You are on page 1of 5
Francois Furet e Mona Ozouf | DICIONARIO CRITICO DA REVOLUCAO FRANCESA Preficio da ediéo brasileira: | José GUIHERME MERQUIOR Tradugio de: Henrique De ARatjo Mesquita 2 Impressio Ill||_Norre pe 4 DE AGOSTO FRANCOIS FURET JA, ts de terse do 4 de Agosto do 1789 6 a data mais fumas de nossa hiss ia parlamentar, marca 0 momento em que uma ordem juridica e social moldada rls séculos, compesta por uma hierarquia de ordens, de corpos ¢ de comunidades las, € definidas por privilégios, de alguma forma desapareceu para dar lugar 1» universo social repensado como um conjunto de individuos livres & iguais, lutnetis cada um 2 autoridade universal da lei. O debate do dia 4 de Agosto de 789 {noite ligou-se com efeito ao sentimento muito vivo, em todos os deputados, "vim ereptisculo ¢ de uma aurora, Mesmo essa comparacdo clissica mio retrata fcliieute & emogao dos atores daquela célebre sessio, que se sentiram todos, por cunts horas, 0S Mmequinistas quase divinos daquele formidével espetdculo. Aquele epusculo © aquela aurora eram obra sua. ‘A interpretagiio mais freqiente no século XX de tal entusiasmo coletivo inves™4 ls tr destruigo do “regime feudal” sublinha 0 cardter um pouco forgado; a sessio iv lia de Agosto foi, com efeito, uma resposta parlamentar improvisada, gragas a nt nuana na ordem do di, a circunstincias prementes, — [Desile a segunda quinzena de julho, 0 descontentamento dos campos, latente ji 1 primavera, assumiu o aspecto de um levante. O antincio da queda da Bastilha, rain ent «ue a insuRreigdo circulava lentamente ¢ mal, provocou um pouco em lo que os historiadores chamaram de Grande Pewr, corrente gigan- eins Falsas em que aparece um pouco em toda parte a imagem de um nor veneido para que triunfassom os tompos novos, abertos pelas eleigées ilos-Gerais © & Assembléia Nacional. Os camponeses se entenderam ¢ se vn com pucleram, Em determinados pontos do terrtério — nos bosques nor- mnie, no Hainault, na Alsfeia, na Borgonha, na Franche-Comté — partiram para avila mais vizinho a fim de ali queimar no patio os tfulos de sua servidio: os miu” em que Os senhiores mantinham registro de seus direitos, do censo das jongoes dis sears, dos direitos ce mutagdo entre vivos etc., devidamente consigna- Jos"por seus legistas. J insunivigio cireunsereveu-se & propricdade senhorial, frendo os eastelos papel de Bastitha a essa ters ou Je casielos colucow a problen Jann puoyuivehutes ck da prategio das bens, & pore 0 1 ripe particular, sta les pussale Low Nore pe 4 De costo finda assim, incontestavelmente, propriedades. A critica da irracionalidade “g6tica” de tais direitos foi um tema comum a filosofia das Luzes e & administragio do Es- tado, mas sua supressio 56 podia ser feita pela reconversio na universidade do livre contrat entre individuos. Queimando os "tombos”, os camponeses pura e simples ‘mente 0s liquidaram pela violencia, Tsso dew origem uo embarago da Assembléia, que recebeu, na segunda quinzena de julho, relatos inquietantes sobre as desordens que ocorriam em toda parte, a despeito dos esforgos das milicias burguesas que se organizaram. Os deputa- dos estavam empenhados em discutir a declaracdo dos direitos ¢ sua articulagao com 1 futura Constituigfo, quando as noticias de uma desordem que se ampliava modifi- ccaram forgosamente seu programa. Na tarde de 3 de agosto, 0 porta-voz do "Comité de relat6rios” néo encobriu a situagao: “Por cartas de todas as provincias, parece que 1s propriedades, seja qual for a sua natureza, sio presas do mais culpSvel dos ban- ditismos; por todos os lados queimam-se os castelos, destroem-se 05 conventos, abandonam-se as fazendas a pilhagem...” E 0 Comité props um projeto de decreto que reafirmasse 0 valor de todas as espécies de propriedades e de direitos, Um pouco mais tarde, na mesma noite, Malouet, um dos deputados “Monarquianos", exp6s 0 plano de uma vasta politica dos pobres mediante uma rede de postos de socorro. Mas 4 primeira solugdo tinha 0 inconveniente, aos ols dos deputados “patriotas”, de en- gajar a Assembléia no caminho da repressfo ¢ de resttwir assim a forga ao que res- tava de tropas monarquicas, ao mesmo tempo que entregava uma capacidade de arbitragem ao rei. A segunda era um projeto a longo prazo, sem efeito sobre uma situagdo que exigia uma decisio politica urgente ‘A idéia do 4 de Agosto — a de separar as propriedades feudais da simples pro- priedade, e de reconverter a parte legitima das primeiras em bom dinheiro burgwés — hasceu como uma solugio para tal impasse. Germinou, provavelmente, numa reuniao do clube bretio na noite de 3 para 4 de agosto, aquela pequena assembléia de depu- tados do Terceiro-Estado que se haviam habituado a combinar suas posig6es antes dos debates, desde maio, em tomo da delegagio bret. O testemunho essencial foi 0 de Parisor, depurado de Bar-sur-Aube, que conta numa carta do dia 5 a noite do dia 3: “NOs, quer dizer cerca de 100, mantivemos um comité particular que nos ocupou {quase toda a noite, Resolveu-se ali empregar uma éspécie de mégica a fim de, dando uma trégua & Constituigéo, destruir todos os privilégios das classes, das provincias, das cidades, das corporagdes. Foi com essa intengdo que ingressamos na sala ontem as cinco horas. $6 nosso comité estava a par do segredo.” ‘Como acontece com tanta freqiéncia no que diz respeito& histGria parlamentar {da Revolugio, nada mais sabemos quanto aos concilidbulos prévios & sesstio de 4 de Agosto. Tampouco possuimos um relato literal ou incontestavel dessa sessio; 0 processo-verbal, redigido por um dos secretérios da Assembléia, foi estabelecido & apresentaxio no dia scguinte ¢ debatido até o dia 12, em razdo dos desenvolvimento cem curso, Mas pemanece, com os jomais da época, a fonte essencial sobre 0 acon- teimento, Iniciada As oit6 horas da noite, a sessio “abriu-se pela diseussto do de- cicly solve « respeite nevessia dos hens e ds pessoas preparado na vésper mas 1 transforma pela duas intervengées de surpresa clo viswonle de Nonilles © ie 'Aiguillon, dois membros. da nobreza liberal, um eagula de fam espiovidlo le forte e 0 outro propritério muito rico. Declararam que os fieses revoltados cram culpados, mas que podiam ser deseulpados por pressio ue sorian por parte ds senhores e dos seus empregados. Abrindo 0 lebate, Nosilles deslocou seu objetivo —a seguranga dos bens © das pessoas — a favor dle wm tomadi de eonscitneia da edlera camponesa, e indicou a diregao em ne o dilema com que se confrontava a Assembléia podia ser resolvido: respate dos lircitos feudais, abolieio sem indenizagdo dos dias de trabalho gratuito que os eam ponieses devia prestar aos senhores e do que restava das servides pessoais. hie d“Aiguitlon, denunciando, por sua vez, 08 *vexames” de que eram vitimas os “amyponses “iz. antes séculos”, eve no entanto o cuidado de apresentar uma mogao aborada, que propunha o resgate “com juros de trinta”; as “prestag6es feudais” de~ veriam, portano, ser resgatadas por uma soma eqivalente a 30 vezes sua importincia inal, ow seja, uma relagso de renda-capital de 3.33%. ‘Com esses dois discursos, indicou-se a solugao para a crise politica e tambén Heu-se @ tom a discussio: uma dentineia geral do “feudalismo” como maior aldigao do passado nacional, que dividia os franceses em vez de uni-los. Mas essa ‘lag coletiva da nova nagdo contra 0 edifieio “gético™ dos privilégios particu hues foi acompanhada por uma preocupagao constante de transformar em bom di- their burguds os “direitos” suprimidos, pelo menos a maior parte dentre eles. Os historiadores, notadamente os do século XX, mostraram algumas vezes espanto di- jn da existéncia desse duplo registro: deve-se isso a que, obcecados pela idéia s0- inl, 36 divisam no 4 de Agosto a desigualdade burguesa sucedenco a desigual- {ale sristocrética. Na realidade, o dinheiro foi, naquela época, o grande igualizador is vondigées, 0 instrumento de destruigio dos privilégios ¢ da antiga sociedade lomposta por ordens, Foi o cardter universal da nova propriedade, a partir de entio ner a 1odos, que exaltou os espirites: foi aquele mundo que o entusiasmo dos- iejntados celebrou na noite do 4 de Agosto. Para compreender a emosio "patristica” que nfo parou de cerear aguela dis- lussio, no € necessério mais do que imaginar retrospectivamente a mancira pela alo atores viam-se a si préprios. Uma vasia literatura, ao mecmo tempo filosstien juridica, thes havia longamente deserito os males do “feudalismo”: por tal coisa liendiam nfo apenas 0 que restava do dircito dos feudos, mas o conjunto da estri- nr corporativa da sociedade tal como a monarquia a havia remoldado, A iia de nifiear a propriedade para transformé-la na base racional do Estado havia sido a cd Fundamental do pensamento fisioerata, ao mesmo tempo em que havia formedo hovizonte de uma reforma do absolutismo. O titimo autor « desenvolver si naticamente todo esse corpo de idéias, ajustando-o as circunstancias de 1789, fora ieyds em Essai sur les priviléges, Vues sur les meyens d'exécution e Qu'est-ce que ' Tiers-Etat? “i preciso retomar aos princfpios", proclamara cle na segunda dessas lvas brochuras, “e opor os direitos da razio 8 pseudo-autoridade dos séculos”. 130 Annoite do 4 de Agosto festejou 0 advento da razio na exaltagio dos coragdes: acontecimento extraordinariamente moderno pelo investimento emotivo que rmanifestou, da erenga de uma Assembléia que mudaria por sua vontade politica 0 ‘curso da hist6ria nacional, O desenvolvimento da sessio, entre cito da noite ¢ duas dda manhi, colocou em cena a cultura do século: os deputados — clero, nobreza, Ter- ceico-Estado — passaram dos direitos feudais aos privilégios dos compos, das cidades das provincias, da terra & sociedade e do social ao nacional. Sucederam-se na itibuna para fazerem & nagio 0 sacrificio dos direitos partculares das comunidades © dos corpos que os haviam eleito: foi um desfile em que naufragou, aids, como mui- tos entre eles notaram com certa inquietagio, a velha idéia do mandato imperative {que 08 ligava aos eleitores. Quando, as dias horas da manhi, Lally-Tollendsl con- seguiu associar © nome de Luts XVI ao espitito da sessfo, foi posta abaixo toda a estrutura da antiga sociedade, No apenas os dircitos feudais, mas tudo o que consti- } tufa 0 mundo social em coletividades definidas por privilégios garantidos pelo rei, |< tanto as cidades quanto as provincias, tanto os beneficios eclesisticos quanto o direi- to exclusive de caga, tanto os dizimos quanto a venalidade dos cargos. A admisséo de todos a todos 05 empregos sclou a igualdade dos individuos diainte da lei, con- digio de sua unio na nagao. Todas essas decisdes hist6rieas foram tomadas naquela noite de 4 de Agosto, adquiridas quando os deputados foram por fim donmir. Alguns entre eles reservaram a concordancia de seus constituintes, embora a antecipassem; ‘mas 0 mais dificil comegaria no dia seguinte, 5 de agosto: a redagHo dos decretos sob forma juridica, Na discussio que se seguiu, entre Se 11. de agosto, e que foi grosso modo fel ‘20 espitito de 4 de Agosto, ha dois pontos a serem notados mais particularmente. iro diz respeito 2s corporag6es profissionais: 0 texto votado dia 4 previa apenas ‘uma “reforma dos representantes eleitos pelas corporagses”. O mundo do trabalho & sua organizagio tradicional icariam fora da legislagio daqueles dias; as corporagbes 86 seriam abolidas em 1791. O segundo ponto refere-se ao dizimo, que constituia sob ‘0 Antigo Regime o recurso fundamental do clero, por meio de um levantamento em bens naturais de uma porcentagem (entre 1/15’ 1/20) das colheitas. Declarado resgatével na noite de 4 de Agosto, foi Finalmente abolido sem indenizagio. A ‘questi foi objeto de um debate importante, em que intervieram notadamente Mira- beau ¢ Sicyés, os dois grandes ausentes da sesso do dia 4. A argumentagio dos ‘deputados hosts & indenizagio foi adiantada desde o dia 6 por meio da idéia de que ‘0s bens eclesiésticos pertenciam & nagio. Mirabeau tomou-se campedo dessa idéia no «ia 10; 0 dizimo nao seria uma propriedade, pois nfo passava de uma contribuigao que se consentia & fgreja em toca da parte de servigo piblico que esta assumia; ccontribuigo demasiado cara, & qual ele propés substtuir alguma coisa menos one: rosa, que nfo definiu de outra forma. Contra ele, Sieyés pronunciou no mesmo dia tum grande discurso, menos como defensor do clero, como ainda sc escreve, do que come te6rico da igualdade dos individuos diante da lei. A origem do dizimo, disse ‘ele sensatamente, nio era nem menos nem mais obscura do que a de tantos outros bens. Sua aboligfo equivalia a fazer um presente arbitrrio aos proprietérios, pois sua 131 Aconrecinentos ‘unpyaitincia foi tridictonalmente subtrafda do prego que pagavam por suas terra, ‘© testo final, cujo principal autor foi Duport, foi votado na sesso da noite de tergit leita ia T1 6e agosto, A primeira frase balanca como uma bandeira. “A As- seumhleia Nacional dest6i inteiramente o regime feudal.” E acompanhada por especi- se haviam decidido desde 0 dia 4: aboligio sem indenizagio dos retavam a servidio das pessoas, enquanto todos os outros se torna- ‘aim texgaiveis. Mas nos artigos que se seguiam (0 decteto continta 19) 0 que foi spike nent sempre se ligava ao feudalismo stcro sensu, Foi certamente o caso «ty citeito ke pomnbal, de eaga, das justigas senhoriais e de foro e de porgio sobre as | seas UArtigos 2.34 e 6). Mas 0 artigo 6 aboliu sem indenizagio os dizimos de ‘quilyict nalureyat “até encontrar 0s meios de prover de uma outra maneira a despesa sh culo diving: os dizimos continuariam portanto a ser recebidos até que a Assem- IMexa tivesse ale outra forma provido a manutengao da Igreja. Tratava-se de uma dis ‘oso cu prime parte era irealista, ¢ cuja segunda iria levar os deputados, entre ‘waite tke 89 e julho de 90, 8 espoliagao e & reorganizagio completa da antiga invita entem do vino, A colocagdo & disposigZo da nagdo estava Tigada & aboligo mia © simples elas dizimos. mediante a qual a monarquia encheu as suas burras vendendo fungies Htesiav is nat aeministragao da justiga, das finangas ou das municipalidades. Ora, 0 ‘atmo 7 do decreto de TT de Agosto aboliu a venalidade dos cargos, ao mesmo Iemipes cin que afirmou a gratuidade da justiga. A Revolugéo resolveu assim, em none das novos prine(pios, um problema diante do qual a monarquia havia recuado. ‘Nes uitiniss anos do reinado de Luis XV, em 1771, 0 chanceler Maupeou havia ‘nado dobar a aposigdo dos parlamentos’suprimindo a venalidade dos cargos do Iuulicivio © cas especiariass mas em seu advento, em 1774, Luis XVI cedera a0 Iwotest dey compos. Quanto aos deputados de 1789, cles envolveram o fim dos pat- nies mas Eonseyiiéncias dos novos prinefpios que liquidaram toda a estrutura “at do reinadlo, desttando assim a contradico em que se encontrara 0 Antigo inv mesmo {empo dispensador de privilégios ¢ por eles ameagado. Mas a » permancecu tambéia fie & idéia de propriedade, Todos os cargos foram dos respatkiveis, 0 que abriu caminho @ um longo contencioso de avaliagio & Hie wembobs. ‘Con os compas foram abolidos todos os direitos particulares que thes estavam Iiyautos, Ax Tiberdhades dos stiditos do rei foram substituidas pela liberdsde de cada cwlicio, consegiicntemente inseparivel da igualdacle, O Antigo 9 proibiu “para sempue i "pessoas ow reais, em matéia eke subsidios. orale ina repartigao uniforme do imposto. ( ie trangia ou de privikégios de que podiam gozar as valetivi ino provincia, tertas, eidades, comunidades cle habitantes tum dito comum aplicivel univershnente a cada france struts injermedideias ot cares qe sepstnssens «ius 19 haFeri mas que 2 Nore pe 4 pe acosro lei. Com a mesma tinta, decretou-se, Artigo 11, que “todos os cidados, sem distingdo de nascimento, poderao ser admitidos em’ todos os empregos e dignidades eclesiésticas,civis ou militares, ¢ nenhuma profissio wil acarretard perda dos foros de nobreza”, ‘A-essa liquidagio geral, que fundou um novo contrato social, nao faltou sequer ‘uma garantia tomada por parte do rei, no Artigo 15: a Assembléia faria com que Ih prestassem contas das “pensGes, gragas e salérios” concedidos por Luts XVI, de odo a regular os favores arbitrdrios do Antigo Regime. No ano seguinte, quando se tomou pibica, a lista de tas favores reavivou o fantasma detestado da corte. Met ante o que Luis XVI foi proclamedo, in fine, como o pediu com instancias Lally- Toltendal, “restaurador da liberdade francesa”. Nao é certo que essa férmula*monar- ‘quiana”, contraditéria ao espirito racionalista de “tébua rasa”, de substituigdo de tuo, ‘raduzisse exatamente 0 sentimento da Assembléia; o futuro préximo 0 mostra Mas indicou, em todo caso, uma tentaiva provisoriamente bem-sucedida de sc 4 pessoa e ainstituigdo real do fim do “regime feudal”. Na realidade, Lufs XVI € 05 que o cercavam nao gostaram das decisBes votalas entre 4 11 de agosto. Dotado oficialmente, desde setembro, de um veto suspensive, sobre as leis da Assembiéia, o rei recusou durante prolongadas semanas sua sn & destruigéo da antiga sociedade, Em 18 de Setembro, quando acabava de ser provi do veto suspensivo nos termos da Constituigdo que se elaborava, o rei comunicon Assembléia uma longa série de observagoes, redigidas por Necker. Concordau cunt © principio do resgate dos direitos senhoriais, mas discutiu a enumeragto daquick que se declararam abolidos sem indenizagao, fez. objegdes 20 tratamento particular dispensado aos dizimos e gostaria de salvar o direito de foro e de pagamento pt ‘mutagio entre vivos, dil & manutengdo da pequena propriedade. Tais direitos, cewn efeito, dissuadiam 0s proprictétios ricos de ampliar ao infinito os seus bens, daha les alguma coisa a conservar de suas prerrogativas honorificas, Era uma argu {ago muito interessante, muito de acordo com as preocupagdcs sociais dle Necker. mas inteiramente fora do espirto do tempo, que queria uma mudanca de tuo ¢ reconstrugtio racional, O rei s6 cedeu A forga, em outubro, quando foi trizide por ‘uma multidéo de Versathes a Paris. A sangfio do 4 de Agosto foi, em agosto sete bro, um dos grandes temas da agitacio parisiense e nacional. A caracterfstica mais importante das decisses aprovadas ness fi de agosto de 1789 foi o seu aspecto duradouro, A Revolugio Francesc insttuigdes provisorias ¢ legistou cont freqiiéncia para o curto przo: mas os dete tos de 4a 11 de agosto figuram enire os textos fundadores da Frang iver Destruiram completamente a sociedade aristocrética e sua estrut © de privilégios, Puseram em seu lugar o individuo modlemo, tudo ayuilo que & fei no proibia, A mudanga completa praticad # partie ded de Agosto liquidou (ude 0 que podia existir de poderes intra-sociais entre 0 individua € ‘© compo social come um todo a disposigéo se completaria em 1791 pel aprovs dda fei Le Chapelier, que proibia as associagies, Assim, muita cede» Revolugao, hanifesiou-se favor de nt inividualisme radical. 1du Aconrecimentos ‘Também foi um individualismo proprietério. A revolugio juridica que se pra cou nos decretos de agosto nio resultou, salvo no caso da Igreja, em espoliagao. A maior parte dos decretos senhoriais foi abolida contra resgate e 0 preco dos cargos devia ser reembolsado pelo valor comercial. A historiografia socialista teve & tendéncia de subestimar a importincia do 4 de Agosto com o pretexto de que o que as medidas alcangaram consistiu em converter simplesmente um tipo antigo de pro- priedade em bom contrato burgués. Mas, por um lado, se os cargos foram efetiva- ‘mente reembolsados em seguida a um longo processo, os direitos scnhoriais declara- dos resgativeis nunca o foram, devido a resisténcia passiva ou violenta do camp: nto. Foram abolidos sem indenizacZo em agosto de 1792.e em julho de 1793. Ea aboligio pura e simples do dizimo foi o prefacio a0 confisco dos bens da Igreja. Por outro lado, ¢ sobretudo, os textos de 4 a 11 de agosto tiveram um alcance imenso na medida em que puseram abaixo toda a estrutura juridico-administrativa da sociedade; 6 deixaram de pé individuos livres ¢ iguais, com os quais se imporia reconstruir um corpo politico. As dificuldades engontradas pela Revolugio Francesa na obra de re fazer ura Constituigao duradoura para 0 velho reino nao deixam de ter relagdo com aquela sociedade toda moderna de individuos livres que ela acabara de estabelecer sem concessdes, em alguns dias, ¢ a respeito dos quais era preciso pensar, ao mesmo tempo que sua liberdade, sua unidade na nova nagio. ‘A noite do 4 de Agosto, prefécio do grande decreto do dia 11, constituiu assim luma das datas-chaves do ano de 1789. Do espirito geral que atravessou 0 famoso ano, 08 meses entre mao € outubro em que a histéria da Frange fez uma reviravolta, ‘© acontecimento dividiu e manifestou os tragos caracteristicos: a rejeigo do passado, a ambigio de reconstruir © social sobre os prinefpios da razio, 0 radicalismo filoséfico misturado & gestio politica das circunstancias revoluciondrias. O que 0 acontecimento teve de duradouro e mesmo de irreversivel foi 0 fato de inaugurar a legislagio civil da Revolugto, instaurando a universalidade da lei na esfera da so- ciedade. Quinet o sublinhou fortemente para opor a solidez desse ato fundamental ® fragilidade das Constituigdes politicas (La Révolution, IV, 6). A scus olhos, © que foi votado tao solenemente entre 4 € 11 de agosto pertence fortemente ao século das Luzes, que constitu a sua coroagfo. Beneficiando-se de um consenso ifio profundo & to preparado em tomo da liberdade, igualdade diante da lei e propriedade, a legis- lagdo civil das Assembléias revolucionérias e do Consulado permaneceria no interior do quadro juridico definido nequeles dias “hist6ricos”. A aboligo da nobreza, a ‘igualdade de sucessfo e os limites dos direitos de legar, foram dedugdes do espirito do 4 de Agosto. HA mais do que matizes entre as discusses da Convengio ¢ as do Consulado sobre 0 futuro Cédigo Civil, rematado por fim em 1804, mas os principios comuns as duas épocas foram fixados em agosto de 1789. Nessa data, num sentido, a Revolugdo foi feita. Mas restaria inscrevé-Ia na soberania do povo: sob esse aspecto ela 6 fazin comegar. 195 Noire pe 4 pe acosro ORIENTACAO BIBLIOGRAFICA ‘Autano, Alphonse. “La nit du 4-AoGt", La Révoturon fangs 1913. Hinsca, Jeun-Pere, Le Nait di 4-Aote Paris, GllimardJuliard, 1978, eolegto “Archives” Invats, Jean Mitre soa dela Reslution froncaze. Edi revit esnotada pot Alben Soho peti e Erest Larose, todo de Made Rebox. ai, Elon Soca, 1 ‘revs, Emmanuel. Essof sur les privléges (1788) € Qu‘etce que le Tiers? (1789), Resdigio, Pi, Preses Universitaires de France, 1982, colegio “Quid” Stevts, Emmanuel. Ves sur fes moyens deréeion dom les répresemans de lo France pourron dis poser en 1789. shod (1788. ‘Tocquevinis, Alexis de. L'Auclen Régime et la Révoltion, Coleglo GR ~ Flanmmarin, prety Frangoise Meloni, 1988. (Pais, 1850), 2 vols, tomo das Bunres compllvs, Pari, Calin 195? REMISSOES dino Fiore Goto Ch tpuslage Gonatiute Civil do Cleo tie vt Feualte Mirtent

You might also like