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PoLfcta:ETIMOLOGIAEEVOLUGAODOCONCEITO Joio José Ropicurs AFONsO onic oe Sacunanga PRLih PORTUGAL kee ‘RESUMO {A palavea polca tem ua longo percurso onomasiolgica. Nasce na Antiguidade Clis- sica greco-romana, com o vocdbulo ‘palit’ dos gregose ‘polit’ dos romanos, com © significado de gocerna da Cidadecsiads.Na ldade Media, 0 conceito de pai evolu ‘para significar doa ordem da raciedade ci, promovida pelo principe. Na dade Moder na, com a emergéncia das teoriasabsolutias do Poder, 0 conceito de polciapassou a desgnar toda a atividade do Fstado tendente 20 bom govemo da nagao e 3 ordem pablica em era. © drecopolicial (ju poltaeentendido como aciénca de governar ‘oshomens,constitia 0 meio através do qual principe atingiao fim eudemonologico do Estado: a fliidade da nagao. Com o fim do Antigo Regime ea introducio dos ‘aloes liberais 0 conceito de policiatomou um novo rum reduzindo-sesdimensies de garanta da seguranga publica para o exercicio dos demais direitos eliberdades. O Estado de drccoajuscou-0 aos seus principio dogmatic. Asim nos chega o sentido tual de policia. PALAyRas-CHAVE: Polic: palit ‘pole’ diteto policial 1. INTRODUGAO Policia, Esse substantivo, tio comum nos dias de hoje, parece ter um significado de ficil compreensio. Masse o investigarmos a fun do, a sua aparente simplicidade desvanece-se perante a sua polissemiae vastidio semintica. Policia como atividade, policia como organizagio ‘ou corpo de homens, policia como poder regulamentar. Ou, até, po- demos falar em muimero de policia, aludindo ao sistema de numeragio para identificar as casas num determinado espago paiblico, que surgiu ‘em alternativa ao antigo rol da igreja, que nem sempre representava © niimero correto de fogos existentes numa parquia. MN tettivntetinan tons 215 teen tend 38 Br m1. 21326 fn 2018 SSHDI7ROOIS ISSN Bein 23186917 Poltiasetimologiae cool do coecito © conceito de polica, que o mais leigo entende com relativa facilidade, nem sempre existiu com o sentido atual. A funsio policial, como a conhecemos hoje, é particularmente recente. Nas comunida- des antigas ou tribais, nao se falava em policia, em policiamento, em forgas de seguranga ou em corpos policiais. Cabia a cada um zelar pe- los seus bens pessoais e patrimoniais. Em caso de agressio, por parte de terceiro, competia & vitima ou aos seus parentes impor 0 castigo 20 culpado, através da vindicta prinata (castigo ou justiga privada). Nestes tempos mais recuados, as pessoas resolviam, através de desforra pes- soal, as ofensas ou delitos de que tivessem sido vitimas. Permitia-se a justiga privada e, até, a vinganga. Embora no houvesse policia, o controlo social (vigiat) e os modos de repressio (punix) no seio das comunidades estiveram sem- pre presentes. Vigiar e punir & uma formula de todos os tempos. Do mesmo modo, esteve sempre presente o sentido de “guarda’, com as, mais variadas fungdes de zelar pelos bens prdprios, vigiar lugares ou pessoas, guardar as portas da cidade, acautelar o patriménio, enfim, tudo com o objetivo essencial de proteger ¢ assegurar algo. Mesmo nos grémios mais birbaros ou menos aperfeigoados do ponto de vista da organizagio comunitaria, o sentido de justica impunha-se «, com ele, ressaltava-se a necessidade de criar instrumentos para 0 controlo dos seus membros. Nao bastava guardar algo do inimigo. Nio bastava defender-se dos ataques externos, fazendo uso do poder militar, Era também necessério resguardar-se das més intengoes dos vizinhos, dentro da comunidade, usando do poder de controlo social ede instrumentos mais ou menos aperfeigoados que, com o passar dos séculos, viriam dar origem a policia. Esse controlo tomou miiltiplas faces, servindo o Poder (poli- tico, rcligioso, aristocrata, oligirquico) de varias mancitas. Ao longo da Histéria, a policia serviu vitios propésitos. Se, no inicio, a policia naseeu com o fito de impor a lei e dominar ou reprimir os impetos dos criminosos mais impiedosos, depressa se transformou num poderoso instrumento para servir os interesses das fagSes ou cites mais diversas da sociedade. So disso bons exemplos as policias seeretas ou politicas, scmpre Aespreita de quem fale mal do Poder instituido, do mais incau- to 20 mais advertido, para recolher informagies e eliminar 0s bergos dos movimentos insurrecionais ou revoluciondtios. f de exércitos e de 204 Ree Rand tes Pils Bri. 9m sp 2132632018 Jot Jost Rodriqus Afonso policia que o Poder gosta de se rodear: Informagio & poder, ea policiaé ‘lho ciclépico do Poder. Tanto 0 é que, como indica Bobbio, “o ideal do poderoso sempre foi o de ver cada gesto e escutar cada palavra dos que estio a ele submetidos (se possivel sem ser visto nem ouvido)"!. Os mil ¢ um espides dos governos mais despdticos ¢ oprimentes da nossa Histéria demonstram isso mesmo. Quando tudo corre bem, nio se fala da policia, Mas quando ‘os conflitos surgem, é para ela que se voltam as atengdes. A policia é uma instituigio ou, se quisermos, sio varias, se pensarmos em cada corpo policial existente, de natureza diversificada, ambigua ou mul- tidimensional (policia civil, policia militar, policia municipal, pol cia econémiea, policia nacional, policia de Estado, policia politica, policia secreta, policia eclesiéstica, ete.). Mas a policia é também, uum conjunto de operagies que descrevem uma fungo: uma fungio administrativa, de natureza prestacional, ¢ uma fungio auxiliar da Justiga, com contornos preventivos e repressivos ao nivel criminal Falar em policia é aludir a um sistema, um modo de manter a ordem na sociedade. Falar em policia é invocar a autoridade, a sua forga e ostensividade, a sua capacidade coerciva para impor a0 povo 0 res- peito pela lei. Mas falar em policia é, também, lembrar o salvamento, ‘ajuda nas horas de desgrasa, 0 espirito solidério, o auxilio ao inde- feso, 0 socorro ao necessitado, o amparo ou consolo ao indigente, 0 conforto ao aflito. O conceito é, por isso, equivoco. Ora mais lato, ‘ora mais restrito no seu significado, Ora com um sentido técnico- jucidico-operativo, ora com um sentido vulgar ou comum. Ora com uma conotacio positiva, de humanismo e benquerenga, ora com uma conotasio negativa, de repreensio ¢ animadversio. A nogio de policia tem, hoje, uma signil tado que no passado, Mas continua a contemplar uma parte da Admi- nistragio Pablia tio vasta, tio complexa, tio exposta a uma pluralida- cde multiforme de acontecimentos ¢ vicissitudes, que nao permite uma simplificago do seu significado ou o estabelecimento de uma ideia clara do que seja. 1 NORBERTO BORBIO— © Fuso da Democracas Una Defends Reyras do Jog Tea Marco ‘Alo Nog. 6 dg Rlo de anc Pa Ter, 1986, p. 30. Tioga I Faro dels ‘emocraas Ui da delle ool det oo, 1984, tite tenn isn 218 Brim ep. 21526 rin 2018 Poltiasetimologiae cool do coecito 2. ETIMOLOGIA DA PALAVRA ‘POLICIA: A ANTIGUIDADE CLASSICA GRECO-ROMANA_ Ao longo da Hist6ria, 0 conceito de policia oscilou entre diversos significados, ora mais amplos na semintica, ora menos abrangentes. Do ponto de vista etimolégico, o termo policia tem origem no latim ‘politia’ (que resulta da palavra ‘polis, que significa cidade), um conceito que deriva da latinizagio do vocabulo gre- g0 ‘politeia’ (Tlehereia) que, ao longo dos tempos, assimilou varias, significagdes: governo ou Constituigio da Cidade-estado, comuni- dade, bem-comum, direitos ou privilégios dos cidadios, cidadania, administragio, politica, medida politica, tradigio, costume ou ma- neira de viver?, Para os romanos, que o tomaram de empréstimo, 0 termo ‘politia’ comporta duas significacdes: o de res publica (coisa piblica) e o de civitas (com o sentido de “negécios da Cidade”), resumindo-se ao conceito de politica, isto é, aquilo que pertence ao governo da Cidade'. Ao longo da Antiguidade Clissica, 0 termo policia absorvew diversos significados. Até ARISTOTELES, 0 conccito ‘politeia’ liga- se, por um lado, a Cidade-estado (‘polis’), enquanto entidade distinta, das outras comunidades politicas, ¢, por outro lado, Aquilo que man- tém a Cidade em sua unidade: a arte de governar. ‘A partir de PLATAO ¢ ARISTOTELES, 0 conccito altera-se 0 seu contetido passa a assumir duas significagdes*: por um lado, de- signa o conjunto de leis e regras tendentes 4 boa administracio geral da ‘polis (ordem piblica, salubridade, subsisténcia dos cidadaos e abastect- ‘mentos da Cidade); por outro lado, encerra a nogio de “guardies das leis e da cidade” de que fala PLATAO em A Repitblica, encarregados de fazer respeitar a legalidade e proteger a comunidade constituida: 2 JOHN GROVES (rr) — A Greck and Eaglsh Dictionary. Boston: Hild, Gray and Company. 1839.46 allan. ATS. 3 JEAN-CLAUDE MONET — Police Sockdader na Eup. Ta. Mary Arszonat Leite de Banos 2+ edio, see, Sto Palo: Editor da Unwed So Paulo, 2006, p20 Tilo conga Police Soin Ero 1986. 4 PEDRO JOSE DA FONSECA — Parvum lexicim lsinum lasiansinerpretatone ade ‘Oise: Typ. Reg 1798, 5. politan, 7.588 5 CHLJEAN-CLAUDE MONET — Polls e Scie cttp.20. 216 Resse Rasa de tes Pls Bri. ep. 21526 en 2018 Jot Jost Rodriqus Afonso * (un) quando os guardides das lise da cidade sao guardiaes ‘apenas na apartncia, perebes que eles a arruinam de alto a Ihaixo, a0 passo gue, de outro lado, sb eles possuem 0 poder de sadminisind-la hem e torné-la venturesa™. Os guardiaes da lei, a que se refere PLATAO, nada tém a ver com guardas ou policias no sentido que hoje Ihe damos. Ao falar dos guardiies da le, o Fildsofo alude aos magistrados que conduzem a po- litica (0 governo) da Cidade, os detentores da sabedoria, a suprema vi tude do Estado, de entre as quatro descritas por PLATAO: sabedoria, coragem, temperanga e justica’. Os conceitos ‘politea’e ‘palitia’ encerram a noséo de guarda da Cidade-estado contra investidas bélicas de nagées estrangeiras, ¢ © significado de governo, associando-se 3 ideia de boa convivéncia ‘em comunidade, i segulagio ¢ & lei da Cidade, & alma da polis, soa ‘ordem e governo da metrdpole eda res publica. Nao admira, pois, que viesse também a assumir o sentido de “ciéncia do Estado". A ampli- tude do conceito nao deixa de fora a ideia da adequada organizagio da comunidade politica civil tendente & cultura, polimento e aper- feigoamento da nasio, de modo a civilizé-la — do conceito ‘politio, de polir, assear, adornar (bons costumes, moralidade)’. A policia é centio vista como a capacidade politica de estabelecer os objetivos e ‘os meios do governo da nagio. Uma comunidade policiada € sindni- ma duma comunidade onde reina uma boa policia, isto é, uma boa constieuigio politica da Cidade. Nestes periodos da Histéria, a expressio policia nio tinha, por iso, qualquer relagio com o sentido atual da palavra, Todavia, é pa tir destes momentos histéricos que a instituigéo policial se vai cando, resultado da evolusio das sociedades e por entre um processo continuo de progressos ¢ retrocessos politicos. A polis, Cidade-estado, {© PLATAO— A Replica LiroIV- Tagan de Guin Inroduioenoas de Rober Bacon ‘io Palo: Difsio Europes do Lito, 1965. Embos sea coahecda por A Repabla,ovelo xg dara tate palit). com igneao de "Goveno ot Cost da Cidade Vide nod de Rober Bacon, 5 7 Param desenolment, yer nots de ROBERT BACCOU em A Rpt. p26 5 8 Ci:ROGERIO SOARES — lncrese Pblic, Lpadaec Mito. Coimbra: Adis, 185,754 9 Che FRANCISCO SOLANO CONSTANCIO — Novo Dicsonatt Cio Erol de Lingus Porto. Pas Na Ofna Typographica de Casini, ed Angel Francisco Cameo, 1936... polit, p.782, tee tntcne de tats 27 Brim ep. 21526 rin 2018 Policia: etimelogia eevlugio do conc relaciona-se, deste modo, com a nogio de policia, tal como o termo palttica. surgimento do Estado politico é, pois, o eixo conduror da fangio policial. Entre os dois conceitos (policiae politica) reconhece- se uma simbiose semantica. Na Grécia Antiga, 0 conceito de policia (‘politeia’) era atribuf- doa ciéncia do direito publico, isto é, 20 conjunto de leis que formavam a Constituigio de todo 0 governo dum Estado. A nogio de policia era, or isso, muito ampla, encerrando todas as leis constitucionais, politi cas civis, bem como o conjunto de les einstrumentos legais essenciais A seguranga e forga piblica interna e externa do Estado. Designava, no fando, toda aatividade da Cidade-estado. Com aevolugio do Direito, adiversidade das leis forgoua sua ca- tegorizasio em trés ciéncias. As leis reguladoras do Governo e da Admi- nistragio Piblica, dos dizeitos da elite governante ¢ dos deveres dos sib- ditos classificavam-se de Leis constitucionaise politica do Estado. As que regulavam 0 gozo da propriedade e dos direitos pessoais catalogavam-se como /es civs. As relativas &s circunstincias locais e & comodidade dos individuos, eram as leis de polcia. O estudo da primeira categoria de leis compunha aciéncia do dieito ptblico,O da segunda, direite privado ou ivi. Por fim, o saber ou gnose da terceira categoria de leis buscava-se na arte da polcia. Juntas, formavam a ciéncia do governo”. O conceito de policia que transita para.a Idade Média é aquele likimo: o das leis de policia, o de diteito policial (jus politiae), embora se eclipse temporariamente a partir do inicio desta era histérica, com 0 surgimento do feudalismo. 3. A PALAVRA ‘POLicIA’ NA IDADE MEDIA O instituto policia estava ainda no inicio da sua construgio. ‘A partir da Queda de Roma, é possivel identificar trés grandes fases de amadurecimento”:a primeira, durante a Idade Média (476-1453), 10 Gf ELIE BERTRAND e FORTUNE BARTHELEMY DE FELICE — Hlemens dels Police (Génie un at Tome Pret, Yeon, 178, p. 5. 1 Che, SERGIO BOVA — & 6 aPolkian, In BOBBIO, Norbemo, MATTEUCCT, Nios € PASQUINO, Gianfranco (coord) — Diconiride Palla Irad. Carmen C. Varley coon ead Jia Fer. Val I 1+ ego, Bla: Edtra Unreridae de Bras, 1998, pp. 94959 DUS Resse Rand tes Pls Bri. ep. 21526 en 2018 Jot Jost Rodriqus Afonso dentro da qual podemos reeortar dois perfodos ou etapas — um de es- tagnacio do conceito e outro de desenvolvimento; a segunda, durante aldade Moderna (1453-1789): e, por fim, a veceira, que se dia partir da Idade Contemporinea. Na Europa Medieval, 0 conceito de ‘politia’ rodeou-se do sig- nificado de boa ordem da sociedade civil, promovida pelo monarca, em contraposicio & boa ordem moral e religiosa, a cargo das autoridades ceclesidsticas. Nessa altura, palavrapolicia nio estava propriamente CO notada A idcia da seguranga de pessoas c bens ou & prevengio da crimi- nalidade, como o esta hoje. A ordem piblica, boa ordems da sociedade ) «dos Comissos da Corp da Caedrl(«Commisaies ds Corp de lt Cathdlem)encargados da on a marcha ederim dis pois er EDME DE LA POIX DE FREMINVILLE — Diconnaire ou Tait de la Police Geng des ‘Ves, Bougs, Paros ec Seigpeuss del Campagne Pais Chez Gs 173, 9. 490-191 tee tntcne de tts 228 Brim ep. 21526 rin 2018 Policia: etimelogia eevlugio do conc Iizar a paz e a felicidade dos seus siibditos tem agora, em suas mios, as razées justficadoras para a ampliagio dos seus poderes. O culto e idolatria da eudemonologia é 0 engenho perfeito para justificar 0 po- der absoluto. A gradual miscigenagio entre os fins do Estado (a pros- petidade do reino e a felicidade do povo) ¢ os meios pata os alcangar (0 poder do principe) conduziu a um autoritarismo sem precedentes, «em que os poderes do monarca se furtavam ao controlo judicial ¢ 4 propria legalidade. A atividade da policia, que se identificava com 0 conceito de administragio piblica a partir da segunda metade de oi- tocentos, passou a mover-se no ambito da completa discricionariedade (c, até, arbierariedade), subtraindo-se &leie & Justiga. Nasee o “mundo do nio-direito da policia™*. Nasce o Estado de Policia, /'Ftat de Police, der Polizeistaat™ Esta forma de Fstado surgi paulatinamente na Alemanha (Sacto Império Romano-Germinice) a partir do século XVII, com 0 camareligmo, num momento em que a administrasio estatal procurou promover, em simultineo, o bem-estar comum (gemeine Woblfithrt) e a felicidade dos siibditos (indische Gliickseligkeit), bem como a prospe- ridade e riqueza do Estado, na base de uma rigorosa ordem publica, um controlo social cerrado, autoritério e de carter paternalista, ampliando, tanto quanto possivel, o campo da agio policial. Este era o argumento politico perfeito para subtrairo exercicio da policia a quaisquer limites. Christian Wolff (1679-1754) resume esta forma de Estado a partir da trade conceptual securitas / tranguilltas /sufficientia vitae, A securitas respeita & seguranga contra ameacas externas, de outros Esta- dos, o que hoje é conhecido por defesa nacional. A sranguillizasrespeita A seguranga interna da nasio, & ordem piblica e seguranga de pessoas & bens. A suficientia vitae respeita & abundancia no apenas dos bens es- scnciais, mas também daqueles que conferem conforto ¢ prazct, press postos paraa felicidade flicitas) do Homem (ad vitee necesstater, com- ‘moditatem,jucunditatem ac decorem indigemus), Estas sio as condigées fundamentais que definem o bem-estar e o estado de seguranga da nagio 22 GE, CATARINA SARMENTO E CASTRO — A Que du Polis Mant, Cimbs Coimbra Editor, 203,923 23 Oconto ficial isoriografsjurlie ams,po scl XIX, par deere cto Nica caze wr Exado ao abcd 20 pencipo de ecu Esa Funan Frinciplo (0 Exado de dco, oe mcedew a0 Estado de Plc). fe PAOLO NAPOLI — ‘Natsancedela police modemes Pou, norms, soe. Da: Edon La Découers, 2003, p12 226 Rese Rasa de tes Polis Bri. ep. 21526 en 2018 Jot Jost Rodriqus Afonso (calus civitatis). A forma como 0 Governo estrutura a sociedade, com vista a conduzi-la a felicidade, determina e impée o modo de vida dos siibditos. A estes compete contribuir com todas as suas virtudes, para levar o Estado ao progresso, a perfeigio, gloria, Willebrand, logo na primeira pagina da sua obra, resume 0 significado, o alcance e 0 objetivo do poder de policia (do Estado de Policia): A verdadeira Potencia e Riqueza dum Estado consiste no nix ‘mero dos sujeits, E de acordo cam este axioma que ¢ determi- nada a visio des que tém o Poder legislative e executive nas Gidades; que, pelos seus respeitiveis cuidadase atengiesparti- culares na tarefe de impor a cuidada observincia da Policia, procuram todos os meios prpris ecapazes de contribuir para 0 erescimento das Cidades, a sua tranquilidade, comodidade, nitidez, limpeca e, enim, tudo o que énecesstri para a sub- sisténcia dos Habitantes, bem como para o enbelezamento, tanto interior como exterior; de modo ques Cidadiosfiquem cencantades corn as suas residéncias, € que os Estrangeiros se- jam levadosa descjar desfrutar da mesma felicdade®, Os assuntos ligados 3 Administragio e a0 Estado estavam sub- traidos ao Direito ¢, em consequéncia, ao controlo judicial. Toda aa vidade adminiserativa era identificada com a atividade de policia, no cstando vinculada & lei. A instituigio de policia tinha por objetivo a ordem da sociedade em geral (ordem publica em sentido lato, o que inclufa a subsisténcia ¢ abastecimento das cidades, a tranquilidade, a seguranga, a salubridade, a paz piiblica, a repressio do erime, os bons costumes, a limpeza das ruas, a iluminagio piblica, et.) dai a exten- sio da sua jurisdigio. A policia tinha, como tinicos limites, a esfera da Justiga. A atividade policial acabava onde comegasse a autoridade da Justiga contenciosa®, Em finais do século XVIII, a policia define-se, por um lado, como “o governo e administragio interna da repiiblica, prineipal- mente no que respeita as comodidades, isto é, limpeza, asseio, fareu- 1H Gh: CHRISTIAN WOLFF — Prncps du Dros de a Nae des Gen Tid Jan Hes Samuel Forme. Tome I Amer «Cher Mae Miche Rey. 1753, Ln VII eX. Tiel orginal: Jasnarute: methodo scenic peictatu, 25 JEAN PIERRE WILLEBRAND — Alig. pp. 1-3. Talo lve. 26 Ci, JEAN PIERRE WILLEBRAND — Abrig..e Prouire Pas. 27. Mtoe tenn ta ts 227 Brim ep. 21526 rin 2018 Policia: etimelogia eevlugio do conc rade viveres e vestidria, eA seguranga dos cidadios"s por outro lado, reporta-se ao “tratamento decente, cultura, adorno, urbanidade dos cidadaos, no falar, no termo, na boa maneira’”. Do mesmo modo, em Portugal, jé em periodo do Estado liberal, CONSTANCIO (1777-1846) define a policia (do Lat. politi) como o “governo ¢ boa administracio do estado, da seguranca dos cidadiios, da salubridade, subsisténcia, etc (..) particularmente da limpeza, iluminagio, segu- ranga e de tudo o que respeita a vigilancia sobre vagabundos, men- digos, ladrées, facinorosos, facciosos, ete. e, num segundo sentido “(do Lat. politi, onis, de polio, ire, polit, assear, adornar), cultura, polimento, aperfeigoamento da nagio"™, Quanto a isto, no deixa de ser interessante verificar que, a transigio do conceito clissico para 0 moderno (uma transigio que coincide com 0 inicio do Antigo Regime) fez-se com uma disseme- Ihanga semantica das palavras radicadas no termo latim ‘politia. O vo- esbulo‘policiar’significava “dar cultura, introduzit melhoramentos na civilizagio de uma na¢io, aperfeigoar as boas artes, e tudo 0 que contri- bua & felicidade, a0 gozo, & instrugao e & urbanidade e mansuetude do homem social’ Jia palavra ‘policiado’ queria dizer “culto, aperfeigoado nas artes, instituicdes, costumes e comodidades da vida social”. ‘Policia- do’ tinha um significado "mais extensivo que civilizado, um progresso da civilizagao”; sinénimo de ‘polide,“entende-se das maneiras cortesas, do trato urbano”, Diferentemente, o adjetivo ‘policia? reportava-se “A policia ou governo municipal, ou de corporagio, grémio’ O direito ppolicial compreendia as “providéncias policiais relativas & seguranga, 3 limpeza, iluminagao da cidade, aos mercados, a navegagio dos tios, etc. (... termo moderno usado nas Leis novissimas””. © conceito de policia continuava ligado & ideia de boa ad- ministragio do Estado, com vista a0 scu enriquecimento através 27 Gh, Disomaio da Lingua Poreguera Compost pelo Pade D. Raph! Beas, Reforma, «© Accrscentado pot Anténio de Mocs Sv, Too I Lisa: Na Oficins de Sido Thaddco Fee, 1789, ¥ apolicam 213. 28 Cli, FRANCISCO SOLANO CONSTANCIO — Novo Dicsionato Co « Bzymolgico da “Lingua Porngucza. Past Ni Offina Typographic de Casini, ed, Anglo Fncico Carer, 1836.5 . Pela mesma altura, em Inglaterra, Smith (1723-1790), pioneiro do liberalismo econdmico, dé também uma atengio especial a essa titi 1ma significagio, comando a palavra policia para se referir 4 administea- gio do governo em ties tipos de matérias: a netteté — relativa &limpeza das ruas ¢ & salubridade publica; a siveré — tratando-se da seguranga piiblica (prevengio de delitos), da ondem e da tranquilidade piiblica; ¢ ‘obom marché — que tem por objeto a abundancia c o baixo prego dos produtos ou bens para consumo, evitando-se a especulagio. Estas sio as condigGes essenciais que um bom governante deve observar para o sar divel destino e riqueza da nagio, Embora no tenha atribuido grande {énfase is duas primeciras matérias (limpeza salubridade piblicas ¢ se- _guranga), por achar estes assuntos demasiado simples para um “curso de jurisprudéncia” (isto & um curso sobre as normas pelas quais os Estados devem ser governados), Smith expie, nas suas igdes,algumas considera Bes sobre a questo da seguranga nas grandes cidades. Para este Autor, a influéncia do mercado sobre as “boas maneiras” das pessoas era evidente. Uma economia saudivel seria capaz de introduzir valores na sociedade civil, desenvolvendo um povo pacifico, honesto e com bons modos. Se- zgundo er, a maior parte da criminalidade seria 0 produto da excessi- vadependéncia entre os servigais e os seus senhores. Pelo contririo, nas grandes cidades, a industrializasio cria oportunidades de trabalho; aqui, 28 pessoas nio artiscam cometer um delito, furtando ou roubando, por receio de perder a sua ocupasio (emprego). Da mesma forma, um nego- ciador honesto tem receio de perder o seu bom cardcer e reputagio, pelo {que ¢ escrupuloso no cumprimento dos seus contratos, O tratamento estas matérias sob o capitulo “Policia” seria, assim, determinante para sealerira opuléncia do Estado™. TLEMOYNE DESESSARTS — Diconnsite Univer de oles Tome p.M3(ax

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