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Sapatinhos Editado
Sapatinhos Editado
OS SAPATINHOS VERMELHOS
Nem dez da noite, só filmes sacros na tevê, mantos sagrados, aquelas coisas, Sexta-
Feira da Paixão e nem sexo
Melhor assim, muito melhor (com a mão esquerda estica o outro olho) Não, nem tanto,
que assim parece uma japonesa, uma japa, uma gueixa (solta) isso é que fui. A putinha
submissa a coreografar jantares à luz de velas – Grenn Miller ou Charles Aznavour?
Camomila ou alfazema? (Preparando uísque para ela), uma ou duas pedras hoje, meu
bem? Nenhuma pedra. Como aprendi com ele, nem gostava tanto antes. Tempo perdido,
pura perda de tempo. Mas teve bons momentos, não teve não? Lembra Adelina?
Vou me apressar antes que a quinta vire Sexta-Feira Santa e os pecados comecem a
pular feito macacos, não beba, não cante, não fale nome feio, não use vermelho, o diabo
esta solto, leva a sua alma para o inferno. – (grita) Ela já está lá.
Sexta-Feira da Paixão e nem sexo, nem ao menos sexo, isso de meter, morder, gemer,
gozar, dormir. Aquela coisa no escuro, roçar de pelos molhados, gemidos depois de...
quantos mesmo? Cinco, cinco anos. Cinco anos são alguma coisa quando se tem quase
quarenta e nem apartamento próprio, nem marido, filhos, herança: NADA. Ponto seco,
ponto morto.
Tinha terminado então. Porque a gente, alguma coisa dentro da gente, sempre sabe
exatamente quando termina. (para olha bem de novo), ou quando começa: certo susto na
boca do estômago. Como o carrinho da montanha russa, naquele momento lá no alto,
justo antes de despencar em direção... Em direção a que? Depois de subidas e descidas,
em direção àquele insuportável ponto seco de agora.