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Música do Planeta Terra


Leopoldo Pontes
2022

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Música do Planeta Terra
Compilações
Por

LEOPOLDO PONTES
Textos sobre música retirados dos e-books:
O gosto das coisas: E o Rock não morreu;
O gosto das coisas: A gorda vai cantar;
O gosto das coisas: O Tempo e as Estações;
Análise de Matrix e outros filmes e textos;
Rock não se aprende na escola;
Na contramão;
Tudo ao Normal;
Antes do despertar - α € Ω A Nova Gaya;
REINICIAR é a solução pra tudo!;
O prazer de fazer barulho.

"O blues é fácil de tocar, mas difícil de sentir.”(Jimi Hendrix)

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À Fafí
Ao Caê
À Ethel
Ao Diego
À Débora
Ao Daniel
Ao Leonardo
Ao Tadeu
Ao Nando
Ao Cirillo
Ao Nil
E a todos os músicos
Musicistas
E musicistes
Do planeta Terra

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Sumário
A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 1.........................................................................................................10
MÚSICA-MERCADORIA........................................................................................................................10
MÚSICA-OBJETO..................................................................................................................................11
A INTERRUPÇÃO PELA MORTE.............................................................................................................11
SURREALISMO E ROCK.........................................................................................................................12
A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 2.........................................................................................................12
A MÚSICA E O SILÊNCIO.......................................................................................................................13
Sentir ou entender..............................................................................................................................13
Silêncio para Ouvir Música nº1............................................................................................................14
Ouvir o Silêncio....................................................................................................................................14
Silêncio para Ouvir Música nº2............................................................................................................15
Equilíbrio e Paz nº1..............................................................................................................................15
Abbey Road.........................................................................................................................................15
Os Chakras e as Notas Musicais...........................................................................................................16
E o Rock Não Morreu...........................................................................................................................17
Instrumentos Antigos..........................................................................................................................17
Ouvir Música........................................................................................................................................18
LP e Música Digital...............................................................................................................................18
O BAIXO...............................................................................................................................................19
O MOVIMENTO PUNK..........................................................................................................................19
CAPOEIRA............................................................................................................................................20
O SOM DA AURA..................................................................................................................................20
PRIMEIRA BANDA................................................................................................................................20
A GORDA VAI CANTAR.........................................................................................................................21
A seguir, cinco matérias que saíram publicadas num sítio da internet, de meu amigo Alex Sakai,
em final de 2010 e início de 2011....................................................................................................21
CACHORRO GRANDE, TCHÊ!................................................................................................................21
HENDRIX, AINDA O MAIOR..................................................................................................................22
SYD BARRETT, O GÊNIO DE LONDON LONDON....................................................................................22
LOKI.....................................................................................................................................................23
Mendigos e Cia....................................................................................................................................24
Final das cinco matérias. Agora, outras coisas.................................................................................25
TREWA.............................................................................................................................................25

6
Mundo do Glam...................................................................................................................................25
ROSAS DE OURO..................................................................................................................................26
THE RUNAWAYS..................................................................................................................................26
LETRA E MÚSICA..................................................................................................................................27
PEPEU..................................................................................................................................................27
Literatura no Rock...............................................................................................................................28
Registros musicais...............................................................................................................................28
Percussão............................................................................................................................................28
Brian Jones..........................................................................................................................................29
Quando existe o som...........................................................................................................................29
Bits.......................................................................................................................................................30
Rita Lee................................................................................................................................................30
Cássia Eller...........................................................................................................................................31
Bixo da Seda........................................................................................................................................31
Rock Argentino....................................................................................................................................32
Anotações sobre Música I....................................................................................................................32
Anotações sobre Música II...................................................................................................................33
Os Tons e as Escalas: os Degraus da Sabedoria...................................................................................33
Anotações sobre Música III..................................................................................................................34
As Escalas.............................................................................................................................................34
Anotações sobre Música IV.................................................................................................................36
SUSTENIDOS E BEMÓIS........................................................................................................................36
Arandu Arakuaa...................................................................................................................................37
Produtor Fala sobre o Novo Álbum do Arandu Arakuaa......................................................................37
Análise da Letra da canção “Por Enquanto”, de Renato Russo............................................................37
Relações de sentido:........................................................................................................................38
Análise do filme “Crossroads”(A Encruzilhada)...................................................................................41
1986, EUA, Dir. Walter Hill,...............................................................................................................41
VALE A PENA SER HERÓI?....................................................................................................................46
Fanny...................................................................................................................................................47
Música Pessoalmente..........................................................................................................................48
Rock Não se Aprende na Escola...........................................................................................................48
Levar a Vida na Flauta..........................................................................................................................49
Cássia Eller...........................................................................................................................................50
Flauta Nova..........................................................................................................................................50
Cordas de Guitarra..............................................................................................................................52

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Música É..............................................................................................................................................52
Grafia das Notas Musicais....................................................................................................................53
A Escala Pentatônica e o Círculo..........................................................................................................54
Dois Sonhos.........................................................................................................................................54
Clavicórdio...........................................................................................................................................55
Música Clássica....................................................................................................................................55
Joelma e Tina Turner...........................................................................................................................56
Sonho..................................................................................................................................................58
Apito no Ouvido...................................................................................................................................58
Os Sentidos..........................................................................................................................................59
O Melhor do Rock................................................................................................................................60
Podcasts..............................................................................................................................................62
Bach.....................................................................................................................................................62
Nil........................................................................................................................................................63
Interpretação Historicamente Informada............................................................................................64
Punk.....................................................................................................................................................65
Um Sonho............................................................................................................................................66
Voltar a tocar.......................................................................................................................................66
Tocar Violão.........................................................................................................................................67
Reis e Rainhas......................................................................................................................................67
Coisa mais Linda..................................................................................................................................68
Cordas Novas.......................................................................................................................................69
Flauta Doce em Línguas.......................................................................................................................70
Violão Novo.........................................................................................................................................71
O Prazer De Fazer Barulho!..................................................................................................................71
Violão Triste.........................................................................................................................................74
A Guitarra Fantástica de Syd Barrett Continua Única!.........................................................................75
O Método Isadora Duncan É Uma Trambicagem.................................................................................78
Violão Triste N°. 2................................................................................................................................79
Adendo............................................................................................................................................80
Carta à Rita Lee....................................................................................................................................80
Sobre o autor.......................................................................................................................................82
Livros e e-Books de Leopoldo Pontes:.................................................................................................84
Índice:..................................................................................................................................................85

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A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 1
Um homem chamado Boécio, na Idade Média, falava sobre a Harmonia das
Esferas, considerando que cada planeta do sistema solar emitia uma nota musical.
No entanto, a estética era vista como um instrumento, uma faceta Divina, e
nada mais lógico que se entendesse essa harmonia como uma sutileza do Criador, naturalmente
muito diferente da música dos homens medievos.

Ora, dizem cientistas atuais que uma estrela em colapso emite uma vibração
equivalente, mais ou menos, à nota fá. Se considerarmos que tudo no universo oscila, nada sendo
estático, os planetas também teriam vibrações específicas. Poderia, destarte, pensar que cada um
deles emitisse um “som”, embora inaudível no espaço, por falta de ar. A oscilação estaria lá, o som
não.

MÚSICA-MERCADORIA

Um mau negócio hoje em dia é abrir uma loja exclusivamente de CDs. Pouca
gente ainda os compra. A música popular deixou de vir embalada apenas em álbuns, pode ser
puxada pelo computador. Tem ainda o pen-drive. E quem não tem acesso à informática, ou quer o
CD, busca o pirata. (Tem o pessoal que curte vinil, mas aí é outra história.)

Esse foi o caminho tomado pela música popular. Tudo começou com os antigos
bolachões de 78 rpm (rotações por minuto). Eram discos que retinham três minutos de cada lado, as
canções precisavam caber nesse exíguo tempo. Claro, havia aqueles um pouco maiores, de cinco
minutos de cada lado, mas eram menos comuns. Esses geralmente eram destinados a peças
eruditas.

Então, ficou-se determinado que a canção popular não podia ter mais do que
três minutos. Isso se manteve com os vinis de 33 rpm, que continham, em média, seis faixas de cada
lado. Tinha também as fitas k7 e as fitas de rolo, mas elas apenas serviam como escudeiras dos LPs,
servindo também para gravar.

Na segunda metade dos anos 1960, a psicodelia começou a usar os discos


inteiros, com composições que duravam muito mais que os normais três minutos. Apareceram os
discos-conceito, e o rock progressivo dos 70 continuou com essa nova tradição, incluindo álbuns
duplos com uma só composição dividida em quatro partes, como em Tales From Topografics Oceans,
do Yes.

Entretanto, essa nova forma não agradou à indústria fonográfica, que dependia
das canções de três minutos para tocar no rádio. A música deveria servir apenas para acondicionar
os anúncios.

Assim, voltou-se ao velho formato, mesmo com a invenção do CD, que pode
tocar mais de setenta minutos sem parar. E também com a gravação digital, que mantém o esquema
de gravar centenas de canções que, dificilmente, ultrapassam os cerca de três ou cinco minutos.

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Hoje se compra pela internet as músicas que se quer ouvir do lançamento de um
artista. Não é necessário adquirir o disco todo. E as letras podem ser obtidas já com as cifras. Os
Beatles não fizeram concertos nos últimos anos e sobreviviam apenas com a venda dos discos, fitas e
quetais, o que hoje seria impossível. A banda tem que se contentar com a renda dos shows.
As velhas gravações podem também se armazenar em nosso computador, e até
passadas para pendrives, por exemplo.
É a nova vida aparecendo. O artista popular tem hoje mais meios de mostrar o seu trabalho,
de vendê-lo, ainda que precise se colocar na ditadura dos três minutos. E para vencer isso, ele tem
os shows, os discos ao vivo e a pertinácia em ganhar o público por sua própria capacidade.

MÚSICA-OBJETO
Quando apareceram os primeiros fonógrafos, a pessoa precisava rodar a
manivela com a mão para ouvir o cilindro, coberto de cera, gravado. Se rodava mais rápido a música
durava menos; mais devagar, durava mais. Mas era necessário ficar junto com o aparelho, rodando o
cilindro enquanto se ouvia a gravação.
Em pouco tempo, a manivela passou a servir apenas para dar corda no fonógrafo,
que começou a tocar sozinho. E rapidamente os cilindros deram lugar aos discos de 78 rpm, que
inicialmente eram gravados apenas de um dos lados. Podia-se dançar, enquanto a música tocava!
Depois vieram as eletrolas, que dispensavam a necessidade de se dar corda a
cada novo disco, pois o trabalho ficava para a rede elétrica. Bastava ligar o botão.
De resto, o que já se sabe: vieram os discos de vinte minutos de cada lado e
depois os CDs, com mais de setenta minutos de música. Por fim, os smart-phones e quetais.
O que mudou nesses aproximadamente cem anos? O que modificou foi o modo de se ouvir a
música popular. Dificilmente alguém fica parado perto do aparelho de som escutando a canção. O
máximo é levá-lo consigo no bolso...

A INTERRUPÇÃO PELA MORTE

Durante anos, amei ouvir Cássia Eller. Gostava de sua voz e da maneira como
interpretava as canções. E a jogada era ficar se perguntando o que ela gravaria em seguida. Na
verdade, eu esperava seu retorno ao esquema guitarra-baixo-bateria, sem orquestra nem músicos
de apoio.
Entretanto, o absurdo aconteceu: estupidamente ela morreu, por razões que
até hoje não temos muita certeza.

O que ficou? Sua obra gravada.

Não é possível saber o que ela faria em seguida. Não dá mais para esperarmos o
que ela fará, porque seu tempo na Terra acabou.

O mesmo se dá com escritores. Machado de Assis, o maior contista e


romancista brasileiro, sabemos que nada mais podemos esperar dele, da sua genialidade. Sua obra
foi interrompida inevitavelmente com sua morte.

É diferente de lermos um autor vivo, do qual podemos esperar um novo livro,


com o qual podemos conversar sobre qualquer assunto, cuja empreitada ainda não está terminada.

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Curioso o caso de Nietzsche: escreveu Ecce Homo dando uma geral em toda sua
filosofia, como um corolário de tudo o que publicara até então, como se soubesse que estava no fim.
Pouco tempo depois, enlouqueceu. Caso raro, para se discutir.

A grande coisa é que tudo isso fica guardado. Podemos rever nossa cantora, nosso escritor
ou filósofo, ainda que estejam mortos. Os quadros revelam os seres humanos que os pintaram; as
fotos, os que as clicaram; os filmes, as pessoas que os fizeram. Temos um grande acervo à nossa
disposição, para aprendermos mais e sempre.

SURREALISMO E ROCK

O movimento surrealista surgiu nos anos 1920. Seu grande impacto consistia de
fazer parecer realidade o imaginário, produto de sonho. Daí, a minha definição de surreal: é o irreal
com ar de real.
Assim, pintores como Magritte e Salvador Dali fizeram a festa. Os relógios moles
de Dali ficaram famosos! Paisagens oníricas eram retratadas como se fossem verdadeiras. Na música
erudita, compositores fizeram o mesmo. Escritores.

No rock, os primeiros discos do Pink Floyd, a partir de 1967, tinham temas


surreais, em que se podiam ouvir o som de outros planetas, do espaço interplanetário, de naves
espaciais e coisas assim. Ora, no espaço não há som, mas o Pink Floyd o tocava. Fazia música do mais
puro onirismo.

Outras bandas, pelo mundo, fizeram algumas peças assim: Yes, Mutantes, Iron
Butterfly e outros psicodélicos e progressivos. Na Alemanha, nos anos 1970, o Eloy fez história no
primeiro disco. Era uma sonoridade gélida! E extremamente surreal.

O surrealismo norteou muitas capas de discos psicodélicos e progressivos nos anos 1960 e
70. As artes plásticas e o rock por muito tempo andaram juntos. Hoje, com o desprezo do público
pelas capas de discos, isso ficou para trás.

A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 2

Há uma teoria que diz que tudo no universo vibra. Nada é estático. Tudo tem,
portanto, seu próprio balanço. Esse movimento vibratório produz um som.
Assim como os planetas, as estrelas, os astros em geral, também a Terra e tudo
que a contém emitiria um som próprio. Apenas não seria ouvido no espaço sideral, onde não se
escutam os sons por falta de ar que os propague.

Pensando nisso, pergunto: qual o som de um gato? No caso, não é o seu miado,
porém uma nota que resultaria da vibração de seu corpo.

Afinal, qual o som de um ser humano? Emitimos todos a mesma nota musical?
Ou ela varia de uma pessoa para outra? O dedo sozinho emitiria uma nota diferente da mão? Seria
nosso corpo um imenso acorde? Ou teríamos um som fundamental que resumiria todos os nossos
tons?

Assim, quando ouvimos uma música que nos parece agradável, é porque ela se
harmoniza com os sons de nosso corpo. Se pensarmos em termos de chakras, há quem diga que
cada um deles tem sua correspondência a uma nota musical.

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Ora, por que não ouvimos esses sons? Porque é muito sutil para os nossos
ouvidos. E além do mais, como seria para nós escutarmos o tempo todo essa série de sonoridades?
Atrapalharia bastante! Não precisamos, afinal, disso para nossa vida diária. Porém, quem sabe
possamos ouvi-las através de algum exercício.

A MÚSICA E O SILÊNCIO

Existe a partitura, que escreve a música em seus mais variados aspectos:


melódico, harmônico, rítmico e dinâmico. Ela inclusive escreve os momentos de silêncio, chamados
pausas, não apenas as notas musicais.
A música se contrapõe ao ambiente em que esteja sendo executada. Assim,
num concerto, há um relativo silêncio; numa festa ou na rua há barulho.

Ocorre que nos tempos atuais é muito difícil obter-se o sossego de séculos
atrás. Mesmo dentro de uma sala de concertos, onde todos se portem reverentemente, sempre se
ouvem sons vindo de fora, como buzinas e freadas de automóvel.

Assim, a música contemporânea já se reveste, desde sua composição até sua


execução, do ruído da civilização. Incluindo o som de ventiladores ou de aparelhos de ar
condicionado.

Nos mosteiros antigos, qualquer som era contraposto ao silêncio, quebrado


apenas pelo canto dos passarinhos. Fossem os cantos gregorianos e cantochões, no caso dos
ocidentais, fossem os mantras, no caso dos orientais.

As pausas eram realmente silenciosas, como queria o compositor. Serviam para


a meditação. Hoje, o silêncio é barulhento. O instrumento musical para de tocar, mas o som
continua. Não existe mais o momento para a reflexão.

Sentir ou entender

O que é mais importante na música: sentir ou entender?

Quando estudava violão, meu professor, seu Serafim, dizia que eu não podia
olhar para o instrumento enquanto tocava e sim para a partitura. Ensinou-me a forma correta de se
posicionar o violão, a mão, o braço, os dedos nas cordas, além de solfejo e teoria musical. Para
educar meu ouvido, ele pegava seu próprio violão ou violino e me fazia acompanhar com acordes e
ritmo. Ele me ensinava, portanto, a entender.

Alguns meses depois de estar com ele, comprei minha primeira guitarra
elétrica. Logo percebi que se tratava de outro instrumento, cuja técnica era diametralmente oposta
ao do violão. Naquela época, não existiam escolas que ensinassem a tocar guitarra elétrica, que nem
era considerado instrumento musical. Porém, as aulas do seu Serafim me auxiliaram muito,
principalmente porque já estava acostumado a tocar sem olhar: tomei a prática, assim, de tocar de
olhos fechados, ouvindo a música que fazia. Foi assim que desenvolvi a nova técnica, sem escola,
sem partitura, só no ouvido. Embora entendesse o que fazia, conseguia sentir com muito mais
emoção a minha própria música.

Com outros instrumentos, como a flauta-doce, comecei também entendendo


para depois sentir. O que seria, então, sentir sem entender? Não sei, a não ser o que eu ouvia antes

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de começar a estudar. Posso dizer que o entender me ajudou a sentir com mais intensidade, mas
isso só depois de muitos anos, pois no começo eu precisava me desvencilhar de um para obter o
outro. Minha opinião naquele tempo seria diferente da atual. Mas posso garantir que sentir é mais
gostoso que entender, embora tenha a mesma importância e um seja suporte do outro.

Silêncio para Ouvir Música nº1

Hoje em dia, para se ouvir música basta apertar um botão que se podem ouvir
horas seguidas de sons musicais. Isso nos faz pensar sobre a qualidade do que ouvimos.
Podem até serem canções de extremo apuro, todavia estarão em sequência
quase sem intervalos, com pequenas pausas intermediando. Ouvem-se músicas seguidas como se
fosse tudo um único som intermitente. Isso é ruído!
Num concerto erudito, há entre os números musicais um espaço silencioso,
irregular, que nos prepara para a próxima música.
No tempo dos discos de vinil, o tempo musical era de, no máximo, de uns 15 a 25
minutos! Então, precisava-se ir até o aparelho de som para virar o disco ou trocá-lo. Havia um
silêncio intermediador. Era o período em que o ouvinte parava suas atividades para se ligar no que
estava tocando. Havia uma tendência maior em se prestar atenção. Não havia controle remoto para
reiniciar o disco. Acabava, reinava o silêncio.
Claro, existia a vitrola automática, mas entre um disco e outro sobrava um tempo
para o braço sair do disco de baixo, subir, bater no de cima, que então caía, para daí a agulha ir à
primeira faixa do disco, que nem sempre chegava exatamente no início. Era uma forma de manter o
ruído que se formava.
A música em si é feita de pausas e sons e estes só são percebidos quando contrapostos a um
relativo silêncio. Muita música em seguida, portanto, vira barulho, e a gente acaba não ouvindo. É
preciso um período para a reflexão, o descanso, a preparação para a próxima. Para se gostar de
música, deve-se aprender a ouvir o silêncio.

Ouvir o Silêncio

O silêncio absoluto inexiste na natureza. Sempre há algum som. Ouvir o silêncio


é saber escutar os pequenos sons que permanecem, como algum pássaro que canta ou um cão que
late ao longe, o mar batendo a dois quilômetros de distância, uma folha que o vento leva pelo chão.

Isso é um exercício que todo aquele que tem o dom da audição deve praticar:
ficar o quanto possível imóvel e buscar os sons que o rodeiam. Desde os externos até os que vêm de
dentro de seu próprio corpo. Se preferir caminhar, juntar aos sentidos o som de seus passos.

Sim! O ritmo corporal, através da respiração. As batidas do coração, mais


sentidas que escutadas propriamente. E não só o ritmo, mas os tons emitidos, mais graves, mais
agudos. Os que vêm do estômago.

Além disso, de onde vem cada som? De dentro de nosso corpo, de fora, de
longe, de perto, da direita, da esquerda, de trás, correndo de um lado para o outro, numa multifonia
natural!

Se estivermos do lado de um computador ligado, o barulho da ventoinha...

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Ouvir o silêncio é uma brincadeira infantil que serve para nos sensibilizarmos
durante a vida inteira.

Silêncio para Ouvir Música nº2

Para se entender música, há primeiro de se entender o silêncio.

Quando vamos a um concerto, presenciamos diversos tipos dele. O primeiro, ao


chegar, é aquele em que o público está conversando, em que escutamos o ranger de cadeiras,
alguma risada...

O segundo é quando, no caso de uma orquestra, os músicos entram no palco e


começam a afinar seus instrumentos. A plateia já diminui seu barulho, respeitosamente. Entram em
cena os sons musicais, que ainda não é a música. Esse momento é emocionante! A isso se segue um
silêncio dos músicos.

Então vêm as palmas para o maestro, que entra. Ele fala alguma coisa, pode
apresentar algum solista, que entra também sob aplausos. Aí é a vez do terceiro silêncio, quando às
vezes até se pode ouvir a respiração do ouvinte a seu lado. É o reverencial, em que todos aguardam
pelo início do concerto propriamente dito. O maestro levanta os braços e introduz o que vinha
sendo esperado!

O ar é tomado apenas pela música, o público reverentemente se silencia. O


resto, já se sabe: as palmas ao final, às vezes acompanhadas por alguns gritos, a calmaria e a
retomada do concerto, isso podendo se repetir mais vezes, até o final, quando todos se vão para
seus silêncios particulares. Ou barulhos.

Equilíbrio e Paz nº1

Para estar melhor em minha vida, quero dizer, mais sintonizado,

Duas coisas são importantes:


A oração
E ouvir música.
A primeira me sintoniza com Deus
E a segunda comigo mesmo, embora
A música sirva também como forma de
Comunicar-me com o Divino.
Na verdade, ambas são atividades que se pode aplicar sozinho ou junto com
mais gente. O melhor é praticá-la em família. Quando isso não é possível, faço em minha solidão.

A oração me conecta com o Altíssimo, Aquele que um dia foi homem. A música
com meu interior, com o divino em potência, que hoje é homem e um dia poderá ser divindade.

Abbey Road

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Gosto dos Beatles. Não falo aqui da importância deles na música, mas de
quanto eles me fazem bem pessoalmente. E de todos os seus discos o que mais me chama atenção é
Abbey Road, que é aquele cuja capa mostra os quatro atravessando uma rua.

Conheci essa grande obra musical na época de seu lançamento, quando meu
pai a levou para casa. Eu tinha onze anos e a descobri com todos os meus sentidos. Já a conhecia de
capa, mas seu conteúdo só fui ouvir então.

Como quase todo vinil, ele tem dois lados tocáveis. O primeiro tem um jeito e o
segundo outro. O lado um tem seis faixas, o dois tem dez! No segundo selo interno, o que se
relaciona são onze canções: qual é a décima-primeira? O incrível é que, em mp3, as dezessete
músicas existem e são as mesmas que vêm no disco.

Havia uma magia: você olhava a agulha da vitrola passar às vezes de uma faixa
para a outra, no lado dois, sem interrupção sonora, sendo impossível descobrir nesses momentos
quando terminava uma canção e começava outra! Absolutamente psicodélico!

I Want You (She’s So Heavy) fechava o lado um de repente, como se a agulha


pulasse do som em abundância para o nada. Então, a gente tinha que ir até o aparelho para virar o
disco. Isso acabou com a reedição no formato digital.

A gravação foi feita em 1969. Era um só grupo, mas cada música tinha um
aspecto diferente. Pode-se até extrair de cada uma o estilo que pelo menos uma banda dos anos
setenta tenha seguido. Ali está o soft, o pop, o progressivo e até o heavy-metal, tudo em princípio,
tudo em gestação.

A banda inglesa estava em seu melhor momento, muito criativa e inspirada.


Embora o disco mais importante da carreira deles seja o Sergeant Peppers, considero Abbey Road o
mais bonito. Na verdade, foi o adeus dos Beatles, o último que eles gravaram. O que saiu depois
desse, Let It Be, foi gravado antes.

Os Chakras e as Notas Musicais

Aprendemos com os orientais que nosso corpo tem sete chakras, que são
centros de energia circulares e rotativos. O primeiro fica na base da espinha. O segundo, três dedos
abaixo do umbigo. O terceiro, no plexo solar. O quarto, no coração. O quinto, na garganta. O sexto,
na testa. O sétimo, na coroa.

Cada um tem suas funções e é ligado a diversas coisas. Entre elas, as notas
musicais. Assim, tocando-as ou entoando-as, sensibilizamos os chakras correspondentes.

O problema é saber a altura exata dessas notas. Nos tempos antigos, cada uma
tinha a altura diferente das atuais. Isso se mede por hertz. O número de hertz do dó central, por
exemplo, era mais baixo na época barroca que atualmente. Isso pode ser comprovado por
instrumentos musicais fabricados naquela época.

Por isso, como decidir a afinação a ser utilizada com respeito aos chakras?
Naturalmente, não podemos usar a atual, mas quiçá a da Antiguidade. E quem sabe qual era a altura
das notas musicais naqueles dias?

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O que se poderia alcançar, portanto, seria através de instrumentos que
pudessem ser afinados da forma antiga. Mas de que maneira, já que não temos a noção exata de
qual era sua afinação?

É impossível determinarmos a altura exata das notas para sensibilizar cada


chakra. Por outro lado, dos antigos tempos até hoje, nós também mudamos e, talvez, possamos
dizer que as notas musicais tenham se alterado ao nosso conforme.

Adendo:

Nosso corpo tem chacras por ele todo, mas sete são os principais. Há quem
coloque como onze.

E o Rock Não Morreu

Nos anos 1970 tinha a turma que dizia que o rock bom era dos anos 50, o
rockabilly. Tinha também os que diziam que o rock tinha tido seu ápice nos 60 e que então o
progressivo tinha matado o bom e velho rock’n’roll.

O tempo passou e presentemente temos grandes nomes das últimas décadas,


incluindo os progressivos. De hoje em dia alguma coisa também ficará, ninguém sabe ainda o quê.

Ora, nos 70 o Black Sabbath não era tão considerado como é hoje! Raul Seixas é
muito mais cultuado agora do que quando era vivo. O Pink Floyd era ainda uma banda experimental.
O Yes era imitado pelo mundo todo. Led Zeppelin! Os Mutantes, Rita Lee e Tutti-Frutti e o Terço
faziam shows fantásticos! Luiza Maria gravava um disco arrebatador que pouca gente comprou. O
Eloy lançava seu primeiro disco. Arnaldo e a Patrulha do Espaço ensaiavam seus primeiros passos. O
Crucis mostrava um rock progressivo de primeira linha.

Dos anos 80 e 90, pinço Legião Urbana e Guns and Roses: o que podemos deixar
de dizer deles? E Cássia Eller e Nirvana. Pra mim, ela foi a melhor intérprete que o rock brasileiro já
teve. Teve também alguns experimentais, que vale a pena ouvir.

Vamos ver o que teremos do início do terceiro milênio... O rock não morreu,
ainda.

Instrumentos Antigos

Os instrumentos musicais antigos eram mais graves que os atuais. A afinação


era diferente, pois o dó central era mais grave.

Na verdade, a tonalidade vem se tornando cada vez mais aguda, o dó central


subindo em número de hertz, talvez acompanhando a ressonância da sílaba Om, que teria sido o
som primordial do universo, ao nascer. Esse som também vai se tornando cada vez mais agudo,
conforme vai se esvaindo.

Assim, para bem afinar um instrumento de cordas antigo é necessário deixa-las


um pouco mais soltas que o normal, a fim de acompanhar o que teria sido originalmente.

O cravo, provavelmente, não era tão agudo quanto o percebemos hoje. Assim
como a viola de gamba, ou a viola d’amore.

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As flautas-doces não se afunilavam nas pontas, como hoje em dia: ganhavam
nos graves e perdiam nos agudos.

A música, portanto, vem se tornando cada vez mais aguda. A não ser no rap,
funky ou no hip-hop, influentes da dance-music, que o baixo marcava o ritmo como um bate-estaca,
assim como a bateria, que muitas vezes era eletrônica.

Ouvir Música

Usar óculos, como já disse noutra feita, tem suas vantagens. Acho essencial
para se ouvir música. Claro, não o uso deles, mas a ausência. Digo isso no caso da miopia.

Ser míope, quando se ouve música, é muito bom. Você pode tirá-los e observar
as imagens que aparecem. Tudo é fluido, as luzes vêm mais dilatadas e você não consegue mais
saber quem está por perto. Talvez, quem esteja pertinho, mas só e por pura prática.

Numa sala de concertos, você tira os óculos e não enxerga mais os detalhes de
quem toca, mas ouve com muito mais apuro. Sem precisar fechar os olhos você tem um
caleidoscópio de cores e sons que se amontoam.

É diferente de simplesmente fechar os olhos, quando o som vem em toda sua


pureza. Na verdade, mistura-se o som com as imagens etéreas... Quanto mais forte a miopia, maior
a impressão. A luz existe, as cores também, mas tudo é mais diáfano.

Quem não é míope, tem a vista perfeita, não consegue obter esse efeito. Talvez
um dia construam óculos especiais para pessoas não-portadoras de desvios visuais, a fim de que elas
possam desfrutar desse bem.

LP e Música Digital

Muito se fala sobre a superioridade dos LPs em relação à música digital. Quanto
aos velhos CDs, não há dúvida. Quando eles apareceram, dizia-se que era uma mídia indestrutível, e
que o som era límpido!

Sem dúvida alguma, alguns detalhes que se perdiam no LP obtinham-se no CD.


Mas isso não durou.

Vieram outros sistemas de música digital e o CD ficou para trás. No entanto,


dificilmente alguém para de fazer qualquer coisa para ouvir música digital. Normalmente, é para
servir de fundo a outra atividade.

Isso acontece menos com os LPs. Ainda hoje, quem os ouve chega a
acompanhar as letras no encarte, observa a capa e até para de fazer o que está fazendo para ouvir a
música. É próprio do LP, faz parte de sua característica. Mesmo, e principalmente, se for ouvir um
antigo compacto, que trazia uma ou duas canções de cada lado, quando muito três.

Outra coisa: o CD quando começa a falhar não tem retorno, só mesmo jogando
fora. Ele é, em essência, descartável. O vinil, mesmo riscado, pulando, continua tocando: este sim, é
pra sempre.

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O BAIXO
Desde criança, quando vou a um concerto, procuro sentar-me perto dos contrabaixos, porque é
impossível ouvi-los se nos colocarmos no meio da plateia. Normalmente, eles ficam do lado extremo
direito da orquestra, com raríssimas exceções.

Então, todos os outros instrumentos são ouvidos, porque de qualquer lugar onde você estiver, eles
serão percebidos. Mas os contrabaixos não.

Quando eu tocava guitarra em bandas, gostava sempre de ouvir o baixo fazendo a cozinha com a
bateria. Podia improvisar à vontade porque, sabia que quando terminasse meu voo, o baixo estaria
lá, firme e forte.

O engraçado é que, mesmo num concerto de rock, geralmente o baixo fica à direita de quem vê. Falo
no geral porque isso não acontecia no Free, no Led Zeppelin e outras bandas por aí. Mas nos anos
1970 isso acontecia com o Terço e com os Mutantes.

Baixo e contrabaixo são o mesmo instrumento: a diferença é que nomeamos da primeira maneira
quando tocam nos tempos fortes, a segunda quando nos contratempos.

O MOVIMENTO PUNK
O punk surgiu no final dos anos 1970 através de bandas que iam contra a vertente de então, que era
um rock elaborado, desde Led Zeppelin até Yes e Pink Floyd. Veio por meio de grupos proletários,
que faziam muito barulho ao tocar, e cantavam gritando, com canções de três ou dois acordes e
minutos, não mais que isso.

Seus ídolos eram grupos como The Who (barulho e instinto, hoje seus discos são clássicos) e os
Rockabilli, dos anos 1950. Era o retorno ao rock básico, gutural, mas com mais confusão.

Era comum, naqueles anos, uma banda de Reggae abrir o show de uma Punk e vice-versa. Eles se
davam bem, uns com os outros, pois ambos eram revolucionários, além de outras similitudes.

Não era um movimento, era simplesmente punk, um antimovimento. Não tinha ideologia nem
modismos, embora usassem cortes de cabelo diferentes para a época. Já não era “paz e amor”. Foi a
época dos Ramones e de Sex Pistols, além de uma banda só de mulheres, The Runaways. A maioria
gravava um disco só, quando chegava a fazê-lo antes da banda se desmanchar. Patti Smith fazia
parte disso, embora fosse um punk intelectualizado, se podemos assim contraditoriamente dizer.
Aqui no Brasil tinha os Ratos do Porão, por exemplo. Nos anos 1980, tinha os Garotos Podres.

Antes do Punk aparecer, as bandas de garagem eram chamadas Punch (soco), já que faziam um rock
primal.

Pessoalmente, considero o New York Dolls a primeira banda Punk, só que em tempos que isso nem
era cogitado, nos primeiros anos 1970.

Com o passar de alguns anos e a chegada do New Wave, pura modinha, e do New Age, para meditar,
o Punk mudou e se transformou no que é hoje, mais um gênero musical como os outros. E as
pessoas em geral falam agora em movimento punk. Nada mais contrassensual.

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CAPOEIRA
A verdadeira capoeira é a de Angola. Veio da África para o Brasil como luta, embora aos olhos dos
não-iniciados fosse apenas uma dança.

Sempre gostei dela, não só em termos de movimento, mas de música: três berimbaus e percussão.
Normalmente, o primeiro berimbau faz o baixo, o segundo a base e o terceiro o solo. Há vezes em
que é tocado apenas um ou dois.

Tentei uma vez aprender capoeira, mas até o básico, que era a ginga, não conseguia fazer direito.

A outra espécie de capoeira é a Regional, com outros movimentos e menos tradição, nata em solo
brasileiro. Na de Angola, tudo o que acontece é mais “chão”; na Regional, ela sobe para o ar.

O SOM DA AURA

Há uma teoria que diz: tudo vibra.

Isso quer dizer que cada um de nós tem uma vibração diferente. Cada parte de nós tem uma
vibração diferente.

Vibramos de maneira distinta diante de cada situação, de acordo com nossas personalidades e de
nossos estados físicos, mentais, espirituais, naquele momento.

A vibração causa um som e assim soaríamos uns para os outros de uma forma particular; temos uma
vibração pessoal, que nos especifica, e variantes, que aparecem conforme nossos estados.

Assim ocorre com nossas auras, que não só têm luminosidade e cores, mas também vibrações, o que
as faz ter som.

A vibração de um ente vivo dá seu som e cor fundamentais. A união de vários num só intento reúne
seus sons e cores numa coalisão polifônica e policrômica.

PRIMEIRA BANDA

Foi em 1974. Não era uma banda ainda, mas eu tinha uma ideia de como seria a minha. Na verdade,
com quase 16 anos, não tinha ainda amigos que tocassem comigo, era eu e uma guitarrinha sem-
vergonha.

Porém, eu tinha a ideia. Queria que fosse de rock progressivo com as letras em latim.

Eu não sabia nada dessa língua, a não ser algumas palavras e pequenas frases. Nunca a estudara em
local algum, mas tinha muito interesse. Com o que achava que sabia, compus a primeira letra:

Carpe oa focvs vox rex.


Carpe oa vox focvs rex.
Que carpea carpea mea vox,

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Que carpea carpea vox rex.

Não vou traduzir, é ridículo! Mas era assim. E a banda ia se chamar PAN, um nome grego. Nunca
aconteceu além de minha imaginação. Contei minha ideia a um amigo da época e ele tirou sarro de
mim perante outras pessoas. Que amigo!

Depois disso, criei outras bandas, algumas imaginárias e outras de verdade. Todavia, isso já são
outras histórias.

A GORDA VAI CANTAR

Antigamente, a ópera era um evento social, em que as pessoas iam para ver outras e para serem
vistas. Usavam pequenos binóculos para verem mais detalhadamente os cantores no palco e,
eventualmente, alguém interessante noutro camarote.

Na verdade, os compositores e cantores não eram muito respeitados pela plateia, que sempre era
silenciada pela overture, em geral bem barulhenta, tocada pela orquestra, a fim de acalmar os
ânimos.

Mesmo quando a peça estava sendo encenada, os burburinhos eram constantes. No entanto, havia
momentos em que as pessoas paravam para ouvir alguém importante, de voz especial.
Normalmente, quando era a vez de uma soprano, diziam: Silêncio, a gorda vai cantar! ... e todos
paravam de conversar para degustar aquele momento.

A seguir, cinco matérias que saíram publicadas num sítio da internet, de meu amigo
Alex Sakai, em final de 2010 e início de 2011.

CACHORRO GRANDE, TCHÊ!

O Rio Grande do Sul vem nos dando boas bandas de rock desde os tempos do Bixo da Seda, que
lançou um único LP. Dessa vez é o Cachorro Grande, que já lançou mais de um cd (e LP, também).
Adquirir Cachorro Grande em vinil custa por volta de 36 reais e é para sempre, diferentemente do
descartável cd.

Essa banda se apoia nas melhores influências setentistas do rock: tem solos de guitarra, tem vocais
roucos, tem uma cozinha alucinante e letras para serem ouvidas pela pele...

Minha canção preferida é você não sabe o que perdeu. Ela tem duas guitarras, uma gravada com
mais volume e outra com menos. Eu só tinha visto isso numa canção do segundo disco do Aerosmith
(get up your wings). Esse detalhe está no disco Pista Livre e abre o álbum. Não existe na versão do
YouTube, onde as duas guitarras têm o mesmo volume.

O último disco do Cachorro Grande foi gravado originalmente em fita de rolo, para obter o som
analógico dos anos setenta e existe em versão vinil, como já escrevi.

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Quando eles cantam uma balada, como Sinceramente, eles lembram O Peso, outra banda setentista
de um LP só. É porque naquele tempo rock brasileiro não tinha vez, os concertos eram para públicos
mínimos e os discos tinham pouca vendagem. Por isso, se você tem algum vinil de rock brasileiro dos
anos setenta, guarde-o com amor.

Enfim, Cachorro Grande resgata um som que não pode se perder.

HENDRIX, AINDA O MAIOR


De todos os guitarristas que já apareceram, nenhum foi maior que Jimi Hendrix. Ele era o maior, não
porque tocasse também com os dentes, não por causa de sua habilidade nos pedais, não porque
tivesse uma pegada única, não porque sozinho valia por uma banda, mas por tudo isso e muito mais.

Se você não o conhece, procure ouvi-lo em vinil. O som digital não possibilita uma boa audição desse
guitarrista. Na verdade, ele enche as caixas de som com a sua guitarra, principalmente em músicas
como purple haze e crosstown traffic. É claro, você pode ouvi-lo nas caixinhas de seu computador ou
nos fones de ouvido de seu MP algum número, mas nunca será como sentar em meio a duas caixas
de som de um áudio estéreo iniciado por uma vitrola.

Quando ouvir wild thing, lembre-se que foi com essa canção que ele colocou fogo na guitarra no
festival de Monterey em 1967. Ele havia sido precedido pelo The Who, cujo guitarrista quebrara seu
instrumento e o baterista idem. Mas quando Hendrix botou sua guitarra no chão, jogou gasolina
sobre ela e tirou o acendedor de fogo, algo ocorreu: wild thing! E o batera do The Who falou algo
como “olha só o que aquele zulu está fazendo, está melhor que nós!”

Hendrix não poupava seus pedais, subia em dois ao mesmo tempo, era um mestre no uá-uá. Em
seus últimos anos de vida, as fábricas mandavam pra ele os protótipos para que fossem testados. E o
resultado disso está nas inúmeras gravações que ele deixou. Muitas inéditas.

Little Wing é um exemplo de seu lirismo, assim como Angel. Ele era hard, heavy, metal, blues, rock,
mas também sabia fazer canções de levar às lágrimas.

Ele é referência até hoje para os maiores guitarristas, porque foi o primeiro a fazer o que fez. Foi o
criador da guitarra elétrica como instrumento de poder. Foi o primeiro verdadeiro guitar hero!!!

Depois, vieram os outros.


09/09/2010

SYD BARRETT, O GÊNIO DE LONDON LONDON

Em 1967, os Beatles estavam gravando seu disco que seria a pedra de esquina da psicodelia, o
Sgt.Peppers. No estúdio ao lado, uma banda gravava seu primeiro disco, muito psicodélico também,
mas com um som mais “espacial”... Era o Pink Floyd, com The Piper at the Gates of Dawn.

Também eram quatro rapazes, mas não de Liverpool, e sim da faculdade de arquitetura, que se
conheceram tocando jazz. Menos Syd Barrett, guitarrista, vocalista e compositor, um gênio à parte,
mergulhado até a tona no psicodelismo, que vinha duma faculdade de arte.

O que salta aos olhos nesse disco é que, exceptuando-se uma faixa, todas têm autoria de Barrett,
sendo que duas são da banda toda.

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O álbum abre com Astronomy Dominé, dele, um som psico-espacial. Depois vem mais três faixas do
mesmo autor e uma da banda toda, terminando o lado A com uma de Roger Waters, o baixista, que
faria uma cisão com a banda aproximadamente duas décadas depois.

O lado B inicia com Interstellar Overdrive, da banda toda, o som espacial que seria a futura tônica do
Pink Floyd. Depois, mais quatro faixas de Barrett, sendo a última Bike, que apesar de parecer que
estavam todos cantando sobre leves bicicletas, era o apelido para o alucinógeno LSD, que todos
consumiam, mas que levou Syd Barrett à loucura. Ele às vezes, em pleno palco, ficava tocando uma
nota só, olhando pro nada...

Então, a banda chamou David Gilmour, que naqueles dias estava tomando um sol no sul da França,
para tocar junto. Passaram a ser cinco, durante um período de adaptação, até a saída inevitável de
Barrett.

Anos depois, foi homenageado pela banda no disco Dark Side of the Moon (“Todos conhecem o lado
claro da lua, mas só o louco conhece o lado escuro da lua e de todas as coisas.”).

Nesse meio tempo, ele ainda gravou dois discos, na base do “o que você tem para nós?” Ele tocava
sozinho e o Pink Floyd cobria depois. No Brasil, saiu como álbum duplo, mas não é uma obra-prima,
como The Piper, o verdadeiro disco de Syd Barrett.

LOKI

Agora vou falar de um DVD que foi lançado há pouco tempo, mas que já ganhou vários prêmios de
voto popular como melhor documentário e melhor filme. É o LOKI, que traça a vida de Arnaldo Dias
Baptista, criador e líder dos Mutantes. Tem muita música, muitos depoimentos nacionais e
estrangeiros, incluindo Liminha, Tom Zé, Sean Lennon, Kurt Kobain, Gilberto Gil, Lobão, sua atual
esposa Lucinha, entre outros.

O documentário mostra cenas dos Mutantes no auge da carreira, até a saída de Rita Lee. Tem o
momento em que os irmãos Baptista recebem o título de cidadão emérito da cidade de São Paulo.
Tem o Arnaldo com a Patrulha do Espaço, uma época em que ele andava esquecido pela mídia.
Nesses dias, ele teve o seu único filho, o Daniel, com a segunda esposa, a Martha.

O retorno de Arnaldo aos palcos foi um milagre. Anos antes, ele teve um acidente num hospital, em
que caiu do quarto andar. Dizem que foi uma tentativa de suicídio, mas acho que foi apenas uma
forma de sair das paredes em que estava confinado. A pressão da vida era muita e não havia mais
maneira de escapar. Foi quando ele conheceu Lucinha, que até então era apenas fã e fazia serviços
de bastidores.

O filme mostra ainda cenas do Arnaldo retornado em Londres e o sucesso que fizeram por lá como
banda psicodélica brasileira. Fizeram o público de um teatro sisudo dançar por todo o final da noite.

LOKI pode ser comprado pela internete, segundo eu saiba, que foi como adquirimos. Talvez tenha
outra maneira de ser comprado, também, não sei, mas vale a pena ter na sua coleção um registro
daquele que já foi considerado o Syd Barrett brasileiro.

Eu sou velho, mas gosto ainda de viajar.

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Mendigos e Cia.
Era 1975. Com 17 anos, já era guitarrista líder do Mendigos e Companhia. Mas, como escreveu
Rimbaud, ninguém é sério aos dezessete anos. Éramos Paulo na bateria, Tadeu no baixolão e eu na
guitarra. O Tadeu e eu fincávamos nossos plugues num amplificador de som de toca-discos
estereofônico. Dava certo, e fazíamos um barulho com vontade de sair música, no enorme saguão
do depósito de meu pai.
Nem sempre os ensaios davam certo. Nem sempre todos compareciam. O Paulo, no meio de
uma peça qualquer, parava de tocar e saía para fumar. Eu ficava muito tenso com isso. O Tadeu só
sabia falar de mulher. Ele era o meu baixista. Eu gostava dele. O Tadeu foi muito companheiro por
aqueles dias, saíamos juntos para comprar uma calça, ouvir música, pegar um concerto, andar pelo
centro da cidade, tomar caldo de cana, comer pastéis, churrasco grego e falar de guitarras, baixos e
baterias.
Eu gritava feito um louco, principalmente quando dava defeito na fiação, no captador, nos
trastes, no absurdo da existência daquele trio. Um dia, fomos à casa do Eduardo Araújo, e a Silvinha
foi contar pra ele a novidade: um trio! Três meninos estavam formados num clássico guitarra-baixo-
bateria! Ninguém mais fazia isso, eram os tempos do sintetizador e da pedaleira. Chegamos a ir
nalguns ensaios, um dia não fomos mais. Tínhamos que nos concentrar mais em nossos próprios
tocares.
O Mendigos durou um período de ensaios e um concerto num festival roqueiro, no Coe, uma
escola da Lapa, bairro da cidade de São Paulo. As ruas do bairro desertas, sábado à tarde, a maioria
das lojas fechadas. O quieto, o moroso, o limbo no ar. Descendo a Doze de Outubro, apenas alguns
malucos. Aumentava o número conforme chegávamos ao local marcado. Cheio de cabeludos, semi-
hippies, entrosados, marginalia, espécies em ascensão e outras em recaída. Presenciei um cara com
tique nervoso, era reputado excelente guitarrista. Uns cabeludos altos, também, uns com cara de
índio, e a gente ali no meio, três garotos com os olhos arregalados. Um loiro magro, com ar de galã
pop, ele ia tocar junto com um guitarrista negro, forte, que batia a mão direita em concha sobre as
cordas. Pareciam muito viajados. Diferentes de nós três. Eu já tinha o meu cabelinho mais comprido,
totalmente desgrenhado e enrolado. O Paulo, na última hora, foi viajar, e tivemos que chamar um
amigo para o substituir. E veio o Luiz, com toda sua boa vontade. Ele era do tipo arrumadinho, mas
eu gostava dele, tinha sentimento. E lá, nervosos, querendo desfilar com nossos instrumentos,
éramos verdadeiras crianças em meio ao geral. Um pessoal tranquilo, com a sabedoria das longas
mechas.
Fomos para um canto, rapidamente ensaiamos o tema, repassando pro Luiz. Éramos os três,
ali, sozinhos, sem conhecer ninguém. Era tudo cara maduro, mas e daí? Pareciam muito sapientes,
mas éramos três bobões tentando passar por figuras de larga data. Nós íamos arrebentar! Claro que
nos sentíamos os pivetes intrometidos, mas podíamos dizer que estávamos lá! E fazíamos pose de
quem já viajou muito...
Nossa, vieram pedir pra gente abrir o festival, e mandaram improvisar bastante! Foi o mesmo
que implorar pro rato comer queijo. O Luiz sentou na banqueta da bateria como se fosse um
profissional. Levantou as baquetas e me pareceu que deu umas velozes dançadas com elas no ar.
Não era cabeludo, e como eu já falei, tinha um jeito arrumadinho, mas eu gostava muito dele, era
persistente, gentil, atencioso. Na verdade, só tínhamos guardado uma única peça no repertório, a
que ensaiáramos exaustivamente. Tanto que o baterista conhecia tudo de fio a pavio, já que éramos
tudo da mesma turma...

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Na hora do vamos ver, o baixista não estava com seu baixolão, mas com um instrumento
emprestado, enorme, e grudara com fita adesiva duas palhetas duras juntas. Começou fazendo
teque, teque, teque, até que entrou e o baterista tocou feito um Rollando Castelo Júnior! E aí?
Fiquei na agrura! Meti meus pés no pedalzinho de uá-uá, e fiz a guitarra mais aguda de todo o
festival! E solei, solei, solei... até que percebi que um solzinho batia no braço de minha guitarra, era
um meio para final de tarde, e nossa energia de adolescentes, misturada com sons que vinham da
cabeça para os dedos, fraquinhos, eu mesmo tinha dificuldade para apertar as cordas e fazer
puxadas, enquanto meu baixista olhava para o fantástico vermelho que adquirira nas mãos, ao
tempo de nossa paciência monástica e vontade de ficar ali por horas. Estávamos nervosos, trêmulos,
mas bastante felizes.
Olhei pra frente e não vi ninguém, só vultos e cabeleiras difusas. Já era muito míope, e
decidira tocar sem os óculos. Apesar de sentir melhor o que tocava, diversas vezes tropecei nos fios.
Naquele tempo, tudo usava fio: os instrumentos, os microfones, os amplis, tudo! A gente não se
mexia muito no palco, mas eu vivia andando de um lado para o outro, ou ficava parado em frente ao
público, que eu sabia, estava lá, mas nem via se olhavam ou não para nós.
De repente, olhei pro céu e vi que era o momento de terminar. O Tadeu parecia exausto. Ele
me disse que havíamos ficado lá por mais de uma hora. O Luiz falou em cinco minutos, e eu achei
que havia sido uns 15. Nenhum de nós usava relógio, éramos bastante intuitivos. Pulsávamos cada
um o seu próprio tempo. Para que marcação cartesiana? Não sei como foi, mas depois que olhei
para o céu, me pareceu que o baterista deu ares de que ia parar de tocar: ele olhou pro Tadeu e
paramos. Terminamos, assim, como quem lambe os lábios depois de comer pizza.
Anos depois, descobri que Hendrix jamais soubera uma nota de teoria musical. Parei de
estudar música e comecei tudo de novo. Mas a banda... Nunca mais uma banda como Mendigos e
Companhia. Foi a primeira e última apresentação, depois de muitos e muitos ensaios. E seguimos
depois cada qual para nossos caminhos.
Final das cinco matérias. Agora, outras coisas.

TREWA

Não me recordo bem a data, talvez tenha sido em 1974, talvez 1976.

O certo é que se tratava de um festival de música competitivo, como muitos naquela época, no
Central Parque Lapa, em São Paulo.

Os organizadores acharam por bem contratar uma banda convidada para tocar no final de cada dia.
Chamaram a Trewa.

Era uma surpresa, ninguém conhecia o grupo, todos achavam o nome estranho, mas nome de grupo
era nome de grupo e ninguém tem nada a ver com isso.

Chegou a noite. Chegou o momento. O som era pesado, altamente heavy-metal como nunca se
ouvira antes. Era muita coisa para as cabeças de então. Ninguém gostou, todos acharam que não era
bom o bastante e trocaram para os outros dias por uma banda mais convencional.

Na verdade, o público não estava preparado para uma sonoridade que iria explodir nos anos 1980...
e nunca mais ouvi falar da Trewa.

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Mundo do Glam

Marc Bolan foi o primeiro homem que apareceu muito maquiado no mundo norte-americano do
rock. Era final dos anos 1960 e a psicodelia gritava alto!

Seu som era instigante e ele tinha a banda Tyranossaurus Rex, mais tarde rebatizada como T. Rex.
Porém seu público sempre foi específico, underground.

Um dia o músico David Bowie decidiu aparecer bastante maquiado, mas com uma sonoridade muito
mais pop. Já era início dos anos 1970 e ele aproveitou a onda do Glamour Rock para se apresentar
como um personagem que ele mesmo inventou, Ziggy Stardust e eclipsou Marc Bolan.

ROSAS DE OURO
Meu pai era comerciante de artigos de época: natal, carnaval e festa junina. Quando eu era criança,
ele ainda vendia artigos de carnaval, como confete e serpentina, espirradores de água, lança-
perfume – que naquela época era permitido -, entre outras variedades.

O carnaval começou para mim com as festas de salão do Clube Jaraguá, acho.

Na adolescência, fui conhecer o carnaval de rua, das escolas de samba. Não dançava nem pulava, só
assistia. Morava na capital paulista e ia à avenida São João para ver as escolas de São Paulo. Não
havia arquibancadas, o público sentava-se na beira da calçada ou ia acompanhando as escolas,
andando. Era nosso caso, pois eu ia sempre com pelo menos um amigo.

A escola Rosas de Ouro tinha sua sede na Vila Brasilândia e todo ano desfilava também na rua Doze
de Outubro, a principal do bairro onde eu nasci e morava, a Lapa. Passou rapidamente a ser a minha
favorita.

Hoje em dia assisto-a pela internete e torço por ela. Não tenho paciência para ver todas, mas ela eu
procuro. É o carnaval de São Paulo, que infelizmente hoje tem Sambódromo e entradas pagas.

THE RUNAWAYS
Essa foi a primeira banda conhecida de rock totalmente feminina. Elas foram lançadas como punk,
mas seu som era um verdadeiro hard-rock anos 1970. Tocavam muito bem e seu único disco, até
onde eu saiba, é de 1976, e não desaponta: não tem uma música lenta, é só pauleira!

Antes delas houve outras roqueiras, mas geralmente eram vocalistas. Guitarristas, baixistas ou
bateristas se imiscuíam no universo masculino. No Brasil, a primeira guitarrista foi Lucinha Turnbull.
Ela tocou no Tutti-Frutti com a Rita Lee, com Gilberto Gil e tentou uma carreira solo. Fez também
uma aparição como atriz na versão tupiniquim de Rock Horror Show.

Mas as Runaways foram um ponto forte no rock estrangeiro. Fizeram sua marca. Sua música
principal era Cherry Bomb, mas o elepê mostra que elas tinham muito mais a mostrar. Se não der
para encontra-las no vinil, tem no YouTube. Pelo menos, enquanto escrevo aqui.

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APÊ NDICE: THE RUNAWAYS

Ainda neste, livro disse que essa banda, a primeira só de mulheres no rock, lançou apenas
um elepê.
Consultando esses dias o YouTube, percebi que estava muito errado. Há mais discos delas,
além daquele de 1976. Tive a oportunidade de ouvi-los.
Não sei porque, mas nenhum me pareceu tão impactante quanto o primeiro. São bons, é
verdade, mas têm músicas lentas, o que não existia no de estreia.
Vi um vídeo delas ao vivo no Japão e descobri um quinto elemento, uma segunda
guitarrista. Parece que ela participou nas gravações de discos posteriores, não sei, mas não
precisava. No entanto, é muito comum vermos bandas de rock se apresentarem com participação de
músicos contratados para dar mais preenchimento a seu som.
5fev2019.

LETRA E MÚSICA
Adoro música! E isso se torna um problema quando as pessoas dizem que eu preciso prestar atenção
naquela letra... porque eu não consigo!

Preciso LER a letra, ou ouvir a canção centenas de vezes, para então prestar atenção no que ela
diz. Fico mais atento à melodia, à harmonia, aos arranjos, aos instrumentos, às vozes principais, aos
backing vocals, às mudanças de ritmo, para depois ouvir a letra.

Adoro ler! Mas acho difícil fazer isso com música ao fundo, seja instrumental ou não, o que para
mim é tudo a mesma coisa. Para bem ler, preciso de silêncio.

Mas a música vive na minha cabeça, sempre tenho música na cabeça, já existente ou de improviso.
Isso é bom, mas às vezes atrapalha, então para fazer alguma coisa manual preciso de uma música de
fundo; pode ser para pintar, desenhar, fazer algum trabalho manual, então aquela sonzera ajuda.
Não pode ser um sonzinho imperceptível, porque aí atrapalha, se mistura com a música na minha
cabeça.

Bom, mas isso é comigo, não espero que ninguém compartilhe. É pessoal.

PEPEU
Eles fizeram uma página virar na MPB, e principalmente, no rock brasileiro. São os Novos Baianos,
que lançaram vários álbuns nos anos 1970. Era uma banda totalmente heterogênea, uma
comunidade, viviam todos juntos e mantinham uma única tv na casa – que não tinha som.

Sua música ia do rock mais pesado ao chorinho. Se acabasse a eletricidade no meio do show, eles
iam pra plateia e organizavam uma roda de samba.

Várias cabeças saíram desse grupo em carreiras individuais. Ou quase.

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Quero falar de Pepeu Gomes e Baby Consuelo, que durante algumas décadas foram parceiros na
música e no amor. A voz de Baby, seu controle rítmico, sua gradação do mais suave ao gutural, era o
que havia de melhor. E a guitarra de Pepeu.

Pepeu Gomes sempre foi e ainda é o melhor guitarrista de rock do Brasil. Infelizmente os produtores
fazem-no cantar. Por isso a dupla era boa, o melhor de cada um juntos. Mas hoje seguem carreiras
separadas e Pepeu continua dedilhando o sol brasileiro.

Literatura no Rock

Depois que Bob Dylan ganhou o premio Nobel de Literatura descobriu-se finalmente o quão ela está
desde sempre imiscuída no rock, Quem foi buscar o premio foi a musicista Patti Smith, autora de
dois livros já editados no Brasil e poetisa desde priscas eras. O que não dizer das letras de John
Lennon, Jon Anderson, Cazuza e Renato Russo?

Algo que sempre uniu artistas plásticos (incluindo principalmente fotógrafos) voltados ao rock e
roqueiros em geral sempre foi a literatura. Todo fotógrafo e artista plástico voltado ao rock que
conheci eram muito loucos!

Temos Luiz Carlos Maciel (conhecido como nosso guru da contracultura, mesmo que ele quisesse
negar isso, falecido em dezembro de 2017), Jorge Mautner, Plínio Marcos, Hermann Hesse, Aldous
Huxley, George Orwell, entre muitos outros literatos que fizeram nossa cabeça enquanto
descansávamos dos discos de vinil e fitas cassete.

Registros musicais

Vamos começar falando de como conheço o cantar de Francisco Alves (Chico Viola). Minha avó o
adorava e colecionava discos dele. Temos hoje, de recordação, menos de quinze bolachões de 78
rpm, ao todo menos de trinta canções. Naturalmente são registros, para os moldes de hoje,
precários. Mas já foram, um dia, o que havia de mais moderno em termos de gravações musicais.

Os Beatles gravaram seu disco Seargent Peppers, de aproximadamente quarenta minutos de


duração, em um estúdio de quatro canais, em fita de rolo, que era o que havia de melhor em 1967.

Das composições de Mozart, tudo o que temos hoje são suas partituras e relatos de época sobre sua
maneira de tocar. Não sabemos realmente como ele tocava pois não temos registro sonoro dele. O
que, na verdade, seria isso mesmo: apenas um registro sonoro. Mas seria mais do que temos agora.

Com o YouTube podemos assistir diversos músicos antigos tocando em apresentações diversas e
conhecê-los assim um pouco melhor. Alguns podem ser uma bela surpresa, outros uma decepção,
mas é sempre uma forma de conhecimento.

Isso nos faz pensar no que os músicos antigos fariam se tivessem a tecnologia de hoje disponível!
Por que os atuais não conseguem dispor dessa mesma tecnologia com a criatividade dos antigos? O
que ocorre com os músicos de hoje, que têm tanto a seu dispor e de nada aproveitam? Secou a
fonte?

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Percussão

Instrumentos de percussão na orquestra erudita não acompanham o ritmo. Isso seria uma função
por demais óbvia.

No entanto, na música popular, isso acontece com uma constância demasiada. É comum ouvirmos
canções com aquele tchic-tchic acompanhando o ritmo de forma tão óbvia que cansa!

Já não falo dos instrumentos de percussão determinados, naturalmente criativos, mas dos
indeterminados, que podem ser utilizados de diversas formas, não precisando ser repetitivos pela
canção inteira. Isso os torna enfadonhos, entediantes.

Os instrumentos de percussão têm que adentrar na harmonia da canção, deixando a marcação do


ritmo no ar, para que o ouvinte a alcance naturalmente.

Exemplos de percussionistas brasileiros que merecem ser ouvidos: Nana Vasconcelos, Airto Moreira
e Rollando Castello Júnior. Estrangeiros: John Bonham, Nundu e James (Mingo) Lewis.

Brian Jones

Esse músico era um gênio!

Fundador dos Rolling Stones, era a mola criativa da banda. Tocava inúmeros instrumentos – era o
único deles que fazia isso – e levou o grupo dos blues ao rock.

Com ele, não era apenas rock’n’roll: ele inventava...

Senão, veja os discos de sua época, onde instrumentos musicais estranhos ao rock convencional de
então apareciam: flauta doce, sitar... todos tocados por ele.

A sonoridade dos Stones mudava sempre, embora tocassem rock e um pouco de blues. Mas não era,
como já disse, only rock’n’roll...

Mick Jagger tinha ciúmes dele nas apresentações, porque embora Jagger fosse o vocalista, Jones era
quem mais aparecia, já pela sua própria aparência de roqueiro modelo, já pela sua presença de
palco.

Depois de sua morte, Jagger assumiu a liderança do grupo e passou a ser aquilo que sempre
pretendeu: o centro das atenções.

O último disco da banda em que Brian Jones apareceu foi Beggar’s Banquet.

Quando existe o som

O som é produzido por vibrações no ar sentidas pelos nossos ouvidos. E pelo nosso tato.

Quando um bumbo amplificado toca, ouvimos com nossos ouvidos e sentimos sua vibração em
nossa barriga.

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Quando uma orquestra toca, podemos, além de ouvir com nossos ouvidos, sentir com nossos corpos
a vibração dos sons, principalmente se o chão for de madeira acarpetada e estivermos sentados em
poltronas.

Há uma famosa tese filosófica que pergunta se o som existe quando uma árvore cai na floresta e não
há ninguém por perto para perceber as vibrações. Há quem diga que o som não existe nesse caso
porque para ele existir tem de se completar a ligação, isto é, haver a criação do som e sua recepção.

Bits

Quando lançaram no mercado o CD, disseram seus propagadores que se tratava


de uma mídia invencível, que não se degradava, que era indestrutível por pisadas de botas sobre o
material gravado, além de um som muito mais puro que o do vinil e, naturalmente, da fita
magnética.
Tudo se revelou, com o passar do tempo, um tremendo engodo. Eu mesmo tenho
em casa vários CDs que pulam em determinadas faixas, as quais se tornaram impossíveis de se tocar.
Em compensação, tenho discos em vinil riscados que, apesar de pularem em várias faixas, não
deixam de tocar.
É certo que a vinda do som digital trouxe alguns avanços, ouço muita música
dessa forma, mas ainda tenho meus vinis.
O mesmo se dá com os livros. Quando Johannes Gutenberg ocidentalizou a
prensa, os manuscritos, que eram feitos um a um, raríssimos e por isso caríssimos, foram pouco a
pouco sendo substituídos por escritos impressos. Estes se multiplicaram em quantidade e
diminuíram razoavelmente o preço do exemplar.
Ao mesmo tempo, muito mais autores passaram a ser lidos. E muito mais
exemplares de cada livro existiam para serem adquiridos e conservados nas bibliotecas públicas e
particulares.
Criaram-se as editoras, que escolhiam quem deveria ser publicado e quem não.
Com tal fato, muitos autores publicaram suas obras por conta própria. Inclusive, nos anos 1970 e
início dos 1980, houve o movimento da literatura marginal, em que, além de se publicar
externamente às editoras, não raro as publicações iam além do tradicional formato-livro.
Com a criação dos e-Books (livros eletrônicos) e dos áudio-livros, deixa-se de ser o
papel (ou a seda, o pergaminho...) o único meio de se propagar ideias. A multiplicação de títulos
aumenta consideravelmente. Isso porque, além de se ter os livros que já existiam fisicamente e
agora podem ser digitados, ou gravados, há inúmeros títulos que nascem digitais.
O que vem tudo isso a dizer? Que estamos pensando em conservar com mais
facilidade os livros de nossa civilização em bits. Mas assim como o papel, a seda, o pergaminho, os
microfilmes, os CDs, os discos, as fitas magnéticas, os bytes também se desgastam: Bits se degradam
com o passar do tempo. Documentos podem se perder no ciberespaço por conta da obsolescência da
mídia em que estão registrados. (Robert Darnton – A Questão dos Livros, Parte I, cap.2).
Ednei Procópio, no glossário de seu livro Construindo uma Biblioteca Digital, quando fala
sobre backup, escreve: já se foi dito que o papel dura até dez vezes mais que os HDs (...) e até
mesmo CDs. (...) com o passar de dois mil anos, livros escritos em papel ainda se mantinham
intactos... E arquivos eletrônicos criados dois anos atrás eram simplesmente inacessíveis.
Craguá, 16 de outubro de 2018.

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Rita Lee
Quando comecei a ir aos shows de Rita Lee & Tutti-Frutti, estávamos pelo meio
dos anos 1970 e seu público era de uma juventude roqueira brasileira, que andava com roupa fulêra
e não militava na política, como o público da MPB, que nos desprezava.
Naquele tempo, na cidade de São Paulo, era mais ou menos sempre a mesma
turminha que ia aos shows de rock. Rita Lee tinha seu público específico, entretanto, pois era quem
mais vendia discos e sempre tinha alguma canção na parada de sucessos – o que em bom português
se convencionou chamar de hit parade.
Como acontecia com todas as bandas, Rita Lee também era muito melhor ao vivo
do que nos discos. Não só na qualidade intrínseca musical, mas na sonoridade. O que se ouve hoje
nos discos que ficaram é apenas uma sombra do que rolava naqueles dias.
Houve, porém, uma particular mudança de público em 1978, quando ela
desmanchou o Tutti-Frutti e lançou o Cães e Gatos. Em sua autobiografia Rita deplora esse período.
Para mim também foi uma decepção, mas por outra razão que a da musicista: não encontrei os
antigos roqueiros na plateia, e sim famílias comportadas, sentadas em suas poltronas.
A partir de então, quem começou em casa a comprar seus discos foi meu pai...
Claro, um dia, mais para a frente, eu também formaria uma família só para
chamar de minha. Porém, sua música mudou muito e nunca mais tive ganas de frequentar shows da
Rita Lee.
Caraguatatuba, 16 de novembro de 2018.

Adendo

Rita Lee abriu as portas para as novas cantoras brasileiras que cantam rock,
principalmente as que lideram bandas. Se não fosse por ela não haveria Ana Cañas, por exemplo, ou
Pitty.
27/11/2018.

Cássia Eller
Ninguém abriu espaço para Cássia entrar. Ela derrubou barreiras musicais e
adentrou com seu vozeirão cantando de tudo, do samba ao baião, da MPB ao rock!
Não discuto sua questão sexual, que é externa ao plano musical, nem a causa de
sua morte, que acho que até hoje não foi bem explicada, mas seu modo de cantar.
Nunca houve, antes, durante, ou depois de sua vida, outra cantora com tanto
potencial ainda por explorar. Tinha muito ainda a dar, muito a experimentar. Sua voz era inigualável.
O pouco que ela deixou gravado mostra isso.
Cássia Eller não deixou discípulos nem seguidores.
Novembro de 2018.

Bixo da Seda
A primeira vez que vi o Bixo da Seda foi quando ele veio para um supershow de
rock que aconteceu num ginásio esportivo na capital paulista. Eram várias bandas e eles fecharam a
madrugada, terminando às cinco horas da manhã.

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Eram de Porto Alegre, e achei o som deles excepcional, muito pesado e bem
tocado. Decidi que compraria seu disco.
Tempos depois, fui a uma loja e o comprei: Estação Elétrica. Ao chegar em casa e
botá-lo na vitrola, o que senti? Uma enorme decepção! Não tinha nada a ver com o que eu tinha
ouvido no show, faltava peso, empolgação, faltava som!
Normalmente, como já falei antes, isso sempre acontecia com os discos de rock
no Brasil. As gravadoras, os produtores, deixavam-nos com cara de música brega, as vozes lá em
cima, as guitarras lá embaixo junto com a bateria e os teclados, o baixo no meio. Como minha
vitrolinha era uma sonatinha estereofônica, nada ajudava.
Passaram-se as décadas. Vieram os CDs, os DVDs, o YouTube, o som digital.
Há poucos dias meu amigo Marcelo terminou de consertar minha vitrola CCE, que
não é o que melhor se pode ter, mas é bem melhor que minha antiga sonatinha. Coloquei para ouvir
o disco do Bixo da Seda. E não é que ele é muito bom? Tenho que me lembrar que ao vivo era bem
melhor, mas não posso deixar de reconhecer de que a gravação me deixou feliz. Não pela
recordação, mas pela música mesmo, em si.
Achei-os no YouTube, tocando ao vivo, em gravação recente. Não é a mesma
coisa que ouvir num vinil, enchendo as caixas de som... Mas para quem nunca os ouviu, é uma boa
ideia pra se conhecer como estão atualmente. É, porque parece que, ou a banda voltou a se reunir
para tocar o velho repertório, ou...
27/11/2018.

Rock Argentino
Estive em Buenos Aires em 1977. Estava interessado em conhecer o rock
argentino de então. Comprei uma revista Pelo – Cabelo -, entre outras, mais históricas, e fui buscar
fitas cassete do gênero.
Os donos das lojas de discos eram peremptórios: - Não existe rock argentino!
Para eles, era impossível ter esse tipo de música na terra de Gardel. Mas achei,
entre outras coisas, uma fita do Sui Generis e outra do Almendra.
O rock latino daquela época era tão bom quanto o brasileiro e suas gravações tão
ruins quanto as nossas.
Não tenho mais as fitas cassete, mas dá pra encontrar muita coisa no youtube. O
problema é que é um som digitalizado, não tem a pureza do original. Mas é melhor que não ter
nada.
6/12/2018.

Anotações sobre Música I


Harmonia é proporcionalidade, ordem, simetria. Na antiga mitologia greco-latina, Eros
era filho de Caos. Encarnava a harmonia e o poder criativo. Posteriormente, passou a ser
companheiro eterno de sua mãe, Afrodite. De onde a ideia de que a beleza pode trazer ao caos a
harmonia; em outras palavras, a cultura, o ensino e a educação poderão trazer a paz à sociedade
conturbada. Eu acredito nisso.
A ideia de harmonia era já evocada por Pitágoras, com a sua explicação a respeito da
harmonia das esferas, retomada na Idade Média: cada um dos sete planetas, os conhecidos nos dias
do filósofo grego, emitiria um dos tons da escala diatônica musical: dó, ré, mi, fá, sol, lá, si, cada tom
para um planeta, mais agudo quanto mais longínquo da terra e mais rápido seu movimento (De

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musica I, 2). Do conjunto, a música dulcíssima que nós não entendemos por inadequação dos
sentidos, assim como não percebemos odores que os cães, por sua vez, sentem – como dirá mais
tarde, com uma comparação um tanto infeliz, Jerônimo da Morávia (...) (ECO, Umberto. Arte e
Beleza na Estética Medieval. Trad. de Mario Sabino Filho. Rio de Janeiro: Globo, 1989. Pág.49.)
Continuando o texto, diz Eco: Nestes argumentos, notamos mais uma vez os
limites do teoricismo medieval: de fato, como foi observado, se cada planeta produz um som da
escala, todos os planetas juntos produzirão uma dissonância desagradabilíssima.
Pessoalmente, digo que Boécio, como Pitágoras, dizia da Harmonia das Esferas
considerando uma nota da escala para cada planeta, sim, diatonicamente. Não seria o que na
Música Nova se convencionou chamar de cluster, em que notas sucessivas são tocadas ao mesmo
tempo, espécie de acorde que, se tocado no piano, abarca uma oitava inteira com todas as teclas
brancas que a compõem. Ou todas as pretas. Ou todas as pretas e brancas. Há notações que
especificam tais. Mas seriam as notas tocadas cada qual por sua vez, cada planeta emitindo sua nota
não-simultaneamente.
A dissonância, não necessariamente o cluster, é desagradável para determinados ouvidos
em determinadas circunstâncias, mas agradam aos ouvintes da bossa-nova, só para dar um bom
exemplo. Ora, Boécio, e muito mais Pitágoras, pensavam na estética como um instrumento divino,
uma faceta de Deus, e assim nada mais lógico que se entendesse a Harmonia das Esferas como sutil,
hábil perante o Grande Ser, naturalmente diferentíssima da música atual.
Antevissem aqueles antigos a existência de tantos planetas quanto os posteriormente
descobertos em nosso tempo, poderiam até pensar numa escala cromática, e até com variâncias de
terças e quartas de tom... Talvez, cada tom haveria de ser emitido à sua vez, no tempo e não só no
espaço. Este último, representando uma harmonia melódica, quiçá harmônica, seria formado apenas
depois da Harmonia temporal, talvez compassos binários, trinários, unitários, quaternários,
quinários, entre outros, pulsando o Universo em ritmos, contrapontos, harmonias, instando o ser
humano a aprender com Deus.
Pitágoras já falava em não-entendimento de nossa parte daquela dulcíssima música por
inadequação dos sentidos. Se o é, que forma temos de dizer que se trataria de uma dissonância
desagradabilíssima?
Campos do Jordão, anos 1990.

Anotações sobre Música II


Os Tons e as Escalas: os Degraus da Sabedoria

Quando cantamos um som, único e preciso, o que fazemos é dar um tom. Um tom
qualquer. Se entoamos um único som, com o objetivo de ser ele o fundamento, então é esse o tom
fundamental.
Esse é o som primordial, do qual partiremos para o nosso conhecimento próximo. Escolha
um tom que te seja confortável para cantar, um tom só, como diríamos, uma nota musical que você
não precisa saber qual é, apenas uma nota, e a cante com boa vontade. Limpa. Sem modulações.
Sem nada, só o tom fundamental. E aí, imagine qual o som que vai ser próximo a esse, só que
diferente. Cante! Esse é o segundo som, a segunda nota, baseada na primeira. Como se fosse uma
escadinha, vá cantando novas notas. Se você começou subindo, continue subindo; se começou
descendo, continue descendo. Eis que você está cantando uma escala musical.

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Os ortodoxos e mecanicistas musicais dizem que, para se chamar o que você fez de
escala, teremos de descobrir quais são os intervalos entre uma nota e outra, até que se obtenha a
mesma nota que a inicial. Sim, a mesma nota, embora em oitava diferente.
A música é relativa, não tem tons fixos e fundamentais, a não ser os que o ser humano
convencionou que são. A chamada afinação também é relativa, pois o que se convencionou ser
afinado na Arábia Saudita não é afinado pelos ouvidos do músico erudito suíço. Da mesma forma,
digo que o Brasil tem um ouvido afinado pelos sons de sua própria terra, e adentra pelos rincões
com seu próprio modular.
Quando o índio kranhacarore constrói sua flauta, não dispõe os buraquinhos para que
soem dentro de uma escala natural europeia, aquela que conhecemos por dó-ré-mi-fá-sol-lá-si-(dó).
Ora, o índio kranhacarore, do sul do Amazonas, não pensa a música da mesma forma
como o suíço. Não é, para o índio kranhacarore, do sul do Amazonas, natural a escala do suíço.
Bom, acho que já deu para entender onde quero chegar. O tom fundamental que você
entoou e a escala que você intuiu podem não ser os mesmos da escala dita natural pela teoria
musical que nos é imposta, mas existe e é musical.
Os Cariocas: eis um exemplo de grupo vocal a ser respeitado. Os intervalos harmônicos
que eles utilizaram só poderiam mesmo sair do Brasil, onde não existe a educação musical ortodoxa
exaustiva, mas os ouvidos captam pulsações diferenciadas e entoações extremas.
O berimbau é um instrumento de corda ou de percussão? Ora, está na área cinzenta! O
berimbau emite tons diferenciados, anotáveis em pauta musical em forma de notas musicais, e pode
tanto acompanhar como solar. Um solo de berimbau pode ser percussivo, melódico ou ambos.
Claro, estou falando ainda do tradicional, encontrado nas rodas de capoeira e afins. Na capoeira
angola, que é a mais antiga, gingada, lenta, chegamos a ter três berimbaus, quando então um fica
dando o uma espécie de tom fundamental, o segundo fazendo uma espécie de baixo/contrabaixo, e
o terceiro, digamos, solando... A Trindade nos Berimbaus da Bahia.
Música é um aprendizado. Não se aprende a tocar se não se aprender a ouvir.
Campos do Jordão, anos 1990.

Anotações sobre Música III


As Escalas

Uma escala é uma escada. Cada um dos degraus da escada é chamado grau. Na teoria
musical europeia, a escala tem sete sons, e o oitavo repete o primeiro, só que mais agudo (mais
fininho): dó-ré-mi-fá-sol-lá-si-(dó). Entendeu agora porque o segundo dó eu coloco entre
parênteses? É porque é igual ao primeiro, só que mais fininho. Porque a escala na música europeia é
cantada do mais grave para o mais agudo, como se o inferno desse os tons baixos, a terra os médios
e os Céus os agudos...
A distância entre dó e ré é de um tom.
A distância entre ré e mi é de um tom.
A distância entre mi e fá é de meio tom.
A distância entre fá e sol é de um tom.
A distância entre sol e lá é de um tom.

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A distância entre lá e si é de um tom.
A distância entre si e dó2 é de meio tom.
A distância entre dó2 e ré2 é de um tom. Etc.
O tom é a distância entre duas notas. Quando essa distância é só a metade, dizemos que
é um meio-tom. Se dissermos que o dó é vermelho, o ré é amarelo e o mi é azul, o fá é azul clarinho
e o sol sustenido negro, então teremos:
O meio-tom entre o dó e o ré será laranja, e o chamaremos de dó sustenido (#) ou ré
bemol (ь);
O meio-tom entre o ré e o mi será verde, e o chamaremos de ré sustenido ou mi bemol;
O meio-tom entre o mi e o fá será... será o próprio mi ou o próprio fá. Porque entre o mi
e o fá só existe meio tom. O mi sustenido é o próprio fá, e o fá bemol é o próprio mi. Por isso é que o
fá é o azul clarinho, para que o fá sustenido possa ser branco e o sol cinzinha. Daí é que sustenizando
o sol, o elevaremos para o negro. E que cor daremos então para o lá e para o si? Vou sugerir. Que tal
fazer o lá marrom, para que o sustenizando se torne roxo, e ao subir para o si fique lilás??? Se entre
o si e o dó apenas teremos meio-tom, novamente, então do lilás para o vermelho será só tirar o que
houver de azul e de amarelo, para se obter o vermelho do dó.
Êpa!!! Duas cores para mexer, apenas dentro de meio tom? Ora, por que não? E vou
explicar para onde vamos agora.
Dissemos que entre um tom e outro, podemos ter um tom ou um semitom. Os hindus
conhecem a quarta-de-tom, que é o meio-tom dividido por dois, e os árabes conhecem a terça-de-
tom, que é o tom inteiro dividido por três. Por isso, eles nos parecem um tanto desafinados. Aliás,
não aos ouvidos brasileiros, mais próximos dos asiáticos e orientais em geral, e inclusive mais
abertos aos sons e às cores em geral. Por isso é que toda música que entra no Brasil é bem ouvida,
não importa de onde seja, porque o povo formador da nação brasílica é oriental e ocidental, de
diversas origens, e não há família paulistana quatrocentona que não esteja misturada com todas as
raças, oficialmente ou não. Então, é só ouvir, deixar passar pelo sangue que pulsa em nós, e
saberemos entender.
A escala de sete sons, sendo cinco tons e dois semitons, é a que os europeus chamam de
DIATÔNICA. Trata-se, já que estamos falando em grego, de uma escala heptatônica, porque de sete
sons. Se juntarmos aos sete tons e semi-tons os graus intermediários, que chamamos de sustenidos,
quando subimos na escala, ou bemóis, quando descemos a escala, teremos a CROMÁTICA, de doze
sons intervalados em meio-tom.
Os chineses, na sua música tradicional, tinham uma escala de cinco tons, a PENTATÔNICA
(5 tons), ou PENTAFÔNICA (5 sons), que pode ser traduzida como dó-ré-fá-sol-lá, por exemplo.
Dispensavam as semitonalidades e afins. É a melhor maneira de se afinar instrumentos de cordas
fixas (harpas, cítaras), quando os entregamos para pequenas crianças ou para pessoas que começam
a descobrir os prazeres da música. Sim, pois quem toca numa escala pentatônica nunca erra, nunca
desafina, nunca sai do quadradinho pentagonal. É um mistério descoberto pelos antigos chineses,
mas que também é encontrado na música japonesa e nos africanos que emigraram para os Estados
Unidos (veja, pois, os conhecidos solos de blues, e os refrões mais utilizados pelos guitarristas
solistas roqueiros). Vamos também encontrar essa escala pentatônica em muitas tribos brasileiras e
latinas em geral.
Eis que houve quem propugnasse pelos tons inteiros, e construiu sua escala assim: dó-ré-
mi-fá#-sol#-lá#-(dó). Construiu a escala hexatônica, ou hexafônica! Tente tocá-la, veja como soa.
O dodecafonismo, que poderíamos sem medo chamar de dodecatonismo, é baseado na
escala dodecafônica, isto é, de 12 sons, que nada mais são que todos os tons admitidos pela música

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europeia. Ou seja, a escala cromática. Não tecerei cá mais descrições sobre o movimento
dodecafônico apenas por não ser da seara deste estudo, pois não deve ser desmerecido.
Agora, vamos misturar a escala de 12 tons com as quartas-de-tom: serão 24 tons
diferentes!!!
Somemos aos 24 tons as terças-de-tom árabes. Entre o dó e o ré, duas terças-de-tom;
entre o ré e o mi, duas terças-de-tom; entre o mi e o fá sustenido, duas terças-de-tom; e assim por
diante, teremos um total ainda maior. Faça as contas. Agora toque essa escala, e ouvirá quase que
um portamento, isto é, como que um deslizar de uma a outra nota, pois nosso ouvido não tem a
capacidade de perceber certas distinções. Você percebe a terça-de-tom, a quarta-de-tom, mas se as
reúne... Suba do dó à quarta-de-tom acima, e você sentirá uma diferença tonal. Agora, suba, dessa
quarta-de-tom acima do dó, para a terça-de-tom acima do dó, e você não sentirá nada... Talvez um
leve hesitar entre o sim e o não, muito sutil. Um nada, para a percepção que o ser humano consegue
ter. Suba um tantinho mais, até chegar no dó sustenido, e vai te parecer que não subiu. Mas retorne
agora ao dó natural e verá o quanto já andou.
Experimente um instrumento cuja escala esteja dividida em terças-de-tom, e sinta o que
é o espírito da música árabe. Faça o mesmo com um instrumento cuja escala esteja dividida em
quartas-de-tom, e sinta o espírito da música indiana. O mesmo utilizando um instrumento em escala
pentatônica, e sinta o Tao percorrer por todo o teu corpo... Um teclado poderá te dar o espírito do
dodecafonismo. Uma escala de tons inteiros também é uma ótima experiência para o ouvido.
Campos do Jordão, anos 1990.

Anotações sobre Música IV


SUSTENIDOS E BEMÓIS
Pensamos, pobres mortais, que o dó sustenido é o mesmo que o ré bemol. Não é. Nunca
foi, realmente. Não são sinônimos.
Quando o músico sobe meio-tom, não faz exatamente com a metade do tom,
matematicamente, aritmeticamente mediano. Faz relativamente, deixando faltar um tantinho de
nada para chegar lá.
Quando o músico desce meio-tom, não faz exatamente com a metade do tom,
matematicamente, aritmeticamente mediano. Faz relativamente, deixando faltar um tantinho de
nada para chegar lá.
Então, existe uma imperceptível diferença de quando ele sobe meio-tom a partir do dó
ou desce meio-tom a partir do ré. É por isso que, ao ouvirmos uma cantora lírica, parece que ela
desafina quando solta aquele agudo loooooooongo... Mas não desafina, é o tom puro. E por que
falei puro?
Quando inventaram de fazer instrumentos de teclado, onde as notas seriam fixas, como
estabelecer essas minimidades tonais, imperceptíveis aos ouvidos dos pobres aprendizes? Ora,
inventou-se uma tal de temperada, onde as imperceptíveis diferenças inexistiriam. Como?
O teclado tem teclas brancas e pretas. As brancas são as notas naturais, e as pretas são as
intermediárias, ou, como já dissemos, os sustenidos-bemóis.
Como diferenciar os bemóis que vêm descendo dos sustenidos que vão subindo?
O teclado não diferencia, mas criou aquela divisão aritmética, chamada temperada, e põe
a tecla preta afinada bem no meinho, entre o sustenido e o bemol, e os chama de sinônimos... Para

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o tocador de violino, essa afinação é um verdadeiro destempero, uma desmusicalização do nosso
ouvido. E o pobre cantor iniciante não consegue entender porque sua professora quer que ele cante
a nota que está no teclado, se não é a nota que sua natureza vocal infere. É tão pouquinho, tão
difícil de perceber, ninguém percebe, mas tá lá, existe.
Na música popular, trêmulos e portamentos resolvem a parada, mas a dúvida permanece
quando se quer manter a nota indefinidamente, ou como se diz, sob uma fermata. A educação
musical manda que o intérprete apenas dobre o valor da nota em sua duração temporal, ao
encontrar uma dessas. Essa regra é para alguns, educados na rigidez. A contemporaneidade
desintegrou essas regras e permite uma nova leitura, mais solta, menos dogmática. Porém, a
questão tonal permanece: o cantor vai temperar suas notas? Ou vai partir para aquela aparência de
desafinado, que tão pouca gente irá entender? Normalmente, o que seu produtor determinar.
Qualquer coisa, acerta na mesa de edição. E ai das sensibilidades dos ouvintes...

Adendo: Comas
O tom é dividido, na teoria musical europeia, em 9 comas. Isto quer dizer que, por
exemplo, entre o dó e o ré, existem 9 comas. O dó sustenido tem 4 comas acima do dó, e o ré bemol
tem 5 comas acima do dó, para ficar 4 comas abaixo do ré.
Campos do Jordão, anos 1990.

Apêndice de 25 de agosto de 2018:

Arandu Arakuaa

Essa banda é um sopro de vento fresco no rock nacional que não acontecia desde o final dos anos
setenta! Eles tocam heavy metal com letras em tupi-guarani antigo. O segundo cd tem letras em
línguas de tribos indígenas modernas, inclusive.
São quatro integrantes: um guitarrista, que construiu um instrumento de dois braços, que não seria
novidade se o de cima não fosse o de uma viola de dez cordas. Ele é o compositor e líder idealizador
da banda.
É a primeira vez que admito um baixista usar no rock um instrumento de seis cordas, que ele faz com
uma grande destreza e paixão, paixão essa que permeia todo o grupo quando toca...
O baterista é extremamente criativo com sua batera cheia de adjuntos.
A cantora salta de uma voz normalíssima para a extremamente gutural, não encontrada em mulheres
normalmente.
Como é difícil encontrar o disco deles em minha cidade, vou ouvindo pelo YouTube...
Mais um apêndice uma hora depois:

Produtor Fala sobre o Novo Álbum do Arandu Arakuaa


Esse é o título de um vídeo postado no YouTube em que o rapaz fala do terceiro disco da banda.
Segundo ele, os integrantes mudaram. Com isso, por enquanto não sei mais o que dizer do som do
Arandu Arakuaa. Não sei se ainda são um sopro de vento novo no rock nacional desde o final dos
anos setenta...

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Análise da Letra da canção “Por Enquanto” 1, de Renato Russo

Mudaram as estações
Nada mudou
Mas eu sei que alguma coisa aconteceu
Está tudo assim tão diferente
Se lembra quando a gente chegou um dia a acreditar
Que tudo era pra sempre
Sem saber que o pra sempre sempre acaba
Mas nada vai conseguir mudar o que ficou
Quando penso em alguém só penso em você
E aí, então, estamos bem
Mesmo com tantos motivos pra deixar tudo como está
Nem desistir, nem tentar
Agora tanto faz
Estamos indo de volta pra casa

Breve comentário: Houve um tempo em que os decanos Chico Buarque de


Hollanda e Caetano Telles Velloso tiveram um programa televisivo na Rede Globo. Ali, os novos
talentos se apresentavam e faziam verdadeiros salamaleques aos dois Monstros da nossa Música
Brasileira Popular. Ocorre que, na vez do Legião Urbana, os rapazes do grupo de novos não se
dobrou à dupla sagrada. Aliás, foi até irônica a fala de Renato Russo, que disse algo como: ‘É, acho
que vai ser bom pro nosso currículo”...

Será que alguém ainda se lembra disso? Será que está gravado ainda esse
programa? Alguma coisa aconteceu naquela noite, já que Renato sempre admirara os dois músicos,
e não parecia haver razão para qualquer falta de sincronia. A imitação que Caetano tentou fazer da
dança de Renato, foi plena e intencionada? Foi homenagem ou chiste? Renato não ficou para a
grande cena final do programa, onde todos tocavam juntos. Quem escorregou aquela noite?
Podemos perguntar a alguém, mas a metade da resposta já não pode ser dada. Uma das versões, do
Renato Russo.

Relações de sentido:
a) sinonímia lexical (levantamento de semas comuns e de um diferenciador);

NADA (mudou)

Vazio

Branco

Transparente

Claro

Zero
1
ELLER, Cássia - (CD) Cássia Eller – PolyGram, 1990

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(Mas eu sei que ALGUMA coisa aconteceu)

Vazio

Branco

Transparente

Claro

Pouco

O nada é muito próximo ao alguma, no contexto acima. O nada é reflexivo,


generalizante, de modo a dizer que, se algo mudou, foi insignificante. O alguma apenas se difere por
conter algum elemento de importância em seu interior. Ambos os vocábulos são colocados com
proximidade semântica muito grande, de modo que o trajeto de uma frase a outra denota uma
descoberta, ou seja, nada mudou, nada que se possa dar importância, mas afinal existe algo que
mudou, alguma coisa, então a imperceptibilidade inicial se transforma numa sutil distinção. No
contexto, senti as palavras nada e alguma como quase sinônimas, o que não ocorreria numa leitura
puramente linguística, cujo distanciamento entre tais vocábulos seria muito maior.

b) sinonímia estrutural (apenas a indicação da ideia);

[alguma coisa aconteceu] [Está tudo assim tão diferente]

Se alguma coisa aconteceu, algo mudou. Se noto esse algo, é porque tem muita
importância para mim. Quando o Autor deu a importância, dentro do nada, para alguma coisa, essa
tal coisa foi tão importante que invadiu o interesse do Autor. Daí a tornar-se estruturalmente
sinônimas, tais frases o fazem contextualmente.

[deixar tudo como está] [não desistir nem tentar]

Se não desisto, tenho uma atitude positiva; se não tento, negativa.: entre o sim e o não,
nenhum dos dois, inatividade total. Eis então essa mesma inatividade na primeira frase: deixar tudo
como está, isto é, não mexer em nada, nada modificar, inalterar, inatividade total.

c) hiponímia ( o acarretamento do específico ao genérico);

a) [só penso em você]

b) [e aí, então, estamos bem]

39
c) [de volta pra casa]

Isto é (do menor para o maior) : a) eu penso em{você},

b) eu resolvo por{nós},

c) eu te levo para o{nosso lar}.

d) antonímia (nuança levantada);

[ desistir] [tentar] Contextualmente, ambas as palavras fazem parte do [deixar como


tudo está], pois ambas são precedidas da negação.

e) contrário (apenas levantamento das categorias “opostas”);

[ o pra sempre ] [ sempre acaba ]

O eterno (pra sempre) não tem fim, a não ser na repetição de sua negação (sempre
acaba).

O Autor diz :{Se lembra quando a gente chegou um dia a acreditar

Que tudo era pra sempre}.

Depois entra com o contrário: {Sem saber que o pra sempre sempre acaba}.

f) contraditório (indicar as estruturas e o esvaziamento).

[Mudaram as estações] [Nada mudou]

Ora, se tudo mudou,

houve alteração.

Porém, diz

o autor:

40
Não houve mudança.

Esvaziou, o Autor, a ideia de modificação inicial. Começou dizendo que o tempo passou, os meses
passaram, levando-nos a pensar que todas as coisas, os eventos, os acontecimentos, tiveram suas
alterações com o cenário geral. No entanto, logo no segundo verso ele esvazia o primeiro, fazendo-
nos tropeçar na pedra de Drummond; no meio do caminho das mudanças, descobriu-se que nada de
importante mudou, só houve alterações inúteis.

Análise do filme “Crossroads”(A Encruzilhada)


1986, EUA, Dir. Walter Hill,
com Ralph Macchio, Joe Seneca, e Steve Vai.

Trilha Musical de Ry Cooder.

a) Nomeação dos operadores do quadrado actancial


O sujeito, projeto de realização, é, a princípio, a busca da canção perdida de Robert
Johnson, mas vai se tornando o próprio blues em sua forma de tocar verdadeira, isto é, com dor, não
qualquer , mas uma especial, que só a estrada lhe poderia ensinar. É, na verdade, a busca do
autoconhecimento. John Lennon teria dito, certa vez, que o blues é como a cadeira, não uma cadeira
qualquer, mas a primeira cadeira: você não olha ou aprecia aquela cadeira, pois ela foi feita para se
sentar; você senta naquele blues. Quando e onde ele disse isso, não sei, mas se não me engano está
no livro de MUGGIATI, Roberto, Rock, o Grito e o Mito, já em sua primeira edição, de 1973.

O objeto do desejo é a canção perdida, que ao sabê-la inexistente, lhe faz cair num
paradoxo: se nunca existiu o que procuro, então o que busco não é apenas uma canção, mas o
blues; mais que isso, descubro que minha busca é de mim mesmo. A caverna de Freud não aparece
no filme, senão imperceptivelmente e sem intenção do diretor (creio, pois não é uma obra
hermética), porém estaria no bar onde ocorre o duelo final: herói versus inimigo, cada qual com a
sua guitarra.

O protagonista não alcançou seu objeto inicial, porém outro, o qual foi inserido pelo
personagem que o acompanha na estrada, o velho tocador de gaita (o Cachorro Louco Fulton). Sem
saber, alcançou o autoconhecimento, quando juntou o que aprendeu antes de percorrer a estrada
dos blues com os ensinamentos desta, justamente durante o duelo.

O herói teve no velho o adjuvante. O oponente era himself, toda vez que decidia não
acatar os conselhos. O adjuvante, sem que o herói soubesse, imprimia o sujeito na direção do
objeto.

b) O percurso do herói
Nos primeiros minutos do filme, a música: blues do início do século, mais exatamente
Robert Johnson. Quem foi Robert Johnson? Lendário violonista e cantor de blues, teria vendido sua
alma ao diabo para poder tocar e cantar melhor, para poder ser um astro, para conseguir ser “the

41
best”.2 O trajeto de R.Johnson vai se repetir mais à frente, pois trata-se de um mito antigo, em que o
herói vende sua alma (ou a troca) por valores terrenos, banais. Sim, banais por serem pequenos
diante da imensidão da Eternidade. Há que se pensar, nesse caso, sobre o que é eternidade:
inexistência de limites, de horizontes, de medidas; o infinito não é alcançável pela mente humana,
por mais que se tente apenas visualizamos imensidões, porém não o infinito.

Há descrições de momentos em que Deus pôs na mente do homem, temporariamente,


a noção do infinito. Verba gratia, isso ocorre aproximadamente na Pérola de Grande Valor: “E
aconteceu que Moisés olhou e viu o mundo no qual ele fora criado; e Moisés viu o mundo e seus
confins e todos os filhos dos homens que existem e que foram criados; e maravilhou-se e assombrou-
se muito com isso.”(Moisés 1: 8) Deus é chamado de Infinito, em Doutrina & Convênios (Seção 19,
versículo 10): “...Pois eis que eu sou infinito”...”,pois Infinito é meu nome.”...

O mito em que o herói vende a alma para o diabo é comum nas memórias de vários
povos da Terra, e passa com muito sucesso nas histórias em quadrinhos, nos antigos bang-bangs
(faroestes), passando pelos números da revista heavy metal e nas atuais graphic novels. No Brasil é
reconhecido entre os violeiros, que, já por tradição, guardam dentro de suas violas de 10 cordas um
chocalho de cobra para o instrumento “soar melhor”... , mesmo que as usem em procissões católicas
e quetais. Mick Jagger teria vendido sua alma para angariar uma juventude eterna? Foi traído,
porque não mais tem o frescor dos tempos de Satisfaction. Seu fã e pretendente a clone Steven
Tyler também envelheceu cantando com o Aerosmith.

O DEVER

O herói é, aparentemente, o garoto, que aparece entre fitas e livros de


blues, tocando violão. Logo na primeira sequência ele está entre dois, um clássico e um ... de
tocar blues. São mundos distintos: a técnica do primeiro é completamente distinta da do segundo
em sua forma de tocar, na sonoridade e até nos detalhes da construção do instrumento. Ambos
são chamados de acoustic guitar, mas pertencem a tradições diversas. O garoto, após tocar no
modo clássico, troca de violão e passa a tocar os blues. Há uma nítida separação, como se fosse
impossível unir o que parece oposto.
A dicotomia se repete no conservatório: o garoto toca para o professor
uma peça de Bach, no violão clássico, em meio a um ambiente acadêmico e conservador. Às
últimas notas, improvisa um breve fraseado blusístico (bluesístico). O professor o repreende:
repete a dicotomia entre os dois mundos. O garoto aprende que se pode pertencer a um se não
se imiscuir no outro. E vice-versa. No caso dos Estados Unidos, isso é um diálogo que se também
adentra no aspecto racial, como vemos em cenas mais adiante, quando tocam em bares de
brancos ou de negros.
O QUERER
O garoto descobre que no hospital está internado um velho tocador de
gaita, o “Cachorro Louco Fulton” que teria conhecido a canção perdida de Robert Johnson. O
encontro entre ambos é patético, o garoto em plena hybris e o velho em némesis. O garoto
mostra como toca blues e o velho o repudia, o humilha veementemente.

2
Diz a História da Música que morreu assassinado por um marido traído.

42
Ambos fogem do hospital. A viagem para o sul é a trajetória vital. O
garoto saiu do dever (Eu devo conhecer aquele que fez a música com R.J.) para o querer (Eu
quero conhecer essa canção).
O SABER
Conforme vai se passando o filme, o velho vai convencendo o garoto a
mudar: fá-lo trocar seu violão por uma guitarra elétrica com caixa amplificada portátil. E ainda lhe
apresenta o slide.
To Slide, deslizar. Inicialmente, uma boca de garrafa de vidro cortada, para
enfiar no dedo e dar um som deslizante sobre as cordas, trabalhando com as notas em legatto, ou
seja, ligando-as sem iniciar novos ataques, intermitando ataques com ligaduras, formando teias
sonoras ininteligíveis ao ouvido europeu. Conhecida forma de tocar entre os havaianos, que o fazem
com o instrumento já no chão, assim como os tocadores de slide guitar da música caipira
estadunidense. Não é o caso dos bluesmen, que utilizavam o violão na posição normal, muitas vezes
um dobro (corpo totalmente de aço, como explica Roberto Muggiatti em seu opúsculo Rock, o grito
e o mito), assim como não é o caso desse garoto. Tal técnica, transplantada para a guitarra, pôde ser
melhorada com o uso de um tubo de metal, no lugar da velha boca de garrafa. Em 1977/78, Dudu,
guitarrista do Arnaldo e a Patrulha do Espaço, grupo paulistano de rock, ganhou e utilizou bastante
um anel que tinha por objetivo fazer slide, embora alcançasse apenas uma ou duas cordas
simultaneamente. Na verdade, possibilitava misturar técnicas.
A hybris é presente aqui e ali, mas tão só no garoto; o velho não
compartilha, apenas se aproveita do suposto herói para amealhar vantagens.
A viagem ao sul dos Estados Unidos é também a que ocorre dentro do
garoto, aproximando-o do velho. É o caminho do saber, não especificamente o saber aquela música
perdida, mas saber the blues, conhecer o fundamento. Isso é mostrado principalmente durante os
números musicais. Em frente a um clube de brancos, a dupla começa a tocar, juntam-se pessoas, até
que o dono do local os ameaça: o garoto sofre o mesmo que o velho, ambos tocavam juntos a
mesma peça e ambos foram expulsos.
Dentro de um clube de negros, próximo ao primeiro, o velho está flertando.
O garoto, que é branco, entra com uma moça, branca, que os vinha acompanhando desde um certo
ponto da estrada. Essa mesma moça, mais à frente, simplesmente sairá da estrada e do filme. Faz
parte apenas de um trecho. Mas aqui, para que não soem estranhos ao local, estritamente racista
neste clube, como no anterior, o velho chama o garoto para subir ao palco com ele, chamando-o
novamente à hybris, desta vez o velho, que é reconhecido pela plateia como o “Cachorro Louco”. A
hybris envolve a dupla, a moça que os acompanha, toda a plateia, os músicos do palco. Vê-se o
guitarrista (o garoto) e o gaitista (o velho) virando ambos para cá e para lá, ao mesmo tempo, no
melhor estilo dos blueseiros, indicando o momento do ápice, onde a dupla está mais afinada, o
métron, que entretanto não é o cume do filme.
Na cena seguinte, o garoto se acha o máximo e tenta compartilhar com o
velho a sua alegria. Este esfria as emoções, não existe mais a dupla afinada porque, segundo o velho,
o garoto tocaria melhor se pusesse mais tempo suas mãos sobre a guitarra que sobre a garota. Isso
é um ensinamento, que vai frutificar logo adiante.

A GLORIFICAÇÃO NEGATIVA
Quando a moça se vai, após manter um rápido caso de amor com o garoto,
este toca sozinho no quarto de um hotel. Eis o motivo único da passagem feminina, além de
aumentar o ibope para a venda do filme, claro, pois como poderia um filme estadunidense ser
vendável sem um caso de amor? Tem que ter um toque de Love Story, ou de E O Vento Levou,... Mas
o que leva importância no presente contexto, semanticamente analisado, é o novo toque do garoto:
o velho ouve e reconhece, no toque, os blues que ele tem como verdadeiros, pois saídos da alma. É
a música do sofrimento, daquele que passou por uma desilusão, e o espectador do filme pode
reconhecer um estilo lânguido, diferente de todos os que já passaram até então: ele usa, pela

43
primeira vez, exclusivamente a técnica do slide. É o momento de uma némesis glorificadora, pois
necessária, reflexo de uma alimentação espiritual baseada na dor, fruto aguardado pelo velho em
relação ao garoto – eis a glorificação negativa.

O PODER
Crucial, a bem dizer, é quando o velho diz ao garoto, numa encruzilhada,
para que toque com toda sua alma, a fim de que ele venha. A cruz formada pelas estradas, seja em Y
ou em X, é significativa para a cultura negra, egressa da África, seja para os ingressos em qualquer
parte da América. É símbolo de pacto, de diferenças que se encontram. De modo geral, as seitas
como o Vodu, Candomblé, entre outras, valoram tais locais como propícios ao encontro com as
forças das trevas. Não poderia deixar de ser diferente aqui, pois é num local desses que o velho
agora se encontra. Ele quer encontrar o demônio, para quem um dia, ainda jovem, vendeu sua alma,
a fim de garantir sucesso pessoal. Ora, o demônio é chamado, na Bíblia, o pai da mentira: como um
contrato com o pai da mentira poderia ser cumprido por este?
O demo chega, o velho conversa com ele. O garoto ainda continua tocando
no melhor estilo. Está no ápice, mas fica no fundo, enquanto o velho tenta negociar com o diabo.
Este diz que não há jeito, o negócio foi feito e está acabado. O velho propõe um desafio e diz que se
perder o demônio pode levá-lo. Eis a resposta: “MAS VOCÊ EU JÁ TENHO!”
O garoto sai do fundo, arrogantemente, da posição de quem já passou pelo
dever, pelo querer, pelo saber, envereda agora pelo poder. Aparentemente, não acredita no pacto,
não consegue se imiscuir totalmente no mundo do velho, porque este é um negro, cultura
indevassável pelo branco. O garoto branco aprendeu a música do velho negro, mas não a apreendeu
de todo, porque ele ainda é um branco, não reconhece os valores da cultura negra. Ainda que
conheça histórias de músicos que tenham vendido sua alma ao diabo para tocarem melhor, fazerem
sucesso, ganharem dinheiro e afins, ainda que esteja frente a frente com o demônio, frente a frente
com um encontro entre as partes pactuantes do contrato demoníaco, ainda que esteja presenciando
um fato metafísico, espiritual, não participa e ainda desafia, porque trata-se de uma cultura que ele
não reconhece. O diabo, entretanto, aceita o desafio. O velho, negro, diz ao garoto, branco: “Não se
meta”, porque aquilo está entre os negros, branco não pode, não deve se meter. Sem saber, o
garoto entrou no mundo do velho, este o vê no mundo dele, mas o branco não reconhece e ainda
faz pouco: “Ele está blefando!”

O FAZER
O ápice do filme é esse desafio. Na trilha sonora, quem toca o som do
representante do diabo e quem toca o som do garoto é o mesmo guitarrista, Steve Vai, mas isso é
apenas um detalhe da produção. O garoto chega com o velho ao lugar combinado, um clube. O
velho lhe empresta seu mojo, um saquinho da sorte, protetor, equivalente ao patuá baiano (patois).
Um excelente guitarrista está tocando no estilo do blues-rock anos 70, com muita distorção, guitarra
ágil e leve, som pesado e firme. Então, para de tocar e um apresentador chama ao palco o próximo.
Eis a subida do suposto herói para o palco, onde demonstrará o aceite do desafio. O filme é para
quem gosta de música, pois essa é o grande sinal simbólico, principalmente agora. O desafiador usa
uma guitarra vermelha, cor do vestido da dançarina; a do garoto é branca. (Símbolos.)
O guitarrista toca uma frase. O garoto responde, no seu modo, com a
técnica aprendida na estrada, abusando do slide. Outra frase, outra resposta, sempre à altura. Então,
o guitarrista faz uma escala. O garoto a reapresenta, mas inclui um sobrepor de técnicas: da estrada,
volta ao que aprendeu no conservatório, uma escala no estilo europeu, branco!

A GLORIFICAÇÃO POSITIVA
A vitória já se ilumina pelo desespero que se antevê no rosto do
representante do diabo. Este tira o casaquinho e tenta repetir, a seu modo, o feito. Não consegue,
porque não teve nunca o acesso ao mundo branco, europeu, da música clássica. Sim, pois a música

44
só é dita “clássica” se advinda de um repertório branco, europeu, do povo dominador, cujos valores
estéticos impostos são dos do dominado, vindo da África e estabelecido na América. Então, o Bem é
europeu, branco e “clássico”; o Mal é africano, negro e destoante da técnica do “clássico”. O garoto
vence quando usa a técnica aprendida no conservatório, que não é a que aprendeu com o velho.
Com isso, salva a alma do “Cachorro Louco”.
Significativo é o guitarrista do demo ser branco. Mas está tomado pelos
valores negros, inclusive no tocar seu instrumento. Tornou-se um branco com alma negra, e
portanto do Mal.
Quem salva quem? O Branco buscou no Negro a sua técnica, mas o Negro
ficou, nos melhores momentos, por baixo, porque o Branco é a representação do Bem. O velho, no
final, age sem a arrogância de até então, tornou-se um negro de alma branca, portanto do Bem.
Olha aí o cheiro do racismo impregnado na ideologia inserida intrinsecamente no filme.

c) Símbolo que salta do filme: A ESTRADA

No meio do caminho, encontrei-me numa estrada escura e tenebrosa3.

Em Conversa de Bois, Guimarães Rosa propõe a representação da vida numa


estrada que sobe e desce4.

A estrada era um símbolo caro e premente aos jovens dos anos 1960 e 70,
significava a busca, a procura, o desafio, o desapego dos valores estabelecidos pela Sociedade, a
Sabedoria, o encontro, o crescimento, a libertação e a liberdade, entre outros valores.
O filme é dos anos 1980, mas captou o espírito da estrada, e por isso a
encruzilhada, símbolo de encontro de caminhos distintos, estradas que se encontram.
A estrada é a representação da vida. No filme, quando o garoto e o velho
saem do hospital, suas estradas se juntam. Vem participar dessa mesma estrada a moça, durante um
período. Depois ela sai, deixando apenas a dupla original. No encontro das estradas, o garoto evolui.
Quando a dupla encontra-se com o demo, é numa encruzilhada, porque o caminho do diabo não é o
do garoto, mas num momento as sendas se encontram: pode ser para um regozijo ou para um
embate; naturalmente, o mote do filme é o encontro, a encruzilhada, que dá inclusive nome ao filme
no original e na versão dublada. Após vencer o desafio, o guitarrista perdedor sai de cena, o diabo
põe seu chapéu, levanta-se e também sai com seus asseclas. Acabou a encruzilhada, voltam o garoto
e o velho a compartilharem, só eles, a mesma estrada. Mas o filme deve terminar. Deixa-se claro que
a estrada vai se repartir, cada qual pegará uma rota diferente.
Há, sim, outros símbolos, mas já os descrevi anteriormente. São eles: o Bem,
representado pela cultura branca; o Mal, representado pela cultura negra, que só se assenta quando
entremeada pela do branco. O diabo é negro, de roupa preta, acompanhado por uma negra, num
carro escuro. Ele aparece quando o garoto (branco) toca um blues em belíssimo estilo (negro). O
guitarrista do mal é branco, mas toca música de negro, e por estar do lado do mal se apresenta num
bar de negros, acompanhado no palco por uma dançarina negra. O garoto (branco) vai salvar o velho
(negro), mas só o conseguirá quando tocar o seu estilo (branco). Então, ao final do duelo, eles
relaxam tocando música negra. Porém, o que fica patente, é que na hora da seriedade o que vale é a
cultura branca, pois essa vence tudo! Decididamente, the Uncle Sam está vivíssimo nesse cult-movie
dos rock-blueseiros.

d) Porque escolher ...


Gosto de música. Gosto também dos blues, do rock, fazer o quê? É parte da
chamada “arte imperialista”, mas I like it... Fui transformado em minha adolescência por ela e

3
Precisa dizer? Dante Alighieri, A DIVINA COMÉDIA, canto 1.
4
Sagarana.

45
embalado naqueles dias por ela. E como já disse em outro lugar, da mesma forma como a bossa-
nova embalou o jazz, o rock fez o mesmo com a música popular brasileira. E quem pode dizer que
não existe roque brasileiro ou samba estadunidense? A invasão é recíproca. E o roubo e o
empréstimo também.
O filme tem um interesse especial porque seu momento culminante não o é
para a dupla, mas apenas para o personagem que desde o início parece ser o herói... Há, destarte, o
métron da dupla, seguido pelo do suposto herói, ao lado e dentro do da música.

Trata-se de um enlatado, mas sob a leitura de um musicista é um grande


filme, um clássico!

VALE A PENA SER HERÓI?

O herói: quem precisa dele? Eu preciso, porque sou um ser humano. Há


uma necessidade interior de se espelhar em alguém que se nos afigure acima do normal, acima
da mediocridade humana, um super-homem, como queria Nietzsche. Não basta ser humano, há
que se ser sobre-humano!
Todos necessitamos de heróis. Os heróis são exemplos para nós.
Podemos ser como eles. Devemos ser como eles. Queremos ser como eles. Encorajamo-nos para
nos parecer com eles, para os sermos. Então, não chegará sermos como heróis, haveremos de ser
heróis!
Desejo ser um herói, assim estarei acima da mediocridade cotidiana. Que
tipo de herói serei?

Dizem que sou louco, por pensar assim.


Dizem que sou louco, por viver assim.
Mais louco é quem me diz e não é feliz, não é feliz.
Sim, sou muito louco, (...)
Se eles têm três carros, eu posso voar.
Se eles são bonitos, sou Alain Delon (...)
Se eles são famosos, eu já estou no ar (...)
Se eu posso pensar que Deus sou eu e brrrrrrrrrrrr...(...)
Mais louco é quem me diz e não é feliz.
Eu sou feliz.
(Os Mutantes, Balada do Louco)

Quero ser um herói, mas pronto para sair de meu cotidiano e viver a
aventura. Não a aventura de minha vida, mas uma das aventuras de minha vida: então, Easy
Rider será uma coletânea transformada num grande e único filme.

46
Mas Jimi Hendrix é um herói americano, Janis Joplin, Jim Morrison...
Morreram no auge, foram heróis, vivem nos Corações e Mentes dos jovens de sempre. E não
parecem seguir o modelo estadunidense de herói, já que morreram sem conhecer ... sem
conhecer o quê? Eles foram famosos, os filmes os mostram sempre lindos, maravilhosos,
afinados com o mundo em que viviam – ainda que contestadores, mas ganhando muito dinheiro,
contestando o sistema e consumindo os valores que ele inventou, os produtos que ele
constantemente cria, usando instrumentos, roupas etc, Dormindo com o Inimigo.
Exemplo de herói brasileiro é, por excelência, Tiradentes: morreu para ser
herói, só o foi depois de ir desta para melhor, ... Não conheceu a fama em vida, como ocorreu
aos acima citados.
Quando vemos Jimi em Woodstock, seus primeiros olhares do palco à
multidão são acompanhados de um sorriso ingênuo, do garoto que se surpreende com o número
de pessoas que o amam, ou que no mínimo o respeitam.
Janis Joplin pergunta ao bando de malucos e congêneres que a assistem,
naquele longínquo festival de 1969: Estão todos bem chapados? E ri, talvez embriagada, dopada,
sabe-se lá, porém adorada! Ela conheceu a fama em vida.
Jim Morrison, no segundo meado dos anos 60, já se atirava sobre o
público, sabendo que o iriam segurar, não o deixariam cair, porque ele era o herói, O Ídolo do
Público.
Criara-se naqueles dias a figura do Guitar Hero, o Herói da Guitarra, que
prosseguiu pela década seguinte: Eric Clapton, Jimi Hendrix, Jimi Page, Santana, Alvin Lee, Jeff
Beck, entre outros. (No Brasil, entre os grandes seguidores tínhamos – e temos ainda vivos -
Sérgio Dias Baptista, Pepeu Gomes, Lulu Santos, Robertinho do Recife, ...) Na verdade, era a
continuação da pungência jazzística dos saxofonistas como Charlie The Bird Parker, Colleman
Hawkins, dos trompetistas (ou trumpetistas, se preferirem) como Louis Amstrong, Miles Davis,
sopristas enfim como Benny Goodman. Era pois um estereótipo a ser mantido, não o herói
beethoveniano sofredor, que só “viu” a fama depois de abotoar o paletó, mas do que só vestiu o
paletó de madeira após ser uma estrela, tornando-se eterno: o imortal brasileiro é um herói com
cara de sofredor; o estadunidense, de vencedor.
Um clássico de Hollywood: A Star is Born, seja em qualquer das duas
versões pré-hippies, ou na dos anos 70, como outros filmes similares, faz o espectador sair do
cinema com a cabeça no crescimento do herói, fazendo-o até imaginar nas possibilidades ainda a
serem possíveis para aquela atriz que conseguiu chegar até lá e que ainda irá ser mais rica, linda e
famosa. O American Dream é constantemente alimentado. O cinespectador quer ser aquele
herói, quer realizar o sonho possível.

Fanny

Descobri, através do YouTube, uma banda só de meninas, mais antiga que a Runaways.
Suas gravações mais remotas datam de, pelo menos, 1971.
Na descrição delas pela Wikipédia em inglês diz que era um grupo norte-americano, mas o
terceiro só de mulheres, fundado em 1970. Porém foi o primeiro de rock exclusivamente, em que
todas tocavam instrumentos musicais. Tinha uma guitarrista, uma baixista, uma pianista/organista e
uma baterista. As quatro cantavam.

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O melhor de tudo é que não se encontram gravações de músicas lentas. Até existem, aqui e
ali, mas não parecem ter sido a especialidade.
O nome é Fanny, e parece que elas gravaram quatro discos. Mas o melhor são as gravações
ao vivo!

9/3/2019.

Música Pessoalmente

Já faz algum tempo que não venho aguentando ouvir som de violão com cordas de nylon, nem
percussão óbvia, principalmente aquela que faz tchic-tchic durante a música inteira.

Ainda gosto de bateria, principalmente aquelas enormes! Solos de bateria, sempre curti e continuo
curtindo.

Agora, não venho mais suportando som de qualquer violão ou piano. Não importa de que jeito
toquem. Piano romântico, na base de Chopin ou Liszt, por exemplo, nem me fale. Já ouvi demais na
minha vida. Violão de bossa-nova, ou de barzinho, só tem me irritado. Qualquer forma que o
toquem não aguento mais.

Piano em alguns tipos de rock ou jazz ainda vai. Guitarra elétrica quando sola. Era meu instrumento
principal, vivia mexendo, não consigo mais tocar uma nota. Todavia ouço com prazer. Ainda.
Contrabaixo é uma paixão! Acústico ou elétrico, admiro como sempre admirei.

Continuo gostando de música oriental, seja árabe, indiana, chinesa, japonesa etc.

Ultimamente procuro por instrumentos que ouvi pouco na minha breve vida, tentando renovar
meus ouvidos, adaptá-los a uma nova realidade. A internet tem me ajudado muito com isso, pois
tem me ajudado a descobrir novas janelas musicais. Muita coisa não necessariamente moderna, mas
que nunca ouvi antes, seja em diversos gêneros musicais.

Em termos de música erudita, sempre gostei mais do período barroco e do contemporâneo, embora
também da chamada música antiga. O período clássico, propriamente dito, não me chama tanta
atenção.

Tenho me fixado no cravo e na harpa, que sempre adorei, mas nunca tive muita oportunidade de
curtir. Nas liras de cordas. E, principalmente, em toda a família das flautas doces, na qual mergulhei
definitivamente. E que está sendo o instrumento ao qual me dedico atualmente. Talvez não com a
constância que era com a guitarra quando jovenzinho. Mas com o mesmo amor.

22jun2019.

Rock Não se Aprende na Escola

Fiquei impressionado – no mal sentido do termo – quando soube que, nas escolas de música,
atualmente, além dos alunos aprenderem a tocar guitarra elétrica, ainda aprendem como formar
uma banda...

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Ora, para mim isso é impensável! Não consigo admitir que o rock tenha chegado nesse ponto! Não
era assim quando era rapazinho... Não parece tanto tempo assim para tanta coisa mudar.

Quando aprendi a tocar guitarra, do meu jeito mesmo, com todas as imperfeições possíveis, não era
considerada um instrumento musical. Pelo menos no Brasil. As pessoas perguntavam se você sabia
tocar alguma coisa e você dizia: guitarra. E elas respondiam: ah, violão...

Tocar guitarra em nosso país nos anos 1970 era uma atitude transgressora. O rock era transgressor.
Muitos jovens tocavam violão, mas poucos guitarra. Não era considerada um instrumento sério,
nem um brinquedo, era quase uma arma contra o sistema repressor.

Naqueles dias, era um instrumento musical para poucos. Não porque fosse cara, afinal podia-se
comprar uma usada por pouquíssimo dinheiro. Mas poucos jovens se dispunham a ter uma. Os que
tinham, se era pra tocar rock, faziam parte de um grupinho muito fechado.

Tocar numa banda de rock era o que havia de bom! Mas ninguém no grupo tinha professor.
Aprendia-se ouvindo discos, prestando atenção nos concertos – shows – e uns com os outros, ali
mesmo, entre músicos.

Roqueiros não tocavam por música. Era tudo por ouvido. Assim era com nossos ídolos.

Claro, estou falando de rock. Outros casos podiam ser outra história.

Quarta-feira, 21ago2019.

Levar a Vida na Flauta

Não é exatamente isso que estou fazendo. Decidi, aos 61 anos, aprender a tocar flauta doce. Lendo
partitura.

As pessoas acham esse instrumento muito fácil, pois qualquer criança toca. Isso não é verdade.
Crianças, como o geral das pessoas, apenas sopram no instrumento de qualquer jeito e já acham que
estão tocando. Não estão. Tocar flauta doce de verdade é um negócio muito sério. Tocar mal é fácil.

Quando adquiri minha primeira flauta, tinha quinze anos. Foi na Casa Manon, em São Paulo. Era uma
Molenhauer soprano, alemã, de trinta centímetros de comprimento, com corpo de madeira escura e
boquilha de resina.

Naqueles dias, tocava como qualquer um, de ouvido, sem levar a sério. Improvisava muito, tocava
alguns temas quaisquer, como a Ode à Alegria e My Lady Greensleeves. Meu instrumento estava
começando a ser a guitarra, com a qual cumpri muitas horas de estudo e barulheira. (Por isso, não
posso reclamar dos vizinhos hoje em dia.)

Nos últimos anos, porém, não conseguia tocar mais instrumento algum, por razões que não vêm ao
caso. Mas a música nunca saiu de minha vida. Até que, há poucos meses, decidi me dedicar à flauta
doce. Ou melhor, às flautas doces.

Agora, com a internet e o YouTube a meu dispor, aprendi diversas coisas. A primeira é que as flautas
doces que eu tinha eram todas em afinação germânica, o que, a princípio, facilita o tocar, mas que a
longo prazo só complica as coisas. Não vou explicar aqui o porquê, se quiser saber é só consultar as
fontes que citei no início deste parágrafo.

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Soube, portanto, que havia uma afinação mais viável, a barroca, com o fá – quase – sustenido no
lugar do fá natural. Comprei uma nova soprano, com essa afinação, e comecei a me acostumar com
o novo jeito de tocar.

Fazem poucos meses que venho treinando com essa soprano, e com uma contralto, de 45
centímetros de comprimento, que comprei pela internet. Ambas têm afinação barroca e são minha
porta de entrada para uma futura aquisição de uma flauta doce tenor, que é o dobro do tamanho da
soprano. Essa, qualquer que seja, só tem com afinação barroca.

Agora, pra começar, minha leitura de partitura é muito tatibitate. Isto é, leio com muita dificuldade e
demoro um bom tempo até decorar.

Pra continuar, estou tendo dificuldade com as notas graves, principalmente quando meu estudo já
passou dos quarenta minutos. Não sei ainda o porquê.

Por fim, estou treinando praticamente todos os dias, cerca de uma hora não contabilizada por dia.

Espero, daqui a algum tempo, tocar bem melhor que hoje.

Domingo, 27 de outubro de 2019.

Cássia Eller

Já disse outra vez que considero ela a melhor intérprete de rock que o Brasil já teve.

Considero isso uma verdade inegável.

Celi Campello foi a primeira mulher brasileira a cantar rock, mas era apenas uma cantora.

Rita Lee era uma intérprete completa, compositora, instrumentista (tocava flauta transversal e
violão). Falo dela no tempo passado só porque deixou a carreira. Mas tem seu principal mérito em
ter sido a primeira mulher no país a comandar uma banda só de homens. Aliás, de grandes músicos,
que ela sabia escolher com o maior escrutínio.

Baby Consuelo tinha uma voz que ia do aveludado ao gutural, com uma extensão vocal de dar inveja,
e uma facilidade no prestíssimo, com as sílabas cantadas todas rapidinho, tudo isso numa cantora
só. Mas ela era mais que roqueira, cantava muita música popular brasileira. Falo no passado porque
perdi o contato, não sei como está agora. Fazia parte dos Novos Baianos, uma banda dos anos 1970
que revolucionou nosso cenário.

Cássia Eller, como muitas outras grandes cantoras, começou com grupos minúsculos, mas
infelizmente se deixou levar pela ganância dos produtores e tocou com um monte de gente ao
mesmo tempo. Isso só desvalorizou sua voz. Que me perdoem os fãs incondicionais, mas era ela
melhor no início da carreira. Para tanto, ouçamos suas gravações.

Entretanto, não sei se é uma fase ou se mudei. Não consigo mais ouvi-la. Parece que suas
interpretações têm me feito mal ao coração e à cabeça. Como disse, inexplicavelmente, não consigo
mais ouvi-la.

Caraguatatuba, 25nov2019.

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Flauta Nova

Recebi ontem, em casa, do correio, minha nova flauta doce. Trata-se de uma tenor, de sessenta
centímetros de comprimento, da marca Zion. Comprei pela internet, através do Mercado Livre. Esse
site tem nos ajudado muito em nossas aquisições caseiras. Escrevi, há pouco tempo, que a
compraria, e agora o fiz, finalmente! Com uma ajudinha da segunda parcela do décimo-terceiro.

Não tenho condições de dar um diagnóstico sobre a qualidade da flauta porque nem sequer consigo
toca-la a contento, ainda. Meu dedo mindinho da mão direita não alcança o dó grave. Além do mais,
após uns quinze minutos começo a ter dificuldades com a nota ré grave.

Os dedos parecem curtos demais para fechar todos os buracos. As junções que ligam o pé e a cabeça
ao corpo parecem apertadas demais, mesmo com lubrificante. Mal consigo segurar a flauta, às vezes
a apoio na coxa para toca-la.

Espero que sejam apenas dificuldades de iniciante. Não estou disposto a devolve-la ou desistir. De
algum modo tenho que conseguir sair desse impasse.

O som do instrumento é bonito e agradável, assim como sua aparência. Tenho partituras que servem
para ele e também minha imaginação. Alguma coisa boa terá de sair de tudo isso.

Caraguatatuba, dez de dezembro de dois mil e dezenove.

Adendo

Ontem fui à Casa Yumi para comprar umas lixas, a fim de usa-las nas juntas da nova flauta. Lixei, hoje
à tarde, só um pouquinho, e ela ficou perfeita. Depois, limpei-a por fora e guardei, para tocar mais à
tarde.

Ontem à noite encontrei-me com meu amigo Daniel – ele é músico profissional, maestro e soprista –
e aprendi uns exercícios de alongamento para os dedos. Quem sabe assim, e com a prática, eu venha
a conseguir alcançar a nota dó grave de meu novo instrumento.

Caraguatatuba, 14 de dezembro de 2019.

MAIS UM ADENDO

Ainda estou com dificuldade de alcançar a nota dó grave. Até chego a alcançar, mas ainda não
consigo tocá-la. E é difícil também o ré grave. Mas aprendi a forma correta de usar o apoio para o
polegar.

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16.12.2019.

OUTRO ADENDO

Ontem consegui soprar o dó grave, incluindo outras notas, por uns dois minutos. Foi a primeira vez.
E já estou conseguindo tocar algumas melodias simples na flauta tenor. Parece que vai...

28.12.2019.

Cordas de Guitarra

Em meus tempos de guitarrista, utilizei muitas marcas de encordoamentos. Naquele tempo, haviam
três tipos de cordas para guitarra: pesada, leve e levinha. Experimentei das três, pois experimentar
era meu verbo preferido.

No final, fiquei com a levinha, que era a mais delicada e sensível ao toque. Mas usava de marcas
diferentes. Para a mi aguda – a primeira corda, de baixo para cima – usava a São Gonçalo. Para as
outras eu variava, de acordo com o que encontrasse.

Na época, não investia em importadas, pois se arrebentassem rápido seria um dinheiro jogado pelo
ralo. E eu não poupava na força da palheta contra as cordas.

Quando estava de boa veia, comprava um jogo inteiro da São Gonçalo, que era minha marca
predileta. Não era adepto da Giannini, que era a mais famosa então, das nacionais.

Da mesma forma, experimentei pedais de efeito nacionais e estrangeiros – dos Estados Unidos, a
bem dizer – mas quando fui comprar minha guitarra definitiva, busquei uma nacional, Finch, modelo
Les Paul, igualzinha a do Jimi Page. E dei um trato nela, com algumas melhorias. Até instalei uma
alavanca de trêmolo!

Enfim, nada é definitivo... Depois de alguns anos, vendi todas as minhas guitarras, cada qual com um
jogo de cordas diferente.

11/12/2019.

Música É

Osvaldo Lacerda (1927-2011), em seu Compêndio de Teoria Elementar da Música, escreve


sucintamente que A música é a arte do som.

Simples. Exato. Não há necessidade de dizer mais nada, a não ser que é também a arte do silêncio,
puro ou combinado com o som. Outros teoristas falam isso.

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Existem definições que falham por descrever desnecessidades, tais como é a arte de se combinar
sons de maneira bela, ou o que o valha.

Antoine Furetière, no volume II de seu Dicionário, diz que Música é A ciência que ensina fazer acordes
agradáveis à orelha, e que regula a harmonia, ou uma ciência pela qual se faz uma disposição dos
sons graves e agudos proporcionais entre eles, e separa por justos intervalos, cujos sentidos e a
razão são satisfeitos. (Cf. Dissertação de Renata Pereira para obtenção do título de Mestre em
Música pela ECA/USP.)
Tal definição é própria da época da obra em que se inscrevia – 1690, e não tem como comparar com
as atuais. Coloquei só como registro, a fim de mostrar como tudo muda.

Como vimos em O Gosto das Coisas, a arte não precisa ser necessariamente bela para assim ser
considerada. Na verdade, por exclusão após exclusão, cheguei ao ponto em que não tenho uma
definição específica para arte. Teria, se fosse no tempo dos afonsinhos, mas não hoje.

Jules Combarieu (1859-1916), musicólogo francês, disse: A música é a arte de pensar sons, um
pensamento sem conceitos. A citação está na abertura da PRIMEIRA PARTE do livro Introdução à
Música, de Luiz Cosme (1908-1965).

Este mesmo autor, na Conclusão, diz que Não se pode porém perder de mira que música é emoção.
Onde não há emoção não existe arte.
Ora, a música é uma arte, disso não tenho dúvida. Ou como escreve Luiz Cosme no final de seu livro,
a mais espiritual e divina das artes.

O que diria ele se ouvisse o atual Funk?

No entanto, fala-se em música visual, para não-ouvintes, composta por cores e vazios. Assim como
podemos falar em música feita para outros sentidos de percepção, o que afetaria totalmente as
definições de Osvaldo Lacerda, de Antoine Furetière e de Jules Combarieu.

Caraguatatuba, três de janeiro de 2020.

Grafia das Notas Musicais

A grafia oficialmente aceita é: dó, ré, mi, fá sol, lá, si, (dó).

Mesmo com a mudança ortográfica de 1990, ela se manteve igual.

Porém, ao solfejar, cantamos o dó grave como do. Por quê?

Ora, o sinal agudo tende a fazer-nos abrir mais a boca, o que não é natural numa nota mais grave.
Por isso cantamos: do, ré, mi, fá, sol, lá, si, (dó). E na hora de fazer a escala descendente solfejamos:
(do), si, lá, sol, fá, mi, ré, do. Por quê?

Porque na descida tendemos a fazer o dó agudo iniciar a escala e, portanto, não o acentuamos no
solfejo.

Claro que tudo isso são meras considerações pessoais, que qualquer professor de música deverá
refuta-las. Mas é como penso e ajo.

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11jan2020.

A Escala Pentatônica e o Círculo

A escala pentatônica não tem tom dominante. São sempre cinco notas fixas, numa disposição tal que
a impressão auditiva é a de uma circularidade sem fim.

Pode-se começar a escala de qualquer nota, e partir para qualquer outra, que sempre dá certo.

Ela é, por exemplo: fá, sol, lá, dó, ré, (fá). Ou do, ré, mi, sol, lá, (dó). Por exemplo. Cinco tons
definidos. Fixos.

Ou seja, entre as duas primeiras notas, um tom. Entre sol e lá, um tom. Entre lá e dó, um tom e
meio. Entre dó e ré, um tom. E entre ré e fá, um tom e meio, completando a escala.

Para quem não entende o que estou falando, é como tocar música usando só as teclas pretas do
piano. Sempre sai música certinha. Nunca tem erro. Mas é limitada.

Os sinos dos ventos tradicionais são afinados nessa escala.

É usada tradicionalmente em culturas milenares, com significados para cada nota e toda uma
filosofia sobre ela.

Hoje em dia encontra-se no YouTube, nos vídeos de música relaxante, ou algo que o valha. É boa
para dar sono, ou se entediar. Normalmente, não passam de uma oitava.

Dizem alguns que a escala blues-rock é pentatônica. A princípio, sim, mas ela varia enormemente,
conforme a habilidade do músico.

16.1.2020

Dois Sonhos

Tive hoje o que chamo de sonho guiado. É um sono nada repousante, que você pode a qualquer
hora acordar e voltar a sonhar o que estava sonhando antes. Você fecha os olhos e sonha, sem ter
controle algum sobre o sonho.

Primeiro sonhei com a Fafí, minha esposa. Não me lembro o que era, mas era algo muito onírico,
que tinha a ver com sonhar acordado, quadros e uma mansão enorme.

Depois, sonhei com meu pai. Estávamos numa zona de pequeno comércio. Em meio a esse sonho,
sonhei que vi um concerto de rock ao ar livre. Era um som de death metal, em que o guitarrista não
usava cordas, mas um motor regulável. Saía muita fumaça do motor, em toda sua volta, uma fumaça
cinzenta. Havia também um baixista e um baterista. Era uma banda instrumental, não tinha
vocalista. Assisti ao show com muito interesse, era um som novo, que eu nunca ouvira antes.

Depois do show, fui conversar com os músicos. O guitarrista tirou o motor de seu instrumento e os
guardou.

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Aí, um músico que eu conheço veio conversar comigo. Não é um personagem da vida real, mas só
aparece em meus sonhos, como outras pessoas. São pessoas recorrentes, que só vivem em meus
sonhos. Se fosse descrever agora cada uma, não saberia, mas reconheço no sonho quando elas
aparecem.

Eu estava de chapéu, um chapéu comum, de abas largas e moles, de feltro. Quando voltei a estar
com meu pai, ele me comprou um copo de vidro com café e uma fatia de pão francês fininha dentro
do café. Fui com ele embora, e no caminho entramos num teatro, onde perdi meu chapéu.

Abri meus olhos e decidi não dormir mais. Eram cinco e meia da manhã, contei o sonho à Fafí, que
estava acordada, e decidi escrevê-lo. Dormi nesse estado por três horas consecutivas. Estou com
sono, mas muito excitado com o que ocorreu. Estou tomando um chimarrão. Não estou em meu
estado normal.

28 de março de 2020. 6h23min.

Clavicórdio

Todos conhecem Mozart como um compositor para obras pianísticas, orquestrais etc.

Poucos se recordam de que ele começou seus primeiros aprendizados num clavicórdio, instrumento
que, em seus dias, já não era de tanto uso profissional.

Este, como o clavicímbalo e o cravo, foram grandes destaques no período barroco, mas infelizmente
desapareceram com o advento do piano.

Hoje, para se ter um instrumento desses, só se consegue por meio de um luthier, um exímio artesão.
Sua sonoridade peculiar tomava conta das casas e dos salões e teve grandes compositores, como
Couperin e Bach, este último o seu maior gênio.

A grande desgraça de se não construir normalmente cravos atualmente é que obras desses autores
não são mais tocadas como pensadas por eles, mas em instrumentos que mal os substituem.

Dessa forma, por exemplo, o famoso Teclado Bem Temperado, que servia tanto para órgão como
para cravo, é hoje lamentavelmente tocado e gravado em pianos. Assim como a obra completa de
outros autores barrocos ou de música antiga.

Domingo, três de maio de 2020.

Música Clássica

Enfim, fiz as pazes com a música clássica. Num de meus últimos livros falei que não estava
mais aguentando música clássica. principalmente os românticos.

Pois é. Estou retornando com Tchaikowsky, Delibes, Mozart, Berlioz e outros. Chopin, Liszt e
congêneres, ainda terão de esperar. Os pianos românticos...

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Continuo ouvindo os barrocos, como Bach, Fischer, Albinoni e Vivaldi, e os contemporâneos,
como Copland, Gerswhin, Satie e Debussy. E Amaral Vieira e Rogério Duprat.

Ainda não estou aguentando os violões com cordas de nylon. E os de aço, só solados.

Quanto a outros instrumentos, redescobri o prazer de se ouvir oboé - ah, o oboé -, fagote e
clarinete, além da harpa, do vibrafone e da celesta. E descobri, pelo YouTube, que fazem agora a
linda lira (de cordas), em várias versões: gaulesa, celta, inglesa...

Hoje, antes do almoço, ouvi “Haroldo na Itália”, de Berlioz. Depois, pra descontrair, Pepeu
Gomes, o melhor guitarrista do Brasil.

Caraguatatuba, 5 de junho de 2020, final de tarde.

Adendo

Ouvi, há uns dias, um disco com as rapsódias húngaras 1 a 6 de Liszt, ao piano, por Roberto
Szidon, e curti. Há esperanças. Quem sabe ainda volte a curtir os discos de Chopin...

Caraguatatuba, manhã chuvosa de domingo, 14 de junho de 2020.

Outro Adendo

Consultando nossos discos (vinis) de música erudita, constei que não temos nenhum de
compositora. De intérpretes do sexo feminino sim, e até de outros sexos, mas compositores... todos
homens. No máximo, homossexuais, como Tchaikowsky. Falha histórica e cultural, mas também
nossa, que nunca fomos atrás.

Compositoras eruditas existem, como Chiquinha Gonzaga (ela foi, sim) e a própria irmã mais
velha de Mozart, Maria Anna. Houveram também Clara Schumann e Fanny Mendelssohn. E muitas
outras, incluindo as contemporâneas. Todavia, não temos nehum disco delas. E agora, procurando
num sebo de vinis, pela internet, que tenho frequentado, não tenho achado.

Meio-dia e meia, o chuvisco permanece. Reouvindo o disco de Lizst. 14/6/2020.

Joelma e Tina Turner

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Jo
elma – Foto metropoles.com - extraída de
https://www.metropoles.com/entretenimento/musica/veja-onde-assistir-e-como-sera-a-live-da-
cantora-joelma no dia 14/07/2020.

Tina Turner – foto divulgação

Joelma da Silva Mendes, paraense, cantora, compositora e dançarina, é a nossa Tina Turner
brasileira.

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Tina Turner nasceu nos Estados Unidos.

Ambas começaram com o marido guitarrista, do qual se divorciaram. Litigiosamente. De má


memória. Sofreram nas mãos de seus ex-maridos.

Tanto Joelma como Tina têm vozes privilegiadas para seus estilos. As duas têm rouquidão no
cantar. Quando querem.

Elas fazem hoje muito mais sucesso que seus ex-cônjuges, esquecidos pela mídia.

Segundo a wikipédia, Joelma é uma mezzo-soprano coloratura, e Tina uma contralto


coloratura. Quer dizer que ambas têm um timbre aveludado na voz, sem perder o brilho. Isso,
podemos dizer, não diferencia tanto nas extensões de vozes de cada uma, que têm suas tessituras
além do que se pode esperar.

Caraguatatuba, dia dos namorados de 2020.

Sonho

Essa noite voltei a ter o que já chamei em meu último livro, NA CONTRAMÂO, de sonho
guiado, que é como eu denomino o sonho não controlado, em sonos tirados à força, em que a
qualquer momento que você queira você pode acordar, se ele não o fizer antes.

No sonho eu tinha 18 anos e um cabelo descomunal, todo despenteado e embaraçado.


Havia muito rock visceral, com guitarras solando desesperadas. Toda música inventada na hora. No
fim, tocou "Angie”, dos Rolling Stones. Daí abri os olhos.

Fui pra cozinha e descobri que eram 5 e meia da matina. Resolvi levantar. Tomei um banho e
preparei meu primeiro mate do dia.

Agora, estou aqui escrevendo. São 7 horas e 6 minutos.

13/6/2020.

Apito no Ouvido
Já faz cerca de um ano que tenho sentido um apito constante no ouvido esquerdo.
Esse ouvido já escuta menos que o direito, há certos anos, conforme atestam exames de
audiometria. Principalmente nos tons agudos.
Agora, esse apito no ouvido. Ele é constante, não me deixa em paz, principalmente nos
momentos de silêncio. Não posso mais ficar num ambiente silencioso, que ele ataca.
Quando vou me deitar de ladinho, não posso encostar esse ouvido no travesseiro, que logo o
apito se torna um apitão. Tenho sempre que encostar o direito, e aí mal ouço o que a Fafí me diz.
Durante o dia, procuro me manter longe de um ambiente silencioso, Graças aos céus, adoro
música. A vida toda gostei demais. Isso me ajuda, ao ouvir discos, por exemplo.
Fui primeiro ao otorrinolaringologista, que me receitou Gingko Biloba. Mas alertou que
deveria ser manipulado.

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Aviei a receita na melhor farmácia de manipulação, no centro de minha cidade, e comecei a
tomá-lo. Tomei um frasco. Dois. Três. Vários. E o apito continuou.
Busquei então uma médica generalista. Ela nem me perguntou que remédios eu já tomava e
me receitou uma medicação alopática que já nem me lembro o nome. Ela falou que o Gingko Biloba
era bobagem e que esse remédio me curaria.
Iniciei o tratamento. Depois de uma semana eu estava babando à toa, tal qual Jimi Page
tocando Starway to Heaven com Eric Clapton. E o apito continuava. Parei de tomar.
Agora, com a quarentena, ficou mais difícil ir ao médico. E minha audição fica prejudicada.
É aguardar.

Domingo, 12 de julho de 2020.

Os Sentidos
Dizem que temos cinco sentidos de percepção para entender o que se passa à nossa volta.
É pouco. Os cientistas dizem que temos, pelo menos, vinte e seis.
Mas vamos nos virando com esses cinco, por enquanto.
Normalmente, o que mais usamos é a visão. Com ela, admiramos o arco-íris, a lua, as
estrelas, a mulher amada, as artes plásticas, tudo o que é iluminado e a própria penumbra. É o
sentido mais amplo e mais valorizado.
Depois, vem a audição. Através dela percebemos a mais bela das artes, a música. Bem,
nem sempre é bela, nem sempre é agradável, mas é a que mais dá prazer à maioria das pessoas.
Poucos existem que não curtem, pelo menos, um tipo de música. Pode ser pra relaxar, pra animar a
festa, pra começar bem o dia, pra apreciar melhor o entardecer, ou simplesmente para ter o prazer
de ouvir.
Podemos ouvir o som dos pássaros, mesmo que não os vejamos. Já soube de mais de uma
pessoa que reclamou de ter acordado com o barulho dos passarinhos! Fiquei atônito. A gente
reclama de acordar com o barulho de ônibus na porta, motocicleta com o escapamento aberto,
porém... acordar com o barulho de pássaros é uma bênção nos dias de hoje.
O olfato. Funciona junto com o paladar. Cheiramos as coisas, sentimos o gosto das coisas,
quase ao mesmo tempo. O cheiro da mulher amada, os perfumes, os extratos aromáticos ou
saborosos, o sabor da comida quando estamos famintos.
O tato. O prazer carnal. A delicadeza do carinho, a delícia de um banho quente no frio, de
uma ducha fresca no calor. A brisa na pele nua.
Os prazeres obtidos pelos sentidos são parte de nossa sobrevivência. São, aliás, o princípio
dela, pois se não fossem benéficos não precisaríamos deles. Os sentidos existem para a nossa
sobrevivência e podem nos dar prazer.
Todos os trinta.

11:52 14/07/2020.

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O Melhor do Rock

(Mandala nº 52 – varetas e lã pelo autor.)

Ninguém vai concordar totalmente comigo, eu sei, mas têm coisas que são inegáveis.

O verdadeiro rei do rock é Little Richard, que só foi eclipsado por Elvis Presley por ser negro
numa terra e época comandada por brancos.

Elvis foi bom em seu início de carreira, quando cantava rock’n’roll acompanhado por um
violão. Depois vieram as baladas, os filmes, Vegas, a decadência, porque ele achava que ninguém ia
gostar dele mais gordinho. Mas seu público o amava, fosse como fosse, e ele não acreditava nisso.

Nos anos 1950 tinha também o exímio guitarrista Chuck Berry, Chubby Checker, e o
conjunto saído do country, Bill Halley & His Comets. Meu filho me mata se eu esquecer de Jerry Lee
Lewis.

Segundo Roberto Muggiati, em seu livro Rock – do Grito ao Mito, esse gênero musical nos
Estados Unidos começou dividido entre negros e brancos. Os primeiros vinham de uma tradição dos
blues, do rhythm’n’blues, e os segundos do contry’n’folk.

O primeiro meado dos anos 1960 não ofereceu novidades, a não ser os ingleses The Beatles,
que revolucionaram a música pop, utilizando as duas correntes. Os Rolling Stones faziam,
visceralmente, um rock de raízes bluesísticas. O folk trouxe a música de protesto de Bob Dylan e a
belíssima voz da sul-latina Joan Baez.

No Brasil, era a doçura de Celly Campello e as músicas bobinhas de Toni Campello e a


turminha do nascente rock’n’roll brasileiro. Não podemos esquecer do The Clevers, que mais tarde
se tornariam Os Incríveis, com um repertório próprio e versões que se tornaram antológicas, nos
anos 1970, como Era um garoto, que como eu, amava os Beatles e os Rolling’n’Stones.

O segundo meado trouxe a psicodelia, os discos-conceito, em que uma música podia durar
um disco inteiro, shows de mais de duas horas, Woodstock, a guitarra revolucionária de Jimi
Hendrix, Janis Joplin, The Who, Gratefful Dead, Santana. Swinging London, Cream. O primeiro disco

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do Led Zeppelin. O início do Yes e o primeiro disco do Pink Floyd, o fantástico The Piper at the Gates
of Dawn.

No Brasil, os Mutantes faziam um som psicodélico e se juntaram à turma do Tropicalismo,


ou foram trazidos por eles. Eram os tempos de Gilberto Gil e Caetano Velloso, o guitarrista Lanny no
primeiro disco de Gal Costa. Jorge Ben e Toquinho lançavam um compacto simples com um som
novo, um ritmo novo, um novo modo de cantar. De um lado, Que maravilha, e do outro Carolina
Carol Bela.

Havia também a Jovem Guarda na TV, Ronnie Von em outro canal, e o programa Quadrado e
Redondo, na nascente Bandeirantes. Tudo em branco e preto.

Os anos 1970 trouxeram o rock progressivo, e o psicodelismo se transformou. Aumentou a


proliferação dos discos-conceito. Era a vez da consagração de bandas nascidas poucos anos antes,
como Led Zeppelin, Yes, Emerson, Lake & Palmer e Pink Floyd. Jethro Tull. Muitas outras nasceram,
trilhando esse caminho, como Black Sabbath, a primeira com um som primário e pesadérrimo.

No Brasil, bandas que estavam começando, faziam covers de Black Sabbath, porque eram
canções fáceis de tocar. E muito boas de se ouvir.

Foi a vez dos Mutantes sem a Rita Lee, mas ela deu a volta por cima e criou o Tutti Frutti,
primeiro com a guitarrista Lúcia Turnbull, depois só com a banda. Lucinha seguiu com uma carreira
solo, mas naqueles dias Rita Lee foi a rainha do rock brasileiro.

Teve o Som Nosso de Cada Dia, com o memorável disco Snegs, O Terço, com Criaturas da
Noite, Made in Brazil, todos cantando em português, que era a tônica do rock brasileiro. Havia
muitos shows de rock, festivais ao ar livre, coisas assim. Muitas bandas no Brasil tinham
percussionistas, mas geralmente isso era função do baterista.

Os discos eram fraquinhos, mal gravados, mal mixados, mal mostrando o que eram os shows
ao vivo. Saber o que era o rock brasileiro naqueles dias, só indo aos shows.

Nessa época, vários países tiveram seus grupos de rock, progressivos ou não.

O segundo meado dos anos 1970 trouxe o Punk, com Sex Pistols, The Runaways e Ramones.
O Punk era selvagem, básico, anti-progressivo, voltado aos princípios do rock’n’roll. Mas não se
dançava mais, pulava, caía no chão, saltava.

Teve também a discoteca, mas estamos falando de rock.

Nos anos 1980 foi a vez do retorno do Heavy Metal, muito mais pesado que o antigo Black
Sabbath.

Nos anos 1990 a banda brasileira Sepultura, cantando em inglês, com um som ainda mais
pesado, atravessou fronteiras.

Os anos 2000 teve Cássia Eller. Cheguei a achar seu primeiro disco em vinil e não comprei. Se
arrependimento matasse...

Minha vida começou realmente aos quinze anos, quando, num curso noturno, meus colegas
mais velhos me contavam sobre as delícias do rock dos 1960, e eu descobria o nascente rock
progressivo dos setenta.

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Eu sei, eu sei, ficou faltando Tina Turner, Cazuza, Prince, Rock da Mortalha etc, mas não dá
pra colocar todo mundo. O espaço é pequeno.

Caraguatatuba de sol, 21 de julho de 2020.

Podcasts

Eis algo que veio para ficar. São inúmeros os tipos.

Têm de literatura, como os audiolivros, os de psicologia, de filosofia, noticiosos, de


tecnologia, de comédia, de assuntos estratosféricos, e até de música.

Tem de tudo.

São mais uma forma de se adquirir conhecimento, informação, ou simplesmente para se


distrair.

Não são álbuns musicais, embora possam falar sobre isso.

As pessoas podem criar individualmente um podcast, dar um nome, uma descrição, uma
figura que o simbolize, arrumar patrocínio - ou não -, e sair fazendo, seja sozinha, em dupla ou trio,
entrevistando outras pessoas, e pondo fundo musical e vinhetas.

O podcast tem inúmeros assuntos e títulos.

Às vezes o som é um pouco baixo demais, outras é simplesmente ruim, às vezes o fundo
musical é alto demais, às vezes é um trabalho mais profissional, outras mais amador, tem de tudo.

Podemos ouvir no celular, no tablet, no computador de mesa etc.

Às vezes ouço no celular, outras no computador.

É tão bom quanto ler.

Quem quiser pode discordar.

25/07/2020.

Adendo

Depois de ouvir tantos podcasts, cheguei à conclusão que a maioria não vale a pena.

Poucos se salvam.

Pouquíssimos permaneceram em meu celular, que valem a pena o gasto de bateria que
fazem.

Não é tão bom quanto ler.

62
12/09/2020.

Bach
Em seu tempo, Johann Sebastian Bach era apenas considerado um exímio organista, um
virtuose, o melhor organista de todos.

Apenas isso.

Seu talento como compositor só foi reconhecido a partir de 1800, 50 anos após a sua morte.
Daí para a frente, os teóricos, a crítica e o público. o reconheceram como um dos maiores
compositores de todos os tempos.

Os hippies dos anos 1960, e os esotéricos, viam e veem símbolos diversos em suas músicas e
partituras.

Musicólogos encontram em suas composições curiosidades visuais, como linhas melódicas


antiparalelas e coisas como, na sua última fuga a quatro vozes, inacabada, que não diz para que
instrumentos se destina, a primeira parte com tonalidade em B (si bemol), a segunda em A (lá), a
terceira em C (dó) e a quarta em H (si).

Bach teve filhos que foram reconhecidos em seus dias, mas nenhum foi um gênio póstero
quanto ele. Teve duas esposas, mas nenhuma foi compositora.

Sexta-feira nublada, 31 de julho de 2020.

Detalhe

Na notação inglesa, não há a nota H, ficando o si como B, mesmo. A complicação é só na


notação germânica. Como Bach era alemão, aproveitou a deixa. Tem gente que renega a história de
que ele tivesse feito realmente isso, outros dizem que ele sabia que seria uma composição última de
sua vida, seu testamento musical.

02/agosto de 2020.

Nil

Ele tocava violino na mesma orquestra que nossa filha tocava violoncelo. Foi como o
conhecemos.
Ficou tão íntimo de nossa família que, feriados, fins de semana, ele sempre passava em
nossa casa. Nil levava seu violino, todas as vezes, e nós o deixávamos tocar a seu bel-prazer, o que só
nos fazia bem. Gostávamos muito.

Ele tocava músicas de seu repertório, mas também improvisava bastante. Era um verdadeiro
músico erudito.

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Tinha um pequeno grupo de cordas, e quando mostrei a ele algumas de minhas
composições, ele pediu para que eu compusesse para seu grupo.

Nil dividia meu chimarrão toda vez que eu tomava.

Ele dizia sempre que me considerava seu verdadeiro pai, e eu o considerava meu filho.

Uma vez ele me deu um livro de Nietzsche, A Gaia Ciência. Era seu filósofo preferido. Por
essa razão, era um pensador sobre o qual sempre comentávamos.

Morreu na Santa Casa de Caraguatatuba, com pouco mais de vinte anos.

Há vários anos.

Outro dia, nossa filha mandou pelo WhatsApp umas fotos dele. Só foi saudade que escorreu
da alma.

Caraguatatuba, 14 de agosto de 2020.

Interpretação Historicamente Informada

Mandala nº44 – aquarela do autor.

Assim é chamada a interpretação musical que procura tocar do jeitinho que se tocava nos
tempos dantes.
Explico.
Na interpretação historicamente informada, se um músico, ou um grupo de músicos, for
tocar uma peça veneziana do século XVI, que contenha flautas doces, viola de gamba e cravo, eles
vão tentar tocar essa peça com instrumentos musicais que sejam o mais próximo possível dos que
eram utilizados naqueles dias e região.
Mais. Esses músicos vão buscar nas partituras, no chamado repertório histórico, a forma
mais próxima possível de como os antigos do século XVI, de Veneza, que foi o exemplo que demos,
tocavam essas músicas, com as devidas ornamentações e baixo contínuo.

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Nisso entram, inclusive, as afinações dos instrumentos, a altura em que eram tocados, os
materiais que eram construídos, seja seus corpos, suas cordas, o formato de suas boquilhas, o
tamanho de seus orifícios, isto é, tudo o que for possível imitar. Isso quando não se usam os
instrumentos originais da época e lugar.
Normalmente, essas indicações não estão nas partituras. Musicólogos as obtém através dos
tratados e manuais que resistiram até hoje.
O objetivo é podermos absorver como era a música de determinada época e lugar, com o
mínimo de interferências pósteras.
Mesmo assim, o ambiente e os ouvidos atuais não são os mesmos. Isso é uma verdade
inalterável.

24/08/2020.

Punk

(Mandala nº41 – aquarela do autor.)

O punk nasceu para salvar o rock.

Na verdade, ele não nasceu, pariu-se por si.

Operários ingleses, cansados de ouvir tanto rock progressivo, que já não tinha mais por onde
caminhar, e que viam roqueiros famosos que saíam às ruas com guarda-costas, decidiram voltar às
raízes básicas, mas com um som mais alto e mais básico. O negócio mesmo era fazer barulho!

Decidiram usar cabelos curtos, tosados só com tesoura. Usavam nos pequenos palcos as
mesmas roupas que usavam no dia-a-dia, ou pra trabalhar.

A origem da palavra punk vem do inglês punch, que tem a ver com soco, murro. Porrada! O
som que os garotos faziam com seus grupos nas garagens era tão primal que levava esse nome. Era
o punch rock. Eles tentavam imitar as bandas famosas nos anos 1960 e 70.

Os críticos deram o nome de punk ao som que começava a ir para os palcos da Inglaterra,
em 1975.

Muitos grupos musicais de rock foram considerados punk, como o intelectualizado Patty
Smith Group e as norte-americanas Runaways, que faziam um ótimo hard-rock. E até mesmo Siouxie
and the Banshees!

Mesmo sendo fanzão do progressivo, me encantei com o Punk, pois era uma forma de
combater a nascente Discoteca. Cheguei a comprar vários discos punk, de bandas que não passaram,
graças aos céus, do primeiro vinil. Porque punk que se prezava não se curvava às grandes empresas

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de gravação. No máximo, um disco, e a banda terminava. Se continuassem, não eram punks de
verdade, mas apenas rock’n’roll.

No Brasil, em 1977, a revista Pop lançou um disco todo bonitinho, estereofônico, pela
gravadora Philips, de renome, chamado A REVISTA POP APRESENTA O PUNK ROCK.

Era recheado de hits do punk, que já se desfazia, com nomes como Sex Pistols e Ramones.

O som era de punk, mas limpinho, bem gravado, para um disco brasileiro.

Naqueles dias, ou um pouco antes, a mídia criou o que se conhece hoje por visual punk. Os
penteados, as roupas rasgadas. Isso veio quando as grandes gravadoras decidiram incorporar o punk
aos gêneros musicais de vendagem.

Foi a partir dessa época que os brasileiros começaram a tocar o que passamos a chamar de
punk.

Há quem considere os norte-americanos New York Dolls, do início dos anos setenta, a
primeira banda punk do planeta, pois o som deles era muito mais básico que os Rolling Stones, e sua
postura no palco era totalmente subversiva. Num tempo em que o glam e o visual andrógino
imperava, eles simplesmente vestiam roupas femininas, saltos altos, batom e maquiagem na
bochecha e nos olhos, e gritavam um rock rouco e primitivo. Pode conferir no YouTube.

Caraguatatuba de sol, 06/10/2020.

Um Sonho

Tive esta madrugada, como último sonho, uma situação extranha.

Participava de uma feira de ciências e artesanato.

Na hora de buscar as minhas coisas, deixei com um rapazinho uma de minhas construções,
um objeto que se movia por si, feito um catavento, mas de mesa, cheio de bric-a-bracs. Era um
objeto que eu construíra há muitos anos, que na vida real não sou capaz de fazer. Pelo menos, não
em sã consciência.

Nesse meio-tempo, vi umas moças tocando um violão estranho, cujo capotraste era móvel,
podendo aumentar ou diminuir o tamanho do braço do instrumento.

De repente, vi esse violão sobre uma escadinha, junto a outros, normais. Estavam lá,
sozinhos, abandonados, como que sem dono.

Furtei o violão diferente, com o senso de que estava fazendo uma coisa errada. E juntei-o às
minhas coisas. Ouvi depois uma voz externa reclamar do furto do violão, e que seria fácil reavê-lo.
Não liguei, embora tenha temido, e mantive o violão entre minhas coisas.

11/10/2020.

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Voltar a tocar

Quem leu meu livro anterior, sabe que parei de todar flauta doce há alguns meses em razão
de um tombo que levei, e que me causou uma dor nos lombos excruciante.

Hoje, com os remédios contra dor, quase estou bem, desde que não carregue pesos maiores
que dois quilos etc. Enquanto a UBS não marcar a data de meu ortopedista, não poderei fazer os
exames necessários, nem partir para a fisioterapia.

O que vinha me impedindo de tocar era a posição correta que eu tinha que ficar, segundo os
manuais e métodos de flauta doce.

Pensava que, quando pudesse voltar, estaria tão destreinado que teria que começar tudo de
novo.

Pois bem. Agora há pouco, sentei-me num sofazinho, desci a estante de partituras à minha
altura, e na posição “incorreta” comecei a tocar. Utilizei a flauta contralto, que é a minha preferida,
e toquei alguns temas de minha predileção. Até que não estava tão mal assim, como achava que
fosse estar.

Enfim, retornei. Acho que toquei apenas por uns vinte minutos, mas foi o bastante para
recomeçar. Volto tocando na posição “errada”, mas volto. Viva o prazer!

Domingo de sol, ar fresco de primavera, 18 de outubro de 2020.

Tocar Violão

Decidi voltar a estudar violão por música.

Baixei pela internet um método baseado no Tárrega, que é, mais ou menos, o que eu
estudava entre meus dezesseis e dezoito anos, com o professor Serafim. Na época, eu parei de
estudar violão para tocar guitarra elétrica por ouvido. Tudo porque ouvira dizer que Jimi Hendrix
nunca soubera uma nota por música. Eu queria tocar como ele!

Vou comprar tinta para a impressora, imprimir o método, e colocar as páginas num arquivo
de folhas de envelope plásticas.

Não pego em meu violão há mais de um ano, nem para limpar. Trata-se de um Málaga,
chinês, com cordas de aço, faltando a primeira corda.

Não é estilo clássico. Não tem nada a ver com o tipo de violão exigido para se estudar pelo
método clássico.

Mesmo assim, vou começar por ele mesmo, iniciando pela compra do encordoamento de
aço. Um bem baratinho.

Depois pensarei em comprar um violão de cordas de nylon, simples, mais próprio para
estudo.

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Fará parte de meu hobby por música, junto com a flauta doce. Nem me importarei com a
posição correta do corpo.

19/10/2020.

Reis e Rainhas

No Brasil e no mundo, o rei do futebol é o Pelé.

Existem fortes motivos para tanto, pelas técnicas que ele usava (intuitivamente) em suas
jogadas, seus dribles e em suas goleadas.

Ele é considerado, internacionalmente, O Atleta do Século XX.

Mas no Brasil, temos também “O Rei”.

Em qualquer lugar que se vá, o povo chama o cantor Roberto Carlos dessa forma. Isso vem
do tempo da jovem-guarda, quando o aclamavam o rei do iê-iê-iê.

Naqueles dias, no lugar de se escrever rock se escrevia ié-ié-ié. Desse jeitinho. Pelo menos
no Brasil. Ou iê-iê-iê. Como dissemos antes. E, às vezes, apenas ié-ié...

Isso por causa dos roqueiros estrangeiros cantarem tantos yeahs. E os brasileiros imitarem. E
quando os anglo-americanos cantavam wow-wow, nós imitávamos cantando uôu-uôu.

Ainda nos anos 1970, Roberto Carlos passou a ser, apenas e simplesmente, “O Rei”. Um
título amoroso, carinhoso, sem precisar mais de motivos. Mesmo tendo deixado de ser um cantor de
iê-iê-iê para ser um cantor romântico.

De qualquer forma, a jovem-guarda já fazia músicas romanescas com ritmo acelerado.

Grande parte da população brasileira tem a coleção quase completa de elepês, compactos,
e/ou CDs d“O Rei”.

Da mesma forma, se tivéssemos uma rainha do rock brasileiro, seria, indiscutivelmente, Rita
Lee.

Nenhuma roqueira, em nosso país, amealhou gerações seguidas em torno de si. Nem
vendeu tantos discos.

Nem juntou tanta gente, de diferentes idades, em seus últimos shows. Famílias. Em que os
avós a curtiram nos anos 1960 e 70. Os pais, nos 80, 90 e seguinte. E os netos, na geração seguinte,
que vêm até às crianças de hoje.

Na verdade, o brasileiro gosta de reis e rainhas. No teatro, no cinema, no rádio, na TV. No


carnaval.

25/10/2020.

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Coisa mais Linda

A bossa nova era algo que eu execrava. Gostava da MPB, mas considerava a bossa nova um
estilo muito elitista. E era, mesmo, em 1958. Era coisa da zona sul carioca.

Gostava de rock, de música barroca, de música clássica, de música antiga, de jazz, de MPB, e
por aí vai.

Foi quando vi a série Coisa mais Linda, na Netflix. É uma série em que, uma moça paulistana,
decide abrir uma boate de música no Rio de Janeiro, parece que em 1959. E descobre um músico
que canta baixinho, e toca violão com dissonâncias, mas num ritmo que mistura o samba com jazz.
Um som que voa.

Ela fica impressionada. E decide contratá-lo para sua boate.

Naquele tempo, as boates não eram como hoje, uma barulheira infernal. Tinham mesas, e
podia-se conversar, em voz normal, se a música não fosse tão interessante. Eram baseadas nas casas
de jazz norte-americanas.

O personagem que interpreta o músico é claramente baseado em João Gilberto, numa livre
adaptação. Uma homenagem, digamos assim.

Na verdade, naqueles anos, quais eram as opções musicais do brasileiro, em termos de


música popular? Tinha o samba, o samba-canção (popularíssimo), o jazz e o rock’n’roll norte-
americano (para poucos). No rádio, o que mais tocava, era o samba-canção. Até a música de fossa
era samba-canção.

Claro, tinha o baião, o frevo, as marchinhas etc, mas o que pegava nas boates era o samba-
canção. O vozeirão, inclusive, sem microfone.

A bossa nova foi uma renovação musical. Para a classe média burguesa do Rio de Janeiro.
Mas logo chamou a atenção dos jazzistas norte-americanos, que passaram a copiá-la descuidada e
descaradamente.

Hoje ela influencia várias gerações de músicos, de vários estilos.

Eu tinha dois discos – vinis – de João Gilberto. Com capa desgastada. Pensava firmemente
em vende-los, a bom preço.

Depois da série, desisti. E agora os ouço com calma e frequência. Além de outros discos
desse gênero que temos em casa.

Não podemos esquecer de Baden Powell, precursor do gênero no Brasil. E no mundo. Desse,
eu já gostava.

Se João Gilberto era perfeccionista, Baden Powell era um verdadeiro ilusionista no violão.

Passei a ter uma nova visão da bossa nova. Não a considero mais tão elitista assim.

05/11/2020.

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Cordas Novas

Comprei, ontem à tardinha, um encordoamento novo, para meu velho violão chinês Málaga.

Estava faltando a corda mizinha, e o resto estava meio enferrujado.

Obtive um encordoamento da Giannini, de aço, leve. Cordas de bronze. Paguei 35 paus na


loja de música da cidade. Achei caro. Mas, vamos ver, com o uso, como elas se portam. Pode ser que
a qualidade supere o custo.

As tarraxas, precisarei passar grafite, pois estão duras, com a falta de uso. Há anos que não
toco mais violão.

Estou enferrujado. Tive dificuldade em fazer alguns exercícios de escala.

A afinação, porém, foi perfeita. Usei meu velho afinador em lá. Não me fio nesses afinadores
de celular. Para tanto, tenho ouvido musical treinado. Isso não se perde.

Agora, está faltando imprimir o método, que eu baixei pela internet, baseado no mestre
Tárrega, que foi o que estudei entre meus dezesseis e dezoito anos.

06/11/2020.

Adendo

Tentei, ontem, imprimir o método. Por ser antiga a cópia, e fotografada em PDF, as folhas
saíram muito clarinhas. Não deu certo.

Imprimi algumas páginas de pauta musical. E estou copiando exercícios à mão, na melhor
tradição dos copistas de orquestras.

10/11/2020.

Flauta Doce em Línguas

Há várias formas, no mundo, de se falar flauta doce, ou flauta de bico.

Também se poderia dizer flauta de vento. Pois toda flauta se toca com o vento da boca (ou
do nariz, numa flauta africana.).

Em Portugal, dizem flauta de bisel.

Em inglês, falar flute tem a ver com a flauta transversal, ou um tubo de órgão. Para eles,
flauta doce é recorder. A mesma palavra usada para dizer gravador. Mas também pode ser chamada
de english flute, menos comumente usada.

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Em alemão é blockflöte, flauta de bloco, por causa do bloco existente na boquilha, para
formar o som. Em muitas flautas doces, esse bloco pode ser retirado para uma limpeza melhor da
boquilha. Só nas de péssima qualidade, isso não é possível. Mesmo assim, não tenho coragem de
tirar o bloco de meus instrumentos. Algo pessoal.

Em francês fala-se flauta de bico, flûte a bec. Tudo para diferenciar da transversal. Mas
também se diz enregistreur.

Em espanhol, flauta dulce. Mas também grabadora.

Em italiano, flauti dolci é o plural. No singular flauto dolce, ou flauto a becco.

Na antiga Grécia, havia o aulo, e o diaulos, uma flauta doce de dois tubos.

Em latim, é tibia recta, algo como tubo oco reto.

Em hebraico, hollow elith, algo como flauta oca, ‫חלילית‬.

Em klingon, bot Dov’agh. A palavra bot, é proibir, segundo o Dicionário Klingon, de Marc
Okrand. Em toda a saga Star Trek que consegui ver, nunca vi um habitante, nascido ou descendente
de Kronos, tocar flauta doce. Pelo que me lembre. Porém, alguns longas ainda não consegui assistir.
Quem sabe. Qaplá!

05/12/2020.

Violão Novo

Uns tempos atrás falei que não estava aguentando ouvir violão de cordas de nylon,
principalmente bossa nova e música de barzinho.

Alguma coisa mudou em meus ouvidos. Interessei-me novamente na música de violão de


cordas de nylon, e comprei um. É da marca Vogga, clássico, preto, modelo VCA204BK.

Comprei pra tocar por música. mas como é um instrumento que já tenho domínio, estou
tocando por ouvido, também.

Estou completamente destreinado. Afinal, há anos que não toco num desses. Mas acho que
é como andar de bicicleta.

Decifrar as partituras está um pouco difícil. Há décadas, não leio partituras de violão. Mas,
vamos em frente!

O repertório ainda é pequeno. Não sei quase nenhuma música e tenho pouquíssimas
partituras. Por enquanto.

Não me lembrava como as cordas de nylon deslizam tanto para afinar. Levei horas para uma
afinação a contento. Ainda bem que ainda tenho meu diapasão afinado em lá. Pelo som dele, afino
todas as cordas. De ouvido, que é a maneira tradicional.

Compramos pela internet. Chegou há uns dez dias, mas abrimos dia 21, quando houve a
conjunção dos planetas Marte e Saturno.

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Estou treinando algumas coisas, por música e por ouvido. As flautas doces estão encostadas,
por enquanto.

24/12/2020.

O Prazer De Fazer Barulho!

Lembro-me quando era criança, que certa vez vi meu pai lavando o rosto, e fazendo o maior
barulhão. Achei bacana! Perguntei a ele como fazia aquilo. Ele me respondeu que expirava com o
nariz e a boca, enquanto lavava o rosto. Naturalmente, não foi com essas palavras. Ele apenas disse
que fazia pfff...

Anos depois, com a prática, aprendi que não era pra fazer barulho, simplesmente, mas pra
não deixar entrar água no nariz. Até aí, morreu neves. Aprendi a lavar o rosto fazendo barulho.

Temos uns vizinhos turistas de Guarulhos que, quando vêm à nossa cidade praiana, trazem
suas crianças, que berram dia e noite, principalmente quando estão na piscina, faça chuva, sol,
trovoada, calor, frio...

Quando éramos crianças, nossos pais não deixavam que gritássemos tanto assim, nem com
tal intensidade. Acho que esses adultos devem achar “bonitinho” seus filhos berrarem de tal forma.

O samba começou com o pessoal cantando alto e batendo instrumentos de percussão.


Podemos ter uma pálida ideia do que era o samba nos primeiros tempos através da primeira
gravação em disco, “Pelo Telefone”. Mas antes disso já havia o batuque, a batida e os cantos
gritados, que vinham da África, com os escravos.

Teve o tempo da Bossa Nova, que misturava o samba com cool jazz. Foi uma época em que o
barulho ficava por conta dos vozeirões do samba-canção.

Depois, veio a MPB, com canções de protesto e a briga com a censura militar. Aí, a MPB
chegou a brigar com os roqueiros brasileiros de plantão, e a interferência da guitarra elétrica na
música popular brasileira. Mas Elis Regina cantava alto, uma estrela da MPB que chegou a se juntar
aos contrariados com a intromissão da guitarra. Mas, com o passar dos anos, as bandas que a
acompanhavam tinham instrumentos elétricos, inclusive a tão propalada “guitarra elétrica”.

Heraldo do Monte, por exemplo, anos depois, foi considerado um dos melhores guitarristas
do Brasil. E ele tocava MPB.

Hoje, o samba no Brasil é representado, em geral, pelo pagode. Muito ritmo e pouco
barulho. E covers com bastante desafinação.

Nos Estados Unidos, a história foi diferente. O dixieland e o ragtime nos anos 1920 foram os
primeiros a fazer barulho, depois dos gritos dos blues, que apareceram antes, mas tiveram público
restrito aos negros norte-americanos.

Depois, veio o bebop, com Charlie Parker (The Bird), que tocava diversas notas rapidamente,
com swing, movimentação e desenvoltura, além de muita alma. Tenho um disco dele, muito mal
gravado, ao vivo, mas que dá pra sentir o soul em evolução.

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O bebop apresentou outros nomes que gosto muito, como Thelonious Monk, Miles
Davis e John Coltrane. Este último, chegou a usar, uma época um sax de plástico. Era altamente
experimental, e fazia muito barulho, para a época.

O rock’n’roll dos anos 1950 foi muito combatido em seu tempo, pela simplicidade dos três
acordes, os saxes tocando poucas notas, mas também fazia muito barulho, e era o prazer de muitos
jovens da época. Outros, preferiam o jazz. Fosse o cool, fosse o hot.

O segundo meado dos anos 1960 trouxe a psicodelia, muitas cores em tudo, no palco, nas
roupas, na música principalmente. Isso porque nasceu em Londres, uma cidade cinzenta e chuvosa.

As bandas deixaram os acordes básicos para se aventurar pelos efeitos eletrônicos, pelas
instrumentações estranhas, como a indiana em especial, pela profusão de sons, acordes e solos
longuíssimos. Muita improvisação, na melhor tradição do bebop e dos blues. E começaram a tocar
muito mais alto.

No Brasil, o melhor exemplo disso foi com Os Mutantes, que faziam um som de
instrumentação estranha para os nacionais. Eles fizeram, em seus discos, inclusive, versões de
canções britânicas e norte-americanas.

Isso se manteve com o rock progressivo nos anos 1970, que começou a misturar a música
erudita com o rock. E a música continuou a ser tocada muito alta nas caixas de som dos palcos e dos
aparelhos dos roqueiros em seus lares.

Por volta de 1972, 73, operários ingleses, cansados de tanta complicação no rock,
começaram a fazer suas próprias bandas e subir ao palco com suas próprias roupas de trabalho. Com
dois ou três acordes faziam suas músicas, ou repetiam, com muita energia e revolta, os velhos
refrões do rock’n’roll dos anos 50. Era o punch.

A indústria cultural aproveitou essa energia e criou o punk, em 1974, com as bandas que
todo mundo conhece, e a modinha de butique, roupas rasgadas e cabelos diferentes, que todo
mundo imitou.

Ao mesmo tempo teve a discoteca, que era uma degeneração do soul.

O punk surgiu para salvar o rock. Uma das bandas que inspiraram o antimovimento foi a
britânica The Who, nos anos 60. Que deixou a marca da força! Da pulsação! Do tumulto!

Keih Moon era um baterista que não tinha técnica alguma, só fazia barulho. Ele se
movimentava o tempo todo, com seu corpo inteiro, com suas baquetas, por toda a extensão de sua
bateria, indo além, muito além, de marcar o ritmo, simplesmente.

Pete Townshend era um mestre da mis-em-scène. Encenava tudo o que fazia no palco, mas
tocar guitarra, mesmo, era só uns acordes pesados e uns solos medíocres. No entanto, foi
considerado um dos maiores heróis da guitarra da história do rock. Na mesma lista onde estão Jimi
Hendrix e Jimi Page. Inacreditável!

Roger Daltrey tinha uma voz comum, a não ser pelos seus agudos e por seu grito
inconfundível na música won’t get fooled again (não seremos enganados novamente), a última do
álbum Who’s next (Quem é o próximo). Para mim, é o melhor disco da banda.

John Entwistle, o mais obscuro dos quatro, era o único que tocava bem, muito bem, com
uma técnica invejável, sendo considerado o melhor baixista de todos os tempos por diversas revistas
especializadas. O público não prestava muita atenção nele...

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O The Who continua se apresentando, mas não sei como, se os admiráveis baixista e
baterista já morreram. Coisas de homens de negócios. Money, Money, Money... como dizia aquela
velha música norte-americana, cantada por Liza Minnelli.

Outro bom exemplo foi quando a banda norte-americana Lynyrd Skynyrd lançou Free Bird,
uma longa canção que tinha uma curta introdução vocal e uma instrumentação de TRÊS guitarras,
uma no solo, outra no contra-solo, e outra na base, um baixo, um piano e uma super bateria.

Led Zeppelin lotou estádios com canções cheias de solos, gritos agudos, um baixo que
também tocava teclados e bandolim, e outra super bateria. Eles faziam longos solos, principalmente
de guitarra e de bateria, onde não se poupava o excesso de barulho! John Bonham fabricava suas
próprias baquetas, maiores e mais pesadas que as tradicionais.

Dos anos 1980 em diante, pouco de novo apareceu no rock. Alguns com escalas rapidíssimas
fizeram sucesso, outros imitando os velhos hard-rockers, mas na base da balada, uns talentos
pipocando aqui e ali, como as primeiras apresentações e discos de Cássia Eller, porém tudo ficou
morno.

Quando eu tocava guitarra, nos anos 70, tinha dificuldade em imitar meu grande ídolo, Jimi
Hendrix. Eu não tinha a velocidade necessária para fazer as escalas ascendentes e descendentes.
Não sabia criar grandes solos. Então primava pelos efeitos especiais.

Efeitos com a alavanca, com o pedal de wa-wa, com a distorção, com a microfonia, com
tudo que era eletrônico que tinha disponível.

O prazer de fazer barulho! E até que agradava meus ouvintes, principalmente os que não
entendiam do instrumento. Era considerado um guitarrista de primeira linha.

Por isso mesmo, não posso reclamar, hoje em dia, de vizinhos que ouvem música no volume
alto. Mesmo que eu não entenda como eles podem ouvir algo tão degradante, como o atual Funk.
Que é diferente do antigo Funky, dos anos 1960 e 70. Porém, imagino como eu era um jovem
desagradável, para meus vizinhos de gerações anteriores.

Tem o pessoal com o som dos carros tunados, com os graves em altíssima potência. No
tempo em que eu tinha meus vinte e poucos anos, o que valiam eram os agudos. Os carros
passavam em alta velocidade e o que se ouvia era tss-tss...

Hoje em dia eles passam devagarinho e fazem TUNC-TUNC, vibrando as paredes de nossas
casas. Ficamos apreensivos com a segurança de nossos imóveis. E incomodados com as letras
ofensivas e o som vibrantíssimo.

Entretanto, as atuais gerações, mais jovens, preferem o fone-de-ouvido para ouvir sons
pulsantes. Não incomodam ninguém, a não ser suas próprias orelhas. Passam horas e horas com
esse dispositivo na cabeça.

Pessoalmente, não gosto de fones de ouvido para ouvir música. Nunca fui muito fã. Sempre
preferi o som ao natural. Fones são bons para se ouvir podcasts e outras coisas, não música. Ou para
serem usados para comunicação. Principalmente se forem bluetooth.

O headphone maltrata mais a eles que a nós, que íamos a concertos de rock, onde o som
era, invariavelmente, altíssimo. E ouvíamos nossos discos de rock nas caixas de nossos aparelhos de
som, os melhores que podíamos, com a altura lá em cima. Que nos deixou parcialmente surdos. Até
hoje.

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Todavia, se o som é bom, como dizia a velha canção brasileira, aumenta que isso aí é
rock’n’roll!

24/2/2021.

Violão Triste.

Havia pouco mais de um mês que eu não pegava em meu violão novo. A afinação das cordas
de nylon não estava sequer ainda estabilizada. Praticamente, o abandonei sobre o sofazinho
amarelo.

De repente, olhei para ele, e a corda lá, a quinta corda, havia arrebentado. Não foi por uso,
foi por puro abandono. O violão estava triste.

No dia seguinte, decidi pegá-lo. Limpei o violão com um paninho macio, e, pacientemente,
tirei a corda quebrada, que havia se rompido bem no meio, não dando mais para reaproveitá-la.

Graças aos céus, eu tinha um encordoamento de reserva. Coloquei uma corda nova e afinei,
com meu diapasão.

O engraçado é que, normalmente, nesses casos, a corda que arrebenta é uma fininha. Mas
foi justo a corda que afina o instrumento, a básica, a que dá o tom para toda uma orquestra. Uma
corda grossa.

Não tem explicação lógica. Violão novo, encordoamento novo, quase sem uso. A única razão
que encontro é essa. Ele ficou triste.

2/3/2021.

A Guitarra Fantástica de Syd Barrett Continua Única!

Meu guitarrista preferido continua sendo Jimi Hendrix, que venero com toda minha alma. O
que ele fez pelo instrumento, ninguém fez.

Mas Syd Barrett tinha uma “coisa” dentro de si, uma criatividade infinda, e isso se revelava
nas composições dele e na influência que ele deu a Roger Waters, Nick Mason e Richard Wright.
Esses três eram, simplesmente, estudantes de arquitetura, bem educados, que se reuniam para
tocar jazz e blues, junto com mais outros.

Quem o apresentou ao grupo foi seu amigo de então, Roger Waters.

Rick Wright, quando passou da guitarra para os teclados, usava um órgão Hammond,
daqueles enormes, que esquentavam pra caramba quando funcionavam. Ele, como Nick e Roger,
nunca teriam deixado de ser uma mera bandinha de estudantes frustrados, que queriam abandonar
a faculdade pra serem músicos.

O que os impulsionou foi Syd Barrett. Ele vinha de uma formação acadêmica em artes. A
qual, segundo sei, não foi concluída. Sua criatividade sem limites, seu carisma, seu toque de gênio,

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trouxe ao grupo um som novo, experimental, de vanguarda, tornando a banda única em todo o
cenário underground londrino de 1966 a 68.

A guitarra de Syd não era de uma técnica invejável. Mas ele a usava de maneiras inusitadas,
mexendo nas afinações, tocando as cordas de modo diferente, independente, como se fossem
instrumentos separados que se unissem numa orquestra.

Syd tornou-se o líder natural da banda, e deu a ela o nome de The Pink Floyd Sound. Pink e
Floyd eram nomes tirados de dois blueseiros que ele admirava, Pink Anderson e Floyd Council.

Pinkney Anderson e Floyd Council eram guitarristas. Dizem que Syd tinha um disco do
primeiro.

É difícil entender que influências ele teve de outros instrumentistas. Seu estilo era errático,
difuso, controverso. Não era, definitivamente, um guitarrista de blues, mesmo quando tocava suas
canções no violão. Ele era tão criativo que, quando apresentava uma música nova à banda, ao
repeti-la fazia-o com outro ritmo, outra letra, outra melodia, ou outro arranjo.

Quando lançaram o primeiro disco – LP –, The Piper At The Gates Of Dawn, oito composições
eram dele, inclusive a longa Astronomy Dominé, que abria o disco. Duas eram da banda toda e uma,
curtinha, era de Roger, a última do lado um.

Só para constar, a língua inglesa, como todos sabem, não tem acentuações, como no título
da longa faixa mencionada acima. O título da música foi tirado do nome de uma brochura francesa
do filósofo Bertrand Russell.

Syd dominava a banda, em termos de condução musical, estilo, moda, e traquejo social. Eles
eram os reis do underground londrino, em 1966, e o disco foi gravado em 1967, aproveitando todas
as possibilidades que o estúdio Abbey Road oferecia. Todos os técnicos trabalharam a favor, e os
managers também.

É um disco que temos de ouvir numa vitrola convencional, com o vinil sendo tocado, para
ser apreciado devidamente. Não adianta querer escutar em CD ou MP3, no YouTube, ou qualquer
outra plataforma. Ele não será devidamente compreendido. E, se possível, a vitrola deve ser
estereofônica, para se obter todos os efeitos perfeitamente.

Aliás, quando os Estados Unidos o lançaram, eliminaram algumas faixas, e trocaram as que
sobraram de lugar. Desuniram, inclusive, duas que eram coladinhas. Portanto, o melhor a fazer é
arrumar uma edição inglesa, original, de 1967. Ou mesmo a nacional, de 1974, que é igualzinha. Só
não tem a mesma qualidade técnica de prensagem.

A capa do disco o complementa. Ela é tão psicodélica quanto seu interior musical. Na frente,
um efeito fotográfico em voga, de então, mostra as imagens dos quatro multiplicadas. Atrás, sob os
títulos das canções, está um desenho em sombra dos quatro juntos, sobre dois pés apenas.

O nome da última música do disco, no lado B, de autoria de Syd, Bike, era, na verdade, um
apelido para o LSD, droga alucinógena que devastou a mente do então líder do grupo, de tanto que
ele a usou.

Por sua causa, as improvisações eram tão longas e diáfanas. E o público simplesmente
amava, e aplaudia cada nova loucura, como quando ele decidiu, em pleno show, desafinar todas as
cordas da guitarra, deixando sair um som histérico, que os outros músicos tentaram acompanhar.
Aliás, ele era o verdadeiro líder até então, e os outros o seguiam como ovelhas.

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Rick disse, numa entrevista à BBC, que não sabe se a esquizofrenia nunca tratada do
guitarrista catapultou a demência posterior dele, mas que as drogas foram a grande vertente para
isso. Tal fato não pode ser negado.

Quando Syd era famoso, as meninas gritavam pelo seu nome, sua fama era acima dos outros
componentes da banda. Ele era bonito, atraente, bem vestido, carismático, gostava de gente à sua
volta.

Porém, muitas das pessoas que queriam se aproximar dele, lhe levavam drogas, para
mostrarem que eram suas amigas. Chegaram a dar-lhe droga escondida dentro de seu chá, dias
seguidos.

No livro Crazy Diamond, seus autores Mike Watkinson e Pete Anderson contam que, sem
Syd saber, seus colegas de quarto colocaram durante vários dias em seguida alucinógenos, em sua
xícara de chá matinal.

Bad company... Maus amigos, má companhia. Tudo confluiu para sua decadência mental. Ele
deixou de ser sociável, tornou-se solitário, alienado de tudo, e da própria banda.

Os músicos ficaram perdidos sem uma liderança, e ficaram com medo de ter que voltar pra
vida de meros estudantes de arquitetura, uma carreira estável e estéril, para o que consideravam.
Eles não queriam uma carreira comum, queriam ser músicos profissionais.

Assim, chamaram David Gilmour, que era um amigo da banda, para ser o quinto elemento.
Ele começou tentando imitar o que Syd tocava, para poderem tocar o repertório. Durante os
primeiros shows, segundo Dave mesmo contou numa entrevista, há poucos anos, em seu estúdio
pessoal, ele tocava de costas pro público, envergonhado, já que seu estilo de tocar nunca foi aquele.

O segundo disco, de 1968, A Saucefull of Secrets, teve a participação de ambos os


guitarristas nas gravações de estúdio, mas só foi creditado David. Syd colaborou com algumas
composições, como Jugband Blues, onde ele fala de sua crise mental.

Rick e Roger chegaram a levá-lo a um psiquiatra famoso na época, que disse que a demência
não tinha mais volta. As drogas lisérgicas dilaceraram sua cabeça.

A partir do terceiro disco, não há mais a participação do antigo guitarrista e compositor, mas
sua sombra permanece sobre o grupo. O estilo de guitarra de David cresce, dentro do grupo. O disco
que levou o Pink Floyd ao grande público, The Dark Side Of The Moon, de 1973, trata principalmente
da mente de Syd Barrett. Principalmente a música de Roger, Brain Damage.

O álbum, como conceito, dá a nítida percepção de uma homenagem ao antigo mentor da


banda. Inclusive, uma frase promocional do disco, dizia algo como: Todos podem ver o lado claro e
brilhante da lua, mas só os loucos podem ver seu lado misterioso e escuro.

Outro disco assim é Wish You Were Here, que também traz menções ao músico, mas que
não considero de tão alto nível. Mesmo tendo solos de guitarra de cair o queixo, de tão lindos que
são. Dessa vez, a canção que, literalmente, fala de Syd, é "Shine On".

O álbum duplo The Wall, de 1979, fala, de uma forma sub-reptícia, da solidão encontrada
por Syd dentro de sua esquizofrenia não tratada, juntada com o efeito das drogas. O muro que se
forma em volta do rapaz é um retrato da posição de então do antigo compositor.

Considero, esse, o último disco real do Pink Floyd, como grupo musical. É um álbum
completo, inteiro, conceitual, que Rick Wright considerava o melhor da banda. Mas as composições,

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desta vez, são todas creditadas a Roger, que sempre foi um exímio baixista, mas cujas criações eram
deixadas pra segundo plano, pelo grupo.

Talvez isso tenha criado sua futura cisão, e sua intenção de ficar com a marca “Pink Floyd”
sozinho. Não conseguiu, como se pode constatar.

O álbum/coletânea Relics, de 1974, traz algumas composições de Syd, principalmente Arnold


Layne e See Emily Play, que saíram como compactos simples (singles), antes do primeiro LP, e que
levaram seus nomes às estações de rádio.

Para mim, o primeiro disco do Pink Floyd é a grande obra de Syd Barrett. Anos depois, seus
colegas o fizeram gravar composições que ele tinha, novas, sozinho, e puseram instrumentação em
cima. Isso originou dois discos, que depois foram reunidos num álbum duplo. Mas revelam um
músico deteriorado, sem a genialidade e o carisma que ele tinha nos áureos tempos.

De qualquer forma, a guitarra fantástica de Syd Barrett não pode ser esquecida. Ela
revolucionou uma banda de blues. Sem Syd, não existiria o rock espacial, muito menos Pink Floyd.

19/4/2021.

O Método Isadora Duncan É Uma Trambicagem.

Soube, outro dia, pela Fafí, de um curso que andam ministrando por aí, intitulado, mais ou
menos, como “Método Isadora Duncan”.

Ora. É o mesmo que falar em “Movimento Punk” (Já falei disto noutra feita.), ou
“Manufaturado à Máquina”. São coisas que não se acertam, não combinam, não se encaixam.

Foi criado, na época da Música Clássica, depois do Barroco, antes do Romantismo, o


chamado Balé Clássico. Por que tinha esse nome? Porque era totalmente apegado a regras. Desde as
vestimentas, cada tipo com um nome, até as sapatilhas. E a língua do Balé Clássico era a francesa,
diferentemente da Música Clássica, que era o italiano.

Aliás, o termo “Clássico”, como se sabe, nunca se aplica a algo presente, mas ao que passou,
e que, por alguma razão, é assim considerado. Como se dissesse que aquilo é para durar
eternamente.

Porém, na linguagem histórica, se aplica essa nomenclatura a um período de tempo


específico, de determinado lugar. E, como já vimos, sempre sobre um período do passado.

O Balé Clássico se difundiu ocidente afora, principalmente na Europa. E manteve suas regras
intocadas, mesmo quando a música mudou, tornou-se Romântica, Moderna, Contemporânea, Pós-
Contemporânea. Até hoje, o Balé Clássico se mantém, sem mudança alguma, com todas as suas
marcações.

As famílias grã-finas mandam suas meninas, e às vezes, seus meninos, estudar isso, como
parte de sua educação básica. Também as famílias, que querem parecer grã-finas, fazem o mesmo.

Isadora Duncan viveu num tempo de mudanças. Os movimentos eram registrados pelo
cinematógrafo, os sons eram finalmente registrados pelo fonógrafo, as cidades tinham um som

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distinto, haviam carros andando sem tração animal, que soltavam fumaça, ao lado de carruagens e
carroças.

Ela buscou, de um tempo idílico, de uma Grécia dos antigos deuses, dos aulos e dos diaulos,
das liras, daquela terra que só existiu na cabeça dos filósofos, dos músicos, e dos poetas, a essência
da Dança. A essência. O que havia de primordial. A liberdade.

É certo que ela dançava com os pés descalços, assim como suas alunas. É certo que haviam
figurinos, mas eles não tinham nomes franceses, assim como não havia um nome francês para cada
movimento.

Os pés descalços eram símbolo da libertação das duras sapatilhas, que machucam os pés.

Suas alunas não usavam roupas apertadas, mas, como ela, túnicas soltas, leves e diáfanas.

Os movimentos eram desprendidos, liberados, as dançarinas não precisavam seguir todas a


mesma marcação.

Não havia competição, para saber quem ergue a perna mais alto.

Valia muito mais a emoção. A jovialidade.

Em seus diários, Isadora fala com alegria, sobre crianças que ela viu nadarem nuas, meninas
e meninos juntos, inocentemente, numa de suas viagens ao exterior.

Isadora fez uma revolução.

Ela criou.

Ela ousou.

Ela quebrou regras rígidas de uma instituição, o Balé Clássico, reinventou a Dança. Ela criou
uma Escola, um caminho.

Porém, se queremos segui-la, não podemos querer imitá-la. Ela não criou método algum,
para que a imitassem.

Ser como Isadora Duncan é buscar a criação de uma nova revolução. Que não precisa
necessariamente ser na dança. Pode ser no rock. Na performance. No teatro. Na música que não
seja erudita, nem folclórica, nem popular. Nem pop. Na pintura. No desenho. Na gravura. Na
escultura. No múltiplo. No design. Na arquitetura. Na arte digital. Em qualquer arte. Até mesmo, em
alguma área que ainda não exista.

Criatividade é própria do ser humano. Qualquer ser humano pode criar. Mesmo eu. Mesmo
você. Mesmo nós coletivamente. Mesmo nossa inconsciência coletiva.

Arte pode ser profissional. Amadora. Séria, sem ser profissional, nem amadora. Brincalhona.
Arte é criação. Qualquer tipo de criação. Até mesmo a arte de criar um filho. A arte de ouvir. A arte
de viver.

Qualquer ser humano pode ousar.

Não sejamos como Isadora. Sejamos Isadora Duncan. Até mesmo sem precisar sair de nossas
próprias casas.

79
20/7/2021.

Violão Triste N°. 2.

Alguns dias antes do Natal, fui ao quintal lavar a cuia do chimarrão. Havia acabado de
chover, o chão estava liso, e minha sandália estava com o solado gasto. Não deu outra. No que eu
me virei, escorreguei, e lá se foi, cuia para um lado, bomba para outro, base para outro.

Na hora, achei que estava apenas com o braço dolorido. Como minha coluna não anda lá
essas coisas, fiquei deitado durante uns cinco ou dez minutos, até conseguir me levantar.

Recolhi tudo de seus lugares e levei para a cozinha. Fui para a sala, onde esperei a dor
passar. Mas não passou. Depois de meia hora, mais ou menos, fui contar à Fafí o acontecido, e ela,
imediatamente, chamou um Uber.

Fomos ao médico e ele mandou tirar um raio-X. O ombro e o braço estavam quebrados.
Fiquei internado na Santa Casa por quatro dias, aproximadamente, acompanhado por minha filha.

Passei a usar uma tipoia. Não pude fazer cirurgia.

Nesse meio-tempo, a sexta corda de meu violão, o mizão, arrebentou. Achei que nunca mais
voltaria a tocar, e aquele era um sinal.

Dez dias depois de sair do hospital, o doutor falou que em breve eu estaria, conforme
perguntara, digitando com as duas mãos e tocando violão. Mal cri. Ele tirou minha tipoia e colocou
uma de pano, daquelas que se usa no hospital.

Depois de dois dias, tirei a tipoia e não a usei mais. Mais uns dias e eu já estava digitando
com as duas mãos. Completando um mês da queda, já estava fazendo escalas no violão, e depois de
alguns dias fazendo posições com pestana.

Ainda não tenho capacidade para trocar a corda, estou tocando com cinco cordas, sem o mi
grave. Mas, tudo bem, tenho uma bênção do Sacerdócio sobre a minha cabeça que garantiu que eu
voltaria a tocar violão e fazer todas as atividades que fazia antes. Além das orações e pensamentos
positivos de amigos e conhecidos.

O violão voltou a ficar alegre.

30/1/2022.

Adendo

Ontem, tirei a roupa do varal e troquei a sexta corda do violão, a mizona. Além disso, afinei o
instrumento com um aplicativo, treinei escala, acordes e solos por seis minutos, e ainda usei outro
app de playback para fazer uns solozinhos.

Estou progredindo.

80
4/2/2022.

Carta à Rita Lee.

Oi, Rita Lee.

Depois que meu psiquiatra excluiu de meus medicamentos a pílula da felicidade, minhas emoções
voltaram.

Hoje, passei a manhã ouvindo um pouco de meus compactos (vinis, é claro!), até que cheguei no seu
compacto duplo, com lá vou eu, caçador de aventuras, status e ovelha negra.

Você não sabe o quanto chorei com esse disco. Ele é muito especial para mim. Depois que parei de
tomar o remédio da felicidade, estou chorando por qualquer coisa. Não de tristeza. De emoção.

Esse disco me toca fundo. Naquela época, você era a rainha do rock brasileiro, num cenário de
roqueiros homens.

Você era a líder de um grupo de rock só de rapazes. No começo tinha a Lucinha Turnbull, mas o disco
com ela foi para um público seleto.

Seus shows encantaram minha juventude dos 16 aos 19 anos, quando o Tutti-Frutti acabou, e eu me
mudei para o interior.

Fui para Rio Claro, onde conheci uma menina que dizia que era sua prima. Devia ser verdade, pelo
que você contou no seu livro, mas na época achei que era piração. Como ela era muito pirada, fui na
onda, e surfei junto. E olha lá que não sou de praia, nem de sol, muito menos de surf.

Mas vamos voltar a falar de você. Você e seu grupo, o Tutti-Frutti, eram a encarnação do rock
brasileiro paulistano. Eu morava na Lapa, e te seguia onde você se apresentasse. Seus shows eram
os melhores do rock paulistano dos anos setenta. O cheiro de incenso de umbanda antes dos shows
pra disfarçar o cheiro de fumo era característico. O cheiro dos seus shows, o som dos instrumentos,
a harmonia barulhenta, meus ouvidos sempre saiam zunindo no final de cada show. Graças a tanto
rock da juventude, nos shows, onde eu ficava na frente, prestando atenção nos solistas, na bateria,
na sua flauta, no guitarrista, no baixista, você reinava no palco. Graças a tudo isso, mais o som alto
que eu ouvia em casa no meu aparelhinho de som, fiquei meio surdo. Mas valeu a pena.

Eu te amava, te achava linda, você era a imagem da beleza roqueira paulistana, você era sexy porque
você não era sexy, você emanava poder feminino, no meio daquele monte de testosterona. Seus
feromônios eram fortíssimos!

Conheci o Arnaldo Baptista na época que ele fez o Patrulha do Espaço, um grupo medíocre, que valia
a pena pelo baterista, o Rollando Castello Júnior. Ele era super! Se ele estivesse no Tutti-Frutti, sua
banda seria perfeita.

Tive ciúmes de você quando você se juntou com o Roberto de Carvalho, e começaram a fazer
músicas para a família popular brasileira. Não era mais a minha praia. Nunca mais fui a um show seu,
nunca mais comprei um disco seu. Olha só, meu pai começou a comprar seus discos. Seu público
mudou.

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Meu amor por você pode-se dizer que era platônico. Tinha fotos suas em que você parecia sexy, mas
nem tanto.

Você aqueceu o coração de um garoto cinzento de uma cidade cinzenta durante a época mais
cinzenta de minha vida.

Naqueles dias, a única coisa que me fazia viver era o rock. Eu achava que com a saúde que tinha não
ia passar dos trinta. Então não pensava em planos futuros, sobre o que ia fazer da vida, sobre
constituir família, fazer faculdade, só pensava no presente, em tocar guitarra e cantar.
Principalmente tocar guitarra como Jimi Hendrix.

Mas esse tempo passou, e você passou, tudo mudou, eu mudei.

No interior conheci o céu azul e o sol brilhante. Que não existia em São Paulo. Conheci amores e
paixões, e comecei a achar que minha vida poderia passar dos 30 anos de idade.

Pouco a pouco, conheci minha própria família e te entendi. Continuo não gostando dos discos que
você fez depois do Tutti-Frutti, com o Roberto de Carvalho, mas agora entendo seu papo família.
Porque agora eu tenho uma família pra chamar de minha.

Obrigado por iluminar meus anos de juventude paulistana. Nunca me esquecerei disso.

Léo.

11 de abril de 2022.

Sobre o autor.

Leopoldo Luiz Rodrigues Pontes é meu nome. Nasci às 4 e meia da manhã, do dia 4 de abril
de 1958, no bairro da Lapa, na cidade de São Paulo.

No final dos anos 1970 e início dos 80, publiquei uma série de livros de poemas, por conta
própria, na base do mimeógrafo e do off-set. Tentei fazer alguns para educação popular, mas não
foram para frente.

Enveredei pelas artes plásticas e pela música. Fiz várias exposições individuais e participei de
coletivas. Fui solista de guitarra e cantei, em várias bandas de rock que não duraram quase nada.

Individualmente, toquei vários outros instrumentos, não só de corda, mas também, muito
mal, de sopro e percussão. Sempre de ouvido, embora tenha estudado profundamente música, o
que ainda o faço.

Minha formação acadêmica inclui jornalismo em Santos e direito em Taubaté, além de meia-
pós-graduação em comunicação social e uma pós-graduação em língua portuguesa e literatura. E
vários pequenos cursos adicionais, incluindo extensões, todos presenciais, que é o que existia
naquele tempo.

Meu primeiro emprego foi ajudar meu pai no depósito de artigos de época, fazendo pacotes,
atendendo a freguesia, carregando mercadoria, auxiliando no escritório, e fazendo contas.

Depois vagabundeei um pouco e fui ser cobrador. Passou um tempo e voltei a vagabundear,
para depois atuar com artes plásticas e antiguidades. O dinheiro não dava para nada.

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Aí, recebi uma pequena herança e abri uma lanchonete que era também uma casa de chá.
Logo, minha esposa estava participando, até que, de repente, passou a cuidar sozinha do local.

Nesse meio tempo, fui chamado como redator e repórter da Rádio Emissora de Campos do
Jordão. Depois, concomitantemente, fui empregado de diversos jornais escritos, como diretor de
redação, fotógrafo, editor, redator, repórter, diagramador, etc, tudo ao mesmo tempo, já que eram
jornais pequenos.

Nessa época, escrevi pra burro, tudo quanto eram notícias, editoriais, resenhas, entre outras
coisas. Mas nunca fui convidado para a Academia Jordanense de Letras.

Também trabalhei, uns meses, como jornalista da prefeitura, o que me garantiu uns bicos
em períodos eleitorais.

Como jornalista, fiz ainda alguns frilas e uma correspondência por três meses tórridos!

Noutra época, meus finais de semana eram tomados por uma galeria de arte de Campos do
Jordão.

Quando fui demitido da Rádio Emissora, comecei a trabalhar como advogado, e logo fui
chamado pela Sabesp, para a qual havia prestado concurso, em Caraguatatuba, onde trabalhei como
atendente a consumidores.

Minha aposentadoria foi pela Sabesp.

Moro atualmente no litoral norte do estado de São Paulo. Meus hobbies são: ouvir discos de
vinil, desenhar, escrever, tocar violão, ler muito, e ver filmes e séries. E fazer cursos e oficinas pela
internet.

Contato: leopoldopontes21@gmail.com

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Foto by Fafí Pontes.

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Livros e e-Books de Leopoldo Pontes:

(Na ordem por publicação)

1. Paixões Remuneradas (1979) (esgotado)


2. Sobre Rio Claro (1980) (esgotado)
3. Já que tá, então fica (1981) (esgotado)
4. (Arte em mimeógrafo) (série) (1981) (esgotada)
5. Série Poemetos (1981) (esgotada)
6. Homoteo (1982) (não publicado)
7. Gabriel: a História do Roqueiro que virou o Grande Herói Nacional (2000) (reeditado em
agosto de 2016)
8. Asas para Teotino (2001) (reeditado em outubro de 2016)
9. Minha Experiência com o Kindle (novembro de 2016)
10. Poemas para serem lidos em voz alta (novembro de 2016)
11. V.M.P.M.: Duas Histórias de Amor (janeiro de 2017)
12. Dialética no Direito: O Estado Leigo (dezembro de 2018)
13. Análise de Matrix e outros filmes e textos (janeiro de 2019)
14. 4 COROS DA TERRA E DOS CÉUS E UMA CANÇÃO INFLAMADA: Teatro (janeiro de 2019)
15. O gosto das coisas: E o Rock não morreu... (abril de 2019)
16. O gosto das coisas: A Gorda vai cantar (abril de 2019)
17. O gosto das coisas: O Tempo e as Estações (abril de 2019)
18. Dialética sem Encher Linguiça (maio de 2020)
19. ZEN SEM FRESCURA: o livro da anti-autoajuda: tudo o que os livros de autoajuda não te
deixam acreditar (maio de 2020)
20. VMPM e outros contos (maio de 2020)
21. ROCK NÃO SE APRENDE NA ESCOLA (maio de 2020)
22. NA CONTRAMÃO (maio de 2020)
23. TUDO AO NORMAL – Felicidade não é obrigatória (julho de 2020)
24. Antes do despertar - α € Ω A Nova Gaia (outubro de 2020)
25. REINICIAR é a Solução pra Tudo! (janeiro de 2021)
26. Contos jurídicos (julho de 2021)
27. O prazer de fazer barulho (abril de 2022)
28. O corvo (tradução do poema de Edgar Allan Poe) (junho de 2022)
29. Música do Planeta Terra [agosto de 2022]
30. O pensamento quântico não é místico [setembro de 2022]

FIM

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Índice:
A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 1
MÚSICA-MERCADORIA
MÚSICA-OBJETO
A INTERRUPÇÃO PELA MORTE
SURREALISMO E ROCK
A HARMONIA DAS ESFERAS Nº 2
A MÚSICA E O SILÊNCIO
Sentir ou entender
Silêncio para Ouvir Música nº1
Ouvir o Silêncio
Silêncio para Ouvir Música nº2
Equilíbrio e Paz nº1
Abbey Road
Os Chakras e as Notas Musicais
E o Rock Não Morreu
Instrumentos Antigos
Ouvir Música
LP e Música Digital
O BAIXO
O MOVIMENTO PUNK
CAPOEIRA
O SOM DA AURA
PRIMEIRA BANDA
A GORDA VAI CANTAR
A seguir, cinco matérias que saíram publicadas num sítio da internet, de meu amigo Alex Sakai,
em final de 2010 e início de 2011.
CACHORRO GRANDE, TCHÊ!
HENDRIX, AINDA O MAIOR
SYD BARRETT, O GÊNIO DE LONDON LONDON
LOKI
Mendigos e Cia.
Final das cinco matérias. Agora, outras coisas.
TREWA
Mundo do Glam

86
ROSAS DE OURO
THE RUNAWAYS
LETRA E MÚSICA
PEPEU
Literatura no Rock
Registros musicais
Percussão
Brian Jones
Quando existe o som
Bits
Rita Lee
Cássia Eller
Bixo da Seda
Rock Argentino
Anotações sobre Música I
Anotações sobre Música II
Os Tons e as Escalas: os Degraus da Sabedoria
Anotações sobre Música III
As Escalas
Anotações sobre Música IV
SUSTENIDOS E BEMÓIS
Arandu Arakuaa
Produtor Fala sobre o Novo Álbum do Arandu Arakuaa
Análise da Letra da canção “Por Enquanto”, de Renato Russo
Relações de sentido:
Análise do filme “Crossroads”(A Encruzilhada)
1986, EUA, Dir. Walter Hill,
VALE A PENA SER HERÓI?
Fanny
Música Pessoalmente
Rock Não se Aprende na Escola
Levar a Vida na Flauta
Cássia Eller
Flauta Nova
Cordas de Guitarra
Música É

87
Grafia das Notas Musicais
A Escala Pentatônica e o Círculo
Dois Sonhos
Clavicórdio
Música Clássica
Joelma e Tina Turner
Sonho
Apito no Ouvido
Os Sentidos
O Melhor do Rock
Podcasts
Bach
Nil
Interpretação Historicamente Informada
Punk
Um Sonho
Voltar a tocar
Tocar Violão
Reis e Rainhas
Coisa mais Linda
Cordas Novas
Flauta Doce em Línguas
Violão Novo
O Prazer De Fazer Barulho!
Violão Triste.
A Guitarra Fantástica de Syd Barrett Continua Única!
O Método Isadora Duncan É Uma Trambicagem.
Violão Triste N°. 2.
Adendo
Carta à Rita Lee.
Sobre o autor.
Livros e e-Books de Leopoldo Pontes:
Índice:

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89

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