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Saiba como a água é fundamental

na exploração do lítio
No Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, a
água vale ouro. São meses sem cair do céu no
semiárido brasileiro. E a água que corre pela
terra tem que dar conta da população e das
empresas que exploram o subsolo atrás de
lítio.
Por Jornal Nacional

23/09/2023 21h07 Atualizado há 14 horas

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Saiba como a água é fundamental na exploração do lítio

Uma das riquezas mais cobiçadas do Vale do Jequitinhonha, em


Minas Gerais, brota do chão sem a ajuda das máquinas das
mineradoras. Água, por lá, vale ouro. São meses sem cair do céu no
semiárido brasileiro. E a água que corre pela terra tem que dar
conta da população e das empresas que exploram o subsolo atrás
de lítio.
Estudos apontam a área do Jequitinhonha com o maior potencial
de reservas do país. Em mais de 40 anos, de 1973 até 2020, foram
108 processos pedindo autorização para pesquisar e explorar com
exclusividade uma parcela do subsolo. De 2021 a 2023, foram
abertos mais 450 processos.

De 2021 a 2023, foram abertos mais 450 processos minerários na


região. — Foto: TV Globo/Reprodução

Aline Weber, pesquisadora da Universidade Federal dos Vales do


Jequitinhonha e Mucuri, diz que a tendência é de aumento dos
conflitos pelo uso do solo.
“O Vale do Jequitinhonha ali não é o vale da miséria. Ele é um vale
marcado pela diversidade, pela agro biodiversidade em função dos
povos e comunidades tradicionais que ocupam historicamente
essa região há gerações”, diz.
O rio que dá nome ao vale recebe as águas de outros rios com
cursos d'água menores, que na época da seca chegam a sumir.
Mas os pesquisadores que estudam essa área dizem que não
desaparecem só por isso. É que a força das nascentes vem
diminuindo ao longo dos anos e, com isso, o volume de água que
chega ao Jequitinhonha é cada vez menor. Ao mesmo tempo, a
mineração é uma atividade que usa muita água retirada desse
sistema natural. Uma equação que precisa de solução.
Região do Vale do Jequitinhonha. — Foto: TV Globo/Reprodução

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Essa não é uma flor brasileira, mas o nome, rosa do deserto, já
explica por que a planta se deu bem no clima do Vale do
Jequitinhonha. E tem também a mão boa do produtor de rosa do
deserto e suculentas José Jurandir Alves Esteves, que aprendeu
sozinho todos os truques para produzir as rosas que vende. Um
desafio sempre foi a irrigação.
“Eu tendo uma reserva de água, eu posso pensar em aumentar
minha produção, porque eu vou estar seguro que eu tenho a água,
pode irrigar o ano todo”, conta.
A rosa do deserto é cultivada na região do Vale do Jequitinhonha.
— Foto: TV Globo/Reprodução

A água que faz a produção do Jurandir florescer vem de uma


barragem. Ela foi construída em um projeto da multinacional
canadense que começou a minerar o lítio em 2023. A companhia
tem uma outorga que permite a retirada de 45 mil litros de água
por hora do Jequitinhonha.
“Essa água é uma água que prove de qualidade de esgoto a céu
aberto, não é uma água plausível para uso nem sequer industrial.
Então, nós temos que tratar essa água na entrada com uma
estação de tratamento de esgoto de entrada para fazer com que
essa água seja plausível para uso nessa planta industrial. Então,
água de esgoto, tratada para uso industrial e, mesmo assim, 100%
reutilizada”, explica Ana Cabral, presidente da Sigma.
A água não é um recurso distribuído por igual. Nas estradas,
caminhões-pipa seguem a caminho de comunidades quilombolas.
É só desse jeito que a água chega até a casa da de Catilene Pereira
Rodrigues. Mas ela só pode pedir abastecimento para a prefeitura
a cada 60 dias e recebe 10 mil litros contados para atravessar com
a família esses dois meses.
“Pode ser que acaba antes, e aí a gente tem que se virar com o que
tem. Água, não pode ficar sem água. Essa água só para beber e
cozinhar... Não pode lavar roupa. ”, diz a presidente da Associação
Quilombola Córrego do Narciso do meio.

Escavadeiras e até caminhões trafegam por galerias subterrâneas


de mina de lítio

Saiba mais

“Nosso território quilombola é um território sagrado”, afirma


Catilene.
Catilene está falando da Chapada do Lagoão, uma área de
proteção ambiental que também é a caixa d'água de Araçuaí. Lugar
de nascentes e onde comunidades aprenderam a lidar com a falta
de chuva.
O espaço por exemplo é um reservatório para armazenar água da
chuva. Depois vai para uma cisterna. Como a gente está no período
de seca, está assim vazio. E fica desse jeito quatro, cinco meses do
ano.
Há poucos meses, essa área esteve na mira de uma das
mineradoras que queria estudar o potencial de lítio no subsolo. A
pesquisa chegou a ser autorizada pelo conselho gestor da área de
proteção, mas voltou atrás da decisão por recomendação do
Ministério Público de Minas Gerais.
“É todo um território que precisa ser protegido e garantido os
direitos, porque não estão levando só lítio, estão levando água. Nós
estamos falando de uma região de caixa d'água. Estão levando
terra. O que é disso que nós estamos falando, nós estamos falando
de território. Estão levando biodiversidade. Essa transição
energética tinha que colocar o ser humano daqui no centro”,
afirma Aline Gomes Ruas, da coordenação estadual do Movimento
de Atingidos por Barragens.
O diretor regional de uma ONG global que defende o fim da
extração de combustíveis fósseis diz que a exploração do lítio vai
além da mudança da matriz energética.
“Essa transição, para ser justa e ser inclusiva, ela precisa envolver
todos esses atores de uma maneira que a gente tenha uma
exploração com o menor impacto possível, e que priorize o
desenvolvimento da região, que priorize o desenvolvimento do
país e que não seja apenas para exportação tudo o que vai ser
extraído”, diz o ambientalista Ilan Zugman, diretor regional da 350
Org. América Latina.
“Os elementos químicos estratégicos é que vão determinar o nosso
futuro, e não só pela disponibilidade do elemento, mas pelas
consequências da exploração deles no ambiente e na sociedade”,
explica Henrique Eisi Toma, professor titular do Departamento de
Química da USP.

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