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ThaYs Cristófaro Silva

Fonética e fonologia
do português
ROTEIRO DE ESTUDOS E GUIA DE EXERCÍCIOS

INCLUI CD COM EXERCÍCIOS


E EXEMPLOS DE PRONÚNCIA
22 Introdução

a linguagem oral se adequadamente orientados por profissionais. Formação: Gra-


duação em Letras e áreas afins. Também o desenvolvimento de pesquisas em cursos
de pós-graduação em áreas afins (como a Lingüística, por exemplo).
Fonética
Lingüística computacional: Um dos grandes desafios da ciência computacional é
encontrar correlatos acústicos da fala que sejam conversíveis em sinais digitais. Muito
tem sido desenvolvido nesta área nos últimos anos. Um exemplo da relação lingüística-
computação é a possibilidade de se obter e passar informações por telefone entre um
ser humano e um computador (via telefonia, por exemplo). Ao definir-se os aspectos
acústicos e articulatórios da língua e seu sistema fonológico, pode-se aperfeiçoar
l. Introdução
mecanismos já existentes. Desafios são impostos sobretudo na área da sintaxe e se-
mântica. Formação: Graduação em Computação, Física e Lingüística e pós-gradua- Esta parte é dedicada ao estudo da produção da fala do ponto de vista fisiológico
ção em áreas afins. e articulatório. Inicialmente, descrevemos o aparelho forrador e discutimos o mecanis-
mo fisiológico envolvido na produção da fala. Em seguida, consideramos as proprieda-
Ciência da telecomunicação: A transmissão da fala em termos físicos impõe desa- des articulatórias envolvidas na produção dos segmentos consonantais e vocálicos. De
fios para a ciência. O som deve ser transmitido nitidamente para que não se perca
posse deste instrumental podemos descrever, classificar e transcrever os sons da nossa
conteúdo de informação. A transmissão dos meios de comunicação - como rádio e
faia. O instrumental a ser apresentado nas próximas páginas permite-nos descrever
televisão depende de pesquisa nesta área. Obter-se um meio eficaz, rápido e
econômico de transmitir a fala são ambições desta área de pesquisa. Formação: qualquer som de qualquer língua natural. Neste livro enfatizamos a descrição dos sons
Graduação em Computação, Física e Lingüística e pós-graduação em áreas afins. do português brasileiro.
A fonética é a ciência que apresenta os métodos para a descrição, classificação e
Zoo-Biologia: Definir os parâmetros envolvidos na comunicação animal e caracteri- transcrição dos sons da fala, principalmente aqueles sons utilizados na linguagem hu-
zar a organização dos sistemas lingüísticos animais são tópicos de pesquisa na área mana. As principais áreas de interesse da fonética são:
de zoo-biologia. Linguagens de chimpanzés, golfinhos, baleias e abelhas são relativa-
mente bem estudadas. Faz-se relevante caracterizar as relações de comunicação en-
Fonética articulatória- Compreende o estudo da produção da fala do ponto de
tre diversos membros de uma mesma espécie em diferentes regiões do planeta. For-
vista fisiológico e articulatório.
mação: Graduação em Lingüística, Biologia, Zootecnia e pós-graduação em áreas
afins.
Fonética auditiva - Compreende o estudo da percepção da fala.
Lingüística forense: A fala de um indivíduo apresenta características específicas e
únicas. Estudos têm sido realizados para caracterizar as particularidades da fala indi- Fonética acústica - Compreende o estudo das propriedades físicas dos sons da
vidual e definir os parâmetros do que corresponde à "impressão digital" da fala. fala a partir de sua transmissão do falante ao ouvinte.
Espera-se que o progresso nesta área de pesquisa permita a utilização de evidências
da fala em tribunais. Formação: Graduação em Lingüística com complementação Fonética instrumental - Compreende o estudo das propriedades físicas da fala,
das áreas de Física e Direito. Pós-graduação em áreas afins. levando em consideração o apoio de instrumentos laboratoriais.
Lingüística indígena: Temos hoje aproximadamente 120 línguas indígenas faladas
em todo o território brasileiro. Destas, apenas umas poucas foram amplamente estu- Nas próximas páginas, investigamos aspectos fonéticos do português brasileiro
dadas. Do ponto de vista teórico o estudo destas línguas permite a ampliação do do ponto de vista articulatório com o objetivo de entendermos a produção dos sons que
conhecimento dos mecanismos que regulam as línguas naturais. Do ponto de vista utilizamos em nossa fala.
prático registra-se tecnicamente a língua nativa que pode ser eventualmente utilizada
em projetos educacionais se for de interesse da comunidade. Formação: Graduação
em Lingüística, Letras, Antropologia e pós-graduação em áreas afins.

Nota: Os trechos do livro que possuem informações complementares no CD estão indicados por um
ícone ((!\ ), acompanhado do número da faixa respectiva.
24 Fonética - O aparelho fonador Fonética - O aparelho fonador 25

2. O aparelho fonador a entrada de comida nos pulmões por meio do abaixamento da epiglote. A epiglote é a
parte com mobilidade que se localiza entre a parte final da língua (ao fundo da gargan-
Os órgãos que utilizamos na produção da fala não têm como função primária a ta) e acima da laringe (cf. figura 1). O ato de engasgar envolve o fato de que a epliglote
articulação de sons. Na verdade, não existe nenhuma parte do corpo humano cuja única não obstruiu a entrada de alimento no sistema respiratório. O ar dos pulmões sai então
função esteja apenas relacionada com a fala. As partes do corpo humano que utilizamos visando a impedir a entrada do corpo estranho (o alimento) no sistema respiratório.
na produção da fala têm como função primária outras atividades diferentes como, por O sistema articulatório consiste da faringe, da língua, do nariz, dos dentes e dos
exemplo, mastigar, engolir, respirar ou cheirar. Entretanto, para produzirmos qualquer lábios. Ou seja, das estruturas que se encontram na parte superior à glote (cf. figura 1).
som de qualquer língua fazemos uso de uma parte específica do corpo humano que São várias as funções primárias desempenhadas pelos órgãos do sistema articulatório.
denominaremos de aparelho fonador. Estas funções relacionam-se principalmente com o ato de comer e podemos salientar:
Com o objetivo de compreend~rmos o mecanismo de produção da fala e da arti- morder, mastigar, sentir o paladar, cheirar, sugar, engolir.
culação dos sons é que passamos, então, à descrição do aparelho fonador. Podemos Os três sistemas descritos acima caracterizam o aparélho fonador e são fisiolo-
dividir em três grupos os órgãos do corpo humano que desempenham um papel na gicamente responsáveis pela produção dos sons da fala. Levando-se em consideração
produção da fala: o sistema respiratório, o sistema fonatório e o sistema articulatório. as características fisiológicas do aparelho fonador, podemos afirmar que há um número
limitado de sons possíveis de ocorrer nas línguas naturais. Isto deve-se ao fato de ser
fisiologicamente impossível articular um som em que a língua toca a ponta do nariz.
Por outro lado, sons cuja articulação envolve a língua tocar os dentes incisivos supe-
Sistema articulatório riores são atestados em inúmeras línguas. Em outras palavras, enquanto certas articula-
(faringe língua, nariz, palato, ções são fisiologicamente impossíveis, outras são recorrentes.
dentes, lábios)
Considerando-se, portanto, as limitações fisiológicas impostas ao aparelho fonador,
podemos dizer que o conjunto de sons possíveis de ocorrer nas línguas naturais é limi-
tado. Na verdade, um conjunto de aproximadamente 120 símbolos é suficiente para
Sistema fonatório categorizar as consoantes e vogais que ocorrem nas línguas naturais.
(laringe onde está a glote) Considerando que seres humanos sem patologia apresentam um aparelho fonador
semelhante (variando quanto às dimensões dos órgãos), podemos deduzir que toda e
qualquer pessoa sem deficiências fisiológicas seja capaz de pronunciar todo e qual-
quer som em qualquer língua. Tal afirmação é verdadeira. Porém, parece que na ado-
Sistema respiratório lescência a capacidade das pessoas de articularem sons novos (de línguas estrangei-
(pulmões, músculos pulmonares, ras) passa a ser reduzida. Precisar exatamente esta idade e as razões que levam a essa
brônquios, traquéia)
perda da capacidade de produção de sons novos, certamente nos levaria muito além
do objetivo deste livro. O que podemos explicar aqui é o fato de que a maioria das
Figura 1: Os sistemas respiratório, fonatório e artículatórío crianças que venham a estar expostas a uma segunda língua falarão esta língua sem
qualquer sotaque. Adultos que sejam expostos a uma segunda língua, quase que em
sua totalidade apresentam sotaque com características de sua língua materna.
Consideremos cada um dos sistemas ilustrados acima. O sistema respiratório Descrevemos acima o aparelho fonador. Nas próximas páginas discutimos a pro-
consiste dos pulmões, dos músculos pulmonares, dos tubos brônquios e da traquéia. O dução de segmentos consonantais e vocálicos que são possíveis de ser articulados pelo
sistema respiratório encontra-se na parte inferior à glote, que é denominada cavidade aparelho fonador. Nosso objetivo_é fornecer um instrumental que permita a descrição e
infraglotal (cf. figura 1). A função primária do sistema respiratório é obviamente a classificação dos sons do português brasileiro. Portanto, damos ênfase à caracterização
produção da respiração. dos segmentos consonantais e vocálicos que ocorrem nesta língua. Outras línguas po-
O sistema fonatório é constituído pela laringe. Na laringe localizam-se múscu- dem ser utilizadas para ilustrar aspectos que não ocorrem no português. Descrevemos
los estriados que podem obstruir a passagem da corrente de ar e são denominados inicialmente os segmentos consonantais e, posteriormente, consideramos a descrição
cordas vocais. O espaço decorrente da não obstrução destes músculos laríngeos é dos segmentos vocálicos.
chamado de glote. A função primária da laringe é atuar como uma válvula que obstrui
26 Fonética - A descrição dos segmentos consonantais Fonética - A descrição dos segmentos consonantais 27

Ql. Qual o mecanismo da corrente de ar?


3. A descrição dos segmentos consonantais Poucos sons produzidos por seres humanos podem ser descritos sem levarmos em
consideração o mecanismo da corrente de ar. Entre os sons que não fazem uso do meca-
Todas as línguas naturais possuem consoantes e vogais. Entenderemos por seg-
nismo de corrente de ar em sua produção o mais conhecido é o ranger dos dentes. A
mento consonantal um som que seja produzido com algum tipo de obstrução nas
corrente de ar pode ser pulmonar, glotálica ou velar. Os segmentos consonantais do
cavidades supraglotais de maneira que haja obstrução total ou parcial da passagem da
corrente de ar podendo ou não haver fricção. Por outro lado, na produção de um seg-
português são produzidos com o mecanismo de corrente de ar pulmonar. Este é o meca- 2
nismo utilizado normalmente no ato de respirar. O mecanismo de corrente de ar glotálico
mento vocálico a passagem da corrente de ar não é interrompida na linha central e
não ocorre em português e o mecanismo de corrente de ar velárico ocorre em algumas
portanto não há obstrução ou fricção. Certos segmentos têm carncterísticas fonéticas
exclamações de deboche e negação.
não tão precisas, seja de consoante ou de vogal. Estes segmentos são d:nominados .na
literatura de semi vogais, sernicontóides ou glides. Adotamos o termo ghde (pronuncia-
Q2. A corrente de ar é ingressiva ou egressiva?
se "gl[ai]de") para referir a tais segmentos. Segmentos vocálicos e glides são tratados
Em sons produzidos com a corrente de ar egressiva o ar se dirige para fora dos
após a descrição dos segmentos consonantais.
pulmões e é expelido por meio da pressão exercida pelos múscl_llos do diafragma. Os
A descrição apresentada abaixo segue parâmetros articulatórios. Há ainda a pos-
segmentos consonantais do português são produzidos com a corrente de ar egressiva. Já
sibilidade de caracterizar segmentos adotando-se parâmetros acústicos. Tais parâmetros
nos sons produzidos com uma corrente de ar ingressiva o ar se dirige de fora para dentro
descrevem as propriedades físicas dos sons da fala. Recomendamos a leitura de Fry
dos pulmões (como se estivéssemos "engolindo" ar). A corrente de ar ingressiva ocorre
( 1979) aos interessados em investigar aspectos teóricos da descrição acústica. Um texto
em exclamações de surpresa de certos falantes do francês e não ocorre em português.
em português que aborda aspectos acústicos da fala é Motta Maia (1985).
Classificamos as consoantes de acordo com a proposta apresentada em
Q3. Qual o estado da glote?
Abercrombie (1967). Embora tenha sido publicado há tres décadas o texto de
A glote é o espaço entre os músculos estriados que podem ou não obstruir a passa-
Abercrombie oferece recursos teóricos ainda atuais, sendo a obra mais adequada para a
gem de ar dos pulmões para a faringe. Estes músculos são éhamados de cordas vocais.
caracterização dos parâmetros articulatórios dos sons da fala. Na produção de segmen-
Diremos que o estado da glote é vozeado (ou sonoro) quando as cordas vocais estive-
tos consonantais os seguintes parâmetros são relevantes: o mecanismo e direção da
rem vibrando durante a produção de um determinado som. Em outras palavras, durante
corrente de ar; se há ou não vibração das cordas vocais; se o som é nasal ou oral; quais
a produção de um som vozeado os músculos que formam a glote aproximam-se e devi-
são os articuladores envolvidos na produção dos sons e qual é a maneira utilizada na
do a passagem da corrente de ar e da ação dos músculos ocorre vibração. Em oposição,
obstrução da corrente de ar. A descrição articulatória de qualquer segmento c~nsona~tal
denominamos o estado da glote de desvozeado (ou surdo) quando não houver vibração
é possível a partir das respostas a estes parâmetros. Faremos uso das questoes abaixo
das cordas vocais. Não há vibração das cordas vocais nem ocorre ruído durante a produ-
para a melhor compreensão desta descrição.
ção de um segmento desvozeado. Isto se dá porque os músculos que formam a glote
Ql. Qual o mecanismo da corrente de ar? encontram-se completamente sepai·ados de maneira que o ar passa livremente. Na ver-
dade as categorias vozeado e desvozeado podem ser interpretadas como limites de um
Q2. A corrente de ar é ingressiva ou egressiva? contínuo que faz uma gradação de sons vozeados a sons desvozeados (passando por
sons que têm características de vozeamento intennediárias ). Por exemplo, os sons [b,d,g]
Q3. Qual o estado da glote? no português são produzidos com a vibração das cordas vocais e são portanto sons
vozeados. Já em inglês os sons [b,d,g] são produzidos com a vibração das cordas vocais
Q4. Qual a posição do véu palatino?
em um grau menor do que aquele observado para o português. Embora os sons [b,d,g]
QS. Qual o articulador ativo? sejam vozeados tanto em português quanto em inglês ao fazermos uma descrição destes
sons em cada uma destas línguas devemos caracterizar os diferentes graus de vozeainento:
Q6. Qual o articulador passivo? completamente vozeados em português e parcialmente vozeados em inglês. Entretanto,
estas duas modalidades - vozeado e desvozeado - são suficientes para o propósito da
Q7. Qual o grau e natureza da estritura? descrição dos segmentos consonantais apresentada aqui. Observe a vibração (ou não)
das cordas vocais na produção dos sons v e f.
Passemos então a consideração de cada uma destas perguntas em detalhes.
28 Fonético A descrição dos segmentos consonontois Fonético - A descrição dos segmentos consonontois 29

possível (somente as vogais devem ser pronunciadas!). O que você deverá observar é
Tarefa que durante a produção da vogal a a úvula deverá estar levantada portanto o ar não terá
Coloque a sua mão espalmada contra a parte central anterior do pescoço (onde nos acesso à cavidade nasal e não haverá ressonância nesta cavidade. Temos então um som
homens temos o "Pomo de Adão"). Pronuncie então o som inicial da palavra "vá" de oral. Na produção da vogal ã a úvula deverá estar abaixada e o ar deve então penetrar na
maneira contínua (verifique que apenas a consoante esteja sendo pronunciada). cavidade nasal havendo ali ressonância. Temos então um som nasal. Concentre-se agora
Agora pronuncie da mesma maneira continuada o som inicial da palavra "fé". Faça a
na posição assumida por sua própria úvula na produção de um segmento oral e nasal.
alternância entre v e f algumas vezes (Pronuncie apenas a consoante!). Você deve
observar que durante a produção de v haverá vibração transferida para a sua mão
3
A e que durante a produção de f a vibração não ocorre. O som v é vozeado e o som f
~ é desvozeado.
Tarefo
Alterne a pronúncia de a e ã sentindo a mudança de posição da úvula.

No diagrama abaixo ilustramos o caso em que as cordas vocais estão vibrando e


portanto temos um segmento vozeado ou sonoro (esquerda) e o caso em que as cordas Observar a posição da própria úvula durante a produção de segmentos consonantais
vocais não estão vibrando e temos um som desvozeado ou surdo (direita). não é tão simples, mas vale a pena tentar verificar se o véu palatino encontra-se levanta-
do na produção dos segmentos orais p,l em oposição ao seu abaixamento na produção
dos segmentos nasais m,n. Para isto, articule cada um destes segmentos consonantais
cordas vocais
cordas vocais alternadamente observando a mudança de posição da úvula, (articule somente a consoan-
te!). A figura abaixo ilustra uma articulação com o véu palatino levantado - quando
ocorre um segmento oral (esquerda)- e uma articulação com o véu palatino abaixado-
quando ocorre um segmento nasal (direita). Qualquer segmento produzido com o véu
palatino levantado obstruindo a passagem do ar para a cavidade nasal é chamado de
oral (figura à esquerda). Um segmento produzido com o abai.xamento do véu palatino
de maneira que haja ressonância na cavidade nasal é chamado de nasal (figura à direita).

Figura 2: O estado da glote em segmentos vozeados (esquerda) e desvozeados (direita).

Na figura da direita os músculos que formam as cordas vocais estão separados e


não vibram com a passagem da corrente de ar que vem dos pulmões. Na figura da
esquerda os músculos que formam as cordas vocais vibram com a passagem da corren-
te de ar que vem dos pulmões.

Q4. Qual a posição do véu palatino?


Para observarmos a oposição entre um segmento oral e um segmento nasal deve-
mos nos concentrar na posição do véu palatino. Para isto, podemos acompanhar o que
Figura 3: A posição da úvu/a na produção de segmentos orais (esquerda) e segmentos nasais
acontece com a úvula, pois ela localiza-se no final do véu palatino ou palato mole. A (direita)
úvula é comumente chamada de "campainha". É aquela "gota de carne" que vemos
quando observamos a boca de uma pessoa aberta (por exemplo para ver se a pessoa está QS. Qual o articulador ativo?
com dor de garganta (consulte a figura 5). Peça a um colega para alternar a pronúncia da Os articuladores ativos têm a propriedade de movimentar-se (em direção ao
vogal a (como em "lá") com a vogal ã (como em "lã") mantendo a boca o mais aberta articulador passivo) modificando a configuração do trato vocal. Os articuladores ativos
30 Fonética A descrição dos segmentos consonantais Fonética - A descrição dos segmentos consonantais 31

são: o lábio inferior (que modifica a cavidade oral), a língua (que modifica a cavidade
oral), o véu palatino (que modifica a cavidade nasal) e as cordas vocais (que modifi-
cam a cavidade faringa!). Eles são denominados articuladores ativos devido ao seu
papel ativo (no sentido de movimento) na articulação consonantal (em oposição aos alvéolos
articuladores passivos que são discutidos abaixo). Identifique cada um dos articuladores
na figura abaixo.

úvula

lâmina

Figura 5: Esquema ressaltando os alvéolos,. o ápice e lâmina da língua e a úvu/a

Note que tanto o ápice quanto a lâmina da língua localizam-se na parte mais
frontal da língua. Enquanto o ápice localiza-se na borda lateral frontal da língua, a
lâmina localiza-se na borda superior frontal da língua. Nos segmentos consonantais do
português não é relevante se o articulador ativo é o ápice ou a lâmina da língua. Contu-
do, tal parâmetro articulatório é relevante em outras línguas.

Q6. Qual o articulador passivo?


1. Cavidade oral 8. Palato duro 15. Parte anterior da língua Os articuladores passivos localizam-se na mandíbula superior, exceto o véu palatino
2. Cavidade nasal 9. Véu palatino (ou palato mole) 16. Parte média da língua
10. Úvula 17. Parte posterior da língua
que está localizado na parte posterior do palato. Os articuladores passivos são o lábio
3. Cavidade nasofaringal
4. Cavidade faringa! 11 . Lábio inferior 18. Epiglote superior, os dentes superiores e o céu da boca que divide-se em: alvéolos, palato duro,
5. Lábio superior 12. Dentes inferiores 19. Laringe véu palatino (ou palato mole) e úvula conforme ilustrado na figura 4. Note que o véu
6. Dentes superiores 13. Ápice da língua 20. Esôfago
palatino pode atuar como articulador ativo (na produção de segmentos nasais) ou como
?.Alvéolos 14. Lâmina da língua 21. Glote
articulador passivo (na articulação de segmentos velares).

Figura 4: O aparelho fonador e os articuladores passivos e ativos, as cavidades oral, nasal, Vejamos a relação entre articuladores ativos e passivos. A partir da posição do
faringa/ e a glote (cordas vocais) articulador ativo em relação ao articulador passivo (podendo ou não haver o contato
entre eles) podemos definir o lugar de articulação dos segmentos consonantais de
A língua é dividida em ápice, lâmina, parte anterior, parte medial e parte poste- acordo com as categorias listadas abaixo. Os números que se encontram entre parênte-
rior. O céu da boca é dividido em alvéolos, palato duro, véu palatino (ou palato mole) e ses indicam o número correspondente ao articulador - ativo ou passivo na figura 4.
úvula. Observe que o véu palatino pode também ser denominado palato mole. Identifi- Observe que as letras em negrito referem-se a pronúncia associada a tal letra. A relação
que o ápice e a lâmina da língua, a úvula e os álveolos na figura 5 apresentada a seguir. letra/som não é uma relação direta um-a-um. Temos casos em que uma letra corresponde
32 Fonética - A descrição dos segmentos consonantais Fonética - A descrição dos segmentos consonantais 33

a dois sons diferentes - como por exemplo c em "cá" e em "cela". Temos também ção da c01Tente de ar causada pelos articuladores durante a produção de um segmento.
casos em que o mesmo som é representado por duas letras diferentes - como por exem- Identificando o "grau e natureza da estritura" (ou seja, a maneira como se dá a obstru-
plo cem "cela" e sem "sela". O leitor deve estar atento para o fato de que nos exem- ção da corrente de ar) estamos caracterizando a sua maneira ou modo de articulação.
plos apresentados aqui estamos interessados nos sons produzidos e não nas letras cor- As categorias referentes ao grau e a natureza da estritura são listadas abaixo responden-
respondentes a estes sons. Para uma discussão detalhada da relação letra/som veja Lemle do a sétima e última pergunta proposta por Abercrombie (1967).
(1987), Cagliari (1989) e Faraco (1994). Listamos a seguir as categorias de lugar de
articulação que são relevantes para a descrição do português. Q7. Qual o grau e natureza da estritura?
Estritura é o termo técnico para a posição assumida pelo articulador ativo em
Lugar de articulação relação ao articulador passivo, indicando como e em qual grau a passagem da corrente
de ar através do aparelho fonador (ou trato vocal) é limitada neste ponto [Abercrombie
Bilabial: O articulador ativo é o lábio inferior (11) e como articulador passivo temos o (1967:44)]. A partir da natureza da estritura classificamos os segmentos consonantais
lábio superior (5). Exemplos: pá, boa, má. quanto à maneira ou modo de articulação. Definimos abaixo as categorias de estritura
relevantes para a descrição do português.
Labiodental: O articulador ativo é o lábio inferior (11) e como articulador passivo te-
mos os dentes incisi~os superiores (6). Exemplos: faca, vá.
Dental: O articulador ativo é ou o ápice ou a lâmina da língua (13 ou 14) e como Modo ou maneira de articulação
articulador passivo temos os dentes incisivos superiores (6). Exemplos: data, sapa, Zapata,
nada, lata. Oclusiva: Os articuladores produzem uma obstrução completa da passagem da corrente
de ar através da boca. O véu palatino está levantado e o ar que vem dos pulmões encami-
Alveolar: O articulador ativo é o ápice ou a lâmina da língua ( 13 ou 14) e como articulador nha-se para a cavidade oral. Oclusivas são portanto consoantes orais. As consoantes
passivo temos os alvéolos (7). Consoantes alveolares diferem de consoantes dentais oclusivas que ocorrem em português são (brevemente identificaremos os símbolos fonéti-
apenas quanto ao articulador passivo. Em consoantes dentais temos como articulador cos que serão utilizados em transcrições): pá, tá, cá, bar, dá, gol.
passivo os dentes superiores. Já nas consoantes alveolares temos os alvéolos como
articulador passivo. Exemplos: data, sapa, Zapata, nada, lata. Nasal: Os articuladores produzem uma obstrução completa da passagem da corrente de
ar através da boca. O véu palatino encontra-se abaixado e o ar que vem dos pulmões
Alveopalatal (ou pós-alveolares): O articulador ativo é a parte anterior da língua ( 15) e
dirige-se às cavidades nasal e oral. Nasais são consoantes idênticas às oclusivas diferen-
o articulador passivo é a parte medial do palato duro (8). Exemplos: tia, dia (no dialeto
ciando-se apenas quanto ao abaixamento do véu palatino para as nasais. As consoantes
carioca), chá, já.
nasais que ocorrem em português são: má, nua, banho.
Palatal: O articulador ativo é a parte média da língua (16) e o articulador passivo é a
parte final do palato duro (8). Exemplos: banha, palha. Fricativa: Os articuladores se aproximam produzindo fricção quando ocorre a passa-
gem central da corrente de ar. A aproximação dos articuladores entretanto não chega a
Velar: O articulador ativo é a parte posterior da língua ( 17) e o articulador passivo é o causar obstrução completa e sim parcial que causa a fricção. As consoantes fricativas
véu palatino ou palato mole (9). Exemplos: casa, gata, rata (o som r de "rata" varia que ocorrem em português são: fé, vá, sapa, Zapata, chá, já, rata (em alguns dialetos o
consideravelmente dependendo do dialeto em questão. Indicamos aqui a pronúncia ve- som r de "rata" pode ocorrer como uma consoante vibrante, descrita a seguir, e não
lar que ocorre tipicamente no dialeto carioca. Uma discussão detalhada dos sons der em como uma consoante fricativa indicada aqui. O r fricativo ocorre tipicamente no portu-
português será apresentada posteriormente). guês do Rio de Janeiro e Belo Horizonte, por exemplo).
Glotal: Os músculos ligamentais da glote (21) comportam-se como articuladores. Exem-
Africada: Na fase inicial da produção de uma africada os articuladores produzem uma
plo: rata (na pronúncia típica do dialeto de Belo Horizonte).
obstrução completa na passagem da corrente de ar através da boca e o véu palatino
encontra-se levantado (como nas oclusivas). Na fase final dessa obstrução (quando se
As categorias listadas acima caracterizam os lugares de articulação dos segmen- dá a soltura da oclusão) ocorre então uma fricção decorrente da passagem central da
tos consonantais relevantes para a descrição do português. Uma vez definido o lugar corrente de ar (como nas fricativas). A oclusiva e a fricativa que formam a consoante
de articulação de um segmento sabemos qual é o articulador passivo e qual é o africada devem ter o mesmo lugar de articulação, ou seja, são homorgânicas. O véu
articulador ativo envolvido na articulação. Além de identificarmos o lugar de articula- palatino continua levantado durante a produção de uma africada. Africadas são portanto
ção de um segmento, devemos caracterizar a sua maneira ou modo de articulação. consoantes orais. As consoantes africadas que ocorrem em algumas variedades do portu- .
A maneira ou modo de articulação de um segmento está relacionada ao tipo de obstru- guês brasileiro são tia, dia. Imagine as pronúncias "tchia" e "djia" para estes exemplos.
34 Fonética - Articulações secundárias Fonética - Articulações secundárias 35

Para alguns falantes de Cuiabá, consoantes africadas ocorrem em palavras como "chá" dizemos que a labialização é uma propriedade articulatória secundária da consoante em
e "já" (que são pronunciadas como "tchá" e "djá" respectivamente). Na maioria dos questão. Propriedades articulatórias secundárias geralmente ocorrem de acordo com o
dialetos do português brasileiro temos uma consoante fricativa nas palavras "chá" e "já". contexto ou ambiente, ou seja, a partir de efeitos de segmentos adjacentes. Para marcar-
Tepe (ou vibrante simples): O articulador ativo toca rapidamente o articulador passivo mos uma propriedade articulatória secundária utilizamos um diacrítico ou símbolo adi-
ocorrendo uma rápida obstrução da passagem da corrente de ar através da boca. O tepe cional junto à consoante em questão. A propriedade adicional de labialização descrita
oc01Te em português nos seguintes exemplos: cara, brava. acima é condicionada ao fato de uma consoante ser seguida de uma vogal produzida
Vibrante (múltipla): O articulador ativo toca algumas vezes o articulador passivo cau- com arredondamento dos lábios. Abaixo listamos as articulações secundárias dos seg-
sando vibração. Em alguns dialetos do português ocorre esta variante em expressões mentos consonantais relevantes para o português.
como "orra meu!" ou em palavras como "marra". Certas variantes do estado de São Labialização: Consiste no arredondameto dos lábios durante a produção de um seg-
Paulo e do português europeu apresentam uma consoante vibrante nestes exemplos. mento consonantal. A consoante que apresenta a propriedade secundária de labialização
-
Retroflexa: O palato duro é o articulador passivo e a ponta da língua é o articulador é seguida de uma vogal que é produzida com o arredondamento dos lábios. A labialização
ativo. A produção de uma retroflexa geralmente se dá com o levantamento e encurvamento geralmente ocorre quando a consoante é seguida de vogais arredondadas (orais ou na-
da ponta da língua em direção do palato duro. Ocorrem no dialeto "caipira" e no sotaque sais) como em "tutú, só, bolo, rum, som". Utilizamos o símbolo w colocado acima à
de norte-americanos falando português como nas palavras: mar, carta. direita do segmento para marcar a labialização: pw, bw, tw, dw, kw, gw, fw, v'V, sw, zw, Jw, 3 w,
X'V, h\"', m'V, nw, lw, rw·, fw; Jw.
Laterais: O articulador ativo toca o articulador passivo e a corrente de ar é obstruída na
linha central do trato vocal. O ar será então expelido por ambos os lados desta obstrução Palatalização: Consiste no levantamento ela língua em direção a parte posterior cio pa-
tendo portanto saída lateral. Laterais oc01Tem em português nos seguintes exemplos: lá, lato duro, ou seja, a língua direciona-se para uma posição anterior (mais para a frente da
palha, sal (da maneira que "sal" é pronunciada no sul do Brasil ou em Portugal). cavidade bucal) cio que normalmente ocorre quando se articula um determinado seg-
mento consonantal. A consoante que apresenta a propriedade secundária de palatalização
apresenta um efeito auditivo de seqüência ele consoante seguida da vogal i. A palatalização
Classificamos os segmentos consonantais quanto ao mecanismo da corrente de ar
geralmente ocorre quando uma consoante é seguida de vogais anteriores i, e, é (orais ou
(egressiva); ao vozeamento ou desvozeamento; a oralidade/nasalidade; ao lugar e modo
nasais). Ocorre mais freqüentemente com consoantes seguidas ela vogali como em "aliado,
de articulação. A notação dos segmentos consonantais segue a seguinte ordem: kilo, guia". Pode ocorrer também em consoantes seguidas da vogal e como em "letra,
leva, tento". Utilizamos o símbolo j colocado acima à direita cio segmento para marcar
a palatalização: ki, gi, ti, di, li.
Notação dos segmentos consonantais
Velarização: Consiste no levantamento ela parte posterior ela língua em direção ao véu
(Modo de articulação + Lugar de articulação + Grau de Vozeamento) palatino concomitantemente com a articulação de um determinado segmento consonantal.
Exemplos: A consoante lateral l apresenta a propriedade articulatória secundária de velarização em
[p] Oclusiva bilabial clesvozeacla certos dialetos do sul cio Brasil e do português europeu. O contexto em que a velarização
[b] Oclusiva bilabial vozeacla ocorre é quando a lateral encontra-se em final de sílaba: sal, salta. Utilizamos o símbolo
[t] para transcrever a lateral velarizacla que acabamos de descrever.
A seguir tratamos de aspectos de articulações secundárias que podem ser produzi- Dentalização: Algumas consoantes em português podem ser articuladas como dentais
dos concomitantemente com uma determinada articulação consonantal. ou alveolares. Por exemplo a pronúncia ele t em "tapa" pode se dar com a ponta ela
língua tocando os cientes (sendo portanto uma consoante dental) ou pode se dar com a
ponta ela língua tocando os alvéolos (sendo portanto uma consoante alveolar). Consoantes
dentais têm como articulador passivo os cientes incisivos superiores e consoantes alveo-
4. Articulacões secundárias lares tem como articulador passivo os alvéolos. Pode-se articular um segmento dental ou
,
alveolar com o ápice ou com-a lâmina da língua como articulador ativo. Note que o fato
ela consoante ser dental ou alveolar expressa uma variação lingüística dialetal (ou de
Segmentos consonantais podem ser produzidos com uma propriedade ar-
idioleto) e não uma variação que seja condicionada pelo contexto (como é o caso ele
ticulatória secundária em relação às propriedades articulatórias fundamentais deste articulações secundárias apresentadas acima). Geralmente as consoantes listadas abaixo
segmento. Por exemplo, quando pronunciamos uma seqüência como su certamente apresentam a propriedade de clentalização no dialeto paulista enquanto no dialeto mi-
arredondamos os lábios durante a articulação da consoantes. Uma vez que a articula- neiro ocorre uma articulação alveolar para as mesmas consoantes. Marcamos a clentalização .
ção de segmentos consonantais nonnalmente não envolve o arredondamento dos lábios com o símbolo [ _ ] colocado abaixo da consoante em questão: !, q, ~, z,, !}, (, !.
36 Fonética - Tabela fonética consonantal Fonética - Tabela fonética consonantal 37

Você deve avaliar o comportamento de sua fala em relação as articulações secun- Dental
Articulação
dárias discutidas acima. Ao fazer o registro fonético de palavras do português omitiremos Bilabial Labiodental ou Alveopalatal Palatal Velar Glotal
Maneira Lugar
Alveolar
as propriedades articulatórias secundárias (exceto a velarização da lateral [±]).Nossa
escolha pauta-se em dois tipos básicos de transcrições que podem ser assumidas. Podemos Oclusiva desv p t k
voz b d g
ter uma transcrição fonética ampla ou uma transcrição fonética restrita [(cf.
Ladefoged ( 1982)]. Ao transcrevermos foneticamente uma palavra como "quilo" pode- Africada desv tj
voz d3
mos por exemplo registráela como [ikiilwu] ou como ['kilu]. A transcrição [ikiilwu]
explicita todos os detalhes observados articulatoriamente. Este tipo de transcrição é Fricativa desv f s s X h
voz V z 3 y fi
denominado transcrição fonética restrita. Note que na transcrição [ 1kiilwu]
explicitamos a palatalização de [k] seguido de [i] e também a labialização de [l] segui- Nasal VOZ m n J1 y
do de [u]. Tanto a palatalização quanto a labialização são previsíveis pela oc01rência Tepe voz f

do segmento seguinte: consoantes tendem a ser palatalizadas quando seguidas de [i] e Vibrante voz f
consoantes tendem a ser labializadas quando seguidas de [u].
Retroflexa voz J
Consideremos agora uma transcrição como [1kilu]. Este tipo de transcrição explicita
apenas as propriedades segmentais e omite os aspectos condicionados por contexto ou Lateral VOZ 1 t ÁV
características específicas da língua ou dialeto. Queremos dizer com isto que a Tabela: Símbolos fonéticos consonantais relevantes para transcrição do português
palatalização e labialização não foram registradas em [1kilu] (pois tanto a palatalização
quanto a labialização são previsíveis pela vogal seguinte). No registro do [l] pode-se O quadro abaixo lista exemplos de palavras que ilustram cada um dos segmentos
interpretá-lo como um segmento alveolar ou dental sem haver a necessidade de utili- da tabela fonética apresentada acima. No exemplo ortográfico a letra (ou letras) em
zar-se o símbolo [ l ]. Isto porque a generalização quanto aos segmentos serem negrito corresponde(m) ao segmento consonantal cujo símbolo fonético é apresentado
dentalizados deve ser expressa para a língua como um todo. No caso da língua fazer na primeira coluna. A segunda coluna lista a nomenclatura do segmento consonantal. A
distinção entre segmentos alveolares e dentais faz-se então relevante acrescentar o forma ortográfica do exemplo é apresentada na terceira coluna e a representação foné-
diacrítico [ " J à transcrição fonética. Denomina-se transcrição fonética ampla aque- tica correspondente é fornecida na quarta coluna. Finalmente, a última coluna apresen-
la transcrição que expljcita apenas os aspectos que não sejam condicionados por con- ta observações quanto a região dialetal predominante de ocorrência do segmento em
questão. Note que as transcrições fonéticas encontram-se entre colchetes. Adotamos o
texto ou características específicas da língua ou dialeto: como [1kilu] (em oposição a
símbolo [a] para as vogais transcritas abaixo (exceto para [i] em "tia, dia"). O símbolo
[ikiilwu] que é uma transcrição fonética restrita).
(1] precede a sílaba acentuada.
Neste trabalho adotamos a transcrição fonética ampla. Ao registrar os segmentos
consonantais omitimos o registro das propriedades articulatórias secundárias previstas por Símbolo
Classificação do Exemplo Transcrição
Observação*
5
segmento consonantal ortográfico fonética
contexto da vogal seguinte (palatalização, labialização) ou a dentalização (que pode ser
interpretada como uma característica dialetal). Marcamos, contudo, a velarização da late- p Oclusiva bilabial pata [lpata] Uniforme em todos os dialetos do português
ral [t] cujo contexto de ocorrência depende da estrutura silábica: posição final de sílaba. desvozeada brasileiro.

b Oclusiva bilabial bala ['bala] Uniforme em todos os dialetos do português


vozeada brasileiro.

t Oclusiva alveolar tapa tapa]


[1 Uniforme em todos os dialetos do português
desvozeada brasileiro podendo ocorrer com articulação
5. Tabela fonética consonantal alveolar ou dental.
d Oclusiva alveolar data [ldata] Uniforme em todos os dialetos do português
Apresentamos abaixo uma tabela consonantal que lista os segmentos consonantais vozeada brasileiro podendo ocorrer com articulação
que ocorrem no português brasileiro. A coluna da esquerda lista o modo ou maneira de alveolar ou dental.

aiticulação a partir da natureza da estritura conforme definido ante1iormente. Quando k Oclusiva velar capa [lkapa] Uniforme em todos os dialetos do português
relevante, foi indicado o estado da glote separando, portanto, segmentos vozeados e desvozeada brasileiro.

desvozeados. Na parte superior indicamos o lugar de articulação definido conforme a g Oclusiva velar gata [lgata] Uniforme em todos os dialetos do português
vozeada brasileiro.
relação entre o articulador ativo e o articulador passivo.
38 Fonética - Tabela fonética consonantal Fonética - Tabela fonética consonantal 39

6 Símbolo
Classificação do Exemplo Transcrição
Observação Símbolo
Classificação do Exemplo Transcrição
Observação
7
segmento consonantal ortográfico fonética segmento consonantal ortográfico fonética

tJ IAfricada alveopalatal 1 tia [ 1tJia] Pronúncia típica do Sudeste brasileiro. Corres- h Fricativa glotal sílaba quando segui elo por consoante clesvozeacla:
desvozeada ponde ao primeiro som da palavra "tcheco-eslo- desvozeada "carta" e em final de sílaba que coincide com
váquia" em todos os dialetos. Ocorre também final ele palavra: "mar".
em outras regiões menos delimitadas (como
N01te e Nordeste). fi Fricativa glotal carga [1ka.figa] Pronúncia típica cio dialeto ele Belo Horizon-
vozeada ty ..f\!.ão ocorre fricção audível no trato vocal.
d3 Africada alveopalatal dia [ 1d3ia] Pronúncia típica do Sudeste brasileiro. Ocorre Ocorre cm final ele sílaba seguida ele consoan-
vozeada também em outras regiões menos delimitadas te vozeada.
(como N01te e Nordeste).
m Nasal bilabial mala [lmala] Unifonne em todos os dialetos do português
f Fricativa labiodental faca [ 1faka] Unifmme em todos os dialetos do português vozeada brasileiro.
desvozeada - brasileiro.
n Nasal alveolar nada [1nada] Uniforme em todos os dialetos cio português
V Fricati va labiodental vaca [ 1vaka] Unifonne em todos os dialetos do português vozeada brasileiro, podendo ocorrer com articulação
vozeada brasileiro. alveolar ou dental.

s Fricativa alveolar
desvozeada
- sala
caça
[ 1sala]
[ 1kasa]
Uniforme em início de sílaba em todos os dia-
letos do pottuguês brasileiro podendo ocorrer
J1
Oj.1
Nasal palatal
vozeada
banha [ibãJ1a] A consoante nasal palatal [J1] oCOJTe na fala de
poucos falantes do português brasileiro. Ge-
paz [ 1pas] com articulação alveolar ou dental. Marca ou ralmente um gli_9e palatal nasalizado que é
y
variação dialetal em final ele sílaba: paz; vasta. transcrito como [y] ocoITe no lugar ela conso-
[ibãya]
ante nasal palatal para a maioria dos falantes
z Fricativa alveolar Zapata [za 1pata] Uniforme em início de sílaba em todos os dia-
do português brasileiro. Esta variação será dis-
vozeada casa [lkaza] letos cio po1tuguês brasileiro poclenclo ocorrer
cuticla em breve.
paz [1paz] com articulação alveolar ou dental. Marca
variação dialetal em final ele sílaba: rasga. f Tepe alveolar cara [lkara] Uniforme em posição intervocálica e seguindo
Fricativa alveopalatal chá (1JaJ Uniforme em início de sílaba em todos os dia- vozeado prata [lpfata] consoante em todos os dialetos do p01tuguês
J [1maf] brasileiro, podendo ocorrer com articulação
desvozeada acha [1aJa] letos do português brasileiro. Marca variação mar
carta [lkafta] alveolar ou dental. Em alguns dialetos ocorre
paz [lpaJJ dialetal em final de sílaba: paz, vasta.
em final de sílaba em meio de palavra: "carta"
3 Fricativa alveopalatal já [13a] Uniforme em início de sílaba em todos os dia- ou em final de sílaba que coincide com final de
[1a3a] letos do português brasileiro. Marca variação palavra: "mar".
vozeada haja
dia-letal em final de sílaba: rasga.
f Vibrante alveolar
rata [rata] Ocorre em alguns dialetos (ou mesmo idioletos)
X Fricativa velar [IXata] vozeada cio português brasileiro. Pronúncia típica do
rata Pronúncia típica cio dialeto carioca. Ocorre marra [imafa] português europeu e ocorre em certas varian-
desvozeada marra [lmaXa] fricção audível na região velar. Ocorre em iní-

1
tes do português brasileiro (por exemplo em
mar [1maX] cio de sílaba que seja precedida por silêncio
certos dialetos do português paulista). Ocorre
carta [ 1kaXta] e portanto encontra-se em início de palavra:
em início de sílaba que seja precedida por si-
"rata"; em início de sílaba que seja precedida
lêncio: "rata"; em início ele sílaba que seja pre-
por vogal: "marra" e em início de sílaba que cedida por vogal: "marra" e em início de síla-
seja precedida por consoante: "Israel''. Em ai- baque seja precedida por consoante: "Israel".
guns dialetos ocorre em final de sílaba quan-
do seguido por consoante clesvozeada: "car- J Retroflexa alveolar mar [1maJ] Pronúncia típica cio dialeto caipira do r em fi-
ta" e em final de sílaba que coincide com fi- vozeada nal de sílaba: mar, carta. Adota-se também o
na! de palavra: "mar". símbolo [.IJ."

y Fricativa velar carga [lkayga] Pronúncia típica do dialeto carioca. Ocorre 1 Lateral alveolar lata [llata] Uniforme em início de sílaba e seguindo con-
vozeada fricção audível na região velar. Ocorre em fi- vozeada plana [ 1plana] soante em todos os dialetos do português bra-
na! ele sílaba seguida ele consoante vozeacla. sileiro, podendo ocorrer com articulação

alveolar ou dental.
h Fricativa glotal rata [lhata] Pronúncia típica cio dialeto ele Belo Horizon-
desvozeada marra [lmaha] te. Não ocorre fricção audível no trato vocal. t Lateral alveolar sal [ 1sat] Ocorre em final de sílaba em alguns dialetos (ou
mar [ 1mah] Ocorre em início ele sílaba que seja prececlicla
ou vozeada velarizada salta [lsaha] idioletos) do português brasileiro, podendo ocor-
carta [ 1kahta"] por silêncio e portanto encontra-se em início [1saw] rer com articulação alveolar ou dental. Pode ocor-
ele palavra: "rata"; em início ele sílaba que seja rer a vocalização da lateral em posição final ele
w [1sawta]
precedida por vogal: "marra" e em início ele sílaba e neste caso temos um segmento com as
sílaba que seja precedida por consoante: "Is- características mticulatórias de uma vogal do tipo
rael". Em alguns dialetos ocorre em final ele [u] que é transcrito como [w].
40 Fonética Tabela fonética consonantal
Fonética - Tabela fonética consonantal 4l

O alfabeto internacional de fonética (revisado em 1993, atualizado em 1996 *)


8 Símbolo Classificação do segmento consonantal
Exemplo Transcrição
Observação Consoantes (mecanismo de corrente de ar pulmonar)
ortográfico fonética
~~ retroflexa
alveolar l1pós-alveolar glotal I
Á Lateral palatal vozeada malha maÁa]
[1 A consoante lateral pala-
bilabial/ lábiO-dent;I

p b
dentaÍ 1

t d t q_ c
palatal

j
-
k
velar

g q
uvular

G
faringail'

7
ou tal [Á] ocorre na fala de pou-
Oclusiva/ 1 1
li ou cos falantes do português bra- Nasal / m nJ n fl J1 IJ N
sileiro. Geralmente uma lateral Vibrante B r R
malia]
[1 alveolar (ou dental) palatalizada
(
Tepe (ou ílepe) f (
que é transcrita por [l'] ocorre
para a maioria dos falantes do Fricativa cp B f V e ó 1 s z IS 3 i' L\ ç j X y X i; h \' h f1 ..
português brasileiro. Esta varia-
ção será discutida em breve.
Fricativa lateral/ 1 l3 --j
Pode ocorrer a· vocalização da
Aproximante / u . 1 \
(fJ ( lll

- lateral palatal e neste caso te- Aprox. latcral / 1: l rx. L


mos um segmento com as ca- Em pares de símbolos tem-se que o símbolo da dir~.~ra r~~resenta uma consoante vozeacla. Acredita-se ser impossível as articulações nas
racterísticas articulatórias dê áreas sombreadas. L,,; "
uma vogal do tipo [i] que é
Consoantes (mecanismo de corrente de ar não-pnlmonar) Suprasegmentos Tons e acentos nas palavras
transcrito como [y]: ['maya]." Nível Contorno
Cliques Implosivas vozeantes Ejectivas
G bilabial 5 bilabial corno em
acento primário e oul muito e ou ;1 ascendente
O leitor deverá encontrar um subconjunto dos segmentos consonantais apresentados acento secundário alta
dental á dental/alveolar p' bilabial
acima para caracterizar as consoantes que ocorrem em seu idioleto. Os símbolos listados 1 pós-alveolar s palatal t' dental/ ,foun;i'tiS;in é -j alta ê ~ descendente

acima devem ser suficientes para caracterizar a fala sem distúrbios de qualquer falante do alveolar longa e: e ~média e 1 alto ascendente
g
i palato-alveolar
e ~J baixa
velar k' velar e
português brasileiro. Tais símbolos são propostos pela Associação Internacional de Foné- semi-longa
e Âbaixo ascendente
tica. Observa-se contudo na literatura a utilização de alguns símbolos concorrentes aque-
lateral al vcolar G uvular s fricativa
alveolar
muito breve e e muito ~ "J ascendente-
les listados na tabela acima. Por exemplo, para representar um segmento "africado divisão silábica 1i.rekt baixo descendente etc.
alveopalatal desvozeado" a Associação Internacional de Fonética propõe o símbolo [tJ] grup0 acentual menor tdownstep ,11 ascendência
(quebra brusca) global
(este é o segmento inicial da palavra "tcheco"). Na literatura, encontra-se o símbolo [e] Vogais
grupo entonativo principal

para representar o mesmo segmento africado alveopalatal desvozeado (cf. "tcheco"). O ~ ligação (ausência de divisão) f upstep '\I descendência
anterior central posterior (subida brusca) global
símbolo [e] é geralmente utilizado na literatura norte-americana. Listamos abaixo símbo- fechada y~ir--m
0
u
los fonéticos concorrentes aos do alfabeto da Associação Internacional de Fonética. (ou alta)
Diacríticos Pode-se colocar um diacrítico acima de símbolos cuja

Símbolos propostos pela Associação


meia-fechada eo--~\e-yo representação seja prolongada na parte inferior, por exemplo Í)
Símbolos concorrentes (ou alta)
Internacional de Fonética ;)

) s meia-aberta E (E-3\G-A :l
o
desvozeado n
o
d
o .. voz. sussurrado ..b ..a n
dental t
n
d
n

(ou média-baixa)
vozeada t, voz tremulante b a uapica] t d
3 z V il, -
t) e ou ts aberta (ou baixa) rea CE_j_a D haspirada th dh linguolabial t d laminai t d
nn nn nn D D D
Quando os símbolos aparecem em pares aquele da
d3 J ou dz direita representa uma vogal arredondada. ) mais arred. ~ W]abializado tW dW -nasalizado -e
J1 ií
Outros símbolos , menos arred. ~ jpalatalizado ~ ~ nsoltura nasal d11
Na página seguinte apresentamos a tabela proposta pela Associação Interna- IA fricativa ç;:: fricativas
cional de Fonética. Tal tabela propõe símbolos para transcrever qualquer som das lábio-velar desvozeada vozeadas epiglotal +avançado u
+
"'vclarizado t"" d1" !soltura lateral dl
línguas naturais. A partir dos parâmetros articulatórios descritos anteriormente o lei- w aproximadamente J tlepe
dl' 1
lábio-velar vozeada alveolarlateral - retraído ~ ~ faringalizado ti' 1 soltura não-audível d
tor deverá ser capaz de inferir e pronunciar todos os segmentos consonantais listados
fj
na tabela. Os segmentos vocálicos serão tratados posteriormente. Aos interessados lj aproximadamente
lábio-palatal vozeada
articulação
simultânea de J ··centralizada e - velarizada ou faringalizada t
em ter as fontes para tais símbolos, estas podem ser obtidas gratuitamente pela internet ex X X
no seguinte endereço: http://www.sil.org/computing/fonts/Lang/silfonts.html (consulte centraliz. média e levantado e (.l= fricativa bilabial vozeada)
H fricativa epiglotal Para representar consoantes i i i

também: http://www2.arts.gla.ac.uk/IPA/ipa.html para obter informações detalhadas desvozeada africadas e uma articulação du-
silábica n abaixada e (B =aproximante alveolar vozeada)
desta associação). s;. fricativa epiglotal pla utiliza-se um elo ligando os 1 1
T T T

vozeada dois símbolos em questão.


Logo após a tabela da Associação Internacional de Fonética, apresentamos uma série f
não silábica e --iraiz da língua avançada e
oclusiva epiglotal kp' ~
~ ~

"
de exercícios que tem por objetivo sedimentar os aspectos teóricos apresentados nas pági-
--. roticização 3'-11'- 1-raiz da Hngua retraída ~
nas precedentes. Respostas aos exercícios propostos são apresentadas no final do livro.
''' A Associação Internacional de Fonética gentilmente autorizou esta reprodução.

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