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Capitulo 1 Nocao ioruba de pessoa € praticas magico-medicinais Nogio de pessoa; concepgdes de tempo, universo, satide, doenga e cura; priticas magico-medicinais Nogio iorubé de pessoa Referindo-se & concep¢ao negro-africana de ser humano, Thomas (1973) utiliza a expressio pluralismo coerente da nogao de pessoa. Nas diver sasetnias africanas hé um sem-nimero de exemplos de concepsdesarespeito | y. da constituicdo humana como resultante de uma justaposigao coerente de partes. pessoa é tida como resultante da articulacio de varios element alguns estritamente individuais e alguns outros simbélicos. Os elementos ~ herdados situam-na em uma linhagem familiar e clanica, enquanto os ele- mentos simbélicos a posicionam no ambiente césmico, mitico e social. Os diversos componentes da pessoa estabelecem relacées entre sie rela- | & «@es com forcas césmicas natura, Além disso, hd relagdes particularmente fortes entre pessoas, como por exemplo as estabelecidas entre gémeos ou entre um individuo eo sacerdote que 0 iniciou. Cada pessoa, enquanto organizagio complexa, tem sua existéncia transcorrendo no tempo e, assim, sua unidade/ pluralidade passa por sucessivas etapas de desenvolvimento, estando todas as dimensoes deste ser sujeitas a transformagées. Durante esse processo podem ocorrer permutas, substituigdes parciais € metamorfoses, algumas de cardter ¥ definitivo, como as associadas aos processos inicidticos, outras de carter pro- Vis6rio, como as ocorridas durante certos rituais. Apesar ‘de todas as mutagdes pessoa reconhece a si mesma e € reconhecida pelos outros como um sujeito permanente, ou se, sua identidade pessoal se conserva a despeito da pluralidade de elementos que a constituem enquanto sujeito e a despeito das muitas meta- morfoses e dos diversos estados experienciados ao longo de sua histéria pessoal. 33 Scanned with CamScanner Através dos homens, ao longo de sucessivas geracdes, a vida flui. O cicly da vida ¢ circular: a crianga vai se transformando até chegar a adulto; este se transforma até chegar a velho; este, por sua vez, se transforma até atravessar 0 portal da morte; e o proprio antepassado poderd renascer como crianga, Q antepassado, além disso, influencia seus descendentes. / Os iorubés consideram a pessoa constitufda dos seguintes principios vitais: ard, djii, okiin, émle ork'Aréé 0 corpo fisico; djliié a representagig visivel da esséncia espiritual que acompanha o homem durante toda a vida, morrendo junto com ard, embora nao sendo enterrado com ele, Okan, cujo significado coragdo, possui profunda relagao com o sangue e é considerado | sedecdainteligtcia ¢ do pensamento int tivo, a alma ea fonte originéria ye | de toda ago. Emi, principio vital, sopro vital, é intimamente relacionado & | a respiracao, mas nio se reduz a ela, pois sé diz por ocasiao da morte de | uma pessoa que ¢mf foi embora; significa também espirito ou ser. Uma | das denominagées de Deus ¢ Flémi, Senhor dos Espiritos. Qri literalmente | cabega, designa orf int, a cabega interior, a grande responsdvel pelo destino | pessoa, peas oportunidades e difculdades existencias designa também a divindade pessoal, cultuada entre outras divindades, mas sendo, de fato,a mais importante de todas.? Todo ori, embora criado bom, acha-se sujeito a mudancas. Feiti- ceiros, bruxas, homens maus e a prépria conduta de uma pessoa podem transformar negativamente seu ori, sendo sinal dessa transformacao uma cadeia interminavel de infelicidades na vida de um individuo, a despeito de seus esforgos para melhorar. Importante é enfatizar que.a qualidade do ori de um homem depende também de aspectos biol6gicos e espirituais de sua ancestralidade. Segundo a narrativa mitica cada ser escolhe o proprio ori ou. recebe. Como saber se a escolha do proprio ori foi boa ou mé? Pode um homem conhecer as potencialidades da propria cabeca ou da cabeca de outrem? O jogo divinat6rio® de If possibilita conhecer os desfgnios do proprio ori, saber qual € 0 orixé a ser cultuado e conhecer os proprios éwg Os ews, bastante conhecidos como quizilas, sao interdig6es relativas, por exemplo, * Conform enunciadona Itrodupdo.oetor observa variagdes na gafia do voctbul orf Escarecemos que em iorubs esse vocdbulo recebe um acento na letra i, 0 que no ocorre em portugues. 2 Essa questo seré melhor esclarecida no préximo capitulo, » Divinatério €0 ato ou recurso de adivinhar. * Ovoctbulo éwg tem seu uso consagrado no idioma portugues. Ao grafi-o no contexto desse idioma ‘optamos por utilizar a forma ewe, quando necessiio, flexiond-lo. 34 Scanned with CamScanner Como se cre que 0 ori dos pais traz boa fortuna aos filhos é comum. ouvir o ordculo recomendando que sejam feitas oferendas ao ori dos pais. Se 08 pais estdo vivos a oferenda pode ser um presente, por exemplo, ou uma atencio especial de qualquer tipo. No caso de paisfalecidos, antes da oferenda &realizada uma consulta oracular com o objetivo de identificar se ela deverd ser feita a Eégin-ilgoua Bégtin-igbald, Eégtin-ilf possui cardter individual, ou seja, trata-se de um determinado ancestral. Eégtin-igbald, por sua vez, possui cardter coletivo, Assim sendo, oferendas a Eégiin-ilf sio realizadas junto ao timulo do homenageado e, no caso de haver dificuldade de acesso aeste timulo, a oferenda é realizada na propria terra, invocando-se nessa circunstincia o nome do ancestral. As oferendas a Eégtin-igbal¢ demandama realizagao de rituais com a incorporacao de Egungun, ou seja, sao realizadas emhomenagem ao coletivo de ancestrais venerdveis, visando obter beneficios para aquele que realiza a oferenda. Disso se depreende a existéncia de oris individuais e de oris coletivos, relacionados, respectivamente, a destinos individuais e a destinos de grupos. s pais, ao rezarem pelos filhos, apelam ao proprio ori, dizendo: 1i 4 sin § Io — Possa meu ori ir com vocé ou Possa meu ori guid-lo € Oni: -n¢od-lo, Analogamente, o ori de uma pessoa tem condigées de proteger e ajudar ou, por outro lado, de prejudicar a ela e a outras pessoas. ‘Todos nascem com um destino a cumprir, o que nao implica numa condicao de mero joguete de forcas inteiramente deterministas. O homem tem 0 direto eo poder de assenhorear-se da prdpria existéncia através da busca continua de conhecimentos, da ampliagao da consciéncia e do desen- volvimento disciplinado da vontade. Ou seja, as realizacdes fundamentais da existéncia dependem nao apenas de inclinaces naturais e/ou da sorte, mas também de esforgos pessoais que venham aliar-se aos designios do destino. A consulta a Ifa possibilita conhecer tais des{gnios, incluindo-se, no ‘no conjunto de recomendagoes, as relativas aos ew6s. A orienta¢ao trazida| através do jogo oracular favorece a realizagzo de um bom destino, instruia| ye respeito de alimentos e comportamentos que devem ser evitados ¢ orienta ‘sobre decis6es a serem tomadas, Isto porque nem todos os alimentos, atitudes, comportamentos, cores ou amizades sao energeticamente compativeis com cada pessoa, O jogo revela compatibilidades ¢ incompatibilidades energé- ticas, orientando quanto ao que deve ser evitado por ser energeticamente inadequado ao desenvolvimento de cada destino humano. A nogao de que o destino & passivel de ser alterado dentro de certos limites se evidencia, por | * exemplo, nesse epiteto de Orunmilé: Ifa, Aquele que adia data da morte. Quando os conselhos sao acatados, as recomendagdes obedecidas e os ew6s 35 Scanned with CamScanner respeitados, torna-se possivel veicular o axé de Orunmilé e de outros orixés, decorrendo disso, necessariamente, melhor qualidade de vida e prolonga- mento da existéncia (com o adiamento da morte). Certamente os esforgos pessoais sao mais efetivos quando desenvol- vidos por um ol6r/ rere, isto é, por uma pessoa dotada de sorte, abencoada, bendita. Para um olérf buntkis, entretanto, a exigéncia de esforsos é bem mais pesada, pois as barreiras sdo maiores e mais constantes. Ol6rf buntiktié expressdio que designa pessoas dotadas de pouca sorte, azaradas, “condenadas & vida’, amaldicoadas. O portador de um destino adverso deve despender muito esforgo para cada minima realizado. Orf ind, cabeca interna, iwa, ariter, personalidade, atitude, conduta, comportamento, ¢ elf destino pessoal, acham-se, pois, intimamente relaci Qu seja, na dindmica estabelecida entre determinismo ¢ livre-arbitrio o sucesso da caminhada na esses trés elementos. Concepgao de tempo A representacdo de individuo, grupo, comunidade e universo é ne- cessariamente influenciada pela representagao de tempo. Consideramos indispensdvel o conhecimento da forma peculiar pela qual o tempo € vivido pelos negro-africanos das sociedades tradicionais para a melhor compreensao destas outras representagées. Segundo Hama e Ki-Zerbo: O tempo africano tradicional engloba e integra a eternidade em todos os sentidos. As geracbes passadas nao esto perdidas para o tempo presente. A sua maneifa, permanecem sempre contempordneas e tdo influentes, se nfo ‘mais, quanto o eram durante a época em que viviam. O sangue dos sacrificios de hoje reconforta os ancestrais de ontem, Tudo é onipresentenesse tempo intemporal do pensamento animista, no qual a parte representa e pode sig- nificar todos como os cabelos e unhas que se impede de cafrem nas maos dos inimigos por medo de que estes tenham poder sobre a pessoa. (HAMA; KL-ZERBO, 1982, p. 62). Os griots, tradicionalistas, cronistas, genealogistas e arautos in- cumbidos de transmitir oralmente a tradi¢ao histérica, dificilmente tra- balham com uma trama cronolégica, interessando-se mais “pelo homem apreendido em sua existéncia, condutor de valores e agindo na natureza de modo intemporal” (OBENGA, 1982, p. 101). Nao se dispdem a fazer a sintese dos diversos momentos da histéria relatada, e pretendem, sim, conceder a cada momento um sentido préprio sem relagdes precisas com outros momentos. 36 Scanned with CamScanner griot praticamente deixa de lado os afloramentos ¢ emergéncias tempo- rais, denominados em outros lugares “ciclo” (ideia de circulo), “perfodo” (ideia de lapso de tempo), “época” (ideia de momento marcado por algum acontecimento importante), “idade” (ideia de duracdo, de passagem do tempo), “série” (ideia de sequéncia, sucessao), “momento” (ideia de instante, circunstancia, tempo presente) etc. £ claro que ele nao ignora nem o tempo césmico (estagdes, anos), nem o passado humano, jé que o que ele relata é, de fato, pasado. (OBENGA, 1982, p. 101). O tempo sagrado e o profano coexistem, e nas narrativas orais dados histéricos se mesclam a elementos miticos. Nas praticas rituais o mito tam- bém se faz presente. Eliade considera que O mito conta uma histéria sagrada; relata um acontecimento ocorrido no ‘Tempo Primordial, o tempo fabuloso do “principio”. Em outros termos, 0 mito narra como uma realidade passou a existir gracas is faganhas dos Entes uma ilha, uma espécie vegetal, um comportamento humano, uma institui- ao. £ sempre, portanto, a narrativa de uma “criagao”: relata de que modo algo foi produzido e comegou a ser. © mito fala apenas do que realmente ocorreu, do que se manifestou plenamente. Os personagens dos mitos s40 os Entes Sobrenaturais. Eles sio conhecidos, sobretudo, pelo que realizaram no tempo prestigioso dos “primérdios” (..). Em suma, 0s mitos descrevem as diversas, e algumas vezes dramiticas, irrupgbes d jo no Mi essa irrupgao do sagrado que realmente fundamenta 0 Mundo e o converte ‘no-que é hoje. (ELIADE, 1972, p. 38). Segundo essa concep¢ao, o homem atual resulta diretamente daqueles eventos miticos, ou seja, € constituido por aqueles eventos. O mito narra as hist6rias primordiais, 0 ocorrido nos tempos miticos. Tais acontecimentos compéem uma Histéria Sagrada, por serem seus atores os Entes Sobrena- turais, O homem das sociedades arcaicas rememora a hist6ria mitica des de um objeto, animal ou planta ¢ repetindo os gestos criadores dos Entes Sobrenaturais, busca reproduzir o poder mégico-religioso sobre omundo, . atraves dorsemendatee Tovigene da reiteracao do Ato Criador. eo reatalizar os Hos atavds JOS oso ROME apa do tempo Profano, cronol6gico, e penetra no tempo sagrado, simultaneamente primor- dial e recuperdvel a qualquer momento e para sempre. Viver 0s mitos nado significa realizar uma comemoragao de eventos miticos, ¢ sim reiterd-los. 7 Scanned with CamScanner ‘Ao invocar a presenca dos personagens dos mitos, 0 individuo torna-se sey contemporaneo, ou seja, deixa de existir exclusivamente no tempo cronolé- gico e passa a viver, com eles, no Tempo Primordial, tempo forte, prodigioso, sagrado, em que algo de novo, significativo e forte ocorreu pela primeira ver, ‘Nesse contexto, alta importancia adquire o conhecimento, entre outros, da correta forma de realizar as evocacées. Sendo a Tradicao Oral o reservat6rio dessas férmulas, 6 ela que se deve recorrer. A correta realizagao dos rituaise uso das palavras certas compoem o quadro de exigéncias bésicas para que se passe do tempo cronolégico ao primordial. Num /ba Sangé (Saudacao a Xango), apresentado por Salam} (1990, p. 81), encontramos uma formula de evocacao do Tempo: ' Mo jiiba akédé. \ Mo jiiba asédé. > Atiyd of6. 4 Atiw6 oorin. QOkanlérigha irinmole. & B’ékokolo bd jib ik \ Ile é lanu fiin-un. 4 Ol6j6 dni. % iba re of Bu satido os primérdios da Existéncia. 1. Satido 0 Criador, 4. Satido o sol nascente. 4 Satido o sol poente. 5 Satido as duzentas e uma divindades. Quando a minhoca satida a terra ~ terra se abre para que ela entre. <4 Oh, Senhor do Hoje, *\ Bu te satido! Nas sociedades africanas a nogdo de anterioridade no tempo é ainda ‘maiscarregada de sentido que em outros lugares, pois nela baseiam-se 0s direitos sociais,como o uso da palavra em piblico, o acesso a certas iguarias eos direitos na sucessao real, entre outros. O essencial, entretanto, nao é a determinacao precisa das datas de nascimento das pessoas, mas a ordem em que ocorrem. Hama e Ki-Zerbo assinalam que entre os africanos a histéria vivida pelo grupo acumula um poder que é1na maior parte do tempo simbolizadoe 38 Scanned with CamScanner concretizado num objeto transmitido pelo patriarca, chefe do cla ou rei ao seu sucessor. Pode tratar-se, por exemplo, de uma bola de ouro conservada num tambor de guerra. Um exemplo interessante é 0 dos sonianke, descendentes de Sonni Ali, que possuem correntes de ouro, prata ou cobre, cada elo das quais representando um ancestral, simbolizando 0 conjunto, a descendéncia dindstica até Soni, o Grande. No decorrer de ceriménias tais correntes sio regurgitadas em publico. No momento da morte, o patriarca sonianke regur- gita a corrente pela tiltima vez e morre tio logo o escolhido para sucessor a engula pela outra extremidade. Esse testamento vivo ilustra com eloquéncia a forca da concepgio africana de tempo mitico e social. Seria tal visio do processo hist6rico estética e estéril, na medida em que coloca a perfeigéo no arquétipo do passado, na origem dos tempos? Constituiria o ideal para © conjunto das geragdes a repeticao estereotipada dos gestos do ancestral? ‘Nao. Para o africano o tempo é dinamico eo homem nao € prisioneira de. um mecinico retorno ciclico, podendo lutar sempre pelo desenvalvimento de sua energia vital. Hé, entre os songhai, um poema significativo: Nao é da minha boca. fda boca de A, que 0 deu a B, que o deu aC, que 0 deu aD, que o deu aE, que o deu a F, que o deua mim. _ Que esteja melhor na minha boca do que na boca dos que me antecederam. Avontade constante de invocar o passado nio significa imobilismo nao contradiz a uma lei geral de acumulacao das forgas e do progresso. Dai a frase: Que esteja melhor na minha boca do que na dos ancestrais, A viva consciéncia do pasado e de sua importancia sobre o presente nao anulam o dinamismo deste ultimo, como testemunham numerosos provérbios. Os rituais cumprem a fungio essencial de articular o presente ao passado, perpétuo e mitico, Que a forga do passado esteja em mim, no presente, para que eu possa assumir compromisso integral com o grupo a que pertengo, participando lado a lado com meus antepassados e contemporaneos da construgao de tempos melhores para os nossos descendentes. Concepgao de universo an onepe siierieh Meleme sue ae além da aparéncia encontta-sea realidade, o sentido, o ser qué, através dela, se manifesta, Sob toda manifestagdo viva reside uma forga vital: “de Deus um gro 39 Scanned with CamScanner deareia, o universo africano é sem costura” (ERNY, 1968, p. 19). Neste universo de analogias, correspondéncias e interages, o homem e todos os demais seres constituem uma tinica rede de forcas. O sagrado permeia de tal modo todos os setores da vida africana que se torna impossivel realizar uma distingao formal entre sagrado e secular, entre espiritual e material nas atividades do cotidiano. Uma forca, poder ou energia permeia tudo. Como diz Tempels (1949), o valor supremo é “a vida, a forga, viver forte ou forca vital”. Esta forga nao é exclusivamente fisica ou corporal, mas é uma forga do ser total, sendo que sua expressao inclui os progressos de ordem material e o prestigio social. Felicidade é possuir muita forca e infelicidade decorre de sua privagao.{Toda doenca, flagelo, fracasso e adversidade indica a auséncia de forca; prole rtumerosa é uma expressao de forga. A forca pode ser adquirida e transmit mitida, pode aumentar ou diminuir até 0 es; ento tots les s de peeserasse eaumento roporcionadas por alguns fatores, como o Situando-se entre as mais belas, completas e sucintas formas de ex- pressar a concepgo de homem e de cosmos, o mito cosmogonico da tradi¢ao bambara do Komo, uma das grandes escolas de iniciacao do Mande, no Mali, narra que Deus, denominado Maa Ngala, tendo sentido falta de um interlocutor, 0 criou. Ougamos a narragao bambara da Génese Primordial: Nao havia nada, sendo um Ser. Este Ser era um vazio vivo aincubar potencialmente todas as existéncias possiveis. O Tempo Infinito era a morada desse Ser-Um. O Ser-Um chamou a si mesmo Maa-Ngala. Entao ele criou “Fan”, um ovo maravilhoso com nove divis6es no qual introduziu ‘os nove estados fundamentais da existéncia. Quando 0 Ovo Primordial chocou dele nasceram vinte seres fabulosos que constituiram a totalidade do universo, a soma total das formas existentes de conhecimento possivel. Mas, ail Nenhuma dessas vinte primeiras criaturas revelou-se apta a ser 0 interlocutor que Maa-Ngala havia desejado para si. 40 Scanned with CamScanner Entio, tomando uma parcela de cada uma dessas vinte criaturas, misturou-as. F, insuflando na mistura uma centelha de seu hélito {gneo, criou um novo ser - 0 Homem — a quem deu parte de seu préprio nome: Maa. ‘Assim, esse novo ser, por seu nome e pela centelha divina nele intro- duzida, continha algo do proprio Maa-Ngala. Maa, simbiose de todas as coisas, recebeu algo que cada uma de suas partes nao recebera: 0 sopro divino. Esta origem determina um vinculo profundo do homem com cada ser, com cada coisa existente no plano material e, ainda, com os seres do plano césmico. A tudo e a cada coisa 0 homem se relaciona numa grande rede de participago. (HAMPATE BA, 1982, p. 184). Emy refere-se ao universo africano como uma imensa teia de aranha: Nao se pode tocar o menor de seus elementos sem fazer vibrar o conjunto. | Tudo esta ligado a tudo, solidéria cada parte com o todo. Tudo contribui P para formar uma unidade. (ERNY, 1968, p. 21). Sob este ponto de vista ganha sentido a preocupacao com a ecologia e com o bem-estar de outras pessoas. Somos interconectados e, por isso, 0 softimento de qualquer pessoa é 0 sofrimento de todos, e seu jtibilo € 0 jubilo de todos. A 4rvore abatida desnecessariamente e outros atos de cruel- dade contra os mundos mineral, vegetal e animal constituem uma agressdo contra si mesmo. Asta trama de relagdes associam-se o fendmeno da sincronicidade eo pensamento de tipo sincronistico, bastante distinto do pensamento cau- sal. Jung (1970) e von Franz (1980) discursam a respeito da diferenca entre essas formas de pensar, contrapondo ao pensamento causal ou “linear” 0 pensamento sincronistico ou “de campo”, campo este cujo centro €0 tempo. Pensando linearmente, ao observarmos a sequéncia de eventos A, B, Ce D, raciocinamos de trds para diante, perguntando-nos por qué D aparece em consequéncia de C, este em consequéncia de B e este, por sua vez, em con- sequéncia de A. Como normalmente pensamos que a causa vem antes do efeito, esta ideia de tempo é linear, com antes e depois, ocorrendo o efeito sempre depois da causa, O pensamento sincronistico, por sua vez, organiza nao linearmente, mas em campos. O centro do campo € 0 momento preciso em que os eventos A, B, Ce D ocorrem. Ao invés de por que tal coisa ocorre, ou de que fator resultou tal efeito, pergunta-se: 0 que é provadvel que ocorra 4l Scanned with CamScanner conjuntamente, de modo significativo, no mesmo momento? O interesse primordial dirige-se, pois, a coincidéncia significativa. Jung diz: Enquanto a mente ocidental examina cuidadosamente, pesa, seleciona, classifica ¢ isola, a visto chinesa do momento inclui tudo, até o menor e mais absurdo detalhe, pois tudo compée o momento observado... tudo que acontece num determinado momento tem inevitavelmente a qualidade peculiar aquele momento... Essa suposi¢ao envolve um certo principio curioso que denominei sinctonicidade, conceito este que formula um ponto de vista diametralmente oposto ao da causalidade. A causalidade enquanto uma verdade meramente estatistica ndo-absoluta é uma espécie de hipstese de trabalho sobre como os acontecimentos surgem uns a partir dos outros, enquanto que, para a sincronicidade, a coincidéncia dos acontecimentos, no espago € no tempo, significa algo mais que mero acaso, precisamente, uma peculiar interdependéncia de eventos objetivos entre si, assim como dos estados subjetivos (ps{quicos) do observador ou observadores. (JUNG, 1987, p. 16). Outra caracteristica do pensamento causal é a distinao que estabelece entre eventos ps{quiicos efisicos (embora haja atualmente uma tendéncia cres- cente ao questionamento a respeito das possfveis interagGes entre essas duas cadeias de causalidades). O pensamento sincronistico, entretanto, nao estabe- lece igual distincao: tanto os fatos internos como os externos podem ocorrer simultaneamente, formando um complexo de eventos fisicos e psiquicos, cujo elemento unificador é um determinado momento critico. Temos nesse caso, como pressuposto primordial bésico, 0 seguinte: “tudo é um fluxo de energia que obedece a certos ritmos numéricos basicos e periédicos. Em todas as areas de eventos, acabariamos sempre por chegar, ao final, a essa imagem especular, o ritmo bésico - uma matriz—do cosmo” (von FRANZ, 1980, p.28).£ 0 pen- samento sincronistico que confere aos diversos recursos divinatérios seu lugar de destaque: a queda dos biizios, do dpelé, a corrente divinat6ria, ou dos ikia, sementes de dendezeiro, define uma configuracdo especifica, sincronicamente relacionada a ocorréncias fisicas, ps{quicas, emocionais e sociais da vida do consulente, de modo que o sacerdote, ao olhar essa configuracao, enxerga a configuracdo existencial daquele que o procurou. Concepgées de satide, doenga e cura Para melhor compreender a dinamica da agéo de Exu e outros orixas convém retomarmos neste contexto os conceitos de satide, doenga 42 Scanned with CamScanner ‘e cura, o que por sua vez demanda a retomada dos conceitos de axé e de ddgun$ e a apresentacao de algumas nogoes relativas as praticas magicas e encantatérias.® Age- Axé Toda manifestacaio viva pressupde a presenca de uma forca vital, que constitui um valor supremo e determina 0 ideal do viver forte nos planos material, social e espiritual. Enquanto energia, pode ser obtida ou perdida, acumulada ou esgotada, e também transmitida. Seu acémulo manifesta-se fisica e socialmente como poder, e seu esgotamento, como doenga fisica ou adversidades de toda ordem. Entre os iorubés tal forga recebe o nome de axé. Axé,a forca vital, a energia que flui nos planos fisico, social e espi- ritual, constitu, pois, a forca maxima para se atingir um objetivo. Nao hé forga maior que essa. Toda e qualquer realizacao depende do axé. Se bem administrado, ele aumenta com o passar do tempo e o actimulo de experi- éncia, proporcionando fertilidade, prosperidade e longevidade. Em outras palavras, a aquisigao gradual e continua de conhecimentos sobre as formas de adquiti-lo e de nao desperdicé-lo e 0 desenvolvimento da capacidade de discernir e julgar com justiga e bom senso favorecem o aciimulo de axé. Distintos elementos possuem distintas qualidades de axé: cada orixé tem seu axé especifico e diferentes substancias materiais possuem distintas qualidades de forca vital.” A transmissio do axé ocorre através do contato com os portadores de forca vital ou por sua ingestdo. $6 est vivo o que carrega axé, Os mais velhos tém o cuidado de nao transmitir indiscriminadamente tudo 0 que sabem a respeito da veiculagao dessa forga através de rituais. Sao considerados portadores do axé os babalaés, os babalorixds e as ialorixés, sacerdotes e sacerdotizas; os gba, reis; os 056 € as ajé, respectiva- mente homens e mulheres que praticam as artes de feiticaria e bruxaria; € 0s gniséguin, conhecedores de ddgiin, priticas mAgico-medicinais. Todo iniciado adquire, através do processo iniciético, a condi¢ao de alse, portador do axé de seu orix4. Sao recursos de obtencao de axé a iniciagao, a pratica de dégin, a heranca deixada de um individuo para outro, seja por vinculo ® Adiante nos deteremos em questdes relativas a prtica de déguin * Este tema foi anteriormente abordado por Ribeiro (1996) e por Saldmi (199%). ? No préximo capitulo discorremos sobre o axé especifco de cada orixd. mei 2 * Lembramos que os babalads sio sacerdotes de Orunmils, enquanto os babalorixis¢ as ialorixts io sacerdotes e sicerdotisas dos demais orixts. 43 Scanned with CamScanner consanguineo ou por empatia pessoal, ¢ 0 bori, ritual de oferenda ao ori para reverencié-lo e fortalecé-lo. A aspiracao de ser forte, de possuir prestigio e poder, faz. com que muitas pessoas desejem ser aldse. Cabe mencionar o fato de que a expressao a s¢ possui o significado de assim seré (ocorreré, acontecerd). Para a nogao ioruba de tempo essa predicao de futuro supde uma ocorréncia que poder seguir imediatamente © momento presente. A s¢afirma que, a qualquer momento, ocorreré 0 que esta sendo afirmado. Odgiin - praticas mégico-medicinais ‘Todos os aspectos da vida biolégica e social se articulam para consti- tuir um individuo e um grupo saudéveis. Assim sendo, as relag6es entre medicina e organizacio social nos diversos grupos étnicos negro-africanos incluem todos os aspectos da vida social e biolégica. Em artigo inédito, ‘Dépama (1989, p. 8) define medicina tradicional como “a arte ea ciéncia de preservar ou restaurar a satide, através de recursos e forgas naturais”. Na sociedade tradicional iorubé, medicina e magia recebem a mesma denomi- nagao, pois a intengao é que determina se os procedimentos adotados visam acura fisica ou a solugao de problemas de outra natureza, Como amedicina e a magia, conhecidas pelos mesmos nomes— ddgiin, egbogi, iségiin — utilizam recursos e forcas naturais para preservar ou res- taurar a satide, ambas encontram-se sob o dominio da mesma divindade, Ossaim; e ambas compartilham as conviccdes de que divindades e espiritos auxiliam a cura e de que certas substancias da natureza possuem qualidades inerentes, de significado oculto. Na prética mégico-medicinal cumprem importante papel os gf, encantamentos. Recursos magicos e medicinais entrelagam-se de tal modo que, em certos rituais, é dificil estabelecer os li- mites entre eles. Por exemplo, uma pessoa com fortes dores de cabeca po- der4 ser orientada a ingerir, em meio a rituais, uma medicagéo também preparada de modo ritualfstico. ‘As moléstias sa0 consideradas resultantes da concatenacao de miltiplos fatores de distintas ordens, como a ago de forgas naturais ou fisicas, de bruxas € feiticeiros, de espiritos da natureza e de ancestrais. Em busca da cura recorre-sea elementos do mundo mineral, vegetal e animal. Uma vez realizado o diagnésticoy através de consulta ao mago-médico ou ao babalaé, sao definidas as causas do transtorno e sobre elas se interviré: alguns tratamentos atuam simultaneamente nos planos biol6gico e espiritual. O ritual nem sempre acompanha a adminis- tragéo do medicamento, mas pode constituir um meio necessério & remogio de \ causas de ordem espiritual, para que o remédio possaagir no plano biolégico._/ 44 Scanned with CamScanner Magia Frazer (1945; 1978) esclarece que a magia é um sistema de pensa- mento que pressupde a ago regular da natureza, segundo leis de simpatia que, uma vez conhecidas, permitem a interven humana. Frazer postulou dois tipos de relacdes simpaticas: as de contiguidade e as de similaridade. As relagdes de contiguidade so de tal ordem que as coisas, uma vez co- locadas em contato, continuam unidas, isto é, podem agir umas sobre as outras, mesmo depois de separadas. As relagGes de similaridade tém por regra fundamental que o semelhante produz o semelhante, isto &, o efeito esua causa se parecem. Dai decorrem a magia de contégio, gracas A qual o mago busca atuar sobre uma pessoa agindo sobre algo que lhe pertenceu, ea magia imitativa, gracas 4 qual o mago procura conseguir certos efeitos através de simulacros desses efeitos. Mauss (1974) acrescentou as duas possibilidades de Frazer uma terceira, baseada nao na simpatia, mas na antipatia: 0 contrério age sobre seu contrério, isto €, excluido o semelhante, pode ser suscitado o seu contrario. Como operam as leis formuladas por Frazer e Mauss no campo da magia? A lei da contiguidade, que possibilita a pritica de magia por con- tégio, afirma que cada parte equivale ao todo ao qual pertence. A distancia entre o todo e suas partes nao anula a continuidade do todo, que pode ser reconstitufdo ou suscitado através de qualquer um de seus elementos. Todo e qualquer objeto ou ser, desde que tenha estado em contato, de uma maneira ou de outra, com uma pessoa, passa a integrar sua totalidade. Assim, uma pessoa ou coisa estabelece um ntimero praticamente infinito de ligagdes simpéticas. Através desses canais de energia & posstvel transmitir influxos mégicos a curtas e a longas distancias na cadeia de ligagdes. A ei da similaridade serve & magia imitativa: dois elementos seme- Ihantes s4o considerados capazes de influir um sobre 0 outro. A similaridade icénica’ obedece a dois principios fundamentais: o semelhante evoca 0 semelhante e 0 semelhante age sobre o semelhante. A semelhanga aqui con- siderada vai além da aparéncia, além da imagem. £ bem mais abrangente que isso, dado que a principal funcdo de determinado objeto é tornar presente a pessoa desejada. O que importa, pois, nao € tanto o objeto escolhido, e sim a sua possibilidade de representar determinada pessoa. A lei da contrariedade tem por fundamento 0 contraste: 2 exclusdo do semelhante faz surgir 0 seu contrério. E 0 que ocorre no processo de "A pla, ppulamente digas, de spear um alate sum boneco para que a vitima sofra a inetada constitui um tipo de magia icbnica. 45 Scanned with CamScanner cura homeopatica, por exemplo, quando o semelhante cura o semelhante, através de sua exclusao e do estimulo para que surja seu contrario. O mago-médico Magos e/ou médicos sao indistintamente chamados de oniségiin elégbogi, olfsényin e oléégiin, embora com distintas conotagdes de valor, conforme assinala Dopémi (1990). Os oniségiin adquirem seus conheci- mentos no ambito familiar, podendo amplié-los através de contato com seres espirituais. Ossaim, 0 orixé da esséncia do mundo vegetal, conhecedor das possibilidades terapéuticas de todas as plantas, inclui entre seus mais importantes seguidores Aroni, ser dotado de uma tinica perna, como as plantas, e cabeca de cachorro. Compartilha-se a crenga de que Aroni, gran- de conhecedor das propriedades medicinais do mundo vegetal, sequestra pessoas talentosas e as leva para viver consigo na floresta, transmitindo-Ihes conhecimentos antes de devolvé-las as suas casas. (SALAMI, 1990). Off, 0 encantamento iorub4 — poder oculto dos nomes A forca vital tem na palavra um de seus principais vefculos. Cada ser, objeto ou elemento é dotado de um poder natural ao qual se pode apelar, desde que conhecido seu nome mistico, de fundamento ou primordial. Frequentemente encontrados em formulas de encantamento, os nomes de fandamento permitem ao praticante agir sobre os seres invocados, controlan- do-os. Dopamii (1988, p. 13), que registrou na Nigéria uma série de formulas encantatérias e teceu considerac6es sobre essa pratica magica, diz que of € © termo genérico usado pelos iorubés para designar encantamento. Pode ser definido como “a palavra falada possuidora de forga magica ou capaz de produzir efeitos mégicos quando recitada ou cantada sobre objetos magicos ou na auséncia destes”. Os encantamentos sao utilizados em todas as esferas da atividade humana, em particular na pratica médica. Os offs sao de uso indispensdvel na pratica de ddgtin. A forca dos enunciados orais é potencializada pelo uso de afse ou de épé. O afose (afoxé), preparado magico para dar poder a fala, permite, por exemplo, que um comando verbal seja obedecido sem questionamentos. Assim, uma pessoa pode ser levada a realizar agdes que nao desejaria em obediéncia as ordens recebidas. Os of6s também podem ser utilizados para orar e aben- oar. O épé, preparado mégico-medicinal, também potencializa a forca do enunciado oral. "= Daqui em diante gafaremos of flexionaremos 0 voedbulo quando em contexto do idioma portugués 46 Scanned with CamScanner Embora muitos encantamentos dispensem 0 uso de objetos, em sua sio recitados sobre objetos mAgicos ou medicinais — iy¢résiin, 4gua, ‘objetos'indicados pelo préprio texto do encantamento — para potencializar sua forga. Podem ser recitados apés mastigacao de sete ou nove obi", ou sete ‘ou nove sementes de pimenta-da-costa, porque ataare a mda pa ord sf éniyan -Igou ~ a pimenta-da-costa toma a boca potente como umi-Yeneno, Para que o encantamento seja eficaz deve ser recitado exatamente como da primeira vez, ou seja, exatamente do modo como foi pronunciado no momento de sua cria¢ao. Os encantamentos registrados por Dopama em diversas regides da Nigéria sao recitados em diferentes dialetos, apresentando, muitas vezes, uma mesma palavra com significados distintos e distintas pa- lavras com o mesmo significado. A traducao nem sempre é possivel porque muitas das palavras usadas pertencem a textos herméticos, nos quais palavras menos inteligiveis possuem maior poder. Por exemplo, no tratamento de um homem mordido por serpente serd usado um encantamento para a remogao do veneno, ameagando-se 0 ser da serpente” de privacao total de sua capacidade de envenenar, caso ele nao remova o veneno injetado. Hé muitos tipos de ofés: os pronunciados para potencializar a ago migico-medicinal; os recitados apés a mastigagao de pimenta-da-costa ou de obi, com finalidades especificas; os associados a libagdes em homenagem a poderes espirituais; os utilizados em praticas do mal, tao potentes que determinam a necessidade de uso de outros ofés capazes de neutralizar os efeitos deletérios produzidos no préprio praticante; os ayéjg, com alusdes miticas, geralmente recitados sobre o iy¢rdstin. Esses tltimos, literalmente o dia em que as coisas aconteceram, narram historias e mitos de origem correspondentes a ocorréncias do presente, e pretende-se, ao recité-los, re- atualizar as forcas primordiais atuantes no momento de criacao. O ofé pode ser pronunciado em voz alta, sussurrado ou resmungado. O importante é que seja enunciado corretamente e na sequéncia exata, pois a menor variagdo poder torné-lo ineficaz. O conhecimento dos nomes da Morte e da Doenga possibilita a longevidade: (nome), mo ontiko yin-fn. Kig mé ba mi wil * Obi€a noz de cola (COLA ACUMINATA), pequeno fruto de uso alimentar esagrado, Daquiem diante adotaremos a grafa obj 0 vocébulo ser flexionado sempre que necessiio. "Alma coletiva das serpentes. 47 Scanned with CamScanner .. (nome), sei seu nome. Nao me perturbe! Uma divindade pode ter muitos nomes secretos referentes a distintas qualidades de forca e, conforme o que se queira pedir ou ordenar, deve-se usar o nome adequado a finalidade pretendida. As chamadas qualidades de um orixé, por exemplo, podem ser melhor compreendidas a luz deste co- nhecimento. Nesse sentido, ao invocarmos Oxum Qparé, ou Oxum ipond, ou Oxum iloba, ¢ assim por diante, estamos invocando um tinico orixd. A diferenga entre as formas de invocar depende do “apelo” que se queira fazer, da evocagao que se queira realizar de uma determinada qualidade energética do mesmo ser. Sabemos que as qualidades dos orixds referem-se a distintas caracteristicas de seu ser, reveladas por seus feitos e virtudes, manifestados em distintos momentos e distintos locais miticos por onde passaram. “Agentes de feitico e bruxaria invocados por seus nomes, através de ofés especificos, podem tornar-se inofensivos; desde que o praticante conheca seus nomes, estard protegido de ataques: w= (nome) Ki apé re mé kd mi! Ki ow6 18 mé rin mi! (nome), Para que vocé nao possa me dominar com sua forca! Vocé nao pode me afetar com sua forca! As partes do corpo humano também possuem nomes de fundamento que, uma vez. conhecidos, submetem-se ao controle do encantador. O of6 gue facilita 0 parto, chamado pf}-igb¢bi, € 0 encantamento utilizado por parteiros e parteiras e inclui o chamado de partes do corpo. Vejamos um exemplo: Adiidi:-fori-sojti 6 como chamamos o penis (nome de fundamento) ta-a-fenu-pelebe € como chamamos a vagina (nome de fundamento) Obér6 € como chamamos o bebé (nome de fundamento) Edidié como chamamos a placenta (nome de fundamento) Nés nunca pegamos dbdré 48 Scanned with CamScanner deixando pra tras édidi. Tanto a placenta como o bebé, descam imediatamente! Concluida a apresentagao de alguns elementos indispensdveis a com- preensio do que é 0 humano para os iorubds, consideraremos, a seguir, os principais aspectos de sta concepgio do sagrado, 49 Scanned with CamScanner

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