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Resenha Carrasco, Escalante e Elliot
Resenha Carrasco, Escalante e Elliot
Primeira avaliação
O centro político, militar e religioso do império Inca era a cidade de Cuzco. A capital
abrigava, em grande parte, a nobreza governante. Essa nobreza era composta pela
etnia inca e pelos curacas, que governavam as subdivisões territoriais e descendiam
de soberanos de locais conquistados pelos incas ou oficiais nomeados pelo
governo, encarregados por determinados números de governo. Dentre esses nobres
estavam os panacas, descendentes diretos dos imperadores incas. Entre eles eram
escolhidos os próximos imperadores, enquanto os demais formavam uma linhagem
real da qual saiam os principais funcionários do império. Os nobres estavam livres
do pagamento de impostos e da prestação de serviços ao imperador, o que os
diferenciava das pessoas comuns. Os impostos eram extremamente importantes no
mundo andino. Eram pagos através da prestação de serviços e por meio da
cobrança deles o governo organizava e controlava os recursos fundamentais para a
subsistência da estrutura imperial, ou seja, o trabalho e a terra.
Os pagadores de impostos eram as pessoas comuns, que formavam comunidades
chamadas ayllus. Eles pagavam um imposto chamado mita, que consistia numa
prestação de serviços ao império dividida por famílias. Cada ayllu estava sob o
governo de uma autoridade local, tendo seus próprios cultos e festas. Podendo ser
formado por famílias com várias etnias, o que unia a comunidade normalmente era
a crença em um antecessor comum. Os casamentos eram endogâmicos, ou seja,
ocorriam dentro do ayllu, reforçando os laços parentescos. Era comum diversos
parentes formarem uma grande família ao redor de um pátio, normalmente
fundamentada na adoração de algum antecessor. Cada pessoa tinha suas
obrigações dentro do núcleo comunitário e familiar, variando as obrigações pelo
sexo e pela idade do indivíduo. Normalmente os jovens de 16 a 25 anos ajudavam
seus parentes nas tarefas, os homens de 25 a 50 trabalhavam no cultivo, nas obras
públicas e serviam de guerreiros, os de 50 a 60 trabalhavam nas hortas e os de 60
eram conselheiros dos chefes locais. Esse trabalho acontecia nas terras recebidas
pelas famílias para uso próprio e nas terras da comunidade. Essa terra era
redistribuída de tempos em tempos e essas divisões parentais estavam sujeitas a
variações regionais.
O exército era essencial para a manutenção do sistema inca, visto que a guerra foi o
principal meio para expansão imperial. As fronteiras eram protegidas, o exército
ajudava a submeter os povos e eram usados para dominar o interior das províncias.
A expansão do império se deu pela ação militar direta e pela diplomacia: o império
dialogava com os senhores das províncias menores e incitava uma submissão
voluntária. Quando adquiriram uma nova província esta era reorganizada aos
moldes do império, sendo construída uma nova capital, colocando os chefes locais
como curacas e incorporando a província ao império de fato. A interferência direta
do estado nas províncias é um marco do império inca.
Um pouco menos estratificada que a sociedade inca era o império Mexica, descrito
pelo historiador mexicano Pablo Escalante Gonzalbo, doutor em História pela UNAM
e estudioso da cultura e arte indígena no México central nos períodos pós clássicos
antes e depois da Conquista. Segundo Gonzalbo, o conhecido império Mexica surge
após séculos de realocação populacional no território americano. Abarcando muitas
etnias mas descendendo principalmente dos toltecas, México-Tenochtitlan se tornou
a maior potência do Vale do México ao derrotar a cidade que lhe impunha inúmeros
impostos, Azcapotzalco. É perceptível a importância dos tributos tanto no mundo
andino quanto no mundo mesoamericano, visto que era uma expressão de poder e
possibilitava o crescimento das cidades e a expansão dos impérios. Os mexicas se
colocaram em um lugar privilegiado politicamente e depois de submeter alguns
reinos que pagavam tributos aos tepanecas eles formaram uma tríplice aliança,
formada por Texcoco, Tlacopan e por México-Tenochtitlan.
A tríplice aliança foi uma forma de garantir estabilidade nas três cidades cabeceiras
e garantir a elas um domínio duradouro. Isso implicava em uma ajuda mútua entre
os membros. As conquistas e as rotas de mercado se somavam na aliança. Os
muitos senhorios do Vale do Mexico foram subordinados a uma das cabeceiras e
tinham que pagar tributos, além de sofrerem interferência política dos tlatoanis
aliados. A riqueza da tríplice aliança se dava devido a tributação dos súditos diretos
a tributação dos reinos dependentes e de todos os reinos conquistados no resto da
mesoamérica. A tributação dos reinos não era dividida entre as três cabeceiras e
cada reino enviava seu tributo às cabeceiras correspondentes. Poderia acontecer de
um mesmo reino tributar a duas cabeceiras, um pouco para cada uma. Três
circunstâncias influenciavam na tributação do reino a uma cabeceira: quando um
dos três membros prestava apoio em um campanha militar de modo que poderia
atribuir-se a conquista da localidade a ele o tributo da localidade era dele, quando
um reino era conquistado pela aliança na área de influência de uma das cabeceiras
o tributo era da cabeceira local e quando a aliança, a fim de equilibrar as suas
forças políticas, designava para onde iriam os tributos daquele reino. Vale ressaltar
que Mexico é possuía um exército forte e suas campanhas militares normalmente
eram bem sucedidas, sendo planejada no palácio do huey tlatoani mexica, Texcoco
possuía prestígio na organização e construção de obras pública e Tlacopan
organizava com mais perícia o comércio. Quando deixaram de estar subordinados
aos tepanecas e entraram na tríplice aliança, os mexicas se tornaram o Estado mais
poderoso. Moctezuma Ilhuicamina consolidou o Estado, fortaleceu as alianças e
iniciou a grande expansão territorial. Através da guerra eles conseguiam novos
tributários e prisioneiros para sacrifícios. Dirigiu obras para o crescimento da cidade
e o controle da água. Organizou, com a ajuda do aliado Nezahualcóyotl, escolas e
tribunais, promovendo o engrandecimento da côrte.
Ambos impérios sofreram duras mudanças com a chegada dos espanhóis. Vindos
da Europa objetivando uma ascensão socialmente que dificilmente se realizaria no
mundo ibérico, os espanhóis fizeram inúmeras alianças com povos andinos e
mesoamericanos a fim de enfraquecer e consequentemente destruir os impérios
Inca e Mexica. No caso inca, encontraram parceria com grupos étnicos que estavam
sobre o domínio inca, principalmente com as elites que buscavam privilégios. Já na
mesoamérica, foram apoiados por povos que queriam se ver livres das tributações.
Em ambos os casos foram oferecidos apoio militar e privilégios em troca de lealdade
aos espanhóis, privilégios esses que incluíam a isenção de impostos. Os
colonizadores se aproveitaram dos conflitos internos para conseguir alianças,
principalmente no império Inca. Os curacas se tornaram caciques e mantiveram o
seu papel de mediadores locais. A evangelização também foi uma grande mudança,
implicando na reorganização política e religiosa da época, fazendo, por exemplo,
com que as artes incaica e tolteca fossem misturadas ao cânone artístico europeu,
que era de cunho extremamente religioso. Segundo o historiador inglês John Elliot,
após a Conquista as leis e disposições práticas criadas em Castela foram
adaptadas a América Espanhola, de modo a reconhecer as subdivisões nativas
preexistentes, conciliando-a com as necessidades da Coroa. A colonização,
segundo Elliot, foi um processo conjunto entre o Estado e a igreja. O Estado
oferecia as ferramentas econômicas e militares enquanto a Igreja cumpria o seu
papel missionário. Neste processo, a Coroa espanhola participou ativamente do
processo de cristianização na América Espanhol, nomeando inclusive eclesiásticos
a partir das recomendações do chamado Conselho das Índias.
ELLIOTT, John H. “La Corona y los Colonizadores”. In: Imperios del Mundo
Atlántico. España y Gran Bretaña en América (1492-1830). pp.189-238