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Sumario déste niimero “EDITORIAL: Dicionario Geografico Brasileiro — Eng? VIRGO CORREIA FILHO (pég. 305). COMENTARIO: Os Fatos Fundathentais da Geografia — EVERARDO BACKHEUSER (p4¢. 309). _TRANSCRICOES: Mapa Florestal do Brasil — I — GONZAGA DE CAMPOS (pig. 404). — Gegrafia Cultural do Brasil — Dr. B, BRANDT (pig. 420). RESENHA E OPINIGES: Notas relativas A evolugio das paisagens rurais do Estado’ de Sio Paulo (ose. 428), — A grafia de Itapecura (pag. 430). — Carvio (pig. 431). — Cruzando 0 Brasil em tOdab as direcdes (pig. 433): — Fatdres geograficos. (pég. 437). — Uma publicagio ‘itil (pag. 498); — Estados Unidos da América (pg. 499). = i CONTRIBUICKO AO ENSINO: Os Territérios ‘Federais Recém-criados ¢ Ses Novos Limites == GIORGIO MORTARA (pig. 46). . TERTULIAS GEOGRAFICAS SEMANAIS: Sexagésima primeira tertilia, realizada a 18 de abril + de 1944 (pag. 445). — Sexagésima segunda tertilia, realizada a 25 de abril de 1944 (pag. 458). + Sexagésima terceira tertillia, realizada a 3,de maio de 1944. (pag. 465). — Sexasésima quarta tertiilia, realizada a 9 de maio de 1944 (pig. 471). — Sexagésima quinta tertiilia, realizada a 16 de maio de 1944 (pag. 477). NOTICIARIO: CAPITAL FEDERAL — Prpsidéneia da, Repiiblica (pag. 484), — Instituto Brasi- Ielko de Geografia © Estatistica (pag. 487). — Ministério da Agricultura (pig. 493). Ministério da Educagio © Saide (pég. 496). — Ministério da Guerra (pég. 497). — Ministério Wa Justi¢a © Negécios Interiores (pag. 497). — Mimistério das Relagées Exteriores (pig. 498). — Ministério do Trabalho, Indistria e Comérelo (pég. 498). — Ministério. da Viaedo e Obras Pblleas (pig. 498). — Prefeitura do Distrito Federal (pég. 409). — INSTITUIQOES PAR- ‘TICULARES — Academia Brasileira de Ciéneias (pég. 499). — Academia Brasileira de Letras (pag. 499), — Academia Carioca de Letras (pig. 500). — Centro de Cultura Afro - Brasileira (pag. 500). — Companhia Rodovidtia Transbrasiliana (pag. 500). — Instituto Histérico. e Geogrificé Brasileiro (pég: $00). — Sindicato:de Engenheiros do Rio de Janeiro (pig. 501). Sociedade Brasileira de Antropologia e Etnologia “(pég. 501). — Sociedade Brasileira de Economia Politica (pag. 501). — Sociedade dé Geografia do Rio de Janeiro (pig. 502). —‘Sociedadk de Amigos de Alberto Torres (pig. 902). — Sociedade Minieira de Gedgrafos ¢ Estatistios (pég. 902). — Touring Clube do Brasil (péis. 503). — CERTAMES — 4.9 Assem- biéia Anual. do. Aimerican Congress of “Surveying and Mapping (pég. ° 503). — — UNIDADES FEDERADAS — Babia (pag. 504)..— Espirito Santo (pag. 604). — Golds (pig. 505).. —-Minas' Gerais (pég. 505). — Paraiba (pig. 508). — Parand (pag. 508). — Pernambuco (pag. 503). — Rlo Grande do Sul (pig. 503). — SKo Paulo (Dag. 509). — Terri- torio do Amiapé (pag. 512). — Territério do Guaporé (pig. 512). — Territério de Ponta Port (Pag. 512). —/Territérlo do Rio Branco (pag. 513). — MUNICIPIOS — Aracaji (pig. 513). Campinas (pig. 513). — Campos (pig. 513). — Cordeiro (pig. 513), — Crato (pag. 13). — Gilbués (Dig: 514). — Itaverd (pig. 514). — Maceié (pag. 514). — Manaus (pag: 514). — Morretes (pag. 514). — POrto Alegre (pig. 514)..— Ralil Soares (pag. 514). — Rio Branco (pag. 515). — Salvador (pég. 515). — So Cristévio (pég. 515)..— EXTERIOR — Inglaterra (ig. 516). 394 BOLETIM GEOGRAFICO BIBLIOGRAFIA: Apontamentos bio - bibliogrificos — MATIAS GONCALVES DE OLIVEIRA ROXO (pag. 517), — REGISTROS E COMENTARIOS BIBLIOGRAFICOS: — Livros (pig. 23). — Peribdicos (pag. 526). — Mapas (pag. 527) — CONTRIBUICAO BIBLIOGRAFICA ESPECIA- LIZADA — Achegas para uma bibliografia sébre o petroleo — I — (Letras A a L) (pag. 528). LEIS E RESOLUCGES: LEGISLACAO FEDERAL — Ementério dos decretos-leis baixados no més de junho de 1944 (pag. 586). — integra da legislac&o de interésse geogrifico (pig. $40). — Atos diversos (pig. 563). — LEGISLACAO ESTADUAL — integra dos deeretos, decretos-leis, fe demais atos de interésse geogritico — Bahia (pig. 577). — Mato Grosso (pag. 583). ~ Par& (pig. 584). — Paratha (pag. 586). — Parana (pag. 586). — Pernambuco (pig. 588). — Piaui (pig. 587). — Rio Grande do Norte (pig. 588). — Rio de Janeiro (pég. 509). — Sergipe (pag. 590). — LEGISLAGAO MUNICIPAL, — integra dos decretos, decretos-leis ¢ demais atos de interésse geogrifico — Belém (pig. $91), — RESOLUGOES DO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA — Consetho Nacional de Estatistica — Junta Executiva Central — integra das ResolugGes de interésse geogrifico aprovadas em 1937 (pag. 692). — Conselho Nacional de Geogratia — Assembléia Geral — tntegra das ResolugSes ns. 114 a 120 (pig. 596). — Diretério Central — integra das Resolucées n.° 114 ‘a 120 (pig. 600), — DIRETORIOS REGIONAIS — Santa Catarina’ — integra das Resolucées ns. 6 a 10 (pig. 606). Boletim Geogrdafico Ano II | JULHO, 1944 | Ne 16 Editorial Dicionério Geograiico Brasileiro Ao organiizar o seu plano de.campanha, tendo por objetivo o Recensea- mento Geral do pais, para cisja realizacdo foi especialmente constituida, a Co- missao Censitéria Nacional sugeriu a0 Conselho Nacional de Geogratia, mediante Resolucéo de 9 de dezembro de 1938, a elaboragdo de um Diciondrio Topo: nimico Brasileiro, que arrolasse nao s6 as localidades e explicacées etimolégicas das ‘respectivas denominagées, como também o maior nimero possivel de acidentes geogréficos, Lembrada em momento oportuno, a indicacéo mereceu a iielhor acolhida por parte do Diretério Central que, sem tatdanga, a incluiu entre os encargos indéclindveis do. Conselho, de que 6 érgao deliberativo. Assim prescreveu a Resolugéo n° 12, de 3 de*janeiro seguinte, acompa- nhada de outra, a de 8 de fevereiro, que atribuiu ao Servigo de Coordenacéo Geografica, hoje denominado Servi¢o de Geogratia Estatistica Fisiogtatica, as responsabilidades da trabalhosa incumbéncia, cuja execucéo. progressiva inspitou diretrizes sisteméticas, estipuladas pela Resolucéo n° 36, de 18 de abril, O esquema,‘em que se delineou, nesse lance, 9 programa do Dicionario Geogréfico ¢ Toponimico Bratileiro, indica o método adotado na elaboracéo, que permite propicia flexibilidade nas indagacées, libertas da exigéncia de en- Volvimento simulténeo integral dos variados assuntos, cujo ‘patcelamento, sem prejuizo da visio panorémica ulterior, apressa o agrupamento dos verbetes em colegées a que nao falte algum elo comum. Para thes facilitar as pesquisas e ao mesmo tempo tornar utilizéveis os resultados parciais obtidos, em qualquer fase das operagées previstas, o plano entao ideado cuidou de racionalmente decompé-las, por marieira que se apresentasse cada grupo.com a sua valia propria, de teor varidvel, conforme 0 grau de aproximacao que.o distinguisse, independente do conjunto a que por tim se destine. 396 BOLETIM GEOGRAFICO De acérdo com as normas entao prescritas, por trés etapas, de penetracéo crescente, deserivolver-se-do as investigacdes necessdrias, desde a primeira, de simplicidade extrema, na qual os verbetes apenas contém breve definigéo do ‘ acidente a que se refiram, até o estudo minucioso, para 0 Grande Dicionério, que deveré comportar o preparo de monografias, quando cabiveis, ilustradas com fotogratias, mapas, quadros estatisticos Em grau intermediério, 0 Pequeno Dicionério admitird descrigdes mais amplas que o Vocabulario inicial, em que seja mencionada a etimologia do topénimo, sempre que possivel, @ explicagdo da sua ocorréncia. Escalaram-se, pois, as fases progressivas de indagagées, independentes umas das outras, embora tédas as trés se subordinem 4 exigéncia basicd de locali- zacéo pot municipio. Dai decorre a necessidade premente de consulta aos mapas municipais, por meio dos quais se conjugam os esforcos valiosos dos informantes. regionais, considercidos fidedignos em seus ensaios cartogréticos . Destarte, mantém-se, por um lado, o principio da cooperacéo produtiva, a que deve o Conselho Nacional de Geogratia 0 maior quinhao de seus éxitos: ‘Por oistro, adquire realce a contribuicéo dos colaboradores dispersos pela imensidao territorial, que apresentaram 0 retrato dos seus municipios, com as localidades mais importantes, os rios, as serras e demais peculiaridades regionais. Désse mariancial, opulento de informes em municipios intimeros, ou escasso de topénimos, em muitos outros, passam pata as fichas os verbetes a que déo causa, acompanhados de esclarecimentos resumidos sobremaneira. Nada mais ser4, pois, 0 Vocabulério que sucinta escrita interpretativa dos mapas municipais, cujo grau de aproximacao, de rigor varidvel, conforme os elementos disponiveis em cada caso, nao é para ésse fim cotejado. Nos periodos imediatos, porém, de investigagées mais profundas, em que se baseard a elaboragdo do Pequeno, e, com mais forte razdo, do Grande Di- “cionrio, as forites informativas j4 se constituiréo de: 1° 2° Eig 42 Livros e publicacées existentes na Biblioteca do Conselho Nacional de Geogratia. Mapas distribuidos 4 Seccéo de Cartogratia e 4 Mapoteca, Informagées do Arquivo Corogratico, Contribuigées dos diretérios regionais e municipais esponténeamente enviadas, ou solicitadas de propésito, mediante questiondrios especiais. EDITORIAL ‘sor Os dados recolhidos de semelhantes procedéncias iréo permitir'a descricéo mais minudenciosa de cada topénimo, de acérdo com a importancia que merece; pela sua propria caracteristica fisica, ou pela relevancia que the resultou da ocupacdo humana das circunjacéncias. E quando particular circunstancia a extreme entre as parceiras, caberé ao Grande Diciondério expland-la em proporgéo, com amplos informes. Nao foi, todavia, sémente em relacéo as pesquisas que se manifestou & orientagdo divergente'dos processos habituais de eJaboracao de obras andlogas. No tocante ao arranjo dos elementos colhidos, para a devida apresentacéo, com intuitos de aproveitamento imediato, em ‘qualquer fase das investigacées em andamento, também ocorréu singular propésito dé flanquear dificuldaded retardativas da ultimacéo pelos procéssos costumeiros. ‘As pesquisas ordenam-se por espéciés ou pela amplitude terrjtorial a que se relacionam. +. Quem pretender arrolar, por exemiplo, os:topénimos brasileiros referentes as elevagées, qualquer que Ihes seja a’ variante vocabular, nenhum resultado poderd exibir, antes de,considerar o territério inteito, em suas particularidades orogrdficas. E se, depois, .quiser tratar de outro acidente, como os ‘cursos.d’égua, de vério calibre, ser-Ihe-4 mister, sem divida, repetir andlogas averiguagées, vol tando a manusear os mesmos documentos ou mapas, tantas vézes quantas forem as espécies analisadas. E. assim prosseguiré, sempre rétomando as ‘caminhadas ‘anteriores, até 0 remate das investigacées. Essas idas e vindas, todavia, poderao ser evitadas, pelo registro simulténeo de todos os topénimos da: regiéo analisada, Tal processo, porém, tornaria o prazo de termmacao depeiidente da coleta Geral dos verbetes, demorando, em conseqiiéncia, a sua utilizacéo parcial. Com intuito de obviar famanho inconveniente, o programa concebido pelo Conselho Nacional de Geografia admitiu processos de pesquisas. parceladas, por maneira que apenas englobem alguma espécie, de répida averiguacao e localizagao, como as cidades e vilas, relacionadas em documentos oficiais, que thes menpionem as categorias e interdependéncia, quando haja, ou limitem 0 campo de pesquisas’ das-miltiplas espécies pelas divisas estaduais. No primeiro caso, o Vocabulario, que inaugurou a série, abrange tédas as capitais de Estados, as suas sedes municipais, obrigatoriamente classificadas como cidade’, e as distritais, qualificadas de vilas. Constitui o volume I, do qual: a Biblioteca possisi um exemplar, dactilo- &tafado. 398 BOLETIM GEOGRAFICO Depois, para nao iricidir na demora acima apontada, as preferéncias con- vergiram para o parcelamento metédico do campo de investigacoes, de modo que s6 féssem examinados, de cada vez, os top6nimos de uma s6 unidade territorial. Com essa providéncia, j4 foram organizados doze Vocabulérios, em volu- mes especiais, referentes a outros tantos Estados, além de preparadas as fichas para os restantes, em grau varidvel de andamento. Terminada a série de Vocabulérios, ou simulténeamente, se houver conve- niéncia, ser elaborada a referente ao Pequeno Dicionério Geografico Brasileiro, e, em seguida, a do Grande Dicionario Geografico Brasileiro, com que se rema- taré o empreendimento cuja execugdo foi confiada a Primeira Seccéo do Servico de Geogratia e Cartografia. Eng.° VirGiLIo CORREIA FILHO Chefe da Secoio de Documentacio Geogrifics do Servigo de Geografia e Estatistica Fisiogratica Comentario Os Fatos Fundamentais da Geografia ‘EVERARDO. BACKHEUSER Professor da Faculdade Catéllea de Filosofia’ Consultor ‘Téenico do Conselho ‘Nacional de-Geografia Hé na geografia miriades de fatos*, dos mais simples aos mais complexos: um ‘rio que placido corre em largo vale, uma cultura que se: intensifica em virtude de novos adubos. Cem mil outros. Alguns, porém, sio mais geralse mais amplos e por isso mesmo tomam caréter de fundamentais, H4 um conceito.fundamental da geografia — 0 da localizacdo, — que com certa largueza de linguagem pode ser considerado um de seus fatos basilares: Considerar a localizaciio como o fundamento mesmo da geografia é assunto que ja nao comporta mais discusséo. Os adeptos de tédas as escolas, os. vete- tanos e os neéfitos,’os partidarios dessa ou daquela doutrina, os técnicos da ciéncia, e os que a olham de fora, todos, unanimes, acertam sem debate que a “localizag&o é a esséncia da geografia”. De fato. So “passam a ser considerados’ eograficos os fendmenos passiveis de fixacao em: certo e determinato lugar. Bsse lugar pode ser grande ou pequeno, a superficie da Terra ou a area de um simples coro, nao importa, o fundamental para a geogratia é que haja um locat. Inversamente, desde que n&o suporte localizacéo o fenémeno hab entra no campo Ga geografia. Aceita por téda gente, esta. nogfio basilar pode ser considerada de doutrina. pacifica, Levantara logicamente 0 edificio da geografia quem a tomar como alicerce da sua doutrina e dela for deduzindo em virtude de cerrados raciocinios, 9s demais conceitos e fatos geograficos. stes aparecerao portanto como. coro larlos do princfpio fundamental, que €, em geografia, 0 da localizacio. . .” Repare-se que o principio da localizac&éo é evidentemente aplicdvel tanto a: geografia fisica quanto 4 geografia humana, e em qualquer dos miltiplos setores de ambos, o que mostra sua generalidade. Por isso mesmo, é o mais proprio a Ihe servir de. alicerce quando se considera ‘a geografia como ciéncia dedutiva e unitéria, na qual os parcelamentos sucessivos sao antes-de ordem didatica qué de natureza filos6fica. A localizacao é pois, mais do que um principio basilar. da geografia, porque é€ a sua mesma esséncia. Pareceré que estou a enunciar truismos, de tic aceitas sio as verdades, que venho repetir.. Ver-se-4, porém, dentro em’ pouco, que nem todos os gedgrafos (e aludo.aos grandes gedgrafos, aos mestres da geografia) fazem suas doutrinas fluir sensatamente désse dogma basilar da geografia. Tomando-o por ponfo dé. partida entremos.a labord-lo como se ninguém; ‘antes de nés, 0 houvesse feito (e ignoramos se alguém o féz como vamos tenté-lo) « Raciocinemos como se estivéramos em face de ‘um teorema de matemética de cujos resultados desejassémos nos aprofundar, tirando conelusées e conseaiiéncias. OR Se a localizacéo'é 0 conceito, quase posso dizer, 0 fato fundamental da geografia cumpre avangar. um pouco a frente e fixar a esséncia de sua carac- terizacio. * Dado o dinamistno das ocorréncias geogrificas podem os fatos ser chamados_fendmenos ‘ou acontectmentos, e, alguns déles,, fllosbficamente falando, tomam as vézes a felgéa abstrata de conceitos. Para’ facilidade do discurso essas varias expressOes serio usadas como sinonimas. +400 BOLETIM GEOGRAFICO Imaginemos, como exemplo, um caso muito simples e muito banal, o de um lote de terreno dentro de uma cidade. A escritura que for passada para sua venda ‘dir, caracterizando-o, que se trata de um terreno situado a rua tal a ‘uns quantos metros de distancia da esquina da rua qual e tendo tantos metros de frente por tantos de fundo. Poderao a seguir ser figuradas outras caracte- risticas: s6bre confrontantes, natureza do terreno, sua ondulagdo, algum bem que 14 exista, etc. Estas tltimas caracteristicas sio, porém, complementares. Essenciais, apenas as indicadas-em grifo, porque estas sio’as que localizam © terreno.’ Sem elas as demais se tornariam supérfluas. _.. Vejamos o que cientificamente significam as condigdes do trecho grifado. Ha néle duas indicacées insubstituiveis. Uma é a referente & situacdo ou posi¢do do terreno,em relacéo a conheeido sistema de coordenadas: certa rua e a distancia a dettrminada esquina. Esses dois ntimeros sio abscissa e ordenada, ou seja, latitude e longitude. A outra indicacao alude a forma e tamanho do terreno, quer dizer, a um certo espago. Vé-se por ésse singelo exemplozinho, que a nocdo de localizacéo se subdivide imediatamente em duas outras, posicdo e espaco, sem as quais seria impossivel sequer imaginar a existéncia de qualquer lugar na superficie da Terra. Um continente, um oceano, um pais, uma provincia, uma bacia hidrografica, uma cidade, um bairro, um quarteiréo nao podem ser concebidos sem que disponham de um certo espaco e sem que estejam situados em dado ponto do Globo. Quem admitir pois ser a localizacéo 0 conceito fundamental da geografia (e j4 vimos que é verdade com foros de pacifica) ha de forcosamente chegar ao corolario imediato, isto é, que os fatos fundamentais dessa ciéncia sio 0 espago e a posi¢do, por isso que os dois em concomiténcia séio predicados essen- ciais da localizacio. Esse segundo passo, fatal consegiiéncia da primeira nocao, nao é todavia dado por todos os geégrafos. Alguns, abandonando a estrada real dos raciccinios sadios, preferem, principalmente em geografia humana, embarafustar pelos invios’caminhos ‘das minticias secundarias. Tomar de fato, para fundamento essencial da antropogeografia os géneros de vida da populacdo ou a maneira, produtiva ou improdutiva, de aproveitar o solo, é visivelmente erigir o particular, poderiamos mesmo dizer, o particularissimo, em geral e comecar 0 edificio. do telhado para as fundacées. Ratzel foi aquéle que sagazmente compreendeu a necessidade de conferir As nogdes de espaco e de posicdo ou situagdo o carater de pedras angulares da gedgrafia. Admito a possibilidade de discordancias na maneira de desenvolver, em geografia, as teorias correspondentes a essas nocoes fundamentais; n&o percebo, porém, que se as possa pér de lado e se deseje levantar o arcabouco do edificio geografico prescindindo delas, esquecendo-as voluntariamente pela simples circunstancia de haverem sido postas em foco por determinado autor co 0 qual por outros motivos se antipatiza. -_ E,. no entretanto, a meus olhos, quando os estudos geograficos, sejam os tedricos e filosdficos, sejam os estudos de dada regiio ou de exploracdo no campo, sfio feitos orientados por aquelas duas determinantes basicas — espaco e posicéo — adquirem ipso facto mais légica e mais método, e, portanto, mais clareza e mais concatenacao. Prossigamos, porém, no encadeamento dos fatos fundamentais da geografia, examinando isoladamente cada um désses dois primeiros conceitos fundamentais. oR Ke Seja em primeiro lugar 0 espaco. Retornemos ao exemplo do lote de terreno. O espaco ai foi caracterizado imaginando o terreno como um retdngulo com z metros de frente por y metros de fundo. As formas dos terrenos podem evidentemente ser outras e muito mais. complicadas que a de um simples retangulo. Havera, nos casos de maior compli- cacéio, necessidade de juntar a planta do terreno, o que, em geografia, corres- ponde a anexar a carta da regiao ou pais, carta essa que permitira melhor carac- terizar geométricamente o terreno ou regiéo, Dar-nos-4 a compreensao conjunta, de sua forma, tamanho e perimetro. COMENTARIO wor © espaco’ geografico se. subdivide assim em trés novos fatos’ todos trés dé grande importancia em geografia, quer -fisica, quer politica. A jorma. peritagonal da Franca, retangular dos‘Estados Unidos, a faixa alon+ gada do Chile, etc. tem caracteristicas faceis de perceber até mesmé por leigos. As regiGes de forma mais complexa de traduco inaccessivel a nedfitos, revelam. e desvendam, s6 por si, muita coisa aos especialistas. O perimetro é afinal a linha de fronteiras terrestres ou-maritimas cujo valor geografico nao é necessario sublinhar pois esté no conhecimento de todos. Igualmente o tamanho do lote 6 importante conhecer pois déle -decorrem possibilidades de maior ou. menor importancia. © conhecimento désse espago geométrico, que alguns, ndo sei porque, tém denominado “espaco em si”, é de consideravel eficiéncia em geografia. Com- péndios e tratados, de fato, descrevem.‘e examinam os varios: espacos terres- tres e maritimos, embora muitas vézes o fagam sem usar nome tao claro e tao sugestivo. °A nogio: de‘ espago assim compreendida globalmente e’nas subdivisdes pro- postas, que-séo de si evidentes, comporta exame em ambos os setores da, geografia. No da geografia fisica quanto. avaliacdo das areas, descricio das fronteiras, conhecimento do solo, ete. No da geografia humana, desde que se imagine @sse' espaco povoado e organizado. politicamente. Tudo. quanto diga, pois com a quantidade de densidade demogrdfica é matéria de estudo nesse setor; Igualmente o estudo da estrututa da populacdo sob os miultiplos aspectos, raciais, culturais e espirituais, que ela apresenta, entra na.esfera do mesmo fato Beografico.a.que se vem fazendo alusao, o espaco: Os interessantes problemas de “conquista de espaco”, quer dizer de “modos de conquistar_terras” é também, embora de saber. histérico, fato geografico do mesmo setor. Igualmente o siste= ma circulatério, que 6 como o sistema arterial e venoso dos organismos.animais. Percebe-se pot ésse ligeiro esquema, quanto, em superficie e protundidade, pode ser explorado neste s6 campo -geografico' resultante do primeiro aspecto do fato geografico fundamental da localizacdo. Caberia a propésito da nocdo de espaco aludir incidentemente aos programas de geografia do curso secundario em vigor desde 1942, mas isso'nos levaria,longe porque o autor do programa deu ‘a espaco apenas carater fisico e em seu conceito incluiu assuntos que absolutamente nfo Ihe pertencem (clima, por exemplo) . Debater e esclarecer essa questo consumiria um novo comentario déste Boletim. Adiemos a questo: RE ‘O’ segundo’ setor a ser examinado ‘em se tratando de localizacio é aquéle que Ratzel denominou Lage, palavra que, em portugués corresponde ao mesmo. tempo & de posigéo (isto €, de localizacao segundo as coordenadas, geograficas): e 4 de situagdo, ou seja de localizacdo, por exemplo, em altitude, ou segundo a distancia ao..mar, ou em relagdo, a outro pais. : As quatro indicagdes aludidas no periodo acima sugerem a primeira subdi- visio, de carater fisico, que o conceito basilar de posicdo ou situacdo comporta. H4‘de fato em geografia, como classifica Supan em Politische Geografie, quatro’ sortes de Lage: : a) ‘posicio em relacio ao. equador; b), situacéo em relacdo ao nivel do mar; ¢) situagio segundo a 4istancia as grandes massas d’agua; d) _situac&o politica, ow de um Estado ou regido em relacio a outro Estado ou regio; Conhecimento sdlido da situacio geogratica hi de ser portanto precedido do estudo do relévo, que constitui assim, a bem dizer, o primeiro capitulo na geografia fisica, nesse novo e grande setor da localizacéo. Em segundo lugar, 0 clima. Realmente as condicées de temperatura, umidade e ventos de cada regiao estéio diretamente influenciados pela latitude, relévo-e proximidade das massas d’4gua. .Conseqiiéncia do relévo e~do clima ‘edo as_bacias hidrograficas, 102 BOLETIM GEOGRAFICO outro grande capitulo portanto da situagdo. As Aguas correntes geram fatos geograficos e déles s&éo conseqiiéncia. Embora contidos no espago de dada Tegiao sio, no ponto de vista filosdfico, como se vé, parte’ do setor .situacdo. ‘A isto também n&o atendeu o programa atual do curso secundario, que embara- Ihando idéias evidentemente claras em ciéncia geografica de bom quilate, impoe tratar sob o titulo nogées que a outro pertencem . Paralelamente a geografia fisica, a geografia humana, explora também, e fecundissimamente, os problemas situacionais. Ratzel os aprofunda exaustiva~ mente. Igualmente Maull Hettner e tantos outros dos grandes: mestres da geografia. E dentro désse campo (situacio geografica) que se agita, a bem dizer, toda a antropogeografia dos autores franceses. Ao passo que 0 aprofundado exame do espaco leva & geografia politica, éste outro, da situacéo ou posicdo, conduz a geografia social, isto é, 4 geografia que tem as preferéncias de Vidal de la Blache, de Deffontaines, de Vallaux e de outros mestres ilustres. Os fenémenos geogréficos decorrenfes da posicéo fornecem & geografia humana 6s mais controvertidos dos seus problemas. & de fato facil tombar em exagerado determinismo téda vez que se empresta subordinacao muito rigida dos fatos geograficos 4s imposicées do chamado meio fisico, meio fisico que final nada mais é que modalidades variadissimas de circunstancias situacionais Alguns, como Montesquieu, j4 se deixavam impressionar por éle antes dé Darwin. A corrente se acentuou porém, depois que o sdbio inglés expés suas revolucio- narias doutrinas. Taine e Demolins, em Franca, Huntington e outros autores norte-americanos so corifeus da teoria.‘O préprio Vidal de la Blache nao conse- guiu fugir a ésse determinismo assoberbante, como se pode ver lendo Principes de Géographie Humaine. Ratzel tem sido violentamente acusado de determi- nista, vitima como outros, dessa doenca que grassou em todos os campos cien- ‘tificos em fins do século XIX e ainda tem carater epidémico nos Estados Unidos. © Ratzel, porém, instituindo a sua fecunda teoria das posicdes politicas, conse- guiu habilmente furtar a antropogeografia as desastrosas conseqiiéncias de um darwinismo exagerado. Os acerbados criticos do grande pensador teuténico pouco aludem a ésse aspecto de sua doutrina, aspecto que é acaso o mais belo e o mais profundo do setor em que éle aborda os fatos correlatos com a posicaéo ‘Beografica. ‘Ao passo que fisicamente cada pais (ou cada regiao, ou‘até, cada coro) quase independe dos demais, circunvizinhos ou distantes, cada sitio esta segundo a teo- ria da posicdo politica, influenciado, de modo permanente por muitos outros sitios particularmente os mais préximos, os vizinhos. Cada estado é como um astro que percorre sua orbita no firmamento. Seu movimento é a cada passo comprometido pela aproximacao de outros. corpos celestes que exercem atracgdes miiltiplas. Isso quer dizer que em geografia humana as féreas fixadoras ‘dos fenémenos de posicao sao de multiplicidade e variabilidade a bem dizer infinitas. Dai a instabilidade e de certo modo a surprésa dos fatos humanos ‘em geografia, fatos humanos ésses na maioria dos casos subordinados ao fendémeno vasilar da situagdo em geral e da situagdo politica em particular. Bsse campo da “influéncia das situacdes politicas” é de grande uberdade. Foi, quando o arava com intensificado esférgo em nossas meditagées antropo- “geograficas, que formulei a lei “do nivel de cultura” (divulgada em 1926 ‘em Notas Prévias) lei que, como dito entéo e se vé do exposto neste comentario nada mais 6 do que um corolério do pensamento fundamental de Ratzel. Verifica-se, assim, que a teoria da posicdo politica, apanagio da geografia vatzeliana, é a melhor prova da nao subordinagig estreita a um determinismo terrenho, por parte do criador da geografia humana. eRe A ésses dois fatos geograficos — espaco e situagéo ou posiedo — esclare- cedores do conceito fundamental de localizaedo, é licito ajuntar um terceiro, ‘complemento daqueles. Quando, para relembrar ainda uma vez o exemplo apresentado, quando se passa a escritura de um terreno, depois de localizé-lo, pela sua situagao e pelo seu-tamanho, em regra se o descreve e se 0 individualiza indicando o que COMEN TARTO: 403 “possui. Essas riquezas, que’ sio_o valor mesmo da terra, formam em conjunte os dominios do proprietario. Constituem, portanto, fato geografico de: rele~ vaneia, por. serem inerentes Aquéle dado pedaco de terra. De longa data j4 a geografia tomara cénhecimento dos fatos dessa tercéira categoria, pela qual Kjellén, em feliz inspiracao, sistematizando-a, completou as outras idéias da concepeao ratzeliana. Assim é que de longes dias'a geografia fisica estuda a natureza’geolégica do solo, o revestimento: vegetal, os acidentes de perfil dos rios que geram as quedas d’4gua, essa hoje em dia importante fonte de energia. A geografia humana, por seu lado, também de tempos afastados, inelui no rol de suas meditatoes os fatos geograficos de dominio. Sob‘o. titulo de geografia econémica é. que ésses conhecimentos vém sendo estudados pelos técnicos'da nossa ciéncia. A subdivisio do setor dominio esta pois claramente indicada pelos trés reinos naturais: mineral, vegetal e animal, acrescidos de um quarto capitulo referente as fontes de energia que séo também riqueza territorial de natureza especifica. E Os ‘fatos geograficos: de industria, de agricultuta, de pecudria, de minerac&o, de coméréio, deixam-se incluir dentro do fato mais géral de.dominio geogrdfico. Os fatos getais de circulacéo que como dito aclma, devem sem diivida figurar como peculiares a0 espago, pols sio movimentos de populacéo, podem ser também sumariados, quando se os eneara pelo lado econémico, como uma das importantes parcelas do fator dominio. Jee Como tera visto o leitor dentro dos tré8 conceitos acima apreseniados: espace, posicao ou situacéo e dominio, se encorporam todos os fatos da geografia. Dentro da légica-e do bom raciocinio, séo portanto, considerados ‘como os con- ceitos fundamentais -da 'geografia, como ésses trés conceéitos correspondem a um certo ntmero de fatos, podemos, forcando um-pouco a expressio, chama-los. de fatos fundamentais da -ciéncia da localizacao, isto é, da geografia. Correspondem, além disso, 4s. trés grandes chavés de classificagio-da antro- pogeografia, habitualmente ‘aceitas pelos. tratadistas. Os fatos de espago equivalem, em linhas gerais aos da geografid politica. Os fatos de posigéo ou situagdocorrespondem, em sua’ maioria,-& geografia social, isto 6, aquilo a que muitos reservam o nome de geografia humana pro- priamente dita. Os fatos de dominio sio, quase sempre, de geografia econdmica. BRR ,5¢ precisar de alguma informagio sobre a geogratia do Brasil, irija-se ao Conselho Nacional de Geografia, que o atenderd pronta e satisfatoriamente. " ~ Transcrigées Mapa Florestal do Brasil * Gonzaca DE CamPos Ir CAMPOS A cér amarelo-clara representa a vegetacdo campestre. A palavra campo, no seu sentido mais amplo, significa para nds todo o terreno que nao tem mata. Assim compreenderia também as 4reas em que a mata tem sido destruida. O mapa, entretanto, para aplicar a.cér convencional exige outra condicdo: que © terreno nunca tenha sido revestido de mata. A grande variedade de climas, de solos e de outras circunstancias tem determinado um grande numero de tipos de vegetacéo campestre, imprimindo a cada um déles uma fisionomia especial. Procuraremos apontar alguns dos principais que foram incluidos na convencaio de campos. . q a) — As campinas * — Bste grupo compreende as Areas em que predomina a vegetacio de gra- mineas e plantas herbaceas, sem.contudo mostrar na maioria das espécies os caracteres de adaptaeao ao xerofilismo. A mor parte sio campos de varzea ou inundag&io; distribuem-se’pelas baixadas ao longo dos rios mais volumosos @ acham-se incluidos como manchas de menor ou maior extensio nas areas das grandes divis6es dos grupos A, B, C e D das florestas da primeira convencdo. Muitas vézes constituem estreitas faixas por detras das matas ciliares. Quando maiores, sio cercados de mato na periferia. Nas enchentes, no geral, ficam co- bertas de agua, com pequenas elevagdes (tesos), para onde foge o gado. Entao, freqiientemente, néles entram as plantas aquaticas que vem descendo arrastadas pelas grandes correntes: agua-pés, mururés e damas-do-lago. Nas vazantes a mor parte desta vegetacao fenece; e entao vingam os capins, quer bravos, quer de pasto, os juncos, as aningas. i Os exemplares mais desenvolvidos e tipicos désses campos de inundacio encontram-se ao longo do curso do Amazonas até a sua foz na ilha de Marajé, nas proximidades das costas do Para e do Maranhao. Sao caracterizados no geral pelo pequeno numero de espécies vegetais, em contraposigao com a flora varia~ dissima dos campos secos dos planaltos do Brasil. omo principais désse tipo aparecem no mapa: as campinas entre o Jutai e o Jurua, entre o“Coari e o Purus, emtre 0 Ituxi e o Madeira, as que ficam a leste do baixo rio Negro, as da barra do Jamunda, as da béca do Trombetas e as que ficam entre os cursos inferiores do Trombetas e do Jatapu, as da barra e curso inferior do Tapajés, e as do Uatuma, do Paru, do Jari e as da boca e baixo curso do Xingu, as do Araguari, e as-que se estendem pela costa da, Guiana brasileira até o cabo Orange; as vastas campinas da ilha de Marajé, as da foz e parte baixa do Tocantins e algumas de menores dimensdes nos pequenos + N.R.: © Boletim n.° 9, ano I, referente ao més de dezembro de 1943 estampou a 1* parte do presente trabalho em que © autor estuda “As Convencoes” e “As Matas”. A parte final serd publicada no Boletim n° 17, ano TI, correspondente ao més de agdsto proximo. TRANSCRIGOES 408, rios que véoao mar na costa paraense, No Maranhao as campinas do Pericumé, do rio Aura e do baixo Pindaré, as compreendidas entre o baixo Mearim e 0 baixo Itapicuru.e as que se éstendem entre o rio Monim e o rio Parnaiba. : Considerando as matas de varzea do Amazonas, vimos’como estas se-dife- renciavam: no curso baixo do. rio, com as altivides nfais volumosas ¢ ricas for mayam as pestanas dos rios e igarapés com suas matas.ciliares, indo apenas os sedimentos mais finos de areia e argila contribuir para o aterramento vaga~ roso, das depressdes. laterais onde se desenvolyem as campinas. Vimos ainda como, com 0.divagar das grandes correntes, se formam os grandes lags laterais. E se considerarmos que ésses mesmos fendmenos:se repetem em larga escala para todés os afluentes, principalmente perto das embocaduras, onde vao con- tribuindo para elevar o nivel da grande depressio pantanosa, teremos mais ‘ou menos explicada a origem das campinas, cuja vegetagao especial também, segundo os Kotanicos, esta de acérdo com ésses fatos, ‘As campinas ocupam as grandes depressoes laterais, antigos leitos, que os rios esto aterrando ou tém aterrado. Se as Areas do leito abandonado sao estreltas, ,0s germes da floresta se propagam, e se desenvolvem as matas alagadicas. Se afaixa destacada pelo novo curso é muito grande, a mata s6 sé pode desenvolver em térno e.a grande area de insolacdo e de inundacdo repetidas s6 permite: a vegetacdo da campina. © professor J. Huber assim explica essa formacdo especial. Estudando 6s campos dos pequenos rios da ‘costa do Para a leste do Amazonas, nota nos do- alto Coatipuru, que em muitos-pontos ainda avancam éles'em continuidade até a margem do rid; em. outros pontos; porém j4 se formou a pestana coberta prin- cipaimente de juguiri, embatiba, faveira, trapid, munguba, mamorana, jurubebo. No tempo. das chuvas: as campinas inundadas estao cobertas de plantas aqua. ticas. Na séca, 0 capim de marreca é 0 mais abundante e quase o ‘nico, & excecdo do barba de bode (Eragrostis reptans)*. A pobreza dessas campinas, em espécies vogetais deve-ser atribuide as repetidas queimas e treqtientacao pelos animals, de modo que apenas resistem as que se reproduzem. pelas raizes vigorosas e as qué com espinhos se defendem dos herbivoros. ‘Testemunhas otllares afirmam que antigamente ésses campos eram ricos de capins. altos, abundando’ o arroz” Bravo (Ory2a-sativa) e 0 andrequicé, (Leersia hezandra). ‘No baixo Coatipuru os campos tém conservado melhor as associagdes vegeta~ tivas naturais; hé capins altos de um metro e outras monocotiledéneas. Encon~ tram-se' ali grandes plagas cobertas de junco, cari, arumé-rana (Thalia gent- culata), espadana (Typha domingensis). : : No referido trabalho, qué estamos resumindo, os Drs. -K. von Kraatz-_ Koschlau e “Jacques Huber -chegam a interessantissimas ‘cofclusées dos’ seus estudos em relacio a ésses campos que vimos enumerando ao longo e no estudrio do Amazonas. : ‘Bsses campos, cuja formacdo data da época terciéria, e ainda hoje conti- nuam a subsistir e a desenvolver-se, ocupando os lugares abandonados pelos antigos leitos da drenagem, correspondem as-savanas do curso inferior das cor- rentes da Guiana; os pampas, da boca do rio da Prata, tem a mesma origem e os. Wanos, da. Venezuela, drenados pelo Orinoco. e seus afluentes, devem caber no mesmo grupo. . + ‘Também os campos-cerrados, campos altos, campos do planalto do Brasil Central podem ser admitidos como campinas' das varzeas e das embocaduras dos rios provindo das.matas pela secura erescente do solo, e gradual empobre- cimento das florestas.* Mas éstes so de idade geologica mais antiga. E assim se explica a relativa pobreza em espécies yegetais dos campos. de rios que recrutam as suas espécies nos remanescentes da vegetacdo j& reduzida das margens, enquanto que os campos‘do planalto tém sua flora variddissima, como resul- tante das trarisformagées da riquissima e complexa constituigéo das florestas, durante um periodo muito mais longo. 1 eses campos de dimens6es relativamente pequenas,,em melo da regifo das matas nia figuram no mapa. : 2 ‘Temos sempre empregado os nomes vulgares dos vegetats. Aqui. copiamos maquinalmente alguns nomes botinicos, quando a nomenclatura vulgar ¢ essenclalmente local e ‘confusa. ‘a "Em abono, eitam Warming — On the vegetation of Tropical America-Botanical Gazette = 1899). 406 BOLETIM GEOGRAFICO Warming, na sua Flora da Lagoa Santa, admite uma diferenga essen- cial entre os pampas do sul e os Hanos da norte de um lado, e os campos do Brasil Central do outro. Os primeiros, muito mais planos, despidos de arvores, tém uma vegetacio gramindcea também muito mais pobre; parecem agora acusar um certo enriquecimento; cita Sachs e Sievers observando que os Uanos de hoje mostram mais arvores e até, em pontos, tendéncia para matas, enquanto que eram despidos no tempo de Humboldt. “Estou mais inclinado a admitir que 0 solo dos anos que num. periodo geo- Jégicamente pouco remoto certamente era fundo do mar, ainda esté em formacio natural e progressiva, e que incessantemente se enriqueceré com Arvores, até. ser alcancada uma certa densidade como nas savanas da Guiana e nos campos brasileiros”. Comparando as descri¢des de Schomburgk das savanas guianenses, Warming encontra a maior semelhanga com os campos do Brasil Central. “Designo as savanas da Guiana e os campos do Brasil como duas espécies, floristicamente de certo diferentes, mas de uma e mesma formacio vegetativa — a formacao das savanas”- Estudando a flora da ilha de Marajé, 0 Dr.’ Huber encontra um tipo um tanto diferente na vegetacdo, uma. influéncia notavel da flora das Guianas. Enquanto nas Guianas as floras do litoral e dos campos interiores se desta- cam. acentuadamente, na ilha de Marajé aparece uma formacao intermediaria entre essas duas, mostrando infiltracéo dos elementos campestres provindos das Guianas. S40 também campinas inundaveis, admitindo vegetacio aquatica nas cheias. Na séca, essa vegetacdo limita-se as baicas, que ainda conservam alguma agua Nos esos, ondulacdes mais altas que nao sofrem a inundacdo, bem como a margem dos rios e igarapés a vegetacdo concentra muito maior numero de. arbustos € de arvores. Nos campos cita, entre muitos outros: Arroz-bravo (Panicum ?), Capim de marreca (Paspalum conjugatum. Berg.) , Paspalum pusillum Vent., Junco-bravo (Cyperus nodosos, Willd.), Capim de rosa (Cyperus surinamensis. Rottb.), muitas espécies dos géneros Cyperus, Eleo- charis, Rhynchospora e Scirpus, Arapari (Vouapa acaciaefolia. Benth.) » Muruct (Birsonima crassifolia, Kunth.), alguns Paepalanthus, diversas, espécies de Jussioea, algumas Schuiteria, Cargqueja (Hydrolea spinosa, L.), Gerardia hispidula, Mart, aigumas Herpestis, Perpétua do campo (Borreria scabiosoides. Cham. e Schlecht.) Limnossipanea spruceana. Hook.), etc. - Nas baixas: Partasana (Typha domingensis, Pers.), Arroz (Oryza sativa, L.), Canarana (Panicum amplesicaule. Rudge.), Panicum appressum. Lam., Capim da Colénia (Panicum numidianum. Lam.), Capim de Angola, que também chamam Cana- rana, (Panicum spectabile. Nees.), Canarana (Paspalum repens. Berg.), Piris, Juncos e outras ciperaceas dos géneros Eleocharis e Scirpus, Aninga (Montrt- chardia arborescens. Schott.), Mururé (Pistia stratiotes. L.), Eichornia natans. Beauv.), Arumd-rana (Thalia geniculata. L.), Juqueri-manso (Neptunia olera- cea. Lour.), etc. : . . Nos tesos e beiras de rios: Grama (Dactylostenium aegiptiacum. Willd.), Capim membeca (André pogon virginicus, L.), Eragrostis. Wahlii. Nees.), Taboca (Guaaua angustifolic Kunth.), Capim da terra (Panicum) , Paspalum paniculatum. L., Arroz do campo (Trachypogon polymorphus), Capim manso (Poepalanthus Lamarckit, Kunth.) , Heliconia psittacorum. L., Embatba (Cecropia leucocoma. Miq.), Apui Curupita (Urostigma), Ariticu (Anona palustris. L.), Cupuda mitda (Couepia bracteosa, Benth.) Uchi-rana (Couepia), Ingé de fogo, Juqueri (Mimosa asperata, L.), Mandubi (Cassia diphyla. L.), Mata-pasto (Cassia marginata. L.), Jutai-rana (Crudia parivoa. D. C.), Morcegueira (Andira inermis H. B. K.), varias Cen- trosema, Canaria (Crotalaria maypurensis. H. B. K.), Mucund (Dioclea lano- carpa Mart.), Aturid (Drepanocarpus lunatus. Mey.), Anil (Indigofera anil L.), TRANSCRIGOES 407 Pitomba (Simaba guyanensis. Aubl.), Breu_branco (Protium heptaphyltumy Aubl.), varias espécies de Murici, Cajucara. (Stigmaphyllum), Ortiga (Jatropha urens.'L.), Curupitaé: (Sapium biglandulosum. Aub.), Timbo (Paullinia pinnat L.), Algodao bravo Hibiscus furcellatus.Desr.), varias espécies de Sida, Sumai= ma (Ceiba pentandra, L.),-Munguba. (Bombax munguba. Mar.), Mamorand (Pachira aquatica.” Aubl.)' Jeniparana (Gustavia augusta. L.), Laranja-do mato (Cassipourea guyanensis. Aubl., Tatajuba do campo‘ (Cassipourea), Folha dourada (Aulomyrcia cuprea. Bere.), diversas espécies de Eugenia, Cuia-rana’ (Terminalia tanibouca..Smith.), Murta (Mouriria guyanensis. Aubl.) e outras melastomaceas. Macaco'- cipé. (Marsdenia),. Batatéo (Ipomoea pentaphylla. Jacq.) € outtas Ipoméias, Paraparé (Cordia umbraculifera, D..C.), Tarumd @ diversas outras Vitex, Sdivia de Marajo e diversas espécies de Hyptis; Purui, varias espécies de Alibertia; Papa’ terra, varias espécies de Basanacantha, - * ‘No Maranh&o os campos da regio dos lagos compreendida entre-os rigs Turiacu.e Pindaré, denominados campos de S40 Bento, de Pinheiro, de Cajapio, de Viana, so campinas da mesma natureza e formacao vegetativa. Inundam na €poca das chuvas, ficando apenas descobertos alguns tesos com’ sua vegetacao arbustiva e arborescente fraca, mas, com 0 chao /revestido. de gramineas e dé ervas que fazerh o recurso para o gado neése tempo. Nos campos sab’ principal- mente capins, juncos e tabuas, com .a yegetacio muito proximamente a-mesma descrita para as campinas do vale do Amazonas. Os campos de Anajatuba, perto da foz-do rio Mearim, sio também campos inundaveis, onde tm lencol d’4gua de dois a trés metros de-profundidade permite navegar ‘por grandes extensdes. Na séca, a argila depositada forma. espéssa camada, que, pela retracio apresenta grandés fendas entrecruzadas, destacando paralelepipedos que constituem a torroada. Onde com a argila sedimentoti-se grande proportao de htmus, desenvolve-se rapidamente a vegetacdo, principal- mente de gramineas tenras-(¢apim mimoso) , que constituem excelentes pastagens. Ao longo de todos os grandes rios; quer na zoria de terras mais baixas qué se aproximam ‘da costa, quer no planalto, desde que os seus cursos se’ estendam em planicies, abrindo-se em grandes varzeas, reproduzem-se tais condicdes. de sedimentacao e formiam-se as. campinas. © rio Doce, depois. de entrar no Espirito Santo, para baixo de Pérto do Sousa,’ principaimente entre a barra do rio Pancas e Linhares, percorre uma zona. aplainada, onde ainda: subsistem ntimerosos lagos e lagoas, toda coberta de campinas dessa natureza. O mesmo acontece, no baixo Paraiba; ‘desde Sa9 Fidélis até:para baixo de Campos. Outra.regiao caracteristica,.porém j4 no planalto, é a depressio quase niv. ‘lada, posta ente as duas' muralhas da Mantiqueira e da serra do Mar. Ai, ha mesma calha mas com direcées’ opostas,.correm os vales’ do alto Paraiba ¢- do alto Tieté por sobre a extrema varzea cujo terrapleno comecou na era tercidria € 0 trabalho de aplainamento vem se prolongando até hoje. Os lagos' onde se depositaram jas argilas, os caledreos, os xistos betuminosos e as areias do tempo tercidrio, esto hoje cobertos de campinas. No Paraiba comecam estas: em Bocaina e chegam até Jacarei na volta brusca’ em que o rio toma orientacad oposta,& que trazia. No Tieté vao desde Mogi das Cruzes até & zona das cachoeiras que principia ‘junto & vila de Parnaiba. £m alguns lugares a varzea inunda.com a expansao das enchentes; aise encontra entao a vegetacdo. caracteristica das plantas aquaticas, dos juncos, das tébuas. No geral séo os campos cobertos de vegetacdo herbacea e de sub-arbustos. Nos tesos e nas pestanas do’rio é a vegetacao arborescente de tipo especial, ara formando capées no meio do campo, ora as matas ciliares. & nas depress6es. dessas ‘varzeas que Ultimamente se tem feito com a maior vantagem a cultura sistematica e em larga scala do arroz. » Em geral osolo mais ou menos imido esta, coberto de um tapéte de gra- mineas'e de vegetacéo herbacea..As gramineas além das verdadeiras gramas deitadas, consistem principalmente de diversos tipos dos géneros Paspalum. Panicum ¢ Andropogon; nas:margens das, estradas e nas lombas 6 muito fre= qiiente o capim barba-de-bode. (Aristida) , Martius cita, entre as ervas, arbustos’e sub-arbustos das campinas do Paraiba: Compostas: Wedelias, Vernonias (assa-peize), Bidens. (picdo), Ambrosia artemisiae-folia, e outras; Melastomaceas: Rhezias e algumas herbaceas; Eufor- bldceas: Cnemidostachys, Tragias, Crotons (Velame); Rubidceas: diversas. es- 408, BOLETIM GEOGRAFICO pécies de Declieusia, e muitas outras; Papiliondceas: Sweetias, Clitorias, ete; Mimosaceas (sensitivas); Malpigiiceas:. muitas espécies de Banisteria, Gau- dichaudia e outras; Asclepiadceas: Oxypetalum; Apocinaceas; Verbendceas; Umbeliferas; Ocndceas; Araliceas e dé muitas outras familias. E refere entre as arvores esparsas nas campinas, ou reunidas em capées, ou nas margens do rio: Melastomaceas; Mirtdceas (psidium); Voquisidceas:, Vochysias, Qualea, Sal- vertia; Anondceas; Malpigidccas; Ternstrocmiaceas: “Laplacea (pau de sdo josé), 6 outras; Anacardiaceas; Schinus (aroeira): Mirsinaceas; Mimosaceas; Casalpinaceas e muitas outras. Desta curta relacdo, vé-se que aqui ja se apresentam alguns tipos, como as Voquisiaceas, caracteristicos dos campos secos (campos-cerrados) dos planaltos do Brasil Central. Dois outros rios importantes, o Araguaia-Tocantins, e 0 Paraguai, com grande niimero de seus afluentes orientais, tém vastas extensoes dos respectivos cursos em zonas aplainadas e de pequena altitude. Nas suas margens abrem-se grandes campinas due .pertencem formacao que vimos descrevendo. Nestas porém 0 aterramento vai mais atrasado; durante céroa de meio ano ficam quase total- mente debaixo d’gua: sdo os pantanais,.indicados no mapa por uma conven¢ao especial; e assim déles trataremos separadamente. b) — Campos do sul © tipo de vegetacéo campestre mais desenvolvido é 0 dos campos-cerrados, com suag variedades. Em todos os planaltos da vasta regiao central do Brasil tropical estende-se em largas areas essa formacdo vegetativa em que predo- tinam antes: os arbustos e as arvores ands. A medida que se avanca. para sul passando da regido tropical para sub-tropical, sofrem os campos uma grande Giferenea: o niimero de plantas lenhosas diminui, e mesmo os individuos tor- nam-se de mui pequeno porte, ao mesmo passo desenvolvem-se as gramineas toraando-se predominantes, nao pelo ntimero de espécies, que é muito mais reduzido, porém pelo numero de individuos, e também pela altura déstes. A contar da parte sul e sudoeste de Sao Paulo comeca esta transformacao que vai crescendo para sul até apresentar-se tipica na campanha do Rio Grande do Sul. Lindman estudou profundamente .a flora do Rio Grande do Sul, levow sua penetrante observacdo pela Argentina, principalmente pelas provincias de Corrientes e Entre-Rios, pelo sul do Paraguai e pelo Gran-Chaco. Das suas descrigdes tomamos os seguintes apontamentos sucintos. , 'A transformacdo da regido campestre do tipo tropical para o tipo temperado 6 caracterizada pela grande reducio do ntimero de espécies. Lindman cita 0 género Aristida, reduzido & quarta parte, e o género Paspalum a quinta parte do ntimero das espécies existentes nos campos tropicais. Em compensa¢do 0 nitimero de individuos e 0 seu desenvolvimento crescem muito. HA diversas associacdes floristicamente distintas dentro dessa formacéo meridional. Porém mais importante, e que pode ser tomada como tipo, é a dos campos paledceos, caracterizada pela abundancia de gramineas plumosas e de Compostas, com elementos que se distinguem por grande sociabilidade, formando grupos purés, como nunca se os encontra nos campos tropicais. As gramineas sdo altas e rigidas e distribuidas em grandes soqueiras de andropogondceas. Sao os campos de palha (espécies grandes de Paspalum), e de macega (espécies de Erianthus) . © resto da vegetacio herbacea e de sub-arbustos mostra o tipo das vassouras; so plantas ramosas de folhas muito pequenas ou sem fdlhas guazumas, carquejas, quinas do campo (Sida, Baccharis, Discaria) . Lindman distingue outro tipo de campo, o sub-arbustivo, acusando uma vege- tacio muito mais pobre. As gramineas, ervas e sub-arbustos sao todos de tipo muito pequeno, em geral de colmos e caules deitados, formando um tapéte duto de caules e folhas aderentes ao chao; dai levantam-se caules e colmos erectos, mas que raramente atingem a altura’ de 30 centimetros. As gramfneas principais so: Andropogons, Aristida, Briza, Eragrostis e Paspalum; ocorrem freqiientes Juncdceas € Ciperdceas. Entre as ervas e sub-arbustos sobressaem.as Amaran~ tdceas, Compostas, Rubidceas, Melastomdceas minusculas e outras. Os érgaos TRANSCRIGOES 409° subterrfneos séo relativamente muito : desenvolvidos, constituindo’ tubéreulos ‘6 troncos duros, que.lembram de algum modo os zilopddios dos campos-cerrados. Também o solo onde vingam ésses campos é de uma argila dura e séca, abun- dante em pedregulho, em pontos de um barre areento muito. endurecido. Os camipos sub-arbustivos desenvolvem-se de preferéncia nas encostas e nos altos mais: secos. das lombadas; os paledceos nas baixadas compreendidas entre as lombas e principalmente:em tédas ag extensdes mais aplainadas e. protegidas do, vento, onde as sementes dos capins plumosos se conservam e’ disseminam. E, como a campanha do Rio Grande é mais aplainada para a parte de sul e de sudoeste, é justamente para ai que dominam, os campos paledceos, que cons- tituem 0. verdadeiro tipo predominante naquelas regides. Principaimente na parte mais meridional do Estado, na zona compreendida entre os rios Jaguaréo € Piratinim, encontra Lindman a maior semelhanea com os. pampas da Argen- tina, semelhan¢a esta igualmente acusada em'todos os campos’ paledceos. Os yentos; mais intensos no Rio Grande’ séo os que vém do sul ede sudeste. Por éssecaminho teriam vindo os-germes da vegetagio dos pampas até as planicies baixas do Rio Grande. Assim, os campos do sul ficam limitados emi sua 'idade & das formacdes. dili- yiais pampeanas:.Se nfo sio tdo novos como as campinas ainda hoje em cons- trucao -continuada, nao podem por modo algum aspirar & idade madura dos campos-cerrados do planalto. Campos da ,Vacaria — Arrojado Lisboa- descreve os campos do planalto sul de“Mato Grosso que ali constituem uma grande. 4rea de excelentes pasta- gens, 0s campos. da Vacaria, onde a criacio do gado prospera com as maiores vantagens desde muitos anos. Comecam ‘éles em faixa estreita ho meio dos cerrados que revestem os altos, divisores entre.o rio Parana e o Paragual, cérea de Campo Grande.. Desenvolvem-se para. sul ganhando ‘em expansao pelas en- costas.dos vales, & medida -que o terreno se vai tornando. mais baixo ¢ aplai- nado, ‘ficando. entéo sdmente nesgas de cerrado. nos ‘estreitos espigdes mais elevados. ‘De espago a espaco, encontram-se nos espigdes pouco acentuados zmanchas de campos em parque, os campos arbéreos, que lembram .muito 0 tipo’ qo fazi- -nal nos Estados’ do ‘Sul: sébre um cho revestido de gramfrieas levantam-se Arvores de bom porte,e grandes copas —.capitdo, paratudo, barbatimdo, ete. Os Campos da Vacarid sio fortnados de’ gramineas deitadas ou asceriden—_ tes, ervas e sub-arbustos, com todos os caracteres dos campos sub-arbustivos que Lindman’ estudou na :campanha do Rio.Grande do Sul. Os verdadeiros campos paledceos tém-aqui-menor importdncia; sé'se encontram atualmente nos lugares mais altos abandonados pelo gado. Entretanto devia ter sido ésse ©. tipg primitive do campo. Com a freqiientacio pelo gado, e as repetidas quel- mas, visando estabelecer melhores pastagens, ‘os campos paledceos se foram transformando em campos sub-arbustivos de-gramineas mais tenras. Tem ha= «vido ali uma certa acio do homem.no aperfeicoamento das ‘pastagens. Os criadores da regiio consideram.o.capim flecha’e 2 macega como tendo sido a primitiva coberta désses campos, depois completamente destruida ¢.substituida principalmente pelo capim branco felpudo, e mais tarde pelo. mimoso, que nas terras fortes, @ nas proximidades das-habitagdes, ou nos lugares mais prote- gidos, dé lugar as gramas. Também no Rio Grande do Sul os campos paledceos trabalhados e trafe- Bados pela criacio passam aos sub-arbustivos de forragens mais macias. Na regio da Vacaria a graminea predominante e a mais resistente 6 0 capim branco felpudo (vatiedade de Andropogon); vem depois 0 capim mimoso Panicum capillaceum. Lam.). muito mais valioso, porém: menos resistente as sécas e As queimas. Avestrutura geoldgica da extensa regiio é de grés tridssi¢é- em alternacdo com trapps que’ fornecem, em pontos, grandes manchas de terra roxa; mas os campos da Vacaria desenvolvem-se principalmente ‘sébre um solo: aluvionar resultante da mistura dos detritos do grés e da rocha eruptiva. Assim pois ésses campos devem ser incluidos no grupo’ dos campos do sul. Representam ainda ds tracos de influéncia da vegetacdo: dos pampas. Seria. o extremo mais avaneado para norte (cérca do paralelo de 21°) até onde a. in- 10 BOLETIM GEOGRAFICO fluéncia da vegetacdo sub-tropical se faz sentir invadindo os dominios de maior aridez das formacées tropicais mais antigas dos campos cerrados. E as cir- cunstancias mais favoraveis para isso so: o clima temperado da regiao; as chuvas regulares e bem distribuidas durante a ano, donde uma abundante réde hidrogréfiea de cursos perenes e de regime pouco’ variavel; e a constitui¢éo do solo enriquecido pelos produtos da decomposicao do trapp. Por todas essas condicées, aquela regifio se apresenta de grande riqueza na atualidade para a criagdo, e de um futuro ainda mais auspicioso para a exploracio agricola de uma série de producoes, entre as quais a do trigo se acha thdicada como das mais prometedoras. ‘Campos gerais — Esta denominacdo tem sido aplicada a diversos tipos de campos, estendendo-se aos campos limpos e. mais elevados, de Minas Gerais como aos da Bahia e de quase todo o interior do Brasil. Aqui nos referimos t40 somente aos campos sub-arbustivos que ficam para sul do trdpico. Vimos que desde o sul de Sao Paulo comeca a modificacio no tipo dos campos: diminuicio em numero e tamanho das plantas lenhosas e aumento em numero de individuos das gramineas, com uma tendéncia geral para a for- “ macdo de associacdes mais puras, tendéncia que alids se manifesta em toda a vegetacio. : ‘Com o decreseimento das plantas lenhosas, vingam cada vez mais os campos paledceos e os sub-arbustivos. & prineipalmente no Parana que esta formacao ostenta grande desenvolvimento. Uma faixa extensa, que, ocupa o primeiro planalto do Estado, limitada a leste pela serra do Paranapiacaba e pelos altos da serra do Mar, e’a oeste pelas elevacées da serra das Furnas e pelas encostas da serra da Esperanca, vem desde as divisas de Sao Paulo, até encontrar com as matas do rio Iguacu. Os planaltos dessa regido, com a altitude de 700 a +000 metros, com o seu clima famoso pela benignidade, receberam especial mente o nome de campos gerais. Infelizmente nfo temos ao alcance nenhum trabalho especial dos bota- nicos modernos e somos obrigados a recorrer as observagées valiosas do notavel Saint-Hilaire. : ‘Sao as gramineas que formam o conjunto dessas pastagens naturais. As outras plantas variam naturalmente entre diversas localidades. Sobressaem, entretanto, Vernénias, Mimosas, uma Convolvulécea, a Composta vulgarmente chamada ¢harrua, uma Verbenacea, uma Cassia ¢ uma Labiada, um Eryngium e outra Composta. O nimero de espécies nos campos gerais é antes bem limi- tado. HA algumas que nao se encontram na zona tropical. Por cima da serra das Furnas (Fazenda de Caxambu), ha campos-cerrados como em Minas ¢ Golds: entre as ervas e sub-arbustos désses cerrados hé muitos que so comuns aos da zona tropical. Pode-se dizer que a flora dos campos gerais tem algu- mas relagoes com as da campanha do Rio Grande do Sul, porem as tem mais fntimas com a dos campos mais para norte. Descrevendo a viagem por Sao Paulo, até Sorocaba encontra campos-cerrados. Dai para sul, até os limites de Sao Paulo, no Rio Grande do, Sul, Uruguai e Buenos Aires, so sdmente campos herbaceos. Comparando as floras de Golds e do sul de Séo Paulo, encontra nesta muito mais Papilionaceas. Em Sao Paulo predominam: Compostas e Papiliondceas; em Goias: Compostas, Mirtdceas, Labiadas, Acanticeas e Melastomaceas. Em todo caso, ésses campos gerais estendem-se para sul através de Santa Catarina, até 0 planalto que constitui a metade setentrional do Rio Grande do Sul. Para esta tltima regifio temos os estudos de Lindman, a que: sempre recorremos. : Os campos do planalto so muito mais acidentados do que os da campa- nha; mas as condigdes climaticas sao proximamente as mesmas, talvez um tanto mais chuvoso o planalto. A zona mais chuvosa é a faixa escarpada leste- oeste que descarrega volumosas Aguas nos rios Jacui e Ibicui e é toda coberta de matas. ‘Na barra do Rio Grande a média de nove anos acusa 911 milimetros de precipitacdo, sendo que as chuvas de inverno foram sempre muito mais fortes que as de verao. , TRANS CRICOES an As observacées em Pelotas indicam uma grande irregularidade: de 691 a 1330 milimetros. Em Cachoeira, em 1890, 1047 milimetros, em 1891, 1 463 milimetros; ¢, além disso, grande irregularidade na distribuicéo pelos meses do’ ano. ~ Em ‘1887, observou-se: mm. Barra do Rio Grande 886 Pelotas . 691 Bagé . 756 Cruz, Alta . 2 021 Cruz Alta fica em cinia da serra, j4 no meio do planalto, na altitude der 468 metros. Nesse ano predominaram as chuvas da primavera'e do verao. “"Tais irregularidades, diz Lindman, originam~se,provavelmente da situacdo do Rio Grande entre uma regiéo ao norte, com chivas estivais predominantes @ outra ao sul (Uruguai-Argentina) com chuvas hibérnais. Dentro da regio cam~: pestre as chuvas continuadas j4 aparecem as vézes em thaio, provocando gran-" des enchentes nos rios e inundando grandes extensbes das planicies. A diferenca de altitudes é bastante considerdvel entre a campanha e 6 pla- nalto, Na campanha a cota de 400 metros aparecé como raridade, apenas em algumas das elevaedes a sul'e a sudeste; pode-se dizer que todo o territério fica abaixo de 200 metros. No planalto, principalmente na metade oriental, as alti- tudes vaio de'500 a 1 000 metros; para oeste vai éle descaindo muito até a costa do rio Uruguai. “Entretanto essa difereri¢a de altitudes nfo basta para, produzir disseme- Thanea entre as respectivas vegetacoes, pelo menos em relacdo aos campos cuja vegetacdo por sua natureza & prépria para suportar as mudangas atmosféricas,. vento, luz, séea;-geada, ete., dentro de limites muito latos. A grande diferenca que possa existir entre 'o planalto e a campanha ‘provém da. situacéio de cada um €m relacdo as regidés circunvizinhas, tao profundamente diferenciadas. A cam- panha tem por tras de si as grandes plahicies. dos pampas e o planalto tem todo © planalto brasileiro com sua superficie acidentada e grandes matas que, como uma réde com grandes malhas, se estendem sdbre éle por.entre consideraveis ex- tensdes de campos.’ Déste territério o pknalto do Rio Grande é uma continua- go direta, manchado como é com grandes aglomerages de matas virgens (parte de drvores de fothas, parte de Araucdria), que na campanha sao representadas apenas por capées. Mas as formacées camipestres combinam com as da planicie, tanto pelo seu carater e fisionomia como pela esséncia de espécies comuns”. No planalto riograndense.encontram-se, como na baixa os campos paledceos. A macega (Erianthus) e a carqueja (Baccharis genistelloides. Pers.), em tou~ ceiras e moitas densas e altas, constituem entio os elementos mais conspicuos. Qs Andropogons @ as Compostas (Eupatoriuns, Vernénias, Asters), diz Lindman, so por tal forma preponderantes que, se todas as outras ervas e sub-arbustos féssem_eliminados,’as planicies conservariam ainda a sua fisionomia-e natureza. Perto de Cruz Alta (em mar¢o) os campos.estavam .cobertos por grupos de Com- . Postas em flor, ostentando diversas céres, como roxo, réseo, branco, amarelo, etc. Tais grupos eram formados de carguejas (Baccharis),’Pterocaulons, macela (Achyroeline) , Stevia, charruas (Eupatorium) . Algumas espécies dos dois tiltimos géneros (charruas e cambards) dio a cor geral a campos inteiros com os seus capitulos vermelhos, roxos e brancos. Algumas espalhavam a grande distancia perfumes de camomila, de baunilha, do zimbro, ete. Algumas macegas enchem ‘os campos com uma vegetacao cerrada, de um metro a metro e meio de altura, quase impenetravel. Outras gramineas, palhas brancas e santa-fé (Paspaluns 6° Panicuns) formam: também grupos compactos, enchendo as baixadas e lugares ‘fmidos, ou mesmo os brejos. Maior disseminacao tém os campos sub-arbustivos com a sta grande varie- dade de vegetacio. Em certos lugares h4 verdadeiras matas mintsculas de.car~ Guejas ¢ vassourgs (Baccharis) ;toutras de mirtaceas, abundando a guabiroba do campo (Campombnesia cyanea. Berg.);: outras de alecrim (Baccharis dracunculi- folia. D, C.), que & borda. das matas é um arbusto de dois a trés metros de altura, mas ali no campo nao excede de meio até um metro, Mesmo nesse tipo dos campos sub-atbustivos ainda aparecem as touceiras de macega, “entremeadas com as moitas de vassouras, que caracterizam os campos paledceos.

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