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FACULDADE DE ODONTOLOGIA DE RIBEIRÃO PRETO

Departamento de Biologia Básica e Oral

ROTEIRO DE ESTUDO

DISCIPLINA DE PATOLOGIA BÁSICA

Ribeirão Preto
2021
1
Sobre o roteiro de estudo

Este roteiro de estudo, ainda em construção, trata-se de um resumo e seleção das bibliografias

utilizadas na disciplina de Patologia Básica da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto -

USP. Este roteiro deve ser utilizado exclusivamente pelos alunos da disciplina de Patologia

Básica e sua leitura não dispensa a consulta de seus originais, citados no fim de cada texto.

O objetivo desse roteiro é direcionar o estudo para os tópicos abordados em aula. Esses textos

serão atualizados anualmente pelo professor responsável pela disciplina com a colaboração de

monitores. Até o momento, esse roteiro teve a colaboração dos monitores Vitor de Freitas

Barbosa, Giulia Battistini Conti e Gabriela Carmonizi (monitores da disciplina de

Patologia Básica junto ao Departamento Biologia Básica e Oral – FORP-USP) e Ana Paula

Valladares de Almeida (bolsista do Programa de Estímulo ao Ensino de Graduação (PEEG)

da Pró-Reitoria de Graduação da USP).

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Sumário

Alterações do crescimento e da diferenciação celular.......................4

Distúrbios circulatórios....................................................................11

Células do processo inflamatório.....................................................22

Imunopatologia da inflamação.........................................................28

Fenômenos vasculares exsudativos do processo inflamatório.........35

Mediadores inflamatórios................................................................43

Lesão e morte celular.......................................................................48

Neoplasias e carcinogênese.............................................................57

Cicatrização e reparo.......................................................................66

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ALTERAÇÕES DO CRESCIMENTO E DA danificadas de tal forma que não podem ser reparadas,
DIFERENCIAÇÃO CELULAR especialmente se a lesão afeta o DNA celular.
Diferentes tipos de estresse podem induzir alterações nas
Aspectos gerais sobre a adaptação, dano e morte celular células e nos tecidos, além dos processos de adaptação, lesão e
A célula está em sua normalidade confinada a uma morte celular. Quando as células são expostas a estímulos
variação limitada de função e estrutura, devido ao seu programa subletais ou estímulos crônicos, essas células podem não ser
genético, à repressão local proporcionada pelas células vizinhas e danificadas, no entanto podem demonstrar uma variedade de
à disponibilidade metabólica na qual está submetida. alterações subcelulares. Geralmente essas alterações subcelulares
Estresses fisiológicos ou alterações patológicas podem se dão por deposições intracelulares de proteínas, lipídeos e de
desencadear um grande número de adaptações celulares, onde carboidratos.
são alcançados novos estados de estabilidade, preservando-se a Finalmente, o envelhecimento celular também pode ser
viabilidade celular. acompanhado de alterações morfológicas e funcionais
As adaptações celulares consistem, principalmente, em características.
hipertrofia, hiperplasia, atrofia, metaplasia e displasia. De Daremos enfoque nas principais alterações de crescimento e
maneira geral, podemos defini-las da seguinte forma: diferenciação celular, descrevendo pontualmente suas
características:
 Hipertrofia: aumento do volume celular;
 Hiperplasia: aumento no número de células;
Alterações do crescimento e da diferenciação celular
 Atrofia: redução do tamanho e da função celular. Alguns Crescimento e diferenciação celular são processos essenciais
autores subdividem atrofia em hipoplasia (redução do número para os seres vivos. O crescimento celular aqui é entendido como
celular) e hipotrofia (redução do volume celular), no entanto, a o processo de multiplicação e é responsável pela formação do
hipotrofia e a hipoplasia estão intimamente relacionadas, o que conjunto de células que compõe o indivíduo. Ele é indispensável
justifica o uso do termo genérico “atrofia” para ambas as durante o desenvolvimento normal dos organismos e necessário
alterações. para repor as células que morrem por envelhecimento ou por
 Metaplasia: alteração reversível na qual um tipo de célula processos patológicos. A diferenciação celular refere-se à
adulta é substituído por outro tipo de célula adulta. A metaplasia especialização morfológica e funcional das células, que permite
ocorre principalmente mediante irritações crônicas físicas ou o desenvolvimento do organismo. Como esses dois processos
químicas. recebem influência de grande número de agentes externos, não é
 Displasia: caracteriza-se pela proliferação celular, associada a surpresa que surjam transtornos nos mecanismos que os
perda de sua diferenciação, contudo sem perder o controle da controlam.
divisão celular.
Se os limites da resposta de adaptação a um estímulo são HIPERPLASIA
excedidos, ou se, em determinadas circunstâncias, a célula for A hiperplasia é o aumento do número de células de um órgão
exposta a um agente lesivo, ocorrerá uma sequência de eventos ou tecido, resultando, geralmente, em aumento de volume e peso.
denominada de lesão celular. A lesão celular é até certo ponto
reversível, mas se o estímulo persistir ou for severo desde o
início, a célula atingirá o ponto de não retorno, culminado com
uma lesão irreversível e, consequente, morte celular.
A adaptação, lesão reversível e morte celular podem ser
consideradas estágios de um dano progressivo das funções e
estruturas celulares normais. Por exemplo, em resposta às cargas
hemodinâmicas crescentes, as células cardíacas inicialmente
aumentam seus constituintes citoplasmáticos e
consequentemente seu volume, o que representa uma forma de
adaptação. Se o suprimento sanguíneo para o miocárdio não for
Apesar da hiperplasia e da hipertrofia serem dois processos
suficiente para a demanda, o músculo sofre lesão irreversível e
distintos, frequentemente ocorrem juntas e podem ser
finalmente ocorre a morte celular.
desencadeadas pelos mesmos estímulos externos. Por exemplo, o
A morte celular é um dos eventos mais cruciais na evolução
crescimento do útero induzido por hormônios envolve tanto o
da doença em qualquer tecido ou órgão. Ela resulta de diversas
aumento do número quanto de volume de células musculares
causas, incluindo isquemia, infecção, toxinas e reações
lisas e de células epiteliais.
imunológicas. Além de ser uma parte normal e essencial da
Na hiperplasia ocorre a mitose, visto que a população celular
embriogênese.
é capaz de se dividir. Por outro lado, a hipertrofia envolve o
Existem dois padrões principais de morte celular: a necrose e
aumento do volume celular sem que ocorra tal divisão.
apoptose. A necrose ocorre após estresses anormais, como a
A hiperplasia ocorre principalmente por aumento de demanda
isquemia e lesão química, e é sempre patológica. Já a apoptose
do órgão, por aumento da demanda funcional (adaptação) ou por
ocorre devido à ativação de um programa de suicídio controlado.
aumento de estímulos tróficos (ex.: hormonais). E para que ela
A apoptose é projetada para eliminar células indesejáveis durante
ocorra, deve-se obedecer as seguintes condições: ter suprimento
a embriogênese e em vários processos fisiológicos, como a
sanguíneo suficiente, integridade morfofuncional e inervação
involução de tecidos responsivos aos hormônios. Também ocorre
adequada.
em determinadas condições patológicas, quando as células estão
As hiperplasias podem ser fisiológicas ou patológicas.

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Hiperplasia fisiológica: caracterizada por hiperplasia do estroma prostático e células
A hiperplasia fisiológica é subdividida em hiperplasia epiteliais, resultando na formação de grandes nódulos,
hormonal e compensatória. relativamente nítidos na região periuretral da próstata. Quando
Hiperplasia hormonal: Ocorre devido ao aumento dos suficientemente grandes os nódulos comprimem e estreitam o
estímulos hormonais, levando ao aumento na capacidade canal uretral, causando obstrução parcial ou às vezes, completa
funcional de um órgão ou tecido. Por exemplo: o útero durante o da uretra.
ciclo menstrual e o tecido mamário durante lactação e durante a Um fator importante para o diagnóstico diferencial de
puberdade. hiperplasia patológica é que o processo hiperplásico está sobre
Hiperplasia compensatória: Ocorre devido ao aumento controle, ou seja, a hiperplasia diminui ou desaparece quando
de demanda do órgão ou tecido, em geral, por dano ou ressecção cessado o estímulo causador.
parcial do órgão. Por exemplo: ressecção parcial do fígado ou A hiperplasia patológica representa um solo fértil para
hiperplasia do rim colateral, após a retirada de um desses órgãos. neoplasias. Exemplo desse agente carcinogênico é o risco
aumentado de câncer endometrial naquelas pacientes com
Mecanismos da hiperplasia fisiológica: hiperplasia prévia do endométrio.
De maneira geral, a hiperplasia fisiológica se dá por: Os responsáveis pela formação do tecido hiperplásico são os
1. Aumento da produção local de fatores de fatores de crescimento. Os fatores de crescimento estão presentes
crescimento. Exemplo: hormônios. tanto na hiperplasia em resposta às células do tecido conjuntivo
2. Aumento do número de receptores de fatores durante a cicatrização como nas hiperplasias associadas às
de crescimento. infecções virais como àquelas provocadas pelos papilomavírus,
3. Ativação de vias de sinalização intracelular. que provocam dentre outras patologias as verrugas cutâneas.
Todas essas alterações levam à produção de fatores de Um outro exemplo de hiperplasia patológica, importante
transcrição que ativam muitos genes celulares, incluindo genes sobretudo na patologia bucal, é a hiperplasia gengival. A
que codificam os fatores de crescimento, receptores para esses hiperplasia gengival pode ocorrer devido às anormalidades
fatores e reguladores do ciclo celular, resultando na proliferação congênitas, anormalidades hormonais e por higiene oral
celular. deficiente. Também pode ser decorrente de medicação prescrita
Hiperplasia hormonal: O próprio hormônio pode atuar como para outras enfermidades. Os três medicamentos mais comuns
fator de crescimento e desencadear a transcrição de vários genes que podem levar a uma dramática hiperplasia gengival são a
celulares. fenitoína (anticonvulsivante), os bloqueadores dos canais de
Hiperplasia compensatória: O aumento do número celular cálcio e a ciclosporina (imunossupressora). A hiperplasia
que ocorre durante a hiperplasia se dá devido ao aumento da gengival se desenvolve em aproximadamente metade dos
proliferação celular ou devido ao desenvolvimento de novas pacientes que tomam fenitoína. A gengiva interdental anterior é o
células tronco. Podemos citar o papel das células tronco ponto mais comum de aumento de volume, começando as
hepáticas durante lesões hepáticas. No entanto, tal via deixa de alterações um mês após o início do tratamento. À medida que o
ser fundamental na hepatectomia parcial, sendo, portanto, a crescimento continua, o tecido marginal pode estender-se e quase
proliferação celular mais evidente. cobrir a superfície facial das coroas. A nifedipina é o bloqueador
A medula óssea é fonte de células tronco que podem dar dos canais de cálcio mais comum a causar aumento de volume da
origem a muitos tipos celulares especializados, dentre eles as gengiva, podendo ocorrer em duas semanas de uso do
células hepáticas. Essas observações enfatizam a plasticidade das medicamento, mas comumente aparece de um a três meses.
células tronco dos adultos, indicando um potencial para Existe uma relação inversa entre a higiene oral e o grau de
regenerar tecidos danificados com células tronco derivadas da aumento da gengiva associado a esses medicamentos. Embora a
medula óssea. boa higiene oral tipicamente não impeça o aumento da gengiva
em indivíduos sensíveis, pode limitar a severidade da resposta a
Hiperplasia patológica: níveis aceitáveis.
É definida como uma estimulação excessiva das células alvos
por hormônios ou por fatores de crescimento.
Um exemplo clássico de hiperplasia patológica é a
hiperplasia do endometrial, que é uma hiperplasia de glândulas
endometriais levando a sangramentos menstruais anormais,
tendo como causa o desequilíbrio entre a relação normal entre
estrógeno e progesterona dentre outros hormônios sexuais. Se
não tratada, pode causar endometriose, que é o crescimento do
endométrio atingindo as cavidades adjacentes ao útero. A
endometriose e a hiperplasia uterina podem causar esterilidade.
A hiperplasia endometrial merece atenção especial devido
sua relação com o carcinoma do endométrio.
Em homens, uma forma de hiperplasia patológica muito
comum é a hiperplasia prostática benigna, que é ocasionada pelo
desequilíbrio de hormônios andrógenos. Figura1. Observa-se o aumento das cristas epiteliais e o aumento no número das
A hiperplasia prostática benigna é um transtorno células epiteliais da camada espinhosa (acantose) Também se observa aumento
extremamente comum em homens com mais de 50 anos. É da camada córnea denominada de hiperqueratose, mais especificamente
hiperparaqueratose.(Aumento de 10x).

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pulmonar; de 400g a 800g na hipertensão sistêmica, de 600 à 1kg
HIPERTROFIA na regurgitação aórtica.
A hipertrofia refere-se ao aumento de volume da célula e Os mecanismos de hipertrofia cardíaca envolvem muitas vias
consequente aumento de volume do órgão. Assim, a população de transdução de sinais, levando à indução de vários genes que
celular do órgão é mantida. O aumento do volume do órgão não por sua vez estimulam numerosas proteínas celulares. De
está relacionado a edema, mas sim a síntese de mais maneira geral os principais genes estimulados são:
componentes estruturais. Sinalização excessiva significando 1. Aqueles que codificam fatores de transcrição (c-fos, c-jun).
aumento da síntese dos constituintes celulares 2. Fatores de crescimento (TGF-beta, fator de crescimento
(Anabolismo>Catabolismo) em células que têm bloqueada sua semelhante à insulina tipo 1 IGF-1, fator de crescimento dos
capacidade para dividir-se (células pós-mitóticas, permanentes fibroblastos).
ou perenes), causará um aumento expressivo do volume celular 3. Agentes vasoativos (agonistas α-adrenérgicos, endotelina-1,
normal. Também ocorre em células com ciclo celular ativo. angiotensina II).
4. Pode haver mudanças das proteínas contráteis da forma
adulta para a forma fetal ou neonatal. Exemplos:
Durante a hipertrofia muscular, a cadeia pesada da α-miosina é
substituída pela forma β da cadeia pesada da miosina, o que
acarreta em uma diminuição da atividade da adenosina
trifosfatase (ATPase), da miosina e uma contração mais lenta e
mais econômica energeticamente.
5. Genes de fases iniciais de desenvolvimento: muitas vezes
genes que são expressos nas fases iniciais de desenvolvimento se
expressam nas células hipertróficas e seus produtos participam
O conteúdo do DNA nos núcleos das células hipertrofiadas
na resposta celular ao estresse. Exemplo: o gene codificador do
pode ser maior do que os das células normais, pois seu ciclo
ANF (que é um hormônio que causa a secreção do sal pelos rins
celular se interrompe antes que elas completem a mitose.
e, portanto, diminui o volume sanguíneo) é expresso tanto no
 Aspectos macroscópicos: aumento de volume de um órgão
átrio como no ventrículo durante nossa vida embrionária. Após o
por aumento da demanda funcional (adaptação – ex.:
nascimento o gene ANF ventricular é inibido, mas pode voltar à
musculação) ou por aumento dos estímulos tróficos (ex.:
sua expressão nos casos de hipertrofia.
hormonais).
O padrão da hipertrofia reflete a natureza do estímulo. Nas
 Aspectos microscópicos: aumento de volume das células que doenças em que ocorre sobrecarga de pressão, como por exemplo
compõem o órgão, associado ao aumento do estroma, com a estenose aórtica ou a hipertensão arterial sistêmica, ocorre
aumento da síntese intracelular e vascularização. hipertrofia das paredes do miocárdio com redução das câmaras
As hipertrofias podem ser fisiológicas e patológicas, e de cardíacas, o que recebe o nome de “hipertrofia concêntrica do
maneira geral estão associadas ao aumento de demanda e a miocárdio”. Os novos sarcômeros são depositados “em paralelo”
estímulos hormonais específicos. Como exemplos de aumento de com relação aos pré-existentes, aumentando a força de contração
demanda podemos citar: dos cardiomiócitos. A espessura do miocárdio ultrapassa com
1. Sobrecarga hemodinâmica sobre o coração ocasionada pela frequência o limite da normalidade, levando uma redução do
hipertensão arterial ou valvas defeituosas. diâmetro do ventrículo. Na evolução do processo costuma
2. Aumento de carga sobre os músculos, como observados nos ocorrer diminuição da espessura das paredes cardíacas e
fisiculturistas, visando a divisão de cargas sobre células com diminuição da força de contração, levando à chamada
maiores componentes estruturais, evitando assim a lesão celular. cardiomiopatia dilatada. A insuficiência cardíaca pode ocorrer
Dentre as hipertrofias por aumento de estímulos hormonais nas duas fases das adaptações, assim como o óbito, que pode
podemos citar: ocorrer por infarto ou parada cardíaca (arritmia grave). Por outro
1. Crescimento do útero durante a gravidez, mediado por lado, nas doenças em que ocorre sobrecarga de volume, como
estrógeno que ocasiona o aumento dos volumes das células por exemplo na insuficiência mitral, a hipertrofia do miocárdio é
musculares lisas, acompanhada de aumento das câmaras cardíacas, caracterizando
2. Efeito da prolactina e estrógeno sobre a hipertrofia dos seios a “hipertrofia excêntrica do miocárdio”. Os novos sarcômeros
durante a amamentação. são depositados “em série” com relação aos pré-existentes,
Estudos recentes mostram que as células musculares possuem levando ao alongamento dos cardiomiócitos. Na evolução
uma capacidade de divisão limitada e podem ser substituídas por também ocorrem insuficiência cardíaca, infarto ou arritmia.
células precursoras. Portanto, estudos recentes mostram que Quando a hipertrofia cardíaca não é mais capaz de compensar
mesmo células com alto grau de especialização, apresentam o aumento de carga, ocorre a insuficiência cardíaca. Nesse
algum grau de renovamento. estágio ocorrem alterações degenerativas onde se predomina a
lise e a perda dos elementos contráteis.
Mecanismos da hipertrofia:
A maioria dos saberes sobre os mecanismos da hipertrofia
são baseados em estudos sobre o coração.
A extensão da hipertrofia varia de acordo com as diferentes
causas. O peso do coração geralmente varia de 300 a 600g
(aproximadamente 2 vezes seu peso normal) na hipertensão

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sofre uma atrofia progressiva, presumivelmente devido à
aterosclerose que reduz o seu suprimento sanguíneo.
4. Nutrição inadequada: a desnutrição proteico-calórica
acentuada, denominada de marasmo, está associada ao uso dos
músculos esqueléticos como fonte de energia, depois que outras
fontes energéticas como o tecido adiposo estão esgotados. A
caquexia é vista em pacientes com doenças inflamatórias
crônicas e câncer. O TNF produzido em processo inflamatório ou
durante o desenvolvimento de neoplasias parece ter papel
fundamental nesse processo, pois ele é responsável pela
diminuição do apetite e pela atrofia muscular.
5. Perda de estimulação endócrina: algumas glândulas
endócrinas, a mama e os órgãos reprodutivos são dependentes da
estimulação endócrina. Um exemplo de atrofia pela perda de
estimulação endócrina é a atrofia do endométrio, epitélio vaginal
e seios durante a menopausa, em decorrência da perda da
Figura 2: Lâmina de um coração acometido pela doença chagas. Nela, é possível estimulação estrógena.
observar hipertrofia das fibras musculares cardíacas. (Amento de 10x) 6. Envelhecimento: está associado à perda celular, tipicamente
em tecidos com células permanentes, especialmente cérebro e
ATROFIA: coração.
É a redução no tamanho celular, devido à perda de substância No caso da senilidade, é acompanhada de acúmulo de um
celular, resultando muitas vezes na diminuição do volume do pigmento chamado lipofuscina - "Atrofia parda". A lipofuscina é
órgão. um pigmento (visível em microscopia na cor alaranjada)
proveniente da ação de radicais livres sobre as membranas
(lipoperoxidação de lipídeos) – a quantidade acumulada indica
envelhecimento celular ou tecidual.
7. Pressão: a compressão de um tecido leva a atrofia. Esse
exemplo de atrofia dá-se de maneira bem clara em neoplasias,
onde a pressão ocasionada pelo tumor pode levar a atrofia do
órgão subjacente. Tal atrofia também pode ocorrer pela alteração
no suprimento sanguíneo provocado pelo crescimento tumoral.
A ausência, privação ou deficiência de nutrição, geralmente 8. Por substancias tóxicas que paralisam o ciclo celular.
ocasiona apoptose e autofagia. Levando à diminuição das 9. Por radiações ionizantes provocando anemia aplástica e
organelas na célula, além da redução do volume e função celular. trombocitopenia (exposição aos radionuclídeos, fontes diretas
Macroscopicamente, nota-se a diminuição de volume como Raio X ou perto de usinas nucleares com vazamentos).
(involução) do órgão ou tecido previamente desenvolvido.
Podendo também ocorrer a redução do peso. A atrofia resulta de uma redução nos componentes estruturais
A atrofia pode ser patológica ou fisiológica. da célula e com uma retração de volume, na qual a sobrevivência
ainda é possível, no entanto, caso a atrofia persista, as células
Atrofia Fisiológica: podem sofrer morte celular.
Comuns nas fases iniciais do desenvolvimento. Involução de No músculo atrófico, podemos notar redução do número de
tecidos ou órgãos. Exemplos: Timo, veias e artérias umbilicais, mitocôndrias, redução do número de miofilamentos e do retículo
útero após o parto, mamas após a lactação, mama e endométrio endoplasmático.
na menopausa, senilidade. A apoptose está fortemente associada ao tecido atrófico, pois
esses dois processos são induzidos pelos mesmos sinais, podendo
Atrofia Patológica: assim a apoptose contribuir para a perda da massa muscular.
Depende da causa e pode ser localizada ou generalizada.
Mecanismos da atrofia:
Causas da atrofia patológica: Os mecanismos bioquímicos responsáveis pela atrofia não
1. Por inatividade ou desuso (Amiotrofia clássica da são totalmente esclarecidos, mas provavelmente afetam o
imobilização e engessamento); É reversível, assim que as equilíbrio entre a síntese e degradação proteica.
atividades físicas são retomadas. No entanto, em um desuso mais As células de mamíferos contêm vários sistemas proteolíticos
prolongado, o número de fibras musculares esqueléticas também que possuem funções distintas. O aumento da degradação
diminui, essa atrofia pode ser acompanhada de aumento da proteica está associado aos seguintes mecanismos:
absorção óssea, levando à osteoporose por desuso. 1. Ativação dos lisossomos: os lisossomos contêm hidrolases
2. Por denervação: o funcionamento normal dos músculos ácidas e outras enzimas que degradam proteínas extracelulares
depende do suprimento nervoso. E a denervação pode levar à que sofreram endocitose, assim como alguns componentes
rápida atrofia dos músculos inervados por eles. celulares.
3. Diminuição do suprimento sanguíneo: a isquemia leva a 2. Ativação da via ubiquitina-proteassoma é responsável pela
atrofia do tecido por perda progressiva. Na velhice, o cérebro degradação de muitas proteínas citosólicas e nucleares. Para

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serem degradadas as proteínas são conjugadas à ubiquitina e
depois degradadas em uma grande organela citoplasmática
denominada proteossoma. Acredita-se que a ativação dessa via
seja a responsável pela proteólise acelerada vista em condições
catabólicas, como a caquexia do câncer.

Os hormônios glicocorticoides e o hormônio tireodiano


estimulam a degradação proteica mediada pelo proteossoma.
Além disso, algumas citocinas dentre eles e o TNF aumentam a
proteólise muscular associada a esse mecanismo.
Microscopicamente, podemos verificar acentuados vacúolos
autofágicos.
Parte dos fragmentos celulares no interior do vacúolo pode
resistir à digestão e persistir como corpos residuais, esses são os
casos da lipofuscina que dá a coloração acastanhada da atrofia
parda senil. Essa deposição está muito presente em
miocardiócitos de pacientes idosos, assim como em
miocardiócitos de pacientes caquéticos. Figura 3: A hiperplasia presente no tecido conjuntivo está acarretando em uma
Exemplos de doenças atróficas: atrofia epitelial. No epitélio, note a redução do número de camadas celulares e a
ausência de cristas epiteliais. (Aumento de 10x).
Doença de Alzheimer: é a causa mais comum de demência em
idoso. Esta doença se torna clínica com comprometimento METAPLASIA:
silencioso de funções intelectuais superiores, com alteração no É uma alteração reversível na qual um tipo de célula adulta
humor e no comportamento. Mais tarde, uma desorientação (epitelial ou mesenquimal) é substituída por outro tipo de célula
progressiva, perda de memória e afasia indicam uma severa adulta.
disfunção cortical. E entre 5 e 10 anos o paciente pode se tornar
profundamente incapacitado, mudo e imóvel. Não se sabe porque
a Doença de Alzheimer ocorre, mas são conhecidas algumas
lesões cerebrais características dessa doença. As duas principais
alterações que se apresentam são as placas senis decorrentes do
depósito de proteína beta-amiloide, anormalmente produzida, e
os emaranhados neurofibrilares, frutos da hiperfosforilação da
proteína tau. Outra alteração observada é a redução do número
das células nervosas (neurônios) e das ligações entre elas
(sinapses), com redução progressiva do volume cerebral.
Ao exame macroscópico do cérebro mostra um variável grau A metaplasia consiste na substituição de células sensíveis ao
de atrofia cortical com alargamento dos sulcos cerebrais que é estresse por células capazes de sobreviver ao ambiente hostil.
mais pronunciado nos lobos frontais, temporais e parietais. Com O tipo mais comum é a substituição de células colunares para
a atrofia significativa, há um alargamento compensatório dos células escamosas, que ocorre no trato respiratório em resposta a
ventrículos secundários a perda de parênquima. irritação crônica.
Exemplos de metaplasias:
Esclerose Lateral Amiotrófica: é uma doença relativamente rara 1. Em fumantes as células epiteliais colunares ciliadas normais
(são registrados um ou dois casos em cada cem mil pessoas por da traqueia e dos brônquios são geralmente substituídas,
ano, no mundo). Acomete mais os homens do que as mulheres, a focalmente e extensamente, pelo epitélio escamoso estratificado.
partir dos 45/50 anos, e é provocada pela degeneração 2. Em casos de cálculos nos ductos excretores na glândula
progressiva no primeiro neurônio motor superior no cérebro e no salivar, nos ductos salivares ou no pâncreas; o epitélio colunar
segundo neurônio motor inferior na medula espinhal. Esses secretório é substituído pelo epitélio estratificado não secretor.
neurônios são células nervosas especializadas que, ao perderem a 3. A deficiência de vitamina A leva a metaplasia escamosa no
capacidade de transmitir os impulsos nervosos, dão origem à epitélio colunar respiratório.
doença. 4. O excesso de vitamina A leva a supressão da queratinização.
Não se conhece a causa específica para a esclerose lateral OBS: Nesses dois últimos casos a consequência é a perda do
amiotrófica. Parece que a utilização excessiva da musculatura efeito protetor do muco.
favorece o mecanismo de degeneração da via motora, por isso os
atletas representam a população de maior risco.
Outra causa provável é que dieta rica em glutamato seja
responsável pelo aparecimento da doença em pessoas
predispostas.

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e irregular, que desloca a junção escamo-colunar vários
centímetros acima. Uma pequena área de mucosa metaplásica
pode existir somente na junção gastroesofágica, algumas vezes
com menos de 0,5cm de extensão.
Microscopicamente, o epitélio escamoso esofágico é
substituído por epitélio colunar metaplásico com glândulas
mucosas. Na avaliação patológica dos pacientes com mucosa de
Barrett é fundamental procurar por displasia, supostamente
precursora de malignidade. A displasia caracteriza-se por
alterações citológicas e arquiteturais do epitélio colunar, que
consiste em núcleos aumentados, aglomerados e
hipercromáticos, além de perda de estroma entre as estruturas
glandulares adjacentes. A displasia é classificada como de baixo
grau ou de alto grau. A principal distinção consiste na orientação
basal de todos os núcleos na displasia de baixo grau e na
localização apical dos núcleos na displasia de alto grau. Cerca de
50% dos pacientes com displasia de alto grau podem já
Figura 4: Imagem de um brônquio com tecido metaplásico. (Aumento de 4x) – apresentar um adenocarcinoma associado.
Vê-se abaixo uma imagem em maior aumento.
Metaplasia do conjuntivo:
Formação de cartilagem, osso ou tecido adiposo (tecido
mesenquimatosos) em tecidos que normalmente não contém
esses elementos. Por exemplo, a formação de osso no músculo
após uma fratura, denominada da miosite ossificante. Esse tipo
de metaplasia não é considerada uma resposta adaptativa.

Mecanismos da Metaplasia:
A metaplasia não resulta de uma alteração do fenótipo de
uma célula diferenciada, mas sim de uma reprogramação das
células tronco que sabemos existir nos tecidos normais ou em
células mesenquimatosas indiferenciadas presentes no tecido
conjuntivo. A diferenciação das células tronco em uma linhagem
distinta decorre do estímulo de sinais gerados pelas citocinas,
pelos fatores de crescimento e pelos componentes da matriz
extracelular que as cercam.
Genes específicos do tecido e de diferenciação estão
envolvidos no processo e um número crescente desses genes tem
Figura 5. Brônquio em maior aumento. Pode-se notar a substituição do epitélio
sido identificado. Por exemplo, proteínas ósseas morfogenéticas
pseudoestratificado ciliado pelo epitélio estratificado pavimentoso. (Aumento de e membros da superfamília do TGF-beta, induzem a expressão
20x) condrogênica ou osteogênica das células tronco. Esses fatores
envolvem a transcrição de genes específicos para determinado
A metaplasia é uma faca de dois gumes, pois, apesar de fenótipo.
existir o epitélio mais resistente ao estresse, ele perde funções Na maioria dos casos, são desconhecidos os meios pelos
importantes. quais as células se tornam metaplásicas, no entanto, no caso da
Se as influências que levam a metaplasia persistirem, o tecido vitamina A, o ácido retinóico participa diretamente na regulação
poderá sofrer transformações malignas. Consequentemente, a do crescimento celular e na diferenciação, influenciando
forma mais comum de câncer no trato respiratório é composta de diretamente a diferenciação das células tronco.
células escamosas que se desenvolvem em áreas em que ocorre a .
metaplasia do epitélio colunar normal para o epitélio escamoso. DISPLASIA
As displasias podem ser conceituadas como uma resposta
Esôfago de Barret: proliferativa atípica e irregular às irritações crônicas, reversível,
É a metaplasia do epitélio escamoso para o epitélio colunar, caracterizada por atipia celular.
semelhante às células intestinais, sob influência do frequente
refluxo gástrico.
Neoplasias malignas podem surgir nessas áreas e são
tipicamente chamados de adenocarcinomas.
O esôfago de Barret é reconhecido como uma mucosa
vermelha aveludada localizada entre a mucosa gástrica
pavimentosa lisa e rosada e a mucosa gástrica pardo-clara. Pode
ter formato de linguetas ou de ilhotas localizadas acima da
junção gastroesofágica ou pode formar uma faixa circular ampla

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em genes supressores de tumor, ou em genes reguladores do
reparo de DNA.
Exemplos: polipose familial do colón; xeroderma pigmentoso
e carcinoma colorretal hereditário não poliposo. Nessas doenças,
não se encontram alterações morfológicas iniciais. São por isso
chamadas condições pré-cancerosas.

Quanto mais displásico o epitélio, maior a chance das atipias


epiteliais se estenderem em toda a espessura epitelial.
As características histológicas das células displásicas são
semelhantes a dos carcinomas e podem incluir:
A displasia é encontrada principalmente no epitélio e se 1. Núcleos de células aumentados. (Aumento da relação núcleo
caracteriza por uma constelação de alterações que incluem a citoplasma)
perda na uniformidade das células individuais assim como uma 2. Nucléolos grandes e evidentes
perda na sua orientação arquitetural. Por exemplo, a maturação 3. Hipercromatismo (coloração escura excessiva dos núcleos).
progressiva de células altas na camada basal para células 4. Pleomorfismo celular e nuclear
achatadas na superfície pode se perder e ser substituída por uma 5. Disqueratose (queratinização prematura individual das
mistura de células com aspecto basal escuro no epitélio. células).
Tais displasias podem ser enquadradas também no grupo das 6. Aumento do número das células em mitose
lesões pré-malignas, onde ocorre um crescimento celular 7. Figuras mitóticas anormais (mitoses tripolares, em forma de
descontrolado. O controle do ciclo celular começa a ser perdido, estrela ou que aparecem em localização anormais dentro do
sendo o início de alterações como as observadas no câncer. epitélio. Assim no epitélio escamoso estratificado displásico as
Portanto, tecidos displásicos são um grave sinal de alerta. mitoses não são restritas a camada basal, podendo acontecer em
Entretanto, nem toda displasia se torna uma neoplasia todos os níveis, e até mesmo nas camadas superficiais).
estabelecida. Além disso, as alterações histomorfológicas do epitélio
Não raro, as displasias estão associadas a tecidos displásico são evidentes em menor aumento, incluindo:
metaplásicos ou se originam deles. As mais importantes na 1. Cristas epiteliais bulbosas
prática são as displasias de mucosas, como o colo uterino, a dos 2. Perda de polaridade (falta de maturação progressiva para a
brônquios e a gástrica, pois precedem os cânceres que se formam superfície).
nesses locais. 3. Pérolas de queratina (coleções focais, redondas e
A atipia mais evidente da displasia é a cariomegalia (aumento concêntricas de células queratinizadas).
do núcleo), resultantes das alterações de DNA. No entanto 4. Perda de coesão típica das células epiteliais.
também é possível observar a poliploidia e a aneuploidia. O grau de displasia se correlaciona à sua gravidade ou
Muitas vezes, é difícil distinguir displasias de neoplasias, intensidade:
inclusive pelas alterações genômicas que elas apresentam. Por 1. Displasia leve: alterações limitadas à camada basal e
essa razão, grupos de especialistas da OMS têm denominado as parabasal.
displasias de neoplasias intra-epiteliais, classificando-as em 2. Moderada: envolvimento da camada basal até a camada
graus discretos, moderado e acentuado. (NIC1, NIC2, NIC3). espinhosa.
Quando as alterações displásicas são acentuadas e envolvem 3. Intensa: da camada basal até um nível acima do ponto médio
toda a espessura do epitélio, mas permanecem confinadas ao do epitélio.
tecido normal, são consideradas um neoplasma pré-invasivo
denominado de carcinoma in situ.
Referências
Lesões e condições pré-cancerosas: BRASILEIRO FILHO, G. - Bogliolo Patologia. 9º.Ed. Rio de
Chama-se de lesão pré-cancerosa uma lesão que tem maior Janeiro: Guanabara-Koogan, 2016.
probabilidade de evoluir para o câncer do que o tecido normal ABBAS, A.K.; KUMAR, V.; FAUSTO N. Robbins & Cotran
onde ela se desenvolve. Desta forma, nem toda lesão pré- – Patologia – Bases Patológicas das doenças. 9º. Ed. Rio de
cancerosa caminha para tumor maligno. Janeiro: Elsevier, 2016.
As principais lesões pré-cancerosas conhecidas são as
displasias do colo uterino, da mucosa gástrica, do epitélio
brônquico.
Quanto mais desenvolvida a lesão, maior é a probabilidade de
evoluir para o câncer e menor é o tempo gasto para ocorrer a
transformação cancerosa.
Certas hiperplasias ou neoplasia benignas são também
consideradas lesões pré-malignas. Dentre estas podemos citar:
hiperplasia do endométrio e pólipos adenomatosos do intestino
grosso, especialmente o adenoma viloso. Outras vezes, o
indivíduo tem determinadas doenças, algumas de natureza
genética, que o torna mais predispostos a desenvolver certos
tipos de câncer. Trata-se de defeitos hereditários em oncogênese,

10
DISTÚRBIOS CIRCULATÓRIOS arterial, a diferença de pressão hidrostática ultrapassa a diferença
de pressão oncótica levando à saída do líquido para o interstício.
A circulação do sangue e a distribuição de líquidos no
organismo são feitas pela ação coordenada do coração, dos vasos Com isso, a pressão hidrostática no lado venoso diminui,
sanguíneos e dos vasos linfáticos. enquanto a pressão oncótica aumenta (pela perda de água sem
As artérias conduzem o sangue do coração aos tecidos. Suas perda significante de proteína) favorecendo a entrada de líquidos.
paredes são espessas e flexíveis, devido à presença de fibras De acordo com esse princípio, o edema se forma pelos
elásticas, permitindo a conversão do fluxo pulsátil em fluxo seguintes mecanismos:
contínuo. 1) Aumento da pressão hidrostática intravascular;
As veias possuem paredes mais finas do que as artérias e 2) Redução da pressão oncótica;
levam ao coração o sangue vindo do corpo. Os capilares são 3) Aumento da permeabilidade capilar com a saída de
responsáveis pela passagem de oxigênio e nutrientes para os líquidos e proteínas;
tecidos, já os vasos linfáticos reabsorvem o excesso de líquido 4) Aumento da pressão oncótica intersticial;
que não retornam pelas vênulas. 5) Obstrução da drenagem linfática.
Nos vasos sanguíneos, os componentes sólidos, como 6) Retenção de líquido no organismo.
hemácias e leucócitos, circulam em maior velocidade, no centro.
Na periferia do vaso, o plasma sanguíneo circula em menor Classificação quanto ao conteúdo:
velocidade, devido ao atrito proporcionado pela parede do vaso. Transudato: líquido com baixo teor de proteínas e com
Existem três forças principais que atuam sobre o vaso: densidade menor que 1020g/ml. O transudato indica que a
pressão intraluminal, longitudinal e de cisalhamento. Quando permeabilidade vascular continua preservada, permitindo a
essas forças ultrapassam a resistência da parede dos vasos, passagem de água, mas não de macromoléculas e proteínas.
surgem lesões como dilatações ou rupturas vasculares. A pressão
intraluminal ocorre devido à compressão radial provocada pelo Exsudato: indica que houve aumento da permeabilidade
fluxo sanguíneo. A pressão longitudinal é provocada por vascular, o que decorre da ação de substâncias químicas
hiperextensão do vaso e o cisalhamento é constituído pela força liberadas nos processos inflamatórios. O exsudato é turvo e,
de atrito que atua tangencialmente a superfície interna do vaso. devido à grande concentração de fibrinogênio, pode apresentar
As alterações dessas forças provocam remodelação estrutural dos precipitados de proteínas (coágulos transparentes). O exame
vasos. O exercício físico, por exemplo, aumenta o fluxo citológico desse líquido revela abundância de células
sanguíneo e consequentemente o cisalhamento, que estimula a inflamatórias.
liberação de óxido nítrico e prostaciclina 2 pelas células
endoteliais. Essas citocinas promovem vasodilatação, que ao Classificação quanto à localização:
longo do tempo, levará à sua remodelação. O edema generalizado é chamado de anasarca. As suas
Visto alguns aspectos gerais do processo circulatório, causas são sistêmicas, e temos como exemplo: a redução da
estudaremos os distúrbios circulatórios, propriamente ditos. Os pressão oncótica, insuficiência cardíaca ou alterações renais.
distúrbios circulatórios estão relacionados às alterações na O edema localizado, na maioria das vezes, deriva de
irrigação sanguínea e no equilíbrio iônico. processos inflamatórios e recebe nomenclatura específica,
composto pelo prefixo hidro seguido pelo local do edema. Por
EDEMA exemplo: hidrotórax, hidropericardio, hidroperitonio ou ascite.
O edema é o acúmulo de líquido no interstício ou em
cavidades do organismo. Ele pode ser classificado de acordo com Edema generalizado:
a sua composição ou localização. Quanto à sua composição, Caracteriza-se pelo aumento de líquido intersticial em muitos
pode ser um transudato ou exsudato; quanto à sua localização, ou todos os órgãos. Manifesta-se predominantemente no tecido
pode ser sistêmico ou localizado. subcutâneo, sendo mais evidente nos pés, tornozelos e pernas,
A patogênese do edema pode ser compreendida a partir do em pacientes não acamados. Em pacientes acamados, o edema se
conhecimento dos fatores que regulam o transporte dos líquidos manifesta inicialmente na região sacral.
na microcirculação. A redução da pressão oncótica leva ao edema generalizado.
A diferença entre as pressões hidrostática e oncótica Como exemplo de patologias que levam a redução da pressão
movimenta os líquidos entre o vaso e o interstício (força de oncótica, podemos citar: desnutrição, lesões gastrointestinais,
Starling). A pressão hidrostática é a pressão que o sangue exerce doenças hepáticas e doenças renais que podem levar a
sobre o vaso. A pressão oncótica é gerada pela diferença proteica hipoproteinemia.
dentro e fora do vaso. As principais proteínas intravasculares são Com a redução do volume intravascular, o sistema renina-
as albuminas e globulinas. Como as proteínas plasmáticas não angiotensina-aldosterona é ativado promovendo a retenção de
conseguem atravessar as paredes de capilares sanguíneos sólidos e água pelos rins, retroalimentando o edema.
saudáveis, elas exercem pressão osmótica sobre os íons e água,
que atravessam as paredes dos capilares e equilibram Principais causas do edema generalizado:
parcialmente a quantidade de líquido que sai dos capilares Insuficiência cardíaca: é a causa mais comum de edema
devido à pressão hidrostática. generalizado. Na insuficiência cardíaca esquerda, ocorre o
A troca contínua de líquidos na microcirculação pode ser aumento da pressão capilar pulmonar e congestão passiva,
explicada pela seguinte teoria: filtração no lado arterial e podendo ocasionar edema pulmonar. Quando a insuficiência é
reabsorção no lado venoso de um mesmo capilar. No lado cardíaca direita, aparecem edemas nos membros inferiores e na

11
região sacral de pacientes acamados, nas cavidades pleurais,
pericárdio ou peritoneal. Quando o débito cardíaco cai, há
estímulos do sistema adrenérgico com vasoconstrição e
diminuição da filtração renal, causando retenção de sódio e água,
que é agravada pela ativação do sistema renina-angiotensina-
aldosterona.

Doenças renais: Em muitas doenças renais, há diminuição da


excreção de sódio e água, o que pode resultar em edema
generalizado. Além disso, muitas glomerulopatias são
acompanhadas de perda de albumina na urina, denominada de
proteinúria, que reduz a pressão oncótica e leva a anasarca.

Cirrose hepática: leva ao edema generalizado por redução da


síntese proteica no fígado e por dilatação arterial periférica que
estimulam o sistema renina angiotensina aldosterona. O reflexo Edema pulmonar. Aumento 10x
hepatorrenal também promove a retenção de sódio pelos rins.
Edema cerebral: Consiste no aumento de líquido intersticial e
Edema localizado intracelular no tecido nervoso. O edema cerebral é importante
É promovido por um fator que atua localmente podendo, às por sua frequência e gravidade. Como o cérebro não possui
vezes, ser uma manifestação inicial do edema generalizado. Os drenagem linfática e está cerrado pela calota craniana, pequenos
principais edemas localizados são discutidos abaixo: edemas provocam grandes aumentos de pressão intracraniana.
Ao exame macroscópico, o cérebro com edema tem peso
Edema de membros inferiores: Pode ser provocado por aumentado, giros achatados, sulcos estreitos e ventrículos
insuficiência cardíaca e pela obstrução da veia cava inferior, reduzidos. Sua superfície apresenta-se lisa.
devido à compressão neoplásica ou compressão do útero O paciente com edema cerebral apresenta cefaleia, vômito,
gravídico, ascite, etc. tontura e nos casos mais graves, perda de consciência e óbito.
O edema de membros inferiores também pode ser ocasionado
pela obstrução linfática, como acontece na filariose (elefantíase)
e na retirada dos linfonodos associados à mastectomia. HIPEREMIA
Em condições normais a contração dos músculos esqueléticos Consiste no aumento da quantidade de sangue no interior dos
e o sistema de válvulas venosas nas veias profundas, contribuem vasos de um órgão ou território orgânico. Ela pode ser ativa ou
para manter o fluxo sanguíneo até o átrio direito. Em indivíduos passiva, aguda ou crônica.
com varizes e insuficiência das válvulas venosas, a bomba
muscular não é capaz de impulsionar o sangue, com isso, a Hiperemia ativa: Consiste na dilatação arteriolar com o aumento
pressão hidrostática sobe, levando ao edema. do fluxo sanguíneo local. A vasodilatação tem origem simpática
Ao exame clínico do edema de membros inferiores, nota-se ou humoral e leva à abertura de capilares inativos, resultando em
aumento da circunferência das pernas, dos pés e do tornozelo, e a uma coloração rósea intensa ou vermelha do local com aumento
compressão digital da região deixa uma depressão local. de temperatura.
A hiperemia ativa pode ser fisiológica, quando há
Edema pulmonar: A parede capilar e o revestimento epitelial nos necessidade de maior irrigação, como ocorre nos músculos
alvéolos formam uma membrana de troca de gases entre os durante o exercício, na mucosa intestinal durante a digestão, e na
espaços aéreos e a circulação. Como essa membrana é muito fina pele em ambientes quentes. A hiperemia ativa também pode ser
para permitir as trocas gasosas, ela é vulnerável a agressões patológica, ocorrendo principalmente durante as inflamações.
físicas. O aumento da pressão capilar, redução da pressão
oncótica ou agressão aos capilares podem levar ao edema Hiperemia passiva: também denominada de congestão. Ela
pulmonar. Quando isso acontece, o líquido se acumula geralmente decorre da redução da drenagem venosa, e portanto,
inicialmente nos septos interalveolares, onde não existe apresenta coloração vermelho escura, devido à alta concentração
drenagem linfática; se a causa persiste, o líquido alcança os de hemoglobina oxigenada. A hiperemia passiva pode ser
alvéolos. O acúmulo de líquido no interstício causa redução da localizada, devido à obstrução venosa; ou sistêmica devido à
distensibilidade pulmonar, com prejuízos nas trocas gasosas, insuficiência cardíaca.
devido ao espessamento dos septos e da inundação dos alvéolos Na insuficiência cardíaca esquerda, surge a congestão
pelo líquido extravasado. A fase inicial do edema pulmonar é pulmonar; já na insuficiência cardíaca direita, surge a congestão
assintomática. Com o seu agravamento, o paciente tem dispneia sistêmica.
e tosse progressiva, expectorando escarro espumoso. Na congestão aguda, os vasos estão distendidos e o órgão é
mais pesado. Na congestão crônica, o órgão pode sofrer
A seguir, podemos observar a imagem de um edema hipotrofia e apresentar micro-hemorragias. Como na hiperemia
pulmonar. O líquido se acumulou no espaço extracelular (neste passiva ocorre o aumento da pressão hidrostática intravascular, a
caso, nos alvéolos). congestão e o edema estão intimamente associados.

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Abaixo, apresentamos os exemplos mais importantes de A viscosidade do sangue resulta da viscosidade do plasma
congestão: dos seus constituintes celulares e da força de cisalhamento. A
viscosidade sanguínea aumenta com a redução do diâmetro do
Congestão pulmonar: os capilares alveolares encontram-se vaso, por essa razão ela é máxima na microcirculação,
dilatados e os septos tornam-se alagados por edema intersticial. especialmente nas vênulas. Na microcirculação, onde o fluxo é
A longo prazo, os septos sofrem fibrose e ficam espessados. lento, qualquer aumento da viscosidade é desproporcionalmente
Devido a microruptura de capilares, ocorre a passagem de maior; por essa razão, a viscosidade repercute mais na
hemácias para os alvéolos e sua fagocitose pelos macrófagos microcirculação do que nos grandes vasos.
alveolares. Esses macrófagos são denominados de células da A síndrome da hiperviscosidade é entendida como um
insuficiência cardíaca. distúrbio da microcirculação caracterizada por aumento da
viscosidade sanguínea, que resulta em redução do fluxo capilar e
isquemia dos órgãos. Suas causas são resumidas abaixo:
Aumento do hematócrito: A produção exagerada de hemácias
(policitemia) ou a desidratação aumentam o hematócrito, a
viscosidade do sangue e a resistência vascular periférica. O baixo
fluxo aumenta o risco de formação de trombos e infartos.

Alterações na forma das hemácias: Anemia falciforme é o


exemplo clássico dessa condição. Na anemia falciforme, a
mutação do gene da hemoglobina resulta em síntese de uma
proteína defeituosa Hb-S. Nos casos de hipóxia ou acidose, a Hb-
S se polimeriza e se precipita no interior das hemácias, alterando
sua forma e rigidez. Hemácias falciformes formam agregados
nos capilares e promovem a adesão anormal, provocando
microclusões múltiplas, infartos em vários órgãos e muitas vezes
desenvolvem úlceras na região do tornozelo.

Leucocitose - leucostase: A rigidez dos leucócitos aumenta


Hiperemia – congestão. Aumento 10x
quando eles são ativados. Nas leucocitoses acentuadas, como
ocorre em leucemias agudas e crônicas, os leucócitos podem
Congestão hepática: pode ser aguda ou crônica. Ela é provocada provocar leucostase, que significa obstrução da microcirculação
pela insuficiência cardíaca congestiva e pela obstrução das veias por grande número de leucócitos anômalos. As microcirculações
hepáticas ou da veia cava inferior. Na congestão aguda, o fígado do cérebro e pulmões são as mais afetadas nessa situação. As
se encontra aumentado, em peso e volume, possuindo coloração manifestações clínicas são sintomas neuropsiquiátricos,
azul vinhosa. Na congestão crônica, o órgão tem cor vermelho distúrbios da visão, insuficiência respiratória, dispneia e cianose.
azulado; as regiões centrolobulares são deprimidas e ficam
circundadas por parênquima hepático amarelado. Ao Hiperviscosidade plasmática: É provocada pela existência de
microscópio, os sinusoides são alargados e os hepatócitos proteínas plasmáticas anômalas ou de alto peso molecular, como
centrolobulares estão hipotróficos pela hipóxia. Em fase ocorre, por exemplo, no mieloma múltiplo, devido a grande
avançada, pode haver necrose, hemorragia centrolobular e deposição de proteína M pelos plasmócitos. Grandes quantidades
fibrose das veias centrolobulares e dos sinusoides. de proteína do sangue aumentam a agregação entre hemácias e
reduz as forças de dispersão entre elas. O paciente possui
Congestão do baço: Causada por insuficiência cardíaca, o órgão sangramento, devido à lesão capilar causada por hipóxia,
encontra-se de volume cianótico e repleto de sangue. A microtrombos ou distúrbios secundários da coagulação. Além de
congestão crônica é encontrada principalmente nos casos de hemorragias são também frequentes manifestações neurológicas
hipertensão portal. O baço se apresenta com aumento em como cefaleia, parestesias, ataxia, nistagmo, confusão mental e
volume, endurecido por fibrose e com focos de hemorragia coma, às vezes letais. A hiperglicemia também aumenta a
recente ou antiga. viscosidade do sangue. Em pacientes diabéticos de longa
A esplenomegalia congestiva pode ser acompanhada de duração, com hiperglicemia prolongada, a hiperviscosidade do
hiperesplenismo, que se caracteriza por anemia, leucopenia, sangue é considerada um fator importante no desenvolvimento
plaquetopenia (isolados ou associados) e pancitopenia. A retirada da retinopatia diabética.
cirúrgica do baço consegue corrigir o hiperesplenismo.
HEMOSTASIA
É o processo fisiológico de controle de sangramento, quando
ocorre lesão vascular. Para permitir sua circulação, o sangue
SÍNDROME DA HIPERVISCOSIDADE
A viscosidade é definida como a resistência intrínseca de um precisa manter-se em estado líquido no interior dos vasos. Ao
líquido contra o fluxo. Sua base molecular é a fricção interna mesmo tempo, é importante que soluções de continuidade da
entre suas moléculas e partículas. Qualquer aumento de parede vascular sejam tamponadas por uma massa solidificada de
viscosidade, diminui o fluxo. sangue, a fim de evitar o seu extravasamento. Distúrbios da
hemostasia são muito frequentes na prática, e são responsáveis

13
por inúmeras condições patológicas. A hemostasia depende da potencial de amplificação. Uma vez iniciada a coagulação, os
ação de três componentes fundamentais: a parede vascular; as sistemas anticoagulantes são estimulados e impedem o
plaquetas e o sistema de coagulação. crescimento descontrolado do coágulo ao mesmo tempo em que
iniciam sua dissolução.
Parede vascular: Os componentes principais da parede vascular
com função hemostática são: 1. Endotélio 2. Moléculas que
participam da coagulação e formação do tampão plaquetário HEMORRAGIA
(tromboplastina: fator tecidual liberado pelo endotélio lesado; É a saída do sangue do espaço vascular (vasos ou coração)
fator de Von Willebrand: presente na região subendotelial e para o compartimento extravascular, cavidades, interstício ou
estimulador da adesão plaquetária; colágeno, fibronectina e para fora do organismo. Desse modo, a hemorragia pode ser
laminina: que ativam a via intrínseca da coagulação). interna ou externa e recebe nomes particulares, segundo sua
Células endoteliais tem atividade antitrombótica por localização.
produção de diversos fatores: 1. glicosaminoglicanos, molécula
de carga negativa com ação semelhante a heparina, inibindo Hemorragia por rexe: É o sangramento que ocorre por ruptura
junto com a antitrombina III, o processo de coagulação da parede vascular do coração e saída do sangue em jato. As
sanguínea; 2. óxido nítrico e prostaciclina 2, que impedem a principais causas são: 1. Traumatismo; 2. Enfraquecimento da
adesão e agregação plaquetária; 3. Trombina, formada pelo parede vascular; 3. Aumento da pressão sanguínea.
sistema de coagulação, se liga a trombomodulina na superfície
das células endoteliais; o complexo formado ativa as proteínas C Hemorragia por diapedese: Se manifesta pela saída das
e S que tem efeitos anticoagulantes. hemácias dos capilares individualmente, por entre as células
O endotélio íntegro também impede a interação das plaquetas endoteliais com o afrouxamento da membrana basal. Quase
com o fator de Von Willebrand, o qual provoca agregação das sempre não se encontram lesões vasculares à microscopia de luz.
plaquetas e sua degradação. Da mesma maneira, o epitélio
íntegro também impede o contato do plasma com o colágeno, As hemácias extravasadas durante o processo hemorrágico
que ativaria a cascata de coagulação. podem sofrer lise ou podem ser fagocitadas por macrófagos. A
As células endoteliais, ainda, produzem ativadores de hemoglobina liberada transforma-se em biliverdina e depois em
plasminogênio, cuja ação resulta na formação de plasmina, bilirrubina; o ferro da hemoglobina gera hemossiderina que pode
responsável pelo processo de fibrinólise. ser encontrada no interior dos macrófagos. Tais transformações
acompanham alterações na cor da lesão hemorrágica. No
Plaquetas: são essenciais na hemostasia além de atuarem na primeiro dia, hematomas subcutâneos são vermelhos, mudando
regulação do tônus vascular e na cicatrização. A carga para o tom azul violáceo no dia seguinte; por volta de uma
eletrostática negativa na sua superfície impede a adesão das semana são esverdeados, adquirindo cor amarelada em torno de
plaquetas entre si e com as células endoteliais. Para cumprir seu 10 dias. Logo depois, desaparecem.
papel na hemostasia, as plaquetas sofrem as seguintes Histologicamente, nas fases iniciais verifica-se a presença de
modificações: hemácias íntegras. Já no período tardio, uma hemorragia pode
ser constatada pela presença do pigmento de hemossiderina.
Adesão: Aderência das plaquetas ao colágeno subendotelial Algumas vezes o sangramento adquire características
mediado pelo fator de Von Willebrand. particulares. A hemorragia digestiva, por exemplo, pode
exteriorizar-se pela boca ou pelo ânus. Nos casos de hemorragia
Secreção: Quando ativada, as plaquetas liberam fatores pró- digestiva baixa, o sangue é eliminado junto com as fezes sem
coagulantes, tais como: sofrer transformação e por isso tem cor vermelho vivo. Nas
Fator plaquetário 4: Possui atividade anti-heparina. hemorragias digestivas altas, após contato com o suco gástrico, a
ADP: estimula a agregação plaquetária hemoglobina se transforma em hematina que tem cor negra. Esse
Tromboxano A2: agregador plaquetário e potente sangue escuro é denominado de melena. Quando o sangue
vasoconstritor. permanece por pouco tempo no estômago, o sangue não é
Serotonina digerido e tem cor vermelha. Esse quadro constitui hematêmese.
Cálcio: essencial na cascata de coagulação. Consequências e complicações da hemorragia são variadas e
dependem da quantidade do sangue perdido, da velocidade da
Agregação: Processo no qual as plaquetas aderem umas às perda e do local afetado. As principais consequências são:
outras. Entre as plaquetas desgranuladas formam-se fibrina, que Choque hipovolêmico; anemia; asfixia e tamponamento
juntamente com as plaquetas, formam o tampão plaquetário. cardíaco.

SISTEMA DE COAGULAÇÃO-FIBRINÓLISE:
A reação fundamental no processo de coagulação é a
transformação do fibrinogênio em fibrina polimerizada, que é
insolúvel. Esse processo ocorre por duas vias:
1. Via intrínseca: a partir do contato de fatores de coagulação
com a superfície de colágeno.
2. Via extrínseca: Ativada pela liberação de tromboplastina
quando há destruição celular. A cascata de coagulação tem alto

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Alteração das plaquetas: indivíduos com trombocitopenia ou
distúrbios da função plaquetária podem apresentar petéquias na
pele, mucosas, retina e órgãos internos. O sangramento causado
pela redução do número de plaquetas cessa imediatamente após
compressão local e não volta depois da descompressão.
A trombocitopenia pode ser provocada por: produção
diminuída, que pode ser congênita ou adquirida; aumento da
destruição, por exemplo, durante a púrpura trombocitopênica
idiopática em que auto-anticorpos antiplaquetários favorecem
sua fagocitose; no hiperesplenismo associado a esplenomegalia
existe a grande retenção de plaquetas; aumento do consumo
encontrado caracteristicamente nos casos de coagulação
intravascular disseminada. As alterações funcionais de plaquetas
denominadas de trombocitopatias decorrem de modificações
quantitativas ou qualitativas e seus componentes.

Fatores de coagulação: Defeitos congênitos ou adquiridos no


Hemorragia. Aumento 10x sistema de coagulação resultam em hemorragias. Dentre os
defeitos congênitos, podemos citar: Hemofilia - decorrente da
diminuição da atividade do fator VIII; Doença de Von
Willebrand, devido a um defeito na síntese desse fator. A doença
de Von Willebrand é relativamente comum afetando cerca de 1%
da população, clinicamente caracteriza-se por sangramentos
anormais após traumatismo.

Aumento da fibrinólise: o aumento congênito dos ativadores ou a


diminuição de inibidores da fibrinólise levam a sangramento
após lesões vasculares. Alterações adquiridas da fibrinólise são
raras. Traumatismo, cirurgias, hipertermia e choque elétrico
podem provocar a liberação do ativador tecidual do
plasminogênio pelas células endoteliais. Algumas neoplasias
malignas, por exemplo câncer de próstata, também produzem
ativador tecidual do plasminogênio, resultando em fibrinólise
acentuada.

Hemorragia. Aumento 20x


TROMBOSE
DIÁTESE HEMORRÁGICA A trombose é uma patologia onde o processo hemostático
Diátese hemorrágica é definida como uma tendência ao está ocorrendo de forma desequilibrada. Ela é definida como a
sangramento sem causa aparente ou hemorragia mais intensa e solidificação do sangue dentro dos vasos ou do coração de
prolongada após traumatismo. A diátese hemorrágica acontece indivíduos vivos.
devido a alterações na parede vascular, nas plaquetas e no Incialmente, é importante fazer uma diferenciação entre o que
sistema de coagulação e fibrinólise. é trombo e qual a diferença entre ele e o coágulo.
Trombo é uma massa sólida formada pela coagulação do
Distúrbio da parede vascular: Pacientes com telangiectasia sangue, dentro dos vasos ou do coração sem a ruptura do mesmo,
hemorrágica hereditária ou Doença de Osler, doença genética já o coágulo é uma massa não estruturada de sangue fora dos
autossômica dominante, apresentam anormalidades das fibras vasos ou do coração. Uma exceção a essa regra se dá em caso de
elásticas e colágenas, assim como persistências de anastomoses morte do indivíduo, onde o sangue coagula dentro dos vasos.
arteriovenosas comuns da idade fetal. Nesses indivíduos,
pequenos traumatismos são suficientes para provocar Etiopatogênese da trombose:
sangramentos de intensidade variável. Três são os fatores que desencadeiam a trombose, e esses três
A vitamina C é uma coenzima importante na síntese do fatores compõem uma tríade, denominada de tríade de Virchow.
colágeno. Na sua deficiência, como no escorbuto, o colágeno é São elas: lesão endotelial; alterações do fluxo sanguíneo e
defeituoso, sobretudo nas membranas basais, o que resulta em hipercoagubilidade.
fragilidade de veias e consecutiva hemorragia. Em indivíduos
idosos, ocorre alteração na síntese de elastina e colágeno na pele, Lesão endotelial:
(elastose senil) resultando em diminuição das fibras colágenas O endotélio é fundamental para a manutenção da fluidez do
nos vasos, propiciando a diátese hemorrágica. sangue, devido à produção local de fatores antitrombóticos.
Quando ocorre um dano, o endotélio fica deficiente na produção

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de fatores antitrombóticos e começa a expressar moléculas de trombóticos. Ela é definida como qualquer alteração das vias de
adesão e outros fatores pró-trombóticos. coagulação que predispõem à trombose. A hipercoagulabilidade
A lesão endotelial pode ocorrer devido: pode ocorrer devido ao aumento do número ou modificações
funcionais das plaquetas e devido a alterações dos fatores pro-
Lesão endotelial direta: Como exemplo de lesões endoteliais trombótico e anti-trombóticos, que podem ser congênitos ou
diretas podemos citar as placas ateromatosas ulceradas, as adquiridos.
agressões, devido a infecções, as agressões provocadas pela
diapedese de leucócitos, as provocadas pelas Inflamações agudas Alterações dos fatores pró e anticoagulante congênito:
e a invasão vascular de neoplasia. Vários são os fatores congênitos que podem predispor o
A lesão endotelial leva a ativação da via intrínseca da paciente a um distúrbio da coagulação, gerando trombose. No
coagulação, podendo acarretar na formação do trombo. entanto, os de maior prevalência são:

Lesão endotelial indireta: Algumas vezes não ocorre a lesão 1. Mutação pontual na molécula do fator V (fator de Leiden)
morfológica do epitélio, no entanto, sua disfunção funcional O fator V de Leiden se torna resistente à inativação pela
pode ocorrer em pacientes tabagistas ou hipercolesterolêmicos. proteína C, aumentando o risco de formação de trombo.
As placas ateromatosas não lesadas podem levar a redução da Essa mutação está associada ao risco aumentado (80 vezes)
síntese de anticoagulantes endoteliais e alterações da superfície de desenvolver trombose em indivíduos homozigotos e de 7
celular. vezes em indivíduos heterozigotos. No entanto, o risco de
desenvolvimento de trombose está positivamente correlacionado
Alterações do fluxo sanguíneo com a penetrância genética dessa mutação.
O fluxo sanguíneo normal é caracterizado pela sua
laminaridade, ou seja, a parte celular, incluindo as plaquetas, 2. Mutação da protrombina.
leucócitos e hemácias, caminham pelo centro do fluxo, já a Ocorre devido a mutações no fator 2, elevando os níveis de
porção plasmática flui na periferia do vaso. Essa disposição do protrombina e elevando sua meia vida. Como consequência,
fluxo sanguíneo aumenta sua fluidez, diminuindo a resistência também aumenta os níveis de trombina, fazendo que com o risco
intravaso e consequentemente a probabilidade de formação de de formação de trombos aumente.
trombo. No entanto, quando o fluxo está alterado, perde-se a
laminaridade e as plaquetas começam a ter maior probabilidade De maneira geral os fatores pró-coagulantes congênitos
de se ligarem a alguma superfície endotelial lesada. ocorrem em pacientes jovens.
Portanto, a lesão endotelial e as alterações do fluxo sanguíneo
são fatores que podem ocorrer concomitantemente, se Alterações dos fatores pró e anticoagulantes adquiridos
potencializando. 1. Liberação de tromboplastina no plasma em decorrência de
As alterações do fluxo sanguíneo podem ocorrer por politraumatismos, queimaduras e cirurgias extensas.
retardamento do fluxo, pela aceleração do fluxo ou turbulência. 2. Neoplasias: podem produzir fatores pró-trombóticos.
As causas do retardamento de fluxo, também denominada de Principalmente neoplasias de pâncreas, pulmão e mama.
estase sanguínea são: 3. Gestação: devido às mudanças hormonais.
a. Presença de placa ateromatosa 4. Uso de anticoncepcionais: O estrógeno aumenta os níveis de
b. Insuficiência cardíaca protrombina e de fibrinogênio, podendo promover processos
c. Dilatação vascular trombóticos. Vale ressaltar que os anticoncepcionais atuais são
d. Aumento do hematócrito muito seguros e a incidência de trombose é cada dia menos
e. Paciente restrito ao leito relatada.
f. Estenose valvular. 5. Auto-anticorpos contra fosfolipídeos plaquetários (lúpus
O retardamento do fluxo pode gerar hipóxia endotelial e levar eritematoso) favorecem a agregação plaquetária, aumentando o
a um aumento dos danos. Assim como também acaba risco de trombose.
concentrando os mediadores pró-trombóticos em uma única 6. Imobilização: devido à redução do fluxo venoso.
região. 7. Tabagismo: Possui efeito de hipercoagulabilidade, devido à
O aumento do fluxo também modifica o fluxo laminar resposta inflamatória provocada pelo tabaco.
permitindo um maior contato das plaquetas com a superfície 8. Trombocitopenia induzida pela heparina: O uso de heparina
interna dos vasos. não fracionada pode induzir a formação de anticorpos que podem
A turbulência sanguínea pode levar a lesão endotelial e a unir-se a complexos presentes nas superfícies plaquetárias e
quebra do fluxo laminar. Dentre as principais causas da endoteliais resultando em ativação plaquetária e,
turbulência, podemos citar: consequentemente, trombose.
a. Aneurisma.
b. Ateromas. Características dos trombos
c. Doença cardíacas congênitas.
d. Bifurcação de vasos, dentre outras. Características gerais
Os trombos são de tamanhos e forma variáveis, dependendo
Hipercoagulabilidade do local de origem e das circunstâncias que levaram ao seu
A hipercoagubilidade também é um componente importante, desenvolvimento.
mas contribui com menos frequência com os estados

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Presença de uma área de ligação entre o vaso ou à parede Lise: O processo de lise ocorre quando a fibrinólise é maior que
adjacente, que com frequência é mais firme no ponto de origem. a coagulação. Trombos recentes ainda sem fibrina estabilizada
são mais susceptíveis à lise.
Trombos arteriais:
 Começam geralmente no local da lesão endotelial Organização: O processo de organização ocorre quando a
 Crescem em direção retrógrada do ponto de ligação e ao coagulação é igual ao processo de fibrinólise. Durante o processo
fluxo sanguíneo de organização ocorre a endotelização da superfície.
 Quando formado no coração ou nas artérias: os trombos Canais podem se formar no trombo devido à necrose central.
arteriais podem ter laminações aparentes denominadas de linhas Posteriormente à remoção do tecido necrótico, ocorre o
de Zahn. As linhas de Zahn são formadas por camadas claras desenvolvimento de fibroblastos e de células endoteliais,
constituídas por plaquetas e fibrinas e camadas vermelhas ricas promovendo o desenvolvimento de um tecido de granulação com
em hemácias. Mostrando o fluxo sanguíneo intermitente. tecido conjuntivo bem vascularizado.
 Trombos murais são aqueles formados nas câmaras cardíacas Para que ocorra a organização, o trombo pode ser
e nas paredes aórtica, geralmente em decorrência de arritmias incorporado à parede do vaso, ou ser recanalizado.
cardíacas ou placa aterosclerótica e aneurismas aórticos. Calcificação: Além de se conjuntivar, o trombo pode se
 Trombos arteriais geralmente são oclusivos. calcificar formando um flebólito.
 Mais comuns em artérias coronárias, artérias cerebrais e Infecção: Quando existe uma bacteremia, septicemia ou uma
femurais. vasculite infecciosa, os trombos podem ser colonizados por
bactérias e fungos.
 Os trombos arteriais podem ser são branco-acinzentados e
Embolização: Por serem friáveis, os trombos podem se destacar
friáveis compostos de uma mistura de plaquetas, fibrina,
ou se fragmentar formando êmbolos.
eritrócitos e leucócitos degenerativos.
Coagulação intravascular disseminada:
A coagulação intravascular disseminada, também conhecida
como coagulopatia de consumo, é um processo patológico, no
qual o sangue começa a coagular por todo o corpo. Isso diminui
o número de plaquetas e fatores de coagulação do corpo,
existindo, paradoxalmente, um risco aumentado de hemorragia.

Causas:
Uma variedade de disfunções (incluindo complicações
obstétricas, liberação de tromboplastina na circulação, devido a
grandes traumatismos, queimaduras, etc.) promovem a ativação
do sistema de coagulação, levando a transformação do
fibrinogênio em fibrina e consequente deposição da fibrina na
parede interna do vaso. Esses depósitos de fibrina podem levar a
formação de centenas de trombos, promovendo o esgotamento da
atividade plaquetária e da atividade fibrinolítica, ocasionando a
propensão às hemorragias.
A rede de fibrina pode lesar as hemácias levando à uma
Trombo. Aumento 10x anemia hemolítica

Trombos venosos: EMBOLIA


 Ocorrem principalmente em regiões de estase sanguínea. A embolia consiste na existência de um corpo sólido, líquido
 Crescem em direção ao fluxo sanguíneo. ou gasoso que é transportado pelos vasos, sendo capaz de
 Trombo avermelhado pela presença maciça de hemoglobina obstruir vasos. Essa obstrução geralmente ocorre após as
que se depositam em decorrência do processo de estase. sucessivas ramificações do vaso.
Quase a totalidade dos êmbolos deriva de trombos,
Evolução e consequências dos trombos caracterizando a tromboembolia.
Logo após as formações iniciais do trombo, ocorre a ativação Outras fórmulas raras de embolia são gotas de gordura,
do sistema de fibrinólise e o início das reações locais associadas bolhas de ar ou de nitrogênio, detritos ateroscleróticos (êmbolos
à sua organização. de colesterol), pedaços da medula óssea e corpos estranhos,
Portanto, a formação, a fibrinólise e a organização como projéteis.
determinam sua evolução: Os trombos venosos vão em direção aos pulmões e dão
origem a tromboembolia pulmonar, com exceção dos formados
Crescimento: O crescimento do trombo ocorre quando o no sistema porta. Os trombos arteriais vão para a circulação
processo coagulativo é maior do que o processo fibrinolítico sistêmica.
(coagulação > fibrinólise). Geralmente, o crescimento ocorre a
partir da cabeça ou da cauda. E sua consequência é a obstrução
do vaso. Tromboembolia pulmonar:

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Os trombos que dão origem a tromboembolia pulmonar são descompressão, leva também a coagulação sanguínea e ativação
formados geralmente nas veias íleo-femurais profundas e nas do sistema de cininas e complementos
veias profundas das panturrilhas. E são muito comuns em: Pacientes sujeitos a constantes descompressões de baixa
pacientes acamados, em fraturas e em cirurgias extensas. intensidade podem desenvolver a doença crônica da
A consequência depende principalmente do tamanho e do descompressão, que leva a necrose isquêmica no sistema
número dos êmbolos. esquelético, em locais de baixa vascularização como a cabeça do
fêmur; tíbia e úmero.
Tromboembolia arterial
A tromboembolia arterial ocorre, principalmente, devido a: Embolia gordurosa
infarto do miocárdio, fibrilação arterial, doença de chagas, É caracterizada pela presença de gotículas de lipídeos na
dilatação do ventrículo esquerdo e lesões de valvas cardíacas. circulação, que pode ser provocada por fraturas de ossos longos,
traumatismos extensos devido à destruição do tecido adiposo.
O trombo arterial pode ser encaminhado para: Algumas doenças podem provocar emulsificação de lipídeos
 Encéfalo: Provocando o acidente vascular cerebral isquêmico como a diabetes mellitus e a pancreatite, podendo levar a
 Artérias mesentéricas: Provocando infarto intestinal liberação de ácidos graxos que lesam o endotélio, promovendo
 Boca e rins: Provocando infartos não letais obstrução capilar e coagulação intravascular disseminada.
 Membros inferiores: Levando à isquemia e dor
Todos os trombos arteriais podem levar à necrose tecidual. Outras embolias
Rupturas de placas ateromatosas: denominada de
Embolia de líquido amniótico: ateroembolia
A embolia por líquido amniótico pode se originar da ruptura Células malignas na circulação: denominada de embolia
das membranas da placenta que se estendem até a veia do útero, tumoral
permitindo a entrada de líquido amniótico na circulação.
O líquido amniótico é muito rico em prostaglandina F 2, ISQUEMIA
células descamadas e mecônio, que possuem alta atividade pró- Isquemia é a redução ou parada do suprimento sanguíneo em
coagulante e podem promover a coagulação intravascular um determinado órgão. Podendo ser total, parcial, de curso
disseminada. rápido ou lento.
Causas da isquemia:
Embolia gasosa venosa 1. Diminuição da pressão entre veias e artérias: devido ao
Consiste na entrada de ar nas veias. choque ou aumento da pressão venosa.
Grande quantidade de ar pode entrar em uma veia quando 2. Obstrução da luz vascular: São as causas mais comuns e
existe um gradiente de pressão negativo entre a veia e o átrio podem ocorrer devido a obstruções anatômicas como as
direito. provocadas pelos tumores, hematomas, por compressões
São causas da embolia gasosa: punções, procedimentos prolongadas (glaucoma, úlceras sacrais) e edemas (ex. edema
cirúrgicos, pneumotórax, bolhas de ar em sistema de infusão, cerebral). Também podem ser provocadas pelos ateromas,
parto, dentre outros. trombos e êmbolos, bacteremias e vasoespamos.
O ar que entra na circulação vai até o ventrículo direito, 3. Aumento da viscosidade do sangue. Provocado pelo
podendo promover a formação de espuma que se dissipa para as aumento do hematócrito, coagulopatias etc.
veias pulmonares ou leva à disfunção ventricular. 4. Aumento de demanda.
Além dos danos provocados pela infusão do ar, podem
ocorrer problemas na coagulação sanguínea e precipitação de A isquemia pode levar à hipóxia e a angina, e variam de
lipídeos plasmáticos. acordo com sua intensidade e duração:
Geralmente a entrada de um pequeno volume de ar pode
levar ao edema pulmonar decorrente da inflamação oriunda dos Isquemia relativa temporária: É caracterizada como uma
danos da embolia. Quando a entrada de ar é abundante, pode obstrução parcial associada ao aumento de demanda (geralmente
ocorrer a morte súbita. levando a quadros de angina)
Outro exemplo é a hipoperfusão intestinal em corridas
Embolia gasosa arterial longas.
A embolia gasosa arterial ocorre pela passagem do ar pelos A isquemia e quadros de hipóxias sucessivas aumentam a
capilares pulmonares, por defeitos cardíacos congênitos, e pelo produção de VEGF que levam a neoformação vascular. Portanto,
forame oval aberto que liga o átrio esquerdo ao átrio direito. os períodos curtos de hipóxia elevam a tolerância à isquemia e
Dentre outras causas, podemos citar: presença de cateter são denominados de pré-condicionamento isquêmico.
arterial, cirurgias cardíacas, circulação extracorpórea e
descompressão súbita. Isquemia subtotal temporária: É caracterizada pela obstrução
Em condições hiperbáricas, os gases existentes no ar se incompleta, que garante o fluxo sanguíneo mínimo, levando à
dissolvem em maior quantidade no plasma e nos líquidos intra e perda da atividade funcional.
extracelulares. Em caso de descompressão rápida, os gases que A duração da isquemia subtotal é crucial para o aparecimento
estavam dissolvidos formam bolhas gasosas no sangue, levando de possíveis lesões e a reperfusão é importante nas primeiras
a obstrução de vasos, morte de tecidos e células. A doença da horas.

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Isquemia absoluta temporária: Interrupção passageira do Inicialmente, as margens do infarto branco são mal definidas,
suprimento sanguíneo. Pode decorrer, por exemplo, em casos de mas posteriormente se tornam bem definidas. Após a
uma parada cardíaca seguida de ressuscitação ou da formação de cicatrização conjuntiva, ocorre uma depressão local.
um trombo seguida por trombólise. Ela é caraterizada por dor Caso haja uma invasão microbiana, geralmente devido à uma
intensa, perda de força contrátil e arritmias cardíacas. embolia séptica, a área de necrose evolui para um abcesso.
Os tecidos possuem tolerâncias à isquemia absoluta Normalmente, os infartos brancos são constituídos de necrose
diferentes: por coagulação.
Neurônio: 4 a 6 minutos;
Miocardiócitos: 20 a 40 minutos; Aspectos morfológicos do infarto vermelho:
Células renais: 60 a 180 minutos; Idêntico ao infarto branco, no entanto, apresenta uma
A hipotermia aumenta o tempo de tolerância à isquemia superfície vermelha escura, consistência dura e uma saliência
absoluta temporária e é muito utilizada em transplante de órgãos. superficial.

Isquemia persistente: Bloqueio total ou subtotal por tempo Infartos crescentes: No cérebro e no coração, a periferia da área
prolongado. As isquemias de baixa intensidade levam a de necrose permanece viva, devido à perfusão mínima local
degenerações e hipotrofias, enquanto as de alta intensidade (penumbra isquêmica). No entanto, pode evoluir para necrose
levam ao infarto. caso não haja reperfusão.
No coração, o infarto se inicia no subendocárdio, mas se não
Em casos de isquemia parcial de longa duração, o miocárdio reperfundido, estende-se para o epicárdio.
pode responder com sua hibernação, que geralmente é reversível,
sendo caracterizada pelas alterações degenerativas e a aquisição Reperfusão
de um fenótipo de células embrionárias. A reperfusão pode ser realizada por cirurgia de
revascularização ou por tromboplastia. A reperfusão realizada
INFARTO em até 60 minutos reduz a mortalidade em até 50%. Portanto, a
Infarto são áreas circunscritas de necrose tecidual devido a agilidade para a realização desse procedimento é fundamental.
distúrbios circulatórios venosos ou arteriais que levam à No entanto, a reperfusão pode levar a lesões adicionais
isquemia prolongada. devido aos mecanismos abaixo citados:
As áreas de necrose podem se apresentar esbranquiçadas ou As células cardíacas quando em hipóxia produzem xantina
avermelhadas, sendo denominadas de infarto branco ou infarto oxidase, a partir da xantina desidrogenase, que em contato com o
vermelho. oxigênio que chega da reperfusão produz espécies reativas de
oxigênio, provocando lesão endotelial adicional. A lesão
Infarto branco: Ocorre devido à obstrução arterial em órgãos endotelial leva diminuição da produção de NO com aumento da
sólidos com circulação terminal. Como por exemplo: coração; expressão de moléculas de adesão, consequente adesão de
baço; rins. granulócitos e diapedese, levando a morte celular das células que
inicialmente sobreviveram.
Infarto vermelho: Acomete os órgãos que não possuem A lesão por reperfusão também ocorre devido ao aumento
circulação terminal e é caracterizado por uma região vermelha intracelular de Ca2+ e consequente desbalanceio osmótico
devido à intensa hemorragia na área de necrose. provocado pela hipóxia. Quando o plasma sanguíneo volta para a
Acomete órgãos frouxos (pulmões) ou de irrigação dupla e região atingida pelo infarto, encontra o desbalanceio osmótico
pode ser oriundo de uma obstrução arterial ou venosa. que acarretará em agravamento da lise celular.

Infarto vermelho por obstrução arterial: a obstrução arterial leva Aspectos clínicos: Consequências do infarto.
a um infarto vermelho quando acomete um órgão de dupla O infarto pode levar a febre, leucocitose e aumento de
irrigação ou em regiões de anastomose. O infarto vermelho pode transaminase e desidrogenase plasmáticas liberadas pelas células
suceder um infarto branco após trombólise e consequente necróticas.
extravasamento de sangue. No caso do infarto do miocárdio encontramos dor precordial
que habitualmente se irradia para membro adjacente e
Infarto vermelho por obstrução venosa: Todos os infartos mandíbula.
decorrentes da obstrução venosa são vermelhos. Eles podem Dor abdominal é o sintoma comum do infarto intestinal.
ocorrer devido à trombose; compressão ou torção de pedículo
vascular. CHOQUE
O choque é definido como falência circulatória associada a
Aspectos morfológicos do infarto branco: um grave distúrbio da microcirculação e hipoperfusão
A área de necrose em decorrência do infarto tem forma de generalizada de tecidos e órgãos.
triângulo com base voltada para a superfície e ápice voltado para O estado de hipoperfusão que caracteriza o choque pode ser
a obstrução. Em torno da área de necrose forma-se um halo provocado por distúrbios iniciais na macrocirculação ou
hiperêmico com vasos dilatados e ricos em infiltrado distúrbio da distribuição do volume sanguíneo. O denominador
leucocitário. O halo hiperêmico acontece na tentativa dos tecidos comum em todos esses casos é a queda da pressão da
vizinhos irrigarem a área que sofreu hipóxia, e que evoluiu para microcirculação resultando em baixa perfusão generalizada. Os
necrose. tipos de choque podem ser divididos em:

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Choque cardiogênico: Instala-se quando o coração torna-se artérias e veias, queda da resistência vascular periférica e
incapaz de bombear adequadamente o sangue, por exemplo, diminuição do retorno venoso ao coração. Ele pode acontecer
durante o infarto do miocárdio, ou na impossibilidade de durante infecções agudas do sistema nervoso central,
contração eficaz como na arritmia cardíaca e tamponamento traumatismos e sangramentos extensos e insolação.
cardíaco.
Em cerca de 20% dos pacientes, o choque cardiogênico pode
levar ao quadro de síndrome da resposta inflamatória sistêmica Formas hemodinâmicas do choque: De acordo com o
(SIRS). A síndrome da resposta inflamatória sistêmica consiste comportamento hemodinâmico o choque pode se dividir em duas
na apresentação de PAMPs, que são liberados durante a morte formas:
celular dos tecidos lesados levando a uma resposta que
discutiremos a seguir. Forma hiperdinâmica: Encontrada no início do choque séptico-
tóxico, no qual inicialmente não se observa transtornos na
Choque hipovolêmico: ocorre na presença de perda súbita na microcirculação e macrocirculação.
quantidade de líquidos do organismo, podendo ser provocado por Em resposta à vasodilatação inicial, o organismo adapta-se
sangramento intenso, traumatismo, cirurgias, perda de plasma, mediante ativação do sistema adrenérgico e renina-angiotensina-
por exemplo, durante uma queimadura extensa, por desidratação aldosterona. Com isso, há taquicardia e retenção de líquidos
ocasionada por diarreia profusa ou calor excessivo. pelos rins na tentativa de manter o equilíbrio hemodinâmico e de
garantir o fluxo sanguíneo ao cérebro e ao coração. Se a causa do
Choque séptico: Provocado por bactérias Gram negativas choque não é eliminada, esses mecanismos adaptativos se
produtoras de endotoxinas, sobretudo o LPS. Nesses casos ocorre esgotam e o paciente entra na fase hemodinâmica hipodinâmica.
a liberação de vários mediadores químicos levando a ativação
generalizada de leucócitos, condição conhecida como síndrome Forma hipodinâmica: Pode existir desde o início do choque ou
da resposta inflamatória sistêmica (SIRS). Essa síndrome suceder a forma hiperdinâmica. Ela pode se apresentar em duas
consiste em uma reação exagerada do organismo a uma agressão fases:
forte, como infecções ou doenças graves com ou sem a
participação de microrganismos. Quando causadas por infecção, Fase hipodinâmica compensada: No período inicial, exceto do
a síndrome da resposta inflamatória sistêmica é desencadeada choque séptico tóxico, há queda de pressão arterial e do débito
por moléculas encontradas em bactérias patogênicas denominada cardíaco, por causa da redução da volemia e do retorno venoso
de PAMPs, ou seja, moléculas padrões associados a patógenos, sistêmico. Como resposta adaptativa, ocorre à ativação do
encontradas na superfície da bactéria ou liberadas após a lise sistema renina- angiotensina-aldosterona. A angiotensina II é
desses microrganismos como, por exemplo, fragmentos de DNA vasoconstritora potente e libera aldosterona, que por sua vez,
ou proteínas do choque térmico. estimula a reabsorção de sódio e água ajudando a manter o
Após a ativação dos receptores, macrófagos e neutrófilos volume intravascular. Ao mesmo tempo, ocorre estimulação
iniciam uma resposta inflamatória liberando, principalmente, simpático adrenérgica com a liberação de adrenalina e
citocinas derivados do ácido araquidônico, fator de ativação de vasopressina, com isso, ocorre a vasoconstrição por estímulo dos
plaquetas e óxido nítrico. Há também aumento de catecolaminas receptores α, os quais existem nos vasos da pele, músculo, rins e
que estimulam o catabolismo e provocam perda de massa mesentério, causando diminuição do fluxo sanguíneo e
muscular por proteólise. O óxido nítrico em excesso causa hipoperfusão. Enquanto o cérebro, o coração e os vasos, que
vasodilatação e reduz a resposta a agonistas beta adrenérgicos na possuem receptores Beta-adrenérgicos não sofrem redução da
microcirculação, além de diminuir a função contrátil do perfusão. A restituição do sangue para órgão vitais, como
miocárdio. A liberação de citocinas e de TNF-α ativa células cérebro e coração, é conhecida como centralização da circulação.
endoteliais e a geração de radicais livres, enquanto a liberação de Como consequência, o metabolismo passa a ser anaeróbio e o
proteases lesa o endotélio. Por essa razão, pode ocorrer edema nível de lactato no sangue aumenta fazendo com que o PH
intersticial e coagulação intravascular disseminada. Em uma diminua (acidose láctica).
segunda fase, a síndrome da resposta inflamatória sistêmica pode
deprimir o sistema imune causando redução da expressão de Fase descompensada: A grande mudança do metabolismo
moléculas HLA-DR em monócitos e apoptose de células defesa. aeróbio para anaeróbio é fundamental para o destino do paciente.
Com isso, bactérias do tubo gastrointestinal podem, por A acidose progressiva paralisa a musculatura dos vasos arteriais,
translocação, penetrar na circulação e agravar o quadro. com isso, as arteríolas previamente contraídas se dilatam e as
vênulas continuam contraídas, aumentando ainda mais a saída de
Choque anafilático: Resulta de uma reação antígeno-anticorpo líquido para o interstício. O hematócrito sobe, a hipovolemia se
mediada por IgE na superfície de mastócitos e basófilos. O efeito agrava e a viscosidade sanguínea aumenta. O processo entra em
mais grave das substâncias liberadas é a dilatação de um grande um círculo vicioso, com piora das condições hemodinâmicas na
número de vasos na microcirculação, o que resulta em queda da microcirculação. Aderência de leucócitos a parede dos vasos
pressão arterial e do retorno de vasos venosos. O choque também aumenta a resistência vascular independentemente da
anafilático pode ocorrer poucos minutos após o antígeno causa do choque. Tais alterações metabólicas graves resultam na
desencadear a reação. síndrome da resposta inflamatória sistêmica, que acompanha a
lesão endotelial e agregação plaquetária. Com o agravamento da
Choque neurogênico: é menos frequente e caracteriza-se por disfunção das células endoteliais, elas perdem a capacidade de
desregulação neurogênica, que resulta em redução do tônus das produzir prostaciclina, que é antiagregador de plaquetas. Por

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isso, tem a formação de um agregado plaquetário que libera o
fator pró-coagulante, levando à formação de microtrombos. A
formação de múltiplos microtrombos reduz a quantidade de
fibrina, plaquetas e fatores de coagulação, contribuindo para que
o paciente entre no estado de hipocoagulabilidade e apresente
sangramentos em vários órgãos.
Na fase descompensada, existe uma intensa hipoperfusão em
vários órgãos, o que, em associação com eventuais toxinas
provenientes do tubo digestivo lesam as células parenquimatosas
e culminam com a chamada falência múltipla de órgãos.

Referências
BRASILEIRO FILHO, G. - Bogliolo Patologia. 9º.Ed. Rio de
Janeiro: Guanabara-Koogan, 2016.

ABBAS, A.K.; KUMAR, V.; FAUSTO N. Robbins & Cotran –


Patologia – Bases Patológicas das doenças. 9º. Ed. Rio de
Janeiro: Elsevier, 2016.

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CÉLULAS DO PROCESSO INFLAMATÓRIO pontes de cromatina (fino filamento nuclear). São células típicas
da fase aguda da inflamação, sendo os primeiros a chegarem ao
Durante o processo inflamatório temos a presença de grupos sítio inflamatório.
celulares variados, que possuem origens distintas e com O neutrófilo jovem possui núcleo não segmentado em lóbulos
diferentes papeis no desenvolvimento da inflamação. e é denominado de bastonete. Em pacientes sadios existe apenas
Algumas dessas células chegam ao tecido através da corrente um pequeno número de bastonetes circulantes no sangue. O
sanguínea (como os neutrófilos e linfócitos), e outras são aumento da quantidade dessas células indica um aumento na
residentes naturais desse tecido, ou seja, já estão presentes no produção de neutrófilos pela medula óssea, explicitando a
tecido antes de ocorrer a injúria tecidual (como queratinócitos e presença de inflamação, principalmente em decorrência de
fibroblastos). Também existem células que residem infecções bacterianas. Esse quadro é denominado de desvio à
permanentemente no tecido, no entanto, seus precursores vieram esquerda do hemograma. Esse nome se dá porque, normalmente,
através da via sanguínea (como as células dendríticas). os tipos de neutrófilos são alinhados da esquerda para a direita
De maneira geral, as células tissulares e as células sentinelas em relação à sua maturação no hemograma. E, portanto, o
residentes emitem sinais na presença do agente agressor, a fim de aparecimento de neutrófilos menos maturados na corrente
recrutar leucócitos da corrente sanguínea para a área afetada. sanguínea leva a maiores índices de neutrófilos à esquerda do
Descreveremos os diferentes grupos celulares, para que gráfico do hemograma.
possamos entender posteriormente o dinamismo dos eventos
celulares do processo inflamatório. Promielócitos  Mielócitos  Metamielócitos Bastonetes
Dentre as células que chegam através da corrente sanguínea Segmentados
podemos destacar:
1. Neutrófilos É importante diferenciar infecção de inflamação. A primeira
2. Monócitos – Macrófagos ocorre na presença de microrganismos ou por parte deles. Já a
3. Eosinófilos segunda acontece na presença de células inflamatórias, não
4. Linfócitos – Plasmócitos necessariamente na presença de microrganismos.
5. Basófilos Os neutrófilos possuem 2 tipos de grânulos dispersos em seu
E dentre as células residentes no tecido que terão papel citoplasma:
fundamental no processo inflamatório podemos destacar:  Granulos azurófilos: (10-20% do total): são os lisossomos
1. Células endoteliais. verdadeiros e apresentam: lisozima, mieloperoxidase, elastase,
2. Fibroblastos. colagenase, hidrolases e defensinas.
3. Queratinócitos.  Grânulos específicos: lisozima e lactoferrina.4
4. Células dendríticas. Os neutrófilos constituem importante defesa celular contra a
5. Mastócitos. invasão de microrganismos. Enquanto eles estão no sangue, são
esféricos e não fagocitam. Uma vez que chegam ao tecido,
Os hepatócitos, mesmo à distância, possuem papel tornam-se ameboides e fagocitários.
fundamental para a inflamação, como será descrito a seguir. Os neutrófilos emitem pseudópodes na bactéria invasora
Começaremos nossa descrição pelas células que chegam no fagocitada. Logo, os grânulos específicos fundem-se ao
tecido pela circulação sanguínea, e posteriormente fagossomo, seguidos pelo descarregamento do conteúdo dos
descreveremos as células residentes e as células hepáticas. grânulos azurófilos.
As células recrutadas da circulação sanguínea possuem a Bombas de próton localizadas na membrana do fagossomo
função de destruir o agente agressor, seja por fagocitose, pela são responsáveis por acidificarem o interior desse vacúolo. O pH
exsudação de seu conteúdo citoplasmático para o meio ácido mata as bactérias e constitui ambiente adequado à
extracelular ou pela produção de anticorpos. atividade das hidrolases dos grânulos azurófilos.
A quantidade normal de neutrófilos no sangue deve ser de
Sistema fagocitário: 3.000 a 6000 células/mm³. Quando a quantidade de neutrófilos
Fagócitos são células envolvidas ativamente nos processos cai abaixo de 1500 cel/mm³, dá-se o quadro de neutropenia:
defensivos do organismo, com grande capacidade de eliminar  Neutropenia leve (1000 <1500) - mínimo risco de infecção
microrganismos e células. Os fagócitos são divididos em 2  Neutropenia moderada (500 <1000) - moderado risco de
diferentes grupos: infecção
 Polimorfonucleares: nome dado por terem  Neutropenia severa (<500) - grave risco de infecção
núcleo segmentado (neutrófilos e eosinófilos)
 Mononucleares: são os macrófagos originários
de monócitos circulantes, que por sua vez derivam de
monoblastos da medula óssea.

Fagócitos Polimorfonucleares:

Neutrófilos
Os neutrófilos, também conhecidos como células
polimorfonucleares, têm o núcleo segmentado em dois a cinco
lóbulos (mais frequentemente 3 lóbulos), ligados entre si por

22
Sistema fagocitário mononuclear:
O sistema fagocitário mononuclear compreende o conjunto
de macrófagos livres (circulantes, dos tecidos linfáticos e
mieloide e das cavidades naturais) e fixos nos tecidos, os quais
constituem populações heterogêneas, mas com propriedades
comuns:
 Possuem núcleo em forma de rim, com centríolo na
reentrância do núcleo.
 São ricos em lisossomos, mitocôndrias e retículo
endoplasmático rugoso.
 Possuem alta capacidade de fagocitose, sobretudo em
microrganismos opsinizados (seja por anticorpos IgG ou pelo
sistema complemento C3b).
 Apresentam antígenos de histocompatibilidade II, que são
importantes na apresentação dos antígenos aos linfócitos.
Opsoninas, de modo breve, são proteínas que se ligam ao agente
Polimorfonucleares (Neutrófilos) – Aumento 40x – FORP-USP agressor, não o destruindo, mas sinalizando para os macrófagos
que aquele é um agressor através da marcação.
Eosinófilos: As diferentes populações de macrófagos estão sujeitas a
Os eosinófilos, assim como os neutrófilos, são fagócitos que variações fenotípicas, induzidas por sinais externos. Por essa
ingerem imunocomplexos, bactérias, fungos e partículas inertes. razão, em uma mesma população pode se ter macrófagos em
São menos numerosos que os neutrófilos (2-4% do total de repouso, macrófagos solicitados e ativados.
leucócitos) e apresentam tamanho semelhante a essas células. Os macrófagos se originam de monócitos circulantes
Seu núcleo em geral é bilobulado, e seus grânulos ovoides são originários da medula óssea, que foram induzidos a migrarem
muito corados pela eosina (eosinofílico). para o tecido através de quimioatratores (C5a, citocinas e fator
Eosinófilos desempenham papel importante na defesa contra de crescimento das plaquetas)
helmintos. Os eosinófilos aderem-se aos parasitas graças aos Estão difusamente espalhados no tecido conjuntivo,
anticorpos IgG e IgE lançados contra estes parasitas. Uma vez recebendo nomes especiais de acordo com seu tecido de origem.
aderidos os eosinófilos degranulam sobre os eles.  Fígado: células de Kupffler (podendo se dividir localmente).
São células abundantes nas reações imunológicas mediadas  Pulmões: macrófagos alveolares.
pela IgE e nas infecções parasitárias.  Ossos: osteoclastos.
A eotoxina é a principal quimiotoxina recrutadora dos Os macrófagos estão muito presentes na polpa vermelha do
eosinófilos. Os eosinófilos são eosinofílicos, e possuem grande baço, onde são fundamentais para a eliminação de elementos
quantidade de grânulos que contém proteína básica principal. envelhecidos do sangue circulante (eritrócitos, plaquetas, etc), na
A Proteína básica principal é uma proteína altamente tóxica apresentação de antígenos e na eliminação de microrganismos da
para os parasitas, mas que também pode levar a danos teciduais. circulação.
Esses granulócitos são atraídos para as áreas de inflamação Embora os monócitos apresentem meia vida curta, de
alérgica pela histamina, produzida principalmente por basófilos e aproximadamente um dia, os macrófagos apresentam vida de
mastócitos. Os eosinófilos também parecem ser capazes de meses ou anos nos tecidos.
inativar leucotrienos e histamina, modulando o processo Os monócitos começam a migrar para os tecidos
inflamatório. extravasculares logo após o início da inflamação aguda, e em 48
horas podem constituir o tipo celular dominante. O
extravasamento dos monócitos segue os mesmos mecanismos de
migração, adesão e diapedese dos neutrófilos da inflamação
aguda.
O macrófago tecidual pode ser ativado pela via não
imunológica (endotoxinas, fibronectina e mediadores químicos)
ou imunológica (Citocina, IFN gama). Mostrando, portanto, uma
grande importância na ligação da defesa inata à defesa adquirida.
Os macrófagos ativados secretam uma variedade de produtos
biologicamente ativos que, se não controlados, resultam na lesão
tecidual e fibrose características da inflamação crônica.

Os macrófagos ativados apresentam:


 Aumento de volume;
 Aumento da quantidade de enzimas lisossomais;
Eosinófilos – Aumento 40x – FORP-USP  Aumento de metabolismo;
 Secreção de produtos biologicamente ativos (superóxido);
 Aumentos de receptores para IgG e para C3b.

23
São responsáveis pela lesão tecidual – devido à produção de: São exemplos de APC:
 Metabólitos tóxicos de O2;
 Proteases;
 Fatores quimiostáticos dos neutrófilos; Células dendríticas
 Fatores de coagulação; As células dendríticas se originam dos monócitos circulantes.
 Metabólitos do ácido aracdônico; São encontradas em muitos órgãos: como nos vasos linfáticos
 Óxido nítrico. e na pele (sob a denominação de células de Langerhans). Possui
projeções celulares denominadas dendritos, que auxiliam a
E também são responsáveis pela fibrose, devido a produção de: envolver os agentes invasores.
As células dendríticas são células imunoestimuladoras, pois
 Fatores de crescimento (PDF, FGF, TGF-beta);
além de apresentarem os antígenos aos linfócitos T são capazes
 Citocinas fibrogênicas;
de estimular células T que ainda não entraram em contato com
 Fatores de angiogênese;
qualquer antígeno, denominadas de células T naïve. Outras
 Colagenases de remodelamento. células, como os macrófagos, são incapazes de estimular células
T naïve.
Evidências recentes mostram que a ativação dos macrófagos As células dendríticas são levadas aos tecidos onde se alojam
é inespecífica, ou seja, não é direcionada ao agente agressor, mas e são capazes apenas de capturar antígenos. Após capturar um
sim, uma vez ativados, os macrófagos aumentam sua efetividade antígeno, essa célula matura-se e perde sua adesividade às
contra todos os patógenos possíveis. células epiteliais, começando a expressar um marcador de
superfície (o CCR7) que as dirige para áreas dos linfonodos,
Na inflamação crônica, o acúmulo de macrófagos persiste onde vão encontrar os linfócitos T naïve e apresentar à eles o
medido pelos seguintes mecanismos: antígeno associado ao MCH-II.
1. Recrutamento dos monócitos da circulação (que são
resultantes da expressão de moléculas de adesão e fatores Células epitelioides
quimiotáticos, produzidos por macrófagos, linfócitos e outras Durante a inflamação crônica granulomatosa, os macrófagos
células ativadas). podem apresentar padrões distintos quando ativados, que lhe dá
2. Proliferação local de macrófagos: a proliferação de características epitelioides. Essas células então são denominadas
macrófagos nos tecidos ocorre predominantemente em algumas de células epitelioides.
inflamações crônicas como nas placas ateromatosas. As células epitelioide geralmente estão associadas a um
3. Imobilização dos macrófagos no local da inflamação, que são granuloma que é o foco de infecção crônica. Nele há um
determinadas pelas citocinas e lipídeos oxidados que pode causar agregado de macrófagos, transformados em células semelhantes
sua imobilização. às células epiteliais, cercado de um colar de leucócitos
mononucleares, especialmente linfócitos e plasmócitos.
Células apresentadoras de antígeno (APCs): As células epitelioides são as células características da
Além de sua capacidade de fagocitose, os macrófagos, inflamação crônica granulomatosa e seus aspectos são:
juntamente com seus subtipos especiais, como as células
 Citoplasma granular rosa pálido;
dendríticas e células de Langerhans, são excelentes
 Perda dos limites celulares, parecendo com que as células se
apresentadoras de antígeno.
fundiram uma as outras;
Através do mecanismo denominado processamento de
 Núcleo pouco denso, geralmente oval ou alongado.
antígenos, essas células digerem parcialmente as proteínas,
transformando-as em pequenos peptídeos (epítopos) que são
As células epitelioides podem se fundir gerando células
ligados às moléculas MHC. As APCs possuem exclusivamente
gigantes, que possuem:
as moléculas de superfície MHC-II.
O processamento desses antígenos pelas APCs é fundamental  Cerca de 40 a 50 µm de diâmetro.
para a ativação dos linfócitos, já que essas células são incapazes  Podem conter mais de 20 núcleos, que quando localizados
de identificar os antígenos em sua forma nativa. randomicamente caracterizam as células gigantes tipo corpo
As células T só reconhecem os antígenos quando associados estranho e quando localizados na periferia, como forma de
ao MCH-II, enquanto as células B reconhecem as moléculas ferradura, são denominadas de células gigantes tipo Langhans.
antigênicas diretamente, sem necessidade das APCs. (Embora esses tipos celulares sejam diferentes
O MHC-I é responsável por reconhecer antígenos morfologicamente, não existem diferenças funcionais entre eles).
intracelulares (células infectadas por vírus ou bactérias). Esses
antígenos são processados no retículo endoplasmático rugoso, Células gigantes do tipo de corpo estranho:
onde se ligam ao MHC-I e são levados à superfície, a fim de Podem conter mais de 20 núcleos localizados
serem apresentados aos linfócitos T citotóxicos (CD8+). Presente randomicamente. São provocados por corpos estranhos inertes
em todas as células nucleadas. (talco, sutura, etc.). Geralmente se formam quando os materiais
O MHC-II é responsável por reconhecer antígenos são grandes o suficiente para impedir a fagocitose por um único
extracelulares. Esses antígenos são digeridos, processados nos macrófago e não provocar uma resposta inflamatória.
lisossomos, os quais irão unir-se às vesículas do complexo de As células epitelioides e as células gigantes se formam e
Golgi, onde estará o MHC-I. Esse complexo chegará à aderem à superfície do corpo estranho.
membrana celular e será apresentado aos linfócitos T auxiliares O material causador geralmente aparece quando se utiliza a
(CD4+). Presente somente em alguns leucócitos. luz polarizada.

24
Células espumosas:
As células espumosas são formadas devido à captação de
LDL oxidado pelos macrófagos, através de seus receptores tipo
scavenger (receptores especializados na captação de LDL
oxidado). Como o LDL não é degradado pelos macrófagos, a
célula apresenta-se repleta de grânulos gordurosos dando aspecto
de uma espuma intracelular (foam cells). Essa característica dos
macrófagos é muito comum na inflamação crônica provocada
pela formação de ateromas.
As células musculares lisas que migram para a camada íntima
das artérias durante o processo de aterosclerose também são
capazes de englobar partículas de LDL oxidadas, se juntando,
portanto, ao grupo de células espumosas.

Células gigantes do tipo corpo estranho– Aumento 40x – FORP-


USP

Células gigantes tipo Langhans:


Podem apresentar mais de 20 núcleos localizados na
periferia, como forma de ferradura. São provocadas,
principalmente, por partículas insolúveis, tipicamente
microrganismos que são capazes de induzir uma resposta
imunológica celular.
Quando estimulados por mediadores quimiotáticos, os
monócitos circulantes deixam a circulação e no tecido
transformam-se em macrófagos ativados. Estes macrófagos irão
fagocitar o antígeno e apresentá-lo aos linfócitos T em forma de
epítopo (sequência de aminoácidos patogênicos derivados do Macrófagos espumosos – Aumento 40x – FORP-USP
agente agressor). Assim, os linfócitos serão ativados e liberarão
INF-gama, ativando mais macrófagos, que desta vez formarão Linfócitos:
células epitelioides, que irão se organizar em células gigantes do Os linfócitos constituem uma família de células esféricas,
tipo Langhans. Essas células irão aumentar a produção de com diâmetro de aproximadamente 6µm. No sangue circulante
enzimas lisossomais e radicais reativos de O2, proteases, encontra-se uma pequena porcentagem de linfócitos maiores que
metabólitos do ácido aracdônicos e fatores de crescimento podem atingir até 18µm, denominados de Natural Killer (NK).
angiogênicos. Assim, haverá destruição tecidual aliada à O linfócito possui um núcleo esférico, sua cromatina se
tentativa de reparo com fibrose e angiogênese. Isto formará o dispõe em grumos grosseiros, de modo que o núcleo aparece
granuloma complexo imune. escuro nos preparados usuais.
O citoplasma do linfócito é pequeno e muito escasso,
aparecendo nos esfregaços como um anel delgado, podendo
conter grânulos azurófilos e pobre em organelas.
Ao contrário de outros leucócitos que não retornam ao sangue
depois de migrarem aos tecidos, os linfócitos retornam
normalmente. Os linfócitos atuam na resposta imune adquirida,
ou seja, uma resposta do organismo específica a determinadas
espécies de microrganismos.
Os linfócitos são classificados em 3 subtipos principais:
linfócitos B, T e NK (natural killer). Essa classificação se dá
devido à região onde eles se maturam e devido aos receptores
presentes em suas membranas. Os tipos de linfócitos não são
diferenciados pela microscopia ótica.

Linfócitos B: seus precursores são desenvolvidos na medula


óssea. Possuem imunoglobulinas como receptores e são
amadurecidos em microambientes da medula óssea e nos vasos
linfáticos secundários.
Célula gigante do tipo Langhans– Aumento 40x – FORP-USP Quando ativados por antígenos, os linfócitos B se proliferam
e se diferenciam em plasmócitos (células produtoras de

25
anticorpos; que serão discutidos posteriormente). Alguns
linfócitos B não se diferenciam em plasmócitos, formando as
células B da memória imune, que reagem muito rapidamente a
uma segunda exposição do mesmo antígeno.

Linfócitos T: seus precursores são desenvolvidos na medula


óssea. Possuem moléculas proteicas TCR como receptores e são
amadurecidos no timo, sendo a maioria dos linfócitos em
circulação.
No timo, os linfócitos T se diferenciam nas subpopulações
das células T helper, T supressoras e T citotóxicas, e em outros
locais do organismo se diferenciam em células T de memória.
 Linfócitos T helper: estimulam a transformação de linfócitos
B em plasmócitos.
 T supressora: inibem as respostas humoral e celular.
 Linfócito T citotóxico: especializados no reconhecimento de
antígenos associados ao complexo MHC-1 na superfície das Plasmócitos – Aumento 40x – FORP-USP
células. Levando essas células à morte celular.
Basófilos:
Células NK: não apresentam na superfície, nem os marcadores Representam uma pequena fração do número total de
encontrados na célula B, nem os que caracterizam as células T. leucócitos circulantes existentes (menos de 1%), sendo mais
São chamados de natural killers por que atacam células difícil visualizá-lo ao microscópio óptico do que as outras
cancerosas e infectadas por vírus sem a necessidade de estímulo células. Possuem núcleo volumoso em forma de S, porém, pela
prévio. presença de grânulos muito volumosos, este núcleo é pouco
visível. Seus grânulos basófilos possuem como principais
Observação: os linfócitos T e B não se diferenciam constituintes:
microscopicamente.  Histamina – leva o início do processo
inflamatório.
 Fatores quimiotáticos para eosinófilos,
neutrófilos.
 Heparina – propriedades anticoagulante.
A membrana plasmática dos basófilos, assim como a dos
mastócitos, possuem receptores para a IgE. Os basófilos liberam
seus grânulos para o meio extracelular, sob a ação dos mesmos
estímulos que promovem a degranulação dos mastócitos.

Mastócitos:
O mastócito maduro é uma célula globosa, grande e com
citoplasma repleto de grânulos que se coram intensamente. O
núcleo é pequeno, esférico, central e de difícil observação por
estar frequentemente encoberto pelos grânulos citoplasmáticos.
Seus grânulos são eletro-densos, heterogêneos e contêm
mediadores químicos como a histamina, leucotrienos, fatores
quimiotáticos para eosinófilos e glicosaminoglicanas. Os
Linfócitos – Aumento 40x – FORP-USP mastócitos colaboram com as reações imunes, e tem papel
fundamental na inflamação, nas reações alérgicas e na expulsão
Plasmócitos: de parasitas.
Os plasmócitos são células derivadas dos linfócitos B, e são Possuem receptores do tipo Toll-like e interagem com as
responsáveis pela síntese de anticorpo. Estão muito presentes em células dendríticas, células B e células T para mediar funções da
inflamações crônicas. São células grandes e ovoides que imunidade adaptativa.
possuem um citoplasma basófilo que reflete sua riqueza em Produzem citocinas que são quimiotáticas para fagócitos.
retículo endoplasmático rugoso. Os mastócitos se originam de células precursoras
O núcleo dos plasmócitos é esférico e excêntrico e contém hematopoiéticas, situadas na medula óssea. Estes mastócitos
grumos de cromatina que se alternam regularmente com áreas imaturos circulam pelo sangue e cruzam a parede de vênulas e
claras em um arranjo que lembra uma roda de carroça. capilares e penetram nos tecidos, onde vão se diferenciar.
Embora semelhantes, os mastócitos são oriundos de células
tronco hematopoiéticas distintas dos basófilos.
A superfície dos mastócitos contém receptores específicos
para imunoglobulina E (IgE), produzidas pelos plasmócitos. A

26
maior parte das IgE, produzidas pelos plasmócitos se ligam aos de outros constituintes da matriz extracelular, tais como as
mastócitos e basófilos, e muito pouco permanece no plasma. glicosaminoglicanas, proteoglicanas e glicoproteínas. Essas
células também estão envolvidas na produção de fatores de
crescimento, que controlam o crescimento e a diferenciação
As células residentes no tecido também apresentam papel celular.
fundamental na inflamação, tais como descrevemos agora: Os fibroblastos possuem citoplasma abundante, com muitos
prolongamentos. Seu núcleo é ovoide, grande e fracamente
Células endoteliais: corado. Possui nucléolo proeminente. O citoplasma é rico em
Há poucos anos, ainda se considerava a célula endotelial retículo endoplasmático rugoso e o aparelho de Golgi é bem
como uma membrana celular passiva, que forma a interface entre desenvolvido.
o sangue e os tecidos, dado a sua estrutura simples, com escassez Os fibrócitos são menores e tendem a ser fusiformes. Os
de organelas celulares quando vista ao microscópio de luz. Na fibrócitos, células adultas, podem ser encontrados, por exemplo,
atualidade, nosso conceito sobre o endotélio foi radicalmente na cicatriz e, caso a pele sofra uma nova lesão, eles retomam sua
mudado, pois ficou claro que a célula endotelial é um atividade, voltando a se comportar como fibroblastos.
componente funcionalmente ativo da parede vascular, capaz de Assim como os queratinócitos, os fibroblastos podem
mostrar diversas propriedades metabólicas, de síntese e produzir diversos mediadores inflamatórios que atuaram tanto no
regenerativas, estando implicada na regulação de vários processo de inflamação quanto no processo de cicatrização à
fenômenos, tais como: fluxo sanguíneo, coagulação, proliferação posteriori.
de células da parede vascular, reatividade imunológica e resposta
do organismo aos estímulos patogênicos.
Além do mais, há na atualidade evidência definitiva de que o
termo endotélio não se refere a um único tipo celular, mas a uma Hepatócitos:
família de células bastante heterogêneas, com estrutura, função e Os hepatócitos desempenham um papel muito importante no
propriedades metabólicas distintas, até mesmo dentro de um processo inflamatório. Essas células hepáticas são poliédricas de
mesmo órgão. diâmetro de 20-30um e possuem citoplasma eosinofílico, devido
O endotélio é formado por um epitélio pavimentoso simples. seu grande número de mitocôndrias e de retículo endoplasmático
A célula endotelial é pobre em mitocôndrias e lisossomos, mas liso. Os hepatócitos são as principais células responsáveis pela
possui uma quantidade regular de retículo endoplasmático produção das proteínas da fase aguda da inflamação.
rugoso, complexo de Golgi proeminente e citomembrana rica em As proteínas de fase aguda são proteínas plasmáticas cuja
sistemas enzimáticos. É importante ressaltar a presença de concentração pode aumentar centenas de vezes como parte da
miofibrilas e de proteínas no citoplasma, como actina e miosina, resposta a estímulos inflamatórios. Sendo elas: proteínas C-
relacionadas com sua capacidade contrátil. As junções reativas, fibrinogênio e a proteína amiloide sérica A. A síntese
intercelulares variam um pouco, mas são características dessas proteínas pelos hepatócitos é estimulada pela IL-6, IL-1, e
estruturas dos tipos zônula ocludentes e, em menor grau, zônula TNF-alfa.
aderentes. A proteína C-reativa e a proteína amiloide sérica ligam-se à
Entre as funções do endotélio podemos citar: limitada parede microbiana e podem agir como opsoninas e fixar o
capacidade fagocitária, síntese de colágeno tipo IV, elastina, sistema complemento. Essas proteínas também podem se ligar à
laminina, fibronectina e glicosaminoglicanos e talvez outros cromatina de células necróticas, ajudando a eliminar seus
componentes da membrana basal. Secretam colagenases, talvez núcleos.
para permitir a gemação endotelial para a neovascularização, O fibrinogênio produzido pelos hepatócitos podem fazer as
esteroides, prostaglandinas (PGE2 e PGF2α), prostaciclina (PGI2), hemácias se empilharem, modificando assim a velocidade de
tromboxano e outros mediadores químicos importantes da hemossedimentação, e alterando a coagulação sanguínea.
inflamação. Participam da formação de elementos da cascata da
.
coagulação e do fenômeno da aderência leucocitária graças à
Referências
secreção da molécula de adesão do endotélio a leucócitos
JUNQUEIRA, LC, CARNEIRO J, ABRAHAMSOHN P.
(ELAM). Estes, por sua vez, contribuem com o mesmo
Histologia básica: texto e atlas. 13. ed. Rio de Janeiro:
fenômeno, secretando moléculas de adesão intracitoplasmática
Guanabara Koogan, 2017.
(ICAM).
BRASILEIRO FILHO, G. - Bogliolo Patologia. 9º.Ed. Rio de
Janeiro: Guanabara-Koogan, 2016.
Queratinócitos:
ABBAS, A.K.; KUMAR, V.; FAUSTO N. Robbins & Cotran
Queratinócitos são células formadoras do tecido epitelial e
– Patologia – Bases Patológicas das doenças. 9º. Ed. Rio de
anexos da epiderme. Além da proteção física, hoje se sabe que os
Janeiro: Elsevier, 2016.
queratinócitos podem produzir diferentes fatores de defesa, tais
como citocinas (interleucinas e quimiocinas) importantes para a
quimioatração de células de defesa, as quais podemos destacar as
células de Langerhans.

Fibroblastos:
Os fibroblastos são as principais células dos tecidos
conjuntivos, e sintetizam as proteínas colágeno e elastina, além

27
IMUNOPATOLOGIA DA INFLAMAÇÃO menor de β2microglobulina. Entre os domínios α1 e α2
é forma uma área onde os epítopos se alojam e são
Conceitos importantes de imunologia apresentados aos linfócitos T.
Uma vez que vivemos em um ambiente cercado de b) MHC tipo II – moléculas presentes na superfície das
“perigos”, nosso sistema imunológico é responsável pela defesa células do sistema imunológico (macrófagos, células
do nosso organismo contra agentes potencialmente danosos. Em dendríticas e linfócitos B e T), tendo sua expressão
princípio, a imunologia estuda o funcionamento do sistema regulada por diversas citocinas. As MHC-II são
imunológico e, embora o conceito básico da imunologia seja de formadas por duas cadeias polipeptídicas (α e β) sem
proteção, é preciso lembrar que ele também pode se apresentar ligações covalentes entre elas. As cadeias α e β possuem
com alteração do seu funcionamento, levando a dois domínios extracitoplasmáticos cada uma (α1, α2,
hipersensibilidade, doenças imunológicas ou deficiência de β1 e β2). Os domínios α1 e β1 formam um sulco de
defesa. associação com os peptídeos para a apresentação aos
O sistema imunológico deve identificar os invasores linfócitos T. Os domínios α2 e β2 possuem sítios de
para construir uma defesa, cuja resposta seja coletiva, ligação aos linfócitos CD4 que auxiliam no processo de
coordenada e com proposta de eficácia contra qualquer reconhecimento desse antígeno.
substância considerada estranha ao organismo.
Basicamente, o sistema imunológico busca destruir e Receptores celulares para epítopos – Diferentes células
eliminar o agente agressor. No entanto, quando ele não pode ser apresentam diferentes tipos de receptores para antígenos, por
completamente eliminado, procura-se construir barreiras para exemplo:
isolar esse agente. a) Nos linfócitos B, os receptores para epítopos são
A resposta imunológica tem dois ramos básicos, representados por imunoglobulinas de membrana que
aparentemente distintos, mas intimamente ligados: a resposta não correspondem com aquelas imunoglobulinas
imunológica inata (natural) e a resposta imunológica adquirida secretadas usualmente na corrente sanguínea, das quais
(adaptativa). se diferenciam por apresentarem um domínio
intramembranoso hidrofóbico, responsável por prendê-
Elementos do Sistema imunológico las à membrana celular, e um pequeno segmento
O sistema imunológico utiliza células e moléculas intracitoplasmático, com função ainda não conhecida.
variadas, espalhadas por todo o organismo, produzidas e
secretadas muitas vezes de acordo com a necessidade. Por essa b) Os receptores de antígenos nos linfócitos T são
razão, seus elementos básicos devem ser conhecidos, uma vez conhecidos como TCR (T Cell Receptor ou TCRs). São
que são citados em diferentes situações e o entendimento de suas formados por duas cadeias polipeptídicas glicosiladas
características auxilia na compreensão do funcionamento do ligadas entre si por pontes S-S e associadas não
sistema imunológico. covalentemente a outras proteínas não polimórficas
Esses importantes elementos, que atuam na execução da conhecidas como conjunto CD3.
resposta imunológica, são:
a) Os antígenos ou epítopos; c) A maioria das células apresentadoras de antígenos
b) As moléculas de histocompatibilidade; possuem diferentes proteínas que interagem entre si e
c) Os receptores celulares para epítopos; podem atuar como auxiliares no reconhecimento e
d) As células apresentadoras de antígenos. geração de estímulos para ativação das células, embora
não sejam especificamente proteínas receptoras de
Antígenos ou epítopos – Um antígeno é, basicamente, uma epítopos. São elas: moléculas de adesão, moléculas
molécula que é reconhecida por um anticorpo. Os antígenos coestimuladoras, moléculas CD-4,CD-8, CD-28, CD-
podem ter natureza variada, mas em geral são moléculas grandes 45, CTLA-4, CD-40L, CD-154, 4-1BB e 4-1BBL.
(macromoléculas) ou moléculas pequenas (haptenos) presas a
moléculas grandes (carreadoras). O sistema imunológico, na Células apresentadoras de antígenos (APCs) –
verdade, não reconhece o antígeno como um todo, mas sim os As células apresentadoras de antígenos (macrófagos,
epítopos (parte do antígeno), também chamados “determinantes células dendríticas e linfócitos B) endocitam o antígeno e,
antigênicos”. posteriormente à proteólise citoplasmática, conjugam os
epítopos às moléculas MHC-II, pelas quais são expostos na
Moléculas de histocompatibilidade (MHC) – São moléculas membrana e apresentados aos linfócitos TCD4+.
acessórias de reconhecimento de epítopos que se ligam a As células apresentadoras de antígenos são
peptídeos e apresentam-nos aos linfócitos. Essas moléculas são principalmente as células dendríticas, linfócitos B e macrófagos,
codificadas por múltiplos genes, possibilitando grande variação embora outras células que expressem moléculas de MHC classe
na sua expressão (polimorfismo). II possam agir como células apresentadoras de antígenos em
alguns casos. As células dendríticas estão presentes,
As MHC são divididas em: principalmente, em órgãos linfoides, mas também nos epitélios e
a) MHC tipo I – presentes em quase todas as células do interstícios de vários órgãos, onde estão estrategicamente
organismo (exceto nos eritrócitos anucleados), são localizadas em áreas de entrada de antígenos. De forma
formados por uma cadeia peptídica com três domínios simplificada, as células dendríticas da mucosa capturam
extracelulares α1, α2 e α3, associadas a uma cadeia antígenos, os transportam aos linfonodos e os apresentam aos

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linfócitos T naïves. A célula dendrítica, após capturar um descamação do epitélio da pele também ajuda a remover bactéria
antígeno, perde sua adesividade às células epiteliais e começa a e outros agentes infecciosos que aderiram às superfícies
expressar o marcador de superfície CCR7, que a dirige para os epiteliais. Movimentos devido a cílios ou peristaltia ajudam a
linfonodos, onde encontrará os linfócitos T naïves. manter as vias aéreas e o trato gastrointestinal livres de
invasores. O fluir das lágrimas e saliva ajuda a prevenir infecção
nos olhos e na boca. O efeito pegajoso do muco que cobre o trato
IMUNIDADE NATURAL E IMUNIDADE ADQUIRIDA respiratório e gastrointestinal ajuda a proteger os pulmões e o
A defesa orgânica é realizada por reações iniciais sistema digestivo contra as infecções. Da mesma forma, como
(imediatas) da imunidade natural (inata) e pelas reações ditas barreiras químicas, os ácidos graxos no suor inibem o
“tardias” (imunidade adquirida ou adaptativa). crescimento de bactéria; a lisozima e a fosfolipase (encontradas
A imunidade inata é considerada a linha de defesa na lágrima, saliva e secreção nasal) podem destruir a parede
inicial, inespecífica e rápida, constituída por células e elementos celular da bactéria e desestabilizar as membranas bacterianas; o
bioquímicos. Seus principais componentes são: baixo pH do suor e da secreção gástrica previnem o crescimento
a) Barreiras físicas e químicas do organismo; de bactéria; as defensinas (proteínas de baixo peso molecular)
a) Células fagocitárias e NK (Natural Killer); e encontradas em muitas secreções têm atividade antimicrobiana; e
b) Proteínas (do sangue e citocinas), chamadas agentes surfactantes (como as opsoninas) auxiliam a fagocitose
coletivamente de “mediadores da inflamação”, que de partículas pelas células fagocitárias. Ainda, a flora normal da
regulam e coordenam as atividades da defesa inicial. pele e do trato gastrointestinal pode prevenir a colonização de
A imunidade adquirida, ou “imunidade específica”, é bactérias patogênicas pela secreção de substâncias tóxicas, pela
regulada principalmente pelos linfócitos e se caracteriza pela sua competição por nutrientes com as bactérias patogênicas ou pela
alta especificidade, capaz de diferenciar as moléculas agressoras ligação à superfície da célula do hospedeiro.
e responder de forma diferenciada. As moléculas reconhecidas
pelos linfócitos são genericamente chamadas “antígenos” ou Células fagocitárias e NK
“epítopos”. As células fagocitárias mais importantes são as
polimorfonucleares (granulocíticas), principalmente os
IMUNIDADE INATA neutrófilos, e as mononucleares (macrófagos). Os neutrófilos
A imunidade inata possui dois aspectos importantes: sua (PMN) contêm dois tipos de grânulos cujos conteúdos estão
capacidade aferente ou sensora (que se refere à forma como os envolvidos nas propriedades antimicrobianas dessas células. Os
organismos “percebem” a infecção) e sua capacidade eferente ou grânulos primários (azurófilos), abundantes em células jovens,
efetora (que se refere à forma como os organismos tentam contêm proteínas catiônicas, defensinas, enzimas proteolíticas
erradicar a infecção). (elastase, e catepsina G), lisozima, e mieloperoxidase. O segundo
Pela parte sensora, o organismo é capaz de reconhecer tipo de grânulo (secundários ou específicos) encontrado em
elementos conhecidos como PAMPs (Pathogen-associated PMNs maduros, contêm lisozima, componentes da NADPH
molecular pattern molecules - Moléculas Padrões associadas aos oxidase e lactoferrina. Macrófagos, ao contrário dos PMNs, não
patógenos), MAMPs (Microrganisms-associated molecular contêm grânulos, mas têm numerosos lisossomos com conteúdo
pattern molecules) e DAMPs (Damage-associated molecular similar ao dos grânulos do PMNs. Basicamente, os PMNs
pattern molecules - de caráter não infeccioso, mas que circulantes e monócitos respondem aos sinais de perigo gerados
identificam células danificadas por outros agentes), e alarminas no local da infecção (estudar texto de mediadores inflamatórios).
(proteínas intracelulares produzidas por células “danificadas” e Além das células fagocitárias, as células NK têm papel
liberadas quando essas células sofrem lise). importante no sistema imune inato. Células assassinas naturais
Já por meio da porção efetora, o organismo tenta se ou células NK (Natural Killer) são conhecidas como grandes
livrar fisicamente do agente agressor, impedindo sua entrada por linfócitos granulares. Elas podem ser identificadas pela presença
barreiras físicas, movimentos, fluidos ou substâncias químicas dos marcadores de superfície CD56 e CD16 e pela falta de CD3,
(citocinas). e conseguem destruir células infectadas por vírus ou malignas.
Os elementos do sistema imune inato incluem barreiras Células normais constitutivamente expressam moléculas
anatômicas, moléculas de secreção e componentes celulares. de MHC classe I na sua superfície, no entanto, células infectadas
Entre as barreiras mecânicas estão pele e camadas epiteliais por vírus e células malignas têm diminuída a expressão de MHC
internas (mucosas), assim como os movimentos peristálticos, a classe I. Dessa forma, as células NK destroem seletivamente as
exemplo dos intestinais, e a oscilação de cílios bronco- células inviáveis e deixam livres as células normais.
pulmonares. Associados a esses agentes protetores estão os
agentes químicos (secreções e suas moléculas) e os agentes Proteínas da Imunidade Inata
biológicos. São basicamente fatores humorais, conhecidos também
como “moduladores inflamatórios”, encontrados no soro e em
Barreiras anatômicas da imunidade inata líquidos presentes nas áreas de inflamação. Entre os mais
As barreiras, sejam elas mecânicas, químicas ou importantes estão: o sistema complemento, fatores da
biológicas (epitélios, produção de líquidos e flora normal), coagulação, citocinas inflamatórias (interferons, interleucinas,
constituem importantes elementos de defesa. As superfícies dentre outros), quimiocinas, fatores de defesa (pequenas
epiteliais formam uma barreira física que é bastante impermeável proteínas como lactoferrina, transferrina, defensinas) e enzimas.
à maioria dos agentes infecciosos, dessa forma agem como nossa
primeira linha de defesa contra organismos invasores. A

29
Sistema Complemento – O sistema complemento é composto 4. Família XC – com 2 quimiocinas conhecidas.
por proteínas da membrana plasmática solúveis no sangue.
Proteínas do complemento são proteases que se auto-ativam por A expressão de quimiocinas e seus receptores se dão
clivagem proteolítica. Denomina-se complemento um complexo respectivamente por células de tecidos inflamados e infectados e
sistema multiproteico com mais de 20 componentes, cujas por todas as células do sistema imunológico. A especificidade de
funções principais são a defesa frente às infecções por micro- cada resposta é influenciada pelo tipo de quimiocina liberada. A
organismos, a eliminação da circulação dos complexos antígeno- modulação da função das quimiocinas é feita por diferentes
anticorpo e a atuação de alguns dos seus fragmentos como mecanismos, por exemplo: as quimiocinas podem ser
mediadores inflamatórios. A ativação do sistema complemento é potencializadas ou inativadas por diferentes enzimas teciduais,
um dos mecanismos mais importantes da resposta imune inata. como as peptidases e as metaloproteases da matriz;
Os efeitos da ativação da cascata do sistema complemento proteoglicanas livres da matriz extracelular podem se ligar e
podem ser observados também a partir de três diferentes rotas, a sequestrar quimiocinas, impedindo que elas se liguem a seus
saber: receptores. Alguns vírus, como o HIV e HSV produzem
1) Ativação do C3b, que se liga aos micro-organismos proteínas que interferem com a ação das quimiocinas.
e os opsioniza para fagocitose;
2) Geração de C5a, que é uma molécula inflamatória e PAMPs, MAMPs, DAMPs e alarminas
quimiotática;  PAMPs (Pathogen-associated molecular pattern
3) Ativação de C9, que forma o chamado “complexo de molecules) → moléculas padrão associadas a patógenos
ataque à membrana”, provocando a lise de bactérias  MAMPs (Microrganisms-associated molecular pattern
e sendo capaz de inativar alguns vírus. molecules).
 DAMPs (Damage-associated molecular pattern
Citocinas molecules) → de caráter não infeccioso, mas
Citocina é um termo genérico empregado para designar identificam células danificadas por outros agentes
um extenso grupo de moléculas proteicas envolvidas na emissão  Alarminas → proteínas intracelulares produzidas por
de sinais entre as células, que atuam tanto na imunidade inata, células “danificadas” e liberadas quando essas células
como na adquirida, além de muitos outros processos fisiológicos sofrem lise.
e patológicos do organismo. Constituem um grupo de proteínas
extracelulares, que podem ser produzidos por diferentes tipos de Um sistema de detecção eficiente, contenção e reparo
células. As citocinas têm uma vida média curta e são capazes de dos danos causados requer uma complexa rede de sinais de aviso
estimular as células com receptores específicos, mas são de perigo, células que respondam a esses sinais (via receptores e
moléculas com atividade pleiotrópica (podem atuar sobre muitos sinais intracelulares para montagem da defesa) e respostas
tipos celulares diferentes) e redundante (várias citocinas podem eficientes a essas ameaças. Classicamente, um complexo de
efetuar as mesmas ações). Além disso, em função do tipo de sinais forma um sistema já estudado e que atuam da seguinte
célula e sua atividade funcional no momento, as citocinas podem forma: PAMPs, MAMPs e DAMPs são um sistema de moléculas
induzir efeitos diferentes sobre as mesmas células, e podem que alertam o organismo de possível ameaça (microrganismos,
também influenciar a ação de outras citocinas de forma traumas, substâncias irritantes – químicas, venenosas ou
antagônica ou sinérgica. A maioria das citocinas exercem efeitos radioativas). Alarminas são moléculas semelhantes aos PAMPs,
parácrinos (ação sobre células presentes nas proximidades das porém sempre endógenas e apresentam algumas características
células produtoras da citocina) ou efeitos autócrinos (ação sobre importantes:
o tipo celular que a produz). Além disso, algumas citocinas 1. São rapidamente liberadas em situações de morte não
exercem efeitos endócrinos, agindo sobre células presentes em programada, mas não em casos de apoptose;
outros locais que não os da célula produtora daquela citocina. As 2. Podem ser produzidas por células do sistema imune
diferentes citocinas, principalmente em função da sua ação mesmo quando não existe situação de morte celular;
identificada, podem ser enquadradas em diversas categorias 3. São capazes de recrutar e ativar células imunológicas,
como: interferons, interleucinas, fatores estimuladores de atuando direta ou indiretamente na produção de resposta
colônias, fatores de necrose tumoral ou fatores de transformação imune adaptativa;
e de crescimento. 4. Atuam na promoção da reconstrução de tecido lesado,
levando à possibilidade de restaurar a homeostase.
Quimiocinas
Quimiocinas compõe um grupo especial de citocinas. Diferente dos PAMPs e MAMPs, os DAMPs são
As quimiocinas e seus receptores são estudados baseados numa produzidos pelas células do próprio hospedeiro. Os DAMPs
divisão de quatro famílias, basicamente divididas pelas suas variam grandemente em função do tipo de célula e tecido
características de localização dos primeiros 2 resíduos de cisteína atingido e, caracteristicamente, podem ser componentes
e sequência de peptídeos em: citosólicos ou nucleares. Exemplos de DAMPs incluem as
1. Família CXC – com pelo menos 16 quimiocinas proteínas intracelulares conhecidas como HSPs (Heat-shock
conhecidas; proteins), HMGB1 (high-mobility group box 1), proteínas
2. Família CC – com pelo menos 28 quimiocinas alteradas da matriz extra celular–fragmentos de ácido hialurônico
conhecidas; - formados em caso de injúria tecidual-, ácido úrico e as
3. Família CX3C – 1 quimiocina conhecida como proteínas S-100. Exemplos de DAMPs não proteicos incluem os
fractalcina ou neurotaxina;

30
metabólitos da purina (ATP, ácido úrico e adenosina), moléculas parte do sistema imune inato. Didaticamente, podemos separar os
S-100 e fragmentos de DNA. PRRs como:
HMGB-1 (high-mobility group box 1) é uma proteína 1. PRRs associados à membrana celular;
essencial à vida, e é considerada o protótipo do DAMP. Em 2. PRRs presentes no citoplasma;
condições normais, quase toda a HMGB-1 é nuclear, mas sua 3. PRRs secretados.
permanência no ambiente nuclear depende dela sofrer ou não
alterações, ou seja, ela pode ser transportada para o citoplasma PRRs associados a membrana
quando sofre acetilação, pode ser liberada por algumas células Dentre os PRRs associados à membrana celular, temos
em situações de perigo, ou liberadas no meio quando a célula os:
sofre necrose. É importante, por exemplo, lembrar que células a. Receptores tipo Toll (Toll–like receptors = TLRs);
que sofrem apoptose não liberam HMGB-1, e que muitas células b. Receptores tipo “scavenger”;
podem liberar HMGB-1 antes de entrar em necrose, c. Receptores N-formil Met-Leu-Phe;
simplesmente por estarem em uma situação de “perigo de entrar d. Receptores tipo lectina C.
em necrose”, como cardiomiócitos em condições de hipóxia ou Os receptores tipo Toll (Toll-like Receptors = TLRs)
algumas células na presença de patógenos. são uma classe de proteínas que atuam num papel chave no
HSP (Heat-shock proteins) sistema imune inato. Muitos fagócitos mononucleares, inclusive
As proteínas de choque térmico, chaperonas ou monócitos circulantes e macrófagos teciduais, outras células
proteínas HSP (do inglês heat shock proteins), são uma família fagocitárias e muitas células epiteliais expressam receptores tipo
de proteínas com funções principais de encaminhar a proteína à Toll. Esses receptores reconhecem moléculas estruturalmente
destruição, caso não seja possível atingir a configuração correta, conservadas derivadas dos micro-organismos. Hoje se
além de auxiliar o enovelamento proteico. Comparando as reconhecem pelo menos 10 TLRs em humanos, os quais são
diferentes proteínas de choque térmico, as chaperonas puderam capazes de reconhecer diferentes elementos microbianos (como
ser classificadas em diferentes grupos baseados no seu peso LPS; diferentes lipoproteínas bacterianas; ácido lipoteitóico de
molecular, sendo: HSP10, HSP40, HSP60, HSP70 e HSP90, com bactérias Gram-positivas; peptideoglicanos da parede bacteriana;
modos de ação ligeiramente diferentes. As HSPs, também componentes das paredes celulares de fungos e micobactérias;
conhecidas como proteínas do estresse, são altamente DNA bacteriano; e DNA e RNA virais). A sinalização celular via
conservadas em todos os organismos e em todas as células. Elas TLR se faz por meio da associação com a molécula intracelular
têm papel crucial na formação de proteínas, formação de conhecida como MyD88 uma enzima associada a receptores da
complexos multiproteicos, transporte dessas proteínas pelos IL-1 que resulta na ativação do NF-kB. Então, os TLRs junto
espaços subcelulares, controle do ciclo celular e apoptose. com os receptores de Interleucina 1 formam uma super-família
Recentemente conseguiu-se identificar o importante papel dessas de receptores, conhecida como Superfamília “Receptor de
proteínas na apresentação de antígenos, levando peptídeos até as Interleucina-1/Receptor Toll-Like”; todos os membros dessa
moléculas MHC Classe I e MHC Classe II do complexo de família têm em comum um domínio também chamado TIR
histocompatibilidade. Estudos também mostraram que as HSPs (receptor Toll/IL-1).
podem estimular APCs (células apresentadoras de antígenos).
Os receptores tipo scavenger são expressos em células
Os metabólitos da purina, como o ATP, a adenosina e o ácido da linhagem mielóide (macrófagos e células dendríticas) e
úrico, parecem também atuar como DAMPs quando alcançam o algumas células endoteliais. Esse tipo de receptor tem um papel
espaço extracelular, entretanto essa atuação é bastante complexa, importante em eliminar células alteradas do próprio organismo –
na dependência de sua concentração. Moléculas S100 são uma como células modificadas ou apoptóticas. Além disso,
multigênica família de proteínas moduladas pelo cálcio, participam na ligação e internalização de microrganismos e de
envolvidas em atividades regulatórias, tanto intracelular como seus produtos, incluindo o ácido lipoteitoico (produto das células
extracelularmente. Fragmentos de DNA e de RNA, sempre que Gram-positivas) e LPS (produto das células Gram-negativas). Os
em outros espaços que não sejam o núcleo ou a mitocôndria, são receptores tipo scavenger também são importantes no
considerados como DAMPs. metabolismo de lipídios (principalmente LDL) modificados
(oxidados ou acetilados).
PRRs (Pattern Recognition Receptors)
No final da década de 1990 a descoberta dos Receptores Os receptores N-formil Met-Leu-Phe são uma classe
de Reconhecimento de Padrão (PRRs) foi um grande marco para de receptores também conhecidas como receptores FPR (formyl
a imunologia inata, pois são uma parte importante e primitiva do peptide receptors = FPR). Esses receptores pertencem à classe de
sistema imunológico. Os PRRs reconhecem os MAMPs e receptores que se ligam à proteína G e são envolvidos,
PAMPs, que são moléculas não muito específicas de estruturas principalmente, com a quimiotaxia. Os peptídeos N-
comuns a diversos tipos de microrganismos (como a flagelina do formylmetionina são produzidos pela degradação de micro-
flagelo ou os lipopolissacarídeos – LPS – da parede celular), e organismos ou células, e os receptores que os reconhecem
moléculas intracelulares que identificam danos celulares que conseguem mediar a resposta imunológica na sua presença.
representam risco de sobrevivência para a célula, liberadas em
casos de danos intracelulares significativos (DAMPs). A Os receptores tipo lectina C (CLRs) são uma grande e
ativação dos PRRs leva ao desenvolvimento de uma resposta diversa categoria de receptores e apresentam diferentes funções
imediata. Esses PRRs chegam a cerca de uma centena, e são no sistema imune. Uma característica importante desses
receptores é a capacidade de identificar carboidratos presentes

31
nas membranas de microrganismos (bactérias, vírus e fungos) Receptores do complemento
diferentes daqueles encontrados em humanos. Esses receptores O complemento compreende mais de 20 proteínas
podem apresentar um sinal intracelular direto via MAP Kinase, séricas diferentes que são produzidas por uma variedade de
ativar a NFκB ou, indiretamente, modular os sinais dos TLRs. células, incluindo hepatócitos, macrófagos e células epiteliais.
Fazem parte desse grupo os Receptores de Manose, os Algumas proteínas do complemento ligam-se a imunoglobulinas
Receptores do tipo DC-SIGN, os Receptores associados às ou a componentes de membrana das células; outras são pró-
células dendríticas como imunorreceptores (DC immunoreceptor enzimas que, quando ativadas, clivam uma ou mais proteínas.
= DCIR), e os Receptores tipo Langerinas. Com a clivagem algumas das proteínas do complemento, há
liberação de fragmentos que ativam células, aumentam a
PRRs citoplasmáticos permeabilidade vascular ou opsonizam bactérias. Além da
São conhecidos como receptores citoplasmáticos: opsonização, o complemento pode recrutar e ativar várias
1) Os receptores tipo NLRs (principalmente NODs e células, incluindo células polimorfonucleares (PMNs) e
NALPs); macrófagos; pode participar na regulação de respostas de
2) Os receptores da classe RNA Helicases. anticorpos; e pode auxiliar na eliminação de complexos
Os receptores tipo NLRs (NOD–like receptores – do imunológicos e de células apoptóticas. O complemento também
inglês Nucleotide-binding Oligomerization Domain = domínio contribui para inflamação e danos tissulares, podendo levar
de oligomerização ligante de nucleotídeo) são proteínas também a reações anafiláticas. C3b e C4b na superfície de
citoplasmáticas que conseguem regular a resposta inflamatória e microrganismos se encaixam no receptor do C (CR1) em células
atuar no processo de apoptose. São reconhecidas cerca de 22 fagocitárias e promovem fagocitose (opsonização).
diferentes proteínas divididas em sub-famílias. Os ligantes
conhecidos como NOD1 e NOD2 reconhecem peptideoglicanos As colectinas são uma família de proteínas que
constituintes de bactérias Gram-negativas e Gram-positivas. desempenham um papel no sistema imune inato, reconhecendo
Três membros da família dos NLRs (Nlrp1, Nlrp3, e padrões microbianos e ativando o sistema complemento pela sua
Nlrc4) e um membro da família PYHIN (AIM2) têm sido ligação com a C1q. São reconhecidas as MBL e as proteínas
observados formando um complexo multiprotéico denominado surfactantes pulmonares (SP-A e SP-D).
“inflamassomo”. Cada inflamassomo tipicamente contém um
receptor NLR, uma proteína adaptadora associada à apoptose, As fricolinas são proteínas plasmáticas estruturalmente
contendo um domínio CARD (Caspase activation and semelhantes às colectinas que se ligam a diversas espécies de
recruitment domain) e uma protease (caspase-1). A ativação dos bactérias, opsonizando-as e ativando o sistema Complemento de
inflamassomos requer dois sinais – o sinal 1 é dado tipicamente maneira semelhante às MBL.
pela ativação de um TLR (Toll-like receptor), que causa a
produção de citocinas pro-inflamatórias (pro-IL-1 e pro-IL-18) As pentraxinas são uma grande família de proteínas
e aumento a transcrição e translação de moléculas NLR plasmáticas que reconhecem estruturas microbianas e participam
citosólicas; o sinal 2 vai depender do NLR ativado no interior da da imunidade natural. Membros bastante conhecidos dessa
célula. Esses complexos multiproteicos além de liberarem família incluem a CRP (Proteína C reativa), o SAP (amiloide P
citocinas inflamatórias, podem levar a uma forma programada de sérico) e a PTX3 (pentraxina longa). A CRP e o SAP ligam-se a
morte celular específica da inflamação denominada “piroptose”. diversas espécies de bactérias e fungos e atuam por opsonização.
Os NALPS (NAcht-LRR and Pyrin domain-containing A PTX3 é produzida por vários tipos de células, incluindo
proteíns = proteínas que contêm domínio NACHT, LRR e células dendríticas, endoteliais e macrófagos, e se ligam a vários
Pirina) são muito semelhantes aos NODs, e hoje já se conhecem “ligantes” como microrganismos, células apoptóticas e C1q.
pelo menos 14 membros dessa subfamília (NALP1 a NALP14). Porém, a PTX3 não é considerada uma “proteína da fase aguda”,
Outros NLRs incluem os receptores tipo IPAF e como a CRP e o SAP.
NAIP5/Birc1e, os quais atuam também na via da caspase-1 em
resposta a Salmonella e Legionella.
CARACTERÍSTICAS DA RESPOSTA IMUNOLÓGICA
Os receptores da classe RNA Helicases são ADQUIRIDA
caracteristicamente os que apresentam domínio de ativação e É importante lembrar que a imunidade adaptativa se
recrutamento das caspases (CARD domain). Esses receptores divide em imunidade humoral e imunidade celular. A imunidade
fazem o reconhecimento intracelular de RNAs alterados. humoral é mediada por linfócitos B, e seus principais elementos
são componentes do sangue e das secreções mucosas (humores).
PRRs secretados Como os principais elementos responsáveis pela imunidade
Dentre eles temos os: humoral temos os anticorpos. A imunidade celular é mediada
1. Receptores de complemento; principalmente pelos linfócitos T.
2. Colectinas; As principais características da resposta imunológica
3. Ficolinas; adquirida são:
4. Pentraxinas. 1) Especificidade, especialização e diversidade – a
Esses receptores da “vigilância imunológica” não especificidade é dada pela expressão de receptores de superfície
permanecem associados à célula, embora sejam produzidos por dos linfócitos, que são capazes de distinguir diferentes antígenos.
elas. A especialização se faz pelas diferenças nas respostas em função
de diferentes agentes agressores, e a diversidade é dada pelo

32
chamado “repertório linfocitário”, que pode identificar muitos e A imunidade celular fornece defesa contra os micróbios
diferentes determinantes antigênicos; intracelulares, mediada por linfócitos T; alguns linfócitos T
2) Memória imunológica – porque exposições posteriores a um ativam outros linfócitos, e alguns linfócitos T (os citolíticos ou
mesmo antígeno gera respostas imunológicas mais rápidas e citotóxicos) destroem qualquer tipo de célula hospedeira que
eficientes; esteja abrigando microrganismos infecciosos.
3) Capacidade de expansão clonal – porque os linfócitos sofrem Os linfócitos T são assim chamados, pois sofrem
considerável proliferação após exposição a um antígeno, sendo maturação no timo sendo também conhecidos pelo nome de
que todas as células geradas expressam idênticos receptores de timócitos. Existem diferentes tipos de linfócitos T com uma
superfície, caracterizando-se como clones; grande diversidade de funções.
4) Autolimitação e capacidade de tolerância às proteínas  Os linfócitos T citotóxicos (CD8+, T8, Tc) conseguem
próprias “self” – a resposta imunológica normal só fica ativa destruir as células infectadas;
durante a fase em que ela é necessária para a proteção do  Os linfócitos T auxiliares (CD4+, T4, Th ou T helper)
organismo agredido, e só o defende contra proteínas são os intermediários da resposta imunitária que se
consideradas “estranhas” ou “non self”. Alterações ou perda proliferam após o contato com o antígeno para ativar
dessas propriedades levam ao desenvolvimento de lesões ou outros tipos de células que agirão de maneira mais
geram situações conhecidas como “doenças autoimunes”. direta. Existem dois subtipos conhecidos de linfócitos T
auxiliares: Th1 e Th2. As células T auxiliares (TH)
Diferentes tipos de linfócitos também auxiliam os linfócitos B na produção de
Os linfócitos são populações distintas de células que se anticorpos;
diferem quanto à sua função, mas são morfologicamente  Os linfócitos T supressores produzem mensageiros
semelhantes. Os linfócitos B são responsáveis pela produção de químicos que inibem a atividade das células B e T
anticorpos (células plasmáticas ou plasmócitos), enquanto os quando a infecção se encontra debelada;
linfócitos T são mediadores da imunidade celular. Tanto os  Os linfócitos T reguladores (Treg) são células T que
linfócitos B como os linfócitos T possuem receptores de evitam as doenças autoimunes; e
antígenos distribuídos em “clones” (CD = Cluster of  Os linfócitos T de memória são células que ficam
differentiation) com especificidades antigênicas. Além das inativas, mas com a capacidade de resposta rápida à
células B e T, outras populações são também chamadas de nova exposição ao mesmo antígeno.
linfócitos pela sua morfologia, como as células Natural Killer
(NK). As proteínas da membrana dos linfócitos (CDs) podem ser Montagem da resposta pelos linfócitos:
utilizadas como marcadores fenotípicos para distinguir Ativação de linfócitos B e síntese de anticorpos:
populações de linfócitos funcionalmente distintas. Após o reconhecimento do epítopo pelos linfócitos B, duas
Caracteristicamente a maioria dos linfócitos T auxiliares respostas são possíveis:
expressa uma proteína conhecida como CD4, enquanto que a 1. Antígeno mitogênico para linfócito B: Promovem a
maioria dos linfócitos citotóxicos expressa CD8. Todos os produção de anticorpo da classe igual à do existente na
indivíduos devem ser tolerantes aos seus próprios antígenos (self) membrana como receptor. São denominados de
e reconhecer os antígenos estranhos (non self). Os linfócitos que antígenos T-independentes 1, os responsáveis pela
atacam antígenos self são eliminados ou inativados durante sua ativação policlonal de linfócitos B. Quando o antígeno
maturação. Falhas na autotolerância geram o desenvolvimento de possui epítopos repetitivos, eles são reconhecidos por
reações conhecidas como “autoimunes”. dois receptores adjacentes, havendo cruzamentos entre
É importante lembrar de algumas características da eles. Esse fenômeno ativa linfócitos que entram em
imunidade adaptativa: mitose e iniciam a síntese de anticorpos. Caso o
a) A resposta imune adaptativa é específica e conta com os linfócito seja virgem de contato com esse epítopo, o
linfócitos que reconhecem especificamente o patógeno invasor; anticorpo produzido é da classe IgM. Esses são
b) Existem vários tipos de linfócitos; chamados de antígenos T-independentes 2.
c) Essa imunidade se divide em imunidade humoral e 2. Se o epítopo é reconhecido sem cruzar os receptores, o
imunidade celular; antígeno é endocitado e processado, e os epítopos são
d) A imunidade celular e a imunidade humoral são mediadas apresentados na membrana junto aos MHC-II. Por
por diferentes tipos de células. influência da IL-4 liberada pelas células apresentadoras
de antígenos, os linfócitos TCD-4+ produzem citocinas
Características da resposta imune humoral (IL-4, IL-5) que ativam os linfócitos B a se diferenciam
É responsável pela defesa contra os agentes invasores em células capazes de produzir IgG ou IgE. Portanto, a
extracelulares e mediada por anticorpos produzidos pelos produção desses anticorpos depende da ação de
linfócitos B. Basicamente, os linfócitos B reconhecem o receptor linfocinas produzidas pelos linfócitos T (antígenos T-
de superfície do antígeno, transformam-se em plasmócitos e dependentes). Durante a diferenciação das células
produzem e secretam anticorpos que se ligam especificamente ao produtoras de IgG, IgE e IgA no centro germinativo dos
antígeno. folículos linfoides, são diferenciadas também as células
de memória. Portanto, só os antígenos T-dependentes
induzem memória imunitária.
Características da resposta imune celular

33
Durante a ativação dos linfócitos B, o efeito mitogênico (estranhos) pela modificação do antígeno, pela apresentação do
das citocinas produzidas pelos linfócitos Th1 induz a antígeno por meio de rotas específicas (como via oral) ou pela
ativação precoce dessas células, que produzem IgM. O administração do antígeno quando o sistema imune está em
deslocamento para a síntese dos outros anticorpos (IgG, IgA desenvolvimento. Alguns micro-organismos conseguem elaborar
e IgE) é mais tardio, razão pela qual a resposta inicial a um estratégias de induzir tolerância de modo que o hospedeiro não
antígeno introduzido no organismo pela primeira vez os destrua (evasão imunológica). A tolerância é diferente da
(resposta imunitária) se faz com a produção de IgM. Já a imunossupressão e da imunodeficiência, é um processo ativo
resposta secundária (que depende da existência de memória) antígeno-dependente em resposta ao antígeno, mas seus
se faz rapidamente com IgG. Por essa razão a pesquisa de mecanismos ainda não estão totalmente esclarecidos.
IgM anti-antígenos de um parasita, por exemplo, se positiva, A tolerância ocorre quando células TCD4 e TCD8 são
indica a infecção aguda recente. estimuladas e seguem um dos diferentes destinos:
1. Entram em apoptose, ocorrendo a deleção do clone que
Ativação de linfócitos T e resposta celular: reconhece o epítopo estimulador.
Células apresentadoras de antígenos (macrófagos, células 2. Entram em anergismo, ou seja, perdem sua capacidade
dendríticas e linfócitos B), apresentam os epítopos para as de responder ao epítopo.
células TCD4+, as quais, dependendo dos estímulos que 3. Produzem TGF-beta, citocina inibidora da resposta de
recebem, podem percorrer dois diferentes caminhos: outras células CD4 e CD8.
1. A IL-12, liberada pelas células apresentadoras de 4. Células CD4 podem ser ativadas e emitem sinais
antígenos, promove a diferenciação das células TCD4 ativadores para as células CD8+ que passam a produzir
em células Th1, as quais são responsáveis por ativarem TGF-beta e outras citocinas inibidoras.
macrófagos e linfócitos TCD8 (células T citotóxicas), 5. Existem células TCD4 e células TCD25 que, ao
resultado na resposta imunitária celular. reconhecerem o epítopo, diferenciam-se em células
2. A IL-4 produzidas por linfócitos B que apresentam produtoras de IL-10 e TGF-beta, ambas em inibidores
antígenos, promovem a diferenciação das células TCD4 de respostas de outros linfócitos.
em células Th2, as quais migram para o folículo linfoide
e estimulam a diferenciação de linfócitos B em Referências
plasmócitos, que são responsáveis pela resposta ABBAS AK, LICHTMAN AH, PILLAI, S. Imunologia celular e
humoral. molecular. 8. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015.
BRASILEIRO FILHO, G. - Bogliolo Patologia. 9º.Ed. Rio de
Regulação da resposta imunitária: Janeiro: Guanabara-Koogan, 2016.
A regulação da resposta imunitária começa já no início ABBAS, A.K.; KUMAR, V.; FAUSTO N. Robbins & Cotran –
de sua montagem; a quantidade do antígeno, sua natureza Patologia – Bases Patológicas das doenças. 9º. Ed. Rio de
(solúvel ou particulado) e o estado imunológico do organismo no Janeiro: Elsevier, 2016.
momento da imunização são fatores que sabidamente
influenciam a qualidade e a intensidade da resposta. A via
digestiva é excelente para provocar tolerância.
Grande ou pequena quantidade de antígeno induzem
tolerância. Quantidades intermediárias menores: induzem
respostas TH1. Quantidades intermediárias maiores promovem a
resposta Th2. Antígenos solúveis em baixa dose causam
respostas TH2, antígenos particulados tendem a estimular
respostas TH1.
As respostas Th1 e TH2 exercem efeitos inibidores
cruzados. O IFN-gama é um potente inibidor da diferenciação de
células TH2, enquanto a IL-4 e a IL-10 inibem as células TH1.
Por essa razão, quando um antígeno estimula fortemente uma
resposta TH1, a resposta TH2 é fraca e vice-versa. Esse fato é
importante na compreensão dos mecanismos patogenéticos das
doenças infecciosas, nas quais os padrões de respostas
inflamatórias dependem da capacidade do organismo de montar
respostas TH1 e TH2.

Conceito de Tolerância Imunológica.


Tolerância imunológica é um estado de não-reatividade
a determinado antígeno. Pode ser induzida para antígenos não-
próprios, mas o aspecto mais conhecido nesse contexto é a
autotolerância, que impede que o organismo elabore um ataque
contra seus próprios constituintes. Muitas vezes a tolerância pode
ser induzida por exposição prévia a um antígeno. A tolerância
também pode ser induzida para antígenos não próprios

34
FENÔMENOS VASCULARES EXSUDATIVOS DO
PROCESSO INFLAMATÓRIO

A inflamação é uma reação complexa dos tecidos


vascularizados contra agentes nocivos, dentre eles, micro-
organismos ou células danificadas, geralmente necróticas,
caracterizada pela saída de líquidos e de células do sangue para
o espaço intersticial. Assim, essa resposta complexa consiste
em respostas vasculares, migrações celulares e diversas reações
sistêmicas.
O organismo está constantemente envolvido em processos
inflamatórios brandos. Sem a resposta inflamatória, as
infecções se desenvolveriam descontroladamente, as feridas
nunca cicatrizariam e os processos destrutivos seriam
permanentes. Embora fundamental no combate às infecções, as
reações inflamatórias são pilares de diversas doenças crônicas,
dentre elas, a artrite reumatoide, a aterosclerose, a fibrose
pulmonar e as reações de hipersensibilidade. Aumento do número de vasos – Hiperemia – Aumento de 20x- FORP-
Algumas causas que levam ao processo inflamatório são: USP
injúrias mecânicas e químicas, isquemia, radiação, mecanismos Ela é constituída por 3 principais fases, que embora sejam
imunológicos, temperaturas extremas e infecções por diversos estudadas separadamente, ocorrem de forma concomitante.
agentes infecciosos (fungos, bactérias, vírus e protozoários).
A inflamação também está intimamente correlacionada ao 1. Alterações no calibre vascular: ocasiona o aumento do fluxo
processo de cicatrização, já que ao destruir o agente agressivo, sanguíneo local
a resposta inflamatória também desencadeia o processo de 2. Alterações estruturais na microcirculação: permite a saída de
reparo. proteínas plasmáticas e leucócitos.
A resposta inflamatória consiste em dois componentes
3. Eventos celulares: relacionada com a migração de leucócitos.
principais: uma reação vascular e uma celular. Muitos tecidos e
células estão envolvidos no processo inflamatório, incluindo as
proteínas do plasma, as células circulantes, os vasos sanguíneos Alterações vasculares
e os componentes celulares e extracelulares do tecido
conjuntivo. Alterações no fluxo e calibre vascular
O processo inflamatório é dividido em duas principais formas: A principal alteração no calibre provocada pelo processo
a inflamação aguda – de resposta rápida e geralmente inflamatório agudo é a vasodilatação. Geralmente a
inespecífica e a inflamação crônica - que consiste em uma vasodilatação ocorre após uma constrição transitória da
resposta mais tardia, no entanto, específica. arteríola, que dura alguns segundos.
A vasodilatação envolve inicialmente as arteríolas e
INFLAMAÇÃO AGUDA posteriormente, com o aumento do fluxo sanguíneo local,
Inflamação aguda é uma resposta rápida e inespecífica a um resulta na abertura de novos leitos capilares na região. Isso leva
agente nocivo encarregada de levar mediadores da defesa do ao aumento no fluxo sanguíneo, que é a causa do calor e rubor,
hospedeiro, leucócitos e proteínas plasmáticas ao local da frequentemente observado nos processos inflamatórios.
lesão. A vasodilatação é mediada pela ação da histamina e do óxido
A inflamação aguda pode ocorrer devido às infecções; traumas; nítrico no músculo liso vascular.
agentes físicos e químicos, necrose tissular e reações
imunológicas. Possui 5 sinais cardinais clássicos: calor, rubor, Alterações estruturais na microcirculação:
tumor, dor e perda de função. A vasodilatação é seguida pelo aumento na permeabilidade na
O calor é devido à vasodilatação, aumento do metabolismo microcirculação. A saída de proteínas plasmáticas e plasma do
celular. O rubor ocorre por meio da vasodilatação e da vaso sanguíneo eleva a concentração de hemácias dentro do
hiperemia. O tumor, ou edema, acontece por meio da vaso, aumentando a estase sanguínea intravascular e,
vasodilatação, do extravasamento de fluido (permeabilidade consequentemente, a migração dos neutrófilos para a superfície
vascular) e influxo celular (quimiotaxia). interna do vaso.
Já a dor acontece pela liberação de mediadores que afetam Vale a pena lembrar que os componentes sólidos do sangue,
terminações nervosas. como os leucócitos, circulam no centro do vaso sanguíneo e
A perda de função ocorre devido a danos ao tecido. que a estase sanguínea é responsável por sua marginação. Este
conteúdo pode ser revisto em distúrbios circulatórios, se
necessário.

Aumento da permeabilidade vascular


Uma característica fundamental da inflamação aguda é o
aumento da permeabilidade vascular. O aumento da
permeabilidade vascular permite a saída de proteínas e líquido

35
do espaço intravascular. A perda de proteínas do plasma reduz Lesão endotelial mediada por leucócitos
a pressão osmótica dentro do vaso, e aumenta a pressão Os leucócitos liberam espécies reativas de oxigênio e enzimas
osmótica no fluído intersticial. Essas forças associadas ao proteolíticas que causam lesão endotelial e elevam sua
aumento da pressão hidrostática, devido ao maior fluxo permeabilidade.
oriundo da vasodilatação, acarretam um extravasamento Ocorre principalmente em vênulas e capilares pulmonares.
acentuado de fluido e seu consequente acúmulo no tecido
intersticial, levando ao edema. Transitose aumentada
Existem dois tipos de extravasamento de líquido, ou seja, A transitose ocorre através de vesículas e vacúolos
edema: o transudato, que é a saída apenas de líquido de dentro interconectados chamados de organelas vesículo-vasculares. A
do vaso sanguíneo, e o exsudato, que é a saída de células e transitose é desencadeada por VEGF, histamina e pela maioria
líquido do vaso. dos mediadores químicos.
Características Exsudato Transudato
Proteínas Elevada > 3g/dl Normal < 3g/dl Extravasamento de vasos neoformados
Densidade  1020 < 1020
Na inflamação a angiogênese é estimulada. No entanto, os
Células Abundantes Poucas
novos brotos dos vasos recém-formados não são fechados, e,
Desidrogenase  200 < 200
portanto, permitem o extravasamento do conteúdo
Lática
intravascular até sua completa formação.
Esse fator explica o edema presente na fase inicial da
A permeabilidade vascular ocorre devido a diversos
cicatrização.
mecanismos abaixo citados:
Principais mediadores inflamatórios
Formação de fendas no endotélio venular Histamina: vasodilatação e aumento da permeabilidade.
Esse é o mecanismo mais comum e é desencadeado pela Prostaglandinas: vasodilatação.
histamina, bradicinina, leucotrienos e proteína P. Leucotrienos: aumento de permeabilidade.
Esse mecanismo é de curta duração e ocorre após o estímulo de
mediadores, sendo denominado de resposta imediata Eventos celulares
transitória. Uma das funções essenciais da inflamação é o
Os mediadores citados ligam-se nos receptores das células encaminhamento de leucócitos à área lesada e sua ativação. Os
endoteliais e ativam as vias de sinalização intracelulares que leucócitos são responsáveis pela destruição dos agentes
levam a fosforilação de proteínas contráteis do citoesqueleto, agressores, bactérias e outros micro-organismos; eliminando
provocando a separação das junções celulares. tecido necrótico e substâncias estranhas. No entanto, também
A formação de fendas no endotélio ocorre somente nas lesam as células do hospedeiro, perpetuando a inflamação.
vênulas, pois seus endotélios são mais sensíveis às proteínas A sequência de eventos no qual os leucócitos deixam o lúmen
desencadeadoras, além de possuírem junções intercelulares vascular e passam para o tecido intersticial, podem ser dividas
mais frágeis. nas seguintes etapas:
 Marginação: A marginação dos leucócitos ocorre devido à
Retração das células endoteliais
estase sanguínea (provocado pela permeabilidade vascular
Ocorre a fosforilação de proteínas contráteis do citoesqueleto
aumentada e pela vasodilação); a estase sanguínea reduz a
levando à retração celular. É rápida e de curta duração,
força de cisalhamento intravaso com a lentificação do fluxo e
induzida por histamina, principalmente. Pode ser induzida por
extravasamento do líquido intracelular, permitindo com que os
interleucina-1, fator de necrose tumoral e interferon gama,
leucócitos migrem para a periferia do vaso.
ocasionando efeitos mais duradouros.
 Rolamento: Uma vez em contato com o endotélio, os
receptores Sialyl-Lewis dos leucócitos se ligam de maneira
Lesão endotelial direta
fraca aos receptores de selectinas (selectina P e E) do
É provocada diretamente pelo agente lesivo, como
queimaduras e infecções bacterianas líticas. Por serem lesões endotélio. Como essa ligação não é de alta afinidade, ela é
diretas, podem ocorrer em quaisquer vasos. rompida pelo fluxo sanguíneo, fazendo com que os leucócitos
Iniciam logo após a lesão e se mantêm até o reparo do vaso, rolem sobre o endotélio ativado.
sendo classificada como resposta imediata sustentada.  Adesão: Durante a inflamação, existe a produção de
quimiocinas no interstício agredido. Essas quimiocinas
Extravasamento retardado prolongado atravessam o endotélio e se ligam à proteoglicanos presentes na
Ocorre devido a efeitos retardados provocados pelos agentes superfície endotelial, apresentando-os aos neutrófilos que estão
lesivos, como exemplo, podemos citar as queimaduras
em fase de rolamento. Essas quimiocinas são responsáveis
provocadas pela luz ultravioleta solar.
Especula-se que a maior parte dos efeitos retardados seja por pela ativação das integrinas dos leucócitos, que por sua vez, se
ação da apoptose, ou efeitos de cininas que levam a retração ligam às integrinas ICAM e VCAM do endotélio de maneira
endotelial. Resumidamente, a luz solar provoca dano e morte forte, promovendo adesão leucocitária.
de células endoteliais, propiciando o extravasamento do fluído Pavimentação leucocitária: O endotélio pode ficar virtualmente
intravascular. coberto de leucócitos, o que é chamado de pavimentação.

36
Diapedese: A adesão leucocitária eleva a expressão de Quimiotaxia
PECAM-1 nos leucócitos e nas células endoteliais Quimiotaxia é a locomoção celular através de gradiente
(especialmente nas junções intercelulares), mediando à químico. Todos os leucócitos são propensos à quimiotaxia.
diapedese ou migração leucocitária Os fatores quimiostáticos podem ser exógenos ou endógenos.
Os agentes exógenos mais comuns são os produtos bacterianos,
Observação: Os diferentes tipos de leucócitos não respondem como os peptídeos que possuem N-formil-metionina ou LPS de
de forma igualitária aos estímulos quimiostáticos. Os bactérias gram-negativas.
neutrófilos são mais numerosos e respondem mais rapidamente Os agentes quimiostáticos endógenos incluem vários
às quimiocinas, e, portanto, são os primeiros a chegarem no mediadores químicos como os componentes do sistema
local de inflamação (6-24 horas). No entanto, por terem complemento (principalmente C5a); produtos da via da
sobrevida curta (24-48 horas) são substituídos por monócitos; lipoxigenase (principalmente o leucotrieno B4) e citocinas,
que chegam ao local da inflamação em 24-48 horas. Os especialmente as quimiocinas.
neutrófilos se ligam mais firmemente às moléculas de adesão, Todos os fatores quimiostáticos se ligam a receptores
rapidamente induzidas nas células endoteliais, como as P e E específicos da proteína G, que atravessam a membrana sete
selectinas. vezes, na superfície dos leucócitos ativando diversas moléculas
No entanto, existem algumas exceções, como por exemplo, as efetoras, que promovem a produção de mensageiros lipídicos
infecções virais levam a presença apenas de linfócitos e as responsáveis pelo aumento do Ca2+ no citosol. O aumento de
reações de hipersensibilidade de eosinófilos. Ca2+ no citosol, ativa GTPase e cinase que induzem a
polimeração de actina no polo de maior concentração de
quimiocinas. Desta maneira, os leucócitos são capazes de se
locomover através da projeção de pseudópodes em direção ao
gradiente quimiostático.

Fagocitose
A fagocitose é uma das maiores responsáveis pela eliminação
dos agentes nocivos no local da inflamação. Denomina-se
fagocitose, o processo de englobamento e digestão de
partículas sólidas, semi-sólidas e micro-organismos pelos
fagócitos. Esse processo envolve três fases distintas:

Reconhecimento e ligação
O reconhecimento e ligação são realizados através de
receptores de membranas, descritos a seguir:
- Receptor de manose: Receptor especializado no
reconhecimento de micro-organismos. O receptor de manose é
uma lectina do macrófago que se liga a manose e a fucose que
são açúcares encontrados na parede celular de bactérias.
- Receptores de scavenger: Reconhecem lipoproteínas de baixa
Uma vez no tecido conjuntivo os leucócitos são capazes de se densidade e micro-organismos. Os receptores de scavenger se
aderirem à matriz extracelular através da ligação das integrinas B ligam a lipoproteínas de baixa densidade (LDL) oxidadas ou
e CD44 às proteínas da matriz. acetiladas, que não podem mais interagir com o receptor LDL
tradicional.
Ativação leucocitária - Integrinas: Reconhecem micro-organismos. As integrinas dos
Micro-organismos, células necróticas, complexo antígeno- macrófagos, especialmente MAC1, se integram à micro-
anticorpo, dentre outras, podem promover a ativação organismos.
leucocitária. A ativação leucocitária ocorre por diversas vias de - Receptores específicos para opsoninas: As opsoninas são
sinalização, promovendo o aumento da concentração de Ca2+ anticorpos, integrantes do sistema complemento ou lectinas
no citosol e ativação de enzimas como a proteíno-cinase C e as plasmáticas que se aderem ao micro-organismo, facilitando seu
fosfolipases A2. reconhecimento pelos fagócitos. Essas opsoninas são
As respostas induzidas pela ativação leucocitária incluem: reconhecidas por receptores específicos de alta afinidade.
 Produção de metabólitos do ácido aracdônico: os metabólitos
do ácido aracdônico são resultantes da ativação da fosfolipase Captura:
A2 e do aumento do Ca2+ intracelular. A ligação de uma partícula ao receptor de um fagócito inicia o
processo de extensão do citoplasma (pseudópodes),
 Desgranulação, secreção de enzimas lisossomais e ativação do responsável pelo englobamento da partícula ou do
surto oxidativo. microoganismo. Posteriormente ao englobamento, a membrana
 Produção de citocinas do fagócito se funde a membrana dos lisossomos, formando o
 Modulação das moléculas de adesão leucocitária. fagolisossomo. Durante essas sucessivas ligações dos

37
lisossomos ao fagossomo, tanto o neutrófilo quanto o Outros fatores também estão envolvidos na resolução do
macrófago se desgranulam progressivamente. processo inflamatório, como a mudança nos derivados do ácido
A fagocitose, assim como a quimiotaxia depende da aracdônico para lipoxinas anti-inflamatórias; liberação de TGF-
polimerização dos filamentos de actina, com sinalizações β pelos macrófagos, etc.
semelhantes aos envolvidos na quimiotaxia.
Padrões morfológicos da inflamação aguda:
Morte e degradação Apesar das reações inflamatórias agudas serem bem
A maior parte da destruição do micro-organismo é caracterizadas, sua causa específica e o tecido envolvido
desempenhada por mecanismos dependentes de oxigênio, que introduzem variações morfológicas nos padrões básicos.
culminam com a produção de intermediários reativos de O 2
Inflamação serosa: É um extravasamento exagerado de um
(ROS). Além da degradação mediada pelo O2, também ocorre a fluido diluído, derivado do plasma ou da secreção das células
destruição microbiana independente de O2. Essas substâncias mesoteliais que recobrem as cavidades corporais.
estão presentes principalmente nos grânulos dos neutrófilos,
tais como: Inflamação fibrinosa: Com lesões mais graves, e,
 BPI: Proteína catiônica que aumenta a permeabilidade consequentemente, com maior permeabilidade vascular,
bacteriana, ativando fosfolipases, danificando as membranas moléculas maiores como o fibrinogênio, passam a barreira
vascular formando massas compactas e grosseiras de fibrina.
celulares das bactérias Histologicamente, a fibrina aparece como uma malha
 Lisozima: hidrolisa a ligação do ácido murânico com a N- eosinofílica ou como um coágulo amorfo.
acetilglicosamina existente na camada glicopeptídica de todas O processo de resolução pode restaurar a estrutura tissular
as bactérias, degradando a parede celular das bactérias normal. Mas quando a fibrina não é removida, pode estimular a
 Lactoferrina: Queladora de Fe+. Ao ligar-se ao ferro tissular, a proliferação de fibroblastos e vasos, levando a formação de
tecido de cicatrização.
lactoferrina promove sua indisponibilidade para os micro-
organismos levando à redução de seu crescimento, já que o Inflamação purulenta: Consiste na produção de grande
ferro é essencial para que o crescimento microbiano ocorra. quantidade de pus. Basicamente o pus é composto por
 Proteases e enzimas hidrolíticas: digerem as proteínas de neutrófilos, células necróticas e edema.
bactérias destruídas. Algumas bactérias, principalmente Staphylococcus, produzem
a supuração localizada e são chamadas de bactérias piogênicas.
É muito importante frisar que esses mesmos mecanismos Os abcessos possuem uma região central constituída de tecido
também são responsáveis pela destruição tecidual. Essa necrótico.
destruição tecidual ocorre devido à liberação dessas
substâncias para o meio extracelular (enzimas lisossomais, Úlceras:
intermediários reativos de O2, produtos do metabolismo do A ulceração ocorre somente quando a necrose tissular e o
ácido aracdônico, etc). processo inflamatório resultante ocorrem em uma superfície ou
O escape dessas substâncias ocorre principalmente devido: próximo a ela. São comuns no trato digestivo, e membros
Liberação do conteúdo granular antes do vacúolo fagocitário se inferiores em pessoas idosas.
fechar.
 Ligação dos fagócitos a materiais que não podem ser
fagocitados.
 Fagocitose de substâncias que são potencialmente líticas para a
membrana (cristais de urato).
 Excreção de grânulos secundários dos neutrófilos diretamente
para o meio exterior por exocitose.
Observação: Imediatamente após a fagocitose, os neutrófilos
morrem por apoptose e são fagocitados. Os neutrófilos podem
formar armadilhas extracelulares (NETs), que são filamentos
de neutrófilos que servirão como obstáculos para a saída de
microrganismos.

Término da resposta inflamatória aguda


É fundamental que o processo inflamatório se finde logo que
ocorra a remoção do agente lesivo, já que o processo
Inflamação aguda com presença de neutrófilos e macrófagos
inflamatório é altamente destrutivo, mesmo para o hospedeiro.
espumosos – Aumento de 40x – FORP-USP
Em parte, a inflamação diminui rapidamente após a remoção
do agente lesivo, pois esses mediadores possuem meia vida
curta e são rapidamente degradados após serem liberados e
suas produções são realizadas em surtos rápidos.

38
INFLAMAÇÃO CRÔNICA
O estudo da inflamação crônica em patologia geral é
fundamental, pois irá permear doenças, geralmente persistentes
e de alta prevalência na população (tuberculose, hepatites,
lepra, sífilis, injúrias provocadas pelo tabaco, cirrose hepática,
doença de chagas, aterosclerose, lúpus eritematoso sistêmico,
asma, dentre muitas outras).
A maior consequência da inflamação crônica é a destruição
tissular e as sucessivas tentativas de reparo. Por isso, as
sequelas da inflamação crônica são mais graves do que na
inflamação aguda, e deixam uma herança fibroide tissular no
tecido acometido.
Embora existam inúmeras medicações anti-inflamatórias, não
existe qualquer medicação anti-fibrótica.

Definição: Inflamação crônica é uma inflamação prolongada,


onde coexistem a inflamação ativa, a destruição tissular e a
tentativa de reparo dos tecidos.

As principais causas das inflamações crônicas são:


1. Infecções persistentes
Bactérias, vírus e fungos de baixa toxicidade podem levar o
tecido à uma hipersensibilidade tardia, que muitas vezes
assume um padrão específico denominado de inflamação
granulomatosa.

2. Exposição prolongada a agentes potencialmente


tóxicos, exógenos e endógenos.
Ex: Sílica e aterosclerose

3. Auto-imunidade:
Sobre determinadas condições, as reações imunológicas se
Inflamação crônica com presença de linfócitos e plasmócitos
desenvolvem contra os tecidos do próprio indivíduo, causando
doenças auto-imunes de aspecto inflamatório crônico.
Características das inflamações crônicas:
O processo inflamatório crônico apresenta as seguintes
características:
1. Pode originar de um processo inflamatório agudo que
não foi capaz de debelar o agente infeccioso, desencadeando a
produção de mediadores que promovam a instalação da
inflamação crônica.
2. Microscopicamente são evidenciados na inflamação crônica:
Infiltrado de células mononucleares, dentre eles os linfócitos,
macrófagos e plasmócitos. Os eosinófilos, mastócitos e
neutrófilos só surgem na inflamação crônica, caso o agente
agressor persista. Lembrando-se de que o número de
neutrófilos na inflamação crônica é muito reduzido quando
comparado à inflamação aguda.3. Destruição tecidual: na
tentativa de destruir o agente agressor induzida pela
persistência do agente nocivo ou pelas células inflamatórias
4. Tentativas de cicatrização pela substituição do tecido
danificado por tecido conjuntivo, caracterizada pela
proliferação de fibroblastos e de vasos sanguíneos e aumento
do tecido conjuntivo com ampla deposição de colágeno.

A inflamação crônica é um processo mais específico e mais


sofisticado quando comparado à inflamação aguda, pois a

39
inflamação crônica envolve apresentações antigênicas e outras Esse tipo de inflamação pode ser subdividido em duas formas.
reações características da resposta imune adaptativa. 1. Imunitária: Quando há a presença de macrófagos e de
A inflamação crônica envolve a imunidade humoral e a linfócitos T.
imunidade celular. 2. Não imunitária ou de corpo estranho: Que é
A Imunidade humoral consiste no tipo de resposta imune caracterizada pela ausência de linfócitos T.
adquirida cujos anticorpos livres estão dissolvidos no plasma.
A função dessa imunidade é a mesma desempenhada pelos
anticorpos, que podem ser resumidos em:
1. Neutralização de antígeno: ligação íntima do anticorpo
com o antígeno fazendo com que esse altere sua conformação
espacial elementar e eliminando sua antiga afinidade com seu
receptor correspondente.
2. Opsonização: é o processo que facilita a ação do
sistema imunológico por fixar opsoninas ou fragmentos do
complemento na superfície bacteriana (epítopos) que facilita a
fagocitose;
3. Citotoxidade dependente de anticorpos e ativação do
sistema complemento: responsável por realizar a lise dos
micro-organismos e fagocitose de micro-organismos
opsonizados com fragmentos do complemento
Inflamação crônica com presença de linfócitos e plasmócitos –
A imunidade célular: É a imunidade mediada por células. Ela
Aumento de 40x- FORP-USP
é a função efetora dos linfócitos T e atua como um mecanismo
de defesa contra os micro-oganismos que sobrevivem dentro
INFLAMAÇÃO GRANULOMATOSA
dos macrófagos ou que infectam células não fagocíticas.
Definição: A inflamação crônica granulomatosa, é um padrão
distinto da inflamação crônica, caracterizada pelo acúmulo de
Vários micro-oganismos podem persistir, mesmo com todo o macrófagos ativados que geralmente desenvolve uma aparência
maquinário da inflamação crônica. Os principais motivos dessa epitelióide.
persistência são: Sua gênese está associada, principalmente, com reações
1. Materiais insolúveis, inertes e não antigênicos: como imunológicas, como a tuberculose, sarcoidose, arranhadura de
por exemplo, podemos citar corpos estranhos, estacas, vidros, gato, hanseníase, brucelose e sífilis.
silicone, etc.
2. Micro-organismos intracelulares: bactérias (hanseníase, O granuloma é o foco da infecção crônica e possui um
tuberculose, sífilis); fungos (paracoccidioidomicose.); parasitas agregado de macrófagos, transformados em células
(doença de Chagas) e infecções virais. epitelióides; cercado por um colar de leucócitos
mononucleares, especialmente linfócitos e plasmócitos.
As células epiteliódeis são as células características da
CLASSIFICAÇÃO DA INFLAMAÇÂO CRÔNICA:
inflamação crônica granulomatosa. Seu aspecto é:
A inflamação crônica pode ser dividida em: inflamação
1. Citoplasma granular rosa pálido
crônica inespecífica ou em inflamação crônica específica (ou
granulomatosa), e esta ainda pode ser subdividida em 2. Perda dos limites celulares, como se as células se
imunitária e não imunitária. fundiram uma as outras.
3. Núcleo pouco denso, geralmente oval ou alongado.
Inflamação crônica inespecífica:
É o tipo de inflamação crônica em que o exsudato inflamatório
e a proliferação de vasos dispõem-se de maneira irregular; de
forma que não se tem indícios de localização do agente
etiológico.
Por não haver um granuloma organizado, não haverá um
modelo de destruição tecidual e por esse motivo o diagnóstico
etiológico é quase impossível.

Inflamação crônica específica ou inflamação crônica


granulomatosa
O exsudato inflamatório crônico se dispõe em forma de
pequenos nódulos (granulomas) e dependendo de sua
constituição, é possível evidenciar o agente etiológico.

40
2. Granulomas imunes: São causados por partículas
insolúveis, tipicamente micro-organismos que são capazes de
induzir uma resposta imunológica celular.
Os macrófagos fagocitam o antígeno, processam e apresentam
partes desses antígenos (epitopos) aos linfócitos T, ativando-os.
As células T reagem e produzem citocinas, como a IL-12,
ativando outras células T, perpetuando a resposta.
O IFN-gama também é muito importante para a ativação dos
macrófagos e sua transformação em células epitelióides.

Patogênese dos granulomas:


A reação primordial para a patogênese dos granulomas é a
interação macrófago-linfócitos.
Estimulado por mediadores quimiostáticos, o monócito
circulante deixa a circulação. Já nos tecidos se transformam em
macrófagos ativados, e fagocitam o antígeno, apresentado os
Granuloma – Aumento de 10x – FORP-USP epítopos aos linfócitos T, ativando-os. O linfócito T ativado
libera INF-gama, que atua na ativação de mais macrófagos e
As células epitelióides podem se fundir gerando células em sua transformação epitelióide. Concomitantemente,
gigantes, que possuem: algumas células epitelióides se agrupam formando células
1. Cerca de 40 a 50 µm de diâmetro gigantiformes, que potencializam a produção de enzima
2. Podem conter mais de 20 núcleos, que quando lisossomais e de espécies reativas de O2, proteases, metabólitos
localizados randomicamente caracterizam as células gigantes do ácido aracdônico, fatores de crescimento angiogênicos.
tipo corpo estranho; e quando localizados na periferia (como Todo esse arsenal celular provoca destruição tecidual, que
forma de ferradura) são denominadas de células gigantes tipo aliada à tentativa de reparo leva a fibrose e angiogênese,
promovendo a formação do granuloma complexo imune.
Langhans. Embora esses tipos celulares sejam diferentes
Caso o agente agressor não apresente caráter imune, ou seja, é
morfologicamente, não existem diferenças funcionais entre incapaz de ativar o linfócito T, o granuloma será denominado
eles. de granuloma puro.

Aspectos microscópicos dos granulomas


Granuloma complexo imune:
Pequenas coleções de células epitelióides circundados por um
halo de linfócitos. As células epitelióides lembram o formato
das células da camada espinhosa da epiderme. Estas células se
apresentam agrupadas de maneira variada: redondas, ovais ou
fusiformes com citoplasma abundantemente eosinofílico.
É comum encontrar neste granuloma células gigantes
multinucleadas do tipo de Langhans. Já que esta fusão favorece
a potencialidade da célula fagocítica.
Dependendo da etiologia do processo inflamatório crônico,
podemos encontrar as seguintes células: plasmócitos;
eosinófilos (principalmente em processos de parasitismo
helmíntico), neutrófilos (em processos fúngicos) e mastócitos.
No interior do granuloma, pode ser observado o
Os granulomas mais velhos desenvolvem cápsulas de desenvolvimento de processo necrótico causado
fibroblastos e de tecido conjuntivo ao seu redor. principalmente pela liberação de radicais livres pelas células
Existem duas formas de granulomas, que se diferem segundo inflamatórias ativadas.
sua patogenia. Essa necrose pode ser:
Tipo supurativa: necrose rica em neutrófilo, característica da
1. Granulomas de corpos estranhos: doença da arranhadura de gato, causada por bactérias gram-
São provocados por corpos estranhos inertes (talco, sutura, negativas.
etc). Geralmente se formam quando os materiais são grandes o Tipo caseosa: necrose com aspecto esbranquiçado, lembrando
suficiente para impedir a fagocitose por um único macrófago e o aspecto de queijo (caseum) característico da tuberculose.
não conseguem provocar uma resposta inflamatória.
As células epitelióides e as células gigantes se formam e Envolvendo toda a coleção de células e o agente agressor,
aderem à superfície do corpo estranho. encontra-se um halo de proliferação de fibroblastos. Esse halo
O material causador geralmente aparece quando se utiliza a luz tem o objetivo de impor limites celulares ao processo
polarizada. inflamatório.

41
As vantagens da produção do granuloma são a formação de
microambiente isolado, capaz de conter o agente agressor e
prevenir sua disseminação.
Os indivíduos que apresentam imunodeficiência natural ou
adquirida apresentam deficiência na diferenciação de
macrófagos em células epitelióides, favorecendo o
aparecimento de infecções oportunistas.

Granuloma puro
É formado a partir da reação inflamatória a um material
insolúvel não antigênico (fio de sutura, etc).
Inicialmente o agente agressor não imunogênico desencadeia
uma resposta aguda, repleta de neutrófilos. Esses neutrófilos,
quando incapazes de remover o agente agressor, são
substituídos por macrófagos, que na persistência do agente
agressor se diferenciam em células epitelióides e em células
gigantiformes do tipo corpo estranho.
Referências:
A formação do granuloma puro evita uma inflamação aguda 1. BRASILEIRO FILHO, G. - Bogliolo Patologia. 9º.Ed. Rio
persistente e destrutiva. de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2016.
2. ABBAS, A.K.; KUMAR, V.; FAUSTO N. Robbins &
Cotran – Patologia – Bases Patológicas das doenças. 9º. Ed.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2016.

Granuloma – Aumento de 20x – FORP-USP

42
Mediadores inflamatórios São proteínas circulantes envolvidas em diferentes
fenômenos orgânicos – o sistema complemento, as cininas e as
Os mediadores (ou moduladores) do processo proteínas da coagulação.
inflamatório são moléculas envolvidas na resposta
inflamatória, responsáveis por modular seus eventos vasculares Incialmente, descreveremos os mediadores
e celulares. inflamatórios produzidos pelas células e posteriormente
Muitos mediadores já foram identificados, no entanto, descreveremos os mediadores químicos mais importantes
suas formas de atuação ainda não estão completamente derivados do plasma sanguíneo.
esclarecidas. Os mediadores inflamatórios atuam de maneira
orquestrada, potencializando ou inibindo outros mediadores. Aminas vasoativas
Os mediadores inflamatórios são regidos pelos As duas aminas histamina e serotonina são especialmente
seguintes princípios: importantes, pois são armazenadas nas células e estão entre os
1. Os mediadores inflamatórios se originam de primeiros mediadores a serem liberados durante a inflamação.
proteínas plasmáticas ou das células.
Os mediadores derivados do plasma estão presentes Histamina: Está presente em todos os tecidos através dos
na forma de precursores e devem ser ativados. mastócitos (também estão presentes em plaquetas e basófilos).
Os mediadores derivados das células, geralmente A histamina está presente nos grânulos dos mastócitos e é
estão armazenados em grânulos ou precisam ser liberada mediante diversos estímulos: lesão física, reações
sintetizados. As principais fontes dos mediadores de imunológicas envolvendo a ligação de anticorpos aos
origem celular são: monócitos, macrófagos, mastócitos, pelos fragmentos do complemento chamados de
neutrófilos, plaquetas, células endoteliais, anafilotoxinas (C3a e C5a), citocinas, neuropeptídeos P e
fibroblastos, músculos lisos, e células epiteliais. proteínas leucocitárias. A histamina leva a:
2. Os mediadores ativos são desencadeados por  Dilatação de arteríolas
produtos microbianos ou por proteínas do hospedeiro  Aumento da permebilidade venular
(proteínas do sistema complemento, cininas, etc), que  Constrição de artérias de grande calibre.
por sua vez, são ativados por microrganismos ou por
A histamina é considerada o principal mediador da fase
tecidos danificados.
transitória imediata do aumento de permeabilidade vascular.
3. Os mediadores geralmente se ligam a receptores
Ela age através de sua ligação aos receptores H, nas células
específicos nas células alvos, e podem estimular a
endoteliais. Drogas genericamente conhecidas como anti-
produção de outro mediador. Entretanto, alguns
histamínicas bloqueiam estes receptores.
mediadores possuem atividade enzimática direta (ex:
Proteases lisossomais) ou causam danos oxidativos
Serotonina: É um neurotransmissor e está relacionado ao
(ex: Intermediários reativos de oxigênio). sistema límbico, controlando as reações de: ansiedade, medo,
4. Um mediador pode estimular a produção de outro
depressão, sono e percepção à dor. No processo inflamatório,
mediador, que pode ser antagônico ou suplementar
apresenta efeitos similares aos da histamina. As serotoninas
ao mediador químico que o estimulou.
estão presentes nas plaquetas e são liberadas após estimulação
5. Um mesmo mediador pode estimular diferentes tipos
provocada pela agregação plaquetária. É um mediador
celulares e levar a respostas diferentes.
vasoativo pré-formado com ações semelhantes à histamina.
6. Uma vez liberados, os mediadores têm meia vida
curta.
Metabólitos do ácido aracdônico
7. A maioria dos mediadores têm potencial para
Quando as células são ativadas, os lipídeos de
ocasionar efeitos danosos.
membrana são rapidamente remodelados para gerar lipídios
biologicamente ativos, graças à fosfolipase A2. Eles funcionam
Descreveremos sucintamente alguns mediadores mais
como sinais intracelulares e extracelulares que afetam diversos
importantes:
processos biológicos, dentre eles, a inflamação e hemostasia.
O ácido aracdônico é um ácido graxo poli-insaturado
Mediadores químicos derivados das células: com 20 átomos de carbono, derivados da dieta ou da conversão
Os mediadores químicos da inflamação derivados de
do ácido graxo essencial, ácido linoleico. Eles estão presentes
células são basicamente proteínas e enzimas que são
em sua forma esterificada nos fosfolipídeos de membrana,
encontradas em grânulos intracelulares ou que são sintetizadas
sendo liberados através da atuação da fosfolipase A2.
mediante estímulo. Estes compostos, ditos pró-inflamatórios,
As fosfolipases A2 podem ser ativadas por estímulos
promovem ou retroalimentam o processo de inflamação. São
mecânicos, químicos e físicos - os eicosanódeis se unem aos
eles:
receptores ligados à proteína G de vários tipos celulares e
a) Aminas vasoativas, podem mediar cada passo da inflamação.
b) Metabólitos do ácido araquidônico, Os metabólitos do ácido aracdônico são sintetizados
c) Fator de Ativação Plaquetária (FAP), por duas classes de enzimas: 1. cicloxigenases (que produzem
d) Citocinas, as prostaglandinas e tromboxanos) e 2. lipoxigenases (que
e) Espécies reativas do oxigênio (ROS), produzem os leucotrienos e lipoxinas).
f) Óxido nítrico (NO),
Via da cicloxigenase:
g) Enzimas lisossômicas dos leucócitos, e
São iniciadas por duas enzimas a COX-1
h) Neuropeptídeos (substância P). (constitutivamente expressa) e a COX-2 (de produção induzida
mediante inflamação) levando a produção de prostaglandinas.
Mediadores químicos derivados do plasma sanguíneo
43
As prostaglandinas mais importantes são a PGE2,  Inibidores da ciclooxigenase: incluem a aspirina e
PGD2, PGF2α, PGI2 (prostaciclina) e TxA2 (tromboxano). Cada outros anti-inflamatórios não esteroidais que inibem
uma das diferentes prostaglandinas é derivada da ação de uma irreversivelmente as COX. Há no mercado também os
enzima específica em um produto intermediário da via de Coxibs, inibidores exclusivos da COX-2, evitando a
ativação. Algumas dessas enzimas apresentam uma restrição na inibição da COX-1 constitutiva.
distribuição tecidual. Por exemplo, as plaquetas contêm  Inibidores da lipoxigenase: Agentes farmacológicos
principalmente a enzima tromboxano-sintetase e, portanto, o que inibem a produção de leucotrienos ou bloqueiam
Tromboxano A2 é o principal produto dessas células. O os receptores de leucotrienos demonstram ser úteis no
endotélio possui a prostaciclina-sintetase, o que acarreta na tratamento de reações asmáticas.
produção de prostaciclina como produto final.  Inibidores de amplo espectro: Incluem os
Dentre os principais papeis das prostaglandinas glicocorticoides. Agem na diminuição da expressão
podemos citar: que codificam a COX-2, a fosfolipase A2, citocinas
 Prostaciclina PGI2: Causa vasodilatação e inibe a inflamatórias (IL-1 e TNF) e a síntese do óxido nítrico
agregação plaquetária. (iNOS). Os glicocorticoides também estimulam genes
 Tromboxano A2: Causa vasoconstrição e promove a que codificam proteínas anti-inflamatórias como a
agregação plaquetária. lipocortina 1.
 PGE2: Causa hiperalgesia, pois torna a pele
hipersensível aos estímulos dolorosos.
 Prostaglandina PGD2; PGE2 e PGF2α: Causam Fator de ativação plaquetária (FAP)
vasodilatação e aumento de permeabilidade Este mediador químico é derivado dos fosfolipídeos
potencializando o edema. de membrana de neutrófilos, monócitos, basófilos, células
Existe um grande interesse na enzima COX-2, pois ela endoteliais e plaquetas, dentre outras. Além da estimulação de
é induzida durante o processo inflamatório e não é encontrada plaquetas, causam vasoconstrição e broncoconstrição. Também
na maioria dos tecidos em condições normais. Diferentemente são capazes de vasodilatação e o aumento da permeabilidade
da COX-1, a COX-2 não é expressa constitutivamente pelos vascular com uma potência de 100 a 10.000 vezes maior que a
tecidos. Portanto, a inibição da COX-1 não influencia apenas histamina. Ele também causa o aumento da adesão leucocitária
no processo inflamatório, mas também na homeostasia aos endotélios, a quimiotaxia, a degranulação leucocitária e o
corpórea, como por exemplo, no balanço hidroeletrolítico renal estresse oxidativo. O FAP estimula a produção de outros
e na proteção celular no trato gastrointestinal. mediadores químicos, especialmente os eicosanoides. Ainda
não existem drogas aprovadas para o uso clínico que atuem
Via da lipoxigenase: como antagonistas específicos do FAP.
São gerados por lipoxigenases que estão presentes em
alguns tipos celulares, das quais destacamos: Citocinas
 5-lipoxigenase: predominante nos neutrófilos. Seu As citocinas são proteínas produzidas por vários tipos
produto é o 5-HETE que é quimiotático para celulares de defesa (linfócitos, macrófagos, neutrófilos), mas
neutrófilos e é convertido em leucotrienos. também por células do endotélio, epitélio e tecido conjuntivo
 Leucotrieno B4: potente quimioatrator para que modulam função de outros tipos celulares. Citocina é um
neutrófilos como o 5-HETE. termo genérico empregado para designar um extenso grupo de
 Leucotrieno C4: Promove vasoconstrição, moléculas proteicas, envolvidas na emissão de sinais entre as
broncoespasmo e aumento de permeabilidade células, que atuam tanto na imunidade inata como na adquirida
 Leucotrieno D4: Promove vasoconstrição, e em muitos outros processos fisiológicos e patológicos do
broncoespasmo e aumento de permeabilidade organismo. Constituem um grupo de proteínas extracelulares,
 Leucotrieno E4: Promove vasoconstrição, com vida média curta, que são capazes de estimular as células
broncoespasmo e aumento de permeabilidade. com receptores específicos, mas são moléculas com atividade
*Os leucotrienos são muito mais potentes do que a histamina pleiotrópica (podem atuar sobre muitos tipos celulares
em relação ao aumento da permeabilidade vascular e diferentes) e redundante (várias citocinas podem efetuar as
broncoespamos. mesmas ações).
Além disso, em função do tipo de célula e sua
 Lipoxinas: São formadas através da 12-lipoxigenase
presente nas plaquetas, para tanto elas utilizam o atividade funcional no momento, as citocinas podem induzir
efeitos diferentes sobre as mesmas células, e podem também
subproduto Leucotrino A4, produzido pelos
influenciar a ação de outras citocinas de forma antagônica ou
neutrófilos, através de uma interação direta entre os
sinérgica. A maioria das citocinas exerce efeitos parácrinos
neutrófilos e as plaquetas. As principais lipoxinas e
(ação sobre células presentes nas proximidades das células
seus respectivos efeitos são:
produtoras de citocina) ou efeitos autócrinos (ação sobre o tipo
 Lipoxina A4: Vasodilatação, inibe quimiotaxia de
celular que a produz). Além disso, algumas citocinas exercem
neutrófilos e estimula a adesão dos monócitos.
efeitos endócrinos, agindo sobre células localizadas em outro
 Lipoxina B4: Vasodilatação, inibe quimiotaxia de
sítio corporal. As diferentes citocinas podem ser enquadradas
neutrófilos e estimula a adesão dos monócitos.
em diversas categorias como: interferons, interleucinas, fatores
*As principais ações das lipoxinas são a inibição do
de necrose tumoral ou fatores de transformação e de
recrutamento leucocitário e dos componentes celulares da
crescimento.
inflamação.

A terapia anti-inflamatória pode ser direcionada para os


seguintes alvos:

44
Fator de necrose tumoral e interleucinas-1 mecanismo compensatório endógeno que reduz as respostas
O TNF e a IL-1 são as principais citocinas que inflamatórias.
participam do processo inflamatório e serão descritas
detalhadamente. Componentes lisossomais dos leucócitos
São produzidas principalmente por macrófagos Os neutrófilos e monócitos contém grânulos de
ativados. A secreção de TNF e IL-1 pode ser estimulada por lisossomos que, quando liberados, podem contribuir com a
endotoxina e outros produtos microbianos, complexos imunes, reação inflamatória. Os neutrófilos possuem 2 tipos de
lesão física e estímulos inflamatórios. Atuam principalmente grânulos:
no endotélio, leucócitos, fibroblastos e na indução de reações  Os grânulos específicos, que são menores, possuem:
sistêmicas de fase aguda. Participam da ativação endotelial, Lisozima, lactoferrina, colagenase,
promovendo a síntese das moléculas de adesão endotelial e gelatinase, ativador de plasminogênio.
mediadores químicos.  Os grânulos azurófilos, que são maiores, possuem:
O TNF e a IL-1 são as principais responsáveis pela Mieloperoxidase, Lisozima, defensinas,
ativação dos neutrófilos. Também participam das reações hidrolases ácidas e várias proteases neutras.
sistêmicas de fase aguda: induzindo febre, perda de apetite, Os grânulos específicos liberam seu conteúdo no
sono de ondas lentas, aumento da frequência cardíaca e fagossomo ou no meio extracelular mais rapidamente que os
redução do Ph do sangue. grânulos azurófilos, no entanto, os grânulos azurófilos são
O TNF também regula a massa corporal, promovendo potencialmente mais destrutivos. Os grânulos específicos
a mobilização de lipídios e proteínas e suprimindo o apetite. A exigem baixa estimulação para liberar seus grânulos, enquanto
produção continuada do TNF contribui para a caquexia que os grânulos azurófilos necessitam de estimulações mais
acompanha algumas infecções e doenças neoplásicas. contudentes.
As diversas enzimas possuem funções diferentes:
Quimocinas 1. Proteases ácidas: degradam bactérias e fragmentos
São um grupo especial de citocinas. São famílias de dentro dos fagossomos, onde o pH se torna ácido com
proteínas pequenas que agem primariamente como maior facilidade.
quimiotáticos para tipos específicos de leucócitos. Elas são 2. Proteases neutras: são capazes de degradar diversos
classificadas em quatro grupos principais, de acordo com a componentes da matriz extracelular e clivar C3 e C5
localização do resíduo conservado de cisteína nas proteínas diretamente.
maduras: Devido aos efeitos destrutivos das enzimas
1. Família CXC – Um aminoácido separa as duas lisossomais, o infiltrado leucocitário inicial, se não controlado,
primeiras cistéinas conservadas. Essa família de pode aumentar mais ainda a permeabilidade vascular e o dano
quimiocina atua em neutrófilos. tecidual. Entretanto, essas proteases são controladas por um
2. Família CC – Duas cisteínas conservadas são sistema de antiprotease no soro no líquido tecidual,
adjacentes. Atuam em monócitos, eosinófilos, denominada de alfa-antitripsina.
basófilos e linfócitos.
3. Quimiocinas C: Duas das quatro cisteínas Radicais livres derivados de oxigênio
conservadas estão ausentes. São específicas para As espécies reativas do oxigênio são compostos
linfócitos. químicos resultantes da ativação ou redução do oxigênio
4. Quimiocinas CX3C: contém 3 aminoácidos entre as molecular (O2). As principais espécies reativas de oxigénio
duas primeiras cisteínas conservadas. Promovem forte são: o ânion superóxido (O2-), o peróxido de hidrogênio (H2O2)
adesão de monócitos e células T. e o radical hidroxila (HO.). Todo organismo exposto ao
As quimiocinas exercem sua atividade ligando-se aos oxigênio produz espécies reativas de oxigênio em seu
receptores de membranas ligados à proteína G que atravessa a metabolismo normal. Em situações patológicas, a produção de
membrana 7 vezes. Algumas quimiocinas são produzidas espécies reativas de oxigênio aumenta.
transitoriamente em resposta aos estímulos inflamatórios e As espécies reativas do oxigênio são enzimas
promovem recrutamento de leucócitos aos locais da sintetizadas através da via NADPH-oxidase e liberadas
inflamação. Outras são produzidas constitutivamente nos principalmente por macrófagos ativados e neutrófilos na
tecidos e atuam na organogênese, organizando as células nas presença de estímulos como bactérias, imunocomplexos e
diferentes regiões anatômicas do tecido. citocinas.
Quando produzidos no interior dos lisossomos dos
Óxido Nítrico neutrófilos e macrófagos, atuam destruindo microrganismos
É um gás solúvel produzido pelas células endoteliais, fagocitados e células necróticas, no entanto, quando liberados
macrófagos e alguns neurônios do cérebro. Atua de maneira das células em baixos níveis podem aumentar a expressão das
parácrina já que sua meia-vida é de apenas alguns segundos. O moléculas de adesão e citocinas, amplificando a cascata de
NO é sintetizado a partir da L-arginina através da enzima óxido mediadores químicos; e ainda, quando em concentrações
nítrico sintase (NOS). Existem 3 diferentes tipos de NOS. A maiores, esses mediadores podem levar à lesão endotelial e de
NOS endotelial (eNOS), NOS neuronal (nNOS) e a induzível outros tipos de células. Os radicais livres derivados de O2,
(iNOS). A eNOS e a nNOS são expressas constitutivamente podem se combinar com o NO e formar diversos outros
em níveis baixos, e a iNOS é induzida quando os macrófagos e radicais reativos de O2.
outras células são ativadas pelas citocinas.
O NO é um importante vasodilatador, devido sua ação Estresse oxidativo: Desequilíbrio entre os sistemas de geração
no músculo liso vascular. O NO também reduz a agregação, a e de eliminação de radicais livres.
adesão plaquetária e inibe a ativação de mastócitos e o As espécies reativas de O2 provocam danos a lipídeos,
recrutamento plaquetário. Assim, a produção de NO é um proteínas e ácidos nucleicos.
45
Os radicais livres iniciam reações autocatalíticas, que sua habilidade em desintoxicar espécies
são reações com moléculas que são convertidas em radicais reativas de O2.
livres, se propagando em cadeia.
Os radicais livres podem ser criados nas células das Neuropeptídeos
seguintes maneiras: Os pequenos peptídeos, como a substância P e a
1. Absorção de energia radiante, como ultravioleta e RX. neurocinina A, pertencem a uma família de neuropeptídeos
 A radiação quebra a H20 em OH- e taquicininas produzidos no sistema nervoso central e
H+. periférico. A substância P têm muitas funções biológicas,
2. Reações de redução-oxidação durante o processo incluindo a transmissão de sinais dolorosos, regulação da
normal. Durante o processo de redução de O2 em água pressão sanguínea, estimulação da secreção pelas células
(no RE, no citosol, mitocôndria, peroxissomos e endócrinas e aumento da permeabilidade vascular.
lissossomos) existe a produção de intermediários de
O2. Dentre eles: Mediadores químicos oriundos do plasma sanguíneo
 Ânion superóxido (O2-) São proteínas circulantes envolvidas em diferentes fenômenos
 Peróxido de hidrogênio (H2O2) orgânicos, dentre essas destacamos: sistema complemento, as
 Hidroxila (OH-). cininas e as proteínas da coagulação.
3. Metais de transição: Fe e Cu doam e recebem elétrons
livres durante as reações intracelulares, levando à Sistema complemento
produção de intermediários de O2. O sistema complemento consiste de 20 proteínas que
 H2O2 + Fe2+  Fe3+ + OH + OH-. são encontradas em maior concentração no plasma. O processo
4. Óxido nítrico: também pode atuar como radical livre e de ativação do sistema complemento resulta em
também ser convertido em ânions altamente reativos permeabilidade vascular ativada, quimiotaxia e opsonização.
(ONOO-; NO2; NO3-). As proteínas do complemento estão presentes no plasma em
sua fase inativa, e são enumeradas de C1 a C9. Quando
Efeitos das espécies reativas de O2: ativadas seus produtos de clivagem se tornam agentes
1. Peroxidação lipídica das membranas: A lesão proteolíticos que degradam outras proteínas do complemento
oxidativa é iniciada quando as ligações duplas dos gerando uma enorme amplificação enzimática.
ácidos graxos insaturados dos lipídios são atacadas A etapa mais crítica da ativação do sistema
por radicais livres (OH). A associação dos lipídeos complemento é a ativação do C3 que pode acontecer por 3
com o OH  leva a produção de peróxidos que são diferentes vias:
instáveis e levam a uma reação autocatalítica, 1. Via clássica: desencadeada pela fixação de C1 a um
culminado com o dano celular. complexo antígeno e anticorpo.
2. Via alternativa: desencadeada por moléculas da
2. Modificação oxidativa das proteínas: Os radicais superfície bacteriana (LPS, endotoxina) veneno de
livres promovem oxidação da cadeia lateral dos cobra e outras substâncias sem a presença de
aminoácidos causando fragmentação proteica. anticorpos.
3. Via da lectina: lectina plasmática se liga à manose e
3. Lesões do DNA: As reações com a timina do DNA se une aos carboidratos dos microrganismos, ativando
nuclear mitocondrial causam rupturas em filamentos diretamente C1.
do DNA. Essas lesões estão correlacionadas ao Independente da forma de ativação, C3 se fragmenta
envelhecimento celular. em C3a e C3b. C3a é liberado na circulação, C3b se liga ao
complexo de complementos e o antígeno, que formará o
Mecanismos de remoção dos radicais livres: complexo C5 convertase, que clivará C5 em C5a e C5b. C5a
Os superóxidos são instáveis e se deterioram vai para a circulação. O fragmento C5b se liga aos compostos
espontaneamente, no entanto, existem vários agentes posteriores C6-C9, culminando com a formação do complexo
enzimáticos que atuam em sua desativação: de ataque à membrana (MAC), composto de várias moléculas
o Antioxidantes: geralmente vitaminas A e C C9.
que bloqueiam a formação de radicais livres As funções biológicas do sistema complemento se
ou os inativam. enquadram em duas categorias: (a) lise celular pelo MAC; (b)
o Ferro e Cobre: catalisam a formação de Efeitos inflamatórios dos fragmentos proteolíticos do
espécies reativas de O2. complemento, dos quais podemos destacar:
*Os níveis dessas formas reativas são minimizados pela  Fenômenos vasculares: O C3a e o C5a estimulam a
ligação dos íons às proteínas de armazenamento e de transporte liberação de histamina pelos mastócitos, levando à
(transferrina, ferritina e ceruloplasmina). permeabilidade vascular e vasodilatação.
o Superoxidodismutase (SOD): acelera a  Adesão; quimiotaxia e ativação de leucócitos: C5a é
conversão de O2- em O2 e H2O. um potente quimioatrator para os granulócitos.
 Catalase: presente nos peroxissomos, é uma  Fagocitose: O C3b fixado à parede bacteriana facilita a
enzima que catalisa a quebra de H2O2 fagocitose por PMNN e macrófagos através da
originando O2 e H2O. opsonização.
 Glutadião peroxidase: também age
protegendo as células dos radicais livres. A Sistema de cininas
proporção glutadião reduzida e glutadião O sistema de cininas gera peptídeos vasoativos a partir
oxidada reflete o estado de oxidação celular e de proteínas plasmáticas, resultando na liberação de
bradicinina que é responsável pelo aumento da permeabilidade
46
vascular e dilatação de vasos sanguíneos. A cascata das cininas
é desencadeada pela ativação do fator XII da coagulação,
quando esse entra em contato com colágeno ou membranas
basais e se ativa. O fator XII ativado converte a pré-calicreína
em sua forma proteolítica, denominada enzima calicreína. Esta
por sua vez, cliva um precursor glicoproteico do plasma, o
cininogênio, de alto peso molecular em bradicinina.

Sistemas de coagulação
O sistema de coagulação está intimamente
correlacionado ao processo inflamatório.
A via intrínseca é composta de várias proteínas
plasmáticas que tem seu desencadeamento de clivagem
estimulada pelo fator XII. O fator XII é uma proteína presente
na circulação sanguínea, produzida no fígado que, quando em
contato com o colágeno, membrana basal ou plaquetas
ativadas, se ativa e quebra fatores consecutivos da cascata de
coagulação. Assim, culmina com a formação da trombina,
através de seu precursor protrombina. A trombina é
responsável pela quebra do fibrinogênio solúvel circulante em
fibrinogênio insolúvel. Ela também se associa aos receptores,
chamados de receptores ativados por proteases, expressos em
células endoteliais, musculares lisas e outros tipos, sendo eles
responsáveis pelas seguintes respostas pró-inflamatórias:
 Mobilização da P selectina;
 Produção de quimiocinas;
 Expressão de integrinas endoteliais;
 Indução da COX2;
 Produção de prostaglandinas;
 Produção de PAF e NO.
O fator XII também é responsável pela ativação do
sistema fibrinolítico através da quebra de pré-calicreína em
calicreína que atuará na transformação do plasminigênio em
plasmina. A plasmina, por sua vez, será responsável por
quebrar C3 em C3a que possui grandes propriedades pró-
inflamatórias, como já descrito.

Referências:
1. BRASILEIRO FILHO, G. - Bogliolo Patologia. 9º.Ed. Rio
de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2016.
2. ABBAS, A.K.; KUMAR, V.; FAUSTO N. Robbins &
Cotran – Patologia – Bases Patológicas das doenças. 9º. Ed.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2016.

47
Outras razões para as lesões de reperfusão são:
Lesão e morte celular  Maior captação de cálcio pelas células anóxicas, em
virtude da volta do fluxo sanguíneo, aumentando a quantidade
Embora as lesões sejam de origem e de intensidade diferentes,
do eletrólito nos tecidos.
suas etiologias elas podem ser agrupadas em:
 Produção de radicais livres pelos leucócitos.
 Chegada súbita de plasma produzindo choque
Hipóxia/Anóxia
A redução do fornecimento de oxigênio às células é chamada osmótico nas células.
hipóxia, enquanto sua interrupção total é denominada de
anóxia. Muitas vezes, a redução do fornecimento do oxigênio Radicais livres
está associada com a redução do fluxo sanguíneo ou sua Radicais livres são moléculas que apresentam um elétron não-
completa parada. emparelhado no orbital externo, o que as torna muito reativas a
A hipóxia deve ser diferenciada da isquemia. A isquemia é a qualquer outro tipo de moléculas, incluindo lipídeos, proteínas
perda do suprimento sanguíneo devido à obstrução do fluxo e ácidos nucleicos.
arterial ou redução da drenagem venosa, levando a falta de Os radicais livres podem iniciar reações em cadeia que levam à
fornecimento de oxigênio e de substratos metabólicos como a formação de novos radicais, amplificando sua capacidade de
glicose. Por isso, os tecidos isquêmicos são danificados mais produzir lesões.
rapidamente do que os tecidos hipóxicos, quando guardadas as O oxigênio molecular é a principal fonte de radicais livres na
devidas proporções dessas lesões. célula. Radicais livres são produzidos no metabolismo normal
São exemplos de hipóxia: das células; na síntese de colágeno, nos peroxisosmos.
a. Insuficiência cardiorrespiratória Diversas agressões podem levar a produção de radicais livres:
b. Anemia (perda da capacidade carreadora de O2 substâncias químicas; radiações ionizantes; cigarros, alimentos
pelo sangue). oxidados.
c. Intoxicação por monóxido de carbono, que resulta
na produção de carboxiemoglobina estável que Lesões produzidas por radicais livres:
bloqueia o transporte de oxigênio. Os radicais livres produzem lesões celulares por reagirem com
lipídeos, proteínas e ácidos nucleicos.
Em hipóxia as células podem adaptar-se, com atrofia, ou sofrer
lesão irreversível. Agentes físicos
Dependendo da intensidade e duração de sua ação, qualquer
Lesões reversíveis provocadas pela hipóxia: agente físico pode produzir lesão no organismo. Por sua maior
importância, serão comentados os mecanismos de ação dos
1. A diminuição da síntese do ATP na cadeia respiratória das seguintes agentes físicos: força mecânica, variações de pressão
mitocôndrias resulta na elevação de acetil-CoA, favorecendo a atmosférica, variações de temperatura, eletricidade, radiações,
síntese e acúmulo de ácidos graxos. e ondas sonoras.
2. A síntese de ácido lático reduz o pH intracelular,
provocando a condensação da cromatina, dificultando a AGENTES QUÍMICOS:
transcrição gênica. As lesões ocasionadas por fatores químicos são muito grandes
3. Redução na atividade das bombas Na+/K+ que é a e heterogêneas. Substâncias simples como glicose e sal em
responsável pela passagem de Na+ e de água para o interior soluções hipertônicas podem levar a morte celular. Outros
celular, promovendo a dilatação do citoplasma (tumefação). agentes altamente perigosos podem levar a morte celular em
concentrações mínimas, tais como o arsênico, cianeto e
Lesões irreversíveis provocadas pela hipóxia: mercúrio.
Os agentes químicos podem provocar lesões por dois
Necrose/apoptose mecanismos:
1. Ação direta sobre células do interstício: através de
 Alterações de membrana: A elevação do nível de Ca2+
transformações moleculares, que resultam em
intracitosplasmático ativa enzimas que causam demolição dos
degeneração ou morte celular, alterações o interstício,
lipídeos de membrana. As figuras de mielina no retículo
ou modificação do genoma, induzindo à
endoplasmático são resultado da degradação de parte das
transformação maligna.
membranas alteradas.
2. Ação indireta: atuando como antígeno, induzindo
 Cristólise (desaparecimento das cristas mitocondriais).
resposta humoral ou celular.
 Perda de enzimas lisossômicas.
AGENTES INFECCIOSOS
Efeitos da reperfusão: Os agentes biológicos incluem vírus, riquétsias, micoplasmas,
Tecidos mantidos em anóxia ou hipóxia, quando reoxigenados, clamídias, bactérias, fungos, protozoários e helmintos.
apresentam agravamento da lesão. Isso ocorre devido à Os mecanismos mais comuns de lesão por agentes
formação de radicais livres de oxigênio a partir das primeiras biológicos são:
moléculas de oxigênio que chegam aos tecidos.
 Ação direta: Os micro-organismos invadem e podem
Também ocorre devido à formação de muitas xantinas oxidases
provocar a morte direta das células pela produção de
oriundas da xantina desidrogenase por ação de proteases
substâncias nocivas, como as exotoxinas e endotoxinas.
durante a hipóxia.
 Ação indireta: Ativação de reação inflamatória,
Resumidamente a xantina oxidase transforma o oxigênio em
indução de resposta imunitária, adsorção de antígenos
superóxido, que origina outros radicais capazes de peroxidar as
parasitários pelas células hospedeiras (ex.: hepatite),
membranas e produzir lesões irreversíveis.

48
similaridade entre antígenos do parasita e do hospedeiro 1. Diminuição do ATP
(autoagressão). São comuns em lesões hipóxicas e químico-tóxicas. O ATP é
fundamental para diversos metabolismos celulares, dos quais
REAÇÕES IMUNOLÓGICAS podemos destacar:
Dependendo do antígeno e da forma de sua apresentação, o  Transporte pela membrana;
organismo reage mediante a produção de anticorpos e/ou pela  Síntese proteica;
formação de linfócitos. Anticorpos podem lesar ou interferir no  Lipogênese;
funcionamento celular através de:  Reação de acilação-reacilação;
 Bloqueio ou estimulação de uma função celular.
 Formação de complexos antígeno-anticorpo e fixação O ATP é produzido por duas vias fundamentais:
do sistema complemento, levando à liberação de 1. Fosforilação oxidativa do difosfato de adenosina, que
fatores quimiotáticos (início da reação inflamatória) promove a redução do O2; através do sistema de
ou à agressão direta às células-alvo, destruindo-as. transferência de elétrons da mitocôndria (com grande
 Fenômeno de ADCC (Citotoxicidade mediada por eficiência na produção de ATP).
células dependente de anticorpos): células com 2. Via glicolítica: utilização de glicose derivada de
capacidade citotóxica, como; por exemplo, os fluídos corporais ou da hidrólise de glicogênio (com
macrófagos e neutrófilos que reconhecem o baixa produção de ATP).
fragmento Fc de anticorpos presentes nas células-alvo,
promovendo sua lesão. Os tecidos com maior capacidade glicolítica, como o fígado,
têm vantagem adaptativa em situações de queda de ATP.
DISTÚRBIOS GENÉTICOS A redução de ATP em 10% leva efeitos disseminados em
Muitos são os distúrbios genéticos que podem levar a lesão muitos sistemas críticos.
celular. De fato, a lesão pode ser oriunda de distúrbio genético
grave, como uma a malformação congênita associada a uma A. A redução da atividade da bomba de sódio e potássio
anormalidade cromossômica (Síndrome de Down), ou ser tão ocasiona
sutil a ponto de reduzir a vida dos eritrócitos devido à troca de  Acúmulo intracelular de Na+;
um único aminoácido na hemoglobina S, como na anemia  Perda de potássio intracelular;
falciforme.  Absorção de H20;
 Edema celular;
DESEQUILÍBRIOS NUTRICIONAIS  Dilatação do Retículo Endoplasmático;
É uma das principais causas de lesão celular e podem ser
 Perda das microvilosidades;
oriundas de: deficiência proteico-calórica (países
 Formação de bolhas.
subdesenvolvidos), deficiência vitamínica, excessos
nutricionais e doenças metabólicas como o diabetes.
B. Alteração do metabolismo celular
A fosforilação oxidativa é reduzida devido à ausência de
MECANISMOS DAS LESÕES CELULARES
oxigênio, promovendo a glicólise anaeróbia e consequente
Todas as lesões celulares seguem os seguintes princípios:
acúmulo de ácido lático e fosfatos inorgânicos devido à
1. A resposta celular a estímulos nocivos depende do
hidrólise dos ésteres de fosfato. Isso leva a redução de pH que
tipo do agente agressor, da duração da agressão e sua
gera queda da atividade enzimática e a condensação da
gravidade.
cromatina celular.
Ex: Baixas doses de uma substância tóxica; períodos curtos de
isquemia.
C. Fluxo intracelular de cálcio e perda da hemostasia do
2. A consequência da lesão depende do tipo celular e da
cálcio.
sua capacidade de se adaptar.
Os íons cálcio são importantes mediadores da lesão celular. O
Diferentes tipos celulares possuem capacidade diferente de
cálcio livre no citosol é mantido em concentrações
adaptação.Ex: Células musculares estriadas podem reduzir
extremamente baixas. O aumento de cálcio intracelular resulta
drasticamente seu metabolismo em hipóxia, já células
do aumento não específico na permeabilidade de membrana.
cardíacas não.
 O aumento de Ca2+ intracelular leva à ativação de
enzimas de potencial efeito celular deletério:ATPases:
A lesão celular resulta de anormalidades funcionais,
acentuam a queda de ATP.
anormalidades bioquímicas ou anormalidades de componentes
celulares comuns.  Fosfolipases: provocam danos às membranas.
Os alvos mais importantes dos estímulos nocivos são:  Proteases: degradação de proteínas de membrana e do
 Respiração aeróbica envolvendo a fosforilação citoesqueleto.
mitocondrial e a produção de ATP.  Endonuclease: fragmentação do DNA e da cromatina.
 Integridade das membranas celulares da qual depende  Aumento da permeabilidade mitocondrial 
a hemostasia iônica e osmótica da célula e de suas organelas. apoptose.
 Síntese proteica.
D. Ruptura estrutural dos mecanismos da síntese
 Citoesqueleto
proteica:
 Integridade genética.
Dentre outros efeitos provocados pela diminuição do
Devido ao ataque desses alvos podemos verificar os seguintes
ATP está o descolamento dos ribossomos do RER,
mecanismos essenciais de lesão celular:
que leva à diminuição da síntese proteica e à

49
deposição de lipídeos e danos nas membranas  Ânion superóxido (O2-)
mitocondriais e lisossomais.  Peróxido de hidrogênio (H2O2)
E. Respostas das proteínas não dobradas.  Radical hidroxila (OH-).
Nas células com privações de oxigênio e glicose, as 8. Metais de transição: Ferro e Cobre doam e aceitam
proteínas podem ser dobradas de maneira incorreta, elétrons livres durante as reações intracelulares,
causando morte celular. levando a produção de intermediários de reativos de
oxigênio.
2. Dano mitocondrial H2O2 + Fe2+  Fe3+ + OH + OH-.
A lesão celular é frequentemente acompanhada de alterações 9. Óxido nítrico: também pode atuar como radical livre e
morfológicas nas mitocôndrias. também pode ser convertido em ânion altamente
O dano mitocondrial pode ocorrer devido a: reativo (ONOO-; NO2; NO3-).
 Aumento do Ca2+ no citosol.
 Estresse oxidativo. Efeitos das espécies reativas de oxigênio:
 Degradação de fosfolipídios pela fosfolipase A2. 4. Peroxidação lipídica das membranas:
A lesão oxidativa é iniciada quando as ligações duplas
A lesão mitocondrial resulta na formação de um canal de dos ácidos graxos insaturados dos lipídios são
condutância, chamada de poro de transição de permeabilidade atacadas por radicais livres (OH).
mitocondrial, que inicialmente é reversível. A associação dos lipídeos com o radical hidroxila leva
Caso a agressão persista, o poro de transição impede a força a produção de peróxidos que são instáveis e
matriz ou do potencial de prótons da mitocôndria, levando a promovem uma reação autocatalítica, promovendo
morte celular. danos a membrana, organelas e células.
O dano mitocondrial está associado ao extravasamento do 5. Modificação oxidativa das proteínas:
citocromo C, que é um importante iniciador da apoptose. Os radicais livres promovem oxidação da cadeia
lateral dos aminoácidos causando fragmentação
3. Fluxo intracelular de cálcio e perda da hemostasia proteica. Essa modificação oxidativa, leva ao aumento
do cálcio. da degradação de proteínas críticas.
Os íons cálcio são importantes mediadores da lesão celular e já 6. Lesões do DNA:
foram discutidas acima. As reações com a timina do DNA nuclear e
mitocondrial causam rupturas em filamentos do DNA.
4. Acúmulo de radicais livres derivados do O2 Essas lesões estão correlacionadas ao envelhecimento
As células reduzem oxigênio em água e , durante esse celular.
processo, pequenas quantidades de formas reativas de
oxigênio, parcialmente reduzidas são produzidas como produto Mecanismos de remoção dos radicais livres:
indesejável da respiração mitocondrial, levando ao estresse  Os superóxidos são instáveis e se deterioram
oxidativo, que é definido como o desequilíbrio entre os espontaneamente, no entanto existem vários agentes
sistemas de geração e de eliminação de radicais livres. enzimáticos que atuam em sua desativação:
As espécies reativas de oxigênio provocam: Antioxidantes: geralmente vitaminas A e C bloqueiam ou
 Danos aos lipídios; inativam a formação de radicais livres.
 Danos às proteínas; e Ferro e Cobre: catalisam a formação de espécies reativas de
 Danos aos ácidos nucléicos. oxigênio. Os níveis dessas formas reativas são minimizados
pela ligação dos íons a proteínas de armazenamento e de
Radicas livres: são moléculas que apresentam um elétron não- transporte, tais como as transferrinas, ferritinas e
emparelhado no orbital externo (frequentemente é um íon), que ceruloplasminas.
as torna muito reativas a qualquer outro tipo de molécula. São Várias outras enzimas também atuam na remoção de radicais
gerados na mitocôndria e atuam principalmente nos ácidos livres, tais como:
graxos, DNA, carboidratos e proteínas. Superoxidodismutase (SOD): acelera a conversão de
Os radicais livres iniciam reações autocatalíticas, que são O2- em O2 e H2O.
reações com moléculas que são convertidas em radicais livres, Catalase: presente nos peroxissomos. Enzima que
propagando-se em cadeia. catalisa a quebra de H2O2 em O2 e H2O.
Os radicais livres podem ser criados nas células das seguintes Glutadião peroxidase: a proporção glutadião reduzida
maneiras: e glutadião oxidada reflete o estado de oxidação celular e sua
5. Absorção de energia radiante: habilidade em inibir as espécies reativas de O2.
Ex: Radiação ultravioleta. A radiação quebra a H20
em OH- e H+. 5. Defeitos na permeabilidade de membrana
6. Metabolismo enzimático de substâncias exógenas ou A perda de permeabilidade da membrana é causa frequente dos
drogas: danos celulares. Vale ressaltar que tais defeitos afetam não
Ex: tetracloreto de carbono (CCl4). apenas a membrana plasmática, mas também mitocôndrias e
7. Reações de redução-oxidação durante o processo outras membranas celulares.
normal:
Durante o processo de redução de oxigênio em água A membrana celular pode ser danificada por:
(no Retículo Endoplasmático, no citosol, na  Redução de ATP
mitocôndria, no peroxissomos e nos lissossomos)  Toxinas bacterianas
existe a produção de intermediários de reativos de  Proteínas viróticas
oxigênio. Dentre eles:  Agentes físicos e químicos
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Segundo Brasileiro filho, se a substância acumulada é um
Vários mecanismos estão envolvidos nos danos à membrana, pigmento, essa deverá ser estudada à parte e deve ser
sendo eles: denominada de pigmentação.
Tomando-se por base a composição química das células (água,
A. Disfunção mitocondrial: eletrólitos, lipídeos, carboidratos e proteínas), as degenerações
A disfunção mitocondrial resulta na redução da síntese de são agrupadas de acordo com a natureza da substância
fosfolipídios que afetam todas as membranas celulares. acumulada. Por esse critério, as degenerações são classificadas
Ao mesmo tempo, a diminuição do ATP promove o aumento em:
do Ca2+ intracelular, ativando fosfolipases levando ao 1. Degenerações com acúmulo de água e eletrólitos.
aparecimento do poro de transição da permeabilidade (degeneração hidrópica).
mitocondrial, que culmina com a morte celular. 2. Degenerações com acúmulo de proteína (degeneração
hialina e mucoide).
B. Perda dos fosfolipídios da membrana. 3. Degenerações com acúmulo de lipídeos (esteatose e
A perda dos fosfolipídios de membrana se dá por duas lipidose).
principais vias: 4. Degenerações com acúmulo de carboidratos
1. Diminuição do ATP  aumento do Ca2+ intracelular (glicogenoses e mucopolissacaridoses).
 ativação de fosfolipases
2. Diminuição da reação de reacilação, promovendo a
diminuição da síntese de fosfolipídios.
Degeneração hidrópica.
C. Anormalidade do citoesqueleto: Degeneração hidrópica é a lesão celular mais comum e é
 O aumento do cálcio intracelular ativa as proteases caracterizada pelo acúmulo de água e eletrólitos no interior da
que lesam o citoesqueleto, promovendo formação de bolhas e célula, tornando-a tumefeita e aumentada em volume.
aumento da permeabilidade de membrana. Esse tipo de lesão possui sinonímia ampla:
1. Degeneração vascular: devido ao aspecto vascular que
D. Espécies reativas de oxigênio: a célula pode tornar-se.
A lesão oxidativa é iniciada quando as ligações duplas dos 2. Degeneração granular: aspecto granuloso do
ácidos graxos insaturados dos lipídios são atacadas por radicais citoplasma ao MO.
livres (OH). 3. Tumefação turva: células tumefeitas são mais turvas
A associação dos lipídeos com o OH  leva à produção de quando observadas sem fixação e coloração.
peróxidos que são instáveis e levam a uma reação 4. Degeneração albuminosa: porque Virchow admitiu
autocatalítica  dano celular. que essa lesão acumula albumina.

E. Produtos de degradação de lipídeos: Causas e mecanismos:


A degradação dos fosfolipídeos leva a produção de ácidos É provocada por transtornos no equilíbrio hidroeletrolítico que
graxos não esterificados e de lisofosfolipideos, que atuam resulta em retenção de eletrólitos e água nas células. O trânsito
como detergente ou trocam de lugar com os fosfolipídeos da de eletrólitos na célula depende de bombas eletrolíticas que são
membrana, levando a alterações de permeabilidade capazes de transportar os íons contra o gradiente de
eletrofisiológica. concentração.
Para o seu funcionamento adequado, algumas bombas
A lesão à membrana resulta em perda do equilíbrio osmótico eletrolíticas dependem de energia na forma de ATP; outras que
com influxo de fluidos e íons, assim como a perda de não gastam ATP dependem da integridade da membrana e da
proteínas, enzimas, coenzimas e ácidos ribonucleicos. integridade das proteínas que formam o complexo enzimático
A lesão nas membranas dos lisossomos resulta no da bomba.
extravasamento de suas enzimas para o citoplasma e sua Desse modo, uma agressão pode diminuir o funcionamento da
ativação, levando à digestão enzimática dos componentes bomba eletrolítica quando:
celulares. 1. Altera a produção ou consumo de ATP.
A gravidade da lesão celular depende em grande parte da 2. Interfere na integridade das membranas.
intensidade da agressão, do tempo e do tipo da agressão. As 3. Modifica a atividade de uma ou mais moléculas que
lesões reversíveis podem ser de intensidade leve ou grave, e formam a bomba.
ainda se manterem reversíveis, ou seja, uma vez retirado o
estímulo agressor, a célula tende a retornar ao seu estágio Portanto, a degeneração hidrópica pode ocorrer nos casos de:
normal. No entanto, existe um ponto de não retorno, que separa 1. Hipóxia.
as lesões que podem ser “curáveis” daquelas “incuráveis”. 2. Hipertermia exógena ou endógena (febre), devido ao
Uma vez ultrapassado esse ponto de “não-retorno”, aumento no consumo de ATP.
obrigatoriamente a célula caminhará para a morte celular, seja 3. Toxinas com atividade de fosfolipases e agressões
ela por necrose ou apoptose, que serão descritas mais adiante. geradoras de radicais livres.

Degenerações Em todas essas situações, as mais diferentes causas conduzem


Definem-se degenerações como lesões reversíveis decorrentes a um fenômeno comum: retenção de sódio, redução de cálcio e
de alterações bioquímicas que resultam no acúmulo de potássio, e aumento da pressão osmótica intracelular, levando à
substâncias no interior das células. entrada de água no citoplasma e expansão osmótica da célula.

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Como as bombas eletrolíticas do retículo endoplasmático liso
são mais sensíveis à redução de ATP, esse é o primeiro Corpúsculos hialinos de Councilman e Rocha Lima:
compartimento a se expandir. Correspondem a hepatócitos em apoptose e são vistos na
hepatite viral e febre amarela.
Aspectos macroscópicos: de modo geral, os órgãos aumentam Em indivíduos com proteinúria, a degeneração hialina por
de volume e peso. endocitose excessiva de proteínas é encontrada no epitélio
tubular renal.
Aspectos microscópicos: as células são mais salientes na
superfície do corte. As células são mais tumefeitas (tumefação Corpúsculos de Russel: É o acumulo excessivo de
turva) e o citoplasma adquire aspecto granuloso (degeneração imunoglobulinas nos plasmócitos. São frequentes em
granular) e menos basofílico. inflamações agudas (p. exemplo nas salmoneloses) ou crônicas
Em estágios mais avançados, as células apresentam pequenos (especialmente na leishmaniose tegumentar e osteomielites).
vacúolos de água distribuídos de modo regular no citoplasma Os plasmócitos, uma vez degradados, deixam os corpúsculos
(degeneração vacuolar). Outas vezes, formam-se grandes de Russel livres no interstício.
vacúolos que chegam a tomar o aspecto baloniforme.
Ao microscópico eletrônico verificamos: redução das
vilosidades, formação de bolhas na membrana citoplasmática,
dilatação do retículo endoplasmático e condensação da
cromatina.
Evolução e consequências: a degeneração hidrópica é um
processo reversível. Suprimida a causa, as células voltam ao
seu aspecto normal.

Corpúsculo de Russel presente no tecido conjuntivo da mucosa


oral com inflamação.

Degeneração mucoide:
Sob essa denominação são conhecidas duas condições:
1. Hiperprodução de muco pelas células mucíparas do
trato respiratório e digestivo, levando as células a se
abarrotarem de mucinas, o que pode levar até mesmo a morte
celular.
Degeneração hidrópica observada em tecido epitelial da
2. Síntese exagerada de mucinas em adenomas e
mucosa oral.
adenocarcinomas, fazendo com que essas sejam secretadas no
espaço intersticial e conferindo o aspecto de tecido mucoide.
Degeneração hialina
O conceito de degeneração hialina é morfotintorial. Trata-se de
Esteatose
um acúmulo de material acidófilo, vítreo no interior da célula.
É a deposição de gorduras neutras (mono, di ou triglicerídeos)
O material é proteico e resulta geralmente da condensação de
no citoplasma de células que normalmente não as armazenam.
filamentos intermediários e proteínas associadas, que formam
É mais comum no fígado, mas também pode acontecer no rim
corpúsculos no interior da célula.
e no coração.
A degeneração hialina pode resultar de:
Etiopatogênese:
 Acúmulo material de origem virótica; A lesão ocorre toda vez que um agente interfere no
 Podem ser corpos apoptóticos; metabolismo dos ácidos graxos da célula, aumentando sua
 Podem ser proteínas endocitadas. síntese ou dificultando sua excreção.
A esteatose é causada por agentes tóxicos, hipóxia, alterações
Corpúsculo hialino de Mallory: Encontrado nos hepatócitos de na dieta e distúrbios metabólicos de origem genética.
alcoólatras crônicos e formado por filamentos intermediários Nos casos de hipóxia, há redução na síntese de ATP. Nesses
associados a outras proteínas do citoesqueleto. casos, a esteatose decorre do aumento da síntese de ácidos
Também são encontrados na esteato-hepatite não alcoólica e no graxos. Nesses ácidos graxos encontra-se grande quantidade de
carcinoma hepatocelular. -glicerato (originado da glicólise acelerada pela redução da
síntese de ATP) e formam os triglicerídeos que se acumulam
Mecanismo de formação: radicais livres atuam na citoqueratina no citoplasma. A redução de ATP também dificulta a síntese
do esqueleto induzindo sua peroxidação e facilitando ligações de lipídeos complexos, a utilização de ácidos graxos e
transversais, favorecendo assim, a formação de aglomerados triglicerídeos, favorecendo o acúmulo intracelular dos
que se precipitam. triglicerídeos.
52
Na desnutrição proteico-calórica, dois fatores são importantes:
1. A carência de proteínas leva à deficiência de fatores
lipotróficos indispensáveis à produção de apolipoproteínas,
reduzindo a formação de lipoproteínas e excreção de
triglicerídeos, que se acumulam.
2. A ingestão calórica deficiente causa mobilização de
lipídeos do tecido adiposo, aumentando o aporte de ácidos
graxos ao fígado.

Agentes tóxicos, como o tetracloreto de carbono, lesam o


retículo endoplasmático rugoso e reduzem a síntese de
proteínas, levando a esteatose por afetar a síntese de
apolipoproteínas.
A ingestão abusiva de álcool é a forma mais frequente de
esteatose. O etanol é oxidado em aldeído acético e acetil-CoA. Esteatose presente no fígado humano.
O excesso de acetil-CoA favorece a síntese de ácidos graxos,
que somados aos provenientes da circulação, originam Evolução:
triglicerídeos que se acumulam nas células. Apesar de ser uma lesão reversível, as lesões mais graves de
esteatose podem levar à morte celular. No fígado, os
Aspectos macroscópicos: Órgãos com esteatose apresentam hepatócitos repletos de gordura podem se romper e formar
aspecto morfológico variável. verdadeiros lagos de gordura (cistos gordurosos). Esses cistos
Fígado: aumento de peso e volume, consistência diminuída; gordurosos podem se embolizar (embolia gordurosa) a partir de
apresenta-se amarelado e com bordas arredondadas. sua fragmentação, que acontece principalmente pelos eventos
Coração: o órgão se torna pálido e com baixa consistência. Nos traumáticos.
casos de hipóxia prolongada, apresentam faixas amareladas No coração, a esteatose difusa pode agravar a insuficiência
visíveis através do endocárdio. Esse aspecto é denominado de funcional do órgão.
coração tigroide.
Rim: aumento de volume e peso; de coloração amarelada. Lipidoses
Lipidoses são acúmulos intracelulares de outros lipídeos que
Aspectos microscópicos: não os triglicerídeos. E se dividem em duas principais formas:
São muito característicos. Os triglicerídeos se depositam em os depósitos de colesterol e as esfingolipidoses.
pequenas vesículas ou glóbulos revestidos por membrana,
denominados de lipossomos. Depósito de colesterol:
Na forma inicial, os vacúolos se apresentam de tamanhos Os depósitos de colesterol e seus ésteres podem ser formados
variados. Na forma clássica, os vacúolos são grandes e nas artérias (aterosclerose), na pele (xantomas) e em sítios de
deslocam o núcleo para a periferia. Essa forma é muito inflamação crônica.
característica na esteatose hepática e os hepatócitos ficam A aterosclerose é a deposição de colesterol na camada íntima
semelhantes aos adipócitos. de artérias de grande calibre e estão presentes dentro de
Em certas ocasiões, os vacúolos podem se apresentar como macrófagos e de células musculares lisas que migraram da
pequenas vesículas, denominadas de microvesículas (esteatose camada média.
microvesicular), que se apresentam como pequenas gotículas
localizadas na periferia da célula. É importante frisar que na Aspectos macroscópicos: Macroscopicamente essas placas
esteatose microvesicular, os núcleos permanecem na mesma apresentam coloração amarelada e amolecida.
posição.
No coração, os triglicerídeos se localizam em pequenos Aspectos microscópicos: Microscopicamente podemos
glóbulos ao longo dos miofilamentos dos miocardiócitos. verificar células musculares lisas tumefeitas, microvacuoladas,
No rim, esses glóbulos podem coalescer e aumentar seu adquirindo aspecto espumoso. Quando as células espumosas
volume, no entanto não verificamos deformidades celulares se rompem, o colesterol passa para o interstício e forma cristais
comuns. romboides. Associa-se a esse processo: a proliferação de tecido
conjuntivo, secreção de proteoglicanas e calcificação.
Na camada íntima de pequenas artérias o processo é bem
diferente, já que os lipídeos oriundos do plasma se associam a
proteínas locais formando lipo-hialinose da íntima. Os
depósitos de lipo-hialinose se associam a outras alterações
(elastose e fibrose), assim sendo, o conjunto dessas lesões
recebe a denominação de arterioloesclerose.
Os xantomas são encontrados na pele sob a forma de nódulos
ou placas que, quando se apresentam na superfície, possuem
cor amarelada. Microscopicamente os xantomas são formados
por macrófagos carregados de colesterol, com aspecto
espumoso. Os xantomas aparecem geralmente em condições de
hipercolesterolemia.

53
As células necróticas apresentam os seguintes aspectos
microscópicos:
1. Eosinofilia: a perda da basofilia do citoplasma ocorre
devido à perda do RNA citoplasmático. Além da perda da
basofilia, a coloração por eosina é potencializada devido ao
aumento de sua ligação com as proteínas citoplasmáticas
desnaturadas.
2. Aparência vítrea: a célula necrótica se torna vítrea
devido à perda progressiva dos grânulos do glicogênio.
3. Aspecto corroído: depois que as enzimas digerem as
organelas citoplasmáticas, os citoplasmas apresentam grandes
vacúolos e começam a ter um aspecto corroído.
4. As células necróticas possuem alta capacidade de
Cristais de colesterol são observados na lâmina histológica de calcificação.
mucosa oral. 5. Tecidos necróticos podem ser saponificados: o
processo de saponificação ocorre devido a grande concentração
Glicogenoses: de fosfolipídios desprendidos na região de necrose. Essas
São doenças genéticas caracterizadas pelo acúmulo de massas de fosfolipídios são denominadas de figura de mielina,
glicogênio nas células do fígado, rins, músculos esqueléticos e
que são fagocitadas por células monocucleares dando origem
coração. A glicogenose é causada, principalmente, pela
deficiência de enzimas que atuam no processo de sua aos ácidos graxos que, em contato com o cálcio local, se
degradação do glicogênio. No entanto, o acúmulo de saponificam.
glicogênio também pode ocorrer por outros mecanismos, como
por exemplo, nos túbulos renais de um paciente com diabetes Na microscopia eletrônica, podemos verificar:
mellitus devido a grande reabsorção de glicose presente em 1. Descontinuidade evidente nas membranas plasmáticas
excesso no filtrado glomerular. e das organelas.
2. Dilatação acentuada das mitocôndrias.
3. Surgimento de densidades amorfas e deposição de
A lesão celular pode progredir para uma lesão irreversível mielina intracitoplasmática.
quando atinge componentes essenciais para a vitalidade
celular. São definidores de lesão irreversível: Ainda, os aspectos morfológicos da necrose incluem as
1. Edema mitocondrial. alterações nucleares, devido à fragmentação inespecífica do
2. Extensos danos à membrana plasmática. DNA. São elas:
3. Edema de lisossomos. 1. Picnose: ocorre devido à condensação do DNA em
4. Perda da integridade genética. uma massa basofílica e é caracterizada pelo encolhimento
nuclear e, consequente, basofilia.
A partir da ultrapassagem do ponto de não retorno, as lesões 2. Cariorrexe: O núcleo picnótico, ou parcialmente
celulares podem evoluir para necrose ou apoptose. Na maioria
picnótico, se fragmenta e se dispersa no citoplasma. Com o
dos tecidos os processos de necrose e apoptose coexistem.
passar do tempo, o núcleo desaparece por completo.
Necrose:
Os aspectos morfológicos da necrose ocorrem devido a uma 3. Cariólise: caracterizada pela diminuição da basofilia
ação progressiva das enzimas celulares após uma lesão letal. ocasionada pela fragmentação do DNA e por sua redução de
Eles são espectros de alterações morfológicas que ocorrem atividade.
após a morte celular em um tecido vivo.
A necrose se caracteriza como a incapacidade celular de Uma vez estudados os aspectos celulares, passamos para os
manter a integridade das membranas e, com isso, seu conteúdo aspectos morfológicos teciduais da necrose.
extravasa, causando inflamação no tecido adjacente. Basicamente, as principais formas de necrose são as necroses
A aparência morfológica da necrose resulta da desnaturação e por coagulação (onde o padrão principal é a desnaturação
destruição proteica, devido à digestão por enzimas celulares, proteica) e a necrose de liquefação (onde predomina a digestão
oriundas dos seus lisossomos (processo de autólise) ou dos enzimática). No entanto, algumas variantes desses dois tipos
neutrófilos em decorrência do processo inflamatório. principais podem ocorrer, sendo as principais: necrose
Os aspectos morfológicos da necrose são vistos gangrenosa, necrose caseosa e a necrose gordurosa.
progressivamente, ou seja, é necessário tempo para que o Passemos agora ao estudo mais detalhado de cada um dos tipos
processo ocorra e possa ser identificado. Em casos de infarto de necrose teciduais.
fulminante, por exemplo, nenhum processo necrótico pode ser
visualizado durante a necropsia. São necessárias de 4 à 12
horas para se avaliar alterações histológicas, e são necessárias
no mínimo duas horas para detectar enzimas na corrente
sanguínea (CKMB e troponina).

Morfologia geral das necroses:


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Necrose de coagulação ou isquêmica. Necrose liquefativa presente em corte histológico de dente
humano.
Necrose de coagulação ou necrose isquêmica: A necrose de
coagulação, geralmente, ocorre devido à acidose intracelular Necrose lítica: É a denominação que se dá a necrose de
ocasionada pela morte celular. Essa acidose desnatura as hepatócitos nas hepatites virais, os quais sofrem lise.
proteínas estruturais e as enzimas, bloqueando o processo de
proteólise. Necrose caseosa: A necrose caseosa também é uma forma
Portanto, o principal aspecto da necrose por coagulação é a distinta da necrose da coagulação, sendo muito presente em
manutenção do contorno celular básico (pelo menos por alguns patologias crônicas como a tuberculose e a sífilis.
dias) e a característica firme do tecido necrosado. As células A aparência macroscópica lembra um queijo branco. Essa
necrosadas apresentam citoplasma com aspecto de substância característica é responsável pela sua denominação, já que
coagulada (acidófilo e granuloso). Nas fases iniciais é possível caseum remete a queijo.
identificar os aspectos básicos da arquitetura do tecido Microscopicamente, ela é caracterizada como um foco
necrosado, mais tarde toda a arquitetura tecidual fica necrótico em uma massa homogênea, acidófila, contendo
comprometida. núcleos picnóticos e núcleos fragmentados (cariorrexe),
Aspecto macroscópico da necrose de coagulação: É principalmente na periferia. Esses focos necróticos com
caracterizada pela aparência esbranquiçada, com saliência na fragmentos granulares e amorfos, com a presença de células
superfície do órgão. Quase sempre é circundada por um halo fragmentadas, são cercados por uma reação granulomatosa e
avermelhado, ocasionado pela hiperemia nos tecidos sua arquitetura tecidual está completamente destruída,
adjacentes. diferente da necrose por coagulação. A necrose caseosa é
A maior parte das necroses ocasionadas pela hipóxia são muito comum na tuberculose e na paracoccidiodomicose. Essa
necroses de coagulação, exceto no cérebro. lesão parece decorrer de mecanismos imunitários de agressão
envolvendo macrófagos e células T sensibilizadas.
Necrose por liquefação: A necrose por liquefação ocorre
principalmente nos tecidos que sofreram invasão bacteriana e,
ocasionalmente, fúngica. Esse tipo de necrose ocorre, pois os
micro-organismos estimulam o acúmulo de células
inflamatórias no local da lesão. No entanto, não se sabe ao
certopor que esse tipo de necrose ocorre no cérebro.
O tecido necrótico por coagulação se torna viscoso e, se a
causa foi uma inflamação aguda, ele é caracterizado por um
aspecto amarelo cremoso, rico em neutrófilos e células
necróticas, sendo denominado pus.

Necrose caseosa. Presença de massas eosinofílicas no tecido


hepático, associadas a infiltrado inflamatório e presença de
células gigantes.

Necrose gomosa: É uma variedade de necrose por coagulação,


na qual o tecido necrosado assume aspecto compacto e elástico

55
como borracha (goma), ou fluido e viscoso. É observada na Gangrena seca: Resultante da desidratação provocada pela
sífilis tardia ou intermediária. exposição do tecido necrosado ao ar. Dá ao tecido necrosado
um aspecto de pergaminho, semelhante aos tecidos
Esteatonecrose/Necrose gordurosa: A necrose gordurosa mumificados.
também não identifica um padrão específico de necrose, Cor azul escura, azulada ou negra devido à impregnação por
sendo, na verdade, uma característica da liberação de enzimas pigmentos derivados da hemoglobina.
pancreáticas sobre a cavidade peritoneal, muito comum durante Muito comum em extremidade dos dedos, dos artelhos e da
a pancreatite aguda. ponta do nariz. Muito comum em pacientes com lesões
As enzimas pancreáticas escapam dos ductos pancreáticos e vasculares como as que ocorrem no diabete melito.
liquefazem as membranas dos adipócitos quebrando os
triglicerídeos, formando ácidos graxos. Os ácidos graxos em Gangrena úmida: Ocorre em decorrência da invasão dos
combinação com o Ca2+ local se saponificam. tecidos necrosados, principalmente, por micro-organismos
Microscopicamente, verificamos adipócitos necrosados, com anaeróbicos produtores de enzimas que liquefazem os tecidos
depósito basofílico de cálcio, cercado por uma reação necrosados. A absorção dos produtos tóxicos resultantes do
inflamatória. micro-organismo e do tecido liquefeito pode levar a reações
fatais, oriundas do choque séptico.
Evolução:
Células mortas ou autolisadas se comportam como corpo Gangrena gasosa: Secundária a contaminação com micro-
estranho no organismo, estimulando a resposta inflamatória, no organismos do gênero Clostridium que produzem enzimas
sentido de promover sua eliminação e posterior reparo. proteolíticas e lipolíticas e grandes quantidades de gás, sendo
Dependendo do tecido lesado, da forma de agressão e de sua evidentes na formação de bolhas gasosas.
extensão, os tecidos necróticos podem seguir vários caminhos,
dos quais podemos destacar: APOPTOSE
A apoptose é definida como uma morte celular programada,
Regeneração: Ocorre quando os tecidos atingidos possuem onde a célula progride para a morte celular, sem que seu
capacidade regenerativa. Os restos celulares são reabsorvidos e conteúdo seja disperso para o meio extracelular, não levando à
fatores de crescimento são liberados pelas células vizinhas e destruição tecidual de tecido vizinho e sem a promoção de
pelos leucócitos exsudados; promovendo a multiplicação de inflamação.
células parenquimatosas. A apoptose pode ocorrer por mecanismos patológicos e
fisiológicos como:
Cicatrização: É o processo no qual o tecido necrosado é
substituído por tecido cicatricial. Inicialmente, na área lesada Fisiológicos:
são liberados mediadores químicos que se difundem para o 1. Embriogênese;
tecido não lesado, iniciando as respostas vasculares e celulares 2. Indução hormônio dependente;
do processo de cicatrização. 3. Tolerância imunológica;
4. Morte das células inflamatórias residentes.
Encistamento: Acontece quando o material necrótico não é Um bom exemplo da apoptose fisiológica é a das glândulas
absorvido por ser muito volumoso, ou por causa de fatores que mamárias. As células dos ácinos mamários se proliferam
impedem a migração de leucócitos. Uma reação inflamatória mediante a estímulos hormonais que levam sua proliferação
com exsudação de fagócitos se desenvolve somente na celular e produção de leite materno. Cessado esse estímulo,
periferia da lesão. existe o desencadeamento de sinais que promovem a apoptose.
Isso provoca exsudação conjuntiva e formação de uma cápsula Os linfócitos também entram em apoptose, uma vez cessado o
que encista o tecido necrosado. estímulo inflamatório.
Gradualmente, o tecido necrosado vai sendo reabsorvido e
substituído por material progressivamente mais líquido. Patológicos:
1. Danos ao DNA;
Eliminação: Se a zona de necrose atinge a parede de uma 2. Acúmulos de proteínas deformadas;
estrutura canalicular que se comunica com o ambiente externo, 3. Infecções, sobretudo as causadas por micro-organismos
essa lesão é expelida através dessa estrutura, formando uma intracelulares;
cavidade. Esse tipo de evolução é muito comum nas lesões 4. Atrofia patológica.
pulmonares provocadas pela tuberculose, e dão origem as
cavernas tuberculosas. O estudo da apoptose é fundamental para a compreensão de
patologias como o câncer, pois as células neoplásicas possuem
Calcificação: Certos tipos de necrose tendem a se calcificarem, redução em sua capacidade de sofrer apoptose, assim como
como a necrose caseosa, principalmente na infância. Embora possuem proliferação descontrolada.
os níveis de cálcio se elevem muito nos tecidos mortos, pouco
se sabe sobre os mecanismos que regulam a calcificação nesses As causas mais comuns de apoptose são:
locais.  Infeções virais
 Hipóxia
Gangrena:
 Substâncias químicas
É uma forma de evolução que ocorre devido a estímulos
externos sobre o tecido necrosado.  Agressão imunitária e radiações.

56
Aspectos morfológicos: Via extrínseca (Mediadas por receptores de morte):
A apoptose não é de fácil reconhecimento morfológico, pois A via extrínseca é ativada quando os receptores de morte são
acometem as células de forma individual e não estimulam o estimulados. Essa estimulação acontece pela ligação com o
processo inflamatório. fator de necrose tumoral (TNF) ou com uma proteína chamada
Como aspectos morfológicos, podemos destacar: de fas, que culmina com a ativação de capases iniciadoras
1. Redução citoplasmática e aumento de sua densidade. (principalmente a caspase 8) e posteriormente com a ativação
2. Condensação da cromatina, tornando-se disposta em de caspases efetoras (caspase 3), como será discutido adiante.
grumos acoplados à carioteca. Também denominados de
Via intrínseca:
núcleos em meia lua, núcleo em ferradura ou núcleo em lança.
Pode ser ativada pela via extrínseca ou por fatores internos.
3. Fragmentação nuclear, denominada de cariorexe. Resulta do aumento da permeabilidade mitocondrial e
4. Corpos apoptóticos: projeções citoplasmáticas com liberação de moléculas pró-apoptóticas.
porções nucleares que são endocitados por células vizinhas. Os fatores de crescimento e outros sinais de sobrevivência
Algumas vezes a célula apoptótica sofre encolhimento e estimulam a produção de proteínas anti-apoptóticas BCl 2.
condensação do núcleo sem sofrer fragmentação (por exemplo, As proteínas anti-apoptóticas residem no citoplasma e nas
os queratinócitos em exposição solar). Os corpos apoptóticos membranas mitocondriais.
Quando ocorre um estímulo estressor, as proteínas anti-
exteriorizam fosfatidilserina na superfície de membrana, o que
apoptóticas são substituídas por proteínas pró-apoptóticas
facilita a fagocitose. (BAK, Bax ou BIM), o que promove a elevação da
Os corpos apoptóticos podem ser intensamente basófilos permeabilidade da membrana mitocondrial e consequente
quando apresentam fragmentos com muito material nuclear, ou extravasamento do citocromo C. No citoplasma, o citocromo C
podem ser muito eosinófilos quando têm pouco material se liga a Apaf-1, que atrai pró-caspase 9 que ativa caspase 3,
nuclear em seu interior. dando início a fase efetora.
Nas hepatites virais são vistos hepatócitos com citoplasma
Fase efetora:
condensado e acidófilo, conhecido como corpúsculo de
A fase efetora é ativada pelas caspases iniciadoras (caspases 8,
Councilman Rocha Lima. 9 e 10). As caspases efetoras são as caspases 3 e 6,
responsáveis por:
A microscopia eletrônica identifica melhor as células  Clivar citoesqueleto.
apoptóticas, mostrando a condensação da cromatina e do
 Clivar matriz nuclear.
citoplasma. As formações de brotamentos e fragmentação da
célula são bem documentadas ao microscópio eletrônico de  Clivar proteínas de transcrição.
varredura.  Clivar proteínas de replicação.
 Clivar proteínas de reparação do DNA.

Observação: A caspase 3 ativa a DNAase que induz a clivagem


internucleossomal, característica da apoptose.
Características bioquímicas da apoptose: As remoções das células mortas são realizadas graças a 3
principais mecanismos:
Degradação protéica: A hidrólise de proteínas envolve a 1. A célula agonizante secreta fatores solúveis que recrutam
ativação de membros de uma família de cisteíno-proteases células fagocitárias.
chamados de caspases.
2. As células agonizantes secretam marcadores de superfície.
As caspases destroem laminina, estruturas nucleares,
citoesqueleto, além de ativar DNAase e RNAase. 3. Os macrófagos secretam opsoninas que opsonizam os
corpos apoptóticos.
Decomposição do DNA: A decomposição do DNA ocorre
devido endonucleases dependentes de Ca2+ e de Mg2+. Na Exemplos de apoptose:
apoptose, verifica-se decomposição característica do DNA em Apoptose após privação de fatores de crescimento: ocorre em
grandes pedaços de 50 a 300 pares de base. Já na necrose não células sensíveis a hormônios de crescimento e em linfócitos
há qualquer padronização na decomposição do DNA. não estimulados por antígenos e citocinas.

Reconhecimento fagocitário: Apoptose mediada por dano de DNA: Esse tipo de apoptose é
Durante a apoptose existe a expressão de fosfatidilserina nas mediada pelo supressor de tumor p53. Quando o DNA está
membranas plasmáticas de células apoptóticas, o que facilita o danificado existe o acúmulo de p53 na célula interrompendo o
reconhecimento dos corpos apoptóticos pelo sistema ciclo celular. Após a interrupção do ciclo, o DNA pode ser
fagocitário. Em algumas células apoptóticas também existe a reparado ou a célula pode evoluir para a morte celular.
expressão de trombospondina. De maneira resumida, o P53 aumenta produção de fatores pró-
apoptóticos (Bax, BAK e Apaf-1), levando ativação de
Mecanismos de apoptose: caspases e morte por apoptose.
A apoptose ocorre em duas diferentes vias: a via extrínseca e a
via intrínseca, que podem se conectar em várias etapas. Apoptose induzida pela família de receptores do fator de
A via extrínseca é iniciada por receptores, a via intrínseca é necrose tumoral: TNF se liga ao seu receptor TNFR1 que
iniciada pela via mitocondrial e as duas vias ativam caspases. associa as proteínas de adaptação, tornando pró-caspase 8 em
caspase 8 que ativa a via efetora, culminando com a formação
de caspase 3.
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patológico
Apoptose mediada pelo linfócito T citotóxico: Além da via Fas-
Fas-ligante já discutida, o linfócito T citotóxico reconhece o Conteúdos Digestão Intactos
antígeno estranho presente na membrana celular do hospedeiro citoplasmáticos enzimática
e secreta perforina. A perforina leva a formação de um poro
transmembrânico que permite a entrada de Granzima B. A
granzima B, por sua vez, é responsável pela ativação de
Referências:
caspases efetoras.
1. BRASILEIRO FILHO, G. - Bogliolo Patologia.
Resumo das diferenças básicas entre necrose e apoptose: 9º.Ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2016.
2. ABBAS, A.K.; KUMAR, V.; FAUSTO N. Robbins
Característica Necrose Apoptose & Cotran – Patologia – Bases Patológicas das doenças.
Tamanho da célula Aumentado Diminuído 9º. Ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016.
(edema) (contração)
Núcleo Picnótico ou Fragmentado
ausente
Membrana Rompida Íntegra
plasmática
Inflamação Presente Ausente
adjacente
Papel no organismo Patológico Fisiológico e

58
NEOPLASIAS E CARCINOGÊNESE Um carcinoma com padrão de crescimento microscópico
glandular é chamado de adenocarcinoma.
Definições Um tumor que produz células escamosas identificáveis
Inicialmente, precisamos definir alguns termos comumente surgindo em qualquer epitélio do corpo é denominado de
utilizados como sinônimos, mas que verdadeiramente possuem carcinoma de células escamosas. Assim é comum que esses
definições distintas. termos venham acompanhados do órgão de origem, por
Neoplasia é definida como um crescimento anormal, não exemplo: carcinoma de células escamosas broncogênico. Não
coordenado, do tecido. Este crescimento persiste mesmo raramente, um câncer é formado por células, cujo tecido de
depois da remoção dos estímulos iniciadores. origem é desconhecido, e deve ser designado de tumor
O termo tumor foi inicialmente utilizado como sinônimo de indiferenciado.
edema, no entanto, o emprego não neoplásico desse termo saiu Uma diferenciação divergente de uma única linhagem de
de uso. célula parenquimatosa em outros tecidos dá origem aos
Oncologia (onco=tumor): Estudo dos tumores. chamados tumores mistos. Um exemplo disto é o tumor misto
Câncer: o termo câncer é um termo comum para todos os originário de glândula salivar, denominado de adenoma
tumores malignos. O termo câncer deriva do latim e significa pleomórfico, onde é verificada a existência de um componente
literalmente caranguejo, que presumivelmente remete à epitelial dentro de um estroma mixoide que às vezes contem
maneira obstinada na qual o tecido neoplásico se agarra ao ilhas de cartilagem e até mesmo tecido ósseo.
tecido saudável. A maioria dos tumores, mesmos os mistos, é formada por
células representativas de uma única camada germinativa, já os
Nomenclatura: teratomas são formados por uma variedade de tipos de células
Todos os tumores benignos e malignos apresentam dois parenquimatosas, que representam mais de uma camada
componentes básicos: As células neoplásicas em proliferação germinativa, esses surgem de células totipotentes e ocorrem
que constituem seu parênquima e o estroma de sustentação. principalmente nas gônadas. Estas células totipotentes se
Apesar das células parenquimatosas serem as responsáveis pela diferenciam ao longo de diversas linhagens celulares,
proliferação do tumor, é de fundamental importância um produzindo tecidos que podem ser identificados, como por
adequado aporte sanguíneo do estroma. Além disso, existe uma exemplo, pele, músculo, gordura, dentes – de fato, qualquer
relação entre as células tumorais e do estroma que parece estrutura do corpo.
influenciar diretamente o crescimento dos tumores. Em alguns É evidente que existem alguns termos inapropriados, porém
tumores, o estroma é escasso, e assim o tumor se torna macio e profundamente inseridos no uso comum. Durante gerações os
cavernoso. Às vezes, as células parenquimatosas estimulam a carcinomas dos melanócitos foram denominados de melanoma.
formação de um estroma colagenoso abundante, denominado Do mesmo modo, carcinomas de origem testicular continuam a
de desmoplasia. Embora o estroma seja fundamental para o ser chamados de seminoma, e os carcinomas hepatocelulares
tumor, e possua características variadas, a nomenclatura dos são frequentemente chamados de hepatoma.
tumores é baseada no componente parenquimatoso. O oposto também é verdadeiro, temos ameaçadores são
Tumores benignos: aplicados para lesões triviais. O resto ectópico de tecido
Células parenquimatosas mesenquimais: recebem a normal e às vezes chamado de coristoma, como por exemplo,
inclusão do sufixo “oma". um resto de células adrenais sobre a cápsula renal.
Ex: Fibroma, condroma, osteoma. Uma diferenciação aberrante pode produzir uma massa de
Em contraste, a nomenclatura dos tumores epiteliais células especializadas, desorganizadas, mas maduras, ou um
benignos é mais complexa. Eles são classificados de modo tecido ou julgar determinado de um lugar determinado,
diverso, alguns com base nas suas células de origem, na chamado de hamartomas. Apesar de ser possível considerar
arquitetura microscópica e outros em razão de seu padrão essas lesões como sendo neoplasma, a semelhança completa do
macroscópico: tecido com a cartilagem normal os vasos sanguíneos e a
Exemplos: mistura ocasional de outros elementos refletem um
Adenoma: neoplasma benigno que forma padrões desenvolvimento anômalo.
glandulares, ou ainda tumores derivados de glândulas. A nomenclatura dos tumores é importante porque
Papilomas: Neoplasmas epiteliais benignos produzindo designações específicas apresentam implicações clínicas
projeções digitiformes ou projeções verrucosas visíveis micro específicas mesmo entre um mesmo tecido.
ou macroscopicamente.
Cistoadenomas: São lesões que formam grandes massas Biologia dos tumores: Neoplasmas benignos e malignos
císticas, como aquelas encontradas no ovário. A diferença entre tumores benignos e malignos tem por
Cistoadenomas papilares: Quando um tumor benigno ou base sua morfologia e sua evolução clínica, por meio de 4
maligno produz uma projeção macroscopicamente visível, critérios:
acima de uma superfície mucosa. 1. Alteração maligna (diferenciação e anaplasia)
Pólipo: neoplasma benigno que produz projeções visíveis 2. Taxa de crescimento
acima da superfície da mucosa. 3. Invasão local
4. Metastase.
Tumores malignos:
Os tumores que surgem no tecido mesenquimal são Diferenciação e anaplasia
chamados de sarcomas (SAR= Carnosos), pois apresentam A diferenciação se refere à extensão com que as células
pouco estroma conjuntivo. neoplásicas lembram células normais, comparáveis tanto
Os tumores malignos que se originam a partir do tecido morfologicamente como funcionalmente. A falta de
epitelial, derivados de qualquer uma das três camadas diferenciação é denominada de anaplasia.
germinativas, são denominados de carcinomas.
59
Os tumores pouco diferenciados apresentam células com O crescimento de um tumor é determinado por três fatores
aspecto primitivo. Em geral, os tumores benignos são bem importantes: o tempo de duplicação das células tumorais, a
diferenciados. A célula neoplásica de um tumor de músculo fração das células tumorais que se encontram em divisão
liso benigno, o leiomioma, lembra tão intimamente a célula celular e a taxa com que as células são eliminadas e perdidas
normal que pode impossível distingui-las células tumorais, ao na lesão crescente.
exame microscópico. Como o controle do ciclo celular está alterado as células
Neoplasias malignas em comparação apresentam-se desde tumorais são levadas para o ciclo mais prontamente e sem as
bem diferenciadas até indiferenciadas. Os neoplasmas restrições usuais. No entanto, as células em divisão não
malignos compostos de células indiferenciadas são chamadas completam necessariamente o ciclo celular mais rapidamente
de anaplásicos. Anaplasia significa literalmente “ir para do que as células normais, na verdade, o tempo total de ciclo
trás” implicando uma reversão de um alto nível de celular para muitos tumores é igual ao das células
diferenciação para um de menor. No entanto, existem correspondentes. A produção de células dentro da população
evidências substanciais de que a maioria dos tumores não celular que se encontra em divisão é chamada de fração de
representa uma diferenciação reversa de células maduras crescimento.
normais, mas de fato, surgem a partir de células- Durante a fase inicial do tumor a grande maioria das células
tronco presentes em todos os tecidos especializados. transformadas se encontra em divisão celular contínua. Com o
O câncer bem diferenciado evolui a partir da maturação ou crescimento celular, as células saem do ciclo em números cada
especialização de células indiferenciadas à medida que vez maiores, devido descamação, falta de nutrientes ou
proliferam, Ao passo que, o tumor maligno indiferenciado apoptose . A maioria das células no interior do tumor
deriva da proliferação sem maturação completa das células permanece em G0 e G1. Assim, com o tempo, quando um
transformadas. A falta de diferenciação ou anaplasia é marcada tumor já é clinicamente detectável a maioria das células não se
por um número de alterações morfológicas. encontra em divisão celular. Mesmo nos tumores muito
Pleomorfismo: Tanto as células como seus núcleos proliferativos a taxa de crescimento não é maior do que 20%.
apresentam uma variação de tamanho e forma. Podemos A fração de crescimento das células do tumor tem um
encontrar células vizinhas com tamanho muito superior e efeito na susceptibilidade da quimioterapia. A maioria dos
outras extremamente pequenas de aspecto primitivo. agentes antineoplásicos atua sobre células no ciclo replicativo,
Morfologia nuclear anormal: Os núcleos contêm DNA em portanto, não é difícil imaginar que um tumor contendo 5% de
abundância e apresentam uma coloração extremamente todas as células em divisão celular vai ser um tumor de
escura, hipercromática. Os núcleos são desproporcionalmente crescimento lento e relativamente refratário ao tratamento
grandes para células e existe um aumento na relação quimioterápico.
núcleo/citoplasma. Normalmente, nos núcleos encontramos Uma estratégia empregada no tratamento de tumores com
nucléolos grandes. fração de crescimento lento é levar todas as células de G0 para
Mitose: Os tumores indiferenciados, em geral, apresentam o ciclo celular, isso pode ser obtido pela redução do volume do
grande número de mitose. Contudo, a presença de mitose não tumor com cirurgia ou radioterapia. Os tumores agressivos
indica que o tumor é maligno ou neoplásico. Muitos tecidos como os linfomas são mais suscetíveis à quimioterapia.
normais como a medula óssea, apresentam várias figuras de Em geral, as taxas de crescimento de tumor se
mitose, assim como a de hiperplasias. As características correlacionam com seu nível de diferenciação. Assim, a
morfológicas mais importantes de neoplasias malignas são maioria dos tumores malignos cresce mais rapidamente do que
mitoses atípicas bizarras produzindo às vezes, fusos tripolares, as lesões benignas. Existem, no entanto, diversas exceções:
quadriculares o multipolares. 1. A taxa de crescimento das neoplasias benignas e malignas
Perda de polaridade: A orientação das células anaplásicas pode não ser constante ao longo do tempo. 2. Fatores como
está acentuadamente alterada. Camada ou grandes massas de estímulo hormonal e suporte sanguíneo podem influenciar a
células tumorais crescem de maneira anárquica e taxa de crescimento. Por exemplo, o crescimento de
desorganizada. leiomiomas pode mudar com o tempo devido a variações
Outras alterações: Pode se verificar a presença de células hormonais. Depois da menopausa alguns neoplasmas podem
gigantes, algumas possuindo núcleo polimórfico único atrofiar e podem ser substituídos por tecido colagenoso muitas
enorme, outras possuem dois ou mais núcleos. vezes calcificados. Durante a gestação, leiomiomas
Essas células não devem ser confundidas com células frequentemente apresentam picos de crescimento. Tais
gigantes de corpo estranho ou células de Langhans. Nas células mudanças refletem a resposta das células tumorais aos níveis
gigantes cancerosas, os núcleos são hipercromáticos e grandes de esteroides circulantes, principalmente o estrógeno. 3.
em relação à célula. Um sub-clone agressivo pode aumentar subitamente a taxa de
Tumores anaplásicos podem apresentar grandes áreas de crescimento do tumor.
necrose isquêmica. Células-tronco cancerosas linhagens de células cancerosas
Os tumores malignos diferem muito na extensão em que Um tumor clinicamente detectável contém uma população
seu aspecto morfológico se desvia normal. De um lado estão os heterogênea de células que se originam do crescimento clonal
tumores extremamente indiferenciadas e anaplásico, de outro da progênie de uma única célula isolada. Recentemente, as
estão os tumores com grande semelhança com os tecidos de células tronco tumorais foram identificadas nos tumores de
origem normal. Alguns adenocarcinoma bem diferenciado da mama e leucemia mieloide aguda. Ainda não se sabe se tais
tireóide podem formar folículos de aspecto normal. Assim o células-tronco tumorais existem em todos os tumores.
diagnóstico morfológico de malignidade nos tumores bem
diferenciados pode ser difícil. Invasão local: Quase todos os tumores benignos crescem
como massas coesas e expansivas, que permanecem
Taxa de crescimento. localizados em seu sítio de origem e não tem capacidade de

60
infiltrar, invadir ou metastatizar para locais distantes como os carcinomas que surgem nos ovários; quando não raros, toda a
tumores malignos. cavidade peritoneal se torna revestida por uma camada pesada
Considerando que crescem lentamente essa massa, em de tumor. É importante ressaltar que as células do tumor são
geral, desenvolvem uma borda de tecido conjuntivo denso, capazes de permanecer restritas a superfície das vísceras
denominada de cápsula fibrosa que separa o tecido normal do abdominais sem penetrá-las.
hospedeiro. Tal encapsulamento não impede o crescimento do Disseminação linfática: O transporte através dos vasos
tumor, mas mantém o neoplasma como uma massa circunscrita linfáticos é uma via comum para a disseminação dos
facilmente palpável e removível cirurgicamente. carcinomas e sarcomas. Os tumores não contêm vasos
Apesar de existir um plano de clivagem bem definido na linfáticos, no entanto, os vasos linfáticos localizados na
maioria dos tumores benignos, em alguns casos, isso pode não margem tumoral são suficientes para sua disseminação.
ocorrer. Os hemangiomas, por exemplo, podem parecer A ênfase na disseminação linfática dos carcinomas e a
permear o local em que surgem. O crescimento do tumor é disseminação hematogênica dos sarcomas é equívoca, porque
acompanhado por uma infiltração, invasão, e destruição existem conexões entre os sistemas vasculares e linfáticos. O
progressiva do tecido adjacente. Em geral, os tumores padrão de comprometimento dos linfonodos segue a via natural
malignos são mal demarcados a partir do tecido normal e não de drenagem linfática. Por exemplo, os carcinomas de mama
apresentam um plano de clivagem bem definido. Tumores que surgem nos quadrantes superiores em geral se disseminam
malignos de crescimento lento podem desenvolver uma para os linfonodos axilares, os tumores do quadrante interno se
cápsula fibrosa aparentemente abrangente. Essa cápsula disseminam para linfonodos dentro do tórax. Em geral, a
pode se apoiar ao longo de uma ampla faixa frente as estruturas disseminação linfática dos tumores de mama é avaliada com a
adjacentes normais. O exame histológico de tais realização de uma dissecção axilar completa. Como este
massas aparentemente encapsuladas quase sempre mostra procedimento está associado a uma considerável morbidade
fileiras de células que penetram na margem infiltrando as cirúrgica, frequentemente, é realizada a biópsia do linfonodo
estruturas adjacentes. sentinela. Define-se como linfonodo sentinela aquele que
A maioria dos tumores malignos é recebe o fluxo de linfa do tumor primário. O mapeamento
obviamente invasiva. Tal capacidade de invasão torna difícil desse linfonodo pode ser por injeção de contrastes
sua capacidade de ressecção cirúrgica. Mesmo se o tumor radiomarcados ou corantes. Em muitos casos, o linfonodo
parece estar bem circunscrito, é necessário remover uma regional serve como uma barreira efetiva contra o tumor, ao
margem considerável de tecido normal adjacente. menos por um tempo. É concebível que as células depois de
Juntamente com o desenvolvimento de metástases, a pararem dentro do linfonodo podem ser destruídas como uma
invasividade é a característica mais segura que distingue os resposta imune específica. A drenagem dos detritos de células
tumores malignos dos benignos. tumorais ou antígenos tumorais pode levar a alterações reativas
Observa-se que os tumores podem evoluir para um estágio dentro dos linfonodos. Consequentemente, o aumento
pré invasivo chamado de carcinoma in situ. Isso ocorre nos nodal em proximidades com câncer não significa,
tumores de mama, pele e de cérvice uterina. Tumores epiteliais obrigatoriamente, uma disseminação da lesão primária.
in situ mostram as características citológicas de Disseminação hematogênica: é a mais típica dos
malignidade sem invasão da membrana basal, com o tempo, a sarcomas, mas também vista em carcinomas. Artérias, com
maioria penetra na membrana basal e invade um estroma suas paredes mais espessas, são mais difíceis de serem
subepitelial. penetradas do que as veias. A disseminação arterial se dá,
sobretudo, quando as células tumorais atravessam os leitos
Metástase: Metástase são implantes tumorais separados do capilares pulmonares e shunts arterio-venosos pulmonares ou
tumor primário. A metástase caracteriza de modo inequívoco o quando as metástases pulmonares dão a elas as mesmas origens
tumor como sendo maligno. Com poucas exceções, todos os a êmbolos tumorais. Com a invasão venosa, as células
cânceres podem sofrer metástase. As principais exceções são produzidas pelo sangue seguem o fluxo venoso de drenagem
as neoplasias malignas das células da glia no sistema nervoso do local do neoplasma, e portanto, é compreensível que o
central, chamadas de gliomas e os carcinomas basocelulares da fígado e o pulmão estejam com frequência envolvidos na
pele. disseminação hematogênica. Toda área de drenagem porta flui
É evidente que as propriedades de invasão e metástase são para o fígado e todo sangue da cava flui para o pulmão.
separáveis. No nível molecular, no entanto, invasão e
metástase representam um contínuo de mudanças.
Em geral, quanto mais agressivo o crescimento, mais CARCINOGÊNESE
rápido é o tumor primário, com isso, maior é a Por que determinadas pessoas desenvolvem câncer e outras
probabilidade de metástase. Entretanto, não? Essa pergunta pode ser bem simplista, entretanto, sua
existem inúmeras exceções, não sendo possível estabelecer o resposta, ou pelo menos a tentativa de um esclarecimento
julgamento sobre a probabilidade de metástase a partir do maior acerca desse assunto, envolve complexas questões. Nos
exame patológico do tumor primário. A disseminação últimos anos, houve importantes avanços no conhecimento das
metastática reduz fortemente a possibilidade de cura. neoplasias, determinando-se que a chave para compreender a
A disseminação metastática pode ocorrer através de três carcinogênese está na constatação de que componentes
vias: ambientais (como vírus, certos agentes físicos e químicos)
Implante das cavidades e superfícies corporais: Esse assim como fatores genéticos possuem papeis decisivos no
tipo de disseminação pode ocorrer sempre que a neoplasia aparecimento de vários tumores humanos e de outros animais.
maligna penetrar um campo aberto natural. Na maioria das Os tumores são resultantes de agressões ambientais em
vezes ocorre na cavidade peritoneal, mas qualquer outra indivíduos geneticamente suscetíveis.
cavidade pleural, pericárdica, subaracnoide e espaço articular A base molecular do câncer envolve alguns princípios
podem ser afetados. Tal implante é característico de fundamentais que são destacados abaixo:

61
1. A lesão genética não letal é fundamental para o As principais estratégias usadas pelas células tumorais para
aparecimento do câncer. adquirir autossuficiência podem ser agrupadas com base no seu
Essas mutações podem ser adquiridas por ações ambientais, papel nas cascatas mediadas pela transdução do sinal do fator
agentes químicos, radiações, vírus ou herdada na linhagem de crescimento.
germinativa. No entanto, nem todas as mutações são
ambientalmente induzidas e algumas podem ser espontâneas. Proto-oncogeneses, oncogenes e oncoproteínas:
2. Um tumor é formado pela expansão clonal de uma Os genes que promovem o crescimento celular autônomo
célula precursora que sofreu lesão genética. são chamados de oncogenes, e seus equivalentes celulares
3. Quatro principais classes de genes reguladores são normais são denominados proto-oncogenes. As oncoproteínas
alvos da lesão genética: lembram os produtos normais dos proto-oncogenes, no entanto,
 Protooncogêne: genes promotores do não apresentam importantes elementos reguladores.
crescimento.
 Genes inibidores do crescimento / Diversas células neoplásicas desenvolvem autossuficiência
supressores de tumor. de crescimento adquirindo a capacidade de sintetizar os
 Genes que regulam a apoptose mesmos fatores de crescimento que respondem. Outra possível
 Genes envolvidos no reparo do DNA. via é ativação de receptores sem que esses sejam efetivamente
estimulados por fatores de crescimento.
Sete alterações fisiológicas são fundamentais para que a
neoplasia apresente um fenótipo maligno. Insensibilidade aos sinais inibidores de crescimento: Genes
1. Autossuficiência nos sinais de crescimento: Os supressores de tumor
tumores apresentam a capacidade de proliferação sem A falta de inibição do crescimento é uma das alterações
estímulos externos, em geral, como consequência da ativação fundamentais na carcinogênese.
de oncogenes. O p53 é um exemplo clássico da insensibilidade aos sinais
2. Insensibilidade aos sinais inibidores do crescimento: inibidores de crescimento. O p53 age como um policial
Os tumores podem não responder às moléculas inibidoras da molecular que impede a propagação de células geneticamente
proliferação de células normais. lesadas. Ele está envolvido na parada do ciclo celular e início
3. Evasão da apoptose: os tumores podem ser da apoptose em resposta a lesão do DNA.
resistentesà apoptose, como consequência da inativação do p53 O gene p53 é o principal alvo para as alterações genéticas
ou de outras alterações. nos tumores e suas mutações ocorrem em 50% dos tumores
4. Defeitos no reparo do DNA: Tumores deixam de humanos. Com menor frequência, alguns indivíduos podem
reparar a lesão no DNA. herdar um alelo p53 mutante o que aumenta as chances de
5. Potencial infinito de replicação: Associado à câncer.
manutenção do comprimento e da função do telômero.
6. Angiogênese mantida: Os tumores são capazes de Mecanismo da mutação do P53:
induzir a angiogênese, principalmente pela produção de VEGF. O P53 mutado, compete com o p53 normal, impedindo sua
7. Capacidade de invadir ou metastatizar. Dependem de atividade.
processos intrínsecos à célula ou são iniciados por sinais do Vírus como o HPV pode promover a degradação do P53.
ambiente tissular. Aumento da expressão de MDM2 que é uma proteína que
causa degradação do P53.
De maneira geral, podemos esquematizar a formação de um
neoplasma maligno e sua metástase da seguinte forma: Das três causas, pode ocorrer o seguinte:
Inicialmente uma célula normal sofre lesões ambientais, Radiação ionizante  lesa o DNA  O P53 não para o
tais como química, por radiação ou por vírus, levando à lesão ciclo celular  não há reparação do DNA  formação de
do DNA. Nesse processo, a célula repara o DNA, no entanto, células mutantes  mutações adicionais  tumor maligno.
caso esse mecanismo seja ineficiente, a mutação não letal se
perpetua. Grande atenção deve se dar as mutações que ocorrem Canceres com mutações do P53 são + resistentes a
em genes de recuperação do DNA ou em genes que afetam o quimioterapia e radioterapia.
crescimento ou a apoptose celular. Caso essas mutações
ocorram em oncogenes promotores de crescimento ou na Via APC/beta catenina:
inativação de genes supressores de tumores, ocorrerá uma A APC é responsável pela destruição da beta catenina.
proliferação celular desregulada. E caso essas mutações Se existe um excesso de beta catenina na célula, ela se
ocorram em genes que regulam a apoptose, ocorrerá transloca para o núcleo e forma um complexo com TCF (um
diminuição desse processo. Tanto o crescimento desregulado fator de transcrição) que aumenta a regulação de proteínas
quanto a diminuição da apoptose levarão à expansão clonal da oriundas de genes que estimulam o ciclo celular.
célula mutante, que ao sofrer mutações adicionais poderá Outra via é a modificação da beta-catenina que passa a não
expressar fatores angiogênicos e mecanismos de escape imune, ser inativada pela APC.
levando a progressão do tumor.
Evasão da apoptose
A seguir, descreveremos de maneira mais abrangentes os São mutações em genes que regulam a apoptose; por
sete principais mecanismos que levam ao surgimento do exemplo:
câncer.
Superexpressão de BCL-2
Autossuficiência nos sinais de crescimento As células com BCL-2 aumentado têm sobrevida
aumentada devido a proteção da apoptose provocada pela

62
BCL-2. É muito característico de linfomas de crescimento Os tumores não podem aumentar seu diâmetro além de 1 a
lento. 2 mm, a menos que sejam vascularizados.
A neovascularização tem efeito duplo sobre o crescimento
P53. tumoral: a perfusão fornece nutriente e O2 e estimula o
A P53 também aumenta a transcrição de genes pró- crescimento tumoral adjacente por meio da secreção de fatores
apoptótico como o Bax; portanto a falta de P53 diminui Bax de crescimento tais como o PDGF.
que aumenta a sobrevida. Outro fator importante é que sem a vascularização, as
células tumorais não poderiam se metastatizar.
A angiogênese pode ocorrer devido mobilização de
Defeitos no reparo do DNA e instabilidade genômica nas precursores das células endoteliais e pelo desenvolvimento de
células tumorais. capilares já existentes.
Células normais reparam o DNA com eficiência, no Os vasos sanguíneos tumorais não são iguais aos normais.
entanto, pessoas nascidas com mutações hereditárias das Em geral, eles são: mais tortuosos; mais irregulares; não se
proteínas de reparo correm maiores riscos de desenvolverem diferenciam em arteríolas capilares e vênulas e são mais
neoplasias, o que se define como síndrome da instabilidade permeáveis. A permeabilidade é atribuída principalmente a
genômica. produção aumentada de VEGF.
A instabilidade ocorre quando ambas as cópias destes genes Incialmente, o tumor não é angiogênico, no entanto,
se perdem. mutações adicionais em algumas células parecem mudar seu
Exemplos: fator angiogênico. Dois fatores estão mais envolvidos com a
1. Síndrome do câncer sem polipose hereditário. angiogênese dos tumores, são eles: o VEGF e o FGF.
Mutações em gene de reparo que levam a pareamento Além dos fatores angiogênicos serem produzidos pelas
errôneo de G com T ao invés de A com T. células tumorais eles também podem ser produzidos por
células inflamatórias residentes.
2. Xeroderma pigmentoso: Um fator muito interessante está entre a ligação do VEGF
Portadores de xeroderma pigmentoso têm maiores chances com a P53.
de desenvolverem tumores de pele devido a sua incapacidade O p53 regula a produção de VEGF, e quando a P53 está
de reparar o DNA exposto à radiação ultravioleta (UV). inativada os níveis de VEGF aumentam.
A radiação UV causa uma ligação cruzada dos resíduos de
pirimidina, impedido a replicação do DNA. Tal lesão é Invasão e metástase
corrigida pela via de reparo pela excisão de nucleotídeos. Está enormemente relacionada a mortalidade.
Diversas proteínas e genes estão envolvidos no reparo pela Apesar de milhões de células serem liberadas na circulação
excisão de nucleotídeos, e a perda hereditária de qualquer uma a cada dia, poucas tem perfil metastático.
pode dar origem ao desenvolvimento de carcinomas. Algumas células possuem aporte genético para efetivar a
metástase, que são:
3. Genes BRCA-1 e BRCA2:  Capacidade para romper a membrana basal.
O BRCA-1 e BRCA2 apresentam relação com os  Capacidade de atravessar o interstício
componentes envolvidos com a verificação da fase G1/S que  Capacidade para acessar a circulação.
atrasa o ciclo celular e permite reparo de lesão do DNA. Para isso as células neoplásicas têm que possuir capacidade
A mutação desses genes está associada a tumores de mama de se desligarem das células adjacentes, capacidade para se
dentre outros. ligarem em componentes da matriz, capacidade de degradar a
Muitas mulheres que herdam a mutação em um alelo do matriz extracelular, dentre outras capacidades.
BRCA 1 ou 2 são mais susceptíveis ao desenvolvimento de
câncer de mama. E-caderinas: Em diversos tumores epiteliais existe uma
diminuição na expressão de E-caderinas, que são importantes
Potencial de replicação ilimitado: telomerase para mediar adesões homotípicase por manterem as células
Após um número fixo de divisões, as células normais epiteliais unidas.
sofrem uma parada num estado não proliferativo terminal Outro fator é a diminuição da expressão da catenina: As
chamado de senescência replicativa, devido ao encurtamento cateninas ligam as E-caderinas ao citoesqueleto, portanto, sua
sistemático dos seus telômeros. baixa expressão facilita o desprendimento celular.
Depois que os telômeros estão encurtados até certo ponto,
ocorre a perda de função deste telômero, que ativa a Algumas células tumorais expressam receptores para
verificação do ciclo celular dependente da P53, causando laminina e fibronectina que não existem nas células normais.
parada da replicação e apoptose. Depois dessa ligação as células do tumor devem criar
Em algumas células germinativas, esse encurtamento é passagens para a migração. E para isso as células do tumor
impedido pela função mantida da enzima telomerase. No secretam enzimas proteolíticas ou induzem as células
entanto, a telomerase não está presente nas células somáticas. hospedeiras a elaborarem proteases tais como as: serinas;
Um dos mecanismos potenciais de replicação ilimitada que cisteína e metaloproteínases (MMPs).
ocorre nas neoplasias é a reativação da telomerase, que Os produtos da degradação da matriz apresentam atividades
propicia inúmeras replicações e consequentes maiores chances promotoras de crescimento, angiogênicas e quimiotáticas.
de mutações. Uma vez na circulação, as células do tumor são vulneráveis
A atividade da telomerase é encontrada em 90% dos a destruição por células da imunidade inata. Para evitar esse
tumores humanos. processo, as células se agregam em grupos através da adesão
homotípica e se aderem a plaquetas.
Desenvolvimento da angiogênese mantida

63
A formação do agregado plaqueta-tumor pode reforçar a aerodigestivo superior. O risco de câncer cervical uterino está
sobrevida celular. relacionado com a idade na primeira relação sexual e com o
Formação de verdadeiros êmbolos tumorais que ao número de parceiros sexuais.
viajarem pelo sistema circulatório podem se aderir ao
endotélio, destruindo sua membrana basal Idade
As células neoplásicas possuem afinidade pelos linfócitos A idade tem uma influência importante na probabilidade de
TCD4 e as utilizam para migrar pelos tecidos linfoides. ser acometido por um câncer. O câncer é a principal causa de
No local, as células tumorais precisam se proliferar, morte entre as mulheres de 40 a 69 anos e entre os homens de
desenvolver aporte vascular e escapar das células de defesa do 60 a 79 anos. Cada faixa etária tem uma predileção para certas
hospedeiro. formas de câncer. Também devemos observar que as crianças
Cabe aqui uma questão: Por que alguns tumores se com menos de 15 anos não são poupados, o câncer
disseminam para regiões que não pertencem às vias de corresponde a pouco mais de 10% de todas as mortes neste
drenagem natural? grupo de idade vindo em segundo lugar apenas por morte por
Isso pode ser respondido pelos motivos abaixo: acidentes.
1. Células endoteliais de diversos tumores se diferem
na expressão de ligantes para as moléculas de adesão. Predisposição genética do Câncer
2. Algumas células tumorais expressam receptores de Um grande número de tipos de câncer, inclusive os mais
quimiocinas e essas células vão para os tecidos que comuns, possuem predisposição genética, hereditária e não
expressam essas quimiocinas. apenas influências ambientais. A predisposição genética do
3. Alguns tecidos podem apresentar solo desfavorável câncer pode ser dividida em três categorias:
para o aparecimento do tumor; como por exemplo, os
músculos esqueléticos. Síndrome autossômica dominante do câncer hereditário:
A síndrome hereditária do câncer inclui diversos tumores
Epidemiologia bem definidos em que a herança de um único gene aumenta
As principais observações relativas à causa do câncer enormemente o risco do desenvolvimento de um tumor. Esta
podem ser obtidas pelo estudo epidemiológico que relacionam mutação hereditária em geral decorre em um único alelo de um
um ambiente particular, a hereditariedade e influências gene supressor de tumor mutado. O defeito no segundo alelo
culturais como ocorrência de neoplasias malignas. Os tumores ocorre nas células somáticas, geralmente como consequência
mais comuns nos homens são os cânceres de próstata, pulmão, de deleção de cromossomos ou de recombinação. O
do cólon e do reto. Nas mulheres o câncer de mama, pulmão e retinoblastoma da infância é o exemplo mais impressionante.
câncer de cólon e reto. As taxas de óbito ajustadas pela idade Os portadores de um gene RB supressor de tumor mutante
para diversas formas de câncer mudaram significativamente apresentam um risco dez mil vezes maior de desenvolver um
durante os anos. Nos últimos 50 anos, a taxa global de morte retinoblastoma. A polipose familial adenomatosa é outro
ajustada por idade aumentou significativamente nos homens e distúrbio hereditário marcado por um risco extraordinariamente
caiu ligeiramente nas mulheres. O aumento nos homens pode elevado. Os indivíduos que herdam as mutações autossômicas
ser amplamente atribuído ao câncer de pulmão. A melhora nas dominantes do gene supressor de tumor da polipose
mulheres é atribuída principalmente a uma diminuição adenomatosa coli (APC) apresentam ao nascer ou logo após
significativa nas taxas de morte por câncer de útero, estômago, inúmeros adenomas polipoides do cólon e quase 100% dos
fígado e principalmente do carcinoma cervical uma das casos estão fadados a desenvolver um carcinoma de cólon por
neoplasias mais comum nas mulheres. No entanto, câncer de volta dos 50 anos.
pulmão é alarmante em ambos os sexos. Nas mulheres, o
carcinoma de mama ocorre com duas vezes mais frequência do Síndrome do reparo defeituoso do DNA
que o câncer de pulmão, no entanto, o câncer de pulmão se Essas condições em geral apresentam um padrão
tornou a causa mais frequente de morte por câncer nas autossômico recessivo de herança. Incluído nesse grupo
mulheres. Queda do número de mortes por câncer de útero encontra-se o xeroderma pigmentoso, a ataxia-telangiectasia e
inclusive da cérvice provavelmente se relaciona ao diagnóstico a síndrome de Bloom, todas as doenças raras são caracterizadas
precoce e aumento ao diagnóstico pelo esfregaço do por instabilidade genética resultante de defeitos dos genes de
Papanicolau. A tendência para baixo nas mortes de câncer de reparo do DNA.
estômago foi atribuída à diminuição de alguns carcinogênicos
ambientais como consequência da mudança dos hábitos Cânceres familiares
alimentares. Além das síndromes hereditárias da susceptibilidade do
câncer, um câncer pode ocorrer com maior frequência em
Fatores geográficos e ambientais algumas famílias sem um padrão de transmissão bem definido.
Podemos encontrar diferenças notáveis na incidência e nas São exemplos os carcinomas do cólon, mama, ovário e cérebro.
taxas de morte por formas específicas de Câncer em todo o Os aspectos que caracterizam os tumores familiares incluem
mundo. Por exemplo, a taxa de morte por carcinoma de pouca idade na instalação, tumores que ocorrem em dois ou
estômago tanto nos homens como nas mulheres é 78 vezes mais parentes próximos do caso, e às vezes tumores múltiplos
superior no Japão do que nos Estados graças aos seus hábitos e bilaterais. É provável que a susceptibilidade ao câncer possa
alimentares. Mortes por câncer de pele principalmente pelos depender de alelos múltiplos de baixa penetrância, cada um
melanomas são seis vezes mais frequentes em países com alta contribuindo apenas com um pequeno aumento no risco do
incidência solar do que naqueles com baixa exposição ao sol. desenvolvimento do tumor.
O fumo de cigarro foi considerado um fator ambiental isolado
mais importante na contribuição para a morte prematura. O Interações entre fatores genéticos e não genéticos:
álcool e o tabaco juntos multiplicam o risco de câncer no trato

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Mesmo nos tumores com componentes hereditários bem DNA do HPV 16 e 18, e com menor frequência 31, 33, 35 e 51
definidos, o risco de desenvolvimento do tumor pode ser muito são encontradas em aproximadamente 85% dos carcinomas
influenciado por fatores não genéticos. Como exemplo, invasivos de células escamosas e seus precursores.
podemos destacar que o risco de câncer de mama nas mulheres Os potenciais oncogênicos do HPV16 e 18 podem ser
portadoras de mutações Brca1 e Brca2 é quase três vezes relacionados com dois produtos genéticos virais iniciais que
superior para as mulheres nascidas depois de 1940, em agem em conjunto para causar danos à célula: as proteínas E6 e
comparação com os riscos para as mulheres nascidas antes E7. A proteína E6 se liga ao gene p53 e E7 se liga ao gene RB,
desse ano. p21 e também ao p53. Assim, a E6 e E7 bloqueiam as vias de
supressão do ciclo celular da p53 e da RB. Assim, as proteínas
Condições predisponentes não hereditárias E6 e E7 do HPV incapacitam dois genes supressores de tumor
Há fatores ambientais que favorecem a mutação genética. importantes que regulam o ciclo celular.
Há ainda, fatores congênitos que também favorecem o O HPV apresenta afinidade pelo epitélio escamoso cervical,
processo de formação tumoral. A única maneira segura de podendo provocar proliferações hiperplásicas. Os subtipos que
evitar um câncer é não nascer, viver é correr este risco. Como a apresentam tropismo pelo epitélio escamoso cervical podem
replicação celular está envolvida na transformação neoplásica, causar lesões pré-neoplásicas intra-epiteliais do colo uterino ou
as proliferações regenerativas, hiperplásicas e displásicas mesmo carcinomas invasores de células escamosas. Contudo,
consistem num solo fértil para a origem de um tumor maligno. alguns subtipos de HPV podem causar doenças mais simples,
As principais condições que podem predispor a formação de como: verrugas vulgares, papilomas e condilomas.
neoplasias, sem que haja um componente genético, são:
• Vírus da hepatite B (HBV): a infecção pelo HBV e a
• Inflamação crônica: em 1863, Virchow propôs que o ocorrência do câncer de fígado estão diretamente associadas.
câncer se desenvolve em locais de inflamação crônica, e a Contudo, fatores ambientais favorecem esta associação. Países
relação entre o câncer e a inflamação crônica foi estudada do Oriente da África, em que o HBV é endêmico, apresentam
desde então. É fato, que pacientes afetados por diversas uma incidência maior de carcinoma hepatocelular. Em
doenças inflamatórias do aparelho gastrintestinal, apresentam praticamente todos os casos de câncer de células hepáticas
maior risco de desenvolvimento de câncer. Entre elas, inclui-se relacionados com o HBV, o DNA viral está integrado no
colite ulcerativa, doença de Chron, gastrite pelo Helicobacter genoma da célula hospedeira e como ocorre com o HPV, os
pylori, hepatite viral e pancreatite crônica. Os mecanismos tumores são clonais em relação a estas inserções. O genoma do
exatos que relacionam a inflamação e os processos HBV não codifica qualquer oncoproteína e foi sugerido que os
inflamatórios podem resultar na produção de citocinas, que tumores poderiam se desenvolver através da mutagênese de
estimulam o crescimento das células transformadas. Em alguns inserção, causando uma lesão hepática crônica e a hiperplasia
casos, a inflamação crônica pode aumentar o grupo de células- regenerativa consequente.
tronco tissulares, que se tornam sujeitas ao efeito de O HBV aumenta o número de células no ciclo celular com
mutagênese. É interessante notar que a inflamação crônica risco de subsequentes alterações genéticas. O HBV codifica
também pode promover uma instabilidade genômica através da ainda um elemento regulador chamado de proteína HBx que
produção de espécies reativas ao oxigênio, predispondo assim interrompe o controle do crescimento celular normal dos
a uma transformação maligna. Seja qual for o mecanismo hepatócitos infectados. Além disso, o processo inflamatório (e
exato, tal elo pode apresentar implicações de ordem prática. seus mediadores) produzido pela infecção do HBV, associado
Por exemplo, a expressão da enzima cicloxigenase-2 (COX-2), à capacidade de regeneração hepática, geram um
que converte o ácido araquidônico em prostaglandinas, é microambiente proliferativo alterado e instabilidade genética,
induzida por estímulos inflamatórios e está aumentada nos favorecendo o desenvolvimento de câncer.
tumores de cólon e noutros tumores. O desenvolvimento dos
inibidores da COX- 2 para o tratamento de câncer é uma área  Vírus Epstein-Barr (EBV):
promissora. É necessário lembrar que a simples presença dos O EBV, membro da família do herpes, foi implicado na
mediadores inflamatórios (como citocinas e fatores de patogênese de quatro tipos de tumores: a forma africana dos
crescimento) em um microambiente de proliferação celular linfomas de Burkitt, os linfomas de células B nos pacientes
neoplásica cria um efeito sinérgico neste processo. imunossuprimidos, linfomas de Hodgkin e carcinomas da
nasofaringe.
Condições pré-cancerosas: O EBV infecta células epiteliais da faringe e os linfócitos B
Algumas condições não neoplásicas (a gastrite crônica e consegue entrar nessas células por meio da molécula CD21.
atrófica da anemia perniciosa, a ceratose cutânea solar, a colite Sugere-se que os genes virais desregulam os sinais
ulcerativa crônica e a leucoplasia da cavidade oral, da vulva e proliferativos e de sobrevida normais das células portadoras da
do pênis) apresentam uma associação tão bem definida com o infecção latente. A membrana proteica 1 latente (LMP-1) se
câncer que foram denominadas condições pré-cancerosas. liga e ativa uma molécula de sinalização que normalmente é
ativada pelo receptor CD40 nas células B. A LMP-1,
CARCINOGÊNESE MICROBIANA simulando a CD40, ativa as vias NFκB e JAK/STAT e
promove sobrevida e proliferação das células B.
Vírus de DNA O linfoma de Burkitt (um tipo de linfoma não-Hodgkin) é
• Vírus do papiloma humano (HPV): alguns subtipos do um tumor de linfócitos B mais comum na infância em certas
HPV (1, 2, 4 e 7) causam os papilomas escamosos benignos regiões da África e em Nova Guiné. Nestas regiões, a forma
(verrugas) em humanos. Contudo, outros subtipos do HPV mais comum deste tipo de tumor é o que se manifesta na região
foram relacionados experimentalmente com diversos tipos de malar e mandibular. A sorologia destes pacientes indica
tumor (carcinoma de células escamosas da cérvice interna, da imunossupressão e malária concomitante. Existe, portanto, um
região anoretal, cavidade oral e faringe). As sequências de cofator ambiental – a malária.
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Iniciação: resulta da exposição de células a uma dose
Vírus de RNA suficiente de um agente carcinogênico (iniciador); uma célula
• Vírus da Leucemia de Células T Humanas tipo 1 iniciada está alterada geneticamente, tornando-se
(HTLV1): o HTLV1 está associado com uma forma de potencialmente capaz de dar origem a um tumor. A iniciação
leucemia/linfoma de células T (principalmente no Caribe e no isolada, no entanto, não é suficiente para a formação do tumor.
Japão). Este vírus apresenta tropismo por células T CD4+,
assim como o HIV, e promove uma aceleração na sua Promoção: os promotores (tais como hormônios, fenóis e
proliferação celular. Contudo, a leucemia só se desenvolve drogas) podem induzir tumores nas células previamente
entre 3 a 5% dos indivíduos infectados depois de um grande iniciadas, mas não são tumorigênicos por si só. Além do mais,
período de latência de 40 a 60 anos. O vírus infecta a célula T, os tumores não ocorrem quando o agente promotor é aplicado
promove a alteração de protooncogenes que regulam a antes do agente iniciador. Isto significa dizer que os agentes
proliferação celular e faz com que ocorra grande quantidade de químicos promotores não afetam o DNA diretamente e são
fatores de crescimento e expressão de receptores na superfície reversíveis.
celular. Essas células infectadas começam a se multiplicar de
forma exacerbada. Também determina a liberação do fator Progressão: indução de novas mutações genéticas com
estimulador de colônias de monócitos-granulócitos (GM-CSF), desenvolvimento de subclones de células neoplásicas. Onde o
estimulando a mitose de macrófagos que, por sua vez, desenvolvimento de uma neoplasia invasiva é o ponto final da
estimulam a mitose de linfócitos que já se encontravam em progressão.
rápida proliferação, gerando um clone neoplásico.
Os agentes químicos que iniciam a carcinogênese são de
Bactérias estrutura extremamente diversa e incluem tanto os produtos
• Helicobacter pylori: existem muitas evidências que sintéticos como os naturais. Eles podem ser de dois tipos:
relacionam a infecção gástrica com a bactéria H. pylori na (1) Carcinógenos de ação direta: não precisam sofrer
etiologia dos carcinomas e dos linfomas gástricos, como metabolismo hepático, eles já agem aderindo às moléculas de
também de úlceras pépticas. Acredita-se que a infecção crônica DNA e lesando-as;
com H. pylori leva à formação de infiltrados linfoides, onde as (2) Carcinógenos de ação indireta (hidrocarbonetos
células B se proliferam ativamente e podem adquirir policíclicos - fumaça de churrasco; aminas aromáticas –
anormalidades genéticas. O crescimento do tumor é corantes; nitrosaminas – alimentos enlatados; asbestos – que
inicialmente dependente de estímulo imune pelo H. pylori, mas causam mesotelioma; cloreto de vinil – que causam
em estágios posteriores não requerem mais a presença da hepatocarcinoma; cromo – presente no cimento que câncer de
bactéria. Toxinas desta bactéria funcionam como fator pele) precisam de conversão metabólica para produzir
mitogênico no momento em que estimula o processo de carcinógenos finais capazes de transformar células. Os
proliferação celular. A bactéria também provoca a inflamação principais agentes químicos carcinogênicos são:
em um meio cheio de citocinas que favorecem o
desenvolvimento de neoplasias. Agentes alquilantes com ação direta: parecem exercer
efeitos terapêuticos com a interação e lesão do DNA, mas são
Carcinogênese por radiações exatamente estas ações que os tornam carcinogênicos.
A energia radioativa, seja sob a forma de raios UV ou
como radiação eletromagnética, são capazes de transformar Hidrocarbonetos policíclicos aromáticos: precisam de
praticamente todos os tipos celulares in vitro e induzir ativação metabólica e podem induzir tumores numa grande
neoplasmas em modelos experimentais. variedade de tecidos e espécies. Eles podem ser produzidos a
partir da combustão do tabaco, especialmente com o fumo de
• Raios ultravioletas: os raios UV derivados do sol levam cigarros, e acredita-se que contribuem com o estabelecimento
a uma maior incidência de carcinomas de células escamosas, dos tumores do pulmão e bexiga. Também são produzidos a
carcinomas basocelulares e possivelmente de melanoma partir da gordura animal no processo de cozimento de carnes e
cutâneo maligno. Esses raios apresentam alguns efeitos sobre presentes nas carnes defumadas e nos peixes.
as células, inclusive a inibição da divisão celular, a inativação
das enzimas, indução das mutações e, numa dose suficiente, Aminas aromáticas e corantes nitrogenados: a ação
morte celular. A carcinogenicidade da luz UVB é atribuída à carcinogênica destes elementos se dá principalmente no fígado.
formação de dímeros de pirimidina no DNA, que é dificilmente
corrigido pela via de excisão de nucleotídeos. Isto leva a Agentes carcinogênicos de ocorrência natural: a aflatoxina
grandes erros de transcrição e, em alguns casos, ao câncer. b1, potente agente carcinogênico hepático, é produzida
naturalmente por algumas cepas de Aspergillus flavus que
• Raios-X: promovem quebra direta da estrutura do DNA. crescem no milho mal armazenado, arroz e amendoins. A
No pescoço, podem desenvolver o Microcarcinoma papilífero aflatoxina e o HBV colaboram na produção de carcinoma
de tireoide. hepatocelular em algumas partes da África e da China.
• Fissão nuclear: Promove quebra direta da estrutura do
DNA. Arsênico ou compostos de arsênico são subprodutos da
fundição de metais, componente de ligas, equipamentos
Carcinogênese por agentes químicos elétricos e semicondutores. Causam tumores de pulmão, pele e
Como sabemos, a carcinogênese é um processo que se hemangiossarcomas.
manifesta em etapas múltiplas. A carcinogênese por agentes
químicos é dividida em três estágios:

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Asbestos: usado em diversas aplicações devido a sua
resistência ao fogo, calor e atrito. Causa câncer de pulmão,
mesotelioma.

Benzeno: principal componente da luz a óleo e de algumas


tintas, borrachas e adesivos. Causa leucemia e linfoma de
Hodgkin.

Compostos do cromo: componente de ligas metálicas,


tintas, pigmentos, preservativos, cimento. Causa câncer de
pulmão e da pele.

Óxido de etileno: agente usado para o amadurecimento de


frutas e nozes. Causa leucemia.

Cloreto de vinil: é utilizado em refrigerantes, monômero


para polímeros de vinil, adesivos para plásticos, entre outros.
Causa angiossarcoma e câncer de fígado.

Referências
1. BRASILEIRO FILHO, G. - Bogliolo Patologia. 9º.Ed.
Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2016.
2. ABBAS, A.K.; KUMAR, V.; FAUSTO N. Robbins &
Cotran – Patologia – Bases Patológicas das doenças. 9º. Ed.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2016.

67
CICATRIZAÇÃO E REPARO Os tecidos são classificados quanto sua capacidade
proliferativa em:
O tecido danificado seja por processo cirúrgico, ferimentos Tecidos lábeis: que possuem alta capacidade proliferativa
ou diversas lesões crônicas podem ser recuperados por dois durante toda a vida, visando à reposição celular. A
principais meios: a regeneração e a cicatrização. Esses dois replicatividade é dependente das células-tronco presentes nas
principais tipos de reparos são distintos e definem-se como: camadas internas desses tecidos. (Ex: Epitélios com superfícies
Regeneração ou reparo: resulta na restituição do tecido escamosas estratificadas da pele, epitélio colunar do trato
perdido pelos mesmos tipos celulares que compunham o tecido gastrointestinal, epitélio transicional do trato urinário; células
antes da agressão. Um exemplo clássico de regeneração é a da medula óssea e tecidos hematopoiéticos).
amputação de membros de anfíbios. A maior parte dos tecidos Tecidos quiescentes ou estáveis: possuem baixos níveis de
de animais superiores, como os mamíferos, não possuem a replicação, no entanto, podem se replicar mediante a estímulos.
capacidade de regeneração. No entanto, esse termo é utilizado Estão habitualmente em G0 mais podem ser estimuladas à
para denominar o crescimento compensatório de órgãos como entrarem em G1. Exemplos: fibroblastos, músculos lisos,
o fígado e o rim após hepatectomia parcial e nefrectomia endotélio, linfócitos, condrócitos e osteócitos.
unilateral. Os tecidos com alta taxa de proliferação tais como o Tecidos permanentes: tipos celulares que uma vez
sistema hematopoiético, os epitélios cutâneos e o trato diferenciados não saem mais da fase G0. E uma vez destruídos
gastrointestinal, possuem a capacidade de regeneração pós- são substituídos por elementos sustentadores desse tecido.
lesão, enquanto, as células-troncos teciduais desses órgãos não Todavia, estudos recentes mostram que pode existir alguma
forem destruídas. reposição celular graças à diferenciação de células-tronco
Cicatrização: pode até mesmo devolver parte da estrutura teciduais. Exemplo: células musculares esqueléticas podem ser
original, no entanto, envolvem a deposição de colágeno e a substituídas por diferenciação de células satélites presentes nas
formação de uma cicatriz. A cicatrização consiste em dois bainhas endomisiais.
mecanismos distintos: 1. A regeneração celular dos tecidos
lesados e 2. A deposição de tecido fibroso. Células-tronco
Como exemplos, podemos citar os ferimentos cutâneos que O estudo das células-tronco tem trazido muitas expectativas
acometem a derme e infartos do miocárdio. à comunidade científica. Diferentemente das células-tronco
embrionárias que são pluripotentes, as células-tronco presentes
A regeneração requer uma arquitetura intacta do arcabouço nos tecidos possuem capacidade de diferenciação restrita e são,
tecidual; ao contrário prevalecerá a formação de cicatriz em geral, de linhagem específica. Células-tronco fora da
tecidual. medula óssea são referidas como células-tronco teciduais ou
A manutenção do arcabouço (matriz extracelular) é tissulares. As células-tronco teciduais estão localizadas em
essencial, pois elas fornecem a estrutura para a migração nichos que se diferem entre os vários tecidos. Como exemplos
celular e é responsável pela polaridade celular proporcionando desses nichos, podemos citar: 1. Na região do trato
à remontagem das estruturas em multicamadas. A matriz gastrointestinal, as células-tronco estão localizadas
extracelular também é responsável pela formação dos principalmente no istmo das glândulas estomacais e na base
microambientes que promovem diferenciações específicas de das criptas do cólon. 2. Área do bulbo dos folículos pilosos e
cada região. Além de tudo isso, a matriz extracelular é limbo da córnea. 3. A medula óssea contém células-tronco
responsável pelo estoque celular que tem papel fundamental hematopoiéticas, bem como células estromais capazes de se
durante a cicatrização, por exemplo: fibroblastos, macrófagos, diferenciar em várias linhagens.
etc. Células-tronco hematopoiéticas podem gerar células
O número populacional celular de um determinado tecido é sanguíneas, podendo restituir a medula-óssea. Podem ser
determinado pela sua capacidade de proliferação, pela sua coletadas no sangue em pacientes que recebem citocinas como
diferenciação e morte celular. Células especializadas como o fator estimulante de colônia granulócito-macrófago, que
miócitos e neurônios são células em estágios terminais de mobiliza as células–tronco hematopoiéticas. As células
diferenciação, e, portanto, são incapazes de se replicarem. Já os estromais da medula óssea podem se diferenciar em
tecidos proliferativos embora apresentem suas últimas camadas condrócitos, adipócitos, mioblastos e precursores da célula
terminalmente diferenciadas, são constantemente substituídos endotelial. Além de poderem se diferenciar em neurônios e
por células-tronco presentes em sua camada mais interna. células miocárdicas, como tem sido demonstrado em pesquisas
A proliferação celular pode ocorrer mediante alterações recentes.
fisiológicas e patológicas:
Exemplos de condições fisiológicas: Papel das células-tronco na homeostase dos tecidos:
1. Proliferação de células endometriais sob Fígado: o fígado contém células-tronco nos canais de
estimulação do estrogênio durante o ciclo menstrual. Hering. As células-troncos do fígado funcionam como um
2. Replicação celular da tireoide mediada por compartimento de reserva e são ativadas somente quando a
hormônios estimulantes tiroidianos, que são proliferação dos hepatócitos for bloqueada.
responsáveis pelo aumento dessa glândula durante a Músculo esquelético e cardíaco: os miocitos não se
gestação. dividem, sendo que seu crescimento e regeneração se dá em
Exemplo de condições patológicas: detrimento da replicação das células satélites, localizadas
1. Morte celular e alterações mecânicas de abaixo da membrana basal dos miócitos.
tecidos que estimulam a proliferação celular. Renovação do tecido epitelial: o epitélio contém células-
A proliferação celular é amplamente controlada por sinais tronco dispostas em suas camadas mais internas. As células
presentes nos microambientes, que podem ser solúveis ou superficiais diferenciadas não se dividem e sua reposição é
contato dependente, que estimulam ou inibem a proliferação dependente da replicação das células dispostas próximo à
celular. membrana basal.

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A proliferação celular é medida principalmente por fatores Mecanismos de sinalização no crescimento celular:
de crescimento, os quais descreveremos agora: Os mecanismos de sinalização no crescimento celular se
dão através de uma ligação específica entre o fator de
crescimento e seu receptor.
Fatores de crescimento: Com base na fonte do ligante e na localização dos
Além de estimular a proliferação celular, os fatores de receptores, os fatores de crescimento podem apresentar efeitos
crescimento são capazes de controlar: a locomoção, a autócrino, parácrino e endócrino.
diferenciação e angiogênese celular. Autócrino: Acontece quando o fator de crescimento atua na
mesma célula que a produziu. A regulação do crescimento
Fatores de crescimento epidérmico (EGF): É mitogênico autócrino desempenha função de regeneração no fígado,
para uma grande variabilidade de células epiteliais, hepatócito proliferação de linfócitos estimulados por antígenos e no
e fibroblastos. Muito presente nas secreções, líquidos teciduais, crescimento de tumores.
suor, saliva, urina e conteúdos intestinais. O EGF é produzido Parácrina: as células estimuladas estão em íntima
por queratinócitos, macrófagos e outras células inflamatórias. proximidade com a célula produtora e são, em geral, de um
tipo diferente. Os efeitos parácrinos são importantes na
Fator transformador de crescimento (TGF-alfa): O TGF- reparação de tecido conjuntivo da cicatrização de ferimentos.
alfa tem homologia pelo EGF e também se liga ao EGFR, Justacrina: ocorre quando a molécula sinalizadora estiver
produzindo as mesmas atividades. estabilizada na membrana celular e liga-se a um receptor na
membrana plasmática de outra célula.
Fator de crescimento do hepatócito (HGF): Possui efeito Sinalização endócrina: as células alvo estão distantes de
mitogênico na maioria das células epiteliais e hepatócitos. seu local de síntese, e estão carregados em geral pelo sangue.
Além dos efeitos mitogênicos, o HGF atua como morfogênico Caso do HGF.
no desenvolvimento embrionário. É produzido, principalmente
por fibroblastos, células endoteliais e células hepáticas. O Mecanismos da regeneração celular:
receptor do HGF é produto do proto-oncogene c-MET que é Os mamíferos perderam a capacidade de regeneração que é
frequentemente superexpressado em neoplasias. apresentada nos anfíbios. O processo de regeneração nesses
animais consistem principalmente em hiperplasia
Fator de crescimento endotelial vascular (VEGF): O compensatória. A inabilidade da regeneração verdadeira em
VEGF é um potente indutor da formação do vaso sanguíneo no mamíferos tem sido atribuída à rapida resposta
desenvolvimento inicial (vasculogênese) e tem um papel fibroproliferativa e formação de cicatriz após o ferimento.
central no crescimento de novos vasos (angiogênese). A função O órgão com maior capacidade de apresentar hiperplasia
do receptor do VEGF não é bem compreendida, porém sabe-se compensatória é o fígado, e ele será o maior exemplo do
que ele pode facilitar a mobilização das células-tronco pseudo mecanismo de regeneração celular a ser detalhado,
endoteliais e tem papel na inflamação. Também é responsável dentre os exemplos abaixo:
pela proliferação de vasos linfáticos.  Rim: devido aos novos néfrons não poderem
ser gerados no rim adulto, o crescimento do rim
Fator de crescimento derivado das plaquetas (PDGF): O contralateral após a nefrectomia inulateral envolve a
PDGF é armazenado em grânulos alfa-plaquetários e é liberado hipertrofia do néfron e alguma replicação das células
na ativação plaquetária. Pode também ser produzido por tubulares proximais.
macrófagos, células endoteliais, células musculares lisas e  Pâncreas: o pâncreas tem capacidade
células tumorais. É responsável pela migração e proliferação limitada para regenerar seus coponentes exócritos e
de fibroblastos, células musculares lisas e monócitos. ilhotas. A regeneração das células B-pancreáticas
envolve a diferenciação das células-tronco das células
Fator de crescimento do fibroblastos (FGF): Os FGF livres pancreáticas ductais.
se associam ao sulfato de heparan na MEC, que pode servir de  Regeneração hepática: pode ser facilmente
reservatórios ao armazenamento de fatores inativos. Os detectada após hepatectomia parcial, realizada pela
receptores de FGF são reconhecidos por uma família de ressecção tumoral ou pelo transplante hepático de
receptores de superfície celulares com atividade tirosina cinase doador vivo. A restauração da massa hepática é obtida
intrínseca. Possuem funções como: formação de novos vasos sem o novo crescimento dos lobos ressecados. Em vez
sanguíneos; migração de macrófagos, fibroblastos e células disso ocorre o crescimento por aumento dos lobos que
endoteliais. Também apresenta função no desenvolvimento permanecem após a operação, um processo conhecido
muscular esquelético e na maturação pulmonar. Atua na como crescimento compensatório.
diferenciação das linhagens específicas das células sanguíneas A proliferação do hepatócito é deflagrada por ações
e no desenvolvimento da medula óssea. combinadas de citocinas e fatores de crescimento
polipeptídeos. Com excessão da atividade autócrina do TGF-
Fator transformador de crescimento Beta (TGF-beta): São alfa, a replicação do hepatócito é estritamente dependente dos
sintetizados por plaquetas, células endoteliais, linfócitos e efeitos parácrinos dos fatores de crescimento e citocinas
macrofágos. E possui como principais funções: Bloquear o produzidas por células não-parenquimatosas hepáticas.
ciclo celular de muitos tipos celulares epiteliais e leucócitos.
Estimular a proliferação de fibroblastos e de células Matriz Extracelular e interações da matriz celular:
musculares lisas. Estimula a quimiotaxia fibroblástica, A MEC é secretada localmente e agrupa-se em uma rede
intensifica a produção de colágeno, fibronectina e nos espaços entorno das células. Suas funções são: sequestro
proteoglicanos. Possui forte efeito antiinflamatório. de água; fornecimento de turgência aos tecidos moles e
minerais que dão rigidez aos tecidos esqueléticos; reservatório

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de fatores de crescimento. Três grupos de macromoléculas rompimento do contato célula-célula entre as células
estão associadas à MEC: endoteliais. Após o ganho de mobilidade das células
1. Proteínas estruturais fibrosas, como endoteliais, elas migram em direção ao estímulo angiogênico.
colágenos e elastinas. A maturação das células endoteliais incluem a inibição do
2. Glicoproteínas adesivas. crescimento e a remodelação em tubos capilares.
3. Proteoglicanas e ácido hialurônico.
Essas moléculas estão presentes entre as células e podem se Fatores de crescimento envolvidos na angiogênese:
agrupar em duas organizações gerais: matriz interticial e Os principais fatores de crescimento são aqueles
membrana basal. pertencentes à famíla do VEGF.
A matriz intersticial consiste em colágeno fibrilar e não Na angiogênese, envolvendo os precursores de células
fibrilar, elastina, fibronectina, proteoglicanas, hialuronato e endoteliais e agindo através do receptor VEGFR-2, o VEGF
demais componentes. estimula a mobilização dos precursores das células endoteliais
A membrana basal é produzida pelas células epiteliais e da medula óssea e intensifica a proliferação e diferenciação
mesenquimais e estão intimamente associadas à superfície dessas células no local da angiogênese.
celular. Elas consistem em uma rede de colágeno não fibrilar As células endoteliais derivadas desses progenitores
amorfo, a maioria dos tipo IV, laminina sulfato heparan, formam um plexo capilar delicado que se desenvolve numa
proteoglicana e outras glicoproteínas. rede capilar madura.
Na angiogênese originária de vasos locais preexistentes o
CICATRIZAÇÃO; FORMAÇÃO DE CICATRIZ E VEGF estimula a proliferação e a motilidade das células
FIBROSE endoteliais, iniciando a germinação de novos capilares.
A cicatrização é uma resposta fibroproliferativa que de Os vasos recém-formados são fragéis e precisam ser
substituição e envolve numerosos processos: estabilizados. A estabilização requer recrutamento de
1. Indução de processo inflamatório; pericistos, células musculares lisas e deposição de proteínas da
2. Proliferação e migração de células teciduais MEC. As angiopoetinas 1 e 2; PDGF e TGF-beta participam
parenquimatosas conjuntivas; no processo de estabilização. A angiopoetina 1 interagem com
3. Formação de vasos sanguíneo; um receptor nas células endoletliais, chamada de Tie2, para
4. Síntese de proteínas da MEC e deposição do recrutar as células periendoteliais. O PDGF participa no
colágeno; recrutamento das células musculares lisas, enquanto a TGF-
5. Remodelação tecidual; beta estabiliza os vasos recém-formados.
6. Contração de ferida;
7. Aquisição de resistência da ferida. PROCESSO DE CICATRIZAÇÃO
No entanto, nem todos esses eventos ocorrem em toda A cicatrização é a forma mais comum de cura dos tecidos
reação de reparação. O processo de reparação depende inflamados. Nela tem-se uma reposição tecidual, porém a
principalmente do: ambiente tecidual e da extensão do dano anatomia e a função do local comprometido não são restituídas,
tecidual; intensidade e duração do estímulo; presença de corpo uma vez que se forma a cicatriz (tecido conjuntivo fibroso mais
estranho; isquemia local; doenças sistêmicas tais quais: primitivo que substitui o parênquima destruído).
diabetes e tratamento com corticosteroides. Para que possa haver cicatrização completa, são
A reparação começa com a inflamação. Em média 24 horas necessárias eliminação do agente agressor, irrigação, nutrição e
após a lesão, os fibroblastos e as células endoteliais começam a oxigenação suficientes. Esses fatores é que determinam o
se proliferar para formar tecido indicador de inflamação equilíbrio de eventos que compõem a cicatrização, eventos
denominado: tecido de granulação. esses divididos didaticamente em três fases:
Tecido de granulação: macroscopicamente possui aparência
rósea, lisa e granular na superfícies de feridas. Fase inicial – inflamatória:
Histologia: tecido rico na formação de pequenos vasos A maioria das formas de lesão envolve a ruptura de vasos
sanguíneos, com proliferação de fibroblastos. A formação de sanguíneos e o extravasamento de seus constituintes. Os
vasos recém criados permitem o extravasamento de conteúdo eventos iniciais do processo de reparo estarão, nos primeiros
líquido e de proteínas para o meio extravascular, e, portanto, o momentos, voltados para o tamponamento desses vasos,
tecido de granulação é edemaciado. formação de trombos e contenção da hemorragia.
Quase concomitante ao estímulo lesivo, devido à influência
Angiogênese: nervosa (descargas adrenérgicas) e ação de mediadores
A angiogênese pode ocorrer em decorrência do químicos, ocorre vasoconstrição como primeira resposta. Além
recrutamento das células progenitoras endoteliais da medula disso, é preciso lembrar que a injúria do endotélio dispara uma
óssea, ou da extensão de vasos sanguíneos adjacentes. sequência de eventos, iniciando-se com a deposição das
As células progenitoras endoteliais atuam na plaquetas, prosseguindo com sua ativação e posterior o
reendotelização de implantes vasculares, na neovascularização recrutamento de novas plaquetas que provisoriamente
de órgãos isquemicos, feridas cutâneas e tumores. Também tamponam a lesão endotelial. Esse trombo rico em plaquetas é
especula-se que o número de células progenitoras endoteliais rapidamente infiltrado pela fibrina, e logo após, os eritrócitos
circulantes pode influenciar a função vascular e determinar o são capturados por essa rede.
risco de doenças cardiovasculares. A angiogênese em Uma vez que os neutrófilos são as células mais abundantes
decorrência da extensão de vasos sanguíneos adjacentes inicia- no sangue, um número significativo é passivamente coletado
se pela vasodilatação em resposta ao óxido nitríco e VEGF pelo trombo provisório durante o rompimento dos vasos. Após
induzido, aumentando a permeabilidade do vaso preexistente. este extravasamento passivo, os neutrófilos começam a ser
Posteriormente, existe uma degradação proteolítica da recrutados de forma ativa a partir dos vasos adjacentes
membrana basal do vaso progenitor por metaloproteinases e formando uma barreira de defesa contra os elementos invasores

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e potencialmente danosos. Ao final de um dia após a lesão eles células são os principais componentes do tecido de granulação
constituirão 50% das células migradas ao local da agressão. e após a influência dos fatores de crescimento e demais
Sua função principal neste processo é a eliminação de mediadores, derivados principalmente (mas não
possíveis microrganismos pela fagocitose. exclusivamente) dos macrófagos, são ativadas e migram para o
As próximas células que surgem na região são os seu centro da área lesada. Os fibroblastos são as maiores fontes
macrófagos derivados de monócitos (segundo ao quinto dia) de proteínas da matriz, onde irão ordenar os feixes de colágeno
que, diferentemente dos neutrófilos, atuam no processo de produzidos, também, pelos próprios fibroblastos, além de ser
reparo de forma muito mais complexa, além da fagocitose. arcabouço para os vasos neoformados.
Além de auxiliar os neutrófilos na eliminação de Com o aumento do número de fibroblastos ativados para a
microrganismos pela fagocitose, após fagocitá-los e processá- produção de colágeno no local, a matriz extracelular começa a
los nos fagossomas, apresenta seus peptídeos pelo complexo ser substituída por um tecido conjuntivo mais forte e mais
maior de histocompatibilidade (MHC) às células T auxiliares. elástico (em substituição ao coágulo anteriormente existente).
Desta forma, os macrófagos atuam como elo entre o sistema Este processo é denominado de fibroplasia e para a sua
imune inato e o adaptativo. Além disso, é a célula mais eficiência é necessária a ocorrência em paralelo da formação
eficiente na eliminação de fragmentos teciduais inclusive de novos vasos sanguíneos, ou seja, é necessária a
removendo pela fagocitose os neutrófilos que perderam função. neovascularização da região. Além da ação direta de fatores de
Ainda, os macrófagos produzem e exportam mediadores crescimento sobre as células da vasculatura, a indução da
lipídicos (eicosanóides), mediadores peptídicos (citocinas e angiogênese é, em parte, creditada à baixa tensão de oxigênio
fatores de crescimento), outras proteínas (tais como frações do característica que ocorre no centro de uma ferida.
complemento e fatores de coagulação) e enzimas relacionadas Nessa fase, o tecido de granulação é composto por
ao reparo (tais como colagenases, metaloproteases). macrófagos, fibroblastos e vasos neoformados que estão
A primeira contribuição dos mediadores circulantes para a suportados por uma matriz frouxa de fibronectina, ácido
formação do gradiente quimiotático na área lesada, vem de hialurônico e colágeno tipos I e II.
proteínas plasmáticas como o Fator de Hageman e o Os fibroblastos começam a depositar grandes quantidades
cininogênio. Da interação entre estas duas moléculas é gerada a de fibronectina que, embora seja substrato que desempenha
bradicinina que, além de propriedades vasoativas e outras funções, basicamente serve para a fixação da própria
nociceptivas (geradoras de dor), é também indutora da célula. Outra substância produzida em grande quantidade neste
metabolização do ácido araquidônico para eicosanóides. As segundo estágio é o ácido hialurônico, um polissacarídeo
moléculas desta família possuem importância comprovada em glicosaminoglicano não sulfatado com facilidade de se ligar à
vários fenômenos inflamatórios e dentre eles a atividade água, que auxilia na resistência do tecido à compressão. Estas
quimiotática. duas substâncias predominam na matriz durante as primeiras
Outros produtos oriundos da circulação que participam da fases do reparo, pois esta combinação propicia um
formação do gradiente quimiotático, são as frações livres do microambiente eficiente para a movimentação das células,
complemento, principalmente a C5a. Além da ação necessárias nesta etapa. A formação do tecido de granulação é
quimiotática direta desta molécula, a sua ligação a receptores uma das partes mais características do processo de
localizados na superfície dos mastócitos, ativa-os para a cicatrização. Representa o novo tecido que cresce para
produção de eicosanóides e liberação do conteúdo de seus preencher o defeito.
grânulos, composto por várias moléculas com atividades pró- A angiogênese é o processo pelo qual células endoteliais
inflamatórias. secretam proteases que degradam a matriz extracelular, depois
Outra contribuição para a formação do gradiente migram nos espaços perivasculares, proliferam e se alinham
quimiotático nestes momentos iniciais da resposta inflamatória para formar novos vasos. Durante o processo de angiogênese
são os produtos da fibrinólise. Durante o processo de formação as células endoteliais se agrupam e fazem protrusão por entre
do trombo definitivo, ocorre a proteólise da rede de fibrina. Os os fragmentos da matriz extracelular, a princípio formando
produtos de sua degradação são fortes agentes quimiotáticos fileiras sólidas de células. Nestes brotamentos sólidos, as
para leucócitos. células endoteliais começam a apresentar vacúolos
citoplasmáticos que se fusionam a princípio entre si e logo com
Fase proliferativa (formação do tecido de granulação): os de células vizinhas, dando origem à nova luz vascular. Os
Uma contínua mudança nos constituintes da matriz sinais ou fatores responsáveis pela angiogênese derivam de
extracelular é observada durante o processo de reparo da vários tipos celulares.
ferida. Inicialmente, a matriz é composta de proteínas Fatores secretados por macrófagos (fator de
derivadas em grande parte das plaquetas e do plasma; e com a angiogênese derivado de macrófagos), por mastócitos (como a
migração dos macrófagos e a formação do tecido de heparina), plaquetas (fator de crescimento derivado de
granulação as suas proteínas passam a vir das células desse plaquetas, fator de transformação do crescimento, beta) e por
tecido. A matriz extracelular substitui, então, o coágulo fibroblastos (fator de crescimento do fibroblasto) têm todos
inicialmente depositado no leito da ferida após o trauma e é efeitos positivos sobre a angiogênese. Eles conferem um
basicamente constituída de várias proteínas, como fibrina e aspecto granuloso avermelhado à superfície (daí se origina o
colágeno, proteoglicanos (ácido hialurônico e condroítina), nome “tecido de granulação”).
glicoproteínas (fibronectina e laminina), água e eletrólitos. A Sob estímulo desses fatores de crescimento e de
principal função da matriz é a restauração da continuidade do outros mediadores, as células endoteliais dos capilares intactos
tecido lesado, funcionando como um arcabouço para a nas margens da ferida passam a secretar colagenase e ativador
migração celular. do plasminogênio. Essas substâncias permitem a migração das
Com a presença local de macrófagos e a produção e células endoteliais que, atravessando a parede do vaso e
liberação dos mediadores químicos produzidos por eles, a utilizando como substrato a matriz extracelular
migração e ativação de fibroblastos é intensificada. Essas provisoriamente produzida e seguem em direção à região da

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lesão. Uma vez na região externa do vaso, elas passam pelo de terceira intensão. Este processo de cicatrização assemelha-
processo de diferenciação para aquisição da capacidade de se ao de primeira e ao de segunda intenção. A ferida é deixada
formação de novos tubos capilares. As células endoteliais aberta por um determinado período, sendo suturada
migratórias formam no exterior do vaso um broto capilar que posteriormente. Este procedimento é empregado geralmente
em seguida une-se ao capilar de onde eram originárias para o nas feridas cirúrgicas com suspeita de infecção. Faz-se
restabelecimento do fluxo sanguíneo. necessário observar e acompanhar para verificar se há
necessidade de iniciar uma intervenção específica.
Fase de remodelação e maturação. É importante observar que quanto menor a perda de
Na fase de remodelação, a matriz extracelular vai se substância, mais rápido e simples será o reparo. Nas feridas
tornando mais densa, adquirindo cada vez mais fibras cirúrgicas, o ideal é aproximar as bordas com o auxílio de
colágenas. Estas, que formavam a princípio um padrão frouxo, suturas, fazendo a aposição das mesmas quase sem deixar
pouco a pouco se dispõem em feixes paralelos, compactos, espaço aberto. Quando isso acontece, o reparo se faz com um
enquanto os novos vasos sanguíneos vão se tornando menos mínimo de produção de tecido de granulação, praticamente
proeminentes e desaparecem. sem deixar cicatriz.
A medida que o processo de maturação da ferida avança, a
concentração de ácido hialurônico diminui e aumenta a síntese Fatores que interferem no processo de cicatrização
de proteoglicanos ou glicosaminoglicanos sulfatados. Essa Existem fatores que podem interferir no processo de
modificação na composição da matriz extracelular favorece a cicatrização natural, retardando qualquer uma de suas fases.
fixação e imobilidade das células favorecendo a diferenciação Esses fatores podem ser locais (relacionados diretamente à
delas para fenótipos mais maduros. ferida) ou sistêmicos (relacionados ao indivíduo). O retardo
cicatricial pode ocasionar complicações, causando prejuízos
Reepitelização estéticos e funcionais.
O crescimento do epitélio nas bordas da ferida se faz a
partir da fase de proliferação, sendo que as células epiteliais Fatores locais:
apresentam mitoses e começam a se proliferar por debaixo da Características da ferida: dimensão e profundidade da
pseudomembrana fibrinosa. A princípio, a camada epitelial de lesão. Presença de secreções, hematomas, edemas e corpos
revestimento é muito fina e deixa ver, por transparência, o estranhos.
tecido conjuntivo avermelhado, que vai se tornando mais denso O tamanho, a profundidade e a localização, assim como o
com o passar do tempo, enquanto o epitélio vai se tornando tipo de ferida influenciam a cicatrização. Feridas maiores
mais espesso. demoram mais tempo para cicatrizar do que feridas menores,
Em tecidos normais, a proliferação das células da camada estando mais susceptíveis às infecções. As feridas em áreas
basal do epitélio fica inibida pelo contato existente entre as ricamente vascularizadas cicatrizam mais rapidamente que
células (“inibição por contato”). Com a ocorrência de uma aquelas pouco vascularizadas.
lesão, este mecanismo inibitório desaparece e as células entram
em processo mitótico – que em geral se inicia de 48 a 72 horas Os corpos estranhos, como suturas desnecessárias,
depois da injúria. Ocorre a migração do epitélio da borda pela fragmentos (aço, vidro, ou mesmo osso), constituem
perda da inibição de contato das células, que, através da ação impedimentos à cicatrização.
de enzimas colagenolíticas, quebram a adesão entre a
pseudomembrana e a área de tecido viável da ferida, Presença de infecção: A presença de infecção local é a
permitindo que estas células avancem cobrindo a área viável. causa mais comum de atraso na cicatrização. Deve-se observar
As superfícies úmidas melhoram a migração celular. À medida a origem da infecção; as infecções de origem externa devem
que a região da lesão vai sendo coberta pelas células ser consideradas com cuidado nos atos operatórios, dada a sua
epidermais é acionado o mecanismo de “inibição por contato”. alta probabilidade de ocorrência; as endógenas (de origem
As células voltam a apresentar o fenótipo original, a membrana interna) podem ser de difícil resolução, pois são resultado de
basal é refeita e os hemidesmossomos e desmossomos são bacteremias transitórias (grande quantidade de bactérias
reconstituídos. circulantes no sangue), a qual tem grande afinidade pela
coleção proteica local (nas necroses ou hematomas).
Tipos de cicatrização da ferida cutânea
Existem três formas pelas quais uma ferida pode cicatrizar, Irradiação local: A irradiação no local pode ser um
e essa variação está associada a quantidade de tecido lesado ou problema para a cicatrização, uma vez que pode lesar vasos
danificado e a presença ou não de infecção: classifica-se essa sanguíneos, evita mitoses e interrompe a produção de tecido
diferença como cicatrização de primeira intenção, segunda cicatricial, podendo inclusive provocar úlceras.
intenção e terceira intenção (fechamento primário retardado).
• Primeira intenção: é o tipo de cicatrização que ocorre Tratamento básico das feridas: assepsia e antissepsia,
quando as bordas são apostas ou aproximadas, havendo perda técnica cirúrgica correta, escolha de fio cirúrgico (que cause
mínima de tecido, ausência de infecção e mínimo edema. A mínima reação tecidual), cuidados pós-operatórios adequados
formação de tecido de granulação não é visível. Exemplo: (curativos e retirada dos pontos), são alguns dos aspectos
ferimento suturado cirurgicamente. importantes a serem observados para garantir uma boa
• Segunda intenção: neste tipo de cicatrização ocorre perda cicatrização. Uma incisão cirúrgica realizada com boa técnica e
excessiva de tecido e a aproximação das bordas não é possível. em condições de assepsia tem melhor condição de cicatrização
As feridas são deixadas abertas e se fecharão por meio de do que um ferimento traumático ocorrido fora do ambiente
formação de tecido de granulação, contração e reepitelização. hospitalar. O cuidado mais elementar e eficiente é a limpeza
• Terceira intenção: é considerada cicatrização por mecânica, remoção de corpos estranhos, detritos e tecidos
fechamento primário retardado, ou cicatrização por fechamento desvitalizados.

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A boa vascularização das bordas da ferida é essencial para neuropatia associada e aterosclerose é propenso à isquemia
a cicatrização, pois permite aporte adequado de nutrientes e tecidual, ao traumatismo repetitivo e à infecção.
oxigênio. O curativo é um meio terapêutico que consiste na A hiperatividade dificulta a aproximação das bordas da
limpeza, desbridamento e indicação de cobertura, com as ferida. O repouso favorece a cicatrização. Assim como a
finalidades de: manutenção do pH; manutenção do meio estresse provoca quebra das reservas corporais, deprime o
úmido; temperatura a 37ºC; não aderência; e controle do sistema imunológico e reduz a resposta inflamatória. A dor
exsudato da ferida. Todo tecido necrótico e corpos estranhos (seja ela local ou sistêmica) está intimamente relacionado com
devem ser eliminados, qualquer processo infeccioso deve ser o estresse (a dor aumenta o estresse e o estresse aumenta a
identificado e combatido, os espaços mortos devem ser dor), resulta em uma sensação de ausência de força.
obliterados, o excesso de exsudato deve ser absorvido, a Doenças que influenciem a oxigenação e perfusão dos
umidade no leito da ferida deve ser mantida, o isolamento tecidos e que alteram o fluxo sanguíneo normal podem afetar a
térmico deve ser favorecido e a ferida deve estar protegida de distribuição dos nutrientes das células, assim como a dos
traumas e bactérias. As coberturas podem ser classificadas componentes do sistema imune do corpo. Essas condições
quanto ao seu desempenho em: afetam a capacidade do organismo de transportar células de
 Passivas: protegem e cobrem as feridas; defesa e antibióticos, o que dificulta o processo de cicatrização.
 Interativas: mantêm um microambiente O tabagismo produz vasoconstrição, reduz a hemoglobina
úmido; funcional e leva à disfunção pulmonar, o que reduz o aporte de
 Bioativas: fornecem elementos necessários à oxigênio para as células e dificulta a cura da ferida, atua como
cicatrização. depressor do apetite e pode levar a uma redução da síntese de
colágeno, dificulta a atividade dos macrófagos, atrasa a
Isquemia tecidual: a falta de oxigenação dificulta a reepitelização e prejudica a contração da ferida.
chegada de células inflamatórias à zona lesada, logo vão existir
menos fatores que estimulem a proliferação dos fibroblastos e Terapia Medicamentosa Associada: a associação
a síntese de colágeno. medicamentosa pode interferir no processo cicatricial, como,
Para que a cicatrização ocorra de forma adequada é por exemplo: anti-inflamatórios, esteroides e agentes
importante observar: a tensão de oxigênio na área, sendo que quimioterápicos.
quando abaixo de 30mmHg a célula passa a ter suas funções O uso de medicamentos deve ser avaliado cuidadosamente.
metabólicas comprometidas; presença de hematomas, que Os corticosteróides, os quimioterápicos e os radioterápicos
caracteristicamente são um excelente meio de cultura, propicia podem reduzir a cicatrização de feridas. Eles interferem na
infecção e edema pela obstrução linfática e capilar, e síntese proteica ou divisão celular agindo diretamente na
deiscência cirúrgica; a presença de edema leva à diminuição produção de colágeno. Além do mais, aumentam a atividade da
do fluxo sanguíneo e do metabolismo celular por baixa colagenase, tornando a cicatriz mais frágil. Esses
concentração de oxigênio; e também prejudica proliferação medicamentos reduzem a força tênsil da ferida e a epitelização
celular. é retardada. Anti-inflamatórios, drogas antineoplásicas,
imunossupressoras, e anticoagulantes também reduzem a
Fatores sistêmicos: síntese de colágeno.
Faixa etária: a idade avançada diminui a resposta Nas doenças imunossupressoras, a fase inflamatória está
inflamatória. O paciente idoso também apresenta uma comprometida pela redução de leucócitos, com consequente
diminuição progressiva de colágeno, a pele torna-se retardo da fagocitose e da lise de restos celulares. Pela ausência
adelgaçada, enrugada, ocorre uma diminuição da espessura, da de monócitos a formação de fibroblastos é deficitária. E o
elasticidade, resposta inflamatória fica menos eficiente, hipotireoidismo alteração qualitativamente a síntese matriz
diminui o número e a luz dos vasos sanguíneos, assim como as extracelular.
terminações nervosas, e ocorre uma atrofia das glândulas Além destes fatores acima mencionados, longos períodos
sebáceas. de internação hospitalar e tempo cirúrgico elevado são também
aspectos complicadores importantes para o processo de
Estado nutricional: uma deficiência nutricional pode cicatrização
dificultar a cicatrização, pois deprime o sistema imune e
diminui a qualidade e a síntese de tecido de reparação. As Patologias da cicatrização
carências de proteínas e de vitamina C são as mais importantes, Podem ocorrer várias alterações no aspecto das cicatrizes,
pois afetam diretamente a síntese de colágeno. A vitamina A incluindo as discromias, alargamentos, úlcera de Marjolin,
contrabalança os efeitos dos corticoides que inibem a contração contraturas cicatriciais, cicatrizes hipertróficas e queloides.
da ferida e a proliferação de fibroblastos. A vitamina B Discromias - As discromias são decorrentes da lesão dos
aumenta o número de fibroblastos. A vitamina D facilita a melanócitos. Podem ocorrer hipercromias e hipocromias, em
absorção de cálcio e a E é um cofator na síntese do colágeno, diferentes graus. Hipercromia pode ser tratada com produtos
melhora a resistência da cicatriz e inibe os radicais livres. O clareadores a base de hidroxi-ácidos e/ou hidroquinona.
zinco é um co-fator de mais de 200 metaloenzimas envolvidas Hipocromia é de difícil tratamento. Pode-se utilizar a tatuagem
no crescimento celular e na síntese proteica, sendo, portanto, como método de camuflagem, assim como o uso de
indispensável para a reparação dos tecidos. maquiagem.
Alargamento de cicatriz - Cicatrizes localizadas em áreas
Doenças Crônicas: enfermidades metabólicas sistêmicas contra as linhas de força da pele, sofrem estiramentos
podem interferir no processo cicatricial. Doenças sistêmicas contínuos e podem evoluir com alargamento.
como o Diabetes melito prejudica a cicatrização de ferida em Úlcera de Marjolin - Úlceras crônicas podem evoluir para
todos os estágios do processo. O paciente diabético com carcinoma cutâneo, principalmente carcinoma espinocelular.
Áreas de queimaduras e de radiodermites, pelo estímulo

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contínuo da mitose celular são mais propensas a evoluírem exuberante, com predomínio de colágeno tipo I e acompanhada
para neoplasias cutâneas. de grande neoformação vascular, fica restrita ao espaço porta.
Contratura cicatricial: A contração da cicatriz é um Tal modificação do fígado pela fibrose resulta em hipertensão
processo biológico que diminui a dimensão do tecido portal, que caracteriza a forma hépato-esplênica da
conjuntivo envolvido. A célula envolvida na contração é um esquistossomose.
fibroblasto especializado que apresenta fibras de actina em seu Tanto a fibrose do etilismo como o da esquistossomose
interior, que lhe proporciona esta capacidade de contração, e é pode regredir se forem eliminadas as causas (parada de
denominada de miofibroblasto. As contraturas podem se tornar ingestão de álcool e eliminação do parasita). A retirada das
lesões deformantes decorrentes da retração exagerada dos causas cessa os estímulos fibrogênicos, enquanto os efeitos
tecidos e que muitas vezes necessitam sua liberação e fibrolíticos passam a predominar.
cobertura com enxertos ou retalhos de pele, para a restauração
da função do local envolvido. Fibrose cardíaca.
As fibroses no miocárdio são frequentes, especialmente as
cicatrizes que se formam em áreas de infarto. Também
FIBROSES importante é a fibrose que se desenvolve em miocardites
São condições caracterizadas por aumento do estroma crônicas, como a chagásica nas quais contribui para diminuir a
conjuntivo de um órgão decorrente de cicatrização normal ou capacidade contrátil do coração. Fibrose do tipo reacional, não
exagerada ou de um processo reacional em que a produção de cicatricial e não inflamatória, ocorre de modo difuso em alguns
matriz extracelular não está relacionada com o processo tipos de hipertrofia cardíaca, representando fator importante na
reparativo. Podem ocorrer importantes transtornos funcionais modificação da arquitetura do miocárdio e na alteração de suas
devido às modificações na arquitetura do órgão e das propriedades contráteis.
alterações na função das células parenquimatosas pela fibrose.

Fibrose hepática: A matriz extracelular do fígado tem Fibrose do miocárdio na hipertrofia cardíaca:
características diferentes nos espaços porta, no interior dos Quando existe a hipertrofia dos miocardiócitos, ocorre
lóbulos e em torno da veia centrolobular. também aumento do estroma, especialmente dos componentes
Na necrose hepática focal, a matriz extracelular permanece da matriz extracelular. Nas sobrecargas cardíacas por exercício
intacta e os hepatócitos regenerados ocupam a mesma posição físico, por anemia, dentre outras, há aumento do estroma de
dos necrosados. Se a necrose é muito extensa, o estroma maneira proporcional à hipertrofia. Nas hipertrofias
reticular se colaba e os hepatócitos regenerados, não provocadas por hipertensão arterial, defeitos valvares, a fibrose
encontrando o retículo que orienta seu crescimento, formam reacional é intensa e desproporcional à hipertrofia.
nódulos que crescem e ficam envoltos pela matriz extracelular A fibrose reacional dessas hipertrofias patológicas
colabada após a necrose. Nessa matriz colabada ocorre apresenta as seguintes peculiaridades:
deposição de mais moléculas de colágeno do tipo I e III que 1. É uma fibrose intersticial difusa, com
formam septos fibrosos envolvendo os nódulos de regeneração. aumento do colágeno no endomíssio.
Esse tipo de fibrose é denominada de cirrose hepática. 2. É perivascular (na adventícia dos vasos
O etilismo crônico é responsável pela fibrose do fígado e coronarianos.
em 15% dos casos evolui para cirrose hepática. Esse tipo de 3. É plexiforme (com feixes cruzados) devido
fibrose inicia-se pela veia centrolobular, avança para os ao desalinhamento das fibrocelulas.
espaços de Disse e chega à região periportal. Desse modo pode Os fatores que governam essa fibrose desproporcional na
se formar septos centroportais, centrocentrais e septos hipertrofia cardíaca não são completamente conhecidos.
irregulares no interior dos lóbulos. Se a regeneração
hepatocitária tornar-se nodular, o processo evolui para Referências:
subversão da arquitetura do órgão, ou seja, para a cirrose. 1. BRASILEIRO FILHO, G. - Bogliolo Patologia. 9º.Ed.
A reação inflamatória induzida pelo etanol pode decorrer Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2016.
da morte dos hepatócitos ou resultar de mecanismos 2. ABBAS, A.K.; KUMAR, V.; FAUSTO N. Robbins &
imunitários. O acetaldeido é capaz de se ligar às proteínas da Cotran – Patologia – Bases Patológicas das doenças. 9º. Ed.
membrana do hepatócito e criar neoantígenos que passam a ser Rio de Janeiro: Elsevier, 2016.
alvos da resposta imunitária humoral ou celular. Também tem
sido demonstrado que o acetaldeído pode se ligar aos lipídeos,
gerando fatores quimiotáticos para neutrófilos. Por qualquer
um desses mecanismos, instala-se uma resposta inflamatória,
que culmina com a formação de fatores de crescimento (PDGF,
FGF, TGFbeta, IL1, TNF) e retiram as células armazenadoras
de gordura do estado de quiescência, estimulando-as a se
proliferarem e a produzir os componentes da matriz.
Na esquistossomose mansônica, a fibrose hepática é a
manifestação mais importante. Os ovos do parasita se
localizam predominantemente no espaço porta, onde induzem
inflamação granulomatosa. Na maioria dos casos, os
granulomas se curam por fibrose discreta ou moderada, sem
consequências importantes. Em uma minoria, no entanto,
ocorre uma neoformação conjuntiva que se estende por todo o
espaço portal, o qual se torna alargado. Essa fibrose portal

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