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SECRETARIA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO DA BAHIA

Jerônimo Rodrigues | Secretário


Marcius de Almeida Gomes | Coordenador Executivo de Programas e Projetos Estratégicos da Educação

FUNDAÇÃO TELEFÔNICA VIVO


Americo Mattar | Diretor-Presidente
Tiago Torres | Analista de Projetos Sociais

COLÉGIO ESTADUAL NORMA RIBEIRO – CENOR


Graça Novais | Diretora
Rosana de Carvalho Souza Andrade | Vice-Diretora
Marilene da Encarnação Leone | Coordenadora Pedagógica

AFETO EDUCAÇÃO COMUNICAÇÃO E JUVENTUDES


Carla Aragão e Daniela Silva | Gestoras
Aline Carvalho Nascimento | Facilitadora
Maria Aparecida Ferreira da Silveira | Facilitadora
Ricardo Penido | Facilitador

EDIÇÃO E REDAÇÃO
Patrícia H. Freitas

FOTO
Tatiany Carvalho
Aline Carvalho Nascimento

PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO


Casa Miúda / Bruna Lubambo

REVISÃO
Carla Aragão
Daniela Silva
Sumário
Empreender no CENOR para a vida! ........................................... 5
Afeto .............................................................................................. 6
Convite à Leitura .......................................................................... 8
Cap.1 | O meu lugar é o Arenoso .............................................. 9
Cap.2 | CENOR – uma história de luta…................................... 14
Cap.3 | Novas visões, amplas possibilidades .......................... 17
Cap.4 | Professores pensam grande ........................................ 34
Cap.5 | Sobre sonhos e realidade ............................................. 62
Cap.6 | Avançar é preciso .......................................................... 74
Cap.7 | O olhar com Afeto ......................................................... 79
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Empreender no CENOR para a vida!


As escolas têm percorrido caminhos mais desejáveis quando se apoiam na implementação de práticas
empreendedoras. O empreendedorismo, nesse caso, surge enquanto alternativa inovadora e atual, pois
permite a todos e todas pensarem nas inúmeras possibilidades de realização de sonhos, projetos e
transformações de vidas. Assim atua o Pense Grande no CENOR, oportunizando à escola ousar novos
modelos, a docentes inovarem e a estudantes empreenderem com suas ideias.
Nesse processo, o papel da Gestão do CENOR consiste não só em apoiar e acreditar em uma educação
empreendedora, mas em mobilizar meios que assegurem as ações planejadas em conjunto. As iniciativas de
2019 partiram de experiências e aprendizados iniciados em 2017 e continuados em 2018, que resultaram em
estudantes empreendendo suas ideias no mundo do trabalho. Essas assertivas possibilitaram a ampliação
do Programa em 2019, que envolveu também professores, além de estudantes. Tudo isso culminando nos
Demodays, nome do evento de apresentação dos projetos inovadores construídos ao longo das formações.
E não são apenas professores e estudantes os contemplados. Toda a comunidade tem sido beneficiada
com aprendizados, projetos e ações que ampliam o conceito de empreendedorismo aplicado à educação,
possibilitando a construção de Projetos de Vida relevantes e transformadores para as pessoas e para o
contexto do bairro do Arenoso.
Sem esquecer que a escola e a família são responsáveis pela formação do ser humano. Assim, a Escola,
enquanto instituição, deve educar os/as jovens para o seu desenvolvimento em sociedade e prepará-los/las
para o trabalho, e as famílias precisam compreender e valorizar a relevância desses aprendizados para o
sucesso na vida estudantil. O Pense Grande no CENOR, portanto, é uma parceria por uma educação conectada
às pessoas, à comunidade e à construção de uma sociedade mais justa, com oportunidades de transformação
positiva para todas e todos.

Equipe Gestora CENOR


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Pensar Grande
para transformar com Afeto!
Não se pode falar de educação sem amor. (Paulo Freire)

Quando a história do Pense Grande começou, em 2017, no Colégio Estadual Norma Ribeiro (CENOR),
a Afeto era um sonho de duas amigas que se conheceram no ensino médio e que viviam em uma
comunidade estigmatizada de Salvador, assim como o Arenoso, onde está localizado o CENOR.
Ambas fizemos da educação a mola propulsora para superação de um ciclo vicioso de problemas
socioeconômicos e de falta de acesso a direitos básicos que impediram nossas gerações passadas de,
por exemplo, ingressarem na universidade.
Transformamos nossas trajetórias e decidimos que trabalharíamos para impactar positivamente a
vida de outras pessoas. Em 2018, com uma equipe maior e já com a Afeto - Educação, Comunicação e
Juventudes fundada, construímos com a equipe do CENOR um trabalho que tem amadurecido a todas e
todos nós. No segundo semestre de 2019, novo desafio nos motivou: ampliar a formação para cerca de
180 professores de 25 escolas da rede estadual.Nesse percurso, a Afeto vem se constituindo como uma
empresa de consultoria que acredita na construção colaborativa de processos educacionais centrados nas
pessoas e em seus contextos. Pautada por metodologias de cocriação, promove uma educação dialógica
e uma comunicação educativa e propositiva, estimulando práticas democráticas, participativas, alinhadas
aos direitos humanos e conectadas com os desafios da contemporaneidade. Temos também uma linha de
atuação voltada às juventudes que prima pelo protagonismo de meninas e meninos. De forma empática e
afetuosa, construímos parcerias de trabalho porque nunca fazemos sós e prezamos pela implantação de
projetos, ações e programas que promovam o desenvolvimento humano.
Nosso propósito é Afetar, de forma positiva, as pessoas e as diferentes realidades, e nos permitir
ser também Afetadas, pois estamos certas da riqueza da aprendizagem mútua e contínua. Em
sintonia com o pensamento freiriano, acreditamos na educação feita com muito sentimento, porque
o amor move e remove o que é necessário para que as transformações que desejamos para o
mundo de fato se concretizem.
Nesse sentido, nosso propósito encontra sintonia com a parceria técnica que estabelecemos com a
Fundação Telefônica Vivo e a Secretaria de Educação do Estado da Bahia. O Programa Pense Grande nos
permite estar conectadas com os sonhos de estudantes que projetam para si, para suas famílias e suas
comunidades futuros melhores. Tal qual nós duas, amigas de três décadas, que conseguimos romper
barreiras que pareciam intransponíveis, esses meninos e meninas carregam a vontade e a potência de
Pensar Grande. E cabe a todos/as nós apoiá-los/as para que materializem seus sonhos.

Carla Aragão e Daniela Silva


Consultoras Afeto
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Convite à leitura
Nossa história se passa entre os anos de 2017 e 2019, no Arenoso, uma comunidade periférica de
Salvador, estigmatizada pela violência e pelo tráfico de drogas. O espaço é o Colégio Estadual Norma
Ribeiro – CENOR, e as personagens principais são professoras e professores dedicadas(os) e estudantes,
em sua maioria jovens negras e negros pobres, que lutam contra a discriminação racial, por uma
perspectiva de sair da invisibilidade social normalizada.
O enredo envolve os desafios que a comunidade escolar enfrenta para garantir um ensino médio integral de
qualidade: necessidade de inserção das alunas e alunos no mercado de trabalho, diminuição no número de
matrículas, evasão e pressões familiares. O núcleo da trama é a chegada do programa Pense Grande à escola
e as ações inovadoras que se seguiram: mentorias, oficinas, capacitações e melhorias no espaço físico, que
provocaram mudanças radicais nas práticas pedagógicas e nas relações interpessoais.
Nos próximos capítulos, vocês vão conhecer em detalhes onde e como se desenrolou essa jornada, quem
são as pessoas protagonistas, os momentos marcantes, os principais acontecimentos e seus impactos
na comunidade escolar. Esperamos que nosso percurso possa inspirar gestoras, gestores, professoras,
professores e estudantes, nos mais diferentes territórios brasileiros, a buscar soluções inovadoras
Convidamos todas e todos a conhecerem um pouco dessa história real.

O esforço de registrar e sistematizar a história do Pense Grande no CENOR parte da convicção de que conhecimento construído deve ser partilhado.
Agradecemos a todas as pessoas que se empenharam para garantir a publicação e a divulgação desse trabalho.
Cap.1

O meu lugar
é o Arenoso
O meu lugar é caminho de Jesus, Orixás,
Tem pagode pra gente sambar
Tem mandinga em cada andar...cada andar...

O meu lugar é cercado de luta e suor


Esperança num mundo melhor
E cerveja pra comemorar

O meu lugar tem um povo bonito e charmoso


Forte firme e bem corajoso
Arenoso!!

O meu lugar tem história do Norte ao Sul


Narandiba, Cabula, Beiru
Horizonte no Banco Central
(paródia da música O meu lugar, de Arlindo Cruz,
escrita pelos alunos do 1º ano do ensino médio, com o prof. Valney Santos)
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1
No Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, que mede o IDH (Índice de
Desenvolvimento Humano) no Brasil, o bairro está incluído na UDH (Unidade de Desenvolvimento
Quem caminha pelas ruas estreitas do Arenoso, Humano) do Arenoso-Beiru-Tancredo Neves-Engomadeira. Juntos, esses bairros ocupam uma área
de 2,47 km2, onde vivem 74.717 pessoas (Censo 2010). Isso significa que a densidade demográfica é
cheias de pedestres disputando espaço com de mais de 30 mil habitantes/km2, maior do que a das cidades mais populosas do mundo, como as
ônibus, carros, entregadores em motos, capitais da Índia (Nova Déli) ou da China (Pequim).
carrocinhas de frutas, sente no ar a alegria,
a simplicidade e a descontração que marcam
essa comunidade com elevada densidade
demográfica1, na periferia de Salvador (BA).
Cultura e arte são outras riquezas locais. Teatro,
dança, capoeira, música, grafite e artesanato
são manifestações mantidas por grupos como
Biblioteca Zeferina, Teatro Realidade, Reflexo
Periférico, Coletivo Tamo Juntx, entre outros.
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“Aqui é um sonho coletivo. Não trabalhamos isolados”, faz questão de


lembrar Diego Lima, ex-aluno do Colégio Estadual Norma Ribeiro (CENOR),
que fundou a Biblioteca Zeferina, com o objetivo de apresentar autoras e
autores negros para leitoras e leitores. Ele conta que a região do Arenoso
já foi território de quilombos e que ainda há descendentes de quilombolas
residindo ali. Quando esse passado histórico se tornou mais conhecido, as
pessoas passaram a acreditar na luta dos ancestrais por reconhecimento e
justiça social e valorizaram mais o seu local.

“Temos de dar continuidade a essa luta, que não


começou e nem vai terminar com a gente.”
Diego Lima

A luta, como em toda comunidade periférica, é pelo acesso aos direitos


básicos de cidadãos e cidadãs: trabalho e renda, moradia, alimentação
e saúde, educação e cultura, transporte. Simplesmente isso. Contudo os
desafios são grandes:
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Desafios
• Vencer o estigma da violência e do crime organizado.
• Fortalecer a articulação da rede de organizações locais.
• Diminuir os índices de gravidez na adolescência e DSTs.
• Melhorar a escolaridade e a qualificação profissional de adultos.
• Combater a violência doméstica contra crianças e adolescentes.
• Alternativas para o desemprego.
• Melhorar o saneamento básico e a limpeza urbana.
• Garantir serviços públicos de qualidade;
• Ampliar a oferta de transporte coletivo.

Os dados do Atlas do Desenvolvimento Humano para essa região do Arenoso (baseados


no Censo 2010) apontam que cerca de 20% da população maior de 18 anos estava
desocupada. Entre as pessoas ocupadas, a renda máxima era de 5 salários mínimos, sendo
que 21% ganhavam até um salário mínimo. 31% da população adulta estavam ocupados
em trabalhos informais e não tinham nem o ensino fundamental completo. Diante da crise
econômica dos últimos anos, o cenário atual não parece ter mudado muito.
Com relação à educação, considerando-se o total da população de 25 anos ou mais de
idade, 7,76% eram analfabetos(as), 53,65% tinham o ensino fundamental completo,
35,06% possuíam o ensino médio completo e apenas 2,03%, tinham o superior completo.
Diego Lima é um desses. Aos 29 anos, graduado em Psicologia, ele celebra o fato de
ter escapado do destino da maioria de seus colegas de colégio: a evasão escolar, a
informalidade ou a morte violenta e precoce.
Entre tantos desafios e potenciais, está o CENOR: uma escola inovadora com uma
equipe dedicada e interessada em ampliar as perspectivas para seus alunos e
alunas. Estão promovendo transformações que podem ser pequenas em escala,
mas cujos impactos positivos, principalmente no campo do simbólico, extrapolam
tempo e espaço. Imaginem o que representa para uma comunidade que só
aparece na mídia nas manchetes policiais ver espalhados pelo bairro cartazes
com as fotos de jovens que conquistaram uma vaga na universidade? Foi isso
que aconteceu no início de 2019, quando seis egressos do CENOR receberam suas
notas do Enem. Pode não parecer muito, mas é um número expressivo diante
dos anos anteriores e que tende a inspirar resultados ainda melhores no futuro.

O meu lugar é cercado de luta e suor,


esperança num mundo melhor...Arenoso!
Cap.2

O Cenor oferece, além do ensino médio noturno, o


ensino médio e o fundamental 2 (a partir do 7o ano),
em regime integral, com aulas nos turnos da manhã e
da tarde. Em 2019, teve 397 alunos matriculados, sendo

CENOR 231 no ensino médio e 166 no fundamental. O colégio


conta, atualmente, com 23 educadores e 4 gestoras.

uma história de luta


Lá por volta de 1985, é possível que a líder comunitária Norma Ribeiro
não planejasse quão longe poderia avançar a escola que ela lutou
para criar, junto com moradores e moradoras do Arenoso. Talvez não
imaginasse que, um dia, ela receberia o seu nome por escolha da própria
comunidade. Muitas histórias aconteceram desde o tempo das casinhas
simples, alugadas pela Associação Comunitária para abrigar as primeiras
turmas de ensino fundamental, até chegar ao prédio onde atualmente
funciona o Colégio Estadual Norma Ribeiro (CENOR), com 14 salas
confortáveis, biblioteca, estúdio multimídia, estúdio da rádio escolar,
sala do grêmio estudantil, horta, quadra, refeitório, equipamentos,
tecnologias digitais, incluindo WI-Fi para toda a comunidade escolar.
Não faltaram pedras no meio do caminho. Gestoras, professores,
professoras e estudantes, por muitos anos, reivindicaram reformas
nas instalações, que eram precárias. Enquanto isso, criavam com
o que tinham à mão, com a ajuda de um conselho gestor atuante,
formado por representantes de funcionários e funcionárias, gestoras,
professores e professoras, pais, alunos e alunas.

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A cada início de ano, docentes elaboravam projetos pedagógicos e reuniam a comunidade para
apresentá-los e deixá-los disponíveis para leitura e esclarecimento de dúvidas em relação às decisões
tomadas. Com essa prática, foram conquistando a confiança de pais, alunos e alunas em relação ao
processo de ensino-aprendizagem. A diretora Graça Novais também abriu as portas do CENOR para
as parcerias, o que, segundo ela, fez com que o Centro de Saúde, a Universidade Estadual da Bahia
(UNEB), a Associação Comunitária e outras organizações locais se sentissem à vontade para propor
atividades e projetos, potencializando as ações da escola.

Conhecimento e aprendizado não vêm somente de professor e aulas.


O trabalho se torna uma alegria quando você está junto de outras
pessoas. (Graça Novais)

Essa visão empreendedora da gestão refletiu-se em várias conquistas. Em 2013, foi o Selo de Gestão
O Programa Pense Grande tem Escolar. Alguns anos depois, veio o reconhecimento pelo Ministério da Educação (MEC) como uma das
como missão fomentar a cultura 178 escolas criativas e inovadoras do país. Isso aconteceu após o colégio ter aderido à modalidade
do empreendedorismo de impacto
social com o uso de tecnologia
de ensino em tempo integral, programa criado pela Secretaria da Educação do Estado da Bahia
para jovens das periferias (SEC). Com o ensino integral, foram introduzidas aulas abertas em espaços fora da escola, visitações
brasileiras, a partir de 15 anos. Seu programadas e participações dos alunos e alunas em olimpíadas, feiras de ciências, concursos
objetivo é incentivar as juventudes,
por meio de formações, apoio ao literários, assim como em conferências e eventos promovidos pela SEC.
indivíduo e seus negócios, para que
criem e implementem soluções e Devido a essa trajetória, em 2017 o CENOR foi indicado para participar do processo seletivo do
oportunidades para transformação programa Inova Escola, que promove inovação educativa, e foi realizado pela Fundação Telefônica Vivo
de suas vidas e das pessoas ao (FTV) em parceria com a SEC. Entre as 11 unidades escolares pré-selecionadas na Bahia, o colégio foi
seu redor, resolvendo problemas ou
necessidades de suas comunidades. escolhido para ser o primeiro de ensino médio a participar do programa no país. Junto com o Inova
Fonte: Fundação Telefônica/Vivo veio o programa Pense Grande, mobilizando professores, professoras, alunos e alunas, por meio de
oficinas de empreendedorismo e aprendizagens ativas, o que resultou em aulas mais dinâmicas e
interessantes.
Em 2019, a FTV concluiu o Inova Escola em todo o Brasil e o Pense Grande passou
a ser um programa mais amplo, englobando as ações do Inova e contemplando
estudantes, professores e professoras, gestores e gestoras. Assim sendo, daqui para
frente utilizaremos apenas o nome Pense Grande, embora as ações realizadas entre
2017 e 2018 tenham sido parte dos dois programas.
Outra conquista histórica alavancada pela parceria com a FTV foi a reforma física
da escola, realizada pela SEC e com apoio da Fundação, para montagem de alguns
ambientes de aprendizagem. “Achávamos que seria feita somente uma pintura, mas
ficamos emocionados quando vimos a quadra de esportes renovada, a biblioteca,
a sala multimídia, a sala do grêmio estudantil, além da cozinha reformada e do
refeitório novinho”, é o que conta Natan Santana, 20 anos, que ali estudou por mais
de oito, e hoje cursa Comunicação Social. A reforma refletiu-se na maior valorização
do espaço e na melhoria da autoestima das pessoas que ali trabalham e estudam.

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Cap.3

Novas visões,
amplas possibilidades
Pensar grande não é simplesmente uma tarefa, tampouco uma necessidade acadêmica. Mais do que
isso, é um direito de professores e professoras, gestores e gestoras, e estudantes da rede pública, porque
implica em liberdade e autonomia para tirar uma ideia do papel, em ampliação e manutenção de recursos e,
principalmente, no fortalecimento da comunidade escolar para encontrar soluções para seus desafios diários.
Fácil não é. Simples, também não. Pelo contrário, pensar grande exige pensamento complexo, aquele que
admite as incertezas; que inclui as opiniões contrárias, as divergências e conflitos; e que nos convida a
compreender a interdependência como capacidade de coexistir neste planeta em constante mudança.
Por tudo isso, foi desafiador o processo que envolveu a comunidade escolar do CENOR na busca por novas
maneiras de construir conhecimento. Para a Fundação Telefônica Vivo (FTV), a parceria com o CENOR inovou
duplamente: dentro do programa Inova Escola, que sempre teve como foco o ensino fundamental 1 e 2,
inaugurou uma experiência piloto com o Ensino Médio; já o Pense Grande foi realizado pela primeira vez em
uma escola de ensino regular, pois até então acontecia apenas em escolas técnicas. No total, três gestoras,
17 professores e professoras e cerca de cem estudantes participaram dessa experiência, que aconteceu em
três momentos: setembro a novembro de 2017; março a novembro de 2018; e março a novembro de 2019.
Nesse curto período, não é exagero considerar que os programas Inova Escola e Pense Grande transformaram
a escola. Em primeiro lugar, por impulsionarem abordagens inovadoras substanciais na gestão, nas práticas
pedagógicas, na ampliação do protagonismo juvenil e nas parcerias com a comunidade. Paralelamente, por
contribuírem para a concretização da tão sonhada reforma da estrutura física.

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A equipe técnica contratada pela FTV para realizar os dois programas


foi constituída por profissionais de comunicação e pedagogia, da
AFETO Educação Comunicação e Juventudes, que também organizou
oficinas pontuais e fez a articulação entre o colégio, a SEC e a
Fundação. As profissionais da AFETO fizeram um diagnóstico inicial
e, junto com a equipe do CENOR, planejaram e executaram as ações
necessárias para solucionar os problemas diagnosticados.
Em seguida, apresentaremos as realizações e os resultados
alcançados até este momento.

Antes de começar a traçar este percurso, é preciso


lembrar que nada acontece se as lideranças não
se envolverem com as mudanças. Como lembra a
diretora Graça Novais, “a janela precisa estar aberta”,
no sentido de que a gestão deve ter pensamento,
fala e ação positivas para os avanços e inovações na
educação. O gestor não pode ser a pessoa do “não”,
porque se a equipe gestora não abraçar as propostas,
o corpo docente não vai aderir, pois sentirá que existe
uma barreira. Este é o pensamento da equipe gestora
do CENOR, formada por Graça, a vice-diretora Rosana
Carvalho e a coordenadora pedagógica Marilene Leone.
Com essa confiança e abertura, gestoras, professoras, professores e estudantes começaram a se
engajar, no segundo semestre de 2017. Desde então, a equipe técnica da AFETO passou a frequentar
semanalmente a escola, para realizar mentorias com as gestoras; formações para educadoras e
educadores; e oficinas com estudantes, tendo como prioridade qualificar cada vez mais as oportunidades
ofertadas a jovens do Arenoso. Porque, afinal de contas, o que importa neste contexto de desigualdade e
exclusão social em que vivem as periferias urbanas, é despertar a potência da juventude para idealizar e
concretizar seus sonhos, apesar de tudo.
Como lembra a vice-diretora Rosana Carvalho, alunos e alunas de escolas públicas periféricas vêm de
uma realidade de pouco contato com o empreendedorismo, o qual já faz parte do universo de estudantes
de classe média, cujos pais têm um capital cultural e simbólico mais próximo dessa realidade, dessa
visão de mundo. Talvez por isso mesmo, como lembram vários teóricos da educação, as possibilidades de
mudança social estejam justamente no domínio e uso das tecnologias e das práticas empreendedoras por
parte de representantes dessas culturas desprivilegiadas. García Canclini2 chama isto de “reconversão”, ou
seja, o ato de apropriar-se dos bens culturais privilegiados em favor de seus próprios interesses.
Foi o que sucedeu com o ex-aluno do CENOR, Natan Santana. Até os 17 anos, ele observava a vida passar
sem grandes perspectivas, como a maioria de seus amigos e colegas, negros e pobres, moradores de uma
comunidade periférica, estigmatizada pela violência. Um diploma de ensino médio e um emprego com
carteira assinada no comércio era o melhor que sua mãe poderia sonhar para o filho. Depois de um ano
e meio de formação no Pense Grande, hoje, aos 20, ele está cursando Publicidade e já sonha com uma
pós-graduação em Marketing, além de ter sido um dos monitores voluntários do Programa, em 2019.

2 GARCÍA CANCLINI, N. Culturas Híbridas – Estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo: Edusp, 2008.
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Recuso
todos os NÃOS que me inventaram
para caber nas
expectativas.
(Mariana Paim, poeta)

O foco na formação de cidadãos críticos e que pensam “fora da caixa” é uma das principais características do
programa Pense Grande. O modelo tradicional de escola se tornou desinteressante e cada vez mais afastado da
realidade dos alunos e alunas. Por isso, é necessário incrementar práticas inovadoras no processo de ensino-
aprendizagem, que incluem aulas mais participativas, nas quais os alunos se sentem ouvidos e têm maior liberdade
para expor suas opiniões. “Nós, professores, temos de tirar da cabeça que o aluno de escola pública não pode, que é
mais limitado. Nós também temos de nos abrir para o novo”, reconhece a vice-diretora Rosana.
A reforma do ensino médio alinhada à Base Nacional Comum Curricular (BNCC) tornou o empreendedorismo um
dos quatro eixos estruturantes dos chamados itinerários formativos, que são divididos em diferentes áreas do
conhecimento e constituem uma carga curricular complementar à formação geral básica. Com isso, a formação em
empreendedorismo social, dentro do Pense Grande, tornou-se ainda mais indicada para educadores e educadoras.
Hugo Machado, professor de Física, encantou-se com a proposta de trabalhar com os alunos e alunas os seus projetos
de vida, atividade que é parte da formação em empreendedorismo social e com a qual as pessoas são estimuladas a
refletir sobre o que de fato as interessa e a estabelecer metas para suas vidas a curto, médio e longo prazos. “Quando
a jovem e o jovem passam a ter essa visão de longo prazo, percebem a importância de se preparar melhor hoje. É
nesse momento de motivação que nós temos a obrigação de oferecer os conteúdos que irão ajudá-la/o a se preparar”,
reflete o educador. Sua colega Géssica Seles, professora de Geografia, concorda que os projetos de vida são importantes
para que o aluno e a aluna vejam o que esses conhecimentos que estão aprendendo têm a ver com as suas práticas: “É
preciso que entendam que o estão fazendo na escola tem sentido e terá reflexos em suas vidas, ao longo do tempo.”
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Percurso

2017 2018 2019


25 estudantes 25 estudantes 25 estudantes
5 projetos de 5 projetos de 5 projetos de
empreendedorismo social empreendedorismo social empreendedorismo social

60 horas/oficinas 90 horas/oficinas 90 horas/oficinas

14 professores formados 14 professores formados 9 professores formados

17 práticas pedagógicas 9 práticas pedagógicas

70 horas de mentorias 70 horas de mentorias


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Formações
Professores
• Como empreender sua aula: Essa formação teve o propósito de desafiar os professores
O Demoday é um dia de
apresentações dos projetos para a refletir sobre as metodologias que vinham utilizando e apresentar-lhes ferramentas
uma banca examinadora, formada para trabalhar a cultura empreendedora em sala de aula. Aqueles que se interessaram,
por jurados convidados, que atuam
em outras organizações. Toda a
desenvolveram projetos para trabalhar com alunos utilizando uma metodologia nova, uma
comunidade escolar é convidada a ferramenta ou tecnologia que aprenderam no Pense Grande. Em cada ano, os projetos e seus
participar do evento. resultados foram apresentados no Demoday.
• Aprendizagens ativas: Formação para os professores visando capacitá-los para utilizar
games, ferramentas de robótica, tecnologias digitais, pensamento computacional e recursos da
educomunicação para tornar suas aulas mais criativas e interessantes.
• Rádio: Formação em técnicas de apresentação, criação de textos e edição, para os professores
que se interessaram em se capacitar junto com os estudantes do Pense Grande.

Estudantes
• Empreendedorismo social: formação voltada para o estudante identificar seus propósitos,
aquilo que o faz feliz, construindo um projeto de vida que permita que ele ganhe autonomia e,
ao mesmo tempo, contribua para melhorar o seu entorno ou a sua comunidade.
• Comunicação para o desenvolvimento: capacitar o jovem para pensar criticamente, se
expressar com mais facilidade e usar a tecnologia a seu favor.
• Cultura digital: oficina que apresentou ao jovem as possibilidades de uso e de criação de
aplicativos, sites, blogs, além de comunicação audiovisual, fotografia e vídeo.
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• Rádio: Capacitação para o uso da linguagem do rádio na criação de programas de
informação, criação de textos, edição, uso de equipamentos e recursos tecnológicos.
• Mobilização Social: formação para criação e gestão do grêmio estudantil.
• Dia do Código 2018: Como parte do Pense Grande, formação oferecida pelo Programaê Brasil,
com intuito de ensinar fundamentos básicos de computação para os estudantes desenvolverem
aplicativos e games.
• Educomunicação: oficina que apresentou experiências do programa Educom Nas Ondas do
Rádio e Imprensa Jovem, desenvolvido em São Paulo.

Mentorias
• Grêmio estudantil: a diretoria eleita do Grêmio Estudantil participou de mentorias, onde
pode resolver dúvidas e problemas reais que faziam parte da gestão.
• Coordenação pedagógica: Mentorias com a coordenadora pedagógica Marilene Leone,
que assumia uma função inexistente na escola, até então. Contribuíram para que ela
compreendesse e delimitasse seu papel dentro da gestão, organizasse suas rotinas junto aos
professores e registrasse tudo.
• Gestão: A vice-diretora Rosana Carvalho foi apoiada na redefinição de suas funções e no seu
preparo para assumir as funções da vice-direção.
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Projetos realizados

2017
• Cine-Debate: Apresentação de filmes de temas relevantes, como o racismo, seguida de discussão
do filme entre os estudantes. O projeto foi idealizado pela turma do Pense Grande 2017 e
continua sendo realizado.
• Grêmio Estudantil: A ideia de criar uma instância de participação dos jovens dentro da escola,
surgiu na primeira versão do Pense Grande, em 2017. Em 2018, o grêmio foi criado, além
de um aplicativo que permite o acesso a informações sobre as atividades propostas, sobre
as chapas concorrentes às eleições e outras iniciativas. Atualmente, é a instância de maior
representatividade dos estudantes no CENOR.
• Merenda escolar saudável: Por iniciativa de um grupo de estudantes, foi criado um mural
para tornar visível o cardápio da semana na escola, além de espaços para opinião e debate sobre
alimentação saudável, o que não havia na escola.
• Show de Talentos: O evento foi proposto por uma equipe de estudantes para apresentar e
valorizar os talentos locais, mobilizando toda a comunidade escolar.
• Quadra esportiva democrática: Um grupo de meninas propôs uma discussão de gênero e
esporte, de onde veio o debate sobre o uso democrático do espaço da quadra de esportes. Como
resultado, foi criado um placar para planejar e divulgar as atividades esportivas que acontecem
na escola, as práticas pedagógicas de esporte foram revistas para garantir maior equidade de
uso, por gênero e faixa etária. Esse movimento gerou a necessidade de novas formações para
professores e estudantes, que contaram com a parceria do Instituto Fazer Acontecer .
• Rádio CENOR: Após a capacitação de alunos e professores, foi criado um estúdio de rádio e ela
foi inaugurada em 2019, com programas diários realizados pelas turmas do 8o e 9o ano e dos
três anos do ensino médio, com o apoio de quatro professores.
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2018
• Festival Beleza Negra: Desfile de moda afro, em que as modelos eram jovens do Programa, que
apresentaram cartazes temáticos.
• Agência Comunicativa: Agência de Comunicação cujos produtos são os materiais de divulgação
das demais equipes do Pense Grande.
• Bazar Amar É: Bazer de roupas e acessórios usados.
• Cantinho dos sonhos: caixotes de livros espalhados pela comunidade do Arenoso para estimular
a leitura.

2019
Os projetos serão apresentados detalhadamente no capítulo 5.

Reformas físicas e melhorias

2017/2018 (realização da Secretaria de Educação do Estado da Bahia)


• Construção de refeitório;
• Reforma da cozinha;
• Renovação da quadra de esportes;
• Pintura e grafitagem dos muros internos e externos;
• Reforma da sala da biblioteca, com mobiliário e acervo novos;
• Horta escolar.
27 2018 (realização da Fundação Telefônica Vivo)

• Montagem de sala de tecnologias, estúdio de rádio e sala do grêmio;


• Doação de equipamentos;

2019 (realização da Fundação Telefônica Vivo)

• Instalação de rede wi-fi em toda a escola


• Dia dos Voluntários Telefônica 2019: melhorias e reparos nos pontos de rede e instalação de
computadores; revitalização da biblioteca, do grêmio estudantil e da horta, com atividades de
pintura, limpeza e replantio; grafitagem na sala de vídeo e na de tecnologias; pintura de portas,
móveis, grades, paredes das salas dos professores, coordenação, diretoria e vice-diretoria.
• melhorias e reparos nos pontos de rede

Eventos

2017
• Demoday estudantes

2018
• Lançamento dos programas Pense Grande e Inova Escola no CENOR.
• Reunião de parceiros do colégio, para apresentação dos projetos de cada um.
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• Encontro com a comunidade do Arenoso, para apresentar o projeto pedagógico, o espaço físico
renovado e discutir a abertura da escola para atividades comunitárias nos finais de semana.
• Visita técnica ao estúdio da rádio Educadora e à TVE Bahia.
• Conferência sobre o Meio Ambiente: reunião com comunidade escolar e parceiros do colégio
para discutir soluções para o lixão que ocupava a praça em frente ao colégio.
• Educação 360 Jovem Tech: participação de estudantes e uma gestora do CENOR no evento
realizado no Rio de Janeiro.
• Participação de alunos/as do Pense Grande na Mostra de Inovações, durante o lançamento do
programa Virtual Educa, da SEC.
• Lançamento do game do Grêmio Estudantil, assembléia, debate e eleições para o Grêmio.
• Seminário de Inovação Educativa promovido pela FTV, em São Paulo: participação de uma
estudante e da coordenadora pedagógica do CENOR.
• Roda de Conversa Juventudes Conectadas, em São Paulo: participação de um estudante do
ensino médio.
• Visita técnica da vice-diretora Rosana Carvalho em duas escolas técnicas paulistas, para trocar
experiências sobre o Pense Grande.

2019
• Demoday Professores/as
• Demoday Estudantes
• Dia do voluntariado 2019: Realizado com apoio da Fundação Telefônica/Vivo, mobilizou cerca
de 200 voluntários que realizaram ações para melhorar as instalações físicas do CENOR.
O desafio de inovar
Com a chegada dos novos equipamentos – notebooks, tablets, projetor multimídia, câmera fotográfica
profissional, microfones, mesa de som – e de um estúdio de rádio novinho e um estúdio multimídia,
o desafio dos professores e professoras do CENOR passou a ser o desenvolvimento de projetos e
trabalhos integrados a essa realidade, mobilizando o aluno e a aluna a interagir criticamente com o
mundo digital e promovendo sentidos, para que as tecnologias não se tornem o fim, mas o meio. Não
há dúvidas que elas deixaram os/as estudantes mais interessados/as, na opinião do professor André
Freitas, que mudou a metodologia de suas aulas e passou a integrar câmeras, vídeos e notebooks.
“Também estou trazendo mais práticas relacionadas ao cotidiano deles/as para serem estudadas em
sala de aula”, explicou o professor, que ficou mais animado com a disponibilidade desses recursos.
Considerar a realidade dos alunos e alunas ao unir empreendedorismo e tecnologia é o conselho
do professor de História, Valney Santos. Ele lembra que as metodologias ativas trazidas pelo Pense
Grande ajudaram a fazer com que os/as estudantes, que muitas vezes conhecem mais de tecnologias
do que os professores e professoras, fossem parceiros/as na construção coletiva de um produto
transformador: “A gente transformou a sala de aula em um ambiente inovador e toda a escola
mudou, a partir daí.”
Mas a equipe docente do CENOR também tem consciência de que a inovação vai além do uso de
computadores e outras ferramentas tecnológicas. Inovar implica ter coragem de modificar a estrutura
de aula tradicional. Um bom exemplo foi a transformação pela qual passaram as aulas da professora
de Educação Física, Bárbara Villas Boas, que participou de quatro formações do Pense Grande, que,
segundo ela, a fizeram querer arriscar mais e sair da zona de conforto, “pensar fora da caixinha”.
Bárbara já fez vários projetos inovadores com seus alunos e alunas, desde 2017. Alguns exemplos são
uma coreografia a respeito da temática do bullying e seus efeitos danosos na vida das pessoas; uma
pesquisa sobre as pessoas que fazem a diferença na comunidade, apresentada na 1a Feira Literária
(FLICENOR); um levantamento das histórias das mulheres vitoriosas no esporte, culminando com
30
a palestra sobre o tema da superação, com a atleta paraolímpica de natação Verônica
Almeida; um trabalho sobre o racismo no esporte que levou ao CENOR jogadores de
futebol negros para falarem de suas experiências. Tudo isso é sempre bem registrado
e documentado em seu exemplar Diário de Bordo, que é uma ferramenta trazida pelo
Pense Grande para guardar a memória do projeto, incluindo o passo a passo de tudo
que as professoras e os professores fizeram para realizá-los.
A metodologia de projetos não era novidade para a equipe docente do CENOR. No
entanto, havia dificuldades para realizá-los de maneira eficiente, com um cronograma
e as etapas organizadas e monitoradas. A formação teórico-prática para isso foi uma
das contribuições oferecidas. Antes não havia coordenação pedagógica no colégio e nem
a prática de professores/as planejarem em conjunto. A partir da necessidade detectada
no diagnóstico inicial, Marilene Leone assumiu a coordenação pedagógica e recebeu a
mentoria da especialista Cida Ferreira. Marilene lembra que a equipe trabalhava com
muito afeto, o que é importante, mas faltava estruturação e fundamentação; nesse
sentido, a troca com os consultores auxiliou: “Com as oficinas, tivemos a oportunidade
de olhar para dentro, para a nossa função e o nosso papel na escola.”
Cida trabalhou com a resolução dos problemas relacionados aos projetos, por meio da
tematização da prática, que significa: planejar conjuntamente as ações, cada profissional
realizar o que foi planejado, registrar o que ocorreu e depois retornar com o resultado, que
é discutido e analisado pelo grupo. “Nesse processo, aos poucos, foi criada uma liga entre
as pessoas, que perceberam que não se tratava de um problema individual”, explicou a
facilitadora. Os impactos foram confirmados pelos professores e professoras:

“Essa interação se refletiu em nossas práticas,


ampliou horizontes e criou novas possibilidades
de ensino-aprendizagem.”
Géssica Seles (Geografia).
31

“Nossos vínculos se fortaleceram e


aumentou a troca de experiências.”
Joselene Leite (Educação Artística)

“Melhorou o relacionamento entre a equipe.”


Lindinalva Bonfim (Língua Portuguesa)

“Elevou o grau de compromisso de todos nós.”


Hugo Machado (Física)

Os projetos realizados ao longo do ano letivo são sempre apresentados pelos professores
e professoras no segundo semestre, no evento de encerramento chamado Demoday.
Os projetos realizados em 2018 estão registrados e disponíveis no site da Fundação
Telefônica Vivo, na publicação Experiências Pedagógicas – Relatos de Professores do Colégio
Estadual Norma Ribeiro. Os que foram desenvolvidos em 2019 serão apresentados a
seguir, no capítulo 4.
Vários professores e professoras tiveram oportunidade de participar de eventos e
conhecer escolas que participam do Pense Grande em outros Estados brasileiros. A
coordenadora Marilene esteve por duas vezes em São Paulo, no Inovação Educativa e
no Encontro Inova Escola. A vice-diretora Rosana participou de um encontro do Pense
Grande em São Paulo e do Educação 360, no Rio de Janeiro. A diretora Graça esteve em
três encontros do Inova Escola em São Paulo e um no Rio Grande do Sul. A professora
Bárbara também esteve no Educação 360, no Rio de Janeiro, enquanto a professora
Edlene Sousa foi a um encontro do Inova Escola, em São Paulo. Todas voltaram
inspiradas pela riqueza das trocas de experiências.
Para sair da bolha
Natan Santana conta que o Pense Grande lhe possibilitou fazer duas viagens para São Paulo, para
discutir educação, empoderamento e participação social. “Eu nunca tive essa visão ampla de como era
a educação em outros Estados. Quanto vi como era a realidade deles, foi como sair de uma bolha”,
explicou o jovem, que estudou no CENOR durante mais de oito anos e se lembra que, antigamente,
os professores não o estimulavam a entrar na universidade. “Aí chegaram as facilitadoras do Pense
Grande e as professoras Amilca, Margarete, Bárbara e Rosana, que nos acolheram e incentivaram,
disseram que éramos capazes.” O resultado é que um terço da turma de 2018 passou na
universidade, o maior número já registrado na história do colégio.
Ele não foi o único que teve a oportunidade de viajar para fora do Estado. Luã dos Santos Silva, 18
anos, aluno do 3o ano do ensino médio em 2019, já se tornou um “embaixador” do Pense Grande
fora do CENOR. Ele tem sido convidado pela Secretaria da Educação do Estado da Bahia para
apresentar diversos eventos da instituição e já foi duas vezes para o Rio de Janeiro, a convite da
FTV, para participar do encontro internacional Educação 360, uma delas junto com a colega Tamires
Moreira, 17 anos, onde debateu as perspectivas da educação no Brasil no painel “O que os jovens
querem ensinar aos mestres?”.
33

A jovem Alessandra Santana também teve oportunidade de viajar para São Paulo, onde participou do
encontro do Inova Escola.Além das viagens e participações em eventos externos, outra experiência de
empoderamento aconteceu dentro do próprio colégio. A partir de um projeto da primeira turma do
Pense Grande, em 2017, foi criado o Grêmio Estudantil, uma conquista histórica, pois em 34 anos de
existência o CENOR nunca teve um grêmio. A experiência adquirida nesse processo fez com que os/
as jovens se qualificassem para participar em diversas instâncias de tomada de decisão, criando até
algumas tensões, no início, como quando demandaram participar da escolha do cardápio da merenda.

A atuação protagonista de estudantes como Luã, Natan, Maurício Mateus e Adriele Gomes fez com
que se tornassem co-facilitadores/as da turma do Pense Grande de 2019. Esta foi uma inovação do
Programa na Bahia. Daniela Silva, uma das coordenadoras da AFETO, avalia que a experiência teve
ótimos resultados. “Além de permitir que continuem em contato com a formação, mesmo depois
de saírem do colégio, a iniciativa dá aos atuais alunos e alunas a oportunidade de ver exemplos
inspiradores, que são próximos da realidade deles/as.

Natan ainda é minoria entre jovens da comunidade, mas já se tornou uma referência positiva para
quem está cursando o ensino médio. Se ele conseguiu, outros/as também podem sonhar com um
futuro universitário. Adriele está empreendendo individualmente na área de estética e sonha montar
um salão no Arenoso, especializado na beleza da mulher negra. Enquanto isso, Luã e Maurício Mateus
são reconhecidos por toda a comunidade escolar como exemplo de empreendedores bem sucedidos.
34

jobs: o poder de
uma história inspiradora
A Jobs Comunicação Audiovisual foi criada no final de 2018 por dois jovens do Arenoso
que aprenderam a pensar grande. Reuniram seus talentos para o desenho e a cultura
digital e decidiram empreender, trabalhando com produção de audiovisuais, decoração de
festas e design de peças gráficas. Luã dos Santos Silva e Maurício Mateus tinham apenas
17 anos, mas se inspiraram nos exemplos de outros/as jovens negros/as de periferias
urbanas, apresentados a eles pelas facilitadoras do Pense Grande. “Eles nos deram
segurança de que também poderíamos ser empresários; e a metodologia do Programa
ensinou que é possível empreender com as coisas que estavam ao nosso alcance, que não
precisávamos esperar por grandes eventos para buscar soluções para nossos problemas”,
justifica Maurício.
Entre os trabalhos realizados pela Jobs, eles destacam aqueles que atendem as
pessoas do bairro que não têm condições de pagar caro por este tipo de produto ou serviço:
um vídeo de apresentação de um rapaz que é jogador de futebol e precisava mostrar seu
talento para alguns times; e uma exposição fotográfica para valorizar a beleza negra de
alunas e alunos do CENOR, com fotos deles em pôsteres. Os professores do colégio e a
equipe da Afeto Educação Comunicação e Juventudes já são seus clientes regulares e, ao
recomendá-los para seus contatos, contribuem para aumentar o networking da Jobs.
PROJETO PROFESSORES
Cap.4
PROFESSORES
PENSAM GRANDE
Como diz o poeta Antonio Cícero em seu poema “Guardar”: guardar uma coisa não é
escondê-la ou trancá-la. (...) Por isso, melhor se guarda o vôo de um pássaro, do que um
pássaro sem vôos. (...) Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica.
Por isso, educadores que pensam grande escrevem, organizam e compartilham os
conhecimentos construídos para inspirar outros vôos pelo mundo afora. Nas próximas
páginas, professoras e professores do Cenor contam um pouco de suas trajetórias e
explicam como desenvolveram seus projetos em 2019, em conjunto com estudantes,
respeitando suas opiniões e reconhecendo seus potenciais e limites, naquele momento.
PROJETO PROFESSORES
36

Amilca Maria
de Lima Fernandes | Língua Portuguesa
Amilca é dessas professoras dedicadas de corpo e alma à profissão, que
em quatro anos de trabalho no CENOR ganhou o respeito de seus alunos,
por quem é capaz de fazer sacrifícios como passar um ano dando aulas
voluntariamente aos sábados, para prepará-los para o Enem.
Nasceu no interior da Bahia e começou a trabalhar muito cedo, porque
a família era grande. Sempre gostou de ler e estudar. Terminou a
graduação em Letras com uma filha bebê no colo; ao longo do tempo,
fez quatro especializações e já tinha mais de 60 anos quando concluiu,
com muito orgulho, o mestrado em Estudos de Linguagens, pela Uneb.
No Ensino Público, ingressou em 1991 e não se aposentou ainda porque
considera a profissão empolgante. “Acho que é hereditário: meu pai era
professor da rede pública e, dos seus oito filhos, cinco são professores. “No Arenoso, tem muitas pérolas
Aprendi a amar a literatura com minha avó analfabeta, que sempre me
contava histórias”, relata Amilca. e é preciso saber cultivá-las.
Um amor que ela cultivou e passa para a frente. No projeto que A gente não vai modificar a
realizou dentro do programa Pense Grande 2019, ela criou roteiros de sociedade com arma na mão.
leitura para os clássicos da literatura. Somente com Educação.”
PROJETO PROFESSORES

Formando Leitores
Conscientes

>> OBJETIVOS:
Incentivar o aluno a usar a Língua Portuguesa como meio de comunicação e libertação.
Despertar leitores críticos; Exercitar a leitura do mundo.

>> COMO FAZER:


1) Contextualizar os clássicos do século XIX e comparar com as questões que são enfrentadas pela
sociedade.
2) Criar roteiros de leitura para clássicos como, por exemplo:
Dom Casmurro – Machado de Assis | Tema transversal: machismo, feminismo, poder de fala
O mulato – Aluísio Azevedo | Tema transversal: Racismo
O Cortiço – Aluísio Azevedo | Tema transversal: desigualdade social
3) Provocar a reflexão dos alunos com questões problematizadoras.
4) Sugestões de músicas: Racismo é burrice (Gabriel, O Pensador); Negro é lindo (Jorge Benjor); Sou
negro (Toni Tornado), Identidade (Jorge Aragão); Lavagem cerebral (Gabriel, O Pensador).
5) Os alunos produzem textos e elaboram sínteses críticas, com independência de ideias. Para
apresentação, podem criar paródias de programas de TV: telejornais, programas de calouros,
programas de auditório, coreografias, poesias, peças teatrais adaptadas, paródias ou paráfrases
de músicas, painéis, jogral, teatro de marionetes, vídeos, fotografias, programa de entrevistas.

37
PROJETO PROFESSORES

COM QUEM:
Alunos de Língua Portuguesa do 9º A, 9º B, 1º e 2º ano do Ensino Médio

ONDE E QUANDO:
Cenor. Durante a segunda unidade de 2019.

RECURSOS NECESSÁRIOS:
Smartfone, máquina filmadora, datashow, computador, caixa de som, microfone,
TV, violão, percussão, vestuários, cenário, vestuário, maquiagem, trilha sonora.

DESAFIOS:
Despertar nos estudantes o gosto, a beleza e a importância da leitura de autores
clássicos como Machado de Assis, José de Alencar e Aluisio Azevedo. Conseguir a
adesão espontânea dos estudantes ao projeto.

DICAS:
Não tornar o projeto obrigatório. Pode começar com poucos interessados e, à
medida que os primeiros resultados são mostrados, ir aumentando o grupo.
PROJETO PROFESSORES
39

André Luis
Silva Freitas | Química e Matemática
Ser filho de pais pobres e iletrados – um jovem garimpeiro que se
encantou por uma quilombola de Catinga do Moura, distrito de
Jacobina (BA), que trabalhava como empregada doméstica em casas
da elite branca – levou André a buscar na educação a possibilidade
de quebrar o ciclo de pobreza que sempre marcou seus antepassados.
Mas só conseguiu concluir os estudos e se formar na universidade
de Química quando já era técnico no Pólo Petroquímico de Camaçari.
“Tinha paixão pelos livros, talvez porque eu não tivesse condições
para tê-los”, conta o professor, que estudava com livros emprestados
e ia muito à biblioteca, desde a adolescência.
Hoje, com 17 anos em docência de Química e Matemática no ensino
médio do CENOR, ele entende bem a realidade de seus alunos, a
maioria vinda de famílias tão pobres quanto a sua já foi. “É uma luta
diária mostrar para eles a importância da educação para conseguir
meios de viver bem”, explica.
A noção de sustentabilidade associada à visão empreendedora, levou
o professor André a desenvolver, com seus alunos, um projeto para
“A minha missão é
o reaproveitamento dos resíduos orgânicos de suas casas, gerando, fazer com que eles se
assim, a possibilidade de comercialização de adubo e terra vegetal. desenvolvam como cidadãos.”
Meio Ambiente
Sustentável

>> OBJETIVOS:
• Conscientizar a comunidade escolar sobre a importância da manutenção do meio ambiente.
• Repensar, reduzir, reutilizar, reciclar o lixo orgânico e inorgânico.
• Transformar lixo orgânico em adubo, terra vegetal.
• Produzir adubo orgânico, terra vegetal, irrigadores para horta e artefatos para venda ou reutilização.

>> COMO FAZER:


1) Apresentação de imagens de lixão e lixo caseiro para provocar discussão, socializando conhecimentos prévios dos estudantes e
promovendo a reflexão sobre as questões sociais e ambientais que envolvem o lixo.
2) Pesquisa orientada, por meio da qual os estudantes buscaram, pela internet, informações sobre as diferentes formas de
disposição e tratamento do lixo, bem como sobre os impactos ambientais.
3) Os alunos, divididos em equipes, fizeram a leitura, discussão e socialização de textos, assistiram vídeos, leram reportagens,
artigos e sites educativos.
4) Roda de conversa com todas equipes. O orientador fez questionamentos para fundamentá-los no momento da culminância do
projeto. Tópicos trabalhados: 1) Reciclagem de lixo inorgânico plástico e sua transformação em reutilizados; 2) Reciclagem do
lixo orgânico caseiro ou de aterro lixão com objetivo de produção de adubo orgânico natural N,P,K; 3) Reciclagem de vegetais,
restos, cascas para produção de terra vegetal.
5) Seleção, separação e acúmulo do material orgânico (casca de banana, café usado, casca de ovo e casca de tangerina, que liberam,
durante a sua degradação com microorganismos, os minerais K – Potássio, P – Fósforo; N – nitrogênio; Ca- cálcio e Mg – magnésio.
6) Em sala de aula, foi feita a preparação do adubo; sua aplicação foi testada na horta do CENOR e em outras plantas do jardim
externo.
7) Construção de artefatos de plásticos reutilizados, para conter os produtos.
40
PROJETO PROFESSORES

COM QUEM:
Alunos do 7o ano B

ONDE E QUANDO:
CENOR - Colégio Estadual Norma Ribeiro. Julho e agosto/2019

RECURSOS NECESSÁRIOS:
Resíduos de alimentos, caixotes, garrafas de plástico descartadas.

DESAFIOS:
Ampliação do projeto em 2020.
PROJETO PROFESSORES
42

Bárbara
Vilas Boas | Educação Física
Para quem nunca pensou em seguir a carreira docente, Bárbara
se revelou uma ótima educadora. Graduou-se em Educação Física,
trabalhou por algum tempo em academias, mas depois optou por
fazer concurso público. Foi assim que chegou ao CENOR, há 19 anos.
Fez uma pós-graduação em Psicopedagogia Clínica e Institucional,
participa do Pense Grande desde 2017 e hoje se sente realizada como
professora. Todas as manhãs é uma das primeiras a chegar na escola
e se esforça para oferecer aos alunos a mesma qualidade de ensino
de uma escola privada.
“Muitos estudantes das comunidades periféricas enfrentam uma fama
que não merecem, são desacreditados pela sociedade, o que os torna
inseguros”, reflete Bárbara. Para ela, o papel dos professores é fazer
com que eles acreditem que são capazes de se desenvolver na vida, a
despeito das condições materiais desfavoráveis.
Em 2019, Bárbara enfrentou outro desafio dentro do Pense Grande:
em parceria com outros três professores (André, Linda e Valney),
colocar no ar a Rádio que havia sido montada no CENOR em
2018, com recursos da Fundação Telefônica Vivo. “A Rádio é uma
ferramenta pedagógica que vai propiciar a construção de diversos “A gente tem de acreditar que a
saberes, vai desenvolver competências e habilidades dos estudantes, educação é transformadora e tem de
além de empoderá-los”, garante. oferecer o melhor para os alunos.”
Rádio Escolar

>> OBJETIVOS:
• Dar continuidade e ampliar o uso da rádio escolar, inserindo-o no contexto
pedagógico do CENOR, a partir de uma produção colaborativa.
• Incentivar o protagonismo juvenil, através de produções de conteúdos, onde os alunos
poderão planejar, desenvolver e executar uma programação de rádio.
• Estimular nos estudantes a criatividade e o desejo de aprender.
• Empoderamento dos estudantes.
• Divulgar as produções dos estudantes utilizando a rádio como ferramenta.

>> COMO FAZER:


1) Aula teórica sobre a história da Rádio no Brasil e no mundo.
2) Pesquisa sobre as características de um programa de Rádio, como Gêneros
(informativo, publicidade, propaganda e gêneros narrativos-novelas) e formatos
(entrevista, reportagem, nota e boletim).
3) Criação de logomarca para a Rádio escolar, com slogan, estilo musical e público alvo.
4) Reuniões para determinar as equipes que serão capacitadas e escolha dos temas
abordados nos programas da Rádio escolar.
5) Capacitação dada por uma profissional de Rádio (Educadora), para professores e alunos.
6) Aulas práticas sobre o uso dos equipamentos da rádio dada pelos alunos do Grêmio do
CENOR, aos alunos envolvidos nesse processo.
43
PROJETO PROFESSORES

COM QUEM:
Alunos do 8º e 9º anos do Fundamental, e 1º ano e 2º anos do E.M.

ONDE E QUANDO:
CENOR. De abril a dezembro de 2019.

RECURSOS NECESSÁRIOS:
Equipamentos da Rádio do CENOR (Playmusic) | Notebooks | Celular
Internet | Capacitação em Rádio por uma profissional de jornalismo.

DESAFIOS:
Fazer com que a Rádio Playmusic torne-se um equipamento pedagógico
do CENOR e proporcione desenvolvimento educacional através da
educomunicação.

RESULTADOS PARCIAIS:
• Eleição para a escolha do nome da Rádio escolar, onde o nome escolhido foi
Rádio Playmusic.
• Aulas práticas sobre o uso dos equipamentos da rádio dada pelos alunos do
Grêmio do CENOR, aos alunos envolvidos nesse processo.
• Programas musicais: cada turma ficou responsável pela produção e
veiculação de conteúdos para um dia da semana.
PROJETO PROFESSORES
45

Géssica
Santos Seles | Educação Científica e Geografia
Ela é a única pessoa da família que ingressou na universidade. E
não se contentou apenas com o título de bacharel em Letras (Uneb).
Fez mestrado em Relações Étnicas (Uesb) e pretende seguir para
o doutorado. Tudo por influência de seus professores. Escolheu
esta profissão, pela qual se diz apaixonada, por ser esta a melhor
alternativa para transformar a sua realidade.
A professora Géssica está no CENOR há apenas um ano e meio, mas
já é muito respeitada e querida por seus alunos, com os quais se
identifica, por ter vindo de um contexto muito semelhante. “Na minha
adolescência, eu nem fazia ideia do que era uma pós-graduação.
Hoje, graças à informação que meu irmão de 13 anos recebe em
todas as mídias e ao exemplo que ele tem dentro de casa, já fala que
vai estudar até o doutorado”, ela ressalta.
Ela acredita na educação como um instrumento de poder e pensa que “O jovem periférico que entra na
o desafio dos professores é estimular os estudantes a aproveitarem
esta oportunidade única. Com seu projeto do Pense Grande voltado universidade tem acesso a um
para a segurança alimentar, Géssica pretendeu modificar as práticas conhecimento que pode abrir portas
de higiene dos alunos e seus familiares. para ele e ampliar as perspectivas
para todo o seu círculo familiar.”
Segurança Alimentar

>> OBJETIVOS:
Promover uma campanha de conscientização para melhoria das práticas de higiene
com alimentos.

>> COMO FAZER:


1) Escolha do tema;
2) Aulas direcionadas sobre o assunto:
3) Elaboração de questionário online.
4) Teste do questionário e depois envio do mesmo.
5) Alunos realizaram roteiros das entrevistas e, posteriormente, os grupos fizeram
entrevistas com profissionais da saúde e feirantes.
6) Alunos organizaram os dados coletados (entrevistas, fotos, vídeo etc.).
7) Após a organização dos dados, as informações foram discutidas e serviram como
base para a o material da campanha, que foi feito pelos alunos.
8) Panfletagem antes do almoço, no refeitório.
9) Apresentação de vídeo sobre como lavar as mãos corretamente.

46
PROJETO PROFESSORES

COM QUEM
Alunos do 7o ano A

ONDE
No CENOR e comunidade do Arenoso.

QUANDO
De junho a agosto/2019.

RECURSOS NECESSÁRIOS
• papel ofício para folder e roteiros.
• máquina fotográfica, celular e tablet, para registros orais e de imagens.
• data show para slides e vídeos.
PROJETO PROFESSORES
48

Hugo Machado
Silva Filho | Física
Com 27 anos de docência no ensino médio e fundamental,
o professor Hugo tem experiência de sobra para afirmar que
a educação deve se transformar para se adequar aos novos
tempos. Ele já ocupou altos cargos executivos na maior
companhia de eletricidade da Bahia, onde se aposentou em
2018, mas nunca deixou de dar aulas no turno noturno de
várias escolas públicas. Desde que se aposentou, ele passou
a se dedicar ao CENOR também no diurno. O gosto pela sala
de aula deve ter sido herdado da mãe, que era professora do
antigo primário, em Feira de Santana, interior da Bahia.
A educação nas periferias é uma
Para o professor, diante de tantas alternativas que o mundo oportunidade de oferecer aos jovens um
oferece aos jovens, atualmente, é um grande desafio para
os professores convencerem o aluno das comunidades caminho para romper o ciclo da pobreza,
periféricas que a educação é importante. “A gente percebe ao prepará-lo para o mercado de trabalho
uma fragmentação, um certo desarranjo na estrutura e também para a vida, porque eles também
familiar, que faz com que os meninos fiquem um pouco
perdidos, sem saber direito por que estão estudando, quais
aprendem valores como a responsabilidade
são suas perspectivas”, ele reflete. e o respeito à diversidade.
Física Interessante

>> OBJETIVOS:
Estimular o estudo da Física, aplicar os conhecimentos de equação do 1º e 2º graus e desenvolver as
habilidades de observação, interpretação e registro dos fenômenos naturais.
>> COMO FAZER
Por meio de atividades experimentais em sala de aula, utilizando materiais simples e de fácil acesso e
relacionadas aos temas estudados de modo que os alunos e alunas desenvolverão as seguintes habilidades:
1) Realizar experimentos práticos.
2) Relacionar os resultados obtidos aos conceitos físicos estudados.
3) Realizar cálculos matemáticos.
4) Analisar dados e tirar conclusões.
5) Registar todas as etapas do experimento.
As atividades serão desenvolvidas em equipes de 2 alunos, que serão avaliados pela participação nas
atividades em sala de aula e pela qualidade do relatório elaborado, onde serão observados:
1) Realização do experimento.
2) Relacionamento do experimento com a teoria estudada.
3) Descrição correta dos procedimentos experimentais.
4) Cálculo, análise e interpretação dos dados.
5) Conclusão.

49
PROJETO PROFESSORES

COM QUEM
1º ano do ensino médio do turno diurno

ONDE E QUANDO
CENOR. Segundo semestre do ano letivo de 2019.

RECURSOS NECESSÁRIOS
sala de aula, quadro, livros, cadernos, acesso à internet e materiais de fácil obtenção,
como cabo de vassoura, fita métrica, régua, bola de gude, moedas, folhas de papel e
cronômetro (do telefone celular).

DESAFIOS
Ampliar o projeto para as demais turmas de ensino médio, em 2020.

RESULTADOS
• Medição do Tempo de Reação, onde os alunos aplicaram a função horária
da posição no MRUV e foi praticado o conceito de média aritmética.
• Cálculo da aceleração no MRUV.
• Independência dos movimentos nos lançamentos horizontais.
• Queda dos corpos.
PROJETO PROFESSORES
51

Joselene
Teixeira Leite | Disciplinas diversificadas
Educar é ajudar alguém a crescer, a caminhar na vida, a descobrir
novos valores. É assim que a professora e psicopedagoga Joselene
define a sua profissão. Josy, como é conhecida no CENOR, confessa
que sonhava ser engenheira civil ou arquiteta, pois sempre gostou
muito de desenhar. Mas as condições financeiras não permitiram e ela
optou por fazer licenciatura em Educação Artística. Hoje, se considera
uma mulher realizada na profissão.
A professora entende que o jovem da periferia tem mais dificuldades
para se dedicar aos estudos devido aos problemas decorrentes da
falta de recursos, como a falta de alimentação adequada, doenças,
insegurança na família.
Por isso, ela acredita que o papel dos educadores do CENOR extrapola Às vezes, temos de auxiliar nossos
os muros da escola, neste contexto de extrema pobreza. alunos até financeiramente, para que
Foi esse olhar sensível que fez com que ela elaborasse, dentro do possam fazer um documento, comprar
Pense Grande, o projeto de uma campanha de sensibilização para
a questão da gravidez na adolescência. A professora reconhece que
um calçado. Isso também faz parte da
ainda é elevado o número de meninas que engravidam sem desejar e nossa profissão, quando trabalhamos
acabam tendo de desistir dos estudos. nas periferias urbanas.
Gravidez na
Adolescência

>> OBJETIVOS:
• Reduzir o índice alto de gravidez precoce e indesejada no bairro do
Arenoso.
• Promover o comportamento mais responsável dos adolescentes no que
se refere ao sexo seguro, à prevenção de DSTs e ao consumo de drogas.

>> COMO FAZER


1) Pesquisa sobre o tema.
2) Entrevistas com profissionais da unidade básica de saúde e com
adolescente que engravidou precocemente.
3) Discussão sobre os problemas decorrentes da gravidez indesejada.
4) Produção de banner sobre a prevenção.

52
PROJETO PROFESSORES

COM QUEM
8a ano do Ensino Fundamental

ONDE E QUANDO
CENOR. 2019.

RECURSOS NECESSÁRIOS
Textos de referência, papel, caneta.

DESAFIOS
Conseguir entrevistas com adolescentes que engravidaram foi o mais difícil.

RESULTADOS
Alunos e alunas que participaram da pesquisa estão mais conscientes a
respeito do tema.

DICAS
Capacitar as/os estudantes para fazer entrevistas e não expor as pessoas
entrevistadas. No caso de adolescentes, é preciso solicitar a autorização dos
pais para realizar a entrevista.
PROJETO PROFESSORES
54

Lindinalva
Bomfim | Língua Portuguesa
Se tem uma pessoa que conhece profundamente a comunidade do
Arenoso, é a professora Linda, como é mais conhecida. Ela fundou o
CENOR, junto com Norma Ribeiro, em 1985. Naquela época, já tinha
criado uma escolinha num bairro vizinho, quando recebeu o convite
para se unir ao novo projeto. Passou a maior parte de sua vida nessa
comunidade, onde ela mora e trabalha.
Por isso, é normal ser reconhecida por onde passa, no comércio,
nas ruas, numa clínica, por ex-alunos ou seus pais. “É gratificante,
eu me divirto na escola e faço amigos com facilidade, porque sou
‘conversadeira’ desde muito pequena, quando ajudava minha mãe
a vender legumes numa barraca de feira em Alagoinhas”, conta.
Na opinião da professora, a educação tem várias vertentes e não se
resume à sala de aula.
“A nossa comunidade vem buscar
Na disciplina de Língua Portuguesa, todo ano Linda organizava um esperança na escola, é aqui que
varal de poesias com suas alunas e alunos. Depois de participar do
Pense Grande, em 2019, ela resolveu inovar, fazendo um sarau virtual, os pais encontram subsídios para
que poderá ser divulgado na internet. educar seus filhos.”
Sarau de
Poesias

>> OBJETIVOS:
Ampliar as possibilidades de expressão da poesia.

>> COMO FAZER


1) Escolha de poesias de Cecília Meirelles, Carlos Drummond e Fernando
Pessoa para serem trabalhadas, de acordo com os temas que agradam
mais aos alunos.
2) Estudo sobre os autores.
3) Criação coletiva de poemas em sala de aula.
4) Gravação, em vídeo, dos alunos poetizando os poemas selecionados.
5) Edição do vídeo.

55
COM QUEM
8o ano B, 1o e 2o anos do ensino médio

ONDE E QUANDO
CENOR. 2019.

RECURSOS NECESSÁRIOS
Livros, câmera de vídeo, equipamento e software para edição de vídeo.

RESULTADOS
Alunos mais interessados em poesia; alunos que poetizaram se sentiram
valorizados e mais confiantes.

DICAS
Não impor a tarefa de poetizar; fazer apenas com os alunos que desejaram;
não pontuar.
PROJETO PROFESSORES
57

Marilene
Leone | Coordenação Pedagógica
Pensar, desejar e sonhar são o início de tudo para Marilene. Foi assim
que ela, aos onze anos de idade, em uma família pobre, sem recursos,
sonhou e traçou a meta de começar a trabalhar cedo para estudar
o máximo possível. “Falo desse lugar de origem de baixa renda, de
alguém que sempre acreditou na possibilidade de ver mudanças”,
conta com entusiasmo. Ela é uma profissional que conseguiu realizar
seu sonho de criança, fez faculdade de Pedagogia, pós-graduação, e
hoje tem certeza de que a educação pode levar as pessoas a caminhos
melhores na sociedade.
Como coordenadora pedagógica do CENOR, Marilene entende que os
estudantes contribuem para o crescimento dos professores. “Sendo
capacitados em programas como o Pense Grande, os alunos desafiam
os professores a se atualizarem sempre. E eu vejo, a cada dia, os
professores se preocupando mais com seu próprio desenvolvimento, O desafio é nos mobilizarmos para
para poder oferecer o melhor ao alunado”.
que as práticas estejam sempre sendo
Foi pensando na necessidade de melhorar a relação de escuta entre
professor e aluno que Marilene construiu, dentro do Pense Grande, o
repensadas, criando a cultura e o
projeto de Mentoria na Escola. reinventar do fazer educativo.
Mentoria na escola

>> OBJETIVOS:
• Fortalecer a relação de escuta entre professor e aluno para reduzir as dificuldades cognitivas.
• Resgatar o interesse dos estudantes em seu processo de aprendizagem.
• Garantir mais qualidade na aprendizagem.
• Ampliar o bem estar dos estudantes na escola.

>> COMO FAZER


1) Apresentação do projeto para os alunos e professores.
2) Em acordo com educadores e educandos, foi escolhida uma professora de referência, que se
reuniu com os estudantes, individualmente ou em pequenos grupos, oferecendo ajuda para a
superação das dificuldades.

58
PROJETO PROFESSORES

COM QUEM
1o e 2o anos do ensino médio

ONDE E QUANDO
CENOR. Segundo semestre de 2019.

RECURSOS NECESSÁRIOS
• Material xerografado
• Notebook
• Papel ofício
• Lápis de cor
• Cola, tesoura e outros.

DESAFIOS
Atender a todos os alunos do CENOR em 2020.

DICAS
Os alunos devem ficar livres para escolher seus mentores, entre os professores
com quem têm maior vínculo.
PROJETO PROFESSORES
60

Valney José
Silva dos Santos | História
Cantor, músico, animador de festas, o professor Valney se considera
um ser em movimento, que dentro da ética e das possibilidades
concretas, vai tentando tornar o mundo que está ao seu alcance o
melhor possível. Nascido em Mutuípe, interior da Bahia, filho de pais
pouco letrados, ele e sua irmã receberam todo apoio para estudar,
embora não tivessem muitas oportunidades em seu ambiente. Foram
os primeiros da família a entrar na universidade e fez História por ser
o único curso disponível na região, em uma universidade pública.
Assim como foi influenciado por alguns professores, ele deseja
contribuir com os jovens estudantes do CENOR, para que pensem um
pouco além do mercado de trabalho, na educação como um direito.
“Acredito na educação emancipadora, que constrói seres autônomos e
empoderados”, reflete Valney.
Foi por isso que ele propôs aos seus alunos, como projeto para o Em uma sociedade como a nossa,
Pense Grande 2019, a pesquisa sobre a história da comunidade do que discute muito o porte de armas,
Arenoso, marcada por estereótipos e preconceitos, mas que tem
valiosas contribuições que merecem ser divulgadas. Como cantor que a gente deveria discutir o porte de
é, não poderia deixar de lado a música, e o projeto incluiu a criação livros. A educação, numa comunidade
coletiva de uma paródia para valorizar o Arenoso. periférica, é a arma mais poderosa
PROJETO PROFESSORES

O Meu lugar
a história do Arenoso
por meio da oralidade

>> OBJETIVOS:
• valorizar a história do Arenoso.
• fortalecer os laços de identidade e pertencimento.
• valorizar a história oral e cultura imaterial do Arenoso.

>> COMO FAZER


1) análise da música “Meu lugar” de Arlindo Cruz.
2) produção de paródia com elementos socioculturais e geográficos do Arenoso.
3) aula dialogada sobre a formação das comunidades periféricas no Brasil.
4) aula sobre a importância da história oral para o fazer histórico.
5) produção dos questionários para entrevistas em equipe.
6) realização das entrevistas e organização.
7) apresentação dos resultados das equipes em sala.
8) edição das entrevistas em um audiovisual sobre a história do Arenoso contada por
seus moradores.
61
PROJETO PROFESSORES

COM QUEM
Alunos do 1o ano e interdisciplinaridade com professoras de Geografia e de Literatura.

ONDE
Comunidade do Arenoso e comunidade do CENOR

QUANDO
julho e agosto/2019

RECURSOS NECESSÁRIOS
Vídeos, músicas, slides, gravador, celular, notebook

RESULTADOS
Alunos tiveram criatividade na criação da letra da paródia de “O meu lugar”.
Alunos passaram a valorizar mais a história e alguns personagens do Arenoso.
PROJETO ESTUDANTES
Cap.5

SOBRE SONHOS
SOBRE SONHOS EE REALIDADE
REALIDADE
Às vezes, a realidade é tão dura nas periferias urbanas do Brasil que é difícil ter espaço para sonhar.
Talvez por isso, no princípio, a maioria dos jovens que participou do Pense Grande no Cenor hesitou
em aceitar o “chamado”. Alguns podem ter sentido medo do desconhecido ou considerado que estava
muito além das suas possibilidades. Mas, ao que tudo indica, elas e eles só precisavam de um
empurrãozinho de uma mentoria – um professor ou professora que admiravam, ou mesmo um colega
mais velho – para ganhar autoconfiança e começar a frequentar as oficinas.
Com o tempo, passaram a se interessar e enfrentaram outros desafios como o de expor suas
ideias, falar em público e trabalhar em grupo com colegas que ainda não conheciam tão bem.
A sensação de risco foi substituída pelo encontro de um propósito, um sentido maior para o
que estavam fazendo. Foi o que aconteceu com Erick Sacramento, um jovem de 18 anos que
cursava o 2o ano do ensino médio em 2019, e, no primeiro encontro do Pense Grande achou
tudo entediante, “não vou mentir”, mas logo passou a querer investigar, segundo ele, “para
ter mais conhecimentos”.
Maurício Mateus Santos, que aos 18 anos já era um veterano do Pense Grande, contou que o projeto
dá mais liberdade para os jovens apresentarem narrativas que representam a sua realidade, o
que faz com que se sintam atraídos pelo que estão aprendendo. Ele frequentou todas as oficinas
realizadas em 2017 e 2018 e, em 2019, foi convidado para ser um dos monitores.

62
PROJETO ESTUDANTES
64

Várias meninas da turma de 2019 relataram que estão começando a vencer a timidez para falar em
público ou apresentar os trabalhos escolares. A timidez não foi relatada unicamente pelas meninas,
mas neste grupo ela é uma característica sempre presente, ao contrário dos meninos. “Tem gente
que preferia perder os pontos, mas se recusava a apresentar trabalho na frente dos colegas”, contou
Andressa Gabriely, 17 anos, que cursa o 2o ano do ensino médio, lembrando a importância de ter um
projeto como o Pense Grande na escola pública, que oferece oportunidades para as pessoas com
“menos recursos” evoluírem e acreditarem que são capazes de ter opinião própria.
Por diferentes motivos, nem todo mundo que fez a formação participou da realização de um projeto,
mas a maioria se engajou e constatou a diferença que essa ação fez em sua vida.

Era uma vez uma ideia


que virou uma bela história...
PROJETO ESTUDANTES

Após algumas semanas de aula no Pense Grande, Erick, cuja


renda familiar não passa de um salário mínimo, começou a
pensar e agir de forma diferente, até descobrir, depois de estudar
os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável - ODS, uma vontade de
ajudar as pessoas que têm mais dificuldades do que ele para
sobreviver. Daí surgiu a ideia de criar um projeto de combate à
miséria no Arenoso. “O Pense Grande mexeu muito com a minha
vida, as minhas atitudes, e passei a sentir necessidade de ajudar
as pessoas mais pobres.” A ele se uniram os colegas Wendel,
Aline e Gisele, para criar o projeto:

OBJETIVO: Combater a miséria no Arenoso.


Solidariedade Juvenil AÇÃO: doação de roupas e alimentos para pessoas em situação de

“Doa aê”
rua da comunidade.
COMO VIABILIZAR: Realizaram bazar para arrecadação de roupas e
alimentos. Criaram página em rede social para divulgar as ações e
Erick, Wendel, Aline e Gisele para que as pessoas possam se conectar com a causa.

65
65
PROJETO ESTUDANTES

A jovem Maria Luísa, estudante do 9o ano, sempre se considerou


tão tímida que não conseguia abrir a boca em sala de aula para
expor suas ideias ou defender uma opinião diante dos outros.
Ao longo das aulas do Pense Grande, aprendeu a batalhar pelas
coisas que deseja. “Criei coragem para lidar com a minha vergonha
de falar em público”, conta. Com determinação, ela enfrentou as
dificuldades para desenvolver, com a amiga Sabrina e o colega
Luan, um projeto para promover a igualdade de gênero, “para que
ninguém sofra com a homofobia e o machismo”.

Gender
OBJETIVO: realizar ações de promoção da igualdade de gênero, com
foco nas mulheres (trans, lésbicas, heteros, negras etc).
AÇÃO: criar uma linha de produtos (canecas, camisas e bijouterias)
Equality Forever personalizados com frases de promoção da igualdade de gênero.
COMO VIABILIZAR: As primeiras peças serão comercializadas para
Sabrina, Maria Luiza e Luan apoiadores do projeto por um valor maior para que eles passem
a ter um capital de giro. Os canecos e camisas serão comprados
prontos e personalizados no próprio bairro, com frases e logomarca
do projeto e comercializados no insta do projeto.

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PROJETO ESTUDANTES

Bianca Muniz, 15 anos, aluna do 8o ano do ensino fundamental, sempre


quis “dar um basta” no preconceito sofrido “por muita gente que se
identifica como gay, lésbica, bi ou trans”. No CENOR, ela e suas colegas
de equipe percebem um tratamento desigual para as pessoas que se
definem como LGBTi+. Na sua opinião, os adultos são mais preconceituosos,
mas ela entende que essa característica também é comum entre alguns
adolescentes. Então, quando discutiram a possibilidade de criar um projeto
de empreendedorismo social, resolveram iniciar propondo a discussão da
LGBTfobia, organizando uma palestra e debate sobre o tema, dentro do
evento Solidariedade Juvenil. “Nós também entrevistamos e gravamos em
vídeo depoimentos de pessoas gays que falaram de suas lutas e deram
conselhos aos jovens que têm orientação homoafetiva”, relata Bianca. O
próximo passo da equipe é vender camisetas com frases de orgulho LGBTi+.

Movimento OBJETIVO: Combater a LGBT Fobia e a discriminação por


orientação sexual.
LGBTi+ Pride AÇÃO: O grupo participou do evento “Solidariedade Juvenil”
trazendo pessoas para palestras e círculo de debate e
Sabrina, Bianca, Gabriela, conversa tendo em vista combater o preconceito.
Ludmila, Jaqueline e Alef COMO VIABILIZAR: Venda de camisas contra a LGBT Fobia
em loja online (Instagram).

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70
PROJETO ESTUDANTES

Trabalhar em equipe sobre um tema que ele considera dos mais


importantes foi o que mais inspirou Lucas Pires dos Santos Alves, 17 anos,
estudante do 1o ano do ensino médio, durante as oficinas do Pense Grande.
Com o objetivo de combater a poluição ambiental, sua equipe escolheu o
ambiente marinho como foco. Uma ação bastante relevante, no momento
em que o mar sofria com o derramamento de toneladas de óleo cru, ao
longo de milhares de quilômetros, especialmente no litoral do Nordeste.
“Além do óleo, tem o lixo que as pessoas sem consciência ambiental jogam
na praia, ameaçando a vida dos animais marinhos. O rio Imbassaí virou um
canal de esgoto que deságua no mar”, afirmou o jovem ambientalista. Após
realizarem uma pesquisa sobre o tema, decidiram criar um aplicativo e um
site para informar as pessoas sobre os riscos que correm com a poluição.

Preservadores Objetivo: Promover a defesa do meio ambiente marinho.


Ação: realizar ações conectadas de proteção aos mares. O ciclo
do Meio Ambiente começa com uma coleta de lixo na praia, com realização de
separação dos materiais recicláveis.
Lucas, Wendel e Luiz Como viabilizar: Com o material coletado na praia, a ideia é
realizar uma oficina de artesanato com materiais recicláveis e
do mar (como conchas, algas etc). Para participar da oficina,
as pessoas levarão os materiais complementares necessários.
Os artesanatos produzidos na oficina serão comercializados em
uma feira, fechando o ciclo de proteção ambiental dos mares.
71
71
PROJETO ESTUDANTES

Passado Marcado
Hoje eu vim falar de uma história / Que ninguém quer
Não foi da primeira vez que ela se encantou com o projeto. Foi e relatar / Uma história de um povo negro / Que sofre
voltou, até que na versão 2019 do Pense Grande ela resolveu ficar. O pelo desemprego. / Será que você não vê / Que a cada
4 minutos tem gente morrendo / Porque não tem o
acolhimento foi decisivo para essa decisão, conta Larissa dos Santos que comer?! / Será que nunca muda / O povo sofre
Mendes, 18 anos, estudante do 8o ano do ensino fundamental. “Eu, pelas ruas / O que vamos fazer? / Sentar e assistir TV?
/ Não, não, não... / Vamos lutar pelo nosso direito de
que sempre fui tímida, senti que ali eu podia falar o que quisesse, pois viver. / Igualdade já! / Preto é cor
fui bem acolhida pelos professores e colegas.” Dentre as aprendizagens, E Negro é raça! - Larissa Mendes

ela destaca a oficina sobre projeto de vida, que “abriu” sua cabeça, e a
fez planejar a vida para conquistar seus objetivos. Um deles é trabalhar
como modelo, para se sustentar e mostrar para o mundo a beleza da
mulher negra. Tendo como fonte de inspiração a rapper Karol Conka,
ela se juntou às amigas Juliana de Jesus e Mércia Sousa para publicar
um livro com uma coletânea de poesias sobre o tema do racismo,
escritas por elas e Bruna Fernandes, Ítalo Chagas e Ednei William,
jovens que participam do coletivo Tamo Juntx.

Transforme Objetivo: Combater o preconceito e a discriminação racial.


Ação: Criar, divulgar e comercializar e-book com composições de
sua opinião para acabar autores jovens que tratem do preconceito racial. O livro conta com
poemas de: Larissa Mendes, Mércia Sousa, Italo Chagas, Bruna
com seu preconceito Fernandes, Ednei William.
Como viabilizar: Comercializar o e-book a preços simbólicos,
dando visibilidade aos autores e fomentando a publicação
alternativa de autores juvenis.

73
73
Cap.6

Avançar é preciso...
Assim como acontece em toda boa história, há momentos em que os heróis e heroínas se deparam
com desafios aparentemente intransponíveis, mas a solução sempre vem por meio de uma resposta
importante que lhes permite retomar sua jornada, mais resistentes e confiantes. Neste capítulo,
vamos apresentar os desafios e os aprendizados que os/as protagonistas do Pense Grande no CENOR
experimentaram, durante esse percurso.
Perguntamos a gestoras, consultoras, professores/as e estudantes:

Quais foram os maiores desafios deste processo?


Que mudanças representaram avanços em relação
às práticas anteriores?
O que é necessário aprimorar daqui para frente?

Como o Pense Grande nunca havia sido testado em uma escola pública de ensino médio regular, o
processo no CENOR foi pioneiro. Houve, sim, uma insegurança porque, como disse a vice-diretora
Rosana Carvalho, não sabiam qual seria a dimensão do Programa. E se não desse certo? E se
as propostas gerassem mais problemas do que soluções? A coordenadora pedagógica Marilene
Leone lembra que se não tivessem feito acordos, haveria mais resistência. Para ela, o passo mais
importante, no princípio, foi “a equipe do Pense Grande sentar com a gestão, com o colegiado, com
os professores, para ter uma escuta atenta, pois o projeto precisa ter a aceitabilidade do grupo, e a
retroalimentação teve de ser feita semanalmente.” Houve alguns atritos, discordâncias naturais, mas
75 as relações acabaram sendo fortalecidas pela mudança na qualidade da escuta:
76

“O que eu mais aprendi com as mentorias,


foi a necessidade de promover uma escuta afetiva de professores e
alunos. ”
Marilene Leoni, coordenadora pedagógica

Sua percepção foi confirmada por Linda (Lindinalva Bonfim), uma das professoras mais antigas do
CENOR, que conhece bem toda a equipe da escola. Neste processo de formação coletiva, além da
troca de conhecimentos, ela reconheceu uma boa contribuição para qualificar os relacionamentos.
O ambiente sempre foi tranquilo e saudável na escola, mas a equipe se uniu mais, a partir do
momento em que se sentiu coletivamente desafiada a apresentar inovações em suas práticas
pedagógicas.
Aline Nascimento, pedagoga que foi uma das facilitadoras do Pense Grande na escola, destaca
que professores e professoras foram desafiados/as a estudar mais, a lidar com tecnologias junto a
estudantes que, muitas vezes, sabiam dominá-las mais do que eles/as. Foi preciso uma boa dose de
humildade e coragem nesse percurso, mas os resultados foram recompensadores.
A mudança das práticas em sala de aula foi aprovada pelos alunos e alunas, inclusive aqueles/as
que não participaram das oficinas do Pense Grande. Reconheceram maior abertura de professores
e professoras para ouvir suas ideias e questionamentos. O jovem Maurício Mateus, do 3o ano do
ensino médio, avaliou que as ferramentas e tecnologias utilizadas tornaram os/as estudantes mais
interessados/as em participar das aulas e apresentar trabalhos criativos. Ele cita um festival de
curta-metragens que foi realizado em 2019 e diz que isso não teria sido possível, três anos atrás.
Também ganhou destaque a maior frequência de alunos e alunas na biblioteca. Antes do Pense
Grande, o que havia era uma sala escura, quase sem acervo, que ficava mais tempo fechada do que
aberta, por falta de uma bibliotecária. Após a reforma, a escola ganhou uma biblioteca confortável,
com um ótimo acervo. “Hoje o espaço se tornou um ponto de encontro cultural e vive cheio de
estudantes; isso não tem preço”, comentou Linda, professora de Língua Portuguesa.
76

“A mudança só aconteceu porque fomos


preparados para pensar de
maneira mais criativa.”
Maurício Mateus, estudante
78

Além de inovar as práticas pedagógicas, professores e professoras foram desafiados a


registrar todos os passos de suas ações, cada etapa dos projetos, relatar como foram
feitos, os desafios, os resultados e aprendizados. Não era um procedimento usual para
a maioria e demandou maior tempo de dedicação, o que certamente é uma barreira
na vida de trabalhadores/as da Educação que, em sua maioria, têm uma carga horária
muito extensa e muitas vezes trabalham em mais de uma escola. Em contrapartida,
as facilitadoras do Pense Grande lhes apresentaram ferramentas como o canva, o
google form e o padlet, que ampliaram seus repertórios para o registro, a criação e a
avaliação das atividades − um resultado destacado pela coordenadora pedagógica.

Os produtos dos mais de 30 projetos realizados por professores/as e alunos/as


durante estes dois anos também são resultados concretos que fortaleceram o espírito
empreendedor, a autoestima e o empoderamento de toda a comunidade escolar.
O colégio ganhou ainda mais respeito dentro do bairro, porque as relações foram
qualificadas após os encontros com parceiros, promovidos pela equipe do Pense Grande.
Todos passaram a entender as demandas de cada um, que ainda não eram conhecidas,
e isso resultou em ganhos mútuos.
79

O Demoday foi uma prática considerada desafiadora por professores, professoras, alunos e alunas,
já que não era usual a exposição de seus trabalhos para uma banca de avaliadores/as, na frente
de alunos, alunas e do público convidado. No evento, cada professor/a ou equipe de estudantes tem
cinco minutos para expor seu projeto, com o auxílio de materiais gráficos e audiovisuais. A partir
de critérios preestabelecidos, os jurados avaliam e premiam os melhores. A partir das vivências,
foram trazidas várias contribuições das pessoas que participaram para o aperfeiçoamento dessa
metodologia e que serão incorporadas nas próximas versões.

Entre outras ações consideradas necessárias para aprimorar o Programa no CENOR foram
destacadas: 1) a necessidade de garantir o envolvimento de mais docentes e estudantes;
2) aumentar a carga horária, sem comprometer os horários de aula de nenhuma disciplina
ou incorporar os conteúdos a componentes curriculares do CENOR; 3) continuar mantendo o
interesse da juventude, por meio de inovações constantes; 4) incursão maior do Pense Grande na
comunidade, promovendo saídas com estudantes e professores pelo bairro; 5) convidar para falar
na escola as pessoas que se destacam na comunidade, para serem exemplos para os alunos.
Cap.7

O olhar com Afeto


Até aqui, a história do Pense Grande foi contada e avaliada por pessoas que estavam imersas no
processo de mudança, seja porque trabalham ou estudam no CENOR. Neste capítulo, apresentamos a
análise das consultoras, uma equipe afinada, formada por mulheres que contribuirão com sua visão
sobre os resultados e os desafios, e refletirão sobre as inúmeras aprendizagens nesse movimento.
As jornalistas e educadoras Carla Aragão e Daniela Silva, da Afeto Educação Comunicação e Juventudes,
coordenam o Programa e articulam o diálogo entre os diversos atores – Fundação Telefônica Vivo
(FTV), Secretaria da Educação do Estado da Bahia (SEC) e CENOR, que foram os principais, e outras
organizações que participaram ocasionalmente, acolhendo profissionais e estudantes do colégio em
visitas técnicas, eventos ou realizando formações pontuais. Elas também se responsabilizam pela
seleção da equipe de facilitação.
A pedagoga Aparecida (Cida) Ferreira trabalhou com a formação da coordenação pedagógica e com
o apoio técnico para as gestoras. Em 2019, a pedagoga Aline Nascimento atuou como facilitadora de
oficinas do Pense Grande para professores e estudantes, e contou com o apoio do comunicador Ricardo
Penido na conclusão das oficinas para estudantes. Em 2018, participaram do Programa os seguintes
profissionais: Fábio Farani (oficina de Cultura Digital), Bruna Hercog (Mobilização Social), André Ferreira
(oficinas Pense Grande para estudantes), Ana Flávia Souza (rádio escolar e apoio ao grêmio), Denise
Borges (oficinas do Inova Escola para professores). Em 2017, atuaram Lucenir Gomes (co-coordenação
junto com Daniela Silva), Izye Santos (oficinas Pense Grande para estudantes, com apoio pontual de
Camila Godinho).

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81
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1) Saber ouvir
Uma das características principais do trabalho da Afeto é justamente
o que dá nome à organização: o cuidado com as relações humanas e a
escuta afetuosa. Porque, afinal, não existe eficiência sem uma boa dose de
afetos. Por isso, para além das metodologias inovadoras e dos resultados
conquistados, estabelecer relacionamentos saudáveis é extremamente
valioso para elas. Daniela e Carla não abrem mão de afinar os processos de
escuta, de conversar olhando nos olhos, demonstrando interesse genuíno
pelo que a pessoa está dizendo. Tal posicionamento não impede a existência
de conflitos, que são naturais e não podem ser ignorados ou minimizados,
na opinião de Daniela. Pelo contrário, ela destaca a necessidade dessas
questões serem integradas às aprendizagens.
83

A arte da “escutatória”, como dizia o poeta e educador Rubem Alves, tem de ser bastante praticada
para ser aprendida. Foi o que aconteceu durante dois anos e meio no Pense Grande, período em que
quase todos/as professores/as do CENOR tiveram oportunidade de se reunir quinzenalmente para falar
sobre seus projetos, dar opiniões sobre os projetos dos/as colegas e planejar juntos/as atividades. Em
consequência, na avaliação de Aline, foi gerada uma interdependência, uma intersdisciplinaridade
na prática, que geralmente é muito difícil de se conseguir. “A qualidade da escuta da maioria dos/as
participantes se ampliou muito, melhorando inclusive o relacionamento com os alunos”, explicou.

Essa disponibilidade da Afeto para o constante aprendizado e para a renovação foi um dos motivos que
levaram Cida a se unir ao Programa; outro foi o formato aberto que ele tem, no sentido de não levar
uma ideia pronta, mas de se adaptar às necessidades da escola. Aline se interessou pela perspectiva de
conhecer novas tecnologias e se sentiu desafiada pelo trabalho com o ensino médio. Ambas analisam
que a coexistência dos dois programas – Inova Escola e Pense Grande – gerou uma sinergia que
contribuiu para que os resultados fossem tão bons. Se não houvesse o Inova, que contribuiu para a
mudança nas práticas da gestão, talvez os avanços das oficinas do Pense Grande junto a professores/as
e alunos/as fossem mais limitados.
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2) Democratizar a gestão
Desde o primeiro ano de trabalho, foram detectadas certas fragilidades na gestão, como a centralização de
vários papéis na figura da diretora, a inexistência de planos de trabalho estruturados e a ausência de uma
coordenação pedagógica. Tais características repercutiam em sala de aula, afetando o processo de ensino-
aprendizagem, o que prejudicava alunos e alunas. Feito o diagnóstico inicial, Cida organizou, junto com a
equipe gestora, um plano de ação com indicadores, acompanhamento, monitoramento e avaliação.
Uma das primeiras ações realizadas foi a definição de papéis da equipe, para que a gestão fosse
descentralizada. Várias ações que antes eram feitas pela diretora foram assumidas pelas pessoas
responsáveis, assim que cada uma passou a saber o seu papel e a ter isso registrado, em formato de um
plano de trabalho. Parece algo simples, mas nunca havia sido feito em mais de três décadas de existência
do CENOR. Com a mudança, professores e professoras passaram a entender qual é o verdadeiro papel da
coordenação pedagógica, que é apoiá-los/as para colocar em prática os projetos temáticos acordados nas
jornadas pedagógicas, entre outros. Passaram a ter acesso à agenda de trabalho da coordenadora. Esta
se sentiu compreendida e fortalecida em sua função. Na avaliação de Cida, o impacto dessas ações foi na
democratização do trabalho da gestão.
Nas reuniões de formação com professores, professoras e a coordenadora Marilene, Cida também
trabalhou a reorganização do processo avaliativo da escola, a partir da discussão dialogada.
Durante um semestre, uma vez por semana a equipe toda se reunia para refletir sobre o que é
avaliar, como se avalia e, aos poucos, criaram um formato que estipulou valores para a entrega de
projetos, para trabalhos em grupo, trabalhos individuais e outras tarefas. Esse modelo vai integrar
o Projeto Político-Pedagógico – o PPP do CENOR, que também foi revisto em 2019.
85

3) Mudanças políticas
Entre os resultados do Pense Grande citados por Carla, está a diminuição da evasão escolar e da
infrequência, principalmente, no ensino médio. É necessário explicar que houve transferências para outras
escolas, o que não pode ser considerado evasão, já que o aluno ou aluna continuou estudando. Essas saídas
estão relacionadas à pressão da família para que os/as jovens passem a trabalhar e contribuir com a renda
familiar, a partir do momento em que completam 16, 17 anos. Como no CENOR o ensino médio é integral,
ou seja, funciona em dois turnos, torna-se difícil conciliar trabalho e estudo. A saída é buscar colégios que
ofereçam um turno, em bairros mais próximos dos locais de trabalho. Entretanto, a existência do programa
Pense Grande foi considerada um fator importante para manter no colégio vários/as jovens que pensavam
em sair, além de ter atraído outros/as que perceberam ali oportunidades de formação que não obteriam em
outras escolas.
Por vários motivos, o colégio ganhou muita visibilidade após a chegada do Pense Grande, avalia Carla.
No evento de lançamento, estiveram na comunidade o então secretário da Educação Walter Pinheiro e o
governador Rui Costa. O atual secretário, Jerônimo Rodrigues, fez questão de convidar dois estudantes que
se revelaram no Pense Grande para serem mestres de cerimônia no primeiro evento após a sua posse, o
que já se repetiu em outros momentos do calendário da Educação no Estado. Os impactos do Programa na
aprendizagem têm sido acompanhados de perto pela SEC, cujo interesse na manutenção da parceria com a
FTV manifestou-se no final de 2019, com a formação de aproximadamente 180 professores e professoras de
24 escolas e profissionais da SEC, em Aprendizagens Ativas.
86

Ter se tornado uma escola referência em inovação contribuiu, na opinião das consultoras, para evitar
uma grande diminuição no número de matrículas no ensino médio, após o fechamento do 6o ano do
fundamental, ocorrido no final de 2018, com a perspectiva futura de o ensino fundamental II não ser mais
oferecido ali3. Segundo Daniela, desde o início, a SEC argumentou que seria interessante trabalhar com o
Pense Grande num colégio exclusivo de ensino médio. O desafio é que, em consequência do fechamento do
6o ano, caiu o número de matrículas no ensino fundamental, pois a maioria dos pais prefere matricular
seus filhos e filhas em escolas onde poderão seguir até a conclusão da educação básica. Isso impactou na
queda do número de matrículas do ensino médio e consequentemente diminuiu o número de inscrições de
estudantes do ensino médio no programa Pense Grande. Por esse motivo, em 2019 houve abertura de vagas
para alunos e alunas do 8o e 9o anos do Fundamental, que já demonstravam interesse em participar desde
o início.

Na avaliação da equipe do Programa, o desafio maior com essa integração de séries diferentes, que não faz
parte da cultura da escola, é o fato de haver uma diferença de maturidade e de repertório entre os/as que
estão no ensino médio e aqueles/as que cursam o fundamental. A própria metodologia tem uma linguagem
voltada para estudantes com maior contato com as tecnologias, segundo Daniela. Depois de dois anos e
meio de atividades, uma questão que ela considera necessário pensar melhor é a carga horária do Pense
Grande com estudantes. Atualmente, são duas horas por semana. “É pouco tempo para avançarmos na
busca de um impacto real na vida dos/as estudantes e temos o desafio de envolver professores e professoras
do próprio CENOR na condução dessas formações como parte de um componente curricular e não mais
como formação extraclasse”, comenta a consultora. Ela acredita que isso também contribuiria para melhorar
o desempenho em indicadores oficiais de aprendizagem.

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Como ainda não há uma legislação clara a respeito de quem deve ser o responsável pelo ensino fundamental II – governos estaduais ou municipais –
o que ocorre é que há uma sobreposição e uma obrigação legal de cada instância aplicar, no mínimo, 25% das suas receitas de impostos na Educação.
A política estadual de Educação na Bahia tem priorizado investir na oferta do ensino médio.
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Afetar estudantes
Entretanto, há outros tipos de manifestações dentro da escola que podem impactar de maneira positiva no
desempenho profissional dos/as jovens, futuramente. Toda a equipe reconhece o amadurecimento das ideias
deles/as após a criação do Grêmio Estudantil e da Rádio, duas ações decorrentes diretamente do Programa.
“O discurso e a argumentação de alunos e alunas ficaram mais articulados, a participação de seus/suas
representantes no Conselho Gestor foi qualificada, houve maior interesse em fazer o Enem e se preparar para
tentar o ingresso na universidade”, resume Carla.
Apesar disso, Daniela percebeu que a metodologia Pense Grande ainda precisa de ajustes para as escolas
regulares, de um modo geral. Atualmente, fora do CENOR e da Escola Estadual Mauro Oliveira (SP), o Programa é
realizado em escolas técnicas (ETECs), cujo perfil de estudantes é diferente. Alunos/as de ensino médio de escolas
públicas regulares não são pré-selecionados, como acontece nas ETECs, para onde vão as pessoas que, em tese,
já estão com objetivos definidos em relação ao mercado de trabalho. Com o olhar da Afeto, a consultora aponta
a necessidade de fortalecer o módulo que trabalha com o projeto de vida nas escolas regulares: “O Programa
poderia contribuir ainda mais com esse olhar dos/as participantes para os projetos de vida deles/as, para além
da escola, quaisquer que sejam suas escolhas profissionais. Isso precisa ser pensado logo no início e com mais
profundidade, para que as outras fases se desenvolvam melhor e façam sentido para eles”.
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Além de propor uma conexão maior entre escola e projeto de vida, ou escola e mundo do trabalho, a avaliação
da equipe destacou a importância de mapear experiências de jovens empreendedores bem próximos à realidade
de alunos e alunas. Esses exemplos próximos dão potência e estimulam a juventude a sonhar e acreditar na
possibilidade de concretizar os sonhos. A experiência no CENOR também mostrou que é importante pensar em
instrumentos de monitoramento e avaliação das aprendizagens ao longo das oficinas, que devem começar no
primeiro trimestre letivo.

Os resultados alcançados, em tão curto prazo é bom lembrar, demonstram que a execução do Programa
no CENOR tem sido bem sucedida, diante de um desafio enorme que é a mudança cultural em um
ambiente tão complexo como é uma escola onde convivem diariamente centenas de pessoas - neste caso,
são aproximadamente 500 pessoas - muitas vezes com diferentes interesses e visões de mundo. Inserir
novas dinâmicas e processos que vão mexer com as estruturas estabelecidas exige abertura, flexibilidade e
disponibilidade para o diálogo. Tudo isso tem sido possível graças ao empenho da equipe da escola, da equipe
técnica do Programa, das organizações parceiras e apoiadoras. Pode ser que, em breve, as oficinas Pense
Grande sejam incorporadas ao currículo escolar, tornando a equipe docente responsável pela facilitação das
oficinas. Construções nesse sentido já estão em curso, de forma colaborativa, e prometem inspirar novos
capítulos dessa linda história...
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Realização:

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