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Arlindo Begonha
Arlindo Begonha
ARLINDO BEGONHA
Professor Auxiliar
FEUP - UP
Porto - Portugal
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO
A defesa do Património inclui não só o respeito pela dignidade que os edifícios merecem, mas
também a sua manutenção, conservação e medidas de intervenção necessárias para manter o
seu bom estado de utilização/conservação.
Para realizar o diagnóstico, utiliza-se um conjunto de técnicas, análises e ensaios que ajudam
os diversos técnicos de diferentes áreas do conhecimento a estabelecer os danos e sua génese,
isto é, os mecanismos de degradação.
Com base no diagnóstico, é possível indicar as técnicas e produtos adequados com o propósito
de: eliminar as causas que provocaram as anomalias; corrigir e/ou eliminar os danos causados
pelas mesmas; tomar medidas e/ou aplicar produtos de protecção e conservação que impeçam
ou atrasem o mais possível o processo de deterioração da pedra.
A Figura 1 refere-se ao Mosteiro da Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia, estudado por
Madureira (2008) [1]. Apresenta uma gravura alusiva aos bombardeamentos que decorreram
nos dias 13 e 14 de Outubro de 1833, em que foram disparadas cerca de 3000 granadas e
bombas vindas das baterias Miguelistas localizadas no Porto e em Gaia, aquando do cerco do
Porto pelas tropas Absolutistas durante as Guerras Liberais. Na mesma figura, mostram-se
marcas de canhão ainda hoje evidentes em diversas fachadas do Monumento Nacional.
A ausência de manutenção pode ter como objectivo a destruição propositada de imóveis como
sucede num conjunto de edifícios em banda na Rua de 5 de Outubro, onde foram retiradas as
fiadas de telhas sobre as paredes exteriores de modo a acelerar o apodrecimento das coberturas
(Figura 3).
Figura 1: Mosteiro da Serra do Pilar em Vila Nova de Gaia - Gravura alusiva aos
bombardeamentos de 13 e 14 de Outubro de 1833 e marcas actuais de balas de canhão.
Os graffiti são percepcionados pela sociedade em geral como uma forma de vandalismo,
contributiva para a degradação local das zonas onde são instalados. É opinião de muitos, que os
graffiti podem até sugerir que se está em presença de locais violentos ou mal frequentados,
especialmente se estes forem de natureza obscena, racista ou sectarista. No entanto, é usual o
cidadão distinguir entre graffiti que podem ser considerados como uma forma de arte,
nomeadamente desenhos que servem para “dar vida” a superfícies “cinzentas”, com o
propósito de transmitir uma mensagem, seja de cariz político, social, económico ou até
publicitário, de outros nos quais as superfícies são literalmente desfiguradas com tags ou
rabiscos (Figura 5).
A insensibilidade é igualmente uma forma comum de revelar a total ausência de respeito pelo
património e a dignidade de um edifício ou Monumento Nacional. A Figura 6 exibe um
conjunto de estruturas provisórias de carácter lúdico, integradas nas comemorações do
Carnaval na Cidade do Porto, totalmente inadequadas e despropositadas para serem montadas
junto à estátua de D. Pedro IV na Praça da Liberdade e na placa central da Avenida dos
Aliados.
1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 87
Viaduto na Rua Domingos Sequeira – Maio 2010 Monumento a Camilo – Janeiro 2006
Figura 5: Porto – Tags em estruturas de betão e num monumento em cálcário.
A Figura 7 apresenta duas imagens do Mosteiro de Paço de Sousa antes e após a intervenção
realizada pela DGEMN na década de trinta do século XX [3].
88 JMC’2011
3.1 Introdução
De acordo com o mesmo inventário, a Igreja Matriz de Caminha é de transição entre o estilo
gótico tardio e o renascentista (Figura 8), integrando-se na tipologia das igrejas de estilo
Manuelino de três naves, com cobertura de madeira, de dois andares na nave central e
cabeceira abobadada, seguindo assim o esquema das igrejas mendicantes do gótico português.
A torre sineira é recuada relativamente ao frontispício orientado para poente.
Figura 9: Igreja Matriz de Caminha – Vista Geral antes dos trabalhos realizados pela DGEMN
na década de 30 do século XX, observando-se ainda as janelas abertas no século XVIII [5].
Assim, segundo o mesmo Boletim nº 6 da revista Monumentos [5] e atendendo apenas às obras
relacionadas com a pedra, referem-se seguidamente apenas alguns dos muitos trabalhos
efectuados: demolição dos edifícios que mascaravam exteriormente a ábside; demolição de
uma capela e seu anexo existente na fachada Norte, reconstruindo-se a parede primitiva com os
modilhões e cornija; demolição de um pequeno edifício acrescentado à capela do Bom Jesus
dos Mareantes (Figuras 10a, 10b), reconstruindo-se com silhares de cantaria a parede testeira
da capela que havia desaparecido; demolição de dois altares encaixados na parede da nave Sul
(Figura 10c), reconstruindo-se a mesma parede em cantaria; derribamento do pórtico
improvisado no segundo tramo da arcada do lado Norte, por debaixo do orgão e do grande coro
que ocupava toda a parte inferior da igreja, compreendendo o contraforte exteriormente
construído para aguentar o impulso dos respectivos arcos de cantaria.
Figura 10: a) b) Demolição de um pequeno edifício acrescentado à capela do Bom Jesus dos
Mareantes; c) Demolição de dois altares encaixados na fachada Sul [5].
3.3 Estudo do granito de grão médio de duas micas e do aplito de duas micas
Analisadas por difracção dos raios (DRX-rocha total), as duas rochas apresentam-se
meteorizadas, contendo pequena percentagem média de minerais secundários (percentagem de
argila entre 2,0% e 2,1%). A observação por MEV revelou a presença de cristais meteorizados
de plagióclase sódica e de moscovite e dos minerais de meteorização gibsite (Al(OH)3) e
caulinite (Al4(Si4O10)(OH)8). De acordo com Sequeira Braga (1988) [6], Begonha (2001) [7],
Sequeira Braga et al. (2002) [8] e Begonha e Sequeira Braga (2002) [9], a caulinite e a gibsite,
1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 91
Begonha (2004) [10] refere que no exterior do monumento, a ascensão capilar é importante.
Com efeito, o monumento está fundado sobre uma antiga praia fluvial do Rio Minho e o nível
freático encontra-se a menos de dois metros de profundidade, oscilando de acordo com o nível
das marés.
c)
a) b)
d)
Figura 11: a) b) Desagregação granular afectando pedras de aplito no Portal Oeste;
c) d) Colonização liquénica na fachada Oeste (c) e na platibanda rendilhda (d).
92 JMC’2011
A actividade biológica era muito intensa na Igreja Matriz de Caminha com desenvolvimento de
líquenes, algas, musgos, fetos e fanerogâmicas. Havia desenvolvimento generalizado de vários
tipos de líquenes, incluindo variedades incrustantes (Figuras 11c, 11d), em todas as fachadas
desde a base até ao topo. O seu crescimento impedia frequentemente e por completo a
observação da pedra e a leitura dos pormenores escultóricos em diversos sectores,
nomeadamente na platibanda rendilha (Figura 11d).
No interior da igreja, a ascensão por capilaridade era igualmente muito importante. Muitas
pedras do pavimento encontravam-se quase saturadas, exibindo inestéticas manchas
acastanhadas e elevado número de pedras das paredes mostravam-se húmidas ao tacto,
incluindo também as dos dois púlpitos. Os elevados índices de humidade no interior
resultavam de a Igreja de Nossa Senhora da Assunção estar fundada numa antiga praia, de o
nível freático se encontrar a pequena profundidade e de o meio poroso das pedras de granito
meteorizado permitir uma transferência rápida das soluções, tal como referido por diversos
autores noutros edifícios e monumentos de granito (Begonha et al., 1994 [11], Begonha 2004
[12], Moutinho, 2005 [13], Costa Leite, 2008 [14], Bré, 2008 [15]). A desagregação granular
era a deterioração dominante à qual se associavam por vezes plaquetas. As plaquetas apareciam
associadas a algumas das pedras mais intensamente afectadas por desagregação granular. A
coesão das plaquetas era muito fraca, pulverizando-se facilmente ao simples tacto.
A maior parte das eflorescências era pulverulenta, de cor branca ou beige, formando-se
predominantemente nas zonas mais baixas das paredes submetidas a ascensão por capilaridade,
estando frequentemente ligadas a áreas com desenvolvimento de algas. No entanto,
observaram-se eflorescências pulverulentas a cerca de 5 metros de altura acima do pavimento
da igreja resultantes da cristalização de minerais de sais solúveis a partir de infiltrações da
cobertura. Eflorescências pulverulentas formam-se igualmente nas juntas do pavimento. Na
base do arco da capela do Santíssimo Sacramento, haviam-se formado eflorescências de tipo
fluffy de cor branca acinzentada.
Os resultados por DRX e MEV permitiram identificar diversos minerais de sais solúveis,
nomeadamente: cloretos - halite (NaCl), sulfatos - gesso (CaSO4⋅2H2O), nitratos - nitratite
1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 93
(NaNO3) e carbonatos - calcite (CaCO3). Observou-se por MEV um fosfato de cálcio em que
não foi possível identificar a fase mineral. Na Tabela 1, apresentam-se os minerais de sais
solúveis identificados por DRX e por MEV.
Tabela 1: Minerais de sais solúveis identificados por DRX e por MEV [10].
DETERIORAÇÃO LOCALIZAÇÃO MINERAIS DE SAIS SOLÚVEIS
Halite + calcite
Portal Oeste
Halite + gesso
Desagregação granular
Halite + nitratite + gesso
Interior da igreja
Gesso + nitratite + calcite
Portal Oeste Halite + nitratite + gesso + calcite
Plaquetas afectadas por Torre sineira – lado Sul Calcite
desagregação granular Halite + gesso
Interior da igreja
Gesso + halite + niter
Portal Oeste Calcite
Plaquetas
Torre sineira – lado Norte Calcite
Placas Fachada Oeste Gesso + calcite
Fachada Oeste Gesso + calcite
Eflorescências
Interior da igreja Gesso + calcite
Pó Púlpito Nitratie + gesso + calcite + fosf. cálcio
Filme biológico Portal Oeste Gesso + calcite
Paramento corpo central Halite
Colonização biológica
Torre sineira – escada Halite + calcite
A cristalização dos minerais de sais solúveis na rede porosa das rochas graníticas utilizadas na
Igreja Matriz de Caminha está na origem da maior parte das deteriorações da pedra. A acção
destes minerais é tanto mais destrutiva quanto maiores as suas solubilidade e higroscopicidade,
quanto maiores as forças de cristalização que desenvolvem no seu processo de crescimento,
bem como quanto maior o número de ocorrências de ciclos de cristalização/dissolução ou
cristalização/deliquescência (Hammecker, 1993 [16], Begonha, 2001, [7]). Na Figura 12,
apresentam-se imagens obtidas por MEV da cristalização de halite no meio poroso do aplito de
duas micas. Na Figura 13, exibem-se alguns dos diferentes hábitos cristalinos dos minerais de
sais solúveis identificados e, na Figura 14, alguns aspectos de material biológico observado.
Halite – cristal prismático Halite sobre feldspato potássico Halite com figuras de dissolução
sobre material biológico
Cau
Halite (H) – “véus transparentes” ao Gesso – Cristais lamelares com Gesso – Cristais lamelares com
MEV sobre caulinite (Cau) hábito pseudo-hexagonal hábito pseudo-hexagonal
Gesso com figuras de dissolução Nitratite sobre plagióclase Nitratite sobre plagióclase
3.7 Intervenção
Arqueologia prolongaram-se até 2007. Foi montada uma cobertura provisória que protegeu
todo o corpo central da igreja (Figura 15).
Figura 15: Cobertura provisória montada para protecção da igreja durante a intervenção.
Nas paredes exteriores foram injectadas caldas de cimento e sob o pavimento da igreja foi
implementado um sistema de ventilação de modo a diminuir a ascensão por capilaridade das
águas freáticas. Provisoriamente, foram colocados pregos no Portal Sul, em substituição dos
dispositivos electrostáticos propostos, de modo a impedir a presença de pombos.
Fojo (2006) [18] realizou um estudo com o objectivo de avaliar a eficácia da aplicação de
produtos consolidantes e hidrófugos em pedras graníticas da Igreja Matriz de Caminha.
Procurou estudar os efeitos imediatos resultantes da aplicação dos produtos de tratamento, bem
1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 97
como a sua acção com o tempo mediante a realização de ensaios de envelhecimento acelerado
através de um conjunto de ensaios, nomeadamente: determinação da densidade aparente,
porosidade livre às quarenta e oito horas, porometria com o porosímetro de mercúrio, absorção
de água por capilaridade, evaporação e profundidade de penetração em amostras sem e com a
aplicação de produtos de tratamento e também após a realização de ensaios de
envelhecimento.O estudo teve ainda como propósito encontrar o produto de tratamento
hidrófugo adequado ao tratamento do granito de duas micas de grão médio presente na fachada
Norte da Igreja Matriz de Caminha e o produto consolidante a aplicar no aplito de duas micas
existente nos portais Oeste e Sul do monumento.
0,014 11,27 µm
AMOSTRA IMC 3.1.1
12,95 µm
AMOSTRA IMC 3.1.2
9,18 µm 12,95 µm
0,012 AMOSTRA IMC 3.1.3 3,83 µm
log DIFERENCIAL VOLUME (ml/g)
3,74 µm
3,22 µm
0,24 µm
0,010
0,008
0,28 µm
0,006
0,004
0,002
0,000
0,001 0,010 0,100 1,000 10,000 100,000 1000,000
DIÂMETRO DOS POROS (µm)
Figura 16: Porometria da patela IMC 3.1 antes (IMC 3.1.1) e depois (IMC 3.1.2) da aplicação
do consolidante Tegovakon V e após o envelhecimento (IMC 3.1.3).
0,60 7 0,10 7
PROVETE IMC 1.3T
0,09
6 dW/S 6
0,50 N48
0,08 ALTURA
dW/S = 0,0056 t-1/2 + 0,0131 r2 = 0,9927
5 0,07 5
0,40 L = 0,0000 t-1/2 + 0,2000 r2 = 1,0000
dW/S (g/cm2 )
dW/S (g/cm2 )
L (cm)
0,00 0 0,00 0
0 2 4 6 8 10 12 14 0 3 6 9 12 15
-1 /2 -1 /2 -1 /2 -1 /2
TEMPO (h ) TEMPO (h )
Antes da aplicação do hidrófugo HB Siliker S101 Depois da aplicação do hidrófugo HB Siliker S101
Figura 17: Diagramas do ensaio de absorção de água por capilaridade – provete IMC 1.3T de
granito de grão médio.
A partir dos resultados obtidos e da análise dos mesmos, Fojo [18] concluiu que:
98 JMC’2011
0 100 200 300 400 500 600 700 0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 1000 1100 1200
0,0 0,0
dW/S (g/cm2 )
Sc Sc = 42 % Sc = 73 %
tS c = 50,73 h tSc = 22,2 h
-0,2 -0,2
-0,3 -0,3
- A aplicação dos dois consolidantes em estudo acelerou o processo de evaporação, mas o facto
de a saturação crítica ter aumentado após a consolidação pode contribuir para a deterioração da
pedra, dado que uma maior quantidade de água poderá evaporar no interior da rede porosa.
Em consequência deste estudo [18] e em virtude de não ter sido possível eliminar
completamente o fenómeno de ascensão capilar a partir do solo, não foram aplicados produtos
consolidantes e hidrófugos nos Portais Oeste e Sul.
1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 99
3.9 Aspecto da Igreja Matriz de Caminha após a intervenção realizada entre 2002 e 2007
A Figura 19 apresenta algumas imagens obtidas após a intervenção realizada entre os anos de
2002 e 2007.
Pormenor do Portal Sul Rosácea e friso sobre o Portal Oeste Pormenor do Portal Sul
Figura 19: Imagens obtidas na Igreja Matriz de Caminha após a intervenção de 2002-2007.
100 JMC’2011
4.1 Introdução
A igreja começou a ser construída em 1756. As torres, com cerca de 56 metros de altura
(Figura 20), foram terminadas entre 1855 e 1863.
Figura 20: Igreja de Nossa Senhora da Lapa – Fachadas principal e laterais das torres.
O nível freático, medido num poço existente perto da cabeceira da Igreja da Lapa, situa-se,
conforme a época do ano, entre os 5 metros e os 6,3 metros de profundidade. No entanto,
durante a fase de intervenção no monumento, medições realizadas em sondagens executadas
junto à torre Sul mostraram que o nível freático se encontrava a cerca de 2 metros de
profundidade e, consequentemente, em contacto com as fundações da igreja.
Os valores de NHg, variam entre 4,27% e 6,11%. Nas duas amostras LAPA 17 e LAPA 18 de
pedras de granito do Porto que caíram de cornijas da fachada principal, a microporosidade Nμ
domina em relação à macroporosidade NM. Assim, a microporosidade representa cerca de 63%
a 70% da porosidade total do mercúrio. Pelo contrário, na amostra de desagregação granular de
intensidade forte LAPA 8, a macroporosidade NM domina relativamente à microporosidade Nμ.
(Nμ representa cerca de 41% de NHg).
Nas três amostras, verifica-se a existência de duas famílias dominantes de fissuras (Tabela 2).
Na Figura 21, apresentam-se as distribuições bimodais dos diâmetros de acesso às fissuras das
amostras LAPA 18 e LAPA 8.
0,008 0,016
0,40 μm
AMOSTRA LAPA 18 AMOSTRA LAPA 8 16,32 μm
0,007 0,014
log DIFERENCIAL VOLUME (ml/g)
0,006 0,012
9,50 μm
0,005 0,010
5,20 μm
0,004 0,008
0,003 0,006
0,002 0,004
0,001 0,002
0,000 0,000
0,0010 0,0100 0,1000 1,0000 10,0000 100,0000 1.000,0000 0,00 0,01 0,10 1,00 10,00 100,00 1000,00
Figura 21: Distribuição dos diâmetros de acesso às fissuras das amostras LAPA 18 e LAPA 8.
Os valores dos diâmetros de acesso da família principal de fissuras (0,40 – 1,17 μm) das duas
pedras de cornijas de granito do Porto (amostras LAPA 18 e LAPA 17) são muito inferiores
aos dos da segunda família de acesso às fissuras (9,50 – 9,96 μm). Na amostra de desagregação
102 JMC’2011
granular (LAPA 8), verifica-se o oposto, isto é, o diâmetro de acesso às fissuras da família
principal (16,32 μm) é muito superior ao do da família secundária (5,20 μm).
A desagregação granular é, a par dos filmes negros, o tipo de deterioração da pedra mais
importante. Afecta grande número de pedras desde o rés-do-chão às torres. A desagregação
granular é muito intensa em muitas pedras do rés-do-chão sobretudo entre as cotas de 3 metros
a 5 metros, com recuo da superfície da pedra por vezes superior a três centímetros, resultado da
queda de material pétreo.
Em diversas zonas, a forte perda de material pétreo, devido à desagregação granular, levou à
reconstituição da geometria inicial das pedras com a aplicação de quantidades por vezes
significativas de argamassas de cimento Portland que, para além do aspecto inestético,
contribuem para a aceleração do processo de deterioração do granito do Porto. A deterioração
das antigas argamassas de cal das juntas conduziu ao emprego de argamassas de cimento
Portland nas mesmas.
Os filmes negros afectam um elevadíssimo número de pedras, sendo, conforme o nome indica,
formações superficiais muito finas, de cor negra ou castanha muito escura. Recobrem e aderem
fortemente à superfície das pedras graníticas, mantendo, devido à sua reduzida espessura, a
rugosidade superficial das mesmas. São constituídos por depósitos superficiais e não por
fragmentos de granito. Usualmente baços, homogéneos e duros, podem exibir brilho metálico.
Devido à forte aderência à superfície das pedras graníticas, a remoção dos filmes negros em
trabalhos de limpeza só é possível com a aplicação de produtos de pH ácido com ácido
fluorídrico na sua composição ou por métodos abrasivos.
As crostas negras caracterizam-se pela sua cor negra. Tal como os filmes negros, não são
formadas por fragmentos de pedras de granito do Porto, mas por depósitos que cobrem as
superfícies das pedras e argamassas das juntas. A superfície das crostas negras é mais ou
menos irregular e raramente acompanha a rugosidade superficial das pedras que recobre. Na
Igreja da Lapa, as crostas negras têm grande expressão. A sua espessura varia dos 2 aos 7 mm.
Podem apresentar superfície com relevo com forma dendrítica característica, idêntica à forma
de couve-flor, aparecendo em zonas abrigadas da chuva, sobretudo sob as largas cornijas da
fachada principal, simetricamente dispostas e a alguns centímetros das juntas abertas por onde
se faz a percolação das águas das chuvas.
O número de pedras afectado por placas ou por plaquetas afectadas por desagregação granular
é diminuto, quando comparado com o número de pedras afectado pela desagregação granular
ou filmes negros.
A actividade biológica é pouco intensa no rés-do-chão devido aos elevados índices de poluição
atmosférica. Verifica-se a ausência de líquenes e o desenvolvimento de algumas plantas
superiores. Sobre as cornijas constata-se o desenvolvimento de plantas superiores.
Algumas fissuras e fendas estão presentes sobretudo nas duas torres e nas padieiras de algumas
janelas.
104 JMC’2011
G
Q
M
G G
Q
G
B B
M H
G
Gesso (G) entre folhetos de biotite (B) Cristais de gesso (G) entre folhetos de Halite (H) em fissura intragranular no
moscovite (M) quartzo (Q)
Figura 23: Cristalização do gesso e da halite no interior do meio poroso do granito do Porto.
Na Figura 24, ilustram-se imagens de minerais de sais solúveis identificados por MEV em
amostras de deteriorações, assim como o aspecto de um filme negro e dois tipos de cinzas
volantes associadas à poluição do ar. Os minerais de sais solúveis tanto cristalizam sob formas
simples típicas (Figuras 24a, 24c, 24d, 24e, 24f, 24g) como exibem hábitos cristalinos muito
diferentes dos habituais (Figuras 24b, 24f, 24h, 24i), resultado das condições espaciais a que
estão sujeitos quando cristalizam na rede porosa do granito. As amostras de filmes negros são
constituídas por um agregado homogéneo que reveste totalmente o granito. Os filmes negros
exibem aspectos distintos: superfície mais ou menos lisa (Figura 24j) ou uma superfície
granulada, nitidamente mais rugosa que a do tipo anterior. Observaram-se ainda os seguintes
tipos de cinzas volantes: carbonosas, porosas, ricas em S (Figura 24l); de superfície rugosa de
óxido de Fe (Figura 24m); de superfície lisa, constituídas por Si e Al.
1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 105
a) Cubos de halite sobre albite b) Cristais de halite sobre microclina c) Cristais de gesso sobre microclina
G
G
d) Cristais lamelares de gesso e) Cristais tabulares de gesso f) Cristais de calcite (C) e gesso (G)
H Br
Br G
g) Cristal acicular de brushite (Br) e h) Cristal prismático de brushite (Br) i) Cristal acicular de niratite sobre
cubos de halite (H) sobre plagióclase sobre gesso (G) e quartzo (Q) albite
j) Aspecto geral do filme negro com l) Cinza volante porosa, carbonosa e m) Cinza volante de superfície rugosa
superfície mais ou menos lisa rica em enxofre constituída por óxido de ferro
Figura 24: Imagens por MEV de minerais de sais solúveis, filme negro e cinzas volantes.
106 JMC’2011
A desagregação granular e os filmes negros são os dois tipos de deteriorações mais importantes
na Igreja de Nossa Senhora da Lapa.
A halite, presente nas pedras afectadas por desagregação granular e plaquetas, tem como
principal origem a água da chuva devido à proximidade do Atlântico. O gesso, identificado em
amostras de desagregação granular, plaquetas, placas e crostas negras, está associado à água da
chuva contaminada pelos elevados índices de poluição do ar na cidade do Porto. A brushite e a
nitratite presentes nas pedras que exibem desagregação granular, plaquetas e placas têm origem
na lixiviação, pela água da chuva, dos dejectos de pombos acumulados nas cornijas da fachada.
Nas zonas mais altas da fachada, as mesmas condições geográficas e climáticas e a diminuição
dos índices de poluição atmosférica favorecem o desenvolvimento de seres vivos nas pedras,
particularmente de diversos tipos de líquenes. No rés-do-chão da fachada, os elevados índices
de poluição do ar que aí se registam impedem o desenvolvimento dos mesmos.
Nas zonas mais baixas do monumento, sujeitas à ascensão de soluções salinas a partir do solo,
a metodologia proposta só conduzirá a uma diminuição ou eliminação do processo de
decaimento da pedra, se forem implementadas medidas que evitem a ascensão capilar da água.
1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 107
A equipa que procedeu à intervenção na pedra era composta exclusivamente por técnicos de
restauro, sendo chefiada por um técnico superior de restauro. A intervenção decorreu em três
fases sucessivas: a primeira fase incidiu sobre a torre Norte, a segunda sobre o corpo central da
igreja e a terceira sobre a torre Sul. A Figura 25 mostra as diferentes fases da intervenção.
O método de eliminação dos fimes negros mereceu alguma discussão, não só pelo elevado
número de pedras afectado por esta degradação, mas sobretudo pelos riscos envolvidos na
aplicação dos métodos de remoção: o método químico com o produto Heavy Duty que inclui
ácido fluorídrico na sua composição; o método abrasivo patenteado Exastrip/Hdo® de
projecção de água e partículas de carbonato de cálcio precipitado.
a) Remoção através de água nebulizada b) Remoção com o método químico ácido Heavy Duty
Figura 26: Ensaios prévios de remoção de filmes negros.
108 JMC’2011
Figura 27: Ensaios prévios de remoção de filmes negros com o método abrasivo patenteado
Exastrip/Hdo® de projecção de água e partículas de carbonato de cálcio precipitado.
Figura 28: Método Exastrip/ HDO® - Imagens de partículas de carbonato de cálcio precipitado
obtidas por MEV.
O método de remoção dos filmes negros através de água nebulizada mostrou-se totalmente
ineficaz.
Pelo contrário, os dois outros métodos revelaram-se eficazes e rápidos. Do ponto de vista
visual, os resultados foram muito semelhantes e satisfatórios, tendo-se obtido uma coloração
final do granito do Porto que agradou aos dois projectistas, Senhor Arqº. Joaquim Massena e o
autor deste trabalho, aos elementos do IPPAR que acompanharam a obra, Senhoras Engª.
Margarida Lencastre, Drª. Adriana Amaral, Drª. Isabel Dias Costa e Arqª. Mafalda Carneiro, ao
responsável pela fiscalização, Senhor Engº. Filipe Almeida, ao empreiteiro, Senhor Engº.
Filipe Ferreira da firma AOF e ao técnico superior de restauro Dr. Pedro Antunes da firma
CaCO3. A segurança da obra esteve a cargo da Senhora Drª. Laura Pereira.
A escolha inicial recaiu sobre o método abrasivo Exastrip/Hdo®. No entanto, devido aos
elevadíssimos custos inerentes a esse método, incorportáveis para o orçamento da obra e,
atendendo igualmente às posições invocadas pela digníssima Mesa da Venerável Irmandade de
Nossa Senhora da Lapa, Dono da Obra, optou-se por uma situação de compromisso.
Dado que as pedras de granito do Porto, localizadas acima da cornija que separa os primeiro e
segundo andares, apresentavam, de um modo geral, um razoável estado de conservação,
decidiu-se que a remoção dos filmes negros seria efectuada pelo método químico com o
produto ácido Heavy Duty, muitíssimo mais económico. Abaixo da mesma cornija, as pedras
apresentavam pior estado de conservação, pelo que se decidiu que a eliminação dos filmes
negros seria aí realizada pelo método abrasivo Exastrip/Hdo®.
1as Jornadas de MATERIAIS NA CONSTRUÇÃO 109
A utilização dos dois métodos poderia conduzir a diferenças de tonalidade do granito, após a
remoção dos filmes negros, pelo que foi necessário um acompanhamento, controlo e avaliação
permanentes dos resultados.
a) b)
Figura 29: a) Remoção das argamassas de cimento de colmatação de lacunas; b) Limpeza de
juntas.
110 JMC’2011
a) Enchimento de juntas com argamassas de cal b) Acabamento de juntas com argamassas de cal
REFERÊNCIAS