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Praxis-Hermeneutica Da Missao-Final
Praxis-Hermeneutica Da Missao-Final
RESUMO
PALAVRAS-CHAVE
ABSTRACT
This article reflects on the origin of the Biblical Theology of Mission, particularly, in face of
the crisis of the missionary enterprise in the mid of the 20th century, and observes the
proposal by several authors which ranges from biblical foundation for missions to the
persue of a biblical hermeneutics of missions; and sugests a hermeneutics of the biblical
purpose of mission that consists of restoring God’s presence in Creation.
KEYWORDS
Introdução
1
Doutor em Teologia pela Escola Superior de Teologia, EST. Professor da Faculdade Teológica Sul
Americana. Email: blane@ftsa.edu.br.
teológica fundada e presidida por John Stott. Na ocasião, foi lançada em português mais
uma obra de Wright sobre a missão: A missão de Deus: desvendando a grande narrativa
da Bíblia. Esta obra, ao contrário do que se possa imaginar, não é apenas mais uma obra
de teologia da missão dentre tantas outras. Pelo contrário, ela pode ser considerada um
marco importante no estudo teológico da missão, pois, propõe um novo caminho ou
abordagem do texto bíblico em relação ao estudo da missão. Em síntese, o que Wright
argumenta é que não basta lermos a Bíblia em busca de uma fundamentação da missão
selecionando textos aqui e ali sobre missão, a preocupação de Deus com os povos, a ação
de envio para proclamação da mensagem do evangelho, a fim de provar que a missão é
uma ordenança divina e um dever da igreja. É preciso entender que “A Bíblia é, ela
mesma, de muitas maneiras, um fenômeno missional” (2014, p. 50; grifo do autor). Com
isso, Wright está sugerindo que os escritos bíblicos, em grande parte, surgiram a partir de
conflitos do povo com sua realidade histórica, cultural e religiosa a qual o levou a
confrontar tais reivindicações em função da proclamação da relação de Deus com a
humanidade. Como ele mesmo resume,
a nossa hermenêutica missional deriva da pressuposição de que a Bíblia como
um todo conta a história da missão de Deus, por meio do povo de Deus, em seu
envolvimento com o mundo de Deus, em prol de toda a criação de Deus (2014, p.
50-51, grifo do autor).
2. A Bíblia e a missão
Vimos que no estudo da missiologia dos últimos sessenta anos houve uma
preocupação de definir a tarefa da disciplina. As obras de Bavinck e Verkuyl, mais
recentemente, Van Engen, Garcia, Bosch e Wright, são especialmente elucidativas nesse
sentido. São significativas tanto pelo contexto da obra missionária, que provocou uma
busca pela necessidade do desenvolvimento de uma teologia de missões, como também
por procurarem, ainda que sinteticamente, definir a natureza, função e abrangência do
estudo das missões.
O que essas obras têm em comum não é só o campo de estudo da teologia da
missão, mas a busca por um modo de leitura da Bíblia, e nessa busca evidencia-se o
elemento crucial e determinante nos resultados o qual é a relação da missão com o texto
bíblico.
Quando Verkuyl discute o lugar da missiologia na “enciclopédia teológica”,
conclui que a missiologia é uma “ciência complementar” e sugere a relação com as
diferentes disciplinas teológicas. Dentre elas, a que nos interessa em particular é a relação
com os estudos bíblicos. Verkuyl defende, “Os estudos bíblicos, especialmente a exegese e
a hermenêutica, são cruciais não apenas para a boa compreensão da missio ecclesiae, mas
também para se ter uma correta visão dos métodos de comunicação” (1978, p. 9).
Verkuyl observa ainda que,
É importante notar que a maioria dos estudos exegéticos sobre a
fundamentação de missões foram escritos pelos próprios missiólogos.
Neste ponto a missiologia está atuando como um complemento às
disciplinas existentes da exegese do Antigo e Novo Testamentos (ibid.).
Ainda, segundo Carriker, “a teologia bíblica não é ‘bíblica’ apenas por procurar
sua base em princípios bíblicos, mas também por seguir a sequência bíblica, através da
qual estes temas são apresentados e desenvolvidos” (p. 9, 10. Grifo do autor).
Na busca por “uma teologia bíblica de missão integral”, Carriker propõe um tema
que demonstre a unidade da Bíblia e seja “abrangente, holístico e integral”. Ele defende
também que “é a ideia de missão que melhor reúne estes conceitos [reino de Deus e um
plano salvífico de Deus na história] e ilustra a preocupação central da Bíblia” (1992, p. 11).
Conforme a proposta de Carriker a tarefa da teologia bíblica da missão é uma
“teologia da história dentro da Bíblia” em que temas bíblicos são apresentados e
desenvolvidos de acordo com a sequência bíblica (1992, p. 9, 10) e procura identificar o
tema central através da Bíblia.
Hedlund tem uma abordagem sincrônica semelhante à de Carriker, em que
reconhece que a história contida nas Escrituras é teológica (1991, p. 19). Na sua teologia,
ele se propõe buscar uma fundamentação e propósito bíblico da missão (1991, p. 11).
Hedlund entende e reconhece que “um estudo exegético completo da teologia
missionária da Bíblia é necessário” (1991, p. 14. Tradução nossa). Não obstante, Hedlund
apresenta em sua obra uma tentativa de fazer sentido dos temas bíblicos que falem a
respeito e definam a missão da igreja.
Tanto Carriker como Hedlund procuram examinar os vários temas bíblicos desde
a criação até o apocalipse e relacioná-los à missão. Ambos também têm uma tônica
contextual com os respectivos contextos de origem de suas obras. Carriker está em
sintonia com questões relativas à missiologia integral na América Latina enquanto
Hedlund se refere constantemente a questões pertinentes à igreja e missão na Índia.
Pode-se dizer que um resultado concreto da proposta de Carriker se materializou
na publicação da Bíblia Missionária de Estudo, da qual ele foi o editor e coordenador do
projeto. Esta obra representa justamente um desenvolvimento da leitura missionária da
Bíblia a partir de uma hermenêutica missionária. Mais do que uma Bíblia com anotações
sobre a missão, essa edição pretende sugerir um modo de leitura da Bíblia (2014).
Na década de 1990, David Bosch publicou sua importante obra sobre as
mudanças de paradigma na teologia da missão. Nesta obra (publicada no Brasil em 2002),
Bosch argumenta que a crise contemporânea da missão afeta a missão em três áreas: o
fundamento, os motivos e meta e a natureza da missão (Bosch, 2002, p. 21), e sugere,
que a solução para o problema apresentado pela atual falta de fibra não reside
numa simples volta a uma consciência e uma prática missionárias anteriores [...]
também não reside em abraçar os valores do mundo contemporâneo e tentar
responder a qualquer coisa que um indivíduo ou grupo particular resolva
chamar de missão. Necessitamos, antes, de uma nova visão para sair do atual
impasse rumo à uma espécie diferente de envolvimento missionário (p. 24-25)
O modo como Bosch propõe construir essa “nova visão” é revendo a definição de missão
examinando “meticulosamente as vicissitudes das missões e da ideia missionária durante
os últimos 20 séculos da história da igreja cristã” (Bosch, 2002, p. 25). Portanto, a
proposta de Bosch se restringe à missão cristã a partir do Novo Testamento, pois
considera que o Novo Testamento já representa uma mudança de paradigma da missão
em relação ao Antigo Testamento.
Em um trabalho acadêmico não publicado e posterior tese de doutorado, Ehud
M. Garcia examina a questão hermenêutica por meio da proposta de uma abordagem
missiológica ao Novo Testamento. Nessa proposta, Garcia basicamente defende uma
abordagem hermenêutica que leve em conta a aceitação da Bíblia como palavra inspirada
de Deus, um método de interpretação sob a direção do Espírito Santo, uma abordagem
metodológica histórico-gramatical, uma compreensão da realidade contextual do
missiólogo (Garcia, 1995, pp. 71-72)
Charles Van Engen talvez seja na atualidade um dos principais expoentes da
discussão hermenêutica da missão. Em diversos artigos e obras, Van Engen defende a
busca de uma nova abordagem da Bíblia como um todo para a teologia bíblica da missão.
Além do mais, ele tem tratado especificamente da relação da Bíblia e a missão (Van
Engen, 1993; 1996, p. 35s.). Em sua proposta, sugere que é preciso superar a forma de
fazer teologia “de cima”, ou seja, de forma dogmática assim como a forma “de debaixo”,
ou seja, a partir de ideologias ou necessidades contextuais. A partir do modelo
hermenêutico do paradigmas missionários proposto por Bosch, Van Engen sugere uma
abordagem dos diversos temas e subtemas da Bíblia como uma “tapeçaria” em que se
leve em conta os diversos temas e motivos bíblicos, os quais se entrelaçam com os
diversos períodos da história bíblica (Van Engen, 1996, pp. 37-38, 41).
O modelo de Van Engen de leitura do texto bíblico se destaca por não reduzir a
revelação bíblica ao tema central da missão e por levar em conta a diversidade de temas e
contextos das Escrituras. Neste sentido, sua proposta é inovadora e concilia os resultados
das diversas abordagens críticas ao texto bíblico além de dar a devida importância aos
diversos contextos históricos.
Christopher J. H. Wright tem igualmente defendido que é preciso prosseguir para
além da fundamentação bíblica da missão e, em vez disso, falar da “base missional da
própria Bíblia” (2014, p. 23). De acordo com sua proposta, é possível “demonstrar que
uma teologia sólida da missão de Deus nos dá uma estrutura fundamental hermenêutica
fecunda pela qual a Bíblia toda pode ser lida” (2014, p. 24). Assim, seu interesse não é
apenas mostrar como a missão é bíblica, mas mostrar como a própria Bíblia tem uma veia
missional ou missionária. Isso não significa usar todo texto com aplicação evangelística ou
missionária, mas envolve refletir sobre
o propósito para o qual a Bíblia existe, o Deus que a Bíblia retrata
para nós, o povo cujas identidade e missão a Bíblia nos convida a
compartilhar, a história que a Bíblia conta sobre esse Deus e esse
povo e, na verdade, sobre o mundo todo e seu futuro (2014, p. 29,
30).
Esse breve esboço do desenvolvimento da teologia bíblica da missão indica como
a relação entre a Bíblia e a missão evoluiu de uma mera fundamentação para uma busca
por uma hermenêutica missional. Essa hermenêutica não se limita a usar a missão como
chave hermenêutica de leitura, mas a levar em conta a diversidade de temas e motivos
bíblicos assim como dos diversos contextos históricos e culturais dos escritos bíblicos.
Conclusão
Uma vez estabelecido o propósito bíblico da missão, ele nos serve não só de
“mapa” para a leitura bíblica e para compreender o contexto de diversas passagens
bíblicas (Wright, 2014, p. 70), mas nos serve, sobretudo de mapa para a ação missional da
igreja. A igreja deve se ocupar com o propósito de Deus ou, em outros termos, com a
missão de Deus. E a missão de Deus é manifestar a sua presença e glória na sua criação e,
individualmente, na vida humana.
Referência bibliográfica