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Bel Canto No Brasil Colonial - José Maurício Nunes Garcia e Marcos Portugal
Bel Canto No Brasil Colonial - José Maurício Nunes Garcia e Marcos Portugal
Por
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ProLDr. Andre Cardoso (Orientador)
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RESUMO
Este trabalho tem como objetivo principal contar as origens do estilo bel canto, suas
principais características e a sua prática no Brasil, no início do século XIX. Após a
transferência D. João VI para o Rio de Janeiro, o estilo bel canto ganha forte impulso,
pois era o gosto predominante entre os membros da Corte portuguesa e da elite cultural
que financiava e freqüentava os espetáculos de ópera. Também são apresentadas
análises estilísticas de trechos de árias de obras sacras de Marcos Portugal (Réquiem de
1816) e do padre José Maurício Nunes Garcia (Missa de Santa Cecília de 1826), onde
identificamos os elementos pertencentes ao estilo bel canto aplicados nessas
composições.
iv
SANTOS, Antônio Pedro de Almeida. Bel canto no Brasil colonial: José Maurício
Nunes Garcia e Marcos Portugal. 2009. Tese de Mestrado em Música – Programa de
Pós-Graduação em Música, Centro de Letras e Artes da Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
ABSTRACT
The main purpose of the present study is to tell about the origins of bel canto style, its
main characteristics and its practice in Brazil in early 19th century. After Don John VI
moved to Rio de Janeiro, the popularity of bel canto increased due to the predominant
taste of Portuguese court and cultural elite that sponsored and frequented opera
spectacles. Excerpts of sacred arias by Marcos Portugal (Requiem, 1816) and by José
Maurício Nunes Garcia (Missa de Santa Cecília, 1826) were here stylistically analysed
and related elements of bel canto style applied to those compositions could be
identified.
v
Dedico este trabalho a minha querida mãe Olivina de Almeida Santos e a minha
querida irmã Ana Lúcia de Almeida Santos
ii
AGRADECIMENTOS
André Cardoso
Daniel Chiesse Zandonadi
Daisy Ketzer
Danielly Souza
Ernani Aguiar
Grace Castro
Inácio de Nonno
Lúcio Chiesse Zandonadi
Rafael Bezerra
Regina Claudia Barros dos Santos
Roque Costa Souza
Thiago Lemos dos Santos
iii
Sumário
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 1
REVISÃO DE LITERATURA ...................................................................................... 7
CAPÍTULO 1. ORIGENS DA MÚSICA VOCAL ITALIANA DOS SÉCULOS
XVII E XVIII ....................................................................................................................................... 28
1.1. O SURGIMENTO DO BEL CANTO ............................................................................... 28
1.2. INSERÇÃO DOS CASTRATI NA ÓPERA ITALIANA DO SÉCULO XVII ............................ 30
1.3. CARACTERÍSTICAS MUSICAIS DO BEL CANTO. ......................................................... 34
CAPÍTULO 2. TIPOS DE ÁRIAS EXISTENTES NA ÓPERA ITALIANA
ENTRE OS SÉCULOS XVII E XVIII ....................................................................... 42
2.1. OS DIVERSOS GÊNEROS DE ÁRIAS ITALIANAS ........................................................ 42
2.2. O CANTO SPIANATO ................................................................................................ 44
2.3. CANTO FLORIDO (CANTO FIORITO).......................................................................... 45
2.4. CANTO DE AGILIDADE............................................................................................ 46
2.5. CANTO DI MANIERA (CANTO DE GRAÇA) ................................................................. 46
2.6. CANTO DI BRAVURA ................................................................................................ 47
2.7. CANTO DECLAMATÓRIO ......................................................................................... 48
2.8. O ESTILO FALADO .................................................................................................. 49
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5.4. CHEGADA DE D. JOÃO AO BRASIL IMPULSIONA A INSERÇÃO DO BEL CANTO NO RIO DE
JANEIRO ...................................................................................................................... 78
5.5. OS CASTRATI NO BRASIL ......................................................................................... 80
CONCLUSÃO............................................................................................................. 117
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 122
APÊNDICE PARTITURAS ANALISADAS VERSÃO INTEGRAL ................... 125
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1
INTRODUÇÃO
décadas do século XVII, e todo decorrer do século XVIII, também buscando citar
período joanino, no qual a absorção do estilo bel canto foi intensa. O meu interesse por
este repertório é de muitos anos, em virtude de possuir uma voz com inclinação para
este estilo. Sendo assim, decidi iniciar uma pesquisa neste âmbito a fim de ampliar o
estilo bel canto, ou seja, consultar fontes que me dessem informações sobre a sua
dificultam a definição do termo bel canto. Concluí que sua definição é complexa, em
virtude dos muitos fatos ocorridos, no âmbito social e musical italiano, que geraram o
seu surgimento. Tentei focar os fatos históricos, para que a partir deles, pudesse
que este estilo se tornasse padrão do canto italiano, do final do século XVII, mantendo-
se em evidência por todo o século XVIII. Tendo em mãos os fatos históricos, fez-se
necessário voltar a atenção para as peculiaridades deste estilo, tais como: suas principais
repertório, que tipo de público apreciava está música, onde era executada.
das vias condutoras que introduziram o estilo bel canto no Brasil, no início do século
XIX. A absorção deste estilo no Brasil foi motivada pela transferência do então,
príncipe regente D. João, e sua Corte para a cidade do Rio de Janeiro. Com a Corte
2
constava o estilo operístico italiano, ao qual o estilo bel canto pertence. A figura do
padre José Maurício está relacionada ao bel canto pelo fato dele ter sido mestre de
compor de acordo com a vontade de seu soberano. Por esta razão, o estilo musical
Lisboa contribui, para o crescimento da adesão ao estilo bel canto no Rio de Janeiro.
chegada de Marcos Portugal aumenta a apropriação deste estilo na Capela Real do Rio
italiano, contribuindo com o aumento da evidência do estilo bel canto na Capela Real.
Sendo a Capela Real do Rio de Janeiro cenário dos grandes acontecimentos religiosos e
do Estado, nela era executada música de grande nível, fazendo com que os dois mestres
OS COMPOSITORES
mulatos. O pai tinha ofício de alfaiate e a mãe cuidava dos afazeres do lar. Nasceu na
Rua da Vala atual Rua Uruguaiana. José Maurício veio ao mundo em um Rio de Janeiro
José, “O pardo”, em pouco tempo alcançou posição de destaque em relação aos demais
alunos, sendo considerado pelo próprio mestre o melhor de seus discípulos. No ano de
1779, com doze anos de idade, inicia sua carreira, como professor de música. Escreve
no ano de 1783 sua primeira composição a antífona de Nossa Senhora intitulada “Tota
Cecília em 1784. Foi nomeado mestre de capela e organista da antiga Catedral e Sé,
hoje igreja do Rosário, no dia 2 de julho de 1798. Com a chegada da família Real em
1808 ao Rio de Janeiro, passou a compor ao gosto do príncipe regente D. João, sendo
1808. Com a transferência dos músicos da Capela Real de Lisboa para a cidade do Rio
de Janeiro a partir de 1809, José Maurício começa a compor para músicos de alto nível
jamais vividos antes na antiga Catedral e Sé. O estilo bel canto começa a transparecer
Conceição 1810. Nesta obra o compositor começa a inserir árias com passagens de
1821 com o retorno de D. João para Portugal a situação dos músicos da Capela Real
torna-se difícil. Após anos de serviços prestados, José Maurício, como membro do
corpo estável dos músicos da Capela Real, também, se encontra em situação lastimosa
Missa de Santa Cecília de 1826, encomendada por antigos alunos: Geraldo Inácio e
Lino José Nunes. Está obra inicialmente é intitulada Missa a grande orquestra, sua
dos músicos do mesmo nome. Está obra foi a ultima expressão da criação mauriciana,
após 43 anos de vida voltada a composição, na qual a música sacra sempre predominou.
No dia 18 de abril de 1830, morre na cidade do Rio de Janeiro, onde sempre viveu aos
Marcos Portugal
Lisboa. A partir de 1785 assume o cargo de regente do Teatro Salitre, onde apresentou
óperas bufas portuguesas de sua autoria. Após conquistar fama suficiente, passou um
período de oito anos na Itália de 1792-1800, onde produziu 21 óperas italianas entre os
oito anos de êxito vividos na Itália decide regressar a Portugal, fixando-se em Lisboa,
tornando-se mestre de capela da Capela Real e diretor do Teatro São Carlos. Após a
partida da família Real para o Rio de Janeiro em 1807, permanece em Portugal até o ano
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capela da Capela Real do Rio de Janeiro, onde se manteve permanecendo com grande
sucesso. Também chegam com ele mais músicos, destinados a Capela Real de Câmara,
entre estes podemos citar, a cantora Mariana Scaramelli, que interpretou óperas do
compositor em Portugal. Foi também nomeado diretor do futuro Teatro Real, em faze
Régio e o Teatro São João, não possuíam uma temporada operística do mesmo volume
do Teatro São Carlos de Lisboa, por essa razão Marcos Portugal teve que direcionar sua
Marcos Portugal apresentada no Brasil, l’oro non compra amore, drama cômico
gênero que tornara glorioso o seu perfil de músico na Europa”. (Mattos, 1997, p. 240).
Mattos continua: “Marcos Portugal não teria como escapar de tal situação e compôs
algumas peças isoladas: Te Deum, sequências, salmos e missas para grandes ocasiões
(...)”. (Mattos, 1997, p. 240). Evidente que não havendo no Rio de Janeiro uma
produção muito intensa no campo operístico em relação a música sacra e sendo Marcos
Portugal mestre de capela da Capela Real, não haveria outra alternativa para ele que não
fosse compor obras de cunho religioso, atendendo assim os anseios do próprio D. João,
Portugal na Europa. Entre as suas obras sacras compostas no Rio de Janeiro para
grandes ocasiões, destacamos: Ofício fúnebre pelo príncipe D. Carlos (1812), Ofício e
6
Missa pela morte da Rainha (1816) e Missa pela aclamação de D. João (1818). Após a
volta de D. João para Portugal em 1821, Marcos Portugal não regressa com ele.
REVISÃO DE LITERATURA
de forma mais clara e objetiva os vários fatores pertinentes na história da música vocal
italiana dos séculos XVII e XVIII, e a inserção e manifestação do estilo bel canto no
Brasil do início do século XIX. Ao iniciar está pesquisa constatei que o termo bel canto
possui muitas definições. Na verdade este termo é complexo e rico de detalhes, exigindo
temas pertinentes nesta pesquisa: A ópera Barroca Italiana, A ópera Clássica italiana,
A ópera romântica italiana (Lauro Machado Coelho), História dos Castrati (Patrick
Barbier), História da música ocidental (Grout e Palisca), Storia e tecnica Del canto
lirico (Guido Tartoni), O canto antigo italiano (Alberto Pacheco), Estudos Mauricianos
(Funarte), José Mauricio Nunes Garcia biografia (Cleofe Person de Mattos), Cantoria
ensaios Marcos Portugal (Jean Paul Seraut), The New Grove versão integral e concisa
relacionadas com o canto antigo italiano, que por dois séculos esteve em voga na Itália e
em outros países da Europa como Portugal. Os textos utilizados dos três livros citados
de Lauro Machado Coelho, contem uma relação predominante com os fatos históricos,
Lauro Machado Coelho, são ricos em detalhes, proporcionando uma compreensão mais
8
objetiva do gênero vocal italiano, relacionado a ópera. Nos seus capítulos, Machado
Coelho cita a situação política européia, em particular a situação dos estados italianos, e
prefácio do seu livro A Ópera barroca italiana, Machado Coelho, contextualiza o início
da ópera em Veneza no final do século XVI, ele expõe o início do dramma per musica,
quer dizer o drama musicado, que posteriormente gerou a ópera italiana. Os períodos da
Coelho, ainda dá uma atenção especial, aos compositores mais proeminentes de cada
são também ressaltadas. Essas considerações, obtidas através dos textos extraídos dos
essa música, onde era executada. Questões de ordem estilística e interpretativa, como os
tipos variados de canto da época, são mencionadas por Machado Coelho, contribuindo
para uma visão também direcionada ao âmbito técnico vocal, além da historicidade.
O livro História dos Castrati de Patrick Barbier, possui também, uma literatura
dos estados italianos dos séculos XVII e XVIII também é contextualizada. Informações
Barbier. A origens dos quatro orfanatos de Nápoles, que depois se tornaram os quatro
conservatórios de música napolitanos (Santa Maria di Loreto, Pietá Del Turchino, Pobre
referentes ao recrutamento dos alunos e sistema de ensino musical adotados nos quatro
geradora do estilo bel canto. Neles atuaram como docentes compositores como:
Napolitana, mediante ao grande nível da intensa formação musical existente, nos quatro
explicitada pelo fato destas instituições exportarem jovens castrati, para grande parte da
Europa, inclusive Portugal. Patrick Barbier, explica em seu livro, que a proibição da
atuação das mulheres por parte da Igreja nos teatros dos Estados Papais e na liturgia,
contribuiu para o aumento dos castrati, nos coros das igrejas e nos teatros. Barbier
afirma que através do estudo intenso e disciplinado da técnica vocal, os jovens castrati
canto. Questões referentes ao estilo e técnica também são abordadas, embora não muito
âmbito em relação às outras literaturas adotadas nesta pesquisa. Embora saibamos que
os castrati não eram os únicos cantores na Itália dos séculos XVII e XVIII, com base
nas informações obtidas em Barbier, é fato que estes predominaram no cenário musical
no Grout e Palisca, em relação a alguns países europeus, nos séculos XVII e XVIII,
como: Itália, Alemanha, França e Espanha, contribuíram para uma visão comparativa
acerca do estilo de música vocal feita em cada um deles. Grout e Palisca também
forneceu a está pesquisa informações referentes a absorção do gênero vocal italiano pela
Europa. Grout e Palisca define os italianos como bons melodistas, a estes compositores
atribuem o gosto pela linha melódica ornamentada, com uma textura orquestral leve
Guido Tartoni em sua Storia e tecnica Del canto lírico, contribuiu também no
aspecto histórico relatando as etapas ocorridas no canto italiano nos séculos XVI, XVII
e XVIII. Tartoni no inicio de seu livro define com poucas palavras o canto. “Cantare
vuol dire modulare La voce, unire parola Allá musica...” (Cantar quer dizer modular a
voz, unir a palavra a música). Tartoni trata em seu livro dos vários estilos de canto
existentes na época. Segundo Tartoni todos os elementos que compõe o canto italiano
floridas, confere ao período setecentista uma linguagem que por sua riqueza passará
para a história definida como bel canto. Como Patrick Barbier e Lauro Machado
canto de bravura. O século XVIII é considerado por ele como o período de hegemonia
do estilo do canto italiano, citando Tosi como uma figura de referência em relação a
técnica de canto, abordado na Itália na época. Estas informações são importantes, pois
professor de canto, Tartoni considera que os princípios técnicos vocais defendidos por
p.22).
2006, é uma literatura de muita relevância nesta pesquisa, pois além de abordar o caráter
histórico, social e político dos estados italianos nos séculos XVII e XVIII, apresenta
com profundidade questões estilística e técnicas referentes ao estilo florido italiano. Seu
de períodos diferentes entre os séculos XVII, XVIII e XIX. Tosi (1647-1732), (citado
aspectos existentes no canto antigo italiano e suas mudanças são considerados por
Alberto Pacheco, nesta obra. Alberto Pacheco considera como Patrick Barbier e Guido
Tartoni a figura do castrato de grande importância no canto italiano dos séculos XVII e
XVIII. Segundo Pacheco, por dois séculos a música vocal italiana esteve relacionada à
figura dos castrati. Alberto Pacheco divide seu livro em várias etapas, cada uma é
formação musical. O segundo capítulo é dedicado aos aspectos didáticos, ou seja, quais
metodologias de ensino eram adotadas pelos três professores e quem eram os discípulos.
voz, respiração, golpe de glote, forma da boca, registração vocal, timbres, extensão
vocal, tipos vocais. O quarto capítulo é dedicado aos aspectos interpretativos como:
abordadas com destaque. Questões comuns na época como, variação de tempo e rubato,
também são consideradas por Alberto Pacheco. Vibrato e tremolo são também citados
neste livro com profundidade, fornecendo ao leitor uma visão detalhada em relação as
considerações feitas por cada um dos três professores de canto adotados. O quarto
capítulo é o mais extenso em relação aos outros, nele Alberto Pacheco cita outros
Itália. Constam ainda considerações feitas acerca de: portamento, dinâmica, sons
sustentados e messa di voce. Em relação aos sons sustentados Pacheco ainda subdivide
este subtítulo, em sete subitens: Sons sustentados de força igual, Messa di voce, sons
filés, Spianata di voce, Sons filés por inflexões, a eco (flautados), Repetição ou Martelar
abordadas com detalhes. Alberto Pacheco detalha o trillo, são citadas considerações dos
três tratadistas, a respeito deste ornamento, que era tido como primordial a um cantor
naquela época. “Quem possuir um belíssimo trillo, ainda que sendo insuficiente em
nas cadências...” (Tosi, 1773: 25). A cadência é citada com destaque por Alberto
Pacheco, considerações dos três mestres (Tosi, Mancini, Garcia), estão contidas em seu
livro. Os estilos de canto são citados por Pacheco, o recitativo também faz parte do
conteúdo do quarto capítulo. Alberto Pacheco dedica o final do quarto e último capítulo
leitura desta obra, foi possível perceber divergências entre Tosi, Mancini e Garcia. Nem
sempre existe homogeneidade na postura dos três professores, em relação aos assuntos
abordados. O teor de importância dado por cada um dos três professores de canto em
13
relação aos diversos assuntos expostos neste livro também variam. Certamente o fato de
terem vivido em épocas diferentes fez com que as suas considerações em relação aos
diversos textos de figuras renomadas na musicologia como: Curt Lange, Luiz Heitor
Correa de Azevedo, Padre Jaime Diniz, José Maria Neves, Bruno Kiefer. Neste livro
encontra-se a biografia do padre José Maurício Nunes Garcia, além de textos tratando
da obra mauriciana e vários aspectos, tais como: José Maurício no Panorama da Música
setecentistas mineiros (José Maria Neves), entre outros textos, todos de grande
relevância em relação ao estudo da obra do padre José Mauricio. Cada texto oferece
inegavelmente José Maurício como protagonista, então, embora seja um livro composto
de textos de autores variados pode-se obter uma visão totalitária de quem foi José
Maurício, do conteúdo de sua obra, para que e para quem foi composta, contribuindo
uma obra na qual a autora oferece ao leitor uma biografia bastante detalhada de José
estilísticas, pelas quais passou José Mauricio, detalhadamente. Em relação ao estilo das
obras mauricianas, Cleofe Person de Mattos divide o livro em duas etapas, a primeira na
pelo subitem intitulado de, A travessia. Neste momento a autora aborda as modificações
adotadas pelo autor após a chegada de D. João e sua corte ao Rio de Janeiro. Cleofe
14
Person de Mattos relata a absorção de José Mauricio pelo estilo vocal italiano do século
XVIII, que era do gosto da família Real. A autora faz inclusive uma breve análise
de 1810. Esta obra é considerada por Mattos como o marco do início da linguagem
característicos da linguagem vocal italiana dos séculos XVII e XVIII. Cleofe Person de
Mattos enfoca a última obra última obra do padre José Maurício que foi a Missa de
Santa Cecília de 1826, esta composição é embasada no estilo fiorito para as partes
solistas, ou sejas árias com passagens de agilidade, com muitas ornamentações. Mattos
considera que no âmbito musical colonial brasileiro, José Maurício se divide em duas
etapas estilísticas bastante diferentes. Embora o estilo operístico italiano, não fosse um
mauriciana, Mattos afirma, que óperas de grandes nomes da Escola Napolitana, como
últimas décadas do século XVIII. A autora sugere que o estilo operístico italiano era
familiar a José Maurício, logo podemos concluir, que a aderência ao estilo napolitano
após a vinda de D. João não foi um ato sem precedentes. A vinda da família Real ao
Rio de Janeiro, e dos músicos da Capela Real de Lisboa, foi um elemento estimulante as
mudanças no estilo da obra do padre José Maurício. “Talvez não fosse imaginoso
fizesse parte das composições de José Maurício antes da chegada de D. João. “Não será
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Brasil D. João e seus cantores italianos”. (Cleofe Person de Mattos, 1997, p. 27).
Brasil. O alvo do texto não está direcionado apenas para a questão da música existente
no Rio de Janeiro em 1808, embora esta seja uma constante no decorrer do livro. A
leitor uma visão mais ampla, das reais circunstancias que motivaram a transferência da
Corte portuguesa para o Brasil, e em que condições aqui chegaram. Figuras importantes
no âmbito da música colonial do Rio de Janeiro como, o padre José Maurício Nunes
Brasil, como, a chegada de Marcos Portugal, faz parte do conteúdo da obra. A vida
musical da cidade é narrada em vários aspectos, o autor não limita a narrativa a este ou
aquele âmbito ou estilo musical. A música sacra, ópera, música de câmara, incluindo a
música popular da época, são incluídas nesta literatura, proporcionando ao leitor uma
visão abrangente dos variados gêneros musicais existentes naquela época na cidade do
Rio de Janeiro. O terceiro capítulo intitulado a Música na corte do Rio de Janeiro foi
seccionado em subitens, nos quais constam: Padre José Maurício Nunes Garcia, A
uma vez que, estes temas estão ligados intimamente a nossa pesquisa.
Maurício Nunes Garcia, é uma análise estética na qual a autora aponta os elementos de
unidade existentes nesta missa. Não podemos deixar de considerar também, outras
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partes do artigo mais direcionadas a definição do termo Missa Napolitana, onde Inez
Martins define a missa dentro da liturgia católica, suas respectivas partes (próprio e
partes fixas). Inês Martins comenta detalhadamente, acerca do estilo antico (antigo)
elementos muitos recorrentes na ópera italiana dos séculos XVII, XVIII, e nas primeiras
décadas do século XIX. Inez Martins ainda define a Missa Cantata, segundo ela esta é
O ensaio de Marcos Portugal de Jean Paul Sarraute é uma obra literária sobre o
compositor português. Nesta obra, o leitor encontra com certo teor de detalhes, na
analítico, referentes à sua obra. Nesta biografia encontramos detalhes sobre o Missa de
Réquiem que Marcos Portugal compôs para as exéquias da Rainha Dona Maria I. Jean
Paul Sarraute comenta a obra em vários ângulos, não é uma análise complexa em
relação a sua estrutura harmônica, mas sim voltada para o aspecto estilístico e estético.
Jean Paul Sarraute oferece ao leitor uma visão do teor de abrangência da obra de
Marcos Portugal, que chega até a Rússia. Um capítulo inteiro do seu livro é dedicado a
Paul Sarraute dedica um capítulo inteiro, referente aos últimos vinte anos da vida
Marcos Portugal, que foram passados na cidade do Rio de Janeiro, a serviço de D. João
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do Brasil de Portugal.
texto, contém informações de caráter histórico e estilístico, que são de grande relevância
como onde se encontra o manuscrito original, quem o doou, são mencionadas no início
que possam ter sido feitos a orquestração da missa. Os nomes dos solistas da missa são
baixo João dos Reis Pereira, do tenor Gabriel Fernandes da Trindade, são citados neste
trecho referente a partitura. Cleofe Person de Mattos cita dados mais esmiuçados
referentes a alguns solistas, como o soprano Augusto Cesar de Assis, Candido Inácio da
Silva tenor. Um fato de relevância a ser mencionado neste texto, são as suposições de
renomado Gioavanni Fasciotti. Segundo Cleofe Person de Mattos, Fasciotti era muito
Informações sobre a historicidade da obra, também são feitas fornecidas por Cleofe
acontecimento foi composta. Segundo Cleofe, o manuscrito original regido pelo padre
manuscritos conhecidos atualmente. Cleofe Person de Mattos afirma, que José Mauricio
segundo ela são peculiares a música profana. Talvez seja possível dizermos que nesta
obra de cunho religioso o padre José Maurício une aos textos litúrgicos da missa, em
a obra em verbetes explicativos, quase uma análise interpretativa das diversas partes
desta missa.
relação ao tema deste trabalho que é manifestação do estilo bel canto no Brasil. Todos
os dados históricos aqui relatados, são necessários para a compreensão das condições,
sociais da época. Tais informações são bem vindas em uma pesquisa de fundo histórico,
dos elementos motivadores do surgimento do estilo vocal italiano dos séculos XVII e
XVIII, chamado posteriormente de bel canto. Como saber que pensamentos norteavam
através de suas obras? Para que interpretes e público o estilo italiano dos séculos XVII e
XVIII era direcionado? Em que locais essa música era executada? Sem informações
legitimar-se, como um trabalho científico. No aspecto histórico, vale a pena dizer que
relevantes no âmbito social. Guido Tartoni, em seu livro Storia e técnica Del canto
ordem histórica, política e social, contidas neste livro a respeito dos séculos XVII e
XVIII, foram importantes, para a comparação com dados históricos, contidos nas
italiano e sua difusão pela Europa. As informações de Patrick Barbier em relação aos
relata, que tipo de alunos pertenciam a estas instituições, que professores eram
responsáveis pela formação dos internos. Tartoni dedica um capítulo de seu livro a
figura dos castrati, o conteúdo deste capítulo é convergente com os primeiros capítulos
do livro da Patrick Barbier, sobre a história dos cantores eunucos. Ambos admitem que
a atuação dos castrati na música vocal italiana dos séculos XVII e XVIII, tornou o
estilo fiorito um forte elemento pertencente nesta música. As mesmas considerações faz
Alberto Pacheco em seu livro, sobre o canto antigo italiana, chegando a dizer: “a ópera
nos seus primeiros séculos de vida estava intimamente ligada ao fenômeno vocal dos
fiorito italiano. Guido Tartoni aponta o castrado professor de canto Tosi (1647-1732),
como responsável pela hegemonia do estilo vocal italiano neste período. Segundo
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Tartoni o canto italiano incorpora suas características principais através de Tosi, suas
estabelece as características principais do bel canto. Alberto Pacheco por sua vez cita
Tosi como importante professor de canto dos séculos XVII e XVIII, porém, também
italiana. O livro de Alberto Pacheco foi útil nesta pesquisa, pois sua abordagem é
comparativa entre os três maestros de canto, uma vez que estes viveram em épocas
diferentes. Neste livro Alberto Pacheco fornece, informações de como a técnica e estilo
vocal se modificaram, em relação ao período vivido por cada um deles (Tosi, Mancini,
convergentes e pontos divergentes entre cada um dos três professores. Tosi e Mancini
viveram nos séculos XVII e XVIII, período de grande evidencia dos castrati na Itália.
Ambos eram castrati (Tosi e Mancini), sendo assim fatores como a técnica e muitos
conceitos entre os dois são convergentes, embora tenham vivido em épocas diferentes.
Garcia por sua vez viveu no século XIX, período no qual os castrados já estavam saindo
inserção da figura dos castrati na musical vocal italiana foi apoiada pela Igreja, através
da proibição da atuação de mulheres nos teatros dos Estados papais e nos coros das
igrejas. Garcia nasce em meio ao domínio napoleônico no início do século XIX, durante
esse período Napoleão proíbe a castração de jovens nos estados italianos. Estas
informações são úteis, pois nos fazem compreender a divergências de alguns conceitos
entre os três professores de canto. Maiores mudanças existem entre Garcia em relação a
Tosi e Mancini, uma vez que Garcia vive em uma Itália na qual a figura do castrato não
é mais a referencia central do canto lírico italiano. Guido Tartoni aponta Tosi como um
expoente da escola de canto italiana nos séculos XVII e XVIII, pois muitos conceitos
21
XIX.
que a maioria dos textos adotados possui uma parcela direcionada para estes assuntos,
embora alguns sejam mais direcionados a eles que outros. Lauro Machado Coelho
século XVIII, que foram comparadas as informações de Alberto Pacheco, Guido Tartoni
estilístico foram vistas nesta pesquisa, pois sem elas não haveria a compreensão final
dos elementos que compunham a canto italiano naquela época. Estas informações são
necessárias, pois existia uma variação do tipo de canto a ser utilizado em relação ao
aquele estilo de canto, exigindo do cantor uma postura vocal condizente com estilo
dentro da ópera (ária), os autores informam que a ária passou a ocupar lugar de destaque
relação ao estilo e a técnica vocal italiana dos séculos de XVII e XVIII. Embora todos
canto, Alberto Pacheco é o que fornece um discurso mais detalhado, em virtude de seu
livro se embasar em uma análise comparativa entre os tratados dos professores de canto
natural que as informações devam ser mais profundas, objetivando fornecer ao leitor
22
uma conscientização mais sólida em relação às considerações feitas por cada um dos
informações contidas nestas obras literárias contribuem para músicos, que como eu
dedicam sua carreira a questões interpretativas, ou, atuando como professor de canto,
Alberto Pacheco, consiste no perfil estético vocal italiano dos séculos XVII, XVIII e
século XIX com a vinda de D. João para o Rio de Janeiro. Não seria possível
conhecer com maior profundidade os elementos que compõe a música vocal italiana,
acerca de suas execuções contribuíram, para uma melhor visão analítica de obras com
abordadas nesta pesquisa, como a ária Laudamus da Missa de Santa Cecília 1826 do
padre José Maurício Nunes Garcia, que possui elementos pertencentes ao estilo fiorito.
Mattos sobre a vida do padre José Maurício, contribuiu imensamente para ilustrar as
origens do compositor, e sua trajetória como músico da Sé, culminando com a chegada
em relação a música feita e dirigida por José Maurício na Sé Catedral, dados referentes
aos músicos que atuavam na época (cantores e instrumentistas), oferecem uma melhor
23
Sem a leitura destas informações, não haveria um entendimento da transição feita pelo
compositor, após a chegada da família Real. Cleofe faz uma espécie de análise
por José Maurício, a partir daquela data em sua obra, que iria permear as suas
composições até a sua morte. Não foi apenas um motivo que fez com que o padre José
Maurício lançasse mão do estilo bel canto na sua obra. Cleofe explica em seu livro, que
entre estes motivos estavam implícitos o gosto pessoal de D. João pelo estilo italiano, a
vinda dos músicos instrumentistas da Capela Real de Lisboa, todos de altíssimo nível.
Como Guido Tartoni, Patrick Barbier, Lauro Machado Coelho, Alberto Pacheco, Cleofe
para o Rio de Janeiro, um agente motivador da adesão do padre José Mauricio ao estilo
italiano. Segundo Cleofe em sua biografia mauriciana D. João tinha uma predileção
especial, em relação aos castrados assim sendo, era natural que padre José Maurício
composse ao gosto de príncipe regente, para as vozes que lhe agradavam utilizando uma
linguagem musical adequada aos recursos vocais destes cantores de vozes singulares.
processo de absorção de José Maurício Nunes Garcia ao estilo italiano, que era o estilo
Nápoles. (Cleofe Person de Mattos, 1997, p. 239). Estas informações são de grande
24
importância, pois, diante da maioria dos olhares, os dois compositores não mantinham
nenhuma relação entre si, embasados nos relatos fornecidos por Cleofe, consideramos a
vinda de Marcos Portugal mais um elemento integrante nas motivações do padre José
religioso.
Marcos Portugal”, nos traz informações detalhadas acerca da vida do compositor, tais
como: sua ascensão em Portugal, sua ida para Itália, seu sucesso como compositor, sua
vinda para o Brasil. A difusão do seu repertório em cidades de centro cultural como
Londres e Paris, o alcance de seu repertório em países como a Rússia. Este conjunto de
manipulado com facilidade pelo compositor. Marcos Portugal como músico de corte,
estava habituado a compor ao gosto da realeza. O estilo bel canto era o padrão musical,
tanto nos teatros como nas suas celebrações religiosas. Por está razão é perfeitamente
aceitável que após sua vinda ao Brasil D. João desejasse uma música no mesmo padrão
estilístico da Capela Real de Lisboa na Capela Real e Sé, instituída por ele no Rio de
Janeiro. Jean Paul Sarraute dá um enfoque maior a Missa de Réquiem composta por
Marcos Portugal para as exéquias da Rainha D. Maria I. A esta obra Jean Paul Sarrraute
Cantata. Inês explica que na Missa Cantata o compositor, amplia as duas primeiras
partes solistas, concertantes e coral. Inês Martins faz algumas considerações em relação
ao Glória, relacionadas a sua extensão, que ocupa grande parte da obra, e atribui a sua
grande duração, ao propósito festivo para qual foi composta está missa, o ensejo da festa
da padroeira da Irmandade dos músicos, de Santa Cecília. De acordo com Inês Martins,
o padre José Maurício compôs o Gloria com grande extensão, em função do texto
alegre de louvor que está parte da missa possui, já que a Missa seria executada em uma
data festiva.
1826 da Funarte, contém informações importantes para esta pesquisa, uma que as árias
Laudamus, Qui tollis, são utilizadas como exemplos da manifestação do estilo bel canto
cunho estilístico são detalhados pela autora por meio de linguagem clara, de fácil
indicação do interprete que a ária se destina. Cleofe Person de Mattos, não define a
quem a ária é dedicada no fim de suas investigações, porém, conclui fechando este
parêntese, afirmando, que diante das exigências impostas pela partitura somente um
interprete de grande domínio técnico vocal poderia executá-la. Cleofe Person de Mattos
afirma que só um castrato poderia cantar está ária, repleta de passagens de agilidade, de
fato polemico afirmando, que provavelmente dois cantores da Capela Real Antonio
Cicconi ou Giovani Fasciotti, executaram está ária. Quanto ao seu parecer, relacionado a
Missa de Santa Cecília de 1826, Cleofe Person de Mattos afirma, que a obra exprime a
estilo, como uma mera conseqüência, por estar em comunhão com o seu tempo.
característicos da Escola Napolitana, passa a usá-lo à medida que vai convivendo com
da Europa, também foram úteis para que compreendêssemos o ambiente em que vários
fatos ocorreram dando origem a música vocal italiana dos séculos XVII e XVIII, que
posteriormente passou a ser chamada por muitos de bel canto. Os textos serviram de
suporte condutor, criando uma ponte de informações até chegarmos à inserção do estilo
bel canto no Brasil. Sem as referências históricas, técnicas e estilísticas citadas nesta
pesquisa, não seria possível compreendermos os motivos que levaram a utilização deste
estilo no Brasil, do século XIX. Valorosas foram as informações acerca do padre José
Portugal ao estilo fiorito, proporcionou a entrada deste no Brasil colonial com a chegada
aliada ao gosto de D. João e sua corte, resultaram na adesão deste estilo na cidade do
27
Rio de Janeiro. A vinda dos castratti membros do coro da Capela Real de Lisboa, é
outro fator motivador para que este estilo fosse absorvido na cidade do Rio de Janeiro,
manifestação do estilo bel canto no Brasil, pois a figura do padre José Maurício
Real e Sé, começa a empregar este estilo, mudando o perfil estilístico de suas
composições. Cleofe Person de Mattos sintetiza em uma frase seu parecer referente ao
teor de profanidade contido na Missa de Santa Cecília de 1826, última obra do padre
José Maurício. “Se a obra contém profanidade, deve-se reconhecer que o sinal dos
tempos o atingira”. (Cleofe Person de Mattos, 1984, p. 19). Talvez possamos considerar
esta frase de Mattos relacionada a toda obra mauriciana calcada no estilo bel canto.
28
Segundo o dicionário The Grove dictionary, bel canto1 é a arte de cantar bem, ou
seja, cantar nos padrões estabelecidos nos séculos XVII e XVIII. O Grove dicionário
definiu o bel canto como um dos poucos termos musicais dos mais usados, e também
dos mais abertos a diversas interpretações. O verbete continua definindo o termo bel
canto como canto elegante italiano, estilo vocal do século XVIII e início do século XIX.
De acordo com o Grove dicionário o termo bel canto é inserido no vocabulário musical,
bastante tardio, segue explicando que a expressão “bel canto”, jamais apareceu nos
tratados dos castratti professores de canto Tosi (1723) e Mancini (1774). Estes dois
nomes são citados pelo Grove como os mais importantes tratadistas da então chamada,
“era de ouro do bel canto”. O termo só começa a ser usado a partir da metade do século
XIX, conclui-se então, que o termo bel canto não era usado nos séculos XVII e XVIII,
período no qual este estilo estava em voga. Provavelmente quando começou a ser usado
no século XIX, o termo bel canto servia como referência ao estilo do canto italiano dos
séculos XVII e XVIII. Segundo o The Grove dictionary o termo bel canto só começa a
ser usado quando na metade do século XIX, quando o peso vocal estava em evidência, e
menos ênfases eram colocadas sobre uma leveza e expressão florida. (The New Grove
1
Bel canto (It.: ‘fine singing’). Few musical terms are as loosely used or open to as many different
interpretations as ‘bel canto’. Generally understood as indicating the elegant Italian vocal style of the 18th
and early 19th centuries, the terms did not enter the musical vocabulary until somewhat later. It does not
appear, for example, in the treatises of Tosi (1723) and Mancini (1774), the most important writings of
the so-called ‘golden age of bel canto. (The New Grove dictionary of music and musicians, 2001, v. 3, p
161, 162).
29
O Grove dicionário edição concisa defini bel canto, como: expressão usada para
referir o elegante estilo vocal italiano dos séculos XVIII a XVIII, caracterizado pela
beleza de timbre, emissão floreada, fraseado bem feito e técnica fácil e fluente.
De acordo com fontes bibliográficas lidas nesta pesquisa o estilo fiorito italiano,
mais conhecido como bel canto, surgiu em nossos dias motivado por diversos fatos,
ocorridos no decorrer dos séculos XVI, XVII e XVIII, atingindo seu ponto máximo no
ascensão deste estilo na sociedade da época. Outro agente estimulante foi à realeza, que
surgimento deste estilo. O gosto italiano pelas melodias é uma das causas da ascensão
século XVIII.
Alberto Pacheco declara que a ópera italiana dos séculos XVII e XVIII, está
intimamente ligada á figura dos castrati, pois nestes dois séculos possuem uma forte
ligação com estes cantores, como interprete e professores de canto. Pacheco segue
afirmando que os castrati eram referência vocal, também muito respeitados como
professores. Por esta razão, a figura dos cantores e professores eunucos será de
Nos dois primeiros séculos de vida, a ópera esteve intimamente relacionada com o
fenômeno vocal e musical que foram os castrati. Eles se tornaram o modelo vocal
tanto como intérpretes quanto como professores. Portanto, não é um acaso o fato de
dos tratadistas analisados nesta dissertação terem sido castrati. (Pacheco, 2006, p.
25).
30
dizer, uma política muito influenciada pela Igreja. Pacheco relata que a Revolução
Francesa motivou o fim do antigo Regime, provocando o início da saída paulatina dos
O advento dos castrati está intimamente relacionado com o Antigo regime que
dominava a Europa. Esta relação é tão forte que a Revolução Francesa, ao dar início
à queda do Antigo Regime, levou os castrati a uma extinção progressiva. Prova
maior disso é o fato de que Napoleão, um produto desta mesma revolução proíbe,
em 1806, a castração de jovens nos estados italianos. (Pacheco, 2006, p. 25).
Espanha. Barbier afirma que os eunucos foram introduzidos na Espanha através das
a ocorrer no plano musical. Introduzido pela civilização moçárabe2 por volta do século
XII, certos eunucos, com voz espantosa, iriam pouco a pouco conquistando um lugar
considerável na liturgia católica, para atingir o apogeu no século XVI. Uma bula do
claramente que os castrati eram admitidos já há muito tempo nas principais igrejas da
música da liturgia romana. A igreja admite a superioridade das vozes dos castrati, em
2
O repertório de canto chão pertencente a igreja da Espanha até sua substituição pelo rito romano em
1085; ‘moçárabe” refere-se a cristão sob dominação muçulmana... (Dicionário Grove edição concisa,
1994, p. 611)
31
porém, aos poucos sua atuação foi se tornando predominante, em relação aos naipes de
sopranos e contraltos. “No espaço de alguns anos, mandou embora todos os falsetistas
músicas, que vão originar a chamada “era de ouro do bel canto italiano”. Nápoles adota
Não é por acaso, que Nápoles ocupa lugar de destaque, em relação ao estilo
fiorito (fioriture)4. Nápoles era uma cidade, que possuía quatro grandes conservatórios5
de música, o mais antigo é o de Santa Maria di Loreto, fundado em 1537. Outros três
conservatórios são fundados posteriormente, Pietá Del Turchini, Pobres de Jesus Cristo
3
Tiple. A mais aguda das vozes humanas, própria especialmente de mulheres e meninos.
Tiple.f. La más aguda de las voces humanas,propia especialmente de mujeres y niños. (Michel Brenet,
1981, p. 512).
4
Fioritura (It., “floreio”) Ornamentação de uma linha melódica, seja improvisada por um intérprete ou
escrita pelo compositor. (Dicionário Grove edição concisa, 1994, p. 328).
5
Conservatório de Nápoles Escola de música italiana. No séc.XVII foram criadas escolas de música em
quatro orfanatos italianos (S. Onofrio, Poveri di Gesù Cristo, Sta. Maria de Loreto, Pietà dei Turchini). Os
meninos aprendiam contraponto e canto, bem como a execução de instrumentos; tomavam parte nos
serviços eclesiásticos e em concertos. (Dicionário Grove edição concisa, 1994, p. 215).
32
outras instituições: a Pietà Del turchini em 1584, os pobres de Jesus cristo em 1589 e
Nápoles, como centro formador de bons músicos, em função das exigências feitas pela
Uma virada decisiva ocorreu durante a primeira metade do século XVII. Diante da
extraordinária explosão da vida musical que se observava mais ou menos por toda a
Itália, e porque a música religiosa exigia muitos bons músicos e cantores, Nápoles
sentiu necessidade de concorrer com as estruturas musicais das outras cidades e
assim escapar á influência delas. Muito rapidamente, os quatro orfanatos das
décadas anteriores iam erigir-se em escolas de música para se tornarem as de maior
prestígio da época: conservar, transmitir e aperfeiçoar a tradição musical
constituíram sua nova ambição, e do verbo conservare nasceu pela primeira vez na
Europa a palavra “conservatório”. (Barbier, 1989, p. 32, 33).
napolitana como referência da ópera italiana do século XVII até 1770, pois, a maioria
Escola Napolitana Expressão usada para indicar o estilo operístico preferido pelos
compositores nascidos ou que estudaram em Nápoles do final do séc. XVII até os
anos 1770. Hoje se considera que jamais existiu uma “escola napolitana”, mas a
expressão continua sendo útil e não é irrelevante, uma vez que a maioria dos
principais compositores operísticos estudou em conservatórios napolitanos. Entre
eles incluem-se A. Scarlatti, tradicionalmente apontado como fundador do grupo,
Porpora, Vinci, Hasse (apesar de alemão), Pergolesi, Jommelli, Traetta, Piccinni,
Paisiello e Cimarosa. (Grove edição concisa, 1994, p. 642).
33
Napolitana, em virtude desta conter elementos do canto antigo italiano que se estendeu
do século XVII até o final do século XVIII, atingindo o seu apogeu no final dos
musical, de meninos e jovens, fez com que Nápoles se tornasse sinônimo da expressão
assim músicos de toda a Itália, mas também, compositores renomados como, Haendel e
Mozart.
Mestre de capela. A pessoa que dirige um coro religioso. As capelas reais e os coros
das igrejas, Catedrais ou congregações tinham antigamente entre seus membros toda
uma hierarquia de mestres e sub-mestres de capela e de meninos cantores. (Michel
Brenet, 1981, p. 302). 6
O estilo bel canto surge apoiado, na valorização da escola italiana pela melodia.
uma função secundária, voltada para o acompanhamento dos cantores, exceto nas
é a voz solista. Nápoles, com seus quatro conservatórios, ocupa uma posição de
destaque no cenário da ópera italiana dos séculos XVII e XVIII. O fato de ter gerado
6
Maestro de capilla. La persona que dirige um coro religioso. Las capillas soberanas y los coros de las
Iglesias catedrales o colegiatas tenian antiguamente entre sus miembros toda uma jerarquia de maestros y
submaestros de capilla y de niños cantores.
34
contribuíram, para que a figura do bel canto estivesse sempre relacionada, à cidade de
Segundo o dicionário Grove, o termo bel canto está relacionado ao cantar bem,
com elegância, com leveza. O estilo bel canto é denominado por várias formas, na sua
maioria estas são cabíveis, porém devem ser conjugadas simultaneamente, pois o estilo
século XVII, a ópera italiana continha os elementos, que seriam constantes nos
importante na ópera italiana, por esta razão, os solos eram tratados com mais ênfase.
35
Talvez por este motivo os compositores começam a admitir mais e mais, os elementos
Lauro Machado coelho afirma, que a ópera italiana adquiriu o seu perfil de
também surge motivado pela super valorização dos solos, criando assim em torno da
demais elementos contidos na obra. O libreto, orquestra e coro, são exemplos de figuras
pouca evidencia neste período. ”Conseqüência direta do grande relevo adquirido pela
ária na ópera seria é o surgimento do fenômeno típico do século XVIII que, com
(Machado Coelho, 2000, p. 187). Machado Coelho fornece ainda mais informações, a
Coelho, a platéia reagia indiferente a exibição da ópera somente voltando a sua atenção
durante a execução de uma ária. “(...) contam-nos que ninguém prestava atenção no que
estava acontecendo no palco, a não ser quando se ouvia uma ária mais conhecida...”
Guido Tartoni, em sua Storia e técnica Del canto lírico, também nos fornece
ornamentado e virtuosístico.
7
Jacopo Peri (Roma, 20 ago. 1561; Florença, 12 ago 1633) compositor cantor italiano. Suas primeiras
óperas, ambas sobre texto de Rinunccini, foram Dafne (1598, Florença), composta com Corsi, e Eurídice,
baseada na lenda de Orfeu, é a primeira ópera cuja música se conservou completa. (Dicionário Grove
edição concisa, 1994, p. 713)
8
Giulio Caccini (Giulio Romano) (Roma/Tivoli, c. 1545; Florença, ent. 10 dez. 1618) Compositor e
cantor italiano.
9
Due elementi contribuirono certamente, in quel período, ad arricchire di melismi e fiorettature in canto,
attizando cosi fin dal Seicento quella polemica sulla fatuità Del canto di agilitá, vocalizzato, Che avrebbe
caratterizzato tutto in Settecento e L’Ottocento, giungendo fino ai nostri giorni: Il fato Che La rendeza ad
impreziosire La vocalità, anche com improvvisazioni e variazioni, s’inquadrasse perfettamente nel clima
barocco dell’epoca, fastoso e ricco di fantasia nella ornamentazione strumentale, e Il fatto Che molto
spesso i compositori stessi, da Peri (interprete della parte di Orfeo nella sua Eurídice) a Cassini, fossero
anche cantante e quindi inclini a sfoggiare La loro sapienza nell’inventare cadenze brillanti. (Guido
Tartoni, 1995, p. 16)
37
estabelecida com predominância, no findar do século XVII, e por quase todo o século
XVIII. Segundo Tartoni o novo estilo que surgia com o findar do século XVII, buscava
cantores, nesta época estavam fadados, a se dedicarem com afinco, ao domínio das
torna-se elemento totalmente ligado ao estilo bel canto, ao ponto, de muitos suporem,
que o estilo musical italiano dos séculos XVII e XVIII, fosse constituído essencialmente
de ornamentações.
Lauro Machado Coelho afirma, que foram vários motivos que contribuíram para
Coelho admite, a importância dos mestres Francesco Antonio Pistocchi e Antonio Maria
10
Evirate. Castrado emasculado. (Éverton Florenzano, Dicionário Ediouro Italiano Português, 2201, p.
100)
11
Il virtuosismo appariva ora indispensabile, per trovare nella propria inventiva fonética e nelle formule
di bravura suoni e modi rari, atti ad esprimere, nel nuovo canto monódico, inauditi sentimenti, fantasie,
ispirazioni descrittive, sai di stati d’animo sai di ambienti e atmosfere. Tanto nell’astrattezza dei moduli
silizzati quanto nella concretezza di queli Che sostanziano invece i moti interiori e gli impulsi dei sensi,
insomma, Il canto lírico asetecentesco riesce ad affermare uma forma di linguaggio che per la sua
presiosità passerà Allá storia come belcanto. Tra i grandi protagonisti di questo período, nel quale
comunque spesso AL fervore degli affetti si sostituisce La pura acrobazia vocale, sono gli evirati,
creaturre destinate Allá fama, magari, ma a prezzo della loro infelicitá. (Guido Tartoni, 1994, p. 16, 17)
38
Bernacchi. Porpora também é citado, como membro deste grupo, que começa a
privilegiar a voz solista, nas óperas italianas. Machado Coelho afirma, que estes três
Para a grande explosão de vocalismo da virada do século XVII para o século XVIII,
concorrem vários fatores: as grandes escolas de canto dos castrati Francesco
Antonio Pistocchi e Antonio Maria Bernacchi, às quais virá juntar-se mais tarde a do
compositor Nicola Porpora: a reforma Arcádia do libreto; e a contribuição
fundamental de alguns operistas aqui mencionados. Estes nomes formam a ponte
entre o trabalho precursor de Alessandro Scarlatti e a fase áurea que será dominada por
Vivaldi, Haendel e Hasse. (Lauro Machado Coelho, 2.000, p. 215).
passagens de registro, quer dizer, a transição da região média da voz para os agudos ou
aguda, serem realizados com suavidade. Tartoni considerava este princípio uma das
muito difundida e apreciada neste período, considerada fundamental aos recursos vocais
Tosi expõe a sua preocupação com uma linguagem clara. A metodologia de ensino de
Tosi, era clara, procurando direcionar o cantor na prática do aprendizado do canto, tais
12
All’inizio Del XVIII secolo si teorizza, da parte del castrato e compositore P.F. Tosi, Il passagio di
registro, cioè a dire La miscelazione graduale dei suoni de petto e di quelli di testa, nelle zone intermedie,
per preparare gli acuti, salendo, e Il processo inverso per scendere ai gravi dalle note alte, onde evitare
bruschi scarti timbrici e dare omogeneità di tinte e vibrazioni all’intera gamma di due ottave. Anche Il
método che prevede l’attacco dolce delle note acute, raccomandato dal Tosi, stabilisce um altro principio
fondamentale del considetto belcanto che caraterizzerà il Settecento e darà all’Italia uma virtuale
egemonia nel teatro musicale europeo.
13
Lo stesso teórico e pedagogo indica altresì il modo di eseguire la messa di voce (cioè a dire attaccare
uma nota piano, riforzarla gradualmente, poi specularmente diminuirla per riportarla al volume iniziale,
senza riprendere fiato), i vari tipi de trillo, le note ribattute, le cadenze, le variazioni e quant’altro formerà
poi il bagaglio técnico dei virtuosi nel secolo dei lumi.
40
pelos compositores. Tartoni afirma ainda, que a ária tripartida, é tomada como base de
caráter heróico, mais escritas sobre tessitura elevada”. (Tartoni Guido, 1995, p. 23).15
Lauro Machado Coelho afirma que a transição do século XVII para o XVIII,
definiu características, que acompanhariam a ópera italiana por muito tempo. Entre elas
atraia pelo virtuosismo vocal, a inserção do obligatto nas árias, se torna presente muitas
vezes. Segundo Machado Coelho, com a ampliação da ária e seu conteúdo embasado
o autor, o canto fiorito exercia o poder de prender a atenção da platéia, porém, segundo
ele, o texto passa a ocupar papel de menos importância na ária. Os conjuntos diminuem,
em função do aumento das árias. Machado Coelho ressalta que as partes orquestrais,
14
Com Scarlatti si va sviluppanjdo l’uso dei passi melismatici e delle invenzioni virtuosistiche, nel canto
e si configura l’aria ttipartita, che sostuisce la bipartita, presentando il da capo variato, e che costituià il
muro maestro del período belcantistico, oltre che in vértice (la grande ária) di ogni opera.
15
Nello stesso compositore, inoltre, si individuano già due tipi di coloratura, vale a dire di agilitá, quella
di grazia a carattere elegíaco e quella di forza, d’impronta epicheggiante, per lo più scritte su tessiture
elevate.
41
interlúdios e introduções, recebem um teor mais forte de elaboração, porém, não são
Na transição do século XVII para o XVIII, o arioso contínuo proposto pela Escola
Florentina sofreu um processo de transformação: dissociou-se em recitativo e ária
nitidamente diferenciados. O recitativo acomodou-se a fórmulas melódicas e
harmônicas restritas; e o acompanhamento, originalmente feito por um cravo ou
pelas cordas. Paralelamente, a ária se ampliou, ganhando melodia com cantábile
expansivo, de muitas vezes acompanhada por instrumento solista obligatto – ou seja,
tornou-se mais brilhante, mas também mais artificial. Com o passar do tempo, como
a ária era o grande atrativo do espetáculo, pois dava ao público a possibilidade de
apreciar as virtudes canoras dos intérpretes, seu número aumentou, e uma proporção
crescente delas passou a ter acompanhamento instrumental mais trabalhado. (Lauro
Machado Coelho, 2000, p. 1677).
XVIII, são consolidadas as principais características, que irão nortear o estilo bel canto
música vocal italiana, até a primeira metade do século XIX. No decorrer do século
fato que caracterizou o século XVIII. A coloratura passa a ser empregada em gêneros
distintos; ora suave, privilegiando apenas a agilidade, e aquelas feitas com força,
informações concluímos, que o cantor nesta época devia ser capaz de executar
bel canto, uma vez, que muitos elementos do estilo fiorito estão contidos nela. Lauro
Machado Coelho cita em seu livro, sobre a ópera barroca italiana, cinco tipos de árias,
através das narrativas do viajante inglês John Brow, em “Suas cartas sobre a ópera
Alberto Pacheco comenta, que Tosi afirmava a existência de três tipos de ária,
no final do século XVII, e início do século XVIII. Estas eram: árias de teatro, de
câmara, e de igreja. Tosi constata que com o passar do tempo, as árias de câmara e de
árias de teatro (árias de ópera), padrão que abrange grande parte do século XVIII.
Tosi (1723:58) afirma que os antigos cantavam árias de três diferentes maneiras:
“para teatro, o estilo era vívido e variado para a câmara, delicado e fino; e para a
igreja, afetuoso e grave. Está diferença é ignorada por muitos modernos’. A última
frase de Tosi revela uma tendência: no decorrer do século XVIII este tipo de
diferenciação foi aos poucos caindo em desuso. (Alberto Pacheco, 2006, p. 266).
para qual foi composta. As diversidades relacionadas ao gênero para qual eram criadas
(teatro, câmara, igreja), não mais determinavam suas características. A partitura por si
Segundo Garcia o estilo fiorito pode ser seccionado em: d’agilità, di maniera, di
grazia, di portamento, di bravura, di forza, di slancio. Garcia ainda diz, que o estilo
declamato pode dividido em sério e bufo. “O canto fiorito pode ser subdividido em
slancio. O estilo declamato pode ser sério e bufo. Esses nomes exprimem a natureza da
estrutura. Hoje em dia este estilo é chamado também de canto ligado, ou seja, sem as
passagens de coloratura e agilidade. No decorrer do século XIX, este estilo foi cada vez
Compositores como Puccini embasaram suas obras neste estilo, que não é ornamentado,
porém, possuí outros méritos tais como: o legato perfeito, igualdade da voz entre outros.
Esse gênero, o mais elevado de todos, mas também o menos picante devido À
as nuances da paixão e sobre a variedade do claro-escuro musical. (...) Este estilo tem
dos timbres; o uso dos sons filados em todas as suas variedades; as mais finas nuances
florido”. Garcia afirma, que o canto florido é voltado às ornamentações, e que este
exige grande flexibilidade do aparelho fonador, pois, segundo ele sua principal
seu ápice no decorrer do século XVIII, vimos anteriormente que seu desenvolvimento
em parte se deve a escola dos castrati. As passagens de agilidade eram muito apreciadas
pelo público. Patrick Barbier relata que este tipo de relação, se estabelecia entre os
interpretes e público, a respeito do estilo florido. “Se essas vozes provocavam tal paixão
no público, é que correspondiam a um gosto muito difundido nos séculos XVII e XVIII
pelos registros agudos, os únicos que permitiam brilhar no canto ornamentado; por isso
(Barbier, 1989, p. 76). Patrick Barbier faz mais citações, que podem contribuir para
pode, evidentemente, falar “da” voz dos castrati; cada um deles possuía “uma” voz,
mais ou menos extensa, colorida, ágil, potente. Uns eram soprani (Cusanino, Cafarelli,
apresentadas em uma mesma obra, ou seja, uma só composição poderá utilizar mais de
uma espécie de fioriture. “Mostra que este estilo se divide em alguns tipos variados.
46
Essas variedades podem vir, às vezes, isoladas, outras vezes, unidas numa mesma
Alberto Pacheco cita considerações de Garcia, a cerca deste tipo de canto que
tem por premissa, a valorização das notas rápidas, e de ornamentos como, escalas
trinados, arpejos, em grande quantidade. Garcia ainda indica, que a voz deve abordar
este estilo com uma emissão leve, ao contrário do canto spianato, sugerindo também
que esta modalidade de canto se adéqua as óperas bufa, e as árias felizes, compostas de
movimentos vivos. Certamente, esta indicação se relaciona com aos estados da alma, de
alegria e satisfação, que se adaptam ao conteúdo musical das árias desta natureza,
Este estilo brilha, sobretudo, pelo movimento rápido das notas. As escalas, os
arpejos, os trilos são abundantes nele. A feitura das passagens deve ser franca, a
execução leve, e a voz medida. Este estilo se adapta perfeitamente a ópera, bufa aos
alegros das árias felizes, aos movimentos vivos dos rondós e variações. (Garcia,
1985, 2ª parte: 68)16
Segundo Alberto Pacheco, Garcia determina este estilo para as vozes leves, que
não possuem grande domínio sobre a agilidade, porém capazes de emitir saltos de
16
Ce style brille surtout par Le mouvement rapide des notes. Les roulades, les arpéges, les trilles y
abondent. La facture des traits doit être franche, l’exécution légère, et la voix ménagée. Ce style s’adapte
parfaitement à l’opéra buffa, aux allegro des airs gais, aux mouvements vifs des rondò, des variations.
47
pianíssimo. Conclui, que as vozes que não possuem domínio da intensidade sobre os
ou sentimental; por isso ele é chamado também de canto di grazia. Somente cantores
consagrados podem ser excelentes neste estilo” (Garcia, 1985, 2ª parte: 68). Portanto,
todos os efeitos exagerados devem se excluídos deste estilo delicado. A voz nas notas
altas e sustentadas deve ser amaciada pelo mais fino e agradável pianíssimo.
canto de câmara descrito por Tosi, são os mesmos do canto de maniera, em virtude da
sua emissão leve, o não uso de excesso de passagens de agilidade. Em suma, Garcia
graça. “Garcia nota que o tipo de canto que Tosi fala para o estilo de câmera deve ser
assim, obtendo um efeito de intensa movimentação, em parceria com uma voz vibrante.
17
Le canto di bravura n’est autre chose que Le canto di agilita, auquel seulement sont venues s’ajouter la
puissance et la passion. L’artiste peut chanter di bravura lorsqu’il possède une voix éclatante e pleine, une
agilite franche e vigourese, de la hardiesse e de la chateur. Dans ce genre, l’élan de la passion se marie à
la plus riche parure Du style ; Le chant de bravoure convient à toute musique brillante et passionée.
48
dificuldade ainda é maior, pelo fato da emissão ser franca e cheia, acompanhada das
vigorosa e intensa, contendo passagens de agilidade, tornando assim, este tipo de ária
intervalos era chamado de canto di slancio por Garcia. Lauro Machado Coelho
denomina este estilo como canto di sbalzo. Na verdade canto di slancio e canto di
sbalzo, são sinônimos, já que ambos admitem a mesma característica que é submeter a
voz a grandes saltos intervalares. “Este canto, quando dominado por grandes intervalos,
é chamado por Garcia de canto di slancio (canto de salto)”. (Alberto Pacheco, 2006, p.
amplos, em que a voz salta de um som muito grave para um muito agudo ou vice-
maioria no caráter silábico, em grande parte não contem vocalizações. Pacheco ainda
afirma, que Garcia adverte, que só devem lançar mão deste estilo aqueles que possuem
49
um aparelho vocal forte, mas que ainda assim, a longevidade desta prática pode
A firma que este estilo dramático é quase sempre silábico, excluindo quase toda
vocalização. Diz ainda que apesar deste estilo ter recursos nos acentos musicais, seu
principal efeito está no acento dramático. Portanto a arte de cantor deve dominar a
de cantor. No entanto, aconselha o cantor a ter cuidado, aproximar-se deste estilo
somente com moderação e reserva, pois ele exaure rapidamente os recursos da voz.
Chega a dizer que somente o cantor cuja constituição é forte, mas que, através de
uma longa prática de sua arte, perdeu o frescor e a flexibilidade da voz, pode adotar
estilo. Assim sendo, seu uso é reservado para o período final de sua carreira.
(Alberto Pacheco, 2006, p. 271).
É provável, que Garcia considere este prática danosa, pelo fato desta exigir uma
emissão intensa e vigorosa, pelo seu caráter dramático. Em curto prazo, o uso abusivo
do aparelho vocal através de uma emissão heróica (embasada nos sons e vigorosos),
Embora seja este estilo monossilábico não representa um perigo eminente para
voz, pois sua característica está ligada a capacidade do cantor em pronunciar as palavras
Logo, podemos concluir que é a articulação, um dos elementos chave deste estilo, aliada
a uma emissão mais flexível da voz, sem exigir do cantor grande esforço, em relação ao
aparelho fonador. Lauro Machado Coelho denomina este estilo de “silabato”. “Garcia
considera este estilo falado como a alma da ópera cômica. Ele seria monossilábico como
o precedente, mas de caráter completamente oposto. Requer que as palavras sigam uma
ou outra muito rapidamente e com perfeita clareza”. (Alberto Pacheco, 2006, p. 272).
50
monossilábico, com declamação velocíssima do texto, que exige do cantor muita clareza
recursos técnicos vocais, pois, era o momento no qual a voz se encontrava sem o
De um modo geral, pode-se dizer que eram dois os procedimentos mais comuns; a coloratura,
com que se embelezava uma determinada linha melódica, e a cadência, com que se ornamentava
– às vezes profundamente – os finais de frase. A coloratura, herdada do Renascimento, ganhou
importância crescente à medida que a ária se desenvolvia e, na época das grandes escolas
setecentistas de canto, chegou a seu apogeu, conservando por muito tempo esse brilho: suas
últimas grandes manifestações datam do início do Romantismo, na primeira metade do século
XIX. (Machado Coelho, 2.000, p. 189).
18
Termo inglês para uma canção cômica em que o humor deriva de se ter o maior número de palavras
emitidas no menor tempo possível. Essa tradição, que começa com A. Scarlatti, foi extensamente
cultivada pelos compositores de opera buffa do final do séc.XVIII, depois por Rossini (especialmente em
seus concertatos de confusão). (Dionário Grove de música edição concisa, 1994, p. 706)
51
Podemos concluir então, que as árias de ópera italiana do século XVIII, eram
eram o momento reservado para uma séria de demonstrações virtuosísticas, com a voz
uma melodia vocal; também chamada de canto figurato....” (Machado Coelho, 2.000,
também chamada de coloratura”. Com base nestas afirmações, podemos concluir, que o
Embora existisse uma liberdade por parte dos cantores na execução da cadência,
existiam regras estabelecidas, para a sua realização. Alberto Pacheco cita considerações
de Tosi, em relação aos cuidados, que deviam ser tomados pelos cantores, na realização
das cadências. Segundo Tosi, existem dois tipos de cadências nas terminações das árias.
“No oitavo capítulo de seu tratado, Tosi afirma que as cadências finais das árias são de
dois tipos: a superior (mi, ré, dó) e a inferior (dó, si, dó)”: (Alberto Pacheco, 2006,
p.251).
52
cuidados a serem tomados em relação a que tipo de cadência executar no final de uma
ária. Tosi alerta o cantor, para o fato de na cadência não estar sozinho, ou seja, estar
acompanhado de por vozes, instrumentos (incluindo o baixo contínuo). Neste caso, deve
acordo com a sua adequação em relação à harmonia das vozes, orquestra, ou contínuo.
cadências. Segundo Tosi, o interprete deve variar suas cadências, a fim de não entediar
na criatividade e bom gosto de sua arte. Além de considerar a repetição das cadências,
um fator de insucesso de um cantor, Tosi questionava a falta de exortação, por parte dos
E não será, talvez, o pior de todos os defeitos, atormentar os ouvintes com milhares
de cadências todas feitas da mesma maneira? De onde procede esta seca esterilidade,
se é sabido por todo professor que, para ser estimado cantando, o meio mais eficaz é
a fertilidade das retomadas? (Tosi, 1723: 86)19
indicar o final da ária, sendo assim, a ela deveria o cantor atribuir uma resolução
(cadência), que é a finalização de uma parte solo. “Apesar de toda sua austeridade no
19
E non sara forse peggior d’ogni difetto Il tormentare gli ascoltani com Mille cadenze tutte fatte a um
modo? Da Che procede questa secca sterilitá, se ad ogni professore è noto, Che per farsi stimar cantando
Il mezzo più efficace è la fertilità de ripieghi?
53
que diz respeito, à execução das cadências, Tosi admite, uma liberdade moderada ao
cadências das árias sacras e das árias de ópera. Tosi lamenta a falta de critério dos
cantores, ao realizarem uma cadência sacra, no mesmo estilo de ária operística. Alberto
Pacheco deduz que o mestre de canto (Tosi), provavelmente não fosse favorável a febre
dos castrati, que dominou o canto italiano no século XVIII. Os castrati com seus
positivamente por Tosi. Para a música sacra, certamente a cadência deveria conter
pois no conceito de Tosi, as árias de igreja deveriam ser mais sóbrias, ou seja, mas
Tosi segue dizendo que além do estilo moderno ter transformado todas as cadências
no teatro num terrível movimento perpétuo, condenou ao mesmo fim as cadências
das cantatas e dos recitativos e conclui que os cantores não sabem mais diferenciar a
música de câmara da teatral. Com essa conclusão, podemos ver que Tosi notou uma
tendência musical do século XVII: a diferenciação cada vez menor entre esses
gêneros musicais. (Alberto Pacheco, 2006, p. 258).
20
Se frà tutte le cadenze dell’ Arie l’ ultima concede qualche moderato arbítrio a chi canta, acció conosca
il fine delle medesime l’ abuso è soffribile, ma si cangia in abbonminevole, quando um cantore si mette di
pie fermlo co’ suoi nojosi gargarismi a nausear gl’ intelligenti, Che tanto più penano, quanto piú sanno,
che i compositori lasciano ordinariamente in ongni cadenza finale qualche nota, che basta ad um
ornamento discreto, senza cercarlo fuor di tempo, senza gusto, senz’ arte e senza intendimento.
54
das muitas ornamentações, e passagens de agilidade nas cadências e recitativos das árias
ornamentação no teatro, motivo da adoção do mesmo estilo nas árias sacras, provocando
música sacra no decorrer do século XVIII, cada vez mais adota elementos da ópera,
como forma de linguagem, textos sacros com uma linguagem musical calcada na ópera.
No início do século XIX, o Brasil também começa a utilizar uma linguagem musical da
ópera italiana, na sua música sacra. A vinda de Dom João e de músicos com formação
deste estilo, em especial na cidade do Rio de Janeiro, local onde a família real se
instalou.
Percebe-se muito claramente, nas citações acima, que Tosi era totalmente contrário
À ornamentação profusa que se tornaria moda entre os castrati italianos. As
recomendações austeras de Tosi não foram capazes de deter o avanço do
virtuosismo vocal. Ao ouvir cantores como Farinelli, ele certamente teria
desaprovado profundamente o maneirismo do Rococó, ficando mais em acordo com
os estilos pré-clássicos. (Alberto Pacheco, 2006, p. 258).
A relação intensa dos castrati com a música vocal do século XVIII, também é
refletida no Brasil, através da vinda dos cantores da Capela Real de Lisboa. Com esses
em uma partitura. O Grove informa que a ornamentação sempre foi utilizada, ao longo
das diversas fazes da música ocidental, porém, afirma que ocupou posição de evidencia,
sugerem, que a ornamentação não surgiu a partir do século XVI, mas, no decorrer deste
começou a ocupar uma posição de maior evidencia. Nos séculos que se seguem XVII e
XVIII, torna-se elemento típico nas composições, tanto instrumental como nas vocais.
notas isoladas em uma obra), ou, as passagi (na qual a ornamentação é utilizada em uma
obra já existente).
objetivo deste estudo, está voltado para a proliferação do estilo bel canto no Brasil. Os
canto.
4.2. Apojatura
Alberto Pacheco comenta que Tosi, o mais antigo dos três professores de canto
abordado acima, não realiza definições a respeito da apojatura, porém, Galliard que faz
(...) é uma nota adicionada pelo cantor, a fim de chegar à nota subseqüente com mais
elegância, tanto subindo quanto descendo (...) A palavra appoggiatura é derivada de
appogiare, apoiar. Neste sentido, você se apóia na primeira (nota) para chegar à nota
desejada, subindo ou descendo; e permanece mais tempo naquela de preparação do que na
nota para a qual foi feira a preparação, e de acordo com o valor da nota (principal). O mesmo
se aplica à preparação de um shake (trilo), ou beat (grupeto) inferior. Nenhuma apojatura
pode ser feita no começo de uma peça. (nota de Galliard em Tosi, 1743: 31)21
melódica, segundo sua explicação, a apojatura atua atenuando o salto intervalar entre
uma nota e outra, que seja ascendente ou descendente. A elegância referida por Galliard
21
[...] its a note added by the singer, for the arriving more gracefully to the following note, ether in rising
or falling, [...] The word appoggiatura is derived from appogiare, to lean on. In this sense, you lean on the
first to arrive at the note intended, rising or falling; and you dwell longer on the preparation, than the note
for which the preparation is mad, and according to the of the note. The same in a preparation to a shake,
or a beat from the note below. No appoggiatura can be at the beginning of a piece.
57
intervalares menos bruscos, como, por exemplo, no canto de sbalzo, que tem por
canto. Podemos concluir que, a apojatura possui uma função de tornar os saltos menos
bruscos, obtendo assim maior suavidade, em oposição ao canto de sbalzo, que preza os
musical.
(1723: 19-23) e afirma que ela é o ornamento mais fácil de ensinar, e também de
aprender, podendo ser ouvida sempre sem cansaço, desde que dentro dos limites do bom
ornamento, pois este confere a melodia, um aspecto mais suave e terno. “Mancini indica
a apojatura em palavras e músicas que não sejam de grande paixão e raiva, mas sim
naquelas que expressam sentimentos líricos e suaves:” (Alberto Pacheco, 2006, p.169).
Com tudo isso, o estudante deve tomar cuidado de servir-se da apojatura somente
nas cantilenas e nas expressões convenientes, já que este embelezamento também
não pode ser posto em todo lugar (...) Para provar que eu digo a verdade, basta ir a
um teatro para ouvir que um cantor ou cantora, por exemplo, em uma ária de
invectiva, cantando no maior fervor da ação, acompanha com a sua sensível
apojatura todas as palavras de tirano, crudele, Spietato, e símiles, e atrapalha assim
o bom andar da exclamação; como demonstrarei alhures. A regra que dei, de não
exagerar na apojatura, não é geral, mas se restringe somente ao canto sério. Se quem
canta o bufo a exagera, não comete erro e conquista aplausos; (Mancini, 1723: 98)22
22
Com tuttociò avverta bene lo sclare di non servirsene Che nelle cantilene, hanno luogo dar per tutto:
[...] Che io dica il vero, basta andare in teatro per sentire, Che um cantantte, uma cantatrice, per ragions
d’esempio, in um ária d’invectiva, cantando nel maggior fervore dell’azione, accompagna com la sua
sensibile appoggiatura tute le parole di tiranno, Crudele, Spietato, e simili, e guasta cosi il buon ordine
della esclamazione; como lo dimostrerò altrove. La regola, Che ho data, di non doversi caricare
l’appoggiatura, non è generale, ma si ristringe solo al canto serio. Se la carica chi canta nel busso, non
solamente non commette errore, ma ne ricava appaluso.
58
parecidas não devem ser executadas com este ornamento, porém, as árias afetuosas de
considerado em relação ao tipo de ornamentação a ser escolhida para a ária. “Fica bem
claro que, para Mancini, o uso da apojatura depende do estilo da música a ser
criar uma dissonância na harmonia e resolve-se por grau conjunto sobre a nota principal,
Segundo Alberto Pacheco, Garcia e Tosi admitem que, a apojatura possa ser
que considera a inserção deste ornamento sempre em grau conjunto. “Da mesma forma
que Tosi, Garcia considera a apojatura dentre todos os ornamentos do canto, o mais fácil
de executar e, além disso, o mais freqüente e o mais necessário, podendo ser usado com
A apojatura, como o nome italiano o exprime, é uma nota sobre a qual a voz se
apóia. Esta nota é geralmente estranha à harmonia; ela precede e serve para atacar
uma das notas reais do acorde. Ela pode ser superior ou inferior; se for superior, é
tomada da maneira que é pedida pela escala seja a um tom (1), seja a um semitom de
distância (2); se for inferior, é feita quase sempre de um semitom. (3) (Garcia, 1985,
1ª parte: 66)23
23
L’appogiature, ainsi que le nom italien l’exprime, est une note sur laquelle appule la voix. Cette note
est généralemnt ètrangère à l’hamonie; elle precede e ser à attaquer une des notes réalles de l’accord. Elle
peut être supérieure ou infèrieure; si elle est supérteure, on a prend telle que la donne la gamme, soit à um
59
4.3. Grupeto
o grupeto não deve ser mais extenso que uma terça menor:” (Alberto Pacheco, 2006, p.
174).
pequeno grupo de notas precedidas de uma nota real principal, sendo assim, sua
Garcia afirma que o grupeto deve ser feito com um sforzando sobre a primeira das
três notas que o compõem. Para conseguir uma boa entoação aconselha, a princípio,
estudá-lo lentamente, aumentando a velocidade somente mais tarde. Diz também
que o grupeto pode ocupar três diferentes posições em relação à nota que ele
ornamenta: (Alberto Pacheco, 2006, p. 174).
1º) Pode ser colocado no início da nota principal, quer dizer no início do valor da
nota.
2º) Pode ser colocado no meio da duração da nota principal, ou seja, a nota principal
será atacada e no meio da sua duração se executará o mordente.
3º) Pode terminar a nota principal
Alberto Pacheco expõe que, Garcia sugere a execução do grupeto com agilidade,
porém adverte que Garcia recomenda que este seja executado no início lentamente. É
ton (1), soit à um demi-ton de distance (2) ; si elle est inférieure, on la fait presque toujours d’um demi-
ton (3).
60
controle da intensidade vocal, que deve ser empregada durante a execução deste
ornamento, uma vez, que o sforzando deve ser empregado apenas na primeira das notas
que o constitui.
4.4.Trilo
O Grove dicionário edição concisa define o trilo como ornamento tremolo vocal,
utilizado pela música italiana no início do século XVII. Esta explicação do Grove
termo trilo está ligado diretamente a musica vocal, que é caracterizado por um tremolo.
Outro fato importante é a ligação do trilo com a música italiana do início do século
italiana do início do séc. XVII”. (Grove dicionário edição concisa, 1994, p. 960).
Embora o Grove edição concisa afirme que, o trilo foi usado particularmente no
início do século XVII, sabe-se, que este ornamento permaneceu sendo utilizado no
decorrer de todo o século XVII, e não só no início deste, atravessando todo o século
dificuldades técnicas por parte dos cantores. O trilo está relacionado à agilidade vocal,
um dom nato do artista (cantor), que pode ser melhorado com o treinamento, porém
jamais adquirido. Pacheco observa que o pensamento de Sally Sanford, faz parte da
crença dos mestres do século XVII e XVIII. Segundo Sally Sanford (1979: 51), “(...)
muitos autores do século XVII e XVIII que escreveram sobre canto, consideravam a
61
agilidade vocal um dom da natureza, uma qualidade que pode ser desenvolvida e
refinada pelo treino, mas não adquirida. Tosi parece estar de acordo com isso ao
incapacidade de realizar este ornamento, tornaria o cantor inapto a exercer a própria arte
de cantar. “Tosi recomenda muita calma e aplicação no estudo do trilo. Segundo ele. O
trilo é necessário ao canto, pois um cantor pode delatar para o público a esterilidade de
trillo. “Tosi (1723, p. 25) recomenda ao mestre que ensine o trillo “através de exemplos
(regular), marcado, que são suas qualidades mais belas”. (Alberto Pacheco, 2006, p.
209).
Três elementos são citados por Alberto Pacheco, como elementares por Tosi,
para que o aluno domine a execução do trilo. Igualdade, articulação definida, e uma
agilidade espontânea e moderada. Pacheco cita que, Tosi considerava existentes oito
tipos de trilos diferentes. Nesta pesquisa, não irei abordar os oito tipos de trillos
considerados por Tosi, mas, aqueles mais usados, objetivando assim a melhor
1. Trilo maior
(...) que se faz conhecer pelo movimento violento de dois tons (inteiros) vizinhos, um dos
quais recebe o nome de principal, porque ele ocupa com maior propriedade o lugar da nota
que o pede; o outro, apesar de que, com o seu movimento, possua o lugar da voz superior, não
faz outra figura que a de auxiliar (Tosi, 1723: 25)24
(notas vizinhas), com o intervalo de um tom. O nome de trillo maior deve estar
relacionado ao fato da articulação das duas notas se dar em tom, e não em semitom
2. Trilo menor
conjunto (notas vizinhas), separadas pela distancia de um semitom. (...) “é composto por
trilo, o que ele chama de preparação. Embora, não seja muito específico em relação aos
elementos que compõem essa preparação, Alberto Pacheco afirma que, essa preparação
era constituída de uma apojatura, que antecedia o trilo. É possível, que esta apojatura
antes do trilo tenha a função de preparação, ou seja, uma espécie de anúncio de que será
executado o ornamento. “Tosi não específica como seria essa preparação, mas, de
acordo com Agricola (1995: 135), tratava-se de uma apojatura preparatória incluída
24
[...] Che riconoscere il suo essere dal moto violento di due tuoni vicini uno de’ quali merita il nome di
principale, prechè occupa com più padronanza il sito della notta, Che li chiede; l’altro poi ancorchè col
sua movimento possegga il luogo della voce superiore, nullandimeno nom vi fa altra figura, Che di
ausiliário.
63
O trillo para ser belo, deve ser preparado, apesar de que nem sempre exija sua preparação, já
que às vezes isso não é permitido nem pelo tempo nem pelo (bom) gosto; isso é necessário em
quase todas as cadências finais, e em diversos outros lugares apropriados, ora no tom ou ora
no semitom acima de sua nota (principal) de acordo com a natureza da composição. (Tosi,
1723: 28)25
canto, este deve ser executada quando houver tempo suficiente, que permita a inserção
concordando com Tosi em vários aspectos, em relação a este ornamento. “Mancini, por
sua vez, também dedica um capítulo inteiro do seu tratado ao trilo e ao mordente e
Entre as qualidades mais necessárias, e entre os belos ornamentos da arte, dos quais
um cantor de estar fornido, não há, em minha opinião, qualidade mais interessante,
nem ornamento mais doce de que aquele que na música chamam vulgarmente de
trilo. Este faz com que o canto produza aos ouvidos e à alma dos ouvintes o
crescimento e o auge da ternura, do prazer, e do amor. Tenha um cantor bela voz,
tenha execução fácil, e tenha ainda bom gosto; não obstante o seu canto, se não for
unido à doce graça do trilo, será sempre imperfeito, árido, e duro. (Mancini, 1774:
108).
indispensável ao cantor, e que dele é possível tirar um excelente efeito, desde que sua
Alberto Pacheco afirma também que, Mancini considerava o trilo essencial, para
uma cadência realizada com perfeição. A messa di voce é também citada pelo professor
de canto Mancini como, elemento vital em uma cadência, logo, é possível concluirmos
que, tanto trilo como messa di você, eram requisitados pelos compositores e cantores da
25
Il trillo per sua bellezza vuol esser preparato, però nom sempre esige la sua preparazione, poichè alle
volte non glie la permetterebbe nè il tempo, nè il gusto; la chiede bem si quase in tutte le cadenze
terminate e in deversi alttri siti congrui or sul tuono, ora sul semituono più alto della sua nota seconda la
qualitá del componimento.
64
época. “Mancini chega a dizer que para uma cadência ser perfeita bastam duas coisas: a
Garcia é dos três mestres de canto, o que aborda o trilo em um aspecto mais
profundo, em relação à fisiologia, tendo ele vivido no século XIX e início do século
“Garcia faz várias considerações sobre a maneira correta de executar o trilo. Segundo
ele, o trilo não é o resultado de duas notas batidas uma depois da outra e aceleradas até a
Alberto Pacheco, em seu livro sobre o canto antigo italiano, fornecendo assim, uma
linguagem didática.
O trilo é somente uma oscilação regular da laringe de baixo para cima, e vice-versa,
que recebe a laringe. Esta oscilação convulsiva tem origem na faringe devido a uma
oscilação análoga dos músculos deste órgão. Os velhos, cuja vos é trêmula,
oferecem o exemplo do trilo involuntário. Neles o trilo é irregular por fraqueza; nos
sujeitos mais jovens, ele deve tornar-se regular através da flexibilidade. Nós vamos
nos ater ao fato mecânico que dará como resultado o fato acústico. Convém
imprimir a laringe um movimento oscilatório regular para cima e para baixo; este
movimento, parecido àquele do pistão movendo-se no corpo de uma bomba, se
opera na faringe que serve de envelope à laringe. Nuca será demais liberar a faringe
para que o encurtar e o alongar dos músculos depressores e elevadores operem com
desembaraço e rapidez. Será possível se formar uma idéia aproximada de tal
operação, quando, mantendo aberta a boca, for executado rápida e seguidamente o
movimento de deglutição; neste caso, a base da língua tem uma função principal. No
trilo, o ponto de ação é situado em outro lugar, e a língua cede ao balanço que lhe é
transmitido. Estes movimentos, sensíveis ao tato, são mais ou menos visíveis
externamente, proporcionando à boa compleição do pescoço.26
26
Le trille n’ est qu’ une oscillation régulière de bas en haut, et vice versa, que reçoit le larynx. Cette
oscillation convulsive prend naissance dans le pharynx par une oscillation toute parelle des muscles de cet
organe. Lês vieillards dont la voix est vacillante nous offrent l’ exemple d’ um trille involontaire. Chez
eux le trille est irrégulier par faiblesse; chez le sujets plus jeunes, il doit devenir régulier par flexibilité.
Nous allons nous attacher ou fait mécanique qui nous donnera pour résultat le fait acoustique. Il faut
imprimer au larynx un mouvevement oscillatoire régulier de haut en bas; ce movement, pareil à celui du
piston jouant dans le corps de pompe, s’ opera dans le prarynx qui sert ou larynx d’ envelope. On ne l’
allongement des muscles abaisseurs et élévateurs s’ opèrent avec aisance et rapidité. On aura une idée
approximative de cette ouverte, le movement de la deglutition; dans ce cas, la base de la langue remplit la
function principale. Dans le trille, le point d’ action es place ailleurs, e la langue cede à l’ ébranlement qui
lui estransmis. Ces ouvements appréciables ou toucher, s’ annouincent plus ou moins à l´extérieur, en
proportion de l´embonpoint du cou.
65
fisiologia, é possível através desta explicação perceber que, este professor possuía uma
da laringe no trilo e a mobilidade de sua musculatura, a fim, de que o efeito a ser obtido
forem iguais e livres tanto mais justa resultará a distancia dos sons”. (Garcia, 1985, 1ª
parte: 70)27
Isto consiste de uma nota repetida muitas vezes, e das quatro primeiras tem que
ser um pouco mais aguda que as outras, apesar de todas serem escritas na mesma linha
extraordinariamente ágil (...) A entoação tem que ser perfeita, de tal forma que a
27
Le rossignols offrent um exemple frappant du phénomène que nous venos de décrire.
Plus ces mouvements réguliers sont égaux et libres, plus la distance des sons est juste.
66
ligeiramente distintos entre si. Outro fato relevante a ser mencionado é, que esta
Neste caso, Garcia afirma que os sons são atacados separadamente, com um
golpe de glote, de modo a separá-los uns dos outros. Quando não são abandonados
imediatamente, e ainda se confere a eles uma ligeira inflexão, que lhes prolonga a
4.7. Arpejo
obtendo um efeito sonoro, semelhante aos arpejos de uma harpa. Alberto Pacheco
menciona este tipo de vocalização, através de considerações feitas por Mancini, acerca
Pacheco, 2006, p. 246). “assim chamado por que, numa tal combinação de notas, com
28
So called because such a combination of tones, one chord following another, is often performed on the
harp, and thus the name, “Arpeggiato”.
67
Lauro Machado Coelho em seu livro sobre a “ópera barroca italiana”, defini a
nota; Caccini a menciona pela primeira vez, em 1602, no prefácio às suas Nuove
Musiche, como importante para demonstrar o controle técnico de que o cantor dispõe; o
termo francês son filé refere-se apenas ao recurso de diminuição”. (Lauro Machado
Alberto Pacheco revela que, Tosi logo no primeiro capítulo de seu tratado cita a
messa di voce, sua importância e sua utilização. “Logo no primeiro capítulo de seu
tratado Tosi define a messa di voce, explicando seus usos e sua importância no canto”:
(...) ensine (ao estudante) a arte da messa di voce, que consiste em deixar a voz crescer
docemente do piano mais suave, até que, pouco a pouco, alcance o forte mais intenso, e,
então, retornar, como a mesma arte, do forte para o piano(...) que a use com economia e se
sirva dela sobre as vogais abertas, nunca falha em conseguir bom efeito....” (Tosi, 1723,:
17)29
Note-se, que a definição dada por Lauro Machado Coelho e de Tosi, em relação
a messa di voce são divergentes. Lauro Machado Coelho definiu a messa di voce como,
determina que, a realização da messa di voce consiste em fazer o som crescer pouco a
pouco do piano em direção ao forte mais intenso, até ao piano com a mesma gradação.
29
[...] gl’insegni l’arte di metter la voce, Che consiste nel lasciaria uscir dolcemente dal minor piano,
affinche vada a poço a poço al píù gran forte, e che pocia ritorni col medessimo artifício dal forte al
piano(...) che ne sai avaro, e non se ne serva, che su le vocali aperte non manca mai di fare um’otimo
effeto.
68
Ordinariamente, esta messa di voce deve ser usada no princípio de uma ária, e em uma nota
com fermata; e finalmente é necessário em preparar uma cadência, mas um verdadeiro e
ótimo professor serve-se dela em qualquer nota de valor, que se encontre também espalhada
em qualquer nota de valo, que se encontre também espalhada em qualquer cantilena musical.
(Mancini, 1774: 100)30
Garcia, em acordo com a definição dada por Lauro Machado Coelho, cita
também a existência, de sons filés. “Garcia define esses sons como em uma série sem
Pode-se dispor destas inflexões de diferentes maneiras: elas podem ser de duração e força
iguais; podem seguir uma progressão crescente ou decrescente etc. Os grandes cantores as
empregam mais familiarmente na disposição seguinte: eles primeiramente fazem uma messa
di voce, com um terço da respiração, num som sustentado; depois este som é seguido de um
outro menos forte e menos longo, depois vem enfim uma longa sucessão de ecos cada vez
mais fracos e próximos entre si, dos quais o último é dificilmente ouvido. É necessário que a
garganta diminua e se dilate com toda liberdade a cada inflexão. (Garcia, 1ª parte: 64)31
aplicada a messa di voce, bem como, a dificuldade de sua execução. Garcia sugere a,
messa di voce seguida de sons interrompidos, aos quais ele chama de eco. Garcia
determina que o eco deva ser feito flautado, e que para obter êxito na sua execução é
necessário aumentar todo o arco de dentro32. O arco de dentro citado por Garcia nada
mais é que a expansão do véu palatino que também podemos chamar de estiramento
30
Ordinariamente questa messa di voce deve porsi in uso nel princípio d’um Ária, Ed in uma nota
coronata; e similmente è necessária nel preparare uma cadenza: ma un vero, ed ottimo professore se ne
serve in qualunque nota di valore, che trovi anche sparsa in qualunque musical cantilena.
31
On peut disposer ces inflexions de différentes manières: elles peuvent être de dure e de force égales;
elles peuvent suivre une progression croisante ou décoissante, etc. Les grands chanteurs le emploient le
plu famileèrement dans la disposition suivante: ils filent, d’abord, avec le tiers de la resíration, un son
soutenu; puis vient enfin une longue sucession d’échos de plus en plus affabilis et rapprochés, don’t le
dernier arrive à peine jusqu’à l’oreille. Il fout que le goisier se resserre et se dilate avec souplesse à
chaque inflexion
32
(Nota de Garcia) Velluti se exprime assim: L’eco si fa flautado e per riuscirlo si ingrandisce tutto l’ardo
di dentro. (O eco se faz flautado, e que para conseguí-lo se aumenta todo o arco de dentro). (Garcia, 1985,
1ª parte, 64).
69
A Missa de Santa Cecília 1826, pode ser considerada, uma das grandes obras do
compositor carioca, padre José Maurício Nunes Garcia, por suas dimensões e
Brasil do início do século XIX. Segundo Cleofe Person de Mattos, o padre José
Maurício, já conhecia o estilo fiorito italiano dos séculos XVII e XVIII. A pesquisadora
Capela Real de Lisboa. Mattos sugere ainda, que José Mauricio antes da chegada da
Mattos relata que o Rio de Janeiro, era uma cidade que alcançara uma posição
Podemos concluir, que o Rio de Janeiro era uma cidade de atividades artísticas
comemorações realizadas no decorrer do ano. Outro fato curioso, é que estas festas
serviam também para aferir, o nível das atividades musicais da cidade. Mesmo após a
canto no Brasil, tem vulto no âmbito religioso, ao contrário da Itália, e de muitos países
como até mesmo Portugal, que divide o estilo fiorito entre os teatros de ópera e as
possuía uma antiga tradição musical, que remonta desde a Idade Média.
português logo se interessa, por seus mestres, interpretes e estilo. “Nós sabemos, por
exemplo, que a família Real portuguesa que chegou a nós através dos Orleans e
Bragança, é uma família de fortes tradições musicais, que vem indiretamente desde a
Idade Média”. Neves cita também a criação de uma escola de música em Vila Viçosa, e
também uma schola cantorum, que chegou a formar e exportar cantores, para Espanha,
obrigação de compor para Lisboa uma ópera séria e uma cômica por ano, além de
música sem acompanhamento para a Capela Real”. (Cardoso, 2008, p. 32). O estilo
os dois países no âmbito musical. Jovens músicos iam estudar em Nápoles, e músicos
72
assim uma grande absorção dos elementos da Escola Napolitana na corte portuguesa.
músicos que atuavam nos teatros, eram os mesmos que atuavam na igreja. Este fato
musical similar, ao realizado nos teatros de ópera. Por esta razão, a música sacra
o modelo do barroco eclesiástico romano cultivado nos anos de reinado de d. João V”.
século XVII, que predominou por todo o século XVIII, resistindo até as primeiras
compreensível a adesão a estes elementos, que eram muito expressivos na música vocal
estabelecimento dos castrati em Portugal. Pacheco cita que D. José nutria paixão pela
música, afirmando, que o rei era conhecedor esclarecido nesta arte. Os teatros da Ajuda
atuavam no teatro e na Capela Real. Estes relatos, nos servem como parâmetro do nível
musical, a que foi submetida a cidade do Rio de Janeiro, após a vinda de D. João, não só
73
nos teatros da cidade, mas também na Capela Real. Pacheco constata que a permanência
dos castrati, no topo da preferência portuguesa, estende-se até o reinado de D. João VI.
Durante todo o século XVIII, inclusive, os papéis femininos eram desempenhados por
partir das últimas décadas do século XVII, e por todo o século XVIII, ocorreu em
brilhar no teatro São Carlos, foram os castrati. Continua dizendo, que cantoras como
Angélica Catalani, atuaram em Portugal somente a partir de 1801, graças uma lei de D.
palcos. (Nery; Castro apud Pacheco, 2007, p. 22). De acordo com Pacheco, após a
de Portuga,l por dois motivos de relevância: tradição e por seu alto nível de capacidade
vocal. Pacheco conclui, que o estabelecimento dos castrati em Portugal, gera a absorção
do estilo fiorito na música vocal clássica portuguesa do século XVIII. “Com esta
rico em ornamentação”. (Pacheco, 2007, p. 23). Pacheco afirma, que as linhas vocais
exemplo, Marcos Portugal e João de Sousa Carvalho. (Pacheco, 2007, p. 23). Mais
importante em nossa pesquisa é Marcos Portugal, pelo fato de ter atuado no Brasil, na
viveu na Itália entre 1792 -1800, período de efervescência da Escola Napolitana. Lauro
Machado Coelho cita, um pequeno trecho das cartas de Rossini, no qual o compositor
Portogallo, que fazia grande sucesso. Eu tinha treze anos”(...). (Coelho Machado, 2003,
p. 295).
relações estreitas, com a Escola Napolitana, da qual o estilo bel canto se deriva. A
relação do Brasil com o estilo bel canto, está vinculada também a figura de Marcos
puderam observar com proximidade, o estilo bel canto, que era muito apreciado por D.
João e sua corte. A figura do padre José Maurício como um dos mais importantes
religiosas da Sé. O cargo de mestre de capela exigia do padre José Maurício, a adoção
de um estilo mais voltado, ao gosto do príncipe regente, e seus súditos. Vale a pena
lembrar que ao estilo fiorito, também estavam habituados os cantores e músicos, que
rumou para Nápoles, onde estudou com Cimarosa. Leandro Santana diz, que Marcos
Portugal compôs várias óperas no período em que permaneceu na Itália, afirmando que
Berço do bel canto, a Itália, no final do século XVIII, já possuía toda uma tradição
da produção e da performance operística. Domenico Scarlatti (1685 – 1757),
Antônio Caldara (1670 – 1736), Domenico Cimarosa (1749 – 1801), Luigi
Cherubini (1760 1842) e Gasparo Spotini (1774 – 1851) são alguns dois nomes que
contribuíram para o pleno amadurecimento do gênero na Itália. Muitos deles,
inclusive chamavam a atenção de músicos e compositores de outros países europeus,
dentre eles, destacamos a presença do Músico português Marcos Portugal (1762 -
1830), que passou a período de 1782 – 1800 em Nápoles, centro das atenções
operísticas da Europa produzindo óperas italianas, sérias e bufas. Nesta época, teve a
oportunidade de estudar e travar amizade com Cimarosa, de quem recebeu profunda
influência no gosto italianizante de composição. (Gregório Santana, dos castrati à
missa vocal dos séculos XVIII – XIX N..., p. 1,2).
qual a Escola Napolitana se apoiara. Marcos Portugal foi apenas um dos compositores a
absorver e adotar o estilo fiorito italiano, como base das suas composições sacras e
operísticas.
Portugal, fato que reafirma ainda mais, a tese de que a Escola Napolitana não era um
estilo estranho ao padre mestre. A chegada de Marcos Portugal, provavelmente deve ter
contribuído, para que José Maurício vivenciasse na Capela Real, o estilo até então
conhecido apenas através dos registros das partituras, e das montagens de óperas
Real.
através dos músicos vindos de Portugal. (Mattos, 1997, p. 95, 96). O estilo bel canto
(1728-1800) são, alguns dos compositores italianos, também incluídos nesta lista. É
provável, que José Maurício tenha conhecido obras destes compositores ainda na
juventude, através do acervo de Salvador José que foi seu professor. (Cardoso, 2008, p.
71 e 72).
compôs uma ópera após sua chegada ao Brasil. Todas as óperas de sua autoria montadas
no Brasil, não eram inéditas. Sua obra criada no Brasil era no gênero sacro, aos moldes
77
do estilo bel canto. A Capela Real era uma espécie de cartão de visitas, das condições
artísticas musicais da capital da colônia. Foi nela que José Maurício, compositor
carioca, que jamais saiu da cidade, teve a oportunidade de absorver e assimilar com
castrati, que eram inéditos no solo brasileiro, até então. José Maurício compôs no estilo
fiorito para a Capela Real, logo, a manifestação do estilo bel canto no Brasil está
mestre. Cleofe Person de Mattos cita, o fato de Marcos Portugal jamais ter composto
Fasciotti ao Rio de Janeiro, foi o auge em relação ao nível excelente, dos músicos e
Marcos Portugal jamais compôs ópera inédita para o teatro da cidade onde viveu
tantos anos. Não teria suficiente apreço pela cidade, pelo teatro, nem pelo público
presente aos espetáculos do Real teatro, embora dele participasse seu augusto
protetor D. João VI. Assim chegaram os Piacentini (Fabrício e Elisa), Nicola
Majoranini, Isabel Ricciolini, Madame Taussaint, Paulo Rosquelas (violinista,
concertista, compositor), Miguel Caccani, Salvador Salvatori; culminaria com a
vinda de Gianfrancesco Fascietti, o mais credenciado entre os castrati que vieram
para o Brasil. ((Mattos, 1997, p. 250).
É possível que, Marcos Portugal não tenha escrito ópera no Rio de Janeiro, em
Talvez, o seu grande número de óperas consagradas, tenha feito com que o compositor
julgasse, não ser mais necessário legitimar-se nas óperas, apenas montando na cidade
Janeiro.
havia elaborado, um estilo próprio de composição, que não era o mesmo adotado pelos
mineiro na obra de José Maurício, porém, com elementos próprios. Mattos conclui, que
o padre mestre utilizava a herança dos compositores das Gerais, porém, acoplada a
Segundo Mattos, o fato de D. João ter criado a Capela Real aos moldes da
Capela Real de Lisboa, contribuiu para que José Mauricio utilizasse, com mais
assimilou, o novo perfil estilístico. É fato, que José Mauricio de imediato utiliza os
ao novo estilo.
79
âmbito musical, estavam alicerçadas na Escola Napolitana, a qual o estilo bel canto
pertence. Logo, adotar os moldes da Capela Real significava, adotar também, o estilo
dos cantores.
em José Maurício:
• o recitativo
• a virtuosidade no canto e na melodia instrumental
• permeabilidade a elementos de profanização
• excessiva ornamentação melódica
• recurso a clichês musicais
• adesão positiva ao concertante
• a prolixidade do discurso musical: testos que se repetem e progressões
• a presença polifônica; a forma fuga
• o sinfonismo
• a missa cantata (Mattos, 1997, p. 95).
José Mauricio. Na Missa Cantata, eram atribuídas variações musicais, de acordo com o
texto da liturgia das partes fixas da missa. Por exemplo: no Kyrie eleison, um caráter
era seccionado em várias partes, intercalado por partes corais e solos. Os concertati
também eram muitos utilizados no Gloria, por ser uma parte da liturgia da Missa muito
extensa.
80
A ação inovadora generalizou-se, mas tem sentido mais profundo nas missas, o que
se compreende diante da complexidade com que se desenrolam os pequenos dramas
que se sucedem na composição de uma missa – piedade no Kyrie, exaltação no
Glória, afirmação de fé no Credo e o grande mistério do “et incarnatus”... (Mattos,
1997, p. 95).
Mattos coloca, a importância da absorção do estilo bel canto por José Mauricio,
fator provocador da apropriação de José Mauricio pelo estilo napolitano. (Mattos, 1997,
p.95).
De acordo com Alberto Pacheco, não se sabe ao certo quantos foram os cantores
uma grande quantidade de artistas, uma vez que estes cantores, geralmente eram muito
bem remunerados. Diante destes fatos, constatamos que, D. João não mediu esforços em
manter na Capela Real do Rio de Janeiro, o mesmo nível vocal da Capela Real de
Lisboa.
naipe de sopranos composto por oito cantores, todos castrati, o que coloca a Capela
Real do Rio de Janeiro, em posição bastante favorável, em relação até mesmo a Capela
Pontifical. “Em geral, a Capela Pontifical contava com 32 cantores, oito por voz: todos
os soprani eram castrati...” (Barbier, 1989, p. 106). Barbier ainda fornece informações a
81
respeito da capela de São Marcos em Veneza, que contava com 28 a 36 cantores, dos
quais treze eram soprani e quatro contralti. De acordo com Barbier, em Nápoles a
Capela Real era ainda mais modesta, composta de dezoito cantores cinco soprani e
cinco contralti. (Barbier, 1989, p. 107). Mais uma vez, a Capela Real do Rio de Janeiro
configurarem na lista de Alberto Pacheco são: Antonio Cicconi (Roma, 1781 – Rio de
Lauretti (Itália, ? – Portugal, 1857), Francesco Realli (Itália, ? – Rio de Janeiro?, 187 -
?), Marcello Tani (Itália, ? – Brasil, ?), Pasquale Tani (Itália, ? – Brasil, ?), Angelo
Tinelli (Itália, 17-? - ?, 18-?). Alberto Pacheco informa que, Capranica teve uma grande
atuação na Capela Real e Real Câmara. “(...) Capranica teve uma participação bastante
ativa no Rio de Janeiro como comprova o número de composições dedicadas a ele pelos
mestres de capela além de sua atuação na Real Câmara”. (Pacheco, 2007, p. 71). Dois
nomes de relevância nesta lista são Antonio Cicconi e Giovani Francesco Fasciotti. Os
possibilidades técnicas vocais e por esta razão possuíam os maiores salários da Capela
Portugal, tendo a ele o compositor dedicado cinco árias solo. Em contrapartida Fasciotti
recebeu apenas duas dedicatórias do autor. Pacheco conclui, que este fato confere a
Ciconni mais prestígio na Capela Real que Fasciotti. (Pacheco, 2007, p. 78).
82
Maurício, ter sido confiada e este cantor. Esta questão será abordada mais a frente.
Além de sua atuação na Capela Real, Alberto Pacheco informa, que Fasciotti foi o
castrato de maior sucesso, no meio teatral no Rio de Janeiro, não só como excelente
músico, mas também como ator. (Pacheco, 2007, p. 84). Alberto Pacheco reafirma, o
obteve na ópera Tancredi de Rossini, que fora escrita para contralto. “Somente levando
papel título da ópera Tancredi de Rossini que foi composta para contralto”. (Pacheco,
2007, p. 86).
motivadores da absorção de José Mauricio pelo estilo bel canto. Segundo Mattos, após a
chegada dos músicos de Lisboa, suas composições eram elaboradas com base nas
possibilidades oferecidas por estes artistas. “Ao centro dos fatores significativos na
dos novos intérpretes”. (Mattos, 1997, p. 95). Mattos se refere as novas possibilidades,
apresentadas então a José Maurício. Conforme citado no capítulo referente a origem dos
castrati, estes possuíam uma sonoridade incomum, com características hibridas. O som
produzido por estes cantores não era como de um menino, homem ou mulher. As
condições a quais eram dispostos estes cantores, após a cirurgia de emasculação lhes
vocal, e formação musical a qual eram submetidos desde a infância, tornavam ainda
mais ampla a capacidade destes interpretes, diante dos desafios peculiares do gênero
83
vocal italiano do século XVIII, que era o estilo adotado pela corte portuguesa, e
colocada a sua disposição estabelece outros parâmetros, bem distantes a esta altura das
condições vocais e instrumentais dos músicos da velha Sé. Não mais tiples ou contraltos
infantis, nem instrumentistas de meia força”. (Mattos, 1997, p. 96). O nível dos músicos
categoria, habituados a outros vôos fazendo jus a tratamento adequado. Sua escrita
vocal desenvolve-se na base da agilidade dos novos interpretes pondo em relevo, não só
a sonoridade específica, mas o seu brilhantismo e o seu estilo próprio”. (Mattos, 1997,
domínio sobre as passagens de agilidade. Mattos faz referência aos castrati, diante do
fato de terem sido estes os sucessores dos tiples, e contraltos infantis da Antiga Sé.
Certamente na Capela Real ocorreu uma transição semelhante, a qual foi submetida à
também nas partes de tenor e baixo. É possível se observar nas partes solistas de tenor e
baixo, passagens de agilidade e virtuosismo, tal qual nas árias de soprano e contralto.
84
Concluímos embasados nestes relatos, que não só os castrati possuíam excelente nível
técnico vocal, mas também os tenores e baixos. Aberto Pacheco relata que a técnica do
século de XVIII, era dominada pelos castrati, como intérpretes professores ou até
mesmo compositores. A técnica vocal dos castrati certamente era aplicada nas vozes
agregado ao estilo napolitano, resultou no estilo misto, ou seja, nas Missas Napolitanas
gêneros diferentes eram unidos, gerando assim duas linguagens musicais em uma
mesma obra. (Inez Martins, 2004, p. 386). A adesão de José Maurício a Missa
Napolitana fez com que o estilo polifônico também fosse por ele adotado, uma vez que
Mattos explica, que o marco do inicio da adoção de José Mauricio pelo estilo
bel canto, ocorreu com a Missa de Nossa Senhora da Conceição 1810. Mattos destaca a
“Laudamus, para soprano, é tratado com todos os requisitos de agilidade e de estilo que
lhe são próprios, na tessitura adequada a que se condiciona, enfim, a grande ária para
Cleofe Person Mattos atribui, a adoção do estilo vocal napolitano (bel canto),
Lisboa, habituados aos desafios impostos pelos compositores através das partituras,
malabarismos vocais. Segundo Mattos, o estilo bel canto, se afasta das premissas
características da música litúrgica, surge uma música com traços dramáticos e teatrais,
necessidades de cada igreja para qual trabalhavam. Outra questão de relevância, era a
instrumental disponível na instituição religiosa para qual ele trabalhava. Caso não
, 1984, p. 95).
. De acordo Mattos, a utilização do estilo bel canto, por parte de José Mauricio,
não consiste apenas no fato de ser ele um músico de corte cumprindo o desejo de um
86
A adesão a princípios que se opunham às obras destinadas ao culto religioso pode ter
criado em torno de determinados trechos a imagem da concessão ao gosto do
príncipe regente ou de vontades que se sobrepunham às dele, compositor, sem
dúvida existiam, mas a conclusão a tirar não vai além da meia verdade. De fato, o
padre José Maurício capitulou diante da técnica e da qualificação das vozes com as
quais pela primeira vez passava a trabalhar, não só os sopranos e contraltos castrati,
mas as vozes masculinas, todas com muita categoria. (Mattos, 1997, p. 98).
instrumentistas de que dispunha na Capela Real. Talvez possamos concluir, que José
decisão não me voltar ao estudo das vozes das cantoras européias, e brasileiras que por
aqui atuaram, neste período, uma vez que estas não atuaram na música litúrgica. O fato
era que, Portugal seguiu a premissa da Igreja que era “Mulier absit a choro” (que a
violinista e professor de música (Portugal, ? - ?,?) deste cantor não se tem o registro
vocal, Ayres barítono e compositor (Portugal, ? - ?,?), José Maria Dias Tenor da
Patriarcal de Lisboa e da Capela Real (Santarém, 17-? – Rio de Janeiro, 18 -?), |Antônio
Nicolao Majoranini baixo da Real Câmara e da Capela Real e do Teatro São João, além
87
de professor de piano e canto (Roma, ? – Rio de Janeiro, 1855), Carlos Mazziotti cantor
(Portugal,?, ? – Rio de Janeiro, 19/05/1850), pe. Francisco Pereira de Paula baixo atuou
como capelão cantor e solista da Real Capela (Portugal, ? – Rio de Janeiro, 20/11/1833),
Felizardo Porto baixo cantante da Real Capela de Lisboa e do Rio de Janeiro, regente de
e António Pedro Gonçalves, ambos tenores vindos da Capela Real de Lisboa, tiveram
Na Missa de Santa Cecília 1826, a adesão ao estilo napolitano das partes solistas
agilidade, de grande extensão (intervalos distantes), para a voz. Nesta composição José
Maurício mantém, a linguagem do estilo fiorito (bel canto), herança dos tempos de
Os solos utilizados como exemplos do emprego deste estilo nesta Missa serão, a
ária Laudamus (solo de soprano), e a ária Qui tolis (solo de tenor em concertato com o
coro). Em relação ao Gloria, segunda parte da missa, existem considerações feitas por
Cleofe Person de Mattos, na edição completa da Missa, com selo da FUNARTE, 1984.
88
trechos corais e solos, estes de grande virtuosiosismo – traço que se instala em sua
Cecília, como pertencente ao estilo Missa Cantata. Inez Martins, afirma que o recurso
utilizado pelos compositores nesta prática era de alargar o Gloria, dividindo-o em oito
Inez Martins justifica a ampliação do Gloria, pelo fato desta Missa ter sido
comemora Santa Cecília. Por ser o Gloria um hino de louvor, agradecimento e alegria,
Inez conclui, que José Maurício resolve ampliá-lo ao máximo, pois este traduz o espírito
Para estender a peça, José Maurício constrói o Gloria numa estrutura conhecida
como Missa cantata. A característica dessa estrutura é alargar os dois textos da
Missa (Kyrie e Gloria) fragmentando os versículos, criando movimentos quase que
totalmente composto em três partes independentes, sendo um deles geralmente
89
Christe eleison, uma fuga ou tema fugato. No segundo, os versículos são divididos
em oito grupos, alternando movimentos rápidos e lentos com trechos corais, árias,
duetos, tercetos, quartetos, ou mesmo, escrito para coro e solistas no mesmo
movimento. A missa de Nossa Senhora da Conceição de 1810 (COM 106) ou a
Missa em Mi Bemol (CPM 107) são exemplos de Missa cantata. (Martins Inez,
2004, p. 38).
Em relação à ária Laudamus, primeira ária a ser utilizada como exemplo nesta
pesquisa, vamos abordar considerações feitas por Cleofe Person de Mattos, na edição da
Missa de Santa Cecília 1826 da FUNARTE, 1984. Mattos considera, o solo de grande
teor de virtuosismo, permeado por vários tipos de ornamentação peculiares do estilo bel
canto.
Mattos sugere, que este solo foi destinado, e só poderia ser executado por um
integralmente, em alguns casos com variações, geralmente acrescida de uma seção coda
século XVIII, como também a função dada pelos compositores aos instrumentos
90
utilizados. Pode-se considerá-las em quatro grupos básicos, que não são mutuamente
excludentes, pois os instrumentos mantêm uma relação flexível com as partes vocais
1. obbligato
2. ripieno (tutti)
4. baixo contínuo
eles são utilizados para pequenos solos em ritornellos dos movimentos para vozes
solistas (árias). (Walter apud Moretzsonh, 2008, p.58). Julio Moretzsohn cita
comentários de Walter a cerca do obbligato nas árias das Missas Napolitanas. “Esses
procedimento pode ser observado nas árias de Caldara, em geral sobre o texto do
Santa Cecília de 1826, referente ao intérprete que José Mauricio dedicou a partitura.
Embora Mattos considere que só um castrato poderia executar um solo deste teor de
dificuldade, ao mesmo tempo, levanta dúvidas a cerca de quem de fato foi seu
interprete, já que no manuscrito, não existe o nome do cantor ao qual a parte se destina.
uma relação amistosa entre José Maurício e Fasciotti. Por outro lado Antonio Cicconi já
acompanhado apenas uma vez, por José Maurício em uma reunião particular. Outro fato
observável nos relatos de Cleofe Person de Mattos, acerca da Missa de Santa Cecília é
que, os solos eram distribuídos a interpretes diferentes, ou seja, nem todos os solos de
tenor eram cantados pela mesma pessoa. É possível que os solos fossem distribuídos de
Cleofe Person de Mattos, Fasciotti era estrela de primeira grandeza na Capela Real,
chegando a receber maior salário que todos os músicos atuantes na Capela Real,
incluindo Marcos Portugal. Alberto Pacheco afirma, com bases em registros da folha de
92
pagamento da Capela Real que Cicconi recebia a maior remuneração entre os músicos.
Pacheco justifica, que muitos musicólogos deixam este fato passar despercebido, em
virtude de não fazerem a soma do salário mensal, não chegando assim ao montante
recebido anualmente pelo cantor. De acordo com Pacheco, mesmo em 1829 Cicconi é o
maior salário de Capela Real. Em relação a este fato Pacheco faz um comentário.
“Sendo assim, a partir de 1829 passa a receber 1:440$000 anuais, e continua sendo o
maior salário pago aos cantores. Isto é algo que tem passado despercebido pelos
musicólogos que sempre enfatizam Fasciotti como o castrato mas bem pago”. (Pacheco,
2007, p. 77). Segundo Pacheco, Fasciotti recebeu o maior salário da Capela Real em
1833, em virtude de Cicconi ter se ausentado do Brasil, em viajem para a Itália. Isso fez
com que naquele período Fasciotti fosse o maior salário da Capela Real.
acordo com Pacheco, Marcos Portugal dedicou cinco árias a Cicconi, tomando como
base a extensão das mesmas, conclui que a tessitura do castrato era bastante grande, do
La2 a Dó5. Em relação a extensão encontrada nas árias de Marcos Portugal, dedicadas a
Cicconi, aumentam a possibilidade deste cantor ter sido o interprete da ária Laudamus,
Santa Cecília do padre José Maurício, em considerações feitas por Cleofe Person de
Mattos. (Pacheco, 2007, p. 85). Sendo uma ária que possuiu no seu extremo superior
93
condições vocais de interpretar esta ária. Mais uma vez Alberto Pacheco toma como
parâmetro as duas árias de Marcos Portugal, que foram dedicadas a Fasciotti, com base
na extensão das mesmas, Pacheco conclui, que embora Fasciotti fosse considerado
soprano na verdade era meio soprano, pois a extensão é de Lá2 a Lá4, atribuindo ainda,
a tessitura geral, que é de Sol3 a Fa#4, sendo a região ótima da voz Lá# a Sib3. Outro
fator que podemos atribuir ao fato de Fasciotti ter sido classificado como soprano, é o
fato de no século XIX ainda não haver a definição de meio soprano, as vozes femininas
existentes eram de soprano e contralto. Lauro Machado Coelho explica, quando foi
introduzido o termo meio soprano no âmbito musical. Por este motivo, os registros
denominação para as vozes intermediárias, fazia com que vozes desta natureza fossem
esperam de um soprano uma tessitura mais abrangente, na região aguda. A tessitura dos
solos dedicados a Fasciotti, é direcionada para uma voz intermediaria. Se esses solos
Raphael Coelho Machado (1814-1887). No seu tratado Raphael Coelho Machado divide
94
a voz humana em seis qualidades diferentes: Soprano, Meio soprano, Contralto, Tenor,
Barítono e Baixo. (Coelho Macho apud Pacheco, 2007, p. 210). Conforme registros
fornecidos por Alberto Pacheco, este tratado foi publicado em 1851, concordando com a
afirmação de Lauro Machado Coelho, de que o termo meio soprano só foi introduzido
interprete da ária Laudamus, da Missa de Santa Cecília 1826 do padre José Maurício.
Por outro lado, nada se pode afirmar com segurança, uma vez que a partitura não possui
nenhuma pista de quem seria o interprete da ária. Alberto Pacheco compara, a tessitura
Portugal de 1817. Embasado nas partes dos castrati deste dueto, Pacheco conclui, que
ambos possuíam tessituras vocais diferentes. Estas dedicatórias mostram claramente que
Cicconi era um soprano mais agudo que Fasciotti. Na verdade, se levarmos em conta os
padrões modernos, podemos dizer que Cicconi possuía a tessitura normal de soprano,
sib4 ao dó5 na região aguda. A ocorrência do fa4 e sol4 determinam, que Cicconi
possuía uma voz com maleabilidade, capaz de executar a messa di voce na região da
passagem, e médio agudo de sua voz. A inserção de volatas, trinados e staccati são
Os trilos são empregados nas árias dedicadas a Cicconi por Marcos Portugal.
agudo da voz, com a nota sib4 repetida sucessivamente, conferindo a esta passagem a
Trilos duplos:
Agilidade martelada:
stacatto.
dedicou este solo possuía uma voz muito extensa, pois ela, abrange quase duas oitavas
alguns trechos na região extremo aguda da voz, conferindo ao interprete uma excelente
aguda como lá4 e si4 estão contidas nesta ária, demonstrando que o cantor possuía uma
passagens melísmáticas demonstram, que o interprete desta ária possuía grande leveza e
encontrados na parte. Neste solo, se evidencia o domínio alcançado pelo padre José
fiorito, os seus solos incidem em uma região mais central, se utilizarmos como
tendo o fá4 e sol4 como limite de notas agudas sustentadas, chegando até o láb4 de
passagem. A partitura fornece pistas, de que a voz de Fasciotti era ágil e extensa, porém
não era um soprano, capaz de emitir notas agudas sustentadas como o lá4 ou si4. Em
virtude das informações que a partitura nos fornece concluí-se ser pouco provável que
Fasciotti seria capaz de executar a ária Laudamus, da Missa de Santa Cecília 1826, uma
vez que esta incide no extremo agudo da tessitura de um soprano, chegando ao dó#5. O
fato de naquela época não haver ainda a definição do termo mezzo soprano, gera um
época existentes nos manuscritos, ele é intitulado soprano. Enquanto Cicconi possuía
uma voz de soprano aguda, dentro dos padrões atuais, Fasciotti possuía uma voz
mais grave em relação a das partes solistas dedicadas a Cicconi pelo compositor. A
99
Ária Laudamus da Missa de Santa Cecília 1826 do padre José Maurício Nunes Garcia
solo de soprano:
estilo bel canto. Neste ária o tenor solista atua em concertato com o coro, prática muitas
vezes adotada pelos compositores. Mattos tece uma breve consideração a respeito desta
Trindade”. (Mattos, 1984, p. 21). A tessitura desta ária é do dó2 ao si3, que é uma
Neste solo confiado ao tenor, o padre José Maurício demonstrou mais uma vez
lá3 é empregado duas vezes no início da ária, embora não seja sustentado sugere que o
cantor possuía uma emissão estável e maleável, que permitia articular o texto na região
Ainda no recitativo, encontra-se a nota sol3 agudo sustentado, mais uma vez
relação ao volume, pois sendo uma nota de grande duração admite a execução da messa
di voce.
mais um elemento do estilo fiorito, adicionado a ária Qui tollis. O canto de sbalzo com
notas agudas sustentadas, sugerem que o tenor solista desta ária possuía, domínio em
robustas, pois, o canto di slancio é realizado com voz cheia e vigorosa própria do canto
di bravura.
Canto di sbalzo:
agilidade, confere ao padre José Maurício conhecimento suficiente deste estilo, com
102
capacidade de agregar em uma mesma frase, uma variedade de elementos do bel canto.
apresentado, bem como, a sua capacidade de realizá-los, uma vez que a ária foi
exemplo genuíno, da apropriação do estilo bel canto no Brasil, uma vez que, ele é o
único cantor brasileiro, dentre os analisados nesta pesquisa. O padre José Maurício é,
considerados absorvidos e realizados por Gabriel Fernandes Trindade, uma vez que as
103
tollis, concomitante com a tessitura bastante aguda, na qual foi escrita, podemos
Escola Napolitana.
condições de saúde morre no ano de 1816, a Rainha D. Maria I. Jean Paul Sarraute
afirma, que a música executada nesta ocasião foi confiada a Marcos Portugal. “Marcos
celebrada do dia seguinte 23”. (Jean Paul Sarraute, 1979, 142). Jean Paul Sarraute cita
Janeiro. Este jornal chega a dizer que Marcos Portugal se superou, chegando a dar a
Missa, o adjetivo de obra prima. Segundo Jean Paul Sarraute, esta Missa trata-se de uma
Paris. Segundo Jean Paul Sarraute, as duas partituras são absolutamente iguais, porém
afirma que a partitura que se encontra em Paris, possui maior número de anotações de
nomes de cantores, que a que se encontra no Rio de Janeiro. (Jean Paul Sarraute, 1979,
104
143). A partitura que se encontra na cidade do Rio de Janeiro é uma cópia, talvez, por
esta razão possua menos anotações, em relação a que se encontra em Paris. Jean Paul
que embora desprovida de suas faculdades mentais há muito, morrera com seu título de
ária, “O Sr. Ciconi”. Sarraute considera ser o mesmo Cecconi, que cantou o solo de
soprano no Dies irae do Oficio de Mortos, fazendo pairar em nossas mentes esta
Mortos de Marcos Portugal, seja Antonio Cicconi, castrato solista da Capela Real, que
Maurício. Segundo Sarraute, o décimo oitavo versículo cabe ao tenor, solo que foi
António Pedro”. Embora, Jean Paul Sarraute não tenha feito considerações a respeito
desta ária, posso dizer após ter visto esta partitura que este solo agrega passagens como:
distancia, entre notas graves e agudas ou vice e versa), gerando assim, certo grau de
Alberto Pacheco no final do tópico “Os tipos vocais e sua extensão”, pertencente
a sua tese de doutorado, tece uma reflexão em torno de dois tenores, atuantes na Capela
Real, Giovanni Mazziotti e António Pedro Gonçalves. Segundo o autor, António Pedro
foi tenor muito apreciado na Capela Real, sendo dos tenores o que mais dedicatórias
recebeu. Das dedicatórias recebidas por ele, duas são do padre José Maurício e quatro
de Marcos Portugal. Em relação a este número de árias dedicadas Pacheco diz: “Sendo
assim, parece ter sido o tenor mais requisitado da Capela”. (Alberto Pacheco, 2007, p.
147). De acordo com as informações provenientes das análises, dos seis solos a ele
dedicados, Pacheco conclui, que sua extensão vocal era de Sib1 a Sib3. Segundo
Pacheco, a sua região ótima entre Sib2 e Mib3, considerado-a uma região bastante
ampla, comparada a de outros cantores, analisados em sua pesquisa. Nas análises dos
solos de António Pedro Gonçalves, Alberto Pacheco identifica notas longas, que muito
incidência do Fa3 sustentado, embora não haja volatas de uma oitava ou longos
melismas.
escritas para os tenores nessa época. O Sib3 nas partes de António Pedro Gonçalves, em
observação, dizendo, que o grau conjunto além de dificultar a emissão, deixa mais
evidente a mudança de registro. (Alberto Pacheco, 2007, p. 149). Os grandes saltos nas
notas agudas sugerem que eram emitidas em falsete. Alberto Pacheco explica, que os
saltos e o ataque direto, facilitam a execução do falsete. Se por ventura as notas agudas
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ária de Marcos Portugal, dedicada a Antònio Pedro Gonçalves, no qual os agudos são
No solo Lacrimosa dies illa sib3 é introduzido por um intervalo de terça menor,
ao invés dos grandes saltos apresentados no exemplo anterior. Este procedimento sugere
duas possibilidades: A primeira seria, que Antònio Pedro Gonçalves possuía um grande
peito, procedimento adotado pela maioria dos tenores da atualidade. Por outro lado, os
illa.
canto, porém, o conteúdo do solo Inter oves evidencia que Marcos Portugal decide
voz a que ela foi direcionada. A sua tessitura abrange do dó2 ao ré4, fato que não é
e Gabriel Fernandes da Trindade, encontramos uma tessitura aguda, porém dentro dos
longa duração nos quais a voz se mantém em uma região extremo aguda, ou super
região extremamente aguda, sugere que o interprete a qual foi destinada possuía
No início da seção andante do Inter oves, contem notas agudas sustentadas que
região aguda. Tais fatores conferem ao interprete, não só a capacidade de graduar o som
extensão, adversa a dos outros tenores. Mais uma vez, Alberto Pacheco com base nas
partituras por ele analisadas, atribui a Giovanni Mazziotti uma extensão e Mi2 a Re4.
“A começar por sua extensão, de Mi2 a Ré4, que é praticamente uma terça acima da
extensão do António Pedro. É uma extensão que está entre a de tenor e a de contralto”.
109
(Alberto Pacheco, 2007, 154). De acordo com Pacheco, Garcia define este tipo de voz
como contraltino ou haute contre. Pacheco explica, que o haut -contre é um tenor
agudo apto a usar o extremo agudo de seu falsete, porém com homogeneidade, entre
este registro e o de peito. (Pacheco, 2007, p. 154). É provável, que o referencial técnico
castrati. Tosi é citado em Guido Tartoni anteriormente nesta pesquisa, no que tange a
falsete, porém com igualdade, talvez, possamos considerar, que o haute contre
possuísse uma sonoridade hibrida, entre o registro masculino de um tenor super agudo,
se mantinha mais intensa em virtudeda região super aguda na qual a voz se encontrava.
intensidade, afim de que a emissão não se tornasse débil, de pouco volume. Fica claro,
se na região aguda e extremo aguda da voz de tenor chegando ao ré4. Outro elemento de
qual o solo Inter oves foi dedicado, possuía excelente extensão. O dó2 vem
acompanhado de fermata indicando que o tenor além de uma extensão super aguda,
tessitura da maioria dos tenores, que não passavam de sib4 ou si4. De acordo com
Alberto Pacheco, António Pedro Gonçalves, possuía voz menos aguda que de Mazziotti,
111
chegando as suas árias ao sib4 no extremo agudo. Atualmente, um dos grandes fatores
que dificultam a execução de obras antigas, como estas, é o fato de que os compositores
tudo que os cantores dominavam, ocultando ao máximo suas deficiências. Por exemplo,
Portugal, o mesmo tenor que canta o Inter oves cantará a Lacrimosa, tornando a
também neste solo. Notas super agudas, inseridas por grau conjunto, são elemento de
unidade entre o solo das duas obras de Marcos Portugal. Com base no exemplo adotado
solo Inter oves, admitimos a possibilidade, deste, cantor ter sido interprete de ambas.
112
A capacidade de igualar o extremo agudo de seu falsete a voz de peito é uma das
Mazziotti na Capela Real, Alberto Pacheco observa, que as árias de Giovanni Mazziotti
possuem tessitura geral de Sol2 a Lá3, sendo a de António Pedro de Sol2 a Sol3. Com
estes resultados Alberto Pacheco conclui: que Mazziotti possuía a tessitura média e
grave dos tenores atuais, bastante diferente daquela adotadas pelos castrati. “(...) apesar
do uso de uma região muito aguda, a tessitura de Mazziotti é de tenor, algo muito
diferente dos falsetistas que cantam como contralto ou soprano.” (Pacheco, 2007,
p.154).
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Alberto Pacheco utiliza, o dueto para dois tenores, pertencente a Missa festiva com todo
tenor que possui tessitura bastante aguda. A tessitura muito aguda era, elemento peculiar
em solos confiados a Giovanni Mazziotti. Por outro lado, a parte do segundo tenor,
dedicada a António Pedro, possui uma tessitura mais voltada para os padrões dos
tenores da atualidade. É provável, que Alberto Pacheco denomine António Pedro como
um tenor com perfil enquadrado nos “moldes atuais”, em virtude da sua tessitura que
embora seja aguda, não ultrapasse o sib3. Esta tessitura é adotada pelos compositores no
decorrer do século XX, conferindo ao tenor uma sonoridade cheia, com caráter mais
viril em relação ao haute contre. A ária Lacrimosa não possuiu passagens de agilidade,
e ornamentações, em contra partida, o solo inter oves possui volatas, trilos, tercinas. Os
bravura. Embasados nestas informações, podemos concluir, que tais saltos bruscos dão
Embora Marcos Portugal não tenha usado na ária Lacrimosa, passagens de agilidade ou
floridas, utilizou o canto di sbalzo, talvez, objetivando conferir ao solo um aspecto mais
dramático, condizente com seu texto, que narra a tristeza do dia de lagrimas em que o
pecador ressurgirá das cinzas para ser julgado. A maturidade de Marcos Portugal como
com sua vontade, a utilização do canto di sabalzo é um exemplo disto. Muitas vezes o
messa di voce nestes momentos. Alberto Pacheco define António Pedro como um tenor
114
diferentes, António Pedro enquadrado em uma tessitura menos aguda, que foi sendo
adotada ao longo do século XIX, atingindo sua adesão plena no início do século XX.
início do século XIX havia cantores como Giovanni Mazziotti que embasavam a sua
técnica e estética na escola dos castrati, e cantores como Antônio Pedro, que se
direcionavam para uma emissão mais robusta, porém com tessitura aguda menos ampla,
em relação aos tenores de estilo haute contre, como Mazziotti. Mediante estas
Europa, uma vez que os castrati ainda não tinham saído de cena totalmente. Ao mesmo
tempo as vozes menos voltadas para escola dos castrati estavam começando a
despontar, fazendo com que os compositores assim pudessem escolher que tipo de linha
adotar em suas composições, o estilo mais moderno, ou aquele calcado nos castrati. Ao
constatável o confronto de qualidades vocais distintas, nas partes dedicadas aos tenores.
Pedro. Embora ambos sejam tenores, a partitura evidência em quais regiões da voz os
cantores atuavam com maior êxito. Ainda que existam passagens de agilidade e
peça uma terça inferior em relação a Mazziotti, não havendo uma inversão de posição.
A tessitura de António Pedro de maior rendimento, e conforto vocal era aquela comum
dos tenores atuais, por outro lado, a de Mazziotti embora pudesse cantar em tessitura
convencional, também possuía uma natureza vocal que lhe permitia atuar também no
115
extremo agudo, qualidade sempre explorada por Marcos Portugal em solos a ele
dedicados.
acompanhamento de baixo. De acordo com Jean Paul Sarraute, não há nenhuma pista no
solo número XXVI de tenor especificando a quem a parte foi dedicada. Por outro lado, a
partir das análises das árias dedicadas a Giovanni Mazziotti, feitas por Alberto Pacheco,
aliadas ao fato de ter escolhido a ária Lacrimosa de tenor de Marcos Portugal, como um
dos exemplos da manifestação do estilo bel canto no período joanino, não pude deixar
de voltar a minha atenção, para a tessitura muito aguda do solo de tenor Confutatis
116
levantasse uma hipótese, em relação ao fato de Giovanni Mazziotti ter sido o interprete
termina dizendo considerar esta obra das mais importantes, e mais bem acabadas de
Marcos Portugal, chegando a afirmar que esta Missa se trata de uma das paginas
essenciais do compositor. Jean Paul Sarraute admite, que esta obra seja mais um
dizendo que em virtude do autor dominar tão bem este estilo, ele ajusta a obra ao estilo
napolitano de acordo com seu gosto. (Jean Paul Sarraute, 1979, p. 73)
117
Conclusão
definições encontradas para este termo, para que assim, as considerações relacionadas a
este estilo fossem agrupadas, resultando em uma compreensão mais abrangente de sua
constituem.
Como uma espécie de ponto de partida, citamos a atuação dos castrati no rito
moçárabe desde o século XVI. Talvez, possamos dizer, que, por esta razão, a Espanha
funcionou como um dos primeiros centros irradiadores do estilo bel canto, pois, dela
estabilidade para estes músicos, uma vez, que naquela época o poder da Igreja de Roma
emasculação, faz com que sua atuação nos ritos da Igreja comece na Espanha, rumo a
formação musical dos meninos e jovens, que por eles passaram, entre os quais muitos
deles eram castrati. Por este motivo Alberto Pacheco declara, que os castrati
musical dos jovens castrati, fez com que estes cantores aliassem a suas possibilidades
e intenso.
Com base nas possibilidades dos castrati, os compositores da época davam crescente
destaque para o canto fiorito. A necessidade de anexar na ópera o caráter artificial que
permeou os séculos XVII e XVIII, fez com que das atuações dos castrati se esperasse,
o estilo fiorito aplicado intensamente nos teatros, também, foi obtendo crescente adesão
na música sacra. Concluímos, que no decorrer do século XVIII, o canto fiorito torna-se
clássica italiana, dos séculos XVII e XVIII. O interesse do público pelo virtuosismo dos
solos, faz com que os castrati recebessem especial atenção por parte dos compositores.
plenamente, excluindo ao máximo tudo que lhes fugisse ao domínio, a fim de não
muitos músicos talentosos. O castrado muitas vezes agregava em si a função de: cantor,
castrati, no cenário musical italiano do século XVIII. Com o passar do tempo, esta
apropriação do estilo bel canto. A absorção portuguesa pelo estilo fiorito se dá através
compositor tivesse referências musicais ligadas ao estilo bel canto. De acordo com
informações contidas nesta pesquisa, o estilo bel canto era evidenciado na ópera e na
música sacra. O período vivido por Marcos Portugal na Itália1792-1800, foi de intensa
que Marcos Portugal não tenha ido para a Itália com intuito de conhecer o estilo
napolitano, mas sim vivenciar com proximidade, aquela prática musical que era por ele
estilo italiano nas composições da recém fundada Capela Real. A inserção dos músicos
mais para a manifestação do bel canto no Brasil. As atividades musicais da Capela Real
do Rio de Janeiro, deveriam manter-se no mesmo nível de Lisboa, assim sendo, também
Brasil. A apropriação do estilo bel canto, pelo padre José Maurício Nunes Garcia é
120
realizada com base nos novos intérpretes vindos de Lisboa, e da vontade de D. João em
estilo operístico em solo brasileiro, estabelecem uma espécie de eixo entre, Itália,
Portugal e Brasil. Muitos elementos do bel canto, foram, utilizados nas composições
dedicadas a Capela Real. Ao contrário da Itália e até mesmo Portugal, o estilo bel canto
no Brasil, teve predominância na música sacra. Embora fosse uma música de caráter
pertencente a ópera italiana. Vale a pena lembra,r que esta característica é apanágio do
século XVIII na Itália, no qual o estilo operístico foi se tornando cada vez mais
estilística, para o padre José Maurício. A transparência do estilo bel canto em José
sua última manifestação como compositor, em uma obra calcada na forma da Missa
Cantata, onde estão contidos os elementos do bel canto, nas partes solistas.
Nas árias da Missa de Santa Cecília 1826, que foram escolhidas como exemplo
nesta pesquisa, vários elementos do estilo bel canto foram identificados. O solo “Qui
tollis” é de grande importância nesta pesquisa, pois, foi dedicado ao tenor brasileiro
tollis”, nos fornecem evidências do teor de absorção do estilo italiano, por um interprete
brasileiro.
121
Portugal, ilustra o domínio deste compositor em relação ao estilo bel canto. Os solos de
tenor desta Missa dos Mortos, utilizados nesta pesquisa, mostram não só a utilização do
estilo bel canto nesta obra, mas também, a existência de dois tipos de tenores distintos
naquela época. O tenor contraltino, e o tenor lírico típico dos dias de hoje. Estas
constatações são úteis, para aqueles, que queiram abordar este tipo de repertório, façam
estilo bel canto. Embora de origem e formação diferentes, ambos utilizaram em suas
obras procedimentos típicos do estilo bel canto. As evidências do estilo bel canto, na
obra selecionada de José Maurício, são tão claras quanto na de Marcos Portugal,
embora, Marcos Portugal, ao longo de sua carreira tenha se dedicado mais a ópera, que
José Maurício. Porém, é fato que o compositor português, após sua chegada ao Brasil
não compôs nenhuma ópera. Dos dois compositores ficaram registros do estilo musical
adotado na Capela Real, e outras igrejas da cidade Rio de Janeiro, no período chamado
por muitos de Joanino. O repertório deste período atualmente está sendo resgatado,
Missa.
122
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MARTINS, Inez Beatriz de Castro. Estudo das texturas da Missa de Santa Cecília de
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SPA. 1995
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PARTITURAS
GARCIA, José Maurício Nunes. Missa de Santa Cecília 1826. Rio de Janeiro:
FUNARTE, 1984. 371p.
SITES
GRAVAÇÕES
GARCIA, José Maurício Nunes. Missa de Santa Cecília 1826. Orquestra Sinfônica
Brasileira, Associação de Canto Coral, Solistas, Zilda Lourenço, soprano, Lucile Boy
Sandra, mezzo soprano, Isauro Camino, tenor, Juan Carlos Ortiz, baixo. Rio de Janeiro:
FUNARTE, 1959.