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EVOLUCAO URBANA do Rio de ane MAURICIO DE A, ABREU IPLANRIO 3 edigfo Fuigdo: Paulo Bastos Ceear (Capa: Valéria Naslausky Diagramagio: Ana Tereza Barrocas Revisio de Textos: Mauricio de Almeida Abreu Eultoragio Eletrnica: Sonia Goulart DigitaizagSo de Imagens: Flivio Baltensberger e André Barbosa Produgéo de Arte Final: HD Editorial Supervisfo: Video Clipping Productes Impressio: Imprensa da Cidade FICHA CATALOGRAFICA -——— ABREU, Mauricio de Almeida, AEVOLUGAO URBANA DO RIO DE JANEIRO, Rio de Janeiro i IPLANRIO 1997, 196 P. TL, MAPAS: 28 om Inclui referencias bibliogrificas. 1. Evolupio Urbane - Rio de Janeiro. 2. Bspago Urbano - Rio de Janeiro, 3, Goograia Urbana - Rio de Janeiro. I. Empresa Municipal de Informatica e Planejamento S.A. - IPLANRIO (Rio de Janeiro, RD, Uta, cu: 1181541) IPLANRIO: BIBLIOTECA As SUMARIO PREFACIO 1. INTRODUGAO 2. SOCIEDADE, FSPAGO URBANO E ESTADO: EM BUSCA DE UMA BASE TEORICA 2.1 CONSIDERACOES INICIAIS: MODELOS PRONTOS E SUA CRITICA 2.2 A FORMACAO SOCIAL COMO PONTO DE PARTIDA we 2.3 FORMACAO SOCIAL B ESPACO: A AREA METROPOLITANA DO RIO DE JANEIRO ... 2.3.1 0 modelo metropoitano. 2.3.2 A estrutura metropolitana 2.3.3. Como se comple a estrutura metropoitane 2.4 ESTRUTURA URBANA E MOMENTOS DE ORGANIZAGAO SOCIAL REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS, 3, 0 RIO DE JANEIRO NO SECULO XIX: DA CIDADE COLONIAL A CIDADE CAPITALISTA 3.1 INTRODUGAO. 3.2 OPERIODO ANTERIOR A 1870: A MOBILIDADE ESPACIAL E PRIVILEGIO DE POUCOS 3.3 BONDES E TRENS: A CIDADE CRESCE EM DIRECOES QUALITATIVAMENTE DISTINTAS 3.3.1 O papel dos bondes aie 7 3.3.2 0 papel dos ten cn 34 AINDUSTRIALIZACAO CARIOCA NO FINAL DO SECULO XIX E. ‘AEMERGENCIA DA QUESTAO HABITACIONAL 3.5 ENFIM O FSPAGO CAPITALISTA: A REFORMA PASSOS ... REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 4. O RIO DE JANEIRO NO INICIO DO SECULO XX: AS NOVAS CONT RADICORS DO ESPACO, 4.1 INTRODUCAO. 412 A BVOLUCKO DA CIDADE COMO REFLEXO DAS CONTRADIGOES ESTRUTURAIS DA EPOCA.. 43. A FORMA URBANA E.0 PAPEL DO ESTADO 43.1. 0 Periodo Carlos Sampaio 44 CRESCIMENTO INDUSTRIAL E A FORMAGHO DA AREA METROPOLITANA 4.5 O PLANO AGACHE i : REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 5. © ESPACO EM MOVIMENTO: DO URBANO AO METROPOLITANO S.L INTRODUGAQ.. 5.2 REVERTENDO TENDENCIAS? AS CONTRADIGOES POPULISTAS E A FORMA URBANA 5,3 O PERIODO 1930-1950... i 5.3.1 O papel da Indistria 5.3.2 O crescimenta dos Subirbios 53.3 A expansto das Favelas 5.3.4 Dos Subiirbios & Periferia 5.3.5 0 erescimonto da Zona Sule a estagnago rlativa da Area Cente 5.4 0 PERIODO 1950-1964 5.4.1 A Explosio Metropolitana 5.442. A Favela em 1960. 5.83 A vercalizago da Zana Sao “Problema Vidrio” o Papel do Estado 5.5 VOLTANDO AS ORIGENS. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS. 6, RESUMO E CONCLUSOES FOTOS ~ 1900-1960 n B B 6 16 ” 18 2s 30 33 35 35 31 6 44 ey 39 68 n n n B 76 n 86 a 93 93 94 96 96 99 106 107 12 nS ng 126 126 ba 136 139 149 PREFACIO A TERCEIRA EDICAO Rio pelo Rio. A cidade que é inspirou centenas de artistas, escritores, pesquisadores, poetas ¢ intelectuais, dlispensa apresentagées. Sua poesia, seu glamour, seus belos cendrios e suas excentricidades ja serviram deen- redo para muitas obras ‘Nao tem sido diferente com os diversos profissionais especialistas em cidades, onde se destaca o professor Mauriciode A. Abreu, Ao comegar, em 1978,0s estudos que dariam origem a este livro, Mauricio integrava a equipe do Centro de Pesquisas Utbanas do Instituto Brasileiro de Administragao Municipal (IBAM). O ‘objetivo inicial de pesquisar a influéncia das politicas piiblicas referentes a distribuigo espacial da populago de baixa renda da cidade se desdobrou na tarefa de escrever sobre a “Evolugdo Urbana do Rio de Janeiro”, ‘A riqueza de informagSes que conseguin reunir eanalisar neste livro tomou-sereferéncia para diferentes segmen- tos que estudam o Rio ¢ sua regido ou que, simplesmente, tém vontade de conhecer sua dinémica histéria. A abordagem do tema foi de tal sucesso que a IPLANRIO reeditao livo, ciente deestar preenchendo uma lacuna ‘que vai atender & grande demanda que fez com que as primeiras edigdes fossem rapidamente esgotadas. ‘Com esta iniciativa, a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro contribui, mais uma vez, para a ampliagio do conhecimento sobre aquela que ficou conhecida como cidade maravilhosa Helin Nacif Xavier Seoretiria Municipal de Urbanismo ‘Novembro de 1997 Quase uma década apés o seu langamento, vem a piblico uma nova edigdo do "Evolugdo Urbana’, ja um classico da nossa literatura especializada em urbanismo. ‘Nesses anos, a obra de Mauricio Abreu conquistou um lugar de destaque entre professores ¢ alunos de arquitetura e urbanismo, profissionais do setor junto a0 publico interessado na historia ena atualidade de nossa Cidade. E um trabalho conciso, esclarecido ¢ inspirado ‘na medida ceria para cativar o leit com o romance da vida real ‘Ocorre que o livto de Mauricio Abreu, para desespero do piblico, havia se transformado em raridade biblio- ‘gifica. A pequena tiragem das duas primeiras edges vinha sendo disputada avidamente em sebos e livrarias, cespecializadas. Um grave contratempo impedia a reim- ppressio: durante uma mudanga da IPLANRIO. agéncia municipal de planejamento encarregada da edigio, 0s, fotolitos se extraviaram e foram frustradas todas as tentativas de encontra-los. ‘Agora, premida por uma procura inconformada, a IPLANRIO encontrou uma soluedo para refazer os fotolitos. Imagens ¢ textos foram cuidadosamente digitalizados com técnica de scanner, obtendo um resultado superior ao que se podia obter com técnica de facsimile. (© "Evolugio Urbana” merece o investimento. E 0 plblico volta a ter acesso a uma das mais importantes contribuigdes 4 historia urbanistica da cidade do Rio de Janeiro, Verena Andreata Diretors-Presidente da IPLANRIO ‘Novembro de 1997 PREFACIO A PRIMEIRA EDICAO Este trabalho é, antes de tudo, um trabalho de épo- a, dai porque € necessério contar um pouco de sua historia Foi escrito em 1978 ¢ integrava, naquela ocasiao, 0 programa de estudos do Centro de Pesquisas Urbanas do Instituto Brasileiro de Administragdo Municipal (BAM), contando com 0 patrocinio do Intemational Development Research Centre (Instituigio canaden- se) ¢ da endo Comissto Nacional de Regides Metro- politanas e Politica Urbana (CNPU, hoje CNDU). 0 objetivo inicial da pesquisa era o estado da influ éncia das polticas piblicas sobre a distribuigao espa- cial da populagao de baixa renda na Area Metropoli tana do Rio de Janeiro. E foi nessa diregdo que eu e Olga Bronstein, responséiveis por sua elaboragto, en- ‘caminhamos inicialmente o estudo. Na divisto de tra- batho que se seguiu, a mim foi confiada a tarefa de buscar elementos histéricos que servissem de ponto de partida para a discusséo da estrutura urbana atual da metrépole carioca. A partir dai, o estudo tal como ‘© haviamos imaginado, comegou a madar de diregao. A consulta & bibliografia entio existente logo reve- lou a riqueza das informagoes disponiveis. Com efei- 10,08 livros, relatérios, artigos, crénicas e dados esta tisticos encontrados tratavam dos mais variados as- pectos da evolugto urbana do Rio de Janeiro, desper- tarde em nés uma curiosidade cientifica crescente Cada nova informagio obtida aumentava, por sua vez, © fascinio pelo tema em estudo, impelindo-nos & ex ploragio de horizontes ainda mais distantes. Havia entretanto um problema: embora rica, a bic bliografia a que tivemos acesso era extremamente setotial e/ou pontual, resultando dai a inexisténcia de qualquer obra que tratasse do processo de construgao/ transformagao do espago metropotitano carioca de for ‘ma integrada, ou soja, ue analisasse as ages dos agen- tes modeladores do Rio de Janeiro no conjunto de suas interrelagbes, conflitos e contradigées. Era preciso, pois, realizar esta tarefa, ou seja, inte- sraras informagdes obtidas em fontes secundérias num texto tinico, Este deveria ter, entretanto, unidade te6- rica e metodolégica priprias, consoantes com os obje- tivos do trabalho proposto. Foi seguindo esta orientagio que, na medida do possivel, © lutando contra a escassez de recursos e a fatalidade dos prazos, se desenvolveu este trabalho. O resultado final revelou-se muito mais amplo do que aquele originalmente previsto, tendo a pesquisa rece- bido o extenso titulo de “POLITICAS PUBLICAS, ESTRUTURA URBANA E DISTRIBUICAO DE POPULAGAO DE BAIXA RENDA NA AREA ME- ‘TROPOLITANA DO RIO DE JANEIRO”. © texto aqui apresentado contém os capitulos de ‘minha autoria constantes desse documento. A vonia- Ge de publicé-tos é antiga, mas a decisio de reaizé-la {i fruto de um longo e difteil processo de reflex. Os cinco anos de pesquisa investidos posteriormente no estudo do mesmo tema ~ e dedicados agora & and- lise das fontes primérias, ausentes do trabalho anteri- or ~ representaram, nesse processo, uma barreira po- derosa, que previsou ser vencida. A tentagio de alte- rar o trabalho original era grande, ¢ aumentava mais ainda a cada novo cédice consultado no Arquivo da Cidade, a cada novo mapa original encontrado no Ar- quivo Nacional, a cada nova leitura de documento antigo na Biblioteca Nacional ou no Instituto Histéri- 0 © Geogréfico Brasileiro, E.o que falar de todas aquelas teméticas, importan- tes para 0 estado da evolucdo urbana da cidade do Rio de Janeiro, ¢ que nem eram tratadas no estudo jé realizado? Era preciso incorpori-las a0 trabalho jé feito!!! A conscientizagao de que qualquer modificagao es- trutural realizada no texto anterior resultaria na sua total reformulagfo e, por conseguinte, num outro es- tudo, demotou a chegat: Mas veio! E, com ela, a decisto de manter o trabatho tal qual ele havia sido elaborado em 1978. O texto aqui apresentado reflete, pois, um pensamento de época Os que conhecem a versio original notarto diver- sas modificagdes estilisticas ea supressfo e/ou altera- $40 de varios pardgrafos e subtitulos, Pretendeu-se, com isso, corrigir certas imprecisdes do texto original e eliminar seu formato de relatério de pesquisa. O con- tetido, entretanto, pouco foi alterado, ‘A oportunidade de publicagao deste trabalho traz inevitavelmente & meméria todos aqueles que contri- buiram, das mais diversas maneiras, para que isto acontecesse. O agradecimento inicial 6 ao IBAM. Sem a conti- anga em mim depositada, ¢ sem o ambiente amigo ¢ intelectualmente desafiante que 6 encontrei, quando 2 essa insituigao estive formalmente ligado, este tra- balho nao teria sido realizado, Ao Professor Diogo Lordello de Mello e a Cleuler de Barros Loyola, o meu profundo reconhecimento, A Carlos Nelson Fereeira dos Santos, a amizade ¢ 0 agradecimento pela auto nomia concedida ao desenvolvimento deste estudo. ‘A Edgar Gongalves da Roche, Paulo Fernando Cavalieri, Alete Ramos de Oliveira, Maria Lais Pe- reira da Silva, Olga Bronstein ¢ Ana Maria Brasilei- ro, minha amizade, consiruida ainda nos tempos do IBAM. A Paulo Luts de Freitas ¢ Gladis Brum, a alegria de poder dividir com vocés a realizagao de um desejo antigo, para ¢ qual muito contribuitam. ‘A Professora Maria Therezinka de Segadas Soa- res, que orientou meus primeiros passos como pes- quisador, e que despertou em toda uma geracdo de estudantes a vontade de desvendar os misters da ge- ografia urbana carioca, a alegria de poder retibuir © incentivo recebido. ‘A.Leila Christina Duarte Dias e Lia Osorio Macha- do, a satisfapdo de poder provar, ainda que com bas- tante atraso, que suas “prelegdes” surtiram efeito. ‘A. Milton Santos, Afonso Carlos Marques dos San- tos, Olge Becker, Lysia Bernardes, Maria Adélia A. de Souza, Licia Valladares, Marta Bebianno Costa, Carlos José Mascarenhas Femandes, Manoel Seabra, Ney Paiva Chaves, Monica Vertis, Ivan Viana, Yelda Saraiva, Mario Aizen, Consolagio Moreira Lima € Alberto Strozemierg 2 gratidio pelo apoio recebido, em momentos diversos. ‘Ags meus alunos de graduagao ¢ pis-graduagao do Departamento de Geografia da UFRI, 0 obrigado pela Constante troca de idéias, realizada sobretudo com Nina Maria C. Elias Rabhe, Nelson da Nobrega Femandes e Susana Mara Miranda Pacheco. ‘A minha equipe de pesquisa, e ao CNPg, FINEP © CEPG/UFRI, que viabilizaram a formacio do grupo, todo reconhecimento ¢ pouco. Sem o apoio e dedica- ‘Go recebidos de todos, e sem 0 suporte dos drgtos financiadores teria sido impossivel avangarnesse cam- po do conhecimento ¢ reconhecer o valor de um traba- Iho pioneiro. © agradecimento é coletivo, mas seria injusto nio citar aqui o estimulo constante recebido de Monica Marques Leo, Maria Cristina Siqueira dos Santos, Angela Nunes Damasceno ¢ Elizabeth De- zouzart Cardoso, Exte trabalho é dedicado a MURILO GoDOY que ainda continua vivo na lembranca de todos nds. 10 sky, Ana Tereza Reig de Cam- pos Barrocas, Patricia Ribeiro Carvatho, Bruno Spe- ranza, Jorge Enrique Janna Herrera e Luzia Cardoso Repinaldo agradeco o esforgo empreendide na prepa ragdo final desta publicagio, & qual dedicaram nao apenas sua eficiéncia profissional, como também um carinho todo especial Sou grato também ao Dr. Gilberto Ferrez que auto- rizou a publicago de algumas fotos de seu livro “0 Rio Antigo do Fotégrafo Mare Ferrez.” e aos amigos ddo Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janciro (Sees deDocumentagto Cartogrifica, conogréfica e Audio- visual) ¢ da Bibliotece Nacional (Seg de Obras Ra- ras e Sego de Microfilmagem), que facilitaram a0 ‘méximo 0 trabalho de selegao de diversas ilustragdes aqui apresentadas, Finalmente, devo 4 IPLANRIO 0 maior agradeci- mento, pela oportunidade de tomar piiblico um traba- Iho que, embora bastante citado, muitos jé considera vam como fadado a ser eternamente “inédito”, Manticio de A. Abreu Junko de 1987 1. INTRODUGAO Este trabalho pretende explicar o presente através do processo histérico que lhe dew forma ¢ contetdo. Mais especificamente, seu abjetiva é demonstrar que alto grau de estratificacdo social do espaco metropo- litano do Rio de Janeiro, na atualidade, & apenas a expresso mais acabada de um proceso de segrega- ‘80 das classes populares que vem se desenvolvendo no Rio hd bastante tempo. Pretende-se, com esia pes- quisa, recuperar esse processo histérico, teérica ¢ empiricamente, ‘Un trabatho que vise analisar 0 processo de evolu jo de qualquer cidade a partir de sua organizagio tual é, por definigdo, um estudo dinfmico de estrutu- ra urbana, Para que evite cair no empirismo da mera descrigdo geogrtica, & nevessério, entretanto, que ele relacione ~ a cada momento ~ a organizagio intema da cidade com 0 processo de evolugdo da formagéo social. $6 assim serd possivel integrar padréo e pro- esso, forma e Fungo, espagoe tempo. Tentando atin- gir este objetivo, o estudo aqui apresentado descreve © analisa a estrurura urbana do Rio de Janeiro, desde 0 inicio do Século XIX até o momento atual, procuran- do perceber, paralelament, suas interagdes com os pro- ‘ess08 evondmicos, sociais e politicos que impulsio- naram o pais nesse mesmo petiodo, Virios sao os responséveis pela evolugao da estru- tura urbana no tempo, Analisé-los todos, ¢ de forma detathada, seria tarefa por demais complexa para os objetivos deste traballio. Por esta razfio, e sem descui- dar da agdo exercida por outros agentes modeladores <0 espago, resolvemos dar atengio especial ao papel 233087 2 ZONA “RURAL” aan 303.251 5 R.A. Campo Grade 116485 ros a RA. Santa Cruz om 92.92 a SUBURDIOS PERIFERICOS1 383.298 1388992 20 Duque de Caxias 241.025 431.397 % Nigpotis 95.111 128011 35 Nowa lguagu? 336.545 m1440 1m So fo de Merit 190516 s02394 39 SUBORBIOS PERIFERICOS tt 24487 430.201 6 | Sto Gonato? 244617 oan 6 Hota 678.266 6595377 a [1 Inst Xerém.2— Intl Cava. 3— nel pita 4 = Inca apa |e: * shape rotmintr so Coto Demogsce de 1970 (Endo de Guna) Cnt Deu de 1960 to Revo lana) oo ‘© Cento Demogrifico de 1970 (Estados da Guanabars o Rio de Jenciro). re 27 ‘TABELA 26 z s ee POPULAGAO URBANA, DENSIDADE E TAXAS DE CRESCIMENTO DA AREA CONURBADA DA RMRJ, POR MUNICIPNO Hite: : z “ : 1960-1970° da RMRI © 1970-1975"* Rio de Janeiro. 1000 3631.09 255 a0 Dague-de Caxias 937 975,89 590 40 Nildpatis 1000 $.822,64 2.85 270 Niterdi 90,1 249513 2800 300 Nova Iguacu 996 95285 730 5:0 ‘Sfo.Gongalo 1000 1.887,50 $70 445, So Jote de Mert 1000 81494 4,65, 3.85 ara total a dea, 950 2.265,90 350 330 ara total da RMRY 70 1.28032 350 330 IBGE ~ Centos Demogrificos dos Estados do Rio de Janciro c Guanabara - 1960 © 1970. IGE = Estimativas de populacfa residente em 19d jlho de 1975. * BREMAEKER, FrangoisE.de. As Regides Metropolitanas. Revises Brasil de Bstatstce, Rio de Fanci, jase. 1915, ** Contr de Pesquisas Ustanas do BAM. cionam para muitos como etapa proviséria. de onde eles seem para a periferia, expulsos por inadimpléncia de pa- ‘gamentos ou simplesmente fugidos por conta prépria. Independentemente da procedéncia desses habitan- tes, o importante a ressaltar & que trata-se de uma po- pulago pobre que, em quase sua totalidade recebia, em 1970, rio mais que 3 salérios minimos (Mapa 2.7). Os centros de servigos existentes ma periferia inter~ mediaria, apesar de dindmicos e de possuirem alguma expressividade, sio de baixo padrao, adaptados as pos- sibilidades de consumo de seus usuarios. © eresci- mento industrial € restrto a algumas reas, especial- mente no municfpio de Duque de Caxias, que partici pacom 12,5% da populagao industrial metropolitans.” TABELA27 PAREICeACKo DA FOPULACKO DOS MUNICIPIOS EM RELAGAO A AREA CONURBADA E A REGIAO ILETANA DO RIO DE JANEIRO. A densidade de ocupagio do solo muito regular: alta em algumas reas e baixa em outras (Tabelas 2.6 2.7). Ainfa-esteutura urbanistica inexiste ou é muito precéria. © mesmo acontece com 0 equipamento so- Cial, ocorrendo ume tendncia para a busca daqueles do nicleo ou da periferiaimediata (© controle progressive do uso da terra no nicleo © nas suas proximidades, alm de expulsar as popula- ‘es pobres para a periferia, obrigou-a a desenvolver lum mercado de emprego informal local. Notas, tam- bbém, grande inforinalidade no uso do solo e nos tipes de construgfo, A conurbagio da periferia intermedia com aime- diata sacralizou-se definitivamente a partir doin Foot IBGE — Coan Domgrtoe dos Eades do Rio de inne e Gunabara~ 196061970. IBGE ~ “Brasil — Estimativa da rsidente ns fo ee ee 28 ‘onugay 018850 Sd 06 9 seu GEE 06189 ETF ‘08 © 1< op EEE soLessep EE oxssaqen opsnag —@ ae SOWINIW SORIVIVS & V YORaINI VONSY WOD WALLY OYSVINdOd VG W3OVINIOUId ‘OULINV 3d ORI Od (VaVEYNNOD Vauy) VNVLMOdOUaW vat — Z'2 VaVW da década de sessenta, quando houve 4 mudanga da capital eo Rio passou a cidade-Estado. E a partir des- sa época também, e especialmente a partir de 1964, ‘que 0 nlcleo metropolitano passa a sero paleo prefe- fido de grandes melhoramentos urbanos, realizados tanto pelo Governa Federal como Estadual, Com efei- fo,as grandes obras, como tineis, viadutoseautopista, ficaram no nicleo em sua matoria, reforgando 0 con traste entre este eas periferias metropolitanas. O mes ‘mo ocorreu com os maiores investimentos, como a construgdo de grandes sistemas abastecedores de égua ou do interceptor oceinico (Tabela 2.8). Mas me~ Thor exemplo e o mais recente (jé durante 0 processo de fusto dos Estados da Guanabara e do Rio de Janei- 10) € 0 do Metrd- obra que, servindo exclusivamente ao nicleo, é2 de orgamento mais elevado de todas, ea e aleance mais restrito, enquanto 0 verdadeiro tans- porte de massa, 0 trem suburban, ficou em completo albandono.” ‘A excolha nfo foi aleatéria nem atipica. Ao con- tririo, ela parece ser apenas um exemplo a mais no longo processo de construpio diferenciada do espaga catioca em beneficio dos mais ricos, conforme sera emonstrado adiante. Antes disso, entretanto, é ne- cessério que se explicite a forma como essa demons- teagao seré realizada 24 ESTRUTURA URBANA E MOMENTOS DE ORGANIZAGAO SOCIAL, © objetivo desta parte & apresentar uma articula- 6410 de conceitos que possibilite teorizar sobre a evo- Tuga da estrutura urbana do Rio de Janeiro. As se- ‘qdes anteriores mostraram claramente o estigio atual dessa estrutura, essaltando o alto grau de estratifieagio social do espago. Mostraram também que a intensifi- cago deste processo de estratificagdo € uma caracte- ristica do momento brasileiro pds-64, um momento historicamente determinado da evolugao da formagiio. social brasileira. ‘Aanélise do momento atual &, pois, o ponto de par- tida do estudo da estrutura urbana, Mas ela 36 nto basta. E preciso ir além, ¢ demonstrar que momentos atuais sto também influenciados por momentos ante- riores, que legaram ao espago atual forma e contetido. Hii que se discutir, ent2o, o que isto significa, ‘Qualquer cidade pode’ser vista como uma coleyt0 de formas geogrificas, Essas formas, sejam elas bair- +0s ou edificios, por exemplo, podem ser analisadas fem termos de forma-aparéncia e forma-contetxlo. (Quando analisada apenas sob 0 critério de forma- aparéncia, a cidade seria composta, a qualquer mo- mento, de formas antigas, testemunhos de perfodos anteriores de organizagio social, ¢ de formas novas, caracteristicas de momentos mais recentes de organi- zagéo social. No presente momento, por exemplo, @ cidade do Rio de Janeiro possui bairros onde predo- rinam antigos sobrados e casas geminadas, ¢ bairros onde a predomindncia ¢ de grandes edificios de apar- tamentos em condominios fechados, reflexos de dois periodos distintos de organizago social pelos quais 30 ‘TABELA 28 DISTRIBUICAO PERCENTUAL DOS INVESTIENTOS EM AGUA E ESGOTO SEGUNDO AS REGIOES ADMINIS- TRATIVAS DO MUNICIIO DO RIO DE JANEIRO 9781977) NOCLEO BLL 05 RA. Centro 20,8 ° AREA PERIFERICA CENTRAL 0,2 ° RA. Portusra oa 0 RIA Rio Comprido on ° RA Slo Ciistorio 02 0 WA. Santa Teresa 0 oO ZONA SUL 0.5 RA. Botafogo 39 RA’ Copacabana 68 RA Lagoa 678 ‘ZONA NORTE ° RA. Tica ° RA. Via labo} 0 PERIFERIA IMEDIATA 38 ‘ZONA SUBURBANAT 10 RA. Ramos 0 RA. Penha 0 RA Mice 0 RA. Eagerto Novo, 0 RAIng 19 RA. Madhieira 9 RA. Tacacepagud 23 2 A'S las (Paquet e Governador) 0.8 57 RA. Barr da Tyjues 196 0 PERIFERIA INTERMEDIARIA 35,5, 10,7 ZONASUBURBANAIL = 102,34 RA. Bunge 08. oF RA. Anchiets 93 34 ZONA “RURAL” 253 13 RA. Campo Grande 13 ° RA. Santa Cruz 120 cee TOTAL 1000. 1000 Fonte: Adaptado de VETTER, David; MASSENA, Ross MLR. RODRIGUES, Elza F Espaso, Valor de Terra © Baitidade dos Tnvestinentos em Infraestratina Urbana: Uma Anélise ‘do Sunietpto do Rio de Janeiro, IBGE, Depastamente de E- {idosc Indicadores Socials, 1978 (mimeo). passou a cidade. As formas-aparéncia, ou formas morfolégicas, representam entio uma acumulagao de tempo, e sua compreensio, desse ponto de vista, de- pende do conhecimento do que foram os diversos ‘momentos de organizago social pelos quais passou tum determinado espaco."* ‘As formas, entretanto, no t&m apenas uma apa- réncia externa, mas também possuem um conteddo, isto 6, realizam uma funcio. E esta fungdo é determi- nada exclusivamente pelo periodo atual de organiza- (© espazo refete, a cada memento, 0 joge de forgas des sistemas que compe a cociedade. Quando a contestapio popular pesst 3er sindnime do cubveraso « &, por ies, reprimid a forgs, 0 expago tende a 80 organiza’ a partir dos interosses do ‘Capital e do Estado. Antigo balrro residancial da cidade, © Catumét foi pratieamente redusido 8 umn grands viaduto durante © ragime militar Sua nova fungio: eclitar © 908880, por automével 4 zone sul cidade, Fonte: CPUNBAM ~ 1980, ‘20 social, Formas morfologicasantigas podem, pois ser chamadas a realizar fungdes totalmente distintas aqueles para as quais foram criadas; podem, inclusi- ve, desaparecer, se assim o determinar a dindimica da organizagao social Para exempliticar, o Rio de Janeiro possufa, até & década de sessenta, uma série de bairros (como Ca tumbi, Estécio e Lapa) que serviam de local de resi- déncia para classes de baixa renda ou abrigavam fun: ges de apoio ao comércio ea industria, Alguns des- se5 bairtos tinham sido, outrora, local de residéncia de classes mais abastadas, e 0 fato de niio mais 0 se- rem refletia uma mudanga ja ocorrida na sua forma- contéudo, ou seja, refletia a perda dessa fungdo orig nal. Hoje, esses bairros praticamente desapareceram do cenrio residencial carivea, por exigéncia de for- 28 poderosas de estruturagdo urbana que, presentes 4 ha muito na cidade, sé vieram a se materializar plenamente a partir da década de 1950, Destacam-se ai as exigéncias vidrias do transporte individual, fru- to, por sua vez, da intensifieactio do processo de con- centragto de renda no pais Visto sab uma ética mais abrangente, o momento atuat diz respeito, entdo, a forma como se estraturam 9s sistemas econdmico, juridico-politico ¢ ideolégico de uma sociedade num dado periodo de tempo. E ele 9 responsavel pelo vator atribuido &s formas antiga. E ele também que leva & criaglo de novas formas ‘A evolugao de um momento de organizacio social para outro, por sua vez, € fungo de modificagdes ocor- ridas nesses sistemas que compiem a sociedade, Es- sas modificages podem decorrer do fato de a evolu- fo diferenciada desses sistemas ter chegadoa um grau de contradigao insustentvel, ou podem ainda refletir tum reajuste ou recomposigdo da estrutura anterior. Tanto num caso como no outro, as caracteristicas do novo momento de organizaglo social dependerso, ob- viamente, do grau de tesolusito das conttadigdes exis- tentes, ¢ de que classe ou grupo passa aser dominant. Dado que o espaco reflete, a cada momento, as ca- racteristicas da organizagéo de uma sociedade, a or- dem espacial de uma cidade, ou seja, sua estrutura urbana, efletité também o resultado do confronto, re- ajuste ou recomposigao dos sistemas que constituem a sociedade. Por essa razio, o estudo da estruturacio da cidade nfo pode ser feito separadamente do estudo do processo de evolugdo da sociedade, Como diz. Castells, 0 espaco no & independente da estrutura social; €, isto sit, a expressio concreta de cada fase histérica na qual uma sociedade se especitfica."* A afirmago de Castells nto deve, entretanto, levar & suposiedo de que o espago ¢ uma matéria inert, “um simples pano de fundto no qual so inscritas as ages de classes ¢instituigdes através do tempo”. Comefeito, se ‘0 processos saciais d8o ao espago uma, forma, uma furn- (0, uma signifieapto social, este também influencia 0 desenvolvimento desses mesmos processos no decorrer do tempo, institucionalizando-os ou modificando-os. Esta influéncia do espaco é determinada, princi- palmente, pela permanéneia de formas anteriores, que a tanto podem se constituir em barreira ao desenvolvi- ‘mento de novos processos, como podem facilité-ts. Tudo depende da atribuigo que essas formas antizas adquirem a cada momento de organizagio social, de sua capacidade de adaptar-se ou resistir 8s novas exi- géncias ¢, finalmente, do papel exercido pelo Estado cada momento, as vezes impondo 0s desejos da clas- se ou grupo dominante, as vezes resolvendo os confli- tos existentes ou potenciais de maneira menos evi- dente, mas geralmente em beneficio dessa mesma classe ou grupo Os capitulos seguintes procuram analisar a evolu- «20 da forma urbana da Metrépole carioca segundo 05 diversos momentos de organizagio social pelos quais, cla passou. A determinagao desses momentos, obvia- est sujeita a criticas, jf que toda classificagtio € arbitréria, Acredita-se, entretanto, que a perio- dizago aqui estabelecida revela os grandes marcos de desenvolvimento da formagao social brasileira, ¢ seu conseqiiente rebatimento no espago urbano ca- -se, em primeiro lugar, o século XIX, dan do destaque ao papel exercido pelos meios de trans- porte coletivo na expanséo fisica da cidade. A Refor- ma Passos, no inicio do século XX, marea 0 inicio de ‘outro momento importante de desenvolvimento da ci dade, um momento de resolugo de contradigbes an gas ¢ de aparecimento de novas, © fitn da Repablica Velha estabelece, finalmente, 0 inicio de outro mo- mento, que vai durar até 1964, Formas morfolégicas antigas podem sor chamadas a realizar fungoes tormenta distntas daquolas para as quals foram ‘riadas, Antiga resincia senhorial tanstormada em depesito (Caturnbil Fonte: CPUNBAM ~ 1980 32 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS, 01. O exemplo mais tipico dessa escola esté consubs- tanciado na teoria de Burgess sobre o eres mento das cidades. Ver BURGESS, E. & MACKENZIE, R. The City, Chicago, Univer sity of Chicago Press, 1925, pp. 47-62. 02. HARVEY, David. Social Justice and the City. Baltimore, The Johns Hopkins University Press, 1973, p. 131 03. CASTELLS, Manuel. La Cuestién Urbana. Mae ahi, Sigio Veintiuno Baitores, 1974, p. 143. 04, ALONSO, Wiliam. Location and Land Use. Cambridge, Mass, Harvard University Press, 1964; WINGO IR. Lowdon. Transportation and Urban Land. Washington, D.C., Resources forthe Future, 1961 ~ MUTH, Richard F. Cities and Housing. Chicago, The University of Chi- cago Press, 1969, 05, CASTELLS, Manuel. Op. cit, p. 298 6, Ver ALTVATER, EF. Notas sobre alguns Proble- mas do Intervencionismo de Estado, 1977, (mimeo) p. 3 07, HARNECKER, Marta, Conceltos Elementais do Materialismo Histérico. Mexico, Siglo Veintiu- no Editores, 1972. 08, SANTOS, Milton. Sociedade e Espago: A Forma- ‘0 Social como Teoria e como Método, Bole- lim Paulista de Geografta, 54, junho 1977, p. 88. 09. SANTOS, Milton. A Diviséo do Trabalho Social como tima Nova Pista para o Estudo da Orga nizagdo Espacial e da Urbanizagiio nos Paises Subdesenvolvidos, in 3° Encontro Nacional de Gedgrafos, Fortaleza, 19-27 de jutho de 1978, Sessdes Dirigidas. Fortaleza, Universidade Fe- deral do Cearé/Associagdo dos Geégrafos Bra sileiros, p. 39. Reproduzido também em SAN- TOS, Milton. Espago e Sociedade, Petrépolis, Vozes, 1979, pp. 36-54, 10. SANTOS, Carlos Nelson Ferreira dos e BRONS- TEIN, Olga. Metaurbanizagio - caso do Rio de Janeiro. Revista de Administragéo Munic!- pal 25 (149), out-dez, 1978, 11, Ver VETTER, David. The Distribution of monetary ‘and real income in Grande Rio's Metropolitan system. Los Angeles, University of California, 1975 12. Censo Industrial de 1970 ~ IBGE, 13. Quanto as razdes da escolha alternativa de inves- timentos em transportes de massa, consultar 0 artigo de SANTOS, Carlos Nelson F. Trans- portes de massa — condicionadores ou condici- onados? Revista de Administracdo Municipal, 24 (144); 13-32, seVout, 1977; cf, também 0 documento de ASSMANN, Plinio Oswaldo. 0 lugar dos diferentes medos de transporte co- letivo. S40 Paulo, 1976. Documento apresen- tado no I Simpésio Internacional de Transpor- tes Pablicos 14, SANTOS, Milton, A Divisio do Trabalho Social como uma Nova Pista para o Estudo da Orge- nizagdo Espacial e da Urbanizago nos Paises Subdesenvolvidos. Op. cit, p. 41 15. CASTELLS, Manuel, Op. cit.,p. 141 16, Ibid, 33 3. O RIO DE JANEIRO NO SECULO XIX: DA CIDADE COLONIAL A CIDADE CAPITALISTA Botafogo por volta de 1850. Gravura do Bardo de Plnit,rapraduzida do Album de ¥2 Vistes do Rio de Jane liveeira em Hamburge. €:B. Planitz € por Spackter & Cis. - Roberta K Fo de Janoiro ii, 3.1 INTRODUCAO. Sé a partir do século XIX ¢ que a cidade do Rio de Janeiro comega a transformar radicalmente a sua for- mma urbana e a apresentar verdadeiramente uma estru- tura espacial estratificada em termos de classes soci- ais. Até entdo, o Rio era uma cidade apertada, limi- tada pelos Moztos do Castelo, de So Bento, de Santo Anténio e da Conceigto, Ocupava, entretanto, um chao duramente conquistado & natureza, através de lum processo de dissecamento de brejos e mangues que if durava mais de tés séculos. Além dos morros ha- via apenas alguns tentaculos, que se dirigiam aos “ser- t5es” do sul, do oeste e do norte! (ver Mapa 3.1), Era também uma cidade em que a maioria da po- ulagao era escrava. Quase que uma cidade de mer- cadorias. Poucos eram os trabalhadores livres, € reduzidissima a elite administradora/militar/mercan- til que the dirigia politica e economicamente. A falta cde meios de wansporte coletivo e as necessidades de ddefesa faziam com que todos morassem relativamente proximos uns aos outros, a elite local diferenciando- 9 desenhadas por Ed. &Henr. Laemmert, Livrairos. se do restante da populaco mais pela forma ~ apa réncia de suas residéncias do que pela localizagao das mesmes. No decorrer do século XIX assiste-se, entretanto, a modificagdes substanciais tanto na aparéneia como no contetido da cidade. A vinda da familia real impbe a0 Ri classe social até entio praticamente inexis- “tente. Impde também novas necessidades mater que atendam néo sé aos anseios dessa classe, como facilitem 0 desempenho das atividades econdmicas, politicas e ideoldgicas que a cidade passa a exercer. A independéncia politica e o inicio do reinada do café sgeram, por sua vez, wa nova fase de exp: nndmica, resultando dai aatragio ~ no decorrer do culo e em progresséo crescente.— de grande niimezo de trabalhadores livres, nacionais.¢ estrangeiros. A partir de meados do século a cidade passa a atrair tam- bbém numerosos capitais internacionais, cada vez mais disponiveis © & procura de novas fonies de reprodu- 40, Grande parte deles é utilizada no setor de servi 603 publicos (Gransportes, esgoto, gs, etc), via con- cesses obtidas do Estado. MAPA 3.1 — A CIDADE DO RIO DE JANEIRO NO INICIO DO SECULO XIX tau Seaton) PLANTA, DA CIDADE DES, SEBASTIAO RIO DE JANEIRO. Redusido de quate rdlccu ne ano de 1812 selene Baseada em relagdes de produedo arcaicas, de base escravista, a formagao social brasileira ainda convi- veria algum tempo com esses novos elementos, essen- cialmente capitalistas, que aqui se introduziam, As contradigdes daf decorrentes nfo tardaram, entretan- to, a aparecer. Com efeito, pouco a pouto, a cidade passa a ser movida por duas ldgicas distintas (escravista e capitalista), ¢ 08 confitos gerados por esse movimento irdo se refletir claramente nd seu es- 36 Tine Ts ops aoa AMPs ft porstove Carlaw Jom i ayo urbano, As contradigies da cidade 36 serio resolvidas no inicio do século XX. Tal resoluedo, entretanto, s6 sera possivel porque, no decorrer do século XIX, sao lan- ‘gados no espago os elementos que a possibilitam, den- tre eles a separagdo, gradual a principio, e acelerada depois, dos usos e classes: ‘que se amontoavam ‘no antigo esparo colonial. Essa separacao s6 foi pos- sivel, entretanto, devido & introdugio do bonde de burro /e da.trem_a vapor que, a partir de 1870, constituiram’ | se nos grandes impulsionadores do crescimento fisico} ida cidade? Um crescimento que segue a diregto dag \*frentes pioneiras urbanas” ja esbogadas desde 0 tulo XVIII, mas que € agora qualitativamente difey, ‘rente, j& que os usos ¢ classes “nobres” seule | cdo dos bairros servides por bondes (em especial aque Tes da zona sul), enquanto que para o sublirbio pas sam a se deslocar 0s 1s03 “sujos” ¢ as classes menos) \privilegiadas. Dada a importincia dos transportes coletivos na cexpansio da cidade ¢ na conseqiiente transformacao de sua forma urbana, € nevessario, pois, que se anali- se a evolucio urbana do Rio de Janeiro no século XIX em dois periodos distintos, ou seja, a fase anterior 20, aparecimento dos bondes ¢ trens, ¢ 0 period que the E posterior. (© ano de 1870 neste sentido, um marco divisé- rio bastante adequado, A nivel da forma-aparéncia da cidade, ¢ neste ano (dois anos depois da entrada em funcionamento da primeira linha de carris da ci- dade), que a Estrada de Ferro D. Pedro If aumenta o niimero dos seus trens suburbanos, Trata-se, pois, do ano em que 0s dois elementos impulsionadores da expansio da cidade (bondes ¢ trens) passam a atuar sineronicamente. A nivel da forma-conteiido, 6a pactir dessa década que o sistema escravista, mola mestra a produgio. nacional, entra definitivamente em lapso,caminhando ccleremente pati @ sua superagdo, mas detonando, ao mesmo tempo, forgas importantes ‘ae estruturago urbana, que mareariam profundamente acidade, » 32 O PERIODO ANTERIOR A 1870: ‘A MOBILIDADE ESPACIAL E PRIVILEGIO DE POUCOS ‘Teeze anos apés 2 chegada da familia real, ¢ a um ano da independéneia do pais, o Rio de Faneio ainda é, em 1821, uma cidade bastante modesta..Restrin- ia-se basicamente is freguesias da Candeléria, Si José, Sacramento, Santa Rita © Santana, que conespondem grosso modo, as atuais regiées admi nistrativas do Centro e Portudria (Mapa 3.2). As de- ‘ais freguesias existentes eram, ent0, predominan- temente rurais ‘i nesta data podia-se nota, entretanto, uma ténue 4iferenciagio social entre as cinco freguesias urbanas. Abrigande agora o Pago Real, na atual Praga XV, e as repartiges mais importantes do Reino, as freauesias da Candelétia e S20 José transformaram-se gradati- ‘vamente em local de residéncia preferencial das clas- se dirigentes, que ocupavam os sobrados das ruas es- tweitas da Freguesia da Candela, ou dirigiam-se as nuas tecém-abertas do Pantanal de Pedro Dias (ruas dos Invélidos, do Lavradio e do Resende, no atual bai- ro da Lapa). Tinham como opsao, também, as chica- ras recentemente retalhadas em terra situadas a0 sul da cidade (nos atuais bairros da Gloria e Catete), se- ‘uindo assim os passos da rainha Carlota, que mora- ‘yaem Botafogo, As demais classes, por outro lado, com reduzido ounenhum poder de mobilidade, ¢ no podendo ocu- par 0s terrenos situados a oeste da cidade devido & cexisténcia das éreas de mangue do Saco de So Diogo (Cidade Nova), adensavam cada ver mais as outras freguesias urbanas, especialmente as de Santa Rita e Santana, dando origem aos atuais bairres da Saide, Santo Cristo € Gamboa.* ‘Tamibém entre as reas rurais havia diferenciagdo. Enquanto as freguesias situadas a grandes distancias do centro mantinham-se exctusivamente rurais, ¢ for- necedoras de géneros alimenticios & Corte, aquelas 4reas mais proximas das freguesias urbanas pouco a ppouco viam suns fazendas retalhadas em chécaras que, e inicio reservadas as atividades de fim-de-semana das classes dirigentes, foram aos poueos transforman- do-se em local de residéncia permanente, justficando inclusive acriagto de novas freguesias. Assim, oapa~ recimento cada vez maior de chécaras no atual bairro de Laranjeiras ¢ 0 adensamento populacional urbano do Catete e da Gloria levaram & criagao da freguesia da Gloria em 1834, desmembrada da de Sio José. Botafogo, arrabalde da freguesia da Lagoa, também passe nessa época por um surto de eriagtio de chéca- ra, situadas principalmente na praia de Botafogo, na rua de Sio Clemente e na de So Joaquim da Lagoa (atual Voluntérios da Patria) Favorecido pelo privilégio de abrigar a residéncia dda familia real, o velho arraial de So Crist6vio pas- sou também a ser procurado pelos que tinham poder de mobilidade, 1ss0, entretanto,s6 foi possivel depois que a Cimara Municipal mandou aterrar a parte. do Saco de Sto Diogo vizinha ao Caminho do Aterrado, ou das Lantemas (no atual lado par da Av, Presidente Vargas), que ligava o centro a Quinta da Boa Vista. Resolvido 0 problema da acessibilidade, o baitro ra- pidamente viu multiplicadas as moradias ricas, fend- meno que se estendeu, embora em grau mais modes- to, até a ponta do Caju. Local de residéncia imperial, foi em diregio a S20 Cristévéo que se primeiras diligéncias de que se tem not E quando, em 1838, circularam os primeiros énibus de trago animal, as chamadas “gondolas”, uma das linhas também demandava esse bairro’ ‘4 no final da primeira metade do séeulo, o Rio de Janeiro apresentava, eno, uma forma diferente daque- la que tinha prevalecido até 0 século XVIII. Beneficia- das pela ago do poder pablico, que abria e conservava as estradas e caminhos que demandavam 0s arrabal- des da cidade, as classes de renda mais alta, as tinices com poder de mobilidade, puderam se deslocar do antigo e congestionado centro urbano em dirego & Lapa, Catete e Goria (freguesia da Gloria), Botafogo (fregucsia da Lagoa), ¢ Sdo Cristovao (freguesia do En- genio Velho). Com efeito, o crescimento dessas fre- ‘guesias € notivel no periodo 1821-1838, como demons- tra a Tabela 3.1. Note-se também 0 aumento popula- cional da freguesia de Santana que, junto com 2 de Santa Rita, abrigava populagdes urbanas de baixa ren- da, Trata-se de érea ainda dispontvel a uma popula- eo sem poder de mobilidade, trabalhadores livres ¢ 37 12 SY "Wid S01UeS eyUO.ON :o1U04 a “9061 ‘1122019 0 ‘ououar ap of ‘oBRLY OM OP 34 apugy eueo9) squedes op 69 anig ewes spuerp odwen s pinta opin) —— ra10MW 9p ay mom ‘mianbed + XIX OTNDIS ON OYNVE 3d Old Od SvisaNOId SV :OUlINVE Ja OY OG Old|DINNW — @°€ WaVW 38 eseravos de ganho que precisavam estar préximos a0 centro, onde 0 trabalho era buscado diariamente. ‘A partir de 1850 a cidade conhece um novo e im- portante periodo de expansio, caracterizado no so pela incorporaeio de novos sitios & rea urbana, como também pela intensificagao da ocupacao das freguesi- as periféricas, notadamente a da Lagoa, ‘No que diz respeito & incorporagia de novos sitios, teve grande importincia a decisio da Camara, em 1850, de intensificar os trabalhos de aterro do Saco de S20 Diogo. Para isso foi levantada, em 1851, @ planta de todo © mangue, 0 que permitiu 0 posterior aterro e construpfo de um canal de escoamento, obra de Maus, criando-se assim a Cidade Nova (que inclui alo s6 a Cidade Nova dos dias atuais, como também fs bairros de Estacio, Catumbi, o que sobrou do Man- gue e parte do Rio Compride). Os trabalhos de dro- nagem do Saco de So Diogo permitiram, por sua vez, @ ocupagio de grande parte dos terrenos situados no antigo Caminho de Mata Porcos (Esticio), ejustifica- ram a criagdo da freguesia de Santo Antonio em 1854, desmembrada das de Sao José, Santana e Sacramen- to, Essa freguesia tinha jurisdigdo sobre parte da Lapa « sobre os atuais bairros de Catumbi, Estécio e Santa ‘Teresa, que 85 a partir da conclusdo das obras de dre- nagem puderam ser efetivamente ocupados, embora 4 fossem habitados desde o inicio do século, estando inclusive localizada af a nova Casa de Detenci, inat- gurada em 1840 e no mesmo local até hoje. A respeito da ocupagdo dessa Area, cita Noronha Santos: “Em 25/01/1812 foi comprada por Francisco Xavier Pires a Joaquim Viegas a bela chacara dos Coqueiras, em Catumbi, por 8:0008000. Anos de- ‘pois foram retathados os terrenos dessa chicara TABELA 3.1 POPULAGAO RESIDENTE E TAXA DE CRESCIMENTO DEMOGRAFICO DAS FREGUESIAS DO RIO DE JANEIRO aa2i/isis/i870) Freguesias Populasso Residonte ‘Taras de Crescimento isa! 138? ts70? | ig2iis3s 18381870 Froguesias Urbanas 7930 97.162 191.002 2 7 Candeliia 1244s 10.13 9.239 -19 “9 Sio Joss i9geie+ 14410 20.220 = 0 Sta Rita 13.744 14857 23.810 6 64 ‘Sacram=nto 22.486 4.256 74.429 8 1 lira = 6.368 1624 164 ‘Santana toa3s 189773 32.686 46 107 ‘Sto. Antonio = = 47477 fe = Espito Santo. a 10.796 = Z ng. Velho” ase B.is6* 13495 a a Lagoa 2425" 3319" 11304 56 wl ‘So Gistévs0 x ec 92m = = Given 2 x = zg = Eng. Novo = = 2 a = roguesiag Rurais 33% 39916 44.289 0 u Init ©3987 5.034 5.46 4 M4 Jasarepagud Saat 11302 1633 25 ae Tohaiima 2.840 3.091 1190 9 aaaeee Guaratiba $434 9385 6918 B 6 ‘Campo Grande 5.628 7319 9.393 4 n Stu. Cruz = 3677 3.445 = 26 Tha do Governador 1.695 2391 2504 4S Tha de Paquet un 1517 1.260 29 7 Total 112.695 137.078 mst 2 + Inciufaa no Conso de 1821 como Frequesia Rural 5° Inclado distito da Gloria, one feed tone eae ee eee uta Na val 1 p. 252. Fontes: 1 ter, Typos Nacional, 139. Apud LOBO, Ella Maca Lahmeyer, Hist do Rio de lena do cali ede «frames if on IBMEC, TOT vp 125 3 2 Ibid,» 136. 3 Tid p. 360. (© Mangal do S80 Diogo (ou de cidede noval ificutou, durante muita tempo a expansso da Fonte: AGCRI para a abertura de ruas, Autorizada pelo Gover rno, abriu a Cémara, em 1850, uma estrada de co- municagao com 0 Rio Comprido e....em 1852, comecou a Camara a mandar aterrar o mangue da Cidade Nova, entre 0 lugar denominado Aterrado € a Casa de Corregdo (rua Frei Caneca) ... A porciio da rua Haddock Lobo, que fica entre Lar- 40 Estdcio de Sé, antigo de Mata Porces, e o Rio Comprido, foi por muito tempo extenso atoleiro, com 0 quai despendew a Camara avultadas quan. fias, até que, em 1850 foi também aterrado conve- nientemente, tornando-se ent excelente logra- douro pitblico."* ‘Otero dos manguese atoleitos que cereavam San- ta Teresa e Rio Comprido permitiu, por sua vez, @ imensificagao da ocupacdo desses bairros, principal- mente 0 de Santa Teresa, que jé se havia ligado a pla- nicie desde 1844 através da ladeira de Paula Mattos.” ‘A rapidez. da ocupagao dessa “Cidade Nova” foi tio intensa que, a parti de 1865, criow-se a freguesia do Espfrito Santo, que tinha jurisdigdo sobre os atuais baicros do Catumbi, Estacio, Rio Comprido e parte de Santa Teresa, tendo sido desmembrada de terrenos per- tencentes as freguesias de Santo AntOnio, Engenho Velho, Santana e Sao Crist6vio (esta eriada, por sua vez, ein 1856). Os vestigios desse tipo de ocupagao sto visiveis até hoje nas areas que conseguiram so- breviver as cinurgias urbanas. Sio prédios estrcitos € muito profundas, “onde a iluminagao & feita através de clarabéias e éreas intemes, sempre de frente da rua € colagos uns aos outras”™, em tudo revelando a preo- cupagdo de aproveitar imensamente 0 espago prdxi- mo ao centro, numa época em que, devido & inexis- téncia de transportes coletivos répidos, a cidade prati- camente andava a pé Enquanto 0 provesso de urbenizagao se espraiava pela Cidade Nova, deixando entretanto, em locais ai da nao totalmente drenados, alguns claros importan- tes, a freguesia do Engenho Velho comegava a sofrer © processo de retalhamento ds antigas fazendas ¢ si- tios af existentes, esse respeito, Bemardes, citando Noronha Santos, desereve a existéncia nessa época de nnumerosos solares na Tijuca, no Engenho Velho, no Andarai, e mesmo no Engenho Novo*, locais que, entretanto, ainda néo haviam adquirido fungao residencial urbana, apesar de ja serem servidos pelos

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