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30/08/2023, 23:15 Entrevistas / Palestras

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Boa noite Quarta-Feira , 30 de Agosto de 2023  
 
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> Fundação Mario Covas consultor do MEC na elaboração
dos Parâmetros Curriculares
Nacionais.

A palestra a seguir foi realizada no


dia 28 de agosto de 2003, como
parte do programa de
videoconferências da Rede do
Saber.

• Introdução

• O atual sistema educativo

• Mudanças de paradigma: o aprendizado pela vivência

• Tipos de Comunidades de Aprendizagem

• Comunidades de Aprendizagem em sala de aula

• Comunidades Escolares de Aprendizagem

• Comunidades de Aprendizagem territoriais

• Comunidades Virtuais de Aprendizagem

• Os obstáculos no caminho das CAs

Introdução

Vou começar fazendo algumas considerações sobre as relações entre


Comunidades de Aprendizagem e educação escolar. Como poderemos
ver, os trabalhos e as iniciativas sobre Comunidades de Aprendizagem
as têm apresentado como uma alternativa aos sistemas de educação
formal. O meu objetivo é fazer uma reflexão sobre até que ponto elas
poderão conter elementos que nos ajudem a melhorar e transformar
o sistema escolar tal como o conhecemos atualmente.

O sistema de educação escolar atual apresenta certas carências e


limitações para satisfazer às necessidades educativas do conjunto da
população. Mas educadores e educadoras que lidamos com educação
há muito tempo sabemos que as comunidades de aprendizagem não
oferecerão soluções a todos os problemas que temos, elas não são a
panacéia para todos os problemas da educação. Nesta exposição,
também assinalarei algumas das limitações que, a meu ver,

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apresentam, ainda, a teoria e a prática das Comunidades de
Aprendizagem.

O conjunto de experiências, propostas, inovações que vêm surgindo


nos últimos 10 anos ganharam a denominação genérica de
estratégias de Comunidades de Aprendizagem. Elas representam
atualmente uma trama conceitual de grande potencial transformador
e proporcionam ao mesmo tempo uma plataforma útil e apropriada
para empreender uma revisão em profundidade dos atuais sistemas
de educação escolar, para satisfazer as necessidades de todos os
alunos e da comunidade.

Esta capacidade de transformação está limitada, atualmente, por uma


série de obstáculos que nos impedem de aproveitar o potencial
transformador do movimento das CAs. Vou citar dois deles. O
primeiro é a heterogeneidade de significados e práticas
associados ao conceito de CAs. Revisando as experiências
concretas relacionadas à aprendizagem, nos damos imediatamente
conta de que, sob a denominação de Comunidades de Aprendizagem,
aparecem experiências muito diversas. Há uma grande variedade de
práticas e de significados associados a elas e que muitas vezes
dificultam o aproveitamento destas experiências.

O segundo obstáculo é um pouco mais conceitual e também mais


discutível, e tem a ver com a objetividade teórica que temos
atualmente para dar conta de como se aprende, uma dificuldade
conceitual para explicar como se exerce a influência educativa no
âmbito das CAs, como os professores que as constituem com seus
alunos conseguem, nesse contexto de co-construção, exercer uma
influência educativa eficaz e orientar efetivamente a aprendizagem.

O atual sistema educativo

O primeiro pressuposto é que nossos sistemas educativos - todos,


creio que não há diferença entre os sistemas nacionais dos diferentes
países - seguem apresentando, apesar dos avanços que se tem
realizado, destacadas limitações para satisfazer as necessidades
educativas do conjunto da população, gerando 'bolsões' de alunos
que não conseguimos fazer avançar.

O segundo pressuposto é que algumas dessas carências e limitações


não podem ser superadas por reformas mais ou menos setoriais e
individuais de determinados aspectos da educação escolar, mas
exigem uma revisão em profundidade da organização e do
funcionamento dos sistemas educativos.

Na escola, especialmente no Ensino Fundamental, encontramos


limitações que nos impedem de satisfazer às necessidades formativas
e de educação de todas as crianças. Fenômenos como o fracasso
escolar, o abandono, o absenteísmo estão amplamente documentados
em todos os sistemas educativos. Variam as porcentagens, mas seja
qual for o critério que usemos para definir 'fracasso escolar', os
estudos comparativos internacionais mostram que em todos os
sistemas encontramos índices mínimos 10 de 15% de fracasso
escolar. O mesmo vale para as faltas, o que não é novo.

Creio que o que é realmente novo é a idéia de que as reformas


educativas implantadas do último terço do século XX, por mais que as
mudemos, não vão fazer muito para superar estas carências em
educação. É a percepção de que o problema não pode ser superado
simplesmente com mudanças curriculares ou no material didático -
podemos seguir melhorando esses pontos, mas a idéia é de que há
algo na organização dos sistemas educativos atuais que impede, de
algum forma, que se chegue à satisfação das necessidades
educativas da sociedade.

Esta idéia, de que já não se trata apenas de implementar reformas


educacionais, no estilo do que foi feito nas últimas duas décadas,
mas de que devemos buscar algo que está na base, em profundidade,
está relacionada ao fenômeno da perda progressiva da centralidade e
do protagonismo quase exclusivos adquiridos pela educação escolar
ao longo do século XX.

Até então, na maior parte dos grupos sociais, desenvolviam-se

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diferentes práticas educativas, de cenários educativos, de agentes
educativos. Ao longo do século XX, no entanto, as sociedades
ocidentais reduziram o conjunto de cenários, práticas e agentes
educativos à educação escolar. De tal maneira que na sociedade
todos os problemas de formação e orientação das novas gerações são
atribuídos de maneira exclusiva à escola. Esta tendência nos levou à
constatação atual de que as instituições de ensino escolar estão
praticamente incapacitadas para assumir todo o conjunto de
responsabilidades que lhes foi atribuído.

A escola tem que cuidar de absolutamente tudo: ensinar a ler e


escrever, ensinar o gosto pela leitura, despertar a sensibilidade,
adaptar-se às novas tecnologias, tem que abraçar todos os temas
transversais - a educação para a saúde, a educação sexual, tem que
educar para a solidariedade. E cada novo programa que aparece
imediatamente é a sua próxima missão. Todo este processo nos levou
a uma situação que começamos a tomar consciência de que é
insustentável, porque a escola não pode fazer tudo sozinha.

Vou dar um exemplo da Espanha. Eu tenho pânico dos debates do


Parlamento sobre 'o estado da Nação', que discutem o sistema
educacional e nos quais, já de madrugada, os senhores deputados
apresentam moções para aprovar propostas de programas educativos
sobre alcoolismo, Aids... Enfim, hoje em dia existe essa suspeita de
que já não podemos nos limitar a mudar algo mais no currículo ou na
promoção do professorado ou qualquer outro aspecto da educação,
sem repensar em profundidade algo mais básico e substancial.
Estamos num caminho sem saída, porque é enorme o conjunto de
expectativas e de exigências que se acumulam e que não
conseguimos cumprir, o que coloca a escola em uma situação de
fracasso.

Mas há outros fatores que estão por trás desse círculo perverso e da
perda do protagonismo escolar, como o surgimento de novas
sociedades e agentes educativos. As escolas seguem com a
responsabilidade de transmitir todos os valores, todas as informações
que consideramos ter relevância para as crianças e jovens, quando é
óbvio que cada vez mais há novos sistemas e novos agentes
educativos que têm influência não apenas em nível de valores, mas
também na aquisição de informações, através de meios de
comunicação como a televisão e principalmente a Internet,
possibilitando o desenvolvimento de cenários educativos que dão
acesso a uma grande quantidade de informações que não respondem
ao esperado pelo sistema escolar, mas que na prática atuam como
cenários e como agentes educativos - ou deseducativos.

Mudanças de paradigma: o aprendizado pela vivência

Outro fator que incide sobre a perda de protagonismo da escola é o


impacto educativo de determinadas práticas sociais, ou seja, a
participação em atividades sociais, comunitárias que estão mudando
a nossa percepção do social e da organização do sistema educacional.
Este é um ponto. Outro é a relevância crescente da formação e da
aprendizagem no decorrer da vida. Todos os sistemas educativos
nacionais que eu conheço estão montados sobre uma base de dois
princípios, que, nós sabemos, hoje já não estão tão vigentes quanto
no passado.

Um é concepção de que a educação inicial das pessoas é a que


determina o futuro e sua história pessoal e profissional. Cada vez
mais estamos conscientes de que no cenário em que nos movemos
será necessário passar por ciclos sucessivos de formação ao longo da
vida. A idéia de que há um período de formação inicial após o qual
nos incorporamos ao mundo do trabalho e só voltamos à instância de
formação se tivermos algum problema de percurso, está em crise.
Todos os analistas nos asseguram - eles até podem estar equivocados
- que no futuro aqueles jovens que hoje estão nas escolas não terão
que mudar três ou quatro vezes de emprego, mas sim de profissão,
o que implica na necessidade de sistemas educativos com princípios
diferentes dos que temos hoje em dia, no qual as pessoas entram,
permanecem durante um período e se incorporam ao mundo do
trabalho. Isso não será possível no futuro.

Tudo isso nos leva a crer que estamos entrando em um período novo

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na maneira de encarar a educação escolar, no qual teremos que
repensá-la a partir de uma visão mais ampla. A educação escolar
continuará tendo uma importância decisiva no futuro, mas terá que
repensar seu papel, pois a educação já não é só aquela que tem lugar
nas escolas. Vamos inaugurar uma época em que teremos que pensar
que a educação escolar é apenas uma das práticas sociais de que nos
utilizamos para favorecer os processos de desenvolvimento e
socialização das novas gerações.

A responsabilidade da educação e da formação destas novas gerações


já não correspondem só e em exclusivo à escola e aos professores,
como profissionais de educação, mas ao conjunto da sociedade e da
comunidade. Insisto que isso não quer dizer que a responsabilidade
da escola cessa, mas que ela segue tendo uma nova
responsabilidade. Teremos o compromisso e a co-responsabilidade de
diferentes agentes do cenário educativo, que desempenharão uma
influência crescente sobre a formação e a educação das pessoas. A
educação escolar deixará de ser identificada como sinônimo de
educação para se transformar em uma parte da educação num
sentido mais amplo, formada por práticas que têm lugar em centros,
que são centros escolares, e por práticas educativas que têm lugar
em outros cenários, que devem chegar a iniciativas de coordenação e
articulação entre os agentes educativos que operam nesses diferentes
cenários.

A idéia fundamental com a qual quero concluir esta parte da


exposição é que adotar uma visão ampla de educação implica aceitar
também as conseqüências, que é necessário refletir profundamente
sobre os princípios básicos dos sistemas atuais de educação escolar.
As reflexões devem chegar ao como ensinar e como aprender, e a
onde se ensina, rompendo que a idéia de que só se ensina e se educa
nas escolas, e também a quem ensina, quem educa. Esta é uma
análise destas carências e limitações que encontramos, como dado
estrutural, em praticamente todos os sistemas educativos, com a
conclusão de que não é possível abordar essas carências, que são
intrínsecas ao próprio sistema educativo, se não houver uma revisão
em profundidade e ampla da educação, adotando uma visão distinta
daquela que temos hoje nos sistemas tradicionais de educação,
focada não apenas em que ensinar e aprender, mas também em
como e a quem estamos ensinando.

Tipos de Comunidades de Aprendizagem

Agora, meu objetivo é levantar argumentos relativos à tese de que o


movimento de Comunidades de Aprendizagem, como um conjunto de
propostas e iniciativas surgidas nos últimos anos, proporciona uma
plataforma única e apropriada para abordar esta revisão em
profundidade dos sistemas educativos. O ponto de partida para esta
argumentação é que este momento das CAs vem se configurando,
nos últimos anos, como o expoente mais visível e com maior
fundamentação desta reivindicação por recuperar uma visão ampla
da educação.

Também como havia falado na introdução, a teoria e as práticas das


comunidades de aprendizagem estão distantes de constituir um
âmbito articulado e coerente de co-movimentos e experiências. De tal
maneira que é muito difícil identificar essas experiências que se auto-
apresentam como Comunidades de Aprendizagem, descrevê-las,
identificá-las por meio de parâmetros coerentes. Além disso, até
certo ponto, é possível conseguir uma complementaridade entre os
diferentes tipos de experiências e propostas.

Quando revisamos a literatura sobre o assunto, nos deparamos com


uma grande variedade de coisas que se denominam como
Comunidades de Aprendizagem. Identifiquei basicamente quatro tipos
distintos de CAs. É uma classificação que serve para exemplificar a
heterogeneidade de experiências, mas peço que não a tomem como
uma classificação definitiva.

As propostas de Comunidades de Aprendizagem identificadas são:

1 - As propostas dirigidas a organizar as aulas e os alunos em classe


como Comunidades de Aprendizagem;

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2 - O segundo tipo é formado por experiências, propostas e
interações dirigidas não à aula, mas ao conjunto da escola, numa
tentativa de organizar o funcionamento desse centro educativo como
uma Comunidade de Aprendizagem;

3 - O terceiro tipo são as Comunidades de Aprendizagem que, à falta


de uma expressão mais adequada, chamamos de territoriais. São
bairros ou regiões que têm uma comunidade de interesses e que se
põem de acordo sobre o que fazer para atingir esses objetivos,
mediante ações que têm como eixo integrador a aprendizagem;

4 - Um dos tipos de comunidades de aprendizagem que mais


cresceram nestes últimos quatro ou cinco anos e que muito
contribuíram inclusive para a popularização do termo são as
chamadas Comunidades Virtuais de Aprendizagem, grupos que se
utilizam das novas tecnologias de comunicação para criar espaços de
aprendizagem.

Como eu disse, essa classificação não deve ser tomada como algo
definitivo, porque também tenho visto comunidades de aprendizagem
com experiências e propostas que se situam em várias destas
categorias, ou em nenhuma.

Mas para o que nos interessa, a argumentação que estou seguindo,


esta classificação vai servir, porque cada um desses tipos de
comunidade nos proporciona uma compreensão sobre como é
possível caminhar de maneira diferente em alguns aspectos da
organização e do funcionamento dos sistemas educativos atuais,
quando se aborda essa questão de uma maneira ampla. Cada um
desses modelos nos diz coisas diferentes sobre aspectos da educação
escolar atual que teríamos que modificar para alcançar essa visão
ampla da educação.

Comunidades de Aprendizagem em sala de aula

A abordagem fundamental deste tipo de CA, nesse momento, é que


se constitui não apenas numa nova maneira de entender como
aprendem os alunos, mas de como se pode exercer a influência
educativa, de como se pode ensinar sem recorrer a modelos
expositivos mais tradicionais. As Comunidades de Aprendizagem em
sala de aula apresentam uma grande variedade, mas a característica
mais freqüente é que a ênfase não se dá no aprendizado individual,
mas na construção coletiva do conhecimento, no sentido de que o
aluno, quando aprende, é porque aprende em um processo de
construção, de aquisição de capacidade, de conteúdo e atividades
coletivo. A ênfase está sempre no aprendizado do grupo.

Partindo da idéia anterior, a segunda característica é que já não é


considerado negativo que os membros de um grupo tenham
conhecimentos, experiências, motivações, capacidades e interesses
diferentes. Pelo contrário, é uma das condições favoráveis para que
se crie o conhecimento coletivo. Quando o objetivo é que um grupo
crie conhecimento coletivo, todos sabemos, por experiência, que o
pior é que todos saibam o mesmo.

Outra ênfase é na aquisição de habilidades e estratégias meta-


cognitivas: as aulas que funcionam como Comunidades de
Aprendizagem sempre têm uma preocupação em que todas as
crianças do grupo, a cada momento, pensem sobre o que estão
fazendo, para que estão fazendo e quais são os objetivos. A
finalidade é que, ao final das atividades, o grupo seja autônomo e
cada indivíduo seja autônomo no domínio da aprendizagem da
realidade. Ser autônomo não é fácil, se aprende.

Não é fácil para um grupo funcionar como uma Comunidade de


Aprendizagem. Muitas dessas características, para que possam
funcionar, terão que ser introduzidas, ensinadas pelo professor.
Trabalhar colaborativamente é uma coisa que se aprende. Por isso,
nem por um momento se pode pensar que numa Comunidade de
Aprendizagem a função do professor seja menor. Pelo contrário, seu
papel é fundamental, pois para que essas características sejam
desenvolvidas e para que o grupo passe a funcionar realmente como
uma Comunidade de Aprendizagem, é absolutamente essencial que
ele tenha claro seu papel.

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Outra característica que aparece freqüentemente nesses grupos é a


ênfase na seleção de atividades percebidas como autênticas e
relevantes, às quais todos os membros do grupo possam dar sentido.
O aspecto do sentido é absolutamente fundamental no marco das
Comunidades de Aprendizagem e está intimamente ligado ao
processo de criação coletiva do conhecimento. Muita gente pensa, e
eu compartilho dessa idéia, que boa parte dos problemas de
aprendizagem apresentados pelos alunos não tem a ver tanto
com questões cognitivas, mas sim com o incentivo e com a
capacidade ou incapacidade que têm os professores e os
alunos de dar sentido às tarefas e aos conteúdos. O conteúdo
pede ser muito importante para o Ensino Fundamental, mas se é
impossível atribui-lhe sentido, é impossível ter uma aprendizagem
significativa desse conteúdo.

A característica das CAs organizadas em sala de aula é a organização


sistemática e estratégica dos conteúdos de modo que eles sejam
compartilhados, de modo que cada um dos alunos possa aportar suas
próprias experiências e vivências. São atividades complexas, que não
têm apenas um processo de desenvolvimento e resolução. São
também propostas que postulam um enfoque interdisciplinar, com a
responsabilidade da aprendizagem compartilhada entre professores e
alunos. Outro aspecto importante é que estas experiências
privilegiam sempre a profundidade frente à extensão. São
experiências, portanto, que exigem um manejo do tempo para
adequá-lo aos propósitos.

E, finalmente, estas Comunidades de Aprendizagem em sala de aula


recorrem constantemente a equipamentos e à participação externa,
por parte dos pais, de agentes da comunidade e de profissionais que
sistematicamente vão à sala de aula, atuando como instrumentos
para a alocação da informação pelos alunos. Uma última
característica é que são experiências que postulam altos níveis de
diálogo e de comunicação em sala de aula.

As Comunidades de Aprendizado em sala de aula recorrem a muitos


princípios clássicos da teoria construtivista, numa linha que poderia
ser denominada de aprendizagem dialógica, quando se pensa que a
aprendizagem se dá num marco de negociação do significado e de
diálogo entre os membros de um coletivo. Neste modelo, o papel do
professor é ensinar e trabalhar com os alunos as atividades
necessárias para construir um diálogo construtivo. Em resumo, este
tipo de Comunidade de Aprendizagem nos proporciona uma visão
distinta do que quer dizer aprender e do que quer dizer ensinar. E,
ainda que não se apresentem assim, grande parte das características
apresentadas pelas experiências das Comunidades de Aprendizagem
são princípios e propostas que têm origem em enfoques
construtivistas mais clássicos, que são sócio-construtivistas ou talvez
construtivistas inspirados nas correntes sócio-históricas e culturais.
De qualquer maneira, têm a virtude de apresentar seus princípios
dentro de um fundamento articulado e coerente, o qual não tem nada
de totalmente novo mas cujo conjunto lhe confere um interesse
especial.

Comunidades Escolares de Aprendizagem

O segundo tipo de comunidades de aprendizagem tem muitos pontos


em comum com a anterior. São as duas categorias de comunidades
de aprendizagem mais ligadas, porque a maior parte das experiências
propostas e inovações também fazem parte das tentativas de
melhora da educação escolar. Uma característica compartilhada é a
percepção, por parte dos professores e alunos, de que pertencem a
uma mesma instituição, que é vista como sua, algo que não acontece
nas escolas públicas, onde é muito difícil conseguir formar uma
equipe. Já a diferença fundamental é que neste caso, a proposta não
se dá nos processos de ensino-aprendizagem, mas nos aspectos de
organização curricular e funcionamento da escola. A
heteregeneidade, neste modelo de CA, é tão grande ou ainda maior
que no anterior.

Outra característica deste tipo de CA são as decisões compartilhadas


em relação a novas formas de organização, currículo e novas
metodologias de ensino. As CAs escolares não se identificam com

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uma metodologia didática concreta, mas se utilizam de diferentes
metodologias, ajustando-as ao trabalho com os alunos. Nestas
escolas, se confere uma grande importância à reflexão sobre a
prática, à articulação teoria-prática, à ação de processos de melhoria
das práticas pela utilização de recursos teóricos. Este é um princípio
difícil de ser aplicado, pois requer tempo.

Outra característica é a importância da participação dos agentes


sociais. De uma forma geral, nas experiências das CAs centradas no
âmbito dos centros educativos, os currículos, em maior ou menor
profundidade, são submetidos a um processo de consulta nos quais
os pais e outros agentes comunitários opinam sobre quais são os
conteúdos de relevância. Experiências como estas rompem com a
tradicional compartimentação dos currículos em matéria estanques.

Em resumo, é possível encontrar centros educativos que funcionam


de uma maneira diferente da tradicional, em torno do que podemos
chamar de uma cultura de aprendizagem. São instituições nas quais o
elemento central é o compromisso de todos na construção e da
aquisição de novos conhecimentos, nas quais as estruturas
hierárquica e burocrática são substituídas por outra, de trabalho e
responsabilidade compartilhadas, que exige tempo e espaço
diferentes dos atuais. São escolas que estão abertas à sociedade e à
comunidade nas quais se encontram não somente porque projetam
as atividades sobre esta comunidade, mas porque são sensíveis às
suas preocupações e interesses e se utilizam de todos os recursos
que aparecem na comunidade para a formação dos alunos. Tentam e
conseguem estabelecer co-responsabilidades e compromissos dos
agentes sociais.

Comunidades de Aprendizagem territoriais

A terceira categoria de CA, esta sim, é completamente diferente das


anteriores. São as Comunidades de Aprendizagem referidas ao
território, experiências que possuem origem distinta das anteriores,
pois não têm como objeto a educação escolar. São experiências
ligadas a estratégias de desenvolvimento comunitário no âmbito
econômico, baseadas na vocação comunitária, e que têm tido um
crescimento espetacular nestes últimos 10 anos.

As Comunidades de Aprendizado referidas ao território são


estratégias de desenvolvimento local inseridas no cenário de novas
tecnologias, de globalização econômica e cultural. São experiências
muito dirigidas, que buscam estabelecer desenvolvimento econômico
sustentável de entornos comunitários. Um exemplo claro deste tipo
de experiência é o Movimento de Cidades Educadoras (surgido em
1990, na Espanha). Esta é a manifestação de Comunidades de
Aprendizagem territoriais com maior referência em educação atuando
do âmbito europeu e latino-americano, que forma um conjunto de
experiências orientadas pela efetividade de aprendizagem e que tem
essa orientação de tentar unir o mundo escolar ao mundo do
trabalho, ao mundo econômico, formando um conjunto de estratégias
de desenvolvimento comunitário que inclua o trabalho nas escolas,
mas que torne a aprendizagem a base da elaboração de estratégias
de desenvolvimento em âmbito local.

Este tipo de CA também possui uma grande variedade de iniciativas.


Entre suas características está o reconhecimento de que nas
comunidades existe uma série de recursos de todo tipo - educativos,
econômicos, serviços, equipamentos - que normalmente são mal
aproveitados e que seriam muito úteis se utilizados em atividades
educativas. Outra característica é que essas CAs dão uma enorme
importância à parceria com os órgãos de educação, saúde, justiça e
outros de âmbito local, estadual e federal. Todos os agentes que
operam no território e que têm relação com atividades que podem
influir sobre a educação e a formação podem agir no sentido de
desenvolver pontos concretos de atuação, contando com os recursos,
os equipamentos desse território. Porém, em todos os casos, sem um
parceiro forte, que compartilhe recursos e objetivos, não é possível
levar adiante uma comunidade de Aprendizagem referida ao
território. Esta é a idéia fundamental.

Outra idéia que aparece com freqüência é que, junto com a


aprendizagem formal, estas experiências conferem uma grande

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importância à educação não-formal, aquela que tem lugar à margem
de qualquer intencionalidade pelos participantes, mas que possui uma
retribuição educativa - e às vezes deseducativa - sobre as pessoas
que participam das atividades. Um exemplo típico de educação
informal é o impacto educativo ou deseducativo que têm sobre os
jovens e as crianças muitos dos programas de televisão.

Outra idéia é que as comunidades de aprendizagem territoriais se


organizam em torno de dois objetivos básicos. Um deles é o
geográfico, e as experiências mostram que o tamanho do território
em torno do qual elas se organizam é importante. Quanto menor o
território, mais rápido se sentirá a ação da comunidade de
aprendizagem e maior o compromisso e a co-responsabilidade por
parte dos diferentes agentes sociais. Já o objetivo funcional
pressupõe que os agentes desse território compartilhem objetivos e
idéias. Levar a cabo as atividades e alcançar resultados são condição
para levar adiante uma Comunidade de Aprendizagem territorial.

Outra idéia que aparece constantemente nesta experiência é a


importância da aprendizagem ao longo da vida, como princípio
organizativo e como objetivo comunitário. E, como falamos antes,
uma das características importantes que a maior parte das
comunidades territoriais compartilham são as iniciativas cujo objetivo
é conseguir um desenvolvimento sustentável em uma área concreta,
favorecendo e melhorando a interação social. Por isso, as
comunidades territoriais cumprem papel importante especialmente
em áreas desfavorecidas.

Um último ponto que gostaria de salientar é a necessidade de que os


membros de uma Comunidade de Aprendizagem a percebam como
eficaz. Passado algum tempo, se eles não a percebem desta maneira,
deixam de participar e a iniciativa fracassa. Daí a necessidade de que
as CA desenvolvam planos de atividade que sejam específicos, para
atingir objetivos concretos e realistas.

Comunidades Virtuais de Aprendizagem

O quarto e último tipo de Comunidades de Aprendizagem, sobre o


qual vou falar rapidamente, porque não traz grandes novidades do
ponto de vista de princípios e de experiências educativas concretas,
são as Comunidades Virtuais de Aprendizagem. A idéia em torno de
uma comunidade virtual é de que possibilite a uma fácil integração e
que seja formada por instâncias ou pessoas que estão conectadas em
rede e que têm como foco um conteúdo de aprendizagem.

Nos últimos anos, no entanto, essa expressão foi descaracterizada, já


que passou-se a chamar de Comunidade Virtual de Aprendizagem
qualquer grupo de pessoas que têm um interesse comum e fazem
intercâmbio de informações sobre um aspecto comum. Sob um ponto
de vista mais exigente, a evolução das novas tecnologias não basta
para que um grupo com interesses comuns seja caracterizado como
Comunidade de Aprendizagem. É necessário que estas novas
tecnologias sejam utilizadas não apenas como instrumento de
intercâmbio de informações, mas que sejam postas como
instrumentos de aprendizagem, o que é muito mais difícil, porque o
desenvolvimento que alcançaram até o momento as novas
tecnologias em comunicação não foi acompanhado do
desenvolvimento de novas metodologias que façam uso de suas
potencialidades para ensinar e aprender.

Os obstáculos no caminho das CAs

Para finalizar, gostaria de comentar os dois obstáculos que nos


impedem de fazer uso dessa possibilidade transformadora que nos
proporcionam as experiências e propostas das Comunidades de
Aprendizagem. Esses obstáculos são aqueles enfrentados por
qualquer processo de transformação. É uma ingenuidade pensar que
quando se mantém um encadeamento correto, eixos teoricamente
sólidos, que a partir daí a transformação é direta. As experiências que
temos puderam demonstrar que quando a transformação proposta é
muito profunda, as dificuldades, logicamente, também são maiores.

O primeiro desses obstáculos tem a ver com a heterogeneidade de

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significados e práticas que antes já havia comentado. Esta
heterogeneidade de significados e práticas tem variações, porque os
diferentes tipos de Comunidades de Aprendizagem se dão a partir de
referências disciplinares distintas. Umas se inspiram na pedagogia, na
didática, na psicologia, caso das comunidades referidas à sala de
aula, outras têm referências tecnológicas, sociológicas, no
pensamento político e em diretrizes disciplinares que unem suas
raízes na ação tranformadora da política.

Há uma grande variedade, tanto em Comunidades de Aprendizagem


referidas à sala de aula quanto à escola e ao território. O que não
temos são experiências de aprendizagem que integrem esses três
tipos de CAs, que nos permitam entender como funcionam aulas
como Comunidades de Aprendizagem, inseridas em centros
educativos que funcionam como Comunidades de Aprendizagem, por
sua vez inseridos em redes de aprendizagem comunitária. Esse é o
grande desafio, para que daí cheguemos à grande transformação do
sistema de educação escolar tal como o conhecemos.

O segundo e último obstáculo tem a ver com o contexto de ensino


dentro das Comunidades de Aprendizagem e com as limitações
teóricas que no meu entender caracterizam a maneira de
contextualizar a função de ensinar dentro das Comunidades de
Aprendizagem, de como os alunos e professores podem se
comprometer com processos de co-construção do conhecimento,
mantendo ao mesmo tempo a capacidade de influir de maneira
sistemática nas linhas que marcam os objetivos e propósitos do
currículo escolar. É através desse processo de co-construção que nós
professores conseguimos, quando conseguimos, ajudar nossos alunos
a aprender e seguir aprendendo.

Para mais informações clique em AJUDA no menu.

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