Professional Documents
Culture Documents
Nota da autora
Olá, querida leitora! É um prazer tê-la em mais uma história. Saiba que
você não encontrará qualquer forma de violência contra as mulheres.
Embora a relação de Vincenzo e Beatrice não seja consensual no início, não
haverá nenhum tipo de relação sexual forçada ou agressões físicas entre
eles.
Com carinho,
Adri luna
Sumario
Sumário
Prólogo
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
44
45
Epílogo
Agradecimentos
Copyright © 2023 Adri Luna
Revisão: Mariana Santana
Diagramação: Adri Luna
Leitora beta: Leticia Ribas
CONTATO:
E-mail: adrianalunagaldino@gmail.com
Instagram: @autoraadriluna
Para a querida Maria Adelaide. Vincenzo Ferrari é todo seu, aproveite esse
mocinho sem alma e coração.
Esta obra é dedicada para todos aqueles que acreditam no poder do amor e
vivem intensamente cada momento. Que as palavras aqui presentes possam
tocar suas almas e inspirar a viver com paixão, entrega e amor. Que vocês
encontrem em suas vidas alguém que os ame com a mesma intensidade,
tornando cada dia mais especial e pleno. O amor é o que nos faz sentir
vivos!
Prólogo
Vincenzo Ferrari
Vincenzo Ferrari
Não é tão comum nevar em Florença, mas, naquela noite, meu carro
derrapou pela estrada coberta de gelo. Um dos soldados dirigiu igual a um
louco pelas estradas. Anna estava perto de dar à luz ao nosso primeiro filho.
Ela estava perdendo muito sangue após cair das escadas de casa e
desacordada, pois havia batido forte a cabeça durante a queda.
— Vai ficar tudo bem, eu prometo a você — falei enquanto a
acariciava e apertava o seu corpo contra o meu.
Entrei no hospital com ela nos meus braços gritando e implorando por
socorro e para que a salvassem.
— Senhor, precisa ficar. Faremos o possível para salvar a sua esposa e
o seu filho.
— Salve-a. Eu a quero viva. — Eu quis gritar, mas a minha voz saiu
fraca como um sussurro.
— Vincenzo, a minha neta virá ao mundo? — A voz do meu pai
ecoou, me fazendo transbordar em ódio.
— Foi você? — vociferei, partindo para cima dele.
— Do que me acusa? — Olhou-me com cinismo.
— Você sabe! Como ela caiu da escada? — indaguei entredentes.
— As pessoas tropeçam o tempo todo, Vincenzo. Ainda mais com a
barriga imensa como a dela. Não queira atribuir a culpa a mim, um velho
senhor que já dormia no momento da queda.
A minha boca tremeu de ódio. Ele estava mentindo e sendo
sarcástico.
Ele se sentou, enquanto eu olhava o relógio impaciente, vendo o
ponteiro dar duas voltas completas, e eu não tinha notícias da Anna.
— Sente-se e espere, Vincenzo. Andar de um lado para o outro não
vai fazer as horas passarem mais rápido — pronunciou com uma
tranquilidade irritante.
— O que faz aqui? — indaguei, irado.
— Estou aqui para te apoiar, é para isso que serve a família.
— Me deixe em paz! Veio torcer pela morte dela e da minha filha?
— Da criança? De forma nenhuma, é a minha herdeira. Garanto-lhe,
Vincenzo, mesmo sendo uma garota, nos trará algum benefício.
Eu estava prestes a me agarrar a sua camisa e lhe socar até perder as
forças, mas o médico surgiu no corredor.
— Como ela está? A minha esposa, como ela está? — indaguei,
ansioso pela resposta.
Os seus olhos foram até o meu pai e voltaram para mim.
— Sentimos muito, mas sua esposa não resistiu. Tivemos
complicações, morte cerebral. Sinto muito, nenhuma das duas resistiu —
falou com pesar. Os ombros rígidos e a tensão em seu olhar eram algo
incomum para alguém acostumado a dar esse tipo de notícia. A não ser que
ele estivesse sentindo remorso por isso.
— Eu não acredito. Anna estava com uma ótima saúde! — gritei.
— Sinto muito, senhor. Fizemos tudo o que foi possível — respondeu
com a voz embargada.
— Mentira! Onde ela está? Quero vê-la — exigi.
— O senhor a verá assim que o corpo for liberado — respondeu.
— Você sabe com quem está falando? — indaguei, agarrando a gola
da sua camisa.
— Largue-o, Vincenzo! Você está chamando a atenção das pessoas.
— Ouvi a voz fria do meu pai, cheia de reprovação.
— Foi você quem a matou, seu filho da puta! Maldito! — Larguei o
médico e virei-me em direção ao meu pai, encarando-o com muita raiva.
— Não! Foi você quem a matou com a sua teimosia, Vincenzo —
tornou a falar, irritado, admitindo a culpa de uma forma que nem mesmo ele
percebeu. Parti para cima dele, mas fui contido pelos soldados.
— Onde ela está? Minha esposa e minha filha? — perguntei,
soltando-me dos soldados que ainda me seguravam.
— Estamos preparando o corpo, senhor.
— Exijo vê-las agora! — Encarei o médico com todo ódio que havia
dentro de mim. Os olhos dele se voltaram para o meu pai outra vez, que
assentiu com a cabeça como se ele mandasse naquele lugar.
Andei até a sala como um homem sentenciado à morte, enxugando as
lágrimas com pressa. Clamei a Deus para que Ele a fizesse voltar a viver. O
meu único elo com a vida acabou de me deixar.
Entrei na sala fria onde ela estava deitada sobre uma maca de inox, eu
não estava preparado para isso, eu conseguiria matar um exército a sangue
frio, vendo-os agonizar, e ainda iria rir de suas expressões de dor, mas ali
deitada estava a minha única razão de viver. O meu coração doeu e cada
passo que dei foi para me levar a uma vida amarga e sem vida.
— Anna? Meu amor… — Alisei o seu rosto gélido. — Levanta-se,
Anna! — ordenei como se ela estivesse sendo teimosa. Olhei para trás,
procurando pelo médico, que me olhava a uma distância que ele
considerava segura.
— Ela morreu, senhor — disse, como se repetir isso fosse me
confortar.
Apertei os olhos, encarando-o. Ele tremia e a sua testa suava.
— O que está me escondendo? — Aproximei-me lentamente.
Precisava de uma resposta.
Ele deu um passo para trás, mas as suas pernas perderam as forças,
obrigando-o a se apoiar na mesa ao seu lado.
— A sua esposa morreu, senhor — repetiu, engolindo em seco.
— Você já disse. Mas quero saber exatamente o que aconteceu. Eu
me recuso a isso. Não aceito! Não posso viver sem ela! — gritei, irado,
derrubando tudo à minha frente.
— Pare já com isso, Vincenzo — A voz autoritária e irritada do meu
pai ecoou na sala. — Levem-no daqui! — O grande Don Ferrari ordenou e,
no minuto seguinte, fui imobilizado por vários soldados e jogado no chão.
Tentei me livrar, mas não tive força. Então, senti uma dor. Uma picada.
Recebi uma injeção no pescoço, que provavelmente era um tranquilizante, e
fui abatido em poucos segundos.
***
Beatrice Marino
Depois de longos anos na Rússia, enfim retornei para a Itália. Não era
como se eu não gostasse do clima de Moscou, mas estava morrendo de
saudade do meu país.
A minha mãe é russa e meu papà, italiano. Nasci na Itália, assim
como o meu irmão. Minha mãe veio morar aqui depois de conhecer o meu
papà em uma viagem aos Estados Unidos e logo se casaram. Poucos sabem
dessa nossa mistura, a minha mãe viveu muitos anos nos Estados Unidos e
não possui sotaque russo. Meu papà diz que devemos manter isso em
segredo. Para todos os efeitos, somos italianos puros! Ele diz que é uma
questão política. Nunca entendi.
Não frequentei a escola ou tive amigos, um problema cardíaco de
nascença me deixa frágil. Vivi sempre sob a ameaça de que, a qualquer
momento, o meu coração poderia parar de funcionar. Milagrosamente,
quando fiz catorze anos, depois de uma vida na fila de espera, surgiu uma
doadora compatível. A esperança de vida longa estava surgindo. Nunca me
esquecerei que o ano em que julgaram ser meu último foi o mesmo em que
recebi milhares de dias a mais.
Dias após o transplante, o meu papà surtou. Era para todos estarmos
felizes, mas ele não estava. Em uma noite, me acordou aos prantos, estava
apavorado. Disse que eu precisava ir para Rússia, que faria uma plástica no
local da cicatriz e ninguém, sob hipótese nenhuma, deveria saber que eu era
uma transplantada. Eu nunca perguntei o porquê, apenas o obedeci. E assim
vivi por muito tempo como uma italiana pura e de coração saudável desde o
nascimento.
— Trice? — A voz doce e fina da minha pipoquinha me despertou de
uma preguiça que me deixou deitada na cama, mesmo depois de horas
acordada.
— Sim, minha princesa. — Virei-me para ela com um lindo sorriso
para vê-la saltar na cama.
Giulia nasceu no mesmo dia em que recebi o transplante, há cinco
anos. A mãe dela foi a minha doadora. Meu papà a adotou assim que soube
que a garotinha tinha ficado órfã e que não tinha ninguém por ela. A nossa
ligação sempre foi incrível. Sei que esse coração sempre bateu por ela.
— Você me prometeu que iríamos fazer um passeio. — Ela pulava
animada no colchão.
— Sim, iremos, onde você quer ir?
— Ao parque Trice — disse sem delongas.
— Iremos ao parque, então.
Levantei-me para tomar os meus remédios dos quais fiquei totalmente
dependente. Eles eram os responsáveis por evitar que o meu corpo
rejeitasse o novo órgão, eu os tomo diariamente, sem pular um dia sequer.
Giulia me esperou no quarto enquanto tomei um banho para
descermos para tomar café da manhã.
— Aonde vocês vão tão arrumadas? — indagou o meu papà, já
sentado à mesa e lendo o seu jornal. Eu senti falta de vê-lo assim todos os
dias.
— Ao parque, eu prometi a Giulia que a levaria.
— Tomem cuidado e não demorem.
— Tudo bem, papà, não vamos demorar.
Nos sentamos e comemos, ela estava eufórica, comeu apressada e
logo se pôs de pé, me apressando. Giulia ainda não conhecia a Itália, então
olhava para tudo com admiração e me fez ir a vários parques até mostrar
sinais de cansaço e pedir para retornar para casa.
No início de noite, Antonella e Giovani vieram me visitar, eles eram
os meus únicos amigos, o papà deles trabalhava como diretor na empresa
do meu papà, e ele sempre os trazia aqui para passar o dia comigo.
— Garota, que saudade de você. — Antonella me abraçou forte assim
que desci as escadas. Giovani me olhou de longe e acenou tímido, as coisas
estavam estranhas entre nós desde que ele se declarou pelo telefone,
costumávamos ficar horas conversando por mensagens e ligações.
— E você não vem me abraçar? — indaguei de braços abertos, e ele
se aproximou ainda tímido.
— Como você está? Senti sua falta. — Sua voz saiu baixa como um
sussurro tímido.
— Giovani, não seja assim, somos amigos certo? — indaguei, dando
uma leve batida em seu ombro.
Eu costumava sonhar com o Giovani quando criança, eu o achava
lindo e educado, mas muita coisa mudou depois do transplante, era como se
outra pessoa vivesse em mim, eu havia mudado os hábitos e até adquirido
novas habilidades que eu nunca tive contato. Pintar foi uma delas, bastavam
alguns minutos sozinha para que eu estivesse agarrada a uma tela ou até
mesmo rabiscando em um caderno de desenho.
— O que acha de fugir hoje e comemorar a sua volta em uma boate?
— ela sussurrou, me encarando com um olhar travesso.
— Como vamos conseguir? — indaguei, considerando impossível tal
fuga.
— Tio, Beatrice pode ir dormir na minha casa hoje, vamos fazer a
noite do pijama? — perguntou com uma voz fofa e doce, o meu papà sorriu
e assentiu com a cabeça.
— Mas os seguranças vão junto — nos lembrou.
— Tudo bem! — disse saltitante.
Estávamos no carro quando ela planejou toda a fuga, iríamos à boate
no carro do Giovani e voltaríamos antes que notassem a nossa falta. Eu
nunca havia ido a uma boate, então, eu estava bem animada com a ideia.
— Você é uma prisioneira agora? — Giovani perguntou, sorrindo
depois de vários quilômetros em silêncio.
— Quase isso! — confirmei, sorrindo de volta.
— Seu papà está cada dia mais possessivo. — Ele mostrou uma
careta engraçada enquanto pronunciava as palavras.
— Tenho pena do homem que resolver pedir a sua mão em casamento
— brincou Antonella, olhando de soslaio para Giovani.
— Não fale besteiras — ele disse, a repreendendo. — Chegamos,
subam e armem tudo para a fuga de vocês, eu espero vocês nos fundos.
— O nosso pai tem que achar que fomos dormir Trice, ele preza pelo
emprego dele e não vai querer ver o seu pai bravo.
***
Vincenzo Ferrari
Eu não tinha nada para fazer naquela noite, então, fiquei vendo a
bella ragazza[1] a dançar, ela era linda, cabelos compridos tão claros quantos
os seus olhos verdes, um jeito sexy, uma boca carnuda, seios fartos, e um
corpo deliciosamente esculpido, mas não passa de uma garotinha cheirando
a leite. Continuei salivando por ela, que dançava sem notar a quantidade de
lobos famintos a olhando com desejo.
Eu tinha me tornado um homem pouco acessível depois que Anna foi
morta. A minha promessa voltou a valer, eu serviria a máfia, teria os
herdeiros que eles tanto querem e, o principal, eu me casaria para ter mais
poder, e eu já selecionei algumas possíveis escolhidas.
— Você se agradou da ragazza? — Mattia, meu primo e consigliere
da máfia, falou ao se aproximar.
— Isso não é da sua conta.
— Vai ficar só olhando? — ele tornou a falar.
— Por que está preocupado? Cuide da sua vida.
Me afastei e voltei a olhar para a garota, algo nela chamou a minha
atenção, ela se afastou dos amigos, e eu a segui com um caçador que não
tira os olhos da presa.
Ela parou em frente a um quadro imenso que não combina em nada
com a boate, ele ficava entre os banheiros, Anna o pintou. A garota olhava
atentamente e só não o tocou por estar alto, mas o seu dedo o contornou no
ar, e eu me lembrei da minha falecida esposa, que costumava pintar as
nuvens ou as paisagens de forma imaginária com o dedo indicador apontado
para o alto.
— Continua olhando a ragazza?
— Qual o seu problema, tirou o dia para torrar minha paciência —
murmurei, irritado.
— Nunca te vi olhando tão concentrado para uma mulher que não
fosse a… — desistiu de falar —, deixa para lá.
— Preciso me casar, não preciso? — pronunciei, sério.
— Com uma mulher e não uma piccola ragazza[2], sem falar que não
é uma das nossas. — falou, me lembrando do dever de um Don em se
fortalecer com conexões.
— Só estava me distraindo, primo, meu objetivo principal é encontrar
o coração de Anna — falei, e ele torceu o nariz.
— A filha do associado têxtil chegou à Itália depois de passar um
tempo fora, tudo indica que, no dia, ela não estava no país, não tem como
ser ela — disse, dando notícias do caso que havia dado ordens para ele
investigar. Eu estava investigando todas as herdeiras dos associados.
— E Francesco? — Eu vinha procurando pelo consigliere do meu pai
há anos, mas ele havia sumido, evaporado, ele, sim, teria respostas para me
dar, já que o meu pai estava morto e enterrado.
— Não temos notícias dele, Don, o filho da puta sumiu no mundo,
isso se também não estiver morto, a família dele vive uma vida miserável.
— Já disse quero que se empenhem mais e me deem a porra do nome
— gritei, esse assunto sempre me deixava nervoso.
— Estamos tentando, Don.
— Tentar não é suficiente. Consiga!
— São muitos associados, na época, o tio realizava negócios com
pessoas que nem sabemos quem são — tentou se justificar.
— Vocês são inúteis — sibilei, enraivecido.
— Não vamos mais falar sobre isso hoje, olha lá a ragazza, é bem
gostosa, não acha? — perguntou, tentando mudar o meu foco do assunto
— É como você disse, é apenas uma garotinha — falei, me afastando,
mas fui seguido por ele. — O que você quer me seguindo? — O prendi
contra a parede, o segurando pela gola da camisa.
— Calmati, calmati[3]— O libertei, e ele soltou o ar dos pulmões, se
recompondo.
— Parla presto[4] — ordenei.
— Estamos com um problema lá em cima, acreditamos que seja um
espião russo.
— Vocês não conseguem resolver nada — pronunciei, subindo até o
meu escritório.
Entrei na sala irritado.
— Então é você que está me fazendo trabalhar no meu dia de folga?
— indaguei com ironia.
O pobre miserável já estava mole de tanto apanhar e logo atrás uma
mulher estava presa pelas mãos em uma cadeira.
— Eu já disse tudo que sei, agora larguem-na, ela é italiana, não tem
nada a ver com esse assunto — suplicou.
Andei até a mulher, a levantando da cadeira pelos cabelos.
— Se importa com ela? — perguntei, puxando seu cabelo para trás, a
fazendo gritar.
— Já disse, ela não tem nada a ver com isso — ele tornou a falar,
mais desesperado que antes.
— Comece a dizer o que interessa em vez de implorar pela vida dessa
vadia. Troquem eles de lugar — ordenei aos soldados. — Podem começar!
— Autorizei a sessão de tortura, começando por um saco na cabeça, eu
gostava de vê-los buscando pelo ar, desesperados.
— Ela não tem nada a ver com isso — o homem gritou em desespero.
— A vida dela está em suas mãos. — Dei leves batidas no seu rosto.
— Vou falar! Eu vou falar! Parem! — gritou quando a mulher já
estava sem forças.
— O Andrei quer o seu associado da indústria têxtil, por isso me
mandou aqui — falou, se referindo ao líder da máfia russa.
— O Marino? — Inclinei a cabeça para o lado, o estudando.
— Ele mesmo, a sua filha passou um longo período na Rússia, o
Andrei se interessou pela menina, mas não só por ela ser linda, e, sim, pelo
poder que ele teria se unindo em matrimônio com ela.
— Compreendo, irei visitar o mio amico[5].
O grupo Marino é o grupo têxtil mais importante em muitas partes do
mundo, meu pai sempre teve negócios com eles, são nossos associados há
anos.
— Senhor, agora nos deixe ir — tornou a implorar.
— Nossos cachorros estão com fome, e não temos bastante carne aqui
— falei, saindo do meu escritório, ouvindo os gritos de desespero em
seguida, o que é música para os meus ouvidos.
***
Vincenzo Ferrari
***
Beatrice Marino
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
***
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
Abri os olhos, alarmada, assim que ele deixou o meu quarto, o meu
coração batia forte, eu podia senti-lo querendo sair pela boca. Ele iria matá-
la. Dei voltas no quarto, eu precisava fazer alguma coisa, não, você não
precisa, Beatrice. Pensei que eu poderia ser a próxima, ela falou de uma
mulher com duas nacionalidades, ela disse com todas as letras.
Coloquei o meu casaco sobre o vestido e desci, a sala estava vazia e
não encontrei obstáculos. Ele certamente a levaria para casa que vi mais
cedo em meio aos vinhedos, e eu corri até lá, sem saber ao certo o que eu
estava fazendo.
— Lorenzo, eu imploro, fale com o Don.
— Para de falar, Carina — ele gritou.
Ouvi os soluços vindos da mulher, que continuava implorando.
— Não, Lorenzo, você não é igual a ele, Lorenzo, por favor. Eu vou
sumir, eu juro, vou sumir.
— Sinto muito, Carina.
Ele a puxou para fora da casa. Ela estava toda amarrada e ele jogava
gasolina nela, que continuou as súplicas.
— Lorenzo, deixe-a ir. — Me joguei em sua frente, recebendo um
banho do líquido que ele jogava nela.
— Está louca, Beatrice? Saia!
O seu telefone tocou, e eu usei o tempo para tentar tirar as cordas que
a amarrava.
— Vá embora! — Congelei, a ouvindo.
— Estou tentando te ajudar.
— Ele vai matar você também — Uma dor tomou o meu peito, eu
senti como se estivesse sendo pisoteado.
— Mesmo assim ajudarei você.
— Beatrice, chega! — Lorenzo voltou a sua atenção a mim com fúria.
— Ele ouviu a sua voz e está vindo para cá.
Eu senti o pavor tomar conta de cada centímetro do meu corpo, mas
eu já estava envolvida em tudo isso e julguei ser impossível recuar.
— Problemas para executar as minhas ordens, Lorenzo? — A sua voz
ecoou calma e tranquila.
Eu perdi o controle nas mãos que tremiam enquanto encarava os
olhos amedrontados da mulher na minha frente.
— Beatrice está confusa, mas já está de saída. — Lorenzo me puxou
pelo braço.
Ele sacou a arma e, sem tempo de súplicas, atirou contra a cabeça de
Carina, que caiu morta em seus pés.
— Rápido e sem tortura, você pode me agradecer na próxima vida —
ele disse de forma doentia, alisando o rosto da mulher que tinha uma poça
de sangue crescendo embaixo dela.
Eu queria gritar, mas a voz não saiu e percebi que eu estava paralisada
pelo medo.
— Minha querida noiva, quer partir tão cedo? Confesso que isso me
deixa desapontado, estou ansioso pela lua de mel.
Eu estava sentada no chão, e ele abaixou-se, ficando na altura dos
meus olhos.
— Venha, vou te levar para casa. — A sua voz soou sem emoção.
— Não toque em mim — gritei, me arrastando pelo chão sem forçar
para me colocar de pé.
— Não tire a minha paciência, Beatrice. — A sua voz reverberou e
me esforcei para levantar, buscando forças onde nem imaginei que tinha.
Corri sem saber exatamente o que estava fazendo, eu não poderia
correr uma vida toda dele.
— Fique parada bem aí, Beatrice. — Eu não tinha a intenção de
obedecê-lo, mas não pude dizer o mesmo das minhas pernas, que
paralisaram com o comando, e eu caí de cara no chão depois de perder o
equilíbrio.
Ouvi os seus passos apressados em minha direção e fechei os olhos
para o que viria em seguida.
— Droga! — murmurou, me pegando nos braços e me jogando em
seus ombros como se eu fosse um saco de batatas.
Entramos na mansão, e ele subiu as escadas comigo ainda em seus
ombros, me jogando na banheira, eu não havia notado nada mais além do
forte cheiro de gasolina, o meu corpo ainda tinha sangue escorrendo por
várias partes.
— Tire o vestido. — Olhei assustada, cruzando os braços no peito.
— Não!
Ele abaixou e arrancou o vestido em um único puxão e o jogou no
lixo em seguida. Com a ajuda da mangueira do chuveiro, ele me molhou, e
eu, completamente envergonhada, tentava cobrir as minhas partes que tinha
apenas as roupas íntimas.
— Você precisa entender uma coisa, Beatrice — ele se abaixou,
ficando de joelho do meu lado. — Eu mando aqui, eu mando em você, e eu
odeio ser contrariado. Tome um banho e durma, não quero mais ouvir
barulho seu hoje.
Deitei-me na água que ainda era rasa na banheira, me agarrei às
minhas pernas e chorei desejando acordar desse pesadelo.
***
O sol fraco, porém, irritante entrou pelas janelas que não possuíam
cortinas grossas. Abri os olhos de má vontade e fui sem coragem tomar um
banho. A água gelada acordou a minha pele de forma cruel, mas, ainda
assim, o resto parecia estar morto.
Me troquei e desci. O meu futuro marido estava de pé de frente para
uma das imensas janelas da sala, ele falava ao telefone em um inglês, cheio
de sotaque, eu não tinha a intenção de prestar atenção, mas ele disse em um
inglês perfeito como um nativo desta vez: “me caso amanhã”.
Amanhã? — gritei em minha mente, encarando os seus ombros
largos.
— Buongiorno. — Lorenzo surgiu na sala com o seu sorriso fácil
pendurado nos lábios.
Fingi não ter ouvido e sentei-me à mesa, eu vinha adquirindo uma
audácia, acreditava ser pelo ambiente que me obrigava a todo instante me
pôr em alerta.
— Beatrice, hoje você irá receber um estilista com alguns modelos de
vestido. — Vincenzo se aproximou, se sentando na ponta da mesa como um
chefe.
— Por que a pressa? — Me fiz de desentendida.
— Nos casaremos amanhã.
— Pensei ter escutado que o casamento seria em sete dias.
— Mudei de ideia, para que esperar.
Eu levantei o rosto para encará-lo e ainda queria entender como os
seus olhos podiam fazer o meu coração disparar como se eu estivesse
apaixonada. Nunca! Balancei a cabeça, afastando de uma vez esses
pensamentos insanos e sem lógica.
— Está tudo pronto para o casamento e os seus sogros já foram
avisados. — Paralisei quando ouvi a voz de Mattia, ele parou ao meu lado,
mas não me direcionou o olhar. Contive o grito horror que considerou sair
quando vi a sua mão coberta por bolhas causadas por queimaduras.
— Perfeito, Mattia, e sobre a questão dos fundos da mansão, cuide
para que não me cause problemas, se for um problema, elimine, sem
fumaça.
Fui tomada pela curiosidade, o que tem nos fundos da mansão?
— Bom… Vamos, Mattia, ainda temos o assunto do Francesco para
tratar — disse Lorenzo, se levantando da mesa e nos deixando a sós.
— Como se sente? — indagou, mas não parecia se importar com a
resposta.
Encolhi os ombros e voltei a minha atenção ao pote de geleia que eu
tentava abrir usando toda a minha força. Ele se levantou, parou do meu
lado, girou a tampa usando apenas três dedos e retornou ao seu lugar.
— Não tem nada a falar sobre o casamento?
— Não. — Se eu falasse, seria certamente morta.
— Perfeito.
O meu telefone tocou sobre a mesa, fazia um bom tempo que Giovani
não me ligava, ele parecia inconformado com a notícia repentina do
casamento. Eu não podia dizer a eles quem de fato era Vincenzo, embora
fosse como se tivesse um letreiro preso na testa dele dizendo: sou mafioso.
— Por que não atende? — indagou, vendo a minha hesitação.
— Me dê licença. — Levantei-me lentamente, esperando ordens para
que eu ficasse e atendesse ali onde eu estava, mas ele não o fez e parecia
não prestar atenção nos meus atos.
Andei até a janela mais próxima da mesa e atendi.
— Giovani?
Ele ficou em silêncio por uns segundos. Parecia chorar.
— Vai mesmo se casar, Trice? — indagou com a voz embargada.
O meu coração quebrou-se em vários pedaços, eu costumava ter
sentimentos por ele, e se hoje eu não me sentia romanticamente atraída por
ele, a culpa foi desse coração que fez todos os meus gostos se tornarem
secundários.
— Sinto muito. — Eu não tinha muito o que dizer.
— Espero que não se importe se eu não for ao seu casamento.
— De forma nenhuma, eu até prefiro que seja assim — disse em um
tom abatido.
Olhei para trás e lá estava o homem que me acorrentou sem precisar
de correntes, que me arrastaria a um altar e a uma vida infeliz.
— Vou desligar. — Encerrei rápido a ligação, incapaz de continuar
segurando as lágrimas.
Continuei de costas tentando conter os tremores que partiam dos
meus pulmões já sem força de conter o grito peso e as lágrimas ardiam em
meus olhos.
— Notícia ruim? — Sobressaltei me assustando com a sua voz
sussurrada em meu ouvido.
— A notícia ruim está parada ao meu lado — respondi, destemida,
esperando a sua reação descontente.
— Consigo ler os seus olhos, Beatrice. Eu sou ótimo em lê-los.
— Então consegue enxergar o quão destroçada está a minha alma.
— A sua alma? — A sua sobrancelha se arqueou e ele me encarou,
fazendo gesto para que eu continuasse a falar.
— Nunca ouviu falar que os olhos são o espelho da alma?
A sua boa ensaiou um sorriso e ele girou os pés, parando de frente a
mim, usando o dedo indicador para levantar o meu queixo, me fazendo
encará-lo.
— O que vê nos meus? — indagou com escárnio.
— Nada! — respondi sem hesitar.
— Nada? — Sorriu perigosamente sexy.
— Você não possui alma.
Ele mordeu o lábio e, envolvido em uma aura de mistério e perigo,
me respondeu:
— Você tem toda razão, Beatrice. Já faz um bom tempo que eu
oferecia a minha alma ao diabo e você está destinada a viver esse inferno
comigo.
11
É o que nos espera, uma morte cruel
Vincenzo Ferrari
***
***
Beatrice Marino
Vincenzo Ferrari
Tudo estava pronto, mas Beatrice ainda não havia descido, eu olhava
para o relógio impaciente. Esse ambiente.
— Onde está a minha irmã? — Luigi se aproximou, perguntando.
— Nunca ouviu falar que o noivo não pode ver a noiva antes do
casamento? Estou igual a você, esperando que ela desça — pronunciei,
furioso.
Olhei ao redor e a movimentação entre os meus soldados estava
estranha.
— Qual o problema? — indaguei, me aproximando.
— A senhorita tentou fugir.
Mordi os lábios, contendo a raiva.
— Onde ela está?
— Na casa do vinhedo.
— Chame o Lorenzo e o Mattia, informem o que está acontecendo e
cuidem para as pessoas perceberem, vou levá-la de volta pelos fundos.
Apressei os passos, assim que fiquei longe da visão dos convidados.
Entrei na casa com muito ódio.
— Não se aproxime — exigiu.
Olhei para ela com toda fúria e ódio que parecia que poderia matá-la a
qualquer momento.
— Faz ideia do que está fazendo, Beatrice?
Caminhei até a figura pequena encolhida no canto da parede. Ela
estava coberta de terra, o vestido branco estava imundo.
— Quando você pretende me matar, depois que eu assinar os
documentos e você ter direitos sobre a empresa da minha família?
— Matar você não estava nos meus planos, mas acabo de considerar
isso. — Me abaixei, ficando na altura dos seus olhos. — Você acabou de me
deixar furioso, Beatrice. — Levantei-me, a puxando pelo braço. — Se você
ousar gritar, eu acabo com cada um da sua família e, quanto a você, posso te
jogar em um bordel qualquer ou usar como isca para algum trabalho.
As suas pernas fraquejaram e com a força com a qual eu a puxava,
acabei arrastando-a pelo chão por alguns centímetros até pegá-la no braço, a
colocando sobre o meu ombro. Ela parecia morta em meus braços, não se
movia e sequer fazia ruídos.
— Se recompõe, coloca outro vestido e desça rápido — disse
entredentes.
— O que aconteceu com você, saiu deste quarto uma rainha? —
indagou o estilista.
— E acho bom que você refaça tudo em menos de trinta minutos —
falei, saindo do quarto.
— Don, eu fico, quando ela estiver pronta, desço com ela — disse
Lorenzo, me encontrando no corredor.
— Certo, vou descer.
— O que aconteceu com a minha irmã, Vincenzo? — Interrompi os
meus passos, virando para encará-lo, deixando transparecer o ódio que eu
estava sentindo.
— A sua irmã está bem, Luigi, você está me irritando ainda mais do
que ela, se é que isso é possível.
— Don… — Se interrompeu, hesitante.
— Seja breve, Luigi.
— Não tire a pureza da minha irmã — Os seus olhos estavam cheios
de lágrimas e sua expressão era lastimável.
— O que espera que eu faça? Devo cobri-la de cera e deixar a
escultura enfeitando a sala? Cacete! Luigi, você está me irritando.
— Não a force — suplicou.
— Eu prometo a você que farei a pequena Beatriz gemer
enlouquecida e pedir por mais, satisfeito?
— A noiva chegou! — Ouvi o anúncio de Lorenzo e virei para vê-la.
— Que porra é essa?
— Se contenha, era o único que tinha — disse Lorenzo, que se
aproximou de mim com urgência.
— Foi você? — Cerrei os punhos.
Ele engoliu seco, confirmando. Os meus olhos percorreram por cada
centímetro dela, o vestido de Anna lhe caiu perfeitamente, subi os olhos e
não vi mais a Beatriz na minha frente. Anna caminhava em minha direção,
e o seu ar triste me incomodou, ele sempre sorria ao meu lado. Eu estava
hipnotizado. Era incapaz de desviar os olhos.
— Estou aqui, satisfeito? — O seu olhar gélido me atravessou
completamente.
Senti os meus joelhos tremerem, uma sensação que eu não sentia há
muito tempo.
— Muito. — Alisei o seu rosto saindo da minha pose de durão.
— Então vamos terminar logo com isso.
— Terminar? Isso é só o começo.
***
Beatrice Marino
Acordei sentindo o meu corpo doer, mas, ainda assim, eu estava feliz,
sentindo uma paz estranha no meu coração. Eu me sentia na minha casa, ao
lado do homem certo, e isso era estranho e esquisito.
Ouvi baterem na porta.
— Buongiorno — Nina fala, colocando a cabeça entre a porta aberta.
— Entre. — Minha voz saiu animada, e ela apertou os olhos, me
analisando.
— Hum… A noite foi boa? — ela indagou como quem não entende o
que estava acontecendo.
— Foi! — Senti o meu rosto queimar de vergonha. — Ele gosta de
mim, eu senti isso — disse com um tom romântico.
Ela mordeu o lábio inferior e me lançou um olhar preocupado.
— Você se apaixonou assim tão rápido?
Dei de ombros, me sentava no sofá ao lado dela.
— Você é doce, ingênua. Foi só sexo, Beatrice, eu duvido muito que
ele sinta algo por você. — Seus lábios se transformaram em uma linha dura.
— Ele me tratou bem. — Mordi o lábio, continuando um sorriso
bobo. — E foi incrível.
— Fico feliz por você. Confesso que estive preocupada com a sua
noite de núpcias, eu, normalmente, vou até a casa das recém-casadas para
lhes receitar remédios para machucados e analgésicos.
— Me espere um minuto, tomarei um banho e desceremos para comer
alguma coisa no jardim.
Tomei um banho rápido, me troquei e descemos até o jardim. Fiquei
desapontada de saber que Vincenzo não estava em casa e que havia saído
sem falar comigo, afinal, somos recém-casados, eu esperei poder, no
mínimo, acordar com ele ao meu lado.
— Precisa colocar os pés no chão e parar de sonhar — disse,
constatando o meu desapontamento.
— Eu não sei o que deu em mim, eu só o odeio e, de repente, ele se
aproxima, eu o quero.
— Juro que achei que ele surtaria assim que te vi entrar com o vestido
que a Anna se casou com ele.
— Como assim? — indaguei, confusa.
— Aquele vestido, Anna usou quando eles se casaram.
— Anna?
Ouvimos uma gargalhada e nos viramos para olhar de quem se
tratava.
— Oi, querida noiva, agora que o meu irmão se casou, podemos
marcar o nosso casamento. Estou ansioso.
Ela revirou os olhos, e eu fiquei confusa que tipo de relação existia
ali. Eles não pareciam se odiar. Lorenzo estava longe de ser um homem
grosso, que gostava de bater em mulheres, e Nina parecia ser dona de si.
— Eu sei que a ideia do vestido veio de você, Lorenzo.
Ela sorriu com deboche.
— Ela havia estragado o vestido, o que queria que eu fizesse? Só
arrumei uma solução. — Deu de ombros.
Aos poucos, a ficha ia caindo, ele delirou, ele me chamou de Anna,
foi puro delírio.
— Onde ele está agora? — indaguei.
— Resolvendo umas questões. Não espere muito dele, Beatrice.
— Sim, eu sei. — A minha luz se apagou. Toda aquela animação que
acordou comigo escorreu junto a uma lágrima teimosa que percorreu a
minha bochecha e que aparei rapidamente com a mão. — Vou subir e deixar
vocês sozinhos.
Me joguei na cama, me enfiando entre os travesseiros.
— O vestido era dela, por isso que ele me olhou com tanta ternura.
Burra! Você é burra, Beatrice, ficou toda comovida com a forma que ele te
tocou. — Corri para o banheiro e molhei o rosto e a nuca, tentando conter o
calor que meu deu só de pensar na noite passada.
— Senhora, colocaremos as suas coisas no quarto do Don. — Ouvi
uma das funcionárias comunicar.
— Foi ordem dele? — indaguei, saindo do banheiro e me sentando na
cama, aguardando a resposta.
— Sim, foram ordens do Don.
Um sorriso bobo e cheio de esperança surgiu novamente.
— Certo, então leve tudo.
***
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
Não me lembro a hora exata em que adormeci, mas sei que esperei
por Vincenzo até o limite do meu cansaço, olhei para o seu lado na cama, e
estava intacto. Ele não dormiu aqui.
Uma tristeza invadiu cada pedacinho de mim e instalou no meu
coração, que parecia estar sendo pisoteado, e ele estava.
— Como é idiota, Beatrice, como pode se apaixonar assim, tão
rápido? Estúpida!
O meu telefone vibrou sobre a mesa, era uma ligação da minha casa.
— Alô?
— Filha? — A voz embargada da minha mãe deixou o meu coração
ainda mais destroçado.
A minha voz sumiu, eu não tive forças para responder, e ela
continuou:
— Venha nos ver. Sei que terá que pedir autorização ao seu marido,
mas faça o possível para vir.
Era difícil para ela admitir isso em voz alta, dizer que eu precisava de
autorização de um homem para visitar os meus pais, certamente estava
acabando com ela.
— Eu irei — garanti.
— Venha o mais rápido que conseguir. — Meu coração parou por
alguns segundos, algo estava errado.
— Mãe, por que não veio ao casamento?
— Filha, estou com problemas aqui em casa, e ele chama por você o
tempo todo.
— Mãe, é a minha pipoquinha? — indaguei, percebendo que as
lágrimas corriam pelo meu rosto e eu estava prestes a soluçar.
— Trice… Ela está doente.
Eu sempre senti que o meu coração batia valente por ela. Ela não é a
minha filha, mas o meu coração é completamente dela.
— Estarei aí em alguns minutos. — Desliguei o telefone e corri para
o banheiro, tomei um banho rápido, me troquei e desci para procurar por
Vincenzo.
— Aonde vai com tanta pressa? — Mattia estava sentado na sala
quando passei correndo por ele.
— Viu o Don?
— Qual a urgência?
— Preciso ir até a casa dos meus pais.
— Sinto muito, mas terá que esperar, o Don precisou sair.
— Pode tentar contato com ele? Preciso muito ir agora.
— Claro, farei isso por você.
Ele pegou o telefone e digitou.
— Deixe-me falar — pedi.
Ele me mostrou a sua mão aberta, me pedindo para esperar.
— Don, a sua esposa precisa visitar a família, e gostaria de lhe pedir
autorização. — Ele encerrou a ligação e pôs o telefone no bolso. — Ele não
voltará tão cedo, mas disponibilizou um soldado para levar você até a sua
família.
— Jura? — indaguei, incrédula, mas não questionei. — Obrigada. —
Corri até o jardim com ele em meu encalço.
— Leve a senhora até a casa da família dela, o Don autorizou.
Ele acenou positivamente com a cabeça e abriu a porta para mim.
***
Vincenzo Ferrari
— Mattia! O que faz aqui parado na porta? Venha, vou até o galpão,
arrancaremos daquele infeliz quem está por trás do roubo das armas.
— Claro, vamos agora mesmo, Don.
— Quem saiu? — indaguei.
— Não faço ideia, acredito que algum soldado foi resolver algum
assunto pendente.
— Viu a Beatrice?
— Não a vi, ainda deve estar dormindo, nunca vejo a sua esposa antes
das onze da manhã.
Ele tinha razão, cheguei a pensar em lhe dar atividades para que ela
não se sentisse tão entediada, mas depois pensei que ela já devesse viver
dessa forma, sem muito o que fazer ao longo do dia.
— A noite do nosso convidado foi animada? — indaguei a Mattia.
— Sim, me encarreguei disso pessoalmente.
— Buongiorno — falei com sarcasmo, entrando na casa do vinhedo.
O homem mantinha o ar petulante mesmo depois de passar a noite
sendo torturado e não ter sequer uma unha em suas mãos.
— Bastardo! — Cuspiu próximo aos meus pés.
— Devo confessar que você é bem forte, mas me diga o quanto a sua
filha aguentaria? — perguntei com as duas mãos no bolso da minha calça
social.
— Não toque na minha família — disse entredentes.
— Não tocarei, é só me dizer o nome da pessoa que você está
protegendo. Quem é? Quem foi o desgraçado que ousou me roubar?
— Eu não sei, ele não aparece, eu sou só um subordinado.
— Se não falará devemos apenas arrancar a sua língua, o que acha?
— Acenei com a cabeça, dando ordens para que fosse feito.
— Espera! — gritou. — Eu ouvi um nome.
— Não venha com mentiras — Mattia gritou, indo na direção do
homem. Eu o contive com a mão em seu peito.
— Diga!
— Luigi — sibilou.
Eu gargalhei.
— Sabe quantos ‘Luigis’ existem no mundo? — Apertei o seu
pescoço com ódio.
— Com quantos deles o Don tem uma dívida que ódio? Ele maquinou
o roubo, contratou homens, e todos eles têm algo contra ao Don. É mais que
receber dinheiro, é vingança.
— Pegue a faca, Mattia — ordenei.
— Vai me matar porque eu disse a verdade?
— Vou matá-lo pela sua afronta e petulância. Você me odeia? Por isso
que se juntou a eles? Pois bem, começarei podando os galhos, até chegar à
raiz e assim evitar que novos cresçam.
Estalei os dedos, e os soldados ao redor ficaram prontos para cumprir
as ordens.
— Cortem a língua dele, coloque em uma caixa com gelo e queimem
o resto.
Mattia parecia feliz com o fim do homem que ele disse que traria,
mas não o fez. Voltou de mãos vazias.
— Don, irá procurar pelos outros? — indagou.
— Claro — respondi, sem entrar em detalhes.
Mattia, como meu consigliere, deveria ser o meu homem de total
confiança, mas há muito tempo que não me sinto assim. Luigi é alguém que
preciso ficar de olho, eu não conheço a sua capacidade, preciso fazer uma
visita ao meu cunhado.
— Tragam o meu carro e me entreguem a caixa com o resto daquele
pobre coitado.
— Onde planeja ir? — Mattia perguntou.
— Mattia, você está dispensado por hoje. Tire o dia e resolva os seus
assuntos.
— Claro, Don.
— Para onde vamos, senhor?
— À casa dos meus sogros.
15
deixe-me levá-la comigo
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
— O que esse carro faz aqui? — perguntei para mim mesmo quando
vi um dos meus carros parado na porta.
— Senhor — o meu soldado disse, arrumando a postura.
— O que faz aqui? — Apertei os olhos, analisando-o.
— Vim trazer a senhora para visitar os pais.
— Quem deu ordens para ela vir? — indaguei entredentes.
— Mattia disse que o senhor havia autorizado — afirmou com a voz
trêmula.
Cerrei o punho e entrei na mansão.
— Beatrice — entrei, chamando-a.
— Don? — Luigi vinha de outro cômodo e me encontrou na sala.
— Onde está a Beatrice?
— Eu ainda não a vi, acabei de chegar do escritório, ela deve estar
vendo a Giulia lá em cima.
Eu esqueci completamente o que eu havia ido fazer lá e subi atrás da
Beatrice, como se a sua desobediência fosse a coisa mais importante do que
um milhão em armas que eu havia perdido.
— Beatrice — esbravejei.
Ela era a única pessoa capaz de me tirar da minha postura calma e
alterar a minha expressão sempre inexpressiva.
— Don? — Ela se sobressaltou, virando-se para mim.
— Venha, vamos embora. — Eu não cumprimentei os meus sogros,
parados próximos à cama, foquei apenas em Beatrice.
— Precisamos conversar antes de ir. — Ela andou apressada na minha
direção.
— Faremos isso em casa. — Puxei-a pelo braço, a arrastando para
fora do quarto.
— Solte-a. — O grito fino e fraco fez com que eu paralisasse os
meus passos.
Beatriz se desvencilhou dos meus braços e voltou para o quarto, se
debruçando na cama para acalentar a garotinha.
— Está tudo bem, minha pipoquinha. — Ela se agarrou a criança que
chorava em seus braços.
— Pipoquinha? — murmurei, tentando me recordar onde ouvi essa
palavra.
— Não toque nela — a criança gritou com audácia.
— Don, a minha irmã está doente — Beatrice pronunciou como uma
súplica.
O olhar da garota encontrou o meu e eu senti um muro enorme sendo
destruído dentro de mim, mas precisei me manter firme para não
demonstrar fraqueza.
— Seja bem-vindo à nossa casa novamente, Don. — Luiza, a minha
sogra, falou.
— Seja breve, Beatrice, e desça. — Virei as costas, saindo do quarto
sem respondê-la.
— Don. — A ouvi me chamar, e paro no meio do corredor, virando-
me para ela.
— Luiza, deixe que converso com ele. — O tom do meu sogro para
ela foi de repreensão.
— Não, eu quero fazer isso — ela retrucou.
Eu perdi a minha mãe muito cedo, mas lembro do respeito que tinha
por ela.
— Fale, eu estou ouvindo.
Luigi estava ao pé da escada, ele é esquentado, protetor, mas o pai
dele era quem dominava o lar, e ele apenas observava tudo, pronto para uma
reação típica dele se fosse necessário.
— Giulia está muito doente, ela tem febre todos os dias, pois sente
falta da irmã, a garota é adotada, a mãe dela morreu e…
— Cala a boca, Luiza — Antônio a impediu de continuar.
Órfã? Lembrei da minha filha e de não ter tido a oportunidade de vê-
la, mesmo que morta.
— Aonde quer chegar com isso?
— Don, meu marido, por favor, deixe-me levá-la comigo. — Beatrice
saiu do quarto e veio em minha direção, ela implorou, deixando que o
joelho tocasse o chão.
— Levante-se — ordenei, sem baixar o meu olhar para vê-la implorar
aos meus pés.
— Que merda! Você não está vendo o que está causando, você está
destruindo a minha família, a vida da minha irmã — Luigi, então, se
pronunciou.
Ele tinha, sim, motivos para querer criar um exército contra mim, e
tudo isso que aconteceu foi de grande valia, eu precisava agir em silêncio e
esperar o momento exato, quem ousou armar contra mim não ficaria
impune e teria um fim lento e doloroso.
— Trice… — A voz fraca da garotinha surgindo no corredor me
impediu de ter uma reação contra Luigi, eu sentia algo diferente quando a
via. Culpa e remorso, logo identifiquei os sentimentos, eu não pude ter a
minha filha nos meus braços, e essa menina... estava nítido que ela tinha a
Beatrice como mãe.
— Traga a menina, Beatrice, vou estipular o prazo que ela poderá
ficar em minha casa.
16
O que você acredita que sou, Beatrice?
Beatrice Marino
— Vai deixar a Giulia ir? — meu fratello perguntou ao meu pai, que
confirmou com a cabeça.
— Luigi, a Giulia ficará só alguns dias — respondi, pegando-a no
colo. — Vou organizar a bolsa dela.
Na volta, Vincenzo foi em outro carro, Giulia estava animada,
aninhada em meu colo.
— Vou morar com você, Trice?
— Veremos. — Sorri para ela enquanto alisava os seus cabelos.
— Que casa linda! — Giulia saiu do carro, admirada com o local. A
nossa casa é linda, mas a vinícola ao redor da propriedade do Don é
encantadora.
— Don? — o chamei assim que o carro estacionou.
— Acomode a criança que parece ter melhorado milagrosamente e
depois venha me ver em nosso quarto.
— Sim. — Peguei na mão de Giulia e caminhei logo atrás dele.
Ela ainda estava com febre, mas agora dava para ver a felicidade em
seu rosto.
— Ele está bravo? — Giulia indagou.
— Um pouco.
Ela se soltou da minha mão e correu, puxando Vincenzo pelo terno.
— Gio, vem aqui! — sibilei.
— O que quer? — questionou com uma voz irritada.
Ela fez um gesto com o dedo indicador, chamando. Ele virou o rosto
para o lado oposto, deu um longo suspiro e se abaixou, ficando na altura
dela, que o surpreendeu com um beijo no rosto. Ele se levantou, arrumando
a postura, sua expressão dura havia se desmanchado.
— A menina ainda está com febre, Beatrice, leve-a para o quarto e
chame a médica.
— Nina? — indaguei.
— Isso, chame-a.
Ele entrou na casa e eu corri até a Giulia, pegando-a no colo.
— Trice, esses são os seus desenhos? — Ela olhou encantada para os
quadros pendurados nas paredes.
— Não, só são parecidos.
Entrei no meu antigo quarto e a deitei na cama. Liguei para Nina, e
ela chegou tão rápido que eu poderia jurar que ela já estava a caminho da
mansão.
— Que menininha linda — disse, entrando no quarto. — O que essa
garotinha linda tem, vamos ver.
— Nina, vou te deixar com a Giulia um pouco, não demoro.
Eu não sabia o que estava deixando Vincenzo tão irritado, mas
caminhei temerosa pelos corredores e coloquei a cabeça na porta
entreaberta.
— Entre — disse sem nem virar, como se tivesse conseguido ouvir
os meus passos pelo corredor até aqui.
— Desculpe a demora, eu-eu… — começo a falar, mas gaguejo, e
não tive a oportunidade de continuar porque ele me interrompeu.
— Quem lhe deu permissão para sair de casa? — indagou, irado.
Dei de ombros, confuso.
— Você — respondi sem hesitar.
— Eu? — Ele se aproximou e inclinou o corpo em minha direção.
— O Mattia, ele ligou na minha frente e disse que estava tudo bem.
— Mattia? Olha bem para mim, Beatrice. — Ele passou a mão pela
minha nuca, trazendo-me para perto e colando o seu rosto ao meu. — Eu,
somente eu digo o que pode, ou não, e eu faço isso pessoalmente, consegue
me entender?
— Perfeitamente. — Ele me soltou bruscamente.
— Da próxima vez, me procure.
— Era urgente, e eu fui apenas à casa dos meus pais. Por que age
como se eu fosse uma prisioneira? — indaguei, demonstrando um pouco de
irritação.
— Você acha que é livre? Acredita que tudo isso é um conto de
fadas? Eu pareço um príncipe para você? — Ele sorriu com sarcasmo.
Não pude conter a lágrima que teimou em cair dos meus olhos.
— Você acredita mesmo que eu me importo com contos de fadas ou
com o que você é ou deixa de ser? Sou humana, eu não sou um animal para
você manter preso. — Vi que a minha afronta não o alegrava, ele me
encarava furioso. — Você é um vilão? — Sorri com ironia, enxugando mais
meia dúzia de lágrimas.
— O que você acredita que sou, Beatrice?
— O que sei, Don, é que um vilão só é vilão quando a história é
contada por um herói, talvez ele apareça e salve a donzela em perigo.
— Não me afronte, Beatrice — ele rosnou, irado, e fechou os dedos
ao redor do meu braço com força.
— Você não faz ideia da vida que levei. Eu vivi presa numa redoma
de vidro. A menina doente, que não podia sequer pegar um resfriado e,
quando começo a viver, você vem e me prende de novo. Eu queria dizer que
estou odiando tudo isso, essa casa, você, mas não é assim que eu me sinto, o
meu coração acelera quando estou perto de você, e eu sinto que ele bate por
você todos os dias e a cada segundo da minha existência.
Ele afrouxou as mãos em volta do meu braço e apertou os olhos, me
encarando confuso.
— É estranho, eu sei, mas eu sinto que esse coração te ama muito
mais do que eu gostaria.
— Saia! — gritou. — Agora, Beatrice!
— Eu iria para o mais longe possível se você assim desejasse. — Eu
queria que essas palavras fossem verdade, mas não eram.
— Às vezes, os seus sonhos e projetos vão exigir de você muito mais
do que só fazer o que lhe dá prazer. Para chegar a certos objetivos, Beatrice,
às vezes é necessário abdicar do descanso, do lazer, das noites de sono ou
até mesmo da companhia tranquila de alguém que durma ao seu lado e lhe
dê bom-dia no nascer do sol. São coisas necessárias para se alcançar o que
deseja.
— Eu só desejo viver, e a vida requer tudo isso que você está disposto
a abdicar.
— Sinto muito, mas agora essa é a sua vida também. Agora saia, vá
cuidar da sua irmã.
Então era isso? Eu estava destinada a viver isso? Virei as costas,
deixando-o sozinho no quarto. Esse homem carrega consigo cicatrizes que
eu não consigo ver, dores que eu não posso sentir, mas, ainda assim, cada
pulsar do meu coração grita que estou onde deveria estar, ele só precisava
descobrir isso.
17
Me perdoe, Anna, eu acho que estou prestes a amar novamente
Vincenzo Ferrari
Beatrice é, de longe, o que esperei que ela fosse, está longe de ser
alguém que considerei ignorar.
— Mas do que ela estava falando sobre uma saúde frágil? — indaguei
para mim mesmo, ainda confuso. Sei pouco sobre ela, e essa afirmação só
me mostra o quanto estou interessado em saber além do necessário.
Peguei o telefone e liguei para Mattia.
— Me encontre no escritório — disse assim que ele atendeu e
desliguei antes que ele pudesse me responder.
Desci, achando que iria esperar pela sua chegada, mas ele estava lá,
de costas para a porta, mexendo nos objetos sobre a minha mesa.
— Quem havia saído no carro no momento em que encontrei você na
porta, Mattia?
— Por que me pergunta novamente se eu já respondi?
Me aproximo e ajusto o terno em seu corpo.
— Mattia, você é o meu conselheiro, meu primo, um homem a quem
dei total confiança. Admito que às vezes agi cruelmente, como no dia em
que queimei as suas mãos com água fervendo. — Ele puxou o ar com força
e me encarou contendo a raiva. — Não quero ter que arrancar sua língua
por mentir descaradamente.
— Do que me acusa, Don? — Ele deu passos para trás, se afastando
de mim.
— Beatrice me falou sobre uma ligação, sobre certa autorização para
visitar a família.
— Confia mais na sua nova esposa do que em mim, que, como você
mesmo disse, sou seu conselheiro e homem de confiança.
— Certo, vamos convidar o soldado para essa conversa. — Ele
arregalou os olhos.
— Vai me questionar em frente a um soldado?
— Não quero que haja brechas para desconfianças entre nós, primo.
Ouvi baterem na porta e permito a entrada.
— Pois não, Don — disse o soldado, entrando e baixando a cabeça
em forma de respeito.
— Quem lhe autorizou levar a minha esposa à casa dos pais? — Ele
levantou a cabeça e olhou hesitante para Mattia, que não tinha nenhuma
expressão.
— Fui informado que o senhor havia autorizado.
— Quem informou? — Ele voltou a direcionar o olhar para Mattia.
— Eu? Você resolve por si próprio que levará a senhora, e eu sou o
culpado?
— Eu nunca faria nada por conta própria, senhor.
— Imagino que todos aqui tenham amor às suas vidas, saia —
ordeno, e ele o faz rapidamente.
— Que mal há em sua esposa visitar a família, Vincenzo?
Espalmei a mesa com fúria.
— Don Vincenzo, não esqueça que sou seu superior e que você me
deve obediência, respeito e lealdade.
— Giulia, Giulia. — Os gritos de Beatrice me fizeram sair apressado
do escritório.
Subi as escadas tão rápido quanto pude.
— O que aconteceu? — perguntei, entrando alarmado no quarto, e me
deparo com o olhar espantado de Nina, me encarando como se eu fosse uma
aberração.
— Ela estava pulando na cama, se desequilibrou e caiu, já viu a altura
dessa cama? — Nina indagou com um ar cômico.
Senti o meu coração se acalmar, vendo-a deitada com uma máscara de
oxigênio. Essa criança nem é nada minha, mas, ainda assim, estranhamente
sinto carinho por ela. Me recompus, arrumando a postura.
— Não grite mais dessa forma, Beatrice, eu pensei que… que… —
Procurei as palavras.
— Que um assassino tivesse entrado nessa casa supersegura, cercada
de homens armados, e tivesse tentado contra a vida da garotinha — disse
Lorenzo com deboche, entrando no quarto. — Que menina fofa. — Ele se
sentou na cama ao lado de Nina.
— Sim, ela é linda. — Beatrice sorriu, se desfazendo da expressão
preocupada.
— Beatrice, me acompanhe. — Ela confirmou com a cabeça e me
seguiu.
Caminhei para fora de casa e parei embaixo de um pinheiro próximo
ao vinhedo.
— Esta casa é tão grande, o terreno é gigante — comecei a falar —,
ainda assim, você se sente aprisionada.
— Não posso percorrer por toda área, lembre-se que impôs limites —
ela voltou a falar se referindo a Alessia, e eu ignorei por completo a sua
queixa sobre o assunto.
— Você vai estudar, disponibilizarei um motorista e dois seguranças.
— Mudo de assunto, indo direto ao ponto.
Ela abriu um lindo sorriso, eu queria dizer que não senti nada. Eu
fingi não me importa com ele.
— Não vai dizer nada? — indaguei, esperando mais da sua reação.
Ela caminhou apressada, zerando a distância entre nós, e envolveu a
minha cintura com os seus braços, me apertando com força. Os meus
braços, até então esticados, levantaram-se lentamente, a envolvendo dentro
deles.
— Por que, Beatrice? — Era para ser um pensamento, mas pronunciei
as palavras mais alto do que deveria.
— O quê? — quis saber, confusa, levantando a cabeça para me
encarar.
— Eu sinto vontade de te proteger, eu sinto vontade de ser Vincenzo
Ferrari — respondi, encarando os seus olhos e desejando a sua boca.
— Você iria rir de mim se eu disser que eu sinto vontade de te libertar
de você mesmo.
Encarei os seus lábios por mais alguns segundos e soltei o ar com
força dos pulmões.
“Me perdoe, Anna, eu acho que estou prestes a amar novamente”,
pensei, encarando o céu.
Um estrondo foi ouvido do céu e uma chuva caiu de repente.
Beatrice soltou-se de mim e colocou as duas mãos sobre a cabeça
como se elas fossem capazes de aparar a chuva.
— Don, vamos correr. — Ela correu em direção à mansão.
Corri tão rápido quanto ela e puxei-a pelo braço, trazendo-a para um
abraço. Levantei seu rosto delicadamente com o meu dedo indicador e
encostei os meus lábios aos dela; minha língua iniciou uma busca
arrebatadora pela dela. Com minhas duas mãos emaranhadas entre as
mechas dos seus cabelos, pressionei o seu rosto contra o meu, as descendo
em seguida, puxei o seu corpo para mais perto e senti meu pau latejar de
desejo por ela.
— Vem. — Puxei-a para dentro do vinhedo e, sem pensar em mais
nada, voltei a beijá-la com paixão e desejo.
Abaixei a alça do seu vestido e levei minha boca até os seus peitos
duros e arrepiados.
— Você enlouqueceu, e se alguém nos ver? — indagou, cobrindo os
peitos com seus braços.
— Quem são os insanos que ficariam andando embaixo desse
temporal? — Sorri como um adolescente quando o seu rosto corou.
Tornei a puxá-la até entrarmos na vinícola, eu a tomaria ali entre os
barris de vinhos. Seu vestido branco estava transparente e totalmente colado
ao seu corpo. Deitei-a no chão e levantei o vestido, me coloquei entre as
suas pernas e abri a minha calça, então, não demorei para colocar o meu
pau duro para fora.
— Don, nós vamos pegar um resfriado — disse, ofegante.
— Eu poderia morrer de espirrar amanhã, mas nada me faria parar o
que estamos prestes a começar agora.
A minha boca voltou a encontrar os seus peitos deliciosos, enterrei os
meus dedos em suas coxas abrindo bem as suas pernas e entrei sem nenhum
aviso.
— Cacete de mulher deliciosa!
Ela gemeu alto e me deixou alucinado, louco de tesão. Tirei o meu
paletó, jogando-o de lado, e voltei a me concentrar naquela boceta
deliciosamente apertada e molhada de prazer.
— Fica de quatro; — Ela fez prontamente, enrolei os seus cabelos em
minha mão e a fodi com força. Levei a minha mão até a sua boceta e passei
a estimular a seu clítoris. — Beatrice, eu não vou me segurar por mais
tempo, mas quero que você goze para mim. — Intensifiquei o estímulo até
sentir o seu corpo estremecer e, assim, com estocadas mais fortes, explodi
dentro dela.
— Nossa! — Ela se jogou no chão, e eu sorri, satisfeito, vendo-a
ofegante ainda se tocando com o corpo implorando por mais.
18
Seguirei conforme as leis da Cosa Nostra
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Eu a peguei pelo braço e atravessei o jardim, arrastando-a sem o
mínimo de cuidado.
— Beatrice, você foi avisada de que não deveria ir até aquela parte da
propriedade — disse aos gritos assim que entramos no quarto.
— Fale o que fará com o meu irmão? O que ele te fez? — Ela me
batia e gritava, me desafiando.
— Me fale que ligação vocês têm com os russos? Você sabe algo
sobre isso?
— Os russos? O que a Rússia tem a ver com tudo isso? — Ela parecia
confusa. — Don, é crime ter contato com algum russo? Isso afronta você de
alguma maneira?
Sorrir com a sua pergunta.
— Beatrice, uma carga de armas foi roubada e isso envolve uma
perda milionária, mas o pior ainda estar por vir, essa carga foi encontrada
nos galpões do Andrei.
— Andrei? — indagou, tentando puxar da memória.
— Não sabe quem é Andrei? Ouvi dizer que ele tinha interesse por
você e passou um tempo na Rússia, estou certo?
— Por favor, o meu irmão nada tem a ver com isso. Ajude-o.
— Eu te aconselho a não fazer isso, Beatrice — disse quando um dos
seus joelhos tocaram o chão. — Se você se ajoelhar, não posso garantir que
o faça apenas para implorar. — A vi hesitar, mas a sua vontade de implorar
pelo irmão falou mais alto e o seu outro joelho alcançou o chão, e eu sorri
com satisfação. — Vejo que está disposta a fazer mais do que implorar. —
No meu tom de voz, havia sarcasmo.
— O que devo fazer? — A sua ingenuidade me comoveu, e eu abri a
minha calça, mostrando-lhe meu pau lambuzado pela minha excitação.
— Use a sua boca com sabedoria, e eu pensarei o posso fazer a
respeito — Ela ainda parecia não entender e isso só me fez perceber que ela
é mais inocente do que julguei ser. — Me chupe! — respondi sem delongas,
colocando um dos meus dedos em sua boca.
Senti a sua língua passear pelo meu dedo, e eu já estava gemendo só
de imaginar a sua boca inexperiente me devorando. Ela pegou o meu pau
com as duas mãos.
— Apenas imagine um doce — pronunciei quando a vi olhando sem
saber o que faria. Ela encontrou a sua língua vagarosamente no meu pau, eu
tremi quando a senti, a sua inexperiência e falta de jeito me excitavam mais
do que se eu estivesse com a melhor profissional de boquetes.
— Assim? — indagou enquanto eu arqueava as costas entregue a
sensação.
— Apenas faça como sabe — respondi, sentindo os movimentos da
sua língua ganharem ritmo. — Delicioso! — gemi.
Não me controlei e enrolei minha mão em seus cabelos para foder na
sua boca deliciosa, uma lágrima brilhou no canto dos seus olhos enquanto
eu a fodia.
— Cacete! — urrei, sentindo que não iria demorar para gozar. Ela
estava empenhada em me chupar e usava a língua deliciosamente. Senti a
excitação vindo e despejei na sua boca, que, para minha surpresa, engoliu
sem fazer cara feia. Levantei-a do chão, limpando os cantos da sua boca.
— E agora, vai poder me ajudar? — quis saber, me mostrando a única
razão para tanto empenho.
— O que possivelmente o seu irmão fez é muito grave, não posso
garantir nada, mas posso jurar que, se ficar provado e ele for condenado, a
sua morte será rápida e eu pouparei você e o resto da sua família.
— Você disse… — Coloquei o dedo em seus lábios, a impedindo de
continuar, e uma lágrima de decepção caiu dos seus olhos.
— Eu odeio ser questionado, Beatrice.
20
Beatrice é uma espiã?
Beatrice Marino
Senti algo pressionar o meu peito, tentei respirar, tudo girava ao meu
redor. Eu pressionava o meu peito, tentando aliviar a dor que me sufocava.
— Vincenzo — tentei gritar, ele já havia alcançado a porta e a minha
voz saiu baixa, fraca. Por sorte, ele olhou-me antes de cruzar a saída.
— Beatrice? — Vi o desespero em seus olhos quando ele me
alcançou, me segurando em seus braços antes que eu caísse no chão.
— Vou morrer, chame a Nina — pronunciei com dificuldade.
— Liguem para a Nina — gritou para o soldado que ficava no
corredor dos quartos. Ele não hesitou em atender o meu pedido. — Você
não vai morrer, não ficarei sozinho novamente.
Ele se importava comigo, e isso era contraditório às suas ações.
Vincenzo desceu comigo em seus braços; na propriedade, tinha uma sala de
emergência onde os soldados feridos eram atendidos, tudo muito bem
equipado.
— Estou aqui, Don. — A voz de Nina me tranquilizou. — O que está
sentindo, Beatrice? — indagou.
— Falta de ar, dor, eu não sei. — A resposta veio de Vincenzo, que
pronunciou as palavras com angústia.
***
Vincenzo Ferrari
— Nina, ela desmaiou — pronunciei com desespero.
— Calma, calma, tire os sapatos, tire tudo, ela precisa respirar. Se
acalma, Beatrice. — Ela ligou o eletrocardiógrafo com rapidez. — Ela está
infartando, me ajude, pegue desfibrilador.
— Como assim infartando?
— O coração está parando — ela me respondeu, mesmo sabendo que
eu havia entendido o que ela tinha dito.
— Beatrice, não faz isso comigo. — O som da máquina informando a
parada cardíaca fez o meu coração parar com o dela.
— Se afaste — exigiu, se aproximando com o desfibrilador. — Volte,
Beatrice — pediu com desespero.
— Você não vai me deixar, Beatrice — disse em um tom autoritário,
exigindo que ela voltasse, enquanto Nina tentava fazer o seu coração voltar
a bater.
— Ela voltou. — A sua voz saiu com um suspiro aliviado.
Eu me sentei na poltrona, sentindo as minhas pernas fraquejarem. Eu
senti medo de perdê-la, o mesmo que senti no dia em que perdi a Anna.
— Já pode respirar, foi apenas um susto, ela ficará bem.
— Nina, qual o problema dela? — Ela virou-se de costas e dedilhou a
mesa na sua frente.
O silêncio dela me deixou irado, eu quase perdi a Beatrice.
— Fale logo! O que você escondeu de mim?
— Um problema cardíaco. — Ela juntava os equipamentos com
pressa, evitando me encarar.
— Ela… pode morrer?
— Claro! — respondeu como se fosse óbvio. — Qualquer ser vivo
pode morrer a qualquer momento e, nos doentes, o risco é maior.
Levantei-me e caminhei até ela que permaneceu de costas.
— E por que não me falou sobre isso? — bradei em seu ouvido.
— Ela estava com medo de te contar. Eu senti pena dela — respondeu
sem delongas.
— Certo. — As palavras saíram em um suspiro. Peguei o bisturi que
estava na bandeja em sua mão e arrastei sobre o alumínio, causando um
som irritante. — O que mais você me esconde, Nina?
— Nada, era apenas isso. — Ela deu vários passos para trás, e eu a
puxei pelo braço, encostando o bisturi em seu pescoço.
— Me fale sobre os remédios — ordenei.
Ela engoliu seco, desviando os olhos do meu.
— São para o coração, se ela deixar de tomar, vai embora mais cedo.
— Certo, e onde está a parte que eles serviam para dormir?
— Eu já disse tudo, Don.
A porta se abre, e Lorenzo me encara espantado e vem apressado em
direção a Nina.
— Eu já trouxe o seu cunhado — disse, baixando a minha mão. Uma
gota de sangue escorreu pelo pescoço de Nina. Ela apoiou-se na mesa para
não cair, todo o seu corpo tremia.
— Me acompanhe. — Joguei o bisturi de volta na bandeja.
Soquei a parede na saída.
— O que foi isso? Você estava com o bisturi no pescoço dela — A
voz de Lorenzo reverberou, me repreendendo.
— Ela mentiu, Lorenzo, Beatrice é cardíaca.
— E pelo que a culpa, pela mentira, ou pela quase morte da Beatrice?
Eu tentava controlar a minha raiva e sede por sangue. Eu respirava
apressado e andava de um lado para o outro, passando a mão nos cabelos
diversas vezes.
— Ela terá que ser punida.
— A sua esposa também mentiu, se tiver que punir, deverá fazer com
as duas — ele disse, me desafiando.
Lorenzo sabia que estava começando a ter sentimentos por Beatrice e
que eu iria querer poupá-la, mas o pior ainda viria, ele estava a metros
daqui e se chamava Luigi.
— Não existe punição melhor, Vincenzo, resolvemos esse assunto e
descobriremos o que eles têm com os russos, afinal. Ah… e caso você não
saiba, a sua esposa estava espionando você com a Alessia no momento em
que ouviu sobre o irmão.
— Ela me viu com Alessia?
— Vocês estavam na varanda.
— Não aconteceu nada, eu estava apenas bebendo, não estou traindo
a minha esposa — afirmei.
— Diga isso ela e não para mim. — Ele sorriu com deboche.
Andei com preocupação até a casa do vinhedo, eu não poderia fechar
os olhos para esse problema.
— Don, por que me trouxe? — Luigi tinha o desespero nos olhos. Ele
estava com os braços amarrados atrás da cadeira.
— Luigi — Peguei uma cadeira e me sentei ao lado dele —, tudo leva
a você.
— Tudo o quê? — Seu olhar confuso quase me convenceu, mas as
provas eram evidentes.
— As armas, Luigi, como soube do carregamento? Qual a ligação da
sua família com os russos?
— Cacete! Você acha que eu faria alguma coisa tendo minhas duas
irmãs aqui com você?
— Quer acabar comigo, Luigi, se acha capaz?
— Onde está a minha irmã? Ela está bem?
— Preocupe-se com você. O seu pai também está envolvido?
— Eu não sei do que está falando.
— Cacete, Beatrice é uma espiã? — A ideia surgiu na minha mente
como um estalo.
— O quê? Nós nunca te oferecemos a Beatrice, foi você que a
procurou e que a trouxe — gritava. — Não machuque a minha irmã. Mate-
me, faça o que quiser, mas não toque nas minhas irmãs.
A minha respiração estava ofegante, eu não estava sendo racional. Saí
da casa ouvindo os gritos de clamor de Luigi pelas irmãs.
— Levem-no para o galpão central, deixe-o no mesmo lugar que os
outros e façam ele falar.
— Devemos torturá-lo?
— Sim, mas não lhe tirem nenhum pedaço.
— Faremos como ordena, senhor.
Retornei para casa e o choro distante de criança me chamou atenção,
subo até o quarto que era de Beatrice e encontro uma funcionária tentando
acalmar Giulia.
— Qual o problema? — A mulher salta, se assustando.
— Nada, senhor, ela só está sentindo falta da irmã, mas farei ela se
acalmar, não se preocupe.
— Saia. — Ela arregalou os olhos e me olhou assustada, mas não teve
coragem de contestar.
— Eu quero a Trice — disse aos berros.
— A sua irmã não poderá vir agora, mas pode pedir o que deseja, e eu
farei o possível para atender ao seu pedido. — Sentei-me na poltrona,
mantendo certa distância da cama.
— Me conte uma história.
— História? — Arqueei as sobrancelhas com um semblante
pensativo.
A minha mãe morreu quando eu tinha a idade dela, mas eu não me
recordo de histórias infantis.
— Sim, Pinóquio. — Ela se aconchegou entre os travesseiros,
esperando que eu começasse.
— Bom… Pinóquio… — Peguei o celular, procurei pela história e
iniciei a leitura.
— O senhor pode se deitar perto de mim? Eu tenho medo de dormir
sozinha — pediu, manhosa.
Me aproximei um tanto hesitante, a situação era desconcertante, eu
nunca tive contato com uma criança tão pequena, embora a porta oculta do
meu quarto me leve a um imenso universo infantil montado para a minha
pequena que hoje teria a idade da Giulia.
Giulia começou a cantarolar uma canção que fez o meu coração parar
por alguns segundos.
“…. Quero ter sempre você comigo
Hoje senti de verdade que
Não posso mais viver assim
Para mim você sempre é
o primeiro amor…”
Ela pronunciou o soneto de olhos fechados. Apertei os meus olhos,
tentando conter as lágrimas.
— Onde você ouviu essa música? — indaguei com os olhos ainda
fechados, ouvindo Anna cantá-la enquanto arrumava as roupas da nossa
filha no closet.
— A Trice canta essa música para mim antes de dormir.
— E você gosta?
— Hum rum…. Eu gosto.
Senti as minhas mãos tremerem, eu queria alisar os seus cabelos, mas
a única coisa que consegui foi cantarolar alguns versos desafinado, lhe
acompanhando na canção com a voz embargada, engolindo a vontade de
chorar.
— Anna, o que quer com isso? — indaguei, encarando o céu limpo e
repleto de estrelas.
21
Acho que estou me apaixonando por você
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
— Nina disse que deve ficar de repouso por mais alguns dias —
disse, vendo-a querer levantar.
— Preciso ir ao banheiro — respondeu, carrancuda. — Vai dormir
aqui? — Seu tom era de deboche.
— Vou — respondi, me sentando do meu lado da cama.
— Hum…
Os seus olhos estavam vermelhos e úmidos como alguém que havia
chorado por um longo tempo.
— O seu irmão está bem, ainda estou investigando.
Ela retornou do banheiro e se deitou de costas para mim em silêncio,
me ignorando.
— Eu não sou um louco que sai matando as pessoas sem motivos,
Beatrice.
Pude ouvi-la aspirar o nariz com força.
— Do que acusa o meu irmão? — indagou em meio aos soluços.
— Chega, Beatrice, já está quase amanhecendo, durma.
— Acredita que sou capaz de dormir? Não consegue ver as olheiras
nos meus olhos?
— Deveria usar os seus remédios para dormir, acredito que serão
úteis — pronunciei com deboche.
— Deboche não combina com você, Don, mas talvez eu devesse usá-
lo também. Deveria considerar ir dormir com Alessia, como tem feito
diariamente desde que nos casamos.
— Sente ciúmes?
— Sinto nojo, você fica com ela e depois vem tocar em mim.
— Não toco mais se não quiser.
Eu queria dizer a ela que não havia tocado da Alessia desde que
ficamos pela primeira vez, mas não achei que ela devesse ter essa
informação.
— Prefiro dessa forma.
— Se me fará restrições, não reclame por não dormir na nossa cama.
— Não venha querer inverter e me culpar por algo que não começou
por mim.
— Sinto muito. — Suspirei, derrotado, recostando minha cabeça no
travesseiro.
— Resolvi que vou para a faculdade, espero que não tenha voltado na
sua decisão.
— Faça como desejar.
— Se importa se eu montar um ateliê em alguma área da propriedade.
Senti um aperto no peito, lembrando-me do dia em que montei um
para Anna.
— O que vai estudar?
— Artes.
Sorri sem humor, virando-me para o lado oposto a ela, passei longos
minutos em silêncio e ela também não disse mais nada.
— Beatrice, eu estou prestes a fazer a maior burrada da minha vida.
— Sorri, quando comecei a falar. — Acho que estou me apaixonando por
você, mas estou com medo, medo de estar confundindo as coisas, medo de
estar vendo coisas que não existem. Eu queria renunciar a tudo e ir embora
com você para longe, para onde eu seja apenas Vincenzo, e se não for pedir
muito, eu queria levar a Giulia. — Tornei a sorrir sem humor e continuei
com a voz embargada. — Sou um filho da puta egoísta que estou vendo em
vocês a família que perdi. — No final, eu já havia me arrependido de tudo
que eu havia dito, mas não tinha como voltar.
Esperei a resposta, mas o silêncio foi a única que recebi, até ouvi-la
ressonar. Virei-me para checar e suspirei com alívio. Ela não ouviu nada,
mas eu me sentia aliviado por conseguir falar.
Levantei-me e fui ao quarto da Giulia, me sentei na poltrona e fiquei
vendo-a dormir.
— Você está louco, Vincenzo. — Recostei a cabeça na poltrona. — É
impossível isso — repetia para mim, vendo aquela criança dormir, eu tinha
me acostumado com a rotina de vir vê-la e conferir se ainda respirava.
Fechei os olhos, e Beatrice me vem na mente. — Por que eu a quero tanto?
“Um coração carregar memórias, Vincenzo”.
“O meu coração acelera quando estou perto de você, e eu sinto que
ele bate por você, todos os dias e a cada segundo da minha existência”.
— Não! É impossível.
Retornei para o quarto onde Beatrice dormia, desabotoei os botões da
blusa que ela usava para dormir e arrastei o meu dedo entre seus dois peitos.
— Se fosse o caso, Vincenzo, estaria aqui — afirmei para mim.
— O que está fazendo? — Ela acordou assustada, se cobrindo. — Por
que está me tocando enquanto eu durmo?
— Volte a dormir, Beatrice.
“ Russa, ela disse que a menina não é uma italiana pura”.
E se o coração da Anna esteve bem aqui? Saí do quarto e fui direto
para o escritório.
— Não, Vincenzo, ela não tem nenhuma marca. Não viaje.
Peguei uma garrafa de uísque e bebi direto da garrafa, os
pensamentos faziam minha cabeça latejar. O que eu faria se esse meu
delírio fosse real? Eu sempre achei que matar a todos e mantê-la comigo
seria uma solução, mas agora começo a pensar como eu iria ferir o coração
que carrega todo o amor que quero para mim.
22
Fique de quatro
Vincenzo Ferrari
***
Beatrice Marino
Vincenzo Ferrari
***
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Eu estava na Sicília, seguindo as pistas do Francesco, eu só voltaria
quando tivesse respostas, eu não viveria como um louco vendo a Anna em
cada canto.
— Você já parou para pensar que sentido faz toda essa busca, Don —
Lorenzo falou do banco da frente do carro.
— Você tem uma hora para rastrear o paradeiro daquele infeliz.
— Farei conforme ordena, Don, embora eu considere tudo isso inútil,
te fará sofrer ainda mais, não percebe isso? Anna se foi, aceite.
— Ela não se foi, ela foi arrancada de mim, assassinada para que
outra pudesse viver.
— E o que pretende, Vincenzo? Pare já com isso, não trará a Anna de
volta.
— Ela vive dentro da outra, Lorenzo, ela está lá.
— Isso é doença, irmão.
— Uma hora, Lorenzo — resmunguei com o olhar inexpressivo fixo
na paisagem que passava pela janela.
Ele não fazia ideia, mas todo esse desespero se tornou maior, porque
eu senti Anna perto de mim.
— Chegamos, foi daqui que rastrearam as últimas ligações dele.
Encarei o local deserto, sem o mínimo de vestígios de civilização ou
que algum humano havia passado por lá, exceto o quadrado feito de
madeira que estava a alguns metros, seria impossível alguém viver aqui.
Desci do carro, tirando o lenço do bolso, tinha urubus rondando o
quadrado de madeira indicando que havia algo podre lá dentro.
— Abram a porta — ordenei.
— Cacete! — Lorenzo vira as costas, tampando o nariz.
— Maldito — cuspi as palavras com ódio. — Morto? — pronuncio
inconformado, vendo-o estirado no chão. — Maldição. Vasculhem tudo.
Saí do cubículo, tentando voltar a respirar e não pelo fedor
insuportável que estava lá dentro, mas porque a única pessoa que poderia
me dizer toda a verdade estava morto.
24
Ser meio russa não é crime
Vincenzo Ferrari
— Isso deve ser um aviso de que você deveria esquecer esse assunto
— Lorenzo falou quando estávamos no caminho de volta para casa.
— Me entregue o gravador.
— O que fará com as poucas informações? — ele perguntou sobre o
áudio do Francesco que foi encontrado no local.
Encostei a cabeça no encosto do banco do carro e não lhe respondi, eu
toquei cada milímetro de pele de Beatrice, e não tem vestígios de um
transplante. Mas eu continuava considerando a questão.
— Desviei o caminho, me leve até o Luigi — ordenei ao motorista,
que me atendeu prontamente.
Quando o carro estacionou, desci do carro, e Lorenzo fez o mesmo.
— Volte, Lorenzo, tenho um assunto particular com o meu cunhado.
— Uma ruga se formou no meio de sua testa, mas ele não perguntou, abriu
a porta do carro e tornou a se sentar, mexendo no celular em seguida.
Luigi estava em uma cela confortável com uma cama e um banheiro,
diferente das outras onde tudo era realizado no chão. Sua aparência era
lastimável e o mau cheiro era insuportável.
— Don. — Ele levantou os olhos para me encarar.
— Vim em paz, cunhado — Levantei minhas mãos, mostrando
rendição.
Estalei os dedos e um dos soldados veio prontamente.
— Providenciem um banho e uma mesa farta em meu escritório, e
ofereçam ao meu cunhado. — O soldado saiu rapidamente para cumprir as
minhas ordens. — Vamos conversar quando seu odor estiver menos
desagradável.
Eu estava recostado em minha cadeira com os pés sobre a mesa
quando Luigi saiu do banheiro.
— Sente-se melhor, cunhado? Um banho sempre me faz recarregar as
energias.
— Quando vai me tirar daqui ou me matar de uma vez?
— Diga-me, Luigi, qual a ligação de vocês com os russos? — Tirei as
pernas da mesa e me levantei, caminhando até ele lentamente.
— Eu já lhe disse que não tenho nada a ver com o roubo dessas
armas. Qualquer pessoa pode ter elaborado isso, Andrei tem os motivos
para querer lhe ver irritado.
— Quais? — Inclinei o corpo em sua direção.
— Poder, território. — Deu de ombros.
— Beatrice — disse em tom sugestivo.
Ele baixou a cabeça, puxando o ar com força.
— Me diga o que cacete tem entre a sua família e o Andrei.
— O que sente pela minha irmã? — Gargalhei com a pergunta.
— Acredita que sou capaz de ter sentimentos por alguém? —
indaguei, e ele sorriu da própria pergunta.
— Se quer tanto saber, a minha mãe é russa, m0,as sempre servimos
ao nosso país e ao senhor, meu cunhado.
Aquela informação me deixou mais confuso sobre Beatrice ser a
garota que era meio russa que o meu pai queria ao meu lado, mas como?
Ela não tinha nenhuma marca.
— E as armas, Luigi?
— Não faço ideia — sibilou.
— Não vou insistir, Luigi. Levem ele de volta para a cela dele.
— Agora que sabe sobre a nossa nacionalidade, o que fará com a
minha irmã? — perguntou antes de sair do escritório.
— Ser meio russa não é crime, Luigi, contanto que vocês escolham
servir a Itália.
Voltei para o carro em silêncio. Lorenzo me olhou pelo retrovisor,
mas não fez perguntas.
Me tranquei no escritório assim que cheguei e voltei a ouvir o áudio
do gravador que encontraram no local onde Francesco foi encontrado
morto.
“Don, o seu pai foi o culpado de tudo, ele planejou tudo sozinho, a
família da garota não sabia nada sobre a assassinato da Anna. Morrerei
por saber dessa informação, eles me caçam assim como você tem me
caçado, eles querem me matar para que você não saiba quem é ela, eles
têm medo de que você queira machucar a garota. Droga! Eles me
acharam…”
Jogo o gravador contra a parede de raiva, como ele pôde levar tiros
antes de dizer o nome?
— Droga! Maldição. — Arrastei tudo que estava sobre a mesa em um
único movimento com o braço e o que sobrou, arremessei contra a parede.
Eu estava perto, muito perto.
— Você chegou? — Beatrice entrou na sala sem bater. — Nossa! —
E se encolhe na porta, olhando as coisas quebradas no chão e a minha
expressão transtornada.
— Por que não bateu? — perguntei, ríspido.
— Desculpe, volto em outra hora. — Ela endireitou as pernas,
apressada, virando-se para sair da sala.
— Espera, Beatrice — Ela virou-se e me encarou assustada. — O que
veio fazer aqui? — perguntei, contendo o misto de sentimento dentro de
mim.
— Eu só ouvi que você havia chegado.
— Cheguei, posso fazer algo por você?
Ela hesitou, balançando a perna em direção à saída, mas retornou
andando na minha direção, se pôs na ponta do pé e envolveu os seus braços
no meu pescoço.
— Eu senti saudades — disse, encostando seus lábios nos meus.
Eu senti todo meu corpo se desarmar dentro do seu beijo, puxei-a para
mais perto, colando o seu corpo ao meu e retribuindo o seu beijo com
paixão.
***
Beatrice Marino
Vincenzo Ferrari
***
Vincenzo Ferrari
***
***
Beatrice Marino
No dia seguinte, Vincenzo parecia nem ter dormido, não que a sua
aparência fosse de cansaço, mas ele estava de pé, arrumando os cabelos em
frente ao espelho com as malas prontas no canto da porta.
— Passou a noite arrumando isso? — indaguei, sentada na cama.
— Não, acordei cedo, aliás, já viu a hora? — perguntou, me
encarando pelo reflexo.
Arregalei os olhos, encarando o relógio sobre a mesa de apoio, já
passavam das dez da manhã e eu acreditei piamente que ainda eram seis
horas.
— Levante-se, eu já arrumei a mochila da Giulia e pedi que a
deixassem pronta.
Eu o olhei com tamanha satisfação, parecíamos um casal real e eu
fiquei feliz pelo momento.
— Estou indo agora mesmo.
Quando voltei do banho, senti o meu coração palpitar de alegria,
Giulia e Vincenzo brincavam no quarto. Eles corriam e ela gritava de
euforia, uma lágrima de felicidade molhou o meu rosto, eu nunca vi a
Giulia tão feliz.
— O que faz aí parada, vamos… — ele disse assim que notou a
minha presença.
— Já estou pronta, podemos ir.
Durante todo o caminho, Giulia conversava com Vincenzo, que lhe
dava total atenção. Ele parecia um menino ao lado dela, descontraído.
— Tio, me conta aquela história sobre a menina que roubou uma flor.
— Vincenzo virou o rosto para me encarar, e eu fingi que estava dando
atenção à paisagem que passava pela janela.
— Posso contar em outro momento? — ele indagou, tímido.
— Hoje, na hora de dormir?
— Sim, posso fazer isso hoje.
Ela agarrou o braço em volta do dele, apoiou a cabeça, abriu a boca
sonolenta e fechou os olhos em seguida.
— É, parece que ela cansou — ele disse, me encarando.
— Eu não sabia que contava histórias infantis.
— Isso te deixa intrigada ou feliz?
— Mesmo que a Giulia não seja a minha filha, eu sinto como se
fosse, não faz ideia do que as lágrimas de garotinha fazem ao meu coração,
e a magia que acontece quando ouço as suas gargalhadas.
— Seria estranho se eu falasse que me sinto igual? Eu gosto muito
dessa garotinha.
Aos poucos, o homem sem alma vinha revelando um coração que eu
nem sabia que existia e aquele brilho que nós humanos comuns temos
quando estamos felizes podia ser visto com facilidade nos dele.
— Não é estranho, a Giulia tem esse poder de nos deixar felizes como
se essa fosse a sua principal missão aqui na terra.
— Bom, chegamos — ele disse quando o carro entrou por um imenso
portão de uma mansão em Spiaggi di cala, no sul da Sardina. — Espero que
a Giulia goste de praia.
— Ela ama — confirmei.
Ele saiu do carro e a pegou nos braços ainda adormecida, entramos
juntos pela imensa casa, tão grande quanto à que vivemos.
— A casa é imensa — disse, olhando tudo com muita atenção.
A mansão não tinha tantos soldados como as outras, e isso me causou
estranheza.
— Aqui não tem tantos seguranças.
— Eles virão. Como não costumo vir, é o lugar menos propício a
ataques de rivais, poucos sabem da existência dessa casa.
Eu o segui pela casa até chegar a uma sala que não parecia ter
paredes. A vista dava para o lindo oceano de águas limpas e bem azul se
unindo ao céu magnífico de um dia ensolarado. No canto da sala, tinha um
pequeno bar, assim como na nossa casa e, mais à frente, uma segunda sala,
que dessa vez não tinha paredes, ela se unia à área da piscina.
— Vou colocar a Giulia na cama.
— Vou com você — eu disse, seguindo-o.
Eu observei o carinho com que ele fazia tal ato, a colocando
cuidadosamente embaixo das cobertas e beijando o seu rosto em seguida.
— Por que me olha assim? — indagou
— Você será um ótimo pai — respondi.
— E o que tem a falar sobre ser o seu marido? — Me abraçou pela
cintura, me deixando confusa com tanto afeto. — Pare de me olhar como se
eu não fosse humano.
— Desculpe, Don.
— Vincenzo, pode me chamar pelo meu nome. — Ele pegou a minha
mão e me levou até a área externa da casa.
— O lugar é lindo.
— Achei que nada te impressionasse, você tem tanto dinheiro quanto
eu.
— Eu nunca visitei muitos lugares, os meus pais me tratavam como
se eu fosse um algodão-doce prestes a ser dissolvido na água e, por fim,
aqui estou eu, com você. — Forcei um sorriso.
***
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
***
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
***
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Vincenzo Ferrari
Cheguei em casa no final da tarde e ouvi Beatrice brincar com Giulia
em nossos aposentos. Fui até o quarto de hóspedes e tomei um banho
demorado. Eu não podia confiar em ninguém, foi assim a minha vida inteira
com o meu pai, com os meus soldados ou com os meus líderes mais
próximos, mas eu necessitava confiar em Beatrice, a ideia de que eu me
abrir para alguém que eu não merecia estava acabando comigo. Me vesti
rapidamente e fui encontrá-las.
Beatrice abriu um lindo sorriso quando me viu entrar, o seu semblante
parecia um pouco perturbado, mas, ainda assim, ela sorriu, trazendo uma
calma inexplicável. Giulia saltou na cama e correu para me abraçar.
— Como foi o seu dia? — indaguei, me sentando ao lado dela com a
garotinha ainda em meus braços.
Beatrice era única e especial, eu não queria acreditar que depois de
tantos anos eu tinha entregue os meus sentimentos para a pessoa errada. O
que eu estava sentindo por ela era assustador.
— Nada de diferente — ela respondeu, encostando a cabeça no meu
ombro, e eu a abracei.
Ficamos assistindo ao filme de desenho que passava, e Giulia dormiu,
eu a levei até o seu quarto e velei o seu sono por alguns minutos, era
prazeroso ouvi-la ressonar, e a sua expressão tranquila me trazia paz.
— Don. — Um dos meus soldados vem até mim com um envelope
nas mãos assim que sai do quarto da Giulia.
— Do que se trata? — indaguei.
— Acabaram de entregar — ele disse, esticando a mão para me
entregar, e eu identifiquei o selo do pacote em sua mão.
Desci as escadas segurando firmemente o envelope com informações
preciosas vindas da Rússia. Meus pensamentos concentrados unicamente
em investigar a família de Beatrice. Cheguei ao escritório e me sentei em
frente ao computador. Abri o envelope cuidadosamente e comecei a analisar
cada documento com atenção. As informações eram extremamente
importantes e precisas. Meu coração batia mais forte conforme eu avançava
nas descobertas.
— Ela é uma espiã, Vincenzo — afirmei para mim mesmo depois de
ver os documentos, o avô dela é um associado importante de Andrei,
Antônio Marino tinha a intenção de estreitar os laços com a Rússia, foi
assim que Beatrice chegou aqui.
Eu estava confuso, ela era doce e um tanto ingênua.
— Não, Vincenzo, ela não tem culpa de nada disso — disse, tentando
me convencer das minhas próprias palavras. Mas como acreditar nisso se
hoje ela recebeu uma ligação dele, do meu inimigo.
Eu sou implacável, eu não tenho sentimentos. Eu pensava, andando
de um lado para o outro no escritório.
— Vincenzo? — A porta se abriu, e eu recolhi os papéis sobre a
mesa, os guardando na gaveta. — Qual o problema? — A voz doce de
Beatrice ecoou na sala, o cheiro de morango invadiu as minhas narinas. Eu
seria capaz de matar toda a sua família, mas ela não, eu não conseguia me
imaginar em um mundo onde ela não existisse.
— Achei que tinha ido dormir — eu disse, me aproximando.
— Eu estava esperando por você, pensei que você estava com a
Giulia. — Ela passou os braços em volta do meu pescoço, e eu cravei os
meus olhos aos dela. O que você me esconde, Beatrice?
— O que sente por mim? — perguntei como um moleque inseguro.
Ela mordeu os lábios e desviou os olhos antes de voltar a me encarar
e então falar:
— Eu sinto que toda a minha existência tem um único intuito, que é
amar você. É por isso que eu ainda vivo, porque você precisa ser amado e
porque você não poderia ficar sozinho.
As suas palavras fizeram os meus olhos se encherem de lágrimas, as
últimas lágrimas derramadas por mim foi há anos, sobre o túmulo da Anna.
— Então me mostre que posso confiar em você, me prove que nós
dois valemos a pena. Com quem se importa mais: comigo ou com a sua
família?
— Que tipo de pergunta é essa? — ela indagou, se afastando, e eu a
puxei de volta. Ela ficou de costas para mim, e eu a prendi contra o meu
corpo, envolvendo os meus braços em sua cintura.
— Eu desejo construir uma família com você e poder contar com o
seu colo confortável nos dias exaustivos. Sinto que você é meu refúgio
nesse inferno em que vivo, no entanto, as minhas obrigações com a máfia
me impedem de demonstrar qualquer tipo de fraqueza. Preciso agir com
rigidez para punir traidores, o que infelizmente pode envolver eliminar
pessoas próximas a mim. Quero saber se você está comigo?
Senti o seu corpo estremecer em volta dos meus braços.
— Por que está me dizendo essas coisas? — A sua voz saiu trêmula.
— Porque não posso dar tudo de mim a uma pessoa a quem não
confio e que não está cem por cento comigo.
Beatrice Marino
Vincenzo Ferrari
***
Beatrice Marino
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Vincenzo Ferrari
***
Beatrice Marino
Beatrice Marino
***
***
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
***
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Vincenzo Ferrari
***
Beatrice Marino
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Vincenzo Ferrari
***
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
— O tiro foi na altura do ombro, ela perdeu muito sangue e o estado dela
ainda é crítico, mas acredito que logo irá se recuperar.
Fechei os olhos, aliviado. Sabia que ainda havia um longo caminho
pela frente, mas, pelo menos, ela estava viva. Sentei-me exausto, sentindo o
peso daquela noite em meus ombros. Ela estava viva, isso era tudo o que
importava.
— O que precisamos fazer agora? — indaguei.
— Eu vou administrar os remédios para estimular a produção de
glóbulos.
— Podemos fazer uma transfusão, temos o mesmo tipo sanguíneo —
disse a minha sogra.
— Bom, é que não é tão simples assim, Beatrice não voltou sozinha e
eu gostaria de tentar os remédios primeiro até termos a autorização de um
médico especialista — ela falou com um semblante sério.
— Como assim não voltou sozinha? Que tipo de especialista você
está falando?
— Um obstetra. — Ela deu de ombros com um sorrisinho. — Você
vai ser pai.
— Como assim? Espera… Nina. — Eu senti o chão se abrir debaixo
dos meus pés. Eu deveria ter pulado de alegria, mas eu só pensei no estado
em que ela estava e que eu não queria passar por tudo de novo. — Nina, eu
confio em você, não permita que ela me deixe.
43
Fique comigo
Vincenzo Ferrari
— Calma, Vincenzo, ela está bem, você vai se pai, ser alegre — disse
o meu irmão.
— A minha filha está grávida? Tragam o médico, vamos fazer a
transfusão de sangue — disse a minha sogra com um tom alterado.
— Trarei um amigo — Nina afirmou.
— Posso ver a minha irmã? — Luigi chorava como um menino e o
meu sogro parecia não acreditar.
— É recomendado esperar, devemos evitar a disseminação de
infecções e ela está sedada agora.
— Sogra, pode verificar a Giulia? Eu não estou com cabeça agora —
pedi, mas ela me olhou contrariada.
— Mãe, por favor, cuide da Giulia — Luigi disse.
— Me avise assim que chegar — ela falou antes de sair e me lançar
um olhar torto e, em seguida, sumiu pelo jardim. Eu não tinha dúvidas de
onde Beatrice havia herdado o gênio difícil e desafiador.
Eu ainda estava coberto de sangue, e eles se entreolhavam.
— O que aconteceu exatamente? — o meu sogro perguntou.
— Andrei está morto, acredito que metade dos nossos problemas
acabou.
— Fico feliz que tenha obtido a vitória — disse o meu sogro.
— Sim, alegre-se, o cenário mudou. Você já tem autorização para
voltar para casa agora que a Beatrice já está aqui comigo.
— Podemos ficar até que ela se recupere? — indagou Antônio.
— Claro, se mudem para a casa principal. Levem eles para a casa
principal — ordenei ao meu soldado. — Assim que o médico chegar,
comunico. — Eles seguiram o soldado, e eu fiquei com o meu irmão,
aguardando o retorno de Nina.
— Ela ficará bem — disse Lorenzo.
— Eu tenho medo, eu estou apavorado, eu não vou suportar isso
novamente, Lorenzo.
— Você não vai, Beatrice ficará bem, irmão — garantiu.
Eu andei nervoso de um lado para o outro e soltei o ar com força.
— Vou entrar para vê-la. Ela tem que ficar comigo. Ela não pode me
deixar.
Caminhei lentamente até o quarto com as mãos trêmulas e a testa
suando. Ainda não conseguia aceitar estar prestes a perder a mulher que
amo novamente. Entrei no quarto e a visão de ela deitada na cama, pálida e
desacordada encheu os meus olhos de lágrimas.
— Beatrice, você não tinha autorização para entrar na frente do tiro
— esbravejei como se ela pudesse retrucar. — Você acredita que viverei se
você me deixar? — indaguei em lágrimas.
Me sentei ao lado dela e tomei a sua mão, sentindo a sua mão fria, e
arrastei a mão até o seu ventre o acariciando.
— Obrigado, vou amá-lo muito.
Fiquei em silêncio por um tempo, sentindo a presença dela ali e
monitorando os seus sinais vitais enquanto esperava Nina voltar com o
outro médico. Subi um pouco a mão parando entre os seios.
— Anna, você voltou para mim — eu disse, sentindo o seu coração
bater contra o peito da mulher que agora eu também amo. Ainda era difícil
para mim, assim como deve ser complicado para Beatrice.
Lembrei-me da viagem que fizemos juntos, das risadas que
compartilhamos e das conversas profundas que tivemos durante a noite.
Senti o coração apertado ao pensar que poderia perdê-la para sempre.
— Beatrice, por favor, fique comigo — sussurrei. — Eu não sei mais
como viver sem você. Eu te amo.
— Don, voltei — disse Nina, entrando com o médico.
Levantei-me, me recompondo.
— Conforme o que a doutora me passou no caminho, acredito que
podemos proceder com a transfusão, vou apenas fazer alguns exames.
— Chamarei a minha sogra para doar o sangue — comuniquei, saindo
do quarto e indo até a casa.
Quando entrei, a encontrei na sala com o Luigi e o meu sogro.
— Alguma novidade? — ela perguntou, vindo até mim.
— O obstetra acabou de chegar, ele vai fazer a transfusão.
— Irei para lá agora mesmo. — Ela passou apressada por mim.
— Como isso aconteceu? — Luigi questionou, voltando ao seu estado
normal.
— A sua irmã se jogou na minha frente, seria eu naquela cama agora,
e não ela. Sei que preferiria que fosse assim, e eu também acreditei.
— O que fará agora que sabe sobre o coração? — Antônio quis saber
dessa vez.
— Quer me ouvir sendo sincero? — Sentei-me na poltrona de frente a
eles. — Eu pensei em trancá-lo na mansão e mandar colocar fogo, eu faria
isso com todos que levassem o nome Marino, e ia deixar um decreto que se,
por acaso, algum sobrevivesse, que estendessem a minha ira por várias
gerações.
— E por que desistiu?
— Porque eu estaria matando a mim mesmo no momento em que
Beatrice deixasse de respirar.
— Não sabíamos da origem do coração — ele se justificou.
— Só uma coisa que não vou perdoar, a Giulia.
Ele arregalou os olhos e me encarou.
— Ela sempre foi apegada a Beatrice.
— Mas eu sou o pai dela. Não acha contraditório você querer salvar a
sua filha tirando a minha de mim?
— Giulia sabe que é adotada.
— Ela é muito pequena para entender esse tipo de coisa — eu disse,
ficando de pé.
— Sei que vai saber como conquistá-la, aliás, acredito que ela já
gosta muito de você — falou Antônio.
— Isso não é graças a você. — Virei as costas e os deixo sozinhos na
sala.
***
Beatrice Marino
***
Vincenzo Ferrari
Vincenzo Ferrari
Beatrice Marino
FIM.
Agradecimentos
Eu gostaria de expressar minha sincera gratidão a todos que
colaboraram, de forma direta e indireta, para tornar possível o lançamento
deste livro. Dedico uma menção especial à Letícia Ribas a minha
maravilhada beta e Joyce da assessoria Fênix, que cuidaram com esmero e
profissionalismo de cada etapa do lançamento deste livro. Por fim, quero
agradecer às minhas leitoras por terem embarcado comigo nesta história.
[1]
Bela menina.
[2]
Garotinha.
[3]
Acalme-se.
[4]
Fale depressa.
[5]
Meu amigo.
[6]
Filho da puta.
[7]
Irmão.
[8]
Senhor.
[9]
Garota.
[10]
Bom dia.
[11]
Oh, meu Deus!