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V BARROCO (1580-1756) PRELIMINARES Quando, em 1578, D. Sebastiao desaparece em Alcdcer-Quibir, era chegado 0 fim melancélico das grandezas arduamente conquistadas a partir da tomada de Ceuta (1415), gracas a abertura do caminho maritimo para as Indias (1498), descoberta do Brasil (1500), € a outros cometimentos semelhantes. Indo para a regencia o Cardeal D, Henrique, tio do malogrado rei, durante dois anos se de- bateu a magna questdo sucesséria, até que, em 1580, Filipe II da Espanha, her- deiro mais proximo da Coroa, anexa Portugal a seus dominios. E ao longo de 60 anos, até 1640, dominou 0 Espanhol. No mesmo ano de 1580, falece na miséria © visionario cantor das glorias perdidas e o intuitivo que pressentira a desastrosa situa¢ao de inconsciéncia coletiva — Luis Vaz de Camées: dois acontecimentos Uagicamente simultaneos, a marcar o creptisculo de um mundo e a aurora de Outro. Termina a Renascenca em Portugal e principia a extensa época do Barro- C0, que se espraiara pelo século XVII, atingindo os meados do século XVII. Extenso mas nao intenso lapso de tempo: na fileira de uma turbuléncia ge- tal, provocada pelo senhorio castelhano e pelo movimento europe das id €M torno da Reforma e da Contrarreforma, a cultura portuguesa baixa de tom, vela-se, hiberna, envergonhada ou ensimesmada, a remoer pensamentos de re- volta ou de misticismo, algumas vezes traduzidos em acao, coerente ou nao. 109 0 ¢ ATURA poRTUGUESA ‘i sparroco” designava ori De duvidosa etimologia, © vocab as ‘ee 8 ta . , la e act 7 ans de forma itregula OU ne um tipo de pérol estan sg los gue servia Pa eoura.! o tempo, passor ja figura. Com PO PaSsou a significa, Itura propria do século XVIL e pring, tam egquiema nanemonice 4g chamados silogismos da segumd todo sinal dem por fim, a cu ios do século NVI. O movimento barreco, durante o reinado filipino, € de instavel co profunda transformacio cultural, cujas ratzes Jamica, Quem nele procure apenas 0 aspecto Tite no Renascimento algumas de suas formas embrio final do século XVI, quando ja s€ percebem as palpitacoes da discordia intema n Barroco, enfeixada no chamado Maneirismo, que que ina transformar-se em sntre as correntes estéticas € ideoldgicas que cruzam se caracteriza pela tensio et aquele século, expressa pelo aciimulo de metaforas, antiteses, trocadilhos, a mescla do real e do irreal. Lembre-se, apenas como exemplo, 0 soneto camo- niano iniciado pelo verso “Amor ¢ fogo que arde sem se ver”, em que ja se ob- no jogo dos paradoxos que levam aos conceitos, aut gosto, Cy panha introduzido em Portuga ntorno, por corresponder a un, onstituem ainda objeto de po. erario, facilmente encontrarg pi ; y iniciado na Es] ndrias, destacadamente no servam antecedentes barroco: uma das bases daquela tendéncia estética ‘Ainda no tocante as suas origens em Portugal, pepel representado por Francisco Rodrigues Lobo (Leiria, 1573?-tio Tejo, 2+ de novembro de 1621): nao s6 serviu de nexo entre o magistério camoniano & 0 Barroco, tendo de permeio o Maneirismo, como também colaborou pata # preciso levar em conta 0 Os silogismos da 2 fi oe is igura consistem em silogismos hipotéticos, em que a premissa menor sempre arcu e nega, a conchsio sempre nega, los os as ad : alunos do 2+ano fizeram exame. (premissa maior) 1 O Aquele aluno nao fez exame. (premissa menor) emissa menor oe (conclusio) uniemto escolastic heparan oldstico, o A designava julgamentos univ nega que 0 aluno pertenga ao 20 , © O Logo, aquele aluno nao é do 2° ano, ersais afirmativos, € 0 O, Pat seo dese ee logis reside no seguinte: a conclus!? \egar A mesma c ipétese de nao ter feito exame, quando P™ or dar margem a coelist, Com isso, descreve-se um cifcu? arson tm 84a sre de toruossconibinagoes one zismo imperfeito ou falso. desnecessario e complicado, divulgacao da estética barroca com as suas ideias acerca da arte liter, didlogo, estampadas em Corte na Aldeia (1619), a exemplo do passo a edo formula, porventura pela primeira vez em Portugal, 0 conceito de agude: que se yrdlgico para a compreensao da literatura ao longo dos séculos nas ; i: XVILe XVIII: “Qs ditos agudos consistem em mudar o sentido a uma palavra para di . i izer outra coisa, ou em mudar alguma letra ou acento a palavra para lhe dar outr ‘0 sentido, ou em wm som € graga com que nas mesmas coisas muda a tencao do que as diz”. E, como nao podia deixar de ser, 0 Barroco sofreu mudancas em solo por- tugués, j4 por causa de tais antecedentes, ja porque a novidade espanhola cor- respondia a uma forma de perturbacdo da serenidade classica, que s6 uns pouces letrados aceitaram em bloco, e foram os menos talentosos. A linha tra- dicional, engrossada pelo magistério poético de Camées, funcionava como barreira contra a invasao das Aguas vizinhas, e acabou dando um toque de identidade especial ao Barroco portugués. No entender de alguns estudiosos, o Barroco tornou-se a arte da Con- trarreforma, visto as caracteristicas basicas do movimento estético servirem aos designios doutrinarios e pedagégicos da Igreja na luta antirreformista. A Contrarreforma teria absorvido a estética barroca, fazendo dela uma espécie de estratégia da sua aco catequizadora; de onde o carater pragmatico assumi- do pelas expressdes da arte literaria barroca, particularmente as em prosa. Por outro lado, a fusio de propésitos e tendéncias nem sempre coerentes explica as multiplas facetas apresentadas pelo Barroco. Posto isso, pergunta-se: quais as caracterfsticas fundamentals da estética barroca? Primeiro que tudo, corresponde a tentativa de fundir, numa unidade ambiciosa de simbolizar a suma perfeigdo, as duas linhas de forga que condu- Ziram o pensamento europeu ao longo do século XVI: 0 Barroco procurow Conciliar numa sintese utopica a visio do mundo medieval, de base teocentt C4, € a ideologia classica, renascentista, paga, terrena, autropocentrica, No amélgama entre orientacdes tao opostas € A primeint visit mumuamente repul- Sivas, haveria inevitavel troca de posigdes, de forma que se operulay espuritlune Teacéo da carne e a correspondente carnalizagao do espitito, Em ue Punha-se todo o empenho em conciliar 0 claro € 0 esewtr, A MAES oespiti- ‘0, aluz ea sombra, visando a anular, pela unificagdo, & dualidade do ser hu- ™ano, dividido entre os apelos do corpo ¢ os da alia, GUESA ‘Y 112 * A LITERATURA PORTUG UES los, de resultado sempre Negativo, : is pol oi | Esse embate entre os doi iS aan \ Be a0 CH -adica no problema do conheci; i nomia persiste ao fim e ao cabo, F Fi mento da | Idd, Enendedose que cnkecer identifica se com, assim gga sujeito, parece evidente que a dicotomia barroca (corpo e alma, luz © somes | ete.) comrespondea dois modos de conhecimento, Primeito, consistiia na de crigao dos objetos, num estado de espfrito que induziria a Pensar-se num del. rio eromattico, em que se procurava saber 0 como das coisas. Conhecer set deserve, como se observa nestes poucos vers0s extratdos do “Lampaday, od | , de Jerénimo Bafa: “Lampada soberana, Dignissima do templo da Diana. | Mas se nele tivera Vossa luz sua esfera, Com tal excesso brilha, Britha tao sem exemplo, Que fora mais estranha maravilha A lampada que o templo; Que fora o templo emulacao do polo De Diana por si, por vés de Apolo” Visto 0 processo descritivo implicar a utilizagao de metaforas e ‘imagens Para todos os sentidos (a chamada sinestesia), e a poesia se exprimir sobretudo Por meio de metaforas e imagens, resulta que essa tendéncia se manilesta no » para alcancé-la, conside- ‘0s, hipérbatos, trocadilhos, dubie- Ue tornam 0 estilo pesado, tortuos? prego de neologism dades etodas.as demas figuras de sintaxe q ealambicado, BARROCO © 143, mos a respeito da vida e das coisas. Trata-se, pois, duma corrente expre * ssa aci- ma de tudo em prosa, de vez que a logicidade (entenda-se: a logica formal) nao constitui atributo inerente a poesia, Recebeu a denominagao de Concept i atibutoinerente apy nceptis- mo, € 0 seu Tepresentante tfpico foi Quevedo. Sirva de ilustragdo este fragmen- to do “Sermao da Sexagésima”, de Antonio Vieir: “Para um homem se ver a si mesmo sto necessérias tr€s coisas: olhos, espelho € luz, Se tem espelho e € cego, nao se pode ver por falta de olhos; se tem espelho ¢ olhos, e € de noite, nao se pode ver por falta de luz, Logo ha mister luz, ha mister espelho, ¢ ha mister olhos” Convém que se entenda, porém, que Gongorismo e Conceptismo consti- tuem tendéncias interinfluentes e contemporaneas, inclusive num mesmo es- critor: ao mesmo tempo que o Gongorismo utiliza por vezes o processo conceptual, 0 Conceptismo lanca mao dos recursos figurados de linguagem que fazem o apanagio da poesia gongorica. Em muitos casos, torna-se mesmo dificil estabelecer distincdo nitida entre os dois procedimentos. Ambos os “ismos” obedecem a uma concep¢ao pragmatica de arte: 0 pri- meiro, enaltecendo as sinestesias, procura criar um clima de ludismo verbal com 0 objetivo de entreter; o Gongorismo nao raras vezes se prope como es- peticulo para 0 gozo dos sentidos; forma inferior, discutivel ou requintada, de pragmatismo, nao ha davida que est longe da “torre de marfim” simbolista: 0s gongéricos parecem pressupor sempre a existéncia dum auditério - forma- do ao menos de seus pares — ao qual neces dirigir-se. Poesia e prazer ltidico se confundem no Gongorismo, a0 p ; ceptismo serve-se da dialética e serve como dialética, uma vez que organiza logicamente as ideias com o fito de convencer ¢ ensinar. Compreende-se a ontrarreforma, quando atentamos para o fato de que restava plenamente aos objetivos ecumeénicos, quele movimento clerical. Nao € para menos 6 Barroco € 0 jesuitismo: a Companhia de 1545-1563), organizava-se como wma ¢ dum corpo de doutrina, por sua seja, conceptista. ariamente suas obras deveriam 10 que 0 Con- alianga do Barroco e da C © processo conceptista se Pp) evangelizadores e pedagogicos da que se estabeleceram vinculos entre Jesus, nascida no Concilio de Trento c verdadeira milicia, armada poderosament vez informada pela ret6rica escolastica, 4 ———— GUESA we 4 LITERATURA pORTUGUE! ae para o fato de 0 Barroco ter Por outro lado, ccumpre atentar para o f \ —_ Comecadg ng 0 aescultura ¢ 4 arquitetura traduzem, mais a prin, s a ita | eos iiss a igi aexitnca de igagdes pouco literiias a ‘a . tado, escrito por ——e Barroco suscitou, em Portugal, wm ample co Leitao Fern ; Arte de Conceitos (2 vols., 1718, 1721) ST - | prelegoes feitas ao longo de seis mam tal de 934 pgs | els an ia, fandadaem 1714 esiniveg es 0s, na Academia dos Anonimos de Lis atividade depois de 1728. BARROCO ® 115, PADRE ANTONIO VIEIRA © Padre Antonio Vieira é a mais alta personalidade, humana e cultural, dessa gpoca, a que a sua estatura invulgar deu nivel e serviu de simbolo perfeito Nele se encontram reunidas, em estranho compésito, as linhas de forca te norteiam o complexo quadro do Barroco portugues. ‘ Nasceu em Lisboa, a 6 de fevereiro de 1608. Aos seis anos, € trazido pata o Brasil. Ingressa no colégio jesuttico da Bahia. Em 1623, entra na Companhia de Jesus, ordenando-se em 1634. Em pouco tempo, granjeia fama de orador eloquente e culto, sobretudo ao ocupar-se da guerra contra os holandeses. Li- berto Portugal do jugo espanhol, a 1* de dezembro de 1640, segue para a Me- tropole com a delegacao que vai hipotecar lealdade ao novo tei, D. Joao IV; Seu talento oratorio atinge entao o apogeu. Ganha prestigio junto a Corte, de que resulta ser enviado em missao diplomatica a Haia, Paris e Roma, mas sem al- cangar éxito. Em 1652, esta no Maranhao, em trabalho de catequese e conver- sio dos indigenas, ao mesmo tempo que denuncia os desmandos de colonos e administradores, provocando-os a ponto de se rebelarem. Em consequéncia disso, retorna a Metr6pole, em 1661. D. Joao havia morri- do cinco anos antes. Por acreditar em sua ressurreicdo e vaticinar para Portugal 0 Quinto Império, no qual o poder temporal caberia ao rei portugués, ¢ o espiritu- al, ao Papa, € acusado de heresia pela Inquisicao. Oito anos decorrem, ao fim dos quais o internam numa casa jesuitica e Ihe cassam o direito de pregar. Posto em liberdade, segue para Roma, onde alcanga que 0 processo condenatorio seja re- visto, e torna-se conhecido como orador do salao da Rainha Cristina, da Suécia. Em 1675, de volta a Lisboa, o desalento dele se apodera, ao sentir infrutite- tas todas as tentativas para anular o tratamento €xce: gressa definitivamente to Br ssivamente rigoroso dado pela Inquisigao aos cristaos-novos. Em 1681, re; sil, e no recolhimento entrega-se a faina de ultimar a redagio e publicagio dos sermoes e de outras obras em preparo. Morte a 18 de julho de 1697, na Baw. Assistido por inquebrantavel dinamismo, © Padre tie pensow wis questées candentes em seu tempo & procurou agir praticamente Pa hes dae rumo compativel com aquilo que julgava correto, HANS Una « a que por si s6 explica a vastidao da sua obra € da sua agio mes es a Neste segundo aspecto, destaca-se a campanha em as dos escravos, indigenas e, por fim, dos judeus, barbara e desumaname! nte torturados pela zl ORTUGUESA 116) A-LITERATURA PO 10 que the advém dessa luta travada acima as lig a humana condicao antes de qualquer verdade », Jo isso Ihe valeu fortes € fatais dissabores, ra grandeza do Barroco luso-brasileiro, Inquisigao. E alto o merit goes sacerdotais ¢ pondo matica ou dogmatica. Tud estrela de primeir tomou-o a estrela de fp coos Contudo, a critica e a historiografia literarias interessa a obra esctita,¢ ty apesar de intimamente associadas Escreveu, além de mai de quinhentas cartas, algumas delas em torneo de importantes WEStOeS (com, as enderecadas ao Marques de Nisa, representante Portugués na Franca, ares. peito dos judeus), obras de profecia: Historia do Futuro (1718), Esperancas & Portugal (1856-1857) e Clavis Prophetarum (escrita em latim, ficou incomplety ¢ inedita), em que, na linha do sebastianismo,? vaticina para Portugal o des, no de Quinto Império, ja previsto na Biblia, no Livro de Daniel. E um ingre. diente desconcertante, mas necessdrio para compreender 0 carater do Padre Vieira, se bem que, literariamente, tenha interesse inferior ao dos Sermées (s vols., 13 publicados entre 1679 e 1690, e 2 entre 1710 e 1718), nos quais concentrou o melhor do seu talento e saber. Para bem se compreender os sermées do Padre Vieira, € preciso ter em mente as caracteristicas fundamentais do movimento barroco. De contomo ag. Tas a atuagio politica, dilematico, contraditério, feito de antiteses e oposicées, instavel como o pro- prio ondular das ideias no esforco de orientar e persuadir, os sermées vieiria- nos correspondem a preocupacao de anular a dicotomia radical existente no ser humano, formado que € de corpo e alma. Entenda-se, todavia, que 0 sit- Sular orador jesuita era barroco mas la dialética conceptista e insurgia- “Prologo do Autor", que abre os Serm nao gongorico, porquanto propugnaa Se contra os excessos gongoricos. No es, declara-o franca e brilhantemente: “Se posts de aletaga : lee Guar A? POMPE de palavas, edo estilo que chamam culo, 7 : et Slo mais florescia, nasceram as primeimas verdrs do (que ra ue Perdoaris quando as encontrares), m “ ——__ as valeu-me tanto sempre a clare=* BARROCO ® 117 s6 porque me entendiam comecé ndiam comecei a ser ouvido; ¢ 0 comegaram também a a ser os que reconheceram 9 seu enganc scu engano, ¢ mal se entendlia jam a si mesmos.” E 0 Sermao da Sexagésima, no qual o orador descre a se apartou “do mais seguido e ordindrio” e que * See een E ‘por isso se poe em primeiri . , * ° Iugar, como prologo dos demais", serve perfeitamente de exemplo, modelo e : s ideias. Espécie de profissao de fé da oratdria conceptista, nele o pregador examina as condigdes indispensaveis para que faca fruto a pa lavra de Deus. O processo empregado e defendido € 0 conceptista, mas a lin- 1m procuta solugdes classicas, como equilibrio, justeza, verdade e clareza, confirmacio de: guage No entanto, de um lado, ataca os gongéricos: “vemos sair da boca daquele homem, assim naqueles trajos, uma voz muito afeta- ¢ logo comecar com muito desgarro, a qué? A motivar desve- Js, a requisitar finezas, a lisonjear precipicios, a brilhar rmaiar jasmins, a toucar primaveras, e outras mil da e muito polida, los, a acreditar empenho: auroras, a derreter cristais, a des indignidades destas” tages, além de recriminar a ten- utiliza uma que outra de suas afe “ah pregado- ista para O retorcido e a agudeza yos-ei com mais pago; OS de la, o Padre Vi e, de outro, déncia concept es! os de ca, achar- Barroco, conceptista € ndo gongorico, flagrante presen¢a (veja-se © tra as de Holanda) para, de de pensar e de reagit: Proce simediiato 0 pregadtor ligt o presente VN 20 respondenelas. Cri presto que deve do pensamento’ com mais passes”. ira parte sempre de um fato real, observado ou de Sermo pelo Bom-Suces- so das Armas de Portugal Con ouvinte, chamando-o a0 dever para despertar as consciencias, de a procurar analo pronto, gulvanizte © o de eletrizagio desse ygias € corm ambos. A imy texto evangélico, rente para o fell en- rma de parentesco aleg scritura (logo post? tadores), faz-se ac 1 colocado de mod um jogo dialético 4 pje' le virtudes. A ten los ocultos, mister rico entre em linguaagem co" ompanbhar dts Conse Jo claro, direto, W6xic indo baisa de to", los, uA dialetica, com os, ingredien- modo, uma fo1 causar 0 peso da E: tendimento dos espec' uencias psicolo- gicas de o problema se! Eo orador desfia-o, enredando os ouvintes, ™ z4-los, para leva-los & acao descortinar paradoxos, ambi 20, commundente- jue nao cess € tivo: impression as atingindo © ob evidenciadora di guidades, sentid ness FF... ON y UGUESA U8 A LITERATURA PORT! brenatumais, leva as conclusdes implicitas nas premissas, Tendo snp tes sobrenaturais, levat as aoe Z jctives morais, como declara no “Prdlogo do Autor”, o Padre Vieira i re objetivos morais, "08 r : convencer para ensinar e orientar, excitando os figis no entendiments 7 conyeneer par fen i : mensagens evang¢licas que pretende transmitir. Examinando 8S ideias leg de Taciog, “®S-com bith, ¢ lucidez, atingindo o seu alvo com invulgar eloquéncia e forga de Persuasie, Estamos em face da parenética conceptista, em que o Tacionalismo Se cas, com uma forma de idealismo dogmatico, representado Pelos textos evangélicgs € que cumpre fazer vivos aos assistentes. Tudo isso confere a0 orador 9 Pape de “duminado”, convicto das ideias que prega, usando processos i insi divulgar, num ardor que nao esmorece, numa estrutut o mais ou dogmaticas diante do auditério, enfrenta dificuldades incriveis mio, que o poderiam levar a becos sem safda; no entanto, vence MITA Vez, 0 Padre Vins “a das virtudes que nela se enalte- -abrupto no assunto, como no * Pregado na Capela Real, em 1650 cf Cf ; Plo, porque J4 disse Quintiliano que a S Por si mesmas, ou supodem a atengao 00 € 6 cag mers Capel Real, em ves da Primeira Sexta-Feit@ BARROCO. ® 119 fas este meu Sermao hoje sera a primeira oragdo evangélica, que, contra todas sem peroragio.” acaba’ as leis da retoric: a vida, 0 Padre Vieira se dispds a ordenar os sermoes para porquanto 6 alguns haviam Quando, no fim blicagao, teve de redigir a maior parte deles, rablicados, em folhas volantes, ao passo que doutros s6 existiam breves ntos, que o senso improvisador do jesufta ia desenvolvendo confor- nncias do momento. Considerando ainda que a oratoria pressu- do orador, com todo o aparato que Ihe € inerente (estatura, ura, entonagao, etc.), 0 texto dos sermées sé corres- 0 ¢ ao modo empregado para o dizer. terior aos eventos, efetuada no recolhi- porventura publicadas contempo- rificacdo: a oratoria, como 0 ribuna, pulpito, ou pal- para a elaboracao so e artificial, pul sido p' apontamen me as circunsta poe a presena fisica yestimenta, Voz, gesto, post ponde precariamente a0 que foi dit De um lado, constituem redacao pos! claustral; e de outro, mesmo as pe¢as go fato resultam numa espécie de pet os no texto, que na a¢ao exercida na t Vieira apenas se amparar num roteiro nte; doutra forma, 0 sermao sairia fal: er sido redigido depois da sua elocucao. ja citados, referem-se as questoes rmées da série “Rosa Mistica”. esto da reacao contra o inv mbém chamado Sermao dos ira Dominga da Quaresma, mento raneamente teatro, reside men co. O fato de o Padre de suas pecas 0 diz clarame como, até certo ponto 0 €, por t Os principais sermoes, além dos que discutiu: a questao dos escravos (se vol. V; n? XX, vol. VI; n° XXVII, vol. VD; a qui holandés (Sermao de Santo Antonio, vol. VIII, ta indigenas (Sermao da Prime da Quaresma). esar de tudo, permaneceu uuve-os, em Portugal no Br dos que Ihe aproveitaram a vida, na atuagio en sociais ne XIV, rast Peixes); a questao dos Sermao da Quinta Dominga O Padre Antonio Vieira, ap gadores de nomeada houve (eho de Sa, Eusébio de Matos), nenhum equiparar-se com ele no talento, nos U a relevancia da obra: é, ch ortugués. E também do Bi nsulado, Se outros pre- rasil, como Antonio de aligao foi cap ranses m favor dos des- om toda a justica, @ figara 8 rasileiro, sem fav mais exponen- protegidos e ni or nenhum, cial do Barroco p arroco br D. FRANCISCO MANUEL DE MELO tomo indica o dom que The antecede 0 nom ligado as casas De origem nobre, ¢ ortugal, nasceu em Lisboa, 23 de novembro de 1608 teais de Espanha e P. pyseeeeeeeeee | N ar e vai combater os turcos; de volta, ¢ atin s a ERATURA PORTUGU 120 ¢ AL! Vida agitadissima ¢ aventuresca: depois dos estudos sob a orientagag jesuitas, entra no servigo mili seine ¢ fequenta a Corte madrilenha, 20 mesmo teMPO que se bare cava ae na Flandres (1639). Liberto Portugal a 18 de dezemipe 0 Corunha, em Mala L adrid, mas nado somente se exime de qual, de 1640, € preso ¢ Ievado a M: Soo i culpa como alcanga ser nomeado para mis pl oa ingles na Holanda. Em 1644, por motivos ainda ignorados, esta preso na Torte de Belém. Onze anos dura 0 processo, findos os quais € desterrado para 9 Brasil (Bahia), onde fica de 1655 a 1658. De regresso a Lisboa, torna-se figura central da Academia dos Generosos, ¢, reabilitado moralmente, € enviado em missag diplomatica ao estrangeiro. Ao regressar, consegue nomeat-se deputado, mas falece a 13 de outubro de 1666, em Lisboa. ‘A sua obra literdria segue-Ihe de perto a vida acidentada de espadachim ¢ homem mundano, uma espécie de vasto ¢ multimodo depoimento de suas andangas de varia fortuna, bem como de sua larga e viva cultura aristocratica e jesuitica. A abundante producao, jamais interrompida, mesmo quando o in- fortunio o lanca na prisao e no desterro baiano, abrange espécies e géneros va- ios: a poesia, a historiografia, o teatro, a polémica, a biografia, a literatura moralista, a epistolografia, nas duas linguas ibéricas. A poesia de D. Francisco Manuel de Melo esta reunida nas-Obras Métricas (1665), divididas em quatro partes, “Panthéon. A la Inmortalidad Del Nombre Ithade”, “Las Tres Musas del Melodino”, “Segundas Trés Musas do Melodino”, “El Tercer Coro de Las Musas del Melodino”, das quais s6 a terceira escrita em vernaculo. Esta, subdividida em “Tuba de Calfope”, “Sanfonha de Euterpe” € “Viola de Talia”, interessa-nos mais de perto: nela ecoam vozes poéticas qui- nhentistas, Camées a frente, a0 mesmo tempo que reflete viva adequacio 4 mentalidade barroca. Dotado duma sensibilidade inquieta, saltitante, D, Francisco Manuel de Melo entrega-se, em poesia, & euforia no jogo das imagens, que progressiva- mente vai cedendo ao gosto do Conceptismo, Seu talento parece coartado Pe- las imposigées barrocas: poucas vezes conseguiu romper as conveniéncias & produzir obra em que pulsasse uma vivida experiéncia das coisas e dos ho- mens. Assim fez em alguns sonetos e églogas, apesar da tendencia para 0 Te" buscamento vocabular e conceptual, BARROCO -% 121 A historiogtafia nao era o forte de D, Francisco Manttel de Melo, posto Ihe tencia aventuresca. Escreveu a biografia de D. reflita o talento, a cultura e a ¢ Teodosio I (publicada em 1944), o Tacito Portugués - Vida e Morte, Ditos e Feitos dc El-Rei D. Joao IV (publicada em 1940, pela Academia Brasileira de Letras), mas a stta obra historiognifica mais importante sdo as Epandforas de Varia His- tes: a “Epanafora Politica”, que toria Portuguesa (1660), divididas em cinco pa narra os acontecimentos relacionados com o motim de Evora, de 1637; a ~Epansfora Trigica”, que trata do naufrigio da armada de D. Manuel de Mene- ses, ocorrido em 1627, e no qual foi dos poucos que conseguiram salvar-se; a Epanafora Amorosa” é a mais sugestiva de todas, do ponto de vista lterario: num estilo brilhante, D. Francisco Manuel de Melo conta-nos a lenda acerca do descobrimento da ilha da Madeira, levado a efeito por dois amorosos ingle- ses, Roberto Machin e Ana d’Arfet; ainda no século XVII, esta “epanafora” foi traduzida para os idiomas francés e inglés; a “Epandfora Bélica” relata dois combates navais havidos entre a frota espanhola e a holandesa no Canal da Mancha, em 1639, dos quais D. Francisco Manuel de Melo foi espectador; a “Epanafora Triunfante”, que nos comunica os sucessos determinados pela res- tauragéo de Pernambuco, em 1654. Para o teatro, D. Francisco Manuel de Melo escreveu em castelhano varias pecas que se perderam, e 0 Auto do Fidalgo Aprendiz (que se publicou apenso as Segundas Trés Musas, em 1665). Composta provavelmente antes de 1646, a peca combina a influéncia do teatro popular vicentino com a comédia greco-latina, italiana e espanhola. Quer-se crer que haja inspirado a Moligre o Le bourgeois gentilhomme. Uma graca nova e a movimentacao incessante dos protagonistas, conferem interesse & peca, sobretudo criando ardis, enganos e quiproqué quando nos lembramos da escassez de teatro durante 0 século XVII Todavia, € na epistolografia e nos escritos morais que D. Francisco Manuel de Melo atinge o maximo de inventividade. Escreveu cerca de vinte mil cartas, & maior parte delas na prisio, de cuja experiéncia sio registro fiel. Dois anos antes de morrer, em 1664, publicaram-se em Roma as suas Cartas Fumiliares, de cara- ter confessional e documental, mas o escritor fala menos de si do que das gentes € acontecimentos contemporaneos, mantendo sempre compreensivel reserva, Redigindo-as com evidente intuito literirio, submeteu-as a rigoroso poli- mento estilistico, sem, contudo, desfazer o ar de angustia ironica em que se encontrava quando preso, visivel no tom sentencioso, conceptista € vagamen- aU A LITERATURA PORTUC ssa, amparado no eMprego CMA Tinga oralista @ vg aeaisinos ¢ NOlOgISMOS, explica gj ecto mi te filosofante. O aspecto 7 me in epressdes populares, mas € ea ey gular inteligéncia tesa ¢ nt Fa camo retraro una singular inteligencia © dun, ri pgrafia co dessa epistologt contraditorio, / ‘a ; ae ma ordem de ideias sitta-se a Carta de Gu te Casados (165) sa mesma | Gu ssa anual do casamento, escrito COM Brae, HuMOr e vivag uosos das relacdes matrimoniais, Por a} do. Aqui também a Sua prog, gcie dem uma especie de de. ao surpreender os meandros tort gu aradoxal morreu solteit mente, morreu guem que, paradoxa ‘crs ganha acentos coloquiais, gracas a importancia conferida aos modi ° pulares ¢ as “sentengas” e conceitos carregados dum filosofismo ligeito, sori. dente e pragmatic, como de resto também jé fizera em Feira de Ane, (publicada em 1875). Nao obstante haverem transcorrido mais de Uezentos anos, a Carta de Guia de Casados encerra muita atualidade: com rara argtica, © moralista surpreendeu na sociedade do tempo facetas ainda hoje vivas em matéria de casamento. Identica atmosfera moralista repassa os Apdlogos Dialogais (1721), em ni. mero de quatro: “Rel6gios Falantes”, “Visita das Fontes”, “Escritorio Avaren- (oe Hospital das Letras’. Aqui esta o melhor de quanto escreveu D. Francisco Manuel de Melo, pela feliz uniao de invulgares dotes de Percuciente e satitico observador das gentes do Seiscentismo, com um estilo Vivo, gracioso, pito- Tesco € comunicativ: Ivou (A Aula Politica, Curia Militar, 1720, ugal, 1647) embi g , embo} » COnstit ™ ostente as Peculiares qualidades de escti- ‘Ml aspecto menos Televante PADRE A NUEL BER “RNARDES Nasceu em Lishog od ’ Bosto d ns me Neri a ies ‘rinta anos, abraga a Congre- vnergin, ° 70 silencio claustral até o fim BARROCO ® 493 dos seus dias, entregue a meditaca lo € a. compor a " su Jouqueceu dois anos antes de falecer, a 17 de agost me ce moralista, En : sto de 1710. Asua existéncia, apenas assinalada por duas dat as, ; diametralmente as do Padre Antonio Vieira, Infenso a side any obra opdem se . Infenso a vida ativa i eao cil, era um contemplativo e mistico por natureza eas obras que leew wel : que legou, refle- tem nitidamente essa condigao, ; i aera ee ae 1. suas obra clhos voltados para o plano transcendente, embora nao esquecese Rane gir igualmente para os seus semelhantes, dentro e fora dos mosteitos. Por isso, a0 comunicar-se com o lei 4 pedago ia: is gus ould Veo ls gen ante oe 7 quece jamais de molhar a pena com a ungida contemplacao espiritual em que se compraz. Quer ensinar 0 ho- mem a encontrar Deus pelo culto das virtudes morais mais auténticas nele, precisamente as que Ihe conferem a marca de criatura humana ‘A numerosa obra, em que se espelham relevantes qualidades de escritor e pensador cristo, construiu-a com esse tinico destino: Nova Floresta (5 vols. 1706, 1708, 1711, 1726, 1728), Pao Partido em Pequeninos (1694), Luz e Calor (1696), Exercicios Espirituais (1707), Ultimos Fins do Homem (1726), Armas da Castidade (1737), Sermoes € Praticas (2 vols., 1711), Estimulo pratico para seguir o bem e fugir do mal (1730). A Nova Floresta € a obra mais conhecida, oescritor atingiu o pice de suas faculdades literarias. Ao mesmo tempo, & nalaa realizagao plena do seu proceso: 0s topicos de que trata estdo dispostos ma Racional, Amizade, Amor Divino, Apetites, Armas, matérias afins: Absti- entre outras razOes porque nela em ordem alfabética: Al Astucia, Avareza, etc., po’ néncia: Jejum; Alegria. Tristez Conscio do poder insinuativo e trans| el Bernardes procura ati a até 0 leitor, conta-lhe wm “ : opula, € dele extra ca, historica ow mest0 PC dite et oral do verdadeire cristo, J quanto lhe parece St ys da fala co voca- 1 vezes reunindo num s6 t6pico Anos. Idade. Tempo; ete. formador das palavr giro mutxitno de ras, como bom con- eleito ceptista que era, o Padre Manu com 0 minimo de recursos: baix: plo”, de origem religiosa, ou piblic as ilacdes que julga fundamentals Para consegui-lo, despoja 4 i Pérfluo, como quem procurassé ¥! confessional, mas sem perder dign! bulétio e uma sintaxe direta, clara, so", wy “ENED para a formato 1 inguagem de twa a m andamento € um tom proxime dade, altura e brilho. Utilizando 1 d yontam Jassica, em qUE raramente despont A ~\ ™ de Sf © A LATERATURA PORTUGU! 124 ns harvoeos, simplifica a doutring gg ‘Ula. Ajuda.g sg semelhantes recurs ; ——— centi-la, interpreté-la ¢ assimil co leitor comum possi maa que ole simples, a ingenuidade cré dula com que atributa fotos tarefa de falar aos simples, * Jade a meras lendas ¢ ficgdes. Por outro lado, certas notacoes “Tealistay verdade a mers a vida crior, e1 denunciam um sacerdote interessado na vida exterior, embora por Vias ing jenuncia ste . relas, como 0 sionatio. elas, como o confessio cla fluéncia ¢ clareza da linguagem, em que nao € estr; . xencia ¢ cla in q anho o ing conceptista ¢ latino, pela elegancia, espontaneidade, Precisdo e CaSticismy verbal, o Padre Manuel Bernardes tornou-se um auténtico modelo da Pros ltcraia seiscentista, Pelo estilo, ealizou um anseio geral no tempo, ¢ re reclusto claustral, um ideal de vida contemporaneo, qual seja, a ascese de po medieval. CAVALEIRO DE OLIVEIRA acontecendo ao pai, Abandona a Patria pai toda ordem, amorosa, emtdo em Viena, junto a Tepresentacao diplomatica. ra Sucede-o, Dai por diante, é um rol de aventuras administrativa, diplom, Veira enqua i area quadra-se ng Capitulo da literatura moralista er vivido em Pleno séculg XVIIL Tendo escrito quase todas cabe na Literatura Portuguesa. Escre- ata 'S amorosag sobretute Propésitos definidos e pragmiaticos: ques que Ihe era © Por meio de cartas, defender-se dos mn dirigia Pan . Os, & satin - leu, mas nag Conseguin, viver 4 "ZAI OS USOS € costumes do tempo. Pre 5 fa pena, BARROCO * 125 O seu espolio litertio consta dos se (1741), Memérias das Viagens (1741), M Familiares, 2 vols. (1741-1742), Amusem, tique (1756), Suite do Discours pathétique vina dos Arcos (1751) e Le Chevalier d’Oli Todas elas, especialmente as Cartas ‘guintes titulos: Mémoires de Portugal ille et une observations (1741), Cartas ‘ent périodique (1751), Discours pathé- (1757), Reflexoes de Felix Vieyra Cor- veyra bralé en effigie (1762). ‘amiliares e 0 Amusement périodique (tra- duzido para o vernaculo com o titulo de Recreacao Periédica), constituem docu- mentos de primacial importancia para o conhecimento da sociedade lisboeta ¢ europeia do século XVIII. Se 0 estilo deixa a desejar por vezes, 0 contetido das observagdes tem sabor de coisa viva, enriquecido dum travo picante empres- tado pela narracdo de aventuras galantes mais ou menos autobiograficas MATIAS AIRES Nascido em Sao Paulo, a 27 de margo de 1705, muito novo ainda segue para Coimbra, onde estuda Artes e Direito, Termina a formagao escolar em Franca. De volta a Portugal, herda grande fortuna e o cargo de Provedor da Casa da Moeda. Falece a 10 de dezembro de 1763, em Lisboa. Escreveu o Problema de Arquitetura Civil (editado postumamente, em 1770, esuscitado pelo terremoto de Lisboa de 1755) e as Reflexdes sobre a Vaidade dos Homens (1752), nas quais, a par da influéncia do pensamento morallista de La Rochefoucauld (1613-1680), autor das Maximas (1665), se observa um espi- rito que encontra forte identidade entre suas ideias e as do Eclesiastes. Pessi- cia do mista, mas dum pessimismo estoico, porque corresponde A consci mal e ao desejo de o repelir, admite a vaidade como centro de todas humanas: “vaidade das vaidades, tudo é vaidade” O seu moralismo € de raiz teleologica: faz crer nas compel nientes da superacdo da vaidade, e do cultivo da vida simples. Pensamento, de que nao € estranho o paradoxo ¢ a concisio sintatica, permite ver em Matias Aires um digno representante do Barroco, inclusive pelo estilo, Preso aquilo que entao era moda, sobretudo dentro da ala conceptista, Entre- tanto, aceita, embora parcialmente, 0 que 0 Iuminismo francés trazia de novo Com a sua tipica atitude racionalista, e assume posturas mentais antecipadoras as. acd des adve- e corpo de do Pré-Romantismo. 126 © A LITERATURA PORTUGUESA A“ARTE DE FURTAR” Importante obra dentro da prosa doutrinaria barroca, publicada pela emt Primera vez em 1652, ¢ escrita por um “Portugués mui zeloso da Patria’ » We preferiy rmanter-se andnimo, Quem seria ele? Varios nomes tém sido lembrados: Pan Antonio Vieita, Jodo Pinto Ribeiro, Tomé Pinheito da Veiga, Duarte Ribeirg gg Macedo, Antonio da Silva e Sousa, D. Francisco Manuel de Melo, Antonio ge Sousa de Macedo, Pe. Manuel da Costa. Embora os trés ultimos nomes te. nham merecido, desde os princfpios do século passado, investigacao acurad, com indicios de probabilidade, a questéo continua aberta. Como o titulo sugere, notadamente se o tomarmos na integridade (Arte de Furtar, Espelho de Enganos, Teatro de Verdades, Mostrador de Horas Minguadas, Gazua Geral dos Reinos de Portugal), trata-se duma impiedosa satira das trapa- as, grandes e pequenas, cometidas por baixos funcionérios e por ministros de Estado, e generalizadas na Corte e nos escalées administrativos, durante o rei- nado de D. Joao IV, isto é, nos anos seguintes a reconquista da autonomia por- tuguesa, em 1640. O seu valor reside no fato de ser documento precioso da situacao burocratica e fidalga daquela época, gracas ao sentimento patristico que leva o satirico a auscultar com fidelidade os minimos pormenores da cole- tiva decomposigéo moral Referindo-se a situacdes e homens contemporaneos, € explicavel que pro- Curasse 0 anonimato para mais livremente retrata-los. Tem menor interess¢ li- terario: sobejam na obra os tipismos expressivos barrocos (antiteses, hipétbates, etc.) que, a custa de repetidos, revelam despreocupacio de criar estilo e att buem certa monotonia & narrativa. O seu conterido sattrico, todavia, € ainda hoje incrivelmente valido e vivo, como se nada houvesse mudado ao longo & séculos: 0 autor poderia encontrar em nossos dias, por toda a parte, ainds mais farta quantidade de exemplos merecedores da sua violenta diatribe. APOESIA BARROCA Diverso da literatura doutrinaria e moralista é 0 camino seguido pela poe! O proprio afeicoamento ao ideario barroco, especialmente na vertente gS” Fica, limita o alcance e o sentido da poesia escrita ao longo do século XVI! ® BARROCO © = 127 primeira metade do século XVIII. Considerada poesia para entreter, valia pelo carater hidico, pelo divertimento verbal, expresso no malabarismo das ima- gens ¢ das correlacoes sintaticas, que acabou sendo principio, meio e fim. Por outras palavras, a poesia barroca corresponde mais ao culto da forma, do ver- so, que do contetido, do sentimento, da emogao lirica. Esse gosto pela pirotecnia vocabulat, sintatica e versificatoria, explica-se pelo aproveitamento indiscriminado e mecanico daquilo que nas artes plasticas contemporaneas era 0 gosto dos cromatismos, dos volumes, das solucées im- previstas, da aproximacao de contrastes, 0 jogo de claro-escuro, etc. Tudo quanto, a0 fim de contas, constitui o arsenal poético gongorico. Nessas citcuns- tancias, é facil compreender que sé raramente o lirismo barroco supera a me- diocridade e ganha interesse estético, muito embora valha por seu lado estilistico e linguistico. Na verdade, somente raras composicées alcancam dizer-nos algu- ma coisa: tudo o mais pereceu com o tempo que Ihe deu causa e razio de ser. A poesia barroca em Portugal apresenta-se em figuras isoladas e em anto- logias organizadas com intuito idéntico ao que presidiu 4 compilagdo dos can- cioneiros medievais. Quanto aos primeiros, sobressaem D. Francisco Manuel de Melo e Francisco Rodrigues Lobo, os mais representativos do século XVIL portugués, em que se cultivam a poesia lfrica, a satirica e a épica. No ultimo tipo se enquadram poemas heroicos, obedientes sobretudo ao modelo camo- niano, como Ulisseia ou Lisboa Edificada (1636), de Gabriel Pereira de Castro (1571-1632), Afonso Africano (1611), de Vasco Mouzinho de Quevedo Castel- Branco, Malaca Conquistada (1634), de Francisco de Sé de Meneses (morto em 1664), Ulissipo (1640), de Ant6nio de Sousa de Macedo (1606-1682), ete. FRANCISCO RODRIGUES LOBO Nasceu por volta de 1573, em Leiria, cuja beleza natural the inspirow parte da obra. Talvez cristéo-novo, morreu afogado no Tejo, a 24 de novembro de 1621. Sua obra poética € formada pelo Romanceio - Primeira e Segunda Parte dos Romances (1596), as Eglogas (1605), 0 poema épico O Condestubre (110) © pela Jornada... que Dom Filipe I hizo a Portugal (1623), € pelos poemas espar- Sos em suas novelas pastoris: A Primavera (1601), O Pastor Peregrino (1608), 0 Desenganado (1614). i pUGUESA 128 © A LITERATURA PORTUGUE yuics Lobo serve de clo de ligagao entre 8 Does inte na parte telativa a Camoes, de quem foi g 1M . soesia barroca. Esse cardter precursor vem docy, sequen 8 a sua inspiracdo pottica: as composigdes ing Francisco Rod nhentista, notadamente Mtlcg Menta : 4 CTidas py melhor que ats logia pastoril. + naiores contatos barrocos. Aind: Como prosador, evitou 1 ‘a eScrevey Cony na Aldcia ¢ Noites de Inverno (1619): a obra compée-se de dezesseig em prosa, travados em noites sucessivas por homens de letras, nu proxima de Lisboa, debatendo assuntos relacionados com a educag: mem de sociedade, fidalgo ou nao. Nos dialogos V, IX, X e XL, espe: faz-se a sumula duma teoria literaria do Barroco, na qual se inse, Midlons Ma aldig 80 do br, Clalmene TeVe 0 mig antigo conceito de conto em vernaculo, 0 que mais acentua o carate sor de Francisco Rodrigues Lobo, inclusive em tela no século XVI. er precy. C40 a boa prosa Cultivad, A“FENIX RENASCIDA” EO “POSTILHAO DE APOLO” ‘Se rc bt ~ cm cinco volumes, entre 1716 € 1728, e com na, revelada na glosa das tpicas “apudezas" teress nes (Eco Te Eco I), em 1761 € 176 als jorge es OMposta igualmente de poe Olhos SA ate g on- da Feniy Renaseigg oS. Alem dos poe mais grave, o influxo de G0 ‘ M no P, est teferidos como participan'® ‘Ostil 40 de Apolo, dentre outros: Euséb? * Nesta cole OS BARROCO © 9g de Matos, Bernardo Vicira Ravasco, Franc Xavier de Meneses. Apesar da sua importancia, Jeronimo Bata (Coimbra, ¢ Castelo, 1688) ainda nado mereceu que fossem recolhidos eee poems publicados nas referidas coletaneas. Parte eee a conn, buigto para a Fenix Renascila foi estampada num volume, opattande nn pe Diez, sob o titulo de Poesia de Jeronimo Bata nA Fenix aera oem Jerdnimo Baia € um barroco tipico, seja na variedade das formas a decimas, sonetos, madrigais, cangées, silvas, romances), seja na mean C0 Rodrigues Lobo, D. Francise ancisco do tom, que gravita entre 0 jocoso e o sério, tendo de permeio os temas mito- légicos, comemorativos, satiricos, ora na clave lirica, em torno do amor, ora tentando a poesia épica em Alfonseida, ou o idilio panegirico em Latim (Elisa- betha Triumphans). O “Lampadatio de Cristal”, mencionado acima, é 0 poema mais representativo do seu estro poético e da propria estética barroca. Soror Violante do Céu (Lisboa, 1601-21 de janeiro de 1693), Violante Silveira Montesinos de nome, professou na Ordem Dominicana em 1630, continuando a escrever poesia, dispersa pelos dois cancioneitos referidos e pelo Parnaso Lusitano de Divinos e Humanos Versos (2 vols., 1733), reunida em vida nas Rimas Varias, em 1646, e reeditada, com introdu¢do, notas e fixagio do texto de Margarida Vieira Mendes, em 1994. Constituida de sonetos, madrigais, cangSes, romances, silvas, caracteriza- se acima de tudo pelo carater laico. Escrita em vernaculo e em espanhol, con- tém panegiricos e poemas de circunstancia, a pat de poemas amorosos, que constituem a faceta mais relevante em densid Conceptismo, engenhosa, gira em torno dos transes tica do amor, tendo como extren lade e ntimero. Inclinada ao da experiéncia amorosa, ps enue a " = ne mais do que da casuis mos 0s ne vida e a morte: “Nao quero sem Silvano ja ter vida, pois tudo sem Silvano é viva morte, Ja que se foi Silvano venha a morte, perca-se por Silvano a minha vida” a “retorica muda” ou © “retrico a, voltada as vezes para Y e arte”, acionada po A “métrica ciénci: sr conceitos silencio” da pintura, revela mestria, “engenho SUESA Y 130 © A LITERATURA PORTUGU! eixa e a ; tipicos da cultura barroca, nao sem deixar margem a uma forga invent stingue Si re as escritoras Va gy ic Séror Vi o Céu entre as do tempo. Me gue Séror Violante do Céu ent of Pp AHISTORIOGRAFIA. A HISTORIOGRAFIA ALCOBACENSE No setor da historiografia seiscentista, observa-se flagrante regressio, Cessa, das as causas que justificaram o fervor ufanista dum Jodo de Barros, em Vig tentaram os historiadores da época barroca escrever obra otimista ¢ de teor épico. E 0 caso, por exemplo, dum D. Fernando de Meneses, Segundo Cony de Ericeira (1614-1699), autor da Historia de Tanger (publicada em 1732), dum Manuel de Faria e Sousa (1540-1594), autor de Asia Portuguesa, Africa Portuguesa e Europa Portuguesa (publicadas entre 1666 e 1681), de D. Luise Meneses, Terceiro Conde de Ericeira (1632-1690), autor da Historia de Portu- gal Restaurado (primeira parte, 1679-segunda parte, 1698), ou de Jacinto Fre. re de Andrade (1597-1657), autor de Vida de D. Joao de Castro, quarto vizo-rei da India (1651). No geral, a atividade historiografica recolheu-se a certo servilismo aristo- cratico, ou, refugiando-se nos mosteiros e conventos, tornou-se enfarruscada, introvertida, subjetivista e retrograda. Por fim, derivou para o campo da ert- dicéo, pacientemente acumulada sem outro Propésito que o de colecionar di- dos segundo uma concepcao ultrapassada e fantasista da Historia. E 0 que se nota no caso da Porque enfeixava o labor intelect Alcoba¢a. A obra coletiva que es tre 1597 € 1727), distribui-se p. seguintes monges: Frei Bernard. Tas partes, Frei Antonio Brand: “historiografia alcobacense”, assim chamad tual de geracdes de sacerdotes do Mosteito de creveram, Monarquia Lusitana (publicada er OF Oito partes, em cuja feitura participaram os o de Brito (1568-1617), autor das duas prim’ 40 (1548-1637), autor das duas seguintes, Fret 0), autor da quinta e da sexta, Frei Rafael de Jt étima, e Frei Manuel dos Santos (1672-1748 autor da oitava, © lapso de tempo abrany los que med bando-se m ido pela Monarquia Lusitana corresponde aos" scimento do mundo e o reinado de D. Joao I. Est i 0 medieval e imaginosa da Historia, seus autores ™ ‘clam entre o nas ‘uma concepcao 4 | BARROCO © 131 temeram recolher tudo quanto era fabula ¢ mitologia relacionada com a historia de Portugal, a comegar de Adao e Eva, ao mesmo tempo que davam por verda- geiros documentos apéctifos, ou inventavam-nos quando necessatios a0 pano- rama que pretendiam oferecer. Nao obstante redigida com mestria nalgumas partes, a obra sofreu compreensivel descrédito como expressao da verdade ou como interpretagao historiogrifica, Relevancia maior exibe Frei Luis de Sousa, FREI LUIS DE SOUSA [Antes de entrar para a vida religiosa, chamava-se Manuel de Sousa Coutinho. Nasceu em Santarém, por volta de 1555, e faleceu em 1632, em Lisboa. De- pois de prestar servigos a Felipe I em Espanha, regressa a Portugal e casa-se, em 1583, com D. Madalena de Vilhena, vitiva de D. Joao de Portugal, desapa- recido em Aleacer-Quibir com D. Sebastiao. Anos mais tarde, quer a lenda que uum peregrino foi ter a Lisboa para dizer a D. Manvel que o primeiro marido de D. Madalena ainda era vivo em Jerusalém. A morte da filha do casal apressa aexecucdo dum propésito anterior, e ambos tomam habito, ele, no Convento de S. Domingos de Benfica, onde assume 0 nome por que € conhecido, ¢ ela, no do Sacramento. Tais fatos € que inspiraram a Garrett a tragédia Frei Luts de Sousa, obra-prima no género. De Frei Luts de Sousa resta-nos pouco: Vida de D. Frei Bartolomeu dos Mar- tires (1619), com base nos apontamentos deixados por Frei Luis de Cacegas, Historia de Sao Domingos Particular do Reino e Conquistas de Portugal (1623, 1662 e 1678), ainda aproveitando material levantado por Frei Luis de Cace- gas, e Anais de D, Joao Ill (publicados em 1844), além de outras obras, que se perderam para sempre. Contrariamente aos processos empre gados em Alcoba- a, Frei Luts de Sousa via de regra p0e rigor e severidade na interpretayo dos fatos e documentos, o que desde logo o recomenda como historiador, em que as observacoes. O seu mérito, para nos fluente, plastica, Pese o carater apologético e edificante d mais significativo, reside no estilo: pela linguagem casti¢a, apropriada ao andamento psicoldgico, moral ou factual das cenas, tornews verdadeiro mestre, ao lado do Padre Vieira e do Padre Bernardes, Evitancdo os excessos barrocos, procurou sempre a sobriedade na variedade, e acabou sen- do um modelo da melhor prosa do século XVII. — LITERATURA PORTUGUESA B28 4 A EPISTOLOGRAFIA anhou fisionomia literaria a ante o aX stolografia ga C aulo XVI, a epistologr ' ante o scculo XVI, tgenron | ia a ta da epistola cm verso, 0 remota quanto Horacio, seu ef} ' " In, Nao se tata da ; is a. emt prosa, Com fungaio es] pecifica de informar acerca dag, 4 eg ra viv daca . . ‘ J ow alheia, ¢ fazer comentarios, a modo de crdnica ou teportagem soal ow alheia, ¢ faz diaria, Embora desde 0 Renascimento ja se serene cartas desse tipo ips exemplo, as cinco de Camoes ¢ as nove de Jeronimo Osorio, intituladas Carey ), € s6 no decurso do Barroco que aparecem numa ProfUS&O € con atingidas, antes ou depois. Ca vig, Portugues uma categoria poucas vezes © grande modelo no tempo é Madame de Sévigné, com seus oito voung, de Lettres, escits a partir de 1671, e apenas publicadas no século XVit,y, caso, a carta faz as vezes do jornal, entao ainda raro mesmo nas mais adianty, das metrépoles europeias. Aos poucos a carta se tornou exercicio Titeratig, chegando até a prescindir de destinatario certo; o epistolografo imaginava un qualquer ou dirigia-se a uma audiéncia ficticia. A moda foi seguida em Portugal por escritores de nomeada, entre 0s quais, © Padre Antonio Vieira, D. Francisco Manuel de Melo, Frei Antonio das Chagas Cavaleiro de Oliveira e, de modo muito especial, Soror Mariana Alcoforado. SOROR MARIANA ALCOFORADO 'Nasceu em Beja, em 1640. Cedo professa no Convento de Nossa Senhora dt Concei¢ao em sua cidade natal. Em 1663, conhece Chamilly, oficial francés servindo em Portugal durante as guerras da Restauragdo, Enamoram-se Ut dia, porém, o militar regressa a Franca, impelido por chamado superior. ES" seem 1667. Teriam trocado cartas, das quais $6 fi 4, que falece a 28 de julho de 1723 Em 1669, publicam-se, em Paris Eraduites en francais, sem declarar 6 nom mesmo ano, sai nova edi religieuse écrites au Chevalier €ra.o seu destinatatio e o Bundo, Guilleragues, No 4 icaram as escritas pela relist” apés longa e dolorosa penitenci. pela primeira vez, as Letts Portus ne do destinatario e do trator: NI © em Colonia, com o titulo cle Lettres d'Amour "de C., Offcier Francais en Portugal, declarando a"

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