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IMédulos de Recidagem Acompanhamento do crescimento e do desenvolvimento 1, INTRODUCAO © crescimento e 0 desenvolvimento da crianga e do adolescente estendem-se Esses processos ocorrem simultaneamente € sio imterdependentes. Eles envolvem nao so aspectos biolégicos e genéticos, mas, fundamentalmente, a interacdo entre esses e 0 ambiente, do qual fazer parte aspectos afetivos, psicol6gicos, socioecondmicos, culturais e outros, © atraso do crescimento pode denunciar um disturbio que também afetard o desenvolvimento e vice-versa Estudos atuais no campo da neurociéncia demonstram que as experiéncias iniciais vividas pela crianca tém efeitos duradouros consolidadores no desenvolvimento aS cca a aa aaa human, atuando como mediadc $ -xperiéncias traumaticas podem danificar estruturas profundas do cérebro, As experiéncias positivas simples e rotineiras, tais como tocar, acariciar, sortir, brincar einteragir, em ambiente social e psicol6gico, ativam vias importantes e estimulam conex6es neuronals, Fssas aperfeicoam 0 desenvolvimento cerebral dos bebés, interferer na aquisicao de habilidades e competéncias e nos processos biocomportamentais que afetam a satide fisica e mental Sendo assim, a monitaracao e a avaliacao permanentes do crescimento e do de- senivovimento tornam-se fundamentais na atencao integral a salide da crianga € Restringir a avaliacdo do crescimento ¢ do desenvolvimento as consultas de pue- ricultura implica ern oportunidades perdidas em relacao ao diagnéstico precoce dos desvios e de uma intervenco imediata. Por meio do acompanhamento e do pleno conhecimento dos fatores envolvidos nesses processos, 0 pediatra pode PRONAP~ Ciclo XVI ~ Nomero 2 10 56 apoiar a promocao e manutencao de um crescimento e desenvolvimento saudéveis, como intervir 0 me maximizando o potencial genético, neurobiol6gico, psicolégico e emocional da crianca. A partir do acom- anhamento adequado do crescimento e do desenvolvimento, desencadeiam-se processos de promosao da sade, prevengao de doencas, tratamento dos agravos, estimulagéo, habilitagéo e reabilitagéo. ‘A promogao do crescimento e do desenvolvimento ¢ eixo integrador de outras intervencées estratégicas na satide da crianca, como: promacéo do aleitamen- to materno, orientacdo quanto a introducao dos alimentos complementares ¢ promocao de uma alimentacio saudavel, prevencdo e tratamento dos disturbios nutricionais (desnutricao, sobrepeso/obesidade e disturbios carenciais), prevencao das doencas imunopreveniveis, prevencao e tratamento das doencas respiratorias (pneumonias, asma e alergias), prevencao e tratamento da diarreia e prevenc3o de acidentes na infancia e de maus-tratos, entre outras, Atualmente, no Brasil, a prevaléncia de desnutricao em criangas tem apresentado Teducdo importante, enquanto que o excesso de peso, nas formas de sobrepeso € obesidade, ver se elevando rapidamente ao longo do tempo, em funcao de habitos alimentares deletérios em boa parte da populacéo. constituindo processo denominado transicao nutricional. Estudos recentes mostram que muitas doencas crénicas do adulto, como a hipertensdo arterial, as doencas cardiovasculares, 0 diabetes e 0 cancer tém suas ralzes na infancia. Portanto, a avaliacgo do cresci- mento e, consequentemente, do estado nutricional e de habitos alimentares das riancas e adolescentes € fundamental na prevengao eficaz de morbidades do adulto e do idoso. © acompanhamento do crescimento e do desenvolvimento deve ser realizado amplamente, no sé nos servicos de sade, mes também nas escolas, nas creches ov em quaisquer outros lugares que prestem atendimen-to a criancas. Nos ser- vigos de sade a abordagem ideal ¢ a interdisciplinar, envolvendo em diferentes momentos pediatras, enfermeiros, psicdlogos, assistentes socials, fsioterapeutas, foncaudidlogos, terapeutas ocupacionais, nutricionistas e odontologos 2. CRESCIMENTO © crescimento € um processo bioldgico, dinamica e continuo de multiplicaco (hiperplasia) e aumento do tamanho (hipertrofial celular, De uma forma geral, 0 Crescimento é entendida como 0 aumento do tamanho corporal, cessando com 0 término do aumento do crescimento linear (altura). 0 periodo pré-natal & o de maior velocidade em relacao ao crescimento, princi- palmente no primeiro trimestre da gestacao. Nesse periodo acontecem as grandes 34 35 [Modulos de Reciclagem ‘ransformacées do ovo fertiizado em embrido e feto, a formacéo do sistema ner- vos0 e de outros sisternas, Hé uma complexa inter-relagao entte as transformacoes somaticas e neurolégicas que ocorrem na vida fetal e os fatores embientais intra e extrauterinos. £ 0 momento de maior vuinerabilidade, estando o embriao/teto ‘exposto as multiplas diversidades ambientais relacionadas a mae, dentre elas a presenca de doencas infecciosas ou crdnicas, a desnuitrigz0 materns, 0 uso de Alcool, drogas licitas e illctas e 0 trauma psicol6gico. 0 acompanhamento do crescimento intrautetino 6 realizado pelo obstetra © periodo de crescimento intrauterino ¢ de vital importancia para o ser humano € 0 peso a0 nascer ¢ 0 indicador que melhor retrata 0 que ocorre durante a fase fetal. O recém-nascido (RN) com peso ao nascer menor que 2.500 g ¢ classificado genericamente como baixo peso ao nascer (BPN), sendo considerado bebé de isco, com meior chance de adoecer e morrer, requerendo atencdo especial dos servicos de atencao & crianca, ‘OBPN pode ser decorrente de prematuridade (< 37 semanas completas de gestacio) e/ou retardo de crescimento intrauterino (RCIL). Os bebés prematuros com peso abaixo de 2.500 9, porém com o peso adequado para a idade gestacional (AIG), mesmo que com peso abaixo de 2.500 9, apresentam um melhor prognéstico em relacao ao crescimento pos-natal compensatorio, quando foram comparados com aqueles classficados como pequenos para a idade gestacional (PIG), mesmo sendo bebés a termo (> 37 semanas de gestacao). 0 RCIU pode ser em decorréncia de alteracoes genéticas, infeccoes maternas, tabagismo, uso de drogas, insuficiéncia e/ou envelhecimento placentarios, desnutricdo materna, dentre outros. Podem ocorrer também casos de bebé grande para a idade gestacional (GIG), no caso de filhos de maes diabséticas, Todo individuo nasce com um potencial ou alvo genético de crescimento (quadro 1). Esse potencial genético est relacionado as especificidades heredité- fias € 20 sistema neuroendécrino. Pode-se observar a diferenca de altura entre sexo masculino e o sexo feminino. Poucas funcoes biolégicas depender tanto do potencial genético quanto o crescimento. No entanto, esse alvo pade ser ou nao atingido. Ele @ fortemente influenciado por questées ambientais, relacionadas & alimentacdo, as condic6es socioecondmices, geofisicas e de urbanizacao. Tambem depende fundamentalmente do afeto proveniente da relacdo mae-filho ou, caso esta néo seja possivel, de outras relacoes. Ainfluencia do meio ambiente no processo de crescimento ocorre até a idade adul- ta, porém, quanto mais jovem é a criance, como os menores de cinco anos, mais dependente e vuineravel é em relagao ao ambiente, Nessa faixa etaria, a influéncia dos fatores ambientais € muito mais importante que a dos fatores genéticos. Por outro lado, nas criancas maiores, nos adolescentes e nos adultos jovens, os fatores genéticos tém influéncia marcante. PRONAP Ciclo xVI~Nimero 2 Quadro 1. Calculo do alvo genético et [(Estatura da mae + Estatura do pal) + 13)] lenin Uestatura da mie + Estatura da mae + Estatura do pai)— 13] Menina (Westatura cn mie» Sstarura Go pa) 73) 45 A velocidade de crescimento da crianca é especialmente elevada nos dois primeiros ‘anos de vida, com declinio acentuado até o final da fase pré-escolar, em torno dos 5-6 anos de idade. Durante o 1° ano de vida a crianga cresce em torno de 24 cm ganha em torno de 6 kg. No primeiro trimestre de vida, o bebé pode ganhar dde 800 a 900 g/mes. Essa velocidade vai diminuindo a cada trimestre de vida. No 2° ano, a crianca cresce em torno de 12 cm e ganha mais ou menos 2,5 kg. Esse € 0 periodo mais vulneravel aos distirbios de crescimento frente as situacoes adverses. A velocidade de crescimento pode diminuir ou até mesmo ser interrompida, porém, 23 capacidade de recuperacao é grande também. A vigiléncia em relacéo a saiide da crianca nessa faixa etdria deve ser constante, incluindo 0 acompanhamento do seU crescimento, a vigiancianutticional, englobando questdes que dizer respeito as condigdes e qualidade de vida da crianca A partir da fase escolar, a velocidade de crescimento é praticamente constante, de 5 a 6 cmfano, até o inicio do estir3o da adolescéncia, que nas meninas ocorre em torna dos 11 anos e nos meninos, em torno dos 13 anos. 0 acompanhamento e a avaliaco do crescimento sao realizados por meio da to- mada de medidas do tamanho do corpo, denominadas medidas antropométricas. ‘As medidas antropométricas mais comumente aferidas so 0 peso, @ estalura (comprimento ou altura) € 0 perimetro cefalico. Inicialmente na atencdo basica, 0 peso foi um indice priorizado por ser de fécil afericao e capaz de sinalizar de forma répida a existéncia de problemas que afetam a sade, principalmente das criancas abaixo de 5 anos de idade. Como a aterico. da estatura é mais complexa e a velocidade de ganho estatural é mais lenta, sendo. afetada por problemas/doencas cronicas, essa afericdo foi postergada na atencdo bsica, Atualmente, ha o entendimento de que todas as medidas antropométricas so importantes para uma melhor avaliacdo global da crianca e do adolescent. A medicao do perfmetro cefdlico deve ser feita, prioritariamente, nas criancas de 0 a 24 meses, tendo em vista que esse € 0 periodo de maior crescimento do sistema nervaso central e, consequentemente, da cabeca. £ importante saber que a antro- 36 7 IMédulos de Reciclagem ppometria é um dos componentes da avaliagdo clinica, mas no deve ser utlizada de maneira isolada para diagndstico e/ou acormpanhamento de puericultura A avaliacao do crescimento deve ser realizada periodicamente. O Ministério da Satide (MS) preconiza pelo menos sete consultas na primeiro ano de vida (iniciando- -se na primeira semana de vida), duas consultas no 2° ano e uma consulta por ano até os dez anos. ‘A coleta das medidas antropométricas deve ser realizada com metodologia pa- dronizada, com pessoal capacitado e com instrumentos de boa qualidade, além de calibrados. Para isso, alguns passos devem ser lembrados: > Calibrar a balanca antes da pesagem — as crlancas devem ser pesadas sem roupa (abaixo de 2 anos, sem fraldas; maiores de 2 anos sd de calcinha/cueca). > Para medir o comprimento da crianca menor de dois anos, ela deve estar deitada, uitilizando-se um antropémetro horizontal; a medicdo da altura da crianca maior de dois anos é feita com a crianca em pé, utilizando-se a balanca-plataforma ou 0 antropémetro vertical 2.1 CURVAS DE CRESCIMENTO. Aanalise das medidas coletadas se d por meio da relacao entre elas e valores de referéncia de peso para a idade, estatura (comprimento ou altura) para a idade e perimetro cefalico para a idade, além do Indice de Massa Corporal (IMC = P/E?) Paraisso, exister as curvas padrao de crescimento (peso, comprimento ou estatura, perimetro cefalico e IMC) da Organizacéo Mundial da Saude (OMS). Em 2006 e 2007, a OMS lancou as novas curvas de crescimento como referencia internacional para o crescimento de criancas de 0 a 5 anos e de 5 a 19 anos, consecutivamente, As curvas da OMS de 0a 5 anos foram construldas a partir de um estudo realizado com criancas de seis paises diferentes, incluindo o Brasil. Para os dois primeiros, anos de vida, 0 estudo foi longitudinal, com criancas amamentadas ao seio, com nivel socioeconémico estavel, cujas maes ndo eram fumantes e de gestacgo dinica. fsas caracteristicas conferiram as curvas da OMS um padrao ouro por mostrarem como as criancas devem crescer. © Ministério da Saiide adotou as novas curvas de crescimento e elas fazem parte da Caderneta de Saude da Crianga, com nova edigao lancada em 2009, As curvas de crescimento da OMS podem ser representadas em percentis ou em desvios padréo (DP). O escore Z é a terminologia mais atual utilizade para repre- sentar a variabilidade de um determinado parametro entre individuos e representa a distancia, medida em unidades de DP, que os varios valores daquele parimetro podem assumir na populacao em relagao ao valor mécio. B PRONAP- Ciclo XVI Namero 2 Quadro 2, Célculo do Escore Z (walor observado para o individuo) — (valor da média do referenciel) “—_ (desviopadrao do referencia) idual em ui lacao saucével, Levando-se em conta a variabilidade individual em uma popul melhor eritéro para a normalidade & um intervalo de valores situados entre 0 escore Z +2 @ 0 escore Z -2 (quadto 2) 2.2 CLASSIFICAGAO DO ESTADO NUTRICIONAL, Asmedidas coletadas devem ser colacadas como pontos no grafico correspondente, ao longo do tempo, que, unidos entre formam uma linha figura 1) Essa linha representa 0 canal de cresdiento da cranga, que sinaliza se ela est crescendo adequadamente cu ndo. Quando acrianca etd crescendo adequadamente,alinba tende a seguir um tracado paalelo ao escore Z=0 (zero), entre os escores +1 “2, Qualquer mudance répda nese tendencia (desvio da curva para cima ou para baixo) deve ser investigada para determinar a causa e orientar a conduta (tabela 1) Figura 1. Grafico de peso por idade ern meninas de 0 a 2 anos de idade PESO X IDADE 0 A 2 ANOS - MENINAS PST ia eels pe uote PILSSERAStS ae Fonte: ‘Caderneta de Saddle (MS), 2009. Médulos de Reciclagem Tabela 1. Parametros de classificacao nutricional, segundo o IMC para idade, em criangas menores de 5 anos de idade. Percenti 0,1 < Faure 3 Magreza acentuada =Percentil0,1 ¢ = Escorez-3e Percent! |< Escore2-2 teas = Percentil 3 = Escore2-2e i + Percentil 85 = Escorez +1 qureta > Percentil 85¢ = Fscorez +12 ‘= Percentil 97 2 Escore-z +2 iiss oe sobrene, fs > Percentil 97 2 Escorez 42 € = Percenti| 99,9 2 Escore-2 43 pour pero, > Porcenti 99,9 > Escore-z +3 Obesidade Fonte: OMS, 2006. ‘Na representacao e interoretacdo dos gréficos de crescimento de criancas pre- ‘maturas e aquelas com retardo do crescimento intrauterino (RCIU), & importante realizar a cortecio de acordo com cada caso. Além disso, & importante lembrar ‘que ctiancas geneticamente grandes nascidas de maes pequenas podem apre- sentar peso de nascimento baixo, assim como criancas geneticamente pequenas nascidas de maes grandes podem apresentar peso de nascimento mais alto. AO longo dos 18 meses de vida, os bebés podem mudar de canal de crescimento para comprimento e altura, mesmo sem a ocorréncia de doencas ou alteracdes, na nutricao. © padrdo de crescimento linear também deve ser avaliado e considera-se uma crianca com crescimento deficiente quando seu tamanho & aquém do padrao. familiar (alvo genético) ja descrito anteriormente, 3. DESENVOLVIMENTO 0 desenvolvimento pode ser entendido como aumento da capacidade do indi- viduo na realizacdo de funcoes cada vez mais complexas, com a finalidade de 40 PRONAP- Ciclo XVI -Namero 2 felacionar-se mais e melhor com 0 mundo. £ um proceso dinamico que tem Drigem no 56 nas condicdes bioldgicas relacionadas & ma-turacéo do sistema Hnervoso e 2 hereditariedade do individuo, mas, fundamentalmente, no resultado {las experincias vvidas e nas relacées com 0 meio ambiente. Ele determinaré mudancas nos aspectos fisico, emocional, linguistico, cognitivo e social, bem como na construgéo do seu psiquismo, A avaliagao do desenvolvimento deve ser realizada em todas as oportunidades de Contato com a crianca, durante toda a consulta médica, na qual se observam a crianga e a dinamica familiar, desde a entrada no consultorio até o final do aten- dimento. O pediatra deve estar atento as sutilezas da relacdo estabelecida entre a inae/cuidadora/familia e a crianca e aos mecanismos do desenvolvimento infantil, 4 fim de diagnosticar e intervir precocemente diante de desvios do desenvolvi- mento normal, bem como atuar na preveng3o de uma variedade de disturbios de comportamento, transtornos mentais e outras afeccoes. desenvolvimento pode ser categorizado segundo alguns dominios de funcoes en sensorial (visa0, audio), motor (geralmente subdividido no estudo das habilidades motoras grosseiras, referentes & utilizaco dos grandes miisculos do corpo, e no estudo das habilidades motoras finas, relacionadas ao uso dos pequenos musculos das mos), da linguagem, social, adaptative, emocional e cogritivo. O desenvolvimento dessas funcdes ¢ interdependente e concomitante, cada funcao influenciando e sendo influenciada pelas outras. Nao ha, portan-to, fenémenos isolados dentro do processo de desenvolvimento, tudo esta em movimento e todas as fungdes estao intimamente relacionadas. © que integra essas funcées ¢ a subjetividade, compreendida como uma funcao de dimensao psiquica. A subjetividade é construida desde o nascimento, & inconstante, mutével e plural, pois € resultado das vivencias individuais e coletivas do sujeito. € por meio da construcao da subjetividade que cada funcio se particulatiza, tormando. Cada ser humano um ser singular, dnico. 0 bebé humano, ao nascer, é absolutamente dependente de outra pessoa para sobreviver e se desenvolver. Antes mesmo de nascer, seus pais desejam, pensam e {alam sobre ele, antecipando-Ihe lugar determinado no espaco familiar. Ao nascer, € acolhido nesse lugar. O ser humano, para que possa "acontecer”, precisa iniciar © seu processo de constituicao a partir de um lugar criado pela subjetividade de outro. A essa aposta dos pais, o bebé poderé responder de varios modos e, em alguns momentos, nao coincidentes com a imagem prévia, mas que nao deixaré de alimentar 0 desejo de seus pais em relacio a ele. Tudo isso colocard em jogo um circuito de trocas. Essas trocas poderdo ser ob- servadas por meio do modo como a mae/cuidador(a) sequra 0 bebé, o despe, faz alusdo a ele, “dialoga” com ele por meio do "mamanhés”. € necessario ao bebé humano um “olhar” constituido em prazeres e encantamentos que o convoque a a Médulos de Recilagem viver*. A mae/cuidadora e a familia/grupo social a0 qual pertence atuam como. mediadores de sua relacao com 0 mundo, atribuindo significados as suas expres- bes, inserindo-o no mundo simbdlico da sua cultura, Portanto, para se avaliar o desenvolvimento de uma crianca, é fundamental observar a relacao estabelecida entre a mae/cuidadora e ela, Também se faz necessério per- ceber 3 sua insercéo no contexto das fantasias e crencas de sua familia e conhecer ‘© ambiente familiar e social para saber se sao adequados para a promocao do seu desenvolvimento, além de conhecer todo o histrico da ctianca desde a concepcao, 2 gestacdo, 0 parto, 0 nascimento, até o momento atual Sendo assim, a anamnese deve ser minuciosa, incluindo se a gestecéo foi ou nao planejada; qual o momento que a familia estava vivendo quando a crianca foi gerada; quais foram as mudangas ocorridas nas relacGes familiares apés 0 seu nnascimento: quem cuida da crianca e como é a sua rotina de vide. Sao fatores de risco para atraso no desenvolvimento da crianca: problemas na gestacéo {doencas maternas, infeccdes, uso de alcool e outras drogas), no parto (anoxia, hemorragias ‘maternas), no nascimento (peso baixo a0 nascer ~ RCIU -, prematuridade, indice de APGAR <7 no 5° minuto) ou no perlodo neonatal (infeccoes congénitas, inter- ‘nagdo). € importante lembrar que, durante a gestaco, no periodo perinatal e nos primeiros dois anos de vida, o sistema nervoso central (SNC) é muito vulneravel. Ao mesmo tempo, principalmente durante o 1° semestre de vida, 0 cérebro ¢ capaz de realizar novas fungOes, transformando, de maneira duradoura e sob presséo do meio ambiente, os elementos que o compoem, bem como a rede de conex6es entre eles. Chama-se a isso de plasticidade cerebral. Quanto mais jover o indivi- duo, mais pléstico € o seu cérebro. Por isso, torna-se t&o importante a deteccéo precoce de um desvio do desenvolvimento, tendo em vista que a recuperacao é ‘80 mais eficaz quanto mais precocemente é realizada, Também, durante a anamnese, devem ser obtidos dados da historia pregressa @ atual de doencas graves, como também historia de traumatismo craniano ou convuls6es, € importante saber sobre historico de deficiéncia ou transtorno psiqui- Atrico na familia. Deve-se incluir a percepcdo dos pais ou substitutos em relacao 20 desenvolvimento da crianca, bem como questioné-ios sobre as aquisicbes de todas as habilidades da crianca, relacionando-as com o que a crianca faz no mo- mento da avaliacao ‘A maturacéo do sistema nervoso acontece de acordo com plano contido no po- tencial genético por meio de etapas previsiveis e predeterminadas, denominadas “marcos do desenvolvimento” (figura 2, quadro 3). Elas correspondem 2 deter- rminados periodos do crescimento e da vida. Ela se dé no sentido cefalocaudal e do centro para a periferia, Cada um desses periodos ou marcos tem suas proprias caracteristicas e ritmos. Além disso, cada crianca tem seu préprio padrao de desenvolvimento, PRONAP Ciclo XVI Nimero2 Figura 2. Desenvolvimento motor da crianga no primeiro ano de vida meses sD meses acemascico| elles subcortas Tits Seguea lz 2 esas Som, baie meses Sustonta a abore Ames Agar oberos S meses Giascbreo abdomen Gmeces Mantem se santado 7 meses Preensao palmar Pinca da Poese senate Engatina De pd pasos Sinapae. comin so Mmeses 12a 1ameses Fonte: Ministerio da Saude, 2002, No primeiro ano de vida da crianga ha a predominancia do aspecto biolbgico- “naturacional, principalmente nas aquisig6es motoras. Entretanto, mesmo estas dependem fundamentalmente das relacoes estabelecidas entre a crianca € os outros seres humanos de seu grupo social, especialmente os pais, como afeto, estimulos e relagdes de troca. Como exemplo, pode-se citar que a crianga que comeca a andar, néo 0 faz apenas pela maturacio do SNC, mas porque também ela é conclamada pelos paisa fazé-lo, ‘Alguns pediatras defendem a utilizacéo de instrumentos de triagem para a avalia- (éo do desenvolvimento infantil. Um dos mais utilizados ¢ o Teste de Triagem do Desenvolvimento de Denver Il (TTDD), que avalia criancas de 0 a 6 anos de idade. Ele classifica 0 desenvolvimento em 4 grandes areas: motor grosseiro, linguagem, motor refinado € pessoal-social. Os marcos de desenvolvimento emacional s8o desprezados. OTTDD nao diagnostica, apenas chama a atencao para alguns pontos que se mostram diferentes do esperado e que deverdo ser analisados levando-se fem conta o contexto familiar, sociale cultural e todo o historico da crianca. Assim Sendo, & um equivoco afirmar que a crianga apresenta atraso no desenvolvimento com base apenas no teste de triagem. A aplicacao do TTDD requer aprendizagem ‘e material especifico para testagem. 2 a Mécutos de Reclagem Quadro 3. instrumento de Vigilancia do Desenvolvimento de Criancas de 0a 3 anos. + Postura: bariga para dma, pernas e br {festa arriga para cima, pena brags fetides, cabecalieraliada; + Eleva a cabeca quando na posicao ventral + Saris sacl quando estimu Aire asmgoss io nace son Moneta athamente os memivos + Respostaativa ao contata soc . eo abjetos; eae 1 Deluge ean Seana cos leva cabeca,apoiando-se nos antbra '* Coloque a crianca de brucos, numa superficie fi Cher Selo a rang ce bros Puma siperie te, Char su tengo apoiandowe nos antebagos, °° rare se ea levanta a cabeca Busca ativa de objetas, Leva objeto 8 boca, Localiza'o som; + Muda de posicio ativamente (ol) + Brinca de esconde-achou ‘+ Transtere abjetos de uma mi a outra;, Bupleaslabes ns NP Pm outa: 4 Senate em apoio. rita estos, fa pines Tee oor fa Com abd, Obsere ea crancaconsoue dr alguns pasos com apo, Masa oa ae 5 Coles bios tm pote Diz uma pelavra, sie * Anda sem apo. += Usa colher ou garfo; + Constioi torre de 2 cubos; * Fala 3 palavras, Anda para tras + Tira a roupa;, Sensis tart de 3 cubos; © Aponta 2 figuras, + china bolas Vestese com spon Gomi tors de cbs, Se ein rn eet coc ec rats Con 2 pilav 3 fal com ones * Brine com outas cri . ec ee ical; ah 4 Reconmece 2 agbes; 1 Arremenss bois Fonte: Adaptado de Cademeta de Satie da Crianca ~ MS, 2008 PRONAP- Ciclo XVI- Numero 2 ‘A avaliacdo de um recém-nascido (RN) inicla-se a partir de sua chegada ao local ide atendimento, Nesse momento ja é possivel identificar 0 vinculo que esté sendo estabelecido entre a mae ou substituta e 0 bebé. Alguns sinais, como irritabilidade intensa ou letargia, demandam verificagao rapida quanto ao seu estado de satide. Para a inspecao completa, o RN deve estar totalmente despido e deve cantar com a participacao dos pais. £ importante verificar 0 perimetro cefalico, registrar a medida no grafico apropriado e interpretar o resultado, Peri- metro cefalico menor que Z -2 ou maior que Z +2 deve ser investigado. Deve-se bservar 0 t8nus muscular, a postura e a atividade do bebé. A postura normal do recem-nascido a termo & em flexao, bracos e pernas fletidos tanto na posicdo supina como na prona, devido ao predominio do tonus flexor. Os movimentos 540 amplos ¢, quando acordada, movimenta-se bastante. Seus movimentos, geral- mente, $80 reflexos controlados por partes primitivas do cerebro. A presenca, a intensidade e 2 simetria dos reflexos como resposta aos estimulos no RN podem. ser usadas para avaliar a integridade do sistema nervoso central e para detectar anormalidades periféricas, como alteracoes misculo-esqueleticas congenitas ou Jesoes de plexos nervosos. ‘Ao longo do processo de mielinizacéo e formacao das conexOes nervosas do SNC, (0 reflexos primitivas surgem em idades previsiveis e apés um determinado perio- do 580 suprimidos. Alguns desses reflexos, como os de succao, preensao palmar, plantar eo da marcha, seréo substituldos por atividades voluntérias; outros, como ‘0 de Moro e 0 reflexo tOnico-cervical assimétrico (RTCA), simplesmente desapare- Cera0 nos préximos meses. A persisténcia da maioria desses reflexos no segundo semestre de vida também indica anormalidades do desenvolvimento. ‘A avaliacao da visio e audicéo deve ser rotineira em todos 05 RN e lactentes. A pesquisa do reflexo vermelho ("teste do olhinho") pode ser realizada ainda na maternidade pelo pediatra, bastando para isso a utilizaco de um oftalmoscopio. ‘© RN a termo é capaz de fixar os olhos e acompanhar um objeto interessante. ‘A audigéo acontece a partir do quinto més de gesta-c8o. Ao nascer, a crianca {8 esta familiarizada com os ruidos provenientes do organismo materno e com fs vozes de seus familiares. A avaliacdo objetiva da audicao pode ser feita de varias maneiras: > Aaudiometria comportamental é realizada utilizando-se estimulos sonoros de varias frequencias; > As emiss6es otoactisticas (EOA), conhecidas como “teste da orelhinha", so mais utiizadas no periodo neonatal; > 0s potenciais evocados auditivas do tronco encefélico (BERA) s80 utilizados quando 0 EOA mostra auséncia de emissGes otoacisticas, Durante os primeiros meses, ha uma diminuicao progressiva do tonus flexor, com predominio do padrao extensor. Na medida em que vai ocorendo a maturagao do “4 45 Modulos de Reckiagem PRONAP- Ciclo xvt- Numero 2 SNC, ha mudanga ou desaparecimento dos reflexos primitivas e hé o aparecimento das reacées de retificacao, que sao reacdes que incluem a extensao, com 0 objetivo de vencer a acdo da gravidade. Essa primeira manifestacao motora antigravita- ional surge a nivel cervical, possibilitando o controle da cabeca. A extenséo em nivel do tronco possiblita a sua retificacdo e € o que vai permitir a0 bebs sentar- =Se. AS reacdes de retificacao continuuam evaluindo na sentido cefalocaudal ¢ no Quarto trimestre a crianca conseque assumir a postura ortostatica. As reacoes de equiltorio comecam a surgir em torno dos 6 meses de vida e a crianca comeca a apresentar dissociacao entre 0s movimentos da cintura escapular e pélvica, Ini- cialmente ela rola e, posteriormente, consegue mudar da posigao deitada para a sentada. Ao nascer, 0 bebé mantém-se com as m&os fechadas a maior parte do tempo e, a estimulacéo da regigo palmar, ocorre a reflexo de preensio. Por volta do terceiro més, em decorréncia da diminuigéo do ténus flexor, as maos ficam abertas por um periodo maior de terpo, os membros superiores tornam-se gra- dativamente mais capazes de alcancar objetos. Inicialmente, a crianca agarra os Objetos com as maos, depois usa os dedos para manipulé-los e, finalmente, faz ‘© movimento de pinca, utilizando o polegar eo indicador. As aquisigbes motoras do acontecem aos saltos, mas sao conquistadas e motivadas pela necessidade da crianca em explorar e interar-se com 0 ambiente sociocultural. Ao se avaliar © desenvolvimento motor de uma crianca, é necessario observé-la em todas as osig6es: em decibito dorsal, em prono, como também quando puxada para sentar, sentada e em pé. Durante os primeios meses de vida, o bebe expressa-se por meio de sua mimica facial, variacbes de ténus e, principalmente, pelo chore. A partir dos dois me- 525 0 bebé comeca a emitir sons, arrulhos, e por volta dos seis meses comeca 2 balbuciar e @ emitir sons bilabiais. A aquisicao da linguagem se inicia pelas trocas sonoras, ritmadas e prazerosas com a mae e vai evoluindo até a crianca se afirmar dizendo nao, fazendo suas escolhas, falando de si e conhecendo 0 Seu pequeno universo, No segundo semestre de vida, aparece a linguagem gestual, que & fruto dos sig- nificados dados pelos pais ao seu meio. Assim, a crianca comeca a bater palmas quando esta fez ou ¢ solcitada a fazé-lo, a dar “tchau" ou jogar beijinhos. Enesse momento também que a crianga descobre a possibilidade de seperacao da mae, que ndo é s6 sua, Nessa fase, 0 lugar do pai aparece com destaque, interpondo- -se entre a mae e a crianca, permitindo que a crianca entenda que a mae nao é 6 dela, nem vive s6 para ela, e que existe também 0s irmaos, 0 pai, o trabalho, e que a mae deseja outras coisas além dela. A partir desse momento, abre-se um espaco que permite & crianca construir lagos com os outros. As brincadeiras de esconde-esconde representam marco do desenvolvimento infantil e ajudam na elaboracéo da possibilidade de separacao. Entre os 2 5 anos de idade, hé o aprimoramento das habilidades até entao adquitidas pela crianca: a capacidade de comnunicacdo por meio da fala, a locomo- {gio (andar e correr) e o manuseto dos objetos e jogos simbélicos {"faz-de-conta’). Fmbora essas funcées tenham autonomia neuromotora, elas se organizam por meio da atividade centralizadora do psiquismo. € 0 psiquismo se constitui mediante ‘a telacdo estabelecida entre a mae e 0 bebé. A partir de entao, circunscreve-se ) campo das diferencas: 0 “eu” e 0 “outro”. A capacidade de representacao fundamental para a elaboragio do pensamento, pois possibilita 3 crianca poder ppassar a prescindir da mae e dos abjetos, bem como pensar e falar sobre eles na fhuséncia dos mesmos. Aparecem as interrogagées sobre as diferencas sexuais & Drrigem dos bebes, ‘hs expectativas que os pais tém a respeito da crianca S80 particularmente impor- antes, uma vez que ela passa a interrogar o desejo de ambos sobre si. Em grande parte, o que prevalece no seu funcionamento psiquico é o desejo inconsciente dos pais, muitas vezes contraditrios as vontades conscientes deles. Embora o desejo dos pais seja referencia para a crianca, ele nao é um determinante absoluto de Sua estrutura psiquica, Portanto, a crianca nao se submete completamente aos desejos de seus pais, podendo se opor ou encontrar outras saldas, fazendo suas proprias escolhas. Nessa faixa etéria & comum as criancas apresentarem senti- Mentos ambivalentes em relacéo aos pais: amore citime intensos e medo de que (5 sentimentos de édio possam levar a0 abandon Durante o perfodo pré-escolar emerge uma forma de lidar com 0 mundo através da funcao simbdlica, que pode ser alcancada por meio do desenvolvimento da linquagem, do desenvolvimento cognitivo e de brincadeiras. O desenvolvimento Wa linguagem por meia da fala se da muito rapidamente nessa fase, e esta inti- mamente ligado ao desenvolvimento cognitivo e emocional. © desenvolvimento cognitivo € caracterizado pelo pensamento magico (animism, crencas irreais sobre o poder dos desejos), pelo egacentrismo e pelo pensamento dominado pela percepcao (e nao pela ldgica). As brincadeiras do “faz-de-conta” permitem que f@ crianca represente o dominio pela resolucao de problemas, como no exercicio de papeis de adulto, na adocao do pape de agressor em lugar de vite, na exibicdo de “superpoderes” e obtencao de coisas que so negadas na vida real Em relacao ao desenvalvimento emocional, os desafios que as criancas enfrentam. dizem respeito & aceitacéo de limites e ao controle de impulsos. A birra e 0 choro {90 serem contrariades s40 comuns, pois é um momento de grandes pasos em Wirecdo & independéncia, E comum nesse periodo surgirem manifestacoes de medo e 0 aparecimento de “gagueira”. As diferencas individuais em relacao a0 desenvolvimento cognitive e emocional dependem em parte das demandas do ambiente, Finalizando, o crescimento e o desenvolvimento séo eixos referenciais para todas 45 atividades de atenc3o a crianca. A partir do acompanhamento do crescimento € desenvolvimento, desencadelam-se processos de estimulacao, habilitacéo € reabilitacao para a crianca 46

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