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Copyright © Giovanna L Pião

1ª edição 2023

Capa: Dara Juliana | Capista Design


Revisão: Daniele Almeida Soares
Leitura Sensível: Dayane Borges
Diagramação: Giovanna L Pião
Arte: Arda Arts

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas.


Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são
produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com
nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.
São proibidos o armazenamento e/ ou a reprodução de qualquer
parte dessa obra, através de quaisquer meios – tangível ou
intangível – sem o consentimento escrito da autora.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Dedicatória

Para você que não me amou de volta, está tudo bem!

Espero que seja feliz, e obrigada,

foi a melhor coisa que você poderia ter feito por mim.
Nota da Autora

Enquanto Eu Te Esperava é o segundo livro da Duologia Irmão


Giordano, e apesar dos personagens estarem interligados, e os
protagonistas dos dois livros serem importantes para as histórias uns
dos outros, o livro pode ser lido separadamente.

Mas, se você quer saber sobre a história dos primeiros


protagonistas, Atena e Rocco, te recomendo a leitura de “Até o
Nosso Último Suspiro”, que está disponível na Amazon para compra
e no Kindle Unlimited para empréstimo.

Dito isso, espero que você aprecie a leitura.

Com amor,

Giovanna L Pião.
Playlist

Labyrinth, Taylor Swift

Perfect, Ed Sheeran

Sweet Nothing, Taylor Swift

All You Had To Do Was Stay, Taylor Swift

I’m with You, Avril Lavigne

Summertime Sadness, Lana Del Rey

All I Want, Olivia Rodrigo

Matilda, Harry Styles

Let Me Down Slowly, Alec Benjamin

Talk, Hozier

Hands To Myself, Selena Gomez

She Will Be Loved, Maroon 5

Leave Me Slowly, Lewis Capaldi

positions, Ariana Grande

When I Look At You, Miley Cyrus

Clean, Taylor Swift

aponte a câmera do seu celular para cá:


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Instagram: giovannalpiao

Tiktok: autoragiov
Prólogo
Raffaela
16 anos atrás
Não sei bem se as pessoas percebem o momento exato em que
se apaixonam, mas também não sei se eu reconheço o instante em
que me apaixonei. Atena e eu sempre brincávamos sobre com quem
nos casaríamos, falávamos sobre os meninos bonitos da escola, mas
aquele sentimento… aquele sentimento real parecia ter acontecido
uma única vez, e por uma pessoa que eu sabia que não me queria.
Matteo Esposito Ricci.
Nos conhecemos quando Rocco, meu irmão, trouxe o melhor
amigo para casa. Os dois estavam com o olho roxo, e eu sabia que
Rocco não costumava brigar na escola. Ele era o filho perfeito:
Sendo apenas alguns anos mais velho que eu – quatro para ser mais
exata – sua conduta impecável era tema comum em casa, embora
nós nunca nos víssemos na escola.
Por isso, quando Rocco apareceu machucado, eu corri para o
meu irmão que estava com um sorriso campeão no rosto, e tentei
entender o que tinha acontecido. Nossos pais iam matar Rocco e eu
não sabia como sobreviveria sem um irmão...
Seria melhor? Sim. Eu teria que parar de dividir tudo com outra
pessoa? Com certeza. Eu sentiria falta do babaca? Nem tanto. Ok,
talvez fosse melhor mesmo.
Mas o que me chamou atenção foi o cara parado atrás de
Rocco. Encarei seu rosto, que estava um pouco pior que o de Rocco,
com uma mancha mais escura que sua pele em volta dos olhos e os
lábios grossos cortados. Mesmo machucado, ele parecia um Deus.
De repente, percebi que estava encarando demais e senti
minhas bochechas ficarem vermelhas. Notei que o cara me encarava
como se eu fosse uma grande idiota, mas o que eu podia fazer
quanto meu coração parecia querer sair voando do meu peito? Dei
um passo para frente, mas ao notar que seu rosto se fechava, recuei
de volta.
O cara ainda não tinha sido apresentado, mas ele tinha uma
atitude maior que o Coliseu. Puxei a blusa para baixo, apenas para
cobrir a minha barriga saliente que aparecia através da blusa mais
curta, que eu usava para aplacar o calor que fazia em Roma. Eu não
tinha problemas com as dobras em minhas barrigas, ou com minhas
pernas e braços grossos, e nem ele parecia de todo interessado. Eu
só não queria ser motivo de piada.
Dei mais um passo para trás, e acabei batendo na poltrona que
ficava na sala, caindo sentada. Parecendo cansado da situação, o
garoto revirou os olhos e fez alguma piada na orelha de Rocco. Meu
irmão não mudou de expressão, mas me encarou como se eu
estivesse incomodando os dois.
— Raffa, esse é meu amigo... a gente se conheceu hoje, Matteo.
Matteo continuava me olhando com cara de poucos amigos, ele
parecia ser alguém com muita raiva dentro dele. Seus olhos verdes
me julgavam, e não parecia com muita vontade de me conhecer, o
que fazia com que eu quisesse me esconder. Mas eu não era assim.
Continuei encarando seu rosto e tudo que eu podia pensar era
em como ele era bonito. Seus olhos verdes claros contrastavam com
sua pele negra, o cabelo era bem aparado e seu corpo era magro.
Eu já sabia como ele tinha apanhado. Dei uma leve risada e seu
rosto se fechou ainda mais, como se fosse possível.
— Prazer, Matteo. Você quer tomar uma água? Um suco? —
Olhando para o meu rosto pela primeira vez, o garoto negou.
— Toma alguma coisa, você vai precisar para encarar sua mãe
com esse lábio cortado — Rocco falou.
— Eu aceito um pouco de gelo para colocar no meu rosto, ou
amanhã vai ficar super inchado.
— Tudo bem, eu pego — gritei.
Saí correndo da sala, fugindo dos olhos que continuavam me
encarando como se eu fosse a pior pessoa que ele já tinha visto.
Desbloqueei meu celular assim que cheguei à cozinha esbaforida,
mandando uma mensagem para Atena. Se ela fosse tão curiosa
quanto eu, logo estaria aqui.
Abri a geladeira e achei a forma de gelo que estava metade
vazia por culpa de Rocco, ele vivia enchendo garrafas com gelo e
nunca repunha. Peguei dois panos de prato velhos na gaveta e
coloquei alguns cubos dividindo em quantidades iguais. Enrolei os
dois e molhei um pouco para que o gelo fizesse efeito mais rápido.
Talvez tivesse algum remédio que pudesse ajudar, mas não
sabia onde minha mãe guardava a caixa de primeiros socorros, e é
claro que eu não daria uma de enfermeira. Apenas a ideia de ficar
próxima o suficiente de Matteo fazia meu estômago retorcer.
Peguei os panos com gelo e corri de volta para a sala. Mas,
antes de entrar, estanquei.
— Sua sorella não parava de me encarar, qual o problema dela?
Nunca viu uma pessoa na vida dela? Ou vocês não conviveram com
pessoas negras? Se me encarasse um pouco mais era capaz de
criar asas. — Sua voz era mesquinha e eu quase chorei, apertando
mais forte os panos em minhas mãos.
— Matteo.
— O quê? — De alguma maneira sabia que ele estava dando de
ombros. — É verdade, eu estava ficando incomodado, se ela voltar
aqui e fizer a mesma coisa, saiba que eu vou sair embora. Não vou
aceitar isso.
Juntei toda a coragem que eu tinha, e saí de trás da parede que
separava a sala da cozinha. Andei até onde os dois estavam,
passando pelo espaço pequeno entre o sofá e a mesa de centro.
Joguei a toalha com gelos em seu colo e o encarei furiosa.
Matteo não tinha expressão nenhuma em seu rosto e aquilo parecia
apenas mais uma segunda-feira para ele, enquanto para mim
parecia o pior dia da minha vida.
— Eu estava te olhando porque você é bonito, seu stronzo!
Mesmo com essa cara toda estragada, babaca.
Virei para Rocco que ria de mim e joguei o pano em seu colo
também. Se eles eram grandes o bastante para brigarem na rua, que
fossem para se cuidar. Eu era mais nova que eles, não era minha
responsabilidade cuidar do meu irmão e do seu amigo que tirava
conclusões precipitadas das pessoas.
— E só pra você saber, eu também vi você me encarando. Sim,
eu sou gorda, qual o problema? Não quero nunca mais te olhar, você
não é bem-vindo na minha casa! — gritei e saí batendo os pés em
direção ao meu quarto.
É claro que minhas palavras não valeram de nada, afinal, mais
tarde meus pais chegaram e viraram grandes amigos de Matteo, que
ficou o jantar todo contando sobre como ele seria um grande
advogado algum dia. Minha vida a partir daquele dia começou a girar
em torno de Matteo e de como meu coração não podia responder por
si mesmo quando estava perto dele.
Enquanto Atena se apaixonou alguns anos depois de uma
maneira calma por meu irmão, mesmo que eu achasse que eles se
gostavam há muito tempo, eu me apaixonei como uma tempestade e
era por isso que eu não podia me envolver com mais ninguém.
Matteo tinha meu coração desde os treze anos, e nada o tirava
daquele lugar.
1
Raffaela

Raffaela Amara Giordano isso. Raffaela Amara Giordano aquilo.


Minha cabeça ia explodir a qualquer momento, e eu sabia que a
culpa seria das vozes dos meus pais que não paravam de dizer
como eu tinha que ser responsável agora que Rocco tinha uma filha
– como se eu não tivesse sido responsável a vida toda.
Ceci.
A criança mais incrível que existia no mundo e o motivo de eu
ser a tia mais babona que existia. Eu não podia estar mais feliz agora
que meu irmão e minha melhor amiga tinham se acertado e,
finalmente, conseguido o final feliz deles.
Enquanto isso, aqui estava eu. Bebendo mais uma cerveja,
torcendo para aparecer alguém e me salvar das vozes dos meus
pais. Eu sempre soube que eu não era a filha preferida. Eles me
amam, nunca deixaram de demonstrar isso, mas também sempre
deixaram claro como Rocco era o menino dos olhos dele, e que às
vezes pensar em mim vinha em segundo ou terceiro lugar.
Eu havia desistido de muito para ser o que eles queriam, e de
vez em quando ficava quebrando minha cabeça e pensando em
como seria se eu tivesse sido eu mesma.
Meu maior sonho era ser uma artista, eu adorava pintar quadros.
Rocco, inclusive, tinha um na sala dele que eu pintei quando era
mais nova, quando eu ainda podia ser o que quisesse. Mas os
outros, meus outros quadros, eu tinha que esconder, como se
fossem algo ruim e não arte.
— Há quanto tempo você está bebendo? — Notei a voz de
Lorenzo perto do meu ouvido e virei.
— Ainda bem que você chegou! Eu estava prestes a chorar em
público, típico de bêbada.
— Então, isso quer dizer muitas?
— Sim, muitas! Onde você estava? — Tentei abraçar Lorenzo,
mas perdi o equilíbrio.
Segurando em seus braços para impedir que eu caísse. Lorenzo
era muito bonito. Era bem mais alto que eu, magro, bem mais branco
que eu, e com o cabelo mais comprido do que quando o conheci. Ele
era diferente de mim em tudo, então, quando nos conhecemos e o
convidei para almoçar comigo, apenas para afastar meu irmão que
na época eu estava fingindo que eu não existia, nos tornamos bons
amigos.
— Eu estava trabalhando… posso saber o que a Nicoletta está
fazendo aqui? — Sim, eu tinha me esquecido de Nicoletta. Tomara
que eu tenha dito tudo na minha cabeça e não para uma das
melhores amigas da minha mãe. — Oi, Nicoletta.
— Oi, Lorenzo.
— Nicoletta é minha também, Rocco não pode roubar tudo só
porque ele acha que é mais legal. Eu trouxe Nicoletta para se divertir.
Você está se divertindo, Nicoletta?
Nicoletta me encarou e voltou a olhar para Lorenzo.
— Agora que você chegou, Lorenzo, eu vou deixar a ragazza
Raffaela com você… acho que ela já bebeu uns sete copos. —
Nicoletta deu um beijo em minha cabeça, como uma avó faria. — Se
cuida, Raffaela.
Coloquei o copo que estava em minha mão em cima do balcão e
pedi mais uma cerveja para o barman, que apareceu sorrindo para
mim. Retribui o sorriso, pensando que se alguém fosse flertar comigo
hoje, eu faria mais do que flertar. Estava cansada.
Eu não tinha nada do que eu queria. Não tinha meu trabalho dos
sonhos, não tinha um namorado, não tinha pais que me amavam
acima de tudo. Eu ia chorar. Se eu pedisse para Lorenzo transar
comigo, será que ele transaria?
— Lorenzo, transa comigo?
O coitado que tinha colocado o copo de sua própria bebida na
boca, cuspiu tudo. Lorenzo me encarou com seus olhos escuros e
abriu a boca em susto. Olhando para os lados, provavelmente
procurando por uma câmera escondida.
— Raffaela?
— Eu estou cansada de ser virgem. Vou correr os riscos.
— Que riscos?
— Ficar grávida do melhor amigo, viver uma comédia romântica
ruim, sermos obrigados a casar e viver infelizes pelo resto da vida.
Lorenzo começou a rir e afastou a bebida de mim. Puxando
minha cadeira para mais perto dele. Senti um leve frio na barriga,
não sabia se era porque meu amigo era muito bonito ou se a
sensação de montanha russa foi demais para uma bêbada.
— Eu achei que você fosse uma romântica, a gente não pode se
apaixonar?
— Eu disse comédia romântica ruim, mas na nossa não seria
boa, afinal… — pedi para Lorenzo se aproximar de mim. — eu gosto
do Matteo… eu acho que gosto dele há muitos anos.
— Nem reparei. — Lorenzo riu e se afastou de mim. — Vamos,
vou te levar para casa, faz horas que você está bebendo.
— Eu não quero ir para casa. Eu quero caminhar pela cidade. A
gente pode fazer isso?
— Acho que vai ser bom para você, vamos.
Lorenzo pagou pelas minhas bebidas e a sua, e saímos do bar
que ficava próximo ao escritório. Não coloquei meu braço por seus
ombros, afinal, eu sabia que meninas gordas não eram carregadas
quando estavam bêbadas. Com o frio, tudo que conseguimos fazer
foi caminhar pela cidade, sem dizer nada um para o outro.
Tropecei algumas vezes, antes de Lorenzo me dar o braço para
que eu pudesse me firmar. Encarei a Fontana dei Catecumeni, e não
tinha percebido que tínhamos andado tanto.
— Quero sentar.
— A gente pode sentar em outro lugar.
— Não, eu quero sentar aqui — falei, apontando para a fonte. —
Se você não quiser, pode ir sentar lá.
Lorenzo revirou os olhos, me deixando fazer o que queria. A rua
estava quase deserta, o que me lembrava que o inverno em Roma
estava finalmente se aproximando. O tempo afastava as pessoas da
rua, tornando o turismo noturno escasso, mas não inexistente. De
qualquer forma, as pessoas preferiam a Fontana di Trevi.
Coloquei a mão dentro da fonte, sabendo que não teria polícia
por aquele lado naquele horário.
— Raffaela Giordano.
— Não, não me fale esse nome.
— Você não pode fazer isso.
— Molhar a mão? — questionei, enquanto ouvia o desespero na
voz de Lorenzo.
— Raffa… você vai se machucar.
Levantei, apenas para mostrar que Lorenzo estava errado. Eu
estava completamente bem. O que não estava bem era minha vida.
Minha vida era uma droga. Eu odiava a minha vida. Eu odiava o
Matteo.
Não sei se foi a bebida ou apenas um desequilíbrio
momentâneo, mas caí de costas dentro da fonte, batendo o quadril
no chão do monumento e molhando todo o meu corpo que começou
a congelar com a água gelada me cobrindo.
— Raffaela.
Fiquei quieta, enquanto o Lorenzo tentava me fazer responder.
Mas ali, foi a primeira vez que eu senti alguma coisa além do peso
de ser um fracasso. O mundo inteiro ficou em silêncio, pelo menos
aquele efêmero mundo.
Até o apito.
— Raffaela! — Lorenzo gritou e eu me sentei rindo.
— Você está presa. — Ok, aquela voz não era tão engraçada
assim.
2
Matteo

Senti um frio na espinha, como se algo ruim fosse acontecer.


Não era sensitivo, mas, normalmente, quando isso acontecia, não
demorava muito para receber uma ligação.
Meu escritório já estava ficando em silêncio, após cada um dos
meus colegas de trabalho terem ido embora. Era sempre eu o último
a partir, perseguindo o meu título de melhor advogado de Roma. Por
isso, além de minha mãe, meu padrasto, Rocco e sua família – com
exceção de Raffaela –, eu não tinha muitas pessoas em minha vida.
Fechei meu notebook, separando alguns papéis que levaria para
casa. No dia seguinte haveria o almoço mensal na casa de Dora, a
nonna de Atena, o que significava que eu tinha que conseguir algum
presente para Ceci.
Ao contrário da mãe, Ceci amava aniversários, e Rocco e Atena
fizeram a garota acreditar que todo almoço na casa de Dora era o
aniversário dela. Agora a garota ficava triste se não aparecesse com
um presente para ela. E eu só deixei isso acontecer uma vez, mas
eu nunca mais deixaria Raffaela dar aquele olhar para mim.
Levantei da cadeira, indo até a parede apagar a luz. Coloquei
minha pasta atravessada entre meu braço e meu corpo, deixando o
escritório. Essa era minha hora preferida, quando eu não precisava
dar tchau para mais ninguém no trabalho e podia apenas ir embora.
O porteiro me cumprimentou, como sempre fazia, e entrei no
meu carro, sabendo que o caminho até minha casa era longo. Esse
era mais um motivo para sair mais tarde: eu odiava pegar trânsito
para chegar em casa.
��️
— Boa noite, figlio — Ouvi a voz da minha mãe, que costumava
sempre me ligar no mesmo horário, sabendo que eu tinha acabado
de chegar em casa.
— Boa noite, mamma.
— Como foi o dia hoje? Salvou alguém? — Ri da brincadeira em
sua voz. Eu sempre disse que seria um super-herói, mas agora
minha arma secreta era ajudar mulheres a saírem de casamentos
ruins.
— Ninguém, mamma, mas prometo que amanhã salvarei.
— Fique bem, ok? Estou sempre preocupada com você. Comeu
pelo menos? Tem visto o Rocco? E como está sua casa? Uma
bagunça?
— Vou ficar bem. Não se preocupe. Comi, almocei com uma
cliente hoje, ela trouxe uma comida caseira que me fez sentir sua
falta. Vou ver o Rocco amanhã. Minha casa está arrumada. —
Verdade, verdade, verdade, verdade e mentira.
Minha mãe não precisava saber que minha casa ainda estava
uma bagunça da última vez que uma mulher veio dormir aqui, o que
tinha sido alguns dias atrás. Eu logo precisaria arrumar, mas os dias
no escritório foram intensos.
— Vou te deixar descansar, figlio. Seu padrasto está te mandando
um beijo.
Desliguei o telefone, me despedindo da minha mãe com uma
sensação de pássaro fora do ninho. Ainda carregava o medo e a
sensação de que não ia conseguir voar.
Abri o chuveiro, tirando o terno que usara durante o dia e o
joguei no cesto. Acertei a cesta e marquei o ponto na lousa que
devia ser para marcar as tarefas de casa.
Tudo bem, eu era o perfeito modelo de cara solteiro. Tinha a
casa bagunçada, saía com diferentes mulheres, nunca entrava em
um relacionamento, tinha uma sobrinha perfeita, e Raffaela.
Raffaela era o que me mantinha verdadeiro comigo mesmo.
Aquela garota nunca aceitou nenhuma merda de mim, pelo contrário,
ela sempre foi uma adolescente destemida, sempre jogou a verdade
na minha cara e nosso relacionamento era construído à base de
muita briga.
Claro que essas eram dentro dos limites ou o irmão dela, e meu
melhor amigo, me mataria. Tenho certeza de que ele também me
mataria se soubesse os sonhos vividos que eu tinha com Raffaela.
Mas isso nunca aconteceria, porque existem duas regras que
um cara nunca pode quebrar com o melhor amigo: Pegar a mulher
dele e dormir com a irmã dele. Não existia chance de pegar Atena,
mas, porra, como eu queria comer Raffaela.
Entrei no chuveiro. Sentindo a água quente cair em meu corpo,
revelando a dor que apenas passar o dia sentado podia dar. Ouvi o
som do meu telefone tocando, mas ignorei, pois nada me tiraria do
banho naquele momento. E nem mesmo de casa. Se fosse algo
sério, me ligaria de novo e talvez na terceira vez eu atendesse.
O som parou e respirei aliviado. Não durou muito, começou a
tocar de novo e pelo desespero em ligar de volta, me senti na
obrigação de atender. Desliguei o chuveiro e enrolei a toalha na
cintura. Peguei o telefone na pia do banheiro e atendi.
— Matteo? Grazie a Dio! — Raffaela. Ela não costumava me ligar,
pelo contrário, evitava. Nas duas vezes em que ela me ligou, foi para
ajudar o Rocco. No que aquele cabeça dura tinha se metido?
— Oi, Raffaela. — Me segurei para não chamá-la de pequeno
problema. — O que aconteceu com Rocco?
— Eu… não foi o Rocco, por favor, eu preciso da sua ajuda.
— Sinto muito, estou em casa e não ligo se você precisa
esconder um corpo.
— Você chegou bem perto… — Sua voz tremeu um pouco. Eu ia
ser amaldiçoado se alguém tivesse feito algo e aquela idiota revidou.
— Eu tenho pouco tempo.
— Não vou passar a sua mensagem de despedida para ninguém.
— Cala a boca, stronzo! Tudo bem, desculpa… eu estou tentando
falar… tudo bem… — Raffaela estava ouvindo alguém e
respondendo. No que ela tinha se metido? — Matteo, eu estou
detida… preciso de ajuda, eu não quero ligar para os meus pais e…
eu estou com muito frio e ninguém me dá uma roupa quente. Eu
estou quarenta por cento sóbria.
— Em que delegacia você está?
Não consegui ignorar ouvindo a sua voz quebrando. Era daí que
vinha o tremor, eu sabia que ninguém daria uma roupa quente para
Raffaela, seja lá o motivo de ela estar com frio. Mas, ainda assim, a
imagem dela com frio me fez ficar com raiva.
Saí andando pela casa segurando a toalha, enquanto
conversava com Raffaela que passava o nome da delegacia que
estava. Joguei o celular na cama e peguei a primeira roupa que vi.
— Me desculpa te ligar, eu prometo que pago os honorários…
— Fica quieta. Eu estou indo, não devo demorar.
— Mas sua casa fica longe…
— Não importa.
Desliguei o telefone, pensando no caminho que eu teria que
enfrentar para ir até a delegacia. Eu mataria Raffaela, mas só depois
de tirá-la da cadeia. Peguei uma roupa quente para ela e saí batendo
a porta.
3
Raffaela

Depois de muito espernear e congelar minha bunda, eu


finalmente entendi que eu não estava presa, eu estava detida. E
mesmo que as palavras fossem diferentes, e os significados também
perante a polícia, para mim, eram basicamente a mesma coisa.
Afinal, era eu que estava atrás das grades e congelando.
Lorenzo tinha ido embora depois da polícia informar que eu tinha
conseguido falar com um advogado, e não posso mentir, me
decepcionou que ele tivesse realmente ido embora.
Eu tinha pedido um cobertor para que, pelo menos, eu pudesse
me esquentar. Mas, não, eu não tinha direito a nada além da ligação.
Muitas pessoas entravam e saíam da delegacia, e eu só conseguia
pensar em como aquilo era movimentado.
Quase sentia vontade de pegar uma caneca e começar a bater
nas grades. Eu era ridícula. Ainda bem que a bebida tinha saído do
meu corpo assim que caí na água congelante.
— Raffaela Giordano.
Levantei a cabeça, encarando o mesmo policial que tinha me
trazido até aqui, o mesmo que me negou o cobertor, e revirei os
olhos.
— Sou eu… cazzo — completei baixinho, sabendo que ele podia
ouvir, só preferiu ignorar.
— Vem, seu advogado chegou.
Finalmente! Finalmente Matteo serviu para algo. Caminhei em
direção à porta da frente, pronta para ir embora. Mas parecia que
não seria tão fácil. Matteo estava sentado com o delegado e os dois
conversavam como se fossem velhos amigos.
— Polpetta… — Eu odiava aquele apelido, e odiava que ele me
chamasse assim na frente das pessoas. — Que merda você fez?
Fechei os olhos, me controlando para não tremer de frio mais
uma vez, minhas roupas já estavam ficando duras em meu corpo.
Matteo olhou para minhas pernas que a saia preta pouco cobria, e a
leve fenda não ajudava em nada. Subiu os olhos por meus seios e
então encarou meu rosto.
— Vocês deixaram ela desse jeito na delegacia? — Seu rosto
virou para o delegado e eu podia ver um pingo de preocupação, era
o mínimo depois de mais de quinze anos convivendo com alguém,
mas aqueceu meu coração. — Toma, vá se trocar. Te espero aqui.
Matteo não me olhou, mas jogou algumas peças de roupa em
mim. Torci para que servissem, afinal, a diferença dos nossos corpos
era gritante, só torcia para não ser roupa de alguma das garotas que
ele dormiu.
Procurei o banheiro mais próximo, e ele fedia, além de ser todo
rabiscado. Senti vontade de me lavar com álcool. Uma garota não
pode ter tudo que deseja, não é?
Tirei a saia, deixando dentro da sacola que Matteo trouxe. Ele
tinha se preocupado em trazer até mesmo uma cueca, que nunca
serviria em mim, mas eu não diria… era horrível que eu estivesse
pensando em nunca devolver?
Coloquei a calça de moletom cinza e uma camiseta branca,
Matteo trouxe um até mesmo um agasalho. Saí do banheiro nojento
e caminhei até a sala do delegado.
— Obrigada — falei, e Matteo apenas acenou com a cabeça,
sentado na cadeira em frente ao delegado.
— Por que minha cliente está presa? — Sua voz fez com que eu
me tremesse inteira, e tentei desviar o olhar de sua mandíbula
travada, mas não consegui.
— Raffaela não está presa, está detida. E assim que pagar a
multa poderá ir embora.
— Qual foi o motivo para ela ser detida?
— Sua cliente danificou um patrimônio público — O homem
branco de meia idade, cabelos brancos e um terno de segunda linha
respondeu, me encarando como se eu tivesse destruído a fonte.
— Eu já falei que eu não tive culpa!
— Polpetta, cale a boca. — Matteo levantou a mão, me pedindo
um instante.
— Eu estava bêbada, acabei me desequilibrando e caindo dentro
da fonte, é claro que eu não fiz aquilo de propósito. Não sou burra,
está um frio do caralho, você acha mesmo que eu pularia lá só pra
vir aqui e aproveitar da sua maravilhosa instalação? O bico do meu
peito nunca mais vai baixar depois de passar quase duas horas
enfiada naquela roupa molhada.
Os dois me olharam sem conseguir piscar, mas foi o delegado
que encarou meus peitos, tentando ver os bicos arrepiados. Claro,
patético, um cara com idade para ser meu avô encarava meu peito,
mas o homem que eu daria meu peito esquerdo para dormir com ele,
continuava me encarando como se eu fosse louca.
— Podemos ir embora? — perguntei, tentando desviar a atenção.
— Quanto é a multa? — Matteo me ignorou, voltando a falar com
o delegado.
— Eu não vou pagar.
— Vai sim, Raffaela, ou eu vou ligar para a sua mãe.
Cruzei os braços, enquanto os dois continuavam conversando. E
quando eu tive que passar meu cartão para pagar aquela multa
idiota, eu sentia que estava inflando o ego de um sistema que não
entendia que uma pessoa bêbada não sabe o que faz.
Saí em direção à rua com Matteo, que estava vestido de terno,
como se não pudesse de se dar ao direito de ir à delegacia de
moletom. Parei ao lado do seu carro e esperei que ele abrisse a
porta.
— Cadê seu melhor amigo?
— Foi pra casa…
Matteo destrancou a porta do carro. Entramos ao mesmo tempo
e ele me encarou como se eu estivesse louca. O que tinha de
errado? Meu Deus!
— O que você está fazendo, Raffaela?
— Eu é que não vou dormir em casa, meus pais me matam.
— Então, alugue um quarto de hotel, eu já fiz muito.
— Não, eu vou dormir na sua casa — respondi, passando o cinto
de segurança por meu peito.
— Sim, claro, e o inferno acabou de congelar.
— Que pena, achei que você ia aproveitar melhor o calor de lá.
— Raffaela, não tem como você passar a noite na minha casa.
Respirei fundo, sabendo que eu precisava ser racional e explicar
para ele que não existia a menor possibilidade de voltar para minha
casa, ou ir para a casa de Rocco.
— Eu sei que eu já pedi muito de você, e agradeço de verdade,
por você ter deixado a sua casa e vindo me tirar daqui. Só que… se
eu voltar para casa agora e com uma roupa diferente da que eu saí,
meus pais vão falar que eu sou uma irresponsável, e esse foi o
motivo de eu ter bebido mais do que eu devia. Per favore, Matteo…
só mais isso, e prometo que você nunca mais vai ter que me
aguentar.
Ouvi seu longo suspiro e sabia que tinha ganhado essa. A que
custo? Eu nunca saberia.
4
Matteo

Eu teria uma conversa bem séria com o melhor amigo de


Raffaela. E depois o mataria por ter que dividir a minha casa com
ela. Não achei que Raffaela fosse mesmo vir para a minha casa, mas
aqui estava ela, encarando tudo como se meu santuário fosse um
insulto à sua pessoa.
— Você não arruma esse lugar? — Minha casa era pequena e
aconchegante, e apenas o lugar onde eu poderia dormir.
Não tinha muito espaço. Era um quarto pequeno, com uma
cama de madeira e o guarda-roupa, enquanto a cozinha e a sala
eram no mesmo ambiente, com uma mesa dividindo os dois, e meu
banheiro.
— Eu ia fazer isso, se você não tivesse me ligado. — Raffaela
revirou os olhos.
Era estranho tê-la aqui, no meu santuário. E Raffaela havia
vindo à minha casa em todos os anos que convivemos. Isso se dava,
também, porque eu mantinha sempre o máximo de distância
possível.
— Não vou pedir desculpas, já disse que vou pagar pelo serviço
prestado. — Raffaela pegou na mão um carro de madeira que eu
tinha ganhado da minha mãe e começou a olhar para tudo em casa.
— Tem uma camisinha no chão.
— Deixa aí.
— Você é nojento…
— E você nem devia estar aqui.
Ficamos nos encarando. Eu conhecia Raffaela o mesmo tanto
de tempo que conhecia Rocco e embora ela fosse uma adolescente
estranha que se transformara em uma linda mulher, ela ainda era tão
irritante quanto antes.
— Você comeu alguma coisa? — perguntou, sentando no meu
sofá.
— Não, não deu tempo… você comeu?
— Não, eu nem lembro de ter almoçado direito.
Raffaela estava de perfil, olhando para o carrinho em sua mão, e
enquanto ela o estudava, eu fazia o mesmo com seu rosto. Ela era
linda, tão bonita que eu sentia vontade de tocar.
Tive que me controlar para não bater no delegado que olhou
para seus seios, depois de a boca grande ter dito que seu bico do
peito estava arrepiado. Confesso que as imagens que se formaram
em minha cabeça também não eram nada puras. Ainda mais depois
de ela aparecer vestida com minhas roupas.
— Eu posso fazer alguma coisa pra gente comer… eu não
cozinho tão bem, mas posso dar um jeito com o que você tiver na
geladeira. — Ri, tinha certeza que ela não conseguiria.
— Raffaela, eu só durmo aqui… é capaz de ter um ovo chocado
dentro da geladeira e mais nada.
— Se tivesse um ovo chocado, você teria um pintinho e a gente
teria que dar um nome bonitinho pra ele.
Abaixei a cabeça tentando não rir do pensamento dela. Eram
quase duas horas da manhã, e eu sabia que precisávamos dormir,
mas antes eu tinha que dar alguma coisa para ela comer.
Peguei o telefone discando um número que sempre entregava
até mais tarde. Fiz o pedido de duas pizzas e fui me sentar ao seu
lado. Raffaela estava de olhos fechados, com a cabeça encostada no
sofá, e por mais que eu duvidasse, eu achava que ela tinha dormido.
— Vai ficar me encarando? — perguntou baixinho.
— Não estou te encarando. Tudo bem, só um pouco… —
Raffaela sorriu como se tivesse ganhado alguma coisa. — Só estou
um pouco incomodado, não costumo receber visitas… a roupa ficou
boa em você.
— Você é alto, mas achei que não serviria… a única coisa que
não serviu foi a cueca… não passou nem na minha perna.
Engoli em seco, imaginando se por baixo da roupa Raffaela
estava sem calcinha. Eu odiava aquela mulher. Agora minha cabeça
ia ficar apenas pensando que a sua boceta estava se esfregando na
minha roupa. Ótimo, eu ia dormir de pau duro.
— Por que você está tão quieto?
— Pensando em um caso.
— Achei que era porque eu falei que a sua cueca era pequena.
— Cala a boca, polpetta.
Ouvi a batida na porta e levantei, pegando as pizzas e
colocando sobre a mesa. Raffaela não parecia com muita vontade de
levantar, mas, quando comecei a comer, ela correu para o meu lado.
Seus olhos estavam pequenos de sono. Minha camiseta estava
um pouco apertada nela, seus seios grandes preenchiam o espaço,
parecendo esticar o tecido. Raffaela se sentou de frente para mim e
começou a comer da minha pizza.
— Eu comprei uma pizza só para você.
— Eu não vou conseguir comer uma pizza toda… nem tenho
estômago pra isso.
— Pode me contar como terminou na água? Agora… de verdade.
— Raffaela franziu o cenho, parecendo indignada que eu pudesse
duvidar da sua história.
— Eu já contei a verdade. — Raffaela chupou o dedo que estava
cheio de gordura de queijo e me fez querer ser seu dedo. Fechei os
olhos, tentando fugir da imagem dela me chupando. — Matteo?
— A verdade.
— Ok, eu bebi, levei Nicoletta comigo porque agora Atena é uma
mãe… Lorenzo chegou, mas eu já estava bêbada, tenho certeza de
que pedi pra ele transar comigo, mas ele negou. Então, fomos
andar… sentei na fonte, caí para trás e acabei detida.
— Você pediu pro Lorenzo transar com você e ele disse não?
— Sim, não ouviu?
— Você… pediu… para… alguém… transar… com… você?
— Sim, era ele ou o barman, mas acho que ele só estava
flertando comigo pra eu comprar mais bebidas.
Eu não podia acreditar que Raffaela tinha pedido para alguém
transar com ela e a pessoa tinha dito não. Claro que ela estava
bêbada, mas no dia seguinte não estaria. E apenas a imagem de
enfiar minha mão em sua carne, apertar meus dedos em sua pele
enquanto a fodia me fez ficar duro.
Era isso que eu conseguia por ir ajudar a irmãzinha do meu
melhor amigo, um pau duro e nenhuma chance de foder alguém.
— Raffaela, vai dormir.
— Eu não terminei de comer.
— Vai dormir, você pode ficar com a minha cama.
Raffaela levantou, sem dizer mais nada e entrou em meu quarto,
batendo a porta com força. Respirei aliviado. Nunca mais eu ficaria
sozinho com Raffaela e a minha própria mente.
— Meu Deus, não tem um lugar nessa casa que não tenha uma
camisinha jogada? Inferno, Matteo.
— Para de reclamar, nunca viu uma camisinha?
Raffaela não respondeu, mas eu sabia que ela devia estar me
xingando. Era isso que ela ganhava por invadir minha casa. Eu não a
convidei, ela estava aqui porque não saiu do meu carro. Ela que
lidasse com os próprios problemas agora.
5
Raffaela

Acordei com uma dor de cabeça terrível, além de uma dor no


corpo que eu não sabia se era de ter caído dentro da fonte, ou de ter
ficado horas aguentando o frio intenso dentro da roupa molhada.
Olhei para o lado percebendo uma luz vindo do lado de fora da
casa. O sol tinha se levantado e, pela primeira vez, eu sentia vontade
de continuar deitada. E isso não tinha nada a ver com a cama de
Matteo, que era extremamente confortável.
Fechei os olhos, passando a mão pelo colchão, pensando que
era aqui que ele dormia todos os dias. Puxei o travesseiro para perto
de mim e esfreguei meu nariz para sentir seu cheiro.
A porta foi aberta e joguei o travesseiro para longe, o coração
disparando em meu peito, embora Matteo não parecesse ciente do
que havia acabado de acontecer. Ou não parecia, até o travesseiro
acertar em cheio seu peito, e o que quer que ele trouxesse em sua
mão acabar estilhaçado no chão. O barulho de algo quebrado me
assustou e me fez sentar.
Matteo me encarava com a boca aberta, o peito molhado com o
que parecia água e as mãos travadas no ar. Cobri a boca, temendo
rir e deixá-lo irritado. Mas que visão!
Seu peito era coberto por tatuagens, no seu lado direito tinha
uma cobra, que eu sabia que vinha da parte de trás das suas costas.
No esquerdo, a deusa Vênus desenhada, e me lembro de quase
morrer quando a vi pela primeira vez.
Era uma representação de Vênus, mas não era como a famosa
pintura de Botticelli, ainda que fosse parecida. Matteo tinha levantado
a camiseta para mostrar para Rocco e eu passei perto, ficando sem
palavras, pois o desenho apresentava uma Vênus gorda. Não era o
meu corpo, mas era próximo demais.
Por causa daquela tatuagem, eu passei meses me perguntando
se Matteo não sentia nada por mim, e é claro que a resposta era
não, mas, mesmo assim, nunca consegui esquecer a imagem em
seu peito.
— Que merda, Raffaela — Matteo se abaixou, recolhendo os
cacos de vidro. Levantei da cama para ajudá-lo, mas ele me impediu.
— Fique aí, você vai cortar o pé.
Me sentei de novo, puxando as pernas para cima da cama,
torcendo que ele ignorasse minha seminudez. Matteo levantou com o
rosto fechado, e não dispensou duas olhadas para mim, apenas se
virou e saiu do quarto, como se nunca tivesse entrado ali.
Ok, aquilo tinha sido um golpe em minha autoestima. Me cobri
de novo, tapando minhas pernas e ignorando a pequena dor em meu
coração. Matteo não demorou para voltar, entregando um copo novo
com água para mim e um analgésico.
— Tome, você deve estar com dor.
— Obrigada… — não olhei para ele, esperando que deixasse o
quarto e eu pudesse ficar sozinha de novo, lambendo minhas feridas.
— O que foi? Acha que precisa ir para o hospital?
Encarei Matteo que se sentou na cama, puxando a coberta para
poder ver minhas pernas. Dei um passo para trás, fugindo de seu
toque.
— Não, eu estou bem.
— Você pode deixar eu ver se você não se machucou?
— Não acho necessário… eu estou bem, só com um pouco de
dor de cabeça.
— Para de ser teimosa, eu prometo que não vou te atacar.
— Ah… eu sei. — Matteo me ignorou, puxando minha perna para
seu colo.
— Que lado você bateu? Toma o remédio, pode piorar a dor de
cabeça.
Não era comum ter Matteo preocupado comigo, às vezes eu
pensava que era só a garota que ele tinha que aguentar por ser
melhor amigo do meu irmão. Por isso, virei de lado para que ele
pudesse ver minha perna direita que doía bastante.
— Caralho. — Matteo tocou minha perna, afastando ainda mais a
coberta, e revelando um roxo bem marcado, com outras cores se
misturando. — Está doendo?
— Não, só…, — minha voz sumiu quando ele passou o dedo
levemente por minha coxa, avaliando o machucado. O arrepio fez
com que cada pelo do meu corpo ficasse em evidência, mas a
fisgada em minha boceta quase me desequilibrou — você não
precisa me tocar. Eu estou bem.
Matteo me encarou, sua sobrancelha franzida. Desviei os olhos
de seu rosto e voltei a encarar suas tatuagens. Sua barriga tinha
diversos desenhos que ficavam sobre os gomos que ele conseguiu
por anos na academia. Notei um desenho novo e sem que
percebesse, minha mão foi parar sobre a tatuagem.
Senti sua barriga tensionar, mas Matteo não se afastou. Era uma
balança da justiça com um cérebro e um coração sendo pesados.
Passei o dedo pelo traço bem desenhado e afastei minha mão,
percebendo que eu estava tocando Matteo.
O quarto estava em completo silêncio, por isso sabia que tinha
passado dos limites. Fui impedida de pedir desculpas, quando meu
celular começou a tocar. Olhei o visor e minha mãe me ligava. Já
passava do horário do café da manhã.
— Raffaela Amara Giordano, onde você está? — Sua voz saiu
gritada e Matteo se afastou, me dando privacidade.
— Oi, mamma… eu dormi em uma amiga, acabamos saindo e
esqueci de avisar.
— Que amiga? Posso saber? Ontem você tinha um jantar
importante com seu pai e o deixou sozinho. Como você pode fazer
isso? — Fechei os olhos tentando lembrar, mas nada passava por
minha cabeça.
— Que jantar? Eu não tinha nada anotado em minha agenda.
— Você sabe bem… seu pai queria te apresentar o filho do
amigo, e o que você faz? Você foge.
Joguei a cabeça para trás e pensei na possibilidade de me jogar
na frente de um carro. Meu pai achava que eu devia me casar, para
ele era inadmissível que eu não estivesse casada ou próxima de ter
um relacionamento sério com vinte e nove anos.
— Eu sinto muito, mas eu nunca prometi ir a esse jantar… eu
preciso ir… preciso me arrumar para o almoço com a Ceci.
Minha mãe não se despediu. Tentou continuar falando sobre o
jantar mas, quando eu parei de responder, apenas me deu o
tratamento de silêncio que era comum para mim.
Joguei o celular longe e encarei o teto de madeira da casa de
Matteo. Sentindo que eu era tão pequena que podia caber no bolso
de alguém, eu me perguntava como era ser amada como Rocco: por
meus pais, por Matteo, por todas as pessoas que o conheciam e o
adoravam, ao passo que eu sentia que as únicas pessoas que me
amavam eram Rocco, Atena e agora Ceci.
Minha vida era merda. Mas eu sabia que um dia alguém me
amaria, ninguém pode viver sem amor.
Nem mesmo eu.
6
Matteo

Olhei para o relógio, Raffaela estava quieta há uma hora. Não


era comum, nem mesmo acho que já aconteceu alguma vez perto de
mim. Normalmente ela ficava me irritando até que eu saísse de
perto. Alguma coisa tinha acontecido, mas ela não tinha dito e eu
não sabia se ela queria falar comigo.
Raffaela aumentou o volume do som do carro e virou para o
lado, como se estivesse fugindo dos meus olhos. Apertei o volante
do carro com raiva. O que quer que tivesse deixado ela assim era
sério e me fazia querer arrancar dela o que estava acontecendo, mas
eu sabia que não tinha direito a coisa nenhuma.
Raffaela tirou o cabelo escuro do rosto delicado e arredondado e
sorriu para algo que viu na rua. Meu coração se aqueceu, vendo que
mesmo triste do jeito que estava ela podia achar algo bonito para
sorrir.
— Você quer passar em casa para trocar de roupa? — Não me
segurei e tive que perguntar algo. A apatia de Raffaela me arrepiava
de um modo que não conseguia mais ignorar.
— Acho que enquanto você estiver… não, pode me deixar em
casa, depois eu pego um táxi.
— Você está louca? Eu posso esperar um pouco enquanto você
troca de roupa.
Raffaela virou para mim e acenou com a cabeça. Eu ia surtar.
Raffaela precisava brigar comigo nos próximos minutos. E eu faria de
tudo para ter uma reação dela.
— Tenho certeza de que Ceci vai gostar mais do meu presente do
que do seu.
— Com certeza, já que… por causa da multa de ontem eu estou
sem presente… acho que suas chances de ganhar o amor da minha
sobrinha são muito maiores.
— Como assim? — Virei o carro para entrar na sua rua.
— Nada, eu só não esperava isso no meu orçamento.
— Mas você pode pedir para os seus pais. — Seria estranho uma
mulher de vinte e nove anos depender dos pais, mas ela era
responsável por metade da empresa que cuidava junto com Rocco.
— Não sou assim, Matteo, mesmo que você ache que sim.
Parei o carro em frente à casa amarela com janelas brancas que
eu tinha passado a adolescência. Raffaela ainda morava com os
pais, e de vez em quando pensava em como ela conseguia fazer
isso, mas eu também sabia que ela sempre foi a bonequinha da
casa.
— Eu vou trocar de roupa, se você quiser ir comprar o presente e
depois me buscar… mas também não precisa, se não puder.
— Eu vou te esperar, Raffaela.
Saí do carro, mostrando que eu podia ficar na sala. Eu tinha feito
aquilo diversas vezes. Aquela casa era metade minha, passei mais
tempo ali com Rocco do que em qualquer outro lugar.
A casa estava trancada, e Anna e Mario já deviam ter saído em
direção à casa de Nonna. Raffaela esperou que eu entrasse e fechou
a porta, me apontando o sofá como se eu fosse um estranho e não
alguém que era velho conhecido da casa e dela.
Sentei no sofá, que era novo – eles haviam trocado antes do
Ano Novo, a festa foi nessa casa e a imagem de Raffaela toda
enfeitada, fugindo pela porta com algumas amigas depois da meia
noite ainda me perturbava.
Ouvi o barulho do chuveiro e não estranhei, é claro que ela
queria tomar um banho depois de dormir fora e com roupas que não
a pertenciam. Levantei para olhar as fotos antigas, mas algumas
tinham sido substituídas por novas Anna Cecília.
Notei que a maioria das fotos de Raffaela estavam um pouco
para trás, na sombra, com as fotos de Rocco e Anna Cecília
sobressaindo as suas. Passei alguns dos retratos de Raffaela para a
frente e uma me chamou atenção, era Rocco e eu, e Raffaela
sorrindo atrás, ela estava escondida atrás de Rocco, como se
quisesse fazer parte da foto.
— Podemos ir. — A voz de Raffaela me assustou, de modo que
acabei derrubando o porta retrato.
Ela se aproximou de mim. Usava uma calça jeans escura solta e
um corset escuro que contrastava com sua pele e um longo casaco
pesado. Fiquei em silêncio encarando seu corpo e engoli em seco.
Ela era linda.
— Eu lembro de quando essa foto foi tirada… eu queria tanto
fazer parte da sua dupla… Rocco ainda deixava.
— Você era um pé no saco, polpetta. — Raffaela virou os olhos e
ignorou o que eu disse.
— Vamos logo.
Raffaela colocou a foto atrás de todas as outras e tentei ignorar
o sentimento que aquilo me causou, como se ela quisesse se
esconder. Mas eu a conhecia bem. Raffaela não se escondia,
Raffaela tomava qualquer lugar que quisesse.
Peguei o porta-retrato de volta, colocando-o na frente das outras
fotos e saí atrás dela. Raffaela estava esperando na porta,
segurando a chave e olhando para fora. Algumas pessoas
passavam, mas a rua estava quase deserta. Ela não parecia melhor
do que antes.
��️
Raffaela não quis sair do carro. Ficou sentada, olhando pela
janela enquanto as pessoas passavam na rua movimentada. Eu não
entendia a melancolia que tinha tomado conta dela. Ela não tinha o
direito de ficar daquele jeito. Ela era Raffaela. Eu estava prestes a
ligar para Rocco e pedir para que ele viesse consertar a irmã dele.
Quando voltei e mostrei o presente, Raffaela deu um leve sorriso
e voltou a encarar a paisagem. Talvez fosse sono e eu estava sendo
extremo demais. Quando chegamos perto da casa de Dora, Raffaela
esfregou a mão na calça em sinal de nervosismo. Aquilo estava
ficando estranho. Parei o carro na entrada da casa, onde todos os
outros carros estavam.
Raffaela entrou como se a casa fosse dela, vestindo um sorriso
que eu não tinha visto desde que ela recebeu aquela ligação, era
como se ninguém pudesse ver o que estava acontecendo.
Minha pele se arrepiava com o medo que aquilo fosse comum.
— Ceci! — Raffaela se abaixou, chamando a menina para ela,
que correu em direção a tia.
Raffaela levantou com Anna Cecília, girando-a no ar, como se
não pesasse nada. Respirei aliviado ao sentir que aquele sorriso era
verdadeiro. Ceci apertou tão forte o pescoço de Raffaela que eu tive
que colocar minha mão em suas costas para que ela não caísse para
trás com a menina em seu colo.
Anna Cecília sorriu para mim e deu um beijo no rosto de
Raffaela.
— Zia, eu estava com saudade! — Ceci desceu do colo e
encarou as mãos de Raffaela. — Cadê meu presente?
Raffaela foi se abaixar para falar com a garota, mas eu fui mais
rápido.
— Aqui, Ceci! Sua zia pediu para que eu segurasse…, ela estava
louca para te dar um abraço bem apertado.
Raffaela olhou para mim com os olhos brilhando, e eu senti
aquilo por todo meu corpo. Eu podia ver a gratidão em seus olhos e
o sorriso que ela deu… Eu faria qualquer coisa para que ela não
perdesse aquele brilho no olhar.
— Obrigada — falou baixinho, enquanto Ceci corria de volta para
Rocco e Atena. — Eu vou pagar, prometo.
— Não precisa, ela provavelmente nem vai lembrar que eu não
trouxe o meu… eu comprei um presente bem legal, queria ganhar de
você dessa vez... Mas acho que você precisava mais que eu.
Raffaela gargalhou e eu me afastei, deixando-a sozinha. Eu
tinha mesmo que me afastar, afinal, estava perto de transformar a
felicidade de Raffaela em meu combustível.
7
Raffaela

Matteo se afastou de mim, sorrindo para a minha família. Nonna


tinha os braços abertos esperando por ele, todos adoravam Matteo.
Atena correu descalça para mim, com uma calça jeans e um pulôver
pesado xadrez que estava sujo de terra. Eu podia ver todas as
perguntas rondando sua cabeça e, por mais que amasse minha
melhor amiga, hoje eu queria fugir dela.
— O que aconteceu com você ontem? E você e Matteo chegaram
juntos? — Atena tinha um sorriso lindo nos lábios, mas eu podia ver
que ela estava confusa. — A Nicoletta disse que você tinha saído
para beber e levou ela.
— Só alguns drinks… juro, mas depois… bom, vamos apenas
dizer que eu me ferrei e precisei de um advogado e agora tenho que
encarar meus pais que estão bravos…
Apontei com os olhos para minha mãe que caminhava para mim.
Atena acenou e me deixou sozinha para escutar o que quer que
minha mãe quisesse dizer, e eu quase implorei que ela ficasse. Torci
para que ela deixasse de fora aquela história de namoro ou eu teria
que ir embora.
Fazia um tempo que eu vinha juntando dinheiro para comprar
minha casa. Era um apartamento pequeno que a mãe de uma amiga
estava vendendo e ela tinha confiado que eu logo poderia comprar,
mas agora não sabia mais. E isso era principalmente por eu saber
que não era bem-vinda em minha própria casa.
— Você demorou, Raffa.
— Desculpa, mamma. Tive que passar em casa. — Matteo
estava me olhando, por isso, desviei e encarei minha mãe. — Não
queria aparecer desarrumada.
— Você está linda, figlia.
Minha mãe nunca me fez sentir pequena por causa do meu
peso, ou sobre meu corpo e aparência, seu problema era ter um filho
preferido. Por isso, acreditei quando me falou que eu estava linda.
— Obrigada.
— Depois vamos falar sobre como você sumiu do jantar com seu
papà, tenho certeza de que ele não vai falar nada porque te protege
demais, mas ele está chateado.
Era sempre assim, eu era culpada por ações deles. Nunca
concordei em ir a jantar algum, nunca disse que encontraria um
namorado, nunca disse que eu queria um.
Caminhei até onde a mesa estava posta. O frio não impedia que
Nonna colocasse a mesa aqui para que todos pudessem comer
tranquilamente sem ficar apertado do lado de dentro.
Respirei fundo, me sentando ao lado de Ceci que brincava com
uma boneca que eu tinha dado para ela quando chegou na casa de
Rocco e Atena. Eu podia ver em seus rostos o quanto eles estavam
felizes com a família finalmente completa. Atena não parava de tocar
na filha e Rocco fazia o prato para ela.
— Zia, você sabia que o meu papà vai me levar para a Disney?
— Ceci colocou um pedaço de rotoli, sem cortar na boca e esperou
por minha resposta.
— É mesmo? Você sabia que, uma vez, seu nonno Mario e a
nonna Anna nos levaram para o parque?
Matteo se sentou ao meu lado e sorriu.
— Eu lembro bem… você queria muito ir na montanha russa, mas
ficou com medo quando já estava lá. Chorou o caminho todo.
Revirei os olhos e o encarei. Matteo tinha um sorriso de escárnio
em seu rosto.
— É? Eu lembro bem daquela vez que você e o Rocco juraram
que podiam ir em uma festa de Halloween e você voltou pálido. Seu
zio tem medo de filmes de terror, Ceci.
Encarei Matteo, seu sorriso tinha desfeito. Seus olhos verdes
brilharam de encontro a mim, como se ele estivesse pensando no
que dizer para me fazer sentir vergonha na frente da minha sobrinha.
— Quando vocês começaram a agir como pessoas normais perto
um do outro? — foi a voz de Rocco que nos fez desviar do olhar
intenso entre nós dois.
— Eu sempre sou educada.
— Eu sempre sou uma boa pessoa.
Falamos ao mesmo tempo. Rocco riu e encarou Atena como se
estivessem vendo algo que ninguém mais via.
— Zia, você namora o zio Matteo?
— Não! Ceci… amore mio… não! Olha pra zia… não! — quase
dava para tocar o desespero em minha voz.
Não que eu estivesse ofendida, era até bonita a sua inocência
que jurava que eu podia namorar com Matteo, mas eu já tinha
passado por aquilo. Sonhar aqueles sonhos. Tinha acabado, mesmo
que o meu sentimento continuasse o mesmo.
Matteo me encarou, a sobrancelha franzida. Olhei em volta e a
mesa toda estava me olhando, como se eu tivesse enfiado uma faca
em Matteo e girado.
— Sabe… Graziella falava o mesmo, você lembra Francesco? —
Nonna falou e eu virei para ela. Graziella era a mãe de Atena, eu
podia ver o sorriso em seus olhos por lembrar da mãe.
— Lembro sim, ela me odiava…
— Não odeio o Matteo, só não estamos namorando e queria
deixar isso claro para Ceci, que é mais curiosa do que devia ser para
a idade.
— Você deixou bem claro, polpetta.
Levantei, deixando a mesa, eu só não conseguia encarar todo
mundo que me olhava como se eu fosse uma alien. Andei para
dentro da casa, com uma vontade de correr e me esconder. Ouvi
Atena vindo atrás de mim.
Fui empurrada para o corredor dos quartos e enfiada dentro do
seu antigo quarto.
— Pode me contar tudo. — Atena fechou a porta e se virou para
mim.
— Ok, vamos começar do começo… meu papà e minha mamma
acham que eu tenho que namorar, então arrumaram um jantar com o
filho de um amigo, eu fugi, fui beber com Nicoletta que deve estar até
agora brava. Lorenzo chegou, eu já estava bêbada, ele quis me levar
embora, eu queria andar. Nós acabamos andando, eu caí em uma
fonte, patrimônio público, fui detida, tive que chamar o Matteo,
porque eu não queria pagar a multa. Ele chegou, me fez pagar a
multa e eu não queria ir para a minha casa. Fui dormir na casa dele e
agora ele está me tratando como um ser humano. Fim.
— Você nem respirou.
— Você pediu tudo.
— Quanto foi a multa?
— Quase mil euros…
— Era o que faltava para comprar o apartamento, não era? Você
disse que estava quase lá…
Faltava quase dez mil euros, mas eu não ia contar para Atena,
ou ela me daria o valor ou – pior ainda! – faria Rocco me dar. Só que
eu queria que aquilo fosse uma conquista minha, totalmente minha.
Por isso, nos últimos anos, eu vinha economizando mais do que eu
podia.
— Você sabe que eu posso te dar o dinheiro e depois você me
devolve?
— Eu sei, mas… não se preocupa. Falta pouco.
Faltava pouco há quase um ano. Eu achava que logo a mãe da
minha amiga desistiria.
— E Matteo… — A voz de Atena mostrava que ela não ia deixar
aquela história morrer.
Isso era bom, eu não queria esquecer que o que ele fez por
mim, era uma história que eu ia escrever no meu diário.
— Matteo foi um bom amigo. Só isso, Atena.
Quando voltei para a mesa, Matteo tinha roubado meu lugar, me
fazendo sentar longe de Ceci. Se ele achava que eu ia deixá-lo
roubar minha sobrinha, ele estava muito enganado.
— Na guerra e no amor vale tudo, polpetta.
8
Matteo

Respirei fundo, tentando ignorar as olhadelas que Rocco me


dava de cinco em cinco minutos. Fazia algum tempo que ele estava
daquele jeito e significava que ele queria conversar, mas eu tinha
visto a cara que Raffaela saiu de dentro da casa, depois de Atena ir
atrás dela. E, com certeza, ele também estava querendo saber o que
tinha acontecido.
Ceci se jogou no meu colo depois de correr por um longo tempo
de um lado para o outro como se algo estivesse a perseguindo. E eu
imaginava como era difícil para ela, uma criança que viveu a vida
toda cercada de outras da mesma idade, agora ter que conviver com
um monte de gente mais velha.
— Matteo, brinca comigo? — Ela fez um bico e me encarou com
os olhos pidões.
— Não, nem pensar…
— Mas zio… — Ceci já tinha aquele olhar que eu reconhecia do
Rocco e trejeitos que Atena tinha, além, é claro de seus próprios
anos de experiência. — prometo não falar que você namora a zia
Raffa.
Levantei da cadeira, levando a garota comigo que sorria como
se soubesse que tinha vencido. Caminhei até o mais longe possível
do jardim de Dora, sabendo que se algo acontecesse com aquelas
flores que sobreviveram ao começo do frio, eu terminaria o dia no
caixão.
— Do que vamos brincar?
— A zia Raffa me ensinou uma brincadeira nova.
Eu podia muito bem imaginar as coisas que Raffaela ensinava
para a criança sempre que estavam juntas. Ela era uma adolescente
terrível quando nos conhecemos.
Ceci se jogou no chão e esperou que eu fizesse o mesmo, como
se eu fosse apenas um adulto idiota que não sabia o que fazer junto
com uma criança. O que realmente era verdade, eu não sabia como
conviver com uma criança.
— Vem! — Ceci deu duas batidas no chão e continuou me
encarando.
Percebi que não tinha escolha, quando olhei para o lado e
Raffaela estava rindo da minha cara, como se eu fosse um idiota por
estar de pé, enquanto a criança claramente me implorava para deitar
com ela.
— A sua zia Raffaela que te ensinou, certo? Acho que a gente
devia chamar ela pra vir até aqui também e participar dessa
brincadeira incrível que envolve deitar no chão gelado.
Ceci levantou em um pulo e correu de encontro a Raffaela que
mordeu sua bochecha assim que a criança chegou perto dela. As
duas caminharam lado a lado de encontro a mim.
Raffaela tinha um sorriso gigante no rosto, que quase explodia
suas bochechas. Ela tinha colocado um suéter escuro, e estava com
o casaco pesado, mas eu ainda podia ver seu corpo, era como se ela
não tivesse qualquer vontade de se esconder de mim.
— Quer dizer então que você tem tanto medo de brincar com
uma criança que tem que pedir ajuda? — falou ao se aproximar de
mim, mantendo um ar brincalhão em seus olhos que eu adoraria
arrancar.
— Só estou pensando que se eu vou passar vergonha, a
responsável pela brincadeira também deveria.
Raffaela riu e se jogou no chão ao lado de Ceci, que corria a
mão pela grama, sem medo de ser feliz. Assisti as duas deitadas e
decidi que era hora de ser corajoso e me deitar ao lado delas.
Escolhi o outro lado de Ceci, afinal, parecia mais seguro que me
deitar ao lado de Raffaela e dar mais motivos para a falação que
tinha começado desde que aparecemos juntos.
Ceci virou para mim sorrindo e passou a mão pelo cabelo,
tirando a franja dos olhos e mostrando seus traços asiáticos que a
faziam parecer mais jovem ao serem combinados com a franja e
cabelo escuro.
— O que nós temos que fazer, bambina?
— A zia Raffa explica melhor.
— Nós temos que encontrar o maior número de nuvens que
parecem com animais.
— Mas, a sua zia não inventou esse jogo. — Raffaela me olhou
brava e eu ignorei, tentando me concentrar em encontrar animais
nas nuvens.
— Ali! — Ceci apontou. — Tem uma galinha.
— E ali, um elefante.
Encarei as nuvens apenas para ter certeza que não existia nada
ali. Nem mesmo a aparência de nada que elas estavam dizendo. Era
claro para mim que as duas estavam roubando.
— E ali uma borboleta.
— Olha, zia, um dinossauro.
— Não tem nada ali — afirmei, enquanto Raffaela virava para
mim com um olhar que poderia me matar.
— Você nunca foi criança, Matteo?
— Já, mas quando eu brincava, eu brincava de coisas reais.
Eu podia ver que Raffaela estava pronta para me xingar, mas
então, Ceci se virou para mim e disse:
— Zio, você tem que imaginar o que quer ver… eu imaginei meu
papà e minha mamma e agora eu tenho os dois.
Toquei o nariz de Ceci e ela sorriu para mim. Aquela pequena
criança tinha trazido um sentimento quase palpável de amor para
aquela família e não tinha como fugir de seus encantos.
— Então, vou imaginar um dragão… eu sempre quis ter um
dragão.
Ceci virou para o céu e começou a apontar para novas imagens
que via. Enquanto isso, Raffaela a olhava com todo o amor do
mundo, como se aquela pequena criança pudesse fazer com que
seu coração explodisse. E eu entendia, Ceci também me tirava da
zona de conforto, ela tinha trazido mais do que amor. Ceci tinha nos
dado um motivo para continuarmos unidos.
— Acho que ali é um gato — falei, e Ceci virou para mim sorrindo.
— Isso, zio Matteo… muito bem.
Raffaela virou para mim e sorriu, como se agradecesse. Eu só
não sabia pelo quê. Voltei a encarar o céu, escutando a voz das
duas, enquanto a grama molhada me deixava gelado.
Estranhamente, era bom, de uma maneira quase meio amarga. Ouvi
a risada melodiosa de Raffaela e virei para ela. Seu sorriso era
gigante, enquanto ela falava as coisas mais bizarras do mundo,
apenas para ver Anna Cecília rir.
Respirei fundo, tentando lembrar de momentos assim na minha
infância, enquanto minha mãe tentava fazer de tudo para que eu não
visse os lados ruins do seu relacionamento com meu pai. Minha mãe
tinha feito de tudo para que eu tivesse bons momentos.
Ela só nunca teve tempo de deitar ao meu lado na grama
enquanto tentava sobreviver ao seu casamento.
9
Raffaela

A porta do meu escritório estava trancada, enquanto ouvia uma


música baixa. Eu gostava de colocar a nona sinfonia de Beethoven
para tocar, enquanto fingia que trabalhava. Sim, era isso que eu
estava fazendo há umas três horas, apenas fingindo. Eu tinha uma
pequena tela em cima da mesa e tentava encontrar o desenho
perfeito para começar a pintar.
Por morar com meus pais, eu quase nunca tinha tempo para me
dedicar à minha verdadeira paixão. E é claro que eu amava planejar
casamentos e dar finais felizes às pessoas, mas esse era meu
trabalho. A tela em branco posta na mesa? Essa era minha paixão.
Puxei a manga da camiseta que continuava caindo: era o que
acontecia com minhas blusas, por meu braço ser gordo, as bocas
das mangas alargavam e no final ficavam me incomodando, caindo
sempre que eu precisava delas para cima.
Fechei os olhos pensando no último domingo. Matteo não tinha
demorado em ir embora, saindo correndo de nós como sempre fazia
em algum momento do dia, mesmo que tentasse ficar um pouco
mais por causa de Ceci.
Abri os olhos, pegando o lápis de esboço e começando a
contornar uma forma ainda indefinida, mas que eu sabia que sairia
alguma coisa, sempre saia. Passei o dedo, tentando limpar um borro
que ficou na tela, sabendo que mais tarde a tinta cobriria.
Voltei a desenhar, sentindo o lápis deslizar e ir criando a imagem
que eu tinha em minha cabeça. Eu ainda tentava encontrar minha
própria voz na arte, e sentia que não tinha uma, ia desde paisagens
bonitas até rostos que eu nunca voltaria a ver, mas, ainda assim,
parecia que faltava algo para encontrar quem eu realmente era.
Estava começando a traçar o canto dos olhos quando ouvi uma
batida suave na porta. Esse era o sinal de Nicoletta de que alguém
logo entraria – a pobre senhora escondia meu segredo como se
fosse algo proibido e a maior parte disso era culpa minha, eu sabia.
Abri a gaveta, jogando os lápis dentro para fechar correndo,
quando ouvi a maçaneta girando com força, e caminhei até o
pequeno armário onde escondia meus quadros. Ajeitei minha roupa,
encarando minha agenda e sabendo que ninguém estava marcado.
Desliguei a música e andei até a porta, fechando o botão da
calça jeans que eu estava usando, eu costumava deixar aberta para
não marcar minha pele. Girei a chave e abri a porta com cuidado,
encontrando meu pai parado com um sorriso no rosto e os braços
abertos.
— Carino! — Sorri para meu pai e o deixei entrar. Ele não
costumava vir muito aqui, então, quando vinha sabíamos que era
apenas para matar a saudade da empresa que construiu com minha
mãe.
Meu pai me deu um abraço e um beijo na minha testa, me
empurrando para o lado como sempre fazia. Logo atrás dele tinha
um homem bonito, devia ter a mesma idade que eu ou um pouco
mais velho.
— Papà, não sabia que viria ou teria preparado alguma coisa
para você… cadê mamma?
— Ficou em casa, sabe como é… quando Ceci precisa dela…
— Mamma faria de tudo por ela. — Virei para o homem e o
encarei de novo, já que ele não parecia desconfortável pela
interação. — E desculpe, já nos conhecemos?
— Prazer, sou Michele.
— Acho que isso quer dizer que não nos conhecemos. Raffaela.
— Figlia, pode fazer companhia para Michele? Preciso conversar
com seu irmão por um segundo, apenas coisas da empresa. — Meu
pai se aproximou de mim e falou em meu ouvido: — Se a montanha
não vai a Maomé, vai Maomé à montanha.
O encarei surpresa. Meu pai não podia ter feito isso, não é? Ele
não tinha trazido o cara que eu não tinha interesse de encontrar para
dentro da empresa.
Meu pai não esperou pela resposta, dando um tapa carinhoso
nas costas de Michele, e me deixou sozinha com o cara que eu não
conhecia, mas que agora tinha se tornado meu inimigo número um.
— Seu escritório é muito bonito.
— Obrigada, aceita um café ou chá? Posso pedir para Nicoletta
preparar ou eu mesma…
— Não, eu estou bem, talvez uma água? — Concordei com a
cabeça, indo até a porta, deixando-a bem aberta para que ninguém
tivesse ideia errada alguma sobre um cara enfiado dentro do meu
escritório.
Quando virei, Michele estava sentado no sofá e olhava para os
pequenos ursos que eu tinha em cima da mesa no canto da parede.
Eu era viciada naqueles pequenos ornamentos, tenho certeza que foi
Rocco que me deu o primeiro quando eu ainda era criança.
— Aqui. — Nicoletta entrou no escritório, me entregando a água e
eu coloquei o copo de vidro nas mãos de Michele, que ainda parecia
perdido encarando os ursinhos.
— Gostei da decoração do seu escritório… mas acho que você
perde muito da vista com a cadeira virada para esse lado.
Sentei ao seu lado, tomando cuidado para não me aproximar
demais e dar a ideia errada de que eu gostaria de estar envolvida em
um relacionamento com um desconhecido total.
— Ah, eu passei a minha vida toda olhando para Roma, acho que
eu já me acostumei com essa vista — respondi, esfregando as mãos
juntas, nervosa por ter que fazer sala para ele.
— Ninguém devia se acostumar com Roma, sempre tem alguma
coisa nova para ver…
— Bom, para mim que cresci e vivi minha vida toda dentro desse
escritório, não tem muita coisa nova para descobrir, eu quase posso
enumerar cada detalhe de olhos fechados.
— Ainda acho que você perde muito. — Michele virou para mim,
depois de encarar a paisagem e sorriu, como se não estivesse me
irritando com a conversa.
Meu pai não voltava nunca e eu tinha que ficar presa no mesmo
ambiente que esse cara. Claro que ele não parecia uma pessoa
ruim, só me deixava desconfortável por estar aqui. Eu queria estar
pintando ou trabalhando, em vez disso, estava conversando com
alguém que queria mudar a disposição do meu escritório para caber
dentro do seu ideal.
— O que você faz aqui?
— Como assim?
— Seu irmão é um dos melhores cerimonialistas de Roma, o que
você é? — Revirei os olhos, respirando fundo e esfregando as mãos
na calça jeans.
— Sou a auxiliar dele, quer dizer, sempre que ele vai começar a
planejar um casamento, eu pego cafés e águas, às vezes ele até me
deixa buscar refeições completas.
Como se não bastasse meus pais, agora tinha um completo
desconhecido achando que tinha o direito de falar alguma coisa
sobre mim, meu trabalho e colocar Rocco Giordano como o centro
do mundo. Ótimo, apenas ótimo.
— Você deve ser ocupada, já que faltou ao jantar que seu pai
organizou.
Era isso, eu ia pular da janela do meu escritório. O cara podia
até ser bonito, mas era um completo babaca.
10
Matteo

Minha cabeça ia explodir, eu podia até mesmo sentir. Fazia


alguns dias que eu não estava me sentindo muito bem, era um
calafrio durante a noite, a cabeça que pesava sempre que eu
precisava ficar muito tempo lendo os papéis de um processo, sem
contar uma dor que vinha se instalando da base da minha coluna e
se arrastava para todo o corpo.
Tomei mais um gole da água que tinha ficado morna desde a
última vez que bebi. Olhei para o processo sem conseguir prestar
atenção e girei a cadeira, fechando os olhos, enquanto sentia um
cansaço que não me era costumeiro cair sobre meu corpo. Eu estava
ficando doente.
Eu odiava ficar doente, sempre acabava tendo que ficar alguns
dias longe do escritório e isso resultava em atrasos que eu não
queria ter. Ouvi uma batida de leve na porta, e o ranger da madeira
ao ser empurrada.
— Sabia que você ia estar assim, reparei hoje cedo na sua cara
assim que chegou… tomou algum remédio? — a voz de Giacomo
me acordou do transe que eu estava, mas não sentia mais vontade
de abrir os olhos, por isso continuei descansando.
— O que precisa?
— Eu? Nada. Você? Um médico, dois analgésicos, chá, uma
enfermeira gostosa, e talvez dez dias enfiado dentro de casa.
— Aceito a enfermeira e o analgésico.
Ouvi a porta ser fechada e o corpo grande de Giacomo caindo
sobre a cadeira. O cara era enorme, quase dois metros de altura,
ombros largos, uma barriga saliente, e cabelos loiros, ele era quase
um viking. Abri os olhos com dificuldade para encarar meu
companheiro de trabalho e ele ria, enquanto chacoalhava um globo
de neve da Torre di Pisa.
— O que você quer? E largue isso aí, eu ganhei de presente. —
Senti uma gota de suor escorrer por meu rosto e me recusei a admitir
que estava pior do que eu achava que estava.
— Presente de quem?
— Uma amiga.
Raffaela. Ela tinha trazido de uma viagem, Rocco e ela
passaram um mês nas férias com os pais e por algum motivo, achou
que eu merecia um presente. Nem mesmo Rocco me trouxe nada. E
quase dez anos depois, eu ainda tinha aquele artefato guardado.
— Sei, ok. Bem, eu vim aqui porque parece que a chefe quer
conversar com você, mas com a cara que você está, e toda a
composição, eu acho que você deveria ir para casa.
— Não posso — respondi, tentando voltar à vida, mas sem
forças. —, a audiência de um dos meus casos está chegando,
preciso estudar algumas provas e rever algumas coisas com a minha
cliente.
— Bom, você que sabe… já comeu? Acho que não te vi se
alimentar.
— Comi um sanduíche que trouxe de casa.
— Eu vou procurar algum remédio pra você tomar e pelo menos
aceite isso, já que não vai aproveitar a sua chance para ir ao médico.
— Tudo bem, mamma — ironizei, enquanto Giacomo levantava
da cadeira, indo em direção a porta.
Respirei fundo, ficando sozinho e coloquei a mão em minha
testa, tentando medir a febre que parecia começar a subir. Parecia
que eu teria mesmo que ouvir o conselho de Giacomo e fazer a coisa
que eu mais odiava na vida: sair mais cedo do trabalho.
A porta se abriu mais uma vez e nem abri os olhos, sabendo que
provavelmente era Giacomo com o remédio que tinha prometido. Por
isso, quando senti pernas muito femininas sobre as minhas, abri os
olhos para encontrar Alice.
— Soube que precisa de uma enfermeira.
Aquele era o pior dia da minha vida.
Alice estava há um ano trabalhando conosco, e por alguma
razão que deve ter a ver com a bebida, eu acabei transando com ela
no banheiro de um bar. Não foi uma das minhas mais brilhantes
ideias, principalmente porque eu sabia que Eleonora odiava quando
eu pegava as funcionárias novas.
E desde então a garota acreditava que ainda tinha chances
comigo. Foi um bom boquete, não posso negar, além de ela ter uns
peitos gigantes, graças aos bons médicos de cirurgia plástica. Deus
abençoe os cirurgiões.
— Alice… você pode me deixar sozinho?
— Mas o Giacomo disse que você precisava de alguém para
cuidar de você… — Tentei ignorar que ela estava abrindo a blusa,
mas eu realmente não costumava cometer duas vezes o mesmo erro
e transar dentro do escritório com uma funcionária de Eleonora que
quase tinha me custado o emprego há alguns anos.
Empurrei suas pernas, fazendo Alice ficar de pé, diante de mim.
Seu olhar parecia magoado, como se eu tivesse chutado seu
cachorro, por isso, tentei ser cuidadoso com minhas próximas
palavras, afinal, eu era um cara legal com a maioria das pessoas que
eu conhecia. A única exceção era Raffaela que conseguia me fazer
ser uma pessoa ruim.
— Eu não estou me sentindo bem e tudo que eu preciso agora é
de um remédio, prometo que te recompenso — Não iria — em algum
outro dia, seria ótimo ter uma enfermeira — Não você — cuidando de
mim, mas no momento eu só quero mesmo ficar quieto e esperar o
remédio fazer efeito, ok?
Encarei Alice que me olhava com um bico gigante, isso era
idiotice. Eu ainda estava sendo sensível, eu podia muito bem ter
mandado ela sumir da minha frente.
— Você é um babaca… me comeu e nunca mais quis ficar
comigo.
A porta abriu e Giacomo parou ao ouvir as palavras, um sorriso
gigante surgiu em seu rosto, porque eu sabia que aquele idiota
adorava uma briga.
— Alice, sinto muito se não correspondo às suas expectativas,
mas eu disse que seria uma única vez. Uma única vez ou o seu
emprego estaria em risco, já que Eleonora me ama demais para me
mandar embora.
Alice bateu o pé no chão e saiu empurrando Giacomo com o
ombro. Respirei fundo, enquanto o babaca do meu amigo me
entregava o remédio.
— Dia difícil, Matteo?
— Eu quero que você desapareça da minha frente.
— Dói, sabia? Ser tratado assim quando tudo que eu faço é ser o
melhor amigo do mundo.
Dei o dedo do meio, enquanto engolia o remédio seco para
tomar um longo gole de água em seguida. Recostei na cadeira
sabendo que nada de bom podia vir de um dia que começava
daquele jeito.
11
Raffaela

Fazia alguns minutos que eu tinha parado completamente de


ouvir o idiota que falava ao meu lado sobre qualquer coisa da
arquitetura de Roma, e passei a encarar a parede. Tudo que eu
sabia sobre ele era contra minha vontade. Tinha a minha idade, seus
pais eram arquitetos e ele seguiu os passos da família, era filho
único, namorou três vezes no último ano, sua última namorada se
chamava Amélia.
Enquanto ele falava sem parar e sem dar chance que eu
respondesse qualquer coisa, eu torcia para que o telefone tocasse,
chegasse algum cliente, uma bomba explodisse ou eu tivesse um
mal súbito e morresse bem ali. Porém, nada disso acontecia e eu
parecia amaldiçoada.
Meu pai estava há horas com Rocco e eu não sabia o que podia
demorar tanto, mas meu Deus, eu ia me matar. Meu celular começou
a tremer em meu bolso e eu finalmente consegui a desculpa perfeita
para encerrar aquela conversa.
— Desculpa, preciso atender essa ligação, é um cliente
importante. — Levantei do sofá, temendo que ele visse o nome de
Atena, eu não sabia o quanto ele sabia da minha família, por isso era
melhor prevenir qualquer desgaste.
— Eu nunca deixo meus clientes terem meu celular pessoal.
— Claro… um segundo.
Virei de costas, respirando fundo e torcendo para ele ser
egocêntrico o suficiente para não perceber que eu estava aliviada de
estar longe dele. Por que homens bonitos sempre eram babacas?
— Oi Maria, em que posso ajudar?
— Maria? — Atena começou a rir e tentei me segurar. — Isso é
por que seu pai colocou um pretendente na sua sala? Precisa de
ajuda? Diga sua frase de segurança.
— Sim, claro, eu posso anotar que você precisa de Crisântemos
no seu casamento. Sim, fico feliz em te ajudar a escolher a cor,
precisa que seja agora?
— Rocco me mandou mensagem quando seu pai foi falar que ia
te apresentar um partido… inclusive, você sabe que crisântemos são
flores para velórios, não é? Nunca deixe uma noiva usar isso no
casamento.
— Não... Se você precisar agora, eu posso dar um jeito. Estou
meio ocupada, mas sempre posso abrir uma exceção para uma das
minhas melhores clientes.
— Tão ruim assim? Eu preciso buscar a Ceci na casa dos seus
pais, se quiser fazer isso por mim e trazê-la aqui, sua mãe já passou
tempo demais com a minha figlia, estou com saudade do cheiro dela.
Ri, sabendo que Atena não estava brincando. Ela sempre estava
com saudade de Anna Cecília, era uma surpresa que ela deixasse a
menina ir à escola.
— Eu vou só terminar algumas coisas e podemos nos encontrar
na minha floricultura preferida, pode ser? Anote o endereço da
Floricultura Caputo, por favor. Até mais.
— Traga a minha filha!
Desliguei o telefone e me virei para encontrar o cara me
encarando. Preferi não dar chance para que ele falasse, mas parecia
que ele tinha algum problema cognitivo, pois logo me cortou antes
que eu pudesse dizer qualquer coisa:
— Você parece ocupada…
— Sim, eu estou. Acho que vou ter que te levar para a sala do
meu irmão, quem sabe você não pode contar um pouco sobre
arquitetura para ele…
Michele levantou, ajeitando o terno bem cortado e me encarou.
Eu sabia antes mesmo dele abrir a boca que algo ruim sairia dali,
não era o seu rosto, que era uma máscara de frieza, mas a
atmosfera.
— Posso te perguntar uma coisa?
— Hum, pode… claro.
— Sinto muito ser direto, mas… por que você fugiu do encontro
marcado por seu pai?
Ok, eu estava esperando por isso. Era honesto e também
invasivo que ele se sentisse no direito de questionar o motivo de não
ter aparecido, principalmente porque eu sabia que meu pai teria
arrumado uma desculpa muito boa que não deixaria pontas soltas.
Isso provava que apesar de ser egocêntrico, o cara tinha percebido
que eu não tinha interesse nenhum nele e aquilo me deixou culpada.
— Eu…
— Não, quer dizer, Mario criou uma imagem de você e então eu
fiquei ansioso, mas você nunca apareceu.
Encarei a parede no pequeno ponto descascando que eu sabia
que tinha que encontrar uma maneira de arrumar, sem me permitir a
vontade de transformar o pequeno furo em um grande buraco.
— Sinto muito se… sinto muito se meu papà fez parecer que eu
estava interessada em um relacionamento, mas é só aquele
pensamento de pessoas mais velhas que acredita que, aos trinta,
você tem que estar casada e com três filhos.
— Entendo… mas você não está ficando mais jovem e… seu
corpo — O cara teve a coragem de me olhar com desprezo. Tentei
tampar meu corpo com meus braços, mas não consegui. Me
sentindo gigante pela primeira vez em muito tempo. — Quer dizer…
— Bom, como eu estava dizendo… não estou interessada em
nenhum relacionamento, além do que estou começando… meu
namorado costuma ser bastante ciumento.
— Namorado?
Ouvi a voz de meu pai me questionando e fechei os olhos,
sabendo que aquela tinha sido provavelmente a pior decisão da
minha vida, e estávamos falando da pessoa que também já tinha
deixado as sobrancelhas ultrafinas, pintado o cabelo de loiro e
tentado permanente, então sim, se aquela era pior decisão da minha
vida. E eu estava falando sério.
Virei para meu pai que tinha um grande sorriso no rosto. Era o
sorriso de alguém que não sabia que a filha tinha acabado de ser
ofendida, depois de ter passado quase uma hora fazendo sala para
um merda.
— Sim, papà…, ainda é recente, por isso, não queria dizer nada,
mas como estava falando com Michele e ele trouxe o encontro…
decidi compartilhar, mas apenas para não criar esperanças.
— Essa é uma ótima notícia, carino. Quem é o sortudo?
Sortudo? Bem, sortudo provavelmente era a pessoa que estava
fora dessa sala e que não tinha que arrumar um nome para um
namorado que não existia. Meu namorado? Bem… como eu daria
um nome para ele. Lorenzo. Só podia ser meu melhor amigo.
— É… depois eu conto, prometo que logo apresento para você.
— Você precisa me contar — Meu pai andou até mim e me
abraçou, dando um beijo em minha testa.
— Prometo, mas agora preciso encontrar uma cliente.
Me afastei de seu abraço, pegando a bolsa que estava em cima
do armário branco com vasos de flores no canto da minha sala.
Andei até o convidado e estendi a mão, o homem me encarou e nos
cumprimentamos. Me aproximei um pouco mais, sabendo que
apenas ele ouviria o que eu iria falar:
— Aposto que seu pau deve ser muito pequeno pro tamanho do
ego que você carrega por aí — levantei a voz, sabendo que agora
meu pai poderia me ouvir: — Foi um prazer te conhecer, Michele.
Não esperei por uma resposta quando saí deixando os dois
dentro da minha preciosa sala. O único lugar que era meu por direito,
e que agora ficava maculado por aquela lembrança.
Eu precisava arrumar um namorado.
12
Matteo

A luz do escritório estava me incomodando, por isso tomei


coragem para levantar e a apaguei. Não ia me matar ler no escuro se
eu tomasse coragem para ler. Fechei os olhos, encostando a cabeça
na mesa.
Não lembrava da última vez que tinha ficado tão ruim, nem
mesmo sabia de onde vinha essa sensação de morte que surgiu
durante a manhã e foi piorando durante a tarde, mas agora eu nem
mesmo sentia vontade de levantar para ir embora.
As palavras dos documentos já se embaralhavam na minha
frente e eu sabia que não conseguiria ser um ser humano produtivo
nas próximas horas, quase sentia vontade de pedir para Giacomo
me levar embora.
A porta foi aberta de supetão, sem pedir licença ou qualquer
batida, o que seria o socialmente aceito. Devia ser alguém da
empresa, ou minha chefe, mas eu simplesmente não encontrava
forças para levantar a cabeça e encarar quem quer que fosse.
— Meu Deus, por que isso aqui está escuro desse jeito? — A luz
foi acesa e invadiu minhas pálpebras e fez com que eu gemesse. —
Não vai me dar oi?
— Preferia que você não estivesse aqui para eu te dar oi.
— Primeiramente: rude.
Ignorei a pontada em minha cabeça e respirei fundo.
— O que você quer, Raffaela? — Minha garganta agora estava
doendo e eu não sentia a mínima vontade de conversar sobre
qualquer coisa com a irmã do meu melhor amigo que tinha me feito
sair de casa para tirá-la da cadeia.
— Preciso de ajuda.
— Tem mais cinquenta advogados nesse lugar, vá procurar outro.
— Mas precisa ser você.
Não precisava levantar a cabeça para saber que ela estava
fazendo biquinho, eu conseguia reconhecer no tom da sua voz, mas
ela não iria me ganhar no momento.
— Por que você está no escuro? E por que ainda não levantou a
cabeça para me expulsar daqui? O que você tem?
— Polpetta, por favor, você pode ir embora? Prometo que
amanhã ajudo a esconder um corpo, mas hoje eu preciso ficar
sozinho e sem a sua voz aguda me lembrando da dor de cabeça
infernal que eu estou sentindo.
Raffaela ficou quieta, e eu quase podia sentir sua presença
ainda na sala, por isso, não levantei a cabeça. Raffaela apagou a luz
e dei graças a Deus que iria ficar sozinho de novo, mas me enganei.
Ouvi seus passos em direção a minha mesa. Raffaela se
ajoelhou e tocou meu pescoço, fazendo massagem, seus dedos
tocavam em pontos estratégicos que aliviavam dores que eu nem
percebia estar sentindo.
— Você já tomou algum remédio? — Sua voz estava mais baixa
agora.
— Sim.
— Quer ir para casa? Eu posso te levar… não dirijo tão bem, mas
posso tomar muito cuidado com o seu carro, prometo.
Não respondi, sabendo que se ela me levasse, teria que dormir
lá, afinal não teria como voltar sem que pedisse ao Rocco para ir
buscá-la e se tinha algo que eu não tinha vontade de explicar, era o
porquê a irmã do meu melhor amigo estava em casa.
— Vamos, Matteo…
— Não… — Virei o rosto, encarando as belas feições de
Raffaela. Seu cabelo estava preso atrás da orelha que não tinha
furos, apenas uma pinta que dava impressão de brinco.
Levei minha mão até sua orelha, e soltei o cabelo que estava
preso ali, fazendo com que ela abrisse um sorriso. Raffaela tinha um
sorriso doce, mas eu sempre negaria a quem perguntasse.
— Não estou pedindo. Você me ajudou, me deixe te ajudar…
prometo que vou embora sem que você perceba, sua casa não vai
ser maculada pela minha presença.
Não tive forças para dizer que não, eu podia passar por
Giacomo e pedir para que fosse com Raffaela e depois a trouxesse
de novo, mas minha mente gritou um não, ao lembrar que ele podia
dar em cima dela e eu não queria ser o culpado da morte de
ninguém.
— Tudo bem, mas prometa não me matar durante o caminho.
Raffaela riu baixinho e se aproximou do meu ouvido e sussurrou:
— Prometo que não vou fazer isso, você é o único que
conseguiria me tirar da cadeia.
— Vamos tentar não passar de novo por isso.
Vi o sorriso em seu rosto e sorri também, mesmo que tudo
doesse em mim. Tentei levantar, mas precisei da ajuda de Raffaela
que colocou o braço por baixo do meu, dando suporte ao meu corpo.
— Você ao menos comeu? — questionou ainda sussurrando,
enquanto andávamos para fora da minha sala.
— Não lembro.
— Espero que tenha alguma coisa naquela geladeira.
Passamos por algumas portas fechadas, enquanto eu ignorava
a dura que Raffaela me dava, e eu sabia que teriam muitas mais no
caminho até minha casa, porque era assim que Raffaela era.
Ela sempre era a correta, sempre era a que sabia de tudo,
sempre era a que não podia ser contrariada e a que sempre ia ter
uma resposta pronta para se defender de quem fosse, e às vezes, eu
me questionava o porquê de ela ser assim.
— Preciso avisar minha chefe…
— Onde é a sala daquele seu amigo daqui? — Apontei com o
dedo para a sala mais próxima e ela virou para lá, me deixando
sentado em uma cadeira da sala de espera.
Tentei me aproximar para ouvir o que eles conversavam, mas só
consegui ouvir o riso de Raffaela, que não parecia envergonhada de
ter invadido duas salas no mesmo dia.
— Pronto, agora me passa a sua chave.
— Eu consigo dirigir — respondi, com medo que algo
acontecesse ao meu precioso carro.
— Claro, não sabia que agora as pessoas podiam dirigir de olhos
fechados, mas vamos testar essa nova teoria e ver no que dá…
Raffaela estendeu a mão para mim e não tive outra alternativa a
não ser entregar a chave do meu carro e torcer para que, até o fim
do dia, meu carro e eu estivéssemos em segurança em frente à
minha casa.
— Para de me olhar como se eu estivesse te levando para a
morte!
— Desculpa, eu devo começar a rezar pela minha alma?
Raffaela me ignorou e eu tive que sair atrás dela. Me arrastando,
sem o apoio que eu tanto precisava para sair de dentro do escritório.
13
Raffaela

Meus olhos se abriram ao ouvir de novo o gemido fraco de


Matteo. Foi uma madrugada difícil para ele, foram vários momentos
que eu jurei que teria que correr e levá-lo para o hospital. Sua febre
tinha subido, nada parava em seu estômago, por mais que eu
tentasse e, por isso, tinha sido uma péssima noite para mim também.
Olhei o relógio ao lado do sofá e tentei manter meu olho aberto
para ver o horário. Quase quatro horas da manhã. Levantei do sofá
de Matteo, que não suportava o meu corpo, me deixando dolorida
em vários lugares. Andei até a porta do quarto e encarei um Matteo
que virava na cama parecendo sofrer com alguma coisa.
Me aproximei dele, que já estava de novo sem a camiseta, mas
a coberta embolada e puxada até o pescoço. Sentei ao seu lado,
tentando medir sua temperatura com a minha mão, sem conseguir
ter certeza se eu devia colocar Matteo de novo embaixo do chuveiro
para baixar sua febre.
— Matteo, fala comigo… você consegue me entender? — Tentei
fazer com que ele me respondesse, mas apenas tive como resposta
o seu grunhido. — Eu vou me odiar muito por fazer isso, mas eu juro
que não tem outra alternativa. Eu ia conversar com você antes, mas
eu sei que vai sair uma merda gigante disso… mas eu não posso te
deixar assim.
Peguei meu celular e corri de volta para a cama. Afastando a
coberta para que ele pudesse respirar melhor. Deixei a luz da sala
invadir o quarto e acendi o abajur para que pudesse ver seu rosto
que estava franzido. Respirei fundo, temendo os próximos momentos
e pedi perdão para Matteo por envolvê-lo naquilo.
— Mamma?
— Raffaela Amara Giordano… — eu podia sentir a raiva em sua
voz, mas eu tinha avisado que ia dormir fora.
— Por favor, antes de me xingar, me ajuda! — Algo no meu tom
de voz que eu tinha certeza que passava o medo que eu sentia, fez
com que minha mãe ficasse quieta e me ouvisse.
Coloquei a mão na testa de Matteo, com medo de que sua febre
subisse mais. Aquilo estava me assustando, eu sabia que pessoas
adultas com febres altas podiam sofrer muito.
— O que eu faço para abaixar a febre de alguém? Eu já tentei de
tudo, já dei banho, já dei remédio, já deixei o mais confortável
possível… eu não sei o que fazer e isso está realmente me
assustando.
Ouvi uma movimentação e meu coração apertou.
— Com quem você está?
— Sozinha… quer dizer… só estamos nós dois, mas eu estou
sozinha pra cuidar da pessoa. Mamma, por favor… me ajuda.
— Tudo bem. Quanto a pessoa está de febre? — Apertei os
olhos.
— Não tem um termômetro aqui, mas está muito quente.
— A pessoa está suando? — Sua voz era prática, enquanto eu
tentava ver se Matteo transpirava.
— Sim, mas bem frio.
— Isso é bom, quer dizer que o corpo está combatendo a febre.
— Respirei aliviada. — Faz quanto tempo que a pessoa está assim?
— Desde que nós estamos juntos, eu acho que desde umas
quatro da tarde… já foi e voltou, mas ele não conversa comigo, ele
reclamou muito de dor de cabeça.
— Com quem você está?
— Matteo — contei por fim, sabendo que a saúde dele importava
mais que qualquer coisa.
— Ok, você vai fazer o seguinte… quanto tempo faz que você
deu o remédio? Se faz mais de seis horas, pode dar de novo e
esperar fazer efeito, mas para ajudar… pega um pano molhado com
água morna para gelada e coloque na testa e pulso dele…
— Eu acho que faz seis horas… não vou matar ele se não estiver
certo?
— Não, você não vai matar o Matteo.
— Ok.
Corri para a cozinha, abrindo a torneira e pegando uma panela
de dentro do armário. Deixei o celular no viva-voz para conseguir
ouvir as recomendações da minha mãe.
— O que você está fazendo sozinha na casa de Matteo,
Raffaela? — Não respondi, preocupada em encarar Matteo,
enquanto a panela enchia de água.
Fechei a torneira, voltando para o quarto. Andei até o banheiro e
peguei uma toalha, deixando dentro da panela com água e peguei o
remédio em cima da mesa de cabeceira para dar mais algumas
gotas para ele.
— Polpetta… — Matteo segurou minha mão, enquanto eu dava
seu remédio. Senti lágrimas nos meus olhos e afastei o medo de que
ele sofresse mais.
— Sim, eu estou aqui, fica bem, por favor…
— Raffaela, me liga se precisar. Cuide dele. Matteo é importante
para todo mundo aqui.
Não respondi, ao ver que Matteo abriu um olho e me encarou,
ainda segurando minha mão. Peguei o pano e apertei, fazendo com
que água escorresse por meu braço. Coloquei o pano em sua testa e
respirei fundo, fazendo uma prece para todos os deuses que eu
conhecia para que ele ficasse bem e para que minha mãe
conseguisse manter isso em segredo. Eu não queria jogar Matteo
aos leões, mesmo que os leões gostassem mais dele do que de
mim.
— Você consegue me ouvir? — Matteo ainda segurava minha
mão presa a sua, movimentei meus dedos, fazendo carinho nele.
Eu conseguia sentir minha testa franzida e o quanto o medo
vinha cobrando seu preço em meu corpo, mas eu não conseguia
imaginar como ele teria ficado sem alguém aqui.
— Me perdoa mesmo… eu sei que você vai me odiar se eles
acharem que você é meu namorado. Me perdoa, Matteo.
Soltei as nossas mãos, colocando o pano que já estava secando
de novo dentro da panela e deixando ensopado para torcer e colocar
de volta em sua testa. Eu conseguia ver na penumbra do quarto que
seu rosto estava mais relaxado.
Toquei seu peito, testando a febre que parecia baixar agora e
senti alívio pela primeira vez em horas. Agora tudo estava esquecido,
o medo, o desespero, a sensação de fraqueza diante de uma
doença, e o telefonema para minha mãe.
— Você vai ficar bem, angelo.
Não parei de tentar fazer a febre sumir, não parei de me manter
acordada, não parei até ouvir a respiração de Matteo se normalizar e
meus olhos já não aguentarem mais ficarem abertos.
14
Matteo

Senti meu corpo dolorido por causa da noite que eu tinha tido.
Eu conseguia lembrar pequenos pedaços aqui e ali, podia jurar que
alguém tinha ficado cuidando de mim, mas isso só podia ser loucura.
Virei, encostando minhas costas ensopadas no colchão que
também parecia molhado. Algo encostou em meu pescoço e olhei
para o meu lado, com medo de ser uma alucinação.
Raffaela estava encolhida, quase caindo da cama, de frente
para mim, dormindo de boca aberta e em sua mão estava a toalha
que tinha encostado em mim. Encarei seu rosto, percebendo que
não tinha sido uma alucinação, alguém tinha mesmo ficado cuidando
de mim.
Tentei me sentar na cama, sem fazer qualquer movimento
brusco para não acordá-la. Peguei o remédio que estava na mesa de
canto e o olhei, era algo para dor, enfiei um comprimido na boca e
engoli sem água.
Olhei o celular que tinha algumas mensagens não respondidas e
ignorei, apenas querendo saber o horário, que já passava das dez da
manhã de um sábado. Tentei levantar da cama, mas minha cabeça
girou e senti as forças das pernas se esvair e caí sentado.
Raffaela deu um pulo e sentou na cama. Seus olhos pequenos
se abriram ainda com sono e ela me encarou com preocupação. Seu
cabelo estava completamente bagunçado e a roupa amassada do
sono.
— Matteo… — Raffaela encostou a mão em minha testa e por
algum motivo, eu não a parei. — você está melhor?
— Você ficou aqui a noite toda? — questionei, sentindo uma
sensação estranha no meu coração.
— Sim… — Raffaela abaixou a cabeça, e começou a enrolar o
dedo no cabelo e morder os lábios, eram hábitos que ela tinha
quando ficava nervosa. Eu tinha convivido o suficiente com ela para
saber coisas assim. — Você… você começou a passar… você ficou
muito mal e eu não… eu não podia te deixar sozinho.
Raffaela me olhou, seu rosto demonstrando um nervosismo que
ela só deixava que eu visse quando estávamos sozinhos.
— Mas eu vou embora.
Raffaela levantou, arrumando sua roupa. Não conseguia pensar
em nada para dizer. Quando Raffaela estava quase atravessando a
porta do quarto, ela virou a cabeça para dentro do quarto e me
encarou por mais um minuto.
— Raffaela — Fechei os olhos. — fica, por favor.
— Não quero te atrapalhar… tenho certeza que você…
— Por favor, eu preciso te agradecer.
Fiquei de pé, me segurando no encosto da cama. Raffaela,
vendo minha dificuldade, se aproximou de mim. Sua mão tocou
minha barriga e senti um choque elétrico me fazendo sentar na cama
novamente.
— Você me deixou pelado? — perguntei com medo da resposta.
— Não, depois do banho foi o único momento em que você ficou
lúcido.
— Me troquei?
— Sim.
— Eu quero ir para a sala, consegue me ajudar? — Raffaela
confirmou com a cabeça e me encostei em seu corpo.
Sua estatura menor que a minha me dava o apoio necessário
para conseguir andar sem que fosse desconfortável. Raffaela andava
devagar para não me derrubar e eu sabia que meu peso estava todo
jogado sobre ela, mas ainda não tinha forças para nada.
A sala estava arrumada pela primeira vez desde que mudei para
cá, a cozinha também estava organizada. Não tinha lixo algum no
chão e quase tudo brilhava. Raffaela me colocou sentado e foi até a
cozinha, esperei por ela e recebi um copo de água.
— Você que arrumou aqui? — Minha garganta estava seca, não
sabia como ela sabia disso.
— Claro, estava imundo. Desculpa… eu fiquei ansiosa e
precisava fazer algo enquanto você não acordava. — Raffaela se
sentou ao meu lado e eu podia ver aquele fogo que ela tinha
voltando para me atacar.
— Bom, acho que é a primeira vez em muito tempo que eu vejo
esse lugar assim, então, obrigado. Por tudo.
— Não podia deixar o melhor amigo do meu irmão morrer…
Dei uma gargalhada, sentindo uma dor nas costas. Raffaela riu
comigo e seus olhos brilharam. Eu podia ver que ainda tinha alguma
coisa escondida, mas logo eu conseguiria tirar dela.
— Eu estou me sentindo ensopado.
— Você suou muito, e por horas. Eu te dei muita água, mas não
sei se foi o suficiente, então beba todo esse copo de água.
Fiz como ela mandou, engolindo forçado a água que ela tinha
trazido. Raffaela puxou o controle que estava enfiado entre as
almofadas do sofá e ligou a TV em uma série de romance que se
passava em Paris.
— Você quer comer alguma coisa? — Raffaela perguntou.
— Acho que eu que devia estar oferecendo…
— Sim, mas no momento você não serve muito para muita coisa,
por isso, vou ser uma boa pessoa e te ajudar.
— E aí está a Raffaela que eu conheço. — Dei um sorriso e ela
revirou os olhos, passando as mãos pelo cabelo e tentando consertá-
lo. — Não adianta… só uma escova para arrumar a bagunça que
você está.
— Bom, nem sei por onde começar a dizer o que precisa
melhorar em você.
— Vamos focar na comida, Polpetta.
Raffaela me encarou e eu podia ver o brilho que o apelido que
eu dei quando ainda era uma adolescente trazia para seus olhos,
mesmo ela ficando brava.
— O que você quer comer?
— Tem uma padaria ótima aqui perto que entrega, daria tudo por
um cornetto, podíamos pedir sfogliatella…
— Vamos fazer assim, eu peço a comida e você vai tomar um
banho, ok? — Raffaela decidiu. — Consegue ficar em pé?
— Vai me dar um banho, se eu disser que não consigo? — Vi as
bochechas de Raffaela ficarem vermelhas, e senti meu coração se
aquecendo.
— Te coloco lá fora e ligo a mangueira para dar banho.
Levantei, deixando Raffaela brava na sala e saí rindo, porque eu
sabia que ela tinha coragem de fazer exatamente isso. Peguei meu
celular e abri uma das vinte mensagens que Rocco havia me
enviado, o que só podia significar que ele estava desocupado.
“Como assim você está namorando a minha sorella?”
Encarei a mensagem, sem saber o que ele queria dizer com
aquilo. Eu nunca namoraria Raffaela. Continuei lendo as mensagens
e todas tinham o mesmo cunho. Voltei para a sala, e encarei Raffaela
que estava com o telefone na mão, a testa franzida enquanto comia
o canto da unha.
Fiquei em silêncio olhando para ela. Raffaela fez um ruído e
olhou para a porta do quarto, me encontrando parado ali.
— Que história é essa de que estamos namorando?
15
Raffaela

Eu sabia que logo a merda estaria no ventilador, mas não achei


que fosse tão rápido. Matteo me encarava com a sobrancelha
franzida, o braço encostado no batente da porta, enquanto, com
certeza, buscava apoio. Tentei ignorar seu peito descoberto, mas ele
estava bem na minha frente, não dava pra desviar os olhos da sua
pele marcada pelas tatuagens.
Matteo ainda esperava por uma resposta e eu tinha certeza de
que eu havia ensaiado uma enquanto ele conversava como uma
pessoa normal comigo. Agora, eu tinha certeza de que tudo estava
perdido, até mesmo a explicação. Tinha algo a ver com meus pais e
eu não ter culpa naquilo, o que era uma grande mentira, porque fui
eu que disse que estava namorando.
Porém, agora tudo que eu conseguia pensar era que Matteo ia
me odiar. Mesmo que a gente não se desse bem, eu sabia que ele
não me odiava. Ninguém saía de casa correndo perto da madrugada
para tirar outra pessoa da cadeia se a odiasse.
— Raffaela?
Fechei os olhos, tentando pensar no que dizer.
— Eu bati seu carro.
Encarei Matteo que agora estava com a boca aberta, seus olhos
iam de mim para a janela da sala de onde dava para ver o carro. Eu
devia ter esperado outro momento, mas se ele ia me odiar, que
odiasse por inteiro.
— Como…? Não! Você não vai desviar a atenção de uma coisa
para a outra e agora eu quero saber porque o seu irmão me mandou
diversas mensagens e todas elas eram sobre como eu devia te tratar
bem e desde quando eu te namoro.
— Eu juro que nunca imaginei que isso fosse acontecer… —
Levantei do sofá, tentando andar para longe dele.
— O quê? O meu pedido super romântico? Me conte, Raffaela,
como eu te pedi em namoro? Foi no dia que te tirei da cadeia e te
trouxe para casa? Ou foi antes? Nos conhecemos há muito tempo,
eu posso ter feito milhares de declarações, não é mesmo? Entre uma
garota ou outra que eu saí posso ter encontrado em você, o grande
amor da minha vida, e nunca ter percebido até te ver ensopada
dentro de uma cela.
Dei mais um passo para trás, e Matteo agora parecia curado o
suficiente para me matar. Ele era um advogado, isso dava algum tipo
de anistia? Porque eu precisava saber se minha vida corria sério
perigo agora mesmo.
— Raffaela, me explique agora!
Resolvi encarar a merda que eu tinha feito. Eu podia sentir sua
raiva emanando. Matteo sempre deixou claro para Rocco como um
relacionamento era a última coisa que ele sempre quis e, agora, eu
estava forçando com que ele entrasse em uma história assim.
Fechei os olhos e respirei fundo, enrolando o dedo no meu
cabelo. Ouvi os passos de Matteo e quando abri os olhos, ele estava
de frente para mim. Levantei a cabeça para encará-lo e quase sofri
um baque, porque de perto ele era sempre mais bonito.
— Raffaela, agora! — O olho esquerdo de Matteo tremia.
— Matteo, eu juro que eu não ia te colocar nisso sem te perguntar
antes. Eu… a gente pode sentar?
— Não.
— Ok… eu fui até seu escritório ontem… eu queria saber se você
podia fingir ser meu namorado, seria só por algum tempo e eu sabia
que podia perguntar pra você, porque… eu nem sei bem porque
decidi perguntar pra você, eu devia ter ido atrás de qualquer pessoa,
mas se eu tivesse decidido ir atrás de outra pessoa, você
provavelmente teria passado essa noite sozinho e eu nem sei como
seria.
— Raffaela!
Matteo passou a mão por seu cabelo e me encarou, tampando
sua boca com a mãe. Eu sabia que estava divagando, mas ele podia
me culpar? Ele estava quase roubando o ar dos meus pulmões para
poder respirar.
— Meu papà queria me apresentar uma pessoa, e eu não sei se
você sabe, mas eu evito relacionamentos tanto quanto você. Eu sei
que não sou a pessoa dos sonhos de muitas pessoas. — Me afastei
de Matteo sem conseguir olhar nos seus olhos enquanto falava sobre
como minha vida era uma merda. — Acontece que papà apareceu
com esse cara no escritório e eu não tive outra escolha a não ser
dizer que eu namorava, eu ia falar com Lorenzo e pedir para ele
fingir por um tempo, mas…
Matteo se sentou e esperou que eu continuasse.
— Eu não podia fazer com que ele perdesse o emprego, porque
meu fratello é superprotetor e acharia que Lorenzo teria feito algo
para me machucar, você é a única pessoa que ele coloca acima de
mim e… eu sei que ele não terminaria a amizade, além disso… eu
não poderia pedir para qualquer pessoa.
Estralei os dedos, sentindo meu coração palpitar de nervoso.
Matteo encarava as mãos e não me olhava. Eu tinha terminado meu
monólogo e esperava que ele falasse algo, mas tudo que ele fez foi
olhar para suas próprias mãos.
— Como… como nós fomos de você pensar em falar comigo para
Rocco me mandando mensagens?
Claro. Minha mãe. A calma de Matteo em falar do assunto me
deixava mais nervosa do que qualquer coisa.
— Quando… quando você estava passando mal de madrugada,
eu não sabia o que mais fazer e então pedi ajuda para mamma, ela
me ajudou, mas eu precisei dizer que estava com você e ela deve ter
contato para todo mundo, porque claramente meu papà contou que
eu estava namorando e agora todos acham que é você.
Matteo ficou em silêncio e juntou as mãos em frente a boca. Eu
podia ouvir uma agulha caindo no chão.
— E eu bati seu carro no caminho pra cá porque você desmaiou
enquanto falava comigo e eu achei que você tinha morrido, bati em
uma moto na rua e eu juro que ainda consigo ouvir os gritos do dono
da moto.
Terminando as confissões fiquei quieta esperando por uma
palavra. Tecnicamente a batida não era minha culpa, afinal, ninguém
liga para um carro quando a vida de alguém estava em perigo. E ele
não teria vida para aproveitar o carro se estivesse morto.
Olhei de canto de olhos para Matteo, mas ele encarava a TV
que ainda passava a série que eu tinha ligado. Fiquei esperando por
qualquer sinal de consciência e comecei a duvidar que ele estivesse
até mesmo acordado, mas eu sabia que sim, porque Matteo não
parava de bater o pé no chão em um ritmo que me deixava cada vez
mais nervosa.
É, ele ia me odiar para sempre.
16
Matteo

Essa era a coisa mais ridícula que eu já tinha ouvido. Como


Raffaela ia inventar uma mentira para os pais? E pior, por que ela
sentia que precisava fazer aquilo? A família de Raffaela era uma das
melhores que eu conhecia e eu conhecia muitas. Tinha muito amor
envolvido, muito apoio, muita amizade e isso não era algo que eu
encontrava no meu dia a dia.
Encarei Raffaela de canto de olho e ela continuava mordendo o
canto dos dedos. Eu não estava melhor, meu corpo ainda estava
estranho e agora eu sentia vontade de vomitar. Continuei o ritmo dos
meus pés batendo no chão, sentindo todas as implicações do que
Raffaela tinha dito.
— Você tem que desfazer essa mentira hoje mesmo — afirmei,
esperando que Raffaela fizesse exatamente isso quando saísse
daqui.
Raffaela sentou ao meu lado no sofá, as mãos caídas ao lado do
corpo. Esfreguei as têmporas, aquilo tudo era ridículo, apenas em
filmes e livros as pessoas inventavam romances falsos.
— Tudo bem. — Raffaela olhou para a porta, como se quisesse
fugir. — Eu vou explicar tudo, pode ficar tranquilo. Quer dizer,
ninguém vai ter dúvidas que você não está envolvido nisso.
— Raffaela, não é dizer que eu não estou envolvido. É acabar
com essa mentira de namoro, o que você vai fazer? Sair daqui e
encontrar outra pessoa? Vai pedir para aquele Lorenzo ser o seu
namorado falso? Isso não existe.
Virei para ela. Podia ver sua mente se mexendo para criar outra
realidade para aquela mentira. Mas eu não deixaria, uma coisa pela
qual eu sempre prezava era a verdade.
— Você não entende.
— O que eu não entendo, Raffaela? É só chegar para os seus
pais e ser sincera. Conte que você mentiu, que você não quer um
namorado agora, que você está focada na sua carreira.
Raffaela virou para mim, com algo nos olhos que eu nunca tinha
visto.
— É tão fácil pra você. “Eu sou solteiro convicto, eu tenho
liberdade, eu sei da minha vida e vivo como quero.” Não é assim pra
mim, eu não tenho esse privilégio.
Raffaela tremia com uma raiva que até para mim era
desconhecida. Como se quem estivesse errado fosse eu e não a
mentira que ela inventou e cimentou quando disse que estava
comigo, prendendo a nós dois em um abismo de mentiras.
— Então seja livre. Faça suas escolhas, saia da casa dos seus
pais, alugue um apartamento, descubra a sua vida e deixe a
proteção das asas dos seus pais.
— Eu estou tentando. — Raffaela deixou uma lágrima escorrer. —
Tudo que eu tenho feito é tentar. Eu já tenho mais da metade do
dinheiro para comprar a minha casa, eu juntei cada moeda para
conseguir isso. Mas sair de lá não significa que eu vou conseguir
viver a vida do jeito que eu sempre quis. Eu só vou estar em um
lugar novo, sozinha e precisando mentir que eu estou em
relacionamento.
Raffaela cutucou o canto da unha de novo e virou o rosto para
longe de mim. Como se não quisesse me deixar vê-la mal. Fiquei
tentado a dar a mão para ela, para que ela parasse com a mutilação
dos seus dedos.
— Eu entendo se você não quiser fazer parte disso e vou limpar
seu nome com todos, prometo. Mas não me peça para acabar com
essa história, só eu sei como é para mim viver isso e eu sei que você
não entende, Atena não entende, Rocco não entende.
Levantei do sofá, sentindo as pernas fracas e a visão
embaçando. Aquela conversa era absurda demais para mim. Eu
conhecia a família de Raffaela. Tudo aquilo era estranho.
— Raffaela… eu só acho que você não precisa disso.
— Eu preciso, Matteo. Sei que é difícil entender, mas quando
você passa a vida toda sendo a segunda melhor… você entende que
você faria qualquer coisa para se proteger. Prometo que vou
desmentir nosso namoro.
Raffaela colocou o sapato e agarrou a bolsa. Ela foi em direção
a porta e me encarou.
— Foi bom namorar com você por um dia inteiro. Você foi o
melhor namorado que eu tive.
Fiquei assistindo Raffaela sair pela porta de casa sem poder
dizer mais nada. Senti um buraco no fundo do estômago e fiquei
encarando a porta fechada. Eu não entendia o que ela quis dizer
com ser a segunda melhor.
Não conseguia aceitar que ela ia apenas mentir para os pais,
que encontraria alguém para ser um namorado falso porque eu não
seria. Quem ela deixaria ficar tão próximo dela para fingir um
namoro?
Namorados se beijam. Ela ia beijar uma pessoa que não
gostava? Você está sendo hipócrita, Matteo. Se Raffaela quisesse
beijar alguém, ela podia ao menos sentir algo pela pessoa, mesmo
que fosse amizade. E isso leva ao Lorenzo. Aquele amigo dela com
certeza tem segundas, terceiras intenções com Raffaela e só ela não
vê isso.
Sentei no sofá e comecei a prestar atenção na maldita série.
Ouvi a porta ser aberta e Raffaela entrou.
— Tudo bem se eu esperar aqui? Eu não sei onde pegar um
ônibus e o táxi está muito caro… Atena está vindo me buscar.
Levantei e esperei que ela sentasse. Raffaela sentou e ficou em
silêncio.
Fui em direção ao quarto, mas parei na porta.
— Sinto muito, Polpetta. Obrigado por ter me mantido vivo —
falei, virando para a sala. —, mas eu não posso mentir.
Raffaela não respondeu. E eu não a encontrei quando saí do
banho. Me sentindo uma pessoa real depois da noite e manhã que
tive. Encarei o quarto bagunçado, e pensei em arrumar para
combinar com o restante da casa.
Um brilho prata chamou minha atenção quando puxei a coberta.
Um colar com um pingente minúsculo em uma pedra rosa estava
perto do travesseiro que Raffaela dormiu, o peguei na mão, sentindo
a textura do colar.
— No que você foi se meter, polpetta?
Não tinha respostas para aquilo. Eu sabia que Raffaela faria a
coisa certa no final e confessaria para seus pais que tinha mentido.
Ela era uma mulher, o que fariam? A colocariam de castigo? E o que
era aquilo de ser a segunda melhor? Deitei na cama, ainda
segurando o colar em minhas mãos.
Eu precisava descansar. Isso que eu precisava fazer. Ainda não
estava bem. Depois saberia de Raffaela por Rocco.
17
Raffaela

Passei a mão por meu cabelo e mordi o canto dos dedos.


Respirando fundo para dentro e para fora como Rocco tinha me
ensinado a fazer quando eu ainda era uma criança nervosa com
alguma conversa que teria com meus pais.
Desde que saí da casa de Matteo, eu vinha me escondendo no
quarto. As palavras dele não paravam de martelar em minha cabeça.
E mesmo que eu soubesse que devia falar a verdade para meus
pais, eu não conseguia pensar em como fazer isso.
Por isso, aqui estava eu, mais uma vez, descontando minha
frustração em uma arte que nunca veria a luz do dia e que iria para o
mesmo lugar que todas as outras: a casa de Nicoletta.
Tinha algo nesse quadro que parecia diferente dos outros. Uma
falta de verdade, de sentimentos reais, de mim. Eu sentia falta de
mim. E era complicado pensar sobre isso, porque eu sempre parecia
incompleta.
Ouvi uma batida na porta e corri para guardar meus materiais,
mas não fui rápida o bastante para esconder antes que Nicoletta
estivesse toda dentro da sala. Coloquei a mão sobre o peito,
sentindo o meu coração batendo forte de encontro a caixa torácica.
— Você quase me matou! — falei, encostando na cadeira e
soltando todo meu corpo.
— Desculpa, você sabe que se for outra pessoa eu aviso de outro
jeito… você só pediu para eu avisar caso Lorenzo chegasse. E ele
chegou.
Me arrumei na cadeira. Sentindo nervosa pela primeira vez em
dias. Tudo bem, isso era uma outra mentira, uma mentira das
grandes. Eu só vinha me sentindo nervosa.
— Raffaela, isso tem algo a ver com estar namorando Matteo? —
Bati o rosto na mesa e grunhi. — Ele não quer que você seja amiga
do Lorenzo? Porque se for, isso é idiotice, só um cara inseguro faria
algo assim.
— Nicoletta… — gemi, ainda com o rosto na mesa.
— E se tem algo que eu acho que aquele belo rapaz, não é, é
inseguro. Quer dizer, ele é muito bonito. E eu não digo isso para
muitas pessoas, além do meu marido.
— Eu não estou namorando o Matteo, foi um erro e eu preciso
corrigir — Achei melhor dizer, afinal, sentia que Nicoletta ia continuar
falando. — E eu só preciso falar com Lorenzo, é sobre um dos casais
que ele vai cuidar agora que eu vou precisar tirar férias.
— Você vai mesmo fazer isso?
Nicoletta sabia que eu sempre dizia que ia tirar, mas acontecia
algo e eu ficava presa aqui. Mas, dessa vez, seria verdade, segui um
dos conselhos de Matteo e entrei em contato com a mãe da minha
amiga e apresentei uma proposta. Eu ia me mudar para a minha
casa. E eu não podia estar mais feliz.
Eu vinha tentando esconder aquilo de todos. Seria ótimo lançar
aquela bomba em um jantar em família.
— Sim, eu preciso. Chegou a hora.
— Fico feliz, você trabalha demais aqui.
Levantei, pegando uma caderneta, apenas para fingir que ia
falar mesmo sobre trabalho com Lorenzo. Nicoletta levantou e me
acompanhou para fora da sala. Rocco estava entrando com Ceci ao
seu lado.
— Ceci! — gritei animada. A pequena criança veio correndo e se
jogou sobre mim.
Demos um abraço apertado e virei para Rocco que sorria para
mim. Ceci passou a mão por meu cabelo que hoje estava preso em
um rabo de cavalo alto e apertou minhas bochechas como ela
gostava de fazer.
— Zia, posso pintar com você? — perguntou em meu ouvido.
— Depois vá para minha sala — cochichei de volta. —, Nicoletta,
reserve o dia para Ceci. Você sabe que não posso deixar minha
melhor amiga.
— Anotado.
— Vem, caramella. Sua zia já te pega na sala. Raffa, depois você
pode conversar comigo, por um segundo?
Concordei com a cabeça, deixando Ceci no chão. Andei em
direção a sala de Lorenzo e eu sabia que ia encontrá-lo mexendo em
suas canetas como ele fazia todos os dias. Entrei sem ser anunciada
e fechei a porta para que ninguém ouvisse.
Eu sabia bem como as fofocas corriam nesse lugar, já que eu
era sempre a responsável por todas. Lorenzo levantou os olhos e
sorriu para mim.
— Aconteceu algo?
— Só o de sempre.
Sentei em uma das cadeiras e fechei os olhos, jogando a
cabeça para trás. Respirei fundo de novo, contando até três e me
endireitei.
— Lorenzo, eu preciso que você seja meu namorado.
— O quê? — Lorenzo virou para mim, soltando todas as canetas
sobre a mesa e abrindo a boca.
— Não de verdade, mas… eu disse ao meu pai que eu estava
namorando e agora… agora eles acham que eu namoro o Matteo,
mas ele não aceitou fingir por mim, então… eu preciso de alguém e
precisa ser você.
Me levantei e esperei que ele disse alguma coisa. Eu sei que era
difícil e ele poderia muito bem não aceitar e, então, eu teria que
entrar em um site de relacionamento e realmente tentar.
— Raffaela, você tem sido uma grande amiga desde que entrei
aqui e eu sinto muito mesmo, mas eu não posso fazer isso. Não
consigo mentir para nada e por ninguém. Eu só não consigo mentir.
— Aquilo fez com que meu estômago caísse nos meus pés, se
Lorenzo não aceitasse, eu teria que colocar o pedido nos jornais ou
na internet.
— Nem se eu prometer vinte por cento do meu salário?
Lorenzo balançou a cabeça com um não.
— Sinto muito, Raffa, mas eu realmente não posso fazer isso,
não é da minha índole. Eu poderia muito bem aceitar e fingir, mas eu
me sentiria mal, tão mal ao ponto de vomitar sempre que visse seus
pais e aí ninguém acreditaria em nada.
— Não… tudo bem, quer dizer… eu realmente entendo… além
disso, não posso te expor às fofocas desse lugar. Desculpa.
Eu ia saindo da sala quando Lorenzo voltou a falar:
— Quer conversar?
— É só que… lembra que eu disse que meus pais colocam
expectativas demais que eu nunca consegui cumprir? Essa é uma
delas.
— Sinto muito, Raffa.
— Eu também.
Saí da sala e voltei para o corredor, fechando a porta para ficar
sozinha. Se alguém não tinha um dia de sorte, esse alguém era eu.
Andei em direção à recepção e dei de cara com Matteo. Seus
olhos brilhavam com algo que eu não sabia o que era, mas ele
estava bravo. Por isso dei alguns passos para trás, mas não fui
rápida o suficiente.
Matteo me agarrou pela cintura, puxando meu corpo de encontro
ao seu. Toda sua estrutura me fez perder o equilíbrio e eu tive que
agarrar sua camisa social. Matteo não me deu tempo de resposta e
grudou nossas bocas em um beijo que para qualquer um parecia
apaixonado, mas eu podia ver a verdade. Ele estava puto.
Mas, quem era eu pra não aproveitar?
18
Matteo

Era pra ser um beijo punitivo. Eu não aguentava mais receber


mensagens de Rocco, de seu pai ou sua mãe me perguntando
coisas sobre o namoro. Mas tudo foi por água abaixo quando recebi
uma mensagem de Rocco perguntando o que eu tinha feito para
Raffaela, já que ela estava trancada no quarto há dois dias.
Quando entrei na empresa e ouvi que ela estava com Lorenzo,
eu andei em direção àquela sala como se tivesse que lutar contra um
exército. Era um namorado que Raffaela queria? Era um que ela
teria.
Tudo começou com um selinho. Era pra ser só isso e eu sabia
que ela sabia que seria só isso, mas aquela mulher. Raffaela passou
os braços por minha cintura, quando eu puxei seu corpo de encontro
ao meu. E gemeu.
Sua boca era macia e parecia ter sido feita para mim. Não era
isso que eu deveria estar pensando, mas o pensamento não parava
de rodar em minha cabeça. Raffaela abriu a boca um pouco, me
dando liberdade para aprofundar o beijo. Segurei seu rosto com uma
mão, enquanto a outra explorava seu corpo.
Senti meu pau ficar duro de encontro ao corpo de Raffaela.
Tentei me afastar para que ela não percebesse, mas Raffaela me
puxou de volta para ela, mordendo meu lábio e enviando choques
elétricos por todo meu corpo. Passei a mão por sua cintura, sentindo
seu corpo com meus dedos.
— Raffaela!
Meu corpo todo entrou em alerta ao ouvir o som da voz de
Rocco gritando o nome de Raffaela e me afastei, tentando me
esconder atrás de seu corpo para impedir que Rocco e a pobre
criança em seu colo com os olhos cobertos pelas mãos do pai
vissem meu pau duro dentro da calça cara de alfaiataria.
— Rocco…
— O que você está pensando?
— Eu estou… — Raffaela travou e olhou para trás, para mim,
procurando uma resposta.
Não dei nenhuma, afinal, ela era uma mulher adulta que podia
muito bem lidar com as próprias escolhas. Ela queria um namorado
falso, aqui estava eu. Ela não precisaria de mais ninguém.
— No meio da recepção?
— Papà!
Rocco puxou a mão da frente do rosto da filha e me encarou.
— Que bom que você tomou coragem de arrumar as coisas.
Sempre soube que vocês terminariam juntos.
— Zio Matteo! — Ceci levantou os braços animada e desceu do
colo do pai e correu em minha direção.
— Ceci, amore mio, como você está? Me deixa ver se está com
todos os dentes intactos.
Peguei a criança no colo e a abracei. Por sorte, enquanto os
dois conversavam, meu pau pôde voltar ao normal. Raffaela me
encarava com uma grande interrogação em seu rosto, mas ela tinha
que me dar respostas e não o contrário.
— Claro, zio. — Ceci revirou os olhos como se eu fosse bobo.
Raffaela fez um carinho na cabeça da sobrinha e virou para mim
de novo. Coloquei Anna Cecília no chão e ela correu de volta para o
pai. Rocco tinha um grande sorriso no rosto que eu não sabia se era
para a filha ou pela mensagem boba de que sempre imaginou nós
dois juntos.
— Matteo, posso conversar com você? — Raffaela pediu dando
um sorriso doce.
— Claro, stella.
Notei Raffaela parando no meio do caminho para seu escritório,
mas não disse nada. Ceci parecia querer correr para dentro junto
com a tia, mas se segurou, dando a mão ao pai. Mandei um beijo
para a criança e ela me retribuiu com um grande sorriso.
Entrei na sala de Raffaela e notei que ela estava virada para a
porta. Seus olhos estavam travados na maçaneta, como se pudesse
fugir. Agora não teria mais escapatória.
— O que foi isso? — questionou, mordendo o canto da unha,
assim que eu fechei a porta.
— Isso? Depende… eu queria saber como você pode ficar dois
dias em casa e não ter tido a coragem de contar aos seus pais que
eu não era seu namorado. Mas é claro que eu não vou saber a
resposta para isso, porque você não consegue me dar uma clara.
Então, aqui está… seu próprio namorado falso.
— E precisava me beijar? — quase gritou, sua face estava
corada ainda, mas tentei não prestar atenção nisso.
Raffaela jogou o sapato para longe e pisou descalça no tapete
felpudo.
— Eu estava buscando outra pessoa. Eu logo contaria, você não
ia ficar envolvido nisso, mas agora tudo que eu sei é que minha
família agora vai ter certeza que estamos envolvidos. Você me beijou
na frente do Rocco.
Andei até ela, sentindo meu sangue ferver por citar que outra
pessoa poderia ser seu namorado falso. Ninguém tocaria em
Raffaela, nem mesmo aquele amigo idiota.
— Se você quer um namorado falso e não tem coragem de
chegar em sua família e contar a verdade… eu vou ser seu
namorado falso, mas saiba que eu vou ser o pior namorado falso que
você já teve, polpetta. O mais grudento, o mais insuportável, apenas
para que você saiba que foi você que me colocou nesse tormento.
— Eu não fiz por querer… — Sua voz tremeu e eu ri.
— Pode não ter feito, Raffaela, mas eu estou inspirado, tenho
diversos nomes para te chamar, diversas coisas que eu sempre quis
fazer… — Raffaela deu um longo suspiro e eu toquei o decote em
seu peito, afastando o tecido de sua pele branca e fazendo Raffaela
tremer. — vai ser uma delícia fingir ser seu namorado, polpetta.
Eu podia imaginar como eu ia encher aqueles peitos grandes e
cheios com meu gozo. Seu rosto ao sentir o prazer de uma bela
espanhola bem feita, enquanto eu metia meu pau até gozar sobre
ela.
— Para mim… — falei, tentando impedir que meu caralho
crescesse de novo. — para você serão os próximos piores meses da
sua vida. Porque é só isso que vai durar. Três meses.
Me afastei antes que pulasse em Raffaela. Seu rosto queimava
agora, e eu podia ver o bico do seu peito apontando sobre o fino
tecido do vestido que usava. Olhei para suas pernas e sorri.
— Ficou sem palavras, Raffaela? Acho que foi a primeira vez.
— Eu não quero mais.
— Não quer que eu seja seu namorado? Sinto muito, não tem
mais como desistir.
19
Raffaela

Isso era um sonho. Só podia ser. Eu ainda estava na minha


cama, logo eu seria acordada pelo despertador e teria que viver um
dia normal. Agora eu realmente tinha um namorado falso. E o meu
namorado falso era Matteo. E ele tinha me beijado.
Eu ainda podia sentir os arrepios por meu corpo. Matteo tinha
me tocado como se eu pertencesse a ele, e eu não sabia o que teria
acontecido se Rocco não tivesse aparecido.
Matteo ainda me encarava do outro lado da sala depois de ter
dito que não tinha mais escolhas, que agora ele seria meu namorado
falso. Eu já tinha um plano definido. Não tinha. Eu ia convencer outra
pessoa, eu tinha muitos amigos. Nenhum aceitaria. Logo minha
família esqueceria disso. Não esqueceria. Matteo era um furacão que
eu não sabia se queria lidar de verdade.
Nós tínhamos coisas para discutir, ele não podia invadir minha
empresa e me beijar onde qualquer um poderia ver. E enquanto eu
tinha um monólogo interno e pensava em tudo isso, Matteo me
encarava com um sorriso no rosto.
Observei cada pedaço do seu rosto, sua pele negra, os olhos
verdes, o sorriso largo que era de um grande canalha. Desci os olhos
por seu corpo e parei na altura da cintura, onde eu tinha sentido algo
duro de encontro ao meu corpo. Nunca comentaria sobre isso, bom,
talvez apenas com Atena. Ela precisava saber sobre como eu tinha
deixado Matteo de pau duro.
— Você não pode ver ninguém nesses três meses — declarei.
— Não estava pensando nisso, Raffaela… mesmo que seja um
namoro de fachada para seus pais, eu sei como as pessoas são.
Tudo bem, eu não esperei que ele estivesse tão disposto a isso.
— Você tem algum pedido? Alguma condição?
— Espero o mesmo de você.
Gargalhei e o encarei. Seu rosto estava fechado e o sorriso tinha
sumido. Matteo cruzou os braços e franziu a sobrancelha.
— Você está falando sério? Desculpa, achei que era uma piada.
Eu… pode ficar tranquilo, vou tentar parar a fila gigante que tem
atrás de mim — concordei, tentando manter o rosto sério.
— Raffaela, eu estou falando sério, não seja uma vaca sobre
isso.
Meu sorriso sumiu e eu o encarei.
— Não me chame de vaca, Matteo. Você pode estar me
ajudando, mas eu ainda posso te matar enquanto dorme.
A porta foi aberta e Rocco entrou, segurando os olhos de Ceci
como se estivéssemos fazendo algo dentro do meu escritório. A
coitada da minha sobrinha batia com os braços pelo espaço vazio à
sua frente. Ri da cena.
— Desculpa, eu não conseguia mais segurar ela.
Matteo andou para perto de mim e sorriu. Seus braços
passaram por minha cintura e algo dentro de mim caiu fundo em meu
estômago. Respirei fundo, sentindo minha pele arrepiar.
— Tudo bem, eu já terminei de falar com a minha lasagna.
Virei olhando Matteo e seu rosto nunca falhou em mostrar outra
coisa que a adoração falsa que ele tinha plantado ali, mas eu tive
que esconder meu rosto para não rir. Polpetta? Tudo bem, afinal, ele
me chamava assim desde que nos conhecemos, agora lasagna?
— Vocês ficam muito bonitos assim, posso tirar uma foto pra
enviar pra Atena? Ela estava desacreditando disso tudo.
— Claro que não! — falei ao mesmo tempo que Matteo, que dizia:
— Claro que sim! Não faça assim, polpetta. Sua melhor amiga
merece saber como nós dois nos amamos.
— Que imagem! — Rocco puxou o celular e bateu uma foto de
nós dois.
— Zia, agora você namora o zio Matteo de verdade?
— Sim, mas venha aqui, vou pegar alguns papéis para você
desenhar.
Ceci soltou a mão do pai e correu de encontro para mim,
segurando a minha mão. Ela fez como eu fazia sempre e tirou os
sapatos, soltando em qualquer lugar da sala.
— Mas eu queria pintar na tela — Tampei a boca de Ceci e olhei
para trás, enquanto Matteo e Rocco me encaravam.
— E vocês dois podem sair daí, muito obrigada pela visita.
Fechem a porta. Matteo, depois te envio uma mensagem — Respirei
fundo, antes de falar. —, amore. Vamos combinar aquele jantar.
— Não posso sair daqui sem outro beijo, não é? — Matteo se
aproximou com os braços abertos, com sangue nos olhos.
— Dio, não aguento mais tapar os olhos da minha figlia.
Matteo se aproximou de mim e tocou minha cabeça, afastando
minha longa franja do meu rosto. Parei de respirar, com a
antecipação de sua boca tocando a minha de novo. Mas Matteo não
fez isso. Seus lábios tocaram minha testa e depois meu ouvido.
— Nós ainda temos regras para estabelecer. Espero que você
entre em contato logo.
Os dois saíram juntos e virei para Ceci que estava sentada na
minha cadeira.
— Marmocchia, você não pode ficar falando das minhas telas pra
qualquer pessoa!
— Mas, eu só falei pro zio Matteo e pro papà…
Rocco não tinha problema, mas Matteo não sabia que eu ainda
pintava. Quando eu era mais nova, eu sempre estava com um
caderno em mãos, desenhando tudo que eu via.
Eu inclusive lembrava bem do dia que desenhei o rosto de
Matteo como eu o via, e ele era lindo. Tinha riscado um rascunho
depois de vê-lo olhando para o sol. Quando eu entreguei, Matteo fez
alguma piada sobre eu ser muito apaixonada por ele. Depois disso,
eu nunca mais mostrei nada. Eu tinha ainda um caderno guardado
com todos os desenhos que eu tinha feito das pessoas que eu
amava. Mamma, papà, Rocco, Atena, Nonna, Nicoletta e Matteo.
— Desculpa, zia… — Ceci tocou meu rosto e eu sorri para ela,
fazendo cócegas em sua barriga. Eu odiava quando ela ficava com
aquele arzinho de tristeza.
— O que você quer pintar hoje? — questionei.
— Você!
— Espero que me faça muito bonita.
— Sempre, zia.
Penteei o cabelo da Anna Cecília e puxei uma tela pequena que
eu deixava para que ela pudesse me acompanhar. Fui até a porta
trancando para que nós duas pudéssemos sentar no chão e
desenhar. Coloquei as telas no chão e fui pegar os materiais de
pintura.
— Você vai ser uma artista? — perguntei, enquanto ela passava
o dedo pelo traço que eu já tinha feito em minha tela.
— Não, eu vou ser professora — respondeu com os olhos ainda
na tela. — Vou ser a mais legal, que nem a minha.
Sentei ao seu lado e toquei seu nariz.
— Você vai ser a melhor professora do mundo.
Ceci sorriu para mim. Eu tinha prometido que nunca faria com
ninguém o que meus pais tinham feito comigo, podar meus sonhos,
então Ceci seria o que quisesse ser. E eu a apoiaria em tudo, pois é
pra isso que as tias servem.
20
Matteo

— Nunca imaginei que isso fosse realmente acontecer.


— O quê? — questionei, entrando na sala de Rocco, que era
menos caótica que a de Raffaela.
Me aproximei das cadeiras dispostas para os noivos que vinham
escolher frufrus e me joguei sobre uma, estendendo o pé sobre a
outra. Rocco revirou os olhos e sentou no seu lugar de sempre,
pegando alguns papéis e começando a trabalhar.
— Você! Tirar o pau da sua bunda e finalmente tomar coragem de
fazer algo com Raffaela, quer dizer…
— Ela não podia ter vindo até mim? — perguntei, pegando seu
molho de chave e jogando para cima.
— Não, — Rocco coçou a cabeça e me encarou. — ela sempre
gostou de você, mas não faria nada.
Era a segunda vez que Rocco repetia isso, não achava certo
que ele ficasse fantasiando sobre os sentimentos de Raffaela por
mim. Quando nos conhecemos, ela era uma adolescente
deslumbrada pelo novo amigo do irmão. Nada demais. E agora ficar
falando que ela gostava de mim como adulta? Era terrível que ele
fizesse isso.
— Aliás, como foi o pedido de namoro?
Essa era a minha chance, não era? Aquela de dizer a ele como
aquilo tudo era uma farsa para enganar os pais deles. Que na
realidade não tinha nada entre nós dois. Rocco era meu melhor
amigo e podia saber sobre isso, eu tinha certeza que logo Atena
saberia. Por isso, me assustei quando falei.
— Eu pedi em casa. Depois que tirei Raffa da cadeia nós
começamos a nos aproximar. Ela sempre me ligava e perguntava de
mim, comecei a perceber meus sentimentos e os dela, por isso, a
chamei para comer em casa, acabamos nos beijando e…
— Não preciso saber essa parte — reclamou baixo.
— Depois de alguns dias pedi a Raffaela em namoro e ela
aceitou, boazinha do jeito que é.
— Se tem uma coisa que Raffaela não é, é boazinha. Quer dizer,
eu cresci com aquele diabinho em forma de criança e você a
conheceu durante a adolescência.
Afastei os olhos de Rocco e comecei a reparar no tempo de
chuva que se formava do lado de fora.
— Ela sempre teve personalidade forte. — Fiquei quieto,
pensando se devia me meter no relacionamento de Raffaela e seus
pais, mas não consegui vencer a curiosidade. — Seus pais… como
estão?
— O mesmo de sempre, quer dizer… mais ligados com Ceci do
que nunca, tenho que implorar que mamma deixe Ceci ir embora,
meu papà agora sossegou com essa história de namoro.
— Como assim?
— Ele queria arrumar um namorado para Raffa, ela deve ter te
contado sobre o último cara que ele trouxe aqui. Atena disse que ele
foi um babaca, sabe como é… homens! — falou, como se nenhum
de nós fosse um. — Raffa respondeu a altura e disse que estava
namorando, só não achei que era você.
— O que esse cara falou?
— Algo sobre Raffa ser gorda, como se ela não soubesse, mas a
diminuiu por isso e ela respondeu que ele devia ter pau pequeno. —
Rocco riu e passou para a próxima página do documento. — Você
sabe como ela é…
Respirei fundo, sentindo, talvez pela primeira vez, raiva de
Rocco.
— E o que você fez? — Rocco franziu a sobrancelha, levantando
os olhos do documento e me encarando.
— Nada… Raffaela sabe lutar as batalhas dela sozinha, nunca
precisou de ninguém e não me olhe assim, como se eu fosse um
bosta. Minha sorella confia em mim, ela sabe que pode me chamar e
eu resolvo o que ela precisar, mas ela nunca fez isso.
Me endireitei na cadeira. Se confiasse tanto assim, ele saberia
que esse era um namoro falso. Raffaela teria contado, mas ela
preferiu manter em segredo até mesmo dele, seu confidente.
— Claro, como é o nome do cara?
Rocco riu.
— Michele, se quer bater nele vai precisar de mais, não é? Mas
sinto muito, não sei…
— Como você deixou o cara sair daqui sabendo que ele falou
algo para sua sorella?
— Já falei, ela luta suas próprias batalhas… e eu só fiquei
sabendo quando Atena me contou mais tarde.
— É lutando as próprias batalhas que as pessoas acabam se
fechando para todos, pense sobre isso.
Rocco me encarou, as sobrancelhas franzidas.
— Você não pode vir aqui e estar em um relacionamento com
minha sorella e achar que tem o direito de colocar em cheque o
nosso relacionamento. Eu conheço Raffaela desde que ela nasceu.
Eu sei que quando ela precisar de ajuda com algo sério, ela não vai
hesitar em me chamar. E você, Matteo, não vai machucar minha
sorella?
— Não posso prometer isso, mas posso prometer que vou fazer o
possível para ouvi-la quando precisar e ser mais presente do que
você.
— Matteo, você está sendo um grande babaca.
Levantei, jogando o molho de chave na mesa e me virando para
sair. Ceci abriu a porta, correndo de encontro ao pai, se jogando em
seu colo. Raffaela parou na porta, olhando para a criança com tanto
amor que eu fiquei no lugar, com as mãos tremendo da conversa
irritada que tive com Rocco.
— Papà, olha! Zia fez para mim.
Eu não conseguia ver a tela de onde estava, por isso continuei
olhando para Raffaela que tinha um sorriso doce nos lábios. Me
aproximou dela, meu coração batendo em um ritmo desconhecido.
Minha pele se arrepiou e deixei a sala, sem falar com ninguém.
Talvez Rocco tivesse razão e eu fosse um idiota por me meter
onde não devia e não era chamado, mas se Raffaela confiou em
mim, tudo que eu podia fazer era ser a pessoa que ela precisava
pelos próximos três meses.
Quando a primeira gota da chuva bateu em meu rosto, percebi
que já estava do lado de fora da empresa e não tinha dado tchau
para ninguém. Puxei minhas chaves do bolso e abri o carro, sentindo
as mãos tremendo. Nem um dia de namoro e Raffaela já quase
estragara minha amizade com Rocco. E ela achava que não ia dar
errado.
Saí com o carro, ligando o som com uma música calma para
tentar voltar para a minha conhecida paz interior. Mas ainda não
fazia sentido Rocco ter deixado um cara falar com a irmã daquele
jeito. Ele não estava por perto, Matteo. Se Raffaela fosse algo minha,
aquele cara não teria os dentes.
21
Raffaela

Olhei mais uma vez para o espelho tentando decidir se aquela


era realmente a roupa apropriada. Matteo não tinha dito muito sobre
onde íamos. Eu estava com uma saia de veludo carmesim, uma
blusa de manga comprida e gola rolê e uma bota, que ia até o joelho,
em couro. E é claro que uma meia calça reforçada, afinal, o frio do
lado de fora balançava as árvores.
— Você realmente acha que está bom? — perguntei, enquanto
Atena tentava terminar minha maquiagem.
— Se você sentar, eu vou conseguir terminar esse delineado e aí
vamos ver como você está, ok?
Atena era mais alta que eu, não por muito. Sentei em sua cama
de novo e ela entrou entre minhas pernas para terminar a
maquiagem.
— Você tem certeza de que estou bonita?
— Modéstia nunca fez seu estilo, Raffaela, você sabe muito bem
que é linda.
Torci a boca e resisti a necessidade de comer o canto das
unhas. Sim, eu era bonita, mas eu era bonita o suficiente para fazer
o cara que eu gostava desde sempre me olhar mais que duas
vezes? Homens são pessoas sensíveis, quer dizer, levantar um pau
não era muito.
— Mas eu quero dizer nesse momento… sabe, agora…
— Você está linda!
Preferi acreditar. Ceci estava sentada no chão com uma das
suas bonecas, que logo viria para o meu colo, enquanto a Nonna da
boneca não podia fazer seu papel.
— Amore, como a zia está?
— Linda — falou, antes de subir na cama ao meu lado e dar a
boneca. — Agora em mim, mamma.
— Já falei que mais tarde faço em você, agora Raffa precisa ficar
pronta antes que Matteo apareça, ok? Vai pedir pro papà colocar
aquele desenho que você gosta e te dar alguma coisa para comer.
— Papà disse que não pode tirar do jornal…
— Rocco Giordano, deixe sua figlia assistir desenho — Atena
gritou e ouvi a risada no andar debaixo.
— Ela é uma mentirosa, estou assistindo Masha e o Urso
sozinho, porque ela disse que ia te ajudar.
Atena virou para Ceci que fingiu inocência, balançando a boneca
e cantando uma música que eu sei que Atena cantava para ela antes
de dormir. O sorriso no rosto de Atena cresceu e ela falou:
— Principessa… vai lá com papà. Preciso contar um segredo
para sua zia e você sabe como os segredos são importantes para
mim, não é?
— Tudo bem, mamma… mas você pode tomar conta da Bi? —
perguntou da boneca.
— Claro, amore.
Atena foi até a porta e a fechou assim que Ceci terminou de
descer as escadas. Como eles conseguem ouvir os passos, sempre
vai ser um grande mistério para mim. Aquela casa não faz barulho
nenhum.
— Você pode me contar sobre? Rocco me contou, mas estou
desacreditada. Não de vocês, mas de como as coisas aconteceram
rápido… você tinha me dito que ele era só um bom amigo.
— Bom, aconteceu sem a gente ver… foi depois que ele me
ajudou…
— Estou feliz por você, você sempre gostou dele.
— Sim, eu… — fiquei em silêncio, pensando em tudo aquilo. — é
normal? Ficar com um frio na barriga? Eu sempre sentia quando o
via, mas agora… agora eu tenho medo que seja bobo?
Eu sentia aquelas coisas. Todas elas. Há muito tempo, mas elas
tinham adormecido. Então, agora quando eu olhava para Matteo, eu
tinha medo que elas voltassem. Tinha medo de sentir tudo de novo e
de, no final dos três meses, estar verdadeiramente apaixonada por
Matteo.
— Tenho medo… por você.
— Eu também tenho.
— Vem, deixa eu te ver inteira. Não acredito que você veio se
arrumar aqui, me sinto aquelas mammas de filme americano, estou
quase pedindo para Rocco tirar uma câmera antiga da gaveta para
eu fazer a cena do baile.
— Você é ridícula.
Parei em frente ao espelho com Atena ao meu lado. A roupa
fazia sentido e combinava comigo. Os meus olhos pareciam mais
longos e minhas bochechas mais rosadas.
— Agora só falta o batom, quer um vermelho ou alguma outra
cor? Se bem que vermelho pode não ser uma boa opção, afinal,
nenhum dos dois quer ficar com o rosto todo marcado, não é?
Tive vontade de rir, não teria nenhum beijo. Eles só deviam
pensar que teria.
— Acho que vou apenas passar o meu gloss de sempre, é mais
fácil de tirar.
— Ainda acho que você devia ter colocado seus peitos para jogo,
quer dizer… se eu tivesse esses peitões…
— Cala a boca.
Atena sorriu para nós duas no espelho. Era uma imagem que
tínhamos visto muito ao longo dos anos. Sempre nos arrumamos
juntas para tantas coisas, primeiros encontros, festas, saídas,
qualquer momento que estivéssemos juntas terminava em diversas
roupas sobre a cama e nós duas maquiadas.
— Sinto falta disso — comentei, me sentindo nostálgica.
— Também sinto, mas ei, agora você vai sair com seu principe. E
eu vou terminar a noite com uma criança jogada sobre mim e Rocco.
— Você está tão mais feliz… ainda bem que Rocco tirou a cabeça
da bunda.
— E você tem sua parcela de culpa, se o mesmo acontecer com
Matteo, eu mesma mato ele.
— Eu sei, prometo que se isso não der em nada… eu vou ficar
bem.
Atena me deu um beijo no rosto e foi guardar suas coisas que
estavam espalhadas pela cama. Encarei meu reflexo no espelho,
pensando em como Matteo ficaria ao me ver. Não esperava por
muito, mas pelo menos que notasse como eu estava bonita.
Eu era uma boba. Isso era um relacionamento de mentira. Nada
sairia daquilo, além de tirar meus pais do meu pé até que eu
pudesse me mudar. Nada além disso.
Desci as escadas, ouvindo o som de conversa. Uma conversa,
aliás, que não parecia tão amigável. Eu tinha sentido um clima
estranho no escritório, mas não achei que ia durar mais que uns
dias.
Parei na ponta da escada e senti meu coração parar ao ver
Matteo segurando Ceci no colo. Sua camisa social branca
contrastava com sua pele que ficava mais escura perto do branco.
Seus olhos estavam perdidos na conversa e por isso não tinha me
notado. A calça social escura era solta, mas não falhava em mostrar
seu corpo definido.
Meu coração voltou a bater quando ele me olhou de canto de
olho e voltou a conversa, apenas para parar de falar e me encarar
completamente. Seus olhos se abriram mais e eu pude ver o verde
derreter, tornando uma cor mais escura.
— Belissima.
22
Matteo

Eu perdi o fôlego. Raffaela estava linda, mais bonita do que eu


já tinha visto na vida. E meu peito se estufou de orgulho de saber
que seria a minha mão em sua cintura naquela noite. Ela terminou de
descer as escadas como se eu não tivesse dito nada e parou ao meu
lado.
Rocco encarou nós dois, esperando por algo. Atena parou ao
lado de Rocco e passou a mão por seu braço. Ceci decidiu pular do
meu colo para o colo de Rocco. Os três formavam aquela foto bonita,
a família perfeita.
Olhei para Raffaela, vendo de perto como ela estava perfeita.
Seus seios estavam cobertos por uma blusa pesada que impediria o
frio, mas também tiraria a visão privilegiada que eu esperava ter
durante o jantar.
Atena sorria de orelha a orelha, olhando para nós dois. O
encontro no meio da porta de entrada não parecia confortável, mas
ninguém queria se mexer. Olhei de novo para Raffaela e sorri,
tentando fazê-la confortável perto de mim, seus olhos subiram de
meu peito para o rosto e ela fez o mesmo, dando um largo sorriso.
— Vamos?
— Claro… obrigada, Atena, por ter me ajudado.
— Sem problemas — respondeu, sem deixar de olhar entre mim
e Raffaela.
Não sabia o que ela tentava encontrar, mas parecia focada
nisso. Por isso, passei o braço pelos ombros de Raffaela e dei um
beijo em sua testa, puxando um pouco para mais perto de mim. Seus
olhos se encontraram com os meus e acenei em despedida para
Rocco e Atena. Dei a mão para Ceci que a apertou, mexendo os
dedinhos enquanto dávamos o nosso aperto especial.
— Até mais tarde, principessa.
Raffaela deu um beijo no rosto de cada um e virou para mim,
sem saber o que fazer. Para quem tinha ideias sobre um
relacionamento falso, ela parecia não saber bem o que fazer ao estar
em um.
Estendi minha mão, esperando que ela pegasse, mas Raffaela
saiu de dentro da casa, sem olhar para mim. Rocco riu baixinho e eu
me segurei para não mostrar o dedo do meio para ele e ofender
minha pobre sobrinha.
Andei atrás de Raffaela, apertando o botão para poder abrir as
portas do carro e Raffaela não esperou por mim, entrando dentro do
carro. Ela fazia realmente impossível de parecer que estávamos em
um relacionamento.
— O quê? — Seu rosto franziu ao me encarar. — Você não vai
entrar?
— Sim, mas você podia ao menos fingir direito, quer dizer, sua
melhor amiga tem certeza que não parecemos um casal.
Raffaela olhou para trás de mim, e eu tinha certeza que ela
podia ver Atena e Rocco ainda na entrada de casa, porque eu não
tinha ouvido a porta fechar. Eu tinha sorte que meu carro era alto, e
apenas por isso consegui ficar em uma posição privilegiada para
fingir dar um beijo em Raffaela.
Aproximei nossos rostos e Raffaela se afastou, dando uma
cabeçada no teto rebaixado. Seus olhos estavam arregalados para
mim. Coloquei a mão em sua perna, arrastando minha pele sobre
sua meia escura. Sentindo cada pedaço da carne que eu queria
apertar e afundar minhas mãos há anos.
Raffaela afastou as pernas sem perceber o que fazia e isso só a
tornava mais deliciosa. Encarei seu corpo, suas coxas grandes, sua
barriga com dobras que eu achava a coisa mais linda do mundo,
seus seios que eu desejava como nunca tinha desejado nada.
— Você tem que se aproximar de mim, polpetta… — falei baixo,
arrastando o nariz por seu pescoço, sentindo o perfume floral que ela
usava.
— O… o quê? — eu podia sentir a respiração ofegante de
Raffaela.
— Vira para mim, e abre as pernas para que eu possa me
aproximar de você.
Raffaela fez como eu mandei, sem nunca desviar os olhos de
mim. E eu quase tremi, sentindo como ela era obediente, como ela
seria obediente na cama. Eu sabia que Raffaela faria tudo que eu
mandasse.
Não me importava mais se Atena ou Rocco estivessem
assistindo e eu quase torcia para que não estivessem, para que
aquele fosse um momento só nosso. Mas eu não teria tanta sorte.
— Raffaela… — eu podia ver seus olhos nublados de tesão e
podia sentir meu pau crescendo, mesmo que eu não tivesse feito
nada com ela.
Puxei seu queixo, aproximando sua boca da minha. Eu não ia
beijá-la, mas eu sentia seu hálito em meu rosto, sua respiração
entrecortada, esperando, ansiando por algo.
Passei o dedo por seus lábios e os separei. Sua língua tocou a
ponta do meu dedo e eu senti a sensação em meu pau, que pulsava
de tesão por ela. Aproximei nossas bocas, enquanto passava a mão
por seu pescoço, afastando seu cabelo de seu rosto.
Não a beijei, mesmo que ansiasse por isso, mesmo com minhas
pernas tremendo em antecipação. Com cuidado passei minha boca
pela dela, e fiz carinho em sua orelha.
Raffaela que até então estava paralisada, colocou a mão em
meu ombro e a apertou. Eu sabia que aquele era o movimento que
sua boceta estava fazendo, senti suas unhas fincarem em minha
carne e sorri. Seus olhos se arregalaram ao perceber o que estava
fazendo, mas não deixei que tirasse as mãos de mim.
— Você quer mostrar para eles que não temos nada? — virei a
cabeça e deixei que ela visse Rocco e Atena nos observando. —
Passa a outra mão por mim ou coloca em outro lugar.
— Como? — ri e a encarei, seu rosto demonstrava a confusão.
Raffaela enroscou a perna em meu corpo com cuidado, não era
pra ser um show de horrores em frente à casa do seu irmão. Era pra
mostrar que estávamos apaixonados. Sua mão me tocou com
cuidado, passando por meu rosto e parou em minha cabeça. Eu
sabia que meu cabelo cortado na máquina devia incomodar um
pouco, mas Raffaela não pareceu que ia reclamar.
Segurei sua cintura, puxando seu corpo de encontro ao meu.
Dei um beijo em seu pescoço, e vi o efeito que aquilo teve nela,
quando tremeu do arrepio.
— Deliziosa… — falei, ouvindo a porta se fechar.
Raffaela olhou para trás e desabou no banco. Suas bochechas
rosadas foram iluminadas pela luz da rua e sorri.
— Acho que depois desse espetáculo não restam dúvidas para
Atena.
— Sim… — confirmou, abaixando a saia. — com…. sim.
Fechei a porta do carro e deixei que Raffaela se ajeitasse. Dei a
volta no carro pela parte de trás, arrumando minha calça, tentando
esconder o volume que podia ser notado pela calça de alfaiataria.
Raffaela quase me fez beijá-la de verdade e não era apenas aí
que eu queria parar. Fechei os olhos, e apertei a parte de trás do
meu pescoço. Eu precisava de um whiskey e eu nem poderia beber
já que eu estava dirigindo.
Como eu fui me meter nisso? Seriam três meses de Raffaela. Eu
seria condenado ao inferno antes dos três meses.
23
Raffaela

“Acho que depois desse espetáculo não restam dúvidas para


Atena.”
Aquela frase me acompanhou durante todo o percurso até o
restaurante, e então até nossa mesa e metade do jantar. Não era
como se eu esperasse que ele estivesse fazendo aquilo por ter
ficado maluco quando me viu, ou algo assim, eu só… eu só torcia
para que sim.
— Você está muito quieta… não gostou do restaurante? Não é
aqui que você vem sempre com a Atena?
— Sim, eu gosto muito daqui… — confirmei, sem vontade de falar
muito com ele. — Mas, como você sabe disso?
— Eu tive que fazer minha pesquisa, eu sou um namorado falso
muito apaixonado.
— Percebi…
— O quê? — Matteo questionou, e eu percebi que tinha falado
em voz alta.
— Nada…
Encarei as paredes que tinham quadros de pessoas famosas
que já tinham visitado o lugar, e ao contrário do que parecia ao
pensar nisso, o lugar era aconchegante e muito simples. A dona era
a mesma há anos e cuidava de tudo com muito cuidado, era uma
empresa familiar, como muitas por aqui.
Uma vez ela contou que Michael Jackson brincou com seu filho
enquanto comia. Balancei a cabeça afastando os pensamentos,
tentando focar no jantar.
— Você levou algum presente pra Ceci? — perguntou, cortando o
pedaço suculento da sua lasagna.
— Claro, eu nunca deixaria minha sobrinha achando que você
era melhor.
Matteo bateu a mão na mesa e riu de mim. Olhei de novo para a
sua lasagna e eu quase me arrependi de ter pedido meu risotto.
Reparei que Matteo me encarava e comecei a olhar para as paredes.
— Você está estranha!
— Você está estranho! — rebati, pegando a taça de vinho.
— Não é uma competição, Raffaela… Eu só preciso saber se fiz
algo errado.
Bom, primeiro ele tinha me agarrado. E eu ainda podia sentir
cada terminação nervosa em meu corpo tremendo por causa do seu
toque, eu nem sabia se minha calcinha se recuperaria de como ele
fez eu me sentir. Depois… depois Matteo deixou claro que aquilo era
um teatro bem executado para Atena acreditar em um
relacionamento que não existia. Por mais que eu devesse estar
preparada para aquilo, eu não estava.
— Não, claro que não. Eu só… acho que podíamos ter resolvido
isso por telefone, não precisávamos sair para um pseudo encontro.
Encarei Matteo e sua sobrancelha estava levantada para mim.
Um grande sorriso em seu rosto e seus olhos brincalhões me
encaravam de volta.
— Sim, namorados não saem nunca. Eu devia mesmo ter te
deixado em casa, porque assim eu estaria na minha casa, montando
um quebra-cabeças, assistindo aquela série idiota que você colocou
em casa e eu me viciei.
— Você está assistindo Emily em Paris? — perguntei animada.
— Sim, — confirmou rindo, Matteo coçou a cabeça e confessou:
— estou viciado, completamente, mas estou assistindo devagar…
mas não gosto daquele Gabriel.
— Ninguém gosta! — avisei, enfiando meu garfo em seu prato e
pegando uma boa porção da lasagna que estava me chamando.
— Não toca na minha comida! — Matteo bateu o garfo em minha
mão, mas o ignorei, vendo o queijo se esticar. — Ele fica fazendo a
Emily de tonta, além de nunca ter tempo pra nada por causa daquele
restaurante.
— É o sonho dele! E, relacionamentos são complicados, mas nós
preferimos o Alfie.
Falei, enfiando a comida na boca. Matteo revirou os olhos e
bateu a língua nos dentes, produzindo um barulho que eu odiava.
— Não são. Se você gosta de alguém, você tem que fazer o que
for preciso para ficar com aquela pessoa, e se não gosta, vem até o
meu escritório se já está casado e se não estiver, não vá ao seu.
— Você precisava me lembrar que você separa casais…
— Eu não separo casais, quando eles vêm até mim, já estão
separados. O mundo não é cor de rosa, polpetta.
— Pois deveria ser.
Eu sabia que os pais de Matteo tinham se separado quando ele
ainda era uma criança. Foi antes de nos conhecermos, eu não tinha
sido muito próxima dele, apesar de Rocco sempre tentar me incluir
nas coisas deles, a diferença de idade era muito grande – ou parecia
ser quando eu era uma pré-adolescente.
— Você sempre foi iludida demais para o seu próprio bem,
polpetta.
Chutei a perna de Matteo que estava de frente para mim na
mesa. Ouvir aquilo depois do que aconteceu no carro parecia que
era uma mensagem e uma bem clara: “Nada vai acontecer entre nós
dois além desse namoro falso”. Por alguma razão que eu tentava
ignorar há anos, doeu muito.
— A gente precisa falar sobre as regras — avisou.
Claro, regras! Eu nem tinha regras, as minhas seriam
basicamente:

1. Me toque sempre que puder


2. Me beije mesmo com ninguém olhando
3. Se apaixone por mim e torne isso um relacionamento de
verdade
4. TIRE A MINHA VIRGINDADE

É claro que eu nunca diria essas regras em voz alta, então, eu


tinha exatos cinco minutos para pensar em algumas regras,
enquanto Matteo falava sobre as dele.
— Você não fala sobre o clube de luta. — rebati, sem conseguir
me conter.
Matteo gargalhou, jogando a cabeça para trás. Eu senti meu
coração bater mais rápido, quase querendo voar do meu peito de
encontro ao dele. Por isso, a frase se repetiu de novo em minha
cabeça, sua voz, sem crueldade dizendo que aquilo era um show.
Um show que eu contratei. Não adiantava agora ficar sofrendo.
Respirei fundo e tomei mais um gole do vinho.
— Qual é a sua principal regra? — perguntei.
— Não podemos nos tocar quando estivermos longe de outras
pessoas. As coisas podem ficar confusas muito rápido. E, por mais
que você seja gostosa…
Meu cérebro faleceu. Blecaute.
24
Matteo

Fiquei esperando por uma reação. Raffaela estava me


encarando com os olhos arregalados e a boca aberta como se fosse
falar algo. Nossa mesa era a única em silêncio, enquanto as pessoas
conversavam em volta de nós no restaurante.
Olhei no relógio notando que já estávamos no restaurante há
muito tempo, e não parecia que a hora tinha passado. Raffaela
piscou e engasgou com a própria saliva, já que não tinha colocado
nada na boca.
Seu corpo começou a tremer e eu arrastei a cadeira, correndo
para o seu lado. Bati nas costas de Raffaela e ela olhou para cima,
buscando por ar. Tirei seu cabelo do seu pescoço e comecei a
massagear o lugar, torcendo para que ela não morresse em meus
braços. Rocco me mataria.
— Eu tô bem… eu tô bem! — Raffaela tirou minha mão dela e eu
estranhei a falta de contato. — Meu Deus, achei que ia morrer. Você
não pode falar uma coisa dessas pra mim!
— O quê? — questionei, tentando pensar no que eu tinha falado.
— Você não pode me chamar de gostosa. Essa é a minha regra,
você não pode me elogiar sem ninguém por perto.
Tombei a cabeça gargalhando. Raffaela olhava para mim, mas
eu realmente não conseguia acreditar no que ela tinha acabado de
dizer.
— Se você for quase morrer depois que eu te fazer um elogio, eu
acho que a nossa melhor opção é sempre treinar os elogios. Como
que eu vou te elogiar e aí você reage assim?
— Isso foi uma frase sem motivo, não precisava ser dito. Isso é
ridículo.
Cheguei mais perto de Raffaela e toquei seu rosto.
— Não sei se você sabe, polpetta… mas nós, italianos, somos
cheios de fogo, cheios de paixão. — passei o dedo por sua orelha. —
Como eu vou ver minha namorada toda gostosa e não chegar perto
dela e dizer que eu poderia comê-la antes de terminar esse jantar?
Raffaela se mexeu e tentou se afastar de mim, mas eu me
aproximei mais. Senti seu perfume e sorri.
— Sabe… acho que eu gosto muito de ser seu namorado falso…
como eu poderia sentir esse seu cheiro doce, se não fosse?
Raffaela encostou a mão em meu peito, e me empurrou,
fazendo com que eu caísse de bunda no chão do restaurante. Todos
os olhares viraram para mim e eu ri para ela. Tentando parar a
sensação de que não era bem-vindo naquele lugar, um segurança
estava perto da porta, virado para nós, parecendo esperar pelo
momento certo para perguntar se eu estava incomodando.
— Você é ridículo. Acho que podemos ir para casa.
— Ainda não falamos todas as regras — lembrei, me levantando.
— Eu não ligo, você vai quebrar toda regra apenas pelo prazer de
me ver me contorcendo por dentro.
Concordei. Se tinha uma coisa que eu não queria era tornar
aquele namoro mais fácil para Raffaela. Respirei fundo e pedi a
conta, esperando que a garçonete trouxesse a caderneta com o valor
para pagar.
O papel foi entregue e virei para Raffaela.
— Muito obrigado pelo jantar — agradeci, ficando de pé para sair.
— Eu não vou pagar!
— Como não, Raffaela? Vai ficar lavando pratos, então?
Raffaela me encarou indignada. Seus olhos queimando minha
pele, mas apenas ri. Saindo em direção ao carro, não esperei por
ela. Parei encostado na porta do meu carro, aguardando o momento
que Raffaela sairia para me matar.
Não era um encontro, eu não tinha convidado, não era minha
obrigação pagar por nossa refeição. Olhei para o relógio, vendo os
ponteiros passarem, enquanto esperava por Raffaela. Eu ainda tinha
que ir para casa e ver um processo que eu teria audiência no dia
seguinte.
Raffaela apareceu na porta do restaurante, colocando os braços
dentro do pesado casaco. Em sua mão um embrulho bonito do
restaurante. Sua cara não era das melhores, por isso tentei esconder
o sorriso que eu dava.
Raffaela passou andando por mim, me ignorando
completamente. Andei atrás dela, ouvindo seus passos nervosos
batendo no chão.
— Polpetta, aonde você vai?
— Espairecer, antes que eu te assassine e passe de ter um
namorado pela primeira vez para assassinar meu primeiro
namorado.
Ri e continuei andando atrás dela. Raffaela não tinha virado
ainda para olhar para mim, mas eu sabia que ela estava brava.
— O que foi, Raffaela? Foi só um jantar!
Seu corpo parou e eu a vi tremer. Raffaela virou para mim, seus
olhos brilhando de ódio.
— Não é só a merda de um jantar. Não é só a merda de um
namoro falso. Não é só a merda de uma noite na cadeia. Não é só
uma casa com dois quartos e quase nenhuma cozinha. São as
minhas coisas, é a minha mente idiota que acredita que as coisas
vão ser diferentes para mim. É eu acreditando que posso morar
sozinha, é eu acreditando que tudo vai dar certo e morrendo de
medo que no final do dia meus pais me odeiem. — Raffaela jogou o
pacote que carregava em meu peito e gritou, batendo os pés no chão
como uma criança faria ao ser contrariada. — Eu estou juntando
dinheiro para a minha casa e mesmo que eu mude para ela amanhã,
eu ainda vou precisar pagar o resto. O universo está o tempo todo
me derrubando e sim, é só a porra de um jantar, mas a cada moeda
que sai, parece que eu não vou conseguir realizar o meu sonho.
Você acha que eu estou com meus pais porque eu sou mimada lá?
Dei um passo para a frente, mas Raffaela fugiu de mim, me
afastando com a mão. Vi seus olhos brilharem com uma lágrima e
recuei.
— Eu só quero estar onde eu não sou lembrada o tempo todo
que eu nunca vou ser boa o bastante como Rocco Giordano.
Puxei Raffaela para mim e a abracei. Não sabia o que falar para
ajudá-la, não sabia o que fazer, mas eu podia dar carinho para ela.
Porque era o que eu fazia para minha mãe quando meu pai a reduzia
a pó. Eu a abraçava.
Raffaela passou os braços por mim e circulou minha cintura. Sua
respiração profunda mostrava que ela precisava muito daquilo. E
pelo jeito que meu coração batia de encontro ao seu rosto, eu
também precisava.
— Por sua culpa minha crostata di ricotta está no chão. Eu te
odeio — murmurou, encostada em meu peito.
— Eu te pago outra, bella. — Afastei seu cabelo no pescoço e
encostei minha boca ali. — Desculpa.
— Tudo bem…
Ainda presa em meus braços, enfiei a mão no bolso, retirando o
colar que Raffaela esqueceu em casa e coloquei em seu bolso. Seus
lindos olhos castanhos encontraram com os meus e eu tive que me
segurar para não olhar para seus lábios.
Parecia que eu estava em grandes problemas.
25
Raffaela

Eu já tinha anotado tudo que o novo casal contava sobre seus


planos para o casamento. As duas mulheres se conheciam desde
crianças e tinham transformado uma amizade em um romance,
agora eu olhava para as duas, enquanto elas falavam de alguns
lugares que vinham pensando para o casamento.
— Vai ser só a nossa família e amigos mais próximos, o nosso
casamento é uma celebração de tudo que passamos para chegar até
aqui… e depois, depois queremos adotar uma criança — falou a
mulher negra de cabelo cacheado curto, seus olhos eram escuros e
era uma mulher linda. — Cordelia quer ver tudo com o advogado da
família dela, mas eu acho que seria melhor contratar outra pessoa.
— Ele é um bom advogado, Virginia só acha que um advogado
criminalista não será o melhor para isso.
— Eu fico muito feliz por vocês, de verdade, e se eu posso indicar
alguém. Meu amigo é um advogado e ele ajudou meu fratello e
cunhada no processo de adoção… posso passar o telefone dele.
A porta foi aberta e Matteo apareceu carregando a pasta que
significava que estava aqui a trabalho. Meus olhos arregalaram,
enquanto meu corpo inteiro se arrepiava com a visão dele em seu
terno. Seus ombros largos preenchiam o paletó escuro, ele era lindo.
Seu sorriso morreu, quando ele viu que não estávamos sozinhos.
— Desculpa. Nicoletta não estava aqui e achei que você só
estava trancada como sempre — Matteo levantou a mão
cumprimentando as duas e apontou para a porta. — Vou esperar lá
fora.
Levantei, afastando a cadeira. Eu estava usando uma calça
jeans agarrada em meu corpo e vi quando os olhos de Matteo foram
direto para as minhas coxas.
— Não, é ótimo que você tenha aparecido. Matteo, vem aqui!
Matteo olhou para fora do escritório e de volta para mim, como
se eu não tivesse falado com ele, mas entrou, fechando a porta.
Caminhei até ele e as noivas viraram a cadeira para onde
estávamos.
— Esse é o amigo que eu estava falando…
Matteo olhou para mim e depois de volta para as noivas.
— Amigo? — perguntou baixinho.
— Matteo foi o responsável pelo processo de adoção da minha
sobrinha.
— Amigo?
— Claro que nós sabemos que um casal heteronormativo tem
chances maiores no processo de adoção, mas Matteo fez tudo em
seu alcance para que o processo saísse antes do esperado.
— Amigo?
Eu tinha ignorado e estava tentando vender o peixe de Matteo,
mas ele parecia preso demais a uma palavra que não dizia muito
sobre a situação ridícula que estávamos metidos.
— Matteo, dá um cartão para elas! — Cutuquei sua coluna e ele
andou até as duas, vestindo a faceta profissional.
Enquanto ele fazia uma breve apresentação, eu enfiava os pés
descalços no meu tapete peludo. Nicoletta bateu na porta e a abriu
em seguida, como sempre fazia.
Viramos os quatro para encararmos a velha senhora. Nicoletta
encarou todos os rostos e revirou os olhos, fechando a porta e eu
sorri.
— Ela tem mania de fazer isso, mas acho que acabou o nosso
tempo de consulta. — Olhei para o relógio em meu pulso. — Eu
posso deixar vocês conversando sobre a situação da adoção, posso
voltar depois, se quiserem…
— Não, Raffa… acho que depois marcamos uma reunião no
escritório do Matteo. Não é, Cordelia?
— Claro, amore.
As duas se levantam, deixando Matteo para trás.
— Vocês sabem que eu vou entrar de férias na próxima semana,
não é? Eu deixei uma das meninas daqui responsável por vocês, vão
ser só as partes mais simples agora. Quando eu voltar finalizaremos
todos os preparativos, mas não hesitem em me ligar se algo
acontecer.
— Não vamos ligar, aproveite suas férias. Vai viajar? — Ri e fiz
que não. — Sei que vai aproveitar da melhor maneira. Você merece.
Abracei as duas e esperei que deixassem a sala para virar para
Matteo. Minha cabeça hoje estava uma bagunça, tendo que resolver
todas as coisas que ainda precisava antes que pudesse apenas
aproveitar minhas férias.
Mas mesmo que tudo estivesse confuso, eu ainda não lembrava
de ter chamado Matteo aqui, nem mesmo lembrava de ter dito que
passaria o dia aqui. Eu ainda estava brava com a situação do jantar,
por isso estava certa de não tê-lo convidado.
Matteo mexia no pequeno globo de neve que eu tinha sobre a
mesa, que era um modelo parecido, mas menor do que eu tinha
dado para ele quando era apenas uma garotinha estúpida e
apaixonada pelo melhor amigo do meu irmão.
— O que você está fazendo aqui? — questionei, andando até
onde ele estava, tirando o globo de neve da sua mão e o colocando
de volta no lugar.
Matteo me encarou e sorriu.
— Amigo? Achei que fosse seu namorado, o grande amor da sua
vida, polpetta…
— Meus clientes que têm relacionamentos verdadeiros não
precisam estar envolvidos no que estamos fazendo, Matteo. Agora…
pode me falar o que você veio fazer aqui?
Matteo sorriu para mim e concordou com a cabeça, sua pasta foi
colocada sobre a minha mesa e eu me sentei na cadeira ao lado de
onde ele estava. Esperei que ele terminasse de se arrumar,
colocasse tudo em ordem e se sentasse na cadeira ao lado da minha
para saber o que estava acontecendo.
O seu notebook foi tirado da pasta e Matteo sentou ao meu lado,
puxando a sua cadeira para mais perto da minha.
— Que pés bonitinhos.
Revirei os olhos e o encarei.
— Fala, Matteo.
— Eu trouxe o contrato da sua casa para você olhar e me ajudar
a preencher o que falta.
Franzi a testa encarando seu rosto que não mostrava nenhuma
emoção. Matteo não cansava de me surpreender e nos últimos
tempos isso tinha acontecido muito. Ele estava focado em ligar o
notebook para poder fazer o que precisava, mas eu não conseguia
parar de pensar que ele tinha perdido seu tempo tentando me ajudar
depois de eu ter jogado sobre ele todos os meus medos e problemas
no último encontro que tivemos.
Não tinham muitas pessoas que saíam de seus caminhos para
me ajudarem com alguma coisa, e eu vinha percebendo que Matteo,
por incrível que pareça, era uma dessas pessoas. Mesmo que ele
batesse o pé e dissesse que estava me ajudando sendo meu
namorado falso, ele ainda fazia o que era possível para transformar a
experiência na melhor possível, como ter saído correndo da sua casa
para me salvar da cadeia, e agora isso.
Uma pequena faísca queimou em meu peito e eu tive vontade
de tocar em Matteo. Peguei sua mão, fazendo com que ele olhasse
para mim.
Olhando dentro dos olhos de Matteo, o tom verde que lembrava
uma floresta com diversas nuances, eu senti como se um bálsamo
quente preenchesse meu peito.
— Obrigada.
26
Matteo

Raffaela esfregou o pé mais uma vez no tapete e encarou a tela


do meu computador enquanto eu explicava sobre como funcionaria o
contrato da compra de sua casa. Ela franziu a testa e mordeu o
canto das unhas. Bati a caneta na mesa, sentindo uma necessidade
de fazê-la parar com aquilo.
— Entendeu? — questionei e Raffaela virou para mim com os
olhos nublados por confusão.
— Eu ainda vou ter que continuar pagando quando mudar?
— Bom, é isso, ou você continua morando com seus pais por
mais algum tempo… você não pode mudar para uma casa com
apenas uma cama, Raffaela. Sua casa precisa de renovação,
móveis, ver se nada está incorreto e te causar morte.
— O que poderia me causar uma morte acidental?
— O teto pode cair na sua cabeça, já ouvi sobre isso. — Raffaela
riu e revirou os olhos.
Peguei um papel para começar a escrever as coisas que ainda
precisava resolver sobre o contrato. Eu não era bom nesse tipo de
situação, minha vara era a vara familiar, por isso teria que pedir
ajuda no escritório. Forcei minha caneta no papel, mas simplesmente
não funcionava.
— Problemas?
— Só essa caneta velha.
— Eu devo ter alguma na gaveta… não sei porque você traz o
notebook se escreve em papel… só loucos ainda fazem isso.
Ri e continuei batendo a caneta para ver se voltava a pegar. Era
sempre assim. Raffaela podia achar loucura, mas minha cabeça
funcionava melhor quando eu escrevia ou riscava. Toda folha do meu
caderno virava um emaranhado de riscos e desenhos que eu não
tinha o menor dom para fazer.
Raffaela se levantou, dando a volta em sua mesa. Olhei para
seu corpo, perdido em como ela era linda. Não apenas gostosa, mas
linda! Segui seu quadril que balançava de um lado para o outro,
fechei os olhos imaginando como seria colocar as mãos nela de
verdade. Sem ninguém olhando. Sem que fosse para que alguém
visse.
Não notei o quão forte estava batendo a caneta, até sentir ela
explodindo em minha mão e a tinta voar para todo o lado. Abri os
olhos, quando senti as gotículas voarem em meu rosto.
— Dio mio, Matteo! — fiquei parado, sentindo que tinha arruinado
uma camisa. — Vem aqui, pode se limpar no meu banheiro ou isso
vai ficar grudado em você para sempre.
Me levantei, jogando a caneta no lixo. Raffaela tocou minha mão
que não estava manchada e me puxou para o banheiro. Me encostei
na bancada, sem conseguir me mover, pensando na necessidade
que eu estava sentindo de manchar Raffaela também.
Seu decote era mais baixo que o de costume e eu conseguia ver
o vale profundo entre seus seios, e meus olhos ficaram presos ali.
Raffaela murmurava alguma coisa, mas eu estava focado demais
nela para me mexer.
— Ok, eu vou limpar onde conseguir, ok? Você quer limpar? —
Concordei com a cabeça, mas logo neguei, eu precisava das mãos
de Raffaela em mim.
A toalha branca foi molhada e quando encostou em minha pele,
senti o gelado da água seguir o caminho que uma gota escorrendo
fez. Raffaela não esfregava a pele, mas tentava tirar o máximo de
tinta possível.
Segurei a pia com mais força. Raffaela riu, não sabendo a
confusão de sentimentos que acontecia dentro de mim. Vinha
acontecendo desde o restaurante, quando ela foi tão honesta
comigo, e depois aquele abraço. Minha cabeça girava em torno do
seu nome.
— Só você para estourar uma caneta com a mão — afirmou,
abrindo o primeiro botão da minha camisa. — Tudo bem se eu puxar
um pouco? Sua pele está cheia de pontos azuis… não sabia que
uma caneta podia fazer tanto estrago.
Era o mesmo que eu pensava sobre ela.
— Pode.
Raffaela olhou para mim, seus olhos negros dentro dos meus. E
era forte, era doce e era poderoso como um raio toda a confusão de
sentimentos que eu estava sentindo.
Seus olhos continuaram nos meus enquanto ela abria cada
botão, revelando mais pele do que era necessário. Senti meu pau
acordar e saltar para a vida. Mudei de posição para esconder o
volume que a calça social não manteria em segredo.
Raffaela piscou para mim e baixou os olhos. Ela voltou a passar
a toalha, que já tinha manchas de azul, em mim e fechei os olhos.
Sua mão era cuidadosa para não machucar minha pele, mas eu
ainda podia sentir a força que ela fazia para tirar aquela tinta de
mim.
O silêncio dentro do banheiro apenas aumentava o som da
nossa respiração. Raffaela respirava profundamente, enquanto eu
fazia o máximo para não respirar e sentir seu perfume que invadia
minhas narinas e meu cérebro.
Senti seu dedo passar por cima do desenho da tatuagem de
Vênus que eu tinha no tórax. A cada leve toque, eu sentia aquela
sensação profundamente em meu pau. Raffaela não sabia o que
estava fazendo, mas ela estava me atando a ela.
— Eu acho que essa é sua tatuagem mais bonita — confessou
baixinho.
Foi a segunda tatuagem que eu fiz. Eu ainda podia lembrar do
rosto de Raffaela quando ela viu pela primeira vez. Suas bochechas
ficaram escarlate e eu quase ri, mas agora… agora o olhar de
Raffaela não era de vergonha. Era desejo.
Seus seios subiam e desciam em uma respiração
descompassada que não parecia em nada ajudar em levar ar aos
seus pulmões. Soltei da bancada, sentindo minha mão machucada e
passei por sua bochecha, que estava quente.
Raffaela levantou os olhos para mim e meu coração parou ao
perceber que ela queria o mesmo que eu. Seu olhar estava nublado
de tesão, sua boca se abriu, esperando por um beijo que eu não
sabia se estava pronto para dar.
Seu dedo escorregou por meu peito e dei um passo para perto
dela. O ar no banheiro se tornou mais quente, minha respiração mais
forte, e a dela quase inexistente.
Raffaela fechou os olhos. Minha boca tocou a dela, e eu estava
tomando cuidado, porque eu sabia que aquele beijo mudava tudo.
Aquilo não era para ninguém. Aquilo era para nós dois.
Sua boca doce, encostada junto à minha, não se movia. E eu
quase tinha medo de me mexer e descobrir que estava acordando de
mais um sonho em que eu tocava Raffaela.
Mas era real. Eu podia sentir sua mão em mim. Eu podia sentir
Raffaela.
27
Raffaela

Fiquei imóvel, sentindo a boca de Matteo próxima a minha.


Minha mente em branco, enquanto eu me perguntava se dava para
ver como meu coração estava batendo.
Minha mão continuava em sua barriga, os gomos da academia
me chamando para fazer mais do que só tocar. Matteo deu um passo
para mais perto de mim, me prendendo em seus braços.
— Eu posso te beijar, bella? — Sua boca se arrastava pela
minha, com cuidado, como se estivesse morrendo por me tocar,
assim como eu morria por ser tocada por ele. Minha voz tinha
sumido.
Dei um passo para frente, encostando meus seios em seu tórax.
Nossas bocas pareciam engolir o mesmo ar, mas Matteo ainda não
tinha feito nada, esperando por uma resposta que eu não sabia se
podia dar. Eram anos esperando por esse momento.
Um beijo de verdade. Um beijo que não fosse para ninguém
além de nós.
— Per favore…
Não tive vergonha de implorar por ele. Não quando ele parecia
tão necessitado quanto eu. Seu pau podia ser sentido em minha
perna, seu peito subindo e descendo e aquela voz… aquela voz que
perguntou se podia me beijar.
Sua boca tomou a minha em um beijo calmo, um beijo que eu
nunca tinha sentido. Seus lábios cheios pareciam que iam me
engolir. Apertei os olhos com medo de acordar de um sonho. Matteo
sorriu no meio do beijo e eu senti minhas pernas perdendo o
equilíbrio.
As mãos de Matteo subiram por minhas curvas, tocando cada
canto do meu corpo. Abri a boca, dando espaço para que ele
pudesse fazer o que quisesse comigo. Matteo não perdeu tempo,
enfiando sua língua na minha boca, tomando meu corpo como seu .
Subi minhas mãos, sentindo seu corpo pela primeira vez.
Arrastei as unhas compridas por sua barriga e Matteo moeu sua
ereção em mim, fazendo com que o líquido escorresse por minha
vagina me lubrificando para recebê-lo. Eu podia sentir a palpitação
em meu coração de encontro ao dele.
Matteo continuava me beijando como se nossas vidas
dependessem daquele beijo. E quando ele mordeu meu lábio,
puxando-o e voltou a me beijar como se não estivesse mudando o
curso da minha vida, eu tive certeza de que eu dependia daquele
beijo.
Sua mão puxou minha perna para cima, me encostando na
parede do pequeno banheiro. Matteo girava o quadril, esfregando
seu pau no meu centro, e enfiei as unhas em sua costa, sentindo a
construção de um orgasmo, coisa que eu só tinha sentido sozinha no
meu quarto em silêncio, mas aquilo… aquilo era a coisa mais
poderosa que eu já tinha sentido.
Gemi baixinho sentindo minhas pernas tremerem, enquanto o
orgasmo ia se construindo em mim. Matteo baixou minha perna,
mudando seus lábios para meu pescoço, seus dentes grudaram um
pedaço da minha carne e eu tive que parar o gemido alto que ia
escapar de mim.
— Eu quero ouvir esses gemidos quando eu estiver dentro de
você. Essa sua buceta está pedindo por mim, não está? —
Concordei com a cabeça, sem forças para responder.
Matteo abriu os primeiros botões da minha camisa, revelando
meus seios para ele. Sua boca continuava mordendo minha pele
como se eu fosse a melhor coisa que ele já tinha experimentado.
Ajudei Matteo a tirar meus braços de dentro da camisa, e ele
não perdeu tempo tirando meu sutiã, se antecipando em abaixar o
tecido rendado e revelando o bico do meu seio que estava duro.
Matteo lambeu o bico rosado do meu seio, causando a
contração em meu centro. Ele sorriu, colocando o que conseguiu do
meu seio em sua boca, sugando com vontade.
Segurei sua cabeça no lugar, enquanto minha outra mão
procurava algum lugar para se apoiar e segurar, antes que eu caísse.
Meu quadril foi para frente involuntariamente, enquanto eu buscava o
contato que eu tive antes.
Matteo gemeu com o seio em sua boca e aquele era o som mais
gostoso e poderoso que eu já tinha ouvido. Olhei para o espelho,
vendo a imagem que criamos. E revirei os olhos, sentindo a mão de
Matteo tomar meu outro seio.
Minha calcinha estava ensopada, e eu quase sentia vontade de
abrir a calça e me masturbar na frente dele. Matteo subiu a boca de
novo para meus lábios e voltou a me beijar como se não tivesse
mexido com todo meu corpo.
— Deliziosa, Raffaela… você é deliziosa…
Matteo deu um beijo delicado em meus lábios e se afastou
sorrindo para mim. Puxando o celular do bolso e sem tirar os olhos
de mim, tirou uma foto.
— O que está fazendo? — questionei assustada.
— Guardando essa memória para mim. — Matteo virou o celular
para mim, me mostrando meus lábios vermelhos, minha pele
marcada por seus dentes e meus seios à mostra. — Eu vou gozar
olhando para essa foto, Raffaela… Quando eu estiver na minha
casa, eu vou tocar meu pau pensando em tudo que eu ainda quero
fazer com você, e quando eu gritar seu nome… eu vou voltar à
minha sanidade…
Matteo guardou o celular no bolso e fechou sua camisa. Seus
olhos nunca saindo dos meus seios, enquanto ajeitava o pau para
que não ficasse na cara a marca do seu tesão.
— Puta merda, você… você não sabe o que está fazendo
comigo, enquanto me olha desse jeito, Raffaela…
— Eu…
— Eu preciso ir, tenho um cliente… mais tarde te ligo para
resolvermos as coisas que faltam do contrato.
Matteo deu um passo para frente e subiu meu sutiã, esbarrando
no bico do meu peito e sorrindo, quando me viu tremer em
antecipação. Suas mãos continuaram me deixando comportada.
Arrumei o cabelo me encarando no espelho.
— Acho que preciso provar para todos que estávamos juntos, não
é? — questionou e eu concordei sem saber o que falar.
Matteo colocou sua boca no meu pescoço e sugou a área,
deixando uma marca em meu pescoço e me fazendo ficar molhada
de novo.
— Agora ninguém vai duvidar de nós.
Matteo deixou o banheiro e eu andei atrás dele. Apenas para
encontrar Rocco parado no meio da sala me procurando. Congelei e
Matteo deu a mão para mim.
— Rocco…
— Matteo… a gente pode conversar? A Nicoletta me contou que
estava aqui.
Olhei para os dois e percebi que aquilo era sobre a amizade
deles e não sobre o que tinha acontecido no banheiro. O que eu
torcia para que ele não tivesse presenciado. Matteo virou para mim e
deu um beijo em minha cabeça, antes de soltar minhas mãos.
— Vamos, Rocco.
— Vamos.
Meu irmão deu um passo para frente, mas virou de volta para
mim. Me encarando, sua sobrancelha franziu e então falou:
— Raffaela, por que você está tão vermelha?
Matteo olhou para mim e começou a rir. E eu só queria matá-lo.
Rocco arregalou os olhos, me encarando.
— Dio mio! Não, por Dio, não!
28
Matteo

Eu encarava Rocco, que me olhava de cima a baixo. Seu rosto


estava fechado, após ter percebido o que tinha acontecido. O que
era ótimo para Raffaela, que queria que todos acreditassem naquele
namoro falso, e péssimo para mim, que agora tinha que enfrentar o
irmão protetor.
— Primeiro: eca! — Escondi o sorriso com a mão, lembrando do
que tinha acontecido. O tesão tinha passado no momento que Rocco
entrou na sala, mas a memória quase tinha cheiro. — E para de me
olhar assim, eu já disse que você é bonito e me confunde.
— Cala a boca! Você e Atena eram quase um filme de terror de
assistir. Eu estava sozinho com a sua sorella, na sala dela, você não
tinha que invadir.
— Para de falar — Rocco quase gritou, tampando os ouvidos
para não me ouvir. — Que nojo! A Raffaela é o bebê da família.
— Então não me provoque! — Cruzei as pernas e encarei o
relógio. — O que você quer comigo? Eu preciso ir atender uns
clientes.
— Eu queria pedir desculpas por ter sido um babaca no dia que
você foi em casa… Atena conversou comigo e me disse que o que
eu fiz não estava certo e que você não merecia aquilo, porque eu
sempre soube que Raffaela gostava de você e em algum momento ia
acontecer, mas eu também quero que você me peça desculpas por
ter sido um idiota comigo.
— Ok, eu aceito as desculpas, mas por que eu tenho que te pedir
desculpas?
— Você deixou claro que acha que eu não me importo com
Raffaela. — Rocco esfregou a testa, parecendo nervoso, mas eu não
tinha do que pedir desculpas.
— Não acho que eu tenho que pedir desculpas, em nome da
nossa amizade… tudo que eu posso te dizer é… se acha que o que
eu disse não é verdade, pergunta pra Raffaela o que eu vim fazer
aqui hoje e descubra porque ela sente necessidade de esconder as
coisas de você e de sua família. — falei, me levantando. Olhei para
Rocco que encarava a parede. —, Eu sei que Atena sabe. E outra
coisa, me empresta uma camisa, eu sei que você tem alguma aqui e
eu não posso ir para casa trocar.
— Não vou te emprestar nada.
— Achei que tínhamos feito as pazes…
Mesmo contra sua vontade, Rocco levantou abrindo o pequeno
armário que tinha em sua sala e puxou uma camisa preta, a
entregando para mim. Eu sabia que ele ia pensar sobre o que eu
disse. Saí da sala, encontrando Raffaela debruçada sobre a mesa de
Nicoletta, conversando com ela sobre alguma coisa.
A puxei pelo braço, dando um beijo em sua testa antes de ir
embora. O sorriso gigante em seu rosto fazia tudo valer a pena.
��️
Quando entrei no meu escritório, a cliente já estava me
esperando. Seus ombros estavam caídos, esfregando uma mão na
outra. Eu conhecia todos aqueles sinais, eu tinha crescido com eles.
Seu cabelo estava solto, cobrindo o rosto, e ao seu lado estava uma
criança, um menino, que não devia ter mais do que dois anos.
Encarei as pessoas do escritório que não pareciam ter o mínimo
de cuidado e ficavam olhando para a mulher. Parei de frente para
onde ela estava sentada.
— Giorgia? — Seu rosto levantou milimetricamente para não tirar
o cabelo do lugar que escondia. — Podemos ir para minha sala, sou
o Matteo. Vamos.
— Si… sim.
Apertei minhas mãos, sentindo vontade de fazer justiça. E eu
sabia que o único tipo de justiça que eu podia fazer era sendo um
bom advogado e ajudando mulheres como minha mãe. Mulheres que
confiaram em alguém, tiveram suas vidas despedaçadas e
autoestima reduzidas a pó.
A criança foi colocada no colo e ela passou por mim. Virei para
todos do escritório e encarei a todos. Na próxima reunião eu falaria
dessa situação, isso não podia continuar acontecendo com vítimas
de violência doméstica que vinham até aqui.
Fechei a porta com cuidado e respirei, pensando em algo bom
para que ela não se assustasse com a minha cara de bravo que
nada tinha a ver com ela, mas sim com todas essas pessoas e o
maldito que fez isso com ela.
Eu sabia que na maioria das vezes a minha imagem por si só
causava um medo nas pessoas, tinha passado por isso mais vezes
do que podia contar, mas não queria parecer ameaçador para aquela
família e nem era. Mas o racismo continuava jogando sobre pessoas
como eu, com a minha pele, aquele estigma.
O rosto de Raffaela sorrindo apareceu em minha cabeça e meu
coração ficou mais leve ao lembrar de como seus olhos brilharam
quando me despedi dela. Raffaela era um bálsamo. Virei para ir até
minha mesa e a mulher tentava impedir o menino de colocar a mão
no globo de neve que Raffaela tinha me dado.
— Pode deixar, é reforçado… e eu sei que deve parecer
interessante para uma criança. — Sentei na cadeira, encarando seu
rosto. — Giorgia… eu preciso saber o que aconteceu.
A mulher que não parecia ter mais do que trinta anos levantou o
rosto, mostrando o machucado. Um grande roxo estava em volta do
seu nariz e bochecha, como se ele não tivesse conseguido atingir o
lugar correto.
— Eu… eu não achei que isso pudesse acontecer — Sua voz
estava embargada, enquanto ela tentava falar. — Nós terminamos há
alguns meses, ele ficou em casa, porque eu sabia que a família dele
era de longe e ele estava desempregado…
Era sempre o que acontecia. A mulher sustentava a casa e um
maledetto, que se mostrava um monstro.
— Um dia ele disse que já tinha achado um lugar para ficar e que
ia embora. Por isso, eu não estranhei quando ele saiu com uma
mala, não era tudo que ele tinha, mas… finalmente éramos só eu e
minha figlio. Eu não esperava que um dia ele fosse chegar lá para
buscar o resto, ele estava alterado, ele me bateu e saiu como se não
fosse nada… e eu vim atrás de você.
Aquilo significava que ela ainda não tinha ido até a delegacia
para denunciá-lo, e nem fez a denúncia no momento que aconteceu.
Fechei os olhos, pensando em tudo que aquela mulher ainda tinha
que passar.
Levantei os olhos tentando parar a dor no meu coração, era a
pior coisa de trabalhar com casos assim, a lembrança constante que
minha mãe tinha passado pelo mesmo, e que eu ainda procurava em
cada uma delas um jeito de salvar minha mãe.
— Precisamos ir até a delegacia, tudo bem? Eu vou estar com
você durante todo o processo. Esse homem nunca mais vai se
aproximar de você ou do seu figlio.
Giorgia deu um suspiro aliviado e o menino abraçou a mãe,
parecendo sentir que era do que ela precisava. Eles tinham um ao
outro, assim como mamãe me tinha. Eles seriam felizes e, em alguns
anos, isso seria só uma sombra no passado. Eu sabia que sim.
Porque ainda era uma sombra no meu.
29
Raffaela

Atena empurrou meu quadril, enquanto eu preparava o jantar.


Eu tinha tomado a decisão, estava tudo acertado, o contrato seria
assinado, e eu finalmente sairia de casa. Isso me assustava e ao
mesmo tempo me deixava feliz.
— Quer conversar? — questionou, enquanto limpava a bancada.
— Não, acho que… não… sinto muito.
— Tudo bem, mas posso fazer uma pergunta?
Parei de cortar o gnocchi, e olhei para Atena. Seu rosto
mostrava preocupação. Encarei seus olhos e esperei pela pergunta.
Atena sempre soube como eu me sentia, quando eu precisava falar,
os momentos certos para me cutucar para qualquer coisa.
Foi para Atena que eu falei sobre querer comprar uma casa, foi
ela que foi junto comigo, mesmo passando pelo processo de adoção
da Ceci. Às vezes eu desconfiava que ela era mais minha irmã do
que Rocco.
— Você está bem e feliz? — Fugi de seus olhos, tomando um
longo gole de vinho. — Sinto que faz algum tempo que você
mudou… foi antes do Matteo, foi antes da Ceci, foi antes…
Peguei a faca, voltando a cortar, para impedir que Atena visse
meu rosto. Eu estava fugindo dela, ela sabia disso. Sim, fazia um
tempo que eu tinha mudado, eu ainda era alegre, ainda defenderia
quem amava com unhas e dentes, mas então eu percebi que
ninguém além de mim mesma me defenderia se precisasse.
— É difícil… eu, eu tentei comentar com você sobre isso, mas
acho que você pensou que era só mais um dia que minha mamma
estava me irritando, mas faz tempo, Atena… faz tempo que eu não
me sinto bem-vinda aqui, na empresa, na minha própria pele.
Limpei o rosto, apagando as lágrimas que teimavam em cair.
Atena se aproximou de mim, passando o braço por meus ombros.
Sua cabeça encostou na minha e ficamos em silêncio.
— Eu sempre torci tanto para você e sua mamma conseguirem
administrar essa relação. E me perdoa por ter ignorado o que você
tentou me falar…
Abracei Atena, escutando a conversa de meu pai e minha mãe
na sala. Eles estavam arrumando a mesa, enquanto nós duas
terminávamos o jantar.
— Você também estava passando por suas próprias coisas, e eu
convivi com isso a minha vida toda. Fotos colocadas atrás das fotos
do Rocco, a profissão que não era boa o suficiente como a do
Rocco. A vida toda.
Atena me deu um beijo na cabeça e continuou perto de mim.
— Mas você também sempre está passando por algo e encontra
um momento para se importar com todos. Seja com Rocco, seja
comigo, seja com Ceci, seus pais ou Matteo…
— Ainda não tive muito com o que me preocupar com ele, sabe?
Ele é bem crescido e sabe se defender sozinho. — Atena riu e eu a
acompanhei.
Coloquei a massa cortada dentro da água fervendo e me virei
para ela.
— Sério, Raffaela? Você saiu correndo para a casa dele porque
ele estava doente…
— Vou ficar quieta, que tal você ir saber em que lugar o Rocco
está com a minha sobrinha? Eu tenho um presente incrível para ela.
— Tá bom, vou tentar parar de te atrapalhar.
Fiquei em silêncio pela primeira vez em muito tempo, ouvindo a
carne fritando na panela, de olho no gnocchi que começava a flutuar
devagar na panela e eu ia retirando.
Senti alguém atrás de mim e virei para encontrar os olhos de
minha mãe me encarando. Apesar do que parecia, nós éramos
iguais, idênticas em todos os pontos, mesmo rosto, mesmo cabelo,
mesmos olhos, mesmo temperamento.
Esperei que ela falasse algo que ia me desestabilizar e fazer
com que eu me sentisse a pior pessoa do universo, mas ela se
aproximou, pegando um pouco do molho que eu estava fazendo e o
provou.
— Isso está maravilhoso.
— Obrigada, mamma.
— Quer me contar o que vai anunciar hoje? Estou percebendo
essa movimentação estranha… Atena grudada com você, Rocco que
ainda não chegou… Matteo te pediu em casamento?
Engasguei com o gole de vinho que tinha acabado de colocar na
boca e tentei parar a risada que nascia na base da minha barriga.
Realmente, só assim para que eles imaginassem que eu ia sair de
casa.
Eu estava pensando em como seria viver longe dela, mas eu
tinha certeza que seria melhor do que viver perto. A história de
namoro falso tinha começado há pouco tempo, longe de ser o
suficiente para nos conhecermos bem o bastante para um
casamento.
— Claro, mamma… não pode ser nada sobre apenas eu, não é?
Tem que ter a ver com outra pessoa, tem que ter a ver com alguém
que você adora.
— Não tem nada a ver com isso, eu só achei… — Minha mãe
não conseguiu terminar de falar, eu podia ver que ela ia dizer algo
que ia me machucar, algo que ia me fazer duvidar de mim, da minha
força.
Por isso, a parei. Levantei minhas mãos e dei um passo para
longe dela, voltando a prestar atenção no que estava fazendo.
Prestar atenção no jantar era o ideal naquele momento ou, até o fim
da noite, eu me mudaria para minha casa com apenas um colchão
nas costas.
— Tudo bem.
Atena voltou para a cozinha trazendo uma travessa para montar
o prato, minha mãe passou por ela sem dizer nada.
— Sabe, eu acho que você devia chamar o Matteo para vir aqui…
ele devia estar nesse momento para comemorar sua vitória com
você.
Concordei com a cabeça, saindo de perto e pegando meu
celular. Matteo tinha se afastado depois do que aconteceu no
banheiro, mas eu sabia que ele viria por mim. Por um momento, eu
pensei em como ele podia ser o único que correria por mim.
Disquei seu número, esperando a resposta que não demorou a
vir.
— Polpetta? Precisa de algo?
Olhei para Atena que me encarava com os olhos arregalados e
gesticulava para que eu falasse.
— Eu estou fazendo um jantar, sabe, para contar sobre a casa —
falei baixinho. — e eu gostaria muito que você estivesse aqui, se
quiser vir… eu vou te esperar.
— Eu chego em quarenta minutos.
Matteo não se despediu, desligando o telefone. Encostei o
celular perto do coração. Ele disse quarenta minutos, mas era quase
uma hora e meia até a minha casa.
30
Matteo

Eu tinha certeza que tinha deixado a TV ligada, e eu encontraria


peças do quebra-cabeça que eu estava montando em todos os
lugares da sala, porque, quando Raffaela me ligou, eu joguei tudo
para o alto para me arrumar e ir para um jantar que eu não queria
estar.
Patético. Era isso que eu era. Podia estar em um bar,
acompanhado, fodendo alguém para apagar os vestígios de Raffaela
da minha cabeça, mas aqui estava eu com um buquê de Begônias
que encontrei em um supermercado aberto.
Bati na porta e esperei por alguém para abri-la. Patético. O som
de um carro parando e a porta abrindo fez com que eu virasse para
trás, torcendo para que fosse alguém da casa e não um vizinho
qualquer que me acharia ridículo ali.
— Mas que cena ridícula, Matteo. — ignorei Rocco, me
concentrando em minha sobrinha que veio correndo e pulou em
minhas pernas.
— Que cena, Rocco?
— Você esperando aqui, entra em casa seu, idiot! — encarei
Rocco que tinha acabado de falar francês comigo, como eu sabia? O
biquinho. — A gente não pode mais xingar na frente da…
A porta abriu e viramos os três para Raffaela que desfez o
sorriso assim que viu o irmão. Mas voltou a sorrir ao encarar Ceci
que estava agarrada a minha perna.
— Pimpolla!
Ceci não parecia querer desgrudar de mim, por isso, a peguei no
colo e me aproximei de Raffaela que tinha um beicinho, mostrando
que estava triste por sua sobrinha ter me escolhido.
Aproximei nossos lábios e sorri para ela.
— Não fica assim, prometo que você ainda é minha número um.
Raffaela revirou os olhos, mas correspondeu ao meu beijo.
Ignoramos os dois ao resmungo de Rocco que estava me imitando.
Ceci abraçou a tia pelo pescoço, mas não saiu do meu colo, por isso
entramos na casa embolados na criança.
A casa estava toda iluminada como eu sabia que Anna gostava.
Anna, Mario e Atena estavam sentados em volta da mesa, como se
estivessem esperando por nós para poder comer.
— Você já foi mais educado, Rocco, deixando sua esposa te
esperando… triste — comentei rindo.
— Eu estava com a minha filha, idiot.
— Bambina, vem aqui com a sua mamma!
Ceci pulou do meu colo, correndo para a mãe que a recebeu de
braços abertos. Atena a rodeou com amor e beijou seu cabelo
escorrido que estava bagunçado do que quer que ela e Rocco
tivessem feito antes de vir para cá. Atena deu a característica
mordida na bochecha da filha e Ceci gargalhou como fazia sempre
que acontecia. Eu sentia meu coração se aquecer por ter juntado
aquela família.
Virei sorrindo para Raffaela, seus olhos estavam na cena das
duas se encontrando como se tivessem passado anos longe uma da
outra, mas, diferente de mim, Raffaela tinha uma pequena ruga entre
seus olhos. Passei o braço por seus ombros e a puxei de encontro
ao meu corpo.
— Está tudo bem? — sussurrei em seu ouvido, notando quando
seu corpo relaxou ao contato com o meu.
Senti a sensação toda por meu corpo. Raffaela virou para mim e
confirmou com a cabeça.
— Certeza?
— Sim, — disse, Raffaela deu a mão para mim, entrelaçando
nossos dedos. — vem comigo buscar o presente da Ceci…
— Eu não trouxe nenhum… — continuei sussurrando. — isso é
só um jeito de me deixar mal na frente da Ceci? Saiba que ela me
ama independente de qualquer coisa, Raffaela.
— Eu sei… — Raffaela deu um grande sorriso e eu sorri junto. —
não tem como não amar, todos amam.
Fiquei em silêncio ao sentir o sorriso se desfazer em meu rosto.
Raffaela não notou, enquanto me puxava em direção ao seu quarto.
As escadas pareciam balançar na minha frente.
Raffaela tinha acabado de dizer que não tinha como me amar?
Que todos me amavam? Isso inclui ela? Isso era insano. Tentei não
puxar minha mão da sua, mas estávamos em um relacionamento
falso. Falso. Ela não podia se apaixonar por mim e eu não podia me
apaixonar por ela.
Entramos em seu quarto – que ainda era o mesmo desde que
ela era criança, apenas com uma decoração diferente. Puxei minha
mão da mão de Raffaela e ainda até a janela, puxando a gola da
minha camiseta, sentindo uma sensação de sufocamento.
— Você está bem? — Raffaela perguntou, enquanto procurava
pelo presente. — Desculpa ter te tirado de casa, eu só achei que
eles iam desconfiar se você não estivesse aqui em um momento
importante para mim… espero que você não estivesse com
ninguém…
— Raffaela, eu já disse que enquanto estivermos nesse
relacionamento falso, eu não vou ter ninguém e nem você, então
espero que nós dois estejamos cumprindo com as nossas palavras,
porque… senão, é melhor terminar tudo por aqui.
Raffaela virou com tudo para mim e sorriu.
— Não precisa ficar bravo, eu só estou tentando me desculpar. —
Confirmei com a cabeça e a encarei. — Vamos, eu achei o presente,
estava guardando para dar em um momento especial. Acho que ele
chegou.
Quando descemos as escadas, todos os olhos viraram para nós
dois, mostrando que eles sabiam muito bem o que tínhamos ido
fazer, mas era uma besteira, afinal… se eu tivesse a chance de foder
Raffaela, eu precisaria de mais tempo do que dez minutos para
aproveitar cada pedaço do corpo dela.
— Ceci! — Raffaela gritou, sem prestar atenção em todos os
olhos julgadores. — Olha o que a sua zia comprou para você.
Ceci correu para o presente com os olhos brilhando de
expectativa. O pacote era uma caixa de tamanho médio e estava
embrulhado em um papel branco com bolas coloridas, o que chamou
a atenção da criança.
As duas se jogaram no chão e começaram a abrir o presente
como se ninguém mais na sala importasse.
— Mais uma vez sem um presente para a minha figlia? — Rocco
desenhou um quadro no ar e escreveu um a zero. — Parece que a
Raffaela está ganhando.
As duas abriram o pacote e eu conseguia ver daqui o brilho nos
olhos da Ceci quando conseguiu tirar as tintas, pincéis e tela de
dentro do embrulho. Ela começou a pular e saiu correndo para Atena
que a segurou.
Raffaela se aproximou de mim, mas não o bastante, enquanto
Rocco ia para o lado da filha que explicava tudo sobre como a tia ia
ensinar a pintar, desenhar e que ela ia ser uma grande artista.
— Não basta você querer seguir uma carreira que ia dar em
nada, você agora tem que colocar esses sonhos irreais na cabeça da
menina também? — Ouvi a voz de Anna e Raffaela abaixou a
cabeça, se retraindo. — Que coisa mais ridícula, você devia pensar
antes de comprar presentes, eu acho que já está na hora de parar
com essa bobagem e eu não sabia que você continuava pintando.
Acho que temos que conversar sobre isso mais tarde.
31
Raffaela

As palavras iam perfurando meu cérebro e eu sentia cada uma


delas invadindo aqueles buracos que eu sempre tentei tampar, mas
eles eram profundos demais. Dei um passo para trás, sentindo os
braços de Matteo me rodearem. Fechei os olhos e suas mãos me
seguraram apertado.
— Eu acho que você está passando dos limites, Anna. — A voz
de Matteo sobressaiu as conversas.
— Você está me dizendo o que fazer na minha casa? — Eu
nunca tinha visto Matteo ser grosso com qualquer pessoa da minha
família, mas ele parecia pronto para me puxar para trás dele e me
defender com uma espada brilhante.
— Eu só acho que você está sendo muito injusta com Raffaela.
Ela é uma ótima filha, o que tem ela pintar? O que tem ela dar um
presente que apresente arte e cores para a nipote? Não estamos
cercados por arte? Você está sendo mesquinha, Anna…
Interrompi Matteo, antes que ele dissesse alguma coisa que
pudesse acabar com o relacionamento dele com a minha mãe.
— Per favore, Matteo, não precisa!
— Não precisa? — Matteo me encarou, seus olhos brilhando de
raiva. — Todo mundo fica quieto e escutando enquanto a sua
mamma te diz coisas terríveis, apenas porque você não queria seguir
a carreira que ela escolheu ou porque tem hobbies diferentes? Isso
não faz sentido.
Rocco levantou da cadeira, se aproximando de nós. As mãos de
Matteo em volta de mim tremiam, por isso o puxei para perto de mim,
tirando de perto de todos que olhavam para a conversa acalorada
que tínhamos.
Arrastei Matteo para a cozinha, nossos olhos estavam
conectados enquanto eu tentava acalmar meus próprios
sentimentos.
— Desculpa… — pedi, entrelaçando nossos dedos.
— Por que você está pedindo desculpas?
Matteo puxou suas mãos da minha, passando a mão por meu
rosto. Fechei os olhos, sentindo seu carinho. Um carinho que eu não
lembrava de ter sentido depois de minha mãe proferir palavras
odiosas para mim.
— Você não precisa pedir desculpas… mas eu também não vou
pedir, alguém tem que te defender e se ninguém vai fazer, eu vou.
Ri e Matteo deu um beijo casto no canto dos meus lábios.
— Posso te chamar de mio Superman?
Matteo sorriu, mas antes de me responder, olhou por cima da
minha cabeça e trocou de lugar comigo, me passando para trás de
seu corpo. Encarei Rocco com cara de brava e Matteo deu um passo
para frente.
— Que merda foi aquela? Como você fala daquele jeito com a
minha mamma?
— Rocco, eu realmente sinto muito, mas você não viu como ela
falou com a Raffaela e tenho certeza que se fosse Atena, você a
defenderia do jeito que eu defendi.
Parei de respirar ao ouvir Matteo comparar os relacionamentos.
Rocco deu um passo para frente e levantou o dedo em riste para
Matteo que tinha passado o braço para trás, como se fosse me
defender de qualquer coisa.
— Você está comparando o meu casamento com o seu
namorico?
— Bom, então imagine Atena falando que a sua filha está sendo
ridícula, que ela está colocando sonhos irreais na cabeça de alguém
por dar um presente… — Rocco ficou me encarando, seus olhos
azuis no meu, e pela primeira vez, eu senti que meu irmão viu como
anos daquelas palavras tinham me feito mal. — não te cai bem, não
é?
— Raffa?
Matteo não saiu da minha frente, impedindo que Rocco me visse
por completo. Respirei fundo, sentindo o coração apertado e uma
vontade de fugir de todos eles.
— Vamos terminar logo esse jantar — pedi, dando um passo para
longe da parede que era o corpo de Matteo.
Andei até a sala de jantar e me sentei ao lado da cadeira de
Ceci.
— Zia, você pode me ensinar a pintar bem bonito que nem você?
— Sorri para Ceci e dei um beijo em sua cabeça, aquela pequena
criança não sabia o quanto eu precisava disso.
— Claro, amore mio… eu vou te ensinar tudo que eu sei.
Meu pai levantou uma taça de vinho tinto. A mesa toda ficou em
silêncio. Matteo e Rocco ainda estavam se olhando estranho, como
se não aguentassem ficar no mesmo lugar.
— Fico muito feliz de estarmos reunidos, senti falta de ter todas
as minhas pessoas preferidas no mesmo lugar. Mas esse jantar não
é meu, mas da Raffaela… prefere contar agora ou depois do jantar?
Encarei cada um, os olhos me seguindo, enquanto eu tentava
pensar na melhor opção. Se contasse antes, ninguém comeria, se
contasse depois, todos teriam indigestão. Então, era ruim ou pior.
— Eu… eu queria muito contar uma coisa muito importante para
todos.
— Você está grávida? — Minha mãe gritou se levantando.
— Não, Dio Santo, não! Eu… Jesus. Vocês dois sabem como eu
amo morar aqui, como eu amo passar meus dias com vocês. — Virei
para Matteo, sabendo que ali não encontraria nada além de
encorajamento. Seus olhos brilhavam com algo parecido com
orgulho. — Mas eu sinto que preciso ter meu próprio espaço…
preciso viver a minha vida sem ser esmagada pelas expectativas
dessa casa.
— O que você quer dizer, figlia? — meu pai perguntou, virando
para minha mãe, tentando ver se ela sabia de algo.
— Eu comprei uma casa, um apartamento há uma hora daqui… a
única pessoa que sabia sobre isso era a Atena, eu tentei manter em
segredo até dar certo...
— Você não vai! — Todos os rostos viraram para minha mãe, que
não encarava ninguém além de mim. — Não adianta, não acho que
seja certo você sair daqui antes do casamento, foi o que aconteceu
com o Rocco e como você deveria fazer.
Segurei o guardanapo e me levantei, sentindo um ímpeto de
raiva pela primeira vez na vida. Bati o joelho na cadeira e encarei
minha mãe, ignorando a dor que eu sentia.
— Quando você vai perceber que eu não sou o Rocco? Que você
não pode ter dois bambinos perfeitos? Que eu vou ser sempre a foto
que fica atrás das outras na estante? Que eu nunca vou suprir o que
você deseja pra mim? — Minhas mãos tremiam e Atena se
posicionou ao meu lado, dando a mão para mim, me dando forças.
— Eu não vou casar com o meu amor de infância! Eu não vou ser a
melhor da minha profissão. E eu nunca vou ter metade do amor que
ele tem. Mas eu vou ter a minha própria casa e eu não estou mais
com vontade de jantar.
Levantei da mesa, andando em direção a sala. Ouvi os passos
atrás de mim, mas não me virei até estar do lado de fora de casa.
— Você sempre se sentiu assim? — A voz de Rocco me fez virar.
— Sempre?
Dei de ombros, sentindo as lágrimas descerem por meu rosto.
— Você sempre foi a pessoa que mais me amou dentro dessa
casa. — Rocco coçou a cabeça e se aproximou de mim.
— Isso não é muito em comparação, não é? Agora faz sentido o
tanto que Matteo me xingou nos últimos tempos. Eu sinto muito,
Raffa…
Rocco me abraçou, deixando que eu chorasse em seus ombros.
Meu irmão fazia carinho em minha cabeça, afastando meu cabelo do
meu rosto. Pela primeira vez, eu me sentia livre de uma maneira que
eu não sabia quando tinha me sentido assim.
Matteo apareceu na porta com uma mochila nas costas e me
encarou.
— Vamos. Você vai ficar na minha casa até podermos arrumar a
sua.
Sorri para ele e Rocco fez o mesmo.
— Obrigado por cuidar dela.
— É o meu trabalho.
Não era, mas eu me sentia cuidada e amada. E eu sabia que
isso podia ser meu fim. Matteo podia ser o meu fim.
32
Matteo

Sentei na beirada da cama, assistindo Raffaela dormir. Eu sabia


que não devia ter reagido da maneira que reagi, não deveria ter
ficado tão bravo, não deveria ter levantado a voz, mas quando ouvi o
jeito maldoso que Anna falou com a própria filha, eu simplesmente
não consegui ficar quieto, era demais para eu aguentar.
Raffaela tinha tomado um banho e vestido uma camiseta minha.
Esperei que chorasse, que mostrasse como aquilo tinha afetado ela,
mas não, não foi o que aconteceu. Ela deitou na cama, colocou o
travesseiro que eu dormia entre as pernas, se cobriu e fechou os
olhos.
Não tinha dormido imediatamente, eu podia notar pelo
movimentar do seu corpo. Mas, agora, estava completamente
adormecida. Eu estava na mesma posição há algum tempo, os
cotovelos sobre os joelhos, as mãos entrelaçadas e a boca
encostada na mão, esperando por algo, mas nada acontecia.
Levantei da cama, indo em direção à rua. Minha casa era
pequena e naquele momento eu sentia vontade de gritar. Tinha sido
toda a semana, essa história de Anna e Raffaela tinha sido a peça
final no quebra-cabeça.
Sentei na beira da calçada, tirando o celular de dentro do bolso.
Tinha diversas mensagens. Rocco, Atena, Anna, Mario. Todos, com
certeza, queriam saber sobre Raffaela, mas eu sentia que ninguém
merecia saber sobre ela, talvez Atena, mas ela contaria para Rocco
que contaria para Anna.
Abri o aplicativo de mensagens, chegando até o telefone da
minha mãe. Fiz a ligação, esperando que ela me atendesse, não
tínhamos conversado ainda e eu estava sentindo falta dela.
— Violeta, quem é?
— Matteo. Oi, figlio! — Escutei uma movimentação, a voz do meu
padrasto continuava soando no fundo, enquanto ele ria com outras
pessoas.
— Está ocupada, mamma? Posso ligar outra hora!
— Não, não! Anselmo está dando uma festa com os amigos.
Precisa de algo? — Cocei a cabeça, sentindo um aperto no peito ao
lembrar de quão frágil Raffaela parecia na minha cama. — Você
comeu?
Foi naquele momento que lembrei que ninguém comeu, bom,
nem eu e nem Raffaela, pelo menos. Ela acordaria com muita fome.
— Mamma… eu sinto muito.
Minha mãe riu e fechou uma porta, tudo que eu conseguia ouvir
agora era sua voz e o barulho da minha rua.
— Sinto muito? Não entendi… está tudo bem, Matteo? Você fez
alguma coisa? Não diga que brigou na rua, você é um advogado.
Não mate sua mamma do coração.
Eu era ridículo. Eu era apenas uma criança, não tinha porque
me sentir culpado por não ter conseguido defender minha mãe, mas
ainda assim, era assim que eu me sentia. Como eu podia ter deixado
meu pai destruir tudo que ela amava?
— Sinto muito por não ter conseguido te defender, eu sei que é
bobeira, mas às vezes penso que eu poderia ter feito alguma coisa.
Cada vez que eu faço um divórcio, ou ajudo alguém em um caso
parecido com o seu… eu só penso que talvez eu esteja salvando nós
dois daquela casa.
— Matteo… bambino… não tinha nada que você pudesse fazer,
levou tempo demais para que eu entendesse que também não tinha
nada que eu pudesse fazer, a não ser sair daquela casa e eu saí.
Não pense nisso, talvez seja bom se afastar dos casos que lembrem
o meu, procurar ajuda… você merece mais do que ficar tentando me
salvar. Eu já estou bem, estou feliz em um casamento com um
homem que me ama, que te ama e que… nunca, nunca, Matteo, fez
com que eu me sentisse menos do que maravilhosa. Eu te amo,
figlio, mas você também tem que sair daquela casa, largar tudo para
trás.
Ouvi a porta abrindo, e me virei para Raffaela que estava
enrolada no cobertor da cama, com os pés para fora e o rosto
cansado.
— Matteo, você está bem?
— Quem é? — questionou minha mãe.
— Raffaela, mamma… é a Raffaela.
Os olhos de Raffaela brilharam para mim e ela pediu que eu
mandasse um oi para minha mãe. Estendi o telefone quando minha
mãe pediu para falar com Raffaela, e me levantei da calçada.
Raffaela virou de costas para mim, falando animada no telefone.
As duas tinham se aproximado quando Anna começou a chamar
minha mãe para qualquer coisa que tivesse na casa dos Giordano, e
agora ela era Tia Violeta para Raffaela.
Abracei o corpo de Raffaela, e a puxei para perto de mim,
tentando ouvir a conversa, mas só conseguia escutar resmungos e
as respostas em sim e não de Raffaela.
— Eu vou cuidar dele, pode deixar… tenho certeza que Matteo
vai comer alguma coisa agora, eu faço Matteo te ligar amanhã. Boa
noite, zia Violeta.
Raffaela virou para mim, batendo o celular em meu peito.
— Você precisa comer e ligar mais vezes para sua mamma,
Matteo.
— Preciso, mas agora preciso cuidar de você. Pizza? —
questionei, tirando seu cabelo do rosto.
— Pizza!
Raffaela ficou me olhando e seu rosto mostrava tantas emoções.
Meu coração batia acelerado, foi quando percebi que não tinha mais
como fugir, eu estava sentindo algo por ela.
Eu, Matteo Ricci, estava sentindo algo por Raffaela Giordano e
era fenomenal.
Puxei seu rosto para perto do meu, sua boca buscou a minha,
como se estivesse sentindo o mesmo. Quando nossos lábios se
tocaram, eu senti meu corpo inteiro respondendo, torcendo para que
ela se entregasse a mim.
A língua de Raffaela invadiu a minha boca e eu passei a mão
por seu corpo, implorando que ela fosse minha. Implorando que
Raffaela se entregasse a mim e, quando ela suspirou, eu sabia que
ela era minha.
— Mia, solamente mia.
— Sono tua, Matteo.
33
Raffaela

Acordei com a coberta em meu rosto, o braço de Matteo estava


em mim. Tentei me virar, mas Matteo não parecia querer me soltar.
Sua mão segurava minha barriga e eu podia sentir algo duro em
minha bunda. Me remexi, mas ouvi um resmungo profundo e Matteo
me puxou para mais perto dele.
— Pare, bella… já foi uma tortura seu corpo imprensado no meu
por toda a noite…
Aquilo fez com que eu sentisse vontade de me mexer. Uma
necessidade gigante de ser rebelde, de provocar Matteo como nunca
tinha feito. Um sorriso nasceu em meu rosto, e tentei esconder para
que ele não pudesse ver para onde meus pensamentos estavam
indo.
Virei para ele e Matteo tinha os olhos perdidos em uma neblina
de sono, mas seus olhos verdes estavam grudados em meu rosto.
Matteo não tinha movido a mão e agora ele me abraçava de frente
para ele.
Sua camiseta estava apertada em meu corpo e por isso,
enrolada em minhas grandes coxas e marcando cada dobra. Matteo
podia ver tudo. Mas, ele não parecia incomodado com isso, e eu
sabia que se em algum momento ele parecesse incomodado com
meu corpo, eu sairia pela porta de cabeça erguida e não voltaria
nunca mais.
O peito de Matteo desnudo chamava minha atenção. Passei o
dedo por sua tatuagem de Vênus e Matteo suspirou profundamente.
Minha mente se encheu de imagens de como seria ouvir seus
gemidos. Eu tinha repertório para imaginar, eu tinha lido livros.
— O que está passando por essa sua linda cabecinha? — Matteo
questionou, afastando meu cabelo do rosto. Sua boca carnuda
chamou minha atenção e lembrei do beijo que ele tinha me dado.
— Posso te pedir uma coisa? — Um pingo de coragem surgiu em
mim.
— Desde que não seja para assistir alguma série.
Ri e fiz que não com a cabeça. Eu sempre imaginei como seria
tocar Matteo do jeito que ele tinha me tocado, como seria ter seu
prazer em minhas mãos, mas ao olhar para os seus olhos, alguma
coisa dentro de mim me disse para não fazer aquilo.
— A gente pode ter panquecas para o café da manhã?
Matteo se aproximou, deu um beijo em minha testa e passou um
tempo me olhando.
— Eu sei que não era isso que você queria falar, mas tudo bem…
no seu tempo.
Sentei na cama, empurrando a coberta. Matteo virou de barriga
para cima, com a coberta empurrada de nossos corpos, eu podia ver
o caminho de pelos que seguia da sua barriga para baixo. O corpo
esculpido de Matteo me chamava atenção. Desci meus olhos mais
um pouco, e a marca do seu pau na cueca box preta, quase me fez
desmaiar. Era grande e grosso.
— Vai ficar encarando? — Matteo riu. — Faça como eu… garanto
que uma foto dura muito mais.
Sua pergunta me fez acordar e eu desviei os olhos dele,
encarando a parede.
— Eu vou tomar um banho… onde tem toalhas?
— Terceira gaveta do armário do banheiro.
Levantei da cama, correndo para dentro do banheiro, torcendo
para que ele não olhasse para meu corpo. Eu me sentia estranha.
Tomei um banho relaxante, com a água quente limpando todo meu
ser.
Olhei pelo banheiro, enrolada na toalha que não cobria nem um
terço das minhas pernas, e me xinguei por não ter trazido a bolsa
quando resolvi tomar um banho correndo.
— Matteo? — perguntei, torcendo para não ter uma resposta. —
Matteo.
O silêncio foi a única resposta que eu tive. Abri a porta com
cuidado, implorando aos céus para que ele não estivesse por perto.
Fechei a porta, passando a chave. Peguei a bolsa que Atena tinha
preparado.
Virei o conteúdo sobre a cama e Atena não tinha colocado uma
lingerie confortável, eu me sentia como Bella na viagem de lua de
mel, quando Alice preparou sua mala. Entretanto, ao contrário de
Bella, eu podia muito bem aproveitar disso.
Peguei um conjunto vinho que tinha uma rosa que escondia os
bicos dos meus seios e vesti. Encarei minhas opções de roupa, mas
nada parecia confortável o suficiente.
— Vai morar aí dentro? — Matteo perguntou batendo na porta.
— Eu já vou… sei que você deve estar querendo seu quarto de
volta.
— Sim, basicamente isso…
Abri uma das gavetas de Matteo, encontrando uma bagunça
terrível. Revirei os olhos, aquilo era absurdo. Mordi o canto da unha,
pensando se usar uma camiseta dele era mesmo a minha melhor
opção.
Minha calcinha parecia um shorts de renda, e ficaria escondida
em sua camiseta, afinal, Matteo era bem mais alto que eu. Puxei
uma camiseta preta que ficava bem larga nele e a vesti, sorrindo ao
ver que ficava certinha em mim.
Penteei os cabelos com os dedos, e abri a porta para Matteo.
Ele estava encostado na porta, os braços dando apoio e seu corpo
posicionado com o quadril no batente.
Matteo me olhou de cima a baixo, parando por algum tempo em
minhas pernas. Ele não disse nada, mas seus olhos não saíram de
mim por um segundo. Tentei passar por ele, mas Matteo me impediu.
— Fica mais um segundo aí, você não sabe o que faz com a
minha cabeça, polpetta. Vestindo minha camiseta como se fosse
feita para você… seu corpo enrolado nela… você não sabe como eu
fico olhando você assim, ainda mais depois de ter passado a noite
inteira ouvindo seus gemidos baixinhos cada vez que você se
esfregava no meu pau…
Respirei fundo, sentindo os bicos dos meus seios ficarem duros.
E ele nem estava me tocando.
— Você não sabe como foi difícil não tocar em você… como foi
difícil saber que você estava choramingando para ser fodida…
ninguém mais tem direito sobre o seu corpo. Quando você gozar
pela primeira vez em um pau, vai ser sobre o meu cacete.
— Matteo…
Ele deu um passo para perto de mim. Sua mão tocou minha
coxa, puxando minha perna e eu quase perdi o equilíbrio, mas
Matteo me segurou. Senti seu dedo passando por meu centro e tremi
ao ver o sorriso em seu rosto.
— Eu sabia que você estaria completamente molhada…
Matteo sorriu para mim, dando um beijo casto em meus lábios.
— Vou tomar um banho, me espere para comer… eu estou doido
para comer.
Fiquei observando enquanto ele se afastava em direção ao
banheiro, como se não tivesse me deixado quente e morrendo de
vontade dele. Quando a porta do banheiro foi fechada, percebi que
estava como uma estátua.
Andei até a cozinha, encontrando as sacolas do nosso café da
manhã. Com as mãos tremendo, comecei a arrumar a mesa,
sabendo que logo Matteo estaria ali e eu não sabia bem do que ele
estava com fome.
34
Matteo

Raffaela já tinha derrubado o garfo no chão umas três vezes, e


esbarrou na caneca mais vezes do que eu podia contar. E mesmo
com toda a confiança que ela mostrava, eu podia ver o nervosismo
escorrendo para fora dela. Raffaela afastou o cabelo escuro do rosto,
arrastando a mão por seu pescoço e eu senti meu pau pulsando.
Eu não conseguia desgrudar meus olhos dos movimentos de
Raffaela, não importava se eles eram engraçados, como quando ela
derrubou um pedaço de focaccia quase em cima de sua caneca.
Me recostei na cadeira, deixando meu tórax à mostra, mas
Raffaela não me olhava. Estava sendo divertido provocá-la, porque,
ao contrário de sempre, ela não respondia na mesma moeda.
— Você vai ficar se mostrando como um pavão? Eu já entendi
que você é bonito, não precisa ficar agindo como um bobo — falou
com a cabeça baixa e eu ri.
— Eu estou me mostrando como um pavão? — Esfreguei o dedo
na ponta do nariz, tentando esconder o sorriso besta que tinha em
meu rosto.
— Tentando… já vi melhores…
— Pavões?
Raffaela levantou a cabeça, sua boca em um risco, que como eu
tentava afugentar o sorriso. Ela revirou os olhos e se ajeitou na
cadeira, cruzando os braços. Seus seios ficaram evidentes assim e
meus olhos saíram de seu rosto para aquela parte que parecia o
paraíso e o inferno em um único lugar.
— Já terminou de comer? — questionei, me levantando para
pegar o prato.
— Si… quer dizer… acho que…
Segui os olhos de Raffaela e percebi que meu pau estava duro,
e aparecendo pela calça de moletom. As bochechas de Raffaela
ficaram vermelho carmesim, virei para a pia. Raffaela empurrou a
cadeira e trouxe seu prato para mim.
Era ridículo um homem de quase quarenta anos não ter controle
nenhum sobre o próprio pau. Raffaela estava parada perto de mim,
seus seios próximos demais das minhas costas. Eu quase podia
sentir os bicos dos seus seios arrepiados e encostando em mim.
Aquilo era tortura. A mais pura tortura. E eu estava adorando.
Raffaela não se aproximou mais, mostrando que, se eu quisesse
algo dela, eu teria que tomar. Eu teria que fazer tudo para ter aquela
mulher. Respirei fundo e ouvi sua respiração seguindo a minha. Um
único passo era tudo que nos separava.
Virei para trás, os olhos de Raffaela eram puro fogo. Um fogo
que eu estava doido para sentir me queimando. Sua boca estava
aberta, tomando ar, mas parecia implorar por mais.
Passei meu dedo por seu lábio. Raffaela o sugou para dentro da
sua boca e senti todas as terminações nervosas do meu corpo
respondendo àquele estímulo. Raffaela passou a língua rodeando
meu dedo e o soltou.
— Você é uma perdição, bella.
Raffaela não se afastou de mim. Nossos olhos continuavam
colados. Aproximei meu rosto do dela, que não parecia nervosa
agora, mas eu podia notar que ela não queria perder um minuto do
que aconteceria. Seus olhos me seguiam como se fosse uma águia.
Encostei nossas bocas e fiquei esperando que ela fizesse algo.
Os seios de Raffaela subiram e desceram em uma longa respiração
que eu sentia em minha pele, me arrepiando e tirando da zona de
conforto. Eu nunca tinha sentido algo assim.
Raffaela fechou os olhos e eu tomei sua boca em um beijo. As
suas mãos grudaram nos meus ombros, tentando subir por meu
corpo. Puxei sua cintura de encontro a mim, Raffaela tremeu e sorri.
Nossas bocas dançavam a mesma música e eu podia ouvir os
pequenos gemidos que Raffaela dava em resposta aos estímulos.
Subi minhas mãos por baixo da blusa em direção aos seus
seios, que pareciam mais pesados de tesão. Eu podia sentir que os
bicos estavam duros e sensíveis. Raffaela mordeu meu lábio, e eu
quase tinha medo de gozar antes que ela tocasse em meu pau.
Levantei a perna de Raffaela, deixando espaço para que eu
pudesse me fartar em sua boceta. Esfreguei meu caralho em seu
centro que eu podia sentir molhado através da peça de renda que ela
usava.
As mãos de Raffaela subiram para minha cabeça e seu gemido
em meu ouvido me fez agarrá-la mais forte. Raffaela grudou sua
boca em meu pescoço, eu senti seus dentes arranhando minha pele
e perdi a cabeça.
— Porra, Raffaela, como você pode ser a mulher mais gostosa
que eu já tive o prazer de tocar? Eu vou passar anos tocando seu
corpo e não vou me acostumar.
Raffaela não tinha nem mesmo processado as palavras quando
pegou minha mão e enfiou por dentro de sua calcinha. Vi seu rosto
ser tomado pelo mais puro choque.
Meus dedos estavam melados pelos sucos de sua boceta que
estava se preparando para ser tomada por meu pau.
— Você sabe que eu vou foder essa buceta com todo o cuidado,
não é? Mas depois, Raffaela, depois que ela for minha… eu vou
gozar bem nos seus seios, e vou tirar uma foto sua espalhada pela
minha cama… cheia de porra… e vou colar por todo meu quarto.
— Per favore, Matteo.
Passei os dedos por seus lábios que já estavam sensíveis, sua
boceta estava inchada. Enfiei um dedo em sua fenda e senti seu
corpo caindo. Raffaela não estava acostumada com tantos
estímulos, mas ela estava aguentando como uma campeã.
Toquei seu clítoris, enquanto chupava seu seio por cima da
camiseta branca, deixando a marca da minha boca no seio. Raffaela
gemeu gostoso em meu ouvido, e eu puxei o bico duro do seu seio
com meus dentes, enquanto rodeava meu dedo por seu clítoris,
tomando um orgasmo potente de Raffaela, ao mesmo tempo em que
suas unhas entravam na carne do meu pescoço.
Embebi meus dedos com seu gozo e trouxe para minha boca.
— Deliziosa…
Levantei Raffaela em meu colo, notei seus olhos se iluminando
pelo movimento, enquanto eu a levava para minha cama. Ela
merecia que sua primeira vez fosse ali. Comigo ela não precisaria
pedir para ser fodida como se fosse uma obrigação. Não, ali, naquela
cama, ela seria venerada como a rainha que ela era. E seria fodida.
Por mim.
Raffaela deitou na cama e esperei que ela fechasse o olho, mas
ela não tirou os olhos de mim quando subiu a camiseta, tirando de
seu corpo e me presenteando com a visão que ela era.
Segui meus olhos por cada pedaço dela. Suas coxas grossas,
as pequenas estrias que marcaram a barriga, os seios cheios.
Raffaela era deliciosa, e em pouco tempo seria toda minha.
35
Raffaela

Eu estava petrificada. O jeito que Matteo olhava para mim, fazia


com que eu não conseguisse me mexer. Ele não estava com pressa,
o que me fazia ter pressa. Matteo estava parado em pé, de frente
para a cama, com as mãos jogadas ao lado do corpo.

Seu tórax definido com as tatuagens que o cobriam, o caminho


da perversão que era coberto por pelos que completavam a pele
negra. Subi os olhos em direção ao seu rosto, admirando cada
pedaço dele: seus lábios que tinham estado em meus seios com
uma avidez que eu desconhecia e os olhos – aqueles olhos que
brincavam de me descobrir.

Matteo passou os olhos das minhas pernas para minha barriga,


e por um momento, eu quase tive vontade de me cobrir, mas ele
abriu um grande sorriso, mostrando que gostava de cada parte de
mim, até mesmo aquelas que, em alguns dias, eu achava que não
gostava.

Eu não estava muito falante, mas apenas porque eu não sabia o


que dizer para fazer Matteo sentir o que eu estava sentindo. Sim, eu
tinha lido livros. Sim, eu já tinha assistido alguns filmes. E claro, que
eu já tinha ouvido as experiências de amigas. Mas estar ali, na pele
de quem perderia a virgindade, me deixava com receio. Um receio
bobo de não ser o suficiente ou de sofrer.

— Você tem camisinha? — Foi a primeira coisa que saiu da


minha boca, assim que Matteo colocou o joelho sobre a cama,
andando como um gato em minha direção.

— Sim, polpetta... eu tenho.


É claro que ele tinha. Eu, inclusive, já as vi no passado. Quis
bater em minha própria testa. Matteo colocou a mão sobre minha
perna, arrastando seus dedos longos em direção a minha coxa, me
tocando com reverência.

— Você está nervosa? — questionou, sua mão chegando perto


demais da minha calcinha, que ainda estava no lugar.

Matteo brincava com a barra. Meu corpo inteiro se arrepiava


com a sensação de tê-lo me tocando.

— Não estou...

— Claro...

Matteo puxou a calcinha, revelando minha boceta que não


estava depilada o suficiente para aquele momento, mas ele não
parecia ligar para aquilo. Ele começou a espalhar beijos molhados
por todo meu corpo. Desde as minhas coxas, passando
perigosamente pelo meu centro, arrastando seus lábios grossos por
minha pele, subindo em direção ao meu pescoço. Seguirei seus
ombros, empurrando-o para baixo sem pensar realmente no que
estava fazendo, mas eu sabia que queria a boca de Matteo em
apenas um lugar.

Quando eu senti seu hálito em mim, quase dei um pulo, sabendo


que Matteo tinha entendido muito bem o que eu queria. Matteo
afastou minhas pernas, dando espaço para ficar entre elas.

Matteo soprou minha boceta e eu tremi com a sensação que


aquilo me causou. Assisti o momento que Matteo encostou seus
lábios em mim, com sua boca me tomando com uma fome que eu
nunca tinha visto acontecer. Sua língua fazia movimentos ao redor
do meu clítoris e aquilo era completamente diferente de imaginar
alguém fazendo oral em você, enquanto você enfia dedos em si
mesma. Aquilo era algo.

A língua de Matteo parecia me saborear, enquanto ele brincava


com meu clítoris. Minhas pernas tremiam como se choques elétricos
passassem por meu corpo, me levando a um lugar que eu nunca
tinha estado.

Grudei as mãos no lençol escuro da cama de Matteo, sentindo


minhas forças me abandonando. Uma das mãos de Matteo subiu por
meu corpo e eu não conseguia tirar os olhos dele, com seus olhos
que me devoravam tanto quanto sua boca.

Matteo segurou um de meus seios, e começou a brincar com o


bico excitado. A combinação da sua boca em mim, enquanto eu
sentia sua língua brincando com meu centro, era a coisa mais
deliciosa que eu já tinha experimentado.

Senti seus dedos me preenchendo e levantei o quadril da cama,


tentando fugir ao mesmo tempo que tentava me aproximar mais dele.
Matteo forçou seu peso sobre mim, me prendendo na cama de uma
forma quase feral.

O quarto era preenchido pelos seus sons, somado aos meus.


Seu nome murmurado pelos meus lábios, enquanto eu tentava parar
os pequenos gemidos que fugiam de minha boca e pareciam fazê-lo
ficar pior, mais violento, mais empenhado em me fazer gritar.

A sensação na base da minha barriga continuava crescendo, me


tomando por todo o corpo.

— Matteo... per favore... — Grudei sua cabeça, forçando seu


rosto para baixo, enquanto ele continuava ondulando seus dedos
dentro de mim, tocando um pedaço de mim que eu nunca tinha sido
capaz de chegar.

Senti uma explosão e finalmente abri os olhos, encarando


Matteo, que tinha o rosto cheio do meu gozo, o qual brilhava em sua
pele.

— Você está tão lubrificada, bella... meu pau vai deslizar tão
gostoso dentro de você...
Respirei fundo, e os olhos de Matteo foram atraídos para meu
peito que subia e descia em desespero. Um sorriso surgiu em seu
rosto e Matteo deitou em cima de mim para me beijar.

Quando nossos lábios se tocaram, enquanto sua língua me


invadia como tinha feito com minha boceta, eu podia sentir meu
gosto em sua boca. Grudei suas costas, enfiando minhas unhas
nele, forçando seu corpo de encontro ao meu, com seu pau
encostado em mim, lambuzando-o com os fluídos que tinham saído
de mim.

— Raffaela... se você continuar assim, eu não vou conseguir...


meu pau está morrendo para te invadir.

— Per favore... Matteo... eu quero te sentir... eu preciso disso...


eu vou morrer nessa cama se isso não acontecer nos próximos
minutos.

Matteo abriu a gaveta ao lado da cama, tirando uma camisinha


de dentro. Se ajoelhando no colchão, tirou a calça mostrando seu
pau que brilhava do pré-gozo que escorria dele.

Fiquei olhando para seu pênis grande, grosso e com longas


veias. Eu não tinha visto muitos paus na vida, era verdade, mas o
dele era lindo. Matteo colocou a camisinha, deslizando por seu pênis,
e gemeu, um gemido que tomou meu corpo. Era como se ele não
conseguisse se controlar, mas ainda assim tentava por mim.

Nossos olhos ficaram conectados, Matteo encostou a ponta do


seu pau em mim, sem forçar a entrada, me deixando perceber o que
ia acontecer. De repente, gelei. Sim, eu queria transar. Eu queria
perder a virgindade, mas realmente ia acontecer.

— Você precisa relaxar, bella... — Sua voz estava baixa, rouca,


como se não conseguisse mais esperar.

Seu pau não tinha parado, Matteo continuava esfregando-o em


minha entrada, espalhando minha lubrificação. Respirei fundo e
Matteo forçou um pouco, e eu parei de respirar. Doía, não ia me
matar, mas doía. Matteo se moveu mais um pouco, e eu quase podia
ver estrelas.

— Quer parar? — perguntou.

— Se você parar de se mexer e não tirar logo a porra desse lacre,


e me deixar nessa cama, eu vou sair na rua e pedir pro primeiro me
comer.

Matteo riu e eu fiz o mesmo, e então ele entrou com tudo. E


senti uma ardência que provava que eu não era mais virgem. Eu
tinha, finalmente, perdido a virgindade. Eu podia quase comemorar,
mas eu só conseguia pensar que Matteo estava dentro de mim.

E ele se movia. Com cuidado. Como se estivesse com medo de


me machucar. Era desconfortável, era como ter um pau no meio da
sua boceta e eu falava no sentido literal da palavra.

Matteo se movia para dentro e para fora, tocando meus seios,


mordendo meu pescoço e me sobrecarregando de sensações. Suas
mãos apertavam meu seio, causando uma dor gostosa, que
combinada com a sensação dele dentro de mim, me deixava fraca.

Matteo ia com calma, mostrando que mesmo com tesão, o


primeiro pensamento dele era eu. Tirei os olhos das suas mãos em
meu seio e subi de encontro aos seus olhos, que me olhavam com
uma reverência que eu desconhecia. Fechei minhas pernas em volta
dele, prendendo seu corpo a mim, enquanto tentava perseguir
aquela mesma sensação que ele parecia estar sentindo.

Eu não ia gozar apenas com a penetração, eu sabia disso.


Apesar de ter melhorado e a sensação estar gostosa, ainda tinha
uma dor me lembrando que era a minha primeira vez.

Molhei o dedo em minha boca, tocando meu clítoris, girando o


dedo na terminação nervosa que estava ensopada por meu orgasmo
mais cedo. Comecei a sentir um novo orgasmo sendo construído em
mim, enquanto minhas pernas tremiam e Matteo continuava me
fodendo com calma. Com seu pau me invadindo, eu podia sentir o
caralho me alargando, me preenchendo, enquanto minhas paredes o
apertavam. Era delicioso e quase surreal.

A combinação de sensações me fez gritar, enquanto eu explodia


em um orgasmo e Matteo me seguiu, se jogando sobre meu corpo.
Fiquei em silêncio, passando as mãos por suas costas, com Matteo
dando pequenos beijos em meus seios. Respirei fundo, sentindo
uma sensação que eu jamais tinha sentido.

— Eu não sou mais virgem... — falei baixinho, mais pra mim do


que pra ele.

— Não, você com certeza não é... parabéns.


36
Matteo

Raffaela encarava o teto e fiquei em silêncio, pensando no que


estava passando pela cabeça dela. Se eu conhecia bem Raffaela,
podia ser qualquer coisa.
Eu tinha descartado a camisinha e estávamos deitados na
cama. Ela aproveitava o momento, enquanto eu pensava no que
tinha acabado de acontecer.

— Depois do sexo… — sua voz soou baixa, por isso eu me virei


para ela. — não preciso tomar banho? Sabe… pra limpar…

Dei uma risada e Raffaela me encarou brava.

— É uma boa sempre… quer ir tomar um banho? — Raffaela


virou para mim, mostrando seus seios pesados para mim.

— Sim, eu estou me sentindo grudando, sei que usou camisinha,


mas parece que tem coisa demais dentro da minha buceta.

Deitei na cama, cruzando os braços e comecei a rir. Raffaela


não parecia achar engraçado, mas eu não conseguia parar de
pensar em como ela sempre foi muito verdadeira. Ela sempre foi
honesta, dizendo tudo o que sentia desde pequena.

— Você está rindo, mas tenho certeza que se alguém enfiasse


algo no seu cu pensaria o mesmo.

Minha gargalhada aumentou e ela subiu em cima de mim,


tentando me fazer parar de rir. Raffaela esfregou sua boceta sobre
meu pau e eu respirei fundo, sentindo meu membro ficar duro de
novo. Não sabia nem mesmo como ela conseguia estar tão molhada,
mas ela estava e aquilo me causava um tesão sem tamanho.
— Agora parou de rir, né? — Raffaela brincou, se esfregando
mais uma vez.

— Você é safada demais para alguém que era virgem até alguns
minutos atrás.

Raffaela revirou os olhos e encarou o lençol. Uma pequena


marca de sangue enfeitava o tecido. Fiquei estudando suas
expressões. Raffaela tinha a testa franzida, mas eu não ia perguntar
o que ela estava pensando… logo ela iria externar o pensamento e
aí eu teria outra crise de riso.

— Achei que sangraria mais…

— É a sua primeira vez, não a primeira morte, Raffaela. E vamos,


levanta! Tomar banho agora, estamos nojentos.

— Você diz isso como se realmente se importasse, e eu vi o


estado da sua casa na primeira vez que apareci aqui… nojento era
aquilo.

Empurrei Raffaela para fora da cama e saí junto com ela.


Levantei Raffaela no colo e ela me encarou.

— Para, você vai quebrar sua coluna com o meu peso. — revirei
os olhos e lambi sua orelha. — Nojento.

— Eu levanto coisas mais pesadas do que você, Raffaela… e se


eu não posso levantar uma mulher gostosa nos meus braços…
então, eu nem mereceria comer ela. Pode ficar tranquila, eu consigo
te carregar.

— Então, vou soltar meu peso.

Senti quando ela o fez, mas continuei indo em direção ao


banheiro. Raffaela prendeu as mãos com mais força em volta do
meu pescoço e escondeu o rosto, mas eu podia sentir seu sorriso em
minha pele.
Raffaela ligou o chuveiro, virando para o lado certo para aquecer
a água e eu sentia que ela já tinha decorado os macetes para cuidar
da minha casa. Assim como eu parecia ter aprendido como cuidar
dela.

Não queria falar sobre coisas tristes, mas sabia que em algum
momento teríamos que falar sobre sua família. Eu sabia que logo
Rocco ia querer entender a irmã, e Atena devia estar explicando
muita coisa para ele, por isso, eu ia aproveitar de Raffaela pelo
tempo que a tivesse.

Raffaela entrou embaixo do chuveiro e deu um gritinho, fiquei na


porta do box, encarando, enquanto ela curtia a água caindo sobre
seu corpo.

— Não vai entrar? — questionou e eu concordei.

Entrei embaixo do chuveiro com ela e apertei seu corpo de


encontro ao meu. A água estava quase pelando, mas ignorei a
sensação na pele, apenas para poder curtir aquela mulher em meus
braços. Arrastei minhas mãos por seu corpo, sentindo todas as
partes que eu tinha tocado, cada pedaço.

Agarrei sua pancinha, segurando-a com gosto e Raffaela me


encarou estranho.

— Espero que você não diga que eu preciso perder uns quilos. —
Passei minha boca em seu pescoço, chupando perto da sua orelha e
senti Raffaela se derreter em meus braços.

Subi minhas mãos até seus seios e os apertei, prendendo os


bicos entre meus dedos, movimentando-os para deixá-los duros. Seu
pequeno gemido me tirou o ar, enquanto Raffaela segurava meu pau
em suas mãos.

Ela fazia movimentos de vai e vem, sem muita precisão, mas


apenas o estímulo me tirava do sério, porque aquilo era a coisa mais
gostosa que eu já tinha vivido.
Desci uma das mãos, enfiando o dedo com cuidado em sua
boceta que já escorria de lubrificação. Raffaela segurou minha nuca,
enfiando as unhas com força em minha pele, enquanto eu fazia
movimentos de vai e vem em sua boceta.

— Você é tão gostosa, Raffaela. Eu poderia te trancar em casa e


viver gozando em você.

Respirei fundo, quando ela deu um gemido baixinho, e


estrangulado, como se quisesse segurar aquela sensação. Mordi sua
orelha, colocando outro dedo dentro da sua boceta, enquanto
Raffaela esfregava a bunda no meu pau com gosto, querendo me
fazer gozar apenas pelo contato.

Comecei a estimular seu clítoris, com movimentos suaves para


que ela pudesse sentir o orgasmo ganhando força. Quando ouvi o
pequeno grito e senti a bagunça que ela tinha feito em meus dedos,
tirei de dentro dela e coloquei em minha boca.

— Nunca mais fale que eu “quero que você emagreça”, você é a


melhor refeição que eu já tive e eu espero que esse assunto não se
repita, porque eu vou te mostrar como você é perfeita para mim.

Raffaela virou para mim, me encarando nos olhos e eu vi uma


vulnerabilidade que nunca tinha testemunhado.

— Desculpa, às vezes eu tenho medo… medo de não ser o


suficiente no final do dia, mesmo que eu me baste… eu tenho vinte e
nove anos e só hoje perdi a virgindade, não beijei muitos caras e
sinto que deve ter algo de errado comigo.

Afastei os cabelos negros de seu rosto e levantei seu queixo.

— Não tem nada de errado com você, você é perfeita. E só


estava esperando o momento certo para você, mesmo que brinque
que queria ter transado antes… eu te conheço, Raffaela, eu sei que
você é romântica, espero ter superado suas expectativas. Nosso
tempo é curto, mas vou fazer valer a pena sendo seu melhor pior
namorado falso.
37
Raffaela

Encarei a TV, enquanto Matteo continuava montando seu


quebra-cabeças. Tinha começado um filme depois de ele finalmente
terminar Emily in Paris, e eu estava pessoalmente investida no filme,
porém Matteo parecia perdido demais montando A Lagoa de Lírios
d'Água, quadro de Monet.
Sentei no chão ao seu lado. O sol ainda estava brilhando do
lado de fora mas, mesmo assim, uma taça de vinho rosé estava
sobre a mesa de centro, bagunçada por conta de todas as peças.
Matteo tinha deixado a caixa virada para cima como referência para
pintura.

— Quer ajuda? — questionei, parando de morder o canto das


unhas. Eu já tinha tirado sangue de um dos lados.

— Você sabe alguma coisa sobre quebra-cabeças?

Revirei os olhos para a pergunta idiota e me sentei ao seu lado.


Ele parecia concentrado demais. Matteo mordia o canto esquerdo
dos lábios, com uma peça na mão, enquanto a girava olhava para
tudo, tentando encontrar o local perfeito para encaixá-la.

Peguei a peça da mão de Matteo, encontrando o lugar perfeito


para ela. Era próxima de um dos cantos, e com muitos buracos
faltando, parecia não ter lugar certo, mas eu sabia que era ali. Eu
conhecia Monet, um dia achei que pintaria como ele.

— Quer ouvir algo engraçado? — perguntei, enquanto Matteo me


olhava abismado.

— Bom, se me explicar como você pode ser boa em quebra-


cabeças… sim, eu gostaria de saber…
Peguei seu copo de vinho e tomei um longo gole, enquanto
pegávamos outras peças para ir completando o quadro. Era bobo e
eu sabia que não devia contar, afinal, só provaria como eu sempre
tinha sido uma boba apaixonada por ele. Não que… não que eu
ainda não fosse. E quando eu achei que sabia o que era paixão,
agora eu a sentia bem fundo se enraizando em mim, crescendo
como uma árvore que podia ser cortada ou cuidada por apenas um
homem.

— Você vai achar bobo, — Matteo não falou nada, mas virou para
mim, segurando uma pequena peça entre os dedos. Seus olhos
verdes me encaravam e me senti insegura pela primeira vez em
muito tempo, uma insegurança que era quase palpável. — lembra
que uma vez você foi dormir em casa? E você sempre fazia isso.
Devia ter seus dezenove anos, eu, meus quinze completos, estava
naquela fase estranha, enquanto você já era lindo…

Matteo riu baixinho e eu quis fotografar aquele momento para


guardar em meu peito.

— Você estava montando um quebra-cabeças, porque o Rocco


tinha saído pela janela para ver a namorada da vez, e a gente sabe
que antes da Atena tiveram muitas. Eu me sentei perto de você na
cadeira da cozinha, nenhum de nós queria que meus pais
soubessem que Rocco tinha saído, então eu tentei te fazer
companhia…

— Você sempre fazia isso.

— Sim… — Encarei o brilho diferente em seus olhos. — eu tentei


montar aquele quebra-cabeças com você, era o mapa mundi, parecia
tão fácil e eu decidi te ajudar… mas, você disse que eu era a pior
pessoa montando quebra-cabeças.

— Desculpa. — Ele parecia realmente culpado.

Virei para colocar mais uma peça no lugar, e devolvi a taça de


vinha para ele. Matteo a pegou e continuou me olhando, eu
conseguia sentir seus olhos em mim. Peguei mais uma peça, e
encarei a pintura na caixa.

— Depois daquilo, eu jurei que seria muito melhor que você em


alguma coisa, eu montei e desmontei vários quebra-cabeças apenas
pra montar de novo. Virou uma obsessão, porque eu queria que você
me olhasse como igual, que visse que eu era inteligente e uma boa
opção. Apenas uma garota de quinze anos. E eu me tornei boa, só
não faço isso há anos.

— Você não era uma garota boba de quinze anos… era mais
inteligente que eu, e mais carinhosa que eu, mais legal que eu… e
você sempre provou isso.

— Eu era apaixonada por você.

— Eu sei.

Era como se uma afirmação tivesse mudado todo o curso da


minha vida. Senti uma descarga elétrica em meu peito e quase parei
de respirar. Fechei os olhos e dei um sorriso triste. Matteo afastou
meu cabelo do meu rosto e colocou o dedo por baixo do meu queixo,
virando minha cabeça para ele.

— Eu sinto muito. Sinto muito, Raffaela.

— Eu era só uma garota boba que se apaixonou pelo melhor


amigo do irmão, talvez fosse a coisa mais próxima que eu achei que
podia ter… mas eu era só isso: uma garota boba.

— Você não é boba.

Balancei a cabeça, afastando uma lágrima que parecia teimar


em cair do meu olho. Matteo pareceu seguir o caminho da lágrima
com seus olhos, e por mais que eu quisesse fugir, parecia que
aquele momento era um adeus definitivo ao sentimento de uma
adolescente. Por que, então, aquela dor parecia tão visceral?
Matteo se aproximou de mim, dando um beijo em minha
bochecha por onde a lágrima tinha escorrido. Toquei seu queixo e
fechei os olhos, sentindo meu peito se apertando com a constatação
de que não era mais apenas um sentimento adolescente. Era mais.
Era muito mais. E era só por pouco tempo. Eu não teria Matteo Ricci
para sempre. Nunca seria para sempre.

Toquei minha boca na sua, porque se eu só tivesse uma


memória dele, aquela memória seria para sempre. Matteo me puxou
para ele, segurando minha cintura em suas mãos, enquanto eu me
entregava em um beijo. Um beijo que eu teria para sempre.

Passei minhas mãos por seu rosto, sentindo a barba por fazer
que começava a crescer e pinicava minha pele. Matteo me puxou
com mais vontade para perto dele. E eu não sabia se ele tinha noção
de como eu estava me sentindo, mas parecia que sim. Afinal, Matteo
me deu o beijo dos meus sonhos.

Suas mãos subiram por minhas dobras, mostrando que cada


pedaço meu era amado. Segurei seu pescoço, sentindo minhas
pernas ficando fracas por sua boca mordendo a minha, enquanto eu
buscava mais daquela sensação.

Matteo se afastou e me olhou.

— Você é linda, Raffaela, espero que saiba disso.

Sorri e fechei os olhos balançando a cabeça.

— Espero que você também saiba que aquela menina de treze


anos, a de quinze e a de vinte e nove são gratas por você ter sido
minha primeira paixão… — e única, completei em minha cabeça.

Matteo voltou a me beijar, sem me dar a chance de falar mais


nada. E sem falar nada sobre o que ele pensava de mim. Então, tudo
que se repetiu em minha cabeça foi: “o nosso tempo é curto”.
38
Matteo

Raffaela jogou as pernas sobre as minhas, comentando mais


uma vez sobre como o Indiana Jones era um dos homens mais
sexys que existia. Eu achei que a conversa de mais cedo poderia
deixar o clima pesado, mas não havia ficado.
Nós já tínhamos cozinhado juntos e os pratos ficaram sobre a
pia. Ainda que Raffaela quisesse lavar, eu não deixei. Agora,
assistíamos a um dos seus filmes favoritos.
Puxei seu pé para mais perto de mim e comecei a fazer uma
massagem, passando meu dedo pela curva do seu pé.
— Hmmm, isso é muito bom… não sabia que você era bom em
massagens. — Sorri, ouvindo o prazer em sua voz.
— Sou ótimo.
— Isso é bom, continua aí — demandou, abanando as mãos.
Raffaela fechou os olhos, e ficou quieta, enquanto eu continuava
a massagem. Senti o seu corpo relaxar e continuei subindo minhas
mãos para suas pernas. Eu conhecia uma coisa ou outra sobre o
corpo humano, mas eu sabia todas as zonas heterogêneas do corpo,
por isso, quando Raffaela gemeu baixinho ao sentir meus dedos em
seus joelhos, não me espantei.
Meu próprio corpo respondia a ela, com todo o sangue que meu
coração bombeava indo direto para o meu pau.
Continuei a massagem, vendo seu corpo responder. A minha
camiseta grudada em seu corpo não deixava muito para a
imaginação, e eu podia ver os bicos dos seus seios ficando duros.
Raffaela abriu os olhos, me encarando, e eu sorri, virando o
rosto para longe dela. Notei sua movimentação quando ela fez que
eu parasse a massagem. Raffaela tirou a camiseta ficando apenas
com um conjunto de lingerie preta.
Já que ela queria que eu olhasse, eu não ia mais desviar. Voltei
a fazer a massagem, encarando Raffaela, enquanto massageava
seu corpo com meus dedos. Meu pau, que tinha ficado duro ao
primeiro gemido, acordou de vez quando ela passou a mão por seus
seios.
— Raffaela… eu posso te chupar? — Raffaela levantou a cabeça
do braço do sofá e me encarou com os olhos embebidos de tesão,
ela concordou com a cabeça, mas eu precisava de mais. — Bella, eu
estou morrendo de vontade de abrir essa sua buceta e te chupar até
você gozar na minha cara, mas eu preciso que você me diga que eu
posso fazer isso.
Fiquei esperando por sua resposta, enquanto Raffaela passava
o pé pelo meu pau, meu corpo inteiro estava arrepiado de desejo por
ela. Eu podia passar horas aproveitando aquela mulher.
— Per favore, Matteo… me chupa.
A virei no sofá, fazendo-a ficar sentada com as pernas no chão.
Me ajoelhei na sua frente, e a encarei, puxando sua calcinha com as
mãos delicadamente para aumentar a antecipação.
— A próxima vez… você vai sentar na minha cara e eu vou me
afogar na sua buceta e vai ser a melhor sensação da minha vida,
Polpetta.
— Matteo…
Raffaela continuava estimulando os seios e eu amava que ela
não tinha vergonhas, ela se tocava na minha frente e buscava o
próprio prazer enquanto eu não começava a minha tortura.
Puxei a bunda de Raffaela para a ponta do sofá. Seus olhos se
arregalaram e eu afastei suas pernas para poder ver sua boceta que
brilhava. Afastei os lábios e enfiei minha cara ali, dando uma longa
lambida e ouvi Raffaela suspirar com o contato.
Comecei a provocar fazendo pequenos movimentos em seu
clítoris, sentindo seu corpo responder, com seu quadril rebolando em
minha cara. Toquei seu clítoris com meus dedos, movendo a língua e
o dedo ao mesmo tempo, sentindo sua lubrificação ficar mais forte.
Raffaela largou o seu seio para agarrar minha cabeça, forçando
meu rosto de encontro a sua boceta. Ri em contato com seu clítoris e
Raffaela me empurrou mais forte.
Levantei a mão, puxando seu sutiã para baixo sem muito
cuidado, expondo seus seios para mim. Prendi o bico do seu seio
entre meus dedos, puxando e deixando-o ainda mais duro do que
estava.
Sua boceta era a coisa mais deliciosa que eu já tinha provado e
eu não conseguia parar de tomá-la como minha.
As pernas de Raffaela começaram a tremer, prendendo minha
cabeça e me impedindo de respirar. Raffaela pareceu perceber o que
estava fazendo e soltou as pernas.
— Nunca! Faça! Isso! — falei, puxando suas coxas de volta para
o lugar que estavam, me sufocando. — Me sufoque com a sua
buceta, per favore.
— Matteo, eu vou…
Sua voz ficava mais rouca a cada minuto, enquanto eu enfiava
meus dedos em sua boceta masturbando-a em direção ao precipício
que eu estava caindo apenas de ouvir seus murmúrios de prazer.
Raffaela tremeu, gritando alto e eu tampei sua boca. Minha casa
era antiga, os vizinhos podiam ouvir e eu sabia que ela não gostaria
daquilo. Senti seus dentes em minha mão.
Afastei meu rosto, depois de ter sugado cada gota do seu gozo,
sentindo meu rosto molhado do seu prazer. Raffaela me encarava
com os olhos quase fechados, e me levantei com o pau duro como
pedra, e abaixei a calça.
Passei minha mão por meu pau, espalhando o pré-gozo por toda
a extensão, bombeando para cima e para baixo, com a visão do seu
corpo jogado no sofá, satisfeito depois de ter gozado com a minha
boca. Raffaela não parecia disposta a se cobrir e aquilo era delicioso,
meu pau bombeava, gozando por seu corpo. Os olhos de Raffaela se
iluminaram quando meu gozo cobriu sua barriga e seios,
continuando com os jatos até eu mesmo perder o equilíbrio das
pernas.
Fiquei assistindo enquanto ela passava os dedos pela barriga,
espalhando minha liberação em seu corpo. Raffaela parecendo
travessa, colocou o dedo molhado na boca, sentindo meu gosto.
— Mais ácido do que eu achei que seria — falou, me encarando
com os olhos brilhando.
— Você imaginava como seria?
— Ah, nos livros o cara sempre fica “não, meu amor, sua boca é
preciosa demais para receber uma gozada”.
— Devo ficar preocupado com os livros que você lê? — Puxei
Raffaela pelas mãos em direção ao banheiro da casa.
— Só se você não quiser repetir alguma cena… aí talvez sim…
— Me mostre agora e eu vou tentar realizar todos os seus
desejos, bella.
Olhei para minha mão que latejava de dor onde ela tinha
mordido e Raffaela notou, pegando minha mão na sua.
— Desculpa…
— Tudo bem, não se preocupe com isso… — Afastei o cabelo de
seu rosto. — É a prova do orgasmo gostoso que eu te dei bem no
meu sofá.
Raffaela puxou minha mão para perto do seu rosto e deu um
leve beijo no local, com seus olhos me provocando. Senti meu pau
ficando duro e um arrepio na coluna.
Aquilo nunca ia passar?
39
Raffaela

Encarei a mão de Matteo em minha perna, ela tinha estado ali


há mais tempo do que eu podia contar. Tínhamos passado o dia
juntos, fosse conversando sobre o passado ou apenas na presença
um do outro, e ele não tinha deixado de me tocar, no entanto, ali,
naquele momento, era diferente.

Talvez a sensação viesse por estarmos deitados em sua cama,


ele com nada além de uma cueca boxer branca e eu vestindo uma
camisola. Poderíamos estar fazendo alguma outra coisa, mas tudo
que eu podia pensar era em aproveitar esses momentos. Matteo
mexeu a mão mais uma vez, causando arrepios em minha pele,
coisa que vinha fazendo muito.

Respirei fundo e ele me acompanhou, no silêncio da casa,


preenchido apenas pelo barulho da rua em que carros passavam,
pessoas conversavam, eu só conseguia pensar em como eu era
sortuda de ter pelo menos algum tempo com Matteo.

Me mexi, virando para ele. Seus olhos estavam fechados, mas


eu sabia que ele estava acordado. Não queria falar nada, apenas
prestar atenção em cada um dos seus detalhes.

Matteo tinha as sobrancelhas grossas, um nariz largo, e a boca


mais linda do mundo, grossa e grande. Sua pele negra era clara,
preenchida pela barba por fazer que não parecia incomodá-lo.
Matteo era lindo, eu sempre tinha achado, mas agora, encarando-o
de tão perto, na cama… depois de ele me fazer gozar em seu sofá...
Matteo era lindo.

Um sorriso nasceu em seu rosto e percebi que fui pega


encarando. Não tentei desviar quando ele virou de encontro a mim e
ficamos os dois nos encarando em silêncio. Meu coração começou a
bater um pouco mais rápido e eu notei que estávamos próximos
demais, seja fisicamente ou figurativamente.

— Me conta uma coisa que ninguém sabe sobre você… e não


vale se o Rocco souber…
— Com ciúmes do seu irmão? — brincou, passando a mão pelos
braços gordos que eu detestava.
— O Rocco tem uma paixonite por você, não sei se já reparou…
— Você acha mesmo que eu não ia reparar? Toda vez que seu
irmão está bêbado, ele começa a falar como eu sou bonito. —
Matteo gargalhava e eu fechei os olhos ouvindo o som grave. — Algo
que ninguém mais sabe, não é?
Abri os olhos, encarando de novo seu rosto, enquanto ele
pensava em alguma coisa. Eu pude ver o momento de realização, ao
pensar em algo que ninguém mais sabia sobre ele e seria algo que
eu poderia guardar para sempre em minha memória.
— Quando eu era pequeno, antes dos meus pais se separarem, e
por causa de todas as brigas, nos momentos que eu tinha me
esconder para não ver minha mãe sendo reduzida a pó com palavras
que pessoa nenhuma devia ouvir… — fiquei imaginando como era
para uma criança aquela situação e meu coração se apertou por ele.
— Bom, a gente morava em uma fazenda e tinha um lago não muito
longe de casa e que eu não podia ir sozinho. Em uma dessas brigas,
eu saí correndo e fui parar lá, tinha um pequeno sapo vivendo por ali,
não sei se sozinho ou com uma família.
— O que você fez? Me diga que não dissecou o sapo…
Matteo me olhou bravo e eu lembrei que ele odiava que alguém
o interrompesse.
— Eu levei o Frederico para casa, demorou semanas para que
alguém percebesse… eu nem sabia como cuidar de um sapo, ou
algo do tipo, eu só deixei uma bacia embaixo da minha cama e
arrancava matos da fazenda para ele comer. Mas Frederico foi o que
me ajudou por muito tempo a passar por algumas situações.
— E quando sua mãe descobriu?
Matteo riu e cobriu os olhos com o braço, me mostrando as
veias que saltaram, ficando em evidência.
— Ela me fez devolver o Frederico para a lagoa. Nem sei como
ele sobreviveu, mas sobreviveu e eu o visitava todos os dias…
poderiam ser sapos diferentes? Com certeza, mas eu adorava meus
milhares de Fredericos.
Comecei a rir da criança que um dia ele foi e joguei a perna por
cima das dele. Era delicioso e muito reconfortante estar tão próxima
de alguém assim.
— Agora você precisa me contar algo, ok? — pediu com um
beicinho. Me aproximei dele, tomando coragem e dei um beijo em
sua boca.
— Ok… me deixa pensar. Você já sabe muita coisa sobre mim,
eu sou uma boca aberta que tinha uma paixão por você, eu não era
excelente em guardar coisas.
— Vai, Polpetta, eu sei que tem algo que você nunca contou.
— Tudo bem, vou pensar em algo. — Fechei os olhos, pensando
em algo que eu pudesse contar e que ele não soubesse ainda, mas
nada me vinha à cabeça. — Ok, vou contar algo muito bobo e você
provavelmente vai achar pesado demais… mas pense que eu
sempre fui uma boa garota e tudo que eu já fiz na minha vida foi
porque alguém me fez algo…
— Deveria estar com medo?
As mãos de Matteo não paravam de passar por minha perna e
aquilo quase me desconcertava, eu estava tentando ignorar, mas
não dava.
— Uma vez eu coloquei pimenta na comida da minha mãe sem
que ela soubesse. Ela ia receber algumas visitas em casa, e antes
que você me julgue, ela tinha dito coisas horríveis para mim. Então,
eu coloquei muita pimenta na comida, uma das pessoas era alérgica
e eu me senti muito culpada depois, mas é… eu me vinguei.
— Você é uma coisinha bem cruel, não é mesmo?
Matteo não deixou que eu respondesse, me beijando e subindo
por cima de mim, enquanto esfregava seu corpo de encontro ao
meu. Eu não sabia muito sobre religiões ou sobre céu e inferno, mas
do jeito que Matteo me tocava, aquilo era o meu céu.
Me afastei, querendo olhar para o rosto dele por mais um tempo,
e ele voltou a me beijar com fervor, mostrando como amava fazer
aquilo. Passei minhas mãos por suas costas, tocando seus músculos
com paixão.
— Sua boca é uma perdição para mim, Raffaela.
Matteo apagou a luz do abajur e se deitou ao meu lado.
Respirei fundo, pensando em perguntar algo que sempre quis
saber sobre ele.
— Matteo?
— Uh?
— Posso te perguntar algo...
— Claro, polpetta...
— Por que quando nós nos conhecemos você foi tão… difícil?
Na escuridão do quarto, eu não podia ver seu rosto, mas podia
sentir sua respiração ficando mais pesada. Eu quase tive medo de
que Matteo não fosse responder, mas então ele deu um longo
suspiro.
— Eu vivia no interior, em uma cidade cheia de sítios e fazendas,
onde ninguém me olhava diferente por ser negro. Eu era só mais um
garoto correndo pelas ruas, mais um garoto jogando bola, mais um
garoto pulando muros… — Matteo colocou a mão sobre os olhos e
voltou a falar: — Quando eu mudei para cá, eu sentia que cada
pessoa me julgava, eu já tinha muito dentro de mim, Raffaela, coisa
demais para uma criança. Parecia que eu não era digno dessa terra,
que eu não era filho da Itália como todos e talvez eu tenha projetado
isso em você, mas… às vezes ainda acho que não sou digno de
nada.
Fiquei em silêncio, entendendo em uma escala diferente o que
ele dizia. Meus olhos se encheram de lágrimas e me aproximei dele,
dando um beijo casto em seus lábios. Sentindo o seu rosto molhado
como o meu.
— Sinto muito, angelo.
Matteo balançou a cabeça e me puxou de encontro para ele,
prendendo meu corpo em seus braços. Matteo tentou aliviar o clima
quando falou:
— Agora vamos dormir, porque o dia de hoje foi cheio de
emoções para você.
Tentei rir, mas uma dúvida surgiu em meu peito e estávamos
sendo sinceros demais para não falar.
— Para você não? — o silêncio foi grande no quarto, mas eu
sabia a resposta. Aquele dia tinha sido só mais um dia para Matteo.
Fechei os olhos e virei de costas, sentindo o coração apertado.
Estar apaixonada pelo melhor amigo do meu irmão era a pior coisa
que eu podia fazer de novo e mesmo assim, eu tinha feito.
Matteo se aproximou de mim, me puxando para dentro de uma
colchinha. E respirou fundo em meu pescoço.
— Esse dia foi cheio de emoções para mim também, Raffaela.
40
Matteo

Meu corpo inteiro relaxou quando eu deitei na cama de novo,


após ter ido ao banheiro. Raffaela estava de olhos fechados ainda, e
a luz do sol invadia apenas a cozinha. Esfreguei os olhos e cocei a
cabeça, com a sensação de noite bem dormida.
Raffaela se mexeu, virando para mim, sua perna grossa
repousando sobre a minha perna. Coloquei a mão sobre sua pele,
afastando a camisola.
Fiquei quieto, aproveitando aquele momento. A cabeça de
Raffaela se moveu, caindo em cima do meu peito. Afastei seu cabelo
escuro do rosto, ainda que ela não parecesse incomodada com os
fios em seu rosto. Afastei-os, na verdade, porque os fios me
impediam de olhar para ela, e a encarei notando como sua bochecha
ficava maior daquele jeito que ela estava deitada.
Depois da conversa da noite passada, lembrei da primeira vez
que nos vimos: por eu ser uma criança irritada, eu me tornei um
adolescente difícil. Raffaela sempre foi sobre flores e princesas,
coisas que nunca seriam para mim. Ela planejava casamentos, eu
ajudava mulheres a saírem deles. Ela pintava as coisas belas que via
e eu… eu começava a achar que a única beleza em minha vida era
ela.
Raffaela se mexeu de novo, começando a babar e eu ri, fazendo
com que ela acordasse do sono. Sua mão foi direto na boca,
limpando a baba que escorria.
— Eca! Quase babei em você! — Ri mais, fazendo-a ficar com
uma cara de brava que era linda. — Vou te proibir de rir para mim,
pode começar a redigir o contrato.
— Fica quieta, Polpetta… a manhã tinha começado tão calma,
por que você tem que ser um furacão? — Ela revirou os olhos,
saindo da cama em direção ao banheiro.
Fiquei encarando o teto, enquanto ouvia o barulho da pia e da
descarga. Raffaela voltou para o quarto com o rosto lavado, os
cabelos atrás das orelhas e se ajoelhou na cama ao meu lado.
— Sabe… eu queria te perguntar uma coisa, se você quiser
responder…
— Ainda não cansou de tentar me desvendar? — perguntei,
virando de lado e apoiando a cabeça na mão.
— Já disse que não precisa responder. — Raffaela revirou os
olhos e me encarou. — É pessoal… você não mantém contato com o
seu pai? Quer dizer, você sempre fala da sua mãe, mas nunca dele,
e eu sei que ele fez muito mal para vocês dois, pra ela
principalmente.
Sentei na cama, encostando as costas na cabeceira da cama.
Fazia muito tempo que eu nem mesmo pensava nele. Raffaela me
encarava com os olhos tristes, mas eu sabia que mais do que sobre
mim, aquela pergunta era sobre ela.
— Eu nunca consegui manter proximidade com ele, embora ele
tenha tentado por mais tempo que eu. Já disse que ele nunca
encostou nela? Ele não batia. Acho que, se tivesse batido, ela teria
fugido mais rápido, mas não, ele levantava a voz, dizia coisas
odiosas e era extremamente racista com ela. — Lembrava de muito,
mesmo para uma criança. — Esse é o problema com homens
brancos que ficam com mulheres negras, eles acham que estão
fazendo um favor, limpando a raça, e ele sempre deixou claro como
ela era menos do que ele, como eu era menos que ele.
— Sinto muito, Matteo… ele devia ser uma pessoa terrível.
Raffaela segurou minha mão, fazendo carinho. Seu rosto tão
bonito me encarava, com pena da criança que eu tinha sido.
— Toda noite eu desejava que ele não estivesse lá quando eu
acordasse, mas ele estava, eu estava e ela estava. Minha mãe foi
muito forte quando conseguiu sair. Eu ficava na rua até mais tarde
para que ela conseguisse estudar… e nos viramos.
— Fico feliz por ela, e por você! E agora vou desejar que ele
morra, duas pessoas desejando a mesma coisa com certeza vai dar
certo.
Sorri para ela. Raffaela se aproximou mais, subindo em minhas
pernas. Puxei Raffaela por sua bunda, aproximando mais seu corpo
do meu, e a abracei. Seu cheiro de sabonete de pêssego me
chamou e afundei meu rosto em seu pescoço.
— Está tudo bem se você não quiser falar mais com sua família
ou se manter afastada pelo tempo que achar melhor, você não deve
nada a ninguém. — Raffaela me olhou, mordendo os lábios e
tentando impedir as lágrimas de caírem. — Eles devem desculpas,
não você…
— É difícil…
— Eu sei, mas eu vou estar do seu lado, Raffaela.
Raffaela desviou os olhos de mim, tocando a tatuagem de
Vênus em meu peito. Eu sabia que ela tinha curiosidade por ela.
— Doeu para fazer? — Seu dedo passava pelas linhas finas, que
já estavam mais claras do que quando eu fiz anos atrás. — Eu
sempre achei tão bonita… posso contar uma coisa boba?
— Sempre — falei, passando minhas mãos por suas coxas,
afastando a camisola.
— Eu achava que você tinha feito por mim, é ridículo, eu sei,
mas… eu nunca tinha visto uma Vênus gorda, a de Botticelli é
curvilínea como as mulheres eram antigamente, mas uma assim,
gorda… eu não tinha visto.
Seus olhos estavam na tatuagem e não em mim, os dedos ainda
passeavam pelas linhas. Meu pau começou a ficar duro embaixo
dela e Raffaela percebeu ao se mover um pouco.
— Quer saber a verdade? — perguntei baixinho, apenas para ela.
Raffaela concordou com a cabeça, subindo os olhos para o meu
rosto. — Eu sabia que queria Vênus, mas quando cheguei no
tatuador, eu não queria a mesma que diversas pessoas no mundo
todo tinham em seus corpos. E aí pensei em você… em como você
era linda, como era atraente e eu pedi que o tatuador me ajudasse a
pensar em uma tatuagem que mostrasse isso. Eu lembro como você
a olhou quando viu pela primeira vez… então, sim, Raffaela… eu fiz
pensando em você.
Raffaela se abaixou, dando um beijo em minha pele e moveu em
meu pau mais uma vez. Sua boca em minha pele parecia despertar
sensações que eu nunca tinha sentido em minha vida. Seus olhos
saíram do meu tórax e ela deu um sorriso.
— Você lembra que disse que queria foder meus seios? —
Raffaela girou o quadril em meu pau e eu quase vi estrelas. — A
gente pode tentar isso?
Joguei Raffaela na cama, e ela riu vendo o meu rosto feral,
enquanto eu a olhava, pensando em tudo que eu podia fazer com
seu corpo. Em tudo que nós poderíamos fazer juntos e como ia ser
sempre incrível, porque era com Raffaela.
E eu ficaria mais do que feliz em realizar cada uma das suas
fantasias.
41
Raffaela

Matteo ficou por cima de mim, os joelhos em volta do meu


corpo. Sua mão grudou as minhas, subindo para cima da minha
cabeça. Matteo me encarou com um sorriso de canto e uma das
suas mãos desceu até minha boca, moldando meus lábios com o
dedo.

— Você ainda vai me deixar louco, bella…


Ri, mas logo parei. Sentindo sua mão descendo por meu corpo e
parando na base da camisola. Matteo afastou minha calcinha,
passando o dedo por minha boceta, espalhando a lubrificação que
saia de mim, girando seus dedos antes de entrar em mim.
Respirei fundo, notando os bicos dos meus seios se arrepiando
de tesão. Tentei mover minhas mãos, mas Matteo segurou mais forte
e a força combinada com seus dedos se movendo dentro de mim me
fez apertá-lo dentro de mim.
— Você quer se soltar, bella?
— Per favore… — pedi, tentando liberar minhas mãos, mas
Matteo me apertou mais forte e em vez de pensar em como aquilo ia
deixar marcas em minha pele, eu só conseguia pensar em como
aquilo ia deixar marcas na minha pele.
Seus dedos continuavam me provocando em um vai e vem em
minha boceta, me masturbando até o limite, enquanto eu respirava
fundo, tentando ter algum estímulo em meus seios.
— Você é uma vagabunda, não é, Raffaela? Doida pra se tocar
enquanto eu te como com os meus dedos…
Nunca alguém tinha me vagabunda, mas o jeito que Matteo me
olhou ao fazer isso... Gemi, sentindo o orgasmo na base da barriga.
Matteo parecia saber o que ia acontecer, porque manteve o ritmo,
enquanto mexia em meu clítoris, me sobrecarregando de sensações.
Gozei gritando seu nome, e Matteo finalmente me soltou,
enquanto minhas pernas tremiam.
— Tira a camisola, Raffaela.
Encarei seu corpo, o pau marcado na cueca, mostrando o
quanto era grande e aquilo já tinha estado dentro de mim. Respirei
fundo, tentando me recuperar do que tinha acabado de acontecer,
mas Matteo não parecia querer esperar.
Suas mãos subiram por meu corpo, tirando a camisola,
enquanto delicadamente tocava meu corpo, tocando cada espaço de
mim com a paixão e o desejo que eu podia ver em seus olhos.
— Eu mandei tirar, mas você não parece querer colaborar
comigo, não é?
— Eu só estava respirando, angelo…
Matteo sorriu, beijando meu corpo, por onde suas mãos
passavam, e eu segurei sua cabeça, enquanto ele começava a
chupar meus seios com vontade. Matteo mudou sua cabeça de lugar,
lambendo o vale entre meus seios, me deixando molhada para ele.
Encarei enquanto ele se ajoelhava na cama, ficando sobre mim
e olhando para meu corpo parecendo maravilhado. Fiquei esperando
por seu próximo movimento, mas eu queria fazer alguma coisa.
— Eu posso te ajudar?
— Abaixa minha cueca, mas não toca no meu pau, se você tocar,
eu vou gozar no seu rosto.
Olhei para ele, mordendo o lábio. Desde que aquilo não fosse no
meu cabelo, era uma coisa a se pensar… quer dizer, eu queria
experimentar de tudo.
— Caralho, Raffaela, não me olha assim.
Segurei a risada e o ajudei, abaixando a cueca. Seu pau saltou
do espaço confinado, e eu lambi os lábios, imaginando como seria
tê-lo em minha boca.
— Eu vou colocar meu pau entre os seus seios e você vai fechá-
los em volta do meu pau, ok? E eu vou me movimentar como eu faria
na sua buceta apertada — Matteo tremeu e eu fiz o mesmo, sentindo
minha boceta molhada, escorrendo por minhas pernas.
Matteo enfiou o pau entre o vale dos meus seios e me olhou,
comandando que eu fizesse o que ele mandava. Apertei os seios,
segurando seu pau no local, enquanto ele começava a se
movimentar espalhando seu pré-gozo por meu corpo.
A visão de seu pau se movimentando era gostosa demais, e
quando ele esbarrava nos bicos dos meus seios, eu sentia minha
boceta se apertando com a vontade de tê-lo dentro de mim.
Continuei apertando meus seios, vendo seu quadril se mover,
enquanto nossos gemidos se misturavam.
A sensação era deliciosa, eu apertava meus seios com mais
força e prendendo seu pau, dominando o espaço. Os olhos de
Matteo giravam e eu me sentia poderosa.
— Você é tão gostosa… esses seus seios me apertando é uma
perdição…
Comecei a sentir minha pele incomodada pela falta de
lubrificação no espaço entre os seios, soltei um dos seios e Matteo
os segurou apertado, mexendo nos bicos para me estimular. Aquilo
era gostoso demais.
Passei a mão por minha boceta molhada e subi a mão,
segurando seu pau e enchendo-o com os sucos que escorriam por
minha perna, me lubrificando e que agora lubrificavam o pau grosso
de Matteo. Aquilo fez com que Matteo metesse mais rápido no vão
entre meus seios.
— Porra, Raffaela, como você é gostosa. Aperta mais esses
peitos pra mim, eu quero eles apertados como a sua buceta é…
Juntei os seios de novo, brincando com os bicos dos meus seios
como ele estava fazendo. Respirei fundo, sentindo vontade de
colocar a língua para fora e fiz, apenas para saber como seria e o
jeito que Matteo ficou… aquilo era insano.
Matteo segurou meu rosto, tentando aproximar seu pau da
minha boca, mas não tinha como. Não demorou muito para que ele
me fizesse soltar os seios e saísse de mim. Puxou minha calcinha
para o lado, entrando em mim com tudo e queimando minha boceta
com a sensação do seu pau todo dentro de mim um dia depois de ter
perdido a virgindade.
Sua mão não deixou meu rosto, enquanto ele continuava
metendo. Prendi as pernas em volta do seu quadril, sentindo a
sensação dele totalmente fora do controle dentro de mim e o prazer
que aquilo me causava era demais.
Meu orgasmo, que já estava próximo, explodiu enquanto eu
gritava e Matteo fez o mesmo, tirando o pau e gozando na minha
coxa.
— Essa buceta apertada vai ser minha morte, bella…

Me ajeitei na cama e Matteo fez o mesmo, deitando ao meu


lado. No silêncio, e sentindo o gozo quente em minha perna, percebi
que não tínhamos usado uma camisinha, o que era burrice. Sim,
burrice de principiante minha. E uma burrice gigantesca dele. Tinha
certeza que nenhum de nós dois queríamos sair de um
relacionamento falso com um filho muito verdadeiro.

— A gente não…
— Eu sei… quando a gente levantar, eu te levo pra comprar um
remédio…
Respirei mais aliviada, levantando correndo para o banheiro.
Ouvi os passos de Matteo, mas gritei para ele.
— Fica aí, estou fazendo xixi, quando eu entrar no chuveiro te
chamo.
Não demorou muito para que ele estivesse lá dentro junto
comigo, me olhando enquanto a água caia em meu corpo. Esses
dois dias trancada dentro de uma casa com ele não tinha feito nada
de bom para mim, descobri coisas que seriam impossíveis de
esquecer e só confirmei que a paixão que eu sentia por ele era pior
do que eu imaginava.
Eu amava Matteo e ele não era meu.
42
Matteo

Entrei na farmácia, olhando para todos os lados. O ambiente


branco deixava claro que aquilo era apenas uma continuação de um
hospital, me deixando com a sensação de estar doente.
Parei em frente ao balcão, os olhos da atendente me julgando
de uma maneira que nunca pensei que fosse ser – e olha que eu já
era um homem criado de trinta e três anos. Por algum motivo, aquela
senhora parecia saber exatamente o que eu procurava.
— Boa tarde — falei, encarando seu rosto, deixando claro que eu
não me envergonhava de ser um cara que transava.
— Boa tarde, o que precisa? Tem receita?
— Não, eu preciso de uma pílula do dia seguinte.
A mulher deu uma risada e se virou, começando a procurar o
produto. Olhei para o lado, encarando as camisinhas que estavam
expostas, peguei alguns pacotes para repor o que tinha sido usado
em casa e, quando me virei, a senhora tinha uma das sobrancelhas
levantadas, segurando o remédio.
— Obrigado, vou até o caixa pagar.
O cara que atendeu, ao contrário da senhora, não olhou com
reprovação, mas algo parecido com orgulho, um orgulho masculino
que era quase ridículo para mim. Você está feliz porque outro cara
transou?
Passei a mão na testa e senti o gelado da embalagem de
remédio. Era besteira achar que tinha chances de Raffaela estar
grávida, mas, por algum motivo, minha cabeça formou a imagem de
sua barriga crescendo até um bebê enrolado em um cobertor azul.
Balancei a cabeça, aproximando meu celular para poder fazer o
pagamento do remédio e das camisinhas. Quando saí, Raffaela
parecia adormecida de encontro ao vidro, a boca estava aberta e ela
parecia adorável.
Abri minha porta com cuidado, com medo que ela acordasse.
Coloquei o remédio no banco de trás para impedir que ele fosse
atingido pelo sol. Liguei a música baixinho e, quando dei partida no
carro, Raffaela abriu os olhos, virando para mim.
— Acho que eu dormi.
— Você está cansada… quer tomar o remédio já?
— Acho que é melhor, né? Quanto mais rápido, mais chances de
ter efeito.
Entreguei uma garrafa de água que lembrei de pegar antes de
sair da farmácia para Raffaela e puxei o pacote com o remédio.
Raffaela o abriu e sorriu.
— Você está muito esperançoso, não é? Eu vou pro meu
apartamento dormir no chão, Matteo… Não vai ter mais sexo por
alguns dias com você.
— Eu poderia dormir no chão com você, Raffaela.
Eu realmente queria dizer aquilo, Raffaela me olhou e deu um
sorriso triste, antes de engolir o remédio e tomar a água para ajudar
a descer. Estávamos parados no mesmo lugar e decidi sair dirigindo.
Não voltaríamos para minha casa, sua mala já estava no porta-
malas do carro. Coloquei a mão na perna de Raffaela e dei um leve
aperto, deixando minha mão ali.
Eu sabia que o dia para ela seria difícil, seria a última vez
entrando na casa de seus pais como uma moradora, e ainda teria
que enfrentar sua mãe. Raffaela colocou sua mão sobre a minha,
entrelaçando nossos dedos.
— Você vai querer ir para a sua casa ou a casa dos seus pais
primeiro? — questionei, virando uma ruela.
— Acho que… prefiro ir até a casa deles, preciso pegar o meu
colchão. Depois eu vou comprar algumas coisas novas, mas primeiro
vou ter que me virar com o que já tenho… sei que a antiga moradora
deixou alguns móveis na casa e vou ver o que ainda dá pra ser
usado.
Dei uma risada.
— Eu montei minha casa inteira assim, sabia? Com coisas que as
pessoas iam abrindo mão porque já estavam velhas, mas na verdade
só precisavam de renovação… posso te ajudar se quiser. E claro,
sempre tem lojas que vendem coisas pelo menor preço.
— Vou gostar disso, sim… a gente pode marcar para um dia em
que você não esteja tão ocupado, afinal, eu estou de férias… vai ser
bom.
— A gente pode ir no horário do meu almoço, o escritório não fica
tão longe do centro comercial.
Parei o carro em frente à casa de Anna e Raffaela deu um longo
suspiro. Segurei sua mão e ela virou de frente para mim. Embora
tivesse vinte e nove anos, pela primeira vez, ela parecia apenas uma
criança com medo.
— Vamos fugir? Podemos ir para qualquer lugar do mundo, me
diz um lugar que sempre quis ir. — Raffaela parecia nervosa, sua
perna tremia e seus olhos mostravam um certo desespero.
— Vamos para o Egito, sempre quis conhecer…
— Você é maluco, eu estava pensando em voltar para sua casa e
me esconder lá, mas eu não posso fazer isso, não é?
— Acho que não… eu vou entrar com você, não vou te deixar
carregar nada.
— Muito obrigada, você é muito gentil. Depois de ter me
quebrado, é o mínimo que você pode fazer.
Raffaela virou para a janela e nós dois assustamos com sua
mãe parada pronta para bater. Raffaela virou para mim, e eu apertei
sua mão três vezes, tentando passar para ela, uma força que eu
sabia que ela não tinha para encarar seus pais.
Saímos do carro e Raffaela cumprimentou a mãe com um
abraço, enquanto eu a esperava, parado atrás das duas. Anna
parecia culpada, e seu rosto mostrava pesar, mas Raffaela parecia
destruída.
— Eu vim pegar minhas coisas… se estiver tudo bem.
— Claro, figlia…
Subimos em direção ao quarto e Raffaela fechou a porta assim
que entramos. Seus ombros pareciam caídos e a puxei para perto de
mim, circulando minhas mãos em volta de seu corpo, fechando-a em
um casulo.
— Por que é tão difícil amar alguém, Matteo?
Dei um beijo em sua cabeça, sabendo que ela não precisava de
palavras de conforto, mas de abrigo e era isso que daria para ela.
Enquanto eu a segurava, pensando na sua pergunta… tudo que eu
podia pensar era que naquele momento parecia tão certo e tão fácil
amar alguém.
Raffaela segurou meus braços, que a apertavam, e deu um beijo
em minha mão. Meu coração parou de bater por um segundo e eu
senti um frio na barriga. Sim, amar alguém parecia muito fácil.
43
Raffaela

Abri a porta, sentindo o cheiro de casa fechada. Matteo estava


bem atrás de mim e começou a tossir. Virei para ele, revirando os
olhos. Não estava tão ruim assim.
As paredes estavam amareladas pelo tempo, e da sala eu podia
ver uma velha poltrona com um estofado de flores, uma mesa alta de
madeira branca ao seu lado. Não tinha mais nada no cômodo, mas,
ainda assim, ele parecia velho.
— Há quanto tempo ninguém vive aqui? — Matteo questionou,
tentando acender a luz.
— Ela disse que a última moradora morou aqui há uns dez anos,
eles não tinham interesse em fazer nada da casa, por isso venderam
tão barato.
— Isso é um modo de ver, mas ok… Parece que você não tem
luz, vou aproveitar que está cedo e encontrar alguma venda aberta e
te trazer velas. Você viu se era algum problema de fiação?
— Sim, tem que pedir pra companhia ligar, mas parece que eles
só trabalham durante a semana, então, velas são uma boa opção.
Enquanto você desce, eu vou tentar dar uma limpada nas coisas
aqui.
Matteo saiu, não prestando muita atenção em mim e eu preferia
assim. Afinal, seria bom que ele não visse as lágrimas em meus
olhos. Um apartamento velho, com poeira para todo o lado,
preenchido apenas com a luz do sol não devia parecer tanto um local
seguro, mas parecia e era a minha casa.
Andei até a grande janela da sala e a abri, permitindo que o
vento gelado entrasse no local. Virei para a porta, sentindo vontade
de dançar. Eu conseguia ouvir a música tocando do lado de fora,
alguns bares ficavam próximos na rua e aquela ruela era conhecida
por ser um ponto de encontro para viajantes que gostavam da
bagunça.
Continuei minha expedição, entrando nos cômodos e
procurando o que eu poderia manter da antiga moradora, torcendo
para que nenhum morador indesejado aparecesse… como um rato
ou um fantasma.
A cozinha tinha um armário antigo e quebrado, o que mostrava
como o tempo tinha danificado as coisas no apartamento e que
provavelmente eu nem deveria mudar tão rápido, mas, mesmo
assim, não tinha espaço para mim na minha antiga casa ou na de
Matteo – eu já tinha tomado seu espaço por tempo demais.
Entrei no primeiro quarto, o quarto principal, que não tinha nada
além de uma cômoda antiga e gigantesca. A janela era maior que a
da sala, iluminando todo o ambiente com a luz do sol que invadia o
espaço tocando cada canto e mostrando cada mínima sujeira que
estivesse visível ao olho humano.
Imaginei as paredes pintadas de branco, com tons azuis, com
minhas milhares de telas não terminadas penduradas por ali,
recebendo aquela luz. Parecia certo ter aquele espaço para me
dedicar ao que amava fazer, mesmo que não desse em nada e fosse
apenas um quarto para que eu pudesse colocar para fora cada
emoção minha.
O grande banheiro ficaria só para mim, então, qualquer pessoa
que visitasse não poderia entrar ali. Fechei a porta, pensando em
como mover a cômoda para o outro quarto sozinha.
Ouvi o barulho na porta e corri para a sala, encontrando Matteo
levantando o meu colchão sozinho, enquanto carregava uma sacola
com velas na mão. Ele estava no final da escada e olhou para cima,
me encarando. Antes que eu pudesse correr para ajudá-lo, Matteo
sorriu para mim e deixou o colchão voltar para o fim da escada.
Meu coração se apertou, doendo por um sentimento que eu
achava que não podia florescer entre nós. Me mexi, correndo para
ajudar Matteo, que parecia bobo, encarando o colchão deitado na
escada.
— Eu acho que você devia ter pensado melhor e chamado
alguém da rua para te ajudar.
Matteo revirou os olhos e me encarou.
— Eu não ia chamar qualquer pessoa para trazer o colchão, sou
um cara forte, por mais que não pareça.
Desci até ele, ajudando a levantar o colchão que parecia mais
leve do que realmente era. Ainda nem tínhamos onde colocá-lo, mas
eu ia limpar antes de encostar no chão.
Subimos a escada, puxando o colchão junto conosco. Minha
cama seria trazida outro dia por Rocco em seu carro. Quando
entramos na sala, Matteo me olhou, encostando o objeto na parede.
— Você ainda não limpou nada?
Dei de ombros, sentindo seu julgamento.
— Eu estava explorando a casa, a cozinha está péssima, vou
precisar de um armário, o quarto… é ok… e o banheiro é bem
grande.
— Você devia ter me contado que só estava trazendo uma
vassoura, vou ver se alguém tem um balde de água e panos para
emprestar, depois damos um jeito de lavar para devolver.
— Você é um anjo — falei, me aproximando e dando um beijo em
seu rosto.
Matteo me puxou para ele, dando um beijo em minha boca,
mostrando que eu não podia fugir e fingir que o que tinha acontecido
em sua casa não tinha acontecido. Era real e era isso que
machucava.
Matteo saiu correndo e eu peguei a vassoura, pensando em
deixar limpo apenas meu quarto, afinal, seria ali que eu passaria boa
parte da noite. O segundo quarto, que seria o meu, era menor que o
outro e sem banheiro, mas o importante era a minha pintura.
No segundo quarto não batia tanto sol, deixando o espaço em
uma penumbra mesmo com o sol ainda brilhando do lado de fora. O
pó subia enquanto eu ia passando a vassoura, atacando minha
alergia.
Matteo apareceu na porta do quarto com a testa franzida e
colocou o balde no chão. Encostando o corpo no batente da porta,
ele me encarou e perguntou:
— Por que você não vai usar o outro quarto? Tem muito mais luz,
e um espaço muito maior, parece até que tem um armário embutido.
— Gostei mais daqui…
— Você sabe que você é completamente louca, não é?
Me aproximei dele, e Matteo se deitou um pouco sobre mim.
— Posso te contar um segredo? — questionou. Senti a energia
do quarto mudar e confirmei com a cabeça. — Eu estou doido pra te
foder mais uma vez, mas você precisa me contar se está tudo bem
ou se preciso esperar até amanhã… e se eu tiver… você vai pegar
suas coisas e voltar para a minha casa comigo. Então, Raffaela…
me diz o que vamos fazer? Aqui ou na minha casa? Você sentada na
minha cara ou eu te fodendo contra a janela enquanto qualquer um
te escuta gritar e a gente começa a sua mudança com o pé direito?
Meu corpo inteiro congelou, senti meus seios pesados de tesão
e tentei fugir dos olhares penetrantes de Matteo, mas não tinha
como. O homem estava em uma missão.
44
Matteo

Raffaela não tinha parado de falar sobre o que faria na casa dela
durante todo o caminho. Conseguia inclusive ouvir agora sua voz em
minha cabeça, mesmo que ela tivesse cochilado encostada na
janela. Estacionei o carro em frente à minha casa e notei que o sol
que antes iluminava todo o céu, agora já se escondia atrás da minha
casa.
Olhei para Raffaela, que não parecia preocupada em acordar,
seu ressonar baixinho. Puxei o celular, encarando a tela que
mostrava uma foto dela na minha cozinha lavando a louça. Senti a
pontada que vinha me acompanhando nos últimos tempos e respirei
fundo. Abri a câmera e tirei uma foto para depois tirar sarro dela.
— Stella, vamos… chegamos em casa.
Raffaela resmungou, afastando minha mão de seu cabelo e
virando para o lado, seu pescoço ficou em uma posição estranha e
ela fez uma careta. Seus olhos abriram procurando pelo motivo da
dor e quando percebeu que eu a olhava, Raffaela abriu o maior
sorriso do mundo.
— Eu tenho uma casa, Matteo.
Tentei parar o sorriso que nascia em meu rosto, mas não
consegui. Ela estava tão feliz que era contagiante e mesmo que eu
não tivesse nada a ver com aquele sorriso, era bom demais poder
fazer parte da felicidade dela.
— Vamos, polpetta… nós precisamos de um banho.
Raffaela se espreguiçou dentro do carro, levantando os braços e
batendo no teto com as mãos.
— Juntos? — questionou, quando me pegou olhando para seus
seios que quase pulavam para fora da regata.
Dei uma risada baixa, sentindo meu pau ficando duro dentro da
calça jeans. Raffaela baixou os olhos dos meus para meu pau. Abri a
porta, sentindo o vento frio batendo em meus braços e esperei por
Raffaela, que saia do carro.
— Uh, está frio demais! Por que você me deixou sair de regata?
— Eu não tenho muito controle sobre o que você faz, Raffaela…
Raffaela revirou os olhos e correu para a porta de casa, fechei
as portas e fui atrás dela, vendo-a esfregar os braços e me
encarando como se eu fosse o culpado do frio.
Dentro da casa, o vento abafado esquentou a pele e eu a puxei
para mim, esfregando seus braços, enquanto a abraçava, tentando
aquecê-la melhor do que ela fazia antes. Encostei minha cabeça
entre o ombro e o pescoço de Raffaela e dei um beijo em sua pele
gelada.
Raffaela passou os braços pelos meus, nos deixando presos.
Suas unhas seguravam meus braços no lugar. Fechei os olhos
sentindo sua presença tão grande em mim que quase era como se
ela fosse dona de mim. Raffaela virou de frente para mim.
— Eu não agradeci, não é? — perguntou com a voz baixa e
sensual. — Por ter me ajudado com a semi mudança…
Raffaela passou seu rosto pelo meu, suas mãos subiram por
meu corpo por baixo da camiseta, parando por mais tempo na minha
barriga. Raffaela se aproximou de meu rosto, tocando seus lábios em
minha pele, espalhando pequenos beijos, enquanto tirava a mão da
minha pele.
Puxei Raffaela para mais perto de mim, colando os nossos
corpos, e abri os olhos, apenas para ver em seu rosto refletido o
sentimento que estava me consumindo nos últimos dias. Aproximei
nossas bocas e falei:
— Raffaela… como eu vou fazer… como eu vou ficar…
Raffaela grudou nossas bocas antes que eu pudesse terminar
de falar e invadiu minha boca com a sua língua, me tomando em um
beijo. Puxei suas pernas, a levantando do chão. Caminhei com
Raffaela pela casa, enquanto não parávamos de nos beijar. Suas
mãos puxavam minha camiseta e, sem conseguir olhar para onde eu
ia, acabei batendo na mesa. Sua risada quase me fez largar seus
lábios, mas a suguei de volta para o beijo. Caminhando como se não
tivesse quebrado algo, sem tempo para nada que não fosse ela.
Raffaela não largava de mim, rebolando em meu colo. Eu queria
rasgar suas roupas, colar seu corpo a mim permanentemente, tudo
para que eu nunca precisasse deixá-la.
— Matteo… — Meu nome parecia um canto em seus lábios,
quando ela se afastou de mim.
Abri meus olhos, sentindo meu pau babando por ela. Raffaela
tinha os seios cheios, os bicos marcados em sua regata. Mordi o bico
que estava bem de frente para mim e Raffaela jogou a cabeça para
trás, gemendo.
— Matteo… mais forte.
Apertei seu seio em minha boca, puxando-o com os dentes por
cima da blusa. Desci seu corpo para o chão com cuidado, e quando
vi que Raffaela estava segura o suficiente para que eu a soltasse,
comecei a despi-la.
Afastei suas pernas, puxando a calça jeans que ela usava.
Passei as mãos por sua pele, subindo de encontro a sua boceta que,
como eu imaginava, estava melada por mim.
— Você está tão molhada, Raffaela, que se eu quisesse comer
você agora mesmo, eu não teria problema nenhum em dobrá-la
sobre essa bancada e te foder gostoso.
Passei o dedo por seu clitóris, movendo o dedo de cima para
baixo, provocando a sua entrada. Raffaela se grudou em meu braço,
e senti sua boceta se contraindo de encontro a minha mão, sentindo
o líquido vazar e molhar meus dedos.
— Porra, Raffaela.
Puxei sua mão, tirando-a do êxtase do orgasmo, em direção a
minha cama. Raffaela me encarou assustada. Deitei na cama e puxei
para cima de mim, seu corpo bateu com tudo no meu e, por estar
sensível do orgasmo, Raffaela gemeu.
— Senta na porra da minha cara!
Raffaela arregalou os olhos, podia ver a preocupação em seu
rosto. Seu corpo se afastou um pouco do meu e eu a puxei de volta,
segurando suas coxas com força, marcando a pele com meus dedos.
— Matteo… eu sou… não acho que… eu vou te sufocar…
Sorri para ela, podia sentir o sorriso sacana crescendo em meu
rosto.
— Raffaela, você vai sentar na minha cara, eu quero me afogar
com a sua buceta. Então, por favor, senta na minha cara.
Raffaela engatinhou até o meu rosto e, com cuidado e
preocupação, sentou em minha cara com sua boceta aberta para
mim. Aquilo era o paraíso. Puxei seu corpo em direção a minha
boca, apertando suas coxas e dando a primeira linguada em sua
boceta aberta e deliciosa de encontro a mim.
Os sucos de seu último orgasmo ainda estavam ali, molhando
meu rosto. Raffaela ainda parecia insegura e por isso, continuei
brincando com sua boceta. Apertando sua coxa, tentando fazê-la se
sentir segura.
Sua boceta molhada parecia o paraíso, me sufocando, enquanto
eu estava pronto para atravessar o oceano a nado por aquela
mulher. Raffaela parecia mais confiante, começando a rebolar
devagar e senti meu pau apertado na calça jeans, mas eu não
pediria para Raffaela virar.
Olhei para cima e pude ver sua mão começando a tocar seu
seio, enquanto se movia para frente e para trás. Enfiei minha língua
em sua boceta, sentindo Raffaela esfregar o clitóris no meu nariz
com vontade.
Sua perna começou a apertar minha cabeça e eu conseguia
sentir meu pau bombeando. Apertei as coxas de Raffaela mais forte
e ouvi seu grito abafado pelas pernas que apertavam minha cabeça.
Eu podia sentir o quanto aquela posição estava sendo gostosa
para ela, com seu corpo em um vai e vem que parecia o paraíso para
ambos. Sua boceta inchada na minha cara estava tão lubrificada que
parecia escorrer.
Raffaela olhou para baixo, para mim, enquanto continuava
rebolando em meu rosto, espalhando sua lubrificação por minha cara
e eu sorri, passando a língua por sua boceta e brincando com ela. Eu
podia sentir que ela estava perto, apenas por como ela grudou no
travesseiro e se movimentou mais rápido.
Seu corpo tremeu e suas pernas me apertaram mais forte,
enquanto seu corpo gozava, molhando meu rosto. Raffaela não
parou de se mexer, até que tivesse terminado e senti meu pau indo
para o mesmo caminho, enquanto eu gozava junto com ela na minha
calça.
Raffaela respirou fundo e me encarou, seu peito subindo e
descendo. Seus olhos estavam nublados pelo tesão e pelo orgasmo.
— Isso… foi… — Raffaela se moveu, saindo de cima do meu
rosto. — insano.
— Acho que eu tenho minha nova posição favorita — respondi.
Raffaela se abaixou, me beijando, espalhando por seu rosto o
orgasmo que tinha acabado de ter.
Eu não podia deixar aquela mulher escapar.
45
Raffaela

A porta do elevador se abriu. Nicoletta subiu os olhos dos papéis


que analisava e me recebeu com um grande sorriso. Retribui, saindo
de dentro do elevador e caminhei em direção a sua mesa.
— Raffaela!
— Nicoletta, como você está? Quer sair para beber comigo
qualquer dia? — perguntei, enquanto ela dava a volta na mesa para
me abraçar.
— Não.
Ri e olhei para a porta fechada de Rocco. A empresa parecia
silenciosa demais para que ele estivesse aqui. Desde que o
casamento com Atena voltou ao normal, meu irmão fazia barulho
demais, seja por causa de Ceci que corria o escritório todo ou por ele
estar feliz demais.
— Onde está Rocco? — questionei, voltando meus olhos para a
senhora que me ajudava em tudo.
— Saiu com a sua mamma… parece que a Ceci queria comer
alguma coisa e os dois foram atrás.
Mentiria se dissesse que aquilo não tinha doído. Para eles era
como se nada tivesse acontecido. Minha mãe nem ao menos tentou
falar comigo depois do que aconteceu em sua casa. Rocco ligou
duas vezes para Matteo, mas não falou comigo e meu pai nem
mesmo parecia preocupado.
— Então… ninguém aqui, certo?
— Certo, precisa de algo? Posso te ajudar?
— Na verdade, eu estava torcendo para que isso acontecesse…
preciso tirar meus quadros daqui.
— Todos? — Nicoletta me perguntou espantada.
— A maioria, pelo menos. Lorenzo vai me ajudar… estou
terminando de me arrumar na minha casa e preciso deles, sabe…
agora eles vão ter o lugar certo.
Nicoletta colocou a mão sobre meu braço e sorriu.
— Eu estou muito feliz por você, Raffa. Você merece seu próprio
espaço.
Abracei Nicoletta e ela me acompanhou até a porta da minha
sala. Destranquei a porta e ali parecia quase abafado por estar
fechado. Agora, no entanto, com os quadros fora do espaço, eu
poderia deixar tudo aberto para que fosse cuidada enquanto
estivesse fora.
Lorenzo apareceu na porta, batendo com os dedos na madeira e
entrou. Seus cabelos estavam maiores do que da última vez que o vi,
a camisa verde realçava seus olhos castanhos e ele parecia feliz,
bronzeado também.
— Finalmente vou ver algumas das suas obras, não é?
— Parece que sim.. — falei sorrindo, enquanto ele me abraçava.
— Não tem tantas aqui, talvez umas três ou quatro?
— Sim, a última foi aquela que você deixou escondida embaixo
da mesa, mas também tem seus materiais dentro das gavetas.
— Por que todo esse mistério, Raffaela?
Nicoletta me encarou, enquanto eu pensava em como responder
que eu não devia pintar em casa e nem aqui. Lorenzo levantou as
mãos e concordou com a cabeça.
— Ok, já entendi, assunto delicado.
Abaixei atrás da mesa, pegando o quadro e toquei a tinta seca
que eu tinha começado a aplicar. Era quase uma carta de amor que
eu não sabia como traduzir em palavras, e ainda tinha tanta coisa
para ser colocada ali.
— Esse quadro me lembra alguém… — Nicoletta falou baixinho.
Temi que ela tivesse percebido o que eu notava também, mas
olhei para ela e ela estava com uma paisagem que eu tinha feito há
uns meses.
— Quem?
— Meu esposo… posso ficar com ele? Combina com aquele
outro que você me deu há uns anos.
— Claro, Nicoletta… você deve ser a pessoa que mais tem
quadros meus.
Nicoletta agradeceu e me deixou sozinha com Lorenzo na sala.
Ele estava guardando os pincéis de qualquer jeito dentro da caixa e
eu quase quis chorar. Me aproximei dele, tirando os materiais
delicados de sua mão.
— Não pode guardar assim, machuca todas as cerdas do pincel.
— Desculpa, não sabia que tinha um jeito certo de guardar um
material que eu nunca usei além de uma sala de aula quando tinha
cinco anos.
Revirei os olhos e comecei a arrumar do jeito certo. As tintas já
estavam guardadas. Lorenzo ficou em silêncio, enquanto eu
continuava guardando e senti que ele queria falar alguma coisa,
então me virei para ele.
— Fale, você está me assustando me encarando assim.
— Eu só queria saber se é verdade que você está junto com o
Matteo ou se… se é sobre aquele negócio de namorado falso.
Encarei a parede, apertando um pincel na mão. Se eu estava de
verdade com ele? Sim. Se era sobre o namoro falso? Também,
mesmo que para mim não fosse mais. Lorenzo ainda esperava pela
resposta e por isso voltei a olhar para ele.
— Eu… ele é meu namorado falso, Lorenzo… você é o único que
sabe disso.
— Raffa, você sabe que não precisa disso e… eu já vi como esse
cara te trata, eu ouvi ele falando com você um dia desses quando
estiveram aqui e tudo parecia uma grande brincadeira, e eu vi nos
seus olhos que você gosta dele de verdade, então por que se
submeter a esse tipo de situação se você pode ter alguém de
verdade ao seu lado?
— Desculpa, Lorenzo, mas eu não vejo como isso pode te afetar.
Isso diz respeito apenas a mim e ao Matteo, ele está me ajudando
como uma boa pessoa e só… eu estou saindo de casa, a farsa não
vai durar muito mais.
Lorenzo colocou as mãos na cintura e me encarou.
— Você vai sair machucada quando esse cara voltar a sair com
as meninas magras e que parecem modelo que ele sai, porque eu
tenho certeza que esse é o estilo dele. Porque é isso que vai
acontecer, Raffaela, e eu vou estar aqui pra te avisar que não dá
para esperar outra coisa.
Lorenzo me olhou de cima a baixo, com uma expressão que eu
nunca tinha visto, mas que de repente começou a martelar em minha
cabeça como se sempre tivesse sido assim: nojo.
Senti a pontada no peito, aquilo não era sobre se preocupar
comigo, mas sobre achar que eu não era suficiente para Matteo, ou
para caras como ele mesmo.
— Lorenzo, você pode me deixar sozinha?
— O quê?
— Eu estou pedindo pra você me deixar sozinha. Eu não vou
ficar perto de alguém que acredita que precisa me diminuir para que
eu entenda algo que eu já sei. Matteo não vai ficar comigo, mas não
é por causa do meu corpo. Matteo não vai ficar comigo porque não
está preparado para um relacionamento, afinal, ele me comeu por
dias e não reclamou. Eu quero você fora da minha sala.
— Raffaela…
— Eu estou pedindo para você sair enquanto eu ainda sinto um
pingo de respeito por você e posso te deixar trabalhando na empresa
da minha família, — Lorenzo me encarou e abriu a boca para falar
alguma coisa, mas eu o parei. — eu posso não ser o Rocco, mas eu
ainda sou uma Giordano e essa empresa é minha. Saia daqui e não
me encare de novo. Ou você está demitido.
Olhei para seu rosto que parecia assustado que eu pudesse
estar mesmo dizendo aquilo, mas Lorenzo acenou com a cabeça e
saiu da sala, batendo a mão na parede.
Sentei no sofá e abaixei a cabeça. Meu corpo estava todo
dolorido, pensando se era assim que todos me viam, se era assim
que eu devia me sentir: sem direito a afeto, seja como for, amizade,
amor ou família.
Massageei meu coração, sentindo as lágrimas caírem em meu
rosto. Sim, eu era gorda. Será que isso me tornava automaticamente
uma pessoa que não merecia um pouco de amor por causa do meu
corpo gordo?
Encarei o vaso na mesa do sofá e o peguei na mão,
arremessando-o contra a parede. Ouvi o estilhaçar enquanto sentia
meu coração quebrando. Eu estava cansada, dolorida por um
sentimento que eu nem sabia que existia.
Levantei, arrancando o salto que usava e o jogando do outro
lado da sala. Peguei outro vaso que tinha flores mortas e o joguei no
chão, precisando extravasar a dor que era quase palpável.
Minha mãe não me amava. Meu pai não parecia ligar. Meu irmão
estava tão focado nele que não me notava.
Peguei um globo de neve com a Torre di Pisa e o joguei junto
com os estilhaços no chão, sentindo como se fizesse cortes em
minha pele. Joguei outros juntos e olhei para a bagunça que aquele
lugar parecia, quebrando o que eu encontrasse pela frente
Eu amava alguém que não me amaria.
Virei a mesa que ficava ao lado do sofá no chão quando parecia
não ter mais nada para quebrar.
Olhei para o quadro que eu tinha feito para minha mãe, um
quadro bobo. Era uma imagem nossa, eu ainda um bebê em seus
braços, quando eu não podia decepcioná-la. Peguei o quadro na
mão e o segurei com ódio, comecei a batê-lo na cadeira, torcendo
para que ele rasgasse como eu me sentia machucada.
Quebrada.
Destruída.
Cansada.
Ouvi a porta se abrindo e braços fortes me agarraram,
afastando-me da bagunça que eu fazia. Comecei a me debater,
tentando afastar quem estivesse me segurando. Rocco me apertou
mais forte, impedindo que eu machucasse a nós dois.
— Raffa, amore mio, sorella mia… — eu conseguia ouvir agora o
som do meu choro que rompeu o surdor que tinha se instalado em
minha mente. — Pare, per favore, você está me matando.
Me agarrei a ele. Sentindo meu irmão me abraçar e parando
uma dor que estava guardada há anos. Meu choro diminuiu
enquanto ele fazia carinho em minha cabeça como fazia quando eu
era criança e tinha medo de alguma coisa.
Olhei para seus olhos e Rocco tinha os olhos tão cheios de
lágrimas quanto os meus.
— Ti amo, Raffaela. Ti amo. Me perdoa, per favore.
46
Matteo

Giacomo estava sentado de frente para mim. Ele ficava me


cutucando com o pé e levantando as sobrancelhas, tentando me
provocar durante a reunião. Tudo porque eu tinha dito que Raffaela
viria para cá e eu ia com ela comprar alguns móveis usados para sua
casa.
Nossa chefe continuava falando sobre algumas mudanças, mas
nem Giacomo e nem eu, por sua culpa, podíamos prestar atenção no
que era dito, o que significava que eu teria que pegar as anotações
com alguém.
Ouvi o fim da reunião e levantei, deixando a sala e sendo
seguido por um Giacomo muito feliz por poder me encher o saco.
Abri a porta da minha sala e acendi a luz.
— Não tem o que fazer?
Giacomo se jogou sobre a cadeira em frente à minha e sorriu,
com a mão na barriga.
— Na verdade, tenho muito o que fazer. Mas nada parece melhor
do que vir aqui saber sobre o que isso quer dizer… você está
apaixonado?
Sentei e abri o terno, me movimentando melhor. Me dobrei sobre
a mesa, encostando os dois cotovelos nela e encarando meu amigo.
— Quer ouvir a verdade? Vem aqui… — pedi, o chamando com o
dedo para mais perto, como se fosse contar um grande segredo.
Giacomo se aproximou sorrindo como uma criança que ganha
um presente no natal. Suas mãos se uniram e ele se dobrou sobre a
mesa como eu tinha feito. Molhei o dedo na água que estava perto
de mim e enfiei no seu ouvido.
— Porra, Matteo! Eu sou seu amigo, precisa disso?
Giacomo ficou mexendo na orelha, tentando tirar a água. Ri e
me afastei, encarando o globo de neve que ficava sobre minha
mesa. Raffaela. Por que eu não conseguia parar de pensar nela?
Encarei meu amigo e pensei em tudo que Raffaela e eu
tínhamos passado nos últimos dias. Eu tinha a deixado em sua casa
todos os dias cedo e a pegado de volta à noite, mas hoje ela queria
dormir lá, por isso, eu estava pensando na logística de ir até a minha
casa e pegar minhas roupas para poder ficar com ela.
— Essa sua cara de babaca apaixonado… eu te conheço,
Matteo.
Dou um sorriso. É… eu achava que estava apaixonado. O que
era uma grande loucura, não era? Eu achava que isso não
aconteceria, mas como não aconteceria se era Raffaela? A minha
Raffaela?
Fechei os olhos e pensei nela, Raffaela tinha marcado minha
rotina. Agora cada pedaço tinha um pouco dela, desde a montagem
de quebra-cabeças até o café da manhã, quando ela tentava fazer
panquecas para nós e todos os dias terminava pior.
— Eu acho que amo Raffaela… não… eu tenho certeza que amo
Raffaela. Não é estranho? Eu achava que podia ficar imune a ela,
mas ela sempre teve um pedaço da minha alma.
— Uau, você está mesmo apaixonado.
Giacomo perdeu o sorriso, me olhando sério. Um silêncio se
formou na sala e eu comecei a pensar em como seria agora que ela
não ia mais precisar da minha casa como esconderijo ou que o
namoro falso poderia acabar. Mas quem eu queria enganar? Eu seria
o esconderijo dela por quanto tempo ela quisesse, e o namorado
para sempre se ela deixasse.
— Como eu provo para alguém que eu quero que ela faça parte
da minha vida? Como eu mostro que eu não quero que esse
relacionamento falso acabe?
— Primeiro você pode mostrar para ela que esse relacionamento
nunca foi falso? Quantas vezes vocês estiveram juntos apenas por
estarem? Não tinha ninguém por perto, para quem vocês precisavam
provar que estavam namorando? E outra, você é um advogado,
ninguém melhor que você para provar um ponto para alguém.
Giacomo estava completamente certo. Eu podia sentar com
Raffaela e conversar, podíamos resolver isso, afinal, não tinha mais
nada segurando qualquer um de nós a esse relacionamento falso.
Sua mãe com certeza me odiava agora, seu pai também. Se
fossemos ter um relacionamento de verdade, ele deveria começar
com uma confissão.
Eu poderia chamá-la para dormir em casa e, durante o jantar, eu
contaria que aquele relacionamento falso deveria acabar para que
pudéssemos ter um relacionamento de verdade. Não que não fosse
de verdade… tudo que vivemos era real.
É, se eu ia dar um discurso, eu precisava escrever. Se eu
falasse qualquer besteira, Raffaela poderia entender errado e
advogados que não são entendidos perdem casos. Eu não queria
perder Raffaela.
Puxei uma caderneta e olhei para Giacomo.
— O que você ainda está fazendo aqui? — Ele riu e me encarou.
— Eu quero ver a sua defesa antes de você apresentar para
Raffaela, posso te ajudar, sabe? Apesar de não estar namorando
agora, eu sou um romântico incurável, isso faz com que eu seja a
melhor opção para te ajudar nesse momento. Vamos lá, como você
quer começar a sua defesa?
— Isso não é um tribunal, isso vai ser Raffaela, eu e meus
sentimentos na sala da minha casa, enquanto comemos uma pizza.
Não tem nada para você ver. Pode ir.
Giacomo revirou os olhos e bateu com a mão na perna.
— Eu vou te deixar, mas saiba que se esse pedido de namoro der
errado, a culpa não vai ser minha, eu tentei te ajudar.
Esperei que ele saísse da sala e voltei toda a minha atenção
para o papel que tinha na minha frente. Eu poderia colocar meus
sentimentos ali, eu sabia que podia, mas por que parecia tão difícil?
Peguei meu celular para olhar o horário e sorri, olhando a foto
de Raffaela como protetor de tela. Eu podia escrever uma carta de
amor para ela. Ela com certeza seria a única para quem eu faria isso.
Eu amava Raffaela e, se aquilo era definitivo, eu conseguiria
colocar os meus sentimentos em um papel.
— Vamos, Matteo Esposito Ricci, você consegue.
47
Raffaela

Eu tinha finalmente me acalmado. Rocco ainda me segurava em


seus braços, fazendo carinho em minha cabeça. Meu coração ainda
doía como se alguém o tivesse perfurado com uma faca.
Tentei me afastar de Rocco, mas ele me apertou mais forte em
seus braços. Passei meus braços pelo seu corpo, abraçando-o de
volta. Eu quase não conseguia respirar de encontro ao seu tórax,
mas ainda assim era a primeira vez em meses que eu respirava
direito.
— Me perdoa, Raffa… — fiquei em silêncio sentindo o peso da
culpa que ele carregava.
Quando Rocco e Atena terminaram, eu quase senti um prazer
estranho vendo que ele não era tão perfeito quanto parecia, mas
nada mostrava isso como agora. Meu irmão estava acostumado a
ser o querido, a primeira pessoa que todos pensavam, e vendo como
aquilo me machucou, Rocco tinha finalmente notado o privilégio que
tinha.
— Eu… eu saí com a mamma hoje… — me afastei dele,
encarando a bagunça que eu tinha feito na sala. — Eu acho que foi
mais fácil para mim viver como sempre vivi, ignorando as coisas que
aconteciam dentro de casa, ignorando como você se sentia, e eu
sinto tanto, porque olhando para Ceci, eu nunca faria isso com ela,
não sei como nossa mamma fez…
Comecei a cutucar o canto das unhas com o dedo, sentindo
lágrimas teimosas voltando para o meu rosto. Minha perna não
parava de balançar e Rocco colocou a mão sobre ela. Ele seguiu
meu olhar para o quadro que eu tinha destruído.
— Quando você fez esse quadro? — perguntou, apontando para
o quadro que agora estava todo rasgado, assim como tudo na sala.
Fiquei encarando a tela rasgada, eu talvez conseguisse salvá-lo
se estivesse com vontade, mas tudo que eu conseguia ver ao olhar
para ele era como eu não me encaixava na minha própria família.
— Faz alguns meses, eu ia dar no aniversário dela… perdi noites
aqui, presa dentro dessa sala, pensando em como fazer para ela
aceitar e ter orgulho do que eu fazia.
— Ficou lindo… como tudo que você faz.
Virei meu rosto para Rocco e senti as lágrimas escorrerem,
enquanto eu tentava impedir a enxurrada de sentimentos saírem de
mim.
— Eu queria ser como você… queria ser alguém de quem ela se
orgulhasse, queria poder dividir o que eu sinto, ter uma mão para me
acolher... Eu nunca tive isso, Rocco. Eu tinha tanta inveja de você,
por ter um lugar, mesmo que pequeno. Eu olho pra você e olho pra
quem você é e penso se eu não seria melhor se eu tivesse a sua
mamma. Eu queria que você tivesse olhado mais para mim, que
você tivesse visto como eu era tratada, como nada do que eu fazia
era importante…
Levantei do sofá, andando até o globo de neve da Torre di Pisa
e encarei o objeto quebrado. Foi naquela viagem que pela primeira
vez eu senti que não pertencia a lugar nenhum. Virei para Rocco,
que me fitava, seus olhos cheios de culpa.
— Promete que nunca vai fazer isso com a Ceci? Promete que
vai ser o refúgio dela? Que você e a Atena sempre vão ser o lar
dela?
— Você não precisa pedir isso.
— Eu sei… mas eu queria que alguém tivesse feito isso por mim.
— Raffaela, eu nunca mais vou deixar que alguém faça você se
sentir assim.
Concordei com a cabeça, largando o globo no chão. Peguei a
caixa de pincéis e o último quadro que tinha sobrado intacto na sala.
Era o que eu tinha começado a desenhar. Eram as únicas coisas que
eu levaria dali.
— Você consegue entender se eu não te desculpar agora, não é?
Dói, Rocco, como se eu passasse por isso todos os dias… e eu
agradeço os momentos que você esteve ao meu lado quando notou
que algo estava errado, mas ainda foi pouco. Muito pouco.
— Eu entendo, mas ti amo.
— Eu também…
Ficamos os dois de pé, olhando para as nossas semelhanças
e diferenças. Rocco deu um passo para frente e outro para trás, mas
andou até mim com uma força que eu não tinha. Seus braços me
circularam e encostei a cabeça em seu ombro.
— Vamos, eu te dou uma carona…
— Você nem sabe para onde eu vou…
— Ah, eu sei. Você vai correr pra quem não mediu esforços para
que todo mundo notasse como você era tratada, não é? Você nunca
deixou de gostar do Matteo…
Dou uma risada triste.
— Acho que gostar era o que eu sentia antes… eu acho que eu
amo o Matteo, Rocco, mas…
— O quê?
— Nada. Esquece, vamos?
Rocco concordou com a cabeça, sem deixar de olhar para mim
de tempo em tempo para ver se meu surto tinha passado. Mas tinha.
Eu acho que pela primeira vez eu coloquei para fora tudo que eu
vinha sentindo, todos os medos, todo o sentimento reprimido, cada
pedaço que eu escondi por anos.
Com o carro estacionado em frente ao escritório que Matteo
trabalhava, Rocco me encarou, apertando o volante.
— Você consegue guardar o quadro? Eu posso pegar na sua
casa, não quero que ninguém veja, está pela metade…
— Claro, pode deixar… só não prometo que a Ceci não vai
querer mexer.
— Ela sabe que não pode tocar, eu já expliquei tudo para ela.
Abri a porta, saindo apenas com a minha bolsa e uma vontade
absurda de ser segurada por Matteo. Dei um olá para o porteiro que
me deixou entrar e segui em direção às escadas.
Giacomo me encarou, dando um largo sorriso, como se
soubesse de algo que eu não sabia, mas não pude notar o quê, já
que seus olhos logo estavam de novo na mulher a sua frente com
quem conversava animadamente.
A porta de Matteo estava entreaberta, parei ouvindo sua voz
conversando com alguém. Devia ser isso que Giacomo me olhava
daquele jeito. Dei um passo para trás, torcendo para que ele não
tivesse me visto.
— Alice… eu sinto muito. — A voz de Matteo parecia diferente,
como se não estivesse querendo ser ouvido. — Eu sei que nós
tivemos um envolvimento, e você é linda, perfeita… qualquer pessoa
teria sorte em ter você como namorada, mas infelizmente, eu estou
envolvido com alguém e não posso retribuir seus sentimentos agora.
— Mas…
O bloqueio em meus tímpanos voltou. Minha cabeça pendendo
para trás, senti uma tontura, como se meus pés não tivessem mais
onde pisar, mesmo que eu soubesse que o chão estava sob mim.
Dei um passo para trás.
Infelizmente.
Infelizmente.
Consegui ver a mulher pela fresta e ela era linda. A voz de
Lorenzo ficando mais alta em minha cabeça, dizendo que eu sairia
machucada. Não precisou de muito para provar que ele estava certo.
A garota era tudo que eu não era. Loira, magra e alguém por
quem Matteo se apaixonaria. Ela não era eu, e acho que só isso já
bastava.
Saí caminhando de cabeça erguida, lutando contra as lágrimas
que pareciam não cessar. Esse era o pior dia da minha vida. Fui em
direção ao único lugar que eu sabia que encontraria amor, apoio e
um abraço. Eu precisava de um abraço.
Eu precisava de Atena.
48
Matteo

Desliguei a chamada, depois de tocar pelo que parecera ser


eras. Era pra Raffaela ter aparecido há duas horas. Achei que
pudesse ter se atrasado por ter ido na empresa, mas agora… agora
eu começava a desconfiar que algo tinha acontecido.
Peguei o telefone de novo, discando o número de Rocco. Tinha
alguma coisa muito estranha. Peguei o paletó que pendurei sobre a
cadeira e, com o celular na orelha, saí andando em direção a saída.
Giacomo acenou para mim, mas eu precisava ir atrás de
Raffaela. E se algo tivesse acontecido na empresa? A chamada caiu
e desci as escadas correndo. Abri a porta do carro e entrei, notando
o casaco de Raffaela jogado no banco de trás.
Respirei fundo e esfreguei a cabeça, sentindo uma dor na base
da cabeça. Liguei de novo para Rocco e nada de ser atendido.
Alguém queria me matar, eu já começava a pensar nas piores das
hipóteses que envolviam outra prisão ou pior hospital.
Encostei o carro na calçada da empresa, correndo para o
elevador, como se minha vida dependesse disso. Comecei a bater o
pé no chão, sentindo uma ansiedade besta se agarrar aos meus
poros.
Quando a porta abriu, foi como se eu pudesse respirar
novamente. Olhei o relógio, temendo que tivesse passado anos
enquanto eu estava dentro do maquinário. Dei de cara com Nicoletta
parada em frente a sala de Raffaela e meu coração ficou mais leve,
eu podia ouvir os barulhos, ela ainda estava ali.
— Nicoletta… — chamei, me aproximando de onde ela estava.
Sua saia cáqui combinava com a blusa de lã azul e eu quase sorri a
vendo ali.
Como ela era mais baixa que eu, consegui ver a sala por cima
de seu corpo. Tudo estava destruído. Todos os enfeites que Raffaela
amava, a mesa... Passei por Nicoletta, encarando a bagunça e
reparei que um homem estava recolhendo os cacos de um globo de
neve que era idêntico ao que eu tinha na minha sala.
Virei para Nicoletta e ela me encarava com tristeza.
— O que aconteceu aqui? — questionei, encarando a sala como
um todo e peguei o quadro rasgado no chão, vendo o trabalho da
Raffaela perdido. — Quem fez isso? Foi a Anna? Ela veio aqui?
Nicoletta parecia confusa, a expressão franzida e a mão na
cintura.
— Por que a Anna faria algo assim? Não, claro que não. Foi
Raffaela.
Aquilo me assustou. Raffaela não era o tipo de mulher que
destruía uma sala, ainda mais se fosse a sua e uma que ela deixou
do jeito que sempre sonhou.
— O que aconteceu aqui?
— A Raffa veio buscar as coisas dela, eu saí por alguns minutos
e ela e Lorenzo começaram a conversar, não quis interromper…
quando percebi Lorenzo estava sendo expulso da sala e Raffaela
destruindo tudo.
Concordei com a cabeça. Passando por Nicoletta e indo em
direção a sala que eu sabia ser de Lorenzo. Aquele idiota, com
certeza ele tinha dito algo ou feito algo para Raffaela.
Abri a porta e Lorenzo estava sozinho, encarando a parede com
cara de culpado. Seus olhos se arregalaram e ele levantou antes que
eu chegasse perto dele.
— O que você falou pra ela? O que você fez para Raffaela?
Lorenzo olhou para os lados e voltou a me encarar. Seus olhos
mostravam medo. Suas mãos subiram para a altura do rosto, como
se eu fosse fazer algo com ele. Eu cagava para esse idiota.
— Eu não fiz nada… eu só disse que… — Lorenzo encarou algo
atrás de mim e eu dei um passo para frente. — Eu só falei para ela
que esse namoro falso de vocês ia terminar mal quando você
voltasse a sair com modelos.
Não consegui me impedir, o puxei pela gola da camisa e soquei
seu rosto.
— Você está louco? — gritou.
Ouvi algumas vozes e virei para dar de cara com metade da
empresa encarando a cena. Voltei a olhar para Lorenzo e ele
segurava o rosto.
— Você é um amigo de merda! Raffaela merece gente melhor na
vida dela, você a deixou sozinha quando foi presa, você não se
preocupa com ela, e ainda expõe sua amiga. Agradeça por ser só
um soco.
— Que porra é essa? — Rocco entrou na sala, me afastando de
Lorenzo. — Posso saber o que está acontecendo na minha
empresa?
— Pergunte para esse escroto — respondi, apontando para
Lorenzo. — Espero que você o demita.
— Nicoletta, leva o Lorenzo para a copa e o ajude com esse
rosto. Cada um para a sua sala e nada do que acontece aqui é
falado. Nos deixem.
Fiquei olhando enquanto a multidão se dispersava. Rocco tinha
as mãos na cintura. Quando todos saíram, ele virou para mim.
— Que merda é essa, Matteo? Como você entra na minha
empresa, soca a cara de um dos meus funcionários e mais
importante: como assim um namoro falso com a minha sorella?
Merda. Merda. Porra!
— Rocco, você acha que pode confiar nesse escroto? — Rocco
balançou a cabeça rindo.
— Acho que você esquece que eu passei a minha vida sendo seu
melhor amigo e que sei quando está mentindo. Então, eu preciso
saber agora para onde eu tenho que correr para encontrar a minha
sorella, que está claramente apaixonada por você. Já que ela não
está aqui, alguma coisa aconteceu.
— Eu preciso ir atrás da Raffaela. Cadê ela? Eu passei a tarde
toda esperando por ela.
Rocco começou a medir a própria pressão. Me olhando com a
cara fechada.
— Me diz você, Matteo, eu deixei Raffaela na sua empresa. Onde
está a minha sorella?
— A Raffa foi até lá? Eu… ela não entrou. — A sensação de
desespero voltou a crescer dentro de mim. — Que horas foi isso?
— Logo depois que ela saiu daqui depois de chorar no meu colo.
Rocco puxou o telefone e começou a ligar para quem eu
imaginava ser Atena, mas eu não podia esperar muito. Saí correndo
da empresa em direção ao meu carro.
A floricultura apareceu na minha visão e quase nem desliguei o
carro, estacionando de qualquer jeito. Abri a porta e corri para
dentro, os funcionários de Atena me encararam assustados.
— A Raffaela não está aqui, Matteo… e — Antonieta respirou
fundo. — não acho bom ela te ver agora.
Dei um passo para trás, sentindo como um soco na boca do
meu estômago. Meu celular começou a tocar e o coloquei na orelha.
— A Raffaela não quer te ver, Matteo. Por favor, respeite isso. Eu
posso não ter protegido minha sorella antes, mas eu vou protegê-la
agora.
Ignorei os olhares de Antonieta e Tommaso e respondi:
— Tudo bem, Rocco, eu vou dar o tempo que ela precisa. Mas eu
amo Raffaela e não vou ficar muito tempo longe. Eu vou recuperar a
sua sorella e nem você, Atena ou o Papa me pararão.
Desliguei o celular e saí sem me despedir. Roma me recebeu
com seu vento frio e senti um desespero se alastrar por mim. Eu
precisava encontrar Raffaela. E era urgente. Mesmo que ela não
quisesse me ver, eu iria atrás dela.
49
Raffaela

Estava sentada no chão, o celular jogado do outro lado da casa.


Eu não conseguia mais ouvir as chamadas e ignorá-las, por isso, eu
tinha decidido que eu esqueceria que tinha celular pelo tempo que
fosse necessário. Eu sabia que uma hora eu teria que enfrentar a
realidade e encarar Matteo.
Eu estava toda suja, com diversas gotas de tintas por meu corpo
e Ceci não estava melhor que eu. A parede que eu queria colorida
estava exatamente como eu imaginei, pinceladas coloridas e nada
organizadas. Esse espaço era o que eu sonhava e muito mais.
Puxei mais um pedaço de pizza para mim e outro para Ceci.
— Zia… sabia que o papà me levou no museu? — Anna Cecília
deu uma grande mordida na pizza, mas não parou de falar, mesmo
com o queijo escorrendo por seu queixo. — Tinha quadros bonitos,
mas eu gostei dos homens grandões, o papà tentou tampar meus
olhos.
Eu tinha certeza que sim.
— Isso se chama esculturas, é mesmo um trabalho muito bonito,
mas também trabalhoso. Você quer aprender a fazer? Tenho certeza
que Rocco e Atena deixariam, desde que você prefira esculpir
animais e não homens grandões.
Ceci riu, batendo a mão suja de gordura na perna, deixando
tudo molhado. Bom, nada está tão ruim que não pode piorar.
— Zia… eu tô com saudade do zio Matteo.
É, Ceci… eu também estava. Eu não podia nem mesmo pensar
nele que crescia um buraco gigante no meio do meu peito e eu tinha
certeza que qualquer um poderia ver.
Fazia quase uma semana que eu não o via. Isso não impedia
que ele tentasse entrar em contato, e eu tinha feito como fiz com
qualquer pessoa, exceto Atena e Ceci, e cortara Matteo da minha
vida.
— Tenho certeza que logo ele aparece na sua casa. Matteo e seu
papà são melhores amigos, assim como eu e a sua mamma.
Ceci levantou com a pizza em sua mão e veio se sentar em meu
colo. Dei um beijo em sua cabeça e a abracei. Anna Cecília era o
único contato que eu tinha com o mundo do lado de fora. Eu estava
tão focada em transformar esse apartamento na minha casa, mas
ainda parecia que faltava alguma coisa.
— Quero o Pipoca e a Petúnia.
Esse era o jeito de Ceci dizer que queria ir para casa, ela nunca
falava que queria ir embora, parecia que tinha medo de ferir meu
coração. Fechei a caixa de pizza e a coloquei de pé, dando um tapa
em sua bunda.
— Vamos, está na hora de tomar banho, logo a mamma vem te
buscar.
Rocco e Atena estavam de mal de minha mãe, por isso, Anna
Cecília passou quase a semana toda em minha companhia, e eu
também tinha certeza de que isso era para que eu não ficasse
sozinha e triste. Quando ela saía da escola, Atena ou Rocco a
traziam para cá.
Ceci saiu correndo em direção ao banheiro, e eu peguei o
produto para tirar a tinta de sua pele, porque eu sabia que ela não
faria isso sozinha. Encarei o quadro inacabado que tinha os olhos de
Matteo bem marcados pela tinta.
Eu tinha tentado continuar aquela obra, mas eu também não
conseguia pensar em terminar, afinal, era uma das minhas cartas de
amor que nunca seriam entregues.
— Zia! — o grito de Ceci me tirou da névoa de tristeza que eu já
tinha entrado de novo.
Corri para o banheiro, a encontrando cheia de espuma, com os
cabelos arrepiados e o chuveiro extremamente gelado.
— Já falei, Ceci… vira sempre pra esse lado. — mostrei virando
para a direita. — Você não quer terminar o banho congelada, não é?
Saí do banheiro, dando a privacidade que ela adorava. Ela vivia
me dizendo que aqui se sentia uma mocinha.
Fui até o meu quarto, pegando a bolsa que Atena tinha
preparado e separando a roupa para Ceci colocar após o banho.
Olhei para a mesa ao lado da minha cama e fui até a única peça de
quebra-cabeças que tinha ali, a peguei na mão, sentindo o desenho
da peça.
Eu tinha roubado do quebra-cabeças de Matteo, o que quase
terminamos juntos e quando eu quase confessei que ainda era
apaixonada por ele. Eu sabia que ele devia procurar por aquela
peça, mas ela era minha agora.
Era horrível perder algo depois de ter por tanto tempo. Quando
eu me apaixonei por ele na adolescência, eu não sabia como era,
realmente, ter Matteo. Por isso, foi mais fácil seguir em frente, mas
agora… agora quando eu pensava em me aproximar de alguém, eu
só pensava em como aquela pessoa nunca chegaria aos pés do que
eu tive com ele.
Não chegaria perto do que era ter suas mãos em meu corpo, ou
de como nada seria igual a ter sua respiração na minha enquanto
dormíamos. Mas tinha sido bom, aquilo tinha acabado antes que eu
vendesse minha alma ao diabo em nome do que eu sentia por ele.
Eu já deixei muitas pessoas se colocarem acima de mim,
passarem por meus sentimentos com um trator. Aquilo não
aconteceria mais. Se alguém fosse me amar agora, teria que me
amar livremente, e por completo.
Fechei os olhos, apertando a peça em minha mão. Por favor,
Matteo, me ame.
— Buh!
Dei um pulo, soltando a peça no chão e encarei Ceci que ria de
mim, enrolada na toalha, mesmo que por enrolada eu quisesse dizer
só metade do corpo.
— Não me assusta assim, Ceci!
Sua risada aumentou quando ela me encarou. Ri junto com ela.
Mesmo que eu tentasse parecer brava, aquela menina tirava o
melhor de mim. Seu cabelo preto escuro estava escorrendo de
encharcado, mas aquilo não a impediu de pular sobre mim,
molhando minha roupa e a minha cama.
— Você vai me matar, ragazza.
— Ti amo, zia. Ti amo do tamanho de Roma.
— Ti amo, amore mio. Quer que eu te ajude a colocar a roupa?
— Eu sei — proclamou, estendendo a mão para a frente, me
impedindo de chegar perto dela.
Ouvi as batidas na porta.
— Aí, sua mamma chegou! Se arrume rápido. Vou atender ela,
qualquer coisa me grita.
Andei em direção à sala, recolhendo as roupas que Anna Cecília
tinha jogado pelo chão, como se não soubesse onde eu guardava a
roupa suja. Eu tinha que lavar aquilo ou Atena me mataria, o azul e o
rosa quase se misturavam na calça.
— Estou chegando… estou chegando...
Abri a porta com um sorriso no rosto, pronta para contar para
Atena como a filha dela era terrível e a melhor coisa que tinha
acontecido na minha vida, mas ele logo morreu em meu rosto.
— Raffaela…
— Mamma?
50
Matteo

Uma chuva caía forte e eu quase conseguia sentir a dor das


gotas batendo em minha pele. Eu notei o exato momento que Anna
chegou ao apartamento, ela fez um sinal de cruz antes de subir os
degraus. Como se Raffaela fosse alguém que ela tivesse medo. Era
pra eu estar indo em direção à Raffaela, mas sabia que agora não
seria um bom momento.
Entrei de novo no meu carro, fazia alguns dias que eu vinha
aparecendo por ali, por isso sabia bem como funcionava a rua. Eu
quase me sentia o Joe da série YOU – eu estava ficando louco, não
estava? Olhei para o relógio e percebi que ainda faltava alguns
minutos para que Atena fechasse a floricultura.
Eu tinha aparecido por lá mais do que eu gostava de assumir.
Não demorou muito até que eu estacionasse o carro na rua da
floricultura. Apertei o volante, encarando a vidraça enfeitada de flores
protegidas da chuva pelo toldo listrado. Atena estava lá dentro, eu
podia ver pelo vidro. Ela rodava no espaço como se soubesse o
exato lugar que cada coisa estava e não precisasse olhar.
Nunca tinha sido próximo de Atena, mas desde que Raffaela
sumiu da minha vida, eu precisava de alguma fonte de notícias e ela
tinha sido doce o suficiente para fazer isso sem me questionar nada.
Ouvi o sino fazendo barulho quando passei pela porta e Atena
virou sorrindo como se soubesse quem era.
— Achei que não vinha hoje… — falou, colocando um buquê
gigante no balcão.
Tommaso apareceu colocando o boné na cabeça por cima dos
dreadlocks com uma grande aliança de ouro brilhando em sua mão
negra. Antonieta e ele tinham se casado há alguns meses, e era até
triste ver duas pessoas tão felizes.
— Eu queria conversar com você, se não tiver problema e não
estiver muito ocupada.
Atena concordou, tirando o avental com as mãos da Anna
Cecília pintadas de rosa que usava por cima da saia longa azul.
Encarei o presente e pensei se um dia teria o privilégio de usar
coisas como aquelas feitas com amor por meus filhos.
A imagem de Raffaela voltava à minha mente, uma imagem
boba que criei dela carregando nosso filho. Dei um sorriso triste e
comecei a seguir Atena que andava até as mesas de reunião para
seus clientes.
Sentei em uma cadeira e ela puxou uma caneca de café escuro
para mim, jogando uma colher de açúcar. Isso só mostrava como eu
vinha visitando a floricultura mais do que minha própria casa.
— Posso saber o que aconteceu hoje? Você demorou, achei que
não ia aparecer, mesmo com a chuva dos últimos dias você sempre
aparece no mesmo horário.
Atena colocou a caneca na minha frente e finalmente me
encarou.
— Eu fui até o apartamento dela.
— Entrou? — perguntou quase pulando da cadeira.
— Não… Anna estava lá.
Atena bateu com a mão na testa. Dei um gole no café e esperei
que ela explicasse a situação.
— A floricultura sempre fica lotada em dias de chuva, o Tom
sempre diz que tem algo a ver com pessoas precisarem ser
românticas. Só que hoje Rocco vai ter que ficar até tarde na empresa
e eu aqui, acho que ele finalmente voltou a falar com a mamma… eu
ia pedir para Raffa entreter Ceci por mais algum tempo, mas ela
disse que estava exausta das arrumações na casa.
— Então, vocês mandam para o apartamento dela a pessoa que
ela menos quer ver agora?
— Você sabe que não é assim… ela estava muito magoada por
Anna não a ter procurado. Elas precisam conversar, mesmo que isso
machuque.
Encarei Atena que pegava um chocolate e colocava na boca. Fiz
o mesmo, roubando um dos seus chocolates caros que Rocco
comprava. Inspirei e expirei, vendo as flores do lugar.
— O que você quer saber hoje, Matteo? Você sabe que pode me
mandar mensagem e eu te responderia, não é?
— Eu sei, mas acho que ver seu rosto quando conta… me ajuda
a saber se você não está mentindo para mim.
— Isso vindo de alguém que junto com Raffaela fingiu um
namoro… — Atena mordeu o lábio escondendo o sorriso. — Eu
ainda não acredito em vocês dois. Bom, mas vou te contar o que
mudou desde ontem.
— Per favore.
Atena desbloqueou o celular e me entregou.
— Aqui tem umas fotos que ela mandou de Ceci pintando a
parede do quarto que ela está transformando em um estúdio de
pintura. Ela disse que a parede era para parecer uma tela confusa e
ela precisava de Ceci… — Passei a foto, encontrando uma de Anna
Cecília e Raffaela sentadas no chão sorrindo. — Ela disse que o
armário da cozinha foi instalado por um vizinho… — Tirei o olho do
celular para prestar atenção naquela informação. — É um velho,
calma…
— Ela é linda, até mesmo os velhos devem se apaixonar por
Raffaela.
— Uma pena que você demorou tanto tempo, não é? — Franzi o
cenho para Atena e ela riu. — Estou brincando… calma. Bom, mas é
isso que eu sei, talvez mais tarde eu tenha mais informações. Sinto
muito, Matteo.
— Tudo bem… você tem me ajudado muito nos últimos dias, mas
Atena… isso é tudo que eu posso aguentar, já faz uma semana, ela
não me atende, você não diz o que eu fiz, ninguém me ajuda.
Levantei da cadeira, andando em círculos pelo lugar. Cocei a
cabeça e a encarei.
— Eu não posso mais esperar por alguma coisa. Eu preciso fazer
algo. Eu vou ter que fazer um grande gesto? Ela quer que eu
apareça na rua do prédio dela com uma orquestra? Eu faço isso.
Raffaela quer que eu reserve o Coliseu e cante Can’t Take My Eyes
Off You? Eu aprendo a cantar. Eu só preciso saber o que fazer para
ter a mulher que eu amo de volta. — Afrouxei a gravata e me sentei
de volta. — Eu só não posso ficar sentado, tomando notas e
sabendo dela por uma tela de celular. Atena, eu preciso da Raffaela
de volta… está me matando não tê-la por perto e eu nunca me senti
assim… nunca estive tão perto de sentar na porta dela e esperar que
ela lembre que eu existo. Por isso, per favore, me ajude… o que eu
posso fazer para ter Raffaela de volta?
Atena me encarou sorrindo e acenou um sim. Meu coração deu
uma volta em meu peito.
51
Raffaela

Desliguei a cafeteira e peguei duas xícaras. Eu podia ouvir a voz


de minha mãe conversando animada com Ceci e, de alguma
maneira, aquilo doía mais do que os anos sendo deixada de lado.
Aquilo mostrava que ela podia ser uma boa pessoa com uma garota,
ela só não encontrou dentro dela os motivos para ser assim comigo.
Coloquei a xícara sobre a mesa e cocei a cabeça, buscando
alguma coisa para dar para ela comer junto com o café. Ceci correu
até mim, jogando seu corpo e me abraçando.
— Zia, eu posso ir pintar? — Olhei para minha mãe que estava
na porta da cozinha, me encarando.
Fiz carinho na cabeça de Ceci e apertei suas bochechas com as
minhas mãos.
— Vamos lá, mas lembra… só nas suas telas, ok?
— Eu sei que eu não posso mexer nas suas… a mamma explicou
que são obras que nem do museu.
Tentei esconder um sorriso, e ignorei o olhar de minha mãe
sobre nós duas. Passei por ela, de mãos dadas com Ceci, abrindo a
porta do quarto de pintura. Puxei o cavalete de madeira para
crianças, armando e Ceci puxou seu banquinho até o lugar. Ela sabia
como fazer, nós já tínhamos passado tempo demais juntas aqui.
Peguei uma tela em branco e Ceci pegou as tintas para pintar.
Coloquei o avental para cobrir sua roupa e a encarei.
— Ceci, per favore, não suje a roupa, seus pais vão me matar.
— Tá bom, zia — falou com o tom de voz mostrando que não
queria mais ouvir a mesma ladainha.
Voltei para a cozinha e minha mãe permanecia de pé,
encarando todo o espaço. Apontei a cadeira e me sentei de frente
para ela.
— Parece que você e Ceci se dão muito bem… — disse,
sentando na cadeira e tomando um longo gole do café.
Não respondi, era a coisa mais idiota de ser dita logo após a
última vez que nos vimos ter sido em uma briga. Era a primeira vez
que nos falávamos, e parecia que para minha mãe tinha sido nada.
— Sua casa ficou bonita.
— Obrigada, ainda falta algumas coisas para fazer…
praticamente não tem tapete em lugar nenhum, mas logo compro
alguns.
— Vai ser ótimo, principalmente com o frio que está fazendo nas
últimas semanas.
Bati com as unhas na mesa. Minha vontade era gritar com ela,
implorar para que fosse embora, que não voltasse. Qualquer coisa
que a tirasse logo dali.
— A gente pode conversar?
— Achei que era isso que estávamos fazendo.
— Você sabe que não, Raffaela Amara.
Seu tom de voz me perturbou, como se eu fosse uma criança
fazendo algo errado.
— Eu vou pedir que se você não conseguir me respeitar ao
conversar comigo, você deve sair da minha casa.
Minha mãe concordou com a cabeça e me encarou. Parecia que
tinha uma pedra no meio da cozinha que me impedia de respirar e
impossibilitando uma conversa real. Ela tinha algo para falar? Porque
tudo que eu sentia era uma raiva e parecia vir de mim e dela em
ondas.
— Quer começar? — questionei, bebendo um gole do café que
começava a ficar gelado.
— Eu quero te pedir desculpas. — Ok, aquilo era inédito. —
Rocco conversou comigo e me fez que eu não estava te tratando da
maneira correta. Que eu não devia ter feito você precisar se
esconder e mentir sobre seus hobbies.
Claro. Rocco falou. Rocco. Rocco. Rocco. Não eu, não Matteo.
Rocco. Não importava quanto eu já tivesse mostrado como aquilo me
machucava, não importava que Matteo tivesse me defendido. Rocco.
— Eu vi o quadro que você fez… Rocco praticamente jogou sobre
mim e ele devia ser lindo, não consegui ver muito, porque estava
destruído, mas você já deve saber disso.
Não teve como. Dei uma longa gargalhada e a encarei incrédula.
— O quê?
— Isso deve ser algum programa de comédia… de verdade. Você
vem até aqui como se não tivesse passado os últimos anos da minha
vida me torturando porque eu queria pintar, porque eu queria mostrar
o que eu fazia para as pessoas. Como se eu não tivesse que me
esconder dentro da empresa para fazer o que eu gostava.
Cada memória voltava a minha cabeça, cada vez que ela
quebrou um pincel, quando escondeu minhas tintas, quando jogou
água dentro dos primeiros potes profissionais que eu comprei.
— E não só isso, você vem aqui mostrando como o Rocco te fez
ver o quanto estava errada. Você não está aqui por mim ou por como
eu me sinto, você está aqui porque Rocco parou de falar com você,
porque Rocco não está te deixando perto de Ceci porque ele tem
medo que você faça o mesmo que você fez comigo.
— Isso não é verdade!
— Não? Ótimo, então me diz mamma, por que você está aqui? É
por desculpas? Sinto muito, não consigo. Isso não é o final de um
livro ou filme onde pessoas são perdoadas. Você me machucou por
anos, foi uma péssima mamma para mim, mas uma ótima para
Rocco. Eu só nunca fui o que você queria e é tão difícil ver que tudo
que você queria era que eu fosse como você, mas você nunca
prestou atenção ao que eu era.
O vento forte bateu na janela e quando afastei meus olhos dela,
percebi que estava quase chorando, mas não permitiria que aquilo
acontecesse.
— Ao contrário do que você pensa… eu sempre gostei muito de
casamentos, eu adorava ver tudo o que você e o papà criavam, cada
pequeno detalhe que deixava o dia das pessoas único e especial. Eu
sempre quis fazer aquilo, tanto que eu fiz.
Parei de balançar minha perna e a encarei, olhando dentro de
seus olhos para me fazer entender.
— Mas eu sempre amei pintar… e foi ok, até não ser mais para
você. Mas, mamma, eu não sou você. Eu nunca fui você e nunca vou
ser. Então, se ouvir um “te desculpo” é o que vai te fazer dormir
melhor… eu te desculpo. Mas dentro de mim ainda tem muita coisa
para ser consertada antes de tentar consertar a nossa relação que
está por um fio. E sobre papà… fala pra ele que meu relacionamento
com Matteo acabou e eu não quero saber de ninguém agora, mas
quando e se eu encontrar alguém que me ame, vocês saberão por
Rocco e Atena.
— Raffaela, me deixe falar…
— Não, mamma. Você já falou por muito tempo, e eu tenho que
aprender a apagar os traços que você deixou em mim. Depois,
quando eu estiver bem para escutar… eu te procuro.
Levantei da mesa, pegando as xícaras intocadas e coloquei
dentro da pia.
— Agora a Ceci quer ir para casa, agradeceria se você a levasse,
talvez o Rocco ou Atena tenham me avisado sobre vir ou não buscar
ela, mas estou ignorando meu celular. Espero que entenda quando
digo que está na hora de você ir.
Fiquei assistindo enquanto Ceci e minha mãe desciam as
escadas. Apertei meus braços, vendo a imagem que me lembrava a
infância, quando minha mãe ainda parecia sentir mais do que
obrigação por mim.
Fechei a porta, me sentindo em muito tempo leve. Leve de uma
maneira que eu nunca tinha me sentido. Sentei no sofá e liguei uma
série na TV. O barulho da chuva do lado de fora era aconchegante.
Respirei fundo e coloquei a mão sobre o coração.
Minha casa era meu lugar de paz e, depois de ter dito tudo que
eu precisava, eu também achava que meu corpo era meu lugar de
paz.
Ouvi o celular tocando e andei até o aparelho que descansava
em meu quarto. Por um momento bobo eu torci para ser Matteo,
talvez dessa vez eu atendesse. Mas não era.
Desliguei a chamada, encarando os prédios que pareciam ser
meus únicos amigos. Aproximei meu celular do meu peito e deixei
uma lágrima de alívio, misturada com saudade escorrer por meu
rosto e dei um sorriso.
— Eu sinto sua falta, angelo.
52
Matteo

Tomei um longo gole de vinho e continuei encarando a taça.


Depois da conversa com Atena, eu simplesmente não conseguia
acreditar no que tinha afastado Raffaela de mim. Uma única palavra.
Infelizmente.
Mas eu não podia culpá-la. Foi uma sucessão de
acontecimentos que tiraram o chão da mulher que eu amava. Sua
mãe tentando destruir sua personalidade, o amigo que deixou claro
que eu não me interessaria por ela e, então, eu. Saber que eu tinha
uma grande parcela de culpa no que aconteceu me matava.
O barman voltou para perto de mim, enchendo a taça de vinho
novamente. Não se podia desperdiçar um bom vinho, principalmente
quando você se sentia tão desiludido quanto eu.
Meu celular começou a tocar e peguei o aparelho, me
deparando com a foto de Rocco. Passei a ligação para o lado e
coloquei na orelha. O som do bar pareceu fazer mais barulho do que
realmente estava. Rocco respirou fundo e falou:
— Você termina um namoro falso com a minha sorella e vai para
um bar? — Revirei os olhos e tomei um longo gole do vinho. — Onde
você está, Matteo? Precisamos conversar.
— Conversar sobre o que? — Apontei para o garçom, pedindo
por mais vinho.
— Sinto que você não conversa mais comigo, só com a Atena, e
não posso mentir, você está me deixando com muito ciúme, quer
dizer… quem é seu melhor amigo? Quem te salvou quando garotos
te batiam? Quem te ajudou a pular o muro da casa daquela garota
na faculdade? Não foi a Atena. Vocês nem iam muito um com a cara
do outro até ontem… Aí!
— Atena te bateu? Ainda bem. Você merece.
Bebi mais da taça e encarei algumas pessoas que conversavam
animadamente, como se meu coração não estivesse quebrado.
Ninguém tinha direito de ser tão feliz quando existiam pessoas como
eu, que estavam desoladas.
Infelizmente.
Eu disse aquilo porque não queria ferir os sentimentos de Alice,
ela era uma pessoa legal, uma mulher interessante que não devia se
sentir diminuída porque eu não estava interessado nela, mas acabei
ferindo a mulher que eu amava. Eu era um burro.
— Matteo? Ainda está aí?
— Sim, estou — respondi, limpando minha mente daqueles
pensamentos. — Estou sim.
— Ok, você está parecendo estranho… onde você tá?
— Em um bar aqui na parte central de Roma, vai vir me salvar,
príncipe?
— Talvez, você precisa ser salvo? Aí, Atena isso dói.
Ri e esfreguei o rosto.
— Te bateu de novo?
— Beliscou meu mamilo. Não, eu não vou deixar você falar com o
Matteo, eu disse que estou conversando com o meu melhor amigo,
você pode me deixar sozinho?
— Matteo?
— Atena.
— O Rocco está indo até você, ok? Eu deixei — disse rindo,
tentei segurar a risada mas não consegui. — Se vocês ficarem muito
bêbados, per favore, venham de táxi.
— Vou esperar por ele e não vou deixar beber demais.
Afastei o celular da orelha quando eles desligaram e eu sabia
que não demoraria muito para Rocco chegar ao bar. Enviei a
localização e voltei a encarar o espaço. Muitas pessoas se divertiam,
conversando, cantando com a música, mas tinham pessoas que
assim como eu pareciam estar vivendo um dia após o outro.
Encostei a cabeça no balcão, tentando pensar no que fazer para
reconquistar Raffaela. Atena tinha me dado uma única dica, algo que
Raffaela tinha dito uma vez para ela. Ficava imaginando como tornar
aquilo real.
Senti uma mão em minhas costas e levantei a cabeça,
apertando os olhos, eu estava com sono.
— Você está bem? — Rocco puxou uma cadeira alta e se sentou
ao meu lado. Ele parecia um pai, uma blusa de moletom, a aliança
brilhando no dedo e ainda assim atraía atenção de todos. — Você
parece bêbado, mas lembre-se: apesar de ser muito bonito, eu sou
casado.
— Rocco, se eu quisesse já tinha te comido e você não ia
reclamar, agora senta aí e cala a boca.
Rocco riu, mas sentou ao meu lado pedindo uma cerveja. Passei
o dedo pela boca da taça, tentando imaginar como faria para que
Raffaela me ouvisse, mais do que tudo eu precisava disso.
Um grande gesto não seria nada se ela não quisesse me ouvir.
— O que você está pensando? — Rocco perguntou.
— Depende… agora é que eu meio que te odeio, mas antes eu
estava pensando no que fazer para Raffaela me ouvir.
— Não conseguiu pensar em nada?
O garçom entregou a cerveja de Rocco e encheu minha taça
mais uma vez. Afastei a taça e encarei Rocco.
— Minha cabeça está fervilhando, tem diversas possibilidades,
mas a maioria delas envolve crimes em vinte e quatro países.
— Só vinte e quatro? Lista aí.
— Cala a boca! Pensei em sequestro, mas sei que ela vai me
matar se eu fizer isso. Pensei em convencê-la aparecendo na porta
dela com um presente, mas a porta fica bem de frente pra escada e
não quero morrer, mas também tem a conversa com a Atena… ela
me disse que uma vez a Raffaela falou que só se casaria se eu a
levasse em um monumento de Roma e fizesse o pedido.
— Oh. oh. Oh. Casamento?
Rocco parecia espantado, como se ele não tivesse levado a
Atena para o altar assim que teve a grande chance. Mas ainda não
era a hora. Raffaela tinha que se entender como ela mesma, na sua
própria casa, com suas próprias vontades. E então eu gritaria dentro
do Vaticano, implorando para que ela se casasse comigo.
— Não ainda, primeiro o pedido de namoro.
— Eu acho que eu tenho a ideia perfeita para você.
Virei para Rocco, pensando em como eu tinha sorte de tê-lo
como amigo. E eu também sabia que ele tinha muita sorte de me ter
como amigo. Aproximei minha mão de sua cabeça e dei um tapa
estalado na sua nuca.
— Nunca mais machuque Raffaela, eu juro que paro de falar com
você na hora, Rocco Giordano, e não me importo se você vai ser
meu cunhado. Eu te mato.
— O mesmo pra você, babaca.
53
Raffaela

Três dias. Faziam três dias que meu celular ficara


completamente silencioso. Esse silêncio quase parecia uma tortura
autoimposta. Matteo parou de tentar fazer contato – nada de
ligações, nada de mensagens. Talvez ele tivesse desistido de tentar
falar comigo. E talvez fosse melhor assim.
Peguei o tom de verde que eu precisava e comecei a pincelar a
tela em frente a mim. Eu precisava terminar essa tela e expurgar
todos os sentimentos que eu vinha sentindo. Cada um deles.
A luz do sol batia na parede e eu amava a sensação de
entardecer que eu tinha durante todo o dia dentro daquele quarto.
Peguei a peça do quebra-cabeça e estudei os detalhes que eu ainda
tinha que fazer.
Esse quadro era uma expressão do que eu sentia por Matteo e
colocar os sentimentos de amor, alegria, tristeza e desamparo
naquela tela tinha me ajudado nos últimos dias.
Eu trabalhava como um artista que dependia de uma obra para
viver: dia e noite pintando, desenhando, colorindo e transmitindo
para aquele pedaço de material tudo que eu precisava.
E tudo isso era apenas para dar adeus a esse sentimento e
guardar o quadro dentro do armário na parede, impedindo que
qualquer um visse todos os meus sentimentos mais crus a olho nu.
Desliguei a música, vendo que a bagunça na rua já começava.
Aquilo me dava mais inspiração do que eu imaginava que daria. Me
afastei um pouco do quadro, puxando uma garrafa de água para me
hidratar e aproveitei para tirar a franja do meu rosto.
O quadro mostrava os olhos de Matteo bem no centro, cercado
pela peça do quebra-cabeça que eu finalmente tinha terminado, a
tatuagem que parecia deitada, o globo de neve quebrado e a renda
da minha lingerie de quando perdi a virgindade, a qual parecia um
manto sobre o quadro. Tudo estava ali. E cada uma das cores que
me lembravam Matteo formavam uma confusão de tintas. Ainda
faltava contornar cada um dos detalhes para terminá-lo de vez, mas
outra hora eu faria isso.
Encarei minha roupa e as manchas de tinta que precisavam ser
lavadas. Tirei o avental e o coloquei sobre a cadeira. Depositei cada
um dos pincéis que eu tinha usado dentro do pote com solvente de
tinta, para que eles ficassem limpos de novo.
Essa parte do processo era minha parte favorita, quando eu
sentia que tinha feito muito e começava a organizar meus materiais.
Fechei a porta do quarto e caminhei até o meu, abrindo o guarda-
roupa, pegando um vestido de lã e jogando-o em cima da cama.
— Você precisa parar de se enfiar dentro dessa casa e fingir que
não existe um mundo do lado de fora, Raffaela. Um coração
quebrado não significa uma vida desperdiçada.
Tirei a roupa que estava usando e joguei no canto do quarto.
Outra coisa que eu precisava: comprar coisas para a casa. Tomei um
banho rápido, lavando meu cabelo que agora estava enrolado na
toalha de rosto.
— Toalhas. Cesto de roupas. Tapetes. Mais copos. Mantimentos
para a próxima semana. — Eu continuava anotando na minha
cabeça as coisas que eu teria que comprar no dia seguinte. — Tinta
azul, verde, amarela. Achar aquele vermelho envelhecido.
Coloquei o conjunto de lingerie e, quando comecei a colocar o
vestido, ouvi a campainha de casa tocando. Saí enrolada, tentando
me arrumar. Olhei pelo olho mágico e Atena estava olhando para o
relógio, parecendo sem paciência.
Abaixei o vestido em minhas coxas e puxei um pouco na cintura
para disfarçar as dobras que ficavam evidentes demais no vestido.
Abri a porta e Atena me encarou.
— Que bom que está apresentável e não parecendo um garoto
de cinco anos que acabou de descobrir o que dá quando mistura
amarelo com azul.
— Oi? Eu estou ótima e você? Fico feliz que perguntou, eu amo a
minha casa e adoro quando ela é invadida por pessoas.
Atena riu e entrou para dentro do apartamento. Estiquei o braço
ainda parada na porta.
— Entre, por favor.
— Quanto drama, Raffaela. Eu preciso da sua ajuda, se não
estiver ocupada…
Respirei fundo. É claro que eu não estava ocupada. O máximo
que eu faria agora seria descer e tomar duas taças de champagne
enquanto via as pessoas se divertindo e dançando.
— O que aconteceu?
— Ceci. Ela cismou que quer conhecer o Coliseu à noite! Não sei
de onde veio isso, mas Rocco e eu temos reuniões. Eu com a
empresa que estou trabalhando junto em um casamento e ele com
noivos que vieram de fora e só ficarão alguns dias. Você precisa
ajudar a gente.
— Com tudo pago? — perguntei. Se era para ser babá longe de
casa, que pelo menos fosse pago.
— Claro que vou pagar as coisas da minha figlia.
— Eu estava perguntando sobre as minhas despesas, mas tudo
bem… finja que não entendeu, Atena.
Atena surpreendentemente me puxou para seus braços, me
abraçando apertado. Meu rosto estava bem nos seus peitos e me
afastei dela.
— Raffaela, é tão bom te ter de volta.
— Fico feliz por te fazer feliz, Atena. Posso terminar de me
arrumar para essa saída? Acho que agora essa roupa não está boa.
— Fique à vontade. — ri e segui para o meu quarto.
Peguei uma jaqueta de couro no guarda-roupa, jogando em
cima da cama, puxei o pé de uma bota branca e comecei a procurar
pelo outro. Eu ainda não tinha arrumado bem o guarda-roupa.
Achei no meio das blusas de frio e me sentei na cama para
poder terminar de me arrumar. Fui até o banheiro, usando o espelho
para me maquiar.
— Que coisa mais linda, Raffaela! Posso ficar pra mim?
Corri até onde Atena estava temendo que fosse exatamente o
que eu estava imaginando. O meu ateliê estava aberto, e Atena
olhava para o quadro de Matteo com lágrimas nos olhos.
— Raffa, isso devia estar em uma exposição. Olha a delicadeza
que os traços são feitos e as pinceladas... mostram muito
sentimento.
— Obrigada, mas esse quadro não é para ninguém ver.
— Por quê?
— Porque ele é sobre Matteo.
Atena arregalou os olhos e encarou de novo o quadro.
Parecendo prestar atenção em cada pedaço do quadro e
percebendo as semelhanças, ainda que não soubesse de tudo.
— Você ama muito o Matteo, não é?
— Mais do que eu achei que pudesse realmente amar, mas
acabou, não é? Chegou ao fim e agora eu tenho que seguir em
frente sabendo que o que eu tive não foi nada. Uma memória, assim
como esse quadro. Apenas uma memória.
— Sinto muito, Raffa…
— Eu sei.
54
Matteo

— A Raffa está por aí, a Atena disse que ia terminar de arrumar a


Ceci e eu ia levá-la para a entrada do Coliseu. Preste bem atenção!
Eu consegui isso apenas porque eu fiz o casamento de uma pessoa
muito importante, que eu vou manter em segredo porque não quero
minha cabeça na guilhotina — Revirei os olhos e estacionei o carro
longe do Coliseu. — Você tem uma hora. Não sei o que combinou
com Atena, mas saiba que eu mandei gravar… então tentem não me
traumatizar e traumatizar a minha esposa.
— Você é muito dramático, Rocco. — Olhei para a porta do lugar
que estava lotada de turistas que vinham de todos os lugares. Por
isso, eu tinha que honrar o que Rocco tinha feito. — Raffaela talvez
nem queira me ouvir.
— Você reservou o Coliseu, é claro que ela vai te ouvir.
— Vou sair. Espero encontrar ela logo, tem uma confusão de
pessoas aqui… não podia ter sido um dia mais tranquilo, né? —
Rocco riu e eu desliguei o telefone, o guardando no bolso da calça.
Ajeitei minha roupa, passando a mão pelo sobretudo preto, e me
encarei no reflexo do carro. Meu coração parecia que ia sair pela
boca. Minhas mãos tremiam e eu quase não conseguia ouvir nada.
Caminhei até perto do Coliseu; a sua magnitude me
impressionava todas as vezes que eu visitava o lugar. Ouvia os
burburinhos enquanto atravessava a grande fila. Raffaela estava
parada, encostada na parede, cansada de esperar por Ceci, com
certeza.
Cheguei até onde ela estava e dei um oi para o segurança que
finalmente deu passagem. Raffaela olhava para o celular e, por isso,
só me notou quando eu estendi a mão para ela.
Seus olhos subiram por meu corpo e esperei que ela pegasse a
minha mão. Eu podia ver que ela estava confusa, seu rosto estava
franzido e ela olhava para os dois lados procurando por Anna
Cecília.
— Seu encontro é comigo, Raffaela… e a gente só tem uma hora.
— Raffaela olhou para o meu rosto e de novo para os lados. — Vem,
lá dentro você pode gritar comigo para toda Roma escutar.
Raffaela pôs a mão na minha, e eu apertei seus dedos nos
meus, apenas para que não houvesse chances dela escapar. Eu
nunca mais a deixaria fugir. Ouvimos alguns xingamentos em outras
línguas enquanto entrávamos sozinhos no monumento.
Seguimos o caminho que eu sabia de cor, porque o Coliseu era
um dos meus lugares favoritos em Roma. Raffaela não falava nada,
mas segurava a minha mão contra a sua vontade, enquanto eu a
arrastava pelos corredores.
Quando cheguei ao centro de tudo, estanquei, olhando para o
que Atena e Rocco tinham feito aqui. Era simples, quase discreto
demais para quem estava aqui para aproveitar apenas da história.
— Uau, você fez isso? — Foi a primeira vez que ouvi a voz de
Raffaela em um longo tempo e o alívio que aquilo me trouxe quase
me colocou de joelhos. — Por que você está me olhando assim?
A pergunta me fez rir e Raffaela largou minha mão.
— Não precisa rir, só estranhei.
— Não, eu não estou rindo de você… é só que a pergunta é tão
absurda, Polpetta… estou te olhando do mesmo jeito que te olhei
todos os dias que passamos juntos.
— Acho que não precisamos trazer esses assuntos agora… eu já
falei para todo mundo que nós não estamos mais juntos e o Rocco
até sabe que era uma mentira… você não precisa mais fingir.
Cocei a cabeça e me aproximei dela, querendo tomá-la e botar
algum sentido em sua cabeça. Raffaela deu um passo para trás e
olhou para o lado.
— Vem comigo, bella.
Raffaela finalmente pareceu notar que ainda estávamos
sozinhos. Puxei sua mão na minha, não querendo soltar nunca mais.
Caminhamos juntos até o espaço que estava rodeado por flores.
Aquilo era coisa de Atena, cada detalhe parecia ter sido pensado.
Ouvi uma música saindo dos alto-falantes do lugar. Era uma
música romântica e virei para Raffaela.
— Me concede essa dança? — Eu tinha escolhido a música a
dedo, era uma cantora que Raffaela gostava, nós tínhamos ouvido
demais aquela música no meu carro.
Sweet Nothing de Taylor Swift seria a música que embalaria
nossos passos. Raffaela concordou com a cabeça e me envolveu
com seus braços. Seu perfume de flores me tirou do chão. Eu
aproximei mais meu rosto de seu pescoço, dando um leve beijo na
curva com o ombro.
— Matteo, o que é tudo isso?
— Nós vamos conversar, bella. Eu te prometo, mas primeiro me
deixe te segurar em meus braços por mais alguns momentos, é só o
que eu te peço. Ho passato l'inferno senza di te.
A música continuava tocando, falando sobre um amor doce para
onde você pode correr no fim do dia e era isso que eu tinha vivido
com Raffaela. Seus olhos se fecharam e ela encostou a testa na
minha. Minhas mãos seguravam sua cintura, com medo que ela
fosse querer fugir de mim.
Eu fazia pequenos círculos em sua coluna, tocando seu corpo
como eu não fazia há uma semana e três dias. Meu coração parecia
bater em meus ouvidos. Torcia para que ela estivesse sentindo essa
mesma sensação de pertencimento que eu sentia.
— Eu senti tanto a sua falta, Raffaela… que mesmo com você
aqui nos meus braços ainda parece que eu estou sentindo sua falta.
Como eu posso viver sem você?
Raffaela se afastou, quebrando nosso contato. As luzes do céu
pareciam pequenos cometas e estrelas cadentes, por isso, mesmo
que não tivesse nada concreto no céu que pudesse transformar
meus desejos em realidade, eu pedi.
Pedi que ela me perdoasse.
Pedi que ela me amasse de volta.
Pedi para que ela me desse outra chance.
55
Raffaela

Matteo baixou os olhos, parecia que ele tinha feito algum pedido
para as estrelas. Eu, no entanto, não pediria nada para ninguém:
nem ao céu, nem ao universo e nem à pessoa à minha frente. Eu
não imploraria pelo amor de mais ninguém.
— Raffa, você quer começar a falar?
— Eu? Quem armou todo um plano pra me trazer aqui foi você,
Matteo.
— Tem razão.
Caminhando até um dos buquês que Atena tinha espalhado,
Matteo pegou um com lírios e me entregou. Resisti a vontade de
revirar os olhos, e coloquei a mão sobre a sua que estava estendida
para mim.
— Você parece feliz.
Matteo não tinha noção de como aquilo era uma fachada. Sim,
eu estava melhor, melhor do que eu já imaginei estar. Não sabia que
sair de casa e ter meu próprio espaço me faria tão bem, mas fez. E
mesmo assim parecia que faltava algo.
Algo que fazia meu coração acelerar e bater contra minha caixa
toráxica. Matteo sorriu me olhando e puxou minha mão para perto de
seu peito, enquanto andávamos.
Aquela palavra ficava rondando minha cabeça e eu quase queria
gritar com ele para que explicasse o que ela significava. Infelizmente.
Tentei afastar meus pensamentos daquilo e a única coisa que eu
conseguia pensar foi que estar no Coliseu vazio era meio macabro.
— Tinha que ser no Coliseu à noite? — perguntei, sentindo os
pelos em meu braço se arrepiando com um assobio alto que ouvi. —
Não podia ter sido em um jardim?
— Eu gosto muito do Coliseu, sabia? Foi aqui que minha mãe me
trouxe assim que mudamos para Roma.
— Não sabia…
— Tem muita coisa sobre mim que você ainda não sabe,
Raffaela, mas você vai saber tudo. Nós vamos ter muito tempo para
que eu descubra todos os seus segredos e você, os meus.
Puxei minha mão da sua e o encarei.
— Matteo, não é assim, eu ouvi o que você disse… eu sei que
estar comigo era um peso que você não conseguia mais suportar.
Era um namoro falso, e só isso. Acabou, por que me machucar
mais?
— Raffaela… quando você vai entender que a parte falsa desse
relacionamento durou apenas alguns dias? Nem sei se foi realmente
um namoro falso… no momento que eu te beijei na empresa, eu já
era completamente seu.
— Você diz isso agora, Matteo, mas eu te ouvi. Eu sei o que eu
ouvi, você estava com aquela mulher linda e dizendo que
“infelizmente estava em um relacionamento”, você não tem noção de
como aquilo me deixou. Eu sei que você não estava naquele
relacionamento por vontade, e que… eu nem posso te cobrar nada.
Nós dois sabíamos que era assim, mas quando transamos, eu achei
que tinha se tornado algo maior. Eu sou só uma boba.
Matteo deu um passo para frente e levantou minha cabeça.
Encarei seus olhos e seu rosto, pensando no quadro que estava em
casa. Mordi meu lábio, tentando parar o choro que eu não conseguia
mais segurar.
— Bella… eu nem sei como começar a pedir desculpas pelo que
você ouviu. Eu prometi para mim mesmo que nunca ia te machucar e
aí Atena me contou como você tinha ficado desolada. — Matteo fez
um carinho em minha bochecha e se aproximou mais de mim. — Eu
passei todos os dias pelo seu prédio, torcendo para que nos
encontrássemos, porque eu não podia tocar na sua porta quando eu
sabia que você estava tão mal e eu tinha sido o causador daquilo.
Ouvi as primeiras pessoas entrando no Coliseu e não percebi
que já estávamos ali há tanto tempo. Matteo percebeu que eu estava
tremendo por estarmos em uma parte mais alta. Senti seu sobretudo
sendo colocado sobre meus ombros e sua cabeça encostou na
minha. Ficamos abraçados em silêncio.
Parecia um fim, eu não sabia o porquê, mas parecia. Tomei
coragem e falei o que precisava.
— Ti amo. — Não olhar em seus olhos facilitava tudo. — Talvez
eu ame por mais mil anos, talvez amanhã eu acorde curada, mas
Matteo… saiba que, enquanto estivemos juntos, eu te amei com toda
a minha alma.
Matteo me virou para ele e seu rosto mostrava uma confusão
que eu mesma sentia.
— Você está louca, Raffaela? Nós não estamos terminando. Quer
dizer, estamos.
Franzi a sobrancelha, esperando por aquela explicação. Aquela
sim era uma explicação que eu queria muito ouvir.
— Estamos terminando o nosso namoro sob o termo de “namoro
falso”, pode excluí-lo da sua cabeça. Não existe nada falso no
sentimento que eu tenho por você. Você me ama? Ótimo. Eu vou
fazer valer cada gota desse sentimento que você depositou em mim.
Mas eu não vou apenas te amar, eu vou te adorar, eu vou construir
altares para você. Raffaela, sei la mia vita. Então, eu preciso saber…
você aceita ser minha namorada? E em algum momento, não muito
longe, minha esposa? Porque eu não estou ficando mais novo e eu
já pensei em pelo menos três crianças com você.
— Você me ama? — Não consegui parar o sorriso em meu rosto.
— Completamente, Raffaela.
Passei os braços por seu pescoço, puxando Matteo para perto
de mim. Nossas bocas se encontraram no meio do caminho, como
se não aguentassem mais ficarem distantes. Meu coração parecia
que ia sair pela boca, voando em queda livre em direção ao solo que
os romanos lutaram, ganharam e perderam batalhas. A minha estava
vencida. Matteo me amava.
Nossas línguas se enroscaram, e suas mãos me apertaram mais
forte de encontro ao seu corpo. Uma chuva fina começou a cair, mas
aquilo não nos parou. Senti meu corpo sendo levantado e Matteo me
puxou para uma parte coberta, impedindo que a chuva nos
consumisse.
Respirei fundo, parando o beijo, suas mãos entraram por baixo
da minha blusa e eu me arrepiei com o quanto elas estavam geladas.
— Raffaela, eu tenho um presente para você.
— Um presente?
— Sim, eu estou tentando me esquentar, sabe? — disse rindo em
meu pescoço, enquanto me beijava. — Então, você pode colocar a
mão dentro do bolso esquerdo e pegar o presente?
Concordei com a cabeça, enquanto sua boca continuava me
beijando. Notei o pequeno objeto redondo e o puxei. A luz refletiu no
vidro e eu tive certeza do que era.
Um pequeno globo de neve da Torre di Pisa igualzinho ao que
eu tinha quebrado. Matteo parou de me beijar quando sentiu que eu
tinha parado de responder aos seus carinhos.
— Essa é a que eu te dei?
— Não, a que você me deu está no mesmo lugar de sempre, no
meu escritório, onde eu posso lembrar da mulher que eu amo
sempre quando estou sozinho… esse eu consegui indo até a Torre di
Pisa, e escolhendo a dedo um que fosse idêntico ao que você
quebrou… — Matteo colocou a mão sobre o objeto e sorriu para
mim. — Isso é uma coisa nossa, amore mio, e ninguém pode
quebrar o que nos liga há anos, arte, amor e o Rocco.
— Ti amo tanto, Matteo.
— Ti amo, bella.
56
Matteo

Raffaela voltou a me beijar, me puxando de encontro a uma


pilastra e nos escondendo dos visitantes curiosos. O lugar que
estávamos era distante de onde as pessoas normalmente passavam.
Minhas mãos subiram por suas coxas, afastando o vestido
colado. Puxei sua perna em volta da minha cintura e me aproximei
mais de Raffaela. Suas mãos geladas já estavam embaixo da minha
blusa, tocando minha pele quente. Senti meu pau ficando duro com a
necessidade de tê-la de novo.
Aproximei minha boca de seu pescoço e Raffaela suspirou,
fazendo seu peito subir e descer. Me afastei dela e notei seus olhos
nublados de desejo.
— A gente precisa sair daqui, Raffaela… — falei, temendo que
perdesse a cabeça na frente de diversos turistas.
— Por quê? A gente não pode fazer aqui? — perguntou baixinho,
abrindo minha calça.
Suas mãos circularam meu pau por cima da cueca box e seus
olhos não saíram do meu rosto, enquanto eu tentava não me
contorcer com seu toque. Raffaela sorriu de lado e começou a beijar
meu pescoço. Sua mão continuava trabalhando em meu pau e a
ajudei a baixar a cueca.
Coloquei minhas mãos na parede atrás de Raffaela e tentei me
apoiar. Suas mãos pareciam seda me apertando e bombeando meu
pau devagar, causando arrepios em todo o meu corpo.
Quando comecei a sentir meu pau crescendo com as suas mãos
em mim, afastei as pernas de Raffaela, puxando seu vestido para
cima, dando liberdade para que eu pudesse tocar sua boceta. Como
eu esperava, estava completamente encharcada.
— Você ama me tocar, não é, Polpetta? Sua buceta está
chorando para ser comida depois de tanto tempo longe, certo? Quer
ser fodida aqui? Enquanto milhares de pessoas caminham por esse
terreno? — perguntei, passando os dedos por sua boceta, melando
ainda mais com a lubrificação de Raffaela. — Eu vou te foder bem
gostoso, mas você tem que ficar quietinha. Agora, vira de costas
porque eu quero ver essa bunda gostosa enquanto eu te fodo.
— Matteo, per favore… — virei Raffaela pela cintura e ela
colocou as mãos na parede, temendo que eu a machucasse, como
se isso fosse possível.
Respirei seu perfume, abaixando a sua calcinha e dei um tapa
em sua bunda. Raffaela gemeu alto e eu quase tampei sua boca,
mas eu sabia que do lado em que estávamos, poucas pessoas iam
pela pouca iluminação.
Passei meu pau por sua abertura e Raffaela rebolou devagar,
experimentando a sensação de estarmos juntos de novo.
— Eu não tenho uma camisinha aqui, Raffaela…
— Tudo bem… eu tomo anticoncepcional.
Aquilo parecia música para os meus ouvidos. Enfiei com tudo,
gemendo, sentindo suas paredes me apertando ao se acomodarem
com minha grossura em sua boceta.
Raffaela se mexia, não conseguindo ficar parada, enquanto eu
me acostumava com a sensação de estar dentro dela sem nada
entre nós dois pela segunda vez. Coloquei a mão em sua bunda,
apertando um lado, fincando meus dedos em sua carne, enquanto
ela rebolava de encontro ao meu pau.
Coloquei minha mão em sua boca, tapando ao ouvir passos se
aproximando e praguejei mentalmente, enquanto Raffaela
continuava seu movimento. Não que eu tivesse parado, a sensação
de sermos pegos era gostosa demais para não continuar metendo
em sua bucetinha enquanto ela mordia minha mão.
— Matteo, mais forte, per favore… — o som abafado de sua voz,
quase me fez gozar. Tirei a mão que estava em sua boca e a lambi,
tocando seu clitóris e movimentando em círculos.
Continuei me movimentando em um vai e vem, enquanto a sua
boceta me apertava cada vez mais.
— Raffaela, eu juro que sua buceta é a melhor coisa que existe
no mundo. Eu vou encher de porra todos os dias e você nunca mais
vai ficar longe de mim, entendeu?
Quando senti o orgasmo de Raffaela em meu pau, eu perdi os
sentidos. Apertando ainda mais sua bunda e continuei metendo até
gozar em sua boceta. Me afastei dela, ainda segurando seu corpo
que parecia fraco e guardei o pau na cueca, fechando a calça.
Abaixei o vestido de Raffaela e a virei para mim, o sorriso em seu
rosto parecia difícil de tirar.
Um homem se aproximou limpando a garganta.
— Os dois têm que me acompanhar até a delegacia. Sexo em
público é crime.
Raffaela me olhou assustada, mas tudo que eu conseguia fazer
era segurar a risada que estava querendo borbulhar em meu peito.
Aquilo era ridículo, claro… Começamos a nossa história com a
Raffaela presa e agora iríamos para a cadeia.
Não teve uma caminhada da vergonha, mas Raffaela parecia
pronta para chorar, por isso, me aproximei dela e a abracei.
— O que foi, amore? Não vai dar em nada, foi só uma
rapidinha… nós só vamos ter que pagar uma multa. — Raffaela se
encostou em mim e eu pude sentir seu corpo chacoalhando. — Não
chore.
— Eu não estou chorando, eu estou rindo… um belo círculo, não
é? — comentou, e eu podia sentir as lágrimas de seu riso em meu
peito. — Pelo menos dessa vez eu vou ser presa e a única coisa
molhada em mim é o seu gozo escorrendo pela minha perna.
— Raffaela!
A delegacia não era muito longe, e por sorte pudemos fazer o
caminho no carro de um dos guarda que cuidava do Coliseu. Ao
chegarmos à delegacia, virei para Raffaela e falei:
— Per favore, vamos tentar não terminar presos de verdade
dessa vez, ok? Vamos apenas pagar o que devemos e ir embora. Eu
não quero ter que pedir pro Rocco vir tirar a gente daqui.
— Estou de boca fechada, meu advogado está comigo.
Dei um beijo em sua cabeça e saímos do carro, indo em direção
ao primeiro policial que encontramos. O guarda explicou a situação e
parecia que eu tinha invadido o Vaticano e praticado sexo lá dentro.
— Vocês dois deviam se envergonhar disso… estou começando
a pensar que seria bom colocar na frente do Coliseu a foto das
pessoas que fazem sexo lá dentro imaginando que não vão ser
encontrados por causa dos diversos espaços.
Virei para Raffaela e ela parecia muito séria, mas eu podia ver
seu lábio tremendo. Depois de quase uma hora de sermão, o cara
nos liberou para fazer o pagamento.
Raffaela ainda tentava segurar o riso. Puxei seu corpo para mim,
quando saímos da delegacia.
— Para onde, senhorita?
— Para as estrelas.
Eu mesmo levaria Raffaela para as estrelas se pudesse. Puxei
sua boca para minha, implorando para estar dentro dela de novo.
— Vamos para casa, Matteo.
— Agora mesmo, bella.
57
Raffaela

Ouvi o fogo crepitando e virei na cama, apenas para confirmar


que Matteo não estava mais ali. Levantei, puxando o roupão felpudo
rosa e enrolando em meu corpo. Andei até o banheiro e me encarei
no espelho enquanto escovava os dentes. Meu cabelo estava
bagunçado, mas eu não estava com disposição para arrumar.
Me aproximei de Matteo e ele fazia alguma coisa no fogão, era
dali que vinha o cheiro delicioso e o barulho de fogão velho. Circulei
seu corpo com minhas mãos, e Matteo virou para trás, me dando um
lindo sorriso.
— Você dormiu bem? — perguntei, eu sabia que a rua poderia
ser bem barulhenta em comparação com a casa de Matteo.
— Como não durmo há uma semana.
Senti o cheiro doce de panqueca e dei um beijo em seu ombro.
— Eu também, eu senti muito a sua falta.
Matteo virou para mim, deixando a panqueca na frigideira. Suas
mãos fizeram uma concha em meu rosto e aproximou nossas bocas.
Respirei fundo, olhando sua boca carnuda, e passei minha mão por
seu rosto, fazendo carinho em suas bochechas e Matteo me deu um
beijo leve.
O cheiro de algo queimado nos acordou do momento que
estávamos vivendo.
— Merda, pelo menos foi a primeira que eu queimei…
— Você quer que eu te ajude com algo? — perguntei, me
encostando no balcão da cozinha, vendo Matteo cozinhar sem
camisa e com a calça social.
— Não, pode deixar, você me distrai… preciso ficar focado ou
nosso café da manhã ficará horrível.
Deixei Matteo na cozinha e voltei para o quarto, arrumando a
bagunça que a cama estava. Puxei o travesseiro que Matteo tinha
dormido e o apertei em meus braços
Soltei o travesseiro na cama, bagunçada do mesmo do jeito que
estava e corri de volta para a cozinha. Matteo virou ao ouvir o
barulho e não teve tempo o suficiente para se preparar para meu
corpo se chocando com o seu.
— Ti amo, ti amo, ti amo, ti amo, ti amo, ti amo, ti amo, ti amo, ti
amo, Matteo. — Matteo puxou minhas pernas em volta da sua
cintura e me olhou, tentando entender o que estava acontecendo. —
Você não tem noção de como é bom poder dizer olhando nos seus
olhos que eu te amo.
— Eu sei, achei que nunca ia falar que amava uma mulher, mas
agora eu não apenas amo alguém, como amo a melhor pessoa que
existe. Raffaela… eu te amo tanto que parece que meu coração vai
sair voando do meu peito.
— Matteo, você não está entendendo. Você não sabe o quanto
eu esperei para poder dizer que te amava. Quantas vezes eu
brinquei com Atena sobre como eu só aceitaria ser pedida em…
namoro… por você e eu agora posso olhar nos seus olhos e dizer
que eu te amo.
Ficamos os dois em silêncio, aproveitando a sensação de ser
amado e ser correspondido. Eu passei eras esperando que Matteo
me amasse de volta e nunca imaginei que esse dia chegaria.
— Acho que devo agradecer meu papà.
— Por quê? — Matteo ainda não tinha me colocado no chão e eu
quase pedi para ele me descer.
— Por ter me feito te colocar nesse namoro falso… quer dizer,
você realmente acha que aconteceria de outra maneira?
— Sim, aconteceria, Raffaela. Nós estaríamos em um jantar
juntos e eu ia te olhar e perceber que você não era mais apenas a
sorella do meu melhor amigo. Eu te olharia e perceberia que você
era tudo que eu sempre busquei sem saber. E então, quando todos
fossem dormir, eu te roubaria um beijo…, apenas para você ver que
eu estava tão interessado quanto você. Eu correria atrás de você
todos os dias. Entregaria flores, entregaria meus dias, e faria de tudo
para que você visse que eu estava sentindo o mesmo que você… eu
fui predestinado a você, Raffaela.
Matteo passou os dedos por meu rosto, limpando as lágrimas
que escorriam por meus olhos. Desci de seu colo e segurei sua mão,
sentindo que aquele homem era tudo que eu mais precisava.
— Eu preciso te mostrar uma coisa, tudo bem? — falei,
segurando seus dedos nos meus. — É uma coisa que eu fiz e
terminei ontem, antes de ir ao Coliseu…, eu achei que nunca
entregaria para você e… você não precisa ficar com ele.
— O que, Polpetta?
Paramos em frente ao meu ateliê de pintura e segurei a
maçaneta. Respirei fundo, e virei para Matteo.
— Per favore, não ria dele.
— Eu nunca faria isso…, eu era apenas um garoto e idiota
naquela época, te juro que sou muito melhor agora.
Abri a porta e tomei coragem, deixando Matteo entrar junto
comigo. O quadro estava exposto no cavalete secando. Ele largou
minha mão, parecendo espantado, e se ajoelhou em frente ao
quadro. Seus dedos seguiam os traços no ar, sem realmente
encostar na tela, acompanhando cada pedaço da nossa história.
Seus olhos foram atraídos pela inscrição no canto do quadro e
ele virou para mim, abrindo e fechando a boca, parecendo sem
palavras.
— Raffaela, esse quadro é uma obra de arte. Cada detalhe
nosso, da nossa história. Eu quase consigo sentir sua tristeza
misturada com o amor. E… o nome. “Enquanto Eu Te Esperava” —
sua voz tremulou ao falar o nome do quadro. — Você é uma artista.
La mia artista.
Matteo se levantou rápido e me abraçou, rodopiando em frente
ao quadro. O sorriso em meu rosto parecia permanente, seria para
sempre. Nossos filhos ouviriam a história de como seus pais se
apaixonaram e viveram felizes para sempre.
Seriam crianças que não teriam medo de ser quem quisessem,
ou ter a profissão que quisessem. E o mais importante: seriam
amados sem reservas. Matteo me puxou para mais perto, me
beijando e se afastando apenas para olhar bem dentro dos meus
olhos e dizer:
— Acho que esse quadro merece uma comemoração…
— Que comemoração?
— Uma que envolva você nua e sentada no meu pau.
Joguei a cabeça para trás rindo, e Matteo continuou me olhando.
É, não tinha como resistir.
Matteo puxou meu roupão para fora do corpo, me deixando
apenas de calcinha. Seus olhos se iluminaram ao olhar para mim e
eu sentia o seu amor, era um amor que duraria. O tipo de amor que
eu merecia.
— Ti amo, Raffaela. Ti amo tanto.
58
Matteo

Raffaela estava deitada sobre meu peito, enquanto assistíamos


uma série nova que ela tinha encontrado. Eu continuava fazendo
carinho em seu cabelo enquanto ela cochilava.
Eu não conseguia descrever o tipo de sentimento que aquela
paz me causava. Finalmente Raffaela estava de volta em meus
braços, finalmente eu podia dizer que estava tranquilo depois de uma
semana vivendo o próprio inferno.
Nós tínhamos colocado o quadro que ela fez na parede da sala,
mas não ficaria ali para sempre. Ele iria comigo para onde eu fosse,
assim como ela. Eu não conseguia pensar em ficar mais tempo
separado dela, nem que eu precisasse me mudar para a sua casa.
Cocei a cabeça e olhei para seu rosto sereno. Raffaela era a
coisa mais linda que já aconteceu na minha vida. Peguei sua mão,
segurando na minha, e entrelacei nossos dedos em meu colo.
Eu nunca tinha pensado em casamento. Era algo que sempre
esteve muito longe da minha realidade. Nunca quis ser igual ao meu
pai, ou ficar em silêncio vendo alguém que amo se destruindo por um
amor.
Raffaela abriu os olhos e se aconchegou ainda mais em meu
peito, voltando a dormir. Eu queria ficar para sempre olhando para
ela. Para sempre.
— Raffa… — apertei nossos dedos e ela abriu os olhos
sonolenta. — Se um dia eu te pedir em casamento, você aceita?
— Antes mesmo de você terminar de pedir.
Meu coração pareceu doer de expectativa pela vida que
teríamos pela frente. Eu sabia que as pessoas sempre imaginavam
momentos como aqueles nos finais dos filmes, mas aquele não era
um final. Era o nosso começo. Um recomeço para o que ainda
estava por vir bem diante dos nossos olhos.
— Você vai pedir agora? — perguntou, de olhos fechados e me
abraçando mais forte. — Eu preciso pelo menos ficar apresentável,
não me venha com um pedido na sala de casa depois de me pedir
em namoro no Coliseu.
— Não, pode voltar a dormir, mas em breve.
— Em breve é um bom tempo, não é?
— Sem dúvidas.
Fiquei em silêncio, deixando-a dormir em meu peito. Voltei a
prestar atenção na série e fui, de novo, sugado para dentro de um
vício que Raffaela me apresentou.
Fechei os olhos, querendo rir, mas não querendo perturbar seu
sono. Quando abri os olhos, percebi que já tinha escurecido do lado
de fora e a TV estava desligada, e o único barulho que parecia vir de
algum lugar era da cozinha.
Levantei do sofá me espreguiçando e andei até o ambiente.
Raffaela estava vestida com uma legging escura e uma blusa
manchada de tinta, os cabelos presos em um coque no alto da sua
cabeça e um sorriso no rosto.
— Boa noite, Matteo.
— Boa noite, Raffaela. — A abracei por trás e inspirei o perfume
de flores que ela usava. — Você estava pintando?
— Sim, mas só enquanto você dormia… eu pedi uma pasta e
eles vão entregar daqui a pouco e a gente pode comer — falou,
passando a mão por meus braços em um carinho que só ela sabia
fazer. — Você quer alguma coisa pra beber?
— Eu posso te ver pintando?
Raffaela ficou em silêncio e virou para mim, seus olhos
brilhavam e um pequeno sorriso se formava em seu rosto. Raffaela
não respondeu, mas grudou minha mão, me arrastando para dentro
do ateliê.
O quadro no cavalete mostrava alguns rabiscos que para mim
ainda não pareciam com nada, mas Raffaela me empurrou para um
canto do espaço e voltou a sentar.
— Me desculpa se não tem nenhum espaço para você ficar
confortável, eu nunca imaginei que alguém fosse querer me ver
pintando…
Andei até ficar ao seu lado e me sentei no chão, olhando de
perto o seu traço delicado na tela. No canto tinha algumas cores
salpicadas, como se ela estivesse estudando qual seria a melhor
opção para aquela tela.
— Eu quero ver tudo de você, bella. Cada pedaço. Eu vou
sempre ser o seu maior fã, aquele que sempre vai estar na primeira
fila para bater palmas para você…
Raffaela virou para mim, e segurando o pincel na mão, ela se
aproximou me dando um beijo leve. Senti meu rosto sujo de tinta,
mas não me importava. Nada mais importava enquanto eu estive
sempre ao lado dela.
Me afastei um pouco, assistindo enquanto ela trabalhava em seu
quadro. Suas mãos batiam no canto da tela, as sobrancelhas
franzidas, dando pequenas mordidas de tempo em tempo nos lábios.
E ela nunca pareceu tão linda quanto naquele momento, fazendo o
que amava fazer, sem que ninguém a podasse.
Não, Raffaela precisava ser vista, apreciada, amada e venerada.
E eu faria tudo isso e muito mais, apenas pelo prazer do seu brilho
refletindo em mim, porque não importava como, eu sabia que
seríamos para sempre.
Puxei meu celular do bolso e tirei uma foto dela, seu sorriso
crescendo conforme ela pincelava o quadro com cores vivas.
Raffaela era minha obra de arte. Não era à toa que eu tinha marcado
minha pele para sempre com ela, antes mesmo dela ser minha.
Porque ela seria.
Raffaela seria para sempre minha. Olhei de volta para ela e ela
me encarava com a mesma devoção que eu direcionava para ela.
Sim, isso era para sempre. Não tinha mais final. Raffaela era
minha e eu era dela. Que fosse assim até o fim dos tempos.
— Por que você está me olhando assim? — perguntou, não
tirando os olhos do quadro.
— Quer casar comigo?
— Não… eu já disse, só quando fizer um pedido tão grande
quanto o Coliseu. — Comecei a rir e ela ficou séria. — Eu estou
falando sério, Matteo Esposito Ricci.
— Eu já entendi, Raffaela Amara Giordano.
— Isso… Raffaela Giordano até você ter coragem de fechar o
Vaticano para mim.
Joguei a cabeça para trás e apertei os olhos enquanto ria.
— Não sei se você lembra, mas não acabou muito bem o seu
pedido no Coliseu… eu estou mais pobre graças a ele. Não vamos
profanar o Vaticano, ok?
Raffaela levantou e começou a tirar a calça, subindo em meu
colo. A camiseta foi logo em seguida e ela passou o pincel por meu
rosto.
— Quer casar comigo, Raffaela?
— Vou pensar no seu caso…
EPÍLOGO I
Raffaela
3 anos depois

O silêncio do apartamento quase me deixava louca. Eu estava


acostumada com o movimento da rua, as bagunças que aconteciam
durante a maior parte dos dias, aquilo quase servia como inspiração.
E tudo que eu precisava naquele momento era de inspiração.
Há um ano, eu comecei a expor minhas pinturas em uma
pequena galeria no centro de Roma. Algumas tinham sido vendidas,
mas a maioria continuava no espaço que era dedicado a novos
pintores da cidade.
Minha mãe e meu pai tentaram se aproximar algumas vezes, e
eu tinha permitido. Não era um relacionamento completo como
tinham com Rocco, mas era o nosso relacionamento. Minha mãe
passou algum tempo na terapia, entendendo como tinha me feito mal
e eu também.
Estiquei minha coluna e senti a dor comum na lombar que vinha
das horas que eu ficava parada em frente à tela. Nos últimos meses
as dores tinham sido mais comuns do que eu gostaria de dizer, tudo
graças ao aumento das horas que eu passava pintando, mesmo que
Matteo achasse que eu devia diminuir.
Ouvi a chave na porta e fechei os olhos sabendo que ele ia
brigar comigo. Joguei os pincéis dentro do pote e tentei ao menos
fingir que não estava pintando, mas, como tudo que na minha vida
não dava certo, o pote caiu no chão derrubando todo o solvente
colorido das horas que passei pintando.
Fui tentar levantar da cadeira confortável que eu tinha arrastado
até o ateliê, mas parecia que eu tinha travado. Tentei chutar os
pincéis para longe do quadro, mas tudo que eu consegui foi sujar
mais. Bufei nervosa, batendo com as mãos na perna e ouvi o riso
que vinha da porta.
— Você não aprende, não é mesmo, polpetta? — revirei os olhos
para o apelido ridículo e respirei fundo, virando na cadeira para olhar
Matteo parado na porta.
— Já falei para parar de usar esse apelido — reclamei brava.
— Você costumava gostar…
— Sim, quando eu não parecia uma almôndega de verdade! —
respondi apontando para a barriga que agora ficava no caminho de
tudo. — Seu filho ainda vai me matar, eu estou presa na cadeira com
sete meses, Matteo… como eu vou sobreviver até os nove meses,
você pode me dizer?
Matteo se aproximou de mim, dando um beijo em minha testa e
sentando no chão longe da bagunça que eu tinha feito para fazer o
que sempre fazia: conversar com seu filho. Eu era apenas o
recipiente que carregava o amor da vida dele.
— Filippo, você deu descanso para sua mamma hoje? —
perguntou perto da barriga, me causando aquele friozinho que só ele
conseguia causar. — Ou ela te colocou sentado por mais de duas
horas?
— Ele não me deu um segundo de paz e você está reclamando
de eu ter ficado sentada? Esse bambino chuta minha costela de hora
em hora e a culpada sou eu?
Matteo tinha se tornado, nos últimos anos, tudo que eu mais
amava e idolatrava. Mas nada me fez sentir um amor tão forte por
ele do que quando eu acordei vomitando pela terceira vez seguida e
a única coisa que ele conseguia fazer era sorrir e chorar enquanto
segurava meu cabelo e alisava minhas costas. Era como se o mundo
inteiro dele estivesse no lugar enquanto o meu desabava.
Eu jurei que podia matá-lo ali mesmo. Quando ele conseguiu
parar de chorar, e eu de vomitar, Matteo me ajudou a levantar, pegou
minha pasta de dente e colocou na escova rosa que eu usava.
Esperou enquanto eu escovava o dente, me deitou de novo na cama
e saiu.
Parecia que eu tinha morrido na cama, porque era como eu me
sentia, e eu jurava que eu estava com uma intoxicação alimentar
terrível, mas Matteo voltou para casa com laranjas e abacaxis para
mim, indicados por sua mãe, e quatro tipos diferentes de testes de
gravidez.
Eu olhei para ele como se fosse louco, mas era mesmo? Claro
que não. Matteo até tinha criado a mania de dizer que tudo entre nós
dois terminava em sexo, o que não era mentira.
Quando entrei no banheiro para fazer o teste e o tranquei para
fora, Matteo ficou do lado de fora conversando comigo enquanto eu
fazia xixi em um pauzinho. Nunca amei e odiei tanto o mesmo
homem.
Não deixei que ele esperasse o tempo do lado de fora, nós dois
ficamos que nem loucos encarando os palitos como se eles
magicamente fossem mudar todo o processo do teste e fosse
acontecer mais rápido. Lembro do exato momento que Matteo me
virou para ele e proferiu:
— Eu vou ser o melhor papà desse mundo. Prometo pra você,
Raffaela, eu vou fazer de tudo para proteger essa criança de tudo, do
mundo, da dor, mas principalmente de mim. Eu nunca vou ser motivo
de medo nele.
Segurei sua mão, sentindo lágrimas nos meus olhos. Eu tinha
certeza que sim. Matteo era a melhor pessoa que existia, ele só
poderia ser o melhor pai do mundo, não tinha outra alternativa.
— É claro que vai ser! Não existe outra pessoa com quem eu iria
querer ter um figlio, Matteo… — Fechei os olhos e também fiz as
minhas promessas dentro de um banheiro pequeno, enquanto
esperávamos o resultado que poderia mudar nossas vidas para
sempre. — Eu prometo que vou ser a melhor mamma do mundo,
prometo que vou sempre apoiar as escolhas dele… e vou sempre
estar com ele.
Quando o resultado saiu, nós dois encaramos os palitos em
cima da pia. Todos confirmavam a mesma coisa: nós seríamos pais.
E aquela era a melhor sensação do mundo.
— Casa comigo?
Matteo passou a mão por minha barriga e eu acordei das
lembranças. Seus olhos verdes me olhavam com tanto amor e não
tinha mudado nem um pouco nos três anos de relacionamento. Ao
mesmo tempo em que parecíamos ainda estar nos primeiros meses,
tudo havia mudado.
— Eu estava com a Ceci, sabia? — perguntou, sem deixar de me
olhar. — Ela estava me ajudando a escolher algo muito importante.
— O quê? Você tem que parar de tentar roubar minha sobrinha
de mim, Matteo… ela já é meio apaixonada por você, mas com o
papà que tem… desconfio que Rocco seja mais apaixonado que eu.
— Você é apaixonada por mim? — Seu sorriso era gigante e eu
revirei os olhos.
— Claro, Matteo. Eu estou carregando seu filho, achei que tinha
ficado meio óbvio depois de algum tempo.
Matteo levantou e me deu a mão, mas eu simplesmente não
sentia vontade de sair dali. Passei a mão por minha barriga e senti
Filippo chutar. Ele fazia muito aquilo quando Matteo estava por perto,
era como se soubesse que seu melhor amigo estava por perto.
— A gente vai ter que vender uma das casas, não? — Suspirei,
aquela era uma questão que estava rondando minha cabeça há eras.
— Acho que a minha é a melhor opção, — Matteo respondeu,
voltando a se sentar, colocando a mão onde a minha estava,
tentando sentir o filho. — é a casa de um solteiro, e a gente pode
comprar uma casa maior e mais perto do Rocco e da Atena.
— Eu ia gostar de morar mais perto deles, mas também penso
em um lugar grande com muito verde.
— Mas isso teria que ser longe daqui, como eu ia te trazer e
deixar aqui? Apenas para pegar minha namorada e meu filho no final
do dia… eu ia sentir muita saudade.
Matteo vivia me chamando de namorada, apenas para me
lembrar que eu não tinha aceitado nenhum pedido de casamento que
ele vinha fazendo nos últimos três anos. Às vezes eu queria me
chutar assim que respondia não, mas eu sempre sentia que tinha
algo para resolver antes de casar.
Era engraçado, eu, a organizadora de casamentos, não aceitava
o pedido que Matteo, o advogado de divórcios, vivia fazendo.
Olhei para fora da janela e ouvi o começo do burburinho que
começava no entardecer. Matteo levantou me dando um beijo em
minha boca e eu virei para ele.
Matteo estava de joelhos para mim, um delicado anel rosé com
diversas pedras de diamante, com uma lágrima que me lembrava a
tiara que Barbie usava em Lago dos Cisnes.
— Eu sei que você vive dizendo não, e essa se tornou sua tortura
favorita. Não quero tirar sua diversão, mas pensei que valia uma
última tentativa antes de que meu figlio nascesse fora de um
casamento, reconhecido como um bastardo pela igreja.
Meu coração batia mais forte, quase como se fosse escorregar
para fora do meu peito e sair voando. Tudo que eu conseguia ver nos
olhos de Matteo era amor. Um amor que eu sentia na mesma
proporção.
— Raffa… estou nervoso — falou, passando a mão na testa e me
encarando com um sorriso que refletia o que ele sentia. — Eu nunca
achei que pudesse me apaixonar tão perdidamente por alguém, mas
como você sempre faz, chegou e mudou a direção da minha vida,
tornando impossível que eu olhasse para outro lugar que não o norte
que você é. Todo dia eu acordo e vou dormir pensando em como eu
sou sortudo de merecer o seu amor, sortudo de não ter conseguido
apagar esse sentimento em você. Olhando para trás, eu fico
pensando se não teria sido melhor eu ter feito o mesmo que Rocco e
te pedido em casamento assim que surgiu a chance.
— Nós somos melhores que eles.
— Per favore, eu vou morrer se não terminar de falar. Eu aceitei
ser seu namorado pelo tempo que você desejou, eu aceitei cada não
que vinha com um sorriso no rosto, porque eu sempre soube que
seria no momento certo.
Limpei a lágrima que escorreu por meu rosto.
— E não tem momento melhor que nós dois, agora, com nosso
figlio, e o lugar que você mais ama no mundo todo, o seu espaço.
Não existe monumento histórico que vença o amor que tem dentro
desse quarto, Raffaela. Então, per favore, aceita casar comigo?
Aceita ser minha esposa? Aceita sair correndo em direção à primeira
igreja que aceitar nos casar? Me aceita…
Matteo não parecia mais nervoso, porque assim como ele, eu
também sentia essa completude e certeza quase firmada em minha
pele que aquele era o momento ideal para dizer sim.
Eu não podia mais enrolar o nosso amor e deixar guardado em
uma caixa de sonhos, enquanto eu tentava me curar. Ele me ajudava
a recolher pedaços. Matteo esteve ao meu lado em todos os
momentos e, assim como ele, eu também queria que fosse para
sempre.
— Sem divórcios? — questionei, sentindo meu nariz escorrer pela
quantidade de lágrimas que desciam por meu rosto.
— Nunca, vai ter que me aturar para sempre.
— Eu aceito, Matteo… em que igreja vamos casar?
Matteo levantou e rodou dentro do ateliê, batendo o pé no chão
como se não tivesse um apartamento no andar de baixo.
— Sua mamma vai casar comigo, Filippo. Sua mamma finalmente
vai casar comigo.
Matteo me ajudou a levantar e me puxou para seus braços,
dando um longo beijo em meus lábios e finalmente colocando a
aliança em meu dedo.
— Per sempre? — perguntou em meus lábios.
— Per sempre.
EPÍLOGO II
Matteo

Rocco me encarava de uma distância segura. Atena tinha um


sorriso no rosto que parecia grudado. Enquanto isso, tudo que eu
conseguia fazer era andar para frente e para trás, pensando em
quais eram as chances. Minha mãe sorriu para mim, tentando me
acalmar e pensei em caminhar para perto dela.
Ceci se aproximou de mim e me deu a mão. Aquela garota tinha
crescido tanto e eu só conseguia pensar em quando ela era nada
mais do que um toco de gente que implorava por presentes cada vez
que eu a vida.
— Você está nervoso, zio? — a puxei para um abraço e encostei
a cabeça na sua. — Zio, você vai me matar!
Atena correu até onde eu estava com a filha dela e puxou do
meu abraço, e eu me sentei na cadeira que ficava encostada na
parede. Sentindo as mãos da minha mãe, que se sentou ao meu
lado, fazendo carinho em minhas costas. O corredor branco tinha um
cheiro de plástico. Olhei para Rocco e ele media a pulsação a cada
dois minutos. Pensei se eu mesmo não devia começar a medir a
minha.
Nervoso? Eu nem sabia se nervoso era a palavra certa para
começar a descrever o que eu sentia. Apertei meu próprio pescoço,
me sentindo quase sufocado.
— Tudo vai ficar bem, figlio… respire.
Aquele pequeno tratante. Eu tinha conseguido finalmente fazer
com que Raffaela se casasse comigo. Fizemos tudo correndo para
que ela pudesse casar com o barrigão de oito meses, e curtir alguns
dias na ilha de Naxos na Grécia.
Acontece que meu filho tinha outros planos, e os outros planos
envolviam a mãe sendo preparada para a cesárea de emergência.
Tínhamos acabado de colocar o pé dentro do salão onde seria
realizado o casamento quando Raffaela se dobrou com dor e apertou
a barriga, quase que morri olhando para seu rosto cheio de lágrimas.
Uma das enfermeiras que tinham nos recepcionado saiu até o
local onde estávamos e encarou a todos.
— Preciso dizer pra vocês, essa é a primeira vez que eu preparo
uma mamma vestida de noiva. Ela quase chorou quando teve que
tirar o vestido, inclusive agora mesmo está perguntando se o papà
do bebê não vai entrar com ela… cadê ele?
Dei um pulo da cadeira e comecei a tirar o paletó. Entregando-o
para Rocco, que parecia pronto para ele mesmo entrar na sala e tirar
o bebê de Raffaela. Meu filho. Meu filho estava prestes a nascer. Eu
sairia daqui levando um pacote de energia para casa. Eu podia
desmaiar.
— Cuida da minha sorella… — pediu, os olhos cheios de
lágrimas e a voz embargada por um choro que eu sabia que assim
que virasse de costas cairia. — E eu quero ver logo meu sobrinho.
Cuide deles, Matteo. Per favore.
— Vou estar esperando aqui, figlio… diga que eu amo a Raffaela.
— Minha mãe fez o sinal da cruz em meu peito e deu um beijo em
minha mão.
Concordei com a cabeça, virando para Atena e ela apenas
balançou a cabeça. Seus olhos passavam toda a mensagem que ela
queria que eu entregasse para Raffaela. Ela a amava. Ela ficaria
bem. Elas eram almas gêmeas.
— Vamos, papà? Você vai precisar se esterilizar. — A mulher
começou a andar para longe de mim e Rocco me deu um empurrão
para que eu a acompanhasse.
Sua voz dava as instruções necessárias, mas tudo que eu
conseguia ver eram as paredes brancas daquele hospital e como ali
seria a primeira casa do meu filho.
Comecei a seguir os procedimentos que a enfermeira me
passava com muita calma, era uma velha senhora e ela devia estar
acostumada com pais quase apáticos, porque tudo que ela dizia era
com muita paz, quase como se eu mesmo fosse estar na mesa de
cirurgia.
Raffaela tinha se preparado para um parto natural mas, de novo,
nosso filho tinha planos diferentes. Quando finalmente estava pronto,
a minha roupa protegida pela roupa verde do hospital, a touca em
minha cabeça e a máscara de proteção, respirei fundo e ela apontou
para onde tinha que ir.
Entrei na sala, olhando cada ponto, desde as enfermeiras, até
os aparelhos e por fim, encarei uma Raffaela com lágrimas nos
olhos. Corri para perto da mesa de cirurgia e seus olhos se
iluminaram com a minha presença, como sempre faziam.
— Bella… eu estou aqui, está tudo bem…
— Meu vestido, Matteo… você precisa descobrir se meu vestido
está bem…
Tentei não rir de alívio, mas não consegui. Só mesmo Raffaela
para estar na sala de parto e pensando no vestido de noiva.
— Não ri, eu quero meu vestido.
— Te prometo, bella… vou encontrar seu vestido e vou pedir pra
Atena levá-lo para casa, mas primeiro podemos focar no nascimento
de Filippo? Ele queria toda a atenção do dia de hoje para ele e eu
acho que devemos isso a ele, não é?
Raffaela concordou meio grogue, e me encarou.
— Mas depois você pode ver meu vestido?
— Com toda certeza.
A médica de Raffaela entrou na sala conversando com
enfermeiras e eu me tranquilizei, sabendo que a pessoa que tinha
acompanhado toda a gestação estaria conosco naquele momento.
Por mais incerto que a situação parecesse, alguma coisa estava do
jeito que imaginamos.
Filippo 20 x 01 Raffaela e eu.
Não que fosse uma competição contra meu filho, mas se
fosse… ele estaria ganhando. De lavada.
Raffaela grudou na minha mão e eu tirei os olhos da preparação.
Fitei seus olhos, que pareciam assustados com alguma coisa.
— Eu não quero que você saia do meu lado, per favore.
Concordei com a cabeça, não tinha como aquilo acontecer. Eu
estaria ao lado dela em todos os momentos. Me ajoelhei ao seu lado
e fiquei parado, fazendo carinho em sua cabeça, enquanto a médica
iniciava os procedimentos para a cesárea de emergência. Dei um
beijo em sua boca e ela sorriu lindamente para mim.
Parecia que tinha passado uma vida enquanto eu esperava por
Raffaela do lado de fora e, agora que estávamos os dois aqui
prontos para trazer nosso filho ao mundo, meu coração começou a
descompassar, querendo sair pelo peito com medo por meu filho e o
amor da minha vida.
— Você conseguiu escapar do casamento, não é? — brinquei,
tentando afastar os pensamentos ruins da minha cabeça. — Tudo
bem, Raffaela, eu posso fazer um casamento melhor, maior, com
diversos convidados, posso até mesmo reservar o Coliseu. Quer
casar no Vaticano? Eu dou um jeito, só pare de fugir de mim, donna.
— Vamos começar, ok, Raffaela… aproveite os últimos
momentos, mamma, logo um lindo ragazzo vai depender
inteiramente de você. E do papà.
Peguei a mão de Raffaela e dei um beijo em sua palma,
sentindo seu nervosismo em sua pele. As gotículas de suor
escorriam por ali e deixavam a mão gelada ao meu toque. Passei a
mão por seu rosto, tentando tranquilizá-la enquanto podia ver todo o
procedimento acontecendo.
— Não vou mais fugir… — falou.
— Não?
— Não, quando a gente sair daqui, vamos direto para o primeiro
espaço que estiver livre para casar.
Suas lágrimas começaram a escorrer e eu senti meu rosto ficar
molhado também. Aquele parecia um momento mágico, eu sabia que
nossas vidas mudariam para sempre e não existia outra pessoa com
quem eu desejaria viver aquilo tudo.
Raffaela mudou completamente minha vida. Transformou cada
canto triste em alegria e completude. Nossas almas eram as
mesmas. Seus olhos voltaram para mim e eu dei um beijo em sua
testa, rezando, pedindo, implorando para que tudo corresse bem.
— Seus olhos são tão lindos, espero que Filippo seja igual.
— Não, ele vai parecer com a mamma dele, ele é um bambino
muito apegado à sua ma.
— Ele podia ter me deixado casar, então.
Começamos os dois a rir baixinho até o som mais bonito que eu
já ouvi na minha vida irrompeu no meio da sala, fazendo que o
mundo todo ficasse em silêncio.
Eu podia sentir as vibrações daquele som em todo meu corpo.
Era o choro mais cheio que eu já tinha ouvido, como se ele estivesse
esperando os oito meses por aquele momento, como se tivesse
guardado toda a sua força para aquele choro.
Meu coração começou a doer e eu temi que fosse ter um infarto.
Olhei para Raffaela e ela chorava quase tanto quanto nosso filho,
olhei para onde ela olhava e lá estava: o meu menino.
— Papà, está na hora de cortar o cordão do seu figlio, venha
aqui.
Soltei a minha mão da mão de Raffaela e caminhei em
pequenos passos até onde Filippo estava. Ele era grande, sua pele
mais clara do que a minha, seus lábios e nariz inchados que
pareciam enormes enquanto ele se esgoelava de chorar, e ele era a
criança mais linda que eu já tinha visto em toda a minha vida.
Alguém me entregou uma tesoura esterilizada e, tentando parar
de chorar, eu fiz a primeira coisa de uma vida toda dedicada àquele
garoto: cortei o fio que o ligava à sua mãe. Agora Filippo era sua
própria pessoa e ele já era o meu ser humano favorito.
— Pode levá-lo para Raffaela ver, mas nós já vamos pegá-lo, ele
precisa se acalmar um pouco.
Caminhei em direção a Raffaela e seus olhos cheios de lágrimas
brilhavam olhando o pequeno menino em meu colo. Me aproximei
dela, colocando Filippo próximo ao seu rosto, e como em um passe
de mágica, ele parou de chorar, fazendo com que nós dois
chorássemos ainda mais.
Ele não sabia, mas nosso mundo agora era todo ele.
Uma enfermeira se aproximou para dar todos os cuidados que
nosso filho precisava e eu fiquei ao lado de Raffaela, enquanto a
fechavam e preparavam para a sala de descanso pós cirurgia.
— Você vai ficar com ele até me levarem para o quarto?
— Ninguém vai ser capaz de me tirar do lado dele, bella… ele é o
amor da minha vida.
— Que bom que você falou isso, porque eu estava com medo de
só eu estar sentindo esse sentimento imenso.
— Não, nosso bambino é meu mundo todo, mas ainda tem
espaço para você.
Raffaela riu e começou a chorar.
— Ti amo, Matteo, grazie.
Fiquei assistindo enquanto levavam Raffaela para longe de mim
e uma enfermeira tocou meu braço avisando que Filippo estava indo
para o berçário. Mandei um último beijo no ar para Raffaela e segui
meu filho.
Minha mãe, Atena, Rocco e Ceci estavam parados em frente ao
vidro, quase vibrando de expectativa, e assim que eu entrei seguindo
o bebê, eles começaram a encará-lo com o mesmo amor que eu
sentia. Aquela era nossa família, uma família cheia de amor, mas eu
só tinha olhos para Filippo.
Fiquei ao lado do meu filho, encarando cada mudança em sua
expressão com medo que algo acontecesse com ele. O tempo
passou tão rápido que me assustei quando a enfermeira responsável
pelo berçário avisou que era o momento de levá-lo para o quarto.
Quando entramos no espaço, Raffaela parecia adormecida na
cama, empurrei o carrinho para o lado da sua cama e me sentei na
poltrona com meu filho no colo.
— Olha, Filippo, é a sua mamma… nós vamos protegê-la e amá-
la para todo o sempre. Ela costuma fugir de casamentos, mas tudo
bem, nós podemos amarrá-la e obrigá-la da próxima vez. — Filippo
abriu os olhos ao ouvir minha voz e aquele sentimento era o mais
bonito que eu já tinha sentido na minha vida. — Ti amo, figlio.
Olhei para o lado e Raffaela nos encarava com amor em seus
olhos. Me levantei, colocando Filippo em seus braços e sentei na
beirada da cama, não querendo tomar seu espaço, mas precisando
fazer parte daquele momento deles. Passei os braços pelas costas
de Raffaela e ela se acomodou em mim, dando um longo cheiro nos
cabelos de Filippo.
— Ele é tão lindo. Eu amo tanto esse bambino…
— Casa comigo? — pedi de novo.
— Todos os dias, se você quiser.
Naquele quarto de hospital estava a minha família, os amores da
minha vida. Nada de ruim poderia acontecer enquanto estivéssemos
juntos: os três mosqueteiros, Raffaela, Filippo e eu. Eu nunca me
senti tão feliz e amado, e eu sabia que aquele era o nosso início feliz.
Ainda tínhamos muito o que viver e seria sempre em unidade.
Fechei os olhos e senti os lábios de Raffaela nos meus. Sim,
isso era para sempre.
FIM
Agradecimentos
“Ufa” é essa a sensação que sinto agora que finalizei a Duologia
Irmãos Giordano, quando comecei a escrever, não pensava nesse
livro como uma duologia. Mas conforme fui escrevendo, Raffaela e
Matteo foram ganhando seu próprio espaço em minha mente e
quando finalizei “Até o Nosso Último Suspiro”, os dois começaram a
conversar e viver sua própria história em minha mente, e tudo que eu
tinha era no grupo do Whatsapp comigo mesma a mensagem
“Raffaela vai presa”, daí veio a história da nossa artista.
Quero agradecer imensamente todas as pessoas que pegaram
“Até o Nosso Último Suspiro” e se encantaram não só pela história
de Rocco e Atena, mas também por Raffaela e Matteo, se esse livro
existe, também é por você!
As pessoas que sempre me acompanham durante todo o
processo criativo e dão pitaco em cada cena para deixá-las ainda
melhor, Ana Cecília, Adriana, Dara Juliana, Maíra, o meu muito
obrigada.
Espero que possamos estar juntos em mais um livro.
PS: Eu já estou escrevendo.
PSS: É um livro de chefe x funcionária.
PSS: É grumpy x sunshine (e ouvi dizer que talvez tenha uma
criança)
Até.

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