e responsabilidade em sua aprendizagem (ver também Monereo, 1994; Monereo e outros, 2000; Pozo, 1996; Pozo e Postigo, 2000). Se ndo podemos diferenciar em terms absolutos entre procedimentos técnicos e es- tratégicos, mas entre o uso técnico e 0 uso estratégico que alguém faz desses procedi- mentos em um contexto ou uma situagao con- creta, € conveniente que tenhamos critérios para diferenciar quando tal uso é mais ou menos estratégico, 0 que de passagem nos servird para assinalar alguns tracos que de- vem reunir as situagées de aprendizagem € ensino para demandar dos alunos uma apro- ximagao mais estratégica, que, como assina- lévamos, parece o mais desejavel do ponto de vista educacional. Evidentemente, nao deve- mos esquecer que isso exigira a consolidacao prévia de um dominio técnico que 0 aluno pos- Sa aproveitar; nao se pode fazer um uso ¢ tratégico de uma técnica ou de um proce mento que nao se domina es que i avrt tums dienes Set -em um uso estratégi nee to, nao necessariamente independentes *T . tas vezes inter-relacionadas, seriam (pare re detalhes, ver Monereo, no prelo; Pozo € Poste" 2000) identificam €/0U mn er 7 DESENVOLVIMENTO PSICOLOGICOE EDUCACAO, v2 159 1. As metas da aprendizagem: nao se trata apenas de que assumam uma orientacdo cada vez mais interiori- zada—o aluno é que deve fixé-la, e nao apenas o professor -, mas da profundidade dessas metas, 0 para que da ativagao ou do uso desses procedimentos. Quando a meta, utilizando uma terminologia jé clas. sica (Entwistle, 1987), supde uma aprendizagem reprodutiva, nao se requer uma aproximacdo estratéy a; so suficientes os mecanismos de aprendizagem associativos de que dispdem os alunos que se mos- tram eficazes para atingir tais me- tas (Poz0, 1996), que, por outro lado, estao fortemente condiciona- das pelas exigéncias das tarefas pro- postas pelo professor, e muito par- ticularmente pelos sistemas de edu- cacao estabelecidos. Em compensa- ¢40, quando a meta é mais profun- da, é mais dirigida a compreensao de novos significados ou a recons- truco de conhecimentos prévios, a aprendizagem —e com ela 0 ensino = costuma tornar-se um problema e requer do aluno ~ e do professor uma maior reflexdo estratégica 2. O grau de controle e regulacao, a consciéncia que precisa a tarefa de aprendizagem: como vimos no item anterior, 0 uso estratégico requer um controle explicito por parte do su- jeito ou aluno. Neste item, também afirmamos que alguns componentes da acao (planejamento, execugao, avaliagao) podem estar sob contro- le estratégico, ou explicito, enquan- to outros nao. Como ja é conhecido, © ensino estratégico deve basear-se em uma transferéncia progressiva desse controle do professor para 0 aluno e, por isso, dificilmente o alu- no sera estratégico em sua aprendi- zagem se antes o professor nao o foi em seu ensino (Monereo, 1994; Monereo e Castelld, 1997). © nivel de incerteza da tarefa de aprendizagem, que est relaciona- do com sua novidade e seu cardter 4. mais ou menos aberto: em geral, quanto mais inovadoras ou menos Totineiras sejam as condigdes de uma tarefa de aprendizagem, maior sera a aproximagao estratégica exigida. E a mudanga dessas condigées que torna necessario adotar um enfoque estratégico; se as condicdes so co- nhecidas, se é um simples exercicio, podem aplicar-se as rotinas habi- tuais; se algumas condigoes variam (contexto, recursos disponiveis, ce- narios de uso ou metas), a situacdo se tornard um problema e exigira que se adotem decis6es estratégicas para enfrenté-la, Além disso, quanto mais aberta se apresenta uma tarefa de aprendizagem, maior sera o grau de incerteza sobre sua resolucao e mais decisdes 0 aluno terd de tomar para abordé-la e, por isso, sua demanda estratégica também seré maior. Em compensacéo, as tarefas fechadas que ndo oferecem opcao de respostas nem alternativas na forma de resolvé- Jas requerem simplesmente que se ponha em pratica rotinas ¢/ou pro- cedimento ja automatizados. Nova- mente, a introducao de sicuagdes pro- blematicas, ou de componentes pro- blemidticos nas situacées, que impli- quem novidade e incerteza, deverd ser progressiva. Se as condicdes de aplicagao sao totalmente conhecidas, bastard ao aluno aplicar uma técni- ca; mas se, no outro extremo, todas as condigées sio novas, dificilmente © aluno conseguira adotar uma es- tratégia adequada. No ambito da aprendizagem situada, as estratégias requerem “ressituar” de forma deli- berada os conhecimentos adquiridos em novos contextos de uso. Para que © aluno aprenda de modo estratégi- co, 0 professor deve fazer com que esses conhecimentos sejam utilizados em problemas cada vez. mais comple- X05 e, por isso, inovadores e abertos. A complexidade da seqiiéncia de agGes: quanto mais complexo for um procedimento, mais provavel sera que requeira um controle estraté- a__-— ~=—=—=S———s—

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