You are on page 1of 4

ENCEFALOPATIA HIPÓXICO-ISQUÊMICA

INTRODUÇÃO
Síndrome neurológica, usualmente relacionada à asfixia perinatal ou a qualquer
condição que curse com hipoxemia, isquemia e acidose no feto, antes ou durante o
parto. Pode desencadear a cascata de alterações que culmina na lesão do sistema
nervoso central. Ocorre em recém-nascido (RN) a termo ou pré – termo tardio ( ≥ 36
semanas) , e caracteriza - se por desconforto respiratório, apneia, alteração do nível de
consciência, depressão dos reflexos e do tônus muscular e presença de convulsões.

QUADRO CLÍNICO
O insulto hipóxico-isquêmico pode levar a sinais e sintomas relacionados ao sistema
nervoso central e a comprometimento de outros órgãos. As manifestações neurológicas
podem se iniciar ao nascimento ou após algumas horas de vida. A síndrome neurológica
classifica - se, de acordo com Sarnat e Sarnat, em três estágios de acordo com a
gravidade (ver tabela 1).

DIAGNÓSTICO
Não existe exame padrão ouro diagnóstico da EHI. Avalia-se o quadro clínico, a
presença de antecedentes de asfixia perinatal, a necessidade de manobras de reanimação
na sala de parto e escore de Apgar. Também realizam - se exames complementares:
análise liquórica, eletroencefalograma, ultrassonografia transfontanelar, tomografia
computadorizada e ressonância magnética.
Análise liquórica: realizar punção lombar em todo RN com EHI, sobretudo se houver
suspeita de quadro infeccioso.
Eletroencefalograma (EEG): avalia a gravidade da EHI; as alterações variam de
acordo com o estágio da EHI.
Ultrassonografia transfontanelar: sempre indicada. Detecta precocemente as lesões
cerebrais e é útil como método de triagem para realização de exames mais complexos.
Tomografia computadorizada: consegue identificar lesões no córtex cerebral,
gânglios da base, tálamo e região periventricular.
Ressonância magnética: fornece imagens com maior resolução, propiciando maior
precisão e precocidade no diagnóstico.

128
Tabela 1. CLASSIFICAÇÃO DA ENCEFALOPATIA HIPÓXICO-ISQUÊMICA
(EHI) – Classificação de Sarnat e Sarnat, 1976.

Características Estágio 1 (leve) Estágio 2 Estágio 3 (grave)


(moderada)

Nível de consciência Hiperexcitabilidade Letargia ou Estupor ou coma


ou irritação obnubilação

Movimentos Aumentados Diminuídos Diminuídos ou


espontâneos ausentes

Tônus mescular Normal ou Hipotonia leve Flacidez


hipertonia leve

Postura Flexão discreta de Flexão acentuada Movimentos


extremidades de extremidades intermitentes de
descerebração

Reflexos complexos Normais Diminuídos Ausentes

Função autonômica Predomínio do Predomínio do Ambos deprimidos


simpático parassimpático

Pupilas Midriáticas Mióticas Posição média e fixa


ou anisocóricas e
pouco reagentes à luz

Respiração Espontânea Espontânea ou Periódica ou apneia


apneias ocasionais

Frequência cardíaca Taquicardia Bradicardia Variável

Secreção brônquica e Escassa Abundante Variável


salivar

Motilidade Normal ou Aumentada Variável


gastrointestinal diminuída

Convulsão Ausente Comum Rara

EEG Normal ↓ da voltagem, Padrão periódico com


espículas focais e fases isoelétrico ou
multifocais. isoelétrico

Duração dos sintomas Menos de 24 horas Dois a 14 dias Horas a semanas

Prognóstico Normal 80% normal ou 50% de óbitos e o


neurológico alterado se restante com sequelas
sintomas persistem
mais de 5 a 7 dias

129
TRATAMENTO
Medidas gerais:
1. Ao nascimento o RN deve receber atendimento rápido e eficaz utilizando o
protocolo de reanimação neonatal em sala de parto para minimizar a lesão
cerebral secundária ao insulto hipóxico-isquêmico.
2. Assistência ventilatória: o asfixiado deve ser mantido em ventilação mecânica
por 48 a 72 horas. Monitorizar oxigenação e ventilação e ajustar o suporte
ventilatório. Objetivos:

 pH: 7,25 – 7,40;


 PaO2: 50 -70mmHg;
 PCO2: 45 – 60mmHg;
 SatO2: 89 – 93%.

3. Suporte hemodinâmico: manter a pressão arterial conforme idade gestacional.


Na asfixia a perfusão cerebral está estreitamente relacionada à pressão arterial
sistêmica pela perda da autorregulação do fluxo sanguíneo cerebral. A
manutenção da pressão de perfusão cerebral requer pressão arterial média
sistêmica entre 45 e 50mmHg. Se necessário utilizar drogas vasoativas para
manter pressão arterial. Evitar hipertensão e sobrecarga hídrica por piorarem o
edema cerebral.
4. Suporte metabólico e nutricional:

 Corrigir acidose metabólica;


 Glicemia - 75 e 100mg/dL;
 Cálcio sérico - 7 e 11mg/dL;
 Dieta zero oral por 48 a 72 horas ou até estabilização hemodinâmica e
metabólica.

5. Equilíbrio hidroeletrolítico: adequar a oferta de líquidos e eletrólitos,


objetivos:

 Débito urinário > 1mL/Kg/hora;


 Sódio sérico 135 a 145mEq/L;
 Potássio sérico 3,5 a 4,5mEq/L.

Medidas Específicas
1. Controle das convulsões
As convulsões podem ocorrer precocemente (focais ou multifocais). Deve - se verificar
distúrbios metabólicos, e tratá-los quando presentes. O tratamento farmacológico das
crises convulsivas envolve preferencialmente os barbitúricos por redução do
metabolismo cerebral, promovendo a preservação de energia ( estratégia
neuroprotetora). O fenobarbital é a droga de primeira escolha nas convulsões
130
secundárias à hipóxia-isquemia. Não administrar fenobarbital profilático em RN
com diagnóstico de EHI. Associar fenitoína se não cessarem as crises. Podem ser de
difícil controle nos estágios precoces da EHI (primeiras 72 horas), atingindo - se o nível
máximo terapêutico do fenobarbital, quando necessário. Se as crises não cederem com
fenobarbital e fenitoina, administra-se o midazolam. Vide capítulo de convulsões
neonatais.

2. Controle do edema cerebral

O insulto hipóxico-isquêmico predispõe o RN a sobrecarga hídrica, sobretudo em


função da redução do débito urinário. Pode ocorrer anúria ou oligúria (diurese <
1ml/kg/hora) por secreção inapropriada do hormônio antidiurético ou necrose tubular
aguda. O manejo inclui restrição hídrica (cerca de 60ml/kg/dia, ou menos). No entanto,
pode ser necessária a expansão volumétrica com soro fisiológico para manter pressão
arterial média e pressão de perfusão cerebral. Não estão indicados: agentes
hiperosmolares, glicocorticoides e hiperventilação.

3. Prevenção de lesão neuronal tardia

Teoricamente as intervenções terapêuticas seriam mais eficazes até 5 horas após o


insulto. Nas primeiras seis horas ocorre: redução do fluxo sanguíneo e do aporte de
oxigênio cerebral com redução de substrato para metabolismo energético,
principalmente glicose, e uma série de eventos bioquímicos com aumento do cálcio
intracelular. Após o primeiro estágio da lesão cerebral, há recuperação parcial do fluxo
sanguíneo (em 12-24 horas), segundo estágio ou estágio de reperfusão.

Entre esses dois estágios da lesão cerebral, existe a fase de latência, que acontece em
média em 5,5 horas após o insulto, e parece ser o momento ideal para intervenções
terapêuticas. É imperioso conhecer o momento do evento inicial, para atuar na janela
terapêutica. O objetivo é reconhecer precocemente os recém-nascidos afetados a fim de
se utilizar estratégias visando a interrupção da cascata de eventos que provocam a lesão
neuronal.

Intervenções neuroprotetoras para os recém-nascidos com EHI, como o uso de


barbitúricos, inibidores de produção de radicais livres, bloqueadores de receptores de
neurotransmissores, prevenção da formação de óxido nítrico, ainda estão em fase
experimental e necessitam de mais estudos para que sejam indicados formalmente.
Hipotermia: é a única terapia neuroprotetora efetiva disponível para o tratamento da
EHI no neonato. Tem eficácia limitada.

131

You might also like