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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

Escola de Arquitetura
ACR 028 – Arquitetura Brasileira e Revitalização de Edifícios e Cidades I

Matheus Maurício Rodrigues

Brasília: as contradições e falhas da capital planejada


PAVIANI, Aldo (org). Brasília, ideologia e realidade: Espaço urbano em
questão. São Paulo: Projeto, 1981, 258p.

Belo Horizonte
Agosto de 2014
Brasília, ideologia e realidade, escrito por Aldo Paviani, nos situa
primeiramente em sua introdução, nos motivos que levaram à transferência da
capital para o interior do país. São vários, dentre os quais o autor destaca:
apagar os vestígios da ação portuguesa no território, unificar o Brasil, uma
melhor localização (protegida contra ataques estrangeiros), promover novos
padrões de eficiência no serviço público, desenvolver um espirito de identidade
nacional, criar uma área que atraia e seja capaz de colaborar com o
crescimento da região central em todos os aspectos.
O autor nos deixa explícito que a ideia da construção de uma nova
capital brasileira teve suas bases muito antes do que se imagina, embora esta
somente fosse concluída nos anos 60. Deste modo, duas vertentes
possivelmente explicariam o por quê da demora em sua execução. A primeira
“coloca a nova capital como produto de uma epopeia de bandeirantes
modernos cumprindo desígnios eternos manifestados na visão profética de
Dom Bosco”. A segunda, considerada mais realista, “aponta para a ocupação
do ‘hinterland’ como vital à soberania e ao desenvolvimento nacional”.
É notório que a construção de Brasília implicou/impôs determinados
padrões de divisão social e espacial do trabalho. Além disso, sua criação
consistiu essencialmente na ação deliberada do Estado sobre o território, de
modo que estavam envolvidos interesses não apenas ideológicos, mas
também interesses capitalistas que se acumularam na época.
Dentro do quadro de formação social do Brasil, os fundamentos das
políticas urbano-territoriais que implantaram a nova capital devem ser avaliados
a partir de momentos históricos e políticos distintos, uma vez que a ideia da
mesma perdurou por vários anos.
Em analogia a um passado histórico, em suma, o país ate o ano de 1930
teve seu desenvolvimento atrelado às oligarquias, que teve suas bases
oriundas da economia agroexportadora de algumas regiões. Posteriormente
ocorre um período de transição, onde o setor industrial cresce
consideravelmente e a divisão social do trabalho também o acompanha. Nesse
cenário se destacam as cidades de São Paulo, que se torna o centro da
economia nacional; o Rio de Janeiro como seu complemento e Belo Horizonte
com destaque na indústria agropecuária. Cabe ressaltar que intrínseco a essas
cidades estavam a região do Nordeste que fornecia mão-de-obra, ao passo
que o Centro-Oeste permanecia como um fronteira agrícola ainda não
ocupada.
Mais adiante, o autor destaca a importância do Plano de Metas (1956-
1961) no cenário politico, econômico e espacial da época em questão. Este
nada mais era que um ambicioso programa setorial, sustentado por
investimentos tanto públicos quanto privados nas áreas de infraestrutura,
indústrias básicas e de bens duráveis e recursos humanos. Entretanto, mais
que isso o plano implantado no governo de JK visava principalmente a
construção da nova capital – Brasília - planejada por Lúcio Costa e Oscar
Niemeyer.
Ainda em relação ao plano, apesar do seu intuito desenvolvimentista,
cabe ressaltar que o mesmo resultou em sérias consequências para o país.
Colaborou para reforçar os desequilíbrios setoriais, acentuou as mazelas
sociais e agravou o desequilíbrio espacial uma vez que a grande maioria dos
investimentos foi destinada à Região Sudeste. Para tentar solucionar tais
problemas “a expansão da fronteira econômica do país, isto é, o alargamento
do seu mercado interno, surge como uma medida capaz de, sem maiores
custos políticos, superar, em grande parte esse abismo”.
Os investimentos destinados à construção de Brasília colaboraram para
o crescimento da demanda interna e incorporou novos segmentos e áreas do
país no processo econômico. Nesse contexto, ganha relevante destaque a
indústria de construção civil que por sua vez atuaria de modo a garantir a
existência de um mercado consumidor numeroso na nova região.
A localização e construção da nova capital tinham como principal objetivo
desenvolver o espaço econômico nacional, a então abandonada Região
Centro-Oeste, de forma a propiciar sua conexão com as demais regiões do
país. Em suma representou “em outras palavras, Brasília e seu entorno
regional constituir-se-iam no verdadeiro trampolim do Sudeste industrial para a
expansão da fronteira agrícola em direção ao Centro-Oeste e Norte do Brasil”.
Apesar de todos os motivos já citados que levaram a mudança da nova
capital, o autor e a história nos demostram que Brasília nasceu essencialmente
para fins políticos e foi pensada e planejada para as classes sociais mais
favorecidas. Nessa mesma linha de raciocínio, é nítido que na projeção, nas
decisões e também no planejamento da mesma, o papel jogado pelo Estado
foi, por assim dizer, de caráter monopolístico operando como o promotor do
novo ambiente a ser construído.
Diante de tudo isso, o autor faz sabiamente reflexões a respeito do que
culminou e ainda culminará a obra de Brasília, como podemos verificar no
seguinte trecho: “Sua base econômica continuará, certamente, repousando
sobre raízes fiscais, dada sua natureza burocrática e estamental. Por
consequência, as diferenças sociais entre classes continuarão muito mais
marcadas pelas distinções entre posições na estrutura funcional do que na
percepção de rendas diretamente provindas de atividade econômica. Isto
continuará a determinar profundas diferenças de status, caracterizada de modo
a exteriorizar não somente diferenças salariais, mas também as de prestígio
estamental”.
Mais reflexões são possíveis perante tal discussão. A cidade ainda
necessita despertar em quem nela habita um sentimento maior de
pertencimento. Isso atualmente não se dá, uma vez que a população tem
pouca representatividade nos assuntos políticos. Além disso, outros fatores
como os contrastes sociais (entre quem habita na capital e nas cidades
satélites), a ausência de espaços para o encontro e a disposição de suas
quadras também colaboram para piorar a situação.
Por fim, como resposta a tais problemas o autor encerra seu discurso
afirmando que: “Brasília hoje não pode ser considerada apenas como Plano
Piloto de Lúcio Costa, como era nos anos 1950. Tampouco pode ser apenas a
cidade com seus núcleos periféricos dispersos, dos anos 1960. Ela é agora a
metrópole, que envolve além desses espaços os municípios vizinhos do
entorno do DF. O espaço metropolitano criado (ou destinado) vai interagir com
as novas fases do processo de urbanização brasileira e não pode ser ignorado
nas politicas urbanas, seja no âmbito local, regional ou nacional”.

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