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A DIVERSIDADE , DA - PSICOLOGIA UMA CONSTRUGAO TEORICA Edna M. Peters Kahhale (org.) Alessandra Ribeiro Ana Gabriela P. Andriani Daniela Kayano Dirle Portella Bezerra Elisa Z. Rosa Madialena Peixoto Maria da Graga M. Goncalves Marisa Markunas Tatiana Cano CORTEZ Ss 2° edicao. PSICOLOGIA HUMANISTA 253 Segundo Schultz, e Schultz (1994:397), “Muitas pessoas consideram tranqitilizador acreditar que ao menos alguns de nds siio capazes de alcan- gar unt estado préximo da perfeigho”’. \ A teoria de Maslow foi muito aplicada nos negécios e na in- duistria, sustentando a crenga de que a necessidade de auto-realiza- ¢So 6 uma forca motivadora e uma importante fonte potencial de satisfacdo. No entanto, seu grau de validade cientifica é bastante baixo.tAdquiriu mais forca no mundo do trabalho, na educagao, na medicina e nas psicoterapias, apesar de Maslow se concentrar na escrita e na pesquisa muito mais que no trabalho detterapia/ por exemplo.(Quanto a esta, considerava-a eficaz por envolver um rela- cionamento intimo e confiante com outro ser humano, represen- tando um modo de satisfazer as necessidades de amor ¢ estima que foram frustradas, geralmente em todos os que procuram ajuda psi- colgica. O terapeuta deveria ser capaz de ajudar sem interferir, respeitando a individualidade de cada um e suas capacidades par- ticulares, cuidando da esséncia ou do ser daqueles com quem tra- balha|Desta forma, as relacées humanas intimas poderiam forne- cer grande parte do mesmo apoio encontrado na terapiaiO método proposto centra-se em viabilizar que 0 individuo possa realizar suas potencialidades internas e inatas, sendo, no entanto, 0 processo de auto-realizaciio impossfvel de descrigio, pois é autodeterminado e justifica-se por sis6. 4 Carl Rogers: a perspectiva centrada no cliente “Comecou a me ocorrer que a menos que et tivesse necessidade de demonstrar minha propria inteligéncia e aprendizagem, seria me- Ihor confiar no cliente para a diregdo do movimento no processo.” (Rogers, 1967, in Fadiman e Frager, 1986:224) /Carl Rogers (1902-1987) desenvolveu sua teoria a partir prin- cipalmente de sua experiéncia clinicaYNao era seguidor de nenhu- ma escola especifica. Desenvolveu trabalhos se relacionando com psicdlogos, psicanalistas, educadores, religiosos, psiquiatras sociais, assistentes sociais, mas nao destaca nenhum nome como sendo seu antecessor.|O seu trabalho questiona a autoridade do terapeuta ea 254 A DIVERSIDADE DA PSICOLOGIA. suposta falta de consciéncia do cliente no processo terapéutico, na medida em que sugere estar nele a grande forga da relacdo; é ele quem dirige e conduz.a terapia, como é capaz de conduzir sua vida. “Defende que 0 comportamento humano é extremamente ra- cional, capaz de evoluir no sentido dos objetivos que seu organis- m0 S¢ esforca por atingir. Desta forma, nega a concepcao de um homem irracional, cujos impulsos, quando nao controlados, levam a destruicao. A pessoa seria, para ele, responsdvel pelas mudangas que deveriam acontecer em sua vida, sendo capaz de alterar cons- ciente e racionalmente seus pensamentos e comportamentos inde- sejaveis, de forma a tornd-los desejaveis para si. | Como Maslow, Rogers de! tendéncia inata para atualizar as | u eu, flesenvolvendo uma teoria da personalidade que se concentra numa tinica motivacdo avassaladora: a atualizacéo do eu.| pul- So para a auto-atualizacao é inato, mas pode ser ajudado ou preju- dicado por experiéncias infantis e pela aprendizagem, A auto-atua- lizagao seria, entao, o nivel mais alto da satide psicolégica, de for- ma que concebe as forgas pésitivas em direcao a satide e ao cresci- Mento como inerentes ao organismo. Cada pessoa guarda em si um impulso para ser competente, capaz, completa e auto-atualizada. O organismo tem uma tendéncia geral para funcionar de maneira a se preservar e se valorizar. que.cada_pessoa_possui_uma ‘Assim, pode-se dizer que, da mesma maneira que! Maslow, Carl Rogers sustenta uma visdo bastante otimista e positiva da na- tureza humana, embora distingue-se dele em dois pontos especifi- cos: primeiro por desenvolver suas idéias a partir do trabalho com individuos emocionalmente perturbados e nao com individuos sau- daveis; segundo, por ter uma concepgao um pouco diferente acerca das caracteristicas das pessoas psicologicamente saudaveis ou que alcancaram seu pleno funcionamento\— elas “se caracterizariam por uma abertura a toda experiéncia, uma tendéncia a viver plenamente cada momento, a capacidade de serem guiadas pelos préprios instintos, e ndo pela raziio ou pelas opinides dos outros, um sentido de liberdade de pensamento e de ago e um alto grau de criatividade.” (Schultz & Schultz, 1994:398) PSICOLOGIA HUMANIST 255 Esteve preocupado, acima de tudo, com a percepgao, a toma- da de consciéncia e a experiéncia, uma vez que acreditava ser a personalidade moldada pelo presente e pela maneira como 0 per- cebemos conscientemente. \Concebe as pessoas como sendo capa- zes de crescimento, mudanga e d ‘olvimento pessoal, de forma que este crescimento pode ser muitas-vezes impedido ou interrom- pido; por exemplo, na medida em que os comportamentos e valo- res reais de um individuo distanciarem-se muito da imagem do seu “self ideal” (caracteristicas que ele gostaria de ter), eles podem se tornar um obstaculo ao crescimento e desenvolvimento pessoais.! Mas é importante ressaltar quetem sua concepcao a personalidade que funciona plenamente é uma personalidade.em continuo.estado de fluxo, constantemente mutdvel,-um-processo. | ‘Sua principal contribuigéo, no entanto, concentra-se na pro- posta de terapia desenvolvida a partir destas concepgdes de ho- mem: a terapia centrada no clientd, Na verdade, pode-se dizer que € a sua teoria da personalidade que descende de seus métodos e idéias sobre terapia. Segundo Rogers (1952, in Fadiman e Frager, 1986), 0 individuo tem dentro de si a capacidade, ao menos latente, de compreender 0s fatores de sua vida que the causam infelicidade e dor, e de reorganizar-se de forma a superar tais fatores.'Assim, coloca-se um peso maior sobre o impulso individual em direcao ao crescimento, a satide e ao ajustamento.\A terapia caberia libertar-a pessoa para um crescimento e desenvolvimento normais. o cliente seria alguém capaz de entender a propria situagdo com uma.mini- ma interferéncia do terapeuta. luo nao é, portanto, um or- ganismo passivo a ser manipulado; ao contrério, é ele quem assu- me_a direcio necessdria: modifica as metas da terapia e inicia as mudangas comportamentais que deseja que ocorram, sendo que as intervengoes do terapeuta seriam, em tltima instancia, prejudiciais ao crescimento da pessoa. Ao terapeuta caberia lutar por um rela- cionamento de aceitacdo ¢ compreensao, sendo acima de tudo au- téntico, expregsando-se verdadeiramente e, assim, preocupando- se com 0 conhecimento dos préprios sentimentos, da forma como esta vivenciando a situagéo. } iRogers é um grande valorizador dos relacionamentos. Eles seriam capazes de tornar mais visivel, para aqueles que se relacio- 256 ‘A DIVERSIDADE DA PSICOLOGIA nam, sua personalidade, permitindo as pessoas olharem para si préprias, conhecerem 0 outro e se autoconhecerem melhor! Permi- tiriam, portanto, que os envolvidos funcionassem por inteiro, de forma plena. E desta maneira que faz parte da contribuigao rogeriana para a Psicologia as propostas de trabalho com grupos. Todo 0 seu empenho com os grupos de encontro leva-nos a destacé-lo como umydefensor da capacidade terapéutica do grupo, que poderia pro- porcionar um verdadeiro processo de encontro. O grupo é um es- Paco em que as expressdes emocionais vém A tona ¢ ficam sujeitas as reacées dos outros componentes, exigindo que a pessoa seja ela mesma e procure um encontro profundo e essencial consigo mes- ma. Os grupos sao, portanto, capazes de resultar em mudangas reais para os membros que dele fazem parte. O proprio Rogers afirmou que, embora nao tivesse muito pres- tigio na Psicologia, suas idéias foram muito bem aceitas e exerce- ram grande influéncia na educagao, na indkistria, em dinamica de grupo e trabalho social, na filosofia da ciéncia e em outros campos. Ha uma série de criticas direcionadas as concepgdes e propostas desenvolvidas por ele, sobretudo no tocante ao papel secundério que destinava a aspectos patolégicos do ser humano, a sua énfase na auto-atualizacao como uma tendéncia inata ou mesmo aos crité- tios cientificos de suas pesquisas. No entanto, Rogers, assim como Maslow, nao esteve muito preocupado com tais imposicées; apos- tava na utilidade geral de suas contribuigdes, na consideracéio que seu trabalho adquiria dentro da Psicologia Clinica e pelas pessoas que liam cada vez mais suas obras. |Ao conceber que a auto-atualizagao s6 6 possivel através de uma relacéo de cumplicidade entre duas pessoas, assume que 0 conhecimento também o é, tendo caréter individual. Portanto, para 0 desenvolvimento de conhecimento a qualidade do encontro en- tre as duas pessoas é fundamental, e para tal deve haver congruén- Gia, empatia, consideragao positiva, consideracao incondicional ea percepcao por parte do outro das atitudes acima descritas. Como congruéncia, refere-se ao fato de ser acessivel a ambos os sujeitos da relacao os sentimentos vivenciados, tornando-os possivel de se- rem comunicados. Por empatia entende-se a percep¢iio do mundo e dos sentimentos do outro como se fossem seus, sem jamais esque- PSICOLOGIA HUMANISTA BT » oxnao julgamento. do.outro.Q mais anto, é que este outro deve perceber conscien- temente essas consideragdes que permeiam a relacao, pois somente_ esse sentimento de cumplicidade podera leva-lo a transformacao e ao conhecimento. ' Considerando que o préprio paciente deve decidir sobre sua vida eo rumo da terapia, nota-se mais uma vez que Rogers conceitua © conhecimento como individual e que a cumplicidade entre as pes- soas apenas propicia que esse seja percebido. Nao ha assim uma in- terferéncia do outro, ou um pressuposto daquilo que deve ser perce- bido ou conceituado pelo paciente, pois somente cada individuo é capaz de perceber o seu modo préprio e deve concebé-lo sozinho. YAssim como em Maslow, percebe-se ento que 0 outro 6 0 possibilitador de qualquer forma de conhecimento e transforma ao, seja isso obtido através da cumplicidade ou satisfacao de suas necessidades basicas, porém é apenas o proprio sujeito que pode perceber o processo e fazé-lo acontecer, caracterizando a possibili- dade do conhecimento como individual. Referéncias bibliograficas AQUINO, Ronaldo & André. Fazendo a historia: a Europa e as Américas nos séculos XIX e XX. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1986. BERGSON, H. A evolugio criadora. Rio de Janeiro: Zahar, 1979. CAPRA, F. O ponto de mutagio, Sao Paulo: Cultrix, 1994. FADIMAN, F. e FRAGER, R. Teorias da personalidade. S40 Paulo: Harbra, 1986. FIGUEIREDO, L. C. M. Matrizes do pensamento psicoldgico. Petrépolis: Vo- zes, 1991. GIORGI, A. A psicologia como ciéncia humana — uma abordagem fenomenolé- gica. Belo Horizonte: Interlivros, 1978. GREENING, T. C. Psicologia existencial humanista. Rio de Janeiro: Zahar, 1975. MASLOW, A. El Hombre Autorrealizado. Argentina: Kairés, 1989.

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