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Estatuto do Embrido: O Inicio de Vida Coase eae aan tat RESUMO. Inés Trinta Sequeiros, Raquel Inés Martins Bento Inicio da Vida Humana é cada vez mais um tema que apresenta uma grande discrepaincia na sociedade atual, Nao s6 pela divergéncia de opinies de diversos autores, como pelo facto de estar associado a questdes probleméticas que surgem no sentido da andlise do Estatuto do Embrido. Neste sentido, 0 presente artigo de revisio bibliografica procura enquadrar diferentes opinides sobre a tematica do momento que da inicio a vida humana, no que diz respeito ao embrio, bem como abordar principios éticos relacionados com a Bioética eo Inicio de Vida, tendo em conta o Estatuto do Embrigo e as implicagées éticas do mesmo. Palavras-chave: Bioética; Embrigo; Inicio de Vida; Principios Eticos. The Beginning of Life is becoming a topic that presents a large discrepancy in the current society. Not only by the divergence of opinions of various authors, but also by being associated with problematic issues that arise towards the analysis of the embryo status. In this sense, this literature review article seeks not only frame different opinions on this topic that gives a start to human life, regarding the ‘embryo, but also the principles related to bicethics and the beginning of life, taking into account the embryo status and the ethical implications of the same. Key-words: Bioethics; Embryo; Ethical Principles; Life Start. INTRODUCAO No intuito de realizar uma anilise contextualizada e uma revisio bibliogrdfica sobre a temética “Estatuto do Embriéo: 0 de Vida” o presente artigo surge no sentido de desenvolver conhecimentos bem como treinar a reflexo e 0 debate sobre os mesmos, com a finalidade de aumentar a capacidade para a tomada racional de decisio, no que diz respeito a problemas surgidos na pratica de enfermagem tendo em conta uma perspetiva pluralista e transdisciplinar (Nunes, 2013). Percursos 12, jlho-setembro 2013 43 Desde 0 tempo de Aristételes que varios filésofos e cientistas tentam responder & pergunta “O que ¢ a Vida?”. Cada vez mais no 1n0ss0 quotidiano ouvimos falar em expressées como “manipulagao genética” e “congelamento de embrides” que nos reportam novamente para o que é a vida € 0 momento que origina o inicio da mesma, sendo esta uma tematica cada vez mais polémica na sociedade atual. As respostas que procuramos sobre 0 momento que dé origem a um individuo revelam-se importantes em varias. questées, nomeadamente o aborto, se € ou nao considerado crime, e também nas questdes éticas associadas @ manipulacéo de embriées humanos & procura de resolugdes para algumas deficiéncias fisicas e outras Patologias cada vez mals presentes na populacSo (Barchifontaine, 2010). Neste sentido, a escolha da temética do presente artigo prende-se pelo facto da crescente controvérsia nas opiniées de diferentes autores sobre o inicio de vida, ¢ pela necessidade de esclarecimento da sociedade no que diz respeito & protec moral e juridica dada ao embrigo humano em prol da. sua natureza, para que todos os cidaddos possam ter uma ideia formada sobre o assunto. O inicio de Vida: visio panoramica Um dos motivos para a escolha do tema do artigo prendeu-se pela discrepancia no que diz Fespeito ao momento que dé origem a vida humana, Neste sentido, é pertinente uma breve contextualizag3o relativamente a opiniso de varios autores. De acordo com Filho (2003), vida humana é definida como “qualquer célula ou conjunto de células cujo patriménio genético seja, na sua quase totalidade, de vida humana”. Na sua perspetiva existem 3 teorias que sustentam o inicio da vida: conceitual, evolutiva e relacional. Na perspetiva conceitual, a concecao & vista ‘como 0 momento que determina o inicio de vida, uma vez que origina um ser humano enquanto pessoa, e onde o zigoto é considerado um potencial ser humano. A visio evolutiva defende que o conceito de vida humana € determinado por uma alteracio corporal no embriso num momento especifico da gestagdo. Por fim, a viséo relacional afirma que € necesséria a presenga do zigoto e da aceitacdo da mulher para a possibilidade de ser mae para que se dé o inicio de vida (Filho, 2009), 414 Barchifontaine (2020) afirma que existem 5 respostas da ciéncia relativamente ao momento que dé origem 4 vida, nomeadamente @ visdo genética, embriolégica, neurolégica, ecolbgica € por ultimo a visdo metabilica. ‘A visio genética, proposta mais aceite oficialmente pela Igreja Catdlica, afirma que a vida humana tem inicio com a fecunda¢do, ou seja, quando 0 évulo e 0 espermatozdide se Pereursos 1028, julho- seterbro 2013, encontram @ formam um novo conjunto genético que origina. um ser nico (Barchifontaine, 2010). Teles (2004) acrescenta que 0 embrido adquire identidade genética, e tendo em conta que o patriménio genético pertence a uma espécie, o embrido humano deve ser considerado como um ser humano. Quando falamos na visio embriolégica, esta defende que a vida comega na terceira semana de gestagdo, onde estabelecida a individualidade humana dado que 12 dias apés 2 fecundaco 0 embriéo mostra capacidade de dividir-se e originar varios individuos. O recurso 2 pilula do dia seguinte e contracetivos administrados nas duas primeiras semanas de gestagio é sustentado por esta ideia (Barchifontaine, 2010). Relativamente a visto Neuroldgica, esta diz-nos que “o prinefpio da morte vale para a vida” pois se a vida termina quando deixa de existir atividade cerebral, a vida comeca quando o feto demonstra atividade cerebral, ndo sendo esta uma data consensual, situando-se entre a 8% ea 202 semana de gestacao (Barchifontaine, 2010). ‘Aviso ecolégica defende que a capacidade de sobreviver fora do titero & que dé ao feto a sua independéncia determinando assim o inicio da vida deste ser. Por ultimo, a visto metabélica vé a discussdo sobre o momento que origina a vida irrelevante dado que afirma que nao existe um momento iinico no qual a vida tem inicio (Barchifontaine, 2010). Do ponto de vista cientifico, quando ocorre a jungao dos gimetas, inicia-se a existéncia de uma nova vida, que se prevé 0 seu continuo desenvolvimento até que a morte natural ou artificial aconteca (Ford, 1991 citado por Teles, 2004), Para Neves (1996) a questo do inicio de vida & de competéncia biolbgica e filoséfica _ndo podendo pensar numa sem ter em considerac3o ‘a outra, Na sua perspetiva, 0 inicio de vida tem origem quando se dé a jungio do gimeta feminino € masculino, reproduzindo uma nova vida humana Sustentando 0 que acima foi referido, Loureiro (2002) afirma que apds 0 encontro dos gémetas estamos na presenga de um novo organismo contendo todo o patriménio genético necessério e a capacidade de desenvolvimento através da multiplicagao e diferenciagao celular, ou seja, uma vida humana. De acordo com Neves e Osswald (2007) 0 ‘embrido é um ser humano numa fase bastante inicial do seu desenvolvimento. Os autores defendem que se tivermos em consideragao 0 dia em que ocorreu a fecundacio como o momento de inicio a vida, ao final da primeira semana de gestacdo 0 embrido jé se encontra implantado no iitero da mae, e realiza trocas com © organismo da progenitora. Aos dois meses, quando passa a ser designado de feto, este apresenta todos os érgios formados Pereursos #28, juho Setembro 2013, 45 apresentando uma forma que o permite ser identificado como espécie humana. Quando falamos de um embriio humano in vitro, para Serro (2003), este possul a natureza biolégica humana desde a sua fase de zigoto, pois apresenta informagao genética suficiente e necesséria para a construcio de qualquer outro ser. O mesmo ainda refere que apenas existe alterag3o da natureza biolégica com a morte mostrando que ao longo do tempo de vida da pessoa esta se mantem inalterdvel Para terminar, e evocando Reis e Meneses (2010), € relativamente ao inicio da vida humana ter ples chegar a um consenso inicio com a fecundagio, aqui a problematica prende-se com as primeiras fases de desenvolvimento do embrio, onde ¢ importante perceber se este deve ter o mesmo tipo de protecdo e respeito que 0 individuo humano. Para os autores, 0 embrio & considerado uma vida humana e como tal exige toda a protegio e respeito. Seré assim o ‘embrido considerado nos dias de hoje? Bioética e o Inicio de Vida ‘A palavra bioética tem a sua origem na Grécia, estando dividida em dois termos, bio e ética. 0 termo bio provém de bios, de seu significado vida, que engloba todos os seres vivos, desde os mais simples aos mais complexos. Por sua vez, 0 termo ética deriva do grego ethos e apresenta- se com dois significados, nomeadamente o principio da aco, o que faz 0 homem agir, € as regras € normas a que determinada acdo obedece (Neves & Osswald, 2007). Hoje em dia, segundo Barchifontaine (2010), 2 bioética pode ser definida como um instrumento de reflexdo e de agdo que tem por base principios éticos como da autonomia, da beneficéncia e da justica. € uma disciplina na rea da Satide que se preocupa em estabelecer um consenso entre a sociedade, cientistas, profissionais de sauide e governos com o intuito de assegurar as geragées futuras a dignidade humana e a qualidade de vida diante do desenvolvimento da biociéncia. Desde os tempos de Aristételes que uma das problematicas no campo da bioética se prende ‘com a questo do inicio de vida, Estabelecer 0 momento na qual esta se principia seria benéfico para a sociedade no sentido em que faciltaria a desmistificagao e resolucdo de probleméticas, como & 0 caso do aborto, da procriagdo medicamente assistida (PMA) e da manipulago de embrides. A delimitago do inicio de vida tem por de tras varios conceitos como o da dignidade humana, j4 referido anteriormente, e também da pessoalidade, que torna este tema um trabalho conjunto entre as cigncias biolégicas e outros campos da ciéncia (Barchifontaine, 2010). Segundo Deodato (2006), todos os assuntos relativos quer ao inicio quer ao fim de vida s8o aqueles em que o ser humano se encontra mais 46 Pereursos 1028, julho- seterbro 2013, vulneravel e com o avangar da ciéncia, tém sido alvo de intervencSes humanas. Neste sentido, reportando-nos & questo do inicio de vida, a realizagao de tats intervengées & da responsabilidade dos progenitores tendo em conta 0 seu declarado ito paternal (Deodato, 2006). Apesar disso, e tendo em conta que ter um filho é uma parte integrante da vida de um casal, se este se tornar obstinado or tal ideia, mostra que a relago que ambos vivem no é sustentada em si mesma mas em algo exterior a esta (Deodato, 2006} ‘Tendo em conta as palavras de Deodato (2006), ¢ reportando-nos para o papel dos profission: nesta situagio, é importante que auxiliem 0 casal no sentido de que cada um entenda o seu papel no seio familiar, € que juntos consigam viver a sua relagio a dois, procurando solugées que tenham em vista a felicidade da familia onde 2 obsessio por um filho seja substituida pelo desejo real em constituir familia. Se tal desejo for alcangado, os pals paderao assim pensar nos seus futuros filhos, n3o como elemento de unigo da familia, mas sim como um elemento dessa mesma familia, No seguimento da _interveng3o dos profissionais, € apds fornecida toda informagdo aos pais, segundo Silva e Silva (2004), cabe aos mesmos usufruirem do seu principio de autonomia com o intuito de decidirem quais as melhores solucées para os dilemas éticos que enfrentam Dado 0 avanco das tecnologias, e 0 periodo em que vivemos relativamente aos conhecimentos inerentes & vida intra-uterina, é importante ter em conta que existe uma malor possibilidade na protecao no que diz respeito aos direitos do embrido humano. Neste sentido, e tomando em. considerago jiva_e Silva (2004) todos os progressos referidos acima deveriam ter em consideracio a defesa da vida humana, uma vez que a deteso antecipada de malformagées graves do feto ou de doencas graves, provocam nos pais sentimentos de dtivida no que se refere a abortar ou néo, ndo tomando em consideragio 0 embrido e 0 direito a vida. No entanto, alguns problemas diagnosticados antecipadamente, dao a oportunidade @ ma de ser encaminhada para ajuda diferenciada, Por exemplo em casos em que exista risco de 0 bebé nascer prematuro. © desenvolvimento de técnicas como a producto, manipulaco, congelamento e protecdo de embrides dizem respeito a resposta da ciéncia na resoluggo do problema de infertilidade que cada vez mais os casais tem que enfrentar. O facto de estes casais no poderem ter um filho levou a ciéncia a encontrar solugSes através da PMA, o que exige 8 sociedade uma maior reflexdo relativamente & problemstica do inicio de vida, nomeadamente © estatuto do embriso (Deodato, 2006; Neves, 1996). Pereursos #28, juho Setembro 2013, 47 De acordo com Reis e Meneses (2010), 0 ‘embrido é encarado como a primeira etapa da vida humana, sendo o mais pequeno cliente que 05 profissionais de sade tém que cuidar, tornando-se crucial 0 —conhecimento relativamente ao estatuto do embrido no que ser reporta aos principios éticos legals e deontolégicos. Estatuto do Embrido Hurnano ~ Clarificagio de conceitos Antes de iniciar a andlise do presente tema torna-se relevante esclarecer determinados conceitos que sero enunciados ao longo do presente artigo. A palavra estatuto, segundo Loureiro (2001), € uma palavra de origem latina, que deriva de status, 8 qual so atribuidos varios sentidos, nomeadamente; posigo, bom estado, estabilidade e base sdlida. No presente artigo, consideramos que 0 conceito mats adequado seria 0 modo como um determinado ser ou entidade é tratado pela sociedade. Por sua vez, embrigo a palavra deriva do grego embryosendo, definida como senda o desenvolvimento humano durante os primeiros estidios de desenvolvimento, mais concretamente até ao final da sétima semana de gestaco, passando posteriormente a designar-se por feto (Teles, 2004) Posto isto, segundo Keating (1993), quando falamos de estatuto do embrido, remetemos 0 nosso pensamento para os direitos e deveres que devemos ter com 0 embrido, bem como, para a posigdo que 0 mesmo assume aquando da sua formacdo. Para além disso, torna-se pertinente enunciar o fato de conceder, ou nao, ‘20 embrido 0 mesmo nivel de proteso das pessoas em geral. Assim, quando falamos em estatuto do embriéo humano, falamos do status do individuo concebido mas ainda ndo nascido, acrescenta Choro (2005). O embri8o pode ser constituido de duas formas: in vivo no processo biolégico de fecundacdo ou por transferéncia intratubar de gémetas; ou in vitro, sendo transferido para 0 utero apés a jungdo do évulo com o espermatozdide (Serra, 2003). Relativamente & forma in vivo, apés a fecundacio, 0 évulo passa a chamar-se de zigoto, sendo este portador dos carateres hereditérios de origem materna e paterna, € dirige-se para. 0 tero__comecando simultaneamente o seu processo de diviséo celular. Quando alcanca o titero, ja se encontra diferenciado numa massa celular interna e numa cama externa, o trofoblasto, que mais tarde vai originar a placenta, tendo esta origem ‘embrionéria. Assim, € gerado um novo genétipo humano, e 0 desenvolvimento a partir do zigoto, em embrido, feto e recém-nascido (Neves & Osswald, 2007; Filho, 2009) De acordo com Lour (2001), os embrides in vitro fazem, cada vez mais, parte da realidade 48 Pereursos 1028, julho- seterbro 2013, atual, pelo que a tematica referente ao estatuto do embrido tem tido mais enfoque, surgindo assim novos desafios relacionados com a experimentagéo e com a fonte de células estaminais. Convém ainda clarificar que, também se poderd considerar um estadio de pré-embrigo. 0 termo pré-embrido surgiu em 1985, num relatério sobre a experimentacao em embrides humanos ‘com menos de 14 dias de desenvolvimento, elaborado por Warnock. © relatério mencionado referiu a existéncia de diferengas moralmente significativas entre 0 conjunto de células antes e depois do 14° dia, sendo que o autor se baseou em critérios biolégicos para evidenciar a distinggo entre embriéo e pré embrido. De acordo com esses mesmos critérios, _constata-se que poder ser considerado um estédio de pré-embrido (até a0 142 dia), de embriéo propriamente dito (do 142 dia & 8% semana) e fetal (de desenvolvimento). (2009) considerarmos 0 estado de Contudo, Filho refere que, se pré-embrigo favorecemos “as entidades e nagdes que Justificam intervengBes com pouca sustentacdo ética_nesse primérdio do desenvolvimento humano”. Posto isto, no presente trabalho ‘apenas daremos enfoque ao estidio de embrido e fetal Diferentes Perspetivas relativamente a0 ‘embriso ‘Avida humana, segundo Rels e Meneses (2010), “merece respeito, qualquer que seja o seu estédio ou fase, devido & sua dignidade essencial”. Os embrides tém a capacidade de se desenvolver de forma individual, pelo que, demonstram ter uma das_ principals carateristicas do ser humano, a individualidade, incluindo, assim, a capacidade de reconhecer € de se adaptar (Siva & Silva, 2004). Neves © Osswald (2007) apresentam diferentes perspetivas de diferentes autores relativamente 2 este tema, Referem que alguns autores consideram que o embrido € apenas um “aglomerado de células, uma bola microscépica, destituida de dignidade e direitos, pelo que é ilicto fazer com ele o que nos apetecer, se tiver alguma utilidade cientifica ou prai a”, ou seja, consideram que o embrido ainda no é nada, permitindo assim que este sofra processos de manipulagéo e experimentacéo, como se tratasse de um simples objeto. Contudo, Neves «© Osswald (2007) revelam que esta posicao tem poucos adeptos dado que o embrido tem capacidade de divisio, crescimento e diferenciagdo, e no se trata apenas de uma “bola”. Outros consideram que 0 embriso merece determinado respeito, pela sua potencialidade para se tornar num ser humano adult. Contude, consideram também que este respeito néo deverd ser um respeito absoluto, visto que cerca de 30 a 60% dos embrides Pereursos #28, juho Setembro 2013, 49 mortem de forma natural nos primeiros dias da sua existéncia. Consideram igualmente 0 fato de cada embrido poder dar origem a dois seres, afirmando que deixa de existir individualizacao, € ainda, 0 fato de, muitos embrides serem a formados por “acidente” e no por vontade prépria dos seus progenitores, constituindo assim uma consequéncia da irresponsabilidade dos mesmos, nao possuindo dignidade humana (Neves & Osswald, 2007; Neves, 1996} Por fim, existe ainda a opi jo de que o embrigio tem, desde o inicio, dignidade essencial, pelo que no pode ser destruido de forma voluntaria. Os autores que apoiam esta opinigo evidenciam ainda 0 fato de 0 embrido ter a impossibilidade de se defender de agressdes, pelo que merece respeito absoluto (Neves & Osswald, 2007). Refletindo sobre este iltimo pensamento, e relembrando os argumentos apresentados para a ideia da falta de respeito absoluto, podemos aferir que os _mesmos seriam refutados, visto que apesar de os ‘embrides serem frégeis no inicio de vida, muitos deles chegarem a morrer, no deveréo ser desvalorizados nem crucificados os que possivelmente irdo sobreviver; relativamente a0 fato de poderem surgir gémeos, a estes deveria ser reconhecido um respeito maior pelo surgimento de dois seres humanos em vez de ‘apenas um; € por tiltimo, 0 fato de os embrides serem concebidos de forma acidental nao deveria interferir nem retirar a dignidade a0 ‘embrido, mas sim aos progenitores (Neves & Oswald, 2007). Para além da exposigo das diversas opinides, torna-se fundamental ainda, evidenciar os pontos de vista biolégico e ético-juridico. Sob 0 ponto de vista biolégico, Reis e Meneses (2010), referem que o embrio deve ser considerado ‘como ser humano, néo existindo qualquer raz0 para isso no acontecer. Os autores acrescentam ainda que 0 zigoto é 0 melhor ponto de partida para garantir protecio de todos os seres humanos. No que toca ao ponto de vista ético-juridico, Neves (1996) afirma que ‘© embrido merece tanto respeito e protegio ‘como a pessoa adulta desde a fecundacso, ou seja, no estado de zigoto, visto pertencer a espécie humana e ter autonomia, O autor referido anteriormente realca ainda que, o zigoto deve ser considerado como pessoa pelo fato de ter potencial para tal e pela grande probabilidade de se vir a desenvolver e a exprimir. Posto isto, o embrido merece ser respeitado em qualquer circunstancia, e visto ser um ser da mesma espécie, 0 ser humano deve zelar por manter a igualdade, tendo assim a obrigagao do respeito e da solidariedade que os seres humanos deve ter uns para com os outros (Filho, 2009). ‘Apés tais afirmagées poderd entéo surgir a questo apresentada por Loureiro (2009) Pereursos 1028, julho- seterbro 2013, afirmada pelo Conselho Nacional de Etica Italiano: “o embrido é um de né: © Embrido é uma pessoa? Neves (1996), depois de se debrucar sobre @ questo levantada e enunciada anteriormente, refere que existem duas_perspetivas relativamente a resposta da mesma. Uma delas, atribui 0 estatuto de pessoa a toda a vida humana desde a fecundagio, como tal, ¢ possivel afirmar que, desde a concegio, existe um novo ser humano. © termo pessoa, para Neves (1996), define-se como sendo “ser humano capaz de consciéncia de si (e, por isso, simultaneamente, de consciéncia do mundo de um transcendente), de _relacionamento (comunicagio) e de participac3o na comunidade moral dos homens [..] Ser pessoa consiste num continuo € infinito processo de realizagéo de si, na criago de si proprio" (Neves, 1996). Indo ao encontro desta linha de pensamento, Chord (2005) refere que a qualidade de pessoa nao é mensuravel, pois ou se & pessoa por natureza ou ndo se é, apenas as capacidades da pessoa sdo varidveis a0 longo do ciclo vital. Este autor afirma que o embrido é uma pessoa, clarificando que o estatuto pessoal do ser humano se mantém desde o inicio até a0 fim de vida, independentemente dos acidentes de ordem somatica, psiquica e espiritual. ‘A perspetiva acima mencionada revela ser a mais apoiada, dado que varios autores consideram que o embrio é uma pessoa desde a fecundagdo, visto que apresenta identidade genética, Unica e irrepetivel na sua natureza (Reis & Meneses, 2010). Em contrapartida, a outra perspetiva remete-se 20 aparecimento de uma linha primitiva, aquando do proceso de implantacéo, aproximadamente no décimo quarto dia, como atribuigdo do estatuto de pessoa (Neves, 1996). Expostas ambas as _perspetivas, convém clarificar que a questo de considerar ou no 0 embrido como pessoa depende de cada um. Por ‘exemplo, Neves e Osswald (2007) aferem que se 0 embrigo é considerado uma pessoa tem de ter 0s mesmos direitos, incluindo o direito & vida; se no, nao existe respeito absoluto e este pode ser manipulado ou destruido, caso os direitos de uma pessoa estejam a ser postos em causa, Contudo, esta questo ainda néo se encontra totalmente clarificada segundo os mesmos autores. Para finalizar, resta expor a resposta 2 questo fenunciada pelo Conselho Nacional de Etica Italiano, apresentada por Reis e Meneses (2010), referindo que, “o comité chegou unanimemente a reconhecer 0 dever moral de tratar 0 embrido humano, desde 2 fecundacao, segundo os critérios de respeito e tutela que se devem adotar em relago 0s. individuos humanos aos quals se atribui comummente a caracteristica de pessoa”. Assim, o ser humano deve ser respeitado como pessoa desde o Pereursos #28, juho Setembro 2013, 51 momento de fertilizacao, sendo que o respeito pela pessoa humana é 2 base da dignidade humana (Nunes, 1995, citado por Reis & Meneses, 2010). Protecgio do embrido humano e perspectiva juridica Como j foi referido anteriormente, o embrigo humano tem direitos fundamentals pelo que deverd ter protesio adequada dada a dignidade que Ihe & intrinseca. De acordo com Reis Meneses (2010), tais direitos do estdo assegurados pela lei, Porém, encontram-se inerentes & natureza humana, sendo que as ssurgem com o intuito de preservé-los. Relativamente 20 quadro legislativo, os dois documentos que demonstram maior relevancia fem relacdo & questo do embriio so a Declaraedo Universal dos Direitos do Homem e 2 Convengdo sobre dos Direitos do Homem e da Biomedicina (Reis & Meneses, 2010). A Declarago Universal dos Direitos do Homem ‘enuncia no artigo 3° que “todo o individuo tem direito vida", porém, Loureiro (2003) afirma que este artigo no permite tirar conclusdes relativamente & vida intra-uterina, Quanto Convencio sobre os Direitos do Homem e da Biomedicina, so de realcar os artigos 188, nt: “quando a pesquisa de embrides in vitro é ‘admitida por lel, esta garantiré uma protecso adequada a0 embrido"; e 182, n%2: “a criacdo de embrides humanos com fins de investigaco & proibida”. Ambos os artigos remetem para a protegéo do embrido, contudo, para Loureiro (2001), a nogo de “protegdo adequada” ndo se encontra bem esclarecida. Pela relacdo com a presente tematica, torna-se também importante fazer referéncia & Constituicio da Republica Portuguesa e & Convengao Europeia dos Direitos do Homem. A Constit 1o da Republica Portuguesa, consagra no artigo 242 que "a vida humana é inviolavel”, contudo, segundo Reis e Meneses (2010) este artigo néo faz distingo sobre a natureza extra- uterina ou intra-uterina, 0 que nos distancia da protesdo do embrido. _Relativamente Convengio Europeia dos Direitos do Homem, & reconhecido, no artigo 28, n2 , que “o direito de qualquer pessoa a vida é protegido por le deste modo seria reconhecido ao embrifo o direito absoluto 8 vida, que no poderia ser limitador mas no explicta claramente a protegdo para com 0 embrido, refere Loureiro (2001). Por fim, torna-se relevante recorrer a um documento promovido pela Associagao dos ‘amigos das criangas (AMADE) pela Organizac3o das Nacdes Unidas para a Educacdo, a Ciencia e a Cultura (UNESCO), onde se faz referéncia aos direitos do embrido: “o respelto pela dignidade do embritio formado in vitro para fins de procriago, em caso de infertilidade do casal, ou para evitar a transmissio da doenga de particular gravidade, Pereursos 1028, julho- seterbro 2013, e-em seguida do feto, deve ser assegurado”. Deste modo, para Silva e Silva (2004), comecam a ser salvaguardados 0 respeito pela dignidade do embrigo. O estatuto do embriso humano [A questo do estatuto do embriéo, aos olhos de Serro (2003), deixou de ser apenas retérica, atualmente existem dado que embriées constituidos fora do corpo humano, disponiv ‘em ambiente laboratorial, menos sensiveis & dignidade inerente 2 uma gestago de um ser humano no interior de outro ser humano. Segundo Warnock (1998, citado por Teles, 2004) a questéo relativamente ao estatuto do ‘embrio seria simplificada se houvesse uma estimativa do estédio de desenvolvimento no qual 0 embriéo deveria ser tratado com o mesmo respeito que se tem para com outro ser humano. Para TristramEngelhardtir. (1986, citado por Teles, 2004) a vida humana ndo se Inicia imediatamente aquando a fecundacdo, causando a enorme dificuldade da atribuigao de estatuto moral aos zigotos, embrides e mesmo criangas, sendo que, para ser atribuido esse estatuto deve ser estimada a importancia dessa vida para outras pessoas. Por sua vez, Keating (2998, citado por Teles, 2004) afirma que 2 consciéncia, a racionalidade e o sentido moral de que so os seres humanos & que Ihe atribui determinado valor, e n’o o facto de pertencerem a espécie humana. Reis € Meneses (2010) constatam que embrio humano necessita de um estatuto préprio, com tradugo legal pois 0 ordenamento juridicoportugués nada reconhece a crianga por nascer. Todavia Estado reconhece valor & vida intra-uterina, pois podem-he ser atribuidos valores, como dinheiro, terras, casas [..] como heranca daquele que hé-de nascer”, ou seja, o embrigo ‘acaba por ser reconhecido como “sujeito”, podendo herdar, contudo, hd um siléncio enorme relativamente a outros dos seus direitos. Desta forma, para os autores referidos anteriormente, a constituigdo do Estatuto Legal do Embriéo humano ¢ imprescindivel, dada a elevada importancia de um estatuto que ateste © direito @ vida desde a fecundagio, assim ‘como, o respeito pela dignidade do embriio desde 0 momento de concegio. Para além disso, apesar de j4 ter sido mencionado anteriormente, convém reforgar novamente 0 fato de o reconhecimento do estatuto do ‘embrido implica também efeitos a nivel ético, legal e deontolégico, visto que o embrido é @ primeira etapa da vida humana, e como tal, as ‘equipas de satide assumem o dever, para com 0 mesmo, de uma prestagdo de cuidados de exceléncia (Reis & Meneses, 2010). Outro aspeto a focar nesta temética, segundo Nunes (1995, citado por Rels & Meneses, 2010), € 0 fato de, “a atribuicéo de um estatuto do ‘embrido humano pressupor que, a priori, tenha Pereursos #28, juho Setembro 2013, 53 sido feita uma profunda introspec3o sobre 0 que é a vida humana, no plano biolégico eno universo moral” Em Portugal, 2 ideia adotada pelo Conselho Nacional de Etica para as Ciéncias da Vide (CNECV), em 1997, relativamente a0 respeito ‘que se deve ter para com o embrido, revela: ” 0 ‘embrido no pode deixar de dar origem a um representante da espécie humana, e nunca desembocard num individuo de qualquer outra espécie [..] a vida humana merece respeito, qualquer que seja 0 seu estadio ou fase, devido sua dignidade essencial. 0 embrigo é, em ‘qualquer fase e desde 0 inicio, 0 suporte fisico e biolégico indispensavel a0 desenvolvimento da pessoa humana e nele antecipamos aquilo que ha-de vir a ser: no hé pois, razes que nos levem a estabelecer uma escala de respeito” (Teles, 2004). Como foi evidenciado anteriormente, a diversidade de opiniées relativamente a0 estatuto do embrigo humano, néo permitiu ainda 0 aparecimento de uma resposta concreta sobre 0 assunto em aprego. Assim, 0 CNECV (citado por Reis & Meneses, 2010) refere que “tem aplicagéo, entretanto e sempre, o principio ético que se estabelece ser gravemente ilicito atentar contra um entidade de que se duvida, sim ou nfo, constitui um sujeito investido em plena dignidade humana” Deste modo, pode-se deduzir que, embora \da ndo tenha sido estabelecido 0 estatuto do ‘embriao humano, devemos respeitar o embriao pelo respeito que Ihe ¢ intrinseco. CONSIDERAGOES FINAIS ‘A realizagdéo do artigo mostra a evidente discrepancia de opiniées no que diz respeito 20 momento preciso que dé origem ao inicio da vida humana. Porém, na sua maioria, 0s autores mencionados ao longo do artigo referem que o inicio de vida diz respeito ao momento em que se dé a concecio. No que diz respeito a0 Embrio Humano, verificou-se que 0 mesmo deve ser considerado como um Ser Humano, 0 que nos reporta para questdes como o respeito ¢ dignidade humana que devemos ter sempre ‘em conta, visto ser uma pessoa devendo este ser tratado como tal. Tendo em conta todas as__informagdes apresentadas ao longo do artigo é de constatar a importancia da existéncia de um Estatuto do Embrio Humano, no sentido de proteger os seus direitos dado que a vida humana deve ser respeitada desde 0 inicio da vida ¢ ao longo do seu desenvolvimento até a sua morte. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS Almeida, R,, & Ruthes, V. (2010). A Polémica do Inicio da Vida: uma questo de perspectiva de Interpretagdo. Revista Pistis Praxis Teoda logia e Pastoral, 2(1), 113-124; Barchifontaine, C. P. (2008). Bioética no Inicio da Vida. Revista Pistis Praxis Teologia e Pastoral, 2(1), 4155; 54 Pereursos 1028, julho- seterbro 2013, Deodato, S. (2006). 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