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RELATORIO IDENTIFICACAO E DELIMITACAO TERRA INDIGENA POTIGUARA DE MONTE-MOR MUNICIPIO DE RIO TINTO/PB Igreja de N. Sra. dos Prazeres - Vila “un para os inilios ¢ caboclos a terra serve para plantar mandioea, feijto, mitho, bananeiras ¢ outras drvores.As matas fornecem caca ¢ material para seus objetos de uso.Aos olhes dos cupitalistas a terra serve para plantar eanu de aciicar, café, eacanalgoddo, soja, on outros produtes de venda e ‘portage. Os indigenes plantar para o consumo prépria Os capitatistas plantar para @ (PREZIA cHOONAERT. 1989, 14). MARIA DE FATIMA CAMPELO BRITO Coordenadora ¢o GT - Antropélogx FUNAVADRIRecife Recife - Margo - 1996 Fundaglio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTICA, INDICK 1. Introdugao.... 2. Historico. 3. Roteiro da Viagem. 4. Inicio do Processo de Luta dos Indios POTIGUARA DE MONTE- MOR, Rio Tinto/PB. 5. Ientificagfo......... 6. Siluagdo Atual das Aldeias. 6.1 Aldeia Jaraguar.... 6.2 Aldeia Lagoa Grande. 6.3 Aldcia Brasilia. 7. Proposta de Delimitagao da Terra Indigena.. 8. Situagiio Funditria... 9. Identidade Etnica 10. Conclusio. TL. AM€XO8.... coerce 12. Regis\tos Fotogrdificos.. 13. Bibliografia......... 14, Mapa de Delimitagdo e Memorial Deseritivo.... 15, Relatério de Levantamento Fundiario da TI POTIGUARA DE MONTE-MOR. om 49 ‘Ay, Jodie de Barros, 668 Bua Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (001) 421.2144 sd aoa) OF a 13 17 oo 20 2h 29 36 44 AG AB 250 327 342 345 352 Fundagdo Nacionat do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA 1, INFTRODUCAO Este relatério tem como objetivo a Ideutificagio da Terra Indigena POTIGUARA DE MONTE-MOR, localizada no municipio de Rio Tinto/PB. © Grupo de Trabalho- GT foi instituido pelas Portarias n°s 907 e 1,040/PRES./95 de 21.08 ¢ 25.09.95, respectivamente (Anexos 01 ¢ 02) e, composto pelos servidores: Maria de Fatima Campelo Brito, Antropéloga - PUNAVADR/RECIFE/PE (Coordenadora do GT), Hélcio de Mattos Batista, Engenheiro Agvimensor - FUNAI/ADR/GOVERNADOR VALADARES/MG, Denisval Diniz Botelho, nico em ~—_Agropecudria FUNAVADE/MACEIO/AL; Luis Pereira dos Santos, Técnico Agricola - FUNAVADR/OAO — PESSOA/PB; — Edval_ Medeiros, Motorista - FUNAIV/ADR/JOAO PESSOA/PB; Gilberto de Almeida Lima, Engenheiro ‘Agrénomo - INTERPA/PB e Luiz Ant6nio Fialho da Costa, Técnico em Agropecuaria- INCRA/PB Nos primeiros dias de pesquisa de campo, tivemos a participagio da Antropdloga Vania Fialho de Paiva e Souza, cuja colaborago aos nosso tabalhos foi de grande importancia (Anexo 03) A referida Antropdloga, coordenou 0 GT que Identificou ¢ Delimitou a TI Jacaré de Sio0 Domingos/PB em 1988, também de indios Potiguara. Hoje, lamentavelmente ja no faz mais parte do quadro de funcionarios da FUNAT. Na ‘Yerra Jndigena POTIGUARA DE MONTE-MOR, Deliuitada com 5.300 ha, estio incluidos trés niicleos de familias que a Comunidade denomina de aldeias: JARAGUAR, LAGOA GRANDE e BRASILIA. As distincias destas localidades até a cidade de Rio Tinto é de aproximadamente 3, 5 e 10 km, respectivamente. A populagdo atual ¢ de 1,082 pessoas, incluindo os nfo indios casados com indios. O Posto Indigena da FUNAL 6 situado no municipio de Baia da Traigdo, na Tl Potiguara, distante 24 Kin de Rio Tinto. Portanto, a assisténcia do 6rgdo tutor a esses indios POTIGUARA DE MONTE-MOR é¢ deficiente. Sendo necessario que a FUNAL tenha servidores especializados mais oat ‘Av. Joo de Barros, 668 02 ‘Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Resife-PE Fone: (081) 424.2144 Fundagao Nacional do Indio. MINISTERIO DA JUSTICA proximos deles, principalmente em casos graves, quando é exigido uma assist@ncia mais rapida Nesta Terra Indigena houve a exclusfio da cidade de Marcagiio, a Vila Regina ¢ a Vila Monte-Mor. A primeira por ser, desde 1994, municipio e as outras duas por constituirem baittos da cidade de Rio Tinto, portanto, consideradas areas de Zona Urbana. Sem esquecer a presenga indigena nessas localidades ¢ diante desses agravantes, a comunidade decidiu excluir 08 pontos acima citados, ficando os indios conscientes de que, a proposta apresentada aqui foi a melhor ¢ mais racional para resolugio da sua situagaio territorial Aptoveitamos a oportunidade para agradecer a colaboragaio de toda a Comunidade Indigena Potiguara de Monte-Mor. Agradecemos, ao apoio fornecido pelo: Chefe de Posto Indigena Potiguara, 0 indio Marcos dos Santos; Advogado da FUNAL ADR/JP, Otavio Uchda; Antropéloga Vania Fialho, ADR/JP, Ivson J, Ferreira, Ana Isabel Brito Leite; Renata Brito Leite; Dr José Americo Barbosa; ¢ em especial a Equipe do GT, que fizeram com que, este Relatorio tornasse uma realidade. §e of 03 Av. Jofio de Barros, 665 Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagfo Nacional do Indio. MINISTERIO DA JUSTIGA 2. HUISTORICO A Historia dos Indios Potiguara na Paraiba pode ser pesquisada ¢ estudada , em Bibliotecas piblicas . Existindo um extensa publicagéo sobre esses indios. Por isso, optamos em apresentar os fatos histéricos resumidamente , nos detendo apenas , aos indios da Antiga Sesmaria de Monte -Mor , deixando o leitor ciente de patte dessa histéria , quando os indios Potiguara foram os mais prejudicados, sem portanto tornar a leitura cnfadonha. A partir do momento que aconteceu a "Descoberta" do Brasil, ou seja, aos primeiros contatos do curopeu com os nossos nativos, acabou-sc 7 paz das nagdes indigenas que aqui habitavam O Sistema de Capitanias Hereditarias, implantado entre 1534 e 1536, quando a Coroa Portuguesa repassava para os Donatarios a tarefa ¢ os custos de promover a colonizagio, teve sua contribuigaio no impacto para destruir os indigenas desta "nova" terra. O conflito maior teve inicio na época em que se instalavam os "primeiros donatdrios, que ndo vinham apenas para tirar pau- brasil, mas sim para aqui se estabelecer e produzir agticar..."(MELATTI. 1977, p. 39). © que se aprende na escola ainda hoje, sobre Capitanias Hereditirias que as Capitanias de Pernambuco ¢ Sio Vicente foram as que mais prosperaram, Se aprofimdarmos a pesquisa neste tema descobriremos que essa "gloria" esta relacionada com a administragao de Duarte Coelho , Donatétio da Capitania de Pernambuco ( que abrangia também o atual Estado da Paraiba ) , caracterizada pela forma violenta da qual dominou os povos indigenas daquela época . {i imteressante observar que existem registros historicos sobre os indios Potiguara habitantes_no litoral Paraibano, e referéncia sobre acidentes goograficos na regio, logo nas primeiras viagens dos Europeus ao Bras 04 Av. Jolie de Barros, 668 Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE. Fone: (081) 421.2144 Fundagiio Naclonal do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA Em 1519, numa publicagio de Lisboa, no mapa "Terra Brasilis" (Anexo 26), aparece a indicagiio da Baia da Traigéo, "A denominagato deste acidente geogrdfico, segundo muitos autores acreditam, se dever (sic) ao fato sucedido quando os portugueses, atraidos a este sitio, foram devorados pelos indigenas que o habitavam ( 1501 ow 1505). ‘ Uma carta de Gongalo Coelho escrita ao Rei de Portugal, em 1549, ja denominava a Costa do litoral paraibano como a ‘Costa dos POTIGUARAS' " (LIVEIRA, 1989,p.3), Em 1575 silo assinalados no mapa do Francés Jacques de Vaux Clay, "as tribos indigenas que podiam auxilid-los, indicando uma enseada, logo adiante de Sdo Domingos" ( Idem). Os Missionaries Jesuitas que vinham para converter os indios a0 cristianismo, chegaram com ‘Tomé de Souza em 1549. Entre os trabalhios desses Missionarios havia o dos aldeamentos estabelecidos no Nordeste. A catequese na Paraiba ocorreu através dos Jesuitas ¢ Franciscanos. E em 1603 ¢ 1605, o franciscano Frei Ant6nio da Estrela esteve ordenando os Potiguara ‘A calequese e 0 aldeamento nao livravam os indios Potiguara das guerras justas, defendidas pela lereja, eles sempre foram resistentes & ‘ocupagdo de suas terras pelos portugueses. "Em 1713 os Carmelitas foram encarregados das aldeias da Baia da Traigéo ¢ Montemor, tendo esta tiltima recebido um contingente indigena transferido pelos Jesuitas do aldeamento de Mamanguape devido a desentendimentos ali corridos entre indios e portugueses" (RODRIGUES, 1992). Na época do Marqués de Pombal (Séc. XVII) ¢ claborado o documento legal mais importante para os indios que foi o regulamento do Diretrio de Indios. Esle documento redigido pelo itmao do Marqués de Pombal (Governador do estado do Maranhtio) foi aprovado pelo rei em 1757, para o Estado do Maranhao ¢ estendido para todo 0 Brasil em agosto de 1758. Av. Jofio de Barros. 68 Boa Vista - CEP, 50.050-00, ife-PE Fone: (001) 421.21 Fundagao Nacona do Indio. MINISTERIO DA JUSTIGA "As leis em que esse regulamento se assentava tinham declarado os indios livres de qualquer tipo de escravidao. ‘Tinham também retirado dos missiondrios, de todas as ordens religiosas, 0 poder temporal sobre os Indios. Além disso, elevava os aldeamentos indigenas a categoria de Vilas ou lugares conforme o famanho que tivessem. O governo dessas vilas € lugares seria exercido pelos préprios indigenas. listimulavam o casamento entre indios e brancos. Aconselhavam a intensificagao do uso da lingua portuguesa" (MELATTI, 1977, p.44). Nos fins de 1834, quando os holandeses se apossaram da Provincia da Paraiba, jé existia uma aldeia de indios Potiguaras em Mamanguape. "Nela se estabeleceram Jesultas, depois expulsos os holandeses, para doulrinarem os Indios jé neste tempo dispostos a receber 0 batismo e edificarem uma igreja gue dedicaram aos apdstolos Sdo Pedro e Sao Paulo. Com o decorrer do tempo fizeram instalar os tndios num alto vizinho do rio que ficava mais perto do mar que a antiga aldeia ¢, em compensagdo da ‘mudanga, foi a nova aldeia chamada Vila com 0 nome de Montemor, ea igreja, de que 0 Orago a Senhora dos Prazeres alcangou o titulo de parochia" ( ADOLPHO. Na pag. 77 do Processo 3669/80). HA noticias de que em 1774, ".. a Vila de Montemor possula doze léguas de largura, confinando ao norte com o rio dos marcos, extremo do Rio Grande, tendo quarenta e quatro léguas de comprimento. As Sesmarias destinadas aos indios Potiguara foram confirmadas pelos alvards de 1785 ¢ 1804"(RODRIGUES, 1992). ‘A chamada "Lei de Terra" que regularizou o regime de propriedade {ettilorial no Brasil apareceu em 1850, Através dela eram divididas as terras do Brasil em duas categorias : "... uma constitulda pelas terras piiblicas que pertenciam ao Histado; a outra pelas terras particulares provenientes de um titulo legitimo de propriedade ou de uma simples posse legalizada, As terras expressamente concedidas aos indios foram consideradas como ierras particulares. Tal providéncia foi prejudicial aos indigenas, pois, nido estando em condigdes de saber o que fazer para promover as medidas necessdrias d consolidagéo dos seus direitos segundo a lei, acabaram em muitos casos perdendo 0 direito que a elas tinham, para 0 que colaborou também a astiicia ¢ md fé de seus vizinhos"( MELATTL, 1977, p. 44). oe os 06 ‘Ay, Joiio de Barros, 668 ‘Boa Vista - CEP, 60.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundago Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA "No relatério da Repartigéo Geral de Terras Piblicas, criada com a Lei G01, de 12.09.1850, estd inclufdo um ‘Mapa Geral das Aldeias’, onde se indica un patriménio indigena inserido em Mamanguape, do qual fasiam parte as aldeias da Bata da Traigao e Montemor. A propriedade de pelo inenos 12 léguas quadradas, ocupada pelos habitantes da aldeia de Montemor é confirmada em 1860, através de um oficio dirigido aquela Repartigao Geral. Lncarregado de realizar a medigido ¢ demareagdo do patrimdnio indigena, 0 engenheiro Anténio Gongalves da Justa Aratjo comunica crt 1866 haver concluldo a demarcagao do perimetro da Sesmaria de sien amon, baseando-se nos marcos de pedra estabelecidas na época da criagdo das sesmarias e doagdo de terras aos indios peto Ret de Portugal. Segundo o relatério do engenheiro (Anexo 27 ) '... esta sesmaria confina a eevinte com a dos indios de S. Miguel da Bata da Traigéo, ao sul com o rio Ntamanguape, a oeste com as terras do Kngenho Camaratuba © Marts Putanga e ao Sudoeste com « ferras chamadas do Morgado...’ totalizando cerca de 13.934 ha. O engenheiro Justa Araijo havia publicado Editais convidando os interessados, indies ou particulares, a apresentarem seus (ftulos (ou outros documentos) comprovantes de posse ¢ direito das terras, aforamento € arrendamento, tendo o prazo expirado em 22.02.1866 Os Indios nao ppossufam documentos a_fim de provar que as tervas eran suas, e muitos ndo ‘compareceram com medo de serem recrutados para 0 servigo da guarda fiactonal, pois o pais encontrava-se em guerra com o Paraguar Dividindo a Grea em lotes individuais, Justa Araiijo promove, en relagda nominal, @ distribuigao de 165. posses aos indios, havendo particulares com Grrendamentos na Sesmaria ¢@ mais de 75 posses demarcadas e nao distribuidas aos indios de Montemor. A divisda das terras da Sesmaria de Montemor em lotes individuais, desrespeitando os critérios culturais de posse coletiva, contribuiu vraisiramente para o esfacelamento do territério indigena, Jé que @ Meer fparte dos ttulos de posse foi perdida com o tempo, ov vos [poucos passot ypara o dominio de terceiras, embora ja aquela época fossem juridicanenye inaliendveis. ow? py. dodo de Barros, 668 o7 Boa Vista CEP. 60,050-000 « Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA Este processo acentou-se(sic) no inlelo deste século, quando Hermann Lundgren decide expandir suas atividades no municipio de Mamanguape. Pretendendo instalar uma fabrica de tecidos no local, a Jamilia Lundgren encaminha para té 0 corretor da fabrica, Artur Barbosa de Gois, que monta uma mercearia no porto do rio Mamanguape e passa a comprar terras na redondeza, repassando-as depois aos irmaos Lundgren. Muitos daqueles titulos doados por Justa Aratijo em 1866, deste modo, acabaram nas méos da familia de Industriais". A fabrica chamava-se Companhia de Tecido Rio Tinto e foi instalada em 1924. (RODRIGUES. , 1992), Hla resistro que "um certo comendador Campélo, homem de grande prestigio politico residente em Mamanguape, pressionava os indios providenciando sua prisdo, negociando em seguida a liberdade em troca do thulo da terra, Teria dessa forma se ‘apropriado' de 30 tinlos, que mais tarde vendera aos Lundgren (AMORIM, 1970). Também a propria Companhia de Tecidos fazia isso. Em 1939, 0 indio Pedro Lourenco foi detido pela policia de Rio Tinto, quando um advogado da Companhia de Tecidos pressionou-o a fim de que assinasse um documento transferindo seu Jote @ empresa" (LINHARES, 1980). .. Os mais velhos contam que a ‘Companhia de Tecido Rio Timo comprava um titulo e tomava dois, trés; aquele que falasse, morria’. im 1932, a vila de Montemor foi invadida por Frederico Lundgren, 0 qual fez uma reunido com os indios, 'colocando para correr' os que insistiam ser, aquela terra indigena." ( Parecer 068/CEA em 22.11.91 -FUNAL p.3 ¢ 4) O indio Leonel Vicente da Paixiio, hoje com 80 anos, nos relatou um pouco dessa historia que foi vivenciada por cle © seus familiares: "-O Coronel Lundgren e seu pessoal torturava os indios, Prendiam os indies por qualquer motivo e & noite quando a familia do desaparecido ia procurar, 0 pessoal avisava que jé tinha soltado 0 indio. E, esse indio, nunca aparecia, muitos morreram na caldeira, lisse pessoal dos Lundgren é coronel sé no capitalismo. Mas, todo mundo chamava eles de coronel Pois bem, 0 Coronel Eduardo obrigou 0 indio a dizer que a terra era da Companhia. Isso era com ameagas, uma arma na cabega do indio. B, 0 Coronel Frederico queria tomar as terras dos Indios ¢ certa vez falou para mex pal, Joao Vicente da Paixdo: '-fale que a terra é minha’, Isso com uma arma na cabega dele, F quando foi a boca da noite ele mandou queimar as cases fa ‘Av, dofio de Barros, 688 os ‘Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Reolle-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagtio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTICA, dos tndios. Os indios se revoltaram, e falavam: '-A mata é dos indios, ninguém bota, abaixo'. E, 0 Tuxaua de Mamanguape, Pedro Belmiro e 0 Tuxaua da Baia da Traigito foram até Getilio Vargas, reclamar com ele pensando que tinha sido ele quem mandou queimar as casas dos indios. Os Tuxaua informaram & Gettlio Vargas que as casas dos indios estavam acabadas ¢ tinham sido queimadas. Com essa noticia, Gettilio Vargas mandou chamar 0 Coronel Frederico Lundgren e mandou que ele fizesse as casas des indios que ele tinha mandado queimar. E nesse meio, 0 Coronel Frederico assentou a Jfébrica, dizendo que as indias iam trabathar na faibrica. As casas foram construidas na Jaqueira e na Vila Regina, Antigamente a rua era toda de casas de patha dos indios. Quando as casas que a Companhia construiu ficaram prontas os indios foram morar nessas casas e ficaram sujeitos aos Lundgren e até pagando pela casa. Nesta época nenhum indio podia tirar nem um garrancho na mata, porque existia uma guarita ocular. Arnilo Costa andava com 0 Coronel Frederico ¢ as torturas contra os fine -s eram muitas,eu mesino, vi um homem morto espetado na grade de fer disse ao meu pai e ele me falou uma coisa que aprendi: '- O que se ver ent terra néo se conta no mar’, E com isso, naquela época fiquei calado. O Coronel Frederico conversando com 0 meu pai, tentando enrolar 0 indio, falava que os indios tinha muita terra boa, E meu pat falava para os indios: '-O Sr. Frederico vai tomar nossas terras'. Um dia 0 Coronel Frederico foi exigir a meu pai sobre os marcos das terras dos indios e perguntou sobre os marcos da Capitania dos Portos. It depois, mandou arrancar os marcos dos indios da Tina até as Pedrinhas. Tudo foi abaixa” . Com esse relato o St. Leonel ficou muito emocionado. of Ay, Jotio de Barros, 668 09 Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Rocife-PE Fone: (081) 421.2144 me Fundagio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA 7 Diante dos fatos, os POTIGUARA DE MONTE-MOR amedrontados, Uispersaram-se, devido as coustautes ameagas ¢ violencias contra eles praticadas, que ultimou muitos dos seus parentes. A revolta ainda & muito presente nos indios, quando esta questio é levantada. Bem, na época a Companhia foi "comprando” aqui e ali e tornou-se, bem dizer, dona de quase tudo, como relata Manuel Correia de Andrade: " A Fabrica de Tecidos Rio Tinto... adquiriu os engenhos que Ihe ficavam nas imediagdes para saciar a sua eterna fome de lenha. Tao extenso é 0 dominio dessa fabrica que abrange todo 0 novo municipio de Rio Tinto, onde, se diz, 's6 0 ar que se respira ndo é propriedade da fabrica' " (ANDRADE. 1957,P.44). "Nao restam diividas, que a divisdo das terras da Sesmaria de Montemor em lotes individuais, propiciou 0 esbulho das mesmas. Quase toda a totalidade dos titulos de posse foi extraviada, estragada ou esquecida. Um exemplo € 0 fato corrido com o pai de Zé Soares, Iider da aldeia de Alagoa Grande que entregara o seu titulo ao Dr. Dustan Miranda, do SPI, que iria encaminhar a Inspetoria de Olinda, a fim de desobrigd-lo a pagar os impostos .O pai do depoente teria dado muitas viagens ao Posto ‘Indigena, sem recuperar o documento de volta, até que 0 juiz de direito fora iransferido de Olinda, perdendo qualquer tipo de contato e esperanga de procurar reaver 0 documento" (SOUZA. 1988,P.17). Os Lundgren ocuparam as terras da Sesmaria de Monte-Mor, pettencente aos indios até os anos 70. Em 1980 essas terras passaram para as ‘cnpresas Rio Vermelho Agropastoril S.A. ¢ Usina Miriri, Assim, pode-se perceber que 0 conflito sempre caracterizou a relagao centre indios ¢ ndo indios na Paraiba. Apesar da violéncia nfo se dar de forma fisica, hd intransigéneia em admitir os direitos originais dos povos indigenas que conseguiram, persistir até os dias atuais “ ol 10 ‘Av. Jofio de Barros, 668 Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundage Nacional do Inco MINISTERIO DA JUSTIA 3. ROTEIRO DA VIAG: Saimos de Recife no dia 04.09.95, com destino a ADR de Jodo Pessoa. Chegando naquela Administrag#o Regional, fomos recebidos com uma noticia nao verdadeira que havia sido publicada no jomnal local " Correfo da Paraiba ", a respeito do nosso trabalho de Identificagio (Anexo 28 ). A repercussiio desta matéria que afirmava, "A FUNAI vai demarcar as terras dos indios..." levou a advogada da Usina Miriri Dra. Madalena Franca, a se comunicar naquela manhd, com a administcador Regional, via telefone, informando de que esta “Demarcagdo" iria ser contestada, Achamos interessante tal situagio tendo em vista tratar-se de assunto futuro, ja que a missiio do GT era Identificar a Terra Indigena e no Demarcé-la de imediato. Apesar disso as atividades de campo néio foram prejudicadas. ‘Apés alguns acertos com a Administrador Regional da FUNAI, Marcos Clemente, sobre 0 apoio daquela Administragio ao GT, nos deslocamos alé a cidade de Rio Tinto . La o indio Vicente José da Silva , Cacique de uma das aldeias , nos ajudava juntamente com alguns indios da Comunidade . Imediatamente fomos até a sua residénoia em Jaraguar, onde aconteceu a primeita reunifio . Estavam presentes indios de outras aldeias como 0 Sr José Gomes de Lima, conhecido como José Soares, representante das aldeias de Lagoa Grande e Brasilia (Fotos n°s 1e2 ). Apés explicagaio dos trabalhos a serem desenvolvidos pelo GT, os indios nos forneceram dados sobre 0 territério pretendido, a ser identificado pelo GT. Nesta reunidio, a comunidade elegeu alguns representantes que iriam ser nossos guias durante a Identificagdo dos limites e do Levantamento Fundiario dos nao indi No dia seguinte 05.09, pela manha , aproveitamos para oficializannos nossa presenga junto as autoridades locais tais como: o Prefeito, o Juiz eb Delegado. A tarde nos dirigimos até a aldeia Lagoa Grande para explicar 0 nosso trabalho, o que ocorreu em reunido semelhante a do dia anterior. Assim ae an ‘Ay. Jofio de Barros, 665 ‘Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagfio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA como a primeira, houve a presenga de indios de outras aldeias (Fotos n°s 3 © 4), O GT percorreu todos os limites da area indicada pelos indios. Com relago ao Levantamento Fundidrio, este nao estava seguindo seu rumo de forma natural, principalmente pela falta de experiéncia da equipe responsavel. Por este motivo, optamos pela inclustio de mais dois técnicos dquela equipe: Denisval Botelho da FUNAI-ADR MACEIO e Luiz Anténio Costa do INCRA/PB (Anexos 04 ¢ 21). Nos dias 15.09 ¢ 16.09 foram realizadas as reuniGes finais nas aldeias de Jaraguar ¢ Lagoa Grande, onde concluimos a Identificagdo dos limites da Terra Indigena pretendida pela Comunidade (Fotos n°s 25 a 30 ). A planta apresentada pelo nosso Eng. Agrimensor, com a proposta indigena foi aprovada e aceita pelos indios presentes ¢ representantes de todas as aldeias, em documento assinado por eles (Anexo 33 ). A Comunidade Indigena residente na cidade de Marcagiio esteve presente na reunidio da aldeia Lagoa Grande, concordando com a exclustio daquela cidade através de documento, onde estes, ao assinarem, se comprometeram em sendo a Terra Indigena POTIGUARA DE MONTE-MOR Demarcada, dar o direito aquelas familias indigenas a utilizago de um espago para fazerem suas rogas, de onde tirariam 0 sustento (Anexo 34 ). : © Estudo Antropolégico, assim como 2 Identificagiio ¢ Delimitagto, se encerraram no dia 19.09. Neste dia o GT foi até Jo&io Pessoa para acertar as metas de apoio na continuagio do Levantamento Fundiério ©, a Coordenadora do GT ¢ o Eng. Agrimensor retornaram até a ADR de Recife (Anexo 09). : Novamente com o apoio da ADR de Jo%o Pessoa, 0 Levantamento Fundiario continuou na area até a conclusio das suas atividades de campo. re 12 Ay. Jodo de Barros, 688 Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagéo Naclonal do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA 4. INICIO DO PROCESSO DE LUTA DOS {NDIOS POTIGUARA DE MONTE - MOR , RIO TINTO /PB ‘A luta desses indios de Monte-Mor deveria ter sido uma imica, iniciada em 1985, seguindo seu caminho para ser Identificada pela FUNAL, juntamente com a TI Jacaré de Sao Domingos em 1988. Mas no foi dessa forma que aconteceu, devido a conflitos internos, ‘Através da Historia desses indios, se tem certeza de que cram duas Sesmarias de indios Potiguara: Uma na Vila de So Miguel e a outra na Vila de Monte Mor. A Vila de Monte Mor inclufa em seu territério, a TI Jacaré de Sao Domingos ¢ a Identificada por este GT. Atualmente, so trés Terras Indigenas distintas de indios Potiguara: a TL Potiguara com 21.238 ha, Demareada e Homologada em 29.10.91 (Dec.267); TI Jacaré de Si Domingos com 5.032 ha, Homologada pelo Dec, de (1.10.93; ea Tl POTIGUARA DE MONTE-MOR, Identificada por este GT com 5.300 ha. Sobre © processo de reivindicagiio da terra, o indio Vicente José da Silva, que se apresentou como sendo Cacique de uma das aldeias da TL ‘Monte-Mor nos informou que: "Tudo que eu faco a Associagio vem tirando. Sempre estou lutando pela terra do Indio. lles estao me criticando 0 tempo todo. Estou enfrentando para defender a terra. Nao vou pedir nada na casa de ninguém e nunca pedi nada d ninguém. Na viagem para Brasilia pedi a meu povo. ‘A minha luta é igual a de Noé ( da Biblia). Eu venho chamando esse povo todo, mas ninguém acredita na lula pela terra. e ¢ 13 ‘Av. JoBo de Barros, 658 ‘Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundago Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA Em 1983 eu jd estava morando aqui, quando tiraram as picadas da Terra Indigena Potiguara. Ii também, quando, aconteceu a morte de um Agrénomo da Companhia, ld na Lagoa Grande (foi um indio quem matou, disseram que 0 homem era fitho de um Coronel). Bem, nesse tempo fiquei com Seu Domingos (Lideranga Politica da ‘Il Jacaré de S. Domingos), Iutando pela terra. Foi em 1985. Conversando com Daniel que & Cacique, ele me disse que tinha os documentos da terra e ia me entregar, para que isso ajudasse a nossa luta. E eu fui e adquiri 0 documento. Depois, fui com Seu Domingos e José Augusto ( indio de Tramataia) lutando pela terra. Até que o Delegado que se chamava Vicente, pediu os documentos para tirar xerox e lutamos pela Vila Monte-Mor com Jacaré no meio. Em outubro de 1983 fomos a Brasilia eu, Seu Domingos, Batista e mais duas pessoas da aldeia de Sao Francisco. No dia que chegamos na FUNAL, nézo foi posstvel falar com o Presidente e ele marcou para que (fossemos outro dia. Em 1983 a FUNAL ficou em greve e ficou tudo pra ld. E ‘a {uta continuava. Tivemos uma problema com Elita que & india. Bla comprou um pedago de terra e saiu de Jacaré. Saiu de ld e foi para Marcagao. Depois Seu Domingos e outros indios descobriram a casa que estava ruim e podia acontecer um acidente e isso fez com que 0 Seu Domingos fosse processado. liu dei o depoimento sobre a melhora da casa para uma ‘reunido. Com isso 0 Seu Domingos ficou indiferente comigo. E foi para Brasilia sem a minha presenga e levou 0 documento, Ld ele pediu ao Presidente para Demarcar em Jacaré. O Presidente disse para Demarcar a Vila Monte-Mor, mas isso n&o aconteceu. Sé fizeram Jacaré. Quando Seu - Domingos chegou, ele disse: '-Agora s6 quero 0 pessoal daqui porque os de Id nao me ajudaram' Av, Jofio de Barros, 668 14 Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagp Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA Fui conversar com Seu Domingos porque ele & quem sabe quantos Indios tem para se-ajuntar. Com os indios unidos fica mais fécil para Demarcar a terra toda, E depois vim para casa. ' José Augusto de Tramataia foi ler 0 documento na rua aqui em Jaraguar. Tinham umas 30 pessoas que ficaram satisfeitas com as noticias sobre a terra. Nisso, chegou um portador de Seu Domingos que mandou dizer que ndo era para 0 pessoal ir para a reuniéio Id porque ndo queriam ninguém daqui de Jaraguar porque ndo tinham ajudado na lula da terra. Com essa noticia eu disse ao portador: '-Vocé vem me dizer que ninguém ajudou? Liu ajudei de tudo ¢ com todos os documentos da terra. Se for s6 para mim ir para a reunido e nao ir mais ninguém daqui, eu também ndto vou’ No Domingo fui lé tomar satisfagdo com Seu Domingos. E disse a ele: ‘-O senhor nao vai dominar tudo’. Depois, eu fui para Jodo Pessoa e falei com Marcos Clemente ¢ conversei com ele sobre a nossa terra, ile me prometeu que iria tirar 0 restante da terra. E me disse que eu fizesse um abaixo assinado, pedindo para tirar a terra de Monte-Mor. Neste tempo, 0 pessoal daqui estava satisfeito e recolhi umas 300 assinaturas e levei tudo para Id em Jodo Pessoa. Marcos disse desta vez, que o trabalho ia chegar. Em junho de 1993 levamos um documento. ao Procurador da Repiiblica pedindo que ele ajudasse nessa luta, requisitando @ FUNAL a Identificagazo e Demarcagao da Vila Monte-Mor (Anexo 35 ). E também em agosto deste ano, mandamos uma carta para o Presidente da Repiiblica Dr. Hamar Franco que nos respondeu através de um telegrama informando que o nosso assunto foi encaminhado para o Minisiério da Justica (Anexo 36). Em novembro recebemos uma carta da Dra. Isa, de Brasilia, informando sobre o trabalho (Anexo 37 '). E no meio de novembro de 1993, ‘Ay, Jofo do Barros, 688 15 Boa Vista - CEP, 60.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundago Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTICA Jjuntei umas 30 pessoas e fui com 0 dnibus da Prefeitura até a FUNAI em Jodo Pessoa. E Marces me prometeu o trabalho para fevereiro. Nisso, chamet‘o pessoal para fazer um levantamento dos marcos. E, em abril, Marcos Clemente mandou me dizer que tinha chegado o resultado de Brastlia e o trabalho passou para 0 outro ano. Em fevereiro de 1994 tiramos a xerox dos documentos e falamos com a Dra. Isa em Brasilia. E ela prometeu que naquele ano fazia 0 trabatho da Vila Monte-Mor. Dessd vez, em Brasilia, fomos conhecer o presidénte da FUNAI. Nés conversamos com ele que perguntou se nds esidvamos satisfeitos. Dissemos a ele que tinhamos comida, uma batata doce, uma macaxeira, mas que nos precisava da nossa terra, isso era muito pouco. E falei para ele que ia fazer ‘um levantamento para saber quantos indios tem aqui. Chegando aqui, convido esse povo toda para contar 0 que se passou em Brasilia com o Presidente da FUNAI e dizer para os indios o que 0 Presidente me disse sobre a terra e poucos me ouviram". ‘A luta desses indios contou também, com a colaboragao da FETAG- Federagao dos Trabalhadores na Agricultura do Estado da Paraiba e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rio Tinto que, através de oflcios do Presidente da FETAG/PB ao Ministro da Justica, ao Presidente da Republica, a0 Presidente da Camara dos Deputados, 20 Presidente do Senado Federal, a0 Superintendente da FUNAI, além de outras autoridades ( Anexos 38 © 39), solicitaram 0 empenho desses representantes para que os trabalhos de Demarcagdo das Terras dos POTIGUARA DE MONTE-MOR fossem executados. Uma das respostas aos oficios foi enviada aos fndios, pelo INTERPA/PB- Instituto de Terras ¢ Planejamento Agricola do Estado da Paraiba, em margo de 1995, informando que, através de contatos_mantidos com a FUNAVADR de Jodo Pessoa, os trabalhos itiam se realizar em 1995 (Anexo 40 ). Finalmente , em setembro de 1995 , foi constituido o GT para dar prosseguimento a reconquista das TERRAS POTIGUARA DE MONTE- ‘MOR. a 16 ‘Ay. Jofio de Barros, 668 Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTICA 5. IDENTIFICACAO Nas primeiras reunides com a Comunidade hridigena, apés.a explicagiio dos nossos trabalhos, foram indicados pelos indios, os seguintes pontos limites daquela Terra Indigena: Camboa da Pina, Vila de Monte-Mor, Rio da Preguiga e Vila Regina. Desta maneira, ficaria fora, parte da cidade de Rio Tinto, ‘As primeiras reivindicagdes dos indios foram: "Nés precisamos da Vila de Monte-Mor. A Vila de Monte-Mor é dos Indios que moravam em suas casinhas de patha que 0 pessoal da Companhia mandou queimar. A Igreja de Monte-Mor também é nossa". Desta forma ,os indios explicaram que na Vila Monte-Mor, hoje conhecida como Vila Regina ,esté localizada a Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres ¢ o antigo Cemitério Indigena, no local onde é hoje o campo de futebol. Atualmente , a antiga Vila de Monte-Mor, pertence aos Potiguara ,e ¢ um bairro da cidade de Rio Tinto, com um grande contingente de no Indios, além de escolas, clubes, farmacias, padaria e casas comerciais que atendem , de uma maneira geral a comunidade da cidade de Rio Tinto, incluindo indios endo indios. Foi alertado para a Comunidade Indigena pelo GT, que esta situagio poderia dificultar 0 processo de regularizagao desta TI. Alertamos aos Potiguara, da problemtica que existe quando em territérios indigenas encontram-se localizados atualmente povoados, cidades e sedes de municipios. Sao aspectos importantissimos a serem considerados, quando se trata da luta por territérios indigenas no Brasil, Estes pontos foram colocados pelo GT, para reflexfo naquela reunido e om outras que aconteceram mais tarde, pois poderiam significar a néio aprovagao de uma proposta indigena ou que, as etapas administrativas nao transcorressem com rapidez. Citamos exemplos de trabalhos anteriores. Mas, se esta questio de incluir ou excluir tal localidade fosse uma reivindicagao indigena, ela seria respeitada ¢ incluida no relatério. Logo se falow na inclusiio ou exclustio de lugares como Brasilia, Lagoa Grande ¢ Marcagao, onde existem familias indigenas Potiguara residentes: Localidades estas, que foram excluldas pela TI Jacaré de Sto Domingos, como nos felatou a Antropéloga Vania Fialho em seu trabalho. oe Ay. Joti de Barros, 688 a7 Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundago Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA "Segundo os préprios indios, esta delimitagdo deixaria de fora lugares como Marcagao, Brasilia, Rio Tinto, Mamangnape, Vila de Montemor, Alagoa Grande, Vila Regina. Quanto & Mareasdo, Brasilia ¢ Alagoa Grande, apesar da presenga dos remanescentes ndigenas, ndo Joram incluidas na drea, por opgio da Comunidade de Jacaré de Sao Domingos; segundo integrantes daquela Comunidade 'ndo & justo, dividir com aqueles que ndo lutaram pela terra’ ." (SOUZA. 1988,p.16). A intengio do GT é de colaborar para que a Comunidade administrarem os conflitos internos que ocorreram € lutem unidos, voltados para um dnico fim: a conquista do Territério Indigena. E neste aspecto que concordamos com o Parecer 068/CEA em 22.11.91, quando na pagina 7 se reporta a Delimitagiio de Jacaré de Sio Domingos. "Os que ficaram de fora da delimitagao, também por causa de conflitos internos do grupo, precisam de terra para sobreviver tanto quanto os indios incluidos na drea indigena” Todas essas questdes foram discutidas por componentes de todas as aldeias incluindo Vila Monte-Mor ( ou Vila Regina), Marcagio, Brasilia © Lagoa Grande. No final, 0 que estaria incluido excluido dentro dos limites da Terra Indigena apoiado pela maioria da Comunidade foi o seguinte: ‘As aldeias da Lagoa Grande e Brasilia estariam incluidas. Quanto a Vila Monte-Mor (ou Vila Regina) e a cidade de Marcagao, estas seriam excluldas, exceto a igreja da Vila Monte-Mor Foto n° 10), A maioria da Comunidade concordou com esta opedo, por ser hoje, a primeira, wn bairro da cidade de Rio Tinto, ¢ a outra, pela Lei 5.913 de 29.04.94 passou a ser municipio. Dessa forma sio consideradas Areas de Zona Urbana, Sem esquecer que a cidade de Marcagio seria um espago dentro da Proposta Indigena sem pertencer aos indios. Caso semelhante ao que acontece com a cidade de Baia da Traigao e a TI Potiguara. Os indigenas que foram indicados pela Comunidade para acompanhar na identificagdo dos limites foram: Vicente José da Silva (Cacique da aldeia de Jaraguar), AutGnio Gomes dos Santos (residente na Vila Monte-Mor) e. Jaime Gomes dos Santos (Aldeia Lagoa Grande). se oot Av, Jodo de Barros, 688 18 ‘Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagiio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTICA _ Foram visitados alguns marcos que fazem parte da T1 Delimitada e que so fronteiras com as Terras Indigenas ja Demarcadas, Potiguara ¢ Jacaré de Sao Domingos. O primeiro foi o MARCO DAS PEDRINHAS (Foto 1° 5 ) ficando bem préximo a Vila Monte-Mor ¢ aldeia Jaraguar. Saido do Marco Das Pedrinhas, segue pela rua do Porto de Marcagiio, em seguida pegando a estrada que vai para a Baia da Traigiio e mais adiante entra a direita como quem vai para os 3 Rios. LA fica facil de envontrar 0 pé de SAPUCAIA (Foto n° 6 ), Conforme informagao dos indios. Existe uma lenda com esta planta que diz: Um companheiro chama outro para ir comer um fruto da Sapucaia, que é um coquinho. Depois de saciarem esta voutade, eles tém que sair do local sem chamar 0 outro, porque se falarem, um com 0 outro, chamando para irem embora, conta a lenda que cai todo 0 cabelo . Petguitei se jé havia acoitecido isso com alguma pessoa e eles me responderam que nfo. “Até haje nunca caiu cabelo de ninguém, mas também nao conhego um que quis experimentar. Todo mundo tem medo de perder os cabelos", Para se chegar ao marco do GURUBU tem que seguir pela estrada da Barra. Este marco ¢ da FUNAI (Foto n° 7 ), fazendo divisa com a TI Potiguara e préximo da TI Jacaré de Sao Domingos. O quarto marco foi 0 JACARAU, seguindo pela estrada de Jacarait (Grupiuna e Caboré) vai encontrar a BR 101 no sentido da cidade de Joao Pessoa (Foto n° 8 ), Este ¢ 0 limite com a TI Jacaré de Sao Domingos. Nas proximidades do municipio de Mareagao, foram os nossos guias, os indios Marcos Padilla ¢ sua esposa Josenice dos Prazeres Silva, eles residem em Matcagao e ela é professora daquele municipio. Com eles, percorremios os limites do municipio de Marcag&o por onde passard a linha divisoria (Foto n° 9 ) ‘A Identificagao esté melhor representada na Planta de Delimitagao que acompanha este Relatério. Veja em croqui (Anexo 41), 0s marcos por nés visitados. oot ‘Av. Jofio de Barros, 668 19 Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 ( i Fundagfio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTICA 6. SITUACAO ATUAL DAS ALDEIAS A Comunidade Indigena POTIGUARA DE MONTE-MOR 6 formada por trés aldeias: Jaraguar, Brasilia e Lagoa Grande. A populagiio atual das aldeias é de aproximadamente 1.082 pessoas, distribu(das entre 255 familias. O modo de vida das aldeias diferenciado de acordo com as necessidades que passam cada uma em particular De wma maneira geral a sobrevivéncia desses indios esti relacionada a utilizagao de sua mao de obra nos canaviais da regio e também 4 pesca. ‘A desnutrigdo ¢ a fome se fazem presentes entre os indios de todas as aldeias. Para se conhecer melhor 0 seu modo de vida abordaremos separadamente a situagio das aldeias xo 3 é 20 ‘Av. Joo de Barros, 668 ‘Boa Visla - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagho Nactonal do Indio. MINISTERIO DA JUSTIGA ALDEIA JARAGUAR A aldeia Jaraguar esta localizada a aproximadamente 3 km da cidade de Rio Tinto. Através de dados fonecidos pelos indios do local, hi 172 familias tolalizando 711 pessoas, Neste mimero, estiio incluidos os casamentos interétnicos principalmente de nfo indios com indios. Conforme a propria Comunidade, atualmente existem apenas 15 familias de ndo indios, perfazendo um total de 72 pessoas que também habitam naquela aldeia, Estes dados podem ser observados na relagio de indios ¢ néo indios que foi elaborada pelo Sr. Severino dos Ramos, atual Presidente da ASSOCIAGAO COMUNITARIA DOS PESCADORES DE JARAGUAR , eleito pela comunidade (Anexo 29). ‘As familias nucleares sao numerosas e compostas pelo pai, mae, filhos ¢ algunas vezes agregados. Esses agrogados podem ser sogros, sogras, tios e primos ou mesmo, um amigo sem qualquer relagao de parentesco. O Sr. Vicente José da Silva, nascido na Vila de S40 Miguel, se apresentou como Cacique e Pajé da aldeia Jaraguar. De acordo com seus depoimentos, ele se considera Cacique devido as sua batalha pela reconquista do Territério Indigena, o que é reconhecido por parte do grupo. Hoje, percebe-se divergéncias dentro da aldeia. E patte das familias est vinculada a Associagaio dos Pescadores que foi instalada no local ha 2 anos e, 0 Sr. Vicente ¢ o Presidente da Associagéo ainda nfio comungam de um mesmo ideal Sera de extrema importdncia a unio interna entre os lideres da aldeia Jaraguar pata se obter com sucesso a aprovagio da Proposta para a Terra Indigena POTIGUARA DE MONTE-MOR em Rio Tinto/PB. Durante algumas reunides com aqueles indigenas, 0 GT tentou chegar a um acordo entre as partes, Sr. Vicente José da Silva - Cacique ¢ 0 Sr. Sevetino dos Ramos - Presidente da Associagao Comunitiria dos Pescadores de Jaraguar, Mas, lamentavelmente nao houve éxito. No més de dezembro,,. oat Av. Joao de Barros, 668 au Boa Visla - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 FFundagfio Nacional do Incio MINISTERIO DA JUSTICA tomamos conhecimento através de correspondéncia enviada pelo Sr. Ramos, de atitudes do Sr. Vicente. (Anexo 42). Por este motivo, atendendo ao convitle do Dr. Eduardo Carvalho, Juiz de Direito em Rio Tinto, participamos de uma reunifio no Forum daquela cidade. A nossa presenga foi de grande importéncia porque tivemos oportunidade de explicar, mais uma vez, as elapas do Proceso Administrative quando da Demarcagdo de Terras Indigenas. 5 provavel que através de reunides, a propria comunidade, apresente 08 lideres que possam representé-los politicamente, independente daquelas liderangas mencionadas acima. As casas dessa aldeia, stio bastante proximas umas das outras, formando ruas, ¢ foram construidas pela Companhia de Tecido de Rio ‘Tinto. Na época, em que essas casas eram de dominio daquela Fabrica, muitos indios tinham que pagar pelo usufruto, Hoje, elas esto nas miios dos Usineiros e, conforme depoimentos dos indios, foi dispensado o pagamento. Ha energia elétrica nessas casas. A escola e as professoras da aldeia sto mantidas pela Prefeitura de Rio Tinto, Ha também uma Casa de Farinha, pertencente ao Sr. Vicente, que atende a todos da comunidade . Segundo o depoimento desse indio, para usuftuir da Casa de Farinha, é necessario que se pague pelo dleo do motor. A forma de pagamento é, para cada “cuia” de farinha , siio nevessarios 2 litros de éleo," les preparam a mandioca, rapando tudo. Isso ndo tem hora para terminar. O restante € feito pelo meu pessoal que fica na Casa de Farinha e no final é sé secar no forno. Este trabalho é de 2° feira em diante, descansando um dia para ser lavado no local": Junto ao Grupo Escolar e a Sede da Associagio de Pescadores, localiza-se a igrejinha de Sido Sebastido. O Pe. Joao, sacerdote em Rio Tinto, vai todo 3° domingo de cada niés, celebrar missa. A maioria da populagio local é catolica. Conversando com o Sr. Ramos da Associag&o de Pescadores, ele nos informou que junlamente com sua esposa desenvolveu um trabalho de evangelizagao catélica com a Comunidade. Cabe a ele orientar os adultos e a Maria José, sua esposa, catequizar as criangas. 5 ew 22 Av, Joo de Barros, 668 Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Reolfe-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTICA A Festa Catolica mais importante na aldeia de Jaraguar ¢ 0 dia de Sa0 Sebastido, comemorado em 20.01. O Pe. Jodo vem até a igrejinha, celebrar missa, batizados, 1° comunhfo, casamentos ¢ hé também a procissio em Homenagem ao Santo. Porém, a tradig&o religiosa mais importante para os indios POTIGUARA DE MONTE-MOR esta relacionada a festa de Nossa Senhora dos Prazeres, cuja igreja localiza-se na Vila Regina, Esie ano (1995) foi comemorada nos dias 22, 23 ¢ 24 de setembro. Quando se toca no assunto referente a esta igreja, 05 indios ficam cemocionados, relembrando as tradigSes dos antigos. O Sr, Vicente acrescentou que, "todo ano se arrecada dinheiro para a festa da Santa ¢ este ano, vamos brincar um ‘Toré'" @ ainda nos relatou 0 seguinte “Naquele tempo existia um quarto na igreja que, todos os couros secos eram guardados Id. Iva brincadeira dos meninos era pegar us couros secos e sair correndo, arrastando pelo chao. Um sala na frente ¢ as outras criangas atrds naquela gritaria. Isso era uma festa para a meninada. ‘A uma certa hora, 0 padre dizia: Pare meu filho'. E quando os meninos paravam, o sangue estava escorrendo do couro e um dos meninos apanhava 0 Cord@o de Sdo Francisco para amarrar no local onde 0 sangue estava correndo, I’ quando amarrava, 0 sangue parava de correr do couro" Hoje, as brincadeiras das criangas so aquelas comuns da regio, bola de gude, pega ( ou tica), quebra panela, corrida de saco, passa 0 anel, entre oulras, O Sr. Ramos da Associag&io nos informov que de vez em quando, vio a praia: "Nés fazemos viagens de Onibus. Um dia desses fui com as professoras levando um énibus de criangas para uma prata no Kio Grande do Norte, foi bom. A garotada gostou muito. Jd as mocinhas gostam mesmo é de namorar, E para os adulios, a brincadeira & um baile, um danga, nos brincamos até a hora que a gente ve que dé para brincar. As mulheres fazem as comidas ¢ os homens levam a bebida, 1: bota misica para se Gangar. As dangas que tinham antigamente era Danga da Ciranda, Boi de Reis, Coco de Roda, Hoje a televiso acabou com tudo, porque as novas geragdes ndo querem saber mais das coisas ios antigos, ‘da tradigdes. listé ‘tudo modificado. A danga que temos hoje é 0 forré". 3° of Av. Jodo de Barros, 668 2B ‘Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagio Nacional de Indio MINISTERIO DA JUSTIGA Os casamentos sido celebrados em Rio Tinto, as 9 horas ¢ a festa de comemoragaio. 6 um almogo. Segundo Sr. Vicente, o pessoal de Jaraguar comega a viver junto, sem casamento. Porque os casamentos so poucos. Mais, quando acontece, "Os noivos convidam para 0 sew casamento, muito tempo antes, e também convidam os padrinhos. No dia do casamento, 0 noivo entra na igreja com a madrinha e a noiva com v padrinho. Depots da ceriménia, tem a festa na casa do pat da noiva. I se 0 cabra tiver condigdes financeiras £ um almoco que tem muita comida e bebida, Geralmente tem carne de peru, porco, farofa, arroz, macarrito, verdura. A bebida & vinko, cerveja, Coca-cola, Pepsi, cachaga. Ea misica 6 de radiola. Antigamente, a miisica era fole, sanfona, rabeca, viola e viola. E no meu tempo, para se namorar, os rapazes iam a boca-da-noite, conversar com as mogas e pedia ao pai para namorar, marcando o dia de pedir a moga em casamento, Se ela quisesse, sala avisando ao pessval do casamento, jd convidando para aquela cerimdnia. No dia marcado ia tudo amontado @ cavalo, A noiva ia na garupa do padrinho @ voliava na garupa do noivo, quando chegava, pedia a béngéio aos pats da noiva e também aos pais do noivo, ‘A mae da noiva se agarrava com a filha, chorando porque a filha ia sair de casa". Afirmou ainda que os casamentos de hoje no estéio dando corto "porque as mulheres ndo querem obedecer aos maridos. O easamento ‘56 dé certo se liver a consideracdo, unio ¢ o respeito. O padre nao faz viver bem e o juiz também ndo faz viver bem". Conforme depoimento do Sr. Ramos da Associagio, na aldeia tem artesanato com capim, junco , bambu e cipé. Todos traballam . Homens, mulheres ¢ eriangas, Confeccionam balaio, samburd, cesta, cayu, colchio de capim e cesto para botar roupa. Parte destes objetos sfio para consumo proprio e 0 restante ¢ vendido aos sébados, na feira de Rio Tinto ‘A saiide é um ponto importante na vida desses indios. As doengas mais comuns sao a desnutrigiio,problemas circulstérios como trombose € problemas com a coluna eo oft ‘Ay. Jolie de Barros, 688 Boa Vista - CEP. 50,050-000 - Recife-PE Fone: (081) 424.2144 c Fundagio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTICA Hoje existe a presenga de agentes de saiide desenvolvendo um projeto que vem sendo acompanhado pelo Ministério da Saiide. onde, pessoas teinadas, vio de casa em casa, ensinando as mies a cuidar dos filhos, utilizando plantas medicinais. Segundo informagdes, ha projetos de uma horta comunitéria onde serio plantadas ervas medicinais e hortaligas, para utilizagio na merenda escolar e para o consumo das fanilias locais. ‘A grande maioria dos indios, conhece os "matos que servem para remédio". O Sr. Vicente nos informou que o "mato" conhecido por "Carrapicho Danta" é um excelente anti-inflamatério, ¢ dele se extrai uma goma (p6) fininha, avermelhada, que serve para qualquer tipo de corte ou ferimento de dificil cicatrizagao. ‘Também, hé pessoas que tam o poder de curar através de oragdes. Sdo chamadas de "rezadeiras de olhado", D. Maria Sivuca, Maria José (esposa de Manu) algumas outras t@m este dom. O Sr. Vicente € o "curador" mais procurado, Conforme seu depoimento, ele "benze" de "olhado", "amo" (explicou que é quando o ar que o vento tras, afeta a pessoa) ¢ do “espirito” (porque ha gente que tem o corpo aberto para receber espiritos). Este dom se manifestou nele desde crianga: "Aprendi as oragdes com os mais velhos, isso eu tinha 5 anos e fui aprendendo de tudo. Hoje, peso a Deus para me acompanhar nesta misao". Contou-nos que com 10 anos de idade, afastou o “espirito mau" de umn info seu. "Hoje en boto minha mao em cima do caboclo e o espirito que estd atrapalhando sai. Por aqui, tem gente que reza sé de olhado, como jé disse, rezo de toda qualidade de doenga’. Nos casos mais graves de doenga, quando ha necessidade de socorro inédico, as pessoas vio para o hospital em Rio Tinto, ¢ os partos geralmente ocorrem em Rio Tinto. Nos casos de morte de um {ndio, o sepultamento é semelhante aos dos regionais. O enterro acontece no cemitério de St? Ant6nio que fica na Vila Monte-Mor ( ou Vila Regina). O cemitério esta localizado fora da area od ‘Ay. Joiio de Barros, 608 ee Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Reoife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagéo Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA Identificada como Terra Indigena. Onde hoje ¢ 0 campo de futebol, proximo aigreja da Nossa Senhora dos Prazeres, era 0 cemitério dos indios, que ficou fora da proposta da TI POTIGUARA DE MONTE-MOR. O Sr. Vicente acrescentou ainda que, quando morre alguém fica dificil de chamar um padre para fazer a “encomendago" do corpo. Os inidios sto enterrados sem ter ocorrido ceriménias como no caso dos nfio indios. Com 8 dias ou 15, a familia daquele que falecen fala com o padre para rezar uma missa em sua homenagein. "De primeiro se cantava a Inceléncia e botava o defunto na sala. Tinha uma india que rezava e oferecia as rezas e outras indias firavam as oragdes. Uma das estrofes da Inceléncia dizia o seguinte: ‘Ou alma tu vais para o Céu Um Anjo vai te levando De tudo vai se esquecendo, E 86 de Deus vai se lembrando' E repetia esta oragao até 12 anjos. Nisso, ficava-se contando estérias até passar a noite, ¢ 08 homens bebiam cachaga. Quando amanhecia o dia ¢ chegava a hora de levar para se enterrado, (Antigamente os defuntos eram enterrados dentro de redes) sata na carreira, gritando pelo meio do povo ' gjude ao irmdo das almas', isso com 0 morto dentro de uma rede, pendurado numa vara, sendo levado por dois homens". ‘A.cconomiia desses indios est relacionada ao cultivo de suas rogas de feijo, macaxeira, batata-doce, banana e mandioca (amazoninba, passarinha, estoura-fé, alandi e rosa branca - tem duas delas que ‘a massa rende bem para se fazer a farinha). A mandioca 6 mais usada para o fabrico de farinha tanto para o.consumo proprio como para comercializagio na Feira de Rio Tinto. A pesca no mangue que também se constitui uma das principais atividades , pode ser de caranguejo, camardo, ostra ¢ peixes como Amoré, Bagre, Curima, ‘entre outros, Na maioria das vezes , € para consumo ‘proprio. ae Av, Joo de Barros, 688 26 ‘Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagle Nacional do Indio INISTERIO DA JUSTICA, Conversando com Sr. Ramos, da Associagio de Pescadores de Jaraguar, ele nos informou que existem projetos para beneficiamento dos pescadores, Um deles é a compra de redes para se pesear, além da aquisigio de freezers para armazenar o peixe ¢ ainda, projetos para incentivar 0 pessoal naretirada da came de caranguejo. : Destacamos como outras atividades econémicas desenvolvidas pelos indios, a mao de obra para Usineiros da regio. Homens e mulheres trabalham na cana, ganhando em média, R$ 24,00 por semana (Set./95). As usinas que oferecem trabalho siio: Japungu, Miriri, Agican e Monte Alegre. Segundo 0s indios, "é muito trabalho para pouco dinheiro. Além de passar 6 meses com comida na mesa e 6 meses passando fome" As fruteiras da aldeia, servem apenas para 0 consumo proprio, jambeiro, a mangueira e outras, Entre 0 criatério de animais, encontramos bois, galinhas, coellios, porcos e antimais domésticos como o eachorro, passarinhos, ete. Finalizando, gostariamos de registrar duas lendas que foram contadas pelos Indios Sr. Leonel Vicente da Paixio e 0 Sr. Vicente José da Silva. A primeira é sobre a cachaga, bebida extraida da cana. "A cachaga era conhecida com endoida juizo ( bebida que o diabo temperow). Conta-se que antigamente a cachaga era bebida por todo mundo. Neste tempo, néo existia doenga. Mas, o diabo preparou diferente a tal bebida., Quando Deus provou, achou diferente ¢ perguntou: '-O que foi que botaram aqui? Essa bebida vai ser chamada de endoida juizo. E eu ndo mando beber, beba aquele que quiser, porque o esplrito fica doido'. Hi desse dia em diante, foi 0 diabo quem ficou preparando a cachaga" ‘A segunda é sobre um caboclo que de viagem, "pediu um rancho na casa de um branco. O branco concedeu a dormida apenas alertando 0 caboclo que tivesse cuidado com a cruviana, ‘Cuidado que mais tarde corre uma cruviana', O caboclo, caitado, ndo sabia o que era uma cruviana e ficou cismado. De repente, no meio da noite, 0 caboclo viu passar uma oe? Ay, Jodo de Barros, 668 2 Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagiie Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA besta (égua) ¢ no esctiro ndo deu para ver o que erae ele pensou: ‘Deve ser a cruviana’, Li passou fogo no animal. Quando 0 branco viu que 0 caboclo linha matado o seu animal, reclamou muito. Ato caboclo falou: '-Foi vocé que disse para ter cuidado com a cruviana!’, Entéo 0 homem branco acrescentou: '-A cruviana é 0 frio'." a en” 2B Ay, Jodo de Barros, 668 Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagio Nacional do Inaio MINISTERIO DA JUSTICA 6.2 ALDEIA LAGOA GRANDE A aldeia Lagoa Grande esta localizada a, aproximadamente, 8 Kin da cidade de Rio Tinto. A distancia dessa aldeia até Jaraguar & de 5 Kn. Os dados do Levantamento de Familias (Anexo 30) foi elaborado pela Coordenadora do GT com a colaboragiio da india Sandra Gomes de Lima, filha do Sr. José Gomes de Lima, conhecido como José Soares, lider desta aldeia. O Sr. José Soares vem assumindo 0 cargo de Lideranga da Lagoa Grande jé ha algum tempo. O Relatorio de Identificago da TI Jacaré de Sio Domingos, cita o Sr. José Soares como Lider da Lagoa Grande. Os indios dessa aldeia confiam no seu trabalho em beneficio das familias, respeitando a sua opinifio para os problemas Atualmente 0 Sr, José Soares ¢ também responsdvel pela aldeia de Brasilia e responde pelo acordo firmado com o indios que residem na cidade de Marcagiio. O seu contato com o Sr. Vicente, da aldeia de Jaraguar, sempre foi amigdvel e entre eles hi um respeilo métuo pelas responsabilidades de cada um para com os seus seguidores. Hoje, a populagdo ¢ de 242 pessoas, perfazendo ui total de 50 familias. Deste némero, 19 familias so de casamentos interétnicos. Geralmente as familias siio numerosas e constituidas de pai, mae, filhos ¢ algumas vezes, agtegados ( avd, av6, tios, primos, sogros ¢ amigos). ‘As residéncias stio muito simples, construidas de taipa. Nesta aldeia no ha energia elétrica e nem Agua encanada, O abastecimento d'agua para consumo é através de um rio que corre ptéximo as casas. A agua que serve para beber ¢ recolhida de madrugada, antes das 5 horas, porque, neste horario, ainda nfo aconleceram os banhos das pessoas ¢ também nao se Javou roupa, Nas casas no hi filtros d'agua _¢ bebe-se a agua sem sor fervida, O abastecimento d'égua nas casas é tarefa feminina. we ‘Ay. Jofio de Barros, 668 29 Boa Vista - CEP. 60.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundago Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA Um problema que preocupa o Sr. José Soares é a educagio escolar das criangas. Na aldeia nao ha escola e nem professoras. Por este motivo os Indios solicitam da FUNAT uma escola e professora. A escola mais proxima fica em Marcagéio ou aldeia Brasilia, distantes 4 ou5 Km. Para as criangas pequenas & longa esta distincia para se percorrer andando. ‘Durante uma das nossas reunides, em que o Chefe de Posto da FUNAL estava presente, os indios reforsaram esta solicitagaio. O interesse do Lider no ensino das criangas é tanto, que ele nos falou que poderia improvisar um local onde pudesse funcionar a escola até que a construgio final fosse concluida, Indicow a india Josenice dos Prazeres Silva, conhecida como Nice, para ser a professora de suas criangas. Atualmente Nice reside em Marcagio © & professora naquela cidade, Interessada cm ensinar na aldeia Lagoa Grande, ela se propde a comparecer para as aulas, independentemente da condugdo, porque gostaria de colaborar para que as 70 criangas da aldeia na faixa ctéria de 5 a 15 anos estudem. E possivel que através de convgnio entre a FUNAI e a Prefeitura de Marcagiio esse problema seja solucionado As tarefas de algumas meninas é ajudar as maes em cuidar dos inndos pequenos enquanto os pais esto trabalhando. Josilene, uma menina de 14 anos, estava no rio com seus 4 irmios, enquanto sua mae foi até a maré pescar camardo ou Amoré (um tipo de peixe), Lavar os pratos e as panelas, lavar a roupa da casa ¢ cuidar dos irméos menores sio atividades didrias dessa garota. Ela nos informou que: "sao poucas as meninas da minha idade que ajudam a mde. Elas $5 serve para namorar, sd namoradeiras". O divertimento de Josilene & ir A praia nna Baia da Traigo com suas amigas. Enquanto conversévamos na beira do rio (Foto n° 24), chegou uma amiga, Gilvinia de 9 anos. Segundo Josilene, sua amiga é diferente das outras meninas de mesma idade, porque ajuda a sua mie nos afazeres domésticos. er ‘Av, Jodo de Barros, 668 a Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagio Nacional do Inco MINISTERIO DA JUSTICA Para Dona Zulmira, esposa do St. José Soares, o divertimento do pessoal da Lagoa Grande é ir a alguma festa na cidade de Marcagdo, que eles chamam de "brincadeira". "Agora estdo inventando uma ‘Lapinha' na casa do Compadre Miguel". D. Zulmira explicou qué Lapinha é uma danga de “mulher moga" e Pastoril é danga de "Mulher da Vida" Esta "Lapinha" acontece aos sabados ¢ domitigos, quando as meninas cantam e dangam. "Ea disputa do Cordéo Azul e Encarnado. Sao 12 mogas e 2anjos. Tem as mogas pequenas ¢ as grandes. As grandes na frente ¢ as pequenas por tris. Sao elas: Mestra do Encarnado e Contramestra do Azul, ‘Libertina do Encarnado e Lindo Cravo do Azul, Pastorinha do Encarnado e Borboleta do Azul. E mais a cigana e 0 Pastor para os dois corddes" A proximidade da Lagoa Grande até as aldeias da TI Potiguara, na Baja da Traigao, faz. com que os iudios se encontrem com mais freqdéncia. E no dia 28 e 29 de setembro, aconteceu a Festa de Sao Miguel, na aldeia de Sao Francisco. O inicio das comemoragdes em homenagerts a0 Padroeiro de Sao Miguel foi no dia 20.09. A partir deste dia sao celebradas as noitadas de novena até o dia da Festa. Na Festa houve o encontro de muitos indios de outras aldeias. D. Zulmira ainda acrescentou: "Nesta festa ndo se brinca 0 Toré. Este & dangado 6 no dia 19 de abril, Dia do fndio". Atualmente poucas pessoas dangam 0 Toré e Sandra José de Lima, filha do Sr, José Soares 6 uina delas. Os santos catolicos comemorados pelos indios sto: Sao Sebastido, dia 20.01; Santo Antonio, dia 13.06; Nossa Senhora Aparecida, dia 12,10; ¢ Santa Luzia, dia 13.12. As homenagens so realizadas na residéncia do indio Miguel dos Santos. © calolicismo predomina nesta aldeia ¢ muitas pessoas se casam "so no padre", como eles dizem, apesar de haver casais amasiados. Os casamentos sto celebrados cm Rio’ Tinto e para este acontecimento, a comemoragio ¢ com uma grande festa. O almogo ¢ pteparado com muitas comidas. Conforme depoimentos dos indios, "sem comida de toda qualidade, peru, galinha, carne, arroz, macarrao e farofi Neste dia ndio tem feijdo. A bebida é cachaga, cerveja, vinko, ram Montilla @ refrigerante”. A festa & comemorada na casa dos pais da noiva. 31 ‘Ay, Jolie de Barros, 668 ‘Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Retife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundaglo Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTICA Antigamente as mulheres se casavam aos 18 ou 20 anos, hoje as mocinhas estéio se antecipando ¢ com 12 ou 14 anos ja se casam, "Tem delas que com 15 anos jd é mae" Quando se casam, 0 casal j4 tem uma casa para morar, porque o marido construiu. ‘Uma outra comemoragao festiva sao os batizados. "A festa também & com comidas e bebidas. Tem deles que botam até ‘baile’ (imisica para dangar), com radio ou gravador & pitha". Em Rio Tinto, o Pe. Vicente so batiza as criangas em que os pais 840 casados. Os outros casais que queiram batizar seus filhos vio até a Baia da Traigdo, E, ha aquelas pessoas que preferem batizar seus fillios em Jacaré de Sao Domingos. Geralmente as criangas nascem em Rio Tinto. Quando chega a hora de dar a Juz, mandam buscar um carro em Mareagdo para levar as mulheres até a maternidade. Apesar da falta de saneamento basico e das precirias condigdes de vida das pessoas desta aldeia, algumas mulheres apontaram como maior problema de satide nas criangas, as constantes gripes. © combate a esse mal & com ervas naturais, usando os chis e lambedores. ‘Todos na aldeia sabem empregar essas plantas que curam com seguranga. Por exemplo: Coldnia, flor do Sabugueiro e Capim Santo servem para febre; as follias de Louro so um dtimo remédio para curar pessoas cuja alimentagiio fez mal; e um banho com o cha de Alfavaca serve para gripe. Quando a doenga ¢ complicada, leva-se a pessoa para o hospital em Rio ‘Tinto. ‘Na aldeia existem pessoas que sabem rezar de olhado, D. Adelvita Maria dos Santos e o Sr. Jodo, no alto, tém esse dom. Quando um Indio chega a falecer na aldeia, 0 enterro acontece no Cemitério de Mareagao. “ee” 32 ‘Ay, Jofio de Barros, 688 {Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagtio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA Enquanto © morto esté em casa, reza-se um Tergo e também o Oficio (tipos de Oragdes Catélicas). D. Zulmira nos informou que antigamente se cantava as Inceléncias. Hoje esta reza foi proibida porque chegava a incomodar as criangas recém-nascidas. Na noite do velorio, faz-se um café para o pessoal que esta velando o corpo. Mas, "fem muitos que sé querem beber cachaga’. Nos informaram que , das atividades artesanais dos antigos, as indias sabiam fazer renda de bitto e colhet de pau. Hoje, essa tradigfio foi esquecida, Dos trabalhos manuais, observamos que 3 meninas faziam tricé com as varinhas de madeira ao invés de agulhas ¢ tiras cortadas de sacos plisticos (Foto n° 13). A alimentagdo desses indios vem do plantio de suas rogas que so de mandioca, {eijaio e millio, ¢ da pesca que acontece no mangue. Quase todos vio ao mangue "apanhar" caranguejo, siti ¢ guaratu (so tipos de caranguejos)e o peixe Amoré, o mais consumido, Nas casas, o fogiio é a lenha ou carvao ¢ a alimentagio do dia-a-dia dessas pessoas 6 0 feijgo com farina, aparecendo, algumas vezes, um pedago de came, peixe ou caranguejo. ‘Tem pessoas que s comem batata doce, macaxeira ou farinha seca com café, porque a falta de trabalho é grande, £ comum encontrar fruteiras em volta das casas. A presenga de mangueiras, cajueiros ¢ jaqueiras também ¢ freqiiente. Esses produtos s6 so comercializados na feira em Rio Tinto, quando a safra é abundante. Caso contrario, so s6 para consumo proprio. Obseryamios, nesta aldeia, alguns pés de Agafidio, que das sementes se extrai o colorau. Para esse proceso, sdo tiradas as sementes ainda verdes, € esfregadas nas farinha de mandioca e fubé (milho), peneiradas ¢ a pasta formada 6 levada para secar ao sol. Apés pisar (amassar) no pildo cla novamente sera peneirada, rs Ay. Joo de Barros, 688 33 ‘Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE : Fone: (081) 421.2144 Fundagiio Nacional do Incio MINISTERIO DA JUSTICA A criagdo de animais domésticos é um costume entre algumas familias. Podemos destacar cachorro, gato e galinha. O carvao é fabricado pelos indios, mas esta atividade 6 proibida pelo IBAMA na tentativa de evitar 0 desaparecimento das matas. ALconomia dessa aldeia recai no comércio da farinha de mandioca na feita em Rio Tinto, no trabalho bragal nos canaviais dos Usineiros da regio © em alguns indios empregados nas fazendas das vizinhangas, A mandioca, apés se transformar em farinha, nfo é toda empregada para a venda. Da mandioca e farinha, as indias preparam pratos da cozinha indigena. Sto cuscuz (um tipo de bolo salgado), beij, bolo, além de outras receilas, Na Lagoa Grande ha duas Casas de Farinha ¢ 0 processo_ para se transformar a mandioca em farinha é assim: A mandioca chega na Casa de Farinha no dia anterior para ser doscascada, fi a etapa chamada por eles de "rapa a mandioca" (Fotos n°s 12. a 14), Nesta etapa, todos podem colaborar, homens, mulheres ¢ criangas. As vezes as pessoas ficam trabalhando até as 22 hs. No outro dia, a mandioca "rapada" vai para a prensa, la ela serd espremida, Depois, sera colocada na cocho (uma espécie de depésito feito de madeira- Toto n° 15). Dal, ela serd peneitada e torrada no forno. Nesta liltima etapa, as mulheres também podem ajudar, mas preferencialmente esta tarefa é desempenhada pelos homens (Fotos n° 16 e 17). A atividade do fabrico de farinha nao esta tendo 0 retorno esperado pelos {ndios. Para eles, este processo ¢ trabalhoso. Na época, o valor de 1 saco de farinha ¢ de apenas RS 10,00. "Sé dé mesmo para comprar o feijzo. A gente tem o trabalho de fazer ¢ 0 que apura € pouco. A gente sé faz a farinha para néo perder a mandioca" No canavial, trabalham homens e mulheres, As modalidades das atividades € que diferenciariio os ganhos. oe 34 ‘Ay, Jotlo do Barros, 668 Boa Vista - CEP, 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA ‘Um exemplo apresentado pelos indios, sobre a Usina Miriri foi de que, 14 existem trabalhadores com contratos © sem contratos. O te:mo utilizado quando se trabalha sem contrato € "por destino". Nesta modalidade, a pessoa pode ganhar por dia de R$ 1,00 a R$ 3,00, sendo o Jema adotado pelo empregador de: "Se quiser pegue o trabalho, sé ndo quiser, pode ir embora’. Os indios nos informaram que em todas as terras de plantio de cana © forma de trabalho se processa dessa maneira. Devido as péssimas condigdes de vida e a falta de emprego, muitos indios se sujeitam a tal esquema de "trabalho" Existe proximo a esta aldeia uma plantagfio de mamio que, segundo os indios, ¢ do Sr. Julio. La s@ trabalham pessoas com carteiras assinadas, € para os indios, existem muitas vantagens. O ganho & de RS 35,00 por semana, acrescentando a produgio ¢ horas extras. Hi indios que chegam a receber uns R$ 70,00 por semana. ao? at ‘Av. Jofio de Barros, 668 35 Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagdo Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA 6.3 ALDEIA BRASIL! Brasilia uma Vila cuja origem se deu uns 30 anos atrés. No infeio, haviam poucas familias, hoje, contam com 100 casas, habitadas por indios e no indios. La existe energia elétrica e digua encanada, Mas, nas casas, niio hi filtros d’agua, Atrayés de projetos da antiga Fundagiio SESP ¢ SUCAN, foram construidos banheiros em todas as casas. Eles stio fora das residéncias, numa distincia de 10m. As pessoas costumam criar animais domésticos tais como: porco, galinha, cachorro, gato, burro, jegue, cavalo e vaca. Awalmente a aldeia é formada por duas ruas paralelas, uma chamada Brasilia Velha (ou Brasilia das Pedras) ¢ a outra Brasilia Nova. Esta aldeia esta localizada 4 5 Km da aldeia Lagoa Grande, 2 Km da cidade de Marcagiio e 13 Kim da cidade de Rio Tinto. 144 33 familias indigenas, incluindo 9 relagdes interétnicas, perfazendo um total de 129 pessoas. O levantamento das familias indigenas desta aldeia (Anexo 31) foi elaborado pela Coordenadora do GT, com uma pequena colaboragfo inicial da india Marlene Lima da Cruz, filha do Sr. José Soares, por ser ela, moradora da aldeia. O restante do levantamento foi continuado com a colaboragiio de Josenice dos Prazeres Silva, india ¢ professora que reside em Marcagiio (Fotos n°s 21 22). ‘Anteriormente jA foi informado que o indio José Soares serd responsivel politicamente por essas familias ¢ também por alguns indios tesidentes em Marcagiio, cujos nomes se encontram na relagio de familias (Anexo 32) apresentada por Josenice dos Prazeres Silva, jé citada anteriormente. e Ay, Joao de Barros, 668 36 Boa Vista - CEP. 0.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundagio Nacional de Inco MINISTERIO DA JUSTIGA __ Gostatiantos de relatar neste espago, a informagiio de que nesta aldeia ha familias indigenas que identificaram sua origem como indios da Vila-Flor, Jocalizada no Estado do Rio Grande do Norte. Em nossa pesquisa nfio chegamos a confitmar a presenga indigena nessa localidade, apenas, nos depoimentos dos indios, havia essa afirmativa Carneira é um sitio pertencente a esta aldeia. La habitam familias indigenas e entre elas a da india Maria Borges (Foto n° 19). O indio Pedro Eduardo Pereira, professor em Brasilia, nos informou que D. Maria Borges é uma cabocla curandeira porque sabe fazer alguns remédios extraidos de ervas, Estes medicamentos sto bastante procurados. "O nome dela é Maria Emilia, mas & conhecida por Maria Borges. Os remédio de maior 'fama' sdo 0 Azeite Preto e as Garrafadas, que servem para curar muitas doengas. Tém também o Purgante, utilizado para limpar a barriga quando estdo com alguma verminose. O tratamento dura em média uns trés dias de resguarde. ‘Amarra-se um pano na cabega e bota algoddo nos ouvidos, usa-se metas nos pés. A pessoa fica trancada num quarto sem comunicagéo com ninguém Sé pode sair do quarto noite ¢, apenas as pessoas que moram na casa é que podem ver 0 doente, E proibido tomar sereno e comer comida carregada, A alimentagaio é cuscuz, arroz e comidas leves". ‘A india nos relatou que atualmente no pode prepara os remédios porque teve um derrame, "Hago Purgante para verme, Azeite Preto e ja Rezei muito, curando todas as qualidades de doengas, cegos, aleijados, de olhado & outros mais. Mas, vai inteirar quatro anos que tive esse derrame hoje deixet de rezar, 0 meu brago néo faz 0 movimento que deve ser. Por isso, ndo tem ninguém que sabe rezar. Sé a minha irmd sabe fazer esses remédios que eu sei" ae 37 ‘Ay, Jofio de Barros, 688 Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 424.2144 Fundagio Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA O problema de saiide das pessoas da aldeia quando no é resolvido com os "remédios do mato", é encaminhado até Rio Tinto, porque 0 posto miédico que existe em Marcagio esta sem assisténcia. O professor nos informou que a desnutrigas e a desidratagdo sio doengas que mais aparecem nas criangas, Acrescentou que 0 motivo dessa situagdo € porque as mulheres n&o amamentam seus filhos. Mas, o principal mal que afeta as pessoas é a fome, atingindo toda a populagiio que ¢ bastante pobre. ‘A escola ¢ 0 professor da aldeia so mantidos pela Prefeitura de Mareagiio. O indio Pedro Eduardo (Fotos n°s 21 ¢ 22), responsivel pelo enisino das criangas, reside na aldeia, e & a pessoa mais bem informada sobre a vida dos indios por acompanhar minuciosamente 0 que acontece na vida daquela gente. Através do Programa do Agente Comunitirio de Saide- PACS com apoio do SUS - Sistema Unico de Saiide, do qual faz parte, Pedro armazena grande niimero de informagdes sobre a Comunidade. Na escola, Pedro conta com a colaboragao da merendeira que também é india e recebe seu salario da Prefeitura. O Estado da Paraiba e a Prefeitura abastecem a escola com a merenda necesséria, Em visita aquela localidade, tivemos a oportunidade de observar ¢ encontramos tudo em perfeita ordem. Na dispensa, havia alimentos variados suficiente para as criangas, tais como: macarréo, charque, alméndegas, sardinha, leite, agdcar, milharina, além de outros mantimentos. ‘As criangas freqientam a escola a partir dos 6 ou 7 anos de idade. O horario da manha, de 7 as 10, é reservado para o ensino Pré-Escolar ¢ ‘Alfabetizagaio, onde estudam criangas de 6 a 10 anos. A tarde, de 13 as 16 horas, é a vez das criangas de 11 414 anos que estudama 1° € 2° séties do L grau menor. O professor informou que nesta aldeia, todas as criangas esto estudando. ‘As brincadeiras das criangas so semelhantes aos divertimentos comuns da regido, incluindo os indios e nao indios. Entre elas encontram-se as de: pular corda, amarelinha (ou academia), bola, tica (pega - comreria para pegar o outro), bonecas, carrinhos (que eles compram "na rua"), roda-pifio (cantiga de roda), esconde-esconde, ¢ casinha. As meninas de 14 anos ajudam as maes a cuidar das criangas pequenas. ee ¢ Av. Jodie de Barros, 6688 38 Boa Vista - CEP. 50.050-000 - Recife-PE Fone: (01) 421.2144 Fundagdo Nacional do hnigio MINISTERIO DA JUSTIGA Para os adultos, as festas religiosas também sfo divertimentos. As realizadas em Marcagao sfio as Festas dos Santos Reis em 06.01 e a de Nossa Senhora da Conceigiio no dia 08.12. As pessoas sio catélicas ¢ (8m 0 costume de rezar o "Tergo", durante as novenas. A Festa de maior repercussao indigena religiosa é a Festa de Sio Miguel na aldeia de Sao Francisco no dia 28.09. Nesta ocasifio se di o encontro de indios Potiguara espathados por outtas aldeias. A proximidade desta aldeia com as outras da TI Potiguara, na Baia da Traigdo, facilita 0 encontro freqiiente desse povo. A Festa do Camario realizada na aldeia Cumaru (TI Potiguara) em 16.09. foi a prov, Muitas pessoas participaram dela. No geral, as unides dos casais sio extra-oficiais ¢ sem 0 Sacramento Religioso. Eles comumente sio amasiados. Mas, quando desejam legalizar a situagio, 0 Cartorio mais procurado é 0 de Rio Tinto ¢ a Igreja é em Mareagiio As tradig6es culturais voltadas para o artesanato foram esque Contam que um senhora por nome de D. Poreina ( jé falecida) que era irma de D. Severina, era a cabocla que fazia panelas ¢ potes de barro. Destacamos as raizes antigas dos Potiguara nas comidas tipicas, saboreadas nas épocas de Sio Joao no més de junho, como pamonha, canjica e beiji, além daquelas na Semana Santa, como: beijit de mandioca mole, mangaba e peixe. Basicamente, a Economia deles esta voltada para as atividades de sobrevivéncia, em trabalhar no mangue e nos canaviais de Usineiros da Regia. No mangue, homens e mulheres pescam peixes; caranguejos, ¢ outros tipos de crustaceos. © lucro é pouco, ficando a maioria, com o alravessader. Através de exemplos observatemos essa confirmagiio (os valores apresentados aqui se reportam a setembro de 1995): oe 6X Av. Jodo do Barros, 668 39 Boa Vista - CEP. 50,050-000 - Recife-PE Fone: (081) 424.2144 Fundagéié Naclonat do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA A corda de carangugjo (12 unidades) custava R$ 1,00. E nos bares, 0 valor de uma unidade jé preparada estava equivalente ao valor da corda. ‘Com a carne de caranguejo, o sistema é semelhante. O custo de | Kg dessa carne, jé tratada, rendia para o indio que a fornecia, RS 0,70 ¢ custava RS 5,00 ao consumidor final A atividade de tratar caranguejo é predominantemente feminina, Elas trabalham em média, de 1 a3 dias (dependendo da produgio) para receber de RS 5,00 a R$ 7,00. Quando ha muito caranguejo, dé para tratar até 20 Ky desse produto. A Sra. Maria José Bernardo, que mora em Marcagiio é uma boa tratadora de carne de caranguejo e, nunca recebeu mais de R$ 10,00 por semana. Na cana, trabatham homens ¢ mulheres, ¢ 0 valor semanal desta alividade, rende em média de R$ 11,00 a R$ 20,00. Esse ultimo valor, é considerado pelo pattdio, como um salirio mais do que suficiente. As mulheres trabalham limpando a cana, Blas recebem RS 4,00 para limpar 1 ha do canavial Muitas mulheres trabalham fora de casa e segundo a estatistica do Prof. Pedro, de 10 mulheres da regido, 8 trabalham fora. Os indios também sio agricultores de suas rogas, onde cultivain milho, feijao ¢ na sua maioria a mandioca. Esta mandioca ¢ transforma em farinha e 70% da produgiio para consumo proprio, ficando 30% para o comércio em Marcagao, sendo vendida nas mercearias e também na Feira de Rio Tinto aos sibados. Na aldeia no existe casa de farinha, Nisso, os indios se deslocam até Marcagao para fabricar a sua farinha nas Casa de Farinha de pessoas particulares. A. ullizagiio dessas Casas é paga com 20% do liquido da produgio, Aos domingos nfo se pode usar as Casa de Farinhe. Neste dia é realizada a limpeza do local. A 2 ot” 40 ‘Av. Jodo de Barros, 668 ‘Boa Vista - CEP, 60,050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144 Fundago Nacional do Indio MINISTERIO DA JUSTIGA 7. PROPOSTA DE _DELIMITAC AQ DA TERRA INDIGENA Finalizando os trabalhos de campo, tivemos reunides nas aldeias da Lagoa Grande © Jaraguar onde sempre estiveram presentes indigenas, representantes de todas as localidades: Jaraguar, Lagoa Grande, Brasilia, ‘Marcagdo e Vila Monte-Mor (Fotos n° 25 a 30 ). Nestas reunides foi apresentado 0 croqui da area (Anexo 33), onde os indios assinaram concordando com aquele territério Delimitado pelo GT, em companhia dos indigenas escolhidos por eles como nossos guias. Atentamos para um detalhe, apenas 3 indios residentes na Vila Monte- Mor presentes na reuniéo em Jaraguar se recusaram em assinar 0 documento alegando que nao concordariam com a decisio da maioria de excluir a Vila Monte-Mor. Julgamos importante registrar alguns fatos ocorridos durante a fase de redagio deste relatério: No dia 23.10.95, recebemos uma comespondéncia cujo remetente, 0 indio Anibal Cordeiro Campos, residente na Vila Monte-Mor, ameagava os trabalhos do GT caso no atendéssemos a exigéncia de uma reunidio com as famitlias de Monte-Mor (Anexo 15). De imediato demos conhecimento a0 Administrador de Jotio Pessoa de {al correspondéncia e ao mesmo tempo solicitévamos mais informagdes dessa carta (Anexo 14). ‘A resposta a nossa solicitagiio foi enviada pelo Chefe do Posto Potiguara no dia 06.11.95, transmitida pela Administragdo de Joo Pessoa, através do FAX em 07.12.95 (Anexo 16). A posigtio.do GT sobre 0 assunto chegou aquela ADR no mesmo dia 07.12.95 pelo FAX 1/GT/PP 907 ¢ 1.040/PRES/95(Anexo 18). Solicitamos que fosse marcada uma reunidio com as liderangas indigenas interessadas e, na auséncia da Equipe do GT, a presenga do Administrador da ADR J.P. , 0 Procurador da Replica ~ Dr. Luciano Maia, Advogado da ADR J.P. ¢ a Coordenadora do’ GT, para a1 ‘Av, Jofio de Barros, 688 ‘Boa Vista - CEP. 0.050-000 - Recife-PE Fone: (081) 421.2144

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