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WAR OF HEARTS

SÉRIE SAINT VINCENT 2

COPYRIGHT © 2023 ANNIE BELMONT


Todos os direitos reservados

Esta obra foi revisada conforme o Novo Acordo Ortográfico.

Estão proibidos o armazenamento e/ou a reprodução de qualquer parte desta obra, através de
quaisquer meios ― tangível ou intangível ― sem o devido consentimento. A violação dos direitos
autorais é crime estabelecido pela lei nº 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Esta obra literária é uma ficção. Qualquer nome, lugar, personagens e situações são produtos da
imaginação do autor. Qualquer semelhança com pessoas e acontecimentos reais é mera coincidência.

Capa: Larissa Chagas (@lchagasdesign)


Diagramação: Annie Belmont; April Jones e L. Júpiter
Revisão: Camille Gomes (@k.millereditorial) e Pigmalateia
(@pigmalateia)
Leitura Sensível: Isamara Gomes (@autoraisagomes)
Leitura e Betagem Crítica: Isadora Lacerda (@isahreading)
Leitura Beta: Bruna Celestino, Eduarda Santos, Esther Hadassa,
Isabella Martins, Maria Eduarda Klazer, Izabela Frazão, Ketlyn Viana e
Thais Souza.
Ilustração do Casal: Gabriela Góis
War Of Hearts
[Recurso Digital] / Annie Belmont — 1ª Edição; 2023
1. Romance Contemporâneo 2. Literatura Brasileira 3. New Adult 4. Ficção I. Título
Sejam bem-vindos novamente a nossa cidade caótica!
Alô, tudo bem?
Eu sou a Annie e, quero que saiba, de antemão, que será um prazer
compartilhar mais uma vez com vocês um pouco do que Saint Vincent
significa para mim.
War of Hearts reúne tudo o que amamos. Ele vai te fazer rir e chorar
na mesma proporção. Vai fazer você querer morar em Saint Vincent e
também vai te ensinar que, em muitas das vezes, o que acreditamos, não se
passa de uma mera ilusão.
Summer Miller e Oliver Wright são almas gêmeas. Eles nasceram em
um momento que eu não imaginava que se pertenciam. Contudo, o amor
deles foi instantâneo e bastou apenas um segundo, um olhar, para que
soubesse que o casal do segundo livro não poderia ser ninguém menos que
eles.
Todavia, houveram momentos durante a escrita desse livro que me
fizeram repensar toda a minha vida. Que me perguntei dezenas de vezes se
eu realmente estava pronta para contar a histórias deles. De mostrar ao
mundo um casal que me ajudou a me reconectar com Saint Vincent; que me
mostraram que também não estavam inteiros e que assim como eu, também
precisavam sangrar suas dores em forma de palavras.
No final, percebi que não fui eu quem os salvou mas, sim, que foram
eles que me salvaram, assim como um dia Logan e Verônica fizeram
também. E o que quero dizer a vocês com este livro é: continuem,
continuem mesmo quando o mundo todo te faça acreditar que não é mais
possível. Sonhe, grite, viva, se decepcione, mas, jamais, em hipótese
alguma, desista.
Dito tudo isso, preciso te lembrar que assim como nós, todos os
personagens deste livro também cometem erros e são imperfeitos. Posso
dizer de antemão que a história do nosso segundo casal também não é uma
história feliz; ela é crua, te ensina que às vezes o amor pode ser feio,
doloroso e acima de tudo, pode machucar de uma forma irreparável. E,
quando digo isso, não estou apenas falando de amor romântico, mas de
qualquer tipo de amor.
Então, por favor, leia atentamente a nota de gatilhos disponível na
próxima página. E caso você não se sinta confortável com algum dos
assuntos listados, por favor, não prossiga com a leitura. Sua saúde mental
SEMPRE será importante para mim e é lógico, vale mais que qualquer
entretenimento.
E se caso esse seja o seu primeiro contato com a série Saint Vincent,
preciso frisar que mesmo que War of Hearts seja um livro independente,
ele é entrelaçado no primeiro livro da série, Broken Hearts, que também
está disponível na Amazon e no Kindle Unlimited. Para uma melhor
experiência, aconselho a lê-lo primeiro.
Sem mais, desejo a cada leitor uma ótima leitura e que esse grupo,
que se tornou família, a cidade mais caótica do condado e a universidade
mais amada do país, conquiste você!
Com todo o meu amor,
Annie Belmont
War of Hearts é um livro sobre aprender que se não nos salvarmos,
curarmos nossas feridas e angústias, nunca poderemos ajudar o outro a se
salvar. E, muita das vezes, ir atrás da verdade, do seu próprio caminho, não
é bonito. Pode ser doloroso, cruel e desumano.
Portanto, WOH POSSUI GATILHOS PARA PESSOAS
SENSÍVEIS AOS TEMAS:
Negligência familiar, violência doméstica, física e psicológica
gráfica; uso excessivo de álcool; linguagem imprópria; negligência e
abandono parental; tentativa de estrupo e abuso sexual infantil (não
possui cenas gráficas); relação familiar tóxica; tentativa de homícidio e
cenas de sexo explícito e não explícito.
Desse modo, a leitura não é recomendada para pessoas menores
de 18 anos.
Com isso, gostaria de alertar que se você já passou ou conhece
alguém que passa por algo semelhante ao que os protagonistas de WOH
sofreram, por favor, ligue para o número 100 e denuncie!
Ouça a Playlist de WAR OF HEARTS
no Spotify.
Para vocês que foram quebrados e machucados pela vida,
Que sofreram em silêncio na calada da noite,
Que lutaram por aquilo que amavam,
E que seguiram sorrindo quando a vontade era apenas de chorar:
Vocês são fortes, imbatíveis, então nunca, em hipótese alguma, deixem que
te digam ao contrário!
E para você, pai, que foi o primeiro homem a quebrar meu coração.
Eu gostei de você porque
você enfrentou todos os
meus demônios, viu todos os
fantasmas, abraçou todas as
inseguranças e permaneceu.

Todas As Coisas Que Eu Te Escreveria Se Pudesse - Igor Pires


Eu não consigo deixar de errar nesta escuridão
Porque estou vencendo esta guerra de corações
Eu não posso deixar de querer que oceanos se partam
Porque estou vencendo esta guerra de corações
War of Hearts | Ruelle

Quando criança, o que mais ouvia sair dos lábios de meu pai era que o
amor é uma fraqueza.
Uma emoção inútil, feito para aqueles que não sabem o poder que tem
em mãos, que não sabem como a sujeira do mundo pode contaminar esse
sentimento tão frágil, chegando a disputá-lo e transformá-lo naquilo de mais
cruel. Por isso eu teria que me abdicar de sentir.
Naquela época, enquanto criança e ingênuo, discordei desse
pensamento, sempre achando que aquele vazio que meu pai carregava nos
seus intensos olhos verdes era algo reparável. Mas, eu estava equivocado.
Ele não tinha reparo, nunca poderia ter.
Contudo, meu pai estava certo em uma coisa.
O amor é de fato uma fraqueza.
Eu aprendi essa terrível lição quando tinha apenas oito anos e todo o
meu mundo foi tirado de mim sem aviso prévio.
Certa vez, me disseram que eu não poderia morar dentro da minha
cabeça para sempre, que meus traumas não poderiam me impedir de viver.
Eu acreditei nisso.
Tranquei meu passado a sete chaves dentro de um baú e atirei em
meio a um oceano, deixando bem escondido na parte mais profunda do meu
coração.
E então, me permiti sobreviver.
Fiz disso um motivo para que eu continuasse a sentir as sensações.
Mas, por baixo de tudo isso, por baixo dos sorrisos doces e das palavras
gentis, eu ainda continuava sendo a mesma. Continuava sendo a menina de
onze anos que sentiu na pele o que os monstros fazem, o que eles
conseguem destruir quando têm uma única oportunidade.
Eu aprendi que os verdadeiros monstros não ficam embaixo das
nossas camas, nem escondidos atrás da porta do nosso armário. Às vezes,
eles se sentam à nossa mesa, tomam de nosso vinho e depois nos destroem.
O que porra nós éramos?
Não me diga éramos só amigos
Isso não faz muito sentido
Mas eu não estou machucado, estou tenso
Pois eu vou ficar bem sem você, garota
Friends | Chase Atlantic

Eu sou uma covarde.


É isso que constato enquanto sinto meus pulmões queimarem feito
brasa e minhas pernas latejarem devido ao esforço extra durante o percurso
entre o apartamento no centro de Saint Vincent, até o condomínio de luxo
na parte alta onde meus pais moram.
Suspiro fundo, passando a palma da minha mão em minha testa,
tentando enxugar o suor que escorre pela minha pele. Observo meu reflexo
através do vidro da vitrine, o top preto que envolve meus seios deixando
minha barriga de fora e o short de tecido fino que me deixa com o aspecto
ainda mais magro, por ser largo. Mas, não é isso que detém minha atenção
nesse momento, mas, sim, o olhar doce e o sorriso gentil estampado na
minha face.
Inclino meu rosto franzindo o nariz, porque sei que essa minha faceta
gentil é apenas uma fachada para o monstro que realmente habita o meu
interior. O que foi empurrado para o fundo do guarda-roupa e que agora se
rebela tentando de alguma forma encontrar uma saída.
A verdade é que estou me sentindo dessa forma desde que meu
melhor amigo, Levi, assumiu seus sentimentos por mim. O que deveria
significar apenas uma amizade, para ele se tornou algo a mais, e tudo piorou
quando ele tentou ter uma conversa séria comigo e eu covarde como que
sou, fugi como uma criminosa que acabou de cometer um dos piores
crimes.
Não deveria ser assim, eu não deveria estar evitando ele. Sou uma
adulta e preciso lidar com as consequências dos meus próprios atos.
E, agora, enquanto corro pelas ruas da cidade quase vazia, me
pergunto como pude ser tão descuidada e deixar minha vida sair do controle
assim sem ao menos perceber que meu melhor amigo se apaixonou por
mim.
E é exatamente por esse motivo, por estar evitando todos esses
questionamentos e toda a bagunça que eu possa ter causado, que estou
levando meu corpo ao limite durante a minha corrida matinal, mesmo
sabendo que é errado correr uma distância tão grande como a que estou
percorrendo no momento. Porém, é esse esforço que está acalmando tudo
dentro de mim, é isso que está mantendo minha cabeça no lugar.
Porque, assim como Levi usa a natação, Logan, o futebol e Vee, a
dança, para aplacar seus pensamentos e frustrações, eu utilizo a corrida.
Deixo que o vento frio do alvorecer bata contra meu rosto enquanto meus
tênis golpeiam o chão asfaltado, me dando impulso para ir mais rápido e
fazendo com que meu corpo precise se esforçar um pouco mais do que o
necessário.
A melodia de Heartburn da cantora Wafia ressoa pelos meus airpods
assim que viro uma esquina, me deparando com Analu Parker se alongando
na entrada do nosso condomínio com uma roupa quase que idêntica a
minha. A loira para por alguns segundos e ergue a sobrancelha, enquanto
coloca seu celular na sua braçadeira e dá um passo hesitante em minha
direção.
— Você não deveria estar enfiada em algum cinema vendo seus
filmes nerds? — questiona, colocando seus próprios fones e alongando as
pernas.
— E você não deveria estar gastando o dinheiro do seu pai? —
devolvo, entre fôlegos, colocando as mãos sobre meus joelhos e respirando
fundo.
Ela sorri, um sorriso perfeitamente alinhado e alongando os braços
sobre a cabeça.
— Ainda está cedo para isso — debocha dando de ombros e erguendo
o queixo para a rua deserta. — Aceita companhia?
Analu Parker, é uma incógnita para mim. Não porque ela tem seus
problemas passados com Verônica, Logan e Mike Burhan, isso é um
assunto entre eles, que apenas os quatro devem resolver. Mas sim, porque
ela esbanja algo superficial pelo campus, quando, na verdade, todos nós que
a conhecemos desde a infância, sabemos que é mentira.
Ela pode não ser a garota perfeita, recatada, que mantém seus
pensamentos na cabeça, mas também não é a garota burra, inconveniente e
má, que muitas vezes deixa que a universidade acredite. Também não é
apenas a filha mimada de um empreendedor do ramo imobiliário, que
construiu um império durante esses anos.
Não.
Analu é mais.
E por isso eu a considero uma incógnita, porque não conhecemos
quem realmente habita a mulher por baixo de tantas máscaras.
Mas o que posso falar sobre isso, quando não sou exemplo? Quando
permito acreditarem que sou a garota perfeita, sendo que isso é uma
mentira?
Merda. Balanço a cabeça, afastando todos esses pensamentos e ergo o
olhar para Analu que ainda me encara com o cenho franzido.
— Tente não ser insuportável — resmungo, já voltando a colocar
minha música.
— Isso talvez seja um pedido impossível de se realizar, Miller. — Ela
sorri, como uma criança travessa.
Rolo meus olhos, suspirando fundo e começo a correr novamente. De
relance, vejo Analu fechar os olhos e respirar fundo. Mesmo que eu saiba
que seu esporte preferido seja o tênis, não a corrida, aprecio a sua
companhia, porque talvez a sua presença não seja tão ruim como sempre
pensei que fosse.
Principalmente porque nos próximos vinte minutos, não emitimos
nenhuma palavra. E apesar de estarmos em silêncio, eu queira quebrá-lo,
tentar dizer algo. Mas, Parker estava com seus olhos tão perdidos que
pareceu entender o meu lado, já que deveria estar lidando com os seus
próprios problemas e, pela primeira vez, eu me sinto totalmente confortável
ao seu lado.
O momento de paz que havia se estabelecido entre nós é quebrado
quando meu celular começa a tocar incansavelmente, fazendo com que eu
leve minha mão até a minha braçadeira com o suporte para ele e o retire de
lá.
Ergo uma sobrancelha ao ver a foto de Verônica e ao lado a de Hazel,
em uma chamada de vídeo. Deslizo o dedo para cima, aceitando a ligação e
preocupada por estarem ligando a essa hora.
O rosto de Vee é o primeiro a aparecer. Logo após, é a vez da feição
de Hazel invadir o lado direito da tela. Sorrio, ao perceber que nossa amiga
está com o rosto inchado de sono e, como sempre, possui uma careta nada
amigável por Verônica tê-la acordado cedo.
— Por que diabos você está me ligando a essa hora, Verônica? — é
Hazel que pergunta.
— Eu estou voltando para casa hoje — responde, sem rodeios.
Paro minha corrida abruptamente, fazendo com que minha companhia
também faça o mesmo. Solto uma respiração cansada e então meu cenho se
franze ao entender as palavras que minha amiga está proferindo.
Meus pensamentos são tão confusos que não percebo que Analu
coloca o seu rosto em frente ao meu celular, preenchendo toda a tela com
seu enorme sorriso.
— Bom dia, garotas! — ela cumprimenta calorosamente. — Como
assim você já está voltando, Blackwell?
Hazel se engasga com algo, levando um susto com a presença da nova
intrusa. O que faz Analu aumentar seu sorriso, se tornando condescendente.
— O que caralhos você está fazendo com a Sum a essa hora da
manhã, Parker? — minha amiga questiona ainda tossindo.
— Seja mais receptiva, Smith — Analu contesta, erguendo uma
sobrancelha. — Estamos tendo uma corrida matinal amigável.
Pela minha visão periférica que agora divido com Analu, observo Vee
soltar um sorriso. Não, é uma fodida gargalhada. Como se não acreditasse
que esse momento entre mim e Analu algum dia poderia acontecer.
Mas para ser sincera, nem mesmo eu posso acreditar que isso
aconteceria. Na verdade, se me perguntassem a alguns meses atrás se algum
dia eu teria uma corrida matinal com a loira ao meu lado e ainda gostaria de
sua companhia, sem dúvidas, teria a mesma reação que minhas amigas
tiveram quando souberam, ou até mesmo pior.
— Eu não vou perguntar os motivos que se sucederam a isso, é
complexo demais para lidar pela manhã — Hazel balbucia do outro lado da
linha.
— Diga o motivo de estar voltando, Vee — sussurro, preocupada.
Por mais que eu ame Verônica, não acredito que estar em um lugar
onde possa se esbarrar com Logan seja a melhor decisão. Não quando
ambos sabem que não conseguem ficar longe um do outro.
— Porque estou voltando para casa, Sum — ela conta, abrindo um
sorriso fraco. — Eu estou voltando para Saint Vincent.
Eu, Hazel e Analu sorrimos quase que sincronizadamente. E mesmo
que a loira não fosse totalmente integrante do nosso grupo, percebi que seu
sorriso é verdadeiro. Ela pode não demonstrar, mas ainda sente por Vee a
mesma conexão que sentia quando éramos adolescentes.
De quando eram tão amigas que ninguém tinha a audácia de se meter
entre a amizade delas. Ou pelo menos até Mike acontecer e toda a merda
estourar.
— Ele já sabe? — pergunto suavemente, me referindo a Logan.
— Ele sempre sabe de tudo — responde, deslizando o óculos escuro
do topo de sua cabeça até seus olhos. Alguém ao seu lado abre uma porta e
pela primeira vez percebo que Dylan e Edmund estão junto dela.
— E aí, Sum! — Dylan cumprimenta sorrindo, então seu rosto se
ilumina quando seus olhos recaem em Hazel. — Oi, ma belle! — Eu nunca
entenderei o contexto desse apelido e sinceramente, acredito que apenas os
dois entendam. Quando os olhos do primogênito dos Blackwell percebem a
minha companhia, ele ergue uma sobrancelha em surpresa — Oi, Parker?
Ah, pelo amor de Deus.
Meus amigos não acreditarem que Analu e eu possamos ter um
momento de convivência sem querer matar uma à outra, está me irritando.
— Quando chegarmos aí, vocês nos explicam o porquê de estarem
juntas a essa hora? — Ed questiona colocado o rosto na tela do celular de
Vee, destacando aqueles olhos castanhos que são a marca registrada deles.
— Eu realmente estou curioso.
— Por que estão fazendo disso um evento? — Analu pergunta,
revirando os olhos. — É apenas uma corrida.
— Desde quando fazem isso? — A voz de Hazel emerge entre todos.
— Desde hoje — respondemos uníssona.
— Ok — Verônica fala, passando a mão pelos cabelos escuros. —
Preciso da ajuda de vocês.
— Somos todos ouvidos.
— Preciso fazer com que meu carro chegue até o aeroporto e que
Logan me encontre — ela confidencia sorrindo. — Ele pode ser teimoso
quando quer, então faça um bom trabalho.
Ed e Dylan nos deixam, enquanto eu olho para Analu e depois para
Hazel, pensando em como faríamos para que ela e Logan se encontrem em
algum lugar que acreditamos ser especial, principalmente quando Logan
está evitando qualquer ser humano desde que tudo aconteceu. Mas quando
abro a boca para dizer algo, Analu suspira fundo e responde por todas nós:
— Marcus está promovendo uma corrida para comemorar o novo ano,
posso fazer com que ele coloque vocês dois como corredores principais essa
noite — ela diz hesitante, mordendo o lábio e se vira para mim — Enquanto
o convenço, vocês duas podem ir até a casa de Verônica, pegar o carro e
levar no aeroporto.
Viro meu rosto para Parker e vejo um olhar compassivo dela. Ela não
estava mandando ou debochando, não, ela está tentando se encaixar,
tentando criar laços.
— É um ótimo plano — digo, surpreendo-a.
— Perfeito! Façam o meu capitão me encontrar na linha de largada —
Vee sorri maliciosamente — Vejo vocês em algumas horas, porque agora eu
tenho que chegar no aeroporto o mais rápido possível.
Ela e Hazel se despedem e por fim desligam. Assim que coloco meu
celular de volta ao seu lugar, me viro para Analu, sorrindo brevemente e
erguendo o queixo para me acompanhar até sua casa. E sem mais nenhuma
palavra, nós corremos pela rua.
Nós não conversamos durante o resto da corrida ou, muito menos,
quando ela acenou brevemente com a cabeça e entrou em sua casa. Mas, eu
soube que Analu Parker acaba de conseguir algo que poucos conseguem.
Ela havia conquistado a nossa confiança, não só a minha, mas a de Vee e
um pouco de Hazel, mesmo que a segunda ainda não seja totalmente a favor
de Parker.
E, mesmo que a loira ainda seja uma grande incógnita para mim, ela
entendeu como funcionamos, entendeu que sempre estaríamos um pelo
outro caso precisássemos. E ela fez isso, ela esteve lá quando viu que eu
não estava bem com a situação com Levi, esteve lá quando Verônica se
despedaçou por ter tido que terminar com Logan outra vez e agora está
aqui, mais uma vez, para nos ajudar.
Por esse motivo, quando chego em casa, me sento na minha cama,
pego meu celular e entro no aplicativo de mensagens. Procurando o número
da loira e fazendo o que o Vee havia me indicado para fazer poucos minutos
atrás, quando também entendeu o que ela agora representava para todos
nós.
Adiciono a mulher que há um ano não suportávamos no grupo dos
meus melhores amigos.
Não por pena ou por algo similar. Mas sim, porque Analu Parker
conquistou seu lugar em nosso grupo.
Ela agora faz parte da nossa família.
itssummermiller: Bem-vinda ao grupo mais caótico de Saint Vincent,
Parker!
Você pode deixar pra lá
Você pode dar uma festa cheia de todo
mundo que você conhece
E não convidar a sua família,
porque eles nunca te mostraram amor
Você não precisa se desculpar por
ir embora e crescer, hmm
Matilda | Harry Styles

Medidas drásticas.
Elas são algo que eu odeio tomar, contudo também são algo que devo
fazer.
E, nesse momento, enquanto estou parado em frente ao enorme prédio
espelhado, localizado na 34th Street, perto do enorme prédio da Brackwell
Enterprise, sei que o que estou prestes a fazer, pode ser o que tanto almejo
ou o que irá foder com o resto de sanidade que ainda carrego comigo.
Por esse motivo, desvio brevemente o olhar da paisagem para o meu
celular que emite um bipe fraco, indicando uma nova mensagem e fazendo
com que eu foque na imagem da minha melhor amiga estampada no visor
do objeto.

itsverônicablackwell: Está feito. Estamos livres.

Um sorriso cruza meus lábios maliciosamente.


Ela conseguiu.
Verônica Blackwell conseguiu fazer com que todo o acordo
relacionado ao nosso noivado fosse por água abaixo. E isso me faz querer
abraçá-la, agradecê-la por ter nos tirado dessa situação de merda. Porém,
me limito a apenas digitar uma resposta que sei que será a maior medida
drástica que tomei até hoje.

itsoliverwright: Eu lido com o resto.

Guardo o aparelho em meu bolso traseiro e sigo em direção ao


elevador já sabendo que existe uma grande possibilidade de que, quando
pisar naquele escritório, toda a fúria que meu pai guarda dentro de si, será
despejada sobre mim por conta das merdas que ele mesmo apronta. Todavia
já estou preparado para isso, acredito que estou neste limiar desde quando
ele despejou pela primeira vez, quando eu não entendia muito o que estava
acontecendo, e mesmo assim senti todas as dores que não deveria sentir.
E isso não deveria acontecer, certo? Quando uma criança acaba de
perder a mãe por algo tão trágico, tão destruidor, não deveria ser tratada
como pária, como um mero apetrecho em uma mansão enorme.
Não, ao contrário, quando uma criança sofre um trauma, ela deve ser
protegida, cuidada e amada.
Contudo, isso não foi a minha realidade, porque enquanto eu estava
sofrendo por algo que não tive culpa, com apenas oito anos de idade, o
mundo estava comentando sobre a morte precoce de Abigail Wright. Seu
rosto fino, os olhos acinzentados e assombrados estampavam as revistas da
cidade e os paparazzi ficavam nas espreitas de nossa casa, à procura de uma
entrevista com a família da mulher feliz que foi encontrada morta por conta
de uma overdose de heroína, em um hotel de classe média nos subúrbios de
Saint Vincent.
Balanço a cabeça irritado por todas essas memórias invadirem a
minha mente e observo o elevador parar no andar onde é sediada a Wright
Enterprise, empresa da minha família.
Assim que as portas se abrem, encaro todos os funcionários correrem
de um lado para o outro e alguns me lançarem olhares questionáveis
enquanto levanto meus óculos escuros da Dior.
— Você não deveria estar aqui — a voz receosa e o barulho do salto
batendo contra o piso faz com que eu erga uma sobrancelha.
Ignoro-a por alguns segundos, observando a decoração em tons
dourados e pretos e a enorme logo da empresa ao lado da recepção. Toda a
ostentação do ambiente é desnecessária e isso faz com que uma careta
estampe meu rosto.
— Meu pai deveria redecorar esse lugar — desdenho, franzindo o
cenho. — Toda essa decoração é de péssimo gosto.
— Oliver! — Suspira.
— Lauren — devolvo, soltando meu melhor sorriso.
Meus olhos focam na mulher à minha frente que está com os braços
apoiados na cintura e um olhar afiado. Lauren Campbell, é uma mulher que
merece muito mais do que aparenta. Ela coloca essa empresa na linha e
mantém todos unidos, contudo, o seu problema é único e específico: ela se
apaixonou por Brandon Wright.
E mesmo que eu queira odiá-la por ser ingênua, eu não poderia. Pois,
por mais que sua voz seja doce e seu jeito de se vestir, simplório, ela não é
má. Ela é apenas uma daquelas mulheres, que ainda sonham com um conto
de fadas e um cavalheiro em um cavalo branco.
Mas o problema de toda essa história, é que ela não entregou seu
coração à Fera, mas sim, ao Gastón.
— O que você aprontou? — ronda, enquanto caminhamos até a parte
superior do andar que dá acesso à ala presidencial.
Abro a boca para dizer algo, mas sou interrompido com o barulho de
algo se chocando fortemente contra a parede do escritório do meu pai. O
som faz com que as poucas pessoas que andam pelo espaço arregalem os
olhos e depois, corram para suas salas para se protegerem da ira de
Brandon.
Oh, então ele já está sabendo sobre o rompimento do meu noivado.
Lauren leva uma de suas mãos até a gola da blusa e a alarga um
pouco, respirando fundo.
— Isso você terá que perguntar a Verônica. — Sorrio vitorioso. —
Porque a minha melhor amiga não gostou nada de ter sido colocada no meio
das merdas do seu… — paro a frase pela metade, ponderando qual rótulo
ela usa com meu pai. — namorado?
Ela suspira fundo se jogando em sua cadeira e fechando os olhos por
alguns segundos, enquanto leva a mão até sua têmpora, massageando-a.
Dou de ombros, ignorando-a — porque sei que mesmo que eu diga a ela
que não merece passar pelo que meu pai a faz passar, ela nunca me escutará
—, e caminho lentamente até a porta do escritório do homem que evito a
qualquer custo.
Assim que paro em frente a porta, fraquejo, porque sei que quando eu
entrar, quando ele decidir que serei seu alvo, nada poderá impedir. E talvez
por isso, por me lembrar das vezes que não pude escapar, levo minha mão
até o relógio que era do meu avô e o rolo em meu pulso, uma mania que eu
havia adquirido quando estava nervoso com algo e assim que começo a me
sentir melhor, tomo uma respiração alta e finalmente abro a porta.
Sou recebido com uma visão de um escritório totalmente destruído,
papéis espalhados por todo o chão, garrafas de bebidas estraçalhadas e o
líquido que antes as preenchiam, escorrendo pelas paredes.
É sem dúvidas uma visão satisfatória para meus olhos.
Brandon Wright não é um homem descontrolado. Não, ele mantém a
porra de uma máscara perfeita em seu rosto o tempo todo, nunca dando um
vislumbre de sua real face. Um sádico de merda. E saber que pela primeira
vez desde que minha mãe morreu, alguém havia ganhado um de seus jogos
tiranos, faz com um sentimento incrível cresça em meu peito.
— Você e aquela maldita Blackwell — ele rosna, apontando o dedo
em minha direção — Vão pagar por isso!
Nós dois sabemos que isso é uma ameaça vazia, porque ele não seria
idiota o suficiente de tocar em Verônica. Não quando ela possui uma família
que queimaria o mundo se alguém tocasse em um fio de cabelo, de qualquer
um dos seus integrantes. E meu pai sabe disso, sabe que mesmo que ele
consiga manipular Jonathan em aspectos empresariais, como foi todo esse
trâmite para um casamento inexistente, ele nunca conseguiria passar por
cima de Amber Blackwell.
Não quando minha madrinha é a mulher que colocou metade dos
homens da Wall Street [1] de joelhos quando era o braço direito de Jonathan
na Blackwell Enterprise e derrubou inúmeros gigantes corporativos nos
tribunais, apenas para que a empresa da sua família continuasse no patamar.
— Eu acho que não — debocho me jogando na cadeira à sua frente.
— E você nem pode me culpar pelo seu plano de merda não ter durado nem
uma semana. — Um sorriso cresce em meus lábios, enquanto levo uma mão
até meu queixo, arrastando um dedo pela minha mandíbula, fingindo pensar
no resto da minha frase. — Porque eu avisei que isso não terminaria bem
para você e Jonathan.
Ele caminha furioso até onde estou sentado e mesmo que a criança
interior dentro de mim – aquela que ainda o teme –, grite para que me
encolha ou saia correndo, eu não faço isso. Ao contrário, ergo meu queixo e
espero a dor, espero que seus punhos acertem meu rosto ou que algo me
machuque, mas nada disso acontece.
Brandon segura a gola da minha camisa e me puxa para frente,
fazendo com que nossos rostos fiquem quase colados, e é como uma guerra;
O verde dos meus olhos contra o dos seus, a raiva brilhando em nossas íris
e o estupor de seu rosto, quando eu não movo um centímetro do meu corpo
como fazia quando ainda era adolescente, me faz querer sorrir, não, me faz
querer gargalhar.
Me faz querer gritar para ele que não há mais controle sobre minha
vida, não há mais um menino assustado atrás da aprovação do papai.
Sim, Brandon, eu sinto em lhe dizer que o garotinho finalmente
cresceu.
— Não se esqueça o que está em jogo aqui, Oliver — ele rosna, me
soltando com força e indo até o outro lado da mesa, se sentando à minha
frente. O meu progenitor apoia o cotovelo na borda do móvel e entrelaça
suas mãos, enquanto me encara friamente. — Não se esqueça que Andrew
pode voltar a qualquer momento para Nova York.
— Não use Andrew para me ameaçar, pai — bufo entediado, ao
mesmo tempo que reviro meus olhos. — Isso já está cansativo e
sinceramente? Eu não me importo mais. Então, saiba que não estou aqui
para suplicar que poupe meu irmão da nossa fodida realidade, nós dois
sabemos que você nunca encostará um dedo nele.
Ele ergue uma sobrancelha, surpreso.
Mas é a verdade. Demorei para entender que todas as vezes que
blefava comigo sobre usar os mesmos métodos, que foram utilizados em
mim, era a mais pura mentira. Ele teve todas as oportunidades para fazer
isso durante o tempo que Andi morava conosco, e ele optou por apenas
ignorá-lo.
Porque meu irmão é a cópia de nossa mãe e mesmo que meu pai seja
o homem mais cruel do mundo comigo e o resto da humanidade, eu sempre
soube que uma parte dele se culpa pela morte dela. Sempre se pergunta o
que teria sido se pela primeira vez, ele tivesse amado alguém, além de si
mesmo.
Mas esse é o grande problema da sociedade, certo? As pessoas não
valorizam aquilo que está na sua frente, elas acham que porque as tem, isso
dá o direito de negligenciá-las. Mas aqui vai uma verdade sobre isso: até as
pessoas mais doces, mais amáveis, se cansam. Elas quebram, quando a
outra parte as destroem.
Porque o amor, só é lindo em contos de fadas, mas na vida real, no
cotidiano, ele é cruel, tem um sabor amargo que quando provado, causa
intoxicação. E mesmo que eu ache isso, que eu saiba que o amor é de fato
uma fraqueza que entra pelos nossos poros e destrói cada célula boa, eu me
forço a esquecer esses pensamentos e solto um sorriso, fixando o meu olhar
no rosto do homem à minha frente.
Afinal, eu já sabia que ele usaria meu irmão com alguma chantagem
para me fazer andar na linha, e estou farto disso. Pelo amor de Deus,
Andrew já tem dezessete anos, não posso controlar mais sua vida apenas
porque acho que será o melhor para ele.
Não posso mais afastá-lo de sua própria família para protegê-lo,
mesmo sabendo que nosso pai não fará nada contra ele. Para ser sincero,
quanto mais faço isso, quanto mais afasto meu irmão de nossa realidade, é o
reflexo do que eu desejava que tivessem feito comigo.
Sempre que mando Andrew para longe, uma parte de mim se
pergunta o que teria sido se alguém tivesse feito o mesmo por mim, se
alguém tivesse me colocado em um avião, a milhas de distância do meu pai
e de todas as lembranças que me perseguiam.
Toda vez que protejo meu irmão mais novo, é como se por algum
motivo eu estivesse protegendo o Oliver de oito anos que não teve a mesma
sorte.
— Mantenha a porra da sua atenção aqui, Oliver — a voz de meu pai
me faz sair dos meus devaneios. Pigarreio enquanto me encosto da minha
poltrona e ergo o queixo, indicando para que continue. — Se tem tanta
certeza de não irei machucar Andrew, por que está aqui?
— Para comunicar que estou voltando para Saint Vincent — anuncio.
— Não, você não está.
— Como você ressaltou há alguns dias, tenho que terminar minha
faculdade e agir como um adulto — repito suas palavras com um gosto
ruim em minha boca. — Estou fazendo isso.
— Você não está voltando para aquela cidade apenas por isso — ele
diz confiante.
Não, eu não estou voltando para lá por isso.
Estou voltando porque, pela primeira vez em anos, me sinto repleto
de pessoas que posso chamar de família e porque preciso encontrar aquilo
que sempre procurei naquela maldita casa, que um dia chamamos de lar e
nunca tive êxito.
— Tenho assuntos inacabados lá — minto descaradamente.
— Você tem? — questiona, desconfiado.
Ok, talvez eu precise de um melhor motivo para voltar para Saint
Vincent.
Mas o que caralhos eu irei dizer a ele? Que estou voltando porque
quero ficar perto dos meus amigos que não me tratam como um mero objeto
em sua decoração cara? Ou que eu quero voltar porque irei procurar até o
último tijolo da casa que foi a ruína da minha família para finalmente ter
minha liberdade?
Merda, eu preciso de uma desculpa melhor. Preciso que acredite que
superei todas as minhas cicatrizes com aquela maldita cidade, apenas para
que eu possa ser livre.
— Eu tenho — respondo, convicto mesmo não sendo verdade.
— E quais são esses assuntos tão importantes que precisam de sua
presença? — Cada sílaba que sai de seus lábios é regada ao sarcasmo.
Como se ele não acreditasse no que estou dizendo, como se estivesse
apenas barganhando com uma criancinha, antes de tirar seu brinquedo.
— Assuntos que precisam da minha total atenção.
Deus, isso é patético.
— Seja mais específico, Oliver.
— Por que você precisa saber? — Ergo uma sobrancelha. — Eu sou
adulto, Brandon, posso me cuidar.
— Você realmente acha que serei estúpido o bastante para largá-lo em
Saint Vincent sem um motivo convincente? — Ele se encosta na sua
poltrona e cruza os braços em frente ao corpo, confiante. — Principalmente
quando sei que você é instável o suficiente para abandonar tudo e sair em
uma nova aventura pelo mundo? Não, Oliver, eu não irei deixar você ir para
aquela maldita cidade sem a merda de um motivo plausível.
Droga.
Por que caralhos tudo para meu pai precisa ser difícil? Por que ele
apenas não esquece a minha existência e me deixa em paz? E por que
diabos eu ainda estou o escutando como se me importasse com o que ele irá
fazer, se caso eu não seguir com o que ele mandar?
Suspiro fundo, tentando acalmar a raiva que começa a subir por todo
o meu ser. Eu posso ter lidado com o assunto de Andrew de uma maneira
fácil, posso ter revertido a situação para onde meu pai não o use mais como
uma ameaça. Porém, se eu não conseguir lidar com isso de uma forma onde
Brandon Wright acredite que eu realmente tenho pelo qual voltar à Saint
Vincent, e que não posso continuar aqui, toda essa merda não adiantará de
nada.
Ele será o vencedor.
E me recuso a aceitar isso.
Olhando para o homem sentado à minha frente, que ainda mantém
aqueles olhos frios e calculistas em meu rosto. A solução dos meus
problemas se ilumina em minha mente, como se fosse uma lâmpada.
Toda essa merda aconteceu porque, segundo ele, preciso me casar e
assumir os negócios da família. Então, farei isso. Porque, desta forma,
conseguirei o que tanto almejo desde o que aconteceu naquele último baile
beneficente em que participei, aos meus quatorze anos.
Eu não me casarei, óbvio. Mas, ele não precisa saber desse detalhe.
Meu pai apenas precisa acreditar que estou apaixonado por alguma garota
da classe alta, que ele considera boa o suficiente para carregar o nosso
sobrenome.
Ou seja: Medidas drásticas. É isso que estou prestes a tomar.
— Eu irei terminar a faculdade…
— Você pode fazer isso em Nova York! — exclama, me
interrompendo. — Onde posso ter certeza de que você não está fodendo
com nosso sobrenome.
— E ter o incidente que aconteceu na NYU em cima de nós
novamente? — questiono, soltando um sorriso maquiavélico. — Não, eu
acho que não. Até mesmo Jonathan está enviando Verônica de volta à Saint
Vincent, para não ter que lidar com isso novamente.
É uma mentira de merda. Verônica está pouco se fodendo para o
incidente que aconteceu na nossa antiga universidade.
Ela está voltando porque ela quer e não precisa dar satisfação para seu
pai, como eu estou tendo que fazer no momento.
— Ok, continue — ele diz, finalmente se interessando pelo assunto.
Deus. Que ela nunca saiba o que estou prestes a dizer.
— Além disso, você quer que eu encontre uma noiva decente — A
forma como sou obrigado a dizer isso, faz com que a bile suba pela minha
garganta. — E eu já tenho a pessoa perfeita para ocupar esse lugar e eu
realmente estou… — a palavra se agarra a minha traqueia e parece que
estou rasgando toda a minha garganta para colocá-la para fora — Estou
apaixonado.
Meu pai ergue a sobrancelha, seus olhos por um momento me
estudam. Avaliando o que caralhos eu tenho, porque todos sabem que não
tenho relacionamentos, muito menos sentimentos por terceiros, a não ser
por quem realmente conseguiu ultrapassar meus limites.
— E quem seria a responsável por tal milagre? — pergunta,
destilando veneno em cada palavra.
Oh, merda.
Eu vou fazer isso.
Vou proferir o nome da única mulher que me odeia com toda a suas
forças desde a noite que transamos e eu fui um estúpido com ela. Vou usá-la
para sair de uma situação que, sem dúvidas, faria com que ela quebrasse
todo o meu lindo rosto, antes mesmo que eu explique toda a situação em
que estou nos colocando.
Todavia, nada a impediu de me usar quando foi conveniente. Quando
ela precisou usar a nossa noite fatídica para se livrar da declaração de Levi.
Bem, talvez esteja na hora dela me devolver o favor.
— Summer. — Inclino a cabeça para o lado, enquanto umedeço meus
lábios e solto um sorriso descarado, antes de proferir a mentira. — Eu estou
apaixonado por Summer Miller.
— Summer Miller? A única filha Gerald Miller? — Meu pai leva a
mão até seu queixo e coça a barba por fazer.
Pelo amor de Deus, como eu vou saber o nome do pai de Summer se
eu mal sei o sobrenome dela?
Reviro meus olhos e confirmo com um aceno, esperando do fundo do
meu coração que o nome do meu suposto futuro sogro seja esse.
— Vocês se conhecem? — questiono, intrigado.
Por todos os meus relógios que estão no meu closet, eu espero que
não.
— Fomos a alguns eventos em comum. Gerald e sua esposa,
Elizabeth, possuem uma rede de construtoras e restaurantes pelo país. — O
que significa que aos olhos do meu pai, isso é benéfico para seus
investimentos. — E por que diabos você escondeu seu envolvimento com a
garota Miller?
Porque ele não existe e se depender de nós dois, nunca irá existir.
A frase quase escorrega dos meus lábios, mas, seguro. Meu pai não
precisa saber que esse envolvimento entre nós dois é inexistente, a não ser
se formos contar pela noite quente que tivemos a alguns meses atrás.
Porra, se aquilo é o que a loirinha faz em seus namoros, talvez eu não
vá me importar de ter um falso relacionamento com ela.
— Porque Sum é discreta — digo uma meia-verdade. — E claro,
porque precisei terminar tudo por conta de seu plano estúpido.
Apelar não é um jogo limpo, mas nessa guerra vale tudo.
Principalmente se meu adversário é um filho da puta sádico que agora está
reformulando todas as suas perspectivas apenas para conseguir colocar suas
mãos nos negócios dos pais de Miller.
Oh, eu estou ferrado.
Ficar em Nova York e não finalizar os planos que arquitetei desde
meus quinze anos, será o menor dos meus problemas se caso Summer não
topar embarcar nesse plano insano que acabei de nos colocar.
— Eu irei te deixar voltar para Saint Vincent em paz — ele pragueja,
me encarando. — Contanto que volte para a universidade e traga Summer
no próximo baile beneficente, para nos conhecermos.
— Por que diabos você quer conhecê-la?
— Porque ela conquistou o coração morto do meu filho. — Ele sorri
falsamente. — E isso é um grande feito para a garota Miller, então acredito
que ela mereça uma boa recepção dos Wright.
Seu tom é insinuoso, com segundas intenções. E mesmo que Summer
não seja a minha pessoa favorita no mundo, eu nunca deixaria que ele
fizesse algo para prejudicá-la.
Primeiro, porque ela não tem nada a ver com isso. A culpa é
exclusivamente minha por ter sido estúpido o suficiente para colocá-la
nessa situação; segundo, porque ela é amiga dos meus amigos, e mesmo
que não gostemos um do outro, nós sempre protegemos os nossos.
— Fique-longe-de-Summer!
Seguro a borda da cadeira com força, enquanto observo ele sorrir
friamente. E então, percebo que ele fez isso para me testar, para saber se
meu sentimento por ela é forte o suficiente para enfrentá-lo, e pela primeira
vez, percebo que agi de forma certa em sua frente, que meu pequeno
descontrole, lhe confirmou algo que sei que não existe.
Porque agora meu pai acredita firmemente que eu estou apaixonado
por Summer Miller, a mesma mulher que preferiria colocar fogo em minhas
bolas a ficar perto de mim outra vez.
— Siga as minhas regras e eu ficarei longe de sua garota.
Observo aquelas íris verdes brilharem em algo obscuro e apenas
aceno brevemente, me levantando e seguindo para fora da empresa, até o
aeroporto.
E apenas quando finalmente estou dentro do avião, rumo a Saint
Vincent, suspiro aliviado. Eu consegui minha passagem de volta à minha
vida e ao meu objetivo. E agora preciso fazer com que Summer aceite fazer
parte da minha farsa ou seu ódio será realmente o menor dos meus
problemas.
Por você, eu passaria do limite
Eu desperdiçaria meu tempo
Eu perderia minha cabeça
Eles dizem: Ela foi longe demais dessa vez
Don’t Blame Me | Taylor Swift

— Eu estou com fome.


A voz sonolenta de Verônica reverbera pela sala do apartamento,
fazendo com que eu, Hazel e Analu levantemos nossos rostos em sua
direção.
Hazel que está apoiada na bancada com seu celular em mãos, ergue
uma sobrancelha para ela e encara a mesma coisa que eu — as roupas da
nossa amiga. Não é segredo que Verônica Blackwell ama moda e tudo o que
ela pode proporcionar, mas vê-la vestida apenas com a camisa do time da
Saint Vincent University que Logan vive usando pela casa, é sem dúvidas
uma coisa nova.
Ergo uma sobrancelha e levo minha caneca de bebida favorita até os
lábios, passo uma página do artigo que estou lendo em meu tablet decidindo
que isso é muito complexo para lidar a essa hora do dia. Analu que está do
outro lado do balcão em que estou sentada, solta um sorriso malicioso,
enquanto Vee leva suas mãos até o cabelo preto, fazendo um coque
bagunçado e suspira fundo.
— Cozinha, conheça Verônica — a loira debocha. — Verônica,
conheça a cozinha.
Vee estala a língua no céu da boca e encara o ambiente como se ele
fosse um animal selvagem prestes a atacá-la.
— Você já cozinhou alguma coisa na vida, Blackwell? — Parker
questiona, soltando um sorriso sarcástico.
— Você já? — devolve, encarando a loira com as sobrancelhas
erguidas em um quê de provocação.
— Talvez — ela responde dando de ombros e voltando sua atenção
para o celular. — Mas eu não estou fazendo seu café da manhã.
Quase solto uma gargalhada com a imagem delas tentando se
provocar ou pior, da ideia das duas tentando cozinhar algo em meu
apartamento e incendiando todo o edifício, mas a voz de Hazel faz com que
eu deixe minha imaginação de lado e a encare.
— Nenhuma de vocês vai cozinhar. Isso seria um desastre —
comunica, então se vira para o corredor. — Logan!
Seu grito poderia ser escutado até mesmo na Parte Alta de Saint
Vincent.
Meu amigo aparece poucos segundos depois, vestido com uma
camiseta preta lisa e uma calça de moletom; seus olhos ainda estão
inchados de sono e isso não me surpreende, não quando ele e Vee decidiram
maratonar todos os volumes de Trono de Vidro[2], desde que ela voltou de
Nova York uma semana atrás.
— Por que diabos você está gritando, Smith? — ele pergunta, indo
até Vee e dando um beijo em sua cabeça.
Hazel emite uma careta ao escutar o sobrenome que todos nós
sabemos que odeia.
— Chame Josh. Nós estamos indo ao Oásis — ela responde, se
referindo ao bar que é o nosso ponto de encontro.
— Por que diabos nós estamos indo ao Oásis a essa hora? — Logan
questiona, encarando o relógio digital que colocamos ao lado da geladeira.
— Porque diabos todas nós estamos com fome e ninguém vai se
aventurar no fogão — Hazel anuncia, lançando uma careta para o casal que
apenas dão de ombros. — E eu preciso de uma carona.
— Onde está meu irmão? — Vee pergunta indo até a geladeira e
tirando uma jarra de suco. — Ele sempre te busca.
Haz dá de ombros, passando um copo para ela e pegando outro para
si.
— Indo ao Oásis, assim como deveríamos estar fazendo — anuncia,
enchendo um copo de água e bebendo.
— Você já havia dito a eles? — pergunto, abandonando meu artigo.
Não me surpreenderia se tivesse feito.
— Não. Eles já iam para lá — sorri para mim. — Estou apenas
juntando o útil ao agradável.
Levanto uma sobrancelha para a resposta simples, porém,
estranhamente nenhum de nós se opõem. Nós até mesmo concordamos com
a ideia.
— Alguém avise Levi — Verônica fala, enquanto seus olhos
estreitam-se. — E digam a ele que se não arrastar sua bunda até o Oásis, eu
mesmo irei até ele e o afogarei naquela merda de piscina.
Meu coração dói com a menção a meu amigo. É uma dor que tenho a
convicção de que sou a responsável. Afinal, desde a noite do ano novo, há
quase duas semanas atrás, não o vejo, não por falta de oportunidade, mas
sim, porque sou covarde demais para lidar com esse assunto, para dizer a
ele que não sinto o mesmo, e principalmente que deveria desistir de mim.
Porém, todas as vezes que nos encontramos, ele me encara como se
eu fosse a pessoa mais incrível do mundo, como se quisesse me dizer que
estará aqui para mim, se caso eu desejar dar um passo a mais em sua
direção.
No entanto, como posso fazer isso se meus sentimentos por ele não
são desta maneira? Não são como a química explosiva de Vee e Logan ou
como a calmaria de Hazel e Dylan? Mas sim, como o mesmo que sinto por
Josh e Ed, que não passa de cumplicidade, irmandade e de um amor
singelo.
E isso não vai mudar.
— Sum? — Logan me chama. — Está tudo bem?
— Onde ele está? — Ignoro sua pergunta.
Porque não, eu não estou bem.
— Na casa dos pais dele — Meu amigo se joga ao meu lado,
enquanto olho de relance para Hazel e a vejo se afastar de Analu, que ergue
uma sobrancelha em sua direção. — Você sabe que está na hora de
conversarem, certo?
Levanto uma sobrancelha.
— Você não é a melhor pessoa para falar sobre comunicação —
respondo na defensiva e aponto o queixo para sua namorada que caminha
em direção ao seu quarto.
— Exatamente por isso estou dizendo para conversarem — ele diz
com se não se importasse com a minha frase anterior. — Eu e Verônica
tínhamos merdas e assuntos demais para lidarmos e se tivéssemos agido de
forma madura, desde que tudo aconteceu, teríamos nos poupado de muito
sofrimento. Então, estou te dizendo para não agir como nós dois agimos só
porque tem medo dos seus sentimentos, quando todos nós sabemos que é a
mais sensata entre nós.
— Eu não quero magoá-lo, Logan — sussurro a verdade.
— Entenda, Summer, que é melhor lidar com um coração partido do
que com doces mentiras que podem se tornar venenos fatais. — Logan sorri
fracamente para mim. — Perder um amor dói, dói pra caralho, mas, perder
um amigo de longa data pode te custar mais do que está disposta a dar,
Summer.
— Desde quando você é tão maduro? — questiono, erguendo a
sobrancelha.
— Desde que percebi que estava perdendo a mulher que eu amo —
responde, deixando um sorriso nascer em seus lábios e se levanta indo até
Vee.
Encosto minha cabeça no sofá e fecho meus olhos, enquanto escuto o
burburinho dos meus amigos na bancada da cozinha. Logan está certo em
uma coisa: perder um amigo que é quase um irmão para mim, pode me
custar muito e eu já perdi demais para deixar que isso aconteça.
Abro um olho quando escuto a porta da entrada ser aberta e vejo Josh
entrando despreocupadamente, enquanto segura uma sacola de compras em
uma das mãos. Ele ergue o óculos escuro, me dando a visão de seus olhos
castanhos e sorri gentilmente em minha direção.
— Por que caralhos você me enviou uma mensagem com emojis de
comida, Haz? — Ele ergue uma sobrancelha.
— Porque estamos indo para o Oásis — Hazel responde à pergunta de
Josh, pegando sua bolsa.
Logan suspira fundo, sabendo que isso é uma batalha perdida, e ergue
o olhar quando Verônica aparece novamente no fim do corredor já vestida
com outra roupa. Vee caminha a passos lentos em nossa direção e percebo
que possui um sorriso enorme estampado no rosto.
É um sorriso que poucos sabem o significado, mas que nós
conseguimos desvendar todas as nuances, porque esse ato pode indicar
apenas uma coisa: problemas.
— Eu tenho uma ideia! — Ela descansa os braços na cintura.
Seus olhos brilham em antecipação e até mesmo Logan solta um
suspiro.
Céus.
— Eu deveria ter medo de perguntar o que seria? — Analu pergunta o
que todos nós estamos pensando.
Verônica solta uma piscadela em direção a loira e caminha lentamente
pela nossa sala. O único barulho são seus saltos batendo contra o piso e me
surpreendo ao perceber que Logan está com uma das sobrancelhas erguidas.
Ela para atrás de Underwood, segura os seus ombros e depois de um
segundo responde a tão temida pergunta:
— Nós vamos dar uma festa neste final de semana.
— Por que iremos dar uma festa? — Analu questiona.
— Porque faltam duas semanas para as aulas e eu estou entediada —
ela responde dando de ombros.
Assim que elas ficam quietas, tenho apenas uma certeza.
Essa festa pode ser a melhor coisa que acontecerá em nossas férias ou
a pior decisão que tomamos desde realizar a maldita confraternização do
ano novo.

A mansão dos Blackwell está lotada.


Paro em frente ao rol de entrada do segundo andar, escorando meu
antebraço no vidro de proteção, e observo quase todos os alunos da SVU
transitarem de um lado para o outro, pelo enorme ambiente. Eu não deveria
me surpreender com tamanha proporção que isso se tornou, já que em
poucos dias, estamos voltando para a universidade para o novo semestre.
Além disso, ninguém diz não a uma festa, principalmente quando os
anfitriões são os herdeiros mais ricos da cidade e estão promovendo uma
festa temática.
Dylan, Ed e Verônica ultrapassaram todos os limites da criatividade
com a decoração da primeira festa do ano. Toda a casa está decorada como
um dos cassinos de Las Vegas. No primeiro andar, entre as inúmeras
pessoas que zanzam por ali, existem inúmeras mesas de jogos; outras se
concentram no enorme bar localizado na lateral da piscina que é abastecido
e equipado com garçons experientes.
No entanto, é a visão de Analu Parker agarrada a um dos garçons,
gargalhando, me faz erguer uma sobrancelha. Ao seu lado, Josh está
segurando uma garrafa de gim quase vazia e sorri descaradamente para um
dos jogadores do time de Logan, sentado na mesa de blackjack, e lhe
devolve o sorriso.
— Essa é definitivamente a melhor festa que eles já deram — Hazel
grita por conta da música.
Olho de relance para minha amiga que arruma seu vestido azul royal
no corpo curvilíneo e logo após, leva as mãos até os cabelos longos
arrumando-os também.
— Eu nem poderia negar — grito de volta por cima da música e
aponto para nosso amigo. — Olhe Josh, como está feliz.
— Definitivamente ele é a alma da festa! — exclama, soltando uma
gargalhada.
Não discordo, porque Josh Brown é uma versão totalmente diferente
da que conhecemos quando está bêbado; não estou incrivelmente surpresa
por isso, não quando sei que o homem que desenha projetos incríveis e
coloca juízo nos nossos amigos, é de fato a pessoa mais divertida ao nosso
redor. Por outro lado, tenho uma enorme certeza de que Analu é a
responsável pelo teor de álcool que roda o corpo dele no momento.
Verônica aparece de repente, segurando uma garrafa de tequila e solta
um sorriso malicioso em nossa direção. O vestido rosa, envolto a pedrarias
que imitam diamantes, destaca a pele bronzeada e os saltos da mesma
tonalidade fazem um gigantesco sorriso nascer no meu rosto. Atrás dela,
Analu se equilibra em um salto e fecha os olhos, enquanto balança o corpo
no ritmo de Love You Like a Love Song, fazendo com que a seda de seu
vestido verde musgo se movimente junto à melodia.
— Acho que vamos precisar de outra garrafa — Vee constata,
cruzando os braços em frente ao corpo.
Seus olhos castanhos brilham em diversão e todos nós sabemos que
esse brilho sempre vem acompanhado de algo a mais. Ela passa a língua
pelo lábio inferior e se vira para Parker cochichando algo inaudível por
conta da música alta. Notando a loira se virar para nós, soube que meu
sossego havia acabado.
— Nós vamos dançar — anuncia Vee, alegremente. — Assim como
na minha primeira festa do ano passado. E dessa vez eu não vou quebrar a
sua cara, Parker.
Franzo o cenho, pronta para negar. Eu não sou uma boa versão de
mim quando estou bêbada e, nos últimos tempos, entrar no meio de
confusão, é de fato, algo que não estou a fim. Sobretudo sabendo o que
minhas amigas aprontam, quando estão no mesmo estado caótico que eu.
Sinto a mão de Hazel em meu antebraço, ergo meu olhar para ela, seus
grandes olhos escuros me indicam que lutar contra isso será uma causa
perdida, porque até mesmo ela já está com um sorriso parecido com o de
Parker, estampado em seu rosto.
— Eu tenho uma escolha? — indago, já sabendo a resposta.
O sorriso delas se alargam. É até mesmo assustador.
— Sim. — Vee inclina a cabeça para o lado. — Você pode escolher
tequila ou vodka.
Mesmo sem querer, solto uma gargalhada, porque definitivamente
não esperava por essa resposta. Mas essa é Verônica, a mulher que te
surpreende quando você menos espera.
Sabendo que não possuo saída para a nossa noite de garotas, seguro a
mão estendida de Verônica e nos viramos para descermos as escadas.
Caminhamos para o bar que não está tão lotado como a pista de
dança, e descanso meu cotovelo no balcão, observando o garçom servir
algumas doses de tequila e nos entregar o limão junto ao sal. Assim como
da primeira vez, seguramos o pequeno objeto e viramos o líquido de tom
dourado em nossa boca. A ardência do álcool é bem-vinda, fazendo meu
corpo ficar um pouco mais leve. Após as próximas doses, puxo-as para
podermos ir em direção a pista de dança.
Repentinamente, a melodia de The Monster começa a tocar nos quatro
cantos da pista de dança improvisada, fazendo nós quatro dançarmos em
sincronia. Verônica levanta as mãos para cima, quando a voz da cantora
Rihanna emite as estrofes do refrão, Hazel imita o movimento e Analu joga
a cabeça para trás com um largo sorriso, como se estivesse feliz por estar
envolta de pessoas que realmente se preocupam com ela.
A dança se estende por mais várias músicas. Até que em algum
momento da noite, sinto uma vontade irritante de ir ao banheiro e, mesmo
não desejando me separar delas, sou obrigada a seguir para o segundo andar
em direção ao corredor onde as pessoas não são autorizadas a entrarem.
Abaixo minha cabeça para procurar meu celular e, sem querer,
trombo com alguém, ao mesmo instante, sinto meu corpo se inclinar para
trás e amaldiçoo o álcool por se tornar meu inimigo e me fazer quase cair de
bunda no corredor elegante. Contudo, quando estou quase sentindo que o
chão é o meu destino, mãos fortes se fecham em minha cintura, forçando-
me a ficar em pé.
Sorrio abertamente e levanto meu rosto, prestes a agradecer ao
desconhecido que acaba de salvar minha bunda de um tombo. Mas quando
meu olhar se cruza com o responsável por tal ato e a imagem de uma pessoa
que reconheço bem invade meu campo de visão, o sorriso estampado em
meu rosto morre, fazendo com que uma careta de desgosto transforme meu
rosto.
Oliver Fodido Wright está parado a poucos centímetros de mim e
sorri convencido em minha direção. Nossos rostos estão perto um do outro,
fazendo-o ter acesso a suas lindas íris esverdeadas.
Culpo o álcool, o momento e até mesmo as lembranças por estudar
seus olhos com afeição e encontrar algo quente, sombrio e intimidador.
Ele inclina a cabeça devagar, mordendo o lábio inferior com a sua
habitual verificação das minhas roupas — uma ação que tenho a certeza de
que apenas realiza para me irritar. Ele começa pela saia preta com uma
pequena fenda na minha coxa, na camiseta branca do Homem-Aranha e por
fim, em minhas botas de cano curto.
— Você é um idiota — sussurro quase que inaudível.
— E você está bêbada — devolve o óbvio.
— Ainda assim, um idiota.
A palavra salta de meus lábios em um tom seco, enojado.
— É bom saber que sentiu saudades, loirinha — ele debocha, ainda
com o sorriso estampado em sua face.
Não respondo, apenas encaro seus lábios. Lábios carnudos que eu
poderia arrastar minha língua, enquanto provo outra vez de seu beijo. Subo
um pouco, voltando a mergulhar em seus incríveis olhos, percebendo que,
agora, suas pupilas estão dilatadas. Há desejo ali. Desejo quente e
imprevisível. Que vem acompanhado de uma certa rebeldia, como se
estivesse em guerra contra si mesmo, segurando a erupção que começa a
emergir dentro de seu peito. Como se pela primeira vez desde aquela noite,
ele sentisse isso, sentisse nós, e estivesse tão assustado como fiquei desde
que nossos corpos se tocaram pela primeira vez.
— Você já pode me soltar, Wright — grunho, dando um passo para
trás, me repreendendo por ter bebido demais.
— Você está estressadinha, loirinha — zomba, passando a mão pelo
relógio.
— É a sua presença que traz esse sentimento em mim — devolvo,
num tom sarcástico, sabendo que minha voz sai um pouco arrastada. —
Você acredita que por um instante, eu achei mesmo que Verônica havia
esquecido da sua existência e não o convidou para essa festa?
Oliver solta uma pequena gargalhada.
— Sinto muito por desapontá-la — debocha, dando um passo à frente.
— Preciso dizer que sua imaginação é tão criativa quanto suas respostas.
Os cantos da minha boca curvam-se em um sorriso frio.
— De fato. Mas, é uma pena que isso tenha acontecido apenas na
minha imaginação.
Ele não responde de imediato. Portanto, dou de ombros e o ignoro,
me preparando para seguir até o banheiro mais próximo e só então percebo
que Oliver não está sozinho.
Mesmo que não deva, olho de esgueira para um garoto da altura de
Edmund. O desconhecido retribui o olhar, fixando-se em minha direção e
sorri. Mesmo com o álcool nublando todo o meu organismo, posso perceber
o quão parecidos ele e Oliver são.
Mas, diferente dos olhos verdes que me atormentaram por um bom
tempo, os dele são acinzentados, um tom lindo, diferente de tudo o que eu
já presenciei. Os cabelos castanhos caem em sua testa e, quando ele dá um
passo em minha direção e me lança um sorriso galanteador, sei que
definitivamente é um Wright.
— Devi essere tu la bionda[3]? — questiona, sorrindo.
Ergo uma sobrancelha, lançando um olhar para que Oliver seja uma
boa pessoa na sua vida inútil e traduza o que o garoto proferiu. Contudo, o
idiota apenas sorri com a minha falta de prática no italiano.
Abro a boca para dizer algo que, com certeza, será a minha
humilhação gratuita, no mesmo instante que Wright revira os olhos e
resmunga para o irmão.
— Fale em inglês, Andrew — ordena, sorrindo e os olhos brilhando
num tom de sarcasmo. — Nem todos são competentes o suficiente para
decorarem mais do que a sua língua materna.
Filho de uma mãe.
— Oh, sinto muito que eu utilizo meu QI em coisas mais úteis do que
aprender idiomas nos quais eu não irei precisar, playboyzinho.
Ele escancara ainda mais seu sorriso, como se eu lhe tivesse dado as
respostas que tanto precisava em uma prova difícil.
— Me perdoe pelos modos de meu irmão. A cada dia que passa eu
acredito que ele não sabe se portar em meio a pessoas de forma educada —
Andrew alega. Seu sotaque é forte, como se não utilizasse muito a língua
materna.
— Eu não tenho como discordar disso — respondo, gargalhando.
Andrew, definitivamente, é o melhor integrante dos Wright. O irmão
caçula de Oliver ergue uma sobrancelha, umedece os lábios e por fim sorri,
calmo.
— Como eu ia perguntando, antes de saber que infelizmente você não
entende italiano — comenta, seus olhos brilham em algo que não sei como
descrever. — Você deve ser a loirinha?
Ergo uma sobrancelha para o garoto que é praticamente do meu
tamanho. Talvez eu esteja sendo precipitada demais ou talvez eu só não
goste dessa família, mas, quando lanço uma careta em direção a Andrew,
ele aumenta seu sorriso, ainda que seja mais doce do que o do irmão.
— Eu sou Summer. Não loirinha — resmungo.
Deus, eu realmente preciso parar de beber.
— Oh, você é exatamente como Ollie descreveu! — Gargalha,
jogando sua cabeça para trás.
Olho para Oliver, mantendo um semblante entediado, como se aquela
conversa estivesse se prolongando demais e quando seus olhos encontram
os meus, por um milésimo de segundo, juro que vejo a surpresa estampada
em suas íris verdes.
Ele não esperava que seu irmão soltasse essa frase, porém, sei que
Wright não demonstrará isso. Não. Ele não irá jogar esse jogo, no máximo,
sorrir após lançar uma resposta cínica para que ninguém perceba que algo o
incomodou.
E é isso o que ele faz, Oliver solta um suspiro rápido e abre a boca
para responder, pela primeira vez, sou mais rápida. Inclino um pouco a
cabeça para o lado e deixo que as mechas claras do meu cabelo caiam pelo
meu ombro, e solto o sorriso mais falso do mundo e umedeço meus lábios.
— Oh, então quer dizer que você anda falando sobre mim para as
pessoas, playboyzinho? — Meus olhos brilham, quando ele me encara com
um misto de surpresa e incômodo. — Eu achei que manteríamos a boca
fechada.
Passar o resto dos meus dias aqui?
Porque você me faz sentir como
Se eu estivesse impedido de entrar no céu
Por um longo tempo
Locked Out Of Heaven | Bruno Mars

Encaro Summer com uma sobrancelha arqueada e uma vontade


imensa de fazer com que Andrew evapore. Onde eu estava com a cabeça
quando decidi trazer meu irmão para a cidade onde todos meus amigos
moram e pensar que ele não iria aprontar nada?
Ainda mais quando meu pai o sondou para saber se meu sentimento
por Summer era real. Agora meu irmão caçula acha que estou caindo de
amores pela loira raivosa — e bêbada — que está parada à minha frente
com um sorriso maléfico no rosto perfeito e com seus olhos brilhantes em
uma pergunta silenciosa.
Claro.
A frase.
A fodida frase a qual proferi para ela na noite da fraternidade meses
atrás, deixando claro que aquilo que tivemos foi um erro e ela deveria
manter a boca fechada. Mas, agora, na verdade, as circunstâncias mudaram
e tudo faz parecer que dei com a língua nos dentes e contei sobre a nossa
noite.
A noite que nunca deveria ter acontecido. A noite na qual ela não
deveria ter visto as marcas e muito menos ter tentado me ajudar, porque não
preciso, e nem que as pessoas me encarem com pena, como se em algum
momento eu pudesse superar aquele dia. Superar como todas as minhas
dores foram derramadas sobre minha pele por algo que eu não tinha
controle, não era o culpado.
— Acho que chegamos à conclusão de que somos péssimos
seguindo acordos, loirinha — digo com um sorriso falso, ao mesmo tempo,
ela ergue uma sobrancelha. — Aliás, onde está Levi?
Summer ergue o queixo, me fuzilando. É como se achasse que
apenas isso pudesse me matar ou me afastar. Mas, para sua decepção, não
me abalo, tampouco dou um passo para trás. Me inclino um pouco para
frente, fazendo ela perder a paciência, porém nunca quebrar a nossa
conexão.
A posição que estamos me dá a liberdade de estudar todo o seu
rosto, desde a pele clara envolta em um pequeno número de sardas aos
olhos castanhos que possuem um brilho que poderia ser considerado a
construção de uma nova via láctea.
Não posso e não consigo deixar de admirá-la.
Uma respiração profunda sai de sua boca em formato de coração,
um pouco antes dela se tornar uma linha reta e até mesmo levanto um
pouco o rosto a fim de me afastar.
— Vá para o inferno, Wright!
Um sorriso de canto cruza os meus lábios.
— Eu já vivo nele, loirinha — respondo lhe lançando uma
piscadela. — Mas, você é minha convidada para apreciar os prazeres do
submundo.
Seus olhos se semicerram, enquanto estala a língua no céu da boca.
— Não ouse flertar comigo — resmunga irritada, me lançando uma
careta.
— Acredite em mim, Summer — minha voz sai baixa o suficiente
para que apenas ela escute — Você saberia se eu estivesse flertando com
você.
Se Andrew fosse inteligente o suficiente, ele perceberia que todas as
palavras proferidas por nosso pai sobre o meu sentimento relacionado à
loira à minha frente, é uma bela mentira. Meu rosto e o de Summer
transmitem a indiferença gritante entre nós, mesmo que todo o nosso corpo
diga o contrário.
Porque nós dois somos isso.
Somos duas pessoas que não deveriam se desejar, mas que se
desejam.
Duas pessoas em polos opostos, como Yin e Yang. Enquanto, eu
represento o yin por ser a escuridão, Summer é o yang, é a claridade, a
personificação de coisas boas e felizes.
A pior parte de sermos assim, é por sabemos que, quando os opostos
se atraem, não é bonito, não é conto de fadas ou clichês ambulantes. Não.
Na realidade, eles se estragam e deixam pedaços de indecisões no meio do
caminho.
Prefiro conviver com o sentimento amargo pairando entre nós
desde aquela noite, a ter de lidar com coisas confusas. Por mais que eu
deseje Summer e saiba que é recíproco, o lado apagado do meu coração, me
diz que ela será tudo que evitei a minha vida toda e não estou disposto a
entrar nesse mar aberto, mesmo que eu precise ser resgatado.
— Eu acho que estou indo aproveitar a festa — a voz do meu irmão
alcança meus ouvidos e chama minha atenção.
Encontro seu rosto com uma das sobrancelhas arqueadas e um olhar
debochado que corria do meu corpo para o de Summer, inegavelmente
próximo, sem que eu ou a loirinha tivéssemos percebido. Sum me encara
surpresa por também não ter percebido esse detalhe e engole em seco,
dando um passo para trás, para longe de mim, liberando a passagem do
corredor e fazendo com que toda a tensão sumisse do ambiente.
De repente, uma porta se abre no fim do enorme corredor e a
imagem de Melany Underwood faz com que todos nós a encaremos
confusos. Ela dá alguns passos em nossa direção e depois de alguns
segundos para ao lado de Summer, puxando as mangas do seu vestido até
seu pulso, ajeitando o rabo de cavalo em seguida.
— Alguém de vocês viu meu irmão? — questiona, franzindo o nariz
delicado e erguendo os olhos azuis, idênticos aos de Logan em minha
direção.
Inclino minha cabeça para o lado, puxando em minhas memórias
onde eu havia visto o capitão da SVU pela última vez e não tenho êxito.
Mas antes mesmo que eu possa respondê-la, a voz arrastada de Summer
ecoa no corredor:
— Ele e Verônica não irão gostar de saber que está descendo para o
primeiro andar, Mel — repreende.
A caçula dos Underwood dá de ombros.
— Estava indo para a sala de cinema — comunica. — Mas preciso
avisar a ele que Audrey está vindo me buscar em alguns minutos.
— Porque diabos você está escondida aqui em cima durante uma
festa, Mel? — indago curioso.
Ela suspira fundo, deixando os ombros caírem.
— Porque Audrey está num encontro e eu não queria ficar com
Aidan. — Ela me encara. — Achei que meu irmão iria permitir que eu
curtisse a festa com vocês, mas ele nem ao menos me deixou ficar lá
embaixo.
Solto um pequeno riso.
— Você esperava que ele e Verônica deixassem você no meio de
vários universitários bêbados? — questiono, erguendo uma sobrancelha.
— Talvez.
Céus.
Summer maneia a cabeça, como se também segurasse uma risada
assim como eu, logo depois ergue seu celular, digitando algo rapidamente,
em poucos segundos, o objeto emite um toque e ela ergue o rosto,
encarando Mel.
— Logan vai nos encontrar em alguns minutos — anuncia. —
Apenas fique aqui.
Mel assente e de relance vejo Andrew inclinar o corpo, olhando em
sua direção, sorrindo. Um sorriso verdadeiro, como se tivesse encontrado a
sua parceira perfeita para as férias. Meu irmão dá dois passos longos e para
em frente a ela, ao lado de Summer, estudando a adolescente com
curiosidade.
Ao contrário dele, Melany inclina a cabeça para o lado devagar,
lançando um olhar desconfiado ao meu irmão. Isso me faz querer sorrir,
afinal, todos sabemos que a caçula dos Underwood é como seus irmãos. Ela
não confia facilmente, não abrirá mil sorrisos apenas porque meu irmão está
direcionando um. Mel o sondará e descobrirá se ele é uma pessoa a qual
deixará entrar em seu ciclo.
— Olá — cumprimenta, com um sorriso largo. — Eu sou Andrew.
— Melany. — Ela levanta o braço para cumprimentá-lo, mas Andi é
mais rápido e a puxa para um abraço.
Mel arregala os olhos, assustada, não retribuindo o aperto. Ela me
lança um olhar de “que porra é essa?”. Suspiro fundo, mas, antes que eu
tenha a oportunidade de mandá-lo se afastar, meu irmão dá um passo para
trás, arruma sua roupa e olha para ela com aqueles olhos acinzentados e
brilhantes.
— É um prazer conhecer a minha nova melhor amiga, Melany —
ele sorri abertamente.
— Nós não somos amigos — ela devolve com uma careta.
— Ainda.
Levo a mão até a ponte do meu nariz, apertando-o, e fecho meus
olhos. Andrew Wright, será de fato uma dor na minha bunda o resto das
férias.
Mas quando volto a olhá-los, vejo Mel o encarando com
curiosidade. E mesmo que eu queira negar, uma parte de mim, deseja
mesmo que eles possam ser amigos, possam ter um elo como tenho com
Vee e Summer com Logan. Ainda mais agora que Andrew está
definitivamente de volta a Saint Vincent.
De relance vejo Logan se aproximar. Ele caminha pelo ambiente,
tranquilo, enquanto digita algo no celular e segura uma long neck em uma
das mãos. Ao seu lado, Verônica se equilibra em seu salto e diz algo para
seu namorado que o faz erguer uma sobrancelha e então soltar um sorriso
em sua direção.
Rolo meus olhos, entediado.
— Você está de volta? — Underwood questiona, parando ao meu
lado.
— Surpresa! — comemoro, sarcasticamente.
— Deixe-o em paz, capitão — Vee fala, passando por ele e parando
a minha frente. — Bem-vindo de volta, Ollie!
Solto um sorriso para a minha melhor amiga que está claramente tão
bêbada quanto Summer.
— É sempre bom estar de volta, Pequena Blackwell! — murmuro,
sarcasticamente.
Ela se vira para meu irmão.
— Oi, Andi. — Vee dá um passo em direção ao meu irmão. — Você
ainda continua um pirralho.
Ele sorri, passando a mão pelo cabelo castanho claro.
— E eu fiquei sabendo que você agora é uma pessoa comprometida.
— Andrew leva a mão até o coração. — Como vou viver sabendo que o
grande amor da minha vida não me ama mais?
Verônica pende a cabeça para trás, gargalhando. E logo após, o puxa
para um abraço.
— E eu aqui achando que eu você tinha se apaixonado por aquele
seu colega de quarto em Milão.
As bochechas de Andrew enrubescem. E Vee aumenta o seu sorriso,
enquanto se vira para Mel.
— Vejo que já conheceu a minha nova amiga — ela diz puxando
Mel para perto de si. — Mel, conheça Andi. Andi, conheça Mel.
— Eu já a conheci. — Ele sorri. — Ela agora é a minha nova melhor
amiga.
— E lá vamos nós novamente... — Summer solta uma lufada de ar,
erguendo o queixo.
Logan olha para sua amiga e ergue uma sobrancelha, logo após,
encara meu irmão enquanto lança a ele um sorriso zombeteiro.
— Ela é? — Underwood questiona, levando uma das mãos até o
queixo e passando o dedo anelar pela sua mandíbula. — Eu não sabia que
estava fazendo novos amigos, Mel.
Sua irmã solta um bufo.
— Ele não é meu amigo! — exclama.
Andi solta um sorriso descarado.
— Novamente: ainda não somos. — Dá de ombros.
Verônica solta uma gargalhada.
— Oh, eu conheço esse diálogo — conclui, levando seu copo até os
lábios. — E estou ansiosa para ver como isso vai se desenrolar.
Summer se encosta na parede, entediada. E agora, enquanto a
observo de relance, me pergunto o que estava fazendo no corredor sozinha.
Porém a voz de Logan, faz com que minha atenção se volte para frente:
— Audrey está te esperando — comunica em direção a Mel. —
Vamos?
Ela nem mesmo responde, apenas se vira e segue com seu irmão em
direção ao primeiro andar. Enquanto observo Summer ir até a porta de um
dos quartos de hóspedes e Andrew ir em direção ao quarto de Edmund,
onde o caçula dos Blackwell está trancado lá desde o começo da festa.
Quando volto meu olhar para Vee, ela está me encarando sobre a borda do
copo. Seus olhos castanhos brilham em perguntas que sei que está prestes a
proferir.
— Bem, agora que estamos sozinhos — ela começa. — Você vai me
contar o porquê diabos voltou sem me avisar?

Existem três coisas que odeio firmemente.


1) Brandon Wright.
2) O dia vinte e um de março.
3) Estar sóbrio em uma festa repleta de pessoas bêbadas.
E a terceira coisa é o que está acontecendo nesse momento,
enquanto estou sentado em frente a uma enorme mesa de pôquer, ao lado de
Dylan e Logan que encaram três integrantes da equipe de natação de Levi,
com uma expressão de desinteresse, como se o jogo já estivesse ganho.
Josh está tão bêbado que não faço a mínima ideia de como ainda
consegue se manter de pé. Seus passos incertos até que se escore, entre
Logan e eu na mesa, arranca um leve sorriso do meu rosto. Que tende a
aumentar, quando ele faz uma concha com as mãos para apoiar o queixo e
sorrir em direção aos nossos adversários.
— Digam-me cavalheiros, vocês estão prontos para perderem
para… — ele se vira, contando quantos somos — Os universitários mais
famosos da SVU que estão bêbados e entediados?
Ergo uma sobrancelha, Logan o encara confuso e Dylan joga a
cabeça para trás, soltando uma gargalhada. Porque de todos, o único bêbado
é Brown. Pelo menos era isso o que pensávamos, até um barulho de uma
música ecoar pelo salão, fazendo todos nós olharmos para o bar. Para onde
a melodia de IDGAF, da cantora Dua Lipa, toca nos quatro cantos do salão
e a imagem de quatro mulheres conhecidas por nós se destacam entre o
aglomerado de pessoas.
Summer, Verônica, Hazel e Analu estão em cima de uma fodida
mesa de jogo, dançando como se suas vidas dependessem disso. Eu,
definitivamente, gostaria de poder entender o porque que essas garotas
gostam tanto de dançar em cima de uma mesa, já que, pelas minhas contas,
é a terceira vez que, pelo menos, duas delas fazem isso.
Hazel levanta as mãos para cima balançando o quadril e quase se
desequilibra. O ocorrido faz nós quatro praticamente corrermos até elas,
inclusive Josh, que não está são, nos alcança em tempo recorde. Assim que
paramos em frente as garotas, Dylan escora na madeira, olhando para cima,
em direção a sua namorada e eu concluo que nenhuma delas chegará até o
fim dessa festa.
Logan suspira fundo, cruzando os braços frente ao corpo, fitando
Vee.
— Eu não posso deixá-la sozinha por um momento, anjo? —
questiona, sorrindo para a sua namorada.
— Eu não tenho culpa se as nossas mesas são confortáveis para
dançar, capitão — ela responde, dando de ombros e leva a garrafa até seus
lábios. — Parker, nós precisamos de outra música!
Analu gargalha de maneira genuína. De uma forma que nunca
havíamos escutado. Até mesmo Dylan a encara por um tempo, como se pela
primeira vez em anos, a enxergasse sem suas máscaras.
— Hazel, amor, por mais que você fique incrível aí em cima —
Dylan diz, repuxando os lábios — Acho melhor descer e continuar, seja lá o
que pretendiam fazer, aqui embaixo.
— Puff, não! Aqui é tão confortável, baby — Hazel responde, com
uma voz arrastada. — Vocês serão amigos bonzinhos e nos deixarão ficar
aqui, não é?
Meu Deus, isso está saindo do controle. Deixo um arranhar de
garganta chamar a atenção delas para mim, e solto o meu melhor sorriso.
— Eu odeio ser o vilão desta situação, mas eu não estou a fim de
estar em cada stories desse campus amanhã de manhã, Haz — conto,
orando para que elas me escutem.
Ela franze o cenho, me encarando. Destacando seus grandes olhos
escuros.
— Oi, Ollie! — exclama depois de alguns segundos. — Eu estava
sentindo sua falta.
Solto uma pequena risada.
— Eu também estava, Haz. Que tal você descer daí e conversamos
aqui embaixo?
Mas, é óbvio que isso não acontece, pelo contrário, ela dá de ombros
de novo e volta a tomar sua bebida como se não existíssemos. Já Analu
aponta para o barman do outro lado do salão, dando-lhe uma piscadela,
agradecendo por algo, enquanto Hazel e Verônica, em desespero, tentam
lutar contra seus namorados para deixá-las onde estão.
Summer que se manteve quieta até o momento, morde o lábio
inferior, dando um passo até onde estou e se abaixa com calma, ignorando
todo o falatório entre nossos amigos. Ela para o rosto perto do meu, dando-
me acesso a suas lindas íris castanhas para que eu estude seus olhos com
esmero, talvez até mesmo com um vislumbre de algo incompreensível.
— Você é um idiota — sussurra a mesma frase de horas antes.
— E você está bêbada — devolvo, novamente. — É quase que
decadente, loirinha.
— Eu sei, dizem que não sou uma versão boa de mim mesma,
quando estou nesse estado — sua voz sai baixa.
— Ninguém é. — Solto um sorriso fraco. — Você até mesmo está
me tratando bem.
Ela não diz nada. Aproveito esse pequeno silêncio para voltar a
estudá-la.
Suas bochechas ainda estão coradas pelos movimentos da dança
com as garotas.
Summer é incrivelmente linda, uma beleza que eu poderia ficar
horas admirando, e, mesmo assim, acharia pouco. Porque ela é um belo
exemplo de algo que almejamos e nem sabemos o motivo. É como se a cada
vez que seus olhos criassem uma conexão com os meus, minha pele
queimasse e uma eletricidade corresse pelo meu corpo, se transformando
em urgência.
É como se nesse mero segundo nos tornássemos únicos.
— Você pode me levar para casa?
Seu pedido repentino faz uma curiosidade pairar em meu peito e
todos meus pensamentos evaporarem.
— Você quer ir?
— Eu preciso.
Ela encara meus lábios como naquela noite. A noite em que
permitimos deixar de sentir o vazio e preenchemos com urgência os espaços
vagos de nossas almas. Me permito lembrar de como Summer Miller me fez
sentir algo que eu achei que seria impossível.
Ela nos fez abrigar um universo inteiro. Naquele pequeno instante,
por uma noite, Summer me fez sentir como se estivéssemos criando um
cosmos em uma linha tênue. E talvez, pela primeira vez,
momentaneamente, eu tive a sensação de não sentir o vazio, mas sim, um
sentimento estranho e quente, uma agitação que deveria permanecer morta.
Que eu prometi deixar morta.
Isso é algo que eu não deveria sentir e muito menos, almejar por
mais.
Porque é como uma chama esquecida em meio a cinzas de um
incêndio.
Uma porta para o inferno com passagem apenas de ida.
— Por quê? — murmuro, rouco.
— Por sua causa.
Ergo uma sobrancelha, confuso.
— Minha?
— Sim.
— Seja específica, Sum!
— Você não deveria ter voltado. — Ela suspira contra meu rosto. —
Não hoje, pelo menos.
Cerro os olhos, confuso.
— Devo perguntar o por quê?
— Porque se eu ficar ainda mais bêbada, irei querer foder com você
novamente, Ollie — Summer arrasta a língua pelo lábio de forma sensual e
logo após, volta a murmurar com a voz aveludada. — E eu não pretendo
cometer esse erro duas vezes.
Suas palavras são calmas, como uma súplica e mesmo que bêbada,
ela deixasse que eu pudesse ver o que se passa dentro dela.
Ela me deseja tanto quanto eu a desejo. Mas sabe que não devemos
almejar por isso, sabe que não podemos ter aquilo novamente. E eu deveria
ficar feliz. Porra, ela é a pessoa que eu não poderia ter por perto, porque,
por mais que a deseje, Summer é a personificação do que odeio. Contudo,
não é isso que acontece, porque, em todas às vezes, uma queimação
estranha corre pela minha veia, um gosto ruim sobe pela minha garganta e
as palavras quase sempre ficam presas em meus lábios.
Eu preciso dizer que a odeio, preciso acreditar nisso tanto quanto
preciso mantê-la longe de mim.
Para o bem do que irei propor à ela assim que estiver sã.
— Não pretendo levá-la para cama novamente, loirinha, pode ficar
tranquila em relação a isso.
Seus olhos vão de quentes como inferno para gelados como um
iceberg. Por algum motivo, me sinto mal em ter proferido tais palavras.
Porém, mesmo bêbada, Summer deixa que os sentimentos bons sobre mim
que pulsavam em suas veias, morram.
Ela pisca devagar, logo após me lança um olhar cético, ao passo que
inclina a cabeça para o lado, me dando a visão do seu fodido sorriso sensual
e morde o lábio inferior.
Summer Miller tem um rosto angelical, mas os olhos são de uma
exímia perversidade.
— É uma pena, Wright, que eu irei precisar procurar algum
universitário para me comer essa noite então — sussurra, maliciosamente.
Puta que pariu.
Definitivamente eu odeio a versão de Summer bêbada.
Na verdade, eu odeio Summer Miller de todas as formas.
Odeio que a deseje. Odeio que não possa suncubir a isso. Odeio que
seja a única com poder sobre mim.
Suspiro fundo e ergo o braço para ajudá-la a descer e, quando suas
mãos delicadas o seguram, uma corrente de energia começa a correr por
todo o meu corpo. Levanto meu rosto, quase chocando com o dela e, por
um instante, tudo para.
Por preferir manter tudo sob controle, apenas ajudo a descer da
mesa e assim que está no chão de novo, me viro, dando-lhe as costas, indo
em direção ao bar do outro lado do salão e pego uma garrafa de Bourbon.
No fundo, eu sei que se me permitir cair na tentação que Summer
Miller é, definitivamente, estarei arruinado por completo.
E eu sei, você sabe, nós sabemos
Você não queria ficar para sempre e está tudo bem
Eu sei, você sabe, nós sabemos
Que não fomos feitos um para o outro e está tudo bem?
If The World Was Ending | Jp Faxe feat Julia Michael

Eu odeio estar de ressaca.


É a primeira coisa que constato quando abro meus olhos na manhã
seguinte à noite da festa. Minha mente é um borrão de memórias
constrangedoras desde o momento em que comecei a beber até quando as
garotas me puxaram para dançar descontroladamente e o álcool nublou todo
o meu julgamento.
Me viro devagar na cama, espreguiçando meu corpo, mas, de
repente, congelo. Um tremor extremo atinge meu corpo e engulo seco
quando sinto uma mão por cima do edredom, pousar sobre minha barriga,
enquanto alguém está adormecido ao meu lado. Olho de relance por cima
do meu ombro, orando para que não seja quem estou pensando. Solto uma
série de palavrões, quando a imagem de Oliver Wright dormindo ao meu
lado invade o meu campo de visão.
Mas que porra!
Ele suspira e meus olhos vagam pelas roupas que traja, a sensação
de alívio toma conta do meu sistema, quando percebo serem as mesmas
roupas de ontem à noite. Ao menos, mesmo que estivéssemos bêbados além
da razão, não tomamos nenhuma atitude imprudente ou ainda mais
constrangedora.
Aproveito que o idiota não demonstra sinais de estar acordado para
esquadrinhar seu rosto com calma. O nariz um pouco arrebitado, os cabelos
loiros sujos e a boca carnuda entreaberta, por conta de sua respiração lenta,
me fazem inclinar minha cabeça, fascinada, apreciando sua essência nua,
leve e corajosa. Ele se vira um pouco para o lado, fazendo com que algumas
mechas caiam sobre sua testa e mesmo eu sabendo que o homem
adormecido ao meu lado contém toda a minha aversão, nunca poderei negar
o quão atraente ele é.
— Você já acabou de me encarar como se eu fosse seu experimento
científico ou eu preciso fingir que estou dormindo por mais algum tempo?
— murmura sonolento.
Praticamente dou um sobressalto, enquanto Oliver solta um meio
sorriso e se senta na cama, passando as mãos pelo rosto amassado em
decorrência do sono, tentando aliviar um pouco da ressaca iminente que,
assim como a minha, irá o acompanhar por toda a manhã.
— O que você está fazendo aqui? — questiono, ignorando que fui
pega em um momento constrangedor.
— Dormindo? — responde, como se fosse óbvio.
— Existem inúmeros outros quartos, Oliver.
— Loirinha — cantarola. Sua voz rouca traz uma chama para o meu
núcleo. — Seja mais gentil. Eu fui o responsável por trazê-la para o quarto
antes que caísse em um coma alcoólico.
Levanto uma sobrancelha.
— E após me deixar, você não se dignou a ir para o seu próprio
quarto? — Me coloco de pé antes que eu tenha uma síncope.
— Eu estou no meu quarto. — Volto o meu olhar incrédulo para ele.
Penso, por um momento, que está mentindo. Merda, eu aceitaria
qualquer mentira para fugir daqui nesse exato momento. Porém, quando
finalmente olho para a decoração do ambiente, percebo que não se trata
disso, por conhecer quase todos os quartos da mansão dos Blackwell, tenho
a total convicção de que esse não é o que escolhi na noite passada.
Suspiro fundo, pegando meu sapato do chão e me levanto na
intenção de caminhar até a porta, antes que o constrangimento por ter, mais
uma vez, adormecido em um quarto ao lado de Oliver Wright se aposse do
meu corpo. Porém, no instante em que estou quase alcançando a maçaneta,
a sua voz volta a me estagnar no lugar.
— Nós precisamos conversar — anuncia.
Deus, que eu não tenha perdido o resto da minha dignidade na noite
passada.
— Conversar? — devolvo, olhando por cima do ombro. A palavra
sai mais como uma pergunta do que uma afirmação.
— Sim.
— Seja mais específico, Oliver.
Ele puxa o ar, se levantando e vindo até mim. Seus passos são
rígidos e percebo uma leve tensão em seus ombros. Por um momento,
penso em todas as possibilidades do porquê Oliver deseja conversar
comigo. Contudo, quando ele ergue o queixo e sussurra as suas próximas
palavras, eu tenho vontade de gargalhar:
— Preciso de sua ajuda — solta rápido o suficiente para que eu erga,
mais uma vez, uma sobrancelha em descrença.
Passo minha língua pelo dente, inclinando a cabeça e lançando-lhe
um olhar porco, ao passo que ergo os ombros e me viro para sair,
procurando colocar uma longa distância entre nós dois.
— A resposta é não — praguejo, já do lado de fora.
Nem ao menos perco meu precioso tempo questionando o motivo
pelo qual necessita da minha ajuda, apenas dou de ombros e continuo dando
passos grandes até a porta do meu verdadeiro quarto. Assim que paro em
frente à minha porta e seguro a maçaneta, me preparando para evitá-lo e
deixá-lo com seus problemas, sinto sua presença atrás de mim.
— Eu tenho uma proposta para te fazer. — Suspira, assim que abro
a porta.
Ok, vai ser do jeito mais difícil.
Me viro totalmente em sua direção, quase que fundindo nossos
corpos e relembro o quão cheiroso esse idiota é. O aroma cítrico de madeira
rompe minhas narinas, trazendo consigo uma explosão de memórias de
como fomos um encaixe perfeito durante um momento que deveria ser
considerado ínfimo.
— Vamos deixar uma coisa bem clara aqui, Oliver — desdenho,
nervosa por conta da enxurrada de recordações, sabendo que minhas
próximas palavras não serão gentis aos seus ouvidos. — Eu não gosto de
você, não pretendo gostar e sei que o sentimento é mútuo. Porém, temos
amigos pelos quais colocaríamos o mundo em chamas para vê-los felizes,
mas, isso não significa que você precise ser um príncipe encantado comigo,
só porque transamos quando estávamos precisando de uma distração ou um
amigo que vá me dar um ombro para deitar se eu estiver triste — maneio
minhas mãos, enquanto profiro minhas próprias palavras. — Então,
obrigada por me ajudar ontem. Mas, pare com o que seja lá o que esteja
querendo fazer e não tente me pedir favores. Porque definitivamente, não
estou te ajudando com nada.
Oliver me encara por alguns segundos, atônito. Como se estivesse
decidindo suas próximas ações. E eu, do fundo do meu coração, desejo que
ele se vire e vá embora. Não quero ser alvo de suas palavras torcidas,
quando ele decidir que esse estranho momento entre nós não é mais o
suficiente para manter seu tom grosseiro sob controle. Já vi o homem por
trás da máscara e não quero ter outro vislumbre. Contudo, ele não faz isso,
Oliver ergue o queixo, me encarando friamente.
— Eu não sou um príncipe encantado, Miller. E você sabe
perfeitamente bem disso. Não tente ser espertinha — devolve, abaixando
seu rosto alguns centímetros, para que ficássemos cara a cara. Sua voz
ressoa no corredor vazio como se fosse uma substância tóxica sendo
aplicado direto nas minhas veias. É um tom letal, desprovido de qualquer
emoção. — E acredite quando digo que pedir a sua ajuda é um ato no qual
não me traz ânimo, tampouco felicidade. Porque eu prefiro mil vezes estar
ao lado de qualquer outra garota, do que ser obrigado a estar ao seu.
Suas palavras não deveriam me afetar, não deveriam significar nada
para mim e exatamente, por isso, engulo todas as emoções que ameaçam
transbordar do muro construído em volta do meu coração e solto um sorriso
frio ao mesmo tempo que dou um passo atrás.
— Bem, então nesse caso… — Seguro a porta do meu quarto. —
Espero que todas essas garotas possam te ajudar.
Ele abre a boca para responder, mas sou mais rápida. Porque no
segundo seguinte, dou um passo para trás e bato à porta fortemente em seu
rosto. Fazendo ele ficar encarando a madeira.
Passo a mão pelo meu rosto, durante o caminho até minha mala.
Retiro uma blusa preta e vermelha com a estampa da Marvel. Preciso
urgentemente de um banho! Então poderei ir até a casa dos meus pais para o
nosso café da manhã obrigatório, antes que eles encham a minha caixa de
mensagens.
Contudo, batidas incessantes na porta aumentam a cada segundo,
como se Oliver estivesse implorando para ser assassinado da forma mais
trivial que eu encontrar. Jogando a roupa em cima da minha cama, tento
ignorar o barulho azucrinante, mas, Wright é irritante em um nível
insuportável. Diante disso, me viro, com a paciência já esgotada, e ando a
passos nervosos até a porta, escancarando-a com uma expressão feroz,
pronta para atacá-lo caso ele não me dê sossego.
— Me. Deixe. Em. Paz! — pontuo pausadamente, tentando não
gritar com o loiro a minha frente e alertar aos nossos amigos que estou
prestes a cometer um homicídio doloso.
— Eu preciso da sua ajuda — ele me ignora, repetindo a frase que
havia proferido há alguns minutos.
— A resposta continua sendo a mesma: não!
— Vamos lá, Summer.
— Não, Oliver.
— Eu tenho ótimos argumentos para te convencer — conta,
enquanto me lança uma piscadela e sorri convencido.
— Oliver, eu não estou com a mínima paciência para lidar com a
sua troca de humor matinal — resmungo, segurando a porta com força,
chegando a deixar a ponta dos meus dedos brancos. — Então me faça um
favor, esqueça da minha existência e suma da porra do meu quarto, antes
que eu acorde todos na base de gritos.
Deixando o sorriso cair por terra, Oliver leva a mão até sua nuca e a
coça. Mas, quando aquelas malditas íris verdes voltam a encontrar o
castanho dos meus olhos, eu me arrependo amargamente por ter aberto essa
porta.
Eu deveria ter deixado ele esmurrar a madeira até que Vee escutasse
ou Dylan o expulsasse por causar danos em sua casa. No instante que
Oliver Wright abre aqueles lábios, juro a mim mesmo que seria presa, senão
por espancamento, seria muito bem pelo assassinato de um dos maiores
herdeiros da parte alta de Saint Vincent.
— Eu posso ter dito ao meu pai que estamos em um relacionamento
— sua voz é baixa, quase um sussurro. — Um relacionamento bem sério.
Semicerro os olhos, encarando o rosto perfeito de Oliver, enquanto
vasculho minha memória para me lembrar se eu realmente entrei em um
coma alcoólico e estou sonhando com toda essa atrocidade, ou algo que me
indique que talvez eu tenha sido drogada durante a festa.
Mas, não. Nada. Nenhum resquício de insanidade ou sintomas me
indicam que passei por algo semelhante. Só há um idiota na minha frente
que me encara. Seus olhos são preocupados, quase imaginando o que eu
faria depois que ele me confidenciou isso.
Ah, ele nem imagina o que está por vir.
Levo minhas mãos até a gola de sua camisa e o puxo de forma
agressiva para dentro do meu quarto, chutando a porta atrás de mim com
uma força sobrenatural. E quando a madeira se choca contra o batente,
causando um barulho ensurdecedor, Oliver entende que ele havia irritado a
pessoa errada.
— Você. Fez. O. Quê? — grito cada palavra saindo em ênfase,
largando-o e dando um passo para trás, frustrada.
Ele passa a mão pela blusa, agora, toda amarrotada e toma uma
longa pausa.
— Eu... Sum, entenda que a situação pedia uma medida drástica —
ele cita o ditado popular sorrindo. Oliver Maldito Wright está sorrindo ao
passo que me diz ter inventado a maior das barbaridades, não para qualquer
pessoa, mas, para um maldito homem que quase destruiu o relacionamento
dos meus melhores amigos há menos de um mês. — E, por favor, não haja
como se eu fosse o único a usar a nossa transa para benefício próprio.
Porque, se não me falha a memória, você fez exatamente o mesmo quando
Levi se declarou.
Não só uma vez, mas, dezenas de vezes, tentando não o agredir.
Porque eu não só vou agredir Oliver, como vou matá-lo, depois desmembrá-
lo da forma mais lenta o possível para depois jogar seus pedaços para
animais famintos e apreciar cada momento.
— Eu fiz isso em frente aos nossos amigos, Oliver. Em frente a
pessoas que eu confio e principalmente, na frente de pessoas que nunca
acreditariam que realmente temos algo — minha voz saí alta, quase que em
um grito histérico. — Qual a porra do seu problema? Ou melhor, onde
caralhos você estava com a cabeça de me colocar na merda das suas
confusões?
Ele me encara nervoso, como se eu não tivesse o direito de agir
assim, como se sua atitude fosse o mesmo que pedir um café numa manhã
de segunda, um ato habitual.
— Oh, certo, então eu posso ser um meio para um fim quando é a
sua bunda que está com problemas, mas você não pode ser para mim? —
ele questiona sarcasticamente, apontando para si mesmo. — Bem, deixe-me
esclarecer, Summer: não é assim que as coisas funcionam!
— Oliver, não me irrite mais do que já me irritou.
— Não foda comigo também, Summer — contrapõe, passando a
mão pelo seu rosto e quando ergue o queixo, me encara sério. — Eu me
recuso a discutir com você quando, na verdade, tenho a solução perfeita
para nossos problemas. Então, no momento em que finalmente parar com
esse surto infantil, talvez possamos conversar como os adultos que somos e
chegar a um acordo.
Minha cabeça cai para trás, fecho meus olhos e solto uma
gargalhada histérica. Eu não posso estar passando por isso. Não. Não posso
acreditar que estou parada em um quarto na casa de Verônica, discutindo
com o único homem que consegue me fazer sentir prestes a entrar em
combustão.
— Nós não somos e nem seremos um casal. Muito menos teremos
uma solução perfeita para nada, Oliver. — Suspiro cansada. — Você se
colocou nesse problema, então, faça-me um favor, e se retire dele sozinho.
— Eu posso fazer com que Levi tire da cabeça a ideia de que vocês
possam ser algo a mais — diz, de repente.
Meu sangue ferve.
Ergo o queixo, olhando para cima, direto para seus olhos. Ele não
tem o direito de se intrometer nessa história. Ele nem ao menos deveria
cogitar a ideia de que pode se colocar entre mim e Levi. Não quando eu já
tinha sido idiota o suficiente para magoar meu melhor amigo com aquela
confissão que achava que seria boa, mas que, na verdade, apenas serviu
para me mostrar o quão vazia sou.
Que, quando eu deveria ter priorizado salvar seus sentimentos,
preferi machucá-lo, preferi que ele se mantivesse longe da minha verdadeira
face, aquela que mantenho para mim sob as máscaras gentis que visto para
aguentar tudo que carrego comigo.
Porque isso é mais fácil, É fácil fingir ser a garota perfeita, a que
não comete erros e sorri para todos. É muito fácil manter esse personagem,
contudo, quando fecho meus olhos ou encaro meu reflexo no espelho, posso
ver por baixo da fachada de perfeição, enxergando que ainda sou uma bela
mentirosa.
Uma mentira que sustento para todos, até mesmo para a minha
família, aquela que se preocupa comigo, que me liga todo dia para saber se
estou bem ou se me joguei no meu próprio poço de lamentações. E, por
conta disso, nunca poderei contar a verdade, contar que guardo cicatrizes
profundas em minha alma desde a minha infância. E que a cada novo dia,
cada vez que o meu pulmão se enche de oxigênio, é como se eu precisasse
provar para mim mesmo que superei o meu passado e que por baixo das
roupas largas e blusas de super-heróis, não estou quebrada, vazia e pior de
tudo, danificada.
— Eu não preciso da sua ajuda — pigarreio, tentando afastar todos
os pensamentos que se instalaram na minha mente.
— Você precisa.
— Não, não preciso.
Oliver suspira, parecendo cansado.
— Summer, apenas me ouça, ok? — diz, como se pela primeira vez,
ele me mostrasse que não desistiria desse assunto e que repetiria quantas
vezes fosse necessário. — Então, você decidirá se vai chutar a minha bunda
ou me ajudar.
Olho para Oliver, derrotada. Ele acabou de acertar uma cicatriz,
acabou de fazer com que tudo que estou evitando, inunde meus
pensamentos. E eu estou cansada. Cansada de andar em corda bamba com
Levi, de ter todos me encarando como se eu fosse quebrar a qualquer
momento, porque meu melhor amigo se apaixonou por mim. Estou apenas a
ponto de jogar tudo para o ar e fugir dos meus problemas.
Talvez por isso, por me sentir desta forma, eu apenas assinto,
fazendo com que Oliver ajeite sua postura e continue:
— Eu preciso da sua ajuda porque sei que não espera que eu te
prometa amor eterno, nem que ao menos achará que esse relacionamento
será verdadeiro ou de longo prazo — sua voz é calma, profunda. — Eu
apenas preciso que finja ser minha namorada e me acompanhe em alguns
bailes que a parte alta vai promover, para que meu pai não fique em cima de
mim. E você precisa que o Levi entenda que você não pode ou não quer
retribuir o sentimento, que não irá cruzar a barreira da amizade. O que é
melhor do que isso? Do que ele achar que você está namorando comigo?
Que você está apaixonada por mim desde aquela festa?
Levo a mão até o meu rosto, coçando minhas têmporas em um sinal
de frustração. Porque Oliver tem um ponto, se Levi realmente acreditar que
estou apaixonada por outra pessoa, se ele ver que não conseguirá chegar até
meu coração, então posso resolver tudo isso de forma prática. Posso fazê-lo
perceber que nós dois nunca seremos compatíveis, que eu nunca vou
conseguir amá-lo como espera, que eu não posso amá-lo desta maneira, que
eu nunca vou poder.
Mas a questão é: eu estou disposta a fingir um relacionamento com
o homem no qual eu ao menos consigo passar cinco minutos sem querer
socá-lo ou até mesmo matá-lo?
— Ninguém vai acreditar nessa mentira — digo, por fim.
— É lógico que irão — ele diz, soltando um sorriso condescendente.
— Você já deu o pontapé inicial no ano novo, quando falou que tínhamos
algo e ontem à noite quando... — ele para por um segundo coçando a
garganta, como se as próximas palavras que sairão de seus lábios, serão a
sua ou pior a minha mortificação — Você se ajoelhou na mesa e nós
praticamente nos fodemos na sala de estar dos Blackwell apenas nos
encarando.
— Eu fiz o quê? — questiono, enquanto o espanto transforma todo o
meu rosto.
— Você...
— Não, por favor, não continue. Eu não quero saber — o
interrompo jogando minha cabeça para trás.
É exatamente por acontecimentos como esses que eu não bebo ou
fico bêbada. Todas as malditas vezes que o álcool toma conta do meu corpo,
eu tomo decisões idiotas, como a de me jogar em cima de Oliver em uma
festa lotada e nem ao menos me lembrar de uma só palavra que proferi em
sua direção.
Ok, destino, você já fodeu com a minha cara muitas vezes, talvez
esteja na hora de parar.
— Para seu alívio, eu não estou tocando nesse assunto nunca mais a
partir desse momento — Oliver falou como se precisasse garantir que eu
estou topando seu plano insano.
Insano. Essa é a definição para o que ele propôs, porque nem em mil
anos-luz eu poderia imaginar, estar em algum momento cogitando a ideia de
fingir um namoro com Oliver Wright. O mesmo que me deixou num quarto
de fraternidade depois de ter surtado. Que me odeia por saber sobre suas
cicatrizes, mesmo que não sejam elas as culpadas por afastá-lo sempre que
chega perto de mim.
Ele não sabe. Mas, o motivo pelo desgosto ser maior do que
qualquer outro sentimento entre nós, é o que Oliver me faz sentir. Ele me
faz desejar algo que deveria permanecer morto, algo que eu não quero que
rasteje sob meu ser.
Algo que foi destruído naquele dia.
O dia que eu deveria ser uma criança protegida, mas, pela primeira
vez, não fui.
— Obrigada? — agradeço distraidamente, mas a palavra saiu mais
como um questionamento.
Ele me lança um sorriso fraco, quase que imperceptível.
— Vamos fazer o seguinte — diz de repente, percebendo que me
perdi em minha própria cabeça. — Pense sobre isso, me amaldiçoe
mentalmente se for preciso. E então, hoje no jantar você me diz qual a sua
resposta.
Mordo meu lábio inferior, tentando pensar em diversos argumentos
de como isso não irá dar certo, porém, todos os que vêm à mente são o
porquê de fazermos esse falso relacionamento acontecer.
— Jantar? — Ergo uma sobrancelha.
— Sim. Eu e você — ele informa intercalando o dedo entre nós
dois, quase que entediado. — Te busco às sete, loirinha.
Meu corpo todo para. Mas não emito nenhuma palavra, apenas
observo-o seguir despreocupado até a porta e o abrir lento da madeira ao
mesmo tempo que ele tenta desamarrotar toda sua roupa. Contudo, Oliver
estagna na porta, encarando algo no corredor e, mesmo que tudo dentro de
mim grite para que eu não ande até lá, para que eu me esconda no banheiro
ou na sacada, eu o faço e me arrependo amargamente quando paro atrás
dele.
Levi está parado do outro lado em que estamos, com uma expressão
confusa e um pingo de decepção em seus incríveis olhos escuros.
Quando seu olhar recai das roupas amassadas de Oliver para as
minhas, tenho a certeza de que meu melhor amigo tirou conclusões
precipitadas. Por um momento, penso em me justificar, dizer que não é
aquilo que está pensando, mas, não faço isso, eu mantenho o silêncio, até
que Oliver arranha a garganta e sorri, condescendente.
— Nós nos vemos às sete, loirinha — Oliver reafirma, me olhando
de relance e lançando uma piscadela. — Bom dia, Johnson.
Encaro as costas do loiro sumirem pelo corredor e tenho certeza de
que irei matá-lo antes mesmo de concordar com qualquer que seja o acordo
a ser discutido entre nós.
— Sum? — a voz rouca de Levi me obrigada a tirar os olhos do
corredor e o encarar. — Nós... podemos conversar?
Sim. Não. Não sei.
São as palavras que ecoam em minha mente confusa, e, mesmo que
não saiba se estou preparada para esse momento, apenas assinto, dando
passagem para ele entrar em meu quarto.
Suspiro fundo, o acompanhando.
Seja adulta Summer, apenas... seja adulta e lide com as
consequências de suas ações.

Levi caminha até a pequena varanda do quarto e se encosta no


parapeito, enquanto encara a paisagem da Parte Alta de Saint Vincent. Sua
blusa branca estampada com um símbolo pequeno da Nike e a calça de
moletom larga me indica que ele não passou a noite aqui. Quando Levi está
trajado com suas roupas esportivas, significa apenas que está se preparando
para ir até alguma piscina despejar todas as suas frustrações na água.
Ando até onde ele está e me escoro ao seu lado, mantendo meu
olhar para frente, tentando não encarar seus olhos. Aqueles olhos
machucados e tristes. Olhos que sempre carregaram alegria, diversão, mas,
que agora, estão assim por minha culpa.
— Você gosta dele? — ele pergunta sem me encarar.
Eu o encaro de relance, querendo contar que não, eu não gosto de
Oliver e nem almejo tal ato. Mas, sou imatura o suficiente para não contar a
meu amigo o porquê estou cogitando entrar em um relacionamento falso
com uma pessoa que nem ao menos suporta a minha presença.
— Você pode me dizer, Sum — ele continua, ao ver que não profiro
nenhuma palavra. — Você sempre pode confiar em mim.
— Eu não quero machucá-lo, Levi. — Mordo meu lábio inferior.
Se ele se machucar, se ele descobrir que eu sou uma mentirosa,
nunca vou me perdoar. Nunca vou poder olhar novamente em seu rosto sem
me lembrar que além de covarde, eu sou uma pessoa cruel.
Cruel como a pessoa que me machucou. Que levou toda cor do
mundo para longe de mim e me deixou apenas com os resquícios de
felicidade, com as migalhas de algo que eu poderia ser, se caso não tivesse
destruído tudo para mim.
— Você não vai me machucar, Sum — diz, finalmente me olhando.
— Eu me apaixonei por você, mesmo que seja clichê como os livros que lê,
mesmo que eu saiba que não teremos um fim como um desses romances.
Foi inevitável e eu não a culpo, eu nunca faria isso.
Suas palavras saem em um tom baixo, quase derrotado. Uma
lágrima ameaça descer pelo meu rosto. Por mais que eu saiba que Levi está
dizendo isso para que me sinta bem, eu sei que por dentro, ele está fingindo
que não dói, mesmo que suas próprias palavras o cortem em carne viva.
E talvez por isso, por não suportar mais essa situação de precisar
escolher entre meus sentimentos e minhas amizades, me viro totalmente
para ele e encaro a escuridão de suas orbes, que são como um céu estrelado,
uma infinidade de pequenas estrelas, que um dia brilhará para alguém tão
especial quanto ele.
— Eu preciso que me escute, Levi — minhas palavras saem baixas,
doloridas. — Você não pode lutar por mim, você não pode se machucar
achando que nós temos um futuro, ok? E você não pode se corroer por
isso...
— Sum...
— Não, por favor, não faça isso — Uma lágrima desce pelo meu
rosto. — Uma vez, alguém me disse que perder um amor dói, mas perder
um amigo pode custar mais do que estou disposta a dar. E eu não estou
disposta a te perder.
— Quando eu disse a Logan que lutaria por você, eu falei a verdade,
eu sempre vou lutar por aquilo que quero, mas, isso não significa que irei
contra a sua vontade — Ele dá um passo à frente, encarando meu rosto. —
Mas, preciso que seja sincera comigo. Quando você olha para mim, quando
te faço sorrir e estou ao seu lado, você já se sentiu como se pudéssemos ser
imbatíveis juntos, como se o mundo fosse pequeno para nós dois?
Não.
É a resposta que tenho em mente. É a palavra que sussurro em sua
direção e o que o faz dar um passo para trás, destruído, com o coração
incrível em pedaços. É o que me faz morder o lábio e entender que essa
guerra de corações está me custando muito.
E o pior de tudo, é o que me faz pensar em Oliver, em sua proposta,
em como ele estava certo quando disse que um namoro falso irá fazer Levi
não cruzar a barreira da amizade, por achar que eu não posso retribuir seus
sentimentos, pois estou apaixonada por outro.
— Eu não penso sobre isso, sobre nós. Porque você é como um
irmão, é meu melhor amigo — Engulo um soluço por conta do choro. —
Você, Levi Johnson, tem meu coração, mas não da forma que gostaria de
ter.
— Por que, Summer? — sua pergunta sai baixa. — Por que não me
deixa lutar por você? Me deixa provar que valemos a pena?
Não faça isso, Summer. Não faça isso.
É o que tudo dentro de mim grita. É o que eu deveria fazer, não
mentir, não terminar de machucá-lo, não ferir seus sentimentos.
Mas não escuto meu subconsciente, não faço o que deveria fazer. Ao
contrário, eu abro meus lábios e sussurro as palavras mais falsas que já
proferi em toda a minha existência:
— Porque eu me apaixonei pelo Oliver.
Acontece que as pessoas mentiram
Eles disseram: É só estalar os dedos
Como se fosse fácil assim
Conseguir te superar
SNAP | Rosa Linn

— Eu aceito.
São as únicas palavras proferidas por Summer na minha direção
quando abre a porta do seu apartamento vazio, por Josh e Levi decidirem
visitar seus familiares e Hazel e Logan ainda estarem na casa dos
Blackwell.
Abaixo meu olhar, estranhando o porquê dela ainda não estar trajada
para sairmos ou se nem ao menos acreditou em minhas palavras quando
disse que a buscaria.
Ela não concordaria com meu plano tão facilmente. Não depois da
nossa conversa amigável mais cedo, a qual não descobri como sai vivo e
ileso.
— Ok — murmuro numa voz desconfiada. — Isso foi mais fácil do
que eu esperava.
— Não seja presunçoso.
— Não estou sendo — digo a verdade — Mas, se me lembro bem,
quando saí daquele quarto pela manhã, você queria me matar da maneira
mais tortuosa que encontrasse, então, estou curioso pelo motivo pelo qual
topou meu plano.
— Acredito que eu deva exigir que me conte os seus próprios
motivos também — contrapõe erguendo uma sobrancelha. — Já que é o
único responsável por estarmos nessa situação.
Touché.
Solto uma lufada de ar, tentando não proferir algo que a fará desistir
do nosso plano insano.
— Eu vou precisar de comida para te contar todos os detalhes. —
Tomo uma respiração alta e volto a encarar aqueles lindos olhos castanhos.
— Para ser sincero, acho que iremos precisar de álcool. Muito álcool.
Summer fecha os olhos por um segundo e logo após, inclina a
cabeça para o lado, derrotada, deixando a impressão de que desde que nos
conhecemos no Oásis, ela não quis entrar em nossas pequenas brigas.
Trégua. É isso que sua linguagem corporal me indica.
É isso que teremos essa noite.
Deixo meus ombros caírem e indico com o queixo para ela liberar a
minha passagem enquanto refaço todo o plano da noite. Talvez não seja
uma boa ideia levá-la a um restaurante para jantar e acertar tudo. Sum,
parece preferir o conforto de sua cama a ter de sentar-se em um
estabelecimento ao meu lado por algumas horas.
— Eu preciso de alguns minutos para me arrumar e podemos ir —
ela enfim diz algo.
— Não é necessário. — Encaro seu rosto, percebendo minha voz
sair calma, apaziguadora. — Já que você está certa de que quer aceitar, nós
podemos conversar aqui mesmo.
Ela solta um sorriso pequeno sem mostrar os dentes e passa a mão
pelo rosto, preocupada. Summer não se importa com nada além de seus
amigos. Apenas por estar disposta a entrar em um falso relacionamento
comigo, mesmo me odiando, me faz querer ir até Levi e esmurrá-lo, para
que acorde e perceba a situação de merda que ele a colocou desde o ano
novo.
Mas, qual direito eu tenho de fazer isso, se também estou a um passo
de mentir para todos, apenas por que quero ficar o mais longe possível do
meu pai?
— Você está bem?
Summer ergue o rosto, tentando me dar uma de suas lindas caretas e
falha miseravelmente.
— Eu pareço mal?
Um sorriso sarcástico cruza meus lábios.
— Péssima.
— Ótimo. — Dá de ombros. — Não é minha intenção parecer bem
para você.
Quase solto uma gargalhada.
— Cuidado, loirinha — brinco com a pulseira do meu relógio,
proferindo minhas palavras com luxúria. — Ou vou realmente acreditar que
está perdidamente apaixonada por mim.
Ela abre os lábios para retrucar, sem dúvidas, com uma resposta
ácida, porém, ignoro-a e caminho até a ampla cozinha do apartamento,
escorando meus cotovelos no balcão e fito o ambiente. Summer não diz
nada, apenas anda até a banqueta ao meu lado e se senta, perdida em seus
próprios pensamentos.
Observamos em silêncio o ambiente calmo, até meus olhos
repousarem em uma fotografia ao lado da TV plana da sala. Demoro um
pouco para reconhecer, mas, quando tenho a certeza, solto um sorriso
disfarçado. Sum apenas se limita a fixar seu olhar na foto que tiramos na
festa de ano novo, alguns minutos antes de todo o caos acontecer. Era
perceptível o quanto estávamos felizes e tudo parecia estar nos eixos. Por
isso, queríamos aproveitar a noite em família.
Poder nos observar desta forma, faz um sentimento não nomeável
crescer em meu peito. Mesmo aqui pensando em como lidar com assuntos
complexos, tenho a convicção de que dará tudo certo.
Eu e Summer faremos isso funcionar.
— Eu não quero que eles saibam — sussurra ainda encarando a foto.
— Eu também não.
— Por quê?
Sinceridade.
É isso que me pede ocultamente nessa pergunta. É isso que devemos
um ao outro se realmente queremos que isso dê certo, porque durante todo o
nosso acordo estarei à mercê de Summer, assim como ela estará a minha.
— Porque se eu contar a Vee, ela precisará esconder um segredo de
todos e principalmente de Logan — digo, me erguendo e cruzando as mãos
em frente ao corpo, arrastando meu olhar até Summer. — E eu vi em
primeira mão o que os segredos fizeram com ela durante todo esse tempo.
Não posso machucar minha melhor amiga, Summer. Eu nunca vou colocá-
la em uma situação como essa, uma em que precisa escolher um lado.
— Eu entendo — balbucia, deixando seus olhos vagarem por todos
os cantos, menos em mim.
— E por que você não quer que eles saibam? — devolvo a pergunta,
curioso. Ela poderia contar a Hazel ou a Josh, eles guardariam um segredo
por ela.
— Porque a confiança é a base da nossa amizade. É isso que nos
manteve unidos até hoje. Seguramos um ao outro — suas palavras estão
regadas a um sentimento fraterno, o mero pensamento de machucá-los,
fosse o pior ato de sua existência. — Nós somos uma família, Oliver,
mesmo que não compartilhando o mesmo sangue, nós somos. Talvez você
ainda não entenda, porque sei que não se considera parte dela, mas, somos
tudo um para o outro. Quando tudo desaba, quando merdas acontecem, nós
entendemos que nada é maior que isso.
— Sum... — minha voz é quase um murmúrio inaudível.
— Então, Oliver, eu estou traindo a confiança deles pela primeira
vez desde que nos conhecemos, porque eu não quero que eles precisem
escolher um lado entre eu e Levi — ela continua. — Estou fazendo isso,
para eles acharem que estou tão apaixonada por você, que só irão se
preocupar em apenas cuidar do coração machucado do meu melhor amigo.
Encaro Summer por alguns segundos em silêncio. Não respondo.
Não emito nem mesmo uma nota da minha respiração. Eu a entendo. Eu sei
que mesmo não me encaixando totalmente no meio de nossos amigos, por
não deixá-los chegar até mim, eu faria de tudo para protegê-los, sabendo
que fariam o mesmo se um dia eu precisasse.
Certa vez, Verônica me disse que nós somos sua casa, seu porto
seguro. Eu espero um dia poder dizer isso, conseguir passar por todas as
barreiras que criei em volta de mim para me proteger do mundo e deixá-los
fazerem morada em meu peito.
Deixá-los me chamarem de família, algo que desaprendi a ter desde
que tudo aconteceu.
— Certo, então vamos fazer isso acontecer. — Maneio a cabeça
ainda sem acreditar que realmente estamos prestes a nos tornar um casal.
Um casal de mentira. — E como exatamente fazemos isso?
— Você nunca namorou, Oliver? — Summer enfim me encara,
perguntando com um tom debochado, abandonando toda a melancolia de
segundos atrás.
Ela sorri, um sorriso doce e ao mesmo tempo perigoso, daqueles que
poderiam fazer homens destruir a porra do mundo apenas para vê-lo. Nesse
momento, enquanto observo a mulher à minha frente, tenho a plena certeza
de que para conseguir a minha liberdade, eu terei que enfrentar um inferno
ao seu lado.
E nem mesmo me importo, porque a acompanharei nesse martírio de
bom grado.
— Eu não sou uma pessoa que curte monogamia, loirinha. — Sorrio
travesso, me levantando. — Sou gostoso o suficiente para ser apreciado por
mais de uma mulher.
Summer solta uma gargalhada, enquanto sigo até os armários, tendo
a melhor ideia para nossa noite, já que jantar em algum restaurante está fora
de cogitação.
— Seu ego, às vezes, me assusta — ela diz, enojada. — Talvez
possamos agir como Verônica e Logan? Eles são o casal de ouro da SVU.
Encaro-a por cima do ombro, tentando encontrar algum sinal de
insanidade em seu rosto delicado. Puxo um pano e o coloco em meu ombro.
— Você quer que eu entre em um carro e aposte uma corrida com
você? Ou pior, quer que eu cante em um karaokê? — Ergo uma sobrancelha
em sua direção, descrente.
Deus, Logan. Que padrões foram esses que você criou?
— É óbvio que não — nega, franzindo os lábios, segurando uma
risada. — Até porque você seria um péssimo cantor ou até mesmo um
piloto.
Vejo em Summer uma versão que nunca presenciei. Uma versão
engraçada e gentil. Uma parte de mim desejou que tivéssemos mais
momentos como esse: momentos com um lado engraçado e gentil de
Summer Miller.
— Disse a mulher que prefere ver um filme de super-herói a estar
em uma festa com pessoas da idade dela — debocho, soltando um sorriso
fraco e volto à minha busca.
— Isso deveria ser um elogio ou um insulto? Não consigo
diferenciar as palavras que saem de sua boa.
— Estou apenas constatando fatos.
Summer abre a boca para responder, porém, é impedida pelo meu
movimento na cozinha em busca de tudo o que preciso para colocar meu
plano em ação.
— O que diabos você está fazendo, Oliver? — questiona, confusa.
Volto minha atenção para a loira, erguendo uma sobrancelha.
— O nosso jantar? — respondo, mas a frase saí mais como uma
pergunta. — Aliás, levante sua bunda daí e me ajude a encontrar os
utensílios necessários. Isso aqui é uma bagunça!
Ela solta um pequeno ruído com a garganta seguido de algumas
palavras inaudíveis, porém, se levanta e segue até a geladeira, abaixando-
se.
— E do você precisa, Gordon Ramsay?[4]
— Quem? — pergunto, confuso.
— Céus, assista mais programas de entretenimento, Oliver —
Summer responde quase sorrindo e termina de se abaixar para pegar
algumas coisas, me dando a linda visão de seu traseiro tampado apenas por
um short de moletom. As longas pernas torneadas que poderiam se enroscar
em minha cintura, faz imagens promíscuas invadirem minha mente. — Pare
de encarar minha bunda.
Impossível.
— Eu não estou encarando — minto.
Ela solta um ruído, incrédulo.
— Diga-me logo do que precisa, Oliver — grunhe, ainda sem virar
para me encarar.
Te foder nessa posição.
Arranho minha garganta, expulsando a resposta e dobro o tecido do
meu pulôver até meus cotovelos, pensando em todas as situações
inconvenientes para meu pau não ficar duro e isso se tornar uma situação
constrangedora ou pior, ela desistir de nosso plano porque não sei controlar
a porra dos meus pensamentos inapropriados.
— Tudo o que tiver para conseguirmos fazer algo decente para
comermos — desvio o olhar e pego uma panela para levar ao fogo.
Summer deixa alguns potes sobre o balcão, depois abre alguns
armários e retira uma massa de espaguete, enquanto levo a panela até o
fogão para aquecer a água e cozinharmos o macarrão. Em todo processo,
ela me observa fascinada, como se não acreditasse que eu poderia ser capaz
de realizar tal feito.
— Então… — Gesticula para a panela em que estou preparando o
molho do nosso jantar. — Quem te ensinou a cozinhar?
Sinto a necessidade de encará-la. De observá-la a todo instante, por
isso, viro novamente em sua direção, segurando uma colher de pau.
— Minha casa não era movimentada e eu não tinha muita
companhia quando era criança — digo o básico. — Então, eu passava muito
tempo na cozinha com as empregadas e acabei aprendendo uma coisa ou
outra.
Dou de ombros. Não digo a ela que todas as vezes em que estava
junto delas, era para que meu pai não me achasse e fizesse na minha pele
uma nova pintura escarlate. Tampouco digo o quanto eu amava cozinhar
macarrão porque era a comida preferida de Andrew e sempre que ele
provava, ao observar aqueles olhos brilharem, me sentia completo.
— E você? — questiono, curioso. — Quem te ensinou?
— Como você sabe que eu sei cozinhar? — Summer indaga,
erguendo uma sobrancelha.
— Você pegou tudo o que precisávamos para fazer o macarrão sem
nem questionar, Sum — comunico, sorrindo e focando minha atenção em
nosso jantar.
Ela para por alguns segundos cogitando se deve me contar ou não e
quando acho que não falará, Summer responde de bom grado.
— Minha mãe. — Dá um meio sorriso. — Ela é uma Chef de
cozinha renomada. A melhor do condado. Então cozinhar sempre esteve na
minha vida.
Não respondo de imediato, apenas termino de cozinhar tudo e depois
preparo dois pratos e levo até a bancada, colocando-os um ao lado do outro
ao mesmo tempo que ela pega uma garrafa de vinho tinto e se senta ao meu
lado.
Tenho vontade de perguntar mais. De desvendar cada nuance da vida
dela, porém, me limito a colher o que está pronta para dividir comigo.
— E ainda sim você preferiu psicologia à gastronomia? — brinco,
pegando a garrafa de sua mão e abrindo-a.
Ela solta uma pequena gargalhada e percebo que realmente não
estamos brigando ou nos provocando. Estamos tentando fazer isso
funcionar, deixando toda a nossa aversão de lado e focando em nosso
objetivo. Desejei que essa trégua se estendesse, se findasse entre nós dois.
— Não me culpe por não ter herdado o talento da minha mãe — ela
devolve, divertida.
Encaro Summer de relance soltando um sorriso fraco. Diferente de
todos aqueles que eu já soltei para alguém.
— Nunca poderia te culpar por algo, loirinha.
Permito apreciar a sua companhia sem que o peso do que estamos
forjando recaia sobre nós. Aprecio como seu rosto é uma arte devastadora
embriagando meus olhos, e faz até mesmo que as cores do céu e do mundo
sejam poucas para conseguir acertar a perfeição de seus traços.
— Eu... — ela gagueja. — Deveria esperar uma intoxicação
alimentar?
— Não me ofenda, loirinha — brinco, levando a mão no meu
coração. — Apenas prove.
Ela enrola a massa em seu garfo lentamente, e sem nunca deixar
meus olhos, leva o objeto até seus lábios carnudos, provando a comida.
Summer fecha os olhos por um segundo e solta um gemido. O som desce
direto para um lugar o qual não deveria ser acordado a esse momento. Um
lugar que estou tentando fortemente não fazer com que foda todos os meus
planos.
— Deus, Oliver, isso é muito bom! — exclama e esse som faz com
que pensamentos indecentes, obscenos e muito, muito sujos vagueiem pela
minha mente, me perturbando.
Solto um ruído com a garganta, puxando um guardanapo de tecido e
colocando-o em meu colo e foco, sempre, na minha própria comida.
— Isso não deve ser difícil de fingir, certo? — questiono de repente,
mudando de assunto.
— Como vou saber disso, Oliver? — Seu foco está em seu
macarrão. — Eu nunca fingi um namoro ou tinha a pretensão de fazer algo
semelhante.
— Isso soa desesperador — digo, por fim levando o garfo à boca.
Summer esquece o macarrão e percebo seu rosto emitir uma
expressão de descrença.
— E, não é?
Não, é mais do que isso. É algo o qual nem deveríamos cogitar a
realizar, porque tenho medo de, em algum momento, essa farsa fazer nossa
pequena desavença ser apenas a ponta do iceberg.
— O que você está ganhando com essa farsa, Oliver? — ela
pergunta, quando vê que não respondo a sua provocação anterior.
A verdade.
É o que tenho vontade de dizer. Mas, ela não entenderá. Se eu disser
isso, terei que explicar o porquê voltei a Saint Vincent e o porquê estou
hospedado na mansão que era dos meus pais — que agora é apenas um
lugar vazio, composto por memórias dolorosas e dores enraizadas em
nossas almas.
E não estou pronto para compartilhar isso, talvez nunca esteja.
— Porque preciso de um tempo longe de Nova York e preciso de
uma desculpa convincente para que meu pai me deixe permanecer em Saint
Vincent.
Não é bem uma mentira, mas, também não é a verdade completa.
— Eu não acredito nisso.
— É uma pena, porque estou sendo sincero.
Mentiroso. Mentiroso. Mentiroso.
Uma voz grita dentro de mim. A ignoro com afinco, não posso me
agarrar a isso. Não posso deixá-la ver mais do que estou disposto a mostrar.
— Você já pensou em confrontar o seu pai? Dizer que é adulto e não
irá seguir suas regras de merda?
Minha sobrancelha se ergue.
— Você já pensou em dizer ao Levi que não tem pretensão de gostar
dele ou melhor, já foi sincera consigo mesma, do porquê está fugindo dos
seus próprios sentimentos?
Summer fica em silêncio e me estuda por alguns segundos,
deixando-me estudá-la de volta. Não dizemos nada, apenas ficamos aqui,
sentados, ignorando nossa comida e nos encarando como se a qualquer
momento, fôssemos nos levantar e nos atirar mutuamente da sacada por
derramar nossas merdas um no outro,com o intuito de nos proteger.
— Isso vai ser complicado — ela afirma.
— Por quê?
— Porque nós não gostamos um do outro.
Summer tem um ponto, porque mesmo que estejamos
compartilhando um momento de paz, isso não significa que a nossa aversão
um pelo outro acabou.
— Vamos ficar bem, Summer, só não agirmos de forma estranha na
frente dos nossos amigos.
— Ok — concorda, erguendo uma sobrancelha. — Então o que
exatamente iremos fazer para que acreditem que estamos juntos?
Como diabos eu vou saber disso? Eu nunca precisei apresentar uma
garota para ninguém e os poucos encontros que eu tive não duraram nem
duas semanas para eu criar experiência em namoros.
— Eu não acho que se aparecermos juntos hoje eles vão acreditar. —
Suspiro fundo, deixando que um plano se crie em minha mente. — Talvez...
talvez se tirarmos alguns dias para fingirmos que estamos nos aproximando
e usamos a próxima festa para anunciarmos que estamos... juntos?
A expressão de Summer foi de neutra para preocupada. E eu a
entendo. Afinal, teremos que nos conhecer, saber o que o outro gosta, como
devemos agir e principalmente como vamos lidar com essa atração que
sempre paira entre nós.
— A festa é em duas semanas, Oliver.
Sorrio.
— Bem, então temos duas semanas para aprendermos como
funcionamos juntos.
Com calma, surpreendentemente, ela apenas acena com a cabeça.
Não profere nenhuma palavra ofensiva ou me lança seus olhares
fulminantes. Somente suspira fundo, pega seu garfo e envolve a massa
cremosa nele, levando a boca. O que me dá a certeza de que ela está
totalmente dentro.
— Então... temos um acordo? — pergunta, baixinho.
— Nós temos, loirinha.
Faríamos isso!
Nós. Eu e Summer. Dois polos opostos, duas matérias que não
deveriam se combinar, estamos nesse momento nos tornando um casal.
Um falso casal.
Acontece que as pessoas mentiram
Eles disseram: É só estalar os dedos
Como se fosse fácil assim
Conseguir te superar
SNAP | Rosa Linn

Acordo no dia seguinte com o barulho ensurdecedor de alguém


batendo em minha porta.
Olho para o lado, imaginando que talvez eu tenha perdido o café da
manhã com Andrew ou até mesmo um terremoto esteja acontecendo e
alguém tenha motivo suficiente para esmurrar a minha porta desta forma.
Mas é pior que isso.
Porque assim que levanto meu rosto, xingo todos os deuses que
existem no universo observando os números vermelhos estampados no
objeto em cima da mesa de cabeceira e caminho até onde o barulho infernal
continua.
O que eu não esperava quando abro a porta, é a imagem de Summer,
vestindo apenas um short de corrida com um top. Ergo uma sobrancelha,
confuso, e nem ao menos tenho tempo para questionar o que diabos está
fazendo aqui a essa hora, porque Sum levanta seu dedo, colocando-o em
frente ao meu rosto, sem nem ao menos tocar meu rosto, porém, me calando
e diz com calma:
— Primeira coisa que você precisa saber sobre mim... — ela
umedece os lábios, enquanto profere o restante da frase. — Eu corro todas
as manhãs e espero que você não seja uma pessoa sedentária, porque está
prestes a me acompanhar.
Bufo, levando minhas mãos até meu rosto, tentando afastar a névoa
de sono que ainda me rodeia. Logo após, escoro o meu ombro no batente da
porta, cruzando os braços em frente ao corpo e a encaro friamente, já
sabendo que alguém será demitido por deixá-la entrar a essa hora da manhã
em minha casa.
— São seis horas da manhã, Summer — resmungo, mordendo meu
lábio para não proferir nenhum palavrão. — Seis. Malditas. Horas.
Ela dá de ombros como se não se importasse, ajeita o rabo de cabelo
alinhado com perfeição e me encara entediada.
— Ainda dá tempo de desistir desse plano insano — cantarola,
lançando-me um olhar desafiador.
Meu Deus!
Summer Miller é de fato irritante além da razão.
— Nem nos seus melhores sonhos, loirinha — devolvo, lançando-
lhe um sorriso. — Aliás, onde está a mulher que jantou comigo ontem? Ela
não é essa pessoa diabólica à minha frente.
— Tentando fazer com que esse plano funcione — responde,
suspirando fundo e colocando duas mechas finas de seu cabelo atrás de sua
orelha e se vira, me deixando parado à porta. — Ah! Eu já ia me
esquecendo: bom dia, playboyzinho.
Ela nem ao menos olha pra trás, apenas segue seu caminho igual a
uma maldita dona da minha casa.
— Eu definitivamente te odeio, loirinha — grito e percebo minha
voz sair divertida.
— Eu sei — ela devolve no mesmo tom quando chega no final do
corredor. — O sentimento é mútuo.
Inconscientemente, um pequeno sorriso nasce em meus lábios.
Summer não se importa se não gosto dela ou se irei reclamar por ter
me acordado à essa hora, ela apenas fará com que nosso acordo seja
desempenhado com a maior destreza possível.
Sabendo disso, caminho novamente para dentro do quarto, quase
choramingando por não poder me deitar novamente e fingir que não existe
nada além de mim e minha cama. Me direciono até meu closet pegando um
short e um tênis de corrida entre minhas roupas, logo sigo para o banheiro,
antes que o diabo em pessoa, invada meu quarto e me obrigue a correr com
ela de pijama.
Tenho a convicção de que Summer Miller seria capaz dessa
atrocidade.
Assim que estou apresentável o suficiente para não parecer um
zumbi correndo pelas ruas da cidade, me arrasto até o primeiro andar e no
caminho me pego imaginando como eu poderia sufocar Summer da maneira
mais excruciante que encontrar, por ela ter atrapalhado meu sono.
— Primeira coisa que você precisa saber sobre mim, Summer —
confesso, assim que piso no último degrau da escada e sigo-a encarando
fulminantemente ao mesmo tempo que caminhamos para fora, em direção
aos portões. — Eu odeio que me acordem.
Ela leva seu braço acima de sua cabeça, alongando o corpo e me
olha de relance, com uma expressão fechada.
— Bem, Oliver, vamos ter que aprender a lidar com isso então —
responde, entediada. — Agora se alongue, não quero vê-lo reclamando que
fui responsável pela sua dor no corpo.
Solto um resmungo irritado e faço o que ela me indica, imitando
seus gestos. Quando finalmente terminamos, Summer indica com queixo
para que comecemos a correr.
Nos primeiros minutos, nós apenas ficamos em silêncio, observando
a cidade ganhar vida, enquanto corremos pelas ruas pouco movimentadas.
Mesmo que Summer não perceba, mantenho minha atenção nela, notando
suas pequenas peculiaridades: como quando olha para cada lugar, cada
espaço cheio ou vazio, tentando entender o que há de tão especial, como
odeia que uma mecha teimosa de seu cabelo caia em seus olhos sempre que
abaixa a cabeça ou em como ela fica leve, livre e impressionante.
É como se toda a sua mente estivesse focada em algo que não
compreendo, porém, aprecio. Porque o silêncio que emana dela, de seus
olhos e de sua expressão relaxada ao sairmos dos arredores da Parte Alta
em direção a Parte Baixa, é como um sinal de tempestade interna. Como se
seus pensamentos a consumissem de forma tão intensa, que nem ela mesmo
percebesse o quão linda fica quando está tão focada.
Summer puxa o ar, fundo, balançando a cabeça na tentativa de
expulsar seja lá o que a atormenta. Pela primeira vez, gostaria que me
mostrasse o que habita sob tanta perfeição. O que a aflige e a deixa tão
submersa em pensamento.
Mas, sei que Summer nunca me permitirá atingir esse lugar, ela
sempre me expulsará. E não a culpo, afinal, eu também tenho essa mesma
atitude quando tentam ultrapassar minhas barreiras.
— Ok, por mim, chega — digo entre fôlegos, parando no meio da
calçada e colocando minhas mãos nos meus joelhos e abaixo minha cabeça
tomando uma respiração.
— Eu nunca imaginaria que o infame Oliver Wright é tão fraco para
exercícios físicos — ela debocha, parando sua corrida.
Solto uma gargalhada fraca ainda com a cabeça abaixada, tentando
não proferir nenhuma palavra de baixo calão em sua direção. Ergo meu
rosto, sendo obrigado a semicerrar os olhos por conta da luz solar que
invade minhas pupilas e lanço-lhe um sorriso condescendente.
— Não era isso que você achava enquanto eu estava enterrado
dentro de você há alguns meses — profiro calmamente, passando a língua
pelo meu lábio inferior e evocando todas as memórias daquela noite que me
atormentou por dias.
Ela me encara por alguns segundos em silêncio, então dá um passo
em minha direção e se abaixa, imitando a minha posição. Pouco nos
importamos se estamos no meio de uma calçada onde qualquer um poderia
passar e ver nosso impasse.
Summer umedece seus lábios, solta uma lufada de ar e inclina a
cabeça para o lado. Neste momento, me preparo para seja lá qual for o que
sairá de sua boca, porque pela sua expressão, tenho a convicção de que está
pronta para lançar palavras frívolas em minha direção.
— Não que te interesse, mas, saiba que me arrependo amargamente
de ter transado com você naquela noite — desdenha, as que palavras saem
de seus lábios são um veneno sendo injetado diretamente numa veia
interventricular. — Se eu tivesse oportunidade, voltaria naquela festa e
quebraria a garrafa de tequila na sua cabeça quando invadiu aquele quarto
— sua voz sai letal. Até mesmo eu me surpreendo, mas, não consigo
quebrar essa conexão. Não consigo nem mesmo respirar alto. É como se
apenas nós dois existíssemos. — E faça um favor para nós dois, durante
esse acordo e após ele, esqueça que nós dois já fodemos.
Me levanto ainda encarando seus olhos e enfeitiçado por como ela se
opôs a mim, em como seu rosto frio e calculista me mostrou o que eu não
queria ver. Mesmo que ela não saiba, acabou de me entregar um fragmento
de si para mim, mantenho um sorriso travesso em meus lábios.
— Você quer fingir que aquela noite na fraternidade não aconteceu?
— pergunto ignorando todas as suas palavras. — Tudo bem, faça isso.
— É um favor que farei a nós dois — devolve, mesmo que eu saiba
que nem mesmo ela acredita nessas palavras, não depois da festa do
cassino.
— Fale isso até você mesmo acreditar, querida. — Dou um passo,
fazendo nossos corpos quase colidirem. Abaixo meu rosto, pairando meus
lábios perto do seu ouvido, sentindo seu cheiro suave, misturado com o
pouco suor da manhã. Quando ela fica tensa, solto uma respiração quente, e
os pelos de seu corpo se arrepiem. — Mas saiba que a sua imagem deitada
sobre a cama, nua, enquanto eu a fodia e te fazia gozar no mesmo momento
que gritava meu nome, é real. Algo que você nunca conseguirá fingir que
não aconteceu, Miller.
Seu rosto guerreia contra o meu, sem nenhuma intenção de ceder. É
por isso que mantemos distância um do outro, por isso que ela me odeia e
eu abomino as emoções que ela traz à tona. Porque somos assim. Somos um
aglomerado de emoções que trazem consigo uma sensação de que estamos
olhando para um espelho, um reflexo do que tentamos esconder.
E é quando nossos olhos se encontram, como nesse momento, que
temos a certeza de que entendemos isso, entendemos que nós, Wright e
Miller, nos escondemos atrás de uma máscara superficial que tenta nos
tornar opostos.
Afinal, semelhante atrai semelhante, certo?
Ela dá um passo para trás, depois outro e por fim, para centímetros
longe de mim, me encarando com os mais lindos olhos castanhos que agora
estão envolvidos em escuridão, êxtase e, o pior de tudo, memórias.
Memórias de como fomos um para o outro, de como ela me mostrou
seu interior naquele pouco tempo, de como fomos peças de quebra-cabeça
que se encaixam da forma mais certa de todo o universo, em como meus
olhos fitaram a clareza dos seus e nossos dedos se entrelaçaram em meio à
obscuridade daquele quarto e em como nossos corpos, se tornaram um só,
se tornaram um abraço apertado com um suspiro abafado, quase que um
pedido para não ir, não desenlaçar.
Como se tivesse sido lá que esquecemos de todos à nossa volta e
apenas nos importássemos com o que criamos naquele instante, onde tudo
se desarmou para vivêssemos aquele momento único e singular.
— Isso não vai dar certo — Sum sussurra, dando mais um passo
para trás.
Merda. Merda. Merda.
Por que fomos por esse caminho? Por que caralhos não podemos ser
pessoas normais, que se portam gentilmente e não tenhamos que nos
provocar a cada instante que estamos juntos? Por que não podemos ser
aquela versão de ontem a noite, onde a leveza fluiu firmemente entre nós?
Fecho meus olhos, puxando os fios do meu cabelo e prometendo a
mim mesmo que se ela romper com o frágil acordo que forjamos na noite
passada, eu estarei perdido, porque Summer não é apenas um meio para um
fim, ela pode ser a chave para salvação da minha alma podre.
— Me desculpe — murmuro.
A frase sai em tom que me surpreende. Summer balança a cabeça,
assentindo. E então, solta uma lufada de ar, indicando o Starbucks à nossa
frente que eu nem ao menos percebi que existia ali.
Quando nos sentamos, frente a frente, percebo ela ignorando meus
olhos. Talvez seja receio de encontrar todos os pensamentos que tivemos a
minutos atrás ou talvez seja o próprio medo de me entregar algo no qual
não está preparada. Mas, quando a garçonete traz nosso pedido, ela é
obrigada a me encarar.
Seu olhar se fixa em meu rosto por um momento, o suficiente para
que eu possa entender que ela está me implorando para não seguirmos por
esse caminho, para não acabarmos com tudo antes mesmo de começarmos.
— Se continuarmos a nos tratar desta forma — começo a dizer,
antes que ela me interrompa. — Isso não dará certo.
É a verdade. Se não conseguimos ficar juntos por alguns minutos
sem brigar, então quem comprará a nossa história? Quem acreditará que
estamos apaixonados um pelo outro?
— Eu sei — concorda, levando o copo com uma bebida estranha aos
seus lábios e quando abaixa, me encara com determinação. — Então, vamos
ser amigos?
— Amigos? — Franzo o cenho.
— Sim, Oliver. Amigos, parceiros ou companheiros — ela pontua,
revirando os olhos — Seja lá como quiser chamar.
Não é uma opção ruim, mas, amigos? Nós dois? Eu não acho que
isso vai dar certo, não quando temos algumas merdas entre nós. Porém, é
um começo. Sermos amigos, é melhor do que sermos inimigos declarados
que precisam fingir um relacionamento. E nós conseguimos dar certo na
noite passada, passamos algumas horas sem irritar um ao outro. Então...
isso pode dar certo.
— Ok... então, somos amigos.
Sum maneia a cabeça, concordando e desvia o olhar para observar
os moradores que começam a zanzar pelas ruas. Ela parece indiferente a
situação, em especial quando precisará passar por todas as nossas
desavenças para conseguirmos mostrar a todos que agora somos o casal
mais inesperado do campus.
— Qual a sua cor preferida? — ela pergunta de repente.
Ergo uma sobrancelha.
— Eu preciso ter uma?
— Você não tem uma? — questiona, ofendida.
Estreito meus olhos, tentando entender porque diabos ela estava tão
preocupada com uma cor ou com coisas tão banais sobre mim. Pelo amor
de Deus, são todas cores, não há nada de especial em escolher apenas uma
cor favorita. Podemos gostar de todas elas.
— Venha comigo — ordena, quando não respondo.
Não emito nenhuma palavra, apenas gesticulo para a garçonete e
aponto meu celular para a máquina de cartão de crédito, antes que Summer
consiga pegar o seu próprio para pagar a nossa conta.
Assim que estamos fora da cafeteria, ela começa a correr de novo e
eu solto um suspiro dramático. Observando-a entrar em uma rua que dá
acesso à parte mais baixa da cidade. Quando estou a ponto de gritar e
comunicá-la que estou desistindo dessa corrida idiota, Summer para,
abrupta, em frente a uma loja repleta de livros. O prédio tem uma fachada
no estilo vitoriano com dois andares. As portas são de madeira e estão
abertas mesmo que ainda seja cedo demais.
Essa loja, é como um tesouro perdido em meio a tantas outras. É
especial, com um toque familiar, e não me surpreendo quando Theodora
Stokes, a proprietária, sai de trás de uma prateleira e caminha até onde
estamos.
— Então, vocês decidiram vir me visitar? — A mulher de cabelos
cacheados e pele negra sorri parando a nossa frente. — Oi, Sum.
— Oi, Thea — Sum sorri grande, abraçando-a. — Eu estava com
saudades.
Thea solta um sorriso e nem me surpreendo por ela ter alegria
estampada em cada parte de seu rosto que até mesmo contagia a mim e a
Summer.
— Eu digo o mesmo, querida — Thea solta um sorriso acalorado
para Summer e depois se vira para mim. — Que milagre você arrastar sua
bunda preguiçosa até aqui.
— Eu sei que ainda continua me amando — murmuro, soltando um
sorriso malicioso.
Ela me ignora, voltando sua atenção para Summer.
— Se você o jogar do segundo andar, direi que foi por legítima
defesa — diz Thea, soltando uma piscadela.
Sum solta uma pequena gargalhada.
— Terei isso em mente. — Solta um suspiro. — Mas, infelizmente,
por hora preciso dele vivo.
É a vez de Thea gargalhar.
— É uma pena.
— De fato — Sum concorda.
Ergo uma sobrancelha para as duas, ofendido.
— Ei! Eu estou aqui, sabia? — questiono, enquanto elas me
ignoram.
Encaro Summer por alguns segundos e tenho a certeza de que terei
que me acostumar a xingamentos mentais, porque, pelo que parece, ela será
a responsável pela minha sanidade escorrer de minhas mãos nesse meio
tempo em que estivermos convivendo juntos.
— Preciso organizar algumas coisas lá atrás, então fiquem à vontade
— Thea comunica, se afastando.
Quando ela some entre as prateleiras, me viro para Summer que já
está caminhando entre os livros, em direção ao segundo andar.
— Não que eu não goste daqui, mas... — digo, baixinho atrás dela
— O que estamos fazendo aqui exatamente?
Summer olha por cima do ombro, fixando aquelas pupilas em meu
rosto e sorri para mim, um sorriso endiabrado, daqueles que possuem gosto
de problema. E, só piora no momento que emite um estalo com a língua e se
vira, pegando um exemplar.
— Usando livros aos meus propósitos — anuncia.
— Propósitos?
— Sim.
— E quais seriam eles? — pergunto, com medo da resposta.
— Te ensinar a sobreviver a um relacionamento falso antes que foda
com tudo.
Um sorriso condescendente nasce nos meus lábios.
— Nós já literalmente fodemos, loirinha. — Summer me encara com
uma expressão embotada. — Ok. Assunto proibido. Entendi!
Um ruído sai da minha garganta, assim que olho para cima e solto
um suspiro arrastado. Porque, nesse exato momento, dentro de uma livraria,
tenho a plena certeza de que Summer fará com que eu leia esses malditos
romances.
Armando minhas defesas
Porque não quero me apaixonar
Se alguma vez fizesse isso
Acho que teria um ataque cardíaco
Heart Attack | Demi Lovato

Uma Farsa de Amor da Espanha[5].


A Hipótese do Amor[6].
The Risk[7].
Pássaro e Serpente[8].
Todas as Nossas Mentiras.[9]
Um a um, jogo os exemplares dos meus livros favoritos nos braços
de Oliver que me encara com os olhos semicerrados desde que entendeu o
motivo pelo qual estamos em uma livraria a essa hora ao invés de estarmos
correndo pelas ruas de Saint Vincent ou aproveitando o restante de nossas
férias.
Tento não revirar meus olhos pela milésima vez e volto minha
atenção para as inúmeras estantes repletas de livros. É como um oásis para
mim. Até mesmo poderia viver aqui para sempre sem nem ao menos
reclamar. Estar entre esses inúmeros títulos, em meio a tantas histórias, é
como o paraíso.
Como encontrar um lar que nem ao menos supunha precisar.
— Summer?
— Sim? — respondo sem olhar para ele, ainda focada nas lombadas
de todos os exemplares.
— Eu quero saber o porquê que você acabou de jogar um livro que
tem uma cobra e um pássaro ilustrados na capa? — pergunta, baixo o
suficiente para apenas nós dois escutemos mesmo que o corredor esteja
vazio.
Solto uma lufada de ar, olhando por cima do meu ombro,
imaginando se vale a pena gastar meu réu primário em um crime hediondo
que se passa pela minha cabeça relacionando uma serra elétrica e Oliver
Wright, por ter me atrapalhado no meio a minha admiração pelos livros à
minha frente.
— Porque eles precisam fingir um casamento falso — respondo
como se fosse óbvio.
Ele vira o livro, lendo as palavras na contracapa e assim que seus
olhos voltam a me encarar, Oliver me lança um olhar preocupado, me
estudando para saber se estou em sã consciência.
— Summer? — volta a me chamar.
— Deus, Oliver! — resmungo. — O que foi desta vez?
— Por que caralhos eu preciso ler um livro sobre uma bruxa e um
caçador de bruxas unidos em sagrado matrimônio? — ele alterna o olhar
entre mim e o livro, como se eu fosse louca.
Franzo a testa, virando meu rosto novamente para a prateleira e
procuro por títulos sabendo quais têm histórias envolvendo relacionamentos
falsos.
Deus, em que momento eu imaginei que estaria vivendo algo
semelhante?
— Porque você nunca namorou e tenho quase certeza de que não
sabe agir como um bom namorado — digo, erguendo a mão e retirando
outro livro.
Percebo de relance, ele mudar seu peso de um pé para o outro e
ergue o livro novamente, girando-o em suas mãos e lendo num murmúrio
baixo o que está detalhado na capa traseira. Franzindo o cenho, Oliver ergue
o rosto, lançando-me uma careta zombeteira.
— Claro! Até porque demonstrarei meu afeto enquanto você será
caçada pela Igreja no mesmo instante que estarei indo atrás de suas
companheiras de coven para assassiná-las — debocha, passando por mim
em direção a mesa e escorando os exemplares que o entreguei. — Eu
deveria me preocupar com isso? Com os livros que você anda lendo?
Oliver cruza os braços frente ao corpo, erguendo uma sobrancelha,
quando percebe meu olhar abaixar para onde a camisa suada se fixa no seu
abdômen definido e correr por toda a extensão de seu corpo. A imagem da
festa de alguns meses atrás escorrega pela minha mente, me lembrando de
como minhas unhas arranharam cada parte de sua pele.
Mas que merda.
Aquela noite não deveria estar me atormentando, não deveria fazer
com que eu tenha esses pensamentos. Não quando concordei em fingir um
maldito relacionamento com ele apenas para meu melhor amigo não
destruir nossa amizade com esses sentimentos confusos.
— Meus olhos ficam aqui em cima, loirinha! — Oliver exclama,
ardilosamente.
— Não seja um idiota, Wright — desdenho, lançando-lhe uma careta
enojada.
Ele não responde, apenas continua sorrindo e descruza os braços
vindo em minha direção e parando à minha frente, poucos centímetros de
roçar sua pele contra minha. Ergo meu rosto, encarando seus olhos verdes.
Os olhos nos quais não deveriam significar nada em minha vida, mas, que
podem ser a minha ruína se eu confessar o que realmente sinto todas as
vezes que nos encaramos assim.
Eu não gosto de Oliver, a presença dele não é confiável. Ele não é
confiável. Ainda que tenha caído em tentação por uma noite, deixando-se
colocar entre minhas pernas, isso não significa que deva abaixar a guarda
perto dele. Mesmo que agora estejamos presos um no outro.
Mesmo, por isso, eu não posso.
— O que há de errado, Summer? — Ele suspira quase preocupado.
— Você está agindo de forma estranha desde ontem à noite e se continuar
assim ninguém cairá na nossa farsa.
Se eu não for sincera comigo e com ele, isso não dará certo. Com
esse pensamento, tomo um suspiro e encaro o rosto de Oliver novamente.
— Eu estou com medo de desapontá-los — murmuro a verdade, por
fim. — Isso precisa ser perfeito, Oliver, você precisa agir como se eu
realmente fosse algo importante para você, como se estivesse tão
apaixonado que decidimos passar por todas as nossas antigas desavenças e
tentar fazer isso dar certo.
Ele me estuda em silêncio por alguns segundos, compreendendo
minhas palavras. Sua postura é tão decidida, que sei que as próximas
palavras a sair de seus lábios, são a mais pura verdade.
— Se isso a deixa tranquila, eu irei ler todos esses livros. Ou
melhor, lerei toda essa biblioteca se assim desejar. E se, mesmo assim,
ainda não for suficiente, construirei uma nova para que possamos ler mais
livros juntos — confessa, me dando um sorriso torto. — E então serei
melhor do que todos esses namorados literários que já leu.
Eu o encaro, perplexa.
— Você vai?
— Eu vou, loirinha.
Oliver abaixa o corpo, fazendo com seu rosto ficar a centímetros de
distância do meu e ergue uma mão até onde uma mecha se soltou do meu
penteado, levando-a até o lóbulo da minha orelha. Seu dedo acaricia
lentamente minha pele apreciando o momento. É uma carícia única, uma
sensação como se estivéssemos sentindo uma faísca percorrer cada lugar
onde seu dedo toca. Meus olhos se fixam nos dele e por um milésimo de
segundo, eu vejo um brilho ali, vejo esperança e preocupação.
Ele se aproxima como se estivesse se segurando para não me atacar
bem ali, no meio de uma casa de leitura. Sua testa encosta na minha e posso
sentir seu hálito fresco contra meu rosto. Ele guerreia contra algo dentro de
si, como se perguntasse quais problemas teríamos por abaixar um pouco
mais e tocar meus lábios enquanto deleita todas as sensações que podemos
sentir juntos.
Me preparo para o toque, para sentir seus lábios contra os meus.
Tudo dentro de mim grita sim, quando eu mesma sei que é a pior das
decisões e que estou passando por cima do que digo para mim mesma.
Contudo, quando finalmente acho que ele, assim como eu, precisa
que esse momento aconteça, Oliver se afasta. Engolindo em seco e me
deixando ali, parada no meio de uma névoa de desejo e abandono. Minha
pele, segundos atrás, estava quente como inferno, agora, sente a corrente de
ar gélido.
— Sabe, você não precisa se preocupar comigo, loirinha, eu sei
como desempenhar um papel quando necessário — pondera, sorrindo
perverso. — Mas, preciso dizer que se agir de forma preocupada na frente
dos nossos amigos, provavelmente vai revelar toda nossa mentira rápido.
Por suas palavras percebo o que ele estava fazendo. Respiro fundo e
olho para trás, vendo que não só Thea nos encara com os olhos brilhantes e
um sorriso bobo no rosto, mas, também, um grupo de quatro adolescentes
que entraram no estabelecimento sem que percebêssemos e, agora, olham
para Oliver como se ele fosse um príncipe dos contos de fadas infantis,
apenas porque, nesse momento, ele parece um namorado atencioso ao me
encarar como o motivo pelo qual seus olhos brilham.
Quando ele pega todas as obras que eu havia escolhido e passa por
mim, deixando um beijo casto em minha bochecha, percebo que Oliver
Wright não é apenas um enigma, ele também é algo que eu tenho medo de
descobrir, porque tenho a sensação de poder lê-lo várias e várias vezes e,
ainda assim, irei encontrar coisas novas que antes não tinha prestado
atenção.
Isso é assustador.
— Você vem, loirinha?
Oliver pergunta quando não respondo sua frase anterior e ergue sua
mão para eu poder entrelaçar nossos dedos. No momento em que percebo
que tudo já está empacotado e ele me espera para sairmos, sou obrigada a
sorrir falsamente em sua direção e caminhar até onde está.
A cada passo até ele, concluo que não há mais volta. Oliver abaixa
rapidamente seu olhar até mim, e acena em uma concordância rápida, não
há palavras, não há nem outro gesto, apenas duas pessoas que não se
gostam, mas possuem motivos suficientes para fazer com que essa farsa
aconteça.
Estamos nisso juntos.
Um acordo.
Uma mentira.
Um segredo.
É o que somos.
Confirmo isso quando entrelaço nossos dedos e sigo para fora da
livraria.

Eu não vi Oliver pelos dois dias que se sucederam a manhã na


biblioteca.
Ele nem ao menos apareceu para os cafés da manhã no Oásis que
nós e o resto de nossos amigos tomamos todas as quartas-feiras. Uma parte
de mim até mesmo ficou preocupada e paranoica sobre ele ter desistido do
acordo. Contudo, mesmo que eu ande com um pouco de receio, sei que não
fará isso, afinal, a farsa é tão benéfica para ele como para mim.
Talvez ele só esteja ocupado, diz a voz reconfortante no meu
subconsciente.
Isso. Talvez seja exatamente isso. Mas eu não sou uma pessoa
paciente que escuta as vozes da minha cabeça ou espera sentada por uma
oportunidade para algo ser feito. E talvez, apenas talvez, seja por isso que
desbloqueio meu celular, me sentando no banco do motorista do meu carro
e abro o Instagram em busca do perfil de Oliver. Deslizo um polegar pela
tela e não encontro nada para indicar que ele está ocupado ou achou algo
mais interessante do que fingir um relacionamento com a pessoa que não
suporta.
Mordo meu lábio inferior em dúvida se envio uma mensagem para
ele ou apenas o ignoro, como está fazendo comigo. Todavia, quando estou
fechando o aplicativo, volto atrás e clico na aba de mensagem, digitando
uma frase simples e prática:

itssummermiller: Você está vivo?

Incrivelmente, a resposta chega poucos segundos depois.

itsoliverwright: Depende. Você está com saudades, loirinha?

Solto uma gargalhada, me encostando no banco e levanto o celular


para digitar. Até mesmo esquecendo o que eu pretendia fazer.

itssummermiller: Nos seus melhores sonhos, playboyzinho. A


festa é em uma semana e acredito que sumir antes dela não mostra
um progresso em nosso – falso – relacionamento.

Sorrio, orgulhosa. Ele não pode me contrariar. Mas, quando meu


celular volta a vibrar indicando a próxima mensagem, eu juro que poderia
matar Oliver Wright.

itsoliverwright: Eu não sabia que minha namorada era


tão carente da minha atenção. Mas, perdoe-me por deixá-la
esperando, prometo estar em Saint Vincent pela noite.

itssummermiller: Eu não sou carente! Você não está na


cidade?

Alguns segundos depois, o aparelho em minhas mãos treme


novamente.

itsoliverwright: Sim, você é. E não, não estou. E precisamos


urgentemente conversar sobre aqueles livros, Summer.
ESTOU VICIADO!!!
Ergo uma sobrancelha, descrente. Ignorando o fato dele responder
minha pergunta da forma que me indica que não está a fim de ceder
explicações, pelo motivo o qual não está onde deveria.

itssummermiller: Você está lendo?

itsoliverwright: Óbvio. Precisamos conversar sobre como


Aaron é apaixonado pela Lina e ela nem percebe.

Minha boca se escancara, enquanto digito a minha próxima


mensagem. Porque, não, não é possível que ele esteja lendo um dos meus
livros favoritos.

itssummermiller: Você está lendo Uma Farsa de Amor na


Espanha???

itsoliverwright: Deus, Summer. Parece que eu acabei de te


falar que encontrei a cura para o câncer.

Solto outra gargalhada, desta vez mais sincera do que achei que
poderia um dia por causa dele, sabendo que ele está sorrindo
condescendente do outro lado da tela.

itssummermiller: Acho que isso não me surpreenderia mais do que


você lendo.

itsoliverwright: Você sabe ser irritante. Mas, diga-me, quando


iremos dividir uma cama? Estou ansioso para esse momento!

Encaro meu celular por mais alguns segundos, lendo e relendo sua
última mensagem, ainda sem acreditar que Oliver está realmente lendo um
dos livros que compramos ou pior, que está me provocando com uma das
cenas mais clichês que existem nesses livros.
itssummermiller: NUNCA!

Posso escutar a gargalhada que provavelmente está dando neste


momento. E, por incrível que pareça, eu não estou irritada com ele. Mas,
como poderia? Oliver está fazendo tudo o que pedi, está se esforçando para
nosso arranjo dar certo, mesmo no fundo, sabendo que há motivos
escondidos para toda essa tramoia que ele nos colocou.
Ele é um Wright. Possui o mesmo sangue que o homem que quase
destruiu o relacionamento dos meus amigos. Oliver nunca faz promessas
vazias ou deixa algo pela metade. Contudo o que ele não sabe e
provavelmente nunca saberá, é que acaba de me surpreender.
Balanço a cabeça, focando minha atenção no volante a minha frente
e começo a dirigir até a casa de Verônica, já que ela praticamente convocou
todas nós para uma tarde de garotas, o que em outras palavras, é apenas
uma tarde regada a tequila e skincare.
Trinta minutos depois, estou entrando pelos enormes portões da
Mansão Blackwell e ergo uma sobrancelha quando avisto Verônica, Hazel e
Analu deitadas nas espreguiçadeiras em frente a enorme piscina, segurando
taças com bebidas coloridas.
Hazel é a primeira a me ver, abandona a taça ao lado de onde estava
deitada e se levanta, colocando uma túnica de pano leve e vindo até onde
estou.
— Ei, sumida! — exclama, sorrindo. Suas bochechas estão coradas
por conta do sol e os olhos escuros brilham. — Achei que nunca chegaria.
Sorrio de volta, deixando minha bolsa em uma das espreguiçadeiras
e encarando as minhas outras duas amigas.
— Passei na casa dos meus pais antes de vir — conto.
Vee nem ao menos ergue o rosto, já focada em um camalhaço que
está lendo. Analu, por outro lado, estuda toda a minha roupa e ergue uma
sobrancelha quando percebe a falta de roupas de banho.
— Se eu fosse você não pularia na piscina com essa roupa, Miller
— adverte, erguendo uma sobrancelha
— Não brinca! — zombo. — O que vocês estão fazendo?
Parker levanta os óculos escuros e semicerra os olhos, virando-os
em minha direção.
— Apreciando como a luz solar faz bem para a minha pele —
responde, sarcástica. — Agora, saia da minha frente, você está
impossibilitando de ela chegar até mim.
Ergo uma sobrancelha, ignorando-a, e olho para Vee ainda quieta e
focada no exemplar em suas mãos. Isso é uma coisa sobre ela, uma que
todos nós já sabemos. Verônica Blackwell é a maior bookstan do nosso
grupo. Ninguém consegue se comparar a ela quando o assunto são livros e,
para ser sincera, seu namorado não fica atrás. Logan Underwood mesmo
não demonstrando, é totalmente fascinado por livros, em principal os de
fantasia.
Inclino de leve a cabeça para o lado, a fim de ler o título e não me
surpreendo ao perceber ser um dos vários exemplares da saga de Trono de
Vidro[10]. É seu vício ultimamente, e sei que enquanto não os finalizar, não
conseguirá largá-los.
— Onde está Logan? — Pergunto.
Vee sorri, enfim me dignando a sua atenção e levanta o óculos de
grau de armação preta, destacando os olhos âmbares.
— Na academia da universidade — conta, sorrindo. — Ele e Dylan
decidiram que vão começar um treino antes do início do semestre.
Quase solto uma gargalhada. Estou, hoje, especialmente, risonha.
Isso não é uma novidade, sabendo que esse será o último semestre deles no
time já que ambos se formam no final do ano e querem que essa temporada
de jogos seja memorável.
— Homens — Analu murmura. Todas a encaram e erguem uma
sobrancelha. — O quê? Quem prefere treinar à aproveitar as férias?
Umedeço meus lábios.
— Você?
Ela não responde, sabendo que não há argumentos contra isso.
Apenas volta sua atenção para o tablet e abaixa o óculos novamente.
Afinal, o que poderia dizer quando pratica diariamente o seu treino de tênis,
mesmo após desistir das competições quando completou quinze anos? Ou o
fato de preferir estar lendo os artigos sobre o seu curso a fazer qualquer
outra coisa?
— Por que Edmund está tão nervoso? — Hazel questiona, de
repente, franzindo o cenho.
Nós olhamos para onde o caçula dos Blackwell caminha pelo jardim
em direção ao lado da piscina, encarando seu celular com uma careta nada
agradável e soltando alguns ruídos inaudíveis, prestes a assassinar alguém
que cruzasse seu caminho.
— Problemas com o protótipo do seu novo projeto — Vee conta,
virando uma página. — Eu já disse a ele que se não se acalmar, vai acabar
tendo uma síncope.
Olho para Ed no mesmo instante que Analu abaixa o objeto em suas
mãos e estuda o irmão de Vee. Não há como negar que Edmund Blackwell é
lindo. Seus cabelos escuros, mandíbula marcada e uma sobrancelha
desenhada com perfeição, faz com sua expressão seja severa e ao mesmo
tempo delicada.
— Eu definitivamente namoraria seu irmão, Verônica — Analu diz,
brincando.
Por um instante, encaramos Analu em silêncio. De repente, soltamos
uma gargalhada, mesmo sabendo que seja apenas uma brincadeira. Nem
mesmo em outra vida, Analu Parker e Edmund seriam um casal. Porque,
definitivamente, sabemos que ele se apaixonará por alguém, assim como
ele, será calma e centrada. Não um furacão que transformará sua vida em
uma bagunça.
Meu pensamento é cortado quando Melany Underwood sai correndo
de uma porta e segue em nossa direção pela lateral da piscina. As madeixas
pretas balançam de um lado para o outro enquanto levanta o rosto. Fazendo
com que o sol destaque suas íris azuladas que combina com a túnica de
banho que está aberta, fazendo com que eu possa observar o maiô vermelho
com uma tira lateral.
Ela solta um bufo irritado por conta do celular tocando enquanto
digita, não percebendo que está prestes a se chocar com Ed que também
está focado no aparelho em sua mão.
Abro a boca para gritar, alertá-los, porém não tenho tempo, no
momento seguinte o corpo de Melany se choca forte com o do Edmund que
tinha acabado de alcançá-la.
E, como se fosse uma câmera lenta, eles caem na parte funda da
piscina.
— Oh, meu Deus! — Verônica exclama, largando o livro e se
levantando.
Hazel, eu e Analu a seguimos e paramos na borda, encarando a água
cristalina. Analu dá um passo para trás, como se tivesse medo da água ou
até mesmo de cair. Olho de relance e percebo que a loira encara a piscina
com os olhos assombrados e então, engole seco.
— Eu até gosto dos dois, mas não contem comigo para entrar aí —
ela murmura.
Levanto uma sobrancelha.
— Você tem medo d'água? — minha pergunta sai em um tom
confuso.
— Digamos que eu e piscinas não somos melhores amigas. — Ela
sorri, falso e se vira, colocando uma distância segura entre ela e a água.
Há algo oculto em suas palavras. Posso sentir. É como se Analu
tentasse esconder seus segredos assim como escondo os meus. Como se a
loira também fosse tão machucada que, ao contrário de mim, prefere atacar
antes de ser atacada.
A dor em suas íris quando seu rosto se vira novamente para a
piscina, é reconhecível para mim. É como se me dissesse, mesmo em
silêncio, que quem a machucou era especial, assim como a pessoa que me
machucou era para mim.
Edmund é o primeiro a emergir, fazendo eu esquecer a pequena
conversa com Analu e foque neles novamente. Logo após, é a vez do cabelo
molhado de Mel aparecer ao seu lado.
Os rostos dos dois estão nivelados e mesmo com a distância
significativa, Melany olha para ele com o rosto furioso e Ed mantém seus
olhos castanhos no rosto da caçula dos Underwood. Há uma letalidade
emanando deles. Um brilho animalesco que nos indica que eles poderiam
matar um ao outro por conta do incidente.
— Sabe, derrubar uma pessoa na piscina não é uma ação apreciada
por convidados — ela alfineta irônica e solta um sorriso descarado, se
afastando ainda mais dele.
Percebo que todas engolimos uma risada, porque Ed a encara como
se ela fosse uma pirralha que não está a fim de lidar. E Mel devolve o olhar,
mas quando ele se prepara para se afastar e solta sua resposta,
definitivamente sei que Mel deseja afogá-lo nessa piscina:
— Sabe... derrubar um dos donos da casa também não é uma ação
apreciada, Melany — Ed sorri. Seus olhos se mantêm no rosto de Mel e em
nenhum momento ela fraqueja. Nenhum deles cede. — Principalmente
quando ele odeia nadar e está no meio de uma negociação importante.
Ela estala a língua no céu da boca.
— Você me derrubou, seu nerd idiota! — exclama, ofendida.
Edmund pode ter vinte anos e ser o caçula, mas, ainda assim, é um
Blackwell. E pelo seu olhar e a risada sarcástica, é visível que não gostou
de ter sido jogado na piscina e provocado por uma garota mais nova.
— Pense como quiser, Melany — o tom dele é calmo, dando de
ombros e nadando até a borda. — Mas, saiba que essa não é a verdade.
Mel levanta a mão, lançando-o um gesto vulgar com o dedo. Ed
apenas revira os olhos a ignorando e se ergue, saindo da piscina,
caminhando em direção a casa, emitindo uma série de palavrões em direção
ao aparelho que parou de funcionar por conta da queda. Melany, por outro
lado, xinga até a última geração da família dele, mesmo com Verônica
erguendo uma sobrancelha em sua direção.
— Pensando bem, acho que prefiro apenas ser espectadora da vida
dele — Analu solta de repente. — É mais interessante. Mas não vou negar
que seu irmão é quente, Verônica.
Pendo minha cabeça para trás, gargalhando.
Porém, no fundo, sei que assim como eu, Analu, também percebeu
algo.
Nunca tive alguém para chamar de meu, oh não
Estou tão acostumado a partilhar
O amor só me deixou sozinho
Mas estou em silêncio
Silence | Marshmello feat. Khalid

Observo o telefone mais uma vez em minhas mãos, ainda podendo


escutar a discrepância na voz de meu pai ao proferir todos os tipos de
ofensas que meus ouvidos pudessem ouvir.
Olho para a paisagem à minha frente, ignorando algumas pessoas
transitarem de um lado para o outro, e apoio meu cotovelo em meus
joelhos, fechando os olhos. Encosto meus punhos fechados na testa,
imaginando como contarei a Andrew a notícia que nosso pai jogou em meu
colo, durante a minha pequena viagem a Nova York.
— Você é uma pessoa difícil de se achar, sabia?
Olho para cima observando Verônica sorrir para mim, enquanto
alisa seu vestido branco florido e se senta ao meu lado, cruzando as pernas e
destacando um salto rosa. Solto um meio sorriso, sabendo que essa escolha
de roupa é uma forma de divulgar a nova coleção de Amber.
— Você está atrasada — debocho, sorrindo fraco.
Vee solta uma gargalhada e mesmo que tudo dentro de mim ainda
seja uma bagunça, eu acompanho o seu gesto.
— Ah, vamos lá, eu não sou sua motorista particular — ela afirma,
dando de ombros. — Estou te fazendo um favor vindo te buscar nesse
aeroporto.
Encaro-a de relance, observando seu perfil relaxado.
Verônica Blackwell é a minha melhor amiga desde que eu era
apenas um garoto assustado; nós acompanhamos cada ciclo da vida um do
outro e nos seguramos quando o nosso mundo ruía cada vez mais à nossa
volta. E agora, poder observá-la sorrir sem que o passado seja um peso em
suas costas, sem que precise fingir para o mundo que odeia o homem que
conquistou seu coração desde que éramos adolescentes, faz um sorriso
verdadeiro se manter em mim.
Ela me encara, percebendo meus olhos em seu rosto, e substitui a
gargalhada por um sorriso leve, fazendo o sentimento que percorre meu
coração, aumentar. Sei que a nominação para isso é amor. Amor singelo e
fraterno, amor como o de Meredith Grey e Cristina Yang[11], personagens de
uma das séries que fui obrigado a maratonar com Hazel.
Mas, o que eu quero dizer com essa comparação patética, é que
somos a pessoa um do outro. Que se caso matássemos alguém, sem
dúvidas, seríamos a quem recorreremos para ajudar a arrastar o cadáver
pelo chão da sala. Mesmo reclamando em todo o processo, ainda assim, nós
ajudaríamos.
Porque é isso. Nós sempre estamos aqui para salvar um ao outro.
Sempre. Independente de qualquer situação.
Verônica e eu somos irmãos, não de sangue, mas de alma. Pois sim,
é possível encontrar uma alma gêmea em uma amizade.
— O que está acontecendo, Ollie? — pergunta, preocupada. — Eu
vejo em seus olhos que algo não está certo.
Não, não está. Não quando eu precisei sorrir e fingir ser um filho
prodígio durante um almoço inteiro apenas para conseguir fazer meu pai
assinar todos os trâmites da mudança definitiva de Andrew para Saint
Vincent.
— Meu pai vai se casar outra vez — solto a notícia que foi o motivo
pelo qual voltei mais cedo para a cidade.
Ela me encara perplexa, seus olhos castanhos estão arregalados e
por um momento, penso que irá cair nesse chão desmaiada e terei que
explicar a Logan o motivo pelo qual sua namorada foi parar em um
hospital. Mas, para o meu bem, ela solta uma respiração rasa e apenas ergue
uma sobrancelha.
— Filho de uma puta asqueroso! — xinga, sem se importar com os
olhares de desaprovação de algumas pessoas que estão passando.
Não me surpreendo, não quando ela, melhor do que ninguém, sabe
exatamente o motivo pelo qual eu não aceito que ele se case novamente.
Não depois de tudo que ele fez.
Ele não merece uma felicidade, redenção ou coisa do tipo. Ele
merece coisa pior. Brandon Wright merece morrer em sua própria
lastimação, envolto em sua arrogância e prepotência.
Lauren, sua noiva, não merece o homem pelo qual está apaixonada,
ela nem ao menos deveria cogitar a ideia de se tornar a nova Sra.Wright.
Não quando a única Senhora Wright que deve existir é minha mãe.
E, nunca, em hipótese alguma, irei aceitar que alguém carregue o
seu título. Que transforme todas as nossas memórias manchada com sangue
para algo límpido e inalterado.
Abigail Victória Wright é a única mulher que deve consumir os
pensamentos de Brandon, porque ele precisa se lembrar. Ele precisa manter
seu pesadelo vivo enquanto pisa em nossas propriedades ou quando escuta a
doce melodia do piano da mansão. Porque minha mãe sofreu para esse
monstro reinar sobre nossa família. Ele fez ela nos abandonar quando não
tínhamos segurança ou felicidade.
Ela deixou Andi e eu aqui.
Na cova dos leões.
Sozinhos.
A mercê dele.
— Ele me enganou todo esse tempo, Vee — murmuro. — Todas as
vezes que eu precisei lutar para preencher o vazio ou quando ele dizia todas
aquelas mentiras sobre minha mãe. Era tudo manipulação. E agora ele vai
se casar com uma mulher que não merece estar entre toda essa
mediocridade.
— Lauren não aceitaria, ela não seria tão ingênua — minha amiga
afirma, mas sua voz não é confiante. — E ele nunca segue com os noivados,
Ollie.
— Desta vez é diferente. Ele quer esse casamento e ela seria sim,
ingênua, porque o ama. O amor faz as pessoas tomarem atitudes egoístas,
descabidas — Solto um sorriso frio, enquanto Vee encosta a cabeça no meu
ombro. — Mas, porque estamos surpresos, no final os monstros sempre
ganham, certo?
— Nem todas as vezes, Ollie — Vee confessa, segurando minha
mão e a apertando. — Às vezes, o amor não cheira mal. Às vezes, ele nos
salva.
— Você é a exceção, Pequena Blackwell, não a regra — minha voz
sai em apenas um sussurro, enquanto devolvo o aperto.
— Não, Ollie, eu não sou uma exceção, eu sou uma lutadora. — Ela
levanta e se coloca na minha frente. — Eu precisei sangrar muito para
poder vencer a minha própria guerra. E você, melhor do que ninguém, sabe
quantas batalhas eu perdi no caminho.
Solto um suspiro, deixando meus ombros caírem e sabendo que ela
está certa, não há exceção quando se trata dos assuntos da família de Vee.
Eles sabem o preço que a ambição pode custar, sabem como mal-entendidos
resultam em tragédias e perdas irreparáveis.
Ela se mantém à minha frente, com os olhos firmes e dolorosos e, eu
me arrependo de minhas palavras. Verônica não merece que eu desconte
minhas frustrações em seus ombros. Porra, ninguém merece.
— Sinto muito.
— Eu sei. — Verônica deixa seus ombros relaxarem. — Às vezes
atacar é a melhor maneira de não deixar que cheguem até onde dói.
Quando volta a se sentar, continua me encarando. Há tantas
perguntas ali. Perguntas pelas quais eu não sei se estou pronto para dar a
resposta. Vee sabe disso, sabe que eu não quero comentar sobre meus
problemas, sobre como tudo ainda me assombra e como eu me mantenho
preso em meu passado.
Minha amiga compreende que quando chegar o momento em que
estarei pronto para falar, correrei até onde está.
Por essa razão somos uma dupla. Nós entendemos até mesmo o
silêncio um do outro. Entendemos que apenas precisamos estar ali, sentados
e segurando a mão do outro, para nos reerguer de alguma merda aprontada
por nossas famílias.
— Você é a minha metade, Pequena Blackwell — digo,
surpreendendo-a.
— E você é a minha, Ollie. — Sorri. — Mesmo que continue sendo
o pior melhor amigo que eu poderia ter.
— Eu sou? — Franzo o cenho.
— Óbvio — declara. — O ano começou e nós não fomos ao nosso
lugar favorito até agora.
— Você estava ocupada com seu namorado — brinco.
— Logan está ocupado com Dylan hoje. — Ela dá ombros. — Então
podemos ir agora.
— Oh, você nem vai negar que estava ocupada? — pergunto,
debochado.
— Eu deveria? — ela questiona, maquiavélica.
— Às vezes, eu me questiono como Underwood consegue te
suportar.
— Eu não vou dar detalhes do meu relacionamento para você, Ollie.
— Revira os olhos. — Agora vamos, se não, iremos nos atrasar.
Solto uma gargalhada me levantando e estendo a mão para ela me
acompanhar até o carro. Depois de alguns minutos, enquanto dirige até o
outro lado da cidade, Vee começa a me contar sobre coisas banais do seu
dia. Poder vê-la assim, despreocupada, feliz, me faz querer sorrir ainda mais
em sua direção.
Porque Verônica merece. Ela merece sorrir sem o peso do passado a
atormentando, merece poder viver seus sonhos, ter Logan finalmente ao seu
lado. Todos nós sabemos que ela e seus irmãos esconderam do mundo o
quanto estavam machucados. Eles precisaram ser uma versão fria e cruel,
uma versão que sabia não ser verdade. Pois, já estive lá, me sentei ao lado
deles e presenciei todas as mentiras, manipulações e segredos.
Até mesmo, julgo a dizer que Dylan Blackwell é o que mantém seus
demônios escondidos sob sua pele, atrás de seus olhos castanhos e uma
postura rígida, há lembranças de um adolescente que precisou carregar sua
irmã caçula para fora de um carro enquanto ela morria lentamente.
— Chegamos — Verônica comunica, me tirando dos meus
pensamentos.
Olho para frente, admirando o pequeno estabelecimento numa rua
pouco movimentada. O logotipo com uma enorme xícara branca, envolta de
pequenas detalhes pretos, me faz regressar em um momento em minha vida
que eu e Verônica corríamos para cá dia após dia, tentando aplacar nossas
dores, enquanto desafiávamos um ao outro para provar todo o cardápio de
bebidas estranhas que a cafeteria possuía, apenas para poder esquecer a
realidade que nos atormentava. Por isso, após essa grande ideia, adquiri um
vício em cafeína, fazendo com que todos dias eu precise de alguma bebida
provinda desse suprimento.
Minha amiga dá alguns passos à frente até que suas mãos delicadas
se encontram na maçaneta escura e a empurra, fazendo um tilintar do
pequeno sino soar pelo ambiente quase vazio. Donna, uma senhora de quase
setenta anos sai de uma pequena cozinha limpando suas mãos em um pano
e olha para frente, em nossa direção e sorri calorosamente quando percebe
quem são seus novos clientes do dia.
— Oh, meu Deus! Joseph, venha aqui, homem — grita, dando a
volta no balcão e correndo até nós. — Eu não acredito que meus melhores
clientes voltaram para mim.
Antes que pudéssemos responder, um senhor de cabelos grisalhos
com enorme óculos quadrados surge atrás dela, se atrapalhando com
alguma coisa e com os olhos arregalados.
— Vocês estão quatro anos atrasados para o café anual! — exclama,
tristemente.
Olho de relance para Verônica que mantém um sorriso singelo nos
lábios ao mesmo tempo percebo que seu olhar está marejado. Se eu ainda
pudesse chorar, diria que estaria da mesma forma.
Porque esse casal, esses dois velhinhos que estão alarmando todo o
estabelecimento de sermos uma visita frequente aqui, nos viu no nosso pior
momento. Eles serviram todos os cafés disponíveis do cardápio, enquanto
lamentávamos sobre nossas vidas medíocres e nossos problemas. Chutaram
nossa bunda quando vínhamos até aqui bêbados ou quase nos arrastando
por conta de uma noite regada a festas que nossos pais nos obrigavam a
participar sempre que eu estava na cidade.
Eles cuidaram de nós até aquela noite. Até aquele nove de janeiro.
O dia em que Sophie morreu.
— Bem, é como dizem: o bom filho à casa retorna — Vee
responde, dando um passo à frente e abraçando-o, enquanto Donna não me
dá tempo de dizer algo, apenas me puxa envolvendo seus braços
rechonchudos em volta do meu pescoço.
— Ela está bem? — Donna sussurra em meu ouvido depois de
algum tempo, se referindo a Verônica. Porque a senhora que está me
esmagando, sabe tudo o que aconteceu em nossas vidas e esteve lá quando a
irmã de Vee morreu naquele acidente e quando abandonamos a cidade.
— Ela está, Donna. — Maneio a cabeça. — Ela finalmente se
perdoou.
— Ah, eu fico tão feliz que minha menina finalmente está bem —
murmura, sua voz é regada a felicidade genuína. — E você, Ollie, você
conseguiu?
Me afasto, não respondendo sua pergunta e quando ela me encara de
novo, seus olhos são penosos e gentis, uma mistura que odeio, um
sentimento que não preciso que sintam, mas sei que ela não está fazendo
por mal, apenas por se preocupar de forma genuína comigo e Vee.
— Vocês chegaram na hora certa — Joseph diz vindo em minha
direção e me abraçando brevemente. — Nós fizemos o seu doce de limão
preferido e aqueles donuts que Vee ama.
Encaro Verônica e ela já está me encarando, pelo sorriso que
mantém em seus lábios, sei que está pensando o mesmo. Estamos prestes a
chegar atrasados no Oásis.
— Bem, eu não me importaria de comê-los — Vee responde tirando
a bolsa do ombro e indo em direção a nossa mesa, no canto da cafeteria.
Quinze minutos mais tarde estamos envoltos de dois pratos com
inúmeros doces de limão, os donuts coloridos que Verônica ama e duas
enormes xícaras de mocaccinos fumegantes.
— Eu não tinha parado para pensar que sentia falta desse lugar até
agora — confesso, levando a xícara até meus lábios quando Donna voltou
para atrás de seu balcão.
— Essa é a coisa, não? Sempre foi nosso lugar preferido porque
todas as vezes que vínhamos aqui sentíamos a mesma sensação — minha
amiga diz, pegando um dos pequenos doces. — A sensação de estar em
casa.
Sorrio fraco, absorvendo suas palavras e sentindo o gosto do café
misturado à calda de chocolate. Um gemido satisfatório quase escorrega de
meus lábios e mal percebo ter tomando quase todo o líquido, até que
Verônica solta uma pequena gargalhada.
— E eu aqui pensando que você tinha superado seu vício em
bebidas com cafeína — comenta, entornando sua própria bebida.
— Não há como superar isso, Pequena Blackwell, é a oitava
maravilha do mundo! — brinco, limpando os resquícios de espuma que
havia grudado em meu rosto. — Posso te fazer uma pergunta?
Ela me encara, esquecendo tudo à nossa volta.
— Sempre, Ollie.
— Como foi visitar Sophie? — minha pergunta não se passa de um
murmúrio.
Os ombros de Verônica se enrijecem e me mantenho quieto, a
observando apoiar seus cotovelos na madeira da mesa e escorar seu queixo
em sua mão, refletindo sobre minha pergunta.
— Eu vivi tanto tempo me prendendo a algo que ela foi, que quando
finalmente disse adeus a tudo o que ela representou para mim durante esse
tempo, foi como se eu tivesse me libertando de tudo — sua voz é baixa,
dolorosa. — Eu não me ressentia dela, não pensava em todo mal que ela me
causou ou nas pessoas ao nosso redor, eu apenas estava me despedindo da
minha irmã e estava bem com isso, sabe? Estava bem em voltar a viver a
minha vida, a continuar por mim. Eu preciso continuar dançando, preciso
seguir em frente e entendi que apenas me lastimar por tudo o que
aconteceu, não ajudaria nem a mim ou às pessoas que eu amo. Então, a
resposta que você está procurando é que sim, eu me senti bem quando a
visitei. Posso dizer que me senti até mesmo aliviada por ter dado um ponto
final a tanto sofrimento.
— Fico feliz por isso — digo, verdadeiramente.
— Eu sei, Ollie. — Ela ergue a cabeça, e estende sua mão até a
minha. — Não é fácil, eu precisei de quatro anos para conseguir entrar
naquele cemitério, mas posso dizer que tudo aconteceu no momento certo.
Cada um tem o seu próprio processo de cura.
— Fico me perguntando se um dia ele irá lá.
Ela sabe que não estou mais falando de Sophie.
Verônica me encara, seus olhos se tornam um reflexo dos meus;
Ódio, dor e ressentimento. São isso que suas orbes castanhas me mostram e
é exatamente isso que reflete nas minhas.
— Eu sinto muito.
— Não sinta, Vee. Não é sua culpa — sussurro. — Ele não pode ter
essa dádiva, não pode ter a nossa benevolência. Ele não pode se casar e
viver como se não tivesse destruído uma mulher, como se suas ações não
acarretaram na morte dela, como se ele não fosse responsável por tudo o
que nossa família se tornou.
A imagem de todas as vezes que minha avó andou pela nossa casa e
parou sempre no primeiro degrau, apenas para encarar a foto da mulher
pendurada em uma das paredes, fazendo eu escutar o suspiro doloroso
emitido de quando se lembrava do sorriso de sua filha, ou quando Andi
procurava por algo que pudesse aproximá-lo dela, porque não teve tempo
suficiente para conhecê-la, me faz fechar as mãos em punhos e cerrar minha
mandíbula.
Todas essas lembranças me machucam mais do que os momentos da
minha pele sendo cortada, por conta da força que Brandon utilizava para me
punir das atitudes que eu não tinha culpa.
— Você não pode impedir, Ollie…
— Felizmente, talvez eu possa.
Solto sua mão, me escorando no meu assento, sorrindo triste.
O que eu estou prestes a fazer é algo que poderá ser o fim da
dinastia Wright. Um escândalo que fará com que ele me odeie ainda mais e
que destruirá tudo o que eu carrego comigo.
Cada vez que ele machucou minhas costas.
Cada vez que ele levantava a mão para minha mãe.
Cada vez que Brandon fez com que eu odiasse meu sobrenome e a
cidade onde nasci.
Eu o destruirei, farei com que pague tudo o que fez comigo e com
minha mãe.
Contudo, para fazer isso, eu precisarei carregar as consequências de
poder destruir duas pessoas inocentes. Duas pessoas que não possuem culpa
do acontecido, mas por serem próximas a mim, também sofrerão as
consequências.
Talvez seja por isso que ainda não dei o pontapé inicial em meu
plano.
Porque talvez, machucar aqueles que eu amo possa me custar mais
do que uma vingança que arquiteto desde meus quinze anos.
E me pergunto o que eu fiz para merecer isso
Como você pôde machucar uma criancinha?
Eu não consigo esquecer, eu não consigo te perdoar
Porque agora tenho medo de que todos que amo me deixem
Family Line | Conan Gray

PASSADO
A casa está silenciosa e isso não é normal.
Mamãe já deveria estar tocando aquele piano que papai odeia e ele
já deveria estar gritando sobre como esse som é insuportável.
Mas hoje não há som. Não há gritos.
Isso é muito estranho.
Olho de relance para a janela do meu quarto onde meus livros estão
e encaro o tempo nublado. É como se até mesmo ele sentisse que algo não
está certo, como se fosse um presságio para algo ruim prestes a acontecer.
Como na noite passada, quando escutei gritos vindo da sala de piano onde
mamãe sempre fica e, logo após, pude observar alguns funcionários
passarem por mim com os olhos tristes e as feições regadas a pena.
Um olhar que, sem dúvidas, faria papai os demitir, já que ele deixa
claro para todos que ninguém pode olhar para um Wright com esse
semblante, porque nós somos fortes e indestrutíveis. Essa definição é uma
que mamãe sempre faz questão de negar. Todas essas vezes, ela olha nos
meus olhos e escancara sua aversão a essa vida, a pessoas que são sujas e
covardes.
Eu não sou isso, certo? Eu não posso ser covarde. Eu até enfrentei
Mike Burhan na escola esses dias quando ele disse que eu era um pacote de
merda, só porque não queria fazer dupla com ele. E mamãe sabe que não
sou sujo, nunca poderia ser, não quando minhas babás me obrigam a tomar
tantos banhos por dia, quando fujo para brincar com Vee no lago próximo a
nossa casa.
Passo as mãos pelos meus cabelos que insistem em cair pelos meus
olhos e jogo minhas pequenas pernas para fora da minha cama, calçando
minhas pantufas e sigo para o banheiro. Não demoro muito porque sei que
Alicia, minha babá, deve chegar em pouco tempo para me arrumar para o
colégio e eu odeio quando ela quer me ajudar. Isso mostra ao meu pai que
não sou capaz de ser independente e não preciso dele me encarando com
aquela expressão nervosa de novo.
Então, por isso, visto meu uniforme e me sento na janela,
observando o enorme jardim localizado na parte perto da piscina, esperando
Alícia vir me buscar para o café da manhã.
Passo meus olhos para a extensão do lugar e percebo que não há
nada ali, a não ser o cachorro de mamãe e alguns funcionários que correm
de um lado para outro, antes que papai chegue.
— Ollie? — a voz suave de mamãe que invade meu quarto. — Por
que está sentado sozinho aí?
— Oi, mamãe! — Sorrio, mesmo sabendo que ela não devolverá o
gesto. — Estou esperando Alícia, ela não vem?
Olho para ela a espera por sua resposta. Mamãe é linda. Seus
cabelos loiros caem pelos seus ombros finos, tampados pelo tecido amarelo
de seu vestido longo. Os olhos acinzentados estão frios, distantes e mesmo
assim possuem uma beleza que pertence apenas a ela. Mas, dessa vez, não é
para seus olhos que minha atenção vai e sim para sua maquiagem que
escondem os hematomas.
Sempre me perguntei como seria se ela pudesse, ao menos, uma vez,
poder andar sem seus produtos. Sem se esconder atrás de seus machucados.
Mamãe merece que as pessoas vejam o quão forte e invencível ela é.
Abigail Victória Wright é a mulher mais linda que eu já vi em todo o
universo.
— Sim, Oliver, ela vem — diz, calma, e junta as mãos em frente ao
corpo, destacando a aliança fina de ouro em seu dedo. — Ela só está
ocupada com o seu irmão.
— Oh, ela precisa de ajuda? — Pulo da beirada da janela onde estou
sentado e caminho até ela. — Andi sabe irritá-la quando quer.
— Não se preocupe com Andrew, Ollie, ela sabe lidar com ele… —
sussurra se abaixando. Pela primeira vez em muito tempo, ela levanta a mão
e mexe no meu cabelo. Seus olhos são tão vazios, tristes. Não há brilho
algum ali. Seu lábio inferior tem uma marca de corte que mesmo com
inúmeras camadas de maquiagem, ainda é perceptível. — Você é tão doce,
meu pequeno super-herói, tão altruísta.
— O que é altruísta, mamãe?
— É alguém que coloca as necessidades dos outros na frente das
suas, meu amor, e isso é lindo. — Ela sorri com lágrimas nos olhos. — Tão
lindo que eu tenho medo de que o nosso mundo tire isso de você.
— Mas você não vai deixar que isso aconteça, certo?
— Você precisa aprender a lutar sozinho, meu pequeno super-
herói… — Uma lágrima desce pelo seu rosto e, mesmo com medo, de que
ela me xingue por estragar sua maquiagem, ergo a mão e a enxugo. Mamãe
inclina a cabeça, aproveitando o carinho que faço em sua pele macia e solto
um sorriso feliz por ela não me afastar. — Você precisa aprender a ser forte
por você e por Andi, ok? Você pode me prometer que fará isso por mim,
Ollie?
Balanço a cabeça, concordando, mesmo sem saber exatamente o
significado de suas palavras. Mas, algo em seu rosto, talvez seja como seus
olhos brilham com as lágrimas a brigarem para derramar primeiro ou o
machucado em seus lábios, que ela faz de tudo para esconder de nós, me diz
que esta conversa não é algo banal ou uma conversa de bom dia, é algo a
mais. Algo que eu não compreendo.
Da mesma forma como fazemos todas as noites quando a encontro
no seu quarto, sentada em frente ao seu piano, eu sorrio e balanço a cabeça
em concordância.
— Eu posso fazer isso, mamãe. — Abro um sorriso escancarado,
sabendo sobre a falta de um dente. — Eu posso fazer qualquer coisa por
você.
Porque minha mãe é a minha pessoa preferida do mundo. É ela
quem amo, quem sempre está ao meu lado, quem eu faria qualquer coisa.
Se é isso preciso fazer para ela poder sorrir para mim como nas noites que
passamos juntos em seu piano, eu farei com prazer.
— Quero que seja feliz, Ollie, quero que ame e se decepcione — ela
continua. — Quero que mostre ao mundo quem você é. Quero que se
aventure, faça amigos e o principal, meu pequeno super-herói, eu quero que
nunca deixe seu pai o destruir.
— Ele não pode fazer isso…
Mamãe balança a cabeça, mordendo o lábio inferior, com pressa
para poder esperar pela minha resposta. Mas tudo bem, eu sei que ele nunca
fará nada contra mim, mesmo sendo frio e poderoso. Acredito que não fará,
nós somos seus filhos e ele nos ama.
— Quando a saudade for maior que tudo, Ollie, quando você achar
que o mundo desabará em cima de sua cabeça e não suportará a dor, quero
que lembre-se do nosso lugar favorito. Lembre-se de todas as noites que
compartilhamos no piano, de todas as vezes que eu tentei protegê-lo e de
todas as vezes que você foi a pessoa que eu mais amei em toda a minha
existência, meu pequeno super-herói — murmura e percebo que seu queixo
treme, como se segurasse para não partir bem aqui, na minha frente. —
Você e Andi são a minha vida, são tudo o que eu tenho de mais precioso,
mas, às vezes é necessário fugir de tudo aquilo que pode te quebrar.
Minha mãe se inclina e beija o topo da minha cabeça e, quando
volta a se levantar, me encara por mais alguns segundos para se virar,
caminhando até o final do corredor onde fica seu quarto.
No instante que Alícia chega para me arrumar, não vejo mais minha
mãe. Nem quando desço para o café da manhã ou quando volto do colégio.
Então, eu a esperei, dia após dia.
Esperei em nosso piano, esperei em todas as manhãs após aquela
pequena conversa que tivemos e esperei em seu quarto, que possuía seu
cheiro floral.
Eu esperei.
E continuei esperando.
Mas mamãe nunca voltou.

Respiro fundo, contando as pedrinhas perto dos degraus da escada


na frente da mansão dos meus pais. Não sei quanto tempo estou sentado
aqui desde que voltei da escola, mas não me importo.
Eu ficaria aqui o tempo que for necessário. Eu a esperaria.
Sempre esperaria minha mãe voltar para mim, mesmo que todos me
lancem olhares penosos e cheios de palavras que eu não entendo. Eu a
esperaria mesmo que ela tenha perdido meu aniversário de nove anos, há
três dias.
Alicia suspira ao meu lado, observando o meu corpo esguio.
Encosto o meu queixo no meu joelho e mantenho meu olhar no portão preto
fechado, da entrada de nossa casa. Eles não deveriam mantê-lo fechado.
Não. Eles deveriam abri-lo, ela pode voltar a qualquer momento. Um
segurança caminha de um lado para o outro, sempre mantendo seus olhos
em mim como se estivesse me vigiando ou protegendo. É difícil saber pela
sua expressão de pedra.
— Como mamãe vai entrar se o portão está fechado, Ali? —
pergunto, apontando para as grades.
— Ela… Ollie… — minha babá gagueja, e eu ergo uma
sobrancelha.
Alicia nunca fala desta maneira. Ela sabe que meu pai odeia quando
seus funcionários se portam com medo ou apreensão. Mas sabe que eu não
me importo com isso, sabe que eu não me importo com nada, a não ser
mamãe.
Mesmo ela não sendo tão carinhosa como tia Amber ou preferindo
ficar trancada no seu quarto com seu piano, ela ainda é a pessoa que eu amo
com todo meu coração. É por ela que eu aprendi a tocar seu instrumento
favorito e aprendi a amar o toque suave da melodia ecoando pelo salão,
todas as vezes que meus pequenos dedos dedilham as teclas.
Por querer passar mais tempo ao seu lado, eu aprendi a amar a
música. Aprendi a apreciar o som único e especial que ela conseguia fazer
quando fechava seus olhos e se entregava ao momento.
Por isso eu acredito que ela voltará, senão por mim e Andi, ela
voltará pela sua música, pelo seu piano. Eu o manterei aqui até ela decidir
estar pronta para voltar para nós. Para mim e meu irmão.
Escuto um arranhar de garganta atrás de nós dois e ambos olhamos
por cima de nossos ombros, dando de cara com papai. Ele empurra as costas
de Andi para ele vir até Alícia e meu irmão faz isso de bom grado. Andi
corre até nossa babá e solta uma gargalhada gostosa, uma que todos nós
amamos. Quando volto meu olhar para cima, para os olhos do meu pai, ele
está me encarando com o rosto fechado, quase que furioso. Seu terno sob
medida está um pouco amassado e a gravata, que sempre está perfeitamente
alinhada, hoje está frouxa.
— Venha comigo, Oliver — ordena.
— Mas, pai… mamãe pode voltar a qualquer momento… —
sussurro amedrontado.
— Agora, Oliver! — ele rosna.
Engulo em seco e aperto a mão de Alícia, quando percebo, ela está
relutante em me deixar ir com ele. Papai nunca falou desta maneira comigo
e, por um momento, me lembro das marcas que mamãe tinha, de como sua
pele sempre estava arroxeada, como seu brilho foi sumindo cada vez mais e
em como ela falou comigo pela última vez.
Não é a primeira vez que tenho medo do meu pai, mas, sem dúvidas,
é a vez na qual o medo se aloja em meu corpo e se recusa a me deixar.
E, mesmo com esse sentimento gritando para não o seguir, eu o
faço. Olho mais uma vez para meu irmão caçula e engulo em seco, entrando
na enorme mansão. O observo caminhar até o segundo andar, na ala dos
quartos e entrar em seu escritório privativo.
Assim que ultrapasso o batente do lugar, vejo que tudo aqui ainda é
escuro, desde as paredes pintadas de marrom à mesa de mogno, as peças de
artes que meu avô comprava em muitos leilões antes de vir a falecer, até as
poltronas que papai indica para me sentar.
Passo minhas mãos suadas pela camisa branca e caminho até a
enorme poltrona à frente dele.
— Sua mãe não irá voltar.
— O quê? — pergunto, mesmo sabendo que ele odeia repetir suas
frases, mas preciso saber que ele está mentindo, preciso saber que minha
mãe não me deixaria aqui sozinho. Ela não faria isso. — Você está
mentindo…
— Não, Oliver, eu não estou! — ele exclama, nervoso. — Sua mãe
fugiu há dois meses com um dos nossos seguranças e foi encontrada hoje.
Ele está mentindo. Ele tem que estar mentindo.
Porque mamãe não faria isso, ela não me abandonaria, ela nunca me
deixaria aqui, nunca deixaria Andi ou seu piano.
Eu sou o pequeno super-herói dela, eu sou Ollie… eu sou seu filho.
— Você-está-mentindo — silibo, mesmo que meu queixo comece a
tremer e as lágrimas se fixam na borda dos meus olhos.
Ele dá volta em sua mesa, para ao meu lado e segura fortemente
meu queixo, uma dor se espalha pelo meu maxilar e sou obrigado a olhar no
fundo de seus olhos verdes. Os olhos idênticos aos meus. Suas pupilas estão
dilatadas e uma veia pulsa em seu pescoço.
Me encolho em meu assento, como se isso fosse me proteger do
temperamento tempestuoso que meu pai está tendo no momento. Mas sei
que é apenas um ato inútil, porque isso não irá me salvar. Ninguém
consegue entrar nesse escritório se ele não permitir. Eu estou à sua mercê,
assim como sempre mamãe esteve.
Pela primeira vez sinto tudo e, ao mesmo tempo, não sinto nada.
A sensação de ser insuficiente faz com que me escolha, me envolva
em uma casca, a fim de me proteger. Ao mesmo tempo que a lembrança de
mamãe me dizendo que nunca nos deixaria faz com tudo dentro de mim
rompa.
Pois, no fim, ela fez isso.
Ela me abandonou.
Mesmo que me doa, mesmo que as emoções se enraízem em meu
peito e se espalhem por cada célula do meu corpo. Mesmo que meu medo
seja maior do que tudo nesse universo, sei que quando sair desse ambiente,
não serei mais o Ollie que entrou. Sei que tudo o que restará de mim, será
um vasto, intimidador e gélido vazio.
— A sua mãe, garoto, era uma puta — grita em meu rosto, percebo
seu hálito fétido a whisky, enquanto sua mão se eleva e meus olhos se
fecham instantaneamente. — Ela preferiu foder com um segurança do que
ter que criar seus próprios filhos!
O primeiro tapa vem forte e conciso. Machucando não só a minha
pele, mas também o meu coração.
A pele da minha bochecha arde e a primeira lágrima desce.
Lágrimas que não deveriam estar no meu rosto. Lágrimas que não deveriam
pertencer a uma criança indefesa. Mas, quando as outras descem
desfreadamente, estou soluçando de uma forma que o faz ficar mais
nervoso, fazendo com que outro tapa atinja meu rosto, cortando meu
supercílio.
Eu nunca esperei isso. Nunca esperei que aquele que deveria me
amar, agora é o motivo da minha ruína. Mas, o que se pode esperar de
alguém que machucou até mesmo aquela que ele jurou proteger, amar e
cuidar?
— Se recomponha. Seja a porra de um Wright! — grita, descendo
sua mão sobre meu rosto mais uma vez. — Porque é isso que você é,
Oliver. Mesmo que ela tenha fodido a nossa família, você e Andrew ainda
são meus malditos herdeiros.
Brandon sorri sadicamente e me levanta pelo pescoço, me jogando
no tapete escuro ao lado de um enorme sofá. Pouso de joelhos, tossindo
pela força que ele colocou em minha garganta e não permito que outras
lágrimas deslizem pelo meu rosto, deixo que a promessa de ser forte, a
promessa de cuidar de mim e Andi seja maior que a minha dor.
Não deixo que ele me quebre.
Eu nunca poderia deixar.
Não por mim, mas por Andrew.
Pela única pessoa que ainda está ao meu lado.
Porém, quando um barulho de cinto emerge na sala, fazendo todo o
meu corpo congelar, meu lábio treme e preciso morder meu lábio
fortemente para ele não escutar meus soluços. Sinto o sangue descer pela
minha boca.
Mesmo em vão, imploro mentalmente para alguém, qualquer
pessoa, me tirar daqui, me tirar desse lugar que está me machucando.
— Pai? — sussurro entre os soluços. — Por favor, não.
— Você não disse que estou mentindo? — ele grita, levantando o
cinto na altura de seus ombros e se preparando para me atingir. Durante
todo esse processo, ele mantém aquele olhar cruel em seu rosto. — Não
disse, Oliver? Não preferiu acreditar na puta que te deixou por um merda de
um segurança, do que acreditar no seu pai que está aqui te contando a
verdade? Que não te abandonou?
— E-eu… não farei mais isso! — grito desesperadamente. — Por
favor, pai!
Ele não me escuta. Pelo contrário. Meu pai desce o cinto com toda
sua força sobre minhas costas, fazendo com que um barulho soe na sala e
um grito agudo saía de meus pequenos lábios. O ar foge de meus pulmões,
enquanto sinto que a pele das minhas costas agora está machucada, mas
quando penso em dizer para ele, o couro volta a entrar em contato com
minha pele. Mordo meu lábio novamente, não me permitindo gritar outra
vez, e ele percebe isso, percebe que me recuso a me quebrar. Que recuso a
ser fraco na sua frente novamente.
Nunca deixe seu pai te destruir, a voz de minha mãe emerge em
minha cabeça. E então compreendo o seu medo, a maneira que falou
comigo, o jeito como me abraçou. Era uma despedida. Ela estava fugindo
para salvar o que havia sobrado de si mesma.
Abigail Wright não precisará se preocupar, não precisará pensar que
eu nunca serei forte. Porque eu sou e eu serei ainda mais. Não por ela,
nunca mais por ela, mas por Andrew e por mim.
Porque por mais que eu a ame, que entenda que ela não possui culpa
da alma pútrida do meu progenitor, ou por ter se casado com o homem mais
perverso na face da Terra, não posso dizer que não dói, que seu abandono
não queima mais do que os cortes que o couro está fazendo em minha pele.
E essa dor vem acompanhada de um sentimento infeliz, um
sentimento que corre pelas minhas veias e se aloja em meu peito. Por mais
que eu não a culpe por todos esses motivos, ainda assim, a culpo por ter
fugido e me deixado aqui, por ter se esquecido que Andrew fará aniversário
em algumas semanas e não a terá ao seu lado para comemorar. Eu a culpo
por ter escolhido um amor romântico a seus filhos, eu a culpo por tudo isso.
Quando o couro para de atingir minha pele e finalmente sinto um
líquido quente e espesso descer pelas minhas costas, a dor é insuportável e
meus olhos lutam para se manter abertos. Nesse momento, entendo que
assim como ela, sobreviveu à sua maneira, agora, está na hora de aprender a
sobreviver por mim e meu irmão.
Porque eu não cederei, eu nunca mais cederia a qualquer pessoa.
Nunca mais deixarei que o amor se instale em mim novamente e me cegue
assim, que eu ache que por mais que as pessoas amem e sussurrem palavras
carinhosas em nossos ouvidos, elas não te abandonam ou machucam.
Não, quando você se deixa ser vulnerável, quando deixa que o
mundo escale suas muralhas, você dá fragmentos de si. E cria esperança,
uma esperança que acreditamos que merecemos, mas que no final, é o
engano mais cruel.
— Amor é uma fraqueza, Oliver — escuto sua voz ao longe, como
se estivesse saindo do ambiente. — Lembre-se disso, quando for defendê-la
outra vez.
Brandon sai batendo a porta, enquanto eu permaneço aqui, sentindo
a queimação em minha pele que se gruda ao tecido da minha camiseta
branca e depois de alguns segundos respirando fundo, finalmente deixo-me
ceder, caindo com o rosto no tapete.
As lágrimas descem pelo meu rosto em cachoeiras e a dor no meu
peito é como um acumulado de rachaduras, que faz com que meu pequeno
corpo se torne um aglomerado de tremores intermináveis.
O choro seguido do grito que sai da minha garganta, quando a dor já
não é mais física, e sim uma que entra pelos meus poros e se infiltra na
minha alma, se torna o som mais aterrorizante que já escutei em meus
poucos anos de vida.
Porque é um grito que verbera pelos quatro cantos do escritório e se
torna o meu único mecanismo de defesa. É um grito por todas as perdas que
estou sofrendo nesse momento, que nunca conseguirei expressar e nem
traduzir. Apenas consigo senti-las, carregá-las comigo, até quando eu for
apenas uma poeira na vastidão do mundo.
Minutos ou horas depois, me levanto e caminho endireitando meu
corpo até meu quarto, pegando um moletom que está em meu closet e um
kit de primeiros socorros, que Alícia havia me explicado como usar. Desço
as escadas lentamente, engolindo a dor que queima minhas costas e vou em
direção a pequena passagem na lateral do muro, que está tampada por
algumas plantas, que eu e Verônica havíamos colocado ali para facilitar a
nossa entrada.
Caminho pela floresta ao lado da minha casa e subo em cima de
uma pedra, onde posso ver a enorme mansão dos pais de Vee. Procuro pela
minha melhor amiga, porque se ela estiver ali, posso tentar dar um sinal e
chamá-la para me ajudar, pois sei que ela sempre correrá ao meu auxílio.
Mas ela não está lá. Pela primeira vez, Verônica não está lá.
Deixo uma lágrima descer pela minha última esperança ter ido por
água abaixo e caminho a passos lentos até o pequeno lago. O píer de
madeira está vazio, ninguém gosta de vir aqui, é quase que um lugar
abandonado, porém, eu o amo.
É o meu lugar favorito em toda cidade, porque foi mamãe quem
ajudou a construí-lo. O lugar onde ela sorriu para mim, que beijou minha
testa e prometeu sempre me proteger, estar comigo.
Ela me prometeu.
E no fim, me abandonou.
Caio sobre a madeira em um choro alto, deixo que a caixa de
primeiros socorros se esparrame pela madeira, fazendo um barulho
estrondoso e observo alguns pássaros voarem assustados. A dor no meu
peito é insuportável, é como se meus batimentos cardíacos se acelerassem e
minhas mãos tremessem.
— Ollie? — uma voz doce me chama, fazendo com que por um
segundo, eu esquecesse o pânico que começa a se apossar de mim. —
Ollie... você está bem?
Eu olho sobre meu ombro encontrando Verônica Blackwell parada,
na entrada píer, com os pequenos braços em volta do seu corpo magro. O
cabelo preto está solto e ela usa a sua tiara de pérolas preferida. O vestido
preto rodado balança enquanto caminha até mim, pisando nas pontas dos
pés, como sempre faz desde que começou suas aulas de balé. Quando Vee
se abaixa a minha frente e observo seus olhos âmbares. Eles que sempre são
brilhantes, incríveis, hoje estão assustados pelos cortes em meu rosto.
Ela levanta a mão delicada, segurando meu rosto com cuidado e
mordendo o lábio inferior.
— Fale comigo, Ollie... — murmura, preocupada. — Eu sou sua
melhor amiga, lembra? Você pode sempre confiar em mim.
Eu posso. Eu sei que posso, mas as palavras não saem. É como se
tudo fosse apenas um vazio, um tormento sem fim.
— Ela foi embora, Vee… — é a primeira coisa que digo a ela. —
Ela me abandonou.
— Ela? — Ergue uma sobrancelha, confusa. Não digo nada, mas
pela minha expressão ela entende quem foi embora. — Oh, Ollie, eu sinto
muito… muito mesmo.
— E meu pai… ele-e me bateu — gaguejo, enquanto digo as
palavras. — Ele me bateu, Vee.
— Me deixe chamar a mamãe, Ollie, ela pode te ajudar. — Vee
pede, seus olhos estão arregalados e eu apenas nego amedrontamento. —
Por favor, Ollie… me deixa te ajudar. Eu não gosto de te ver machucado.
— Se você contar a ela, ela vai atrás do meu pai… e ele vai
descontar em mim, de novo — Engulo em seco, deixando uma lágrima
descer. — Por favor, Vee, nós damos conta…
— Eu não sei se consigo limpar seu rosto direito, Ollie… — ela
sussurra. — Eu vou chamar Dylan, meu irmão já se machucou uma vez e se
limpou sozinho, ele pode nos ajudar. E você pode confiar nele, Ollie.
Fico apreensivo por um momento, mas Dylan também é meu amigo.
Ele também está ao meu lado em diversos momentos em que precisei de sua
ajuda. Por isso, por saber que Dylan não contará a mais ninguém, eu
balanço minha cabeça acenando para ela buscá-lo.
Sem perder tempo, Vee corre desesperadamente entre as árvores,
ignorando que os galhos rasgam a borda de seu vestido ou que seu pai irá
xingá-la por estar correndo na floresta outra vez. Mas sei que minha melhor
amiga não se importa com isso, ela destruirá mil vestidos se isso significar
que Dylan chegará aqui para me ajudar.
E é exatamente isso que acontece. Quando Vee surge na floresta
novamente, acompanhada de Dylan, que briga com ela por ter destruído seu
vestido por correr entre os galhos soltos, ela apenas grita que não se importa
com isso. Eles caminham até mim e se ajoelham ao meu lado. Dylan, que é
dois anos mais velho do que eu e Vee, ergue uma sobrancelha para meu
rosto, mas quando vê o meu supercílio machucado e minhas bochechas
vermelhas pelos tapas de papai, sua expressão se torna letal.
— Esses não estão doendo… — murmuro, derrotado. — São esses.
Retiro meu moletom e minha camiseta, engolindo o choro pela dor
do tecido ter se grudado à pele viva das minhas costas e me viro para meus
amigos. Vee solta um grito de terror colocando suas mãos na boca,
enquanto seus olhos se enchem de lágrimas. E pela primeira vez eu vejo a
minha amiga demonstrar que está sofrendo por algo, porque mesmo que
seja da minha idade, ela é tão forte que às vezes todos nós nos
surpreendemos.
— Quem fez isso com você, Ollie? — Dylan questiona com os
punhos fechados, como se estivesse pronto para socar o responsável por
isso.
Mas ele não pode fazer isso, ninguém nunca poderá.
— Meu pai…
Seus ombros murcham, é uma ação que entendo bem. Porque ele,
assim como eu, também entende que mesmo que quiséssemos, seria
impossível se vingar do que ele me causou.
— Vamos cuidar das suas costas. Mas, Ollie? — Dylan chama
hesitante. — Se não te levarmos para mamãe, isso pode deixar marca, igual
ao meu joelho…
Ele aponta para o seu joelho, que contém uma marca feia do tombo
que Vee havia mencionado antes. E mesmo que eu não queira deixar marcas
do que aconteceu hoje, não posso correr o risco de meu pai saber que pedi
ajuda, que corri diretamente para os filhos de seu amigo de negócios,
principalmente quando tia Amber irá querer matá-lo por ter me machucado.
Pela primeira vez em nove anos, eu sinto inveja de Dylan e Vee por
terem uma família tão boa que se apoiam e se protegem a qualquer custo,
por não ter uma mãe que me protege quando dias como esse acontecem e
então, sinto raiva. Raiva por ter esse sentimento em relação a minha melhor
amiga, a mesma que correu pela floresta para ir atrás de ajuda, que entrou
sorrateiramente em minha casa dezenas de vezes com seus donuts coloridos
e um sorriso gigantesco no rosto, apenas para me fazer sorrir junto.
Eu amo Vee, amo com todo meu coração, porque ela é a única que
me ajudaria a mover o mundo caso precisasse.
E quando seus olhos encontram o meu, ela entrelaça nossos dedos e
solta um sorriso fraco, como se dissesse que tudo ficaria bem, que eu me
recuperaria e voltaria a sorrir e brilhar, como sempre fizemos antes de hoje.
Mas, pela primeira vez, eu sinto que não posso retribuir o sorriso, não posso
me enganar, nada será como antes, nunca poderia ser.
Eu perdi a minha mãe.
Ela me abandonou e meu pai abriu uma lacuna em meu coração,
uma lacuna irreparável que o dividiu em dois lados.
Como em uma guerra, uma guerra de corações quebrados.
De um lado, o ódio pelo que minha mãe havia feito pairou dentro de
mim, mas, do outro lado, ainda tento sorrir para Vee, que mantém as
esperanças intactas, mantém a imagem de mamãe perfeita, a promessa que
fiz, a forma doce como falou comigo.
Dois lados em uma batalha.
Guerra e paz.
Luz e escuridão.
Silêncio e gritaria.
E no meio disso, Abigail ainda está sussurrando para que eu não
quebrasse. E eu não faria isso.
Nunca mais quebraria.
Eu quero viver com você
Até quando nós virarmos fantasmas
Porque você sempre esteve lá por mim
Quando eu mais precisei de você
Say You Won't Let Go | James Arthur

Levo o copo até meus lábios novamente, sentindo o sabor cítrico do


drink que o barman havia me entregado há alguns minutos, observando o
bar onde eu e meus amigos estamos.
O Oásis é o nosso ponto de encontro desde que começamos a
estudar na SVU. É como se fosse a nossa segunda casa. Um lugar que
vamos quando precisamos de um tempo juntos e que, ao mesmo tempo, nos
trouxe a sensação de que estamos fugindo da nossa realidade.
Suspiro, levando o copo até meus lábios novamente e percebo uma
figura masculina parada ao meu lado. Olho de relance, tentando fazer com
que meu corpo relaxe, afinal, é Levi que está agora encarando o mesmo
lugar que eu, com um semblante leve, quase que relaxado.
— Por que está escondendo de todos?
Toda a tentativa de fazer com que meu corpo ficasse tranquilo, vai
por água abaixo. Mesmo assim, mantenho minha expressão blasé e me viro
em sua direção.
— Desculpe? — Ergo uma sobrancelha.
— Você e Oliver. — Seu tom é duro e meu corpo definitivamente se
enrijece quando ele lança suas próximas palavras em um tom ácido,
decepcionado. — Por que estão escondendo de todos o que há entre vocês?
Porque não passa de uma farsa.
É a resposta que está na ponta da minha língua, mas não é a que sai
de meus lábios.
— Porque se der errado, não queremos que tudo fique estranho entre
todos nós — a mentira escorrega dos meus lábios com dificuldade. Como se
cortasse tudo dentro de mim a cada sílaba proferida. — Seria estranho ter
todos pisando em ovos ao nosso redor se caso isso não der certo, então...
queremos ir com calma.
— Certo — É a sua única resposta.
Ele leva o copo de suco até a boca, ingere um pouco o líquido e
depois apenas mantém o olhar para frente. Todos nós sabemos que Levi não
ingere nenhuma bebida alcoólica perto dos campeonatos de natação e
depois do ano novo, quando viveu quase uma semana a base de destilados,
não me surpreendo que ele tenha se afastado das garrafas importadas.
— Nós... nós estamos bem, Levi? — pergunto, insegura. — Eu não
quero que nada mude entre nós dois, não quero te perder.
— Você não vai, Sum, eu sei conviver com um pé na bunda, não se
preocupe. — Ele se vira para mim, sorrindo. Porém, sei que é um sorriso
falso. — Eu amo nossa amizade e talvez um dia você perceba que somos
um encaixe perfeito.
— Levi… — Suspiro.
Ele solta um sorriso fraco.
— Relaxe! Nós estamos bem, Sum. — Ele solta uma gargalhada que
não há calor, alegria. É apenas um som desprovido de qualquer emoção e
seus olhos me mostram que não é aquilo que realmente deseja. — Nós
sempre vamos estar, ok?
Não é a verdade. Ele sabe disso. Ele sabe porque mesmo que não
queira dizer, deseja mais. Deseja algo que eu não posso dar. Nem a ele e
nem a ninguém.
Ignorando o sentimento de culpa que começa a rasgar minha
garganta, o puxo para um abraço, um abraço quente e sufocante. Tento
mostrá-lo que mesmo que eu não corresponda a paixão que emana dele, eu
o amo.
— Eu quero que você encontre alguém que te ame na mesma
proporção, Levi — confesso em seu ouvido. — Quero que quando essa
pessoa chegar para você, não haja dúvidas ou empecilhos. E eu realmente
desejo que não ache que o amor é um sentimento banal, apenas porque não
teve o que tanto desejava.
Ele se afasta, me encarando profundamente. Seus olhos são distantes
e machucados, mas, ainda sim ele sorri, um sorriso lindo. A pele escura se
enruga perto dos olhos, deixando suas íris se destacar e covinhas
aparecerem em cada lado de suas bochechas.
— Talvez um dia eu ache alguém, mas no momento eu prefiro
apreciar a minha liberdade — brinca, levantando o copo e sorrindo
abertamente. — Você já viu como universitárias amam um capitão?
Jogo a cabeça para trás, gargalhando. Sabendo que eu devo apreciar
cada um desses momentos, porque talvez eu possa estar perdendo o meu
melhor amigo por ser egoísta demais e o pior de tudo, por ser uma
mentirosa.
— Não seja pretensioso, Levi — repreendo.
— Eu não estou sendo. Porém não irei negar que tenho a intenção
de provar meu ponto até o fim deste semestre — ele comenta, me lançando
uma piscadela. — Uma delas pode até mesmo ser a próxima Senhora
Jonhson.
Minha gargalhada aumenta, enquanto viro o resto do meu drink.
— Espero que elas chutem sua bunda.
— Oh, com certeza elas vão! — brinca, se virando e indo até onde
Josh e Logan estão.
Volto meu olhar para frente para onde Analu está encostada, me
encarando atentamente como se pudesse ver a mentira transpirando pelos
meus poros.
— Venha até aqui e me faça companhia no meu martírio — chama,
passando a mão pela sua franja.
Abandonando o copo vazio em cima do balcão, me viro caminhando
até ela. Mas, uma movimentação na lateral do bar faz com que meus olhos
vagueiam para o lado e encontre Verônica e Oliver vindo na direção de
nossos amigos.
Vee segue até onde Logan está e percebo que Underwood está tão
distraído com algo que Levi diz, que quando ela se aproxima, não tem
tempo de cumprimentar sua namorada, já que Johnson é mais rápido e a
pega no colo, girando-a, fazendo com que gargalhe alto e arranque uma
carranca de Logan por não ter tido tempo de cumprimentá-la antes de
qualquer outra pessoa.
— Você deveria terminar com Logan e se apaixonar por mim, Vee
— ele grita por cima da música e lançando a ela um sorriso zombeteiro.
— Eu deveria? — Ergue uma sobrancelha, se sentando no colo de
Logan.
Logan inclina a cabeça, erguendo uma sobrancelha e esperando a
resposta de Levi.
— Claro! Eu sou mais bonito que Underwood. — Johnson sorri
descaradamente para Blackwell. — E o melhor: também sou capitão.
Verônica joga a cabeça para trás gargalhando. Enquanto Logan
enruga o nariz, balançando a cabeça e soltando um sorriso sem acreditar nas
palavras de nosso amigo.
— Céus, vá procurar algo para fazer antes que eu decida te afogar
na sua própria piscina — Underwood diz, por fim.
— Você está se sentindo ameaçado, eu sei.
Deixo-os para lá, voltando minha atenção para frente e encontro o
olhar de Oliver diretamente em mim. Ele maneia a cabeça em um
cumprimento leve, depois seu olhar se volta para a loira ao meu lado que
apenas acena entediada, e volta a sua atenção para o drink que ocupa suas
mãos.
— Sabe — ela começa, lentamente. — Eu estou começando a achar
que Levi é mais idiota do que eu imaginava.
— Você acha? — Ergo uma sobrancelha.
— Sim, ele está prestes a usar algumas mulheres como desculpa
para curar seu ego ferido — ela responde, bebendo seu drink. — É infantil,
mas quem sou eu para julgá-lo?
— Ok. — Dou de ombros, chamando a atenção do garçom. — Esse
é o seu martírio?
— Oh, não! Meu martírio será observá-lo quebrar corações no
campus esse semestre — conta, como se isso fosse ser a coisa mais
divertida que presenciara. — E, claro, observá-lo levar muitos tapas na
cara.
— Vocês vão estudar juntos esse semestre? — questiono, me
lembrando que ambos cursam Direito.
— Felizmente, apenas no próximo — responde pegando a azeitona
da sua bebida e levando até sua boca. — Mas, infelizmente, estamos no
mesmo bloco, o que significa que estarei o ano todo observando-o ser um
babaca.
Pego minha bebida quando um dos garçons estende para mim e a
levo até meus lábios. A verdade é que enquanto sinto o líquido descer pelo
meu esôfago, só consigo ponderar que tenho muito compadecimento dos
alunos que serão companheiros de Parker e Jonhson durante esse ano,
porque, por mais que Levi esteja agindo desta maneira e Analu seja cruel e
insensível como sempre foi, eu não posso deixar de constatar que ambos,
desde o primeiro ano da faculdade, lutam pelo primeiro lugar no curso.
Se no próximo semestre eles realmente forem colegas de turma, eu
prevejo que a briga pelo título de melhor aluno se estenderá em níveis que
os tornarão, de fato, rivais acadêmicos.
E que Deus nos ajude quando esse momento chegar!
— Boa sorte? — digo, mas a frase acaba saindo dos meus lábios
soando como uma pergunta.
— Eu não preciso de sorte, Summer — afirma, virando o resto do
seu drink. — Eu só preciso dos sapatos certos e da melhor oportunidade
para que tudo saia da maneira como eu desejo.
— Eu diria que Levi e você serão péssimos parceiros de turma —
constato o óbvio.
— Ele não perde por esperar. — Parker solta um sorriso frio e
começa a se afastar. — Agora deixe-me ir procurar outro lugar, antes que
Oliver me jogue pela janela por não liberá-la logo, para que possa
finalmente vir até você.
— O quê? — Franzo o cenho.
— Ele está nos observando desde que chegou — diz como se fosse
óbvio. — E tenho a total convicção de que aquele olhar ansioso não é para
mim.
Antes que possa dizer algo, ela se afasta, me abandonando. Percebo
que agora seremos só nós dois, longe de todos. Porque nossos amigos se
deslocaram para o outro lado do bar, em direção a pista de dança
improvisada.
Sei que não deveria estar nervosa ou preocupada, mas, algo em
Oliver traz essas emoções em mim. Ele provoca sensações que não consigo
controlar. Faz com que meu diafragma perca o compasso das minhas
respirações e que as palmas das minhas mãos suem. E mesmo que seja
difícil estar perto dele sem sentir essas coisas, ignoro tudo isso e me
concentro nele, trazendo à tona tudo o que é importante e que precisamos
conversar para que saibamos quando parar, se formos longe demais nessa
farsa.
Para o bem da minha sanidade e para que esse acordo dure até o
final, preciso que Oliver se mantenha longe das minhas muralhas.
— Oi — digo, quando para ao meu lado.
— Oi — Oliver responde, escorando as mãos no balcão.
Seus olhos me encontram e há tanta coisa ali, tantas coisas que não
compreendo. E que sei que ele não falaria mesmo se eu perguntasse. Oliver
não confia em mim, assim como não confio nele.
— Você me disse que me atualizaria sobre os livros — sussurro de
repente, quebrando o olhar e voltando a encarar o palco.
Ele sorri.
— Temos muito o que conversar sobre eles — responde enigmático.
Soltando um sorriso cafajeste. — Mas, antes… Sinto muito por ter sumido
por alguns dias. Precisei resolver alguns assuntos familiares.
Maneio a cabeça.
— Você não precisa se explicar, Oliver — murmuro a verdade.
— Ainda assim, sinto muito! — exclama, pegando um copo com
whisky.
Olho para ele de volta, sabendo que esse é o momento, mesmo que
estejamos no meio de um bar, ao redor dos nossos amigos, nós precisamos
fazer isso. Precisamos conversar sobre as regras. Sobre como vou
sobreviver a esse acordo, sem que essa tensão que paira entre nós dois leve
toda a distância que construí, por água abaixo.
— Temos que conversar.
— Nós estamos conversando — ele pisca, confuso.
— Conversar sobre nosso acordo, Oliver.
— Certo — concorda, confuso. — E… sobre o que você precisa
conversar?
— Sobre nossas regras básicas.
Um vinco se forma entre suas sobrancelhas.
— Regras básicas?
Oliver maneia a cabeça pacientemente, como se estivesse
raciocinando o que eu quero dizer com essas duas palavras.
— Sim, Oliver! Regras para que possamos saber até onde ir, para
não ultrapassarmos o limite um do outro — minhas palavras saem rápidas.
— Eu preciso disso e acredito que você também.
— Ok, se te deixa confortável, nós iremos fazer isso.
— Obrigada — inalo profundamente. — Você quer começar?
— Não, acho que ainda preciso entender tudo o que está dizendo —
Ele diz tomando um gole de sua bebida e me encara sobre a borda do copo.
Seus olhos focam em meu rosto com tamanha atenção, que é como
se, para ele, nada mais existisse. Como se eu pudesse até mesmo estar
articulando sobre o assunto mais entediante do universo e, ainda sim, ele
prestaria atenção e conversaria como se estivéssemos falando de algo muito
interessante.
E talvez seja um dos maiores perigos sobre ser próxima de Oliver
Wright, porque ele te escuta. Ele te vê. E quando isso acontece, você se
torna a pessoa mais importante no planeta, mesmo com um bilhão de
pessoas ao seu redor.
— Certo. — Engulo em seco, levando meu drink até meus lábios. —
Em primeiro lugar, o acordo precisa de uma data de validade.
— Isso não é um produto, loirinha — diz, rabugento.
— Ainda sim, quero uma data, Oliver.
Ele suspira fundo, fechando os olhos por um segundo, como se
estivesse orando ou juntando toda sua paciência para ter que lidar com isso.
— Ok, até o baile anual dos Blackwell.
— Certo, dois meses então.
Dois meses. Sessenta dias. É isso que estou me comprometendo,
sessenta dias sendo a namorada — falsa — de Oliver.
— Sem apelidos bregas — continuo, enumerado com meus dedos.
— Nem por um segundo pense que você está me chamando de algo.
Um sorriso se entende pelo seu rosto.
— Não vou concordar com isso — diz simplesmente. — Não abrirei
mão do meu loirinha, loirinha.
Solto um bufo levando o drink até meus lábios e Oliver acompanha
o movimento, focando seus olhos na borda do copo, onde meus lábios
encostam. Um brilho surge em suas pupilas e mesmo que eu queira negar,
basta apenas esse pequeno movimento para que o meu eu interior comece a
querer se iluminar como fogos de artifício.
— Sem declarações idiotas. — Levanto outro dedo. — E o
principal, sem desfilar com alguém pelo campus. Por mais que eu não goste
de você, não quero ser conhecida como alguém que foi traída.
Seus olhos rodaram nas órbitas, logo após me encarou com uma
careta.
— Nunca pensei em fazer tal ato, Summer.
Uma linha aparece entre minhas sobrancelhas, enquanto observo
seus lábios se transformarem em uma linha fina.
— Ótimo! — Decido não provocá-lo, já que o músculo na sua
mandíbula contraiu-se, após a minha acusação de uma possível traição. —
Está tudo bem, Oliver?
Ele ignora a minha pergunta.
— Mais alguma outra regra básica? — ele questiona balançando a
cabeça como se estivesse expulsando algum pensamento e ergue uma
sobrancelha.
— Estou pensando. — Mordo meu lábio inferior, ignorando a
sensação de que ele está escondendo algo, enquanto vagueio pela minha
mente atrás de todas as regras que pensei, desde que aceitei esse maldito
acordo. — Você quer colocar algo?
— Eu posso? — questiona, como se achasse que apenas eu ditaria
como isso aconteceria e apenas reviro meus olhos. — Eu quero um
encontro por semana.
Por vários segundos, apenas encaro Oliver perplexa.
Não me movo nem um centímetro tentando entender o que diabos
ele quer dizer com um encontro por semana e até mesmo o breve calor que
rondava meu corpo, é substituído por uma sensação gélida.
Até mesmo reflito se talvez quebrar uma garrafa em sua cabeça será
melhor do que ter que enfrentar toda essa situação. Afinal, se eu inventar
que estou de luto pelo amor da minha vida ter sido assassinado, Levi, com
certeza não tentará se aproximar romanticamente de mim.
— Um encontro? Por semana? — pergunto, ainda perplexa.
— Sim.
— Por quê?
— Porque é o que eu quero.
— Explique com mais do que pequenas frases, Oliver.
Ele suspira por um momento, como se estivesse ponderando sobre
isso.
— Um encontro para que as pessoas acreditem que estamos juntos,
Summer — explica, revirando os olhos entediado. — Jesus, você é sempre
complicada assim?
Ok, talvez assassiná-lo não seja uma péssima ideia.
Mas, por incrível que pareça, apenas maneio a cabeça concordando.
— Certo. Mas, nada de encontros românticos ou de teor sexual. —
Respiro fundo. — Aliás, a próxima regra é simples e não haverá discussão
sobre isso.
— Apenas fale, loirinha.
— Sem beijos, sem sexo, sem nada de contato entre nós dois — falo
alto e claro. — Na frente de todos, podemos fingir com toques sutis, mas,
nunca, em hipótese alguma, invadiremos o espaço pessoal um do outro.
Oliver se desloca do balcão e dá um passo à frente, parando há
poucos centímetros de mim. Em uma distância segura e ao mesmo tempo
perigosa. Perigosa porque posso sentir a fragrância de seu perfume e posso
observar seus olhos verdes brilharem, como a minutos atrás.
Mas esse olhar que me lança, repleto de certeza e luxúria, como se
soubesse que estou o afastando para longe, para um local onde não pode me
tocar e fazer com que eu me sinta viva, elétrica, como fez uma vez,
assombra até os meus piores pensamentos. Porque é contra ele que tento
lutar, contra as memórias que me traz, contra como foi me permitir confiar
em alguém, mesmo que apenas por uma noite, sem nem mesmo que
soubesse.
E sei que, se eu não me proteger, se não mantê-lo longe de tudo o
que mantenho escondido dentro de mim, suas garras grandes e afiadas,
podem ter o poder de dilacerar minha pele sem dó nem piedade e, no fim,
sei que acabarei deixando com que me domine.
Oliver Wright pode vir a ser a minha fraqueza caso eu permita que
ele chegue até mim, que ele ultrapasse meus segredos e solte meus
monstros. E como eu poderei ganhar uma batalha contra todos os monstros
que habitam em mim, quando eu nunca tive coragem de enfrentá-los?
— Nós já tivemos essa conversa, loirinha.
— Agora é diferente, Oliver.
— Explique — ele exige, contudo não há um tom autoritário, é mais
como um pedido.
— Vamos fingir sermos namorados. Íntimos. E para que isso não
venha ser um desastre por completo, preciso desse limite — digo
verdadeiramente. — Você sente atração por mim e eu sinto por você, não é
necessário negar. Porém, uma vez foi suficiente para sabermos que somos
uma péssima combinação.
— De fato — diz, mas seus olhos parecem não concordar.
— Então, por mais que tenha deixado a entender algo a mais
naquela festa, saiba que não acontecerá — minha voz é firme, convicta. —
Sendo assim, o assunto não virá mais à tona, nós não ultrapassamos os
limites. Seremos um falso casal por dois meses e só. Após isso, você volta a
me ignorar e eu volto a fingir que não sei da sua existência.
Oliver faz menção de dizer algo, mas engole em seco e assente,
dando um passo para trás.
— Há outra coisa que quero colocar como regra — acrescento,
quando ele não emite nenhuma palavra.
— Ok.
— Não pergunte sobre meu passado. — Ele ergue uma sobrancelha.
— Não me intrometerei nos seus assuntos, não irei querer saber do que eu
presenciei na fraternidade ou do porquê me tratou daquela forma. Contanto
que seus assuntos sejam somente seus, como os meus sejam apenas meus,
ok?
Oliver pela primeira vez, parece querer contrariar minhas palavras,
mas, ele precisa entender. Precisa saber que eu não deixarei chegar até mim,
que me blindarei até onde puder, me afastarei quando isso estiver saindo do
controle. Porque não é apenas Levi que merece algo melhor do que alguém
danificado, o homem à minha frente também.
Mesmo que eu saiba que ele não procura por isso, que se fecha para
o mundo e se esconde atrás de suas barreiras. Oliver não merece ter que
lidar com tudo o que eu carrego apenas por esse acordo.
— Se é o que deseja, Summer, é dessa forma que vamos fazer — há
um tom que não compreendo por baixo de suas palavras que decido ignorar.
Solto um sorriso fraco, tentando mostrar que ficaremos bem.
— Estamos na mesma página, Oliver.
Ele maneia a cabeça, concordando, enquanto devolvo o aceno e me
preparo para sair e me juntar aos meus amigos. Contudo, quando estou
prestes a caminhar entre todos os universitários que se aglomeram no bar,
escuto sua voz rouca me chamando.
— Eu irei precisar que você me acompanhe em um evento em
algumas semanas.
— Ok, eu estarei lá.
Concorda balançando a cabeça.
— E Summer? Vai dar tudo certo — ele afirma, e por um momento,
até mesmo acredito nisso. — Somos uma boa dupla. Talvez até mesmo a
melhor!
— Eu sei — sorrio me virando e encarando-o por cima do ombro.
— Talvez eu possa até mesmo começar a confiar em você.
— Não deveria.
Quase solto uma gargalhada.
— Talvez seja inevitável.
Sorrio fraco e me viro novamente, indo em direção às minhas
amigas. E a cada passo que dou, tenho a certeza de que nós seremos
oficialmente uma dupla. Uma dupla que ninguém espera, mas que não
poderia ser diferente.
Porque na próxima festa, eu e Oliver deixaremos de ser inimigos
que não se suportavam para namorados que estão perdidamente
apaixonados.
Mesmo que a ideia de se apaixonar seja como uma doença terminal
para ambos.
Eu quero ver você perder o controle
Assim como nicotina, heroína, morfina
De repente, estou viciada e você é tudo que preciso, tudo que preciso
Sim, você é tudo que eu preciso
Never Be The Same | Camila Cabello

Encaro o enorme prédio do bloco de economia da Saint Vincent


University, enquanto minha face se transforma em uma careta.
Não que eu odeie meu curso. Não, não é isso. Eu adoro números, até
mesmo gosto da parte burocrática da coisa. Contudo, saber que estou
novamente em uma universidade, prestes a iniciar um novo semestre e ter
que fingir para todos que minha vida não é um caos absoluto, é o motivo
pelo qual uma carranca está estampada em meu rosto no momento.
— Tire essa careta do rosto, Ollie — Dylan repreende ao meu lado.
— Vai ser divertido!
Olho de relance para meu amigo, segurando uma das alças da minha
mochila e erguendo uma sobrancelha. É obvio que será divertido para ele, o
idiota está a poucos meses de se formar e não precisa lidar com toda a coisa
entediante das matérias teóricas.
Sem contar, que nosso bloco está praticamente ao lado do bloco de
medicina, onde Hazel fica enfurnada o dia todo. O que para ele, sem
dúvidas, é a oitava maravilha do mundo.
— Eu deveria ter escolhido o curso como o de Vee — Suspiro
fundo. — Pelo menos seria mais divertido que este.
Escuto a gargalhada de Dylan atrás de mim, enquanto dou mais um
passo à frente, subindo os degraus da escada que liga as enormes portas de
vidro da recepção que contém o brasão roxo com um falcão estampado.
— Ah, vamos lá, Wright, você ama números e cafés — Dylan grita
atrás de mim. — Não há curso melhor para você do que este.
— Me lembre o porquê de você estar cursando um curso parecido
com o meu, por favor — resmungo, quando ele finalmente me alcança. —
Talvez, eu me anime com a sua lástima, já que todos nós sabemos que você
adora a sua câmera.
— Porque é algo que aprecio. Fotografia é apenas um hobby e o
futebol é uma forma de contrariar meu pai — confidencia, ainda sorrindo e,
logo após, olha diretamente em meu rosto, com uma expressão zombeteira.
— Vamos lá, Ollie, nós seremos ótimos rivais de negócios no futuro.
Sim, é a verdade. Nós seremos ótimos rivais de negócios no futuro,
principalmente quando sei que Dylan desistiria da sua nova posição no
time, se isso significasse que entraria para a Forbes Under 30[12] ou até
mesmo para poder administrar a empresa de sua família.
E isso é um talento nato que o acompanha desde quando seus olhos
pousavam na sede da Blackwell Enterprise quando era um pirralho, ou
quando se sentava escondido na cadeira de seu pai em algum baile idiota
que participávamos.
Aquelas orbes castanhas, brilham em admiração, desejo, porque lá é
o habitat natural do meu amigo, e é lá que o imaginamos, ocupando a
presidência que é sua por direito.
— Eu me pergunto como não pegou a cadeira do seu pai ainda —
brinco, gargalhando.
Ele sorri. Não é um sorriso de gozação, é convicto. Cheio de
mistério e avidez.
— Talvez no próximo ano.
Abro a boca para responder, para perguntar o que significa essa
frase, contudo, sou interrompido pela chegada de um convidado indesejado.
Mike Burhan caminha em nossa direção com um sorriso de escárnio
estampado em sua face e uma pose prepotente, como se fosse o rei da
universidade. Tenho vontade de revirar meus olhos, e me pergunto
mentalmente o que diabos Verônica viu neste idiota quando se envolveu
com ele, assim que se mudou para cá.
— Então é verdade que Oliver regressou à SVU? — sua pergunta
vem com uma boa dose de veneno.
Ergo uma sobrancelha e olho de relance para Dylan, que revira
propositalmente os olhos e cruza os braços.
— E você ainda continua tão inconveniente quanto a última vez que
nos vimos — solto a verdade, sem rodeios.
Ele finge ser uma piada e solta uma gargalhada irritante.
— E como está sua irmã, Dylan? — questiona, com segundas
intenções e umedecendo o lábio.
Solto uma risada fraca quando Dylan limpa uma sujeira invisível em
sua camisa e ergue o corpo, ajeitando a postura. Mike, por um segundo,
percebe o erro que cometeu e fraqueja. Contudo, não é por esse motivo que
estou sorrindo ou porque Dylan simplesmente se manteve quieto pela
pequena provocação, mas sim, pela presença atrás dele.
— Você pode perguntar diretamente para mim, Burhan — a voz
grave de Logan ressoa. — Afinal, Verônica é a minha namorada.
Logan inclina a cabeça para o lado, estudando seu companheiro de
time. Ele passa o dedo anelar sobre a mandíbula marcada, destacando a
jaqueta roxa do time de futebol americano onde é capitão. Seus olhos azuis
fitam Mike com uma genuína curiosidade, como se esperasse a resposta
dele para enfim tomar uma atitude.
— Soube que adotaram Parker como nova escoteira do grupinho —
Mike diz para Logan, ignorando sua frase anterior. — Eu me pergunto até
quando vão fingir serem melhores amigos ou se irá durar até que a memória
de vocês refresque, e se lembrem do que Analu fez a Vee quando
estudávamos no Saint Vincent College.
Logan dá um passo à frente, ficando cara a cara com Mike.
— Ouça bem, Burhan, porque eu não pretendo repetir o que estou
prestes a dizer — grunhe, lançando a ele um olhar porco. — Eu amo
Verônica e ela me ama. Então, faça um favor para todos nós e pare de tentar
criar um problema entre nós e nossos amigos, apenas por não ser maduro o
suficiente para lidar com um pé na bunda.
Dylan encara Logan com um misto de aprovação e admiração. E
mesmo que eu e Underwood não sejamos tão próximos, sei que sinto o
mesmo. Porque ele lutou por Verônica, a ajudou a se curar lentamente e,
juntos, enfrentaram tantos obstáculos que apenas nós, que estamos ao lado
deles, sabemos o quanto lhes custaram.
Definitivamente, não será um idiota mimado que abalará o
relacionamento deles.
— Eu sempre soube que era um babaca mimado, mas se tentar usar
minha irmã ou Parker mais alguma vez para provocar Logan — Dylan
ameaça, chegando mais perto. — Seu problema será comigo.
— E comigo — acrescento calmamente.
Mike semicerra os olhos, tomando a melhor decisão de se virar,
ignorando nós três e entra no prédio, como se pela primeira vez, percebesse
que não é apenas Logan que defenderá Vee ou Analu contra as falcatruas
que pode vir a aprontar.
Será todos nós.
— Vejo vocês no almoço — Logan se despede, segundos depois e
segue o mesmo caminho que Mike fez. — Não se atrase, Wright, ou ficará
sem carona.
Solto um meio sorriso.
— Você não ousaria — brinco, cruzando os braços frente ao corpo.
Logan para e me olha sobre seus ombros. Enquanto me lança um
sorriso zombeteiro. É fácil lidar com ele desta forma, é bom estar perto dele
sem que ele deseje me socar por conta de todos os conflitos passados.
Underwood nunca foi babaca presunçoso como fazia com que todos
pensassem antes de se resolver com Verônica, ele apenas era uma pessoa
machucada pelo passado que não sabia como lidar com a dor da perda.
Perda de sua namorada, de sua rotina, de sua vida na parte baixa e a perda
da confiança em todos.
Ele, assim como eu, apenas projetou o machucado em seu coração
com atitudes duvidosas que faziam com que duvidássemos de seu caráter.
Mas, diferente de Logan, que descontou sua fúria em festas, bebidas e
corridas, eu guardei a minha. Guardei-as em um lugar obscuro que permeia
as nuances da minha alma e faz com que eu use o sorriso e o sarcasmo
como uma válvula para afastar as pessoas das minhas feridas.
Porque é assim que sou. Eu não grito por ajuda, para ser sincero,
sempre fui silêncio. Nunca precisei de barulho para me defender, nem me
expressar. Porque o barulho chama a atenção, faz com que as pessoas
percebam que há lugares para machucar, para fincar a faca.
Por isso, mantenho meus gritos em meu âmago, deixo com que o
caos que habita em mim, a tempestade que transmuta em meu corpo e
vulcão ativo que incendeia minha alma se mantenha inerte enquanto lido
com o barulho dos outros.
Porque às vezes, a dor do outro é parecida com a nossa e ajudar a
curá-la, acaba sendo um remédio para a nossa própria.

A nossa mesa de sempre no Oásis já está composta por quase todos


os nossos amigos. Contudo, percebo que Melany, Edmund e Josh não estão
presentes em nosso primeiro almoço do semestre. Josh, sei que não pode
comparecer por estar ocupado demais com um projeto de arquitetura que
está participando, mas os outros são, definitivamente, um mistério.
— Onde está a nossa outra bailarina e o caçula nerd? — pergunto,
me sentando ao lado de Summer. — Loirinha.
Ela ergue os olhos de seu livro, estudando meu rosto e então, sem
dizer nenhuma palavra, apenas acena brevemente e volta a sua atenção ao
livro que possui uma capa azul.
— Mel está ensaiando para alguma apresentação — Hazel responde
levando um copo de suco até a boca. — E Ed... Onde está Edmund, afinal?
A sua pergunta é direcionada a Verônica que está ocupada demais
com um donuts colorido para responder. Ela nem ao menos cumprimenta
Logan que se senta ao seu lado e ele nem se importa, apenas sorri em sua
direção, enquanto rouba um doce de seu prato e recebe um tapa na mão em
troca.
— Em casa — Dylan murmura se inclinado até a bandeja de batata
frita. — Algo sobre um novo projeto ou um novo jogo, não sei, não prestei
atenção quando gritava palavras soltas no café da manhã.
— Eu diria que ele estava falando em códigos — Logan comenta,
sorrindo, entre uma mordida e outra.
O primogênito dá de ombros, como se já estivesse acostumado com
os sumiços de seu irmão.
— Ele está trabalhando na interface de um novo jogo — Verônica
finalmente diz algo, enquanto limpa os resquícios do doce de seus lábios.
— Está ficando bom. Incrível na verdade!
— Ele é a porra de um gênio — Analu declara, esboçando um
sorriso descontraído.
Nenhum de nós discorda. Edmund Blackwell é de fato um gênio.
— Você já viu? O protótipo? — Dylan questiona, franzindo o cenho.
— Óbvio, sou a irmã preferida dele — brinca, sorrindo para o irmão
e ele joga uma meia batata nela, arrancando uma gargalhada de Verônica.
Me distraio da conversa deles, apenas para observar Summer que
não disse nada até o momento, assim como Levi. O cabelo loiro que está
amarrado em um coque bagunçado, destaca o seu pescoço fino, fazendo
com que imagine, por um segundo, como seria arrastar minha língua por
aquela extensão até a altura do osso de sua clavícula, enquanto geme meu
nome deliberadamente.
Fecho minhas mãos em punhos embaixo da mesa, tentando afastar a
imagem pecaminosa que agora ronda minha mente. Mas, quando volto meu
olhar para cima, Levi está me encarando. Seus olhos escuros me fitam com
algo que eu poderia dizer ser ciúmes ou até mesmo antipatia.
Antipatia por eu estar ao lado dela, por achar que ela deseja estar
comigo e não com ele. E uma súbita raiva começa a subir pelas minhas
veias. Não raiva dele. Mas de sua atitude, de como está sendo imaturo em
não perceber que poderá perder a amizade de uma mulher incrível, caso não
entenda que às vezes, o amor não acontece como desejamos.
Olho através da vidraça para o tempo pouco ensolarado e tento
esquecer esse assunto.
O inverno já se despede lentamente, dando lugar à primavera. A
estação mais esperada na cidade, onde os parques e as praças ficarão
infestados de flores, de todos os tipos e formas. E mesmo que eu não seja
totalmente fã desta estação, não posso deixar de dizer que é quando Saint
Vincent fica incrivelmente deslumbrante.
Volto meu olhar para a companhia ao meu lado que ignora todos e
mantém seus olhos no livro. Então, decido que definitivamente não quero
ser ignorado pela mulher que deveria estar fingindo que está caindo de
amores por mim. Inclino um pouco a cabeça para conseguir ler o título e
não me surpreendo em saber que é um romance.
Um maldito romance com um relacionamento falso.
Encosto minhas costas no acento da cadeira e relaxo minha postura,
me inclinando um pouco para poder sussurrar no ouvido de Summer:
— Eu achei que apenas eu leria esses livros, loirinha.
Ela me lança um olhar desdenhoso.
— Ainda não acredito na sua palavra de que irá ler todos eles — diz,
virando uma página. — Então, estou fazendo o meu próprio estudo de
campo.
Solto um sorriso aberto e convicto.
— Sou um homem de palavra — afirmo me divertindo com seu
olhar. — Já até mesmo li este em sua mão.
Está claro em seu semblante que ela não acredita em minhas
palavras. E mesmo que eu queira esfregar em sua cara que realmente sou
um homem de palavra, apenas me limito a umedecer meus lábios.
— Prove — diz, por fim.
— Olive e Adam — digo. Ela ergue a sobrancelha. — Os
personagens, Summer, se chamam Olive e Adam.
Ela fica em silêncio, esperando por mais. Esperando que eu liste
cada palavra que contém no exemplar em suas mãos.
— Isso está na sinopse, Oliver. Seja mais criativo.
Franzo o cenho.
— Eles são cientistas e fingem um namoro.
Suas íris castanhas deslizam vagarosamente pelo meu rosto.
Sorrindo fraco, como se estivesse se divertindo com o pensamento de que
eu realmente não tenha lido, ouço-a dizer:
— Você acha essa definição em qualquer vídeo no TikTok —
desdenha, sarcasticamente. — Então, por favor, playboyzinho, seja mais
específico.
— Eu não vou te contar a história inteira.
Nem fodendo.
Ela dá de ombros, entediada.
— Não pedi por isso.
Maldita loira.
— Não? — questiono. — Você está praticamente me obrigando a
contar todo o enredo do livro.
— Não seja tão dramático, estou apenas te pedindo uma prova de
que realmente leu — afirma, determinada. — Ou você pode apenas dizer
que realmente nem o tocou, eu entenderei, nem todos sabem apreciar uma
boa leitura.
Nunca, em hipótese alguma, alguém conseguiu tirar toda a minha
paciência como Summer Miller faz desde que nos conhecemos e ainda
assim, aqui estou eu sorrindo para ela, apenas por não conseguir acreditar
que eu tenha lido um livro.
Um maldito livro com dois cientistas que fingem um namoro e que
se encontram toda quarta-feira em uma lanchonete.
Fito seu rosto, estudando-o, e é como se todas as vezes que esses
lindos olhos castanhos, que chegam a ser de um tom amêndoa, me encaram,
uma vontade estranha de abaixar a guarda baixa se apossa de mim.
Trazendo uma sensação de que em algum momento tivéssemos vivido algo
parecido.
Porém, é impossível.
Nunca havíamos nos encontrado antes, a não ser no dia do
sepultamento de Soph, onde apenas a enxerguei de longe, junto de sua
família. Fora isso, nunca soubemos da existência um do outro até o dia que
fomos apresentados aqui nesse mesmo ambiente.
Porque ela se mudou para a parte alta depois que eu fui embora e eu
havia voltado aqui apenas duas vezes. Uma na noite do baile anual dos
Blackwell, quando eu tinha quatorze anos, e outra na morte de Sophie.
Então, realmente seria impossível esses olhos serem familiares.
Balanço minha cabeça, abandonando esse pensamento estranho que
vagou pela minha mente e solto um sorriso. Um sorriso maquiavélico.
— Sabe, Sum — sussurro apenas para ela ouvir. — Eu não sabia
que você me daria esse tipo de livro.
— Que tipo de livro? — questiona, franzindo o cenho.
— Com conteúdo explícito — minha voz é apenas um murmuro. —
Não estou julgando, ao contrário, eles foram ótimos materiais de estudos.
— Do que caralhos você está falando, Oliver? — pergunta,
baixinho.
Eu solto uma risada, umedecendo meus lábios e levando meu dedo
até seu queixo, erguendo-o. Apenas para me aproximar e sussurrar a frase
que eu havia lido no livro que compramos.
— Eu estou falando dos livros que me deu — minha voz é um
murmuro, uma carícia única. E seu cheiro é como meu veneno. Um veneno
que eu não me importaria se não houvesse um antídoto. — Aquele que no
final, eles estão em um quarto de hotel praticamente fodendo. E acredite em
mim, Summer, quando você esquecer essa regra idiota de sem sexo em
nosso acordo, eu farei questão de repetir cada uma dessas frases.
Ela engole em seco, os pêlos de seus braços se arrepiam e é como se
nada mais existisse.
— Oliver...
Porra, meu nome sai como uma prece, uma oração que ninguém
além de nós entenderia.
— E quando isso acontecer, eu vou deixar claro, como Adam deixou
para Olive que quero te chupar até você desmaiar — digo, e meu desejo é
tão palpável que se não estivéssemos em um lugar público, a jogaria nesta
mesa e enterraria nela até que entendesse o quanto queima dentro de mim.
— E então irei te perguntar, com todas as palavras “posso te comer, por
favor?”
O brilho de seus olhos, quando me afasto, faz algo dentro de mim.
Sinto o exato momento em que percebo que cruzei a linha que definimos
naquele dia.
Mas, eu não posso negar, não posso dizer mesmo que eu saiba que é
errado. Eu desejo Summer. Desejo foder com ela outra vez, desejo que seus
gemidos sejam meus, apenas meus.
Eu preciso parar. Preciso impor limites. Porque se eu a tomar outra
vez, se ela me permitir chegar perto do seu corpo novamente, não sei se
terei forças para negar, para me afastar.
Sei que serei irracional. Que vou agir da forma que não desejamos.
Cometerei um erro irreversível. Porque é isso que Summer me causa.
Irracionalidade. Ela tira tudo para si, me faz enxergar apenas seu sorriso
doces e suas palavras falsas. Ela me leva ao meu limite, beirando o abismo
e uma só ação, um só beijo doce, pode me fazer cair em queda livre, direto
a um lugar irreal.
Me afasto dela, de seu calor, dos meus devaneios, apenas para
encontrar todos os olhos em nós.
Todos nossos amigos presenciaram a cena que demos.
Presenciaram nosso desejo, mas não nossas palavras.
Eles viram tudo, menos a verdade.
E agora me pergunto se plantamos a semente do que queremos que
eles pensem que somos, ou se testemunharam algo que nunca, em hipótese
alguma, acontecerá.
Um pouco antes de fechar meus olhos
A única coisa que está em minha mente
Tenho sonhado que você também sente
Eu me pergunto como é ser amado por você
Wonder | Shawn Mendes

Um silêncio se instala sobre a mesa.


Todos os pares de olhos estão encarando a mão de Oliver em meu
queixo e a maneira como ele está inclinado em minha direção. E para quem
nos encara de outra perspectiva, é como se estivéssemos a um passo de nos
beijar, como se a paixão fosse tão descomunal que não conseguimos manter
nossas mãos longe um do outro.
Abro a boca mesmo sem saber o que irei dizer no mesmo instante
que Oliver se afasta completamente de mim. Porém, Hazel solta um ruído,
um arranhar de garganta, chamando toda a atenção para ela. Nesse
momento, sem dúvidas, eu poderia beijá-la em agradecimento por ter
cortado a tensão que se instalou em nossa mesa.
— Hum… A festa — ela gagueja, lançando a Verônica um olhar
cheio de significados. — Você estava falando da festa, Vee.
Olho para Verônica que está bebendo algo e me encarando por cima
da borda, como se estivesse colocando seus pensamentos em ordem ou
tentando entender o que diabos Hazel queria com isso. Todavia, assim que
olha para Levi é como se entendesse a súplica velada de nossa amiga.
— A festa. Claro… — assente, apoiando os braços na mesa e
escorando o queixo na sua mão, destacando as unhas perfeitamente
pintadas. — Nós temos que decidir onde será a festa.
Ergo uma sobrancelha, ignorando as batidas descompassadas do
meu coração. A festa do semestre sempre é realizada no começo do ano. É
uma tradição. Uma que ela e seus irmãos criaram desde o ano sênior.
— Eu achei que a festa aconteceria na sua casa — digo, confusa.
Dylan cruza os braços frente ao corpo, se apoiando na cadeira,
enquanto Hazel apoia sua cabeça no seu ombro. Me dando visão de seus
grandes olhos castanhos. Eles são calorosos e gentis, um sentimento que
sempre me perguntei como conseguiu preservar quando sua realidade não
foi totalmente agradável.
Porque não é novidade para nenhum de nós que Hazel foi criada nos
subúrbios da Parte Baixa de Saint Vincent, pela sua mãe que fazia o
possível e o impossível para criar ela e o irmão mais velho.
Mesmo assim, quando toda a sua realidade a forçava para que se
ressentisse de todos nós por termos privilégios que muitos na cidade não
possuem, ela se manteve fiel e amável.
Hazel Grace Smith é toda graciosidade envolvida um uma luz que
perpetua por outras estações. Ela é o pilar desse grupo, a quem todos nós
recorremos quando precisamos e que sempre sabemos que estará lá com
seus conselhos e sua gentileza.
— Mamãe estará na cidade. E, definitivamente, Amber Blackwell e
festas não são uma boa combinação — Dylan explica, me tirando dos meus
devaneios. — Vamos fazer na casa de Ollie.
Oliver franze o cenho ao meu lado, se inclinando para pegar uma
batata frita ao mesmo tempo que pego a jarra de suco. Sem perceber, ele
apanha meu copo ao seu lado e o segura para mim, enquanto encho-o do
líquido laranja.
— Por que caralhos estão cogitando colocar uma centena de
universitários bêbados na minha casa? — questiona, me entregando o copo.
Logan solta uma gargalhada leve, encarando Ollie de baixo para
cima. Ele sorri sarcasticamente, passando seu braço por cima do encosto da
cadeira de Vee.
— Porque será a comemoração da sua entrada na Saint Vincent
University — ele diz, desviando o olhar para sua namorada. — Sem contar
que Verônica estava atrás de um motivo para uma festa. Você é um meio
para um fim.
Inconscientemente, uma risada se forma em meus lábios.
Meus amigos procuram qualquer desculpa para realizarem uma
comemoração, e todos nós sabemos disso, não era nem necessário Logan
explicar para Oliver. Está explícito no olhar de Vee. Sem contar que foi
exatamente assim que iniciou-se a tradição do primeiro semestre e a festa
da temporada de jogos que deve acontecer em algumas semanas.
— Tudo bem — Oliver, concorda. — Mas, isso não está
acontecendo na minha casa.
Verônica revira os olhos.
— Você é um péssimo anfitrião — Analu reclama.
Oliver volta a se encostar em sua cadeira, sorrindo para loira e ela o
encara entediada, mantendo seu celular em uma das mãos. Percebo que
diferente de todos nós, Analu não está trajada para a aula ou com suas
roupas que custam mais do que um aluguel na cidade, mas sim, com seu
uniforme verde e branco do clube da cidade, onde pratica tênis.
O esporte que, assim como debates e roupas de grifes, é apaixonada.
— Eu tenho um pirralho de dezessete anos que acabou de se mudar,
e que com certeza, me colocará em problemas se decidir participar das
nossas festas — ele conta. — Então sim, Parker, estou sendo um péssimo
anfitrião.
Solto uma risada nasal, porque se Oliver acha que conseguirá
manter Andrew longe das festas que nossos amigos promovem, ele está
sendo ingênuo. Ainda mais agora que Andrew e Melany se tornaram quase
inseparáveis. Uma amizade improvável, mas que se estabeleceu após eles
descobrirem que estão estudando no mesmo colégio.
— E você está rindo? — Oliver ralhou, com os olhos semicerrados
em mim. — Quando deveria me ajudar?
Meu sorriso aumenta.
— Me desculpa, mas é impossível não rir.
Ele abre a boca para responder, porém seu sorriso se desfaz quando
outra voz se sobressai a dele.
— Façam na minha casa — a voz áspera, imponente e dura de Levi
irrompe a mesa.
Nós olhamos para ele, que mantém um copo de suco verde em uma
das mãos e um olhar sereno em nós.
Apreensão toma conta do semblante de alguns integrantes da mesa
e, infelizmente, sei o motivo pelo qual estão assim. Levi pode não estar
dizendo nada sobre a repentina aproximação entre mim e Wright, contudo,
nós sabemos sua opinião sobre isso, posso até mesmo afirmar com
convicção de que ela não é positiva.
— Você tem certeza, Levi? — Hazel pergunta.
A pessoa segura para questionar, porque Levi a protege como se
fosse uma irmã caçula, então nunca seria grosseiro ou daria uma resposta
sarcástica.
— Sim, Haz — ele sorri calorosamente para nossa amiga. — Meus
pais estão indo para os Hamptons neste final de semana, então a casa na
Parte Alta estará livre.
— Sua mãe vai nos matar quando voltar — Vee comenta. — Você se
lembra da última festa que demos lá?
Levi pende a cabeça para trás, gargalhando com a lembrança e um
sentimento leve se infiltra em meu coração.
— Foi o primeiro porre da Sum — diz olhando para mim com suas
íris obstinadas brilhando em nostalgia. — Acho que descobrimos lá que
você e o álcool não são melhores amigos.
Minha face fechou-se em uma careta brincalhona.
— Ei! Foi a primeira vez que bebi — me defendo, ofendida. —
Você pulou pelado na piscina, Jonhson, me respeite!
Hazel solta uma gargalhada, apontando para Levi com uma batata
frita entre os dedos que agora tem uma careta parecida com a minha no
rosto.
— Meu Deus, como eu pude me esquecer disso? — questiona entre
gargalhadas. — Você falou que sabia voar. Voar, Levi, meu Deus!
Uma enxurrada de gargalhadas cobre a mesa, quando Hazel
desencadeia a lembrança.
— Isso não foi o pior! O pior foi o Sr. Johnson nos obrigando a
pagar o seu Macallan que roubamos de sua adega pessoal — Verônica
acrescenta. — Aquilo foi um ultraje, porque nem bebemos tudo.
— Nós bebemos duas garrafas, Verônica — advirto. — E
quebramos o vaso preferido da Sra. Johnson.
— Mexa com seus processos, mas nunca mexa com seus whiskys ou
quebre os vasos de mamãe — Levi dita, sorrindo amplamente.
— Eu sinto o desfalque na minha conta até hoje por conta dessa
festa — Dylan lamenta. — Eu jurei que seríamos deserdados depois
daquela festa.
Ele curva a cabeça para o lado, lançando a Levi um olhar cheio de
diversão, como se estivesse se lembrando de como foi aquela festa. Aquela
noite. A noite em que percebemos que éramos mais que amigos, mas sim,
família. E que, infelizmente, foi poucos dias antes que todo o nosso grupo
sofresse com a morte precoce de Sophie.
Porque sim, não foi apenas a família de Verônica e Logan que
sofreram com os acontecimentos daquela tragédia. Nós também.
Ainda me lembro de como foi me despedir de Verônica quando ela
estava indo embora, como foi ver a minha segunda família se fracionar.
Quando precisamos ver o sofrimento nos olhos de Logan e termos que lidar
com a ausência de cada um que compunham o nosso cotidiano.
— É isso! Nós vamos repetir a última festa do ano sênior na minha
casa — Levi afirma, seus olhos agora são brilhantes e ansiosos.
Por algum motivo olho de relance para Oliver que apenas observa
todos com um semblante desprovido de emoção. Então, percebo que ele
nunca esteve no meio de nossas lembranças. Ele nem ao menos foi um
membro permanente de nosso grupo no passado.
Oliver sempre foi um lobo solitário, mesmo tendo Verônica ao seu
lado.
Sempre segurou seu mundo sem ajuda, sem permitir que criasse
conexão para ter para quem ligar quando o silêncio fosse demais. Como se
ele estivesse tão acostumado a ser apenas uma unidade que, nesse instante,
percebeu que poderia ter tido mais, poderia ter tido a nossa família ao seu
lado em todos os momentos que precisou caminhar sozinho.
Espero que nessa festa, ele consiga criar mais um laço, mais uma
conexão.
E a junção desse desejo junto a ansiedade de repetirmos algo que
praticamos tantas vezes no passado mais a vontade de vê-lo ao nosso lado,
faz com que uma pequena sensação inquietante comece a dançar em meu
estômago.
O fogo em chamas normalmente nos mataria
Mas com todo esse desejo, juntos, nós somos vencedores
Eles dizem que estamos fora de controle e outros dizem que somos
pecadores
Mas não deixe eles estragarem nossos belos ritmos
Porque quando você vê quem eu realmente sou e diz que me ama
Fire On Fire | Sam Smith

A residência dos Jonhson 's está lotada.


É como se fosse uma nova versão da festa do ano passado, que os
irmãos Blackwell haviam dado para comemorarem a sua volta para a
cidade. Todavia, desta vez, não há uma ruptura entre nós, ao contrário,
todos estamos juntos.
Alguns estão no andar debaixo e outros encostados no parapeito de
vidro do segundo andar, observando a aglomeração dos universitários na
enorme sala da casa dos pais de Levi, como eu neste exato momento.
Sorrio por ter tomado a decisão de ficar sóbria essa noite. Afinal,
depois da cena na última festa, sem dúvidas, irei regrar o álcool em meu
sistema por um bom tempo. Mesmo sendo ele que me dá coragem
suficiente para sair da concha onde me enfiei, ao trazer-me a sensação de
que sou capaz de poder fazer tudo o que eu desejo sem o receio de me
machucar.
Mesmo com todos esses motivos, isso não é suficiente para que eu
enfrente a minha vergonha, no dia posterior por ter que lidar com as
consequências das minhas ações. Como dizer a Oliver Wright que desejo
repetir a nossa noite. Uma noite que ainda guardo ressentimento pelo que
fiz na manhã seguinte.
Levo meu copo de refrigerante até meus lábios outra vez, e observo
por cima da borda minhas amigas dançarem alegremente na pista de dança
improvisada. Analu balança as madeixas loiras de um lado para o outro,
destacando seu vestido dourado e ao seu lado, Josh vira um drink
avermelhado, rápido o suficiente para que eu possa ter certeza de que ficará
ainda mais bêbado logo.
Ele olha para Mackenzie, um dos colegas de time de Logan e pisca
sedutoramente, o que me faz sorrir por ter a plena certeza de que
definitivamente ele não voltará para o apartamento conosco e se voltar, não
será desacompanhado.
Verônica, que está ao lado de Analu, olha por cima do ombro e
mexe o corpo sensualmente, encarando Logan que apenas devolve o sorriso
malicioso de sua namorada.
Hazel e Dylan são os únicos ao meu lado e sussurram um no ouvido
do outro. O primogênito encara minha amiga com tanto louvor, que por um
segundo, até mesmo desejo ter o que eles têm. A cumplicidade, os segredos,
o amor. O amor puro e singelo que é visível a cada troca de olhar.
— Onde Ed está? — grito, por cima da música alta, decidindo que
estou entediada o suficiente.
Dylan vira o rosto para me encarar, enquanto passa sua mão pela
cintura de Hazel e puxa contra o peito, apoiando seu queixo no topo da
cabeça dela.
— Chegando com Oliver — ele devolve, gritando. — Meu irmão
pode ser um saco quando não quer participar das nossas festas.
Meu corpo enrijece com a menção da companhia de Ed.
Oliver Wright.
O homem que a partir de hoje será meu namorado de mentira.
Eu não o vejo desde quando tivemos aquele momento no Oásis.
Porém, agora que tudo está calmo, iremos lidar com isso o mais rápido
possível. Principalmente, quando percebi que desde o momento em que
coloquei meus pés nessa casa, Levi me encarou com aqueles olhos
brilhantes.
Todas as vezes que suas pupilas obsidianas encontraram as minhas,
elas me dizem que mesmo que eu tenha dito que estou apaixonada por
outro, ainda sim, suas esperanças não foram totalmente esmagadas.
Ele ainda acha que podemos ter algo. E não sei como afastá-lo sem
machucá-lo e isso está me deixando nervosa. Pois, o pensamento de que
posso perder a amizade que construímos durantes todos esses anos, faz com
que toda a intenção de contar tudo, escorra de meus dedos.
Por isso, por todo esse medo que corrói minha alma, me torno
alguém que não desejo. Alguém que esconde do melhor amigo a verdadeira
intenção por trás de tudo isso. Pois, por mais que eu diga a mim mesmo que
aceitei esse relacionamento por causa da nossa situação, de fugir dos
sentimentos de Levi, sei que no fundo não se passa de uma grande mentira.
Eu aceitei o acordo por causa daquela noite anos atrás.
Por causa de uma memória que não posso esquecer, mesmo que
desejasse.
— Está tudo bem, Sum? — Hazel questiona, quando não respondo.
Olho para ela que tem uma das sobrancelhas escuras, arqueada.
— Sim, claro! — digo, rápido o bastante. — Estou apenas sentindo
falta do meu companheiro, ele sempre se junta a mim para reclamar das
festas.
Dylan solta uma gargalhada, levando o copo vermelho até a boca e
tomando o último gole de sua cerveja.
— Vocês sabem ser um pé no saco quando querem.
Sua boca se curva em um sorriso cínico e minha única reação é
mostrar a língua para meu amigo, que deixa a sua gargalhada aumentar.
— Você sabe ser tão irritante quanto Verônica — alego, enquanto
tomo um gole da minha bebida.
— É uma das melhores qualidades de ser um Blackwell, Sum —
pisca, deixando um beijo na bochecha de Hazel. — Vou pegar outra bebida,
vocês querem algo?
Nego com a cabeça.
— Traga outro copo para mim.
Hazel entrega seu copo para ele, que o pega com a outra mão.
— Certo. — Maneia a cabeça e começa a se afastar, mas quando
está no primeiro degrau da escada, ele para e encara sua namorada. — E ma
belle?
— Sim, amor? — Hazel devolve.
— Fique aqui com Sum, eu odiaria ter que chutar a bunda de algum
universitário bêbado por não saber apreciar a sua beleza de longe —
confidencia, lançando uma piscadela para ela e voltando a descer as escadas
rapidamente.
Encaro o local onde ele estava a segundos atrás, perplexa. Meu rosto
se vira lentamente para Hazel que sorri para Dylan que agora está no andar
de baixo, falando com Logan. Quando os olhos da minha amiga encontram
os meus, apenas começo a gargalhar e ela apenas me acompanha logo em
seguida.
Dylan Blackwell é, de fato, completamente rendido por Hazel Grace
Smith. E não há no mundo nada que, em sentido absoluto, se pertença mais
do que eles.
A risada ainda flutua para fora de mim quando, de repente, sinto
alguém me encarando. E mesmo sem saber quem me observa, sinto uma
corrente elétrica percorrer cada centímetro da minha pele. Meu sangue
borbulha e meus pêlos se eriçam. Quando me viro, olho para a porta e é
como uma conexão instantânea. Porque meus olhos se fixam em Oliver
Wright parado na entrada, ao lado Edmund. O meu falso namorado não tem
seus orbes na sala infestada por universitários. Não, suas íris esverdeadas
estão em mim.
Apenas em mim.
Me prendendo na teia que começamos a construir, me dizendo
coisas que não consigo compreender. Nesse instante, somos como a
equação de Dirac, que descreve o fenômeno do entrelaçamento quântico e
afirma que se dois sistemas interagem entre si durante um determinado
período de tempo e depois que se separam, podem ser descritos como dois
sistemas diferentes, mas de certa forma se tornam um sistema único que
continuam se afetando, mesmo a distância de quilômetros ou anos luz.
Isso é o que somos. Eu e Oliver.
Nós somos um raro tipo de entrelaçamento ou conexão quântica.
Somos duas partículas nesse mundo, que, por algum motivo, estiveram
ligadas e continuarão, de alguma forma, relacionadas mesmo após o fim
desse acordo. Não importará a distância ou que estejamos em extremos
opostos do universo.
Nossa conexão sempre será instantânea. E isso me assusta. Me faz
querer correr e me esconder, faz com que eu queira quebrar esse acordo e
esquecer que um dia meu mundo se chocou com o de Oliver.
Ele leva a mão até o Rolex em seu braço direito e o gira no pulso,
duas vezes. Aproveito o movimento para abaixar o olhar para o conjunto de
seus trajes todo escuro, desde a blusa preta de frio com gola alta enrolada
até a altura do seu cotovelo e tampa todo o resto de sua pele pálida, até a
calça que contém apenas um detalhe prata da fivela do cinto.
Oliver está esplêndido. Não, esta palavra ainda é ínfima demais para
descrevê-lo. Ele é mais, muito mais que essa definição medíocre. E
enquanto procuro, no fundo do meu âmago, algum sentido que faça jus a
Oliver, ele não desvia o olhar, tampouco faz um movimento para entrar na
residência.
Apenas fica lá, me encarando. Como se eu fosse o centro do mundo.
Do seu mundo.
— Acho que vocês já podem parar de se encarar assim — Hazel
murmura ao meu lado, olhando de mim para Oliver com um pequeno
sorriso tenso no rosto.
— Hum? — Quebro a conexão primeiro para dar atenção a minha
amiga.
E nesse momento pondero o pensamento que estava rodando minha
cabeça.
Isso é errado. Merda.
Ter pensamentos como esse sobre meu futuro namorado de mentira,
pode me levar a uma ruína.
— Você e Oliver — repete a frase que não compreendi. — Vocês
estão se encarando como se estivessem prestes a atacar um ao outro.
Nós estamos e talvez não seja num bom sentido.
Não digo nada disso a ela, óbvio. Apenas me limito a fingir um
sorriso envergonhado. Pelo menos é isso que eu acredito que garotas
apaixonadas fazem quando alguém diz coisas semelhantes a que Hazel
acabou de proferir.
— Estamos progredindo — minto.
— É perceptível — ela comenta, me encarando.
Oh, merda!
Suas palavras não saem em forma de elogio e eu estava ocupada
demais para compreender o tom que proferiu.
— Diga logo, Haz — suspiro.
— Não acho que Oliver seja a melhor opção para você, Sum —
solta, deixando os ombros caírem e percebo que doí dentro do seu coração
dizer isso. — Desculpe, mas... vocês possuem problemas demais e isso
pode não ser bom.
Engulo em seco, levando minhas mãos até as dela e as aperto. Uma
parte de mim quer dizer a ela que não estamos nisso por conta de
sentimentos amorosos, mas sim, para salvarmos nossas bundas de
problemas maiores do que nossa antipatia um pelo outro. Entretanto, não
posso.
— Amo você, Haz, muito — sussurro, encarando seus olhos. —
Porém, você não precisa se preocupar comigo, apenas porque sabe o que
aconteceu no meu passado. Eu posso viver minha vida sem que aquilo me
limite.
Mentirosa.
Mentirosa.
Mentirosa.
Ela deixa o semblante preocupado para dar lugar a um sorriso fraco,
enquanto leva sua mão até uma mecha solta do meu cabelo e o coloca atrás
da minha orelha.
— Ok, desculpe — diz, por fim. — Eu apenas me preocupo com
você. Eu sempre vou me preocupar com você, Sum.
— Não precisa…
Não tenho tempo de terminar a frase, porque uma movimentação ao
nosso lado me faz desviar o olhar do rosto de Hazel e encarar três figuras
atrás da minha amiga. Dylan segura dois copos, enquanto conversa com um
Edmund irritado e tenho quase certeza de que está assim por ter sido
obrigado a sair do seu quarto para participar dessa festa.
E a terceira pessoa, é Oliver. Ele sorri abertamente para mim, um
sorriso canalha que sempre solta quando está prestes a aprontar algo.
— Haz — cumprimenta primeiro minha amiga, dando um rápido
abraço e logo após, para ao meu lado — Loirinha.
— Oliver — devolvo, soltando Hazel e inclinando um pouco para
ter a visão do caçula dos Blackwell. — Ei, Ed, estava sentindo sua falta.
Oliver ergue uma das sobrancelhas enquanto cruza os braços frente
ao corpo, fingindo estar magoado por não ter o mesmo tratamento que
Edmund.
— Ei, Sum — ele cumprimenta, desviando o olhar de seu irmão e
vindo até mim e Hazel. Ele beija a bochecha de sua cunhada primeiro e
depois me dá um abraço rápido. — Pensei que também se esconderia para
não participar dessa palhaçada.
Solto uma gargalhada.
— Sua irmã nos mataria se não viéssemos à sua festa.
— Touché! — brinca, sorrindo. — Quando quiser fugir, grite.
Abro a boca para responder, para dizer que farei isso logo, contudo,
a voz rouca de Oliver invade o espaço.
— Acho que isso não será necessário, Ed — afirma, sorrindo. — Eu
e a loirinha temos assuntos pendentes para tratar.
— Temos? — arquejo, franzindo o cenho.
— Com certeza.
Encaro Oliver por alguns segundos.
— Nós vamos... hum... — Hazel diz ao fundo — Vamos descer.
Observo de esgueira o momento em que ela puxa o braço de Dylan e
Ed para descerem as escadas até onde nossos amigos estão. Porém, minha
atenção logo se volta para Oliver e para o significado oculto nas entrelinhas
de suas palavras.
Estamos fazendo realmente isso. Hoje. Nesse momento.
Tento apaziguar o medo que sobe pela minha espinha e tento dizer a
mim mesma que tudo dará certo. Que conseguiremos convencer todos e que
no fim, eu e minhas amigas iremos rir dessa situação. Porém, não é isso que
acontece, pois engulo em seco, sentindo minhas costas ficarem tensas e dou
um passo na direção dele, apontando a cabeça para o corredor do lado
esquerdo, que não possui muito movimento.
Ele me segue em silêncio, ignorando algumas pessoas que falam
conosco no caminho e assim que viramos um corredor, paramos em frente a
uma porta de madeira escura que sei que é um dos quartos de hóspedes.
Abro-a, dando espaço para que entre primeiro, então, olho para o corredor,
vasculhando para saber se algum dos nossos amigos nos viu entrar aqui.
— O que diabos você está fazendo? — indaga atrás de mim.
Ergo meu corpo, me virando e ajeito o vestido em meu corpo.
— Inspecionando.
— Parece que está vigiando enquanto roubo os itens valiosos da
casa dos pais do Levi — comenta, torcendo o nariz.
Olho para ele, tendo sérios pensamentos homicidas.
— Eu já disse que você é um idiota hoje?
Ele sorri maliciosamente.
— Não, por favor, me lembre o quanto você ama o meu intelecto.
Reviro meus olhos.
— Você é um idiota.
— É sempre um prazer, loirinha — diz ele, escorando o corpo na
escrivaninha branca. — Agora, me conte o porquê diabos estamos fazendo
nesse quarto. A não ser que...
— Não ouse terminar essa frase! — rosno, apontando um dedo para
ele e encarando-o mortalmente.
Respiro fundo, dou um passo na sua direção. Oliver me encara,
estudando cada um dos meus movimentos, como se eu fosse um gato
prestes a atacar um rato que acabara de roubar um queijo.
— Certo — Maneia a cabeça lentamente. — Então, novamente, o
que estamos fazendo aqui?
— Eu não sei se estou pronta — pondero, suspirando fundo.
— Desculpe?
Ele franze o cenho.
— Eu não estou preparada, Oliver. Não posso simplesmente ir lá e
anunciar para todos que estamos namorando — jorro as palavras
rapidamente. — Não posso mentir para eles... Meu Deus, eles vão me odiar,
Oliver.
Ele se desencosta da mesa, vindo até mim e parando alguns
centímetros longe. Não invade meu espaço pessoal, porém sua presença
poderia muito bem sobressair a qualquer outra presença que pudesse existir
no ambiente.
Existe apenas ele.
Ele e a preocupação que ronda suas órbitas.
— Ei, loirinha — chama lentamente, segurando meu rosto entre as
mãos e levantando-o. — Respire, ok? Apenas respire. — Eu faço o que
manda. — Agora, expire. Isso, agora faça mais uma vez.
Sua boca emite o movimento de inspirar e expirar e sempre mantém
o olhar no meu. Nunca deixa com que meus pensamentos gritem em minha
cabeça. Ele me mantém em plena sanidade, faz com que a ansiedade dilua,
até que reste apenas o barulho do meu coração se normalizando dentro da
minha caixa toráxica.
— Desculpe, eu apenas… — confesso, fechando meus olhos por um
segundo e sentindo a sensação de sua pele macia contra meu rosto. — Eu
apenas... não sei, Oliver.
— Não sabe o que, Sum? — ele pergunta, baixinho. — Confie em
mim, loirinha.
— Não sei se quero te arrastar para minha bagunça.
Ele sorri um sorriso doloroso. Um sorriso daqueles que ele quase
nunca dá.
— Não se preocupe com isso, loirinha, porque eu já sou uma
bagunça por completo — comenta, sorrindo fraco.
Oliver dá mais um passo à frente, colocando o dedo indicador em
meu queixo e o levantando. Seus olhos são fascinantes, é um tom de verde
magnífico, nem muito claro, tampouco muito escuro, são como esmeraldas
lapidadas em uma joia valiosa. Seus lábios estão entreabertos e me pergunto
se sua respiração rasa, indica que está tão afetado como eu estou.
— Você não é uma bagunça, Oliver — murmuro, passando a língua
pelo meu lábio inferior e percebo a atenção dele se fixar em meus lábios. —
Mas acredito que nós dois juntos, seremos a pior das confusões.
— Eu não me importo, loirinha — sussurra, acariciando minha pele
onde seu dedo toca. — Se você estiver dentro, eu não me importo com mais
nada, a não ser você.
— Oliver...
— É a sua última chance, Summer — comunica, me interrompendo.
— Você está dentro ou não?
Respiro fundo.
Eu escolho lutar.
— Eu estou.
Ele sorri. É um sorriso diferente dessa vez.
Fico parada, absorvendo. Não sei por que, mas parece que acabei de
conquistar algo ao fazê-lo sorrir desta forma. Oliver fecha os olhos por um
segundo, inspirando o ar a nossa volta e quando volta a abri-los, posso
enxergar a vastidão dos seus pensamentos.
— Bem-vinda ao nosso jogo, loirinha.
Um jogo. É isso que somos.
Repito essas duas palavras, testando-as e quando termino, tenho a
impressão de que precisarei me lembrar delas eventualmente. Porém, as
arremesso para o fundo do meu subconsciente, trancando-as com outras
coisas que não preciso lidar no momento e olho para Oliver, soltando um
sorriso condescendente.
— Bem-vindo ao nosso jogo, playboyzinho.
Oliver solta uma gargalhada, e o som de sua risada rompe algo
dentro de mim, algo que eu nem mesmo sabia que existia.
— Summer?
— Hum?
— Eu irei te beijar.
Nunca estive apaixonado
Nunca me senti assim até agora
Enquanto eu deito aqui na sua cama
Eu preciso de você em meu peito
Para me aquecer o tempo todo
Para tirar o seu fôlego
Common | Zayn Malik

Summer me encara sem entender a complexidade das minhas


palavras.
Ou melhor, sem entender que a atitude de beijá-la, será não só o
começo do meu martírio, como também o que precisamos fazer para que
acreditem que estamos loucamente apaixonados.
Não que eu não deseje beijá-la, porra, é um dos únicos pensamentos
que rondam a minha cabeça desde o momento em que nos trancamos nesse
quarto. Na verdade, sempre me senti atraído por Summer. Não há um
momento desde quando nossos olhares se cruzaram no Oásis, meses atrás,
que eu não sinta isso. E, hoje, apenas desejo concretizar todos os
pensamentos pecaminosos que circundam a minha mente.
Pensamentos que variam de como eu poderia me sentar na beirada
da cama e curvá-la sobre minhas pernas, enquanto desfiro inúmeros tapas
em suas nádegas, por todas as respostas ácidas proferidas em minha
direção, desde que nós nos conhecemos até eu me ajoelhando a sua frente e
provando seu gosto. Seu maldito gosto viciante.
Todavia, não posso fazer isso. Ela está no meio de um momento
ruim. Além disso, não serei um idiota por completo por invadir seu espaço
pessoal, apenas por não saber como controlar o meu pau dentro das minhas
calças.
Sem contar que existe a regra.
A regra que será meu purgatório até o baile dos Blackwell, em dois
meses.
Mesmo que eu tenha usado o momento no Oásis para provocá-la, sei
que ela nunca iria para a cama comigo outra vez. Não depois do que fiz a
ela naquela manhã, após a festa na fraternidade.
— Digo… — Arranho minha garganta, me afastando e expulsando
meus pensamentos pecaminosos. — Lá embaixo, eu irei precisar te beijar.
Para… você sabe... que eles acreditem na nossa mentira
Deus, desde quando gaguejo dessa forma tão patética?
Ela não percebe minhas palavras tensas ou, se percebe, escolhe
ignorar. Então, finalmente solta uma respiração e percebo que seu corpo
assume uma postura inquietante.
— Oh, certo... ok — se enrola com as palavras, assim como eu, e
quase solto um sorriso por vê-la tão afetada.
Escoro novamente no móvel branco, segurando com força as
laterais, em uma forma de manter minhas mãos para mim, longe de
Summer e de seu cheiro cítrico. Se ela abaixar os olhos, poderá perceber
que não é apenas ela que necessita de uma distância segura.
Summer Miller é como a porra de um oximoro [13]para mim,
contradizendo da forma mais agonizante dentro do corpo.
— Se você precisar de mais tempo... nós podemos fazer isso depois
— digo, encarando a parede ao seu lado, evitando o seu olhar.
Viro meu rosto no momento em que ela morde o lábio inferior.
Que Deus tenha piedade de mim, porque isso é muita tentação para
um espaço tão minúsculo.
— Não — adverte, convicta. — Nós vamos fazer isso. Agora. Antes
que todos fiquem bêbados o suficiente e não se lembrem do que aconteceu.
Ok.
Ela está certa.
Me agarro a isso como se fosse uma válvula de escape. Penso em
como Verônica, já parecia animada o suficiente para finalmente ficar
bêbada com Analu e Josh. E que talvez, os outros, assim como eu e
Summer, estarão sãos até o final.
Afinal, Logan e Dylan não podem exagerar, já ambos possuem
treino para a próxima temporada de jogos e Hazel está tentando uma
residência em um dos melhores hospitais da cidade, o que significa que ela
não deseja aparecer na universidade com ressaca e um semblante cansado.
— Certo, vamos descer juntos — comunico. — E talvez dançar. Se
preferir podemos tomar uma bebida primeiro.
— Sem álcool — adverte. — Não irei ficar bêbada essa noite ou em
nenhuma outra noite.
O vinco entre minhas sobrancelhas franze com um quê de pergunta.
— Eu quero saber o motivo de você estar rejeitando bebida gratuita?
— lanço do modo mais suave possível. — Por um longo tempo?
Summer desvia o olhar para meu rosto e passa a palma das mãos
pela seda de seu vestido, exasperada.
— Digamos que tomo as piores atitudes quando não estou em meu
juízo perfeito — geme, enterrando o rosto nas mãos.
— Oh, eu sei disso — zombo, adotando um tom irônico nas minhas
palavras.
Provoco-a com um único fim: fazer com que esqueça o que estamos
prestes a desempenhar no primeiro andar, onde praticamente toda SVU está.
Não digo a ela que seremos notícia no campus no próximo dia e
muito menos que posso já ter dado a entender para algumas garotas que me
cercaram na minha vinda para cá de que não estou mais disponível. Deixo
de fora também a informação que nesse exato momento, enquanto levanto
meu celular e tiro uma foto distraída dela, é porque estou postando um story
em meu Instagram.
Quando volta a olhar em meu rosto, Sum me encara com os olhos
cheios de fúria e sei que fiz a porra do trabalho com maestria.
Ela só precisa agora entrar no teatro e ser a namorada perfeita.
— Não me provoque, Wright — dispara, mantendo um tom
controlado.
Summer abre a boca para dizer algo, contudo seu celular apita,
indicando uma nova notificação.
— Hora do show, loirinha.
Ela desliza o dedo indicador pela tela do iPhone, e arregala os olhos
quando vê o conteúdo da notificação.
É uma menção. A foto é simples, ela está apenas virada para o lado,
olhando para a parede. A luz ilumina apenas metade do seu rosto, deixando
sereno.
Linda.
— O que você fez, Oliver? — pergunta, baixinho.
— Apenas dei aos meus seguidores uma prova de que estamos tendo
algo, loirinha — declaro, sorrindo abertamente. — Agora vamos, ainda
temos um grupo de amigos para convencer.
Ela quer me matar. E tenho quase certeza que será lento e doloroso.
Não precisa ser mágico para adivinhar isso.
Principalmente pela forma demoníaca que me encara, como se
estivesse cogitando me atirar do segundo andar e depois apagar a foto.
Summer pisca, duas vezes. Então respira fundo, colocando uma
mecha do cabelo claro atrás da orelha, passando por mim, ajeitando o
maldito vestido e trilhando um caminho para o corredor, escolhendo não
proferir nada a mais sobre a foto.
Ok, isso talvez seja um bom começo.
No caminho até as escadas, vejo seus punhos abrirem e fecharem,
indicando seu nervosismo, contudo mantenho-me um pouco distante.
Dando a ela um momento para se preparar, porque sei que está se
perguntando o que acontecerá quando pisarmos na pista de dança e todos
observarem o que estamos prestes a fazer.
Ainda estou pensando nisso, quando ela se vira em uma velocidade
alarmante, assim que chegamos ao topo das escadas. Summer segura um
dos lados do corrimão, impossibilitando a passagens das pessoas que tentam
subir e preciso sussurrar um pedido de desculpas para a fila que se forma
atrás dela.
— Ok, é agora — diz, mas percebo que é mais para si mesmo do
que para mim. — Como faremos isso?
Solto um sorriso em sua direção, e estendo minha mão para que
entrelace seus dedos. Quase solto uma gargalhada quando ela olha para meu
braço estendido e o encara como se fosse tentáculos prestes a agarrá-la.
Por fim, sabendo que não temos saída, suspira fundo e une nossas
mãos.
— Confie em mim, ok? — digo, puxando-a para meu lado e
liberando a passagem.
Ela ergue o rosto e seus olhos se fixam nos meus. Há receio, medo e
até mesmo inseguranças envoltas de suas retinas, porém quando volta a
proferir uma pergunta, sei que irei precisar prová-la que estou falando sério
quando digo que pode confiar em mim:
— É uma boa opção?
— É a melhor, loirinha — conto. — Você pode confiar em mim.
Sempre.
Sorrio quando ela acena positivamente, e desce um degrau, depois
outro e assim sucessivamente, até que estamos no meio da pista de dança,
escutando a melodia de Another Love de Tom Odell. Quando a letra atinge o
refrão, uma cacofonia de vozes se juntam para cantar. Sorrio pelo ambiente,
sentindo falta dessa sensação e quando passo meu olhar, a fim de localizar
onde nossos amigos estão, puxo fracamente a mão de Sum.
Dylan, Hazel e Ed ainda estão escorados no segundo andar sorrindo
para algo que o caçula murmura, enquanto Analu, Josh, Verônica e Logan
estão aqui embaixo. O último tem suas mãos envolta da cintura de Vee e
eles estão sorrindo um para o outro, que não percebem a nossa chegada,
enquanto Analu sorri arrastado para a minha companhia que ainda tem suas
mãos entrelaçadas nas minhas e solta uma piscadela, erguendo o copo
vermelho. Josh, está do outro lado da sala, escorado em um sofá ao lado de
Mackenzie e nem mesmo a nossa chegada é interessante o suficiente para
que ele desvie o olhar do jogador.
Umedeço meus lábios e abaixo meu olhar até Summer. E em uma
conexão bizarra, ela o levanta no mesmo instante.
Percebo, nesse momento, que eu nunca havia admirado tanto a
tonalidade de um olhar até Summer, porque os seus olhos, são sublimes e
intensos, são de uma cor escura, quase como ébano. Mas, ainda sim,
escondem segredos que, mesmo que eu negue, no fim, sei que almejo
desvendar.
A verdade disso tudo, é que olhos castanhos haviam sido apenas
olhos castanhos até que eu conheci Summer Miller, até que essa pequena
criatura que possui péssimo gosto para filmes e literatura, entrasse
sorrateiramente pela vida e fizesse uma bagunça.
Uma bagunça que eu já não sei mais se desejo organizar.
Porque essa ação, mesmo que inconsciente, me fez voltar a ter
sensações que, no mesmo instante que tenho medo de aprofundá-las,
também me fazem sentir vivo, elétrico.
— Summer.
— Oliver.
É um maldito déjà-vú.
Como se o destino estivesse esfregando em nossos rostos todas as
lembranças daquela noite. Como nos sentimos extasiados e fomos de águas
calmas que balançavam na direção da maré baixa, à uma tempestade
desordenada que enche rios e interdita cidades inteiras, chegando a matar a
seca e inunda vielas.
Nós fomos uma síntese que poucos entendem e muitos desejam
estudar.
Fomos um arco-íris no meio de uma tempestade, uma beleza
incompreendida no meio do caos.
— Eu irei dançar com você.
É um pedido, talvez até mesmo uma súplica, que nem mesmo eu
consigo compreender o motivo pelo qual essas palavras saíram de meus
lábios.
Eu deveria vir aqui, beijá-la, vender um relacionamento falso para
todos e então ir embora. Todavia, não é isso que está acontecendo. Não. É
totalmente ao contrário. Eu estou praticamente implorando pelo contato
dela. Da mulher que não me suporta, que apenas topou esse acordo para
manter seu melhor amigo longe dos seus segredos e de seu coração feito de
espinhos.
— Uma noite foi suficiente — ela sussurra.
Sua voz é doce, baixa e afetada. Meu olhar abaixa, lentamente até
seus lábios pintados de um rosa claro, quase que invisível, porque sei que
ela odeia cores alarmantes. Estou tão focado nisso, que não percebo o
momento em que os cantos da minha boca transformaram-se em um sorriso
fraco, quase que imperceptível por lembrar desse pequeno detalhe.
— Uma noite nunca será suficiente quando se trata de você,
Summer.
É a verdade. A mais pura e doce verdade.
As pupilas da loira à minha frente se dilatam. Há desejo, confusão e
necessidade envolta delas e posso garantir, com toda a minha existência,
que estou encarando-a da mesma forma. Prestes a cometer um pecado, a
corromper a garota perfeita da Parte Alta que nunca comete um erro.
Aquela que é diferente de mim.
O oposto.
A porra do meu oximoro.
Ela engole seco, passando a língua pelo lábio inferior e eu apenas
acompanho o gesto, ignorando tudo à minha volta.
Só existe ela.
Summer Miller.
Loirinha.
Meu dedo indicador segura seu queixo e o levanta, erguendo o lindo
rosto. Passo meu dedo livre pelo seu lábio inferior, sentindo a maciez.
Desejando, suplicando para que ela chegue mais perto, que me tire da
minha penúria.
— V-você... tem certeza disso? — ela murmura tão entregue quanto
eu nesse momento.
Minha testa pousa contra a sua, enquanto tento não atacá-la como
um troglodita e talvez seja por isso que começo a nos movimentar em
sincronia com a música. Sinto como se cada estrofe que a letra emite fosse
para nós dois.
Como se quando a voz rouca do vocalista entoasse “E eu quero
beijar você, fazer você se sentir bem” e emergisse pelo espaço, por cima da
melodia, não fosse apenas uma simples frase, mas sim, as palavras que
estou gritando, mesmo que eu me mantivesse em silêncio.
— Não há outra coisa que eu deseje mais no momento do que fazer
isso.
Ela me encara, se perguntando se estou dizendo isso sobre beijá-la
ou sobre mostrar a todos que estamos juntos, de que finalmente estamos
colocando nosso arranjo para o mundo.
Contudo, não dou tempo para que consiga decidir, porque nem eu
mesmo sei por qual dos dois estou mais ansioso. Apenas paro a dança,
estagnando-nos no lugar, encarando seu lindo rosto.
Me aproximo, lentamente, quase agonizando.
E então, tomo seus lábios.
É um beijo doce, lento. Como se estivéssemos nos lembrando da
sensação de estarmos assim novamente, de como a cada vez que nossos
lábios entram em contato com o do outro, todo o mundo some.
Suas mãos delicadas sobem até minha nuca, aprofundando ainda
mais o momento. E eu me perco. Sinto como se a nossa combustão
estivesse correndo por todo meu corpo, como se nosso toque soltasse fogos
de artifício dentro de mim e o universo estivesse prestes a colidir contra um
meteoro e eu não me importasse.
Eu não me importo com nada. Nada, a não ser a loira em meus
braços, um lugar onde ela se encaixa tão perfeitamente que por um
milésimo de segundo, percebo que não quero soltá-la.
E talvez seja por isso, que puxo seu pequeno corpo, fazendo com
que uma das minhas mãos circule sua cintura e a outra, a que estava em seu
queixo, arraste em uma carícia até a sua nuca, segurando-a, enquanto
caímos e caímos.
Durante essa queda, peço aos céus para que o chão jamais chegue.
Porque se isso significa que, nessa queda livre, Summer Miller é minha, eu
aceito a queda, mesmo que saibamos que quando nossos lábios se
separarem, ambos sairemos marcados, permanentes, como sempre
soubemos que aconteceria.
Porque é assim que somos, nunca somos metades, sempre
transbordamos, sempre somos tudo ou nada. E nesse momento, enquanto
provo descontroladamente o beijo envenenado dela, escolho o tudo, mesmo
que o momento após isso, seja amargo.
Ela me solta por um momento, um momento bem pequeno, porque
no próximo segundo Summer me encara calorosamente e então volta a colar
nossos lábios em uma dança bem elaborada. Um misto de sensações que
não consigo controlar. Tudo me atinge de forma desgovernada.
Aperto sua nuca, em um aperto fraco, roubando dela tudo o que está
disposta a me dar no momento. Meu fôlego é roubado assim que a sua
língua quente e impetuosa faz um caminho para dentro da minha boca. E
Deus, eu recebo com tanta sede que não me reconheço, porque nunca perdi
o controle assim, melhor dizendo, nunca perdi o controle por conta de um
beijo que não deveria significar nada.
Mesmo assim, sabendo que isso será uma dor no meu traseiro
quando ela entender o que estamos fazendo, saboreio cada gota do gosto
doce de Summer, sentindo tudo e suplicando por mais. Puxo-a contra mim,
escutando o arfar que solta quando estamos quase fundindo nossos corpos.
Então, sem nenhum aviso prévio, ela corta a nossa ligação. Me
expulsa de si, como se a realidade tivesse esmurrado seu rosto perfeito,
porém, ainda se mantém em meus braços.
Summer respira com dificuldade e me encara com sua visão
parcialmente nublada, como se estivesse recobrando a consciência. Minha
testa abaixa, encostando na dela, e solto um suspiro sentindo seu corpo ficar
tenso, preocupado. Abro a boca para dizer algo, qualquer coisa que faça
com ela não surte ou se afaste, todavia, não é minha voz que verbera pelo
ambiente. E muito menos, a frase que eu pretendia dizer.
— O que está acontecendo aqui? — Verônica questiona, atrás de
Summer e na minha frente.
Minha melhor amiga tem os olhos castanhos arregalados e uma
sobrancelha erguida. Passo meus olhos para o lado, encontrando Logan
olhando para mim e Summer com um quê de confusão estampada em sua
face e Analu apenas paralisa o copo perto de sua boca, como se o objeto
estivesse estagnado ali e decidido não sair.
Ainda no segundo andar, vejo Hazel colocar a mão na boca e Dylan
apenas lançar um olhar para o outro lado do parapeito.
Então, percebo o porquê da reação de Vee e o pior, percebo o que
acabamos de fazer, do lugar em que fizemos. Porque no segundo andar, do
lado oposto ao que Hazel e Dylan estão, Levi Johnson está parado,
encarando a cena que acabamos de fazer.
Não pensamos nisso. Eu não pensei.
É a porra da festa de Levi. Na casa dele. E eu acabei de beijar a sua
melhor amiga, a garota que ele ama.
E talvez Summer também tenha percebido a merda na qual nos
colocamos. Porque quando olha por cima dos ombros, em direção ao seu
amigo, há tantos sentimentos ali que apenas tenho vontade de me socar por
ter sido tão imbecil.
— A culpa é minha — conto, surpreendendo a todos, inclusive a
mim.
Verônica coloca a mão em sua têmpora e massageia, assim que volta
a nos encarar, me pergunto como Logan conseguiu manter a rixa com essa
mulher, como suportou brigar por tanto tempo, porque até mesmo o olhar
dela me causa arrepios.
— Eu já imaginava que estavam tendo algo, mas... — ela murmura
calmamente.
— Mas, foi imprudente? Sim, nós sabemos — Summer responde,
erguendo o queixo e não dando a ninguém tempo para responder. — Porém,
aconteceu e não há motivos para surto.
— Summer... — tento intervir.
Percebo, de relance, Hazel, Dylan e Josh se juntarem a nós no centro
da sala, e o pior, percebo alguns celulares levantados em nossa direção.
Eu esperava por isso, esperava que comentassem pelo campus, eu só
não esperava que meus amigos reagissem tão severamente, afinal, nós
demos todas as indicações de que estávamos caminhando para esse
momento.
— Não, Oliver. Está na hora de todos saberem — ela comunica,
erguendo os olhos até mim, me dizendo que esse é o momento.
Deus me proteja.
— Sabermos do que? — Hazel pergunta, erguendo a sobrancelha.
— Nós. Eu e Summer... — meu timbre se agrava. — Nós...
— Estamos juntos — Summer completa.
— Juntos? — Josh repete a última palavra, em confusão.
— Sim — eu e ela respondemos em uníssono.
— Desde quando? — Verônica pergunta, baixinho.
— Desde a festa na sua casa — não é a minha voz, tampouco a de
Summer que responde à pergunta de Verônica. — Minto, talvez seja desde o
ano novo.
É a voz rouca e decepcionada de Levi.
Sinto o corpo de Sum enrijecer. E não sei, porque, mas a puxo
contra mim, fazendo com que suas costas batessem em meu peito.
Proteção.
Summer não se afasta, ao contrário, tenho a impressão de que se
pudesse fundir ao meu corpo para não lidar com essa situação, ela faria isso.
A loira odeia ser o centro das atenções, odeia com que a encarem como
todos nossos amigos estão nos encarando nesse momento.
— Biblioteca. Agora — Verônica anuncia. — Todos nós.
Não temos tempo para discordar.
Ela se vira caminhando entre os convidados, batendo seu salto no
chão. Vee não está nervosa pelo show que acabamos de aprontar, ela está
agindo assim porque está decepcionada; Comigo e com Summer.
Nós somos amigos dela e de todos, mesmo assim, não contamos a
nenhum deles. E agora ela acha que estamos juntos desde o ano novo.
Vee abre a porta de mogno e a empurra, entrando no enorme
ambiente e então seguimos a ação. Ed, que foi o último a adentrar, fecha-a,
nos trancando aqui, longe da música alta e dos curiosos que rondam a sala.
— Expliquem — ordena Hazel, se escorando em uma mesa na
lateral.
— Nós estamos juntos — digo, forçando um sorriso.
— É perceptível — Dylan responde, inclinando a cabeça e soltando
um sorriso fraco, debochado.
Idiota.
Eu nunca fui fã de deixar as pessoas falando sozinhas, a não ser meu
pai. E, nesse momento, enquanto observo cada um dos meus amigos, me
encararem como se tivéssemos cometido um homicídio, faz com que uma
vontade súbita de puxar Summer e sair daqui, deixando com seus
questionamentos, suba pelas minhas veias.
— Levi está falando a verdade? — Vee questiona, baixinho,
decepcionada. — Vocês estão juntos desde o ano novo?
Ergo meu rosto para Levi, que está no canto, ingerindo uma boa
quantidade de álcool.
— Sim — Summer mente.
Verônica, Hazel e Analu a encaram por alguns segundos. Uma
conversa silenciosa. Elas são amigas, melhores amigas, daquelas que
contam tudo uma para a outra e que agora pensam que estamos juntos a
todo esse tempo e Sum não confiou para confidenciar algo de tamanha
proporção.
Levo minha mão até a dela que está tremendo e entrelaço meus
dedos nos seus, em um sinal.
Nós estamos juntos. Somos um time.
— E nenhum dos dois achou conveniente contar a nós? — Analu
questiona, passando o dedo pela borda de seu copo. — Tipo, tudo bem, nós
já desconfiávamos de algo. Até mesmo estranhamos a súbita aproximação
de vocês... mas, vocês estão juntos, como um casal há meses e não
contaram a nenhum de nós. E mesmo que Levi tenha aprontado aquela cena
ridícula, nós merecíamos saber...
Engulo em seco.
Nós sabíamos que isso aconteceria. Sabíamos que eles reagiriam
dessa forma, mas ver a decepção estampada em seus rostos é mil vezes pior
do que quando imaginei. Talvez seja por isso que decidir que minhas
próximas palavras poderiam não ser verdadeiras, mas necessárias para
contornar todo o dano causado.
— E como você iriam reagir se disséssemos que por conta de um
momento em uma festa, eu e Summer acabamos nos aproximando e
percebemos que queríamos mais? — Suspiro fundo. — Como reagiriam
quando disséssemos que duas pessoas que não se suportavam se
apaixonaram?
— Nós... — Vee começa. — Vocês se odiavam, Ollie. É difícil de
entender.
Desculpa, Vee. Desculpa mesmo.
— Vocês não acreditariam... — interrompo. — E se acreditassem,
ficariam preocupados. Nós não queríamos levar problemas para vocês.
Porém, não tivemos como evitar o que aconteceu e sinceramente? Não me
arrependo em nenhum momento, exceto mentir para vocês.
Summer me encara com os olhos arregalados, e tenho certeza de que
está se perguntando de onde caralhos tirei tudo isso. Digo a mim mesmo
que mentir com tamanha maestria é por conta de todas as mentiras que
contei por causa das ações de meu pai.
— Não queríamos mentir — Summer me surpreende, mergulhando
na minha mentira e se afogando junto comigo. — E peço desculpas por
isso, mas aconteceu e eu amo vocês demais para complicar a suas vidas por
conta das minhas escolhas. Levi está certo, tudo começou no ano novo e
não contamos por tudo o que está acontecendo no momento. Eu não queria
te machucar mais ainda, Levi. Não queria machucar nenhum de vocês.
É uma mentira que sei que a corrói por dentro e mesmo assim
Summer se mantém firme.
— Então vocês estão juntos? — Ed é o primeiro a perguntar,
sorrindo e tirando uma batata chips de um recipiente, levando até a boca. —
Juntos tipo um casal?
Olho para Summer e sorrio.
Está feito.
Não há mais volta.
— Estamos.
Vee deixa os ombros caírem e solta um suspiro.
— Sinto muito por talvez ter agido como uma megera — diz, dando
um passo à frente. — Eu apenas...
— Se preocupa demais. Eu sei, Pequena Blackwell — respondo, me
desvinculando de Summer e indo até a minha melhor amiga. — E é por isso
que você é a minha melhor amiga.
Ela sorri, deixando toda a tensão sumir de seu corpo.
— Vocês dois, nunca, em hipótese alguma, escondam algo
novamente, ok? — indaga, para mim e Summer.
Me desculpe, Vee, mas, talvez isso não seja possível.
— Foi a última vez — asseguro, mesmo sabendo que é mentira.
Ela assente, satisfeita e volta para o lado de Logan, que encara Levi
com os olhos preocupados.
O capitão da SVU, sabe, melhor do que ninguém, o quão profundo é
o sentimento de seu amigo por Summer e sabe também que ela não tem a
intenção de retribuir da forma como Jonhson almeja.
— Vamos voltar para a festa, eu preciso de álcool para comemorar o
novo relacionamento dos meus amigos! — Analu exclama, quando percebe
que estamos todos olhando para Levi que vira uma garrafa de Jack Daniel’s
nos lábios, sem nem ao menos emitir uma careta. — Não é, Johnson?
Ele ergue uma sobrancelha para Parker pela provocação velada.
Algo que começaram desde que souberam, três dias atrás, que vão competir
por uma vaga de estágio em uma das maiores escritórios de advocacia do
país, no próximo semestre.
— Claro, Princesa de Gelo — zomba, levantando a garrafa,
imitando um brinde. — Talvez, comemoramos antecipadamente a minha
vaga na McLaughlin&Conway.
Analu sorri, não, ela gargalha sarcasticamente.
— Nos seus melhores sonhos, Johnson.
— Sabe o que está nos meus sonhos? Você desistindo da minha
vaga! — ele diz, engolindo outro gole da bebida. — Infelizmente, isso não
está acontecendo.
Ergo uma sobrancelha.
— Eu me lembrarei dessa sua lamentação quando estiver
comprando o seu presente pelo seu fracasso em competir comigo, querido
— desdenha venenosa.
Com isso, com a provocação mais inusitada dos tempos entre a
desavença de Parker e Jonhson por conta de uma vaga de emprego, o
assunto Summer e eu fica em segundo plano e nunca agradeci tanto por
uma distração como a de agora.
Contudo, sei que essa foi apenas a primeira partida do nosso jogo.
E algo me diz que as próximas serão mais difíceis do que a de hoje.
Tem uma tempestade se formando
E estou preso no meio disso tudo
E isso toma o controle
Da pessoa que eu pensei que eu era
Do garoto que eu costumava conhecer
Waves | Dean Lewis

— Você está me evitando.


Eu desejaria que essa voz viesse de Logan, Josh ou, até mesmo, de
Levi. Porque, assim que eu levantasse meu rosto e os mandasse para o
inferno, eles ririam e logo após voltariam para suas atividades, me deixando
em paz nesse canto.
Todavia, não é isso que está acontecendo, porque a voz que ecoa na
biblioteca silenciosa não é pertencente a nenhum deles, mas sim, de uma
pessoa que realmente estou fazendo isso no qual está me acusando desde a
festa de Levi, há quatro dias.
Oliver está parado em frente à minha mesa, no segundo andar da
biblioteca da universidade. E mesmo que meu rosto esteja abaixado,
consigo ver uma parte do seu pulôver preto de frio, contrastando com sua
calça clara.
— Hum? — resmungo ainda encarando meu livro, fingindo que não
escutei sua acusação.
De repente, o artigo sobre a consciência humana se tornou muito
interessante.
— Você, loirinha, está me evitando — ele repete e tenho certeza de
que se eu levantar o meu rosto nesse momento, ele estará com um sorriso
condescendente no rosto. — Quer compartilhar o motivo pelo qual está
ignorando o seu lindo namorado?
Ergo uma sobrancelha, ainda encarando o livro.
Deus, por favor, dai-me paciência para enfrentar esse martírio até o
baile anual.
— Nós nos vimos no sábado, não seja tão dramático — respondo,
revirando meus olhos e passando outra página.
Ele suspira.
— Se não se importa, loirinha, gostaria de conversar olhando para o
seu rosto, não para o seu cabelo — debocha, puxando uma cadeira e se
sentando à minha frente, fazendo com que eu quase revire meus olhos
novamente.
Solto um bufo, erguendo meus olhos e deparando com o rosto
sereno de Oliver. Ele inclina a cabeça para o lado e leva um copo do
Starbucks até os lábios, destacando o Cartier em seu pulso e fazendo com
que o cheiro do café flutue até mim. Antes que eu possa dizer algo, Oliver
estende um outro copo em minha direção.
Diferente do dele, que é o copo específico para cafés, o que está
estendido para mim vem acompanhado de uma boa porção de chantilly no
topo e coberto com uma calda de caramelo. Continuo observando o copo,
me perguntando como diabos Oliver Wright sabe que o tão famoso
Frappuccino é a minha bebida favorita de todo o cardápio da cafeteria.
— Por mais tentador que seja ficar aqui segurando um copo gelado
e olhando para o seu belo rosto — ele resmunga, me encarando — Eu
apreciaria se o pegasse. Além disso, eu nem mesmo o envenenei.
— Deveria estar aliviada por isso?
Ele solta um pequeno sorriso.
— Certamente.
Puxo o copo de sua mão, levando o canudo verde até meus lábios e
sentindo o gosto de caramelo misturado a pitada fraca do café gelado.
É a porra da oitava maravilha do mundo!
— O que você está fazendo aqui? — questiono, após finalmente
apreciar a minha bebida.
Ele dá de ombros, tomando o seu café.
— Fingindo que a minha namorada falsa não está fugindo de mim
como uma foragida da polícia — responde, colocando seu copo na mesa. —
Gostaria de, por favor, me dizer o porquê está me evitando?
Lanço-lhe uma careta.
— Não estou te evitando.
— Não?
— Não.
Ele maneia a cabeça, concordando.
— Então, por que fingiu que não me viu na segunda-feira quando
praticamente nos esbarramos na entrada do seu bloco?
Merda.
— Estava atrasada.
— Na terça?
— O mesmo — minto.
— Ontem?
— Tinha uma prova importante — outra mentira.
Ele gargalha, fazendo alguns alunos que estão perto da minha mesa,
nos encararem severamente. Oliver sabe que é uma mentira de merda,
afinal, estamos no começo do semestre e as provas não chegarão tão cedo.
— Vamos lá, loirinha, você é uma péssima mentirosa — murmura,
inclinando o corpo para frente e apoiando os cotovelos na mesa. — Agora,
diga-me a verdade.
Umedeço meus lábios e imito a sua posição, fazendo com que
nossos rostos se nivelem, ficando a poucos centímetros. Ergo meu olhar,
observando-o por baixo dos meus cílios e o fixo no seu pomo de adão, no
momento em que engole em seco percebendo a nossa proximidade.
Oliver não desvia o seu olhar, ele me mantém neste lugar, refém de
suas pupilas esverdeadas. É como se ele soubesse que estou prestes a
mentir, e talvez seja por isso que suspiro fundo e dou a ele o que tanto
deseja saber.
— Odeio pessoas cochichando sobre a minha vida, Oliver — conto
a meia verdade que ensaiei desde que praticamente fugi dele após aquele
maldito beijo. — E acredite em mim, depois do nosso espetáculo, toda a
universidade não fala em outro assunto.
— Era o ponto, não? — indaga, confuso.
— Não, não era. Tínhamos que convencer nossos amigos — declaro
e sinto um vinco se formar entre minhas sobrancelhas — Não toda a cidade,
Oliver.
Ele maneia a cabeça, levando o copo até seus lábios outra vez. E o
cheiro de café invade minhas narinas.
— E você está me evitando, por quê?
Mordo meu lábio.
Você pode confiar nele, digo para mim mesma.
— Eu… hum... Não sei lidar com isso, ok? — solto, suspirando
fundo. — Eu não sei compartilhar meu espaço pessoal, não sei ser uma
dupla e isso ainda é estranho para mim.
É uma das verdades. E é apenas o que ele terá saindo dos meus
lábios nesse momento.
Porque é isso, eu não sei como funcionar a dois, não sei como
manter alguém na minha vida da forma como preciso manter Oliver. É até
mesmo estranho pensar que somos namorados para o resto do mundo,
quando mal sabemos do que o outro gosta.
E mais estranho ainda, é que no fundo, eu desejo saber. Desejo saber
o porquê de seus olhos serem tristes e seu sorriso contagiante. O porquê
dele não mostrar ao mundo suas cicatrizes, quando elas não deveriam ser
motivo para que se reprima.
Eu quero saber tudo e isso me assusta.
Porque o que temos é momentâneo, um meio para um fim.
Além disso, o beijo idiota não sai da minha cabeça, é como se eu
estivesse em um looping onde apenas aquele pequeno momento reprisasse
todas as vezes. Como se pudesse sentir seu tato, seu gosto e a forma como
me segurou e fez com que me sentisse viva, completa.
Como se tivéssemos mesclando nosso caos e os observando
dançando a quinta sinfonia de Beethoven enquanto sentimos o nosso mundo
ser o borrão mais bonito que qualquer astigmatismo já presenciou em toda
existência.
— Você não precisa agir como se fossemos destinados um ao outro,
Sum — ele brinca, tranquilo, me tirando dos meus devaneios. — Haja como
sempre agiu, seja você mesma. Nada mudou. Eu não mudei.
— É diferente — sussurro. — Antes, nós mal nos suportávamos.
Agora nós nos suportamos e parecemos desconhecidos um para o outro.
— Não somos desconhecidos, somos amigos.
— É… nós somos — sussurro, baixinho.
Minha voz não sai confiante e nem o culpo quando franze o cenho,
confuso.
— Achei que tínhamos passado dessa fase onde me odeia.
— Eu nunca te odiei — confesso.
Eu não acho que poderia.
— Não? — pergunta.
— Você é um idiota na maioria do tempo? Sim! — respondo sem
dar tempo de ele dizer algo. — Mas, isso não significa que eu te odeio.
Ele inclina a cabeça, franzindo o cenho.
— Todas as vezes que me mandou para o inferno?
— Leve isso como um bom dia.
— Às vezes que ameaçou me matar? — Ergue uma sobrancelha,
levando o copo até os lábios.
— Vingança por ter sido um babaca — respondo, imitando sua ação.
Uma risada fraca sai de seu corpo, enquanto maneia a cabeça,
concordando.
— Obrigada por esclarecer.
— Não há de quê.
Sorrio. É um sorriso fraco, quase que imperceptível. Mas, ainda sim,
um sorriso.
— Acho que precisamos mudar isso.
— Mudar o que?
— O fato de você achar que somos desconhecidos — admite. —
Vamos voltar naquele interrogatório de alguns dias atrás.
É a minha vez de erguer uma sobrancelha.
— Aquele no qual você nem ao menos sabia me dizer sua cor
preferida?
— Uhum — confirma, passando a mão pelo cabelo. — Você tem
direito a três perguntas e eu o mesmo, ok?
É um jogo simples, fácil. Contudo, para nós, é como se fosse o
questionário do ano, como se com essas três perguntas fossemos conhecer
um ao outro. Mas, isso é um jogo de merda, e nós dois sabemos disso,
porque não tem como conseguir o suficiente de Oliver Wright com apenas
três perguntas.
Levo meu copo até meus lábios e tomo um gole da minha bebida,
me afastando e escoro minhas omoplatas na cadeira, aceitando que é apenas
isso que está me dando e decido aproveitar a oportunidade.
— Certo. — Maneio a cabeça. — Posso começar?
— Faça as honras, loirinha.
Mordo meu lábio inferior, passando a mão pela lombada de um dos
meus livros.
— Um vício? — questiono, calma.
Meu pai sempre me disse que quando conhecemos os vícios do
outro, nós sabemos com que ser humano estamos lidando. Afinal, há vícios
que podem destruir vidas, famílias. E há aqueles que não geram
consequências a terceiros, mas sim, que afetam apenas a nós mesmos.
— Fácil. Números — responde, sem hesitar. — Um filme?
Faço uma careta. De todos os vícios que eu imaginaria que Oliver
Wright teria, este não estava na lista. Balanço a cabeça, expulsando essa
surpresa e respondo a sua pergunta:
— Monstros S.A[14] — a resposta sai sem nem ao menos precisar
fazer esforço para pensar.
— Eu achei que fosse um daqueles filmes horríveis de super-heróis
— diz, confuso.
Eu deveria. Também não seria uma mentira. Amo a Marvel tanto
quanto amo respirar, porém quando se trata do meu filme favorito,
Monstros S.A sempre estará no topo, independente do tempo. Porque a cada
vez que assisto, lembro de como meu pai lutou para que eu saísse do lugar
onde me escondi e me mostrou o melhor de mim, mesmo quando nem eu
mesma acreditava.
— Eles ocupam a segunda posição — digo, dando de ombros.
Oliver não precisa saber o significado por trás disso. — Algo que precisa
fazer e não tem coragem?
Ele congela seu copo na altura do seu queixo e me encara. Seus
olhos não são mais corajosos, eles são machucados, como se, de repente,
começassem a gritar confissões que palavra alguma seria capaz de traduzir.
Percebo que, mesmo sem saber, acabei tocando em um ponto que não
deveria.
Todavia, quando abro a boca para perguntar outra coisa, Oliver me
surpreende erguendo os ombros e respondendo:
— Piano.
Uma palavra, vários significados velados.
Sei o que ele quer dizer com essa pequena palavra, sei que está
proferindo, alto e claro, que precisa, deseja, tomar coragem para tocar
piano, porém não possui coragem suficiente. E talvez, seja pela pequena
ligação que forjamos nesse pequeno tempo, decido que quero explorar mais
do pequeno fragmento que confidenciou para mim.
Apoio meu cotovelo na mesa, escorando meu queixo e solto um
sorriso fraco.
— Você não toca mais.
Ele imita a minha posição, fazendo com que nossos rostos voltem a
ficar a poucos centímetros de distância.
— Não — sopra na minha direção, fazendo com que uma lufada de
ar, acaricie minha bochecha.
Maneio a minha cabeça concordando.
— Por quê?
Oliver não desvia o olhar, tampouco deixa de responder.
— Porque me lembra de uma pessoa. — Suas palavras são
carregadas de sentimentos. — Por que Monstros S.A é seu filme favorito?
Engulo em seco. Porém, meus olhos ainda continuam perfurando os
dele.
— Porque ele é importante para mim. — Um fragmento, é isso que
estou dando. — E você não quer se lembrar da pessoa?
— Não.
— Por quê?
Ele para, apenas encarando meu rosto por alguns segundos. Como
se estivesse se perguntando se deveria me contar, se poderia confiar em
mim, da forma como deseja que confie nele.
Mas, não faz. Ele apenas sorri um sorriso fraco, falso.
Um que descobri nesse exato momento que odeio.
— Você já fez suas três perguntas, loirinha.
— E você me deve uma resposta — solto, levando o copo até meus
lábios e bebendo o resto do líquido.
Ele solta uma pequena gargalhada.
— Espertinha! — brinca, tocando a ponta do meu nariz com seu
dedo. — Vou ficar devendo essa resposta, mas quem sabe algum dia eu seja
um bom garoto e responda.
Franzo o cenho, observando-o se levantar e arrumar o pulôver no
corpo.
— Você não é um bom garoto — contraponho, semicerrando os
olhos.
Os cantos da sua boca curvaram-se em um sorriso zombeteiro.
— Esse é o ponto.
Encaro-o furiosamente quando, por fim, percebo o que aquelas
palavras significavam.
Eu não teria uma resposta. Nunca.
— Eu não...
Começo a frase, pronta para atacá-lo e dizer que não estou
acreditando que ele não me responderia. Porém, Oliver simplesmente me
ignora e se vira, começando a caminhar para fora da biblioteca.
— Ei! — grito. — O que diabos você veio fazer aqui afinal?
Surpreendentemente quando está perto da escada que liga os
andares, ele se vira, sorrindo abertamente.
— Eu vim ver a minha namorada e trazer a bebida favorita dela —
praticamente grita, fazendo com que todos nos encare. Algumas pessoas até
mesmo sorriem para ele. — Um homem apaixonado não pode querer ver a
sua amada?
Deus, eu matarei Oliver quando essa farsa acabar.
— E, Summer? — ele acrescenta quando não respondo.
— O quê? — devolvo, tentando colocar um sorriso apaixonado no
rosto que, sem dúvidas, está parecendo uma careta assassina.
Oliver solta outra pequena gargalhada, olhando para baixo e quando
volta a me encarar, inclina a cabeça para o lado.
— Te pego hoje, às sete.
Encaro-o, incrédula.
— Por que diabos você me pegaria hoje à noite?
Aquele sorriso idiota ainda está estampado em sua face. E apenas se
amplifica quando solta sua resposta, como se fosse uma carícia de um
amante apaixonado:
— Porque a partir de hoje eu estou cobrando meus encontros,
loirinha — admite, se virando.
Oliver não me dá tempo para responder, nem ao menos para
contradizer.
Ele solta uma piscadela em minha direção e volta descer as escadas,
parando no balcão, dizendo algo para Audrey, tia de Logan, que a faz
gargalhar alto e então some pelas enormes portas.
Apenas enfio a mão em meus cabelos, abaixo a cabeça, fechando os
olhos e me perguntando no que eu estava pensando quando achei que esse
acordo realmente daria certo.

Olho para minha roupa em frente ao espelho do meu quarto.


Oliver não havia me dado nenhuma informação sobre o que eu
deveria vestir. E para ser sincera, eu preferiria vestir meu pijama e me jogar
no sofá ao lado dos meus amigos, para que pudesse obrigá-los a assistirem
novamente toda a franquia de Vingadores[15], a ter que sair hoje à noite.
Contudo, quando passo a blusa branca e larga, com os rostos de
quase todos os meus personagens favoritos estampados e visto a saia
plissada preta, tenho convicção de que esse plano ficará para outro
momento.
De esgueira, posso observar Josh abrir a porta do meu quarto, ao
mesmo tempo que caminho pelo ambiente atrás dos meus tênis. Assim que
se joga na minha cama, puxa uma HQ da minha mesa de cabeceira e franze
o cenho para as páginas ilustradas em preto e branco, me viro totalmente
em sua direção.
— O que você já está aprontando, Josh? — questiono, encarando-o.
Ele hesita e sei que não há boa coisa vindo para mim. Os olhos
escuros encontram os meus e quando solta um sorriso fraco, sei que algo
realmente se passa.
— O que você acha de Mackenzie?
Ergo uma sobrancelha, lançando-lhe uma careta.
— Eu preciso achar algo? — contraponho, indo até meu closet
improvisado e puxando uma jaqueta jeans.
Meu amigo é um cara gay, o rapaz também parece gostar dele… isso
é como o relacionamento do filho da Wanda,[16] Billy e o príncipe Hulkling.
— Vamos lá, Sum, me ajude! — exclama, dramaticamente. — Ele
me convidou para um encontro, mas, você sabe como eu odeio
formalidades.
Termino de vestir meu casaco e me viro para o meu amigo que ainda
está jogado em minha cama, mas que agora me encara com os olhos
brilhantes, em busca de conselhos.
Sabendo que estou prestes a me atrasar para esse maldito encontro
com Oliver, caminho até onde Josh está e me sento na beirada da cama.
Olhando para ele, que mantém suas íris focada em meu rosto, inclino minha
cabeça para o lado, sorrindo fracamente.
— Josh... — começo, puxando minha HQ de suas mãos. — Você
está preocupado com o que eu acho de Mackenzie ou com o fato de que
você pode desenvolver sentimentos por ele?
Meu amigo passa os dedos pela nuca despretensiosamente. Por fim,
volta a me encarar com um misto de incerteza e receio.
— Um pouco dos dois? — admite, incerto.
— E por que você acha isso? — questiono.
Josh para por um segundo, como se estivesse pensando na resposta
com afinco.
— Porque... eu acho que nunca me senti assim, sabe? Como se
alguém pudesse ter tanto poder sobre mim. Como se tivesse chegado o
momento em que eu queira deixar alguém ser especial para mim. É estranho
pra caralho, Sum — Ele suspira fundo. — Mack é algo que eu não sabia
que queria até aquela festa, e agora eu estou com medo de fazer algo errado.
De machucá-lo ou até mesmo me machucar.
Percebo seus ombros caírem enquanto espera pela minha resposta.
— Não é errado se apaixonar, Josh — profiro, mordendo meu lábio
inferior. — E se seu coração está pronto para dar uma chance a alguém
como Mackenzie, então dê essa chance. Se permita viver, mesmo que talvez
no fim você acabe se decepcionando.
Ele ergue uma sobrancelha, lançando-me uma careta.
— Você não deveria dizer que nós seremos felizes para sempre
como nos contos de fada? — questiona, quase que horrorizado.
Solto uma gargalhada fraca.
— Não — rebato, levando minha mão até a sua e apertando-a. — Eu
serei realista com você. Você vai se decepcionar e está tudo bem, porque
relacionamentos não são apenas arco-íris, eles podem ter momentos
tempestuosos. E será nesses momentos que você precisa aprender que nem
tudo é como você imagina, que relacionamentos são como um trabalho em
dupla, que vocês são a equipe um do outro. E para ser uma equipe, é preciso
confiar, se doar na mesma proporção que o outro se doa, porque, aí sim,
todos esses momentos serão apenas um resquício perto de tudo o que estão
vivendo, de todo o sentimento que compartilharão.
É a mais pura verdade. Relacionamentos precisam disso e de uma
boa dose de cumplicidade. Porque sem isso, nem mesmo o mais poderoso
sentimento, conseguirá se manter firme. É importante cuidar, escutar e saber
ser aquilo que o outro precisa. E não precisa ser em atos gigantescos, às
vezes é num gesto simples que encontramos a maior prova de amor.
— Eu odeio que seja tão boa com conselhos. — Ele ri. — Obrigada,
Sum.
Devolvo o sorriso. E percebo que diferente de quando chegou, Josh
agora está calmo, sereno outra vez. Me pergunto se talvez, eu esteja certa e
o sentimento que ele possa vir a sentir realmente é maior do que o medo
dele de se relacionar.
— Eu sempre estarei aqui para ajudá-lo, Josh — devolvo, me
levantando. — Agora, deixe-me ir antes que Oliver suba aqui em cima
apenas para me dizer que estou atrasada.
Ele solta uma gargalhada.
— Aliás, temos que conversar sobre o seu namoro. — Ele ergue a
sobrancelha. — Oliver Wright, Sum?
Rolo meus olhos, puxando minha bolsa e escutando meu celular
apitar, indicando que essa é a minha deixa para sair dessa conversa, antes
que precise contar mais mentiras.
— Nós não estamos falando sobre meu relacionamento com Oliver
— discordo, já caminhando até a porta.
— Summer Miller! — chama, e sei que esse tom é para quando ele
quer saber mais detalhes. Decido dar a ele um pedaço de informação para
que me deixe em paz. — Não deixe um homem morrer com uma fofoca
pela metade. Volte aqui!
— Sim, estou namorando com Oliver. E não, nós não estamos
falando sobre a minha vida amorosa hoje, Josh. — Solto um sorriso. — Ou
melhor, não estamos falando dela nunca.
Escuto sua gargalhada atrás de mim quando o deixo esparramado
em minha cama, como se a pertencesse, sabendo que logo moverá sua
bunda para a sala ou para o seu próprio quarto.
Começo a caminhar pelo corredor, mexendo em minha bolsa e assim
que chego na sala, posso observar a enorme televisão ligada. Paro perto dos
sofás, olho para Verônica que está deitada em um deles, dormindo
tranquilamente. Sua cabeça está escorada na coxa de Logan que está
sentado ao seu lado, assistindo uma partida de futebol americano.
Analu está sentada no tapete com vários papéis espalhados em torno
de si e do seu outro lado, está Levi, quase imitando os movimentos da loira
com uma careta de desgosto estampada no rosto, segurando uma pasta
amarela.
— Estou saindo — comunico, mal parando perto deles.
Apenas Logan ergue o rosto para mim, acenando fracamente,
enquanto passa uma das mãos pelo cabelo de Vee. Levi me ignora e uma
pontada dolorosa, atinge meu coração.
— Avise Ollie que se meu carro estiver com algum arranhão
amanhã, você ficará viúva antes mesmo de pensar em casamento —
Verônica avisa, sua voz é sonolenta e nem mesmo abre os olhos para
proferir a ameaça.
Solto uma pequena gargalhada, andando até a porta do apartamento
e deixando-os, ignorando a atitude de Levi e dizendo para mim mesma que
o que estou fazendo é o certo.
Poucos minutos depois, estou caminhando no saguão do prédio e já
podendo avistar Oliver escorado no Bugatti de Verônica. Caminho
lentamente, passando meus olhos por ele, encontrando-o com uma blusa
preta de botões e uma calça da mesma tonalidade.
Ele encara seu telefone com uma careta estranha, como se o
conteúdo não o agradasse nenhum pouco. Assim que paro a sua frente,
esperando que se desencoste do automóvel para enfim sairmos.
— Você precisa urgentemente renovar seu guarda-roupa, loirinha —
crítica, encarando minha camiseta com um semblante estranho.
— E você precisa começar a guardar suas opiniões para si —
devolvo, revirando meus olhos.
— Você ficaria entediada se eu não dissesse o quão atraente é ter o
Capitão América me encarando — debocha, sorrindo abertamente.
— Vamos? — ignoro sua provocação.
Ele abre a minha porta, logo após, dá volta no carro e se senta no
banco do motorista. Nós não emitimos nenhum barulho enquanto saímos da
frente do meu prédio rumo ao centro da cidade, é como se estivéssemos tão
absortos em nossas mentes que não desejamos quebrar a pequena paz que
se instalou.
De relance, posso observá-lo encarar a rodovia. Oliver está tão
concentrado na atividade que nem me nota encarando-o. O braço forte e
definido segura o volante com uma pequena força e a mão, com as veias
saltadas, o gira calmamente. É até mesmo difícil prestar atenção em
qualquer outra coisa, enquanto ele faz os movimentos com destreza.
Porque é algo quase que sobrenatural. Uma visão sedutora e ao
mesmo tempo inquietante. E talvez seja exatamente por isso que penso em
como ele poderia estacionar o carro no acostamento vazio e envolver esses
malditos braços envolta do meu corpo. Enquanto sinto seu beijo, suas mãos
em mim, seu toque quente em cada parte do meu corpo, assim como aquela
noite.
Por Deus, apenas a imagem dele fazendo tal ato, já me parece o
paraíso.
Mordo meu lábio inferior, abaixando o olhar e concluo que,
definitivamente, seu corpo é escultural. Daqueles que parecem que saíram
de um filme, como Tom Cruise[17] em Top Gun[18].
É inacreditável. Eu nunca conheci alguém assim, alguém que me
fizesse praticamente salivar ao pensar em cada detalhe pecaminoso do que
sei que imploraria para que fizesse comigo.
Oliver inclina seu rosto simétrico para o lado assim que paramos, a
luz da rua invade um dos lados de sua face e percebo sua barba feita, as
sobrancelhas grossas franzidas. Os olhos esverdeados encaram a todos com
muita atenção, e, quando se vira para mim, se semicerram e me pergunto o
que o aflige para estar tão alheio ao seu redor.
Mas de todos esses detalhes, é a voz dele que faz com que meu
núcleo se aperte e uma vontade imensurável de atacá-lo me consuma,
porque ela é sexy, grossa e aveludada. E mesmo que eu saiba que nunca
admitirei isso para ele, sei que poderia ficar horas e horas ouvindo-o falar,
até mesmo de assuntos não tão interessantes.
— Quando finalizar a sua inspeção ao meu rosto, eu gostaria de
avisar que chegamos — debocha, me encarando com aquele sorriso
zombeteiro.
— Eu não estou fazendo tal coisa — minto, sentindo um rubor subir
pelo meu pescoço por ter sido pega.
Ele balança a cabeça, ainda sorrindo.
— Certo, loirinha, eu vou fingir que acredito em você — declara,
abrindo sua porta. — Agora vamos, ao contrário, chegaremos atrasados.
Saio do automóvel, parando na calçada e ergo uma sobrancelha para
o estabelecimento à minha frente. O prédio pitoresco, tem uma enorme
placa em neon vermelho, com os dizeres: CINEMA. Porém, não é isso que
me prende a atenção, mas sim, as inúmeras pessoas que estão do lado de
fora, reclamando de algo com os funcionários.
Duas garotas vestidas com o uniforme amarelo e vermelho, engolem
em seco quando alguns adolescentes gritam uma palavra de baixo calão e
então, se viram e vão embora. Outras insistem em ficar ali, percebo que elas
dizem que não haverá sessão de nenhum filme hoje.
— O que diabos estamos fazendo aqui? — questiono, preocupada.
— Não, é óbvio? — Indaga, erguendo uma sobrancelha. — Estamos
indo ver um filme.
Inclino a minha cabeça me perguntando o que caralhos Oliver
Wright tem na sua mente, porque não é possível que não esteja percebendo
a pequena aglomeração de pessoas na frente do lugar.
— Sim, Sherlock! — exclamo. — Agora, por favor, me explique
como você vai conseguir tal proeza, já que, pelo que me parece, está tudo
fechado.
Sua boca se curva em um sorriso maléfico, daqueles que ele apenas
me lança quando significa que alguma merda estava vindo.
De repente, tudo faz sentindo.
Puta merda!
Oliver não fez isso, eu não posso acreditar.
— Oliver — minha voz sai em um tom de aviso.
— Summer — ele devolve, brincando com seu relógio.
— Você não fez isso.
— Seja mais específica — diz, simplesmente. — Porque eu já fiz
muitas coisas.
— Não seja brincalhão. Não agora.
— Não estou sendo.
Solto um suspiro nervoso.
— Oliver, eu vou fazer uma pergunta e espero a verdade — afirmo,
entredentes.
— Vá em frente.
— Você fechou um cinema apenas para um maldito encontro? —
pergunto, temendo pela resposta.
Ele me encara, seus olhos são tão brilhantes que temo pela resposta
que virá.
— Eu não fechei o cinema, me respeite, loirinha! — Quase respiro
aliviada por ter me enganado. Mas, quando as próximas palavras saltam de
sua boca, como se estivesse me comunicando sobre o tempo, eu tenho
vontade de esganá-lo. Assassiná-lo a sangue frio. Jogar seu corpo para os
tubarões. — Eu o comprei.
Arregalo meus olhos e com um suspiro fundo de irritação, pendo a
cabeça para trás, fechando meus olhos.
— Você não pode comprar um cinema e fechá-lo para um encontro,
Oliver.
Trovejo minhas palavras com voracidade que até mesmo algumas
pessoas que estão perto o suficiente para nos escutar, arregalam os olhos.
— Puff! Eu sou rico, loirinha, posso fazer o que eu quiser — zomba,
me lançando um sorriso perfeitamente alinhado.
Eu o encaro sem palavras. Sem conseguir digerir o que está
acontecendo nesse instante. Apenas o encaro, perplexa.
Oliver Wright de fato não só fechou um cinema para um encontro
sem sentido, que é apenas uma regra idiota em nosso acordo, como também
havia comprado o prédio.
Comprado o lugar onde eu me escondo quando preciso.
O cinema da cidade.
O meu lugar favorito agora pertence ao meu namorado falso.
Eu tenho pensamentos sujos sobre você
Eles pioram quando estou sem você
Isso significa que vou para o inferno
Ou você está pensando neles também, oh
Dirty Thoughts | Chloe Adams

Ela quer me matar.


É isso que concluo enquanto Summer me encara com aqueles olhos
castanhos em chamas, e não emite nenhuma frase desde que contei que
agora sou o novo proprietário do cinema.
Pelo bem da minha sanidade e, claro, da minha vida, apenas me
limito a ignorar seu rosto envolto a indignação e começo a caminhar até a
entrada do cinema. Porém, antes mesmo de alcançar a pequena
aglomeração perto das portas, olho por cima dos meus ombros, sorrindo
abertamente para a loira, ainda parada no mesmo lugar.
— Você vai ficar parada aí? — indago. — Porque eu ouvi dizer que
a sessão de hoje vai ser incrível!
Ela passa a língua pelo lábio inferior, e tenho certeza de que está se
segurando para não me mandar para o inferno ou para me assassinar. Estou
começando a achar que ter pensamentos homicidas em relação a minha
pessoa, é o maior feito do seu dia.
Quando volta a caminhar, em direção a entrada, Summer passa por
mim dando um esbarrão em meu ombro e me ignorando, enquanto desvia
de algumas pessoas e entra no estabelecimento. Assim que ultrapasso as
enormes portas, posso observá-la parada no balcão de lanches conversando
com uma garota.
Summer não me encara quando paro ao seu lado e tampouco nos
próximos minutos. Para falar a verdade, ela me ignora por completo. Até
mesmo quando seguimos andando em silêncio para a única sala de cinema
aberta e sei que preciso reverter essa situação. Porque prefiro mil vezes tê-la
me xingando por qualquer motivo, do que tê-la ao meu lado em silêncio.
Subimos para um corredor pouco iluminado, preciso caminhar com
nossos pedidos um pouco atrás e assim que enfim emergimos na enorme
sala, Sum sobe alguns degraus e se senta em uma poltrona com a vista
privilegiada.
— Eu ainda não acredito que você fez isso, Oliver! — exclama,
suspirando fundo, como se dissesse mais para si do que para mim.
Inclino o corpo em sua direção, lançando-lhe um sorriso fraco,
quase que cúmplice.
— Espere até ver qual filme iremos ver — sussurro, perto de seu
rosto, sentindo seu maldito cheiro invadir meu espaço pessoal.
Ela não tem tempo de responder, porque, de repente, a tela se acende
e a tão famosa abertura dos filmes da Marvel começa. Posso dizer que sei
praticamente todos os personagens que passam pela enorme tela, já que
passei dois dias maratonando esses filmes de super-heróis apenas para
entender a fixação dela por eles, depois que percebi seu receio em topar
nossa farsa.
Summer precisa de certezas, precisa saber que estou dentro dessa
bagunça de corpo e alma e se fosse preciso que eu decorasse cada nome
desses personagens como fiz nos últimos dois dias, eu não me importaria.
Faria de bom grado.
Tenho a certeza disso assim que a observo olhar para frente com
seus incríveis olhos brilhantes e um pequeno sorriso no rosto.
— Não me diga que... — murmura, quando finalmente entende o
que estamos prestes a assistir.
— Sim, loirinha. — Sorrio, orgulhoso, pelo meu feito. — Somos
praticamente as primeiras pessoas do mundo a assistirem ao novo
lançamento deles.
Afasto qualquer pensamento da minha mente, me encosto na minha
poltrona e levo minha mão até o balde de pipoca, roubando algumas.
Summer nem ao menos percebe e se percebe, não se importa. Porque é
como se a mulher furiosa de minutos atrás desse lugar a nerd viciada em
quadrinhos e em super-heróis vestidos em trajes questionáveis.
Ela morde o lábio inferior, absorta demais no filme para perceber o
movimento. Suas mãos delicadas se cruzam na frente do corpo, um pouco
abaixo do seio, enquanto inclina a cabeça para o lado, extasiada.
Deus, é como se apenas por ver esses personagens, ela fosse ter um
orgasmo.
A figura de uma criança de cabelos azuis andando de bicicleta
invade a tela e sei que definitivamente perdi a atenção da minha falsa
namorada. Porque é como se no momento em que as luzes se acenderam e
os personagens emergiram na tela, apenas existisse eles e Summer no
mundo, como se naquelas poucas horas, a história contada a fizesse transitar
por outro universo. Como se aquele filme, aqueles personagens a salvassem
de algo que eu não consigo nomear.
Proteção, talvez.
A imagem é linda. É como se os olhos de Summer brilhassem a
cada cena, e ela viajasse entre o enredo do filme. Talvez por isso, por achar
a cena incrível, retiro meu celular e tiro uma foto dela distraída. Digo a mim
mesmo que apenas estou postando-a em minhas redes sociais e colocando-a
como papel de parede da minha tela de bloqueio, para que a farsa se torne
ainda mais real.
— Oliver? — chama, fazendo com que levante meu rosto.
Encaro-a de relance.
— Loirinha.
— Ainda não concordo sobre você ter comprado o cinema —
comunica, seus olhos ainda estão na tela, porém quando se viram para mim,
eles são lindos e brilhantes. Nesse instante, percebo que cada sacrifício que
precisei realizar para conseguir esse momento, valeu a pena. — Mas,
obrigada. Obrigada de verdade.
Sorrio. É impossível não sorrir para essa mulher, até mesmo quando
está soltando fumaça pelos ouvidos, apenas porque a irritei.
Sou obcecado por Summer Miller desde que coloquei os olhos nela
naquela lanchonete.
Não entendo o motivo disso. Apenas sei que todas as vezes que
esses olhos castanhos recaem sobre os meus, é como se eu estivesse
sofrendo de palpitações, como se minha pressão arterial se elevasse em um
nível incontrolável.
Ela se torna o centro do mundo. O centro do meu mundo.
E eu odeio isso.
Odeio que alguém possa ter tanto poder sobre mim, que uma
simples pessoa, que eu nem ao menos conhecia até o dia no Oásis, pudesse
desencadear tantas emoções que eu não seria capaz de explicar, nem mesmo
se quisesse.
Eu odeio e, ao mesmo tempo, não sou capaz de afastá-la.
— Me agradeça contando o que diabos está acontecendo nesse filme
— respondo, vendo um sorriso cruzar seu rosto junto a uma felicidade
genuína por falar de algo que ama.
Summer endireita o corpo, se virando completamente para mim.
Suas mãos seguram o apoio da minha poltrona. Digo para mim mesmo que
apenas imito sua posição, colocando o balde de pipoca ao banco vazio ao
meu lado, pois quero muito entender o que me custou uma pequena fortuna
e não porque o cheiro de Summer é convidativo demais para apreciar de
longe.
— É o filme da Viúva Negra[19].
Ergo uma sobrancelha, confuso.
— A ruivinha que praticamente salva todo o mundo?
Summer franze o cenho.
— Eu não colocaria dessa forma.
— Ah, vamos lá, loirinha! Ela bateu em todos aqueles russos
enquanto colocava o telefone em espera — respondo, inclinado a cabeça e
citando a cena de Vingadores. — E depois ainda foi atrás do grandalhão
verde lá.
— Hulk?
Sorrio.
— Exatamente.
— Você anda vendo Vingadores, playboyzinho?
Franzo o cenho, lançando-lhe uma careta.
— Eu precisava entender a sua fixação por esses filmes.
— E mesmo odiando, ainda sim, comprou um cinema só para
assistir um lançamento que ainda nem está disponível? — questiona,
segurando uma risada.
Inclino a cabeça para o lado, lançando a ela um sorriso cúmplice.
— Talvez.
Summer pende a cabeça para trás, gargalhando.
Deus.
Esse som.
É melhor do que qualquer melodia emitida em qualquer piano no
mundo.
Tenho certeza, de que nem ao menos Beethoven conseguiria uma
composição de tinido tão única e magnífica. Esse som que sai de seu corpo,
simula uma criança levada, com as bochechas rosadas e uma travessura em
mente.
Os lindos olhos que horas atrás estavam estreitos e furiosos, agora,
estão pequenos, quase fechados e, mesmo assim, parece existir um mundo
infinito e desconhecido dentro deles. Abaixo o olhar para o canto da sua
boca, percebendo o quão lindo seu sorriso é. Seus cabelos longos e
brilhantes caem para frente, iluminando com perfeição o molde de sua
mandíbula.
Engulo em seco.
Summer Miller é a criatura mais linda e deslumbrante na face da
Terra.
Ela é como uma obra de arte.
Levo uma mão até uma de suas bochechas e a acaricio, sua pele
porcelana toca a palma da minha mão trazendo uma corrente elétrica que
faz os pelos da minha espinha se eriçam.
Sem pensar muito, me vejo diminuindo o espaço entre nós,
vagarosamente, esquecendo de tudo à nossa volta. Do filme, do lugar, das
malditas regras. Apenas enxergo a mulher a minha frente que de repente
para de sorrir e, agora, apenas encara meu rosto com um sentimento que
queima semelhante dentro do meu peito.
Desejo.
Meu rosto paira sobre o seu, poucos centímetros um do outro, posso
sentir seu cheiro leve e viciante. A pequena distância entre nós é agonizante
e assim que meus olhos sobem para os seus, percebo que há um céu ali, um
que está me convidando para conhecer cada constelação, mas que não sabe
que não sou uma estrela cadente que viaja por aí e realiza os desejos das
pessoas, mas, sim, um meteoro prestes a colidir com seu mundo e destruir
tudo, cada partícula de coisas boas.
Mesmo sabendo disso, eu não me controlo. Não consigo me
controlar, não quando se trata de Summer. E exatamente por isso, sugo seu
ar enquanto roço meus lábios nos seus, sentindo a maciez de sua pele e
desejando que ela se aproxime mais, mais e mais. Que me faça sentir como
me fez sentir na noite da festa de Levi.
Estamos a três centímetros de distância.
Dois.
Um.
— Linda — suspiro contra sua boca, deixando com que uma lufada
de ar voe pelo mísero espaço entre nós dois. — Linda pra caralho.
Summer estagna, todo o seu corpo congela. Minhas palavras a
fazem lembrar de algo. Por isso, de repente ela se afasta, jogando seu corpo
para trás e escorando-o na poltrona, precisando de toda distância possível
de mim.
— O filme... Nós deveríamos prestar atenção no filme — adverte,
quase que se enrolando com as palavras.
— Summer — chamo, ainda absorto pelo momento e sem saber o
que ao menos vou dizer.
— O filme, Oliver. Nós temos que prestar atenção no filme — sua
voz sai como um pedido, e se eu fosse sincero, poderia até mesmo ter sido
uma súplica.
Ainda que eu saiba que todo o filme passará em um borrão, porque a
única coisa que eu consigo pensar e desejar são os lábios da loira ao meu
lado, faço o que me pede.
Foco minha atenção na porra da tela por duas fodidas horas,
assitindo Summer evitar contato visual comigo. Durante o tempo em que
me ignora, apenas desejo que sua atenção seja minha de novo, mesmo que
apenas para brigarmos.
Para que provoquemos um ao outro.
Porque por mais que muitas das vezes nós tiremos o sono e a paz
um do outro, no fim, sabemos que lutar contra esse desejo fulminante
correndo entre nossas veias é entrar numa guerra mesmo sabendo que ela
será perdida.
Talvez, guerra seja a melhor definição quando se trata de nós dois.
Lugares, lugares, vão para os seus lugares
Coloquem seus vestidos e rostos de bonecas
Todos pensam que somos perfeitos
Por favor, não os deixe olharem através das cortinas
Dollhouse | Melanie Martinez

O clube de Saint Vincent é o maior meio de entretenimento da


população da Parte Alta. Além de ser localizado perto do grande lago e
contar com uma vasta extensão, ele possui três blocos divisórios. O
primeiro contém piscinas, restaurantes e um luxuoso spa. O segundo, fica
em uma das partes laterais e possui um enorme campo de golfe e, de lá, se
pode observar a pista de equitação, onde Andrew está nesse momento.
Contudo, não é nenhuma dessas áreas que estou interessado, mas
sim, na última parte, aquela na qual possui inúmeras quadras. Algumas são
utilizadas para vôlei, basquete, entre outros esportes. Porém, a última que
sei que é totalmente privada por pertencer a filha do proprietário, e é
voltada apenas para o tênis.
O jogo preferido de Analu Parker.
Caminho a passos lentos até onde ela está, observando seu treinador
gritar algumas instruções. Paro na lateral da quadra, vendo a loira correr de
um lado para o outro com uma expressão concentrada. É como se ela
precisasse ter controle de todas as suas ações, como se um mero erro fosse
capaz de destruir todo o jogo.
Parker levanta o olhar, percebendo a minha presença e ergue a sua
sobrancelha.
— Summer já chutou sua bunda? — grita, batendo a raquete na
pequena bola com precisão.
Ergo uma sobrancelha.
— Por que você acha que eu te procuraria se caso ela fizesse isso?
— indago confuso, enquanto cruzo meus braços frente ao corpo. — E não,
estamos bem. Mais do que bem para ser sincero.
Ela sorri maliciosa, dando um pulo para a esquerda e batendo
novamente na bolinha branca, fazendo ela voar direto para a raquete de seu
adversário.
— Boa, Parker! — grita o seu treinador, quando o garoto do outro
lado erra a jogada.
Ela ergue os ombros, como se não ligasse para o elogio e inclina o
queixo na direção do seu esterno, massageando a área do pescoço esguio,
logo após começa a caminhar na minha direção, alisando seu uniforme
composto por um short saia plissado branco e um camisa polo da mesma
tonalidade, com o logotipo do clube de seu pai.
Assim que para na minha frente, gira a raquete na mão e ergue o
rosto, fazendo com que eu possa observar sua face suada e seus olhos
castanhos que me lembram de uma certa pessoa.
— Porque vocês tendem a me procurar quando precisam de um
conselho — responde a minha pergunta, convicta. — Agora, pegue a
raquete de Joshua e me deixe acabar com você na quadra enquanto me
conta o porquê de estar atrapalhando meu treino.
Solto uma gargalhada, entrando no seu santuário e estendendo a
mão para o seu antigo parceiro de jogo me entregar o objeto. Ele me lança
um olhar ansioso, como se estivesse em êxtase por abandonar a quadra e
então se senta em um banco na lateral, bebericando um pouco de água em
uma garrafinha azul.
— Você fez isso apenas uma vez. — Giro a raquete em minha mão,
voltando a atenção para Analu. — E nós tínhamos quatorze anos.
— E foi necessário apenas uma vez para que você nunca mais
entrasse em quadra comigo.
— Não seja egocêntrica. Você é ótima assustando adolescentes, olhe
só para Joshua — minto, soltando outra gargalhada. — Além disso, eu
prefiro esgrima.
Seu sorriso se alarga, encarando o garoto sentado que nos observa.
— O que você prefere é gastar centenas de dólares em relógios —
debocha, jogando a bola para cima e batendo nela, fazendo com que voe até
meu lado da quadra. — Então... por que está aqui, Ollie?
Direta. É assim que Analu sempre foi e nem mesmo me surpreendo
por ter me abordado o assunto tão rápido. Mas, ainda não estou pronto para
perguntar a ela o que Summer pode estar escondendo por trás de seus olhos.
Nem muito menos, perguntá-la o que posso fazer para ela se sentir
confortável o suficiente para me contar.
— Eu não posso ter um momento com você?
Analu gargalha, sabendo que estou apenas enrolando para dizer o
motivo pelo qual estou atrás dela.
— Não — nega, assim que o objeto branco chega até mim e eu o
rebato com força. — Você sabe que odeio bajulação.
— Eu deveria imitar Jonhson e começar a te chamar de Princesa de
Gelo — brinco, quando ela faz uma careta. — Esse apelido de fato combina
com a sua personalidade.
Ela faz uma jogada que eu não esperava e acabo perdendo um
ponto.
— Não se atreva — adverte, me encarando com olhos afiados. —
Ou serei obrigada a contar a todos que o seu relacionamento com Summer é
falso.
Quase tropeço em meus próprios pés quando as palavras saltam de
seus lábios. No entanto, me limito apenas a fingir uma careta ofendida e
devolver a jogada com força, fazendo ela correr mais rápido pela quadra.
— E o que a faz pensar assim? — questiono, fingindo indiferença.
— Eu minto e escondo coisas das pessoas diariamente, Oliver —
confessa, encarando meu rosto. — Então não me ofenda, achando que seria
ingênua em não perceber os sinais, e pior, por cair na atuação de vocês.
Engulo em seco, parando a partida e caminhando até a rede que
divide a quadra. Parker entende o que quero fazer e começa a caminhar até
mim, parando do outro lado.
— Sinto muito em dizer que está enganada pela primeira vez —
afirmo, sorrindo.
— É mesmo? — Analu sorri, umedecendo os lábios.
— Sim.
— Bem, você não me perguntou, mas eu diria para você tomar
cuidado. — Seus olhos de corça se fixam nos meus. — Porque talvez
Verônica também desconfie. Ela pode estar absorta demais em seu
relacionamento para te dizer que isso é uma ideia de merda, mas não
significa que em algum momento ela não te pressionará para saber a
verdade.
Aperto a ponte do meu nariz, incrédulo. Eu deveria contar com esse
detalhe. Deveria saber que Analu poderia ler nossos passos melhor do que
ninguém. Mesmo que Verônica nunca deixe nada passar despercebido, é
Parker que mantém seus olhares afiados e segredos obscuros guardados a
sete chaves para que ninguém os descubra.
Ela é tão perigosa quanto Blackwell, se desejar isso.
Merda. Merda. Merda.
Com um suspiro agudo, apoio uma mão na rede e opto por não dar
voltas no assunto.
— Não espalhe essa sua ideia de merda para ninguém, Parker —
delibero, calmo.
Analu levanta a mão até sua franja, arrumando antes de enrugar o
nariz.
— Eu não vou — pontua, desenhando seu lábio inferior com os
dedos. — Pelo menos não até alguém me perguntar.
Pressiono uma das minhas palmas em meus olhos, apertando-os,
tentando aplacar o nervosismo que começa a emergir em minhas veias.
— O que você quer dizer com isso?
— Eu não vou mentir se alguma das minhas amigas me
perguntarem, Ollie — dispara, me encarando com os olhos semicerrados.
— Você sabe o que mentiras já fizeram na minha vida e não estou disposta
a repetir isso, a perder pessoas que gosto por guardar segredos dos outros.
Mas, vou me abster de comentários até que vocês sejam maduros o
suficiente, e enfrentem os problemas sem precisarem de algo tão ridículo
para os proteger das consequências de suas próprias ações.
Solto o ar com força, afagando a lateral do meu pescoço.
— Você não entende, Analu — declaro, finalmente. — E acredite
quando digo que um relacionamento entre mim e Summer era a última
coisa que desejávamos.
Ela sorri maliciosamente, me lançando um olhar de soslaio com uma
expressão zombeteira.
— Vocês pareciam confortáveis o suficiente durante o beijo na festa
— solta, mordendo o lábio inferior enquanto segura uma risada.
— Dos males, o menor — respondo dando de ombros.
— Claro.
Analu Parker é, de fato, a filha do anticristo.
— Eu preciso de Summer e ela precisa da minha ajuda — disparo.
— Não é por imaturidade ou medo das nossas ações, é por algo que não
interessa a ninguém a não ser nós dois, Parker. E eu espero que você
entenda, que assim como nunca me meti nos seus assuntos, você faça o
mesmo.
Ela dá um passo à frente, quase que colando seu corpo na rede.
Essa é a coisa de Analu Parker. Ela nunca se dobrará para ninguém,
mesmo quando tem todos os motivos. Ela se mantém fiel a si.
— Vocês são meus amigos. A porra da minha família — despeja,
friamente. — Então, escute quando digo que no primeiro sinal de que irão
se machucar, vou interceder, você gostando ou não.
Aceno com a cabeça, entendendo seu ponto.
— Não chegará a esse ponto — digo, precisando reforçar isso para
mim também. — Eu e Summer não nos gostamos o bastante para conseguir
machucar um ao outro.
Sorrio.
É a verdade, certo?
Summer pode não amar Levi, mas isso não significa que quando se
resolver e abrir aquele coração de pedra para relacionamentos, ela não
correrá para os braços do capitão de natação para viverem o maldito
romance água com açúcar que todos aplaudirão.
Eles definitivamente seriam o casal estrela da cidade, depois de
Verônica e Logan.
A imagem disso, deles juntos e felizes, faz com que uma queimação
estranha suba pelo meu estômago. E, ainda que isso traga uma reação
desagradável, eu ficaria feliz pela loirinha.
Summer merece a chance de viver um amor como os daqueles
filmes de cinema, merece alguém que busque a lua ou conte quantas
estrelas há no céu, enquanto sussurra em seu ouvido o quanto ela merece o
sentimento que queima dentro do peito.
Ela merece alguém completo. Alguém que não sou eu e nunca
poderia ser.
Porque sou um vazio que nunca mais poderá se completar, um vazio
que se perpetua em minha alma e que cria raízes de uma forma que não há
mais como arrancar. Almas despedaçadas como a minha, entendem que não
nasceram para encontrar a sua outra metade ou para se sentirem completos,
nós somos destinados à solidão e ao vazio.
— Vocês, homens, são as criaturas mais idiotas do universo —
dispara Analu, quando percebe que estou divagando.
Com essas palavras, ela gira nos calcanhares e começa a caminhar
para fora das quadras, enquanto se abaixa e pega uma garrafa de água, indo
em direção ao spa do clube.
Pendo minha cabeça para trás, fechando meus olhos ainda pensando
nas suas palavras e esquecendo o real motivo pelo qual vim procurar Parker.
Agora a única coisa que consigo constatar é que após tudo o que passei, eu
nunca serei suficiente para ninguém.
E por isso que eu quero aproveitar cada segundo do meu tempo
emprestado com Summer até ela romper o que temos e encontrar a porra da
sua metade da laranja.
Mas até lá, farei com que Summer Miller seja minha. Mesmo que no
fim, eu saiba que ela nunca me pertencerá.
Agora eu vôo, alcanço as notas altas
Eu tenho uma voz, me ouça esta noite
Você me segurou
Mas eu batalhei bravamente
Bird Set Free | Sia

PASSADO

Uma vez, quando havia errado uma tarefa de álgebra, minha


professora me contou que existe uma infinidade de números. Eles vão de
zero a um milhão e ainda assim, continuam crescendo. Existem também os
negativos, antes do zero, que decaem em igual conformidade.
É como Alicia, minha babá, disse uma vez sobre seu livro de
romance favorito, que contava a história de um casal, com uma doença, que
a fez chorar por horas.
“Existe uma quantidade infinita de números entre 0 e 1. Tem o 0,1 e
0,12 e o 0,112 e uma infinidade de outros. Obviamente, existe um conjunto
ainda maior entre o 0 e o 2, ou entre o 0 e 1 milhão”.
É uma analogia estranha, porém, minha professora me disse que
essa infinidade de números, são como uma infinidade de pequenas chances
de tentar refazer aquilo que fizemos errado. Ela me explicou que a vida é
semelhante a isso. Nós podemos ser mais de um número. Se errarmos na
primeira tentativa, haverá a segunda, a terceira e assim sucessivamente.
Sempre teremos uma infinidade de tentativas pela frente, por isso,
não precisamos e nem devemos desistir de tentar acertar.
E hoje é a minha oitava tentativa de fazer meu pai me amar.
Porque se ele gostar de mim, se me amar, não me baterá mais.
Eu não vou desistir, não posso desistir. Se fizer isso, se realmente
achar que ele nunca poderá me olhar como olha para a empresa da nossa
família, não sei o que farei com os restantes dos números que possuo.
Caminho pela enorme cobertura em Nova York segurando o seu
whisky preferido, que sei que é um dos mais caros e que foi presente de seu
último parceiro de negócios. Ele ama tomar um pouco quando chega em
casa depois de um dia longo, principalmente agora que nos mudamos em
definitivo para cá, por conta da morte da mamãe.
Pensar nela, mesmo que eu não deseje, dói. Porque ainda me lembro
de cada segundo após a sua partida, me lembro de como foi escutar cada
sílaba dos lábios do meu pai e ter que engolir em seco, sabendo que ela
realmente havia me abandonado e preferido fugir com seu segurança, do
que cuidar dos seus próprios filhos.
Porém, o que mais doeu, foi quando ela foi encontrada sem vida em
um hotel moribundo, nos subúrbios da cidade, por conta de uma overdose.
Eu nem sabia o que isso significava, até que escutei algumas funcionárias
conversando que ela tinha usado drogas.
Era mentira! Tinha que ser mentira.
Mamãe não usaria essas coisas. Eu sei disso. Sei porque sempre me
disse que substâncias assim faziam mal ao nosso corpo e, principalmente, a
nossa alma. Então, mesmo que todos digam que é verdade, uma parte de
mim, não consegue acreditar que ela realmente seria capaz disso.
— Ollie, querido? — Alicia me chama, fazendo com que me vire e
sorria fraco. — Onde você vai com essa garrafa?
Solto um pequeno suspiro por conta do peso do objeto em minhas
mãos, mas, logo escondo minha reação, porque se ela me impedir, não
conseguirei chegar até o escritório no primeiro andar a tempo.
— Vou levar para o papai — conto sorrindo. E sei que meus olhos
brilham por conta da esperança que inunda meu peito. — Ele gosta dessa
bebida e ele vai gostar de mim se eu levar, Licia.
Um caroço se aloja em minha garganta quando seus olhos brilham
com piedade.
— Ollie, querido... deixe-me te levar para cama. Andi está
chamando por você — ela sussurra, dando um passo à frente.
Reteio, negando com a cabeça. Aperto meus lábios, sabendo que
minha voz agora sairá trêmula por conta do choro preso em minha garganta.
— Não, Licia, eu tenho que levar — suplico, mordendo meu lábio
para que as lágrimas não desçam. — Eu preciso.
Não digo a ela que preciso levar porque, a memória de seu cinto
contra as minhas costas, ainda dói. E nem digo que as cicatrizes em minhas
omoplatas são uma lembrança eterna, daquelas que fixam na alma e nos
fazem nos questionar o porquê de merecermos tamanha dor.
Apenas a observo, enquanto uma lágrima cálida e solitária desce
pela minha bochecha e quase atinge a altura dos meus lábios. A seco com a
manga da minha blusa de frio para que Alicia não sinta ainda mais pena do
que está estampada em cada parte de seu rosto.
Percebo, tarde demais, que não sou rápido o suficiente, porque ela
leva a mão até a boca, segurando o próprio choro e se vira correndo para o
quarto de Andi, quando percebe que não farei o que está me pedindo.
Vendo sua expressão antes que ela corresse, constato que odeio que
as pessoas se sintam dessa forma quando olham para mim e, por isso, me
virando outra vez e seguindo pelo enorme corredor até as escadas, ignoro a
sensação em meu peito de que meu plano idiota dará errado, se eu não
mantiver minha atenção no caminho. Eu preciso descer com calma e levar a
garrafa cara até o escritório, antes que ele chegue.
Porque assim, papai vai perceber que eu posso ajudá-lo, posso ser
um filho perfeito. E o melhor, vai perceber que não precisa me bater até
deixar minhas costas marcadas como das outras vezes.
Desço o primeiro degrau segurando o objeto e sorrio para mim
mesmo assim que percebo que não o deixei cair. Desço, detidamente,
focado em conseguir concluir com êxito essa atividade, porém, assim que
meus pés tocam um dos degraus, a porta se abre e uma mulher alta e loira,
vestida em roupas brilhantes, totalmente diferente do que mamãe
costumava vestir, entra pela porta principal sorrindo e olhando para o meu
pai, como se ele fosse a sua pessoa favorita em todo o mundo.
Ela não pode olhar para ele assim. Ninguém pode!
— Pai? — chamo, encarando sua mão na cintura da desconhecida.
Brandon levanta o olhar, gélido e surpreso. É como se não desejasse
me ver. Como se apenas olhar para mim, faz com que sua raiva emergisse
em suas veias. Ele não gosta de mim, é um fato, mas no fundo ainda
acredito que ele possa começar a gostar.
E essa esperança, é um sentimento tosco e infundado, porque sei
que, apenas por olhar nos seus olhos, ele nunca vai ser o que eu preciso, o
que eu tanto almejo que seja.
Mesmo assim, a dor de saber que ele nunca vai me ver tocar piano
como mamãe fazia, que nunca participará de uma festa de aniversário
minha e me segurará quando for a hora de assoprar as velas, é como uma
fissura que se abre a cada vez que suas enormes mãos dirigem tapas em
minha pele, como uma faca cravada em meu peito, torcendo
vagarosamente.
Meus olhos se nublam com lágrimas que, pela primeira vez, não
permito que desçam pelo meu rosto, mesmo quando meu queixo e minhas
mãos começam a tremer, por conta do esforço de esconder as emoções que
tomam conta de mim.
De repente, mesmo com meu esforço de não envergonhá-lo na
frente da sua convidada, sinto o vidro escorregando das minhas pequenas
mãos. O objeto frágil se estilhaça no chão, fazendo com o líquido de cor
marrom desça pelos degraus, molhando-o. E um odor forte de álcool
verbera pelo ambiente.
Alguns pedaços do antigo recipiente voam por todos os lados,
fazendo com que eu leve minhas pequenas mãos em meu rosto, mordendo a
palma dela evitando o grito apavorado por saber do que virá logo em
seguida.
Outro grito, um agudo e afeminado emerge no ambiente, fazendo
com que eu saiba que assustei a companhia de papai. Quando olho para
cima, para meu pai, agora na base da escada, segurando o corrimão com
raiva e me olhando com desprezo, constato que perdi meus números,
minhas tentativas.
Ele nunca vai gostar de mim depois disso.
Brandon leva a mão até a gravata do terno caro e a afrouxa, sem
nunca tirar os olhos do meu rosto.
Eu não posso chorar. Eu preciso ser forte.
— Amara — grunhi, sem olhar para a mulher. — Desça, George a
levará para o seu apartamento.
George é o motorista fiel de papai e sei que ele fará o que lhe é
mandado. Mas o que me chama a atenção é que ele está usando seu
motorista preferido, o que me indica que ela é mais importante para ele do
que imaginei.
Olho para a mulher alta que tem os olhos castanhos afiados em meu
rosto, gritando, mesmo que em silêncio, que acabei de destruir a sua noite.
Quero pedir desculpas, mesmo que ela não mereça, porque não tinha
intenção de fazê-lo expulsá-la. Porém, não tenho tempo, porque a mulher se
vira batendo os saltos no piso alabastrino e sumindo da minha vista.
Volto a encarar os olhos de papai, observando-o começar a subir os
degraus até parar em dois abaixo do que estou, quase que nivelando nossos
olhares.
Ele é alto. Muito Alto.
Alicia sempre diz que quando eu crescer serei tão grande como ele e
até mesmo desejo que isso seja verdade, assim, ele nunca mais fará o que
está prestes a fazer comigo.
— Por acaso a garrafa que acabou de derrubar, não seria o meu
Glenfiddich, certo? — a pergunta sai tão calma que meu queixo volta a
tremer. — Responda-me, Oliver.
Não respondo. Não posso responder. Sei o que virá, sei que a dor
que me causará desta vez será maior do que a anterior.
— Responda. A. Porra. Da. Pergunta. Oliver! — grita pausadamente
em meu rosto.
Engulo em seco.
De novo não. De novo não.
São as palavras que gritam em minha mente. São as palavras que
quero gritar para ele. Porém, não faço isso. Apenas fico quieto, fechando
minhas mãos em punhos e sentindo a ponta das minhas unhas perfurar
minha pele, por conta da força que aplico.
O medo que ele me faz sentir, é visceral. Ele estagna, une um
amontoado esmagador que sufoca e ocupa um tremendo espaço em meu
peito e assim, dessa forma, acaba faltando lugar para quaisquer outros
sentimentos. Não há mais esperança, nem vontade de fazê-lo me amar, não
há nada. Há apenas um vazio que me faz viver nesse limiar entre temer
quem deveria me amar e proteger a única pessoa no andar de cima, que
agora dorme tranquilamente das consequências das ações do homem à
minha frente.
Mesmo querendo todas as tentativas de fazer com que papai me
ame, acho que aprendi do pior jeito possível que quando a confiança de
alguém é quebrada, a recuperação é lenta e muito dolorosa, quase
inexistente. Compreendo isso, pelo simples fato dele apenas ter chegado
perto de mim e todo o meu corpo já ter entrado em modo protetivo, em uma
forma de autodefesa por ter receio de ser quebrado novamente.
Ele levanta a mão e, instantaneamente, meu corpo se encolhe e meus
olhos se fecham, já esperando a dor de seu punho contra meu rosto. Porém,
ela não me alcança. Ele não me bate desta vez. Brandon segura a gola do
meu pijama e me arrasta para o segundo andar.
No percurso, sinto minhas pequenas pernas baterem contra a quina
do degrau e uma dor subir pelo meu corpo, mesmo que eu deseje pedir para
parar, para ir devagar porque está me machucando, não faço isso, sei que
não adiantará.
Ele para em frente ao meu quarto, longe o suficiente do quarto de
Andrew para que ele não escute meu choro e espero do fundo do meu
coração que meu irmão caçula já esteja dormindo. Andrew não merece
presenciar o que ele fará e nem precisa saber o que acontece quando está
em seu sono tranquilo.
Meu irmão merece ter o que eu não posso ter.
E eu vou protegê-lo, mesmo que eu não possa me proteger.
— Quantas vezes eu preciso dizer para não mexer nas minhas
coisas, seu merdinha? — sua voz sobe um decibel. Um arrepio atravessa
meu corpo, enquanto escuto o murmúrio de Alicia no corredor, indo em
direção ao seu quarto no andar de baixo. É um sinal de que Andi está
dormindo, um alívio por saber que está seguro. — Quantas malditas vezes
você precisa aprender a ficar fora do meu caminho?
Ele não me dá um direito de resposta. Meu pai puxa o cinto com
rapidez, levantando-o e acerta em minhas costas, fazendo com que uma
queimação agonizante envolva minhas costas.
Sem pensar duas vezes, agarro o tapete felpudo do meu quarto,
sentindo a dor lancinante que me infringe. Meu grito reverbera pelo quarto,
até que as lágrimas descem pelo meu rosto e eu comece a gritar para que
pare, para que me deixe em paz.
Mas não é suficiente.
Ele não me ouve.
E tudo dói.
O modo desesperado com que os gritos deixam meus lábios faz
finalmente me despertar e começar a me arrastar pelo quarto, fugindo das
agressões.
— Oh, você finalmente decidiu reagir e parar de gritar como um
merdinha? — debocha, soltando uma gargalhada de escárnio. — Vamos,
Ollie, reaja com um homem!
— P-pare... por favor, pai — gaguejo, ainda de joelhos, sentindo as
lágrimas caírem no tapete.
— Pare? — repete, ainda sorrindo. — Você sabia que a puta da sua
mãe também implorava dessa maneira? — O cinto desce outra vez. —
Todas as vezes, Oliver, ela suplicava. E sempre pedia para que não te
acordasse, porque sabia que iria defendê-la.
Outra lágrima desce pelo meu rosto. Não é pela sua frase, é pela
lembrança que a acompanha. A lembrança da imagem dos machucados de
mamãe, a forma como ela se escondia na sua sala de piano, em como ela se
despediu.
Eu sinto tanta falta dela, falta de quando eu apenas fazia com que
seu dia fosse melhor, quando ela se escorava em mim para não se quebrar,
de como tocávamos juntos e no final ela me abraçava como se eu fosse o
seu mundo.
Eu sinto tanto a falta dela, que se estivesse aqui para cuidar dos
meus ferimentos, enquanto apanho no seu lugar, eu não me importaria de
sentir essa dor e até mesmo a perdoaria por ter nos abandonado.
Nunca deixe seu pai o destruir.
A frase que ela havia dito grita em meu subconsciente. E mesmo
que ainda me ressinta por suas últimas ações, choro por saber que eu não
poderei cumprir essa promessa.
Uma dor excruciante atinge meu estômago, quando sinto o bico dos
sapatos caros de Brandon chutar com força, jogando meu corpo contra a
minha cama. Minhas costas machucadas, ardem com o contato da madeira
fria e nem me importo com o grito agudo que salta dos meus lábios.
Pouso de joelhos, tentando respirar fundo, então, de repente, vomito.
Meu rosto pende para baixo e meu olhar se fixa no que foi expelido do meu
estômago. O odor forte sobe em minhas narinas, fazendo com que meu
nariz se enrugue.
Ainda de joelhos, olho para cima, sob as lágrimas e prometo a mim
mesmo que essa seria a última vez, seria o ponto final. Porque se eu me
submeter a isso novamente, não sobreviveria.
— Ollie? — uma voz suave, doce, chama do outro lado da porta.
Não. Não. Não.
Encaro meu pai com os olhos cheios de súplica, pedindo para que
não abra a porta, não me faça gritar e que não permita que meu irmão
presencie o que está acontecendo aqui, que ele não se quebre como fui
quebrado.
Ele não pode saber, ele é minha esperança.
Meu ponto de luz em meio a tanta esperança.
— Por favor... O Andi, não — choro, não me importando se estou
me humilhando. — Ele não, pai... Faça qualquer coisa comigo, mas com ele
não.
Brandon não diz nada, apenas caminha até onde eu estou e se abaixa
a minha frente.
— Ollie, você disse que assistiria Bob Esponja comigo — Andi
continua, quando não respondo. — Eu preciso de você, Ollie, não posso
assistir sozinho.
Eu preciso de você também, Andi.
Lágrimas jorram dos meus olhos e a salinidade toca os meus lábios.
— Se você ousar tocar em algo meu novamente, as marcas em seu
corpo serão seu menor problema, Oliver — meu pai ameaça, segurando
meu queixo com força, assim que o barulho de passos leves se distanciam
da porta.
Isso, Andi, fique longe daqui.
Não respondo, apenas deixo que uma última lágrima desça pelo meu
rosto.
Observo-o se levantar e sair do meu quarto, deixando-me sozinho,
sujo e machucado. Escoro meu cotovelo na minha cama, levantando meu
corpo lentamente e, com dificuldade, finalmente libero meu choro por todo
o caminho até o lavabo do meu quarto.
Meus olhos se fixam no espelho a minha frente, refletindo a minha
imagem, e quase tenho vontade de gritar outra vez. Desta vez, não seria de
dor, mas, de raiva, abandono e de sentir tudo dentro de mim se estilhaçar,
como o vidro que eu derrubei na escada mais cedo.
Levo a mão até o botão do meu pijama, desabotoando-o e podendo
observar os roxos já começarem a adornar minha pele pálida. As manchas
de sangue são escondidas pelo tecido escuro, porém quando encho a
banheira e, logo após entro, o carmesim se espalha pela água morna, então,
novamente, volto a chorar.
É como se estivesse me remendando, segurando a linha e a agulha
invisível e costurando o rasgo do meu coração. Tentando moldá-lo para que
não fique quebrado, porque preciso estar inteiro por Andi, preciso fazer
com que ele não passe pelo mesmo que eu passo, todas as vezes que cruzo a
linha com meu pai.
Depois de alguns minutos, me levanto e me seco, sabendo que não
adiantará cuidar das minhas costas. As marcas permanecerão, se fixarão em
minha pele como um lembrete, como se me dissessem que vão sempre estar
ali para me lembrar das vezes em que estive frente a frente com os meus
próprios demônios e, ainda assim, sobrevivi.
Quando finalmente estou pronto, caminho a passos lentos até a porta
do quarto de Andrew e entro, esperando que meu irmão já esteja dormindo.
Mas sou surpreendido pela imagem dele sentado na beirada de sua cama,
segurando uma barra de Hershey's, o seu chocolate preferido, e um episódio
de Bob Esponja pausado na TV.
— Por que você não está dormindo? — pergunto, segurando a
maçaneta e impedindo que uma careta de dor se forme em meu rosto.
— Porque eu estava te esperando.
Ele se levanta, dá a volta, se deita do seu lado da cama, que possui
alguns cavalos desenhados, e bate no lado vazio, indicando para que eu faça
o mesmo. Não discuto, preciso dele, preciso do meu irmãozinho de quatro
anos, que tem os olhos gentis e um sorriso singelo nos lábios.
— Você não precisava me esperar.
— Você prometeu assistir Bob Esponja comigo — conta, quando me
deito ao seu lado. — E nós sempre assistimos juntos.
Sorrio, mesmo que minha vontade seja de chorar.
— Você não deveria comer doce a essa hora, Andi — aponto o
queixo para o chocolate em suas mãos.
— Não é para mim, bobo. — Sorri, um sorriso cúmplice. — É para
você.
— Por que para mim?
Puxo o cobertor colorido por cima dos nossos corpos.
— Porque quando eu estou triste, Licia sempre me dá um chocolate
para melhorar meu dia — murmura. — E eu não gosto de você triste, Ollie.
Engulo o choro que se aloja na minha garganta.
— Eu não estou triste, Andi — minto.
Ele sorri, segurando minha mão e apertando.
— Você está, sim. Desde que papai voltou ontem, mas vou te contar
um segredo: tudo bem, estar triste, Ollie. Porque eu vou te dar um abraço de
urso, se caso chorar — ele diz, é tão doce e singelo que realmente deixo
uma lágrima descer pelo meu rosto. — E não vou contar para ninguém, nem
mesmo para Vee. Será o nosso segredo.
Engulo seco, apertando a mãozinha dele de volta.
— Eu te amo, Andi.
— Eu te amo mais, Ollie.
Puxo-o para um abraço e então me viro para a frente, para onde a
imagem do desenho animado nos espera, e passamos horas rindo da forma
como Patrick e Bob Esponja se completam, de como são almas gêmeas
mesmo que sejam completamente diferentes, de como uma amizade pode
significar tudo quando o resto é nada.
Pela primeira vez entendo que sinto falta da minha melhor amiga,
porque apenas ela e Andi fazem com que o vazio dentro de mim seja
extinto. Eles me fazem sentir suficiente, quando todo o resto me mostra que
sou apenas um mártir na vida deles. Uma peça descartável, produzida
apenas para dar continuação à uma maldita linhagem.
Estou cansado disso. Cansado de tentar provar que valho a pena, que
não sou uma tentativa fracassada de um casamento destruído. Mas sei que
nem mesmo todos os números, todas as tentativas, farão com que eles me
amem, com que eles, que deveriam ser aquilo que precisam ser para os
filhos, sejam para mim.
Eles nunca serão.
Mesmo não querendo ainda me pergunto como posso fazer de tudo e
ainda não ser suficiente. Como posso usar todos meus números e, ainda
assim, não ter o amor dos meus próprios pais?
Você e eu juntos é mais do que química
Me ama como eu sou
Vou segurar sua música aqui em minhas mãos
Dizemos que somos amigos, brincamos de fingir
Você é mais para mim, nós somos tudo
Perfect Harmony | Julie and the Phantoms

— Então, você finalmente decidiu comprar um carro?


É uma pergunta simples, também são minhas primeiras palavras
para Oliver quando ele sai de um BMW I8 preto, o automóvel grita o quanto
esse idiota é fodidamente rico e eu nem deveria me espantar, não depois que
ele comprou a porra do meu lugar favorito apenas para um encontro
comigo.
— Eu sempre tive um carro, loirinha — responde, parando na minha
frente.
— E não usava, por quê?
Oliver inclina a cabeça para a lateral, passando a língua lentamente
pelo lábio inferior, umedecendo-o. É um movimento simples, quase
imperceptível, mas que, mesmo assim, traz uma sensação quente, causando
pequenos espasmos em meu núcleo.
— Você já tentou argumentar com Verônica sobre o porquê dela ter
que emprestar seu carro? — questiona, quando começo a caminhar pelo
estacionamento do Oásis, decidindo que preciso de distância considerável
entre nós.
— Óbvio que não — respondo, franzindo o cenho. — Tenho amor à
minha vida.
Oliver está a poucos centímetros atrás de mim. Posso sentir o seu
maldito perfume picar minhas narinas. É uma tortura. Uma tortura
agonizante que nem mesmo sei o motivo de ter se iniciado.
— Você deveria tentar. É divertido vê-la ameaçar matar um ser
humano, se caso aparecer um arranhão no seu tão amado carro — ele
zomba, me alcançando.
Ergo uma sobrancelha.
— Diga isso na frente de Logan. Será divertido vê-lo querer chutar
sua bunda, por provocar a sua namorada — devolvo, soltando um sorriso
malicioso. — E acredite em mim, será uma cena que eu amarei presenciar.
Ele para de caminhar, fazendo com que eu imite seu movimento e
olhe por cima do ombro, lançando-me um olhar com um quê de confusão
por saber o motivo pelo qual não está me acompanhando.
— Você está ferindo meu coração com esse desejo de que alguém, a
não ser você, chute a minha bunda, loirinha.
Solto uma gargalhada pendendo minha cabeça para trás.
— Duvido muito disso. — Me viro em sua direção. — Afinal, é
necessário ter um para feri-lo.
É a vez dele soltar uma gargalhada. O som é tão singelo e único que
dispara sensações dentro do meu peito.
— Deus, Summer, como você é má! — exclama, vindo em minha
direção e passando o braço pelos meus ombros.
Enrijeço meu corpo por conta da súbita aproximação e um sorriso
frio se aloja em meu rosto.
Não estava preparada para isso, e nem o idiota que agora tem todas
as partes da lateral do seu corpo grudadas ao meu. Ele me avisou que isso
aconteceria, porém quando olho para cima, em direção a enorme janela de
vidro, posso perceber o porquê dele ter feito isso, de ter se aproximado
rápido e sem explicação. Nossos amigos estão nos encarando
disfarçadamente em seus lugares, Analu até mesmo solta um sorriso fraco e
falso em nossa direção.
Coloco um sorriso fácil no rosto, sabendo que não podemos enrolar
mais aqui fora e sigo com Oliver para dentro do estabelecimento, que agora
está tomado de universitários famintos. Não é novidade que o Oásis é o
melhor lugar perto do campus da universidade. Não apenas porque servem
o melhor hambúrguer de Saint Vincent, mas porque todo o ambiente é
acolhedor. Porém, mesmo assim, não esperava que hoje a aglomeração
estivesse fora do normal.
É como se todos decidissem que almoçariam aqui.
— Hazel vai começar a trabalhar aqui — sussurro para Oliver. —
Será meio período, mas, ainda assim, trabalhará.
— Ela vai? — Meu falso namorado ergue a sobrancelha.
— Sim, acho que o irmão dela não está conseguindo arcar com as
despesas da casa deles e com as de Haz, por conta da faculdade em Chicago
— conto, sabendo que ainda estamos longe o suficiente para que eles
escutem.
Nem ao menos entendo o motivo pelo qual estou contando a ele
sobre isso.
— Ela não precisa se preocupar com dinheiro — a voz de Oliver sai
carregada de proteção. — Ela tem a nós!
Solto um suspiro.
— Nós dissemos isso a ela, Oliver — conto calma. — Mas, Hazel
odeia se sentir bancada. Ela é independente.
— O que Dylan acha disso? — questiona rápido, quando percebe
que estamos chegando à mesa.
— Ele está odiando a ideia tanto quanto nós — digo a verdade,
deixando meus ombros caírem.
Não é o fato de Hazel querer trabalhar para se sustentar que nos
deixa assim. Não, não é isso, ela sempre foi independente, sempre correu
atrás de seus próprios sonhos, porque sempre soube que se não corresse
atrás deles, ninguém faria. E não é de me surpreender que hoje ela é a
melhor aluna do curso de medicina da Saint Vincent University.
O problema disso tudo, é que sabemos que ficará sobrecarregada,
precisará se esforçar mais para dar conta de seus estudos e do trabalho. E
mesmo que eu, Levi, Josh e Logan cubramos a sua parte no aluguel do
apartamento, sabemos que odeia ter que depender de nós para outra coisa.
Pior que isso, Hazel odeia o pensamento de precisar usufruir do dinheiro de
Dylan.
— Vocês demoraram — Josh, cumprimenta.
— Ollie precisava namorar o seu carro novo — brinco quando
paramos em frente à mesa.
Arrasto meu olhar pelo ambiente, observando todos nossos amigos
sentados um do lado do outro, como sempre fazemos quando vamos
almoçar. Porém, desta vez, a figura inusitada de Mackenzie, colega de time
de Logan, ao lado de Josh me faz erguer uma sobrancelha.
Não pela companhia dele, afinal, não é novidade que eles estão se
conhecendo melhor. Até mesmo fico feliz pelo meu amigo enfim estar se
interessando por alguém que o olhe com os olhos brilhantes e um sorriso
orgulhoso no rosto. Contudo, o motivo pelo qual encaro-os desta forma,é
nada menos porque a presença do jogador, atrapalhou a dinâmica da mesa,
fazendo com que falte uma cadeira.
Giro minha cabeça, arrastando o olhar pelo ambiente a procura de
um assento vazio, porém, percebo que está em falta por conta de tantas
pessoas que virem para o almoço.
Oliver, sem se preocupar se um de nós ficará em pé, se senta na
única cadeira vazia que está ao lado de Josh e me encara com a testa
franzida, confuso do porquê estou encarando o lugar com uma irritação
aparente.
— Nós… hum... tentamos pedir outra cadeira — Hazel diz baixinho
do outro lado da mesa. — Mas estão todas ocupadas.
Abro a boca para dizer algo, porém, Oliver é mais rápido.
— Sem problemas, Haz.
Oi?
Ele só pode estar de brincadeira.
Sem problemas?
Eu estou em pé e Oliver decidiu que tudo bem se sentar e deixar a
porra da sua namorada nessa posição?
Deus! Que belo namorado falso eu fui encontrar.
Meu pensamento que estava percorrendo o caminho quase que
homicida é cortado quando sinto duas mãos em meus quadris me puxando
para baixo, diretamente para uma poltrona macia, que em outra situação eu
poderia dizer que até mesmo é confortável.
Mas, não agora.
Não na frente de todos meus amigos e dezenas de universitários que
nos conhecem.
Porque o meu projeto de poltrona, nada mais é do que a porra do
colo de Oliver Wright.
Instantaneamente meu corpo fica rígido igual a uma pedra. Oliver,
me levanta um pouco, puxando meu corpo para mais perto, fazendo com
que minhas costas fiquem grudadas em seu peito e seu queixo se apoie em
meu ombro tampado pela camiseta.
Respire e expire lentamente, Sum.
A respiração suave do meu companheiro, faz cócegas em minha
bochecha e tenho que ter todo o controle do universo para não o sentir
abaixo de mim.
— Relaxe. — Sua voz é suave. Suave demais e mesmo que ele não
saiba, acarreta uma onda elétrica em minha parte íntima. — Ou todos vão
achar estranho que minha namorada está agindo como se estivesse sentada
em uma cerca de arame.
Mordo o interior da minha bochecha, suprindo um palavrão.
— Eu não estou fazendo isso.
Ele sorri, maquiavélico.
— Oh, você está! — exclama. — Mas, não se espante, Olive
também não se sentiu totalmente confortável quando foi obrigada a se
sentar no colo de Adam.
— Jesus Cristo. Esqueça esses malditos livros, Oliver!
Ele gargalha sensualmente.
— Impossível, querida. — A entonação de sua voz é como um
afago sensual em meu ouvido. — Ainda estou contando com o momento
em que poderei replicar aquelas frases que eu te prometi ou que iremos
dividir uma cama. Estamos vivendo um clichê, Sum, e eu quero ter e
experiência completa.
— Isso não está acontecendo, Oliver. — Engulo em seco. — Temos
regras, iremos segui-las. Você deve segui-las.
Ele se aproxima mais um pouco. Muito perto. Perto demais e todo o
meu autocontrole grita para que eu saia correndo, me proteja da queda que
irá acontecer se caso eu permitir que o que desejamos aconteça.
— Diga-me, Summer, diga-me que não me imagina afundando
novamente em sua doce boceta — ele sussurra lento, tão lento. — Diga-me
que sempre que se toca não pensa naquela noite, em como me implorou até
que gozasse.
Puta que pariu! Merda!
Eu deveria agradecer que meu cabelo está tampando boa parte do
rosto de Oliver, impossibilitando que nossos amigos percebam o que ele
acaba de proferir. Mas, o que não posso ignorar, é a excitação que agora
corre dentro de mim. As chamas de desejo que queimam.
Encaro-o sobre o ombro, nossos olhos fixos um no outro. Nossos
rostos quase que colados, poucos centímetros, é isso que nos separam de
unirmos nossos lábios. De nos deleitarmos com a sensação de nossas bocas
dançando uma coreografia única, viciante.
Luxúria queima em mim. Luxúria suja e tão, tão deliciosa que talvez
não me importaria de deixá-lo me curvar sobre uma mesa nesse instante e
enterrar dentro de mim forte e bruto. De maneira como um dia fizemos.
Sinto sua mão contornar minha cintura, prendendo-me no local. A
sensação de seus dedos circulando minha pele por cima do tecido, queima e
traz sensações esquecidas, piorando tudo. Faz com que eu sinta meu
coração acelerar e meus dedos suarem.
E Oliver sabe disso, sabe que acabara de me afetar.
Idiota.
Engulo em seco, uma, duas vezes. Nossos olhares não se
desgrudam. Não cedem. É como se mesmo que tenhamos plateia, ainda
assim, o mundo é apenas nosso.
Suas pupilas se dilatam em desejo, é cru e primitivo. Sinto como se
minhas veias fossem fogo em lava quente, cada pedacinho do meu corpo
entra em combustão, pedindo que me aproximasse apenas um centímetro,
apenas isso e acabasse com a nossa agonia, com esse maldito desejo que
paira dentro do meu ser, desde a noite em que me deixei cair nesse
precipício sem fim que é Oliver Wright.
Porém, antes mesmo que um de nós pudéssemos fazer algo e tomar
uma atitude, o arranhar de uma garganta me obriga a afastar e olhar para
frente, para Levi que está me encarando como se suspeitasse o que está
acontecendo entre mim e Oliver no momento.
— A temporada de jogos começa em algumas semanas — diz,
encarando Logan e virando seu rosto para o capitão, me ignorando.
— Vai ser complicado esse ano — meu amigo conta, suspirando.
Dylan resmunga algo do outro lado da mesa, mas não presto
atenção, nem mesmo na discussão de Vee e Analu. A única coisa que detém
todo o meu foco é a sensação de traição que queima em meu peito.
Eu não deveria desejar Oliver quando estou nesse arranjo para
Johnson superar o sentimento que acha que sente por mim.
Sinceramente? Todas as vezes que ele age assim quando me ignora,
eu me pergunto se estou fazendo o certo. Mesmo que eu entenda todos os
motivos pelo qual está me tratando desta forma, não posso deixar de me
sentir cruel. Cruel por machucá-lo. Por ser egoísta e por não conseguir ser
corajosa o suficiente para mantê-lo longe do meu passado e perto do meu
coração, como sempre foi.
— Você se lembra que eu havia dito que precisaria que me
acompanhasse em um evento? — Oliver pergunta baixinho, ignorando o
falatório de nossos amigos e focando sua atenção em mim.
— Sim — respondo pegando uma batata frita da bandeja de Josh,
forçando-me a esquecer suas palavras sujas, porém ele não tem tempo de
continuar, pois uma garçonete finalmente para na nossa mesa e se ajeita
para anotar nosso pedido. — Um hambúrguer da casa e um suco de laranja,
por favor. Você, Ollie?
Percebo que o sorriso malicioso que a garota lança a ele é regado a
segundas intenções, mesmo vendo que eu estou literalmente em cima dele.
E, não sei porque e talvez nem queira descobrir o motivo pelo qual um
sentimento estranho sobe pela minha espinha, e faz mesmo que seja madura
e algo que eu nunca faria em sã consciência, me ajeitar em seu colo, dando
a ela, uma visão clara das mãos de Oliver envolta da minha cintura.
Céus, isso é patético.
— O mesmo que a minha namorada, por favor — ele responde
frisando o termo para ela entender que não está a fim e olha para meu rosto,
com um sorriso zombeteiro estampado em seus lábios. — Eu não sabia que
você tinha um lado possessivo, loirinha.
Meu queixo cai, perplexa.
— Um lado possessivo? Por você? — indago, soltando uma
gargalhada fria. — Me poupe, Oliver.
— Cuidado, loirinha, ou nossos amigos vão acabar achando que
você não me ama — zomba no meu ouvido e posso sentir seu sorriso perto
da minha orelha.
— Eu te odeio — murmuro apenas que ele ouça.
— Eu achei que tínhamos superado isso.
— Eu também — forço um sorriso falso. — Mas foi apenas uma
falta de sanidade momentânea.
Ele solta uma pequena gargalhada, voltando a se encostar na
cadeira.
— Ah é? — debocha. — Que pena, eu realmente estava começando
a achar que você estava me amando loucamente.
É a minha vez de soltar uma gargalhada falsa.
— Nos seus melhores sonhos, playboyzinho.
— Só você, Sum, só você — diz, balançando a cabeça enquanto
sorri. — Voltando ao assunto do baile, estamos indo para Nova York.
Ergo uma sobrancelha.
— Nós estamos?
— Sim.
— Explique-se.
— Meu pai exige a minha presença em um baile beneficente. —
Suspira fundo. — Eu te deixaria de fora, mas, ele foi irredutível em dizer
que não posso aparecer sem você.
Olho para ele, acenando positivamente.
— Ninguém de Saint Vincent está sendo convidado, certo? —
questiono.
— Acredito que não — nega, devagar. — Por quê?
Solto um suspiro.
— Meus pais não sabem sobre esse namoro, Oliver — digo,
mordendo meu lábio. — E não quero que saibam ou isso pode ficar um
pouco complicado.
— Eles são superprotetores? — pergunta, me arrumando em seu
colo e erguendo a sobrancelha. — Devo me preocupar?
Como posso dizer a ele que meus pais são os melhores pais do
mundo e que fariam qualquer coisa por mim? Porém, eles se sentem
culpados pelo que aconteceu em minha infância. Que eles precisaram não
só lidar com uma criança retraída, mas autodestrutiva, que não conseguia
sentir nada, a não ser um vazio.
— Eles são apenas… intensos — declaro. — Mas, não quero que
saibam. Vai ser melhor assim.
Vejo o exato momento em que Oliver olha para meu rosto com uma
expressão estranha, e por mais que deseje desviar o olhar, eu o sustento.
Não deixando-o avistar o que estou tentando esconder. Porque eu sei que se
ele desejar, saberá desvendar tudo o que escondo.
Ficamos nesse impasse, ambos sem ceder ou recuar. Esperando que
em algum momento alguém nos tire dessa pequena bolha, nos faça parar de
tentar montar o quebra-cabeça que criamos.
— Você está escondendo algo — Oliver, diz, por fim.
Sua atenção cai para o meu rosto, e por uma fração de segundo,
pondero a ideia de contar a ele. De desinibir todo o meu segredo. Contar a
ele todas as sensações, todo o medo e tudo o que guardo em meu âmago.
Porém, sei que nunca poderei confiar em Oliver nesse sentido.
— Não estou.
Minha resposta é como se fosse a gota que faltava para o balde
transbordar.
— Sim. Você está! — acusa, me encarando intensamente. — E não
irei te pressionar para me contar. Nunca farei isso, Summer. Mas, quero que
saiba que você pode confiar em mim. Mesmo quando tudo isso acabar, eu
ainda serei a sua dupla.
Sorrio, todavia, não há rastros de humor. Pelo contrário, é como se
eu estivesse dizendo a ele que nunca poderíamos ser uma dupla quando
tudo isso de fato acabar. Porque talvez, no fundo, eu saiba que sempre
carregaremos pedaços de nós no outro.
Por isso, apenas solto um suspiro, me virando para minha amiga,
que está do outro lado da mesa concentrada em tirar informações de
Mackenzie.
— Verônica?
— Sim? — responde, encarando a mim e Oliver.
— Você está pronta para me ajudar a encontrar um vestido para um
baile?
Ela sorri. É um sorriso que conhecemos bem o suficiente.
Deus, é como se eu estivesse entregando a ela a chave da cidade
envolta de diamantes.
— Eu nunca digo não a compras, Sum.

Eu não deveria ter pedido ajuda a Verônica.


Não quando eu já tinha plena consciência de que ela não compraria
apenas um vestido para o baile, que acontecerá no final desta semana em
Nova York. Minha amiga me obrigou a comprar pelo menos metade de um
guarda-roupa, que eu nem ao menos sei se um dia chegarei a usá-los.
O salto rosa bate contra a porcelana durante o seu percurso até a
arara de onde tira um vestido azul e franze o cenho, concentrada. Mordendo
o lábio inferior e desviando o olhar do vestido em suas mãos até mim, Vee
decide que ele não será bom o suficiente, joga-o em uma pilha junto aos
outros que está descartando.
Afinal, não é novidade que Verônica Blackwell carrega nas veias o
talento para a alta costura, assim como sua mãe e quando passo meu olhar
pelo estabelecimento, não me surpreendo por ela chamar a atenção de
todos.
E não é apenas o seu talento que faz a herdeira dos Blackwell se
destacar, mas sim, a sua beleza que chega a ser inaceitável. Seu cabelo
escuro e longo vai até o meio de sua cintura modelada, destacando o
conjunto Channel da mesma tonalidade de seus calçados. E mesmo vestida
de maneira glamurosa, ninguém imagina que por baixo de toda essa
sensualidade e bom gosto, ela carrega demônios que já a levaram a ver o
pior lado da vida.
Vee é tão forte quanto linda. E tenho orgulho de chamá-la de amiga,
de irmã.
— Eu estou em dúvida — ela geme num tom irritado, colocando as
mãos na cintura e fazendo beicinho. — O tom de sua pele é lindo demais
para ser apagado com um vestido marfim, mas o caimento dele é incrível!
Quase solto uma gargalhada, por conta de suas palavras. Ela aponta
para um vestido no fim de uma arara. Ele é indiscutivelmente deslumbrante,
porém, preciso concordar com ela de que não ficará bom em mim.
— Verônica, pelo amor de Deus, nós já temos um vestido —
respondo, apontando um dedo para as dezenas de sacolas.
— Não, nós temos a sua roupa para o brunch [20]— informa,
caminhando até outra arara — Nós precisamos agora do vestido para o
baile. Eventos diferentes, trajes diferentes!
Abro a boca para responder, mas uma figura loira e esbelta de Analu
entra no estabelecimento, arrumando um terninho amarelo e branco no
corpo. Jogando as madeixas para o lado, ela também ajeita a bolsa Prada
que carrega, ergue o nariz pequeno e fino em desgosto para a roupa na
entrada, e logo após caminha em minha direção.
— Deveria ser crime andar com roupas assim nesta loja, Sum —
Analu estala, se jogando ao meu lado na poltrona.
— Eu deveria estar ofendida? — indago, erguendo uma
sobrancelha.
Não estou vestida como ela ou Verônica. Contudo, isso não significa
que estou totalmente mal vestida para o ambiente. Tudo bem que a minha
blusa com a estampa do Hulk se destaca entre os tecidos. E nem mesmo me
importo, não quando terei que abandonar todo o meu guarda-roupa, por
conta desse maldito evento em que Oliver está me obrigado a ir.
— Relaxe, querida — zomba, pegando uma taça da mão da
atendente e se escorando na poltrona com um tecido claro.
Parker suspira fundo, desviando o olhar para o seu celular e percebo
que está tensa, quase preocupada. Então, a minha ficha cai de que hoje seria
a entrevista do estágio para o próximo semestre.
— E como foi? — pergunto, mexendo em uma das caixas que Vee
me entregou.
— Uma merda! — seu nariz enruga quando responde. —
Definitivamente matarei o amigo de vocês lentamente.
— O que Jonhson aprontou? — é Verônica que questiona, olhando
para as araras e puxando um outro vestido com um semblante concentrado.
Analu fica de pé, indo em direção a um único vestido vermelho
longo e o retira de lá, levando-o até Verônica. O rosto de Vee muda de
chateado para empolgado, quando pega o cabide das mãos de Parker.
— É simples, ele é um idiota que pensa apenas no próprio umbigo
— Analu siliba, cruzando os braços acima dos seios. — Eu não apostaria
nada que ele seria capaz de trapacear para conseguir a vaga de Sócio Júnior
no escritório.
Verônica ergue uma sobrancelha vindo até mim.
— Levi não faria isso — defendo-o, rolando meus olhos.
— Você está falando de si própria ou de Levi? — debocha, me
entregando o vestido que a loira escolheu. — Experimente este. Vai
destacar seus cabelos.
— Verônica! — Analu sopra, ofendida.
Me levanto, indo em direção aos provadores que uma das
vendedoras me indicou, mas antes mesmo de alcançá-los me viro para
escutar a resposta de Vee.
— Apenas a verdade, querida — atira de volta, se jogando no lugar
que eu ocupava segundos atrás.
Assim que fecho a porta, não consigo mais escutá-las, retiro
calmamente a minha roupa, deixando no espaço reservado e ergo o vestido
vermelho.
O tecido se ajusta perfeitamente ao meu corpo, fazendo com que o
espartilho vermelho e delicado se agarrasse às minhas curvas, moldando-as
sensualmente. Um tule da mesma tonalidade, justo até a metade da minha
barriga, faz com que a saia semi rodada e com uma fenda reveladora, desça
até o chão com pequenos brilhos, imitando diamantes que, quando me
movo, dão um aspecto de pequenas estrelas surgindo em diversos pontos.
É lindo, uma verdadeira obra de arte.
Passo a mão pela saia, erguendo-a e caminho para fora, em busca
das minhas amigas, assim que paro em frente a elas e perto de um enorme
espelho, sorrio abertamente. Verônica e Analu largam suas taças e imitam
meu gesto. Os olhos delas brilham, é até mesmo engraçado presenciar a
cena.
— Definitivamente, esse vestido foi feito para você! — Verônica
exclama.
— Deus, alguém grave a reação de Ollie quando a ver neste vestido
— Parker zomba, sorrindo.
Dessa vez, sou eu quem sorrio. Melhor, gargalho. O som sai dos
meus lábios em cacofonia alegre e despreocupada.
— Bem, então acho que temos o nosso vestido perfeito.
Nós três sorrimos. Um sorriso no qual elas nem imaginam esconder
tudo dentro de mim, que grita para este baile poder ser o divisor de águas
no meu falso relacionamento. Porque caso contrário, assinarei o decreto da
minha ruína por estar disposta a cair por Oliver Wright devido a esse desejo
que queima dentro no meu âmago feito a porra de um inferno.
Ao mesmo tempo, quero abraçá-lo
Quero colocar as minhas mãos em volta do seu pescoço
Você é um babaca, mas eu amo você
True Love | P!nk feat. Lily Allen

Ela está atrasada.


E eu ainda continuo tentando absorver o porquê diabos estou
sentado em uma sala de embarque vazia esperando por ela, se uma parte de
mim diz que não virá.
Chame de negativismo, realidade ou qualquer coisa, contudo, ainda
assim, sei que não virá.
Suspiro fundo batendo minhas mãos nos meus joelhos e me levanto,
alcançando minha mala, começando a arrastá-la pelo caminho até o
terminal de embarque. Algumas pessoas passam por mim sorrindo e outras
correndo para não perder o voo. Um apito seguido da voz mecânica do
aeroporto de Saint Vincent, anuncia o embarque imediato para os
passageiros do voo com destino a Nova York — o voo que deveríamos
estar —, e isso faz eu andar um pouco mais rápido.
Não posso perdê-lo, não quando preciso estar esta noite na casa do
meu pai, antes que Andi chegue amanhã e dê de cara com ele e sua nova
noiva, que nem ao menos imagina que será nossa madrasta em breve.
Eu deveria ter dito a Andi quando o trouxe de Milão ou no momento
em que fiquei sabendo desse acontecimento inoportuno, todavia, não
consegui. Não por egoísmo ou por querer esconder a verdade do meu
irmão, fiz porque sei que ele odiará tudo isso, como odeia desde que
Brandon Wright começou a colecionar noivas, assim como coleciona ações
empresariais.
Brandon não levará isso adiante. Ele nunca leva. É o mesmo
monólogo todas as vezes. Ele fará um baile, apresentará o relacionamento à
elite nova-iorquina e então usurpará da felicidade genuína de sua noiva pelo
tempo que achar necessário e logo após, partirá para uma próxima modelo
em ascensão que possui a metade de sua idade.
— Oliver?
Uma voz suave soa atrás de mim e apenas ergo a cabeça por cima do
ombro, soltando um pequeno suspiro e afastando todos meus devaneios.
Não percebi que estava tão preocupado com a possibilidade de ter
que enfrentar toda essa situação sozinho após tudo o que precisei inventar,
para conseguir o que eu tanto preciso, até que a presença da loira a alguns
metros de distância se tornou real.
— Oliver? Está tudo bem? — chama outra vez.
— Você está atrasada — digo, virando todo o meu corpo. — É a
nossa última chance de embarcar, vamos?
A expressão de Summer se torna carrancuda. E ela nem mesmo me
responde a minha pergunta, apenas rola os olhos castanhos e voltar a puxar
uma enorme mala preta pelo aeroporto, passando por mim.
Nós não conversamos durante o embarque, tampouco quando o
avião começa a decolar. Apenas quando estamos em nossa cabine privativa,
é que ela finalmente me encara. Mas, antes de proferir qualquer palavra,
Summer olha de esgueira para o pequeno espaço que será nossa
acomodação nas próximas horas e franze o nariz para as duas poltronas
frente uma da outra em que estamos acomodados.
Diferente do jatinho particular dos Blackwell, o voo em que estamos
é privativo, reservado apenas para alguns executivos que conseguem um
passe vip para tais acomodações e para as principais mordomias e serviços
que vão além de quase todos os aspectos que os babacas da parte alta
vangloriam.
— Há algo que eu deveria saber antes de pousarmos em Nova York?
— Summer pergunta, se sentando em uma poltrona, puxando um iPad de
sua bolsa, colocando-o em seu colo.
Estico as pernas, colocando meus cotovelos no apoio lateral da
minha própria poltrona. Todas as merdas da minha família passam pela
minha mente. Talvez eu devesse alertá-la de ficar longe o suficiente de
Brandon, ignorar Lauren e não se importar com o que minha avó dirá. Isso
se Lucy Wright largar sua casa em Seattle para ver o ex-marido de sua filha,
noivar pela milésima vez.
Porém, nada disso é importante, a não ser o que estou prestes a
confessar.
— É o baile de noivado do meu pai e Andrew ainda não sabe que
ele se casará outra vez — murmuro, a língua ficando pesada.
Summer franze o cenho.
— Por que eu estou começando a achar que esse baile não será
apenas um baile normal? — questiona, pegando o pencil e deslizando pela
tela.
Franzo o cenho.
— Porque não será.
— Detalhes, Oliver — sopra, sem me encarar. — Eu preciso de mais
detalhes para saber com o que lidarei.
Certo.
Arranho a garganta, pegando um cantil de whisky escondido em
minhas coisas e o virando em meus lábios. Uma dose de coragem, apenas
isso.
— É o noivado oficial de Brandon e sua antiga assistente — conto,
sentindo a queimação em minha garganta em decorrência do álcool. — Ele
usará o baile beneficente como desculpa. Típico dele.
Summer finalmente olha para cima, para mim.
— Muito bem — responde, pousando o objeto na mesa ao seu lado
e focando sua atenção em mim. — Você está me levando para o olho do
furacão. Então, me corrija se estiver errada. Eu terei que lidar com um pai
negligente que usará um evento que deveria ser filantrópico para anunciar
um noivado, além um adolescente que não sabe que a família aumentará?
Suspiro pausadamente, ingerindo outro gole da péssima bebida.
— Digamos que sim.
Ela mal sabe que isso ainda é apenas a ponta do iceberg quando se
trata da minha querida família.
— Alguma chance desse baile dar alguma merda?
— Todas elas.
É a vez de Summer respirar.
— Eu deveria começar a cobrar um honorário — zomba, voltando a
pegar seu tablet. — Ser sua namorada falsa está começando a me custar
mais do que combinamos.
Solto uma gargalhada fria.
— Nunca disse que seria fácil.
— Nem difícil — contrapõe.
Inclino para frente, deixando o cantil no chão e colocando meus
cotovelos em meus joelhos, enquanto estico minhas mãos, unindo-as perto
do joelho de Summer.
— Como se fosse fácil aturar todos os olhares hostis que Johnson
está me lançando sempre que estamos juntos — declaro, sorrindo fraco. —
Eu achei que tinham se resolvido.
Ela deixa os ombros caírem, bufando.
— Eu também, mas acho que ele ainda acredita que posso mudar
meus sentimentos e começar a amá-lo da maneira que deseja.
Uma pontada de um sentimento mesquinho sobe pelo meu corpo,
fazendo com que eu precise mascarar minhas emoções.
Ela não me pertence. Nunca irá me pertencer.
Mesmo que eu deseje possuí-la de corpo e alma, ainda assim,
Summer é apenas um acordo com data de validade. Um acordo no qual
preciso encontrar uma maneira de subir para outro nível.
Um nível que envolva ela embaixo de mim, em cima, de lado, em
qualquer posição, contanto que esteja em mim.
— E você não deseja isso? — questiono, rouco.
Espero que não.
— Não.
Bom, muito bom.
— Por quê?
Percebo seu corpo ficar tenso, contudo, ela logo estampa uma careta
em sua face e me fuzila com o olhar.
— Não te diz respeito, Oliver.
Sorrio friamente, encarando seu rosto delicado.
Me levanto, segurando os dois lados de sua poltrona e me
aproximando dela, sobrepondo meu rosto ao seu, unindo castanho e verde.
Pacífico e tempestuoso.
Quente e frio.
Percebo, nesse momento, que uma palavra pode desordenar toda a
pequena paz que construímos, posso constatar, que aqui, nesse pequeno
espaço, somos fogo, caos, redenção e explosões multicores no céu.
Que podemos ser mais que um acordo, que uma mentira. Que, se
permitirmos, seremos a perda do nosso controle, seremos tudo ou até
mesmo o nada. Uma dupla indefinida que tenho a plena convicção de que
seríamos tão bons juntos, mesmo que no fundo, sabemos que somos
péssimos em durar.
Passo a língua pelo meu lábio, lentamente, observando suas pupilas
dilatarem e seu olhar cair para a minha boca.
— Sabe, eu acho que me diz respeito sim — sussurro, minha voz
saindo em um tom aveludado, perigoso. — E sabe, por quê? — Roço meu
lábio no seu. — Porque enquanto estivermos neste acordo, você é minha,
Summer, e eu definitivamente não compartilho o que é meu.
Ela engole em seco, seu olhar nunca deixa o meu. Não há respostas
sarcásticas ou palavras de baixo calão, não há nada. Há apenas seu olhar me
queimando feito brasa, como se me dissesse para provar, para marcar
minhas palavras em toda sua pele.
Há uma urgência inadiável, um sentimento feroz que faz eu levantar
minha mão até seu rosto, desenhando seu lábio inferior com meu dedo.
Enquanto Summer fecha os olhos e inclina a cabeça para trás, absorvendo a
sensação do meu contato quente contra sua pele macia.
Ela entreabre os lábios, é uma lacuna pequena, quase inexistente,
porém, ainda assim, é o suficiente para que sua língua adorne meus dedos,
indicando para que o coloque em sua boca, deixando-a que chupe,
mostrando-me o que poderia ser o paraíso.
E quando estou prestes a fazer isso, a porta da cabine é aberta de
forma brusca. Abaixo minhas mãos, tampando a visão de Summer e sou
recebido com a imagem de uma aeromoça com um sorriso alegre no rosto e
uma bandeja em uma das mãos, enquanto a outra segura a porta meio
aberta.
Puta que pariu!
Definitivamente passar um final de semana ao lado da mulher que
possui todo o meu pensamento e desejos pecaminosos, não será fácil.
— Desculpe... hum... interrompê-los — se enrola com as palavras.
— Mas, o almoço de vocês está pronto.
Sorrio, mesmo que minha vontade seja de esganá-la e me levanto,
alinhando minha roupa ao corpo, tentando esconder a ereção em minha
calça escura.
— Obrigado — sorrio frio, quase nervoso.
De todos os momentos em que poderiam trazer um maldito almoço,
o destino resolveu que o melhor seria agora?
— Oliver… — Summer, chama.
Suspiro, evitando seu olhar e colocando seu almoço ao seu lado.
— Estaremos em Nova York em algumas horas — murmuro.
Não digo mais nada, apenas me sento, puxando um dos livros que
compramos da minha pequena mala de mão sobre um jogador de hockey e a
filha do treinador do time rival, que também precisam fingir um
relacionamento e me acomodo no meu acento, ignorando a presença da
loira a poucos metros de mim.
Porque sei que se eu levantar meu olhar e encará-la, eu não me
controlarei mais, não vou conseguir ser calmaria, ser o que ela necessita, ser
apenas um maldito acordo. Eu serei mais. No momento em que nossos
lábios se tocarem novamente, nos tornaremos uma destruição ambígua e
desajeitada.
Um fim poético e avassalador.
Uma colisão de novas cores.
Summer e eu seremos um aglomerado de apocalipses que se
transmutam em novos universos.
Um caos que dá corpo aos nossos medos e voz as nossas coragens.

Nós chegamos à cobertura de Brandon no final da tarde.


Não havia ninguém para nos receber a não ser a governanta, que
sempre cuidou de tudo desde que Alicia, minha antiga babá, pediu demissão
após o incidente aos meus quatorze anos.
Virgínia Allister, uma mulher de quarenta anos com o rosto severo e
as bochechas pálidas. Seus olhos oblíquos me lembram o quão perigosa e
falsa pode ser quando deseja algo de Brandon.
Ela caminha à nossa frente, com graça e elegância, batendo os
sapatos baixos na porcelana branca, como se eu não conhecesse cada canto
dessa maldita cobertura e, pior, como se em cada parede não tivesse um
resquício dos meus gritos e choros.
Eu odeio esse lugar.
Odeio cada parte dele e apenas continuo voltando aqui para me
lembrar do porquê ainda aturo as armações do meu progenitor.
— Eu preparei o antigo quarto de Oliver para vocês — Virgínia diz,
sorrindo friamente. — Espero que esteja do agrado dos dois.
Falsa do caralho.
Sorrio, deixando minha mala e a de Summer no chão, enquanto abro
a porta e me deparo com o quarto que é como minha regressão ao passado.
Cada detalhe me lembra como Brandon me despedaçou ao mesmo instante
que meu irmão me gritava do outro lado da porta, de todas as vezes que
precisei esconder roupas ensanguentadas e de como me sentava no canto,
lendo as únicas partituras que minha mãe havia esquecido em sua fuga
preeminente.
Summer dá um passo à frente, entrando no ambiente e passando os
olhos pela decoração simples. Alguns porta-retratos de mim, Andrew ou até
mesmo de Verônica, estão espalhados pelo grande espaço. A cortina branca
que vai até o chão está aberta, fazendo com que possamos observar o
Central Park. Todavia, não é isso que prende a atenção de Summer, mas
sim, o móvel que está do outro lado, de frente para a porta de vidro que dá
acesso a sacada.
Ela engole em seco e olha por cima do ombro, para mim. Percebo
sua boca se tornar uma linha fina, como se estivesse prestes a me matar
lentamente. Diante disso, me viro para a mulher que nos encara com
atenção, absorvendo todas as informações que acha relevante para levar até
meu pai. E sei que se Summer falar o que estou imaginando, nós dois
estaremos em maus lençóis.
— Está ótimo — digo, rápido o suficiente para que a funcionária de
Brandon, erga uma sobrancelha, desconfiada. — Agora se nos dá licença,
nós estamos cansados e queremos um momento a sós.
Virgínia inclina a cabeça para o lado, a fim de encarar Summer e me
coloco à sua frente, tampando a sua visão da mulher atrás de mim, que está
prestes a me matar.
— Mas…
Dou um passo em sua direção e ela reteia, saindo do quarto e
parando na soleira.
— Obrigada, Virgínia! — agradeço. — Nós nos viramos a partir de
agora.
Com isso, fecho a porta não me importando se isso é uma falta de
gentileza com a mulher que nos recepcionou. Tenho mais problemas para
lidar do que uma bisbilhoteira da vida alheia.
Espero alguns segundos, escutando passos se afastarem da frente do
meu quarto e finalmente giro os pés em direção a minha falsa namorada que
agora está ao lado da cama, com uma mão na cintura, a cabeça inclinada e
uma raiva incandescente em suas pupilas.
Que Deus me salve desse projeto de demônio à minha frente.
— Que porra é essa, Wright? — questiona, baixo e letalmente.
Summer quase nunca usa meu sobrenome e quando o usa, sem
dúvidas, é porque entramos em um limiar em que ela poderia me assassinar
e não se arrependeria pelo feito.
— Uma cama.
Uma cama de casal.
Uma enorme cama que será meu purgatório por três malditos dias.
É a porra de um clichê como aqueles livros que fui e estou sendo
obrigado a ler por conta da loira raivosa a minha frente.
— Não brinca, Sherlock! — exclama, vindo até mim. Parando a
poucos centímetros do meu corpo. Sum ergue o rosto e percebo, tarde
demais, que seus olhos estreitaram-se. — Você fez de propósito.
Ergo uma sobrancelha.
— Por mais tentador que seja, não, eu não fiz! — Reviro meus
olhos. — Não estou desesperado a esse nível para transar com você,
Summer.
Ela ergue uma sobrancelha.
— Que alívio o meu, então — retruca, sarcasticamente. — Pois não
dormiremos na mesma cama.
— Não?
— Não!
Sua voz ressoa pelo ambiente de uma forma inabalável. Sem
brechas para uma possível discussão.
Certo. Não está acontecendo do jeito fácil, então.
Solto uma lufada de ar, fuzilando o rosto de Summer e me inclino
um pouco. Fazendo com que fiquemos cara a cara.
— Tudo bem, Summer. Então faremos o seguinte: eu desço, chamo
Virgínia e peço para que arrumem um quarto de hóspedes para a minha
namorada — desdenho, lançando-lhe um revirar de olhos. — Se desejar
nós também podemos gritar para todo o prédio que isso é uma farsa. Ou
você poderá explicar para todos o motivo pelo qual abomina a ideia de
dormir no mesmo quarto com o homem que, supostamente, está
apaixonada.
Minhas palavras saem ácidas, conflitantes.
Summer se afasta, dando um passo para trás, mas nunca deixando
meu olhar. Ela nem mesmo pragueja quando me sento na beirada da cama,
colocando a mão nos meus joelhos e abaixando minha cabeça.
— Ok. Mas você não está dormindo comigo na cama — afirma,
fazendo com que eu olhe para cima.
— Você quer que eu durma onde? — indago, erguendo uma
sobrancelha. — No sofá da varanda?
Ela franze o cenho, ofendida, mas se aproxima e se senta ao meu
lado.
— Isso já não é um problema meu — adverte, me encarando de
esgueira e torcendo o nariz. — Porém, você está certo, eles esperam isso de
nós. Seria estranho um casal dormir em quartos separados.
— Obrigada pela sensatez — zombo.
— Há algo além de dividirmos uma cama que não estou sabendo?
— questiona, imitando a minha posição.
O modo como escora seus cotovelos na coxa tampada pela calça
jeans, faz com que algumas camadas de seu cabelo caiam para frente,
criando uma cortina entre nós dois. Sem ponderar no que estou fazendo,
ergo minha mão, alcançando as mechas loiras e colocando-as atrás de sua
orelha que está adornada com um brinco delicado.
Ela me encara de relance, fixando seus olhos em meu rosto. Eles
tremulam em algo que não consigo identificar. Por isso, afasto minha mão e
suspiro fundo.
— Virgínia é perigosa — comunico. — Tudo que faz, escuta, é
exclusivamente para agradar Brandon. Apenas... tome cuidado perto dela e
não se preocupe que cuido de tudo.
Sum solta um suspiro seguido de um meio sorriso, concordando. E
deixando toda a tensão de segundos atrás, evaporar.
— Acabei de perceber algo — diz, baixinho.
Ergo uma sobrancelha.
— Sinta-se à vontade para compartilhar.
— Não estamos mais em Saint Vincent, não são mais nossos amigos
que precisam ser convencidos. A aposta dessa farsa agora é alta, Oliver —
conta, sem nunca deixar de me encarar. — E para isso dar certo, não
podemos discordar um do outro, não podemos ter essas brigas bobas. Nós
realmente precisamos ser uma dupla. Um casal que vai vender a fachada de
apaixonados para todos esses idiotas.
Sorrio, enquanto ela brinca com os dedos, preocupada.
— Somos uma dupla, Sum — repito, soando mais confiante do que
nunca. — E nós seremos mais que isso, seremos o casal apaixonado que
ninguém questionará. Eles vão nos pintar como a porra do casal do ano.
Ela franze o cenho, descrente de minhas palavras e quase solto uma
gargalhada por conta de suas feições fofas.
— Uma dupla — murmura, por fim.
— Eu e você, loirinha — sussurro. — Eu e você contra o mundo a
partir desse momento.
Ela sorri e, céus, quero me aproximar e selar esse acordo como um
maldito beijo. Quero deitá-la nessa cama e mostrar que não apenas aqui que
desejo que sejamos uma dupla por completo, quero que saiba que
talvez, apenas talvez, ela seja a única coisa capaz de me fazer transcender as
dimensões do tempo e do espaço.
Porém, sei que se eu fizer isso, ela nunca mais confiará em mim.
Nunca mais me dará abertura para que sejamos mais do que conhecidos em
um acordo necessário. E talvez, apenas por isso, solto um sorriso,
observando seu lindo rosto. As bochechas rosadas, os olhos brilhantes e o
sorriso deslumbrante estampado na sua face.
— Mas você ainda está dormindo no chão, querido — ela diz, de
repente.
Solto uma pequena gargalhada.
— Veremos, loirinha — Um sorriso escorrega pelos meus lábios,
substituindo a gargalhada. — Agora, arrume-se.
Ela me encara confusa, inclinando a cabeça para o lado.
— Para onde estamos indo?
— Para o nosso próximo encontro.
— E qual seria a programação deste encontro? — Summer ergue a
sobrancelha.
Brinco com a pulseira do meu relógio, estudando suas feições.
— Estou te levando para conhecer a cidade que nunca dorme.
— Eu conheço Nova York — adverte.
— Não como eu conheço — me levanto, puxando-a comigo.
— Eu já te contei como seu ego me assusta?
— Uma vez.
— Que bom, porque minha opinião continua sendo a mesma.
Seguro sua cintura, girando-a e colando suas costas em meu peito,
enquanto sussurro no pé do seu ouvido, antes que ela tenha qualquer reação:
— Linda, você vai perceber que conhecer Nova York quando estou
ao seu lado, é superior a qualquer visita medíocre que tenha feito a essa
cidade.
Um portal profundo, uma viagem no tempo
Todo o amor que desvendamos
E toda a vida que eu dei
Porque ele era um raio de Sol, eu era a meia-noite
Midnight Rain | Taylor Swift

No momento em que finalmente saio do banheiro, Oliver já está me


esperando sentado na enorme cama king size, vestido para sairmos e não me
surpreendo quando esquadrinho seu corpo e observo que está trajando um
conjunto preto, composto pela blusa lisa sobreposta por um blazer aberto e
uma calça de alfaiataria.
Para ser sincera, o que realmente me faz fixar o olhar nele, é o
pequeno acessório que tem a atenção de suas mãos. Ele gira lentamente o
relógio Cartier que adorna o pulso direito e diferentes de todos os outros,
este possui uma coroa canelada, ornamentada com um espinélio em formato
cabochão, destacando o prateado e os ponteiros em formato de espada, com
uma pulseira em couro preto.
— Confesso que estava quase acreditando que sairia com aquelas
blusas questionáveis — ele zomba, colocando o cotovelo nos joelhos e
sorrindo abertamente para mim, enquanto me olha de baixo para cima. —
Você acabou de me impressionar, loirinha.
Torço o nariz.
— Estou desapontada comigo mesma então — as palavras saltam de
meus lábios em um tom dramático, mas há uma pitada de sarcasmo nas
sílabas.
Seu maldito sorriso se alarga e ele abaixa o olhar me estudando.
Queimando a minha pele. Suas pupilas passam pela blusa branca de frio que
possui gola alta, depois pela saia curta de alfaiataria que adorna minhas
curvas e, por fim, na pequena parcela da meia calça fina coberta pela bota
que sobe até meus joelhos.
Definitivamente nunca mais, em hipótese alguma, deixarei Verônica
fazer minha mala novamente.
— Culpe nossa amiga — resmungo, pegando a boina que componhe
o resto da roupa que Verônica montou e vou até o espelho do closet. — Ela
perdeu toda a sanidade quando fez a minha mala. E agora estou cogitando a
ideia de quebrar seus saltos quando voltarmos.
— Boa sorte com esse plano, loirinha — Gargalha. — Desculpe,
mas não poderei te ajudar nisso. Eu definitivamente amo minha vida.
— Péssimo namorado você, playboyzinho — desdenho,
sarcasticamente.
Ele solta uma risada fraca, se levantando e vindo até mim. Parando
atrás do meu corpo e encarando-me sobre meu ombro. É uma visão que tira
o oxigênio dos meus pulmões, um tipo de cena como naqueles quinze
minutos finais do filme, onde esperamos a reviravolta, o tão aguardado
momento grandioso.
É a sensação de um plot inesperado de um livro. É quente e bem-
vindo.
É como se por um breve instante, o calor irradiasse de um corpo
para o outro. Um calor que queima os ossos e incendeia a alma. Como se o
seu perfume que dança pelo ar, se misturasse ao meu e envolvesse minhas
narinas, tornando-se meu cheiro predileto.
Nós nos encaramos fixamente no espelho, nunca desviando o olhar.
Nem mesmo quando Oliver pega o acessório de minhas mãos e o ajeita
sobre minha cabeça, com calma.
— Você está linda, Sum — murmura perto do meu ouvido. — Você
sempre está.
Mordo meu lábio inferior, agradecendo suas palavras com um aceno
fraco e perdendo completamente a capacidade de emitir qualquer som.
Pisco no intuito de colocar os pensamentos em ordem e suspiro
fundo, colocando um sorriso fraco no rosto. É um ato que acontece
habitualmente, mas que esconde que esses sorrisos me ajudam a disfarçar o
nervosismo, desde que certa vez li em um artigo que sorrir libera serotonina
e endorfina, substâncias que trazem a sensação de bem-estar, prazer e
alegria.
Não que isso me ajudasse quando todas as lembranças me
arrastavam para um lugar que eu não conseguia sair. Pelo menos não até
aquela noite. A noite em que conheci a única pessoa que conseguiu fazer
com que meu medo não fosse meu inimigo, mas sim, a força pela qual eu
continuaria lutando.
— Vamos? — pergunto, baixinho afastando meus devaneios. —
Você prometeu o melhor passeio por Nova York e agora estou realmente
curiosa para saber se o que diz é verdade.
Oliver se ergue em seu um metro e oitenta, lançando-me um olhar
brilhante e então aponta a cabeça para a porta.
Considerando que todo o lugar está silencioso enquanto
caminhamos pelos corredores, acredito que somos os únicos na cobertura. E
talvez seja por isso que Oliver se mantém relaxado, sorrindo e até soltando
suas provocações.
Todavia, quando chegamos no saguão da sala de estar, prestes a
sairmos, um frio se aloja na parte de trás do meu pescoço. É uma sensação
inquietante, que traz um aperto no coração e um mal pressentimento.
Talvez, eu esteja louca ou paranoica, mas sinto que o corpo de Oliver
enrijece ao meu lado e constato que nada disso é obra da minha cabeça.
Um arranhar de garganta, faz com que olhemos para trás, por cima
de nosso ombro. A silhueta de um homem alto, vestido em trajes elegantes
e com uma expressão intragável, faz minha companhia se aproximar mais,
colocando-me um passo atrás de seu corpo, me protegendo.
Brandon Wright.
Sei que é com ele que estamos prestes a lidar, por conta dos olhos
idênticos ao de Oliver e pela semelhança em cada traço de seu rosto. Ele se
aproxima a passos lentos e graciosos, como uma onça circundando sua
presa antes de atacá-la e para na nossa frente, arrumando a abotoadura de
seu terno.
— Eu não sabia que chegariam hoje, Oliver — Sua voz é rouca,
acompanhada de uma tensão inexplicável.
Oliver ergue uma sobrancelha, entediado.
— Eu preciso de permissão para vir à minha própria casa? — Seu
tom é totalmente diferente de todas as vezes que profere alguma frase em
minha direção.
Brandon não se deixa abalar pela provocação de Ollie ou se faz tal
ato, não permite que saibamos, já que no momento seguinte ele sorri falso,
ignorando-o e focando sua atenção em mim.
— Você deve ser Summer — afirma, sorrindo friamente em minha
direção.
Oliver me olha de esgueira, pedindo que eu não saia de seu lado.
Não por causa dele, mas sim porque essa é a forma que ele está tentando me
proteger. Compreendendo isso, levo minha mão a dele, entrelaçando-as e
erguendo o queixo, enquanto encaro o meu falso sogro, com um semblante
frio.
Somos uma dupla. Eu e Oliver.
— Sim, sou eu — minha voz sai desprovida de emoções, quase
idêntica à de Ollie.
— É um prazer finalmente conhecer minha nora — ele balbucia.
Há algo por trás dessas palavras. Algo que não sei nomear.
— O prazer é todo meu, Sr. Wright — minto, as palavras saem de
meus lábios com amargor. — Se nos dá licença, nós estamos atrasados para
um compromisso.
— Um compromisso?
— Sim — Coloco o melhor sorriso que treinei por anos. É doce,
falso. — Oliver prometeu me mostrar a cidade. Você não se importa de
sairmos agora, não é?
— Oh, claro não — murmura a contragosto. — Divirtam-se.
— Conversamos amanhã no evento, Brandon — Oliver diz,
comprando minha desculpa.
Percebo uma veia saltar para fora do seu pescoço por conta da
despensa e aperto a mão de Oliver em busca de algo. Ele devolve o
movimento e solta um sorriso de escárnio para seu pai, sem importar com
sua reação. Ollie nos puxa em direção a saída enquanto pega sua chave em
cima do aparador e em questão de minutos estamos presos no elevador
privativo.
Solto uma respiração rasa, escorando minha cabeça no metal frio e
encaro Oliver de relance, ele imita a minha posição, mas é como se não me
enxergasse, como se estivesse perdido em suas próprias memórias. E pelo
escurecer de suas pupilas, sei que elas não são prazerosas.
Decido que não o deixarei cair em um poço de auto lamentação.
Não deixarei que o maldito homem naquela cobertura faça com que Oliver
regresse em seu próprio processo de cura. Por isso, viro meu corpo,
escorando a lateral dele no metal e encarando seu rosto que ainda não
percebe que estou encarando-o.
— Então... Nova York possui lugares divertidos, hein? — adoto um
tom leve, descontraído.
Os olhos verdes de Oliver piscam, então se fixam no meu olhar.
Lentamente a escuridão dá lugar a um sentimento genuíno, leve. Ele não
devolve minha provocação de imediato, apenas me encara como se
perguntasse o porquê diabos me colocou no meio disso. Porque não estou
correndo em sentido contrário ao dele e me salvando da avalanche de
sentimentos que vem acompanhando de toda essa confusão.
Mas, o que ainda não percebeu é que agora é tarde para
lamentações, nós estamos juntos nisso até o pescoço. Sem opção de fuga.
— Digamos que sim — sua voz profunda retumba pelo elevador,
ainda com uma pitada de nervosismo. — Qual a sua disposição para
conhecer os melhores lugares escondidos da cidade que nunca dorme?
Fico quieta, meditando se realmente estou com disposição para
conhecer os lugares que Oliver tanto diz.
— Nenhuma?
Ele solta um sorriso.
— Vamos lá, Sum. Nós estamos em Nova York! — declara, se
virando e imitando minha posição.
Fico matutando por alguns segundos, enquanto mordo meu lábio e
ergo o rosto para Oliver, que já me encara com seus orbes ansiosos.
— Eu vou me arrepender disso?
Todo o seu rosto se ilumina.
— Talvez.
Uma pequena risada nasce em meu peito.
— Você vai estar ao meu lado se caso alguma merda acontecer? —
pergunto, minha voz descendo um decibel.
Oliver nunca desvia seu olhar. Ele o sustenta, ficando cara a cara
comigo. E de repente, a temperatura do elevador se eleva, e posso jurar que
sinto uma gotícula de suor descer pela minha espinha.
É uma pergunta que eu já sei, mas ainda sim ouvir as palavras dos
lábios de Oliver faz com que meus lábios se curvem em um sorriso aberto,
idêntico ao que está me lançando:
— Eu sempre vou estar ao seu lado, loirinha.

Oliver estava certo em duas coisas.


Primeira: ele sempre estaria ao meu lado. Porque de fato, não me
largou em nenhum momento. Nem mesmo quando precisei utilizar o
banheiro de um dos restaurantes que fomos. Praticamente tive que obrigá-lo
a me esperar do lado de fora.
Segunda: Nova York é indiscutivelmente uma cidade deslumbrante,
vista pelos olhos dele.
Oliver me apresentou lugares que nunca sonharia em ir. Desde
restaurantes no Bronx que jamais ouvi falar, até algumas ruas lotadas de
pessoas que assistiam alguns artistas exibirem seus talentos.
Ele não me apressou em nenhum momento, nem mesmo quando
parei para assistir uma senhora tocar uma melodia lenta, apaixonante,
seguida de uma voz suave, aveludada, que me fez parar e apreciar aqueles
meros segundos. Era uma composição sofrida, que contava sobre dois
jovens que se apaixonaram, mas que não podiam ficar juntos por conta dos
segredos que os rondavam. Eles lutavam contra o sentimento, guerreavam
sobre suas vontades e no fim, sofriam com o coração partido.
Era uma cantiga taciturna, mas que se fixa em sua mente e te obriga
a não ser esquecida.
Assim que as pessoas começaram a se dispersar, nós caminhamos
no sentido oposto até uma viela, fugindo de toda a aglomeração. Enquanto
passávamos por ali, senti uma de suas mãos entrelaçar na minha, como se o
toque o fizesse saber que eu estou bem, estou ao seu lado.
Depois de andarmos alguns minutos, passamos pelo High Line Park,
um jardim urbano, construído sobre uma antiga linha ferroviária elevada e
repleto de vegetação, arte e esculturas.
De ponta a ponta, pude observar que o ambiente é todo forrado com
arranha-céus, edifícios e esculturas interessantes. Tudo é tão fascinante, que
levanto meu rosto e fixo meu olhar em cada detalhe, absorvendo o
momento.
Todavia, o que realmente fez com que meu coração transbordasse de
amor por essa cidade, foram os grafites da imagem de Einstein, expressando
seu amor por Nova York, e um de Frida Kahlo, que foi grafitado de forma
com que representasse dois rostos em um só. Uma representação do amor
em forma de arte. Um tesouro escondido na cidade. Algo que todo mundo
deveria ver e comentar.
— Isso é lindo, Ollie! — exclamo. — É mais que lindo.
Não posso vê-lo da posição onde estou, contudo sinto seu sorriso em
mim. Sinto seus olhos queimarem minhas costas e sinto suas próximas
palavras em meu âmago.
— Isso é.
Não tenho certeza do que ele está se referindo, porém tenho uma
leve impressão de que não é sobre a paisagem.
— Por que você me trouxe aqui? — sussurro, sem me virar.
Esse lugar não é um lugar escondido, mas ainda assim, parece ser
especial.
Oliver suspira e de repente solta a resposta que eu nunca imaginaria:
— Porque é o meu lugar favorito na cidade. — Para o corpo atrás do
meu, soltando um sorriso perto do meu ouvido. — E eu gosto de ver minhas
coisas favoritas no mesmo lugar.
Sua voz sai baixa, quase em murmúrio. E tenho vontade de me virar,
de poder ver sua expressão. Poder ver o brilho esverdeado de seus olhos
que não são novos em meu mundo castanho, mas que traz a magnitude de
um sentimento que é desconhecido em meu peito. E, acima de tudo, tenho
vontade de poder sentir o seu sorriso como se, mais uma vez, fosse música
nova aos meus ouvidos. Música que carrega tons sombrios e misteriosos e
que abrem minhas portas e fazem morada em meu corpo.
— Ele é brasileiro — continua, quando não respondo.
— Hum?
Ergo uma sobrancelha, confusa.
— O artista que fez todas essas artes, é brasileiro — Oliver comenta
sorrindo.
Eu gostaria de perguntar como ele sabe desse detalhe, contudo
apenas sorrio, concordando com a cabeça e começo a caminhar pelo
ambiente.
Poucos minutos depois chegamos ao enorme espaço do Central Park
que agora se encontra vazio. Não tínhamos pretensão de realmente ficarmos
até tarde na rua, mas, a companhia de Oliver faz com todos aqueles lugares
incríveis se transformem e o tempo se torne apenas um mero detalhe. Por
conta disso, percebi que Ollie é uma pessoa diferente quando não precisa
manter a pose que o pai exerce sobre ele.
Oliver Wright deixou de ser um enigma para mim, agora ele é um
quebra-cabeça de um bilhão de peças, que estou descobrindo amar
desvendar cada pequeno encaixe que encontro. Porque é como se a cada dia
tenho mais certeza de que, de certa forma, nos encaixamos de maneira
única e perfeita.
É como se o homem ao meu lado fosse a peça que falta no meu
próprio quebra-cabeça, que nunca percebi que estava incompleto.
Oliver pega minha bolsa e a passa pelo seu ombro, logo após, sinto
seu braço circular minha cintura me aproximando dele, mesmo que todo o
ambiente esteja vazio.
Namorados fazem isso, penso, quando meu corpo não enrijece por
conta do repentino contato.
— Céus, eu definitivamente preciso de uma cama — minha voz sai
tensa por conta de todas as coisas que acabei de constatar.
Ele lança uma piscadela. Meu olhar fica um tempo a mais em seu
rosto e até mesmo penso em dedilhar sua pele lentamente, linha por linha,
mas me limito apenas a lançar uma careta em sua direção.
— Eu sei. Você está quase dormindo em meus braços. — Solta um
sorriso zombeteiro, é arrastado e lindo. Tão lindo. Deus, Oliver Wright é a
porra de um deus grego. — Obrigado?
Franzo o cenho, confusa.
Oh, merda.
— Eu disse isso alto?
— Me chamar de deus grego? Sim, você fez. — Uma gargalhada
fraca salta de sua boca. — Mas, sinta-se à vontade para continuar.
Abro minha boca, perplexa.
Posso culpar as três margaritas que tomei na vinda para cá — não,
eu não poderia, porque elas nem ao menos me fizeram ficar bêbada —,
talvez possa inventar uma desculpa qualquer ou apenas ignorá-lo. Mas, por
incrível que pareça, não faço nada disso, apenas observo-o atentamente e
lambo meus lábios de forma lenta, sem nenhuma pretensão.
É apenas um gesto banal.
Porém, percebo que para Oliver, que acompanha meu movimento
com os olhos em chamas, não soou deste jeito. Ele se aproxima, segurando
minha cintura e apertando-a com uma força que não chega a machucar, mas
que definitivamente faz com que meu núcleo crie vida própria e clame por
ele e seu maldito pau.
Ele caminha a passos cegos comigo, parando apenas quando sinto a
superfície gelada de uma árvore contra minhas costas, tampando-nos do
mundo.
— Oliver? — minha voz sai tensa, carregada de desejo.
Ele abaixa seu rosto, colando nossas testas e suspira fundo. Mãos
delicadas seguram a lateral do meu rosto e afastam minimamente algumas
mechas do meu cabelo. Ollie desliza seus dedos pela minha face com um
toque quase que etéreo. Os castanhos dos meus olhos focam nos
esverdeados dos olhos dele, observando que existe um oceano de devoção
ali.
Oliver se move um centímetro, o suficiente para que nossos narizes
se encostem, roçando-os suavemente um no outro.
— Está difícil de me segurar, Summer — ele sussurra. — Está
difícil viver com você ao meu lado e não poder senti-la novamente. Está
difícil não poder chegar até você — Sua voz não se passa de um lamento
sofrido. — Eu sou um homem paciente, mas quando se trata de você,
loirinha... Nada no mundo é suficiente para que me mantenha longe.
Palavras fogem dos meus lábios. Não emito nenhum som, posso
ouvir o barulho ao nosso redor, as buzinas e o murmúrio da cidade que
nunca dorme. E posso ouvir a respiração inquietante de Oliver. Mas, nada
sai de mim, porque enquanto o observo, sinto que se eu me permitir cair
nesse desejo, estarei assinando a minha perdição.
Mesmo que eu saiba que desejo mergulhar em suas águas
esverdeadas e que quero sentir o toque quente de suas mãos em cada parte
do meu corpo, também sei que no momento em que permitimos essa queda,
meu coração sairá despedaçado dessa relação.
Nós não somos certos. Não somos complementares.
Somos quebrados tentando conviver com nosso próprio caos.
Somos peças de um quebra-cabeça que não se pertencem, mas que
se moldam perfeitamente.
— Nós temos regras, Oliver — sussurro mais para mim do que para
ele.
Seu dedo acaricia minha pele lentamente trazendo uma corrente
elétrica.
— Eu quebraria todas elas por você, linda — afirma, rouco. —
Apenas diga, Sum. Diga que me deseja tanto quanto eu te desejo e eu serei
seu.
A existência me pesa, o universo me vê sucumbir, me vê querer
negar tudo o que quero dentro do meu coração. E até mesmo as galáxias
sentem pena de mim. Porque eu quero continuar negando, quero que nosso
acordo não evolua a isso, quero que mantenhamos nossos olhares longe um
do outro e quero que esse sentimento saia de dentro de mim.
E ao mesmo tempo quero Oliver. Quero ele de corpo e alma. Quero
que ele me deixe entrar em seu mundo e me mostre as nuances de seus
segredos, quero que me mostre o que há por trás de seus sorrisos
zombeteiros e de suas respostas espertas.
Quero conseguir mapear milimetricamente cada pedacinho dele e
guardar todas as informações num lugar seguro dentro do meu coração,
para quando finalmente rompermos, eu possa guardar esse sentimento que
meu coração ferido está transbordando.
Quero deixar de ser apenas frieza e o caos que exalam da minha
alma.
Eu quero sentir. Quero viver.
E talvez, apenas talvez, seja por isso que seguro a lateral de seu
rosto e mordo meu lábio inferior, antes de fazer o único pedido que me
impede de pular no precipício ao seu lado:
— Apenas por hoje. Apenas por hoje nós quebraremos nossas
regras...
Ele sorri, um sorriso tão lindo, que faz com que eu perceba que
nesse momento que somos explosão de estilhaços.
Somos explosões e ao mesmo tempo uma bela poesia que está em
perfeita desordem.
— Apenas por hoje, linda.
Não há verdade em suas palavras.
No entanto, eu não me importo. Não hoje. Não agora.
Por isso, apenas ergo meu olhar para ele e sussurro as palavras que
serão como a minha entrada para essa guerra e que nunca, em hipótese
alguma, imaginei repetir:
— Beije-me, por uma noite, apenas beije-me.
E como na festa da fraternidade, ele me beija.
Seus lábios devoram os meus. Suas mãos seguram a minha nuca,
prendendo-me no lugar.
Ele pega meu rosto muito delicadamente e de repente, o beijo se
torna algo a mais. Uma de suas mãos descem até minha cintura para me
puxar para mais perto, nossos lábios se fundem e o roçar cria uma pressão
deliciosa, fazendo um pequeno gemido escape de mim.
Passo os braços ao redor do pescoço dele para me equilibrar e nos
mantermos presos um no outro, enquanto ele solta um suspiro rouco. De
repente, Oliver me levanta fazendo com que minhas costas fiquem presas
na árvore e minhas pernas entrelaçem na sua cintura. Seu nariz serpenteia
pela pele do meu maxilar, logo após, a do pescoço, inalando meu cheiro
com louvor e evaporando toda a sanidade que restava em meu corpo.
Minha cabeça pende para trás, liberando o acesso para que sua boca
possa chupar a pouca pele exposta do meu pescoço. Sinto o arranhar de
seus dentes em minha pele delicada e isso faz com que minha boceta se
aperte, desejando por atenção. Desejando que ele se abaixe e me faça ver
estrelas, assim como fez naquela noite.
— Se eu colocar um dedo em você, o quão molhada você vai estar,
loirinha? — arfa em minha pele, e tenho a certeza de que isso é o começo
de algo sem fim.
— Sinta-se à vontade para descobrir — ronrono em minha nuvem
de luxúria.
Oliver me encara sorrindo diabolicamente. Quando penso que irá
desistir, que me soltará, ele olha para trás, para todos os lados em busca de
algo e assim que percebe que realmente estamos sozinhos nessa área do
parque, volta seu olhar queimando de desejo até mim.
Ele me eleva mais um pouco, fazendo com que minha entrada fique
rente ao zíper de sua calça. E, Deus, desejo que ele solte seu pau e me
penetre com força e precisão, quero que ele me ajude a libertar o desejo
acumulado dentro de mim.
Quero que ele leve sua mão até minha entrada molhada e dolorida.
Quero que faça tudo o que vem prometendo. Meus quadris traidores se
movem descaradamente em seu pau duro, tampado pelo tecido da calça e
um gemido desesperado acaba escapando dos meus lábios entreabertos,
enquanto uma das mãos de Oliver deixa minha coxa e, deliberadamente
segue em direção a minha saia, enrolando-a na minha cintura.
Assim que ele vê o tecido da meia-calça fina, que esconde a
calcinha de renda branca, ele definitivamente perde a sanidade. Seus olhos
queimam em mim feito brasa quente e posso até julgar que chega arder em
proporções inimagináveis.
— Oliver... — choramingo, impaciente Ele passa a língua pelo meu
pescoço, soltando uma risada sombria e perversa. Daquelas que são uma
promessa e uma dívida em que você sabe que não sairá inteira quando ele
acabar. — Oliver, por favor.
Eu nunca fui de implorar, em principal, quando se trata de Oliver e
cá estou eu me esfregando de forma descarada em seu corpo sem pudor
algum.
Sua mão se move novamente, dessa vez, indo em direção aonde o
quero e frustrada me arqueio em sua direção. Puxo seus cabelos claros
tentando ignorar as sensações e os arrepios que seu pequeno toque está
causando em minha pele.
— Você pode ser uma boa garota e não gritar, Sum? — ele pergunta,
seus dentes beliscam o lóbulo da minha orelha. — Você pode me deixar
comer sua boceta com meus dedos, sem que alerte que estamos fodendo em
um lugar público?
Céus.
Aceno, preparada para finalmente sentí-lo, para que seus dedos
longos aliviem o latejar de minhas pernas. Ele arrasta um dedo suavemente
pela minha meia-calça e sem aviso prévio, puxa o tecido com força,
rasgando-o e me deixando apenas com a saia enrolada na minha cintura e a
calcinha agora exposta.
Seu corpo grande me prensa na madeira, enquanto uma de suas
mãos afunda em meu cabelo, puxando-me para olhar para ele. Estou em um
limbo entre implorar para ele me foder ou me deixar encarar seus malditos
olhos verdes ao mesmo tempo que me penetra. Sua outra mão viaja até
minha calcinha, colocando-a de lado e então, seus dedos estão em meu
clitóris, colocando uma pressão que me faz entreabrir meus lábios em um
gemido satisfeito.
— Não hoje, mas um dia, eu vou te foder. E não será como aquela
noite, linda — sopra, avisando. Prometendo. — Eu vou foder sua boquinha
bonita e então vou colocar tudo. Eu vou te comer de um jeito que ninguém
mais será capaz de te dar o que precisa.
De repente, sem nenhum aviso, ele escorrega um mísero dedo para
dentro de mim, fazendo com que eu me agarre em seus cabelos com
tamanha força, que ele solta um grunhido satisfeito. Enquanto o tenho indo
e vindo com indicador, sinto meu estômago contrair e minhas pernas
fraquejarem, sentindo-o espalhar minha umidade com o dedo e continuar o
movimento de vem e vai, estimulando minha boceta.
É um desespero deliciosamente agonizante. A visão do seu corpo
másculo nos tampando da penumbra das luzes do parque, nos deixando
expostos e vulneráveis, faz com que o desejo queime ainda mais dentro de
mim.
— Sua boceta é tão perfeita, linda — ele murmura contra meus
cabelos, enquanto aumenta a força de suas estocadas. — É tão molhada e
perfeita.
Arqueio contra ele, enquanto minha cabeça tomba em seu pescoço e
eu chupo a extensão de sua pele exposta, enquanto ele me fode forte com os
dedos.
Quando adiciona um segundo dedo, praticamente solto um grito.
Mas a boca de Oliver logo cobre a minha, fazendo com que absorva meu
gemido agonizante. Seus dedos continuam a trabalhar em minha entrada e o
som escorregadio deles, entrando e saindo de dentro de mim, seria o
suficiente para que eu me desfizesse.
— Ollie... — sussurro, entre fôlegos. — Meu Deus, Oliver!
Ele sorri diabólico, como se tivesse uma palavra pronta para isso.
Todavia, não diz nada, apenas aumenta a sua força, fazendo eu montar em
seus dedos descaradamente.
— Grite para mim, linda — ele tira o segundo dedo e volta a
empurrar apenas um, esticando-me. — Deixe-me ouvir o quão sujo isso é.
O volume dos meus gemidos aumenta um decibel. E, ainda sim, me
contenho, mesmo que meus músculos clamem por conta dos meu esforço,
mesmo que eu queira gritar.
— Oliver — choramingo, baixinho.
Ele morde meu pescoço e então o lambe, provocando minha entrada
com seus dedos e leva o dedão até meu clitóris.
Eu não posso gritar. Não posso correr o risco de que alguém nos
pegue nessa posição, mas, a cada vez que ele muda a posição dentro de
mim, é difícil de segurar, de me conter.
— Quando eu mando você gritar, você grita, Summer. — Sua boca
roça a minha orelha, enquanto sua voz me atinge. — Porque se não fizer
isso, vou te curvar contra aquele maldito banco e bater em sua bunda, até
que você implore para que eu pare.
Jesus Cristo.
Gemo quando ele volta a aumentar o ritmo, fazendo com um sorriso
perverso cruze meu rosto com a ameaça que, sem dúvidas, imploraria que
cumprisse.
Nós somos a epítome do inferno nesse momento. E talvez seja por
isso que quando ele bombeia mais uma vez, encontrando meu ponto G,
sinto a minha liberação chegar.
Grito, fazendo com que um sorriso satisfeito se erga nos lábios de
Oliver, ao mesmo tempo que encharco seus dedos durante meu orgasmo
trêmulo.
— Boa menina — ele murmura. — Agora abra essa linda boca.
Eu faço.
Um brilho contente invade suas íris enquanto ele leva o dedo que
acabou de retirar de mim até meus lábios e então os coloca em minha boca.
Não preciso de instrução, sei exatamente o que deseja. Passo minha língua
lentamente pelo seu dedo encharcado com meu orgasmo e, imediatamente,
sinto o meu próprio gosto.
— Você tem um gosto bom pra caralho, loirinha — conta, tirando o
dedo da minha boca e levando até a sua. — E não vejo a hora de prová-la
como se fosse a porra do meu banquete.
Ergo meus olhos cansados até seu rosto e constato que estou
completamente ferrada.
Ainda que eu saiba que, isso que está acontecendo entre mim e
Oliver vá acabar de uma forma ruim, eu almejo por mais sensações como a
de hoje.
Se você quiser se apaixonar
Se você quiser apostar em nós
Se você quiser ser meu único
Eu estarei esperando
I'll Be Waiting | Cian Ducrot

Existe um momento em que você percebe que talvez tudo o que


sempre acreditou pode ser uma bela mentira.
Como naquele momento quando nossos pais dizem que vão voltar
para buscar aquele brinquedo, mesmo que no fundo, saibamos que não se
passa de uma distração patética. É uma comparação idiota, eu sei. Contudo,
há uma explicação por trás disso.
A minha é simples: eu menti para Summer Miller. Menti quando
disse que quebraria nossas regras apenas naquele momento. Sabia que era
uma promessa sem fundamento. Uma que fiz no calor do momento, quando
aqueles olhos envoltos de desejos me prenderam em uma teia que não havia
escapatória.
Eu planejo quebrar nossas regras para sempre. Cada segundo do
nosso acordo, porque ela é o meu maldito vício. Um vício injetado em
minhas veias como uma droga mortal que, mesmo se alguém ousasse me
dar qualquer forma de cura, não aceitaria.
Eu nunca poderia.
Porque a loira ao meu lado é como meu martírio. Minha tentação
sem fim.
Uma obsessão que não estou pronto para abandonar, mesmo que eu
saiba que isso irá nos destruir e, por fim, deixará nosso acordo em
frangalhos.
E, agora que estamos presos nesse pequeno cubículo de metal, rumo
a cobertura de Brandon, me questiono o que tem de errado comigo. O
porquê de mesmo que eu seja completamente obcecado por Summer, ainda
assim, não consigo esquecer todos os planos que rondam a minha mente e
não me digno a pensar na melhor maneira de não causar a destruição da
única mulher com que me importo além da razão.
— Eu sei que acabamos de comer... — Summer murmura quando o
elevador começa a subir, me tirando de todos meus devaneios. — Mas
ainda estou com fome.
Sorrio, abandonando todos os meus pensamentos, sabendo que em
um algum momento terei que lidar com as consequências disso.
— Fome, hein? — zombo, lançando-lhe um olhar cheio de
significado. — Eu acho que posso ajudá-la com isso.
Ela pende a cabeça para trás, gargalhando. O som faz com que meu
coração morto lateje em minha caixa torácica. É a mesma sensação que
senti quando sorriu para mim no cinema. A mesma que me fez descobrir
que aquele som, sem dúvidas, é o meu favorito.
— Nós não estamos transando, Wright! — exclama, no mesmo
instante que as portas se abrem. — Então, não se anime tanto com a ideia de
me ajudar com a minha fome.
Ergo uma sobrancelha.
É estranho e ao mesmo tempo reconfortante vê-la sem suas
respostas ácidas. Olho para ela, por alguns segundos, sabendo que, por
incrível que pareça, desejo que mantenhamos esse clima não apenas nesta
madrugada, mas sim, todos os dias. Por mais que eu saiba que está assim
pelo momento que compartilhamos no parque, no fundo, acredito que
também está cansada dessa nossa guerra. De lutar em trincheiras que não
nos pertence, de ir contra nossa vontade.
Quero seguir o nosso acordo sem todos esses empecilhos, quero que
evoluamos em um nível que apenas ela pode definir, quero que seja a porra
da dona do jogo, o meu último xeque-mate antes de tudo ruir.
— Não estamos? — questiono, baixinho, abandonando meus
pensamentos.
Dou um passo em sua direção, fazendo com que fique presa entre
meu corpo e a parede do amplo corredor. Seus olhos encontram os meus e
mesmo que sejamos extremos, pólos inversos, sinto algo nos unindo como
um ímã, como se fosse possível duas pessoas tão diferentes se completarem
assim. Como se fosse tão evidente que um não seria o mesmo sem o outro,
que o seu coração só responderia um chamado se fosse meu.
É estranho e ao mesmo tempo assustador.
E, mesmo assim, me pego sorrindo como um predador para
Summer. Como se ela estivesse presa a mim, mesmo que não desejasse.
— Não.
— É mesmo? — Meu sorriso condescendente se amplia, enquanto
passo meu dedo anelar pelo seu pescoço, vendo-a engolir em seco. —
Então, se eu me aproximar de você, beijar bem aqui — circulo lentamente
sua clavícula — E então descer meus dedos até sua boceta perfeita, não a
encontrarei pronta outra vez para mim, Sum?
Ela ergue o rosto quase colidindo nossos lábios, e por um milésimo
de segundo, acredito que isso realmente acontecerá. Que, Summer, cairá
outra vez em meus braços e se jogará ao meu lado no precipício que
construímos.
Todavia, ela me surpreende. Porque no instante seguinte, sorri
abertamente e inclina o rosto para o lado, estudando minha expressão
confusa.
— Não estamos transando, playboyzinho — reafirma. — E você
ainda está dormindo no chão.
Abro meus lábios, perplexo.
Eu ainda estou dormindo no chão? Depois do que fizemos naquele
parque?
Não, Sum, eu acho que não.
Decido me abster de opiniões, pelo menos até estarmos no quarto.
Summer percebe isso, visto que se vira quando não emito nenhum
som e abre a porta da cobertura, adentrando o espaço e indo até a cozinha.
Segundos depois, quando sigo o mesmo caminho, percebo que escora seu
quadril no enorme balcão de mármore e estuda o ambiente com uma feição
embotada, amarrando o cabelo em um rabo de cabelo.
— O que você está procurando? — questiono, retirando meu relógio
e colocando-o no meu bolso.
Summer me encara sobre o ombro, terminando seu novo penteado.
— Algo para comermos. — Ela vai até a geladeira e a abre. — Acho
que não há nada aqui além de laticínios, então pode ser uma tarefa difícil.
— Encarando-me sobre o ombro, ela franze o cenho e continua: — Seu pai
é algum tipo de cara viciado em leites e queijos?
Quase solto uma gargalhada.
— Eu não saberia dizer — afirmo, parando atrás dela e segurando a
porta do eletrodoméstico, encarando tudo o que há lá dentro. — Mas,
conheço onde os melhores ingredientes estão guardados. Então, sente-se e
me deixe fazer seu lanche.
Summer vira o rosto lentamente e me encara com o cenho ainda
franzindo. Nessa posição em que estamos, nossos rostos ficam nivelados.
Posso perceber que a luz que ilumina o interior da geladeira, ilumina
também um lado de sua face, fazendo com que os olhos que me levam a
insanidade, brilhem profundamente.
— Você não precisa...
— Alguma preferência? — interrompo-a, voltando minha atenção
para frente e focando nos recipientes.
Percebendo que não desistirei, Sum apenas se distancia do meu
corpo, fazendo uma sensação de abandono percorrer meu peito. Ela morde
o lábio inferior, se senta na banqueta e escora os braços na bancada, me
lançando um olhar como o do Gato de Botas no filme do Shrek.
Solto uma gargalhada.
— Você pode fazer aquele macarrão? — pergunta, envergonhada. —
Eu realmente gostei dele.
Esbanjo um sorriso em sua direção, encostando meu quadril na porta
da geladeira e encarando-a intensamente.
— Eu posso fazer tudo o que está com vontade de comer, linda —
sussurro em sua direção.
Ela não responde de imediato e decido que, definitivamente,
Summer Miller será a responsável pela minha queda. Porque nos próximos
vinte minutos, faço o possível para conseguir preparar um macarrão
parecido com aquele que comemos em seu apartamento há algumas
semanas, quando fazia o impossível para que concordasse em embarcar
nessa situação que estamos hoje.
Caminho com dois pratos de porcelana em sua direção, observando-
a se levantar e pegar duas taças, antes de roubar uma garrafa do melhor
Merlot da adega de Brandon. O que o fará surtar quando perceber.
Poucos segundos depois, ela se senta ao meu lado e leva o garfo até
os lábios.
— Jesus, Oliver! — exclama, fechando os olhos. — Isso é
definitivamente o melhor macarrão que eu já comi.
Escancaro um sorriso, me estendo e pego sua taça, enchendo-a do
líquido roxo.
— Não deixe minha sogra ouvir isso — brinco, enrolando a massa
em meu talher. — Ouvi dizer que ela é a melhor Chef do condado. Então,
pode soar como um desrespeito.
Summer larga o garfo, pende a cabeça para o lado e solta uma risada
gostosa.
— Você é um idiota — diz, balançando a cabeça, visivelmente
achando graça do meu comentário.
— É sempre um prazer, loirinha. — Os olhos dela brilham. — Você
não está cansada?
Minha pergunta sai em um tom despreocupado. Mas, sei que por
baixo das minhas palavras, há preocupação. Posso observar seus olhos
cansados e seus movimentos que sempre são perfeitos, um pouco
desleixados. Não posso impedir que a culpa dela se sentir assim, se aposse
de mim, afinal, Summer não teve tempo para descansar desde que
pousamos, já que minha prioridade foi mantê-la o mais longe o possível
dessa cobertura até a amanhã à noite e nem ao menos pensei na
possibilidade dela se sentir cansada após horas de voo.
— Não, está tudo bem. — Leva outra garfada até os lábios. —
Divido a casa com quatro universitários, Oliver. Ficar a noite acordada já
faz parte do meu cotidiano.
Suas palavras são brincalhonas, mas sinto o amor e proteção em
cada uma delas.
— Como é? — pergunto, baixinho. — Morar com eles?
Silêncio.
Não há nada além disso, emanando dela. E por um breve segundo,
acho que não virá a responder.
— Muitas das vezes tenho a sensação de que estou morando com
todo o time de Logan. — Summer sorri. — Mas, não trocaria por nada
nesse mundo, sabe? É uma sensação inigualável os ter comigo. Saber que
posso atravessar o corredor e encontrar Josh ou Haz me esperando para
assistirmos nossos filmes preferidos, ou que posso contar com Logan para
correr comigo pela cidade quando preciso extravasar meus pensamentos. E,
também há Levi... — ela para, mordendo o lábio inferior e de repente, a
tristeza nubla as suas feições. — Quer dizer, havia ele... E-ele é um dos
meus melhores amigos. Mesmo tendo os outros, Levi sempre me
acompanhou, sempre esteve comigo e sinto tanta falta dele, sabe? Dos
nossos pedidos de pizzas com sabores questionáveis todas as quintas-feiras,
da sua mania idiota de recitar leis como se fosse receitas de bolos e de seus
gostos para roupas esportivas que me fazia gargalhar toda vez que aparecia
com uma nova sacola da Nike ou Adidas.
Ela faz uma pausa, lutando contra as lágrimas, apenas pela
lembrança de seu melhor amigo, começasse a destruísse por dentro.
— Eu sinto falta e ao mesmo tempo sei que estou tentando me
convencer do que estou fazendo é o certo, sabe? — indaga, deixando seus
olhos vagar pela cozinha. — Estou repetindo para mim mesma que tudo
dará certo. Que ele vai entender que eu não o desejo dessa forma, porque há
coisas que não controlamos. Eu... a-apenas estou tentando fazer tudo de
uma maneira que não vai machucar todos, a não ser a mim mesma. Ao
mesmo tempo sinto que estamos destruindo qualquer resquício da família
que construímos e isso está me assustando. Porque eu não quero perdê-los.
Eu não posso perdê-los.
Suspiro fundo, quando a voz quebrada de Summer chega até meus
ouvidos. Sem pensar, me inclino para frente, ficando perto o suficiente dela
para que observe meus olhos e saiba que o que eu irei dizer é a mais pura
verdade.
— Nós não controlamos o sentimento dos outros, Sum — sussurro,
brincando com seus dedos. — E não podemos ser responsáveis pelas
atitudes deles também. Não é culpa sua o que está acontecendo. Não é culpa
sua que Levi tenha criado sentimentos unilaterais. E não é culpa sua que
não consiga retribuir como ele deseja. Você não pode controlar essas coisas,
mas se serve de consolo, ele perceberá o que pode perder.
Ela ergue o rosto, encarando-me intensamente.
— Como você sabe disso?
— Porque um dia eu também confundi os sentimentos pela minha
melhor amiga — solto a verdade, que quase me custou a minha irmandade
com Vee e que é um assunto que odeio tocar, porque é um resquício do
quão quebrado estava. — Quando Sophie morreu e Verônica ficou
machucada por dentro, achei que a minha dor combinava com a dela. Que
se eu a ajudasse a esquecer que estava ferida, também poderia me ajudar.
Que, talvez, a ideia de sermos duas pessoas com problemas maiores do que
podíamos suportar, poderia ser o que precisávamos... Por um breve
momento, achei que realmente poderíamos ser bons um para o outro.
Sermos certos juntos.
Summer ergue uma sobrancelha, descrente. Enquanto solto um
sorriso incrédulo, me lembrando de que fui um idiota por quase ter
estragado uma das coisas mais bonita em minha vida.
— Você realmente fez isso? Se declarou para Verônica?
— Infelizmente.
— E o que ela fez?
Empertigo-me.
— Chutou minha bunda, claro. Depois me disse que nunca poderia
amar alguém novamente, porque o amor já tinha lhe custado o suficiente —
digo as mesma palavras que Vee proferiu em minha direção. — Mas, não
era necessário ela dizer essas coisas, porque no momento em que as
palavras saíram dos meus lábios, percebi o quão foi errado. Como aquilo
soava como uma traição a nossa amizade, sabe? — Uma careta
involuntária nasce em meu rosto. — Foi como se nem eu mesmo
acreditasse naquelas palavras, porque no fundo, eu já sabia que nossos
corações nunca se pertenceriam dessa forma e que estaríamos destruindo a
nossa amizade por nada.
— Nada o fez mudar de ideia? — pergunta, baixinho. — Você
passou quatro anos ao lado dela e não pensou nisso outra vez?
Sorrio.
— Não.
— Por quê?
— Porque eu aprendi que nós podemos ter almas gêmeas na
amizade também.
Summer me encara por alguns segundos e, de repente, sopra uma
risada que faz meu estômago dar um salto.
— Obrigada. Isso me dá esperanças — murmura em minha direção.
— Mas, preciso perguntar uma coisa: Logan sabe dessa declaração?
Lanço a ela uma piscadela, me levantando.
— Claro. Ele até mesmo quis chutar a minha bunda também —
conto, sorrindo. — Agora vamos, você está quase caindo de sono.
Ela faz o que digo sem nem mesmo praguejar e quando estamos no
patamar da escada que me cai a ficha de que agora é o momento pelo qual
esperei:
O nosso clichê de uma cama só.

Summer encara sua mala com uma expressão estranha. É como se a


qualquer momento um monstro fosse atacá-la ou entre suas roupas
houvesse um artefato roubado de um dos maiores museus do mundo.
— Você está bem? — pergunto, levantando uma sobrancelha.
— Hum? — Responde ainda encarando sua mala.
Encosto meu quadril na mesa lateral, encarando-a.
— Você está encarando suas roupas como se elas estivessem prestes
a te atacar, loirinha — brinco, sorrindo. — Então... você está bem?
Ela morde o lábio inferior, puxando algo e estendo a mão para pegar
uma necessaire, enquanto se vira quase que nervosamente para ir até o
banheiro.
— Eu... hum... Nada que eu não possa lidar — joga as palavras sem
sentido algum, enquanto praticamente corre até a porta e a fecha.
— Ok — digo para o espaço vazio.
Solto uma risada nasal, enquanto sigo para o meu closet, a fim de
tirar minha roupa e cair na cama. E decidindo que Summer definitivamente
pode vir a ter uma síncope a qualquer momento se não relaxar.
Contudo, não é bem ela que ronda meus pensamentos no momento,
não quando tenho a certeza de quando acordamos amanhã, Brandon fará do
meu dia um inferno, apenas para provar que ele está no controle da
situação. Além disso, há Andrew que chegará pela manhã e precisará lidar
com a notícia do noivado e não tenho ideia de como ele reagirá desta vez.
Pendo a cabeça para trás, suspirando fundo indo até o
compartimento onde guardo uma parte da minha coleção de relógios. Retiro
do bolso o objeto que ganhei a alguns anos da minha avó e me preparo para
guardá-lo, contudo, quando abro uma das gavetas, passos leves fazem com
que erga meu rosto, encarando minha nova companhia.
— Qual é o seu lance com relógios? — Summer indaga, curiosa.
Sorrio, abrindo meus lábios para respondê-la, porém, esqueço todas
as palavras que estavam prestes a sair, porque, nesse momento, entendo o
motivo pelo qual encarava suas roupas com uma expressão aterrorizante.
Entendo o porquê Summer correu para o banheiro e se trancou lá, entendo
tudo ao mesmo tempo que amaldiçoo Verônica Blackwell com todas as
maldições que possam rondar minha mente.
Pois, no momento em abaixo meu olhar, me deparo com Summer
Miller vestida em uma camisola de cetim preta, que possui uma pequena
fenda na lateral envolta de uma renda leve e delicada. O tecido molda seu
corpo fodidamente sensual de uma forma que faz com que meu membro
pulse instantaneamente em minha calça e um maldito desejo percorra
minhas veias.
Faz com que pensamentos impuros, dela deitada entre minhas
roupas enquanto me enterro dentro dela, fodendo-a em todas as posições e
então ajoelhando-a no tapete felpudo, calando-a com meu pau em sua boca
gostosa, ronde minha mente e gotículas de suor escorra pelas minhas costas.
É a porra do meu purgatório.
— Oliver? — chama, erguendo uma sobrancelha.
Ela dá um passo em minha direção e o movimento faz com que o
tecido suba mais, mostrando toda sua pele delicada.
Jesus. Eu estou fodido.
— Não me diga que Verônica colocou essa camisola em sua mala —
murmuro, rouco.
Ela revira os olhos e me lança um olhar desgostoso. Descrente de
que eu realmente cogitei a ideia de que ela traria uma peça dessa para nossa
viagem.
Deus, Pequena Blackwell, eu te odeio nesse momento.
— Infelizmente. — Suspira. — Por quê?
Porque eu definitivamente estou prestes a te foder.
Solto uma respiração profunda.
— Porque estou pensando seriamente em ajudá-la a quebrar os
saltos dela depois que voltarmos — conto, me virando e tomando uma
respiração profunda, a fim de me restabelecer.
Céus, eu pareço um adolescente prestes a ter seu primeiro
orgasmo.
Sigo até onde meus pijamas estão e retiro de lá uma calça de
moletom e uma camisa de algodão branca, demorando mais do que o
suficiente para me virar outra vez. Quando enfim volto minha atenção à
loira, Summer está parada perto de onde guardo todos meus relógios.
— Então... o seu lance com os relógios? — pergunta novamente.
Me aproximo lentamente, parando ao seu lado e tentando ignorar
totalmente sua roupa. Mas, quando sua cabeça fica rente ao meu peito e ela
precisa olhar para cima, me dando a maldito visão do decote delicado,
definitivamente sei que estou por um fio de perder a minha sanidade.
— É uma coisa de família — falo, me virando para frente. — Meu
bisavô começou a colecionar, depois passou para meu avô e então, para
mim. Nós sempre carregamos um conosco.
— Por quê? — questiona, de repente, passando a mão pelos
acessórios.
— Para nos lembrar que o tempo é um instante. — Imito o seu
movimento, dedilhando os relógios que são passados de geração em
geração. — Você pode achar que tem todo o tempo do mundo, mas tudo
pode mudar no instante seguinte. Tudo o que você acredita, pode ser
alterado em um instante. Por isso, sempre usamos. Para nos lembrar que o
tempo é precioso e a realidade maleável.
Summer ergue o rosto novamente, há tantas coisas que ela deseja
falar, tantas coisas que quero que me diga, mas não há nada saindo de seus
lindos lábios.
Há apenas ela me encarando intensamente.
Há desejo. Luxúria. E há nós.
Nós nesse ímpeto segundo. Lutando contra o que queremos
novamente porque prometemos que seria apenas aquela vez deixaríamos
tudo ruir.
— Se o seu tempo é precioso, Oliver — sussurra. Sua voz é calma,
mas soa como um canto de uma sereia. — Com o que você desejaria gastar?
Como você passaria todos os instantes que possui?
Encaro seu rosto com tanto fervor, que chego a constatar que somos
explosões que se transformam em pequenos pedaços e se perdem no céu
estelar. Somos um conjunto de quase todos os átomos de estrelas antigas.
Novamente somos tudo e nada.
Wright e Miller.
Transbordando em um oceano.
Somos um acordo. Um segredo. Uma mentira.
— Você. — Sopro em seu rosto. — Eu passaria todos os meus
instantes com você.
No momento seguinte, estou sobre ela, segurando seu rosto e
encarando suas pupilas dilatadas, enquanto caminhamos cegamente até uma
parede lisa. A mão delicada de Summer segura meu braço nu, no mesmo
instante que suspiro fundo deixando minha testa cair sobre a sua. Sou
obrigado a puxar meu ar para fora e para dentro, tentando me segurar, me
estabilizar antes que eu faça algo que me arrependerei, ou pior, que faça
com que Summer se afaste completamente de mim.
— Eu realmente falei sério quando disse que estou me segurando,
Sum — o apelido deixa meus lábios como uma oração suave. — Eu estou
tentando não foder com tudo outra vez. Estou tentando... não te atrair para a
minha bagunça. Porque se eu fizer isso. Se eu te tiver outra vez, não
conseguirei te deixar ir. Você vai ser minha, Summer. De corpo e alma.
Seus olhos se tornam chamas incandescentes.
Uma mão sobe até meu rosto, segurando-o como se quisesse ter
certeza de que tudo é realmente real. De que eu sou real.
— Isso é um acordo. Uma farsa. Nós já quebramos as regras hoje,
não podemos quebrá-las novamente. — Summer suspira, mas vejo que suas
palavras são mais para si do que para mim. — Porque se fizermos isso,
vamos nos machucar. E eu não posso me machucar mais do que já fui
machucada, Ollie...
Sorrio, percebendo que nesse momento que somos uma explosão de
estilhaços.
Somos explosões e ao mesmo tempo uma bela poesia que está em
perfeita desordem.
— Eu me destruiria antes mesmo de pensar em machucá-la, linda.
Você não compreende o que eu seria capaz de fazer por você — sopro as
palavras tão baixas que quase nem mesmo as ouço. — Você é tudo o que
me importa, Sum. Tem sido desde que forjamos esse maldito acordo e
mesmo que eu saiba que nunca poderá ser minha de verdade, eu aceito o
meu tempo emprestado. Aceito todos os nossos instantes. Porque eu prefiro
mil vezes poder ter momentos incríveis ao seu lado do que não ter nada.
Eu me aproximo, roçando meu lábio no seu. Um toque leve, quase
me fazendo perder o controle. É um toque como mel, daqueles raros,
viciantes. E sei que necessito de mais, preciso que isso não seja o fim.
Eu preciso de Summer Miller tanto quanto preciso de oxigênio.
— Ollie...
Um telefone toca. O barulho faz com que Summer abra os olhos,
percebendo que estou à beira de perder a sanidade. Que meus olhos são
nebulosos, envoltos a um desejo sobrenatural.
Então, ela faz o que é mais sensato e covarde para o momento.
Ela corre.
Me deixando sozinho e praticamente morrendo pelo seu toque.
Agora mesmo eu gostaria que você estivesse aqui comigo (oh)
Porque agora mesmo tudo é novo para mim (oh)
Você sabe, eu não posso lutar contra o sentimento
E todas as noites eu o sinto
Right Now | One Direction

Eu não esperei Oliver acordar na manhã seguinte.


Para ser sincera, acho que não poderia. Não quando minha mente
ainda estava nublada por um desejo incontrolável, que compartilhamos
naquele closet, e meu juízo ainda não havia retornado ao meu corpo.
Apenas me levantei assim que o sol nasceu e fui sorrateiramente até
o banheiro, fazendo toda a minha higiene matinal com o mínimo de barulho
possível e quanto voltei para o quarto, ele ainda estava em seu sono
tranquilo atrás da muralha de travesseiro que construí enquanto estava ao
telefone, depois que fugi do ambiente em que estávamos.
Suspiro fundo assim que estou no corredor e começo a caminhar
rumo a qualquer lugar longe daqui, longe dos meus pensamentos confusos e
da minha vontade imensurável de quebrar todas as regras que eu mesma
impus. Durante todo percurso, oro para que ninguém me intercepte ou que
algum funcionário me veja fugindo como uma covarde.
Porque é exatamente isso o que eu sou.
Olho para o primeiro andar vazio e silencioso, exalando uma
respiração longa e começo a descer as escadas lentamente.
— Sabe, eu odiaria dizer para meu irmão que a namorada dele está
fugindo antes mesmo do café da manhã — uma voz divertida soa atrás de
mim.
Dou um sobressalto, segurando o corrimão.
— Jesus, Andrew! — exclamo, me virando. — Alguém já te disse
que não se deve assustar alguém? Principalmente quando estão descendo
uma escada?
Ele solta uma gargalhada.
— Eu te pegaria se caísse, cunhadinha.
— Eu não confiaria em você para isso — devolvo cruzando os
braços frente ao corpo.
Andrew, inclina a cabeça para o lado, ainda sorrindo.
— Alguém já disse que o seu humor pela manhã é idêntico ao do
meu irmão?
— Alguém já te disse que você tem a mesma personalidade que a
dele? — devolvo, erguendo uma sobrancelha.
Seu sorriso aumenta e estou cogitando a ideia de me virar e sair pela
aquela porta e não voltar. Talvez, eu até mesmo possa conseguir um voo
direto para Saint Vincent antes que Oliver perceba minha falta.
— É uma característica exclusiva dos Wright! — conta, orgulhoso.
— Mas, se me permite perguntar: onde está indo a essa hora? E vestida
como se fosse participar de uma maratona?
Solto um suspiro, deixando meus ombros murcharem.
— Correr.
Ele balança a cabeça, concordando.
— Ótimo — afirma. — Me dê dez minutos.
Um vinco se forma entre minhas sobrancelhas.
— Para?
— Trocar minhas roupas, ora — fala, como se fosse o óbvio. — Ou
você realmente achou que eu deixaria minha cunhada preferida sair sozinha
pelas ruas de Nova York?
Inclino a cabeça para o lado.
— Acredito que eu seja sua única cunhada.
Ele dá de ombros, se virando.
— Ainda assim, a minha preferida — diz, já indo em direção ao seu
quarto. — Dez minutos, Sum. E se você me deixar para trás, eu vou acordar
Ollie e contar que fugiu.

Andrew Wright não estava brincando quando disse que precisava


apenas de dez minutos para se trocar. Exatamente após esse tempo, ele
desce as escadas pronto para me acompanhar em uma das minhas corridas.
Não que eu quisesse companhia. Na verdade, preferiria fazer isso
sozinha. Precisava extravasar tudo o que queima em meu peito antes de
encarar Oliver outra vez, antes de deixá-lo saber que não podemos mais
brincar com fogo sem sairmos queimados.
Suspiro tomando um fôlego à medida que corremos pelas ruas
pouco movimentadas do bairro onde o pai deles mora. Andrew, por incrível
que pareça, não é a pior companhia do mundo, ele até mesmo pode se
comparar a Parker. Contudo, diferente da loira que se mantém quieta por
parte do percurso, ele gosta de conversar, de saber que estou à vontade.
Andi não me deixa sumir em minha própria cabeça e que os meus demônios
me puxem para um lugar que não anseio por estar outra vez.
— Você sempre faz isso? — questiona, cortando o silêncio e
franzindo o cenho cansado. — Correr pela manhã?
Diminuo meus passos assim que viramos uma esquina rumo ao
Central Park. O maldito parque que agora contém memórias vívidas em
minha mente.
— Não todos os dias. — Expiro fortemente. — Algumas vezes por
semana. Outras faço apenas porque minha mente fica agitada o suficiente
para que eu precise de uma válvula de escape, para fazê-la calar a boca.
Ele me olha de esgueira.
— Como hoje?
Devolvo o olhar. Decidindo que eu não quero começar o meu dia
com mais um número considerável de mentiras.
— Talvez.
— Ollie pode ser difícil de lidar, às vezes — conta, sorrindo. —
Mas, ele é a melhor pessoa que existe no mundo. Então se ele te irritar,
apenas ameace quebrar todos aqueles relógios ridículos dele e então o verá
comer na sua mão.
Solto uma pequena gargalhada.
— Vou me lembrar disso — afirmo. — Você e ele são próximos, né?
— Como carne e unha. Ollie sempre fez de tudo para suprir a falta
da nossa mãe e até mesmo do papai. — Seus olhos brilham com orgulho. —
Meu irmão me ensinou a ser quem eu sou hoje. Mesmo que não fosse
responsabilidade dele, ele fez isso. Ollie me mostrou que nunca devo
esperar que alguém me faça feliz, quando eu mesmo posso ser a minha
própria felicidade. Ele... foi a minha base quando todo mundo nos
abandonou naquela mansão, Summer.
Olho para Andrew por alguns segundos, quieta. Os olhos
acinzentados, tão diferentes dos de Oliver, me indicam que talvez tudo o
que sei sobre Wright, pode ser apenas a ponta do iceberg. Ele não é apenas
um rico mimado da Parte Alta, que usa a sua influência e seu sarcasmo para
se proteger do que aconteceu em seu passado.
Não, Oliver é mais que isso. Ele é a esperança e o porto seguro de
Andrew. Ele faz com que a luz do adolescente ao meu lado, não suma,
mesmo que o lado da sociedade em que pertencemos seja como um veneno
que mata lentamente.
Ele é para Andrew a luz no fim do túnel, daquelas que nos fazem
desejar a sensação que queima nosso peito e se apossa do coração. E Oliver
é para Andrew, aquilo que meus amigos são para mim, aquilo que nunca
pode ser tirado do meu peito, mesmo que esse órgão podrido seja dividido
entre duas partes, sendo uma delas aquela que presenciou o que monstros
podem fazer quando possuem oportunidade e a outra que é envolta em
esperança.
Uma esperança que apenas começou a ser cultivada após uma noite
qualquer, em um píer abandonado entre dois desconhecidos, que já não
acreditavam em segundas chances da vida.
— Eu fico feliz por isso, Andi — sussurro, verdadeiramente. —
Acho melhor voltarmos antes que eles deem nossa falta.
Ele abre o maior dos sorrisos, enquanto segue o mesmo caminho.
— E você realmente acha que meu irmão não sabe que você está
fora? — indaga, sarcasticamente. — Sum, você poderia estar a anos luz de
distância que Ollie encontraria uma forma de saber onde está.

Eu não vi Oliver durante todo o dia. A não ser pelo nosso rápido
café da manhã, quando praticamente me engoliu com os olhos e mal
conversou com qualquer pessoa da mesa. É como se todo o mal humor do
universo tivesse se personificado no loiro.
Além disso, de ter que observá-lo daquela maneira, também havia o
fato de que não conseguimos nem ao menos conversar sobre a noite
passada, ou chegarmos a um acordo que tudo não se passou de um maldito
erro que não podemos cometer outra vez.
Todavia, isso claramente não aconteceu. No momento em que ele
terminou seu desjejum, Brandon o interceptou e o obrigou a acompanhá-lo
até a empresa da família, a fim de participar de vários compromissos.
— Você está me evitando — a voz de Oliver soa atrás de mim,
fazendo eu ter um sobressalto e o encare sobre meu ombro. — E está
fazendo isso desde a madrugada.
Estamos em seu quarto e nem ao menos sabia que havia chegado.
Para ser sincera, achei que iríamos nos encontrar apenas no baile, já que
está quase na hora de sairmos. Suspiro fundo, me virando e apoiando as
mãos em minha cintura, o encarando com o cenho franzido.
— Não, não estou.
— Você está — afirma, convicto. — Depois que Amber me ligou
para dizer que Andi estava chegando mais cedo em casa, você
simplesmente evaporou. E quando acordei você havia saído. — Um sorriso
falso nasce em seu rosto. — Então, sim, loirinha, você está me evitando.
Dou de ombros, ignorando-o e caminhando até o enorme closet, a
fim de realmente começar a me arrumar. Porém, não me surpreendo quando
sinto Oliver vindo atrás de mim, abrindo um maldito relógio em seu pulso e
me encarando com os olhos envoltos a labaredas de fogo.
— Eu estava cansada. Apenas fui dormir — minto, por fim. — E,
nós nos vimos no café da manhã, Oliver. Pare de ser dramático.
— Mentirosa — joga a palavra fazendo com que eu o encare.
— Não estou entendendo o seu ponto aqui. Muito menos o motivo
pelo qual voltou tão estressadinho da empresa de seu pai. Porém, não me
importo, porque precisamos nos preparar para o baile e você está nos
atrasando — gotejo as palavras nervosamente. — Então, por favor, me
poupe de seu surto involuntário e vá se arrumar.
Ele solta uma maldita risada que me faz meu rosto transformar-se
em um semblante irritado.
Oliver havia me deixado com Andrew durante o dia todo. Não que
eu me importasse de ficar com Andi, ele é uma boa companhia. Nós até
mesmo conseguimos descobrir que temos vários livros em comum, como a
distopia de Maze Runner[21] e Jogos Vorazes[22].
Porém, mesmo que houvesse Andi para me fazer companhia, uma
sensação incômoda se apossou de mim. Afinal, esse não é meu habitat
natural, não é a minha casa e a cada vez que eu andava pelos corredores, me
sentia como se eu fosse uma intrusa em terras inimigas. Então, Oliver que
me desculpe, mas a única pessoa que poderia estar totalmente irritada nesse
âmbito, sou eu.
Não, fodidamente ele.
— Nós somos os malditos donos do baile, Miller. Podemos chegar
quando desejarmos! — exclama, indo até onde está seu smoking. — Então,
se quisermos chegar no final dele, nós chegaremos.
Ergo uma sobrancelha, cruzando os braços frente ao corpo.
— Me desculpe, mas pontualidade é algo que prezo, Wright.
Oliver solta uma gargalhada fria.
— É sério? Não é o que está demonstrando ultimamente! — ele
debocha, olhando-me por cima do seu ombro.
Solto uma lufada de ar.
— Por que caralhos você está tão nervoso? — praticamente rosno.
— E não venha me dizer que é porque estou te evitando. Nós dois sabemos
que será uma maldita mentira. Se algo está acontecendo, esse é o momento
para me dizer, Oliver. Antes que eu me irrite ainda mais, abandone essa
farsa e volte para casa.
Ele sorri um sorriso perigoso, frio. Caminha até onde estou, parando
a poucos centímetros longe de mim e me encara ferozmente. Posso dizer
que suas pupilas me entregam tudo o que guarda para si e mesmo que eu
tente lutar contra, seus olhos travam uma batalha contra os meus.
— Você quer a maldita verdade, Summer? — o tom sarcástico de
Oliver, me faz perder os nervos. — Quer saber o que ficou na minha mente
o dia todo? O que está rondando a minha cabeça nesse exato momento?
Me aproximo dele, sustentando o olhar que ele me direciona.
— Não há nada no mundo que eu deseje mais do que isso, Wright!
— sibilo. — Então, por favor, esclareça-me o porquê está agindo assim.
Ele me fuzila com o olhar.
Há uma guerra dentro dele.
Há tudo o que não estou pronta para saber, porém quero.
Quero saber o que o está afligindo, quero saber se aquele momento,
se a nossa pequena aproximação desde que pousamos em Nova York está
mexendo com sua cabeça como está com a minha.
— Porque eu estou ficando maluco, Summer — ele devolve, rouco,
passando as mãos pelo cabelo e fechando os olhos por um segundo. —
Estou ficando completamente maluco.
Capturo o vislumbre de suas íris verdes, engolindo em seco na
medida que me perco nelas. Desejo que a próxima pergunta não saia dos
meus lábios, desejo que o mundo se exploda e que o tempo pare, porque sei
que isso que está acontecendo é, nada menos, que o começo da nossa
queda, o paradoxo de tudo o que acreditamos.
— Maluco pelo quê?
— Por você.
Não sei como agir, talvez até mesmo como respirar.
Apenas sei que a tensão dentro desse closet se intensifica. Sei que
mesmo se o mundo se partisse em um milhão de coisas como desejei há
segundos atrás, não seria suficiente para quebrar essa conexão similar a
todas as estrelas do universo, alinhadas a uma sentença com o brilho de cem
mil sóis.
Nada seria suficiente, porque a intensidade arrebatadora das pupilas
de Oliver se mistura com a compreensão do castanho das minhas,
mostrando o quanto estamos prestes a transbordar, prestes a derrubar a
muralha que moldamos após a noite na fraternidade.
É o começo do nosso fim.
A farsa se emaranhando a realidade.
A guerra pedindo passagem para a paz.
O desejo sucumbindo a todos os outros sentimentos que
escondemos.
— Bem, isso é um problema que eu convivo desde o maldito beijo
naquela festa — ralho, dando um passo para trás, me afastando, mas ainda o
encarando-o. — Então, Wright, sinto muito em lhe dizer que você terá que
aprender a lidar com essa maldição como eu fiz.
Ele me encara por alguns segundos, dando um passo em minha
direção.
— Bem, eu fodidamente irei fazer isso! — exclama.
— Ótimo!
Nossos olhos travam uma batalha e, no meio de um suspiro regado a
passos rápidos de Oliver, nossos lábios se chocam.
Não é um beijo como aquele que compartilhamos na festa ou no
parque. Esse é diferente de todos os outros. É animalesco, possessivo. É tão
quente que chega a queimar toda minha pele. É uma dança bem
coreografada, uma que vibra dentro de mim. E faz o êxtase interno se
multiplicar. Sinto a dor da intensidade me invadir e me queimar com força
sobrenatural.
Oliver se afasta por um mísero segundo, caminhando até que minhas
costas se colidem com uma parede lisa em um baque surdo. Ele leva a mão
até meu pescoço, segurando com uma força que não me impede de respirar,
contudo, me faz desejar por mais. Por ele. Oliver sabe disso e eu tenho
certeza no momento que abaixa a cabeça, rumo a minha clavícula, raspando
os dentes e trazendo consigo uma sensação desesperadora.
Uma sensação que o sinto em todos os lugares. Sinto minha boceta
pulsar e implorar por atenção. Sinto-o com tanta sede e voracidade, que
chego a acreditar, que estou à beira de colapsar. E não é apenas isso. A cada
toque de sua pele contra a minha, posso sentir a corrente elétrica, a
adrenalina correr sob minhas veias e todas as minhas cargas sendo
descarregadas em meu peito com precisão.
Meus dedos sobem até seu cabelo, e prende os fios entre eles,
puxando-os com força, para que chegue mais perto e se funda a mim. Solto
o ar pela boca, quando suas mãos seguram a borda da minha camiseta e a
sobe, retirando-a do meu corpo e me deixando apenas com o sutiã de renda.
Oliver aproveita a minha pele nua e arrasta o dedo pela extensão do meu
abdômen e então sobe lentamente, arrastando o tecido do sutiã para baixo e
apertando meu seio com força, enquanto um dedo se arrasta pelo meu
mamilo eriçado.
A fricção é suficiente para me fazer perder a sanidade, no momento
seguinte, estou desabotoando sua camisa, com um movimento rápido que
até mesmo posso ter certeza de que alguns botões foram arrancados no
caminho. Contudo, Oliver não me deixa retirá-la e, de repente, ele segura a
minha cintura como se eu não pesasse nada, e suspende meu corpo,
posicionando-se entre minhas pernas e fazendo com que minhas pernas
rodeiem seu corpo, caminhando comigo até a ilha no centro do cômodo,
que acomoda todos os seus relógios e me deita sobre ela.
— Porra, eu quero te foder tanto — Sua voz sai num rosnado e ele
quase arranca minha calça no processo. — Eu quero comer você com tanta
força que cada partícula sua vai me sentir no próximo dia. E eu vou fazer
isso. Não agora, mas eu vou. E quando acontecer, você pode ter certeza de
que quando terminamos, estaremos arruinados para outras pessoas, linda.
Cada palavra proferida faz com que os pelos da minha nuca se
erricem.
Todos os meus pensamentos somem quando ele termina de retirar
minha calça jeans me deixando apenas de calcinha e então se inclina para
frente, sorrindo como uma onça prestes a atacar sua presa e posiciona
minhas pernas sobre seus ombros, fixando-me no lugar, sem nenhuma
chance de fuga.
O primeiro toque de seus lábios veio no topo da minha barriga lisa,
o outro um pouco acima do umbigo e então seus dedos estão subindo
lentamente em minhas pernas, passando pelas minhas coxas e por fim,
segurando a parte interna delas com uma força que faz desejar por mais.
Ansiar pelo que está por vir.
Ele arrasta dois dedos devagar pelo tecido da minha calcinha
encharcada e solta um sorriso convencido, erótico.
— Sempre tão molhada para mim, loirinha — murmura, fazendo
uma pequena pressão, enquanto seu dedo indicador roça levemente a borda
do tecido. — Eu lhe disse que iria acabar com você de um jeito que
ninguém mais será capaz de te dar o que precisa. Agora… estou prestes a
começar a cumprir com a minha palavra.
Ele não dá tempo para que eu possa processar suas palavras, porque
no momento seguinte, Oliver arrasta a calcinha para o lado e projeta sua
língua para fora, umedecendo o lábio inferior de modo predatório. Então,
sua boca está em mim, lambendo minha carne, sugando tudo, me levando
ao limite.
É impossível controlar o gemido que escapa da minha garganta
quando ele segura fortemente minhas coxas, elevando minha bunda,
abrindo-me mais e me deixando completamente exposta para que possa
tomar tudo e me levar ao limite.
— Você é deliciosa! — Ele beija o caminho entre meu clitóris,
lambendo a extensão de toda a minha intimidade. — Agora, por favor, abra
mais essa boceta para mim, linda.
Eu o obedeço.
Deus. Eu poderia fazer qualquer coisa que me pedisse nesse
momento, contanto que ele não pare, que me fizesse sentir essa sensação
que me levasse ao limite.
Oliver percebe que estou perdendo o controle, no segundo em que
arqueio minhas costas e me esfrego descaradamente em seu rosto,
obrigando-o a me foder com a língua de forma brutal. Ele acrescenta um
dedo a nossa dança, em um movimento de vai e vem.
O fôlego é roubado dos meus pulmões e outro dedo me penetra,
enquanto a língua dele me saboreia como se eu fosse um oásis e ele
estivesse faminto.
Sucumbo a invasão tortuosamente deliciosa e me arqueio. Pedindo
por mais, suplicando para que ele me foda como sempre quis, e me deixe
cair nessa doce agonia.
Oliver me encara sobre a nossa nuvem de luxúria e então solta um
sorriso perverso, como se soubesse que estou a ponto de implorar por mais,
por ele.
Movimento meu quadril, montando em seus dedos, desesperada por
fricção, assim que sua língua impetuosa se arrasta pela minha fenda, me
devorando lentamente. Ofego, desesperada por mais, ao passo que os dedos
de Oliver se movimentam, fazendo-me estremecer e cair para trás,
levantando a cabeça e entreabrindo os lábios.
— Oh, meu Deus! — grito, segurando fortemente o móvel abaixo de
mim. — Ollie, eu vou...
De repente, sou tomada por espasmos, em um êxtase brutal que
desce pela minha espinha, fazendo-me explodir em mil pontos brilhantes,
no instante que me desfaço em sua boca, jorrando todo meu orgasmo nele e
esquecendo as palavras que estavam prestes a sair dos meus lábios.
Ainda estou me recuperando do meu orgasmo quando ele me senta
no móvel se colocando entre minhas pernas e afasta o cabelo suado do meu
rosto, delicadamente. Nossos olhares colidem e uma sensação diferente de
tudo o que já senti, enche o meu peito.
A gentileza em seu toque está totalmente em desacordo com a
selvageria com que ele fode. E mesmo assim, quase ronrono em
contentamento, porque, como da outra vez, esse mesmo homem me deu o
melhor orgasmo da minha vida, fez as vozes em minha cabeça se
silenciarem e me fez esquecer da sensação de sujeira que sempre me
acompanhou quando permitia que alguém me tocasse.
Oliver, mesmo que não saiba, me fez sentir viva. Ajudou-me a me
entregar verdadeiramente ao prazer e a me deleitar com todas as sensações,
sem que as lembranças sejam como uma nuvem sobrecarregada sobre
minha mente.
— Vamos, linda — ele murmura. — Nós temos um baile para ir.
Oh minha querida, você parece Hollywood, hm
Eu acho que você vai me machucar mesmo que você disse que nunca faria,
ah, ah
Eu tenho medo que você vai amar e me deixar aqui esta noite, eu
Você pode ser a paranóia em minha mente
Be The One | James Arthur

Eu a quero.
Eu a quero não apenas em um parque vazio durante uma madrugada
ou em um closet, enquanto proferimos maldições um para o outro, porque
estamos malucos demais para perceber o que está acontecendo entre nós
desde que forjamos esse acordo.
Eu a quero completamente. Corpo e alma. Quero tanto que até
mesmo estou cogitando a ideia de acabar com toda essa farsa apenas para
tê-la por inteiro, para que enfim possamos parar de fingir que não nos
desejamos, que essa desculpa de que vamos quebrar as regras apenas uma
única vez, é uma besteira.
Até mesmo ela sabe disso. Nunca poderemos fingir que não
sentimos essa atração infernal ou superemos todos os momentos posteriores
ao dia em que nossos olhos se encontraram no Oásis.
— Nós estamos atrasados — sua voz preocupada invade meu
subconsciente.
Viro-me lentamente, sorrindo, pronto para proferir alguma coisa que
a fará sorrir para mim. Um daqueles sorriso que solta quando está irritada e
encaminha uma pontada costumeira em meu peito.
Porém, todos os pensamentos me abandonam quando meus olhos
focam no patamar da escada, onde Summer está segurando o corrimão e
encarando-me com uma sobrancelha arqueada.
Ela joga os cabelos claros por cima do ombro, fazendo as mechas
onduladas se estendam pelas suas costas, me dando a visão do topo de seu
decote acentuado, do vestido vermelho que desce até seus pés e possui uma
abertura lateral.
É a mais bela das obras primas já feitas no mundo.
Sum leva a mão ao seu rosto, prendendo uma mecha solta de seu
cabelo atrás da orelha, continuando a descer lentamente os degraus, me
permitindo ver o pequeno brilho do brinco que aderna sua pele.
Assim que para em frente a mim, minha respiração fica presa na
garganta. Porque a mulher que é meu maior vício e que sei que possui todos
os meus pensamentos, é incrivelmente deslumbrante.
Não, ela é mais que isso.
Porra, não há palavras para descrever Summer nesse momento.
Tenho a convicção de que nem mesmo o mais inimaginável dos adjetivos
chegaria aos pés dela.
Summer é como uma arte que é guardada nos cofres dos maiores
museus do mundo, protegida de todos e que possuem uma beleza
incomparável. E confirmo isso, quando seus olhos brilhantes que são como
uma poesia oculta, feita para lermos calmamente, trecho por trecho,
decorando rimas e apreciando a beleza, seus lábios se transformam em um
sorriso tímido.
Um maldito sorriso extraordinário.
— Se você não parar de me encarar assim — diz, franzindo o cenho,
porém o sorriso ainda se faz presente em seu rosto. — Serei obrigada a ir lá
em cima e colocar uma blusa com a estampa do Peter Parker ou até mesmo
do Hulk.
Solto uma gargalhada, dando um passo à frente, me aproximando
dela.
— Eu não me importaria. — Inclino a cabeça, arrumando a minha
gravata borboleta. — Acho que até mesmo vou implorar para que faça isso.
Uma sobrancelha dela se ergue.
— Você vai? Por quê?
— Porque talvez ter o rosto do Homem-Aranha ou do Hulk
estampado em sua blusa, pode me ajudar a espantar todos os riquinhos de
merda que vão tentar te roubar de mim — conto, sorrindo abertamente.
Summer ergue o rosto, me encarando intensamente.
— Está dizendo que minhas roupas serão mundanas demais para o
baile do seu pai?
Balança a cabeça, soltando uma risada nasal.
— Nada é mundano quando se trata de você, loirinha — afirmo,
passando a língua pelo meu lábio inferior e percebo que Summer
acompanha o gesto. — Você se destacaria até mesmo se estivesse vestindo
apenas uma roupa em frangalhos.
Ela me encara por alguns segundos.
Há algo nublando suas pupilas que leva cada fragmento de
autocontrole do meu corpo. É como se a sensação que queima meu peito
fosse familiar. Como se atrás de toda luxúria, todo sentimento confuso,
houvesse algo que ela deseja me confessar, contudo não consegue.
— Eu acho que está enganado — murmura, no mesmo instante que
percebo que suas bochechas ficam rosadas.
Sorrio.
— Nunca. E sabe o por quê?
— Não — sua voz sai em um murmúrio. — Mas, por favor, diga-
me.
— Porque você e esse acordo estão me estragando para as outras
pessoas, loirinha — conto, fechando o espaço restante entre nós e tocando o
seu queixo, apenas para levantá-lo e obrigá-la a encarar meus olhos. — E
ninguém nunca foi capaz disso.
Summer franze o cenho, porém não quebra a nossa conexão.
— Eu estou?
— Sim, mas quer saber um segredo? — pergunto retoricamente. —
Eu não me importo. Não me importo se quando isso acabar estarei
arruinado para outras pessoas. Porque você, Summer Miller, é inigualável.
Não estou mentindo, porque sei que após Summer, todas as outras
bilhões de pessoas que habitam o planeta, serão apenas simplórias perto do
que ela está sendo capaz de fazer comigo.
E mesmo que isso me apavore, me pego desejando por mais.

A estrutura do Metropolitan Museum of Art[23] possui um aspecto


gótico-romano grandioso que desenha a fachada e se destaca por conta da
tão famosa escadaria que serve de cenário para as dezenas de produções
cinematográficas, como uma das séries que Verônica era apaixonada
quando adolescente, que contava sobre a vida de jovens da elite do Upper
East Side e possuíam duas amigas que mesmo que tivessem seus
problemas, se apoiavam.
E como Blackwell mesmo diria, Gossip Girl[24] não é apenas uma
série, é um “marco nas produções norte-americanas!”
Sorrio balançando a cabeça e arrasto meu olhar pelo lugar. Acredito
que boa parte de toda a decoração que observo, ao mesmo tempo que
subimos as dezenas de degraus, seja apenas para a bajulação das dezenas de
celebridades passando pelo tapete vermelho. Nenhum deles realmente se
importam com a causa, são apenas seres humanos mesquinhos preocupados
em manter uma fachada hipócrita de benevolência.
Quando Summer e eu paramos em frente na entrada, longe de todo o
caos de fotógrafos e repórteres espalhados pela escadaria principal que liga
a entrada, eu a encaro de relance, pegando seu braço e entrelaçando ao meu.
— Você quer saber um outro segredo meu?
Summer ergue uma sobrancelha, confusa.
— Quero? — diz, mas a incerteza em cada sílaba.
— Me diga você.
— Fale logo, Oliver.
Inclino minha cabeça em sua direção, a fim de sussurrar.
— Eu odeio essas festas — conto, baixinho, no pé do seu ouvido. —
É uma besteira, eu sei. Mas não lido bem com lugares fechados e festas
com pessoas hipócritas.
Ela me encara erguendo uma sobrancelha. Logo após, sua expressão
dá lugar a um sorriso compreensivo, compartilhando um dos segredos de
Estado.
— Se precisar fugir, você sabe a quem gritar.
Com uma piscadela, ela abaixa o olhar brevemente e alisa o tecido
do vestido. Aproveito a distração para finalmente entrarmos no ambiente
glamoroso. A parte interna foi decorada em tons de gelo e dourado, dando
um ar de riqueza, elegância e requinte.
Caminhamos entre as dezenas de obras de artes e pego duas taças
que um dos diversos garçons carregam em bandejas que se misturam à
decoração. Summer não solta meu braço enquanto transitamos de um lado
para o outro, evitando o momento em que teremos que ficar junto à minha
família.
Contudo, quando paramos perto de um quadro lindo, levanto meu
rosto e o movimento faz com que seja possível observar Brandon em seu
traje elegante segurando a cintura de Lauren, que sorri abertamente para o
noivo como se ele fosse o homem mais amoroso de todo o universo.
Do seu outro lado, Andrew arruma sua gravata com um sorriso no
rosto que todos nós sabemos que é falso, totalmente treinado para essas
ocasiões em que nosso pai nos obriga a sermos os filhos perfeitos e a
seguirmos seus passos. E não é apenas isso que me entrega o desconforto
dele, mas também, a expressão vazia e a maneira como ele se afasta de
Brandon e Lauren, uma atitude que vem o acontecendo desde que soube do
noivado pela manhã.
Por presenciar isso, por ter que observar meu irmão ser quem não é,
vê-lo triste e uma versão do que ele nunca foi, tenho vontade de chegar até
onde ele está e mostrar para todos os tabloides quem realmente habita o
interior de Brandon Wright, quem é o homem que para mídia é um dos
maiores empresários da Wall Street e que por trás é apenas um monstro
vestido em ternos de marcas e uma conta bancária exuberante.
Eu poderia matá-lo e apreciar o feito. Homens como ele não
deveriam ter a dádiva de viverem em sociedade, em conquistar tantas
vitórias sem nem ao menos lutar.
Sem perceber, dou um passo à frente, pronto para socar meu
progenitor. Porém, de repente, como se percebesse que estou a um passo de
tomar uma atitude que me arrependerei mais tarde, Summer segura meu
braço. É um toque leve, sem nenhuma pretensão e ao mesmo tempo é um
aviso de que está aqui comigo, que não me soltará mesmo que eu esteja a
fim de agir impulsivamente.
— Ollie — sussurra, encarando meus olhos. — Olhe para mim. —
Eu faço o que ela pede. — Agora, respire. — Uma respiração profunda
deixa meus pulmões como brasa. — Não dê isso a ele, não deixe que ele
tire um pedaço de você para que possa machucá-lo. Ok?
Segurando sua mão, eu a aperto. Conforto. Agradecimento.
Coragem. São emoções que tento replicar através do toque quente entra
minha pele.
— Estou bem, Sum — sussurro. — Estou bem.
— Eu sei. — Sua boca se curva num sorriso fraco, lindo. — Você
sempre está bem.
Devolvo o sorriso e me viro totalmente para ela, levando minha mão
até seu rosto e acariciando sua bochecha.
E tenho a plena convicção que se alguém me dissesse há meses atrás
que estaríamos assim, tocando um ao outro e desejando todos esses sorrisos,
sem dúvidas, eu chamaria um psiquiatra e pediria uma consulta de
emergência.
Contudo, agora, não há nada no universo que me faça desejar estar
em outro lugar, com outras companhias. Mesmo que o mundo seja uma
droga, Summer Miller é a minha pessoa favorita.
É quem eu estou descobrindo ansiar. Quem me tira da zona de
conforto e move o tabuleiro em uma partida diferente de todas as que estou
acostumado.
— Eu tenho a melhor dupla de crime, loirinha — declaro depois de
um tempo e percebo meu timbre de voz calmo, baixo. — Como a Wanda
tem o Visão. O Peter Parker tem MJ e Natasha Romanoff tem Steve Rogers.
Summer me encara, perplexa.
— Você realmente decorou todos esses nomes? — questiona,
gargalhando.
— Demorei alguns dias, mas consegui — conto, passando o dedo
pela sua bochecha. — Eu sempre vou conseguir decorar todas as coisas que
se relacionam à você, loirinha.
É a verdade. A mais pura e crua verdade.
E, no momento em que Summer ergue o rosto, chocando seus olhos
contra os meus e sorri amplamente, uma respiração que não sabia que
estava segurando sai pelos meus lábios e meus olhos se fixam em suas
pupilas dilatadas. Elas são lindas e abrigam um universo que desejo, não,
que necessito desvendar.
Me aproximo lentamente, deixando todo o resto sumir. Nós nos
mantemos quietos e focados. Absortos em nossa bolha. E mesmo que eu
queira negar, o motivo pelo qual tudo se acalma dentro de mim e um sorriso
fraco sai dos meus lábios, é ela.
É como suas orbes que estão me encarando com orgulho e em como
seus dedos delicados se fecham contra os dois lados do meu rosto, em busca
de contato, faz uma corrente elétrica percorrer meu sangue e esquecer todo
o resto.
Apenas focar em como ela faz tudo sumir e reivindica cada átomo
do meu corpo para si, fazendo que não exista Brandon, nem Andrew e nem
várias câmeras viradas para nós, eternizando esse momento que vai me
acompanhar para sempre, mesmo quando estivermos longe e ela perceber
que sou uma casca vazia, uma prole indesejada de um casamento medíocre
e um ser indigno de sentimentos.
Infelizmente é isso que sou, isso que Brandon fez de mim. Ele me
ensinou o lado obscuro das emoções, me ensinou que não precisamos e não
devemos precisar de amor, carinho e cuidado. Que nós somos feitos para
sermos aço que mesmo contra o fogo, não se derrete.
Somos quem machuca, jamais aquele que recebe o ferimento.
E agora me pergunto se tudo isso realmente é verdade. Se o pouco
tempo que convivi com a loira a minha frente, me fez perceber que talvez,
apenas talvez, eu seja digno de viver, de sentir. De poder caminhar com
meus próprios pés sem que o passado dos meus pais seja uma nuvem
sobrecarregada sobre minha cabeça.
Mas, acima de tudo me pergunto se sou o suficiente para fazê-la
enxergar por cima das nossas regras, se está disposta a arriscar o que somos
por conta dessa atração infernal que está tirando meu juízo e se vai
conseguir compreender a semântica que esfrega em nosso rosto que
podemos ser essa mistura perigosa, feitas de complementos diferentes e que
se comparam a um monte de constelações, brilhando e ardendo.
Ainda sim, conseguimos entender o outro, conseguimos ser uma
dupla.
Uma parceria.
Uma parceria que se tornou algo indecifrável. Algo que nunca
almejei e agora me vejo sedento por mais. E por entender isso, por saber
que tudo o que constatei nesse mero segundo, roço meu lábio no dela,
sedento por um beijo, por fazê-la me deixar entrar em seu âmago e me
permitir mostrar que já não somos apenas um acordo.
E que talvez, no fundo, nunca fomos.
Que sempre estivemos predestinados a isso. Que nós nos
pertencemos.
Somos uma dupla.
Minha língua passa lentamente pelo seu lábio inferior, pedindo por
passagem, implorando por ela. E não há nada, em absoluto, que consiga
fazer com que eu foque em outra coisa. Pelo menos era isso que eu
acreditava até que uma voz rouca, e ao mesmo tempo preocupada, invade
toda a bolha que criamos e a obriga se afastar rapidamente:
— Boo?
Summer enrijece o corpo e seus olhos se arregalam, enquanto toda a
cor foge do seu rosto. Minha companhia aperta meu braço fortemente,
enquanto se vira e, mesmo que não desejando, acompanho o gesto sem
nunca soltá-la, porque sei que nossa noite está prestes a se tornar um
inferno.
Tenho certeza disso, quando a pessoa a chamou por um apelido
estranho está totalmente no meu campo de visão.
Merda. Merda. Merda.
Apenas por encará-lo, posso perceber quem é. Os olhos castanhos
idênticos ao de Summer encaram onde estou segurando-a com uma
expressão severa. E mesmo estando a um degrau abaixo de nós, posso
perceber que assim como eu, ele é alto. Ao seu lado, uma mulher mais
baixa, quase idêntica a Summer, a encara com uma expressão fechada,
quase como se o fato de me ter ao seu lado, fosse preocupante o bastante.
Sum suspira fundo, colocando um sorriso no rosto e me lançando
um olhar vazio, que faz todas as minhas entranhas se agitarem.
Ela sabe o que eu sei desde que meus olhos se encontram com os de
seu pai.
Nós estamos completamente fodidos.
— Pai? — murmura, engolindo em seco e então olha para o lado
para a companhia do homem que me ainda me encara. — Mãe?
O homem ainda se mantém quieto, me encarando.
— Summer. Acho que não conhecemos o seu amigo — diz sua mãe
friamente e então estende a mão para mim. — Eu sou Elizabeth. Elizabeth
Miller. Você é?
Abro a boca para responder. Para dizer que realmente sou apenas
um amigo de Sum, antes que meu pai ou Andrew nos encurralem aqui e
solte algo que fará com que Summer me mate lentamente quando recuperar
de seu choque.
Contudo, não tenho tempo. No momento seguinte, Brandon para ao
meu lado, colocando as mãos em meus ombros e olha para os pais de
Summer com avidez, como se tivesse dado o xeque-mate nesse jogo e
saindo como o vitorioso.
— Ele é Oliver, meu filho — enfatiza as palavras. — Achei que já
soubessem, já que agora somos praticamente família, Sra. Miller.
Filho de uma puta.
— Família? — ela questiona, impassível. — Summer você pode me
explicar o que está acontecendo aqui?
Encaro meu progenitor friamente, sentindo o músculo da minha
mandíbula contrair-se.
Ele percebe a minha reação, percebe que eu não desejo os meus
falsos sogros presentes nesse show de merda. E o pior de tudo, Brandon
percebe que estou sem saída. Que terei que dançar conforme sua dança
nesse momento, para que Summer não seja atingida pelo seu sadismo.
Por isso, por saber que estou em suas mãos esta noite, meu
progenitor levanta a taça de champagne e solta um sorriso calculado, com
toda a situação em suas mãos. Como se estivesse me dizendo claramente
sobre a borda de sua taça que esse é o seu maldito xeque-mate, após eu me
recusar a ajudá-lo a contatar Gerald para uma possível compra de ações,
quando cheguei com Summer em Nova York.
Ele fez isso para fechar todas as nuances do tabuleiro.
Ele me encurralou em uma armadilha sem que eu nem mesmo
percebesse e agora me pergunto como sairei dela, sem que Summer se
machuque. Sem que ela perceba que acabamos de jogar seus próprios pais
na boca do lobo.
E no caminho, caímos juntos.
Você tomaria a direção
Se eu perdesse o controle?
Se eu me deitasse aqui
Você me levaria para casa?
Take Me Home | Jess Glynne

Sabe aquela sensação de sentir que o mundo continua girando,


mesmo quando estagnamos no lugar, e não conseguimos acompanhar o que
está acontecendo ao nosso redor? Como se a qualquer mísero movimento
nos fizesse cair em um precipício sem fim, apenas para a dor agonizante e o
barulho insuportável dos murmúrios ao nosso redor se aquiete?
Pois bem, é assim que me encontro nesse instante.
Como ousei acreditar que conseguiria manter meus pais fora dessa
farsa? Como fui ingênua em não pensar que Brandon, o mesmo que quase
destruiu meus amigos, não faria algo similar comigo e seu filho?
Como, apenas... como?
São tantas perguntas, tantos questionamentos sem respostas que não
sei como agir. Eu apenas sinto minha mente entrar em curto-circuito, o ar
não consegue passar pelas minhas vias aéreas, ao mesmo tempo que os
tremores começam lentamente em minhas mãos, se espalhando pelo meu
corpo e o suor desce pelas minhas costas.
São tantas sensações que não consigo suportar. Apenas desejo que
desapareça. Não posso mostrar que a mera visão de meus pais perto de algo
que tentei muito esconder, me despedaça.
— Summer? — Oliver sussurra ao fundo, porém não consigo
escutá-lo claramente. Meu coração bate tão descontrolado em minha caixa
torácica que nem mesmo sua voz é suficiente para me acalmar. — Respire.
Olhe para mim, loirinha. Apenas para mim, ok?
Ele leva suas mãos até meu rosto, imitando o movimento de inspirar
e expirar e me puxa, me protegendo de todo o rebuliço ao nosso redor. Não
há baile, não há problemas. Há apenas Oliver. Ele nunca desvia o olhar,
tampouco se importa se estamos no meio de um baile repleto de pessoas
importantes ou se isso implicará em sua relação com seu pai mais tarde.
Oliver não se importa com nada, nem ninguém. Apenas comigo.
Ao ponto de colocar o mundo em chamas por mim, pois o simples
fato de me ver vulnerável, o destrói. Tudo o que está fazendo não é pela
nossa farsa, mas sim, porque realmente se importa comigo.
Ele acaricia minha bochecha, enquanto, mesmo com dificuldade,
volto a respirar.
De relance posso observar a cor fugir da face de mamãe e a
preocupação tão frequente, inundar seu lindo rosto. Os olhos castanhos que
sempre estão brilhando, tentando superar nossas cicatrizes, agora estão
como naquele dia, o dia em que um pedaço da minha infância quase foi
levado sem aviso prévio.
Engulo em seco, levando meu olhar para meu pai, meu herói, que
mantém os olhos impassíveis, mas que quando me encaram, também há dor,
culpa e arrependimento.
Desvinculando-me de Oliver, dou um passo hesitante até eles. Até
os meus heróis. Até as pessoas que me protegeram como puderam e que
agora serão incluídas na minha mentira, mesmo com todas minhas lutas
para mantê-los de fora dessa parte da minha vida.
— Me desculpe — murmuro. — Eu... eu apenas...
Meu pai dá um passo à frente, pegando meu rosto e levantando-o.
— Apenas me conte o que está acontecendo aqui. Ok, Boo? —
sussurra, me interrompendo. — Eu confio em você, filha.
Um caroço se aloja em minha garganta.
Eu não posso mentir para eles, não posso fazer isso.
Mesmo desejando que o mundo caísse sobre mim neste exato
momento, sei que agora é tarde demais. Não posso voltar atrás, tampouco
abandonar Oliver. Por isso, solto um sorriso fraco, tentando mostrar a ele
que está tudo bem, que eu não sou uma mentirosa que coloca até mesmo os
próprios pais em uma mentira descabida.
Olho por cima do ombro, para Oliver que ainda me encara com seus
orbes esverdeados envoltos há um sentimento que não consigo nomear, mas
desejo.
— E-eu, eu e Oliver estamos... — começo, mordendo meu lábio —
Estamos namorando.
Minha mãe finalmente compreende o que está acontecendo, dá um
passo à frente, fazendo meu pai se afastar e suspirar fundo.
— Namorando? — pergunta. — Você está namorando?
Mentirosa.
Mentirosa.
Mentirosa.
— Estou — minto.
— E você não achou conveniente contar aos seus pais, Summer? —
questiona, porém não me dá tempo de responder. — Você nos disse que
viajaria com suas amigas e, de repente, nos encontramos em um baile
beneficente em Nova York e você simplesmente me diz que está
namorando? Com o filho de Brandon Wright?
Eu sabia que isso sairia do controle, sabia que enfrentaria isso.
— Mãe...
— Sra. Miller — a voz rouca de Oliver emerge ao mesmo tempo
que a minha e ele dá um passo à frente, entrelaçando nossos dedos. — Acho
que todos nós podemos conversar em um espaço reservado.
Minha mãe desvia, brevemente, o olhar para Oliver que indica o
andar superior com o queixo e logo após seus olhos descem para nossas
mãos. Ao lado do meu falso namorado, Brandon encara toda a cena com
curiosidade genuína. Como se estivesse estudando meus pais para que possa
tirar proveito dessa situação e percebo que ele nem se importa com o fato
de que alguns convidados estão nos encarando curiosos.
Sem mais nenhuma outra palavra, ela segura a barra de seu vestido e
se vira, indo em direção aonde Oliver indicou.
Meu pai, Oliver e eu seguimos atrás, já Brandon fica parado no
mesmo lugar, após um olhar enervante de Ollie em sua direção, mandando-
o não terminar de foder com tudo. Por incrível que pareça, ele faz o que seu
filho determina, mas não deixa de levantar a taça e bebericar a sua bebida.
Assim que estamos longe de todo barulho e aglomeração, mamãe se
vira, suspira fundo e me encara.
— Por que não nos contou? — pergunta, sem enrolação. — Você
sempre nos conta tudo.
— Mãe...
— É o nosso combinado, você se lembra? Me mantenha informada
e eu não me meterei em sua vida. Não serei superprotetora... — continua,
mesmo com a minha interrupção. — Mas, acredito que não é isto que está
acontecendo.
— Não te colocar a par sobre a minha vida amorosa, não significa
que não estou cumprindo com os nossos combinados, mãe — advirto,
suspirando. — E pelo que me lembro, isso se estendia apenas para as
minhas sessões de terapia e nossos cafés da manhã obrigatórios.
— E, ainda sim, não encontrou tempo para me contar?
— Não achei necessário.
— Não? — questiona erguendo uma sobrancelha. — Você está
namorando, Summer! Você não está comprando um livro novo ou uma
blusa dos personagens que gosta. Estamos falando de algo que você nunca
se permitiu viver! E, agora acha que não é necessário nos contar?
— Elizabeth! — papai, exclama. Logo após me encara com os olhos
brilhando em preocupação. — Boo, eu entendo que você quer sua
privacidade, que você sabe lidar com tudo sem a nossa ajuda. Mas você
sabe que sempre pode confiar em nós dois, certo?
Encaro-o sobre a névoa de culpa que me invade e sobre a dor de
estar os decepcionando, de precisar passar por essa experiência de se
preocuparem comigo outra vez. E tudo isso, faz com que meu coração se
aperte.
Sei que mesmo que não admitam, estão se corroendo por dentro ao
ver que a sua pequena garota que não mentia e que sempre precisou deles
para sua proteção, contra tudo e todos, não existe mais.
Ela precisou crescer, roubar a armadura do príncipe encantado e
proteger a sua própria torre, porque, no fim, percebeu que se não fizesse
isso, se não aprendesse a lutar suas próprias batalhas, nunca conseguiria
consertar as rachaduras que foram impostas nas paredes de seu castelo.
E mesmo que meus pais ainda não estejam prontos para aceitarem
essa nova realidade, eu não os culpo. Não quando sei que tudo o que
fizeram foi apenas para nos livrar da dor das memórias e para que
conseguissem me ver bem outra vez, mesmo que fosse impossível.
Uma respiração se aloja em minha garganta quando encaro o rosto
de papai.
— Boo? — sussurra, quando mordo meu lábio inferior. — Ei, eu e
você somos um time, lembra?
Balanço a cabeça, prestes a desabar bem aqui.
— E não há nada mais importante do que a nossa amizade —
completo a famosa frase do nosso filme favorito.
Ele sorri.
Gerald Miller, mesmo preocupado, sorri para mim como sempre
sorriu. E tenho vontade de me jogar aos seus braços e chorar como sempre
fiz quando criança. Contudo, não posso me dar a dádiva, não posso mostrar
a ele que estou outra vez caindo em um poço que talvez não haja saída.
Não posso fazer isso com a única pessoa que me fez forte, que
tentou, melhor do que ninguém, me tirar do poço onde me enfiei e que fez
todo o possível para que eu voltasse a ver o brilho das estrelas e sentisse o
calor da luz solar, quando minha vontade era apenas abraçar a escuridão.
Ele não desistiu de mim.
Meu pai lutou, dia após dia, enquanto me distanciava de tudo e de
todos. Mesmo assim, ele esteve lá.
Ele nunca desistiu.
Ele se sentou na porta do meu quarto, longe o suficiente e leu meus
livros favoritos. E quando isso não adiantou, ele maratonou filmes que
considerava tediosos apenas para que eu não me afogasse em meu próprio
martírio, aprendeu piadas sem graça no intuito de me fazer sorrir, me
apelidou de Boo porque Monstros S.A era o nosso filme preferido e chorou
quando percebeu que eu havia me perdido.
Meu pai lutou por mim e continua lutando.
E talvez eu tenha acabado de decepcioná-lo.
Porque eu sou uma covarde.
Assim como aquele que me machucou.
— A culpa foi minha — uma voz rouca, receosa, rompe meus
pensamentos. — Sum estava preocupada com o que iriam pensar, então eu
sugeri que esperássemos um pouco antes de contar a vocês...
Oh, Oliver...
Olho para ele, para o meu namorado falso que outra vez pega toda a
culpa das consequências de nossas ações para ele. Seus olhos travam uma
luta contra os meus, me dizendo para não discordar, não contar outra
mentira.
Ele está me salvando de algo, agindo como uma dupla, uma
parceria.
Algo que nunca imaginei que aconteceria, mas que agora é como se
fosse parte do nosso cotidiano. E ao mesmo tempo que isso se torna uma
coisa boa, também é apavorante.
— Isso é verdade, Boo? — papai, questiona.
Engulo em seco.
— Sim — sussurro, ainda olhando para Oliver. — Nós não
estávamos escondendo, apenas esperando o momento certo para contar a
vocês.
Um suspiro fraco faz com que finalmente eu encare mamãe. Os
olhos dela estão calmos, mas há vestígios de lágrimas que nunca deixará
que caia. Porque ela, assim como eu, jurou que jamais deixaria que aquela
noite a quebrasse novamente.
— Eu te amo, você sabe disso, certo? — pergunta, baixinho vindo
até mim, enquanto aceno brevemente. — E que eu moveria o mundo por
você, mesmo que seja cabeça dura e aja sozinha na maior parte do tempo.
Eu sou sua mãe, querida. Eu sempre vou estar aqui para você e por você.
Então, não me esconda as coisas por medo ou receio, porque sempre irei te
apoiar.
Solto um sorriso, abraçando-a.
— Eu te amo, mãe — murmuro em seu ouvido. — Mesmo que você
seja uma mãe coruja, superprotetora.
— Tudo para ver a minha menina feliz. E vocês não estão fugindo
de nós dois. Estarei esperando-os para o jantar em dois dias, na nossa casa
— ela diz alto o suficiente para que Oliver escute. — E não aceito não
como resposta.
Quase solto uma gargalhada, quando me desvinculo dela.
Porém, quando abro a boca para dizer algo, a voz de Oliver emerge
no ambiente. Sinto sua mão se entrelaçar outra vez na minha e tenho certeza
de que isso não passou despercebido pelos meus pais:
— Eu nunca poderia negar — diz, sorrindo abertamente. — Ainda
mais quando soube que você é a melhor Chef do país.

— Você quer fugir daqui?


A voz de Oliver me faz erguer uma sobrancelha, sobre a taça de
champagne que estou tomando.
Arrasto meu olhar para o salão lotado, tentando entender o porquê
da pergunta. Nós voltamos para cá a menos de uma hora, e todas as vezes
que Brandon se aproxima de nós dois, Oliver me puxa fazendo com que seu
pai nos encare irritadamente.
Porém, não me importo. Ao contrário, até mesmo puxo Oliver junto
a mim para mostrar que a sua atitude de convidar meus pais para pressioná-
lo, não foi bem-vista aos meus olhos. E, não foi apenas eu e Ollie, que
também nos aborrecemos com isso, meu pai claramente evitou o CEO da
Wright Enterprise por toda a noite e até mesmo se despediu apenas de mim
e Oliver, há menos de quinze minutos com a desculpa de que precisavam
voar para Saint Vincent em poucas horas.
— Nós não deveríamos ficar até o final?
— Você quer ficar?
Ele franze o cenho.
— Nem por mais um segundo.
— Ótimo, porque definitivamente estamos fugindo pela saída dos
funcionários. — sorri, pegando minha taça e a colocando sobre uma
bandeja do garçom que está passando no momento.
— Isso parece uma fuga de adolescente.
Oliver solta uma risada nasal, me puxando entre as várias pessoas.
— Então, vamos fingir que somos adolescentes e fugir daqui antes
que mais alguém nos pergunte como nos conhecemos.
Uma risada fraca rompe meus lábios.
— Não irei me opor, mas e Andrew? — Ergo uma sobrancelha,
confusa. — Como ele irá embora?
Oliver me puxa entre as dezenas de pessoas e tenho um pouco de
dificuldade em acompanhá-lo, por conta dos saltos.
— Pedi que o motorista o levasse para casa há alguns minutos — ele
conta, abrindo uma porta que dá acesso à cozinha. — Nunca deixo com que
fique até o final.
Meu cenho se franze.
— Por quê?
Ele olha por cima do ombro, me encarando com os olhos vazios.
— Porque é quando Brandon vira a sua pior versão — sua voz sai
desprovida de sentimentos.
Pela primeira vez, não sei o que responder. Oliver nunca foi tão
sincero comigo. Ele nunca me contou nada sobre sua família ou sobre os
fragmentos que compõem sua alma, tampouco me deixou ver atrás de suas
muralhas. Ollie apenas me mostrou um lado de si que, pensando bem, é o
que todos estão acostumados.
Aquele lado que sorri mesmo que as cicatrizes ainda doam, que usa
respostas espertas para mascarar o que realmente elas significam. E,
principalmente, ele cuida dos machucados dos outros como se fossem seus.
Ele faz tudo por todos. Ele fez para Vee durante quatro anos, fez por
Andrew quando eles perderam a mãe e agora sinto que está disposto a fazer
por mim.
Porém, o que me pergunto é: quem faz isso por ele?
Quem segura seu mundo quando ele está prestes a desabar? Quem
dá a mão para ele quando precisa pular em um poço sem luz para salvar
algo? Quem está para ele como ele está para todos? Apenas… Quem é a
pessoa que prioriza Oliver como ele prioriza os outros?
São perguntas que desejo, até mesmo suplico, por respostas. Porque
eu as quero. Eu quero tudo o que se relaciona a Oliver Wright. Eu quero que
ele confie em mim, e, no fundo, mesmo que eu saiba que é errado, eu quero
ser aquela em que ele confia.
— Ollie?
Ele sorri para mim.
— Sim, loirinha?
— Me mostre aonde você realmente vai quando precisa de um
momento para si — sussurro.
Os olhos de Oliver se fixam ao meu. Há dúvida nele, mas também
há uma ansiedade que conheço bem. É a mesma que sinto sempre quando
começo a correr e meus pensamentos se dissipam. É uma calmaria após um
tsunami, uma luz quando tudo é escuridão. Como a força em momentos de
fraqueza e o sol para uma flor que nunca sentiu o calor antes.
É efêmero, contudo, único.
— Você tem certeza?
— Você tem?
— É um lugar simples — murmura.
— Nada que envolva você é simples, Ollie.
É a verdade. Uma verdade que não compreendi há pouco tempo,
talvez eu já soubesse a milhares de vidas.
E esse fato foi o começo do nosso declínio.
Porque Oliver Wright é mais que meu namorado falso.
Ele é um pingo de esperança.
Um fragmento do meu coração.
E uma lembrança do meu passado.
Então talvez
Talvez nós sempre fomos feitos para nos encontrar
Como se esse fosse todo o nosso destino
Como você já sabe
Seu coração nunca será quebrado por mim
Maybe | James Arthur

Eu nunca experimentei a sensação de pertencimento.


Acho que nunca desejei ter essa sensação.
Na minha cabeça, nunca fui digno de pertencer a algo. Não quando
estava preso a uma vingança que venho construindo desde aquela maldita
noite, quando eu tinha quatorze anos e meu destino foi findado em uma
cama de hospital.
Porém, mais uma vez eu estava equivocado.
Começou com um acordo. Uma farsa entre duas pessoas que
precisavam de uma escapatória, para situações que nos encurralaram em um
canto. Situações essas, que me aproximaram de uma certa loira que possui
gostos questionáveis para roupas, mas, que mesmo assim, eu faria questão
de comprar todas, se isso significasse que ela me olharia com os olhos
brilhantes como quando eu a levei naquele encontro que custou mais que eu
gastaria em qualquer situação. Que também ama bebidas com um alto teor
de açúcar e correr pela manhã apenas para que seus demônios não tenham a
chance de perturbá-la, mesmo que os esconda de todos e finja que seu
mundo é perfeito.
Começou com um acordo e então descobri que essa mesma loira é a
quem agora eu sinto que pertenço, e que apenas o destino pode me dar um
parecer sobre o porquê diabos duas pessoas que possuem traumas além da
razão se encaixam tão perfeitamente.
E acho que mesmo assim, eu não me importaria.
Não, eu o agradeceria. Até mesmo o infinito me parece efêmero
quando se trata de Summer.
Enquanto a observo me lançar um sorriso lindo que ocupa
praticamente todo o seu rosto, parados na frente do ambiente em que
acontece o baile, durante uma noite fria de Nova York, tenho a plena
convicção de que nunca experimentei essa sensação, até ela.
Até Summer Miller.
Até a loirinha.
A minha loirinha.
— Você está me assustando — sussurra, assim que paramos na
calçada enquanto esperamos o Uber.
— Hum?
— Você e sua cara de quem vai me jogar no asfalto gelado — ela
conta, erguendo uma sobrancelha. — Estão me assustando.
Franzo o cenho, observando como ela some dentro do meu blazer
que havia a obrigado a vestir, assim que saímos do museu por conta do
vento frio.
— Por que diabos eu te jogaria em um asfalto gelado?
— Não sei. — Dá de ombros. — Foi a primeira comparação que me
veio à mente.
Pendo a cabeça para trás, gargalhando.
— Às vezes eu me pergunto de onde vem tamanha imaginação —
murmuro, puxando-a para perto de mim.
Ela não me xinga, nem se afasta. Diferente de todas as vezes que
fizemos isso em Saint Vincent e Summer quis me esbofetear, desta vez, ela
encosta suas costas em meu peito, procurando por calor, se aquecendo da
baixa temperatura. E digo a mim que está apenas fazendo isso, por conta do
vento frio que bate em nossos corpos e não por conta de que sente o mesmo
que eu, que sente essa queimação insuportável no meio do peito.
Não. Para Summer, isso é apenas um acordo com data de validade.
— O motorista chegou, Oliver — Summer diz, erguendo o rosto em
minha direção. — E, vamos logo, porque, definitivamente, estou
congelando nesse maldito frio.
— Diz como se Saint Vincent fosse uma ilha tropical.
Ela me encara, enquanto uma linha aparece entre suas sobrancelhas.
— Ainda bem que não é. — Dá de ombros. — Eu odeio o calor.
Uma careta confusa se forma em meu rosto ao entrarmos no
automóvel. Assim que me encosto no banco, olho para ela, confuso.
— Seu nome é literalmente verão e você odeia o calor? — pergunto,
inclinando a cabeça para o lado.
— Eu não odeio a estação. Eu odeio o calor — conta. — Você já
tentou ler em um clima insuportável? Já tentou fazer alguma atividade física
ou até mesmo apenas ficar de bobeira? É horrível, Oliver! — Summer nem
ao menos percebe o quão agitada e alegre fica, enquanto fala sobre um
assunto tão banal. — Então, sim, eu não gosto do calor. Eu gosto daquele
clima chuvoso, onde posso me deitar embaixo dos meus cobertores, com
um livro em mãos e um chocolate quente ao lado. Eu gosto da sensação de
poder ler e não me importar com o calor escaldante. Ah, e eu gosto de
chuva. Eu amo as chuvas!
Sorrio, levando uma das minhas mãos até seu rosto e colocando uma
mecha do seu cabelo atrás da orelha, estudando seu estado relaxado,
enquanto me confessa suas pequenas peculiaridades. Peculiaridades essas
que a tornam ainda mais perfeita.
Perfeita para mim.
— Acho que já temos a programação do nosso próximo encontro.
— Temos? — Summer, questiona.
— Claro.
— E qual seria?
Minha boca se curva num sorriso escancarado.
— Um dia chuvoso, cobertores, inúmeros livros e chocolate quente.
Ela pende a cabeça para trás, soltando uma gargalhada. E, nunca, em
hipótese alguma, cansarei de dizer que esse som é o meu som favorito.
— E se não estiver chovendo, espertinho?
Dou de ombros.
— Então, nós colocaremos um daqueles vídeos de ASMR com
barulhos chuvosos para tocar no Youtube e fingimos que é chuva — conto,
enquanto ela me encara. — Será o nosso encontro perfeito, loirinha.
A risada de Summer aumenta, fazendo uma semelhante nascer em
meus lábios.
— Você realmente acha que isso dará certo? — pergunta,
balançando a cabeça descrente.
— Claro. — Dou de ombros. — É a melhor ideia de todos os
tempos.
Summer abre a boca para responder, porém a voz rouca do motorista
rompe a nossa bolha e faz com que nossas cabeças se virem em sua direção.
— Nós chegamos.
De repente, toda a alegria de segundos atrás morre, dando lugar a
uma sensação apavorante. Uma que eu não estou acostumado. Não quando
ela significa que todas as lembranças me atingirão com uma força
sobrenatural, assim que eu pisar no lugar onde estamos.
Um arranhar de garganta faz com que acorde do meu pequeno
devaneio e agradeça rapidamente ao motorista, enquanto saímos do
automóvel. Assim que estamos na calçada, ergo minha cabeça para a
construção de três andares. A fachada é toda revestida em tijolos vermelhos
e as janelas e a porta são pintadas de preto.
É um porto seguro, um local que poucos sabem da existência e que
guardo como se fosse o meu segredo de Estado.
Porque a casa em minha frente, pertenceu à minha mãe.
Era o seu lugar favorito. Um lugar que ninguém sabia da existência,
a não ser eu.
— Uau... é linda — Summer sussurra.
Balanço a cabeça, ainda perdido em minhas memórias.
Memórias que me acompanham desde que coloquei meus pés aqui,
quando eu tinha dezessete anos. Memórias que me fizeram odiar e amar
esse espaço, e memórias que eu nunca desejei compartilhar, até agora.
— É uma herança de família — murmuro, subindo os poucos
degraus.
— Seu pai... — ela começa, receosa.
— Ele não sabe sobre esse lugar — conto, me abaixando e pegando
a chave reserva em um dispositivo que havia mandado instalar. — E mesmo
se soubesse, não acredito que viria aqui.
Summer ergue uma sobrancelha, me observando destrancar a porta.
— Por quê?
— Porque era da minha mãe. E ele odeia tudo o que pode lembrar
dela.

Suspiro fundo caminhando pela enorme sala interligada à cozinha.


Não há muito para ver aqui, a decoração em tons escuros é simples e
familiar. Alguns retratos da minha mãe, de Andrew e meus, estão
espalhados pelas paredes e há um enorme sofá branco no meio da sala, em
frente a televisão plana, com uma mesa de centro entre eles.
Do lado direito, o piano de cauda se ilumina por conta da luz que
entra pela fresta da janela. Mesmo vazio, posso imaginá-la ali, sentada
naquele banco, tocando suas melodias favoritas enquanto seus olhos se
fecham e o mundo fica em silêncio, apreciando como o seu talento
transcende o universo. Como seus dedos magros se arrastavam pelas teclas
brancas, e o seu sorriso iluminava o ambiente, mesmo que por trás dele, ela
estivesse completamente machucada.
Quebrada por quem um dia a jurou amor, lealdade, zelo e proteção.
Quem confiou e no fundo, a decepcionou severamente.
Posso sentir tudo o que ela sentia sempre que se escondia aqui e, ao
mesmo tempo, desejar que nada me atinja.
— Ollie? — Summer chama, vindo até mim, arrastando o vestido
pelo piso. — Está tudo bem?
Encaro-a de relance, tentando afastar tudo o que me atinge
gradualmente. Foco apenas na loira que retirou o salto, ficando um pouco
mais baixa do que eu e é obrigada a erguer seu rosto para me encarar.
Seus olhos, seus lindos olhos castanhos me estudam com afinco, em
busca de algo, qualquer coisa que possa lhe indicar que não estou bem.
Todavia, solto um sorriso e abaixo minha cabeça, roçando seu nariz no meu
lentamente, expirando seu cheiro viciante. Tentando não me perder em meu
próprio poço de memórias.
Eu não deveria ter vindo aqui. Não deveria ter a trazido comigo.
Não porque não confio nela, mas sim porque não desejo que ela me veja
assim. Me veja lutar contra meus próprios demônios.
Eu não quero manchá-la, não quero que a minha escuridão a atinja;
não quero que Summer me olhe com outros olhos. Não quando finalmente
conquistei aquele olhar brilhante para mim.
— Claro que está, loirinha — minto. — Mas, acho que está na hora
de alimentá-la.
Sum franze o cenho.
Ela é linda. Cada pedaço dela, perfeito!
— São duas horas da manhã.
— Acredito que há algum fast-food funcionando. — Sorrio. —
Estamos na cidade que nunca dorme.
Uma desconfiança se aloja em seu rosto.
— Não estou com fome.
— Não?
— Não.
Deixo um pequeno selinho em seus lábios.
— Ok.
— Comece a falar — ordena, calmamente.
— Sobre? — Ergo uma sobrancelha, fingindo confusão.
Summer inclina a cabeça para o lado, preocupada.
— O porquê de estar inquieto. — Ela dá um passo para frente,
colocando sua mão delicada em meu rosto. — Você girou esse relógio
dezenas de vezes, desde que seu pai anunciou o noivado e fez mais uma
dúzia de vezes, desde que entramos nesse apartamento.
Engulo em seco, desviando o olhar. Não havia percebido que estava
tão nervoso, a ponto de fazer que ela mesma percebesse. Porém, essa é a
coisa de Summer, ela não deixa nada passar despercebido. Ela pode não
comentar, mas sempre está atenta a algo, sempre estudando o
comportamento das pessoas e o que está acontecendo ao seu redor.
— Você não deveria usar o que está aprendendo na faculdade contra
as pessoas, loirinha — tento brincar.
— Não estou fazendo isso — sussurra. — Eu apenas o conheço o
suficiente para saber que não está bem.
— Eu estou bem.
— Você está?
Não. Eu não estou bem há um bom tempo.
— Sempre estou.
Ela inclina a cabeça para o lado, estudando meu rosto.
— Mentiroso — acusa, baixinho. — Confie em mim, Oliver. Eu sou
sua amiga, agora. Eu posso te ajudar.
Você não é uma amiga, loirinha. Nunca poderia ser.
Engulo em seco, de novo, encarando-a. Eu nunca havia confiado em
alguém além de Verônica e Andrew. Nunca deixei que meus segredos
fossem descobertos e muito menos deixei com que as pessoas acreditassem
que poderiam um dia alcançar algo tão profundo.
Contudo, ela sempre foi diferente. Sempre conseguiu fazer com que
me questionasse o porquê de nunca me permitir sentir, e agora, mesmo que
eu não consiga explicar o motivo, sei que posso e quero confiar nela.
Quero, pois sei que estou prestes a transbordar e que talvez, apenas talvez, a
pequena leveza que se estendeu entre nós nesses poucos dias longe do caos
de Saint Vincent possa me salvar do que estou pronto a enfrentar.
Solto um suspiro fundo e dou a ela um fragmento de mim.
Um que nunca dei a ninguém. Nem mesmo a minha melhor amiga.
— Esse era o porto seguro da minha mãe. Era onde ela se escondia
de Brandon quando ele perdia o controle e a agredia — murmuro me
afastando, andando pelo ambiente passando os dedos pelos móveis e
parando em frente a uma foto dela. — Todas as vezes que ele a machucava,
ela vinha para cá. Se escondia do mundo e da sua família, até que os
ferimentos cicatrizavam e os roxos em sua pele não eram mais perceptíveis.
Minha mãe se escondia de mim e de Andrew, por vergonha de que víssemos
sua fraqueza.
— Ollie...
Seguro o porta-retrato em minhas mãos, observando o sorriso lindo
de Abigail.
— Mas, o que ela não sabia, Summer... — interrompo-a, perdido em
pensamentos. — Era que eu nunca a achei fraca. Eu nunca achei que
merecia aquilo, nem ela nem ninguém. Minha mãe era uma lutadora, uma
sobrevivente. Ela era o meu mundo! — Eu não sei o porquê estou dizendo
isso, mas não consigo guardar mais, não consigo suprir todas as dores que
ficaram alojadas em meu peito, após aquela noite quando tinha oito anos.
— E eu fui obrigado a assistir meu pai destruí-la pouco a pouco. Dia após
dia. Até que ela não aguentou mais e sucumbiu ao desespero de se salvar.
Eu fui obrigado a presenciar isso e nunca pude ajudá-la. Eu nunca consegui
salvar a única pessoa que me amou mais que tudo em sua vida. Ela não
pôde ver os aniversários de Andi, não me viu se formar na escola. Não me
colocou na cama quando os pesadelos me acordavam. Ela não conseguiu
ver seus filhos crescerem, por conta de um monstro que é aplaudido por
todos como se fosse a porra de um Deus intocável.
Uma dor dilacerante irrompe por minha traqueia. O ar some dos
meus pulmões e minha visão fica escura. É como se todo o mundo estivesse
girando, enquanto me prendo ao mesmo lugar, sentindo meus batimentos
cardíacos praticamente abrindo minha caixa toráxica.
É uma dor agonizante.
Uma barreira sendo destruída. Como se todos os sentimentos,
choros e angústias que engoli durante todos esses anos, estivessem
finalmente se libertando e me levando junto.
Uma sensação que desejo que suma e que ao mesmo tempo me
agarro. Sentir isso, sentir que estou prestes a perder o controle, pode, pela
primeira vez, me indicar que estou vivo.
Não apenas sobrevivendo. Mas, voltando a viver.
A sentir.
— Ollie? Ei, olhe para mim. — Uma voz assustada sobressai a todas
as sensações que estou sentindo, fazendo com que eu pisque lentamente. —
Isso, continue olhando para mim. Não me deixe, ok? Não volte para onde
está indo. Apenas, fique comigo, Ollie. Por favor!
Eu não posso.
Não posso ficar com ela, com a voz que é como meu último fio
ligando a sanidade. Não posso, porque eu preciso disso, preciso que a dor
finalmente saia. Preciso que, pela primeira vez, eu sinta algo. Sinta tudo.
Mesmo que tudo dentro de mim pareça que está a ponto de sucumbir.
Preciso fazer isso, preciso que o imediatismo que me machuca, que
as promessas não cumpridas e a sensação do meu peito em chamas,
pulsando sofrido e com pesar, finalmente me tire das águas profundas do
meu subconsciente, que me arrasta sem rumo, me destroçando cada vez
mais e me leve para águas seguras e límpidas, onde posso enxergar com
segurança o destino a seguir.
Mas como posso fazer isso se meu coração é uma faca de dois
gumes, uma rota perigosa e às cegas? Se é como uma batalha árdua em uma
guerra sangrenta?
Sinto todas as dores que nunca me permiti sentir, o grito que ecoa no
vazio ao meu redor e o silêncio que me responde com uma solidão tão
densa, que é difícil de respirar. Meu coração pulsa o caos que eu, tão
fervorosamente, tento esconder.
Tento respirar, mas é como se o ar me faltasse e a sensação de mãos
leves que seguram meu rosto, ficasse cada vez mais longe. É como se as
dores que pensei serem infinitas e que se perderam no passado, me atingisse
com força total.
Dor. Raiva. Vergonha. Traição. Medo.
E, principalmente, a impotência.
Todos esses sentimentos se acumulam em meu âmago, nem mesmo
sou capaz de diferenciar cada um deles. Eles são um conjunto de emoções
que me atingem como um raio, me cortando, sagrando o meu peito em
camadas desesperadoras. Camadas essas, que são como uma lágrima
solitária que escorre lentamente pelo meu rosto, enquanto deslizo para o
chão, sentindo meu corpo sendo abraçado, confortado.
Como se pela primeira vez, alguém estivesse disposto a me segurar,
enquanto meu corpo cai em uma queda livre tão amedrontadora que me
agarro ao tecido liso de algo – talvez um vestido –, sinto cabelos criarem
uma nuvem entre nós e o mundo, e lábios macios beijarem a minha testa.
— Está tudo bem, Ollie — é um sussurro sofrido. — Está tudo bem.
Eu estou aqui por você. Eu sempre vou estar, amor.
Não presto atenção nas palavras, eu apenas as sinto. Apenas me
convenço de que realmente tudo ficará bem, mesmo que no momento eu
não passe de uma respiração acelerada em meio a um ataque de pânico e
um puro desespero que faz com que me perca nos corredores da minha
mente.
Corredores que mostram que sou os inúmeros caminhos e atalhos
frustrados que ressoam como melodias estridentes. Sou a dor que lateja no
peito e rompe o silêncio da noite com um soluço engasgado, mesmo que me
faltem lágrimas. Sou todas as palavras que nunca saíram de meus lábios e
que morreram em mim, e sou o luto por essas palavras que ainda retumbam
nos meus ossos.
Sou o rascunho de algo que nunca deu certo e foi descartado.
Algo que nunca conseguiu salvar aqueles que precisavam de mim.
— Ollie? — a voz de Summer me chama. — Respire.
Eu faço.
Faço dezenas de vezes.
— Faça de novo — continua, quando não digo nada. — Isso. Agora
expire lentamente.
Assim que minha visão volta ao normal e minha respiração se
acalma, olho para cima, para onde Summer me encara. Estamos no chão da
sala do apartamento da minha mãe. Sum está sentada atrás de mim, me
segurando, enquanto minhas costas encostam em seu peito e seus braços me
seguram, me protegendo.
Ela nunca me solta. Summer se mantém ali parada e sentindo a
minha dor, como se fosse a dela. Quando abaixa a cabeça, escorando seu
queixo em minha cabeça, ela suspira. É um suspiro tão doloroso que
prometo a mim mesmo que se um dia o mundo vier a machucá-la, eu
mesmo o queimarei, esmagarei cada átomo presente nessa Via Láctea.
Prometo ainda mais que quando ela precisar de mim, ela terá a
minha ajuda. Mesmo que estejamos a milhas de distância. Mesmo que ela
me odeie após isso. Mesmo que eu saiba que ela é mais do que um simples
acordo e que nunca poderemos passar disso.
— Sinto muito, Ollie — ela murmura contra meus cabelos. — Eu
sinto tanto que tenham te machucado.
Fecho meus olhos, sentindo o seu calor, sentindo-a se fundir em
meu coração morto e a agonia que, antes, percorria cada veia do meu corpo
se dissipar.
— E eu sinto o mesmo por você, linda.
Olho para o lado, encontrando o rosto preocupado de Summer.
Observando seus lindos olhos castanhos, olhos que tenho a certeza de
guardam segredos, assim como os meus.
Segredos que desejo saber. E, quando este momento chegar, sei que
não me fará mal, já não me fazem agora. Cada parte de Summer é
importante para mim, até mesmo aquelas que se escondem em sua alma,
pois quero estar com ela até mesmo na sua escuridão.
Porque eu não quero perder você agora
Estou olhando bem para a minha outra metade
O vazio que se instalou em meu coração
É um espaço que agora você ocupa
Mirrors | Justin Timberlake

O meu primeiro ataque de pânico aconteceu quando eu tinha treze


anos.
Lembro que não entendia o que estava acontecendo. Apenas me
senti sufocada, agoniada. Mil pensamentos passando pela cabeça e todas as
lembranças não me abandonavam. Era como se estivesse vivendo um
looping daquela noite, de quando pensei que eu pagaria por algo que não
tinha culpa.
Mas, para ser sincera, o que realmente ficou gravado em mim, foi a
sensação de sentir como se meu coração estivesse correndo a quilômetros
por hora, como se estivesse prestes a ter um ataque cardíaco.
Foi a pior sensação que já senti.
Desejei que aquilo não voltasse, que os fragmentos daquela maldita
noite não me afetassem tanto. E por ter aprendido a lidar com isso, por ter
tido ajuda para superar esses momentos, consegui ajudar Ollie quando se
perdeu em sua mente e se ajoelhou no chão. Eu sabia que precisava salvá-
lo de si mesmo, que ele precisava de mim, assim como um dia precisei de
alguém.
Fui a sua válvula de escape e não me arrependo. Aprendi que
mesmo querendo superar tudo sozinhos ou sem que as pessoas saibam do
quão machucados ainda somos, ter uma rede de apoio, alguém que nos
segure quando cairmos, pode ser a nossa salvação.
E, sei disso porque tive pessoas assim, tive meus amigos, meus
pais… por eles, eu lutei até que aqueles pensamentos não me consumissem
e não fossem um monstro pelo qual lutaria todo dia.
— O que você está fazendo aí? — Oliver pergunta, escorando a
lateral do corpo na parede e encarando o banco em frente ao piano no qual
estou sentada.
Olho para cima, para ele. Seus olhos verdes já não possuem aquele
pânico, tampouco as lembranças que o jogaram em um poço que achei que
não conseguiria salvá-lo. Ele agora parece o mesmo homem que implica
comigo e solta sorrisos sarcásticos.
Ele parece novamente o meu Ollie.
Meus olhos se desviam dele, vagando pela rua deserta e para a noite
estrelada. Constato que esse lado da cidade é tranquilo, não há aquele
tumulto de carros e a gritaria das pessoas. Talvez seja por isso que me sinto
tão confortável.
— Observando — digo por fim.
Ele se desencosta, vindo até mim e assim que me alcança, coloca
suas mãos no bolso frontal, me encarando. Fazendo com que meu rosto se
levante e crie uma conexão momentânea com os olhos dele.
— Gostaria de compartilhar?
— A paisagem?
Ele sorri.
— Não, linda. Seus pensamentos — murmura, se sentando ao meu
lado.
Eu o encaro, calmamente, umedecendo meus lábios.
— Nada relevante — murmuro. — Estava apenas observando a
calmaria da rua. É diferente de onde moramos.
— É difícil ter calmaria com dois capitães, uma acadêmica de
medicina e outro de arquitetura, na mesma casa — brinca, se virando para o
piano. — Sem contar a companhia adicional de Verônica e Analu.
Solto uma risada, acompanhando o movimento e percebo que Oliver
está encarando as teclas do piano como se estivesse se lembrando de algo e
sentisse medo de sequer encostar no instrumento.
— É... por ela? Digo, é por causa da sua mãe que não toca mais? —
questiono, baixinho.
Oliver levanta o olhar para estudar o meu rosto. E, por apenas
observar a dor em suas pupilas, sei que estar aqui e se sentar em frente ao
tão amado piano de sua mãe, traz de volta um complexo de rachaduras e
tremores intermináveis em sua mente.
— Sim — confessa, quase que em um som inaudível. — Ela amava
o piano mais do que os próprios filhos...
— Não acredito nisso.
— Você não a conhecia.
— Mas eu conheço você — advirto, encarando-o. — E sei que ela
fez o possível para que você fosse feliz, que pudesse ser quem é hoje.
— E o que eu sou hoje? — reitera, confuso.
— O homem que coloca o irmão na frente de todos seus objetivos.
O melhor amigo que protegeu a melhor amiga por quatro anos, apenas para
que ela não definhasse em sua própria dor — minha voz sai em um
sussurro. — O playboyzinho que comprou o meu lugar favorito apenas para
um encontro, porque sabe que eu sou completamente apaixonada pela
Marvel — Levo minha mão até seu rosto. — Você é uma das pessoas mais
incríveis que eu já tive o prazer em conhecer, Ollie. E, mesmo que soe
estranho, eu fico feliz por ser você o meu namorado falso.
Oliver sorri.
É lindo. Perfeito.
O sorriso se estende por todo o seu rosto, destacando o brilho de
suas íris esverdeadas e uma pequena covinha. É um sorriso que raramente
vemos e que desejo que mais pessoas conheçam, que ele não é apenas um
amontoado de sarcasmo e sorrisos treinados.
Não. Oliver é mais.
— Você deveria sorrir assim mais vezes — digo, acariciando sua
bochecha.
Oliver franze o cenho.
— Eu sorrio o tempo todo.
— Não assim.
— Assim como?
Os cantos da minha boca curvam-se em um sorriso.
— Como se realmente acreditasse que merece a felicidade.
Oliver me observa por alguns segundos, como se estivesse
ponderando minhas palavras.
E eu não faço nenhum movimento, apenas continuo encarando-o e
esperando.
Nada mais importa, é como se finalmente tivéssemos chegado ao
fim da batalha. O momento de cessar fogo, levantarmos a bandeira e
acabarmos com todas as guerras.
Da maneira como estamos se nesse instante, sentados aqui, com um
piano como testemunha e sozinhos em um lugar que Oliver considera
especial, tenho a certeza de que algo se finda entre nós. Não há mais fuga. É
como se nossos destinos tivessem sido traçados no momento em que nossos
olhos se encontraram pela primeira vez.
Nem mesmo o fim deste acordo será capaz de destruir o que
construímos. A cumplicidade que forjamos nessas semanas que estivemos
juntos, é maior que qualquer outro relacionamento que chegaremos a ter
após provarmos como somos juntos.
— Eu acho que nunca cheguei a te pedir desculpas... — ele sussurra,
mudando de assunto.
Ergo uma sobrancelha.
— Pelo quê?
— Pela forma como te tratei naquela noite na fraternidade — conta,
envergonhado. — Eu não tinha o direito de tratá-la daquela forma por algo
que você não tem culpa. Foi uma atitude de merda e reconheço isso.
Aceno levemente, indicando que aceito suas desculpas atrasadas,
mesmo que ele tenha tentado fazer isso há algum tempo, porém não permiti
que chegasse perto de mim.
— Você roubou o carro de Vee para me pedir desculpas.
— E você disse ao segurança que eu estava tentando sequestrá-la.
— Ele sorri. — Mas para seu conhecimento, eu não o roubei. Eu pedi a Vee
que me emprestasse, porque amo minha vida o suficiente para não tentar
algo contra aquele carro.
Uma gargalhada se forma em minha garganta e quando menos
percebo estou jogando minha cabeça para trás, emitindo um som envolto a
alegria.
— Era a única forma de tirá-lo da frente do meu prédio — admito.
— Além disso, eu não gostava de você naquela época.
Sua boca se curva num sorriso.
— E agora você gosta? — as palavras saltam de sua boca em um
timbre ansioso.
— Às vezes sim, mas na maioria do tempo, estou imaginando a
maneira mais tortuosa para te matar — conto, passando os dedos pelas
teclas do piano.
Uma gargalhada inesperada salta dos lábios de Oliver.
— Um relacionamento saudável, de fato.
— Sem a menor sombra de dúvidas.
Sorrimos um para o outro. Acho que talvez essa seja a nossa nova
ação favorita.
Viro-me pra frente, de repente, encarando o piano com uma careta
estranha e, então, sem pensar, deslizo um dos meus dedos pelas teclas,
emitindo um som que causaria vergonha a qualquer pianista.
— Você está fazendo errado — Oliver sussurra. — Não é necessário
colocar tanta força para que o som saia.
Mordo meu lábio inferior, envergonhada.
— Desculpe. Eu não deveria, é pessoal demais para você —
murmuro, me afastando.
Oliver segura a minha mão delicadamente, não permitindo que eu
me mova um centímetro sequer. Ele me encara intensamente, como se as
memórias estivessem fazendo-o mergulhar em um lago que não deseja.
Como se estivesse prestes a enfrentar algo que evita a todo custo.
— Está tudo bem — devolve no mesmo tom. — Acho que talvez
esteja na hora de alguém finalmente usá-lo.
Observo sua mão chegar até a minha e a levar até as teclas
novamente. Percebo que Oliver parece ter medo de sentir a sensação de
seus próprios dedos tocando a superfície do instrumento, por isso, usa as
minhas mãos para que possa, pelo menos, ter a sensação de ter algo do seu
passado que não o destrua.
De relance observo o seu rosto impassível. Como mantém seus
olhos nas teclas brancas e uma respiração rasa.
— Você se lembra de quando te disse que eu precisava fazer algo,
mas, não tinha coragem? — pergunta, baixinho quando não digo nada.
— Sim.
— Eu não tenho coragem de tocá-lo porque isso me lembra de como
minha mãe era. — Seus ombros murcham. — De como ela me fez prometer
algo e então...
Levo minha mão na dele outra vez, apertando-a.
— O que ela te fez prometer, Ollie?
— Que quando a saudade fosse maior que tudo e não suportasse a
dor, eu deveria me lembrar das vezes que tocamos juntos. — Sua voz tem
um leve timbre embargado. — É por isso que não toco, Sum. Porque as
lembranças são sufocantes, sabe? E não desejo que elas me atinjam. Não
desejo que eu me lembre dela. Porque por mais que ainda a ame, uma parte
de mim também nunca a perdoou.
Olho para ele, tentando dizer que, mesmo em silêncio, não me
importo que ele não toque, que está tudo bem evitar algo que o machuca se
isso significa que esteja bem.
Para ser sincera, vendo-o assim, tão vulnerável, tenho a plena
convicção de que poderia destruir todos os malditos pianos do universo.
Poderia fazer com que ele nunca precisasse olhar para outro instrumento na
sua vida.
Eu faria isso por ele.
Queimaria até mesmo as famosas partituras de Beethoven.
Eu faria qualquer coisa por Oliver Wright, sem nem ao menos
praguejar.
— Eu sinto muito, Ollie.
Ele suspira.
— O problema é que eu desejo tocar. Mesmo com todas essas
lembranças, eu ainda desejo isso. — Uma das minhas sobrancelhas se
elevam e seus olhos se encontram com os meus. — Eu desejo tocar para
você, Sum. Desejo isso desde quando jogamos aquele jogo idiota das
perguntas e você quis saber o motivo pelo qual eu não queria me lembrar da
minha mãe. E mesmo assim, você ainda deixou claro que eu lhe devia uma
resposta.
Mordo meu lábio inferior.
— É sério?
— Cada sílaba, loirinha — ele sorri brevemente. — Você tem a
tendência de me fazer desejar até aquilo que eu não achava mais possível.
Os cantos dos meus lábios se elevam em um sorriso.
— Então... você vai tocar?
— Eu não pratico há tempos...
— Eu não me importo — minha voz sai rápido demais.
— Ok.
Oliver me encara e, nesse mero instante, posso perceber tudo,
porque seu olhar é como labaredas, como se o que está prestes a fazer, é
apenas para nós dois.
Não pela sua mãe ou qualquer outra pessoa.
É para nós.
O que me faz sentir como se Oliver Wright já não fosse mais apenas
um acordo para mim.
Mantenho um sorriso de canto enquanto ele, lentamente, leva seus
dedos até as teclas brancas e fecha os olhos por um breve instante.
Apreciando, consumindo o momento e se preparando.
Ele respira uma, duas, três vezes. E então a melodia suave irrompe o
ambiente, me fazendo cair em um precipício sem ter medo. Não reconheço
de primeira qual música ele está reproduzindo em sons suaves,
incomparáveis. Porém, assim que finalmente entendo, minha garganta se
fecha e mordo meu lábio.
Porque não é apenas uma simples música, é a letra da nossa história.
Uma história interrompida. Uma que não tivemos tempo para aproveitar e
que se perdeu durante os anos.
Uma maldita história que apenas eu carrego as memórias.

Você não é algo para admirar?


Porque o seu brilho é algo como um espelho
E eu não posso deixar de reparar
Que você reflete neste meu coração

A melodia de Mirrors do Justin Timberlake que está ressoando pela


sala e por mais que Oliver se mantenha com os olhos fechados, enquanto
seus dedos trabalham rapidamente nas teclas, posso ouvir claramente a
letra, posso sussurrar os versos como se estivessem impregnados em minha
mente e me fizessem voltar há anos atrás, naquele píer, onde o conheci,
onde fomos dois adolescentes que não tinham problemas, apenas soluções.

Se você um dia se sentir sozinha e


A luz intensa tornar difícil me encontrar
Saiba apenas que eu estou sempre
Paralelamente do outro lado

Oliver move seu braço lentamente, fazendo ele se encostar ao meu e


um arrepio percorrer por todo meu corpo. A sensação junto ao som suave
da música, faz com que meus olhos se encham de lágrimas e todas as
memórias me atinjam com uma força sobrenatural.

Porque eu não quero perder você agora


Estou olhando bem para a minha outra metade
O vazio que se instalou em meu coração
É um espaço que agora você ocupa
Dói, tudo em mim, dói.
Uma lágrima desce pelo meu rosto, depois outra. Quando Oliver
enfim me encara, os olhos também estão envoltos a lágrimas que acredito
que não deixará cair. Ele está se rompendo, como eu, assim como fizemos
naquele dia.

Mostre-me como lutar


E eu vou lhe dizer, amor, foi fácil
Voltar para você uma vez que entendi
Que você estava aqui o tempo todo

Honestamente, não consigo mais segurá-las, talvez precise disso,


precise fazer com que essas malditas lágrimas desçam e me deixem mais
leve. Porém, o que eu não esperava era que Oliver também fosse se quebrar.
A ardência que está consumindo nossas almas enquanto nós nos
encaramos, combina com a intensidade da dor que assola todo nosso
âmago. É nesse instante, que percebo, que assim como eu, Oliver está
machucado além de reparos.

Que estamos tornando dois reflexos em um


Porque é como se você fosse o meu espelho
Meu espelho olhando de volta para mim
Olhando de volta para mim

Ainda que sejamos essa bagunça ambulante, quero que permaneça


ao meu lado, quero que ele seja meu por completo. Sem acordo, segredos
ou mentiras. Eu o quero de corpo e alma, quero que ele se cure, desejo que
suas cicatrizes parem de ser seu fardo e que ele possa me encarar e sorrir
verdadeiramente.
Eu quero Oliver Wright como nunca quis algo em minha vida.
Eu o quero, mesmo que não o mereça, mesmo que eu esteja
danificada.
Eu o desejo.
— Sum?
Me levanto rapidamente, sentindo a borda do vestido se arrastar pela
sala ao mesmo tempo que ando de um lado para o outro.
— Eu não posso, Ollie — murmuro. — Eu não posso.
Ele corre até mim, segurando meu rosto e levantando-o até que
nossos olhos estão fixos um no outro.
— O que você não pode, Sum?
— Ultrapassar ainda mais os nossos limites — Uma única lágrima
escorre pelo meu rosto. — Quebrar mais regras do que já quebramos.
Algo se quebra dentro dele.
Algo se rompe dentro de mim.
É doloroso. Cruel. Desumano.
— Por que, linda?
Não respondo. Não dou a ele o que está preso em minha garganta.
Apenas encaro-o e faço com que as peças do tabuleiro em que
estamos jogando se embaralhem novamente.
— Me pergunte o porquê não gostava de você quando voltou para
Saint Vincent, Oliver — ordeno, engolindo em seco. — Apenas me
pergunte.
Ele ergue uma sobrancelha, confuso. Mas quando abre a boca para
fazer o que disse, sei que uma parte do nosso passado está prestes a voltar
para nos atormentar.
— Por que você me odiava, Summer?
— Porque você me fez voltar a dançar e nem ao menos se lembrava
de mim.
Você é o pino em meu coração, é uma granada
Você é, você é, você é
A cura para todas as minhas cicatrizes
Sinto como se você
Pudesse me salvar agora
Medicine | James Arthur

PASSADO
Suspiro uma.
Duas.
Três vezes.
As ruas deste lado estão iluminadas e não há riscos de algo
acontecer. Não, não há como. Não quando meu pai praticamente nos
deslocou para esse lado da cidade depois que tudo aconteceu comigo e
mamãe. Não quando ele preza mais a nossa segurança do que nossa
felicidade.
Dou um impulso com meu pé esquerdo, virando uma das esquinas e
corro pelas ruas pouco movimentadas, a fim de espairecer todo o caos que
ronda a minha mente. Depois de mais algumas quadras, vou por uma trilha
ao lado de um enorme jardim, em direção ao píer que sempre está vazio
desde que nos mudamos para cá, há alguns meses.
Depois que ultrapasso algumas árvores e faço o caminho, chego ao
lugar que venho todos os dias à noite para pensar, para tentar engolir todos
os monstros que gritam em meu peito para serem libertos. Dou um passo
para descer o único degrau de madeira que liga ao deque e sinto meu corpo
todo relaxar por estar em um lugar onde ninguém pode me achar, onde
posso me esconder da minha realidade por algumas horas.
Porém, assim que meus pés pisam no ambiente que deveria estar
vazio, minha respiração fica presa em minha garganta e meus braços se
arrepiam com o medo; não há nada aqui para me salvar, não há ninguém
que possa escutar meus gritos se caso tudo aconteça novamente. Dou mais
um passo à frente, mesmo que errado, mesmo que tudo dentro de mim diga
para correr e voltar para a segurança da minha casa, para onde os
seguranças irão me proteger caso eu diga a eles, mesmo que seja errado, a
curiosidade de averiguar quem está ali, escondido no escuro, é maior que
tudo, maior até mesmo que a necessidade de me proteger.
O desconhecido está sentado no parapeito, de costas para mim, seu
smoking preto se mistura à escuridão da noite e percebo que seus
movimentos são lentos, quase como se não conseguisse mover seu braço
direito, enquanto levanta a garrafa de Jack Daniel’s até seus lábios. O
cabelo loiro cai um pouco em sua testa, me impedindo de observá-lo
completamente, porém tenho que ter certeza de que ele possui a minha
idade.
— Isso é uma propriedade privada — declara, com sua voz
arrastada, sem olhar para trás. — Sugiro que saia.
Franzo o cenho. Esquecendo todo o pânico que a segundos atrás
corria sob minha pele e sendo envolvida pelo incômodo causado pelo tom
de suas palavras.
— Não, não é.
O desconhecido vira seu rosto totalmente em minha direção. E o
mais incrível dos olhos verdes me encaram, suas pupilas dilatadas me
mostram algo, talvez um resquício de uma eternidade não compreendida,
talvez uma escuridão repleta de estrelas cadentes.
Contudo, o seu semblante abatido entrega o quanto algo o está
incomodando, e minhas dores sussurram em meu ouvido que talvez ele
tenha vindo até aqui para também encontrar algo que acabe com essa
aflição que percorre o seu ser.
De repente, nesse exato momento, eu quero dizer que não, não há
nada nesse lugar ou nesse mundo que mudará o que quer que esteja doendo,
porque, pela minha própria experiência, ainda vai doer por um bom tempo e
talvez nunca se cure.
— Então, você é nova neste lado da cidade — desdenha, engolindo
outro gole. — Porque todos que moram por aqui, sabem que este é o meu
local.
Sei que é mentira. Ninguém nem ao menos vem até aqui.
Dou de ombros, cruzando os braços em frente ao corpo, erguendo
uma sobrancelha.
— Sinto muito em decepcioná-lo e dizer que se o ambiente não
possui placas com o seu nome ou um documento que comprove tal fato —
constato, lhe lançando um sorriso frio. — Este lugar continua sendo de
propriedade pública.
Ele estala a língua no céu da boca, provavelmente me insultando
com todos os palavrões existentes no nosso idioma. Contudo, pende a
cabeça para trás e solta uma gargalhada. É um som rouco, que traz
vibrações para dentro do meu peito.
— Você fala como a minha avó quando está dando uma bronca em
seus funcionários — debocha, passando a língua no céu da boca. —
Patético.
Ergo uma sobrancelha, irritada. Sem perceber, dou um passo à frente
sentindo o cheiro lascivo de álcool e outra garrafa de licor vazia
abandonada ao seu lado. O meu companheiro está completamente bêbado e
não tenho a mínima ideia de como consegue suportar o seu peso enquanto
está sentado daquela forma.
— Você não deveria beber desta maneira.
Não é problema seu, Summer. Vire-se e volte para casa antes que
eles cheguem e sintam sua falta.
É o que meu subconsciente grita, é o que eu deveria fazer. Mas, há
algo na presença dele, algo que me faz sentir confortável em estar perto de
alguém depois de meses, eu não sei explicar, mas sinto e sem perceber já
almejo por mais.
— Você não deveria cuidar da sua vida?
— Estou tentando não ser testemunha de uma morte acidental, caso
caia desse píer e se afogue.
Ele gargalha novamente.
— Acho que seu complexo de heroína não me deixaria morrer
afogado — diz, simplesmente, levando a garrafa até a boca.
— Não seja tão confiante. — Dou de ombros. — Eu não pularia em
um lago praticamente congelado para salvar um estranho.
Ele me estuda por alguns segundos, passa as pernas pela mureta e
pula de lá, cambaleando em seus próprios pés até chegar onde estou. O
garoto desconhecido é mais alto que eu, o que me obriga a olhar para cima,
para seu rosto estupidamente bonito. A mandíbula marcada, os olhos verdes
e lábios carnudos, envoltos de uma pele clara e sedosa. Por algum motivo
inexplicável, não senti vontade de me encolher, de fugir ou de entrar em
pânico por estar tão perto de mim.
Não, eu inclinei a cabeça para o lado, estudando-o lentamente,
tentando entender quem era e o que fazia aqui. A poucos metros de uma
festa que toda a cidade gostaria de ser convidada, longe de pessoas da sua
idade que o ajudariam a ficar bêbado sem que precisasse implorar.
Eu o estudo, tentando chegar a uma conclusão. Porquê alguém tão
lindo e misterioso prefere a solidão a um lugar repleto de pessoas, sendo do
seu ciclo social ou não, mas que o bajulariam da mesma forma?
— Meu nome é Oliver — diz, por fim. — E definitivamente, não
sou um estranho.
Umedeço meus lábios, sem nunca desviar o olhar e maneio a
cabeça, concordando.
— Ainda sim, eu não o salvaria, Oliver — afirmo, convicta.
Ele sorri, um sorriso tão lindo e ao mesmo tempo perigoso. Um
sorriso que me lembrou o dia que eu recebi um parecido, de uma pessoa
totalmente diferente, e que no final foi o motivo pelo qual eu visitei o
inferno com os pés descalços.
— Eu não acredito nisso.
— É uma pena, porque é a verdade.
Dou de ombros, me escorando do outro lado do píer, longe o
suficiente dele e perto do degrau, para ter uma rota de fuga segura, caso o
meu julgamento sobre o garoto tenha sido incoerente.
Ele deixa seus ombros caírem e leva a bebida outra vez até seus
lábios, tomando outro gole exagerado. Assim que tenta dar um passo à
frente, na minha direção, tropeça em seus próprios pés, se desequilibrando.
Antes que eu possa pensar no que estou fazendo, ando rapidamente até ele e
o encosto no parapeito, mantendo seu peso em meu lado direito.
— Eu disse que seu complexo de heroína me salvaria — ele
sussurra arrastado, me lançando um sorriso que deveria ser sedutor, mas que
é apenas um resquício do estado que está nesse momento.
Mordo minha bochecha, tentando segurar uma risada, mas,
inconscientemente, meus lábios se curvam para cima, formando um enorme
sorriso.
Um sorriso verdadeiro, alegre.
Olho de relance para Oliver, que está me encarando sob sua névoa
embriagada e de repente, o seu rosto bêbado se ilumina, ao mesmo tempo
que solta outro lindo sorriso. Um sorriso que faz com que borboletas
dancem em meu estômago e um frio suba pelo meu esôfago.
Um ato impensado para dois desconhecidos.
Um sorriso verdadeiro entre duas pessoas que não se conhecem, mas
que sabem que estão machucadas.
Uma ação humana que não pertence ao meu cotidiano.
— Linda — murmura. — Linda pra caralho.
É um elogio simples, mas que por algum motivo se fixa em minha
alma e faz morada.
Talvez seja por isso, ou talvez seja pelo medo que vem logo em
seguida, que me desvinculo dele. Dou um passo para trás e respiro o ar
gelado da noite. Tento juntar todos os meus pensamentos, a fim de aplacar a
vontade de gritar com ele, exigindo uma explicação sobre ter despertado
esses sentimentos em mim, o porquê me sinto à vontade em sua presença
quando nos conhecemos há apenas cinco minutos e não sinto um pingo de
medo ou receio de suas intenções.
— Você não deveria estar no baile? — pergunto, ignorando sua frase
anterior.
Ele bufa, voltando a se sentar e a beber o whisky caro.
— É minha primeira noite aqui, após alguns anos — conta, e sinto
verdade em suas palavras. — Achei que um lugar tranquilo seria melhor do
que um baile com pessoas hipócritas.
— Ok.
— E você, loirinha, por que está aqui vestida em trajes que tenho
certeza de que minha madrinha não aprovaria para o seu baile? — ele
questiona, sarcasticamente.
Mordo meu lábio inferior, olhando para baixo, para minhas roupas e
para um papel amassado em uma das suas mãos.
— Não gosto de comemorações — digo uma meia verdade. — E
meus pais preferem que eu esteja na segurança de nossa casa.
— Acredito que está burlando o desejo deles.
Solto um pequeno sorriso. É fácil sorrir quando Oliver é o motivo
pelo ato, talvez ele mascare tão bem suas dores que me sinto bem em fazer
o mesmo.
Por uma noite, me permito não ser a pessoa que não consegue sair
do quarto ou que tem medo de todo o mundo.
Eu apenas me permito ser Summer, a versão que eu era, pelo menos.
A versão que sorria sempre que queria. Que confiava em si mesmo e
nos outros.
Eu apenas sou eu.
Sem mentiras, medos e anseios.
— Sim, eu estou.
Ele sorri, sem julgamentos. Apenas maneia a cabeça, como se
entendesse, como se tivesse encontrado algo pelo qual não sabia que estava
procurando.
— Bem, você não está sozinha nisso — conta, se virando para o
lago.
Dou um passo em sua direção, depois outro e quando percebo, estou
sentada ao seu lado. Nossas mãos quase se tocando, nossos corpos
enrijecidos pelo frio da noite. E mesmo que eu saiba que é momentâneo, eu
aproveito todas as sensações. Aproveito que Oliver não me trata como uma
boneca quebrada e sem conserto, como se me tocar significa que entrarei
em pânico. Aproveito a normalidade do momento, mesmo sabendo que
talvez seja a única e última vez que poderei desfrutar de tal ensejo.
— Você… — pauso, tentando encontrar a palavra certa para a frase
que irei proferir. — Está fugindo de algo?
Ele me encara de esgueira, refletindo sobre minha pergunta.
Assim que o silêncio se torna cômodo, Oliver deixa seus ombros
caírem, leva a garrafa outra vez até sua boca e ingere uma grande
quantidade da bebida. Logo após, estende o objeto em minha direção e
percebo que já está abaixo da metade, o que me preocupa. Ele pode entrar
em um maldito coma alcoólico nesse lugar deserto.
Nego com a cabeça e abro a boca para dizer que deve parar de beber
desta forma, mas ele é mais rápido e apenas responde a minha pergunta:
— Não estamos sempre fugindo de algo?
Olho para ele, tentando entender suas palavras. Compreendo que é a
verdade.
Nós sempre estamos fugindo de algo.
— Às vezes, fugir é a única alternativa — divago.
Como estou eu fazendo. Sei que não é a melhor escolha. Sei que
estou fugindo e sei que é inevitável. Mas, preciso dessas medidas
suportáveis, preciso fugir das minhas lembranças, dos meus martírios, fugir
de mim mesma, porque sempre que cruzo a linha, sempre que caio no velho
abismo conhecido, tenho a plena consciência de que é difícil sair de lá.
Ainda que no final todos achem que irei aparecer renovada, fica
sempre uma mancha, um medo, um assombro. Sempre que volto dessas
lembranças, volto com algo perturbador que incomoda até o fundo do meu
âmago.
Oliver suspira, tentando erguer os ombros. Percebo que seu rosto se
enrijece, como se estivesse sentindo dor ou algo similar. Seus olhos
encontram os meus e, por um milésimo de segundo, quero que esse
momento dure, quero manter essa imagem dele, relaxado e confiante em
minha mente. Quero que esse lago, esse lugar, esse momento, seja
permanente.
Contudo, não há nada no mundo que seja permanente em minha
vida.
— Quem te machucou, loirinha?
Todos.
— Quem te machucou, Oliver?
Mordo o lábio inferior quando ele fica me encarando. Há apenas o
silêncio pairando entre nós dois, enquanto nos encaramos. Há barulhos no
fundo, bem longe daqui, barulhos de carros, música, vida…
Mas aqui, nesse ínfimo lugar, há apenas nós.
Dois desconhecidos.
Dois adolescentes que precisaram superar dores ainda jovens.
Dois feridos que não sabem como se salvar.
— A vida — é a sua resposta.
— Sinto muito — é a minha.
— Eu também.
Oliver não está se referindo a ele mesmo, mas a quem me
machucou. A pessoa que é o motivo pelo qual preciso correr todas as noites,
para que meu corpo exausto possa dormir e descansar por algumas horas,
antes que os pesadelos me peguem, me façam regressar na noite que quero
e preciso esquecer.
— Eu tenho uma amiga. Sophie, o nome dela — ele diz, de repente.
— Ela sempre diz para Vee, sua irmã, que devemos continuar a dançar
mesmo quando não houver música.
É uma frase simples, uma metáfora que contém tantos significados
para pessoas machucadas. Sorrio. Sorrio por saber que ele tem amigas, por
saber que ele não está sozinho em seu próprio martírio.
— E por que você ainda continua dançando, Oliver?
Minha pergunta é tão baixa, que quase acho que ele não me escutou.
Todavia, seus olhos encontram os meus. Não há brilho, nem diversão. Eles
são vazios, distantes e quebrados.
— Porque se eu parar, se eu permitir me quebrar, significa que os
monstros venceram.
Sua frase tem mais impacto em mim do que qualquer outra palavra
que proferiu em todo o momento que nos conhecemos.
Se você parar, os monstros vencem.
É a verdade.
E eu parei.
Deixei que eles vencessem, deixei que eles triunfassem em minha
derrota. Mas, talvez esse momento seja tudo o que eu estava procurando,
seja o momento pelo qual esperei noite após noite.
Se você parar, os monstros vencem.
É um mantra, um mantra que Oliver me deu.
Um mantra que eu irei usar em minha próxima batalha.
Um que irei utilizar para me reerguer.
— Obrigada, Oliver — agradeço mesmo que ele não faça a mínima
ideia do que estou agradecendo.
Mesmo que não saiba o que ronda meus pensamentos, Oliver parece
compreender o que estou agradecendo. Parece saber que aquela frase,
aquela simples metáfora, acabou de transformar todo o meu futuro, acabou
de me mostrar que posso me reerguer, que posso, outra vez, ser uma pessoa
forte, guerreira. Ainda que isso signifique que eu precisarei mentir para
mim mesmo.
Precisarei dizer, dia após dia, que se eu parar, ele vence.
Se eu não for feliz, se não me permitir viver, ele vence.
E eu perco.
E não estou disposta a perder outra vez!
— Sempre ao seu dispor, loirinha.
Sorrio.
— Acho que está na minha hora — sussurro, sabendo que logo
meus pais irão chegar.
E eu preciso dizer a eles. Preciso dizer que o tempo de me lamentar
pelo que aconteceu, acabou.
Eu preciso viver.
Preciso que eles saibam que estou jogando meu passado para dentro
de um baú, trancando e atirando-o em meio a um oceano profundo dentro
do meu coração.
Estou cansada de apenas sobreviver.
Uma nova música se reinicia, uma nova dança, uma que não
permitirei que eles vençam.
— Foi um prazer te conhecer, loirinha — sinto verdades em suas
palavras.
— Continue dançando, Oliver — murmuro para ele.
— Volte a dançar, loirinha. — Ele se aproxima, deixando um beijo
rápido em minha bochecha. — E nunca, em hipótese alguma, se esqueça
desse momento.
Eu não esqueceria, nem se quisesse.
— Não se atreva a esquecer de mim, Oliver. Eu te salvei de um
possível afogamento — brinco sorrindo.
Ele sorri. Um sorriso lindo, incrível.
— Você sempre será a melhor memória desse lugar, loirinha.
Eu me levanto, seguindo até a pequena escada do píer sorrindo pois,
pela primeira vez, não estou saindo desse lugar com lágrimas nos olhos e
medo no coração. Não, eu estou saindo com um mantra e uma esperança.
Olho para trás, para Oliver. E percebo que ele já está me encarando.
— Eu não sei seu nome, loirinha.
Solto uma gargalhada.
— Da próxima vez que nos encontrarmos, eu te conto.
Me viro, começando a correr. Imaginando como seria a próxima vez
que nos encontraremos.
Mas há algo que ninguém me contou: não haveria uma próxima vez.
Nunca mais conversei com Oliver.
Ele nunca soube meu nome.
Porque Oliver se esqueceu de mim.
Mas eu voltei a dançar.
Bem, eu não quero perder também
Eu acho que não posso ficar sentado
Enquanto você está se machucando, amor
Então pegue minha mão
Fall | Justin Bieber

Eu encarei Summer por vários minutos, talvez horas.


Aquilo não podia estar acontecendo. Não, eu não podia acreditar que
essa parte da minha vida foi tirada de mim. Que eu a esqueci como se fosse
um detalhe insignificante de existência medíocre.
Não posso aceitar isso.
Não posso aceitar que ela guardou essa lembrança e me odiou por oito
anos.
Oito. Malditos. Anos.
Anos que me foram arrancados, memórias que foram distorcidas e
reconstruídas a fim de agradar apenas uma pessoa.
Brandon Wright.
Quando Summer se virou e se trancou no quarto que pertencia a minha
mãe — se escondendo de mim, do que acabou de me confessar —, eu quis
correr até ela e abraçá-la, quis pedir desculpas por tudo. Por não ter tido
controle do que aconteceu posteriormente ao momento em que nos
conhecemos.
Mas, como eu faria isso se tudo o que quero entender, é o por que
caralhos eu não me lembro dela? De como eu posso lembrar de todas as
sensações daquela noite, porém não consigo lembrar de como nos
conhecemos?
De como a fiz sentir viva, mesmo que estivesse machucada? Como fui
capaz de esquecer a única coisa boa que aquela noite me trouxe?
Arranco a gravata, jogando-a no chão e desabotoo os primeiros botões
da minha camisa, a fim de conseguir finalmente respirar. Me sento no sofá,
vendo os primeiros raios solares nascerem, escorando meus cotovelos nos
joelhos e deixando minha cabeça pender entre meus braços.
Eu havia programado todo um dia para nós dois. Havia criado o
monólogo perfeito para nosso último dia na cidade que consistiria em
mostrar a ela todos os outros pontos turísticos que não tivemos tempo de
visitar, mas agora, é como se tudo se tornasse impossível. Como se uma
parte de mim não conseguisse olhar para Summer sem que a culpa se
infiltrasse em meu coração.
Sem que fizesse o possível e o impossível para me lembrar.
— Nós podemos voltar para o apartamento do seu pai? — Sum pergunta
atrás de mim.
Me viro lentamente, encarando seu lindo rosto e desejando tocá-lo.
— Sum...
Ela solta um sorriso falso.
— Eu não quero falar sobre isso, Oliver. Por favor... apenas vamos
embora para que possamos arrumar nossas malas. — Sua voz sai em um
murmúrio sofrido. — Eu quero voltar para casa o quanto antes.
Sua última frase me acerta como se fosse uma faca sendo cravada em
meu peito. E, por incrível que pareça, apenas maneio a cabeça concordando
e chamo um Uber.
Não tento fazer com que mude de ideia e ela não me pede explicações.
Não grita comigo e exige que confesse o porquê a ignorei por todos esses
anos ou porque me mantenho tão blasé sobre isso, mesmo que por dentro eu
sinto como se tudo estivesse a um fio de explodir.
Por isso, por ser um maldito covarde, a assisto se afastar para tudo o que
vivemos nestes poucos dias nessa cidade.
E digo a mim mesmo que ela precisa do seu próprio tempo para se
recuperar de todas as lembranças que despejou entre nós. Por esse motivo,
passo os próximos vinte minutos em silêncio total dentro do táxi e evito o
quarto que estamos dividindo pelas próximas horas que se sucederam a
nossa chegada a cobertura.
Deixo que ela decida como deseja lidar com a bagunça que causei em
sua vida, que consiga decidir se quer romper nosso acordo e nunca mais
olhar em meu rosto ou que apenas deseja que possamos achar uma solução
para isso juntos.
Mesmo que eu almeje pela segunda opção, eu desistiria de tudo por ela.
Desistiria da minha vingança, dos meus planos e de todas as regras. Por ela,
eu escolheria nós dois acima de qualquer outra coisa.
Escolheria todas as sensações que me fez sentir nessas semanas,
escolheria seus sorrisos, seus olhares e suas pequenas peculiaridades.
Escolheria assistir mil filmes de super-heróis, vestir inúmeras camisas com
os rostos dos personagens estampados.
Eu escolheria Summer Miller acima de qualquer coisa.
— Onde está a minha cunhada preferida? — Andrew questiona, se
jogando ao meu lado no sofá da sala, vestido em um pijama de cetim preto.
Solto um suspiro, saindo dos meus devaneios.
— No nosso quarto — digo, encarando a cidade através das enormes
janelas de vidro que vão do chão ao teto. — Ela... está cansada.
— Você é um péssimo mentiroso, sabia? — sorri abertamente.
— Eu sou? — devolvo, encarando-o.
— Claro. — Dá de ombros. — Sempre mexe nesse relógio idiota
quando está nervoso. É um tique que Vee me contou um dia e ela nunca
erra!
Ergo uma sobrancelha, mal percebendo que realmente estou girando o
acessório em meu pulso.
— Há algo importante por trás disso que eu não estou conseguindo
distinguir? — pergunto, voltando minha atenção para frente.
Andrew inclina a cabeça para o lado me estudando.
— Claro! — exclama, sorrindo. — Você é um babaca. Mas,
infelizmente, é meu irmão. Então é meu trabalho dizer que ficar aqui
sentado e se perguntando o que há de errado, não fará com que ela saia
daquele quarto e fale com você.
— Eu sei o que há de errado — digo, suspirando fundo e jogando minha
cabeça para trás, encarando o lustre no teto. — E ela está falando comigo.
— Ela está? — ele pergunta, ironicamente. — Porque não foi isso que
eu e Lauren percebemos quando chegaram.
— Você é amigo de Lauren agora?
— Não mude de assunto!
Reviro meus olhos.
— Deus, você é irritante!
— Idem. — Ele se levanta. — Agora, escute a voz da razão aqui, não sei
qual a merda você aprontou, mas faça algo que ela gosta para se redimir.
Porque eu realmente gosto da minha cunhadinha, Oliver.
Olho para ele por alguns segundos.
Summer está assim por conta do nosso passado. E, mesmo que eu
realmente queira contar tudo, contar o motivo pelo qual não me lembro
dela, o motivo pelo qual apenas alguns resquícios de memórias daquela
noite rondam a minha mente, ainda não posso confessar. Não posso dizer a
ela tudo o que houve após aquele momento no píer.
Não até que todas as pessoas que eu amo estejam seguras.
— O quanto você gosta dela? — pergunto, baixinho.
— Muito.
— Ótimo, pois você está indo até um maldito Starbucks e me trazendo
um frappuccino — digo, me levantando e tirando meu cartão do bolso. — E
não demore.
Andrew ergue uma sobrancelha.
— Por que diabos você quer um frappuccino? — questiona. — Achei
que fosse viciado só em cafeína.
— Não é para mim.
— É para ela?
— Sim. É a sua bebida favorita — conto, indo em direção às escadas. —
Agora ande logo, Andrew!
— Eu estou de pijama, Oliver! — ele não hesita em praticamente gritar
ofendido. — Eu tenho uma reputação a zelar.
Reviro meus olhos.
— Talvez você não goste tanto assim de Sum — solto um sorriso frio.
— E, pelo amor de deus, o Starbucks é do outro lado da rua.
Ele solta um suspiro fundo, derrotado. Então, caminha até a porta e a
abre, não se importando que realmente está indo caminhar pelo Upper East
Side vestido apenas com um pijama de frio preto e a cara amassada. Andi
não se importa se isso resultará em uma foto em uma manchete de fofoca
ou em olhares desagradáveis.
Assim como eu, ele apenas se importa com Summer.
E, constato isso quando se vira e ergue uma sobrancelha.
— Ela vai voltar a sorrir para mim se eu buscar a sua bebida favorita?
— pergunta, esperançoso.
— Ela vai, Andi.
— E... ela vai te desculpar, Ollie?
Hesito por um segundo, sem ter a resposta para a sua pergunta.
— Não sei, mas tenho algo em mente.
Andrew abre um sorriso fraco, de uma forma mais tímida, como se
realmente estivesse controlando uma risada.
— Ah é? E o que seria?
É a minha vez de abrir um sorriso. Um sorriso que se estende por todo o
meu rosto e causa borboletas em meu estômago.
— Eu estou levando a minha namorada para correr — digo, dando de
ombros.
— Você odeia corridas.
— Mas ela ama — murmuro. — E ela é tudo o que importa para mim.
Summer hesitou por alguns segundos.
Ela olhou no fundo dos meus olhos e pude ver cada machucado, cada
lágrima que queria poder deixar descer pelo seu lindo rosto, porém não
permitiria.
Summer Miller é assim, ela é uma maldita força da natureza que nunca
se permite quebrar. Ela é forte. Linda. Perfeita.
Após alguns segundos me encarando, ela assente e caminha até a sua
mala, procurando por um conjunto de roupas confortáveis para que
pudéssemos correr pelas ruas da cidade por uma última vez. Uma última
vez em que estaremos assim, leves, livres e aproveitando a companhia um
do outro. Uma última vez para que ela possa me contar coisas que eu nunca
poderia ter as respostas.
Alguns minutos depois, estamos passando pelo corredor que liga ao
elevador e, de repente, um apito fraco, indicando que as portas estão se
abrindo faz com que olhemos para frente, para onde Andrew está segurando
dois frappuccinos com um sorriso descarado e um botão do pijama aberto.
— Por que você ainda está vestido assim? — ela pergunta, erguendo
uma sobrancelha.
Andi dá um passo à frente, ainda mantendo o sorriso no rosto.
— Porque eu não podia perder tempo.
— Para?
— Buscar a bebida favorita da minha cunhada favorita — ele conta,
estendendo um copo em sua direção.
Sum ergue o braço, pegando o objeto e mordendo o lábio inferior, como
se estivesse segurando uma risada.
— Você foi até o Starbucks buscar um frappuccino para mim? De
pijama? — questiona.
— Aham. — Os olhos cinzentos brilham para Summer. — Eu queria ver
você sorrindo outra vez e um passarinho verde me contou que é a sua
bebida favorita. E… eu conheci um garoto na fila, convidei ele para um
encontro.
Summer olha de relance para mim, seus olhos me dizem tudo o que
preciso saber.
Tudo o que não posso controlar, mas desejo.
De repente, um sorriso nasce nos cantos da boca de Summer e ela volta
seu olhar diretamente para Andrew que agora está prestes a pular de alegria
por ter conseguido. Por ter feito com que a tristeza abandonasse aquelas
lindas íris.
— Você é incrível, Andi! — exclama baixinho, puxando-o para um
abraço.
Andrew não hesita em abraçá-la fortemente.
— Você é a minha pessoa favorita, Sum — ele murmura, afagando seus
cabelos. — Depois de Ollie, é claro.
Ela solta uma gargalhada.
Tudo dentro de mim se acalma. Todo o caos que nos acompanha desde o
apartamento, nesse momento, é apenas um cochicho distante perto do som
emitido no corredor. Nenhum outro barulho, poderia se comparar com a paz
que está por trás.
E, assim que Andrew a solta e ela me encara, sei que meu irmão acabou
de fazer o que eu não irei conseguir tão cedo.
Andrew a fez sorrir de verdade.

Nós corremos pelos arredores do parque sem emitirmos nenhum som


além de nossa respiração ofegante. O silêncio nos abraça e faz morada entre
nós. E mesmo que meu coração esteja batendo descontroladamente em meu
peito, me recuso a parar. A fazer com que voltemos para casa sem que nos
resolvamos, sem que ela olhe para mim com aquele brilho que faz com que
tudo dentro de mim se agite.
Porra, nós estávamos progredindo. Nós fomos um casal, uma dupla.
Confiamos um no outro, deixamos que nossos problemas não interferissem
em nossa dinâmica. Agora, voltamos à estaca zero.
E isso é uma merda.
Prefiro que ela grite comigo. Que me diga algo, qualquer coisa. Que fale
sobre seus filmes horrendos que estou aprendendo a gostar ou me insulte
apenas para que possamos voltar a nossa rotina em que me peguei
almejando por mais. Desejo tudo isso, apenas para que pare de morar em
sua mente como está fazendo desde o apartamento da minha mãe.
— Eu acho... Acho que preciso parar por um momento — ela diz entre
fôlegos, colocando as mãos nos joelhos. — Apenas cinco minutos.
É tudo o que preciso.
Maneio a cabeça, indicando com o queixo um banco vazio.
Essa área do parque não é tão movimentada como as outras e, por conta
disso, podemos apenas nos sentar e descansar.
E, é exatamente isso que fazemos. Summer e eu nos sentamos em
silêncio, observando alguns pássaros na grama, seguidos de um vento
gélido que bate contra nossas bochechas. Então, olhamos um para o outro.
Nós nos encaramos com tantas perguntas sem respostas, tanto medo de
questionar algo e sairmos ainda mais machucados e confusos.
Temos tantas muralhas entre nós que nem ao menos parece que estamos
lado a lado. É como se estivéssemos voltando outra vez àquela guerra de
corações. Aquela na qual utilizamos para proteger o que habita em nosso
interior, porém agora sabemos que é em vão.
Porque eu estou completamente fora desta batalha se isso significa que
ela se machucará.
Suspiro fundo, levando a mão em meu cabelo e o bagunçando.
— Summer...
— Sim?
Meus olhos encaram os dela. Enxergam ela. Nada mais importa.
— Por que você colocou aquela regra?
— Qual delas?
— Sobre seu passado.
Seu corpo enrijece.
— Porque eu não gosto de falar sobre ele — confessa, olhando para o
lado e fincando seus olhos em qualquer lugar, menos em meu rosto. — Eu
faço terapia há anos, mas, ainda não consigo falar sobre o que aconteceu
com quase ninguém, porque é um machucado não cicatrizado. Acho que
nunca vai se cicatrizar para ser sincera.
Encaro-a por alguns instantes.
— V-você colocou isso com a intenção de que eu não descobrisse?
Ela solta um sorriso fraco.
— Todos temos segredos, os que nós escondemos e os que se escondem
de nós — ela sussurra como se estivesse ditando. — É uma frase simples,
que ouvi em um dos meus filmes favoritos, sabe? Mas carrega um peso
enorme. — Summer me encara, finalmente, percebendo que ainda estou
esperando pela resposta certa. — Eu coloquei essa regra porque não
confiava em você, Oliver. Porque há coisas que precisamos esconder, que
precisamos manter em um lugar seguro da nossa memória, porque a cada
vez que contamos, é como se um pedaço de nós se quebrasse junto.
— E agora você confia? — pergunto.
Ela me encara por um momento, assim que volta a abrir os lábios, não
era a resposta que eu esperava:
— Você não gosta de corridas...
Franzo o cenho.
— Não, eu não gosto.
— Mas, você me chamou para vir correr — continua a sua linha de
pensamento, mordendo o lábio inferior. — E disse a Andrew a minha
bebida favorita, apenas para que ele me fizesse sorrir outra vez.
— Sim.
Decido que a deixarei conduzir essa conversa.
— Por quê?
Me inclino, apoiando meus cotovelos em meus joelhos e a encaro de
relance.
— Porque eu não tinha Verônica, Hazel ou Analu para te abraçar e dizer
que estava tudo bem — murmuro a encarando. — Mas, eu tinha a memória
de suas coisas favoritas e Andrew ao meu lado para ajudar. Então... eu segui
a minha intuição e fiz o que poderia para te tirar do lugar onde se escondeu.
Quando ela vira totalmente o rosto em minha direção e abre a boca para
responder, sei que o que está prestes a sair dos seus lábios é a mais pura
verdade.
— Você é a minha dupla, Ollie — um sorriso fraco nasce em seus
lábios. — Você me irrita às vezes, me faz perder a cabeça. Mas, ainda
assim, você está ao meu lado como prometeu. Então, é claro que confio em
você. Confio como nunca imaginei que confiaria em alguém.
Eu também confio em você, loirinha.
Só por isso, digo as minhas próximas palavras. Elas não são tudo, mas
sim, o que posso ceder no momento até ter respostas.
— Eu preciso que saiba que a minha família, não é uma boa família,
Summer. Eles não são como os seus pais que te protegem de todo o mundo,
pelo contrário, a minha mesmo que possua riquezas incomparáveis, por
dentro, é totalmente pútrida. — Engulo em seco. — Minha mãe sofreu
violência doméstica por quase toda a sua vida de casada, e só achou saída
para isso depois que fugiu com seu amante, quando eu tinha oito anos. Meu
pai é um filho da puta sádico que se alimenta da dor dos outros e sempre sai
impune. Ele me espancou, machucou e humilhou em todas as oportunidades
que possuía. Ele fez isso até os meus quatorzes anos, Sum.
Eu a encaro, percebendo que assim como protejo a minha verdade sobre
qualquer outra coisa, Summer faz o mesmo.
— Eu sou quebrado, linda. Sou um amontoado de memórias de um
casamento construído a base de dor e violência. Sou um mártir na vida
daqueles que deveriam me proteger. Eu não sou bom, Summer. — Minha
voz é desprovida de qualquer emoção, é como se mesmo que as sentisse, eu
não permitia que me atingissem. — A única parte intocável da minha
família é Andrew — continuo quando ela não emite nenhuma palavra. —
Ele é o motivo pelo qual ainda guardo toda a bondade dentro de mim. É por
quem eu continuo aceitando todas as merdas e é por conta dele que, talvez,
eu não me lembre do que aconteceu naquela noite.
Os olhos da loira se arregalam.
Ela engole, uma, duas, três vezes.
— Você não é quebrado, Oliver — sussurra, se inclinando para frente e
levando sua mão até a minha. Nessa posição seu rosto fica nivelado ao meu
e nossos olhos se encontram, se fixam e criam uma conexão inquebrável. —
Você não é um mártir. Não repita isso, por favor. Você é forte, Ollie... E vê-
lo lutando contra seus traumas, seus medos e suas cicatrizes, mesmo que o
mundo te diga para parar, é lindo. Lindo, porque você não se quebra, não se
permite perder. E a sua força, Oliver Wright, é invejável.
Suas palavras se fixam em mim. Ela me encara, nunca desvia os olhos
que, agora percebo, possui um tonalidade cor de mel quando exposto à luz.
Eles são lindos. Impecáveis. Perfeitos.
Encarando-os tenho a plenitude de saber que até mesmo o infinito me
parece efêmero enquanto a olho, a admiro e a desejo.
— Eu vou me lembrar, linda — sussurro, levantando minha mão e
acariciando sua bochecha. — Eu vou me lembrar de nós. Do que tivemos
naquela noite. E isso, Summer Miller, é uma promessa.
Ela não diz nada, acho que nem ao menos respira. Apenas estende sua
mão até o meu rosto imitando a minha ação.
— Por que você não se lembra de mim? De nós?
Nem ao menos hesito em responder:
— Porque eu fiz o que era necessário para salvar o meu irmão, Summer.
Essa é para os solitários
Aqueles que sempre se perguntam para onde seus amigos foram
O garoto que não consegue parar de chorar
A garota que desistiu de tentar
Lonely Ones | LOVA

Nós desembarcamos em Saint Vincent na manhã seguinte.


Acho que Summer não via a hora de estar em casa, de volta a sua rotina
e os seus amigos. Estava explícito em seus olhos o quanto sentia falta deles
e exatamente, por isso, quando saímos do aeroporto, apenas dirigi até o
apartamento dela. E observando-a destravar o cinto de segurança e me
encarar com os olhos ansiosos, sei que tomei a atitude certa.
Solto um pequeno sorriso, abrindo minha porta e indo até o porta-malas
retirar a sua mala. Assim que a entrego, percebo que o rosto de Summer
está virado para frente, encarando o prédio de inúmeros andares e sorrindo.
— Eu... estou indo, ok? — indago, atrás dela. — Até amanhã, loirinha.
Ela se vira e inclina a cabeça para o lado, me estudando.
Um sorriso toma conta do seu rosto. Não é um daqueles sorrisos abertos
e calorosos, mas, ainda assim, é um sorriso.
— Amanhã?
— Nós temos um jantar com os seus pais, esqueceu? — pergunto,
erguendo uma sobrancelha.
— Certo, jantar. Ok! — ela se embaralha com as palavras.
Dou alguns passos até a porta aberta do carro e quando estou prestes a
adentrar o automóvel, a voz suave de Summer faz com que erga meu rosto.
Sua figura se move com rapidez, parando diante de mim, erguendo o rosto.
Sum fica na ponta dos pés e deixa um beijo suave em minha bochecha. O
contato rápido de seus lábios faz com que tudo dentro de mim se agite,
como se pequenas borboletas invadissem meu estômago e fizessem morada.
— Obrigada pelos dias em Nova York, Ollie.
Sua voz não é alta, nem baixa, porém é como se estivesse gritando em
meu âmago. Como se sua pequena frase, mesmo que simples, significasse
tudo.
Ainda, absorto em pensamentos, solto um sorriso.
— Eu quem deveria agradecer, loirinha — digo, lançando-lhe uma
piscadela.
— Bom dia, Ollie.
O canto da minha boca se curva em um sorriso.
— Bom dia, loirinha.

Caminho calmamente entre os enormes corredores da academia de


dança onde Verônica treina. Ela não está atendendo minhas ligações e posso
julgar que esteja tão absorta em sua dança que esse seja o motivo pelo qual
está me ignorando.
As portas do estúdio principal estão abertas, dando-me a imagem de Vee
rodopiando pelo salão ao lado de Melany. Elas colocam a perna direita em
uma posição que seria impossível para qualquer um de nós fazermos e de
repente, dão um giro.
A delicadeza do momento faz todas as outras alunas pararem para
admirá-las. Não é novidade que elas, juntas, são uma dupla incomparável.
Uma lufada de ar escapa dos lábios de Mel, todavia, seus olhos se
mantêm fechados, concentrados, como os de sua companheira. Por um
segundo, sinto-me mal por estar prestes a interromper a atividade predileta
delas. Contudo, preciso da minha melhor amiga, preciso que ela me dê uma
luz como sempre fez.
De relance, vejo Emmy observando-as, em suas mãos repousa uma
prancheta. Ela anota algo e instrui Verônica a refazer o movimento de uma
forma que não entendo. Minha amiga solta um bufo e pousa os pés no chão
com uma delicadeza que seu rosto não possui. Por outro lado, apenas leva
os braços para cima, esticando-os e vira o rosto em minha direção, soltando
um pequeno sorriso.
— Oi, Ollie — Melany cumprimenta. Os olhos azuis, idênticos aos de
Logan, brilham gentilmente em minha direção, diferente de quando nos
conhecemos. — Você finalmente devolveu Sum para nós?
Solto uma risada nasal.
— Ela é toda de vocês, pelo menos até amanhã — pisco, virando-me
para Verônica. — Oi, Pequena Blackwell.
Ela olha para mim, semicerrando os olhos castanhos e focando-os em
mim.
— O que você fez? — questiona, colocando suas mãos na cintura.
Franzo o cenho, ignorando como sua respiração sobe e desce por conta
dos esforços do treino.
— Não há um “bom dia, Ollie” ou um “como foi a viagem, Ollie”? —
devolvo, sarcástico. — Que bela amiga você é!
Ela solta uma risada fria, indo até uma mesa na lateral do salão e
pegando uma garrafa de água. Mel revira os olhos, nos ignora e caminha até
o segundo andar para se juntar a algumas meninas, que me encaram com
um sorriso tímido e bochechas coradas.
— Você nunca atrapalha meu treino — diz, por fim, vindo em minha
direção. Ela para no meio do salão alisando a saia rosa, que entra em
contraste com seu collant preto. — Então, sim, não há essas perguntas para
você hoje. Agora me diga o motivo pelo qual arrastou sua bunda até aqui.
Suspiro fundo, deixando meus ombros caírem e me aproximo dela,
sentando-me no chão e a observando fazer o mesmo. Vee dobra uma perna
e a outra ela estica, enquanto se inclina para ajeitar algo em sua sapatilha.
De esgueira, percebo que agora essa parte do salão está vazia, como se
todos imaginassem que precisaremos de um pouco de privacidade.
— Eu preciso conversar.
— De fato — responde sem me encarar. — O que me preocupa é o
motivo dessa conversa.
Encaro-a em silêncio, me perguntando como diabos vou iniciar isso.
Como vou dizer a ela que estou em um relacionamento falso com uma das
suas melhores amigas, em como tudo o que eu acreditava foi por água
abaixo após a minha ida a Nova York.
Como vou dizer que toda a minha vida foi uma mentira?
— Oliver? — ela chama quando não respondo.
— Summer me conhecia...
— Eu estou perdida aqui, Ollie! — exclama, confusa. — Todos nós nos
conhecemos...
Engulo em seco, encarando-a.
— Não, Vee. Summer me conhecia, ela me conhecia desde o incidente
dos meus quatorze anos — conto a ela. Deixo com que o peso dessa
informação recaia sobre mim. — Ela foi a minha parte perdida daquela
noite.
Os olhos de Verônica se arregalam.
Ela me encara, pela primeira vez, entendendo a proporção do que perdi
naquela noite.
O que ele me tirou. O que talvez eu nunca consiga recuperar.
Brandon me destruiu de formas irreparáveis, mas a pior dor, a pior
cicatriz, é a de saber que talvez nunca me lembrarei de como conheci a
única mulher que faz meu coração bater de uma forma que as emoções não
sejam minhas inimigas.
De como foi ver seus olhos sublimes e sua gargalhada eletrizante. De
saber como foi a sensação de ter sido um porto seguro para ela, mesmo que
ela desejasse me afogar naquele píer.
Ou de como ela me salvou do meu martírio naquela noite, de como eu
estava tão imerso em pensamentos ordinários que apenas ela conseguiu
fazer com que desistisse de fazer aquilo que havia me proposto a fazer.
Summer Miller mesmo que não saiba, me salvou quando eu mesmo não
queria ser salvo.
Então, eu fui lá e a esqueci.
Eu esqueci a peça fundamental do dia em que jurei nunca mais deixá-lo
me quebrar.
— Oh, meu Deus! — A boca de Verônica se abre em surpresa. — Eu
sinto muito, Ollie.
O silêncio, de repente, paira entre nós.
— Não é apenas isso, Vee.
Levo meu olhar até o dela e tento demonstrar todo o conflito, todas as
coisas ocultas desde que embarquei para Nova York, sabendo que quando
voltasse tudo explodiria como uma bomba nuclear.
Verônica não é idiota, ela sabe o que estou tentando lhe dizer mesmo
que em silêncio. Ela sabe que o que acabei de lhe contar é apenas a ponta
do iceberg se tratando dessa viagem.
Ela me entende melhor do que ninguém.
— O que você fez? — sussurra.
— Eu menti para ela, Vee.
Verônica balança a cabeça, inconformada.
— Ela vai te odiar, Oliver.
Seu semblante apático se fixa em meu rosto desprovido de emoções.
Estamos nos encarando como poucas vezes fizemos. Estamos travando uma
batalha, Verônica me ama o suficiente para saber que não quero que se
envolva, contudo, o sentimento que ela tem por Summer está gritando mais
alto. Não é novidade, que o quarteto delas se protege acima de tudo. Se
machucamos qualquer uma delas, todas se machucam.
E, isso foi perceptível, em toda a briga do passado entre Verônica e
Logan. Pois, mesmo com anos de amizade, Hazel e Summer, não hesitaram
em proteger Vee.
Eu nunca desejei isso, nunca quis que ela escolhesse um lado. Por isso,
por proteger as pessoas que amo, escolho a opção mais fácil e a mais
covarde.
Aquela que não prejudicará ninguém, a não ser a mim mesmo.
— Não se eu terminar com ela antes.
Os olhos âmbares de Vee se enchem de tristeza e decepção.
— Oliver, não.
— É o melhor para ela, Verônica.
— Você é um covarde de merda.
Sua acusação me faz sorrir com incredulidade.
— Eu prefiro que ela me odeie do que vê-la se decepcionar.
A risada anasalada que Verônica solta enquanto se levanta me faz erguer
uma sobrancelha, pois o som evidencia todo o seu desagrado.
— E você realmente acredita que ela não vai se decepcionar quando
souber o que você fez? Que não vai te odiar mesmo com todas as desculpas
que der? — reitera, sarcástica. — Summer não é assim, Oliver. Ela não
confia facilmente, ela não é alguém que dá segundas chances para quem a
machucou.
Ela levanta o queixo, soltando um bufo e alisando seu traje, porém
nunca desvia o olhar do meu enquanto me levanto.
— Pelo menos ela não vai presenciar o que eu irei fazer — digo,
passando a mão pelos meus cabelos e dando alguns passos para trás. —
Agora, imagine, Verônica, quando ela souber que eu sabia perfeitamente
que seus pais estavam confirmados na lista de convidados do noivado de
Brandon e mesmo assim menti? Mesmo assim escondi dela? — minha voz
sobe um decibel e até mesmo me surpreendo, porque nunca perdi o controle
desta maneira, nem mesmo por Brandon. — Como ela vai se sentir quando
descobrir que eu causei a ela um maldito ataque de ansiedade apenas por
conta de uma atitude que eu tomei de forma totalmente egoísta? Me diga,
Vee, me diga como ela vai poder olhar em meu rosto novamente após isso?
Verônica dá um passo à frente, os olhos tão decepcionados que uma dor
irrompe meu peito. Ela nunca me olhou desta forma, uma parte de mim
sente a dor como um tiro vindo a quilômetros por horas.
— Os pais de Summer são tudo para ela, Oliver! — Verônica exclama.
— Você não imagina a complexidade da situação, do quanto ela abre mão
quando se trata deles e do que aconteceu em sua família.
— Eu não tinha como imaginar que sairia do controle — digo, deixando
meus ombros caírem. — Eu pensei que...
— Esse é o problema, Ollie. — Um suspiro escapa dos seus lábios —
Você está tão absorto em sua vingança, em destruir Brandon, tirar tudo dele,
que não percebe o que está perdendo a sua volta.
— Você pensou assim quando fez aquilo? Quando se destruiu por uma
vingança? — pergunto, engolindo a bile.
Ela me lança um sorriso frio, falso.
— Eu perdi meus amigos. Meu namorado. Minha vida — pontua,
inclinando a cabeça. — Eu perdi mais do que estava disposta a dar. Então,
sim, Oliver, eu me senti exatamente assim. E é por isso, estou te dizendo
que mesmo que seja o meu melhor amigo, meu irmão e que eu te ame
demais — sua voz é baixa, machucada. — Eu não irei te apoiar e cooperar
com isso. Eu não posso, Oliver. — Ela morde o lábio inferior. — Eu vou
segurar sua mão e chutar a sua bunda, porque sei que vai precisar. Mas,
sinto muito, eu não posso te apoiar nisso. Porque essa vingança, esse
plano… já está indo longe demais e está caminhando em direção a sua
própria destruição.
Ela segura a garrafinha de água em uma das mãos e se vira, começando
a caminhar em direção aos vestiários, me deixando parado em meio a tantos
espelhos.
Assim que levanto meu olhar, encontro meu rosto no reflexo na parede.
Todos os meus traços são a cópia dele. Todavia, o que me chama atenção
são os olhos assombrados que me ferem como espinhos que rasgam meu
peito.
Por isso, por estar tão inerte em minha dor, solto à última mentira que
escondia da minha melhor amiga:
— É falso.
Verônica se vira lentamente, franzindo o cenho.
— Desculpe?
— O meu relacionamento com Summer. É falso.
Não perca quem você é, no borrão das estrelas
Ver é iludir, sonhar é acreditar
É normal não estar bem
Às vezes, é difícil
Seguir o seu coração
As lágrimas não são uma derrota
Who You Are | Jessie J

Detenho meu passo no primeiro degrau da escadaria da casa dos


meus pais.
A cada vez que meus pés tocam um deles ao mesmo passo que subo,
a necessidade de me virar e correr sentido contrário envolve o meu peito.
Passado e presente borram uma linha que não consigo controlar
desde Nova York. Como se, no fundo, soubesse que tudo isso não acabará
como desejo. É como se, outra vez, eu soubesse que estou sendo a culpada
pelo definhamento da minha família.
Por conta de uma mentira. De algo que eu poderia ter controlado e
não fiz.
E eles não merecem isso, essa mentira. Tampouco merecem viver
com o fantasma do que aconteceu comigo pairando sobre as suas
lembranças. Minha mãe não merece dormir com a lembrança dos meus
gritos sendo seus pesadelos, quando nem ela mesmo poderia se salvar ou
salvar nós duas do que estava nos esperando naquele dia.
Ela fez o possível e o impossível para nos manter segura, mesmo
que no final, não tenha conseguido e foi tão machucada como eu, se não
mais.
— Você está bem, loirinha? — a pergunta de Oliver invade meus
pensamentos, fazendo com que volte a realidade.
— Não sei ainda — murmuro. — Vai dar tudo certo, não é?
Oliver hesita em responder.
Olho para ele, erguendo uma sobrancelha. Ele está me escondendo
algo. Não é preciso ser uma pessoa superdotada para perceber isso. É
perceptível em cada fala, ação ou maneira como evita meus olhos.
— Não responda — ordeno. — Acho que não preciso acrescentar
mais drama a essa noite.
— Sum...
Solto um suspiro resignado, o ignorando e finalmente abro a enorme
porta de madeira escura adornada com vidros. Assim que adentramos,
lembro do sangue em minha roupa que não era meu, contudo não deixava
de fazer com que a culpa pairasse em meu peito, invade meu subconsciente.
Eu fui a responsável por aquela noite.
Eu a machuquei. Foi por mim que ele veio e foi por mim que a
destruíram.
De repente, é como se estivéssemos regressando em uma noite
chuvosa, como a de hoje, em uma casa longe daqui, longe de toda essa
segurança e que continha um cheiro nojento de álcool e gritos de mamãe,
que me despertaram medos incontroláveis e mudaram a nossa vida para
sempre.
Engulo em seco, controlando a minha respiração e então deixo
minha bolsa na mesa de apoio ao lado da porta, que é um pequeno closet
para casacos e dou passos ínfimos ao lado de Oliver até a enorme sala de
estar.
— Boo? É você? — a voz rouca e sentimental do homem que eu
amo atravessa o enorme lugar, vindo do corredor lateral que liga ao seu
escritório.
Me viro lentamente, colocando um sorriso leve em meu rosto, ao
mesmo tempo que ele vira o corredor.
Papai para no centro da sala, encarando-nos e quando os olhos
castanhos brilham em felicidade quando me vê e seu sorriso grande e
caloroso, sei que o ato iluminou até as partes mais escuras da minha alma.
Ele retira as abotoaduras e dobra as mangas da blusa social escura,
dando um passo à frente, vindo até mim, não me dando tempo para me
preparar e me envolvendo em um abraço apertado.
Aprecio a fragrância familiar, sentindo seus braços apertarem meu
corpo magro, me obrigando a respirar com uma força atípica.
— Pai — minha voz sai em um chiado, percebendo que o ar está
começando a me faltar. — Você está me apertando. Muito.
— Me desculpa, Boo — sussurra se distanciando. — Estou com
saudades da minha garotinha. Acredita que ela começou a namorar e não
achou que seria conveniente contar aos seus pais?
Ergo uma sobrancelha, cruzando os braços frente ao corpo e
lançando a ele um olhar mordaz. Daqueles que sempre lanço quando usa a
voz de criança comigo ou nas ocasiões que quer dar uma bronca, mas acaba
fazendo um drama digno de Oscar.
Meu pai pode ter o dobro da minha idade, porém, mesmo assim,
continua com um humor que nem mesmo minha mãe consegue suportar às
vezes.
— Você e mamãe já estão a par de tudo — friso, sarcástica. —
Vocês dois precisam parar de me tratar como se eu ainda fosse uma
adolescente, pai.
Ele inclina a cabeça, franzindo o cenho. Sempre digo a ele que essa
expressão adiciona dez anos a mais à sua idade e como soubesse que as
palavras saíram de meus lábios, ele responde antecipadamente:
— Besteira! — Estala a língua no céu da boca. — Você sempre será
a minha pequena marvete. — Ele olha para Oliver ao meu lado e maneia a
cabeça, ainda desconfiado. — Oliver.
Ollie dá um passo à frente.
— Sr. Miller — cumprimenta.
Rolo meus olhos para a formalidade com que Oliver responde.
Todavia, não tenho tempo suficiente para zombar dele, pois a risada do meu
pai rompe o ambiente.
— Deixe disso, garoto! — exclama, o puxando para um abraço. —
Sou praticamente seu sogro, pode me chamar de Gerald.
Oh, céus.
Oliver o encara surpreso por algum tempo. É como se ele nunca
tivesse presenciado uma cena como essa. Como se o fato do meu pai ser tão
receptivo fosse estranho ou até mesmo uma experiência nova.
— Vou ajudar sua mãe antes que ela venha me buscar — brinca. —
Fiquem à vontade.
Inclino a cabeça sorrindo e quando ele some entre os corredores,
volto minha atenção para Oliver.
Ele respira fundo, fechando os olhos por um segundo.
— Está tudo bem? — pergunto.
Oliver me encara. Há algo ali, algo que talvez eu não queira nem ao
menos descobrir. Pela primeira vez, eu quero ser uma covarde e fingir que
não estou percebendo que algo está ruindo entre nós.
— Marvete, hein? — brinca, de repente, mudando de assunto. —
Acho que talvez esteja na hora de abandonar o loirinha.
Franzo o cenho.
— Não ouse.
— Largar o loirinha? — questiona. — Eu sabia que você amava.
Meus olhos se semicerram e cruzo os braços frente aos meus seios,
percebendo que os olhos de Oliver vão diretamente para onde o pequeno
decote do meu vestido lhe dá uma visão privilegiada.
— Você é um idiota.
— E você é linda — devolve se aproximando. — Mas, por mais que
eu deseje te curvar sobre esse sofá e lhe ensinar o quão idiota eu sou, eu não
farei isso. Preciso ter uma imagem a zelar com seus pais.
Solto uma gargalhada, mesmo que por dentro meu núcleo se aperte e
a imagem dele me curvando no sofá e... Deus, Summer!
— Você está imaginando — acusa, passando a língua pelo lábio
inferior.
Jesus!
— Nunca! — exclamo.
Ele abre a boca para dizer algo que tenho certeza de que fará com o
desejo de jogá-lo pela janela aumente, todavia, o barulho de saltos batendo
contra o piso alabastrino, me faz fechar a boca, esperando a nossa
companhia.
Minha mãe aparece, segundos depois, com seus cabelos loiros
amarrados em um coque elegante, destacando o pequeno cordão de pérolas
e um vestido midi preto. Quando ergue o rosto lindo e severo, solta um
sorriso fraco, aliviado.
Diferente do meu pai, ela sempre preferiu atitudes de serviços para
demonstrar seu sentimento amoroso. Palavras sentimentais nunca foram o
seu forte, e talvez eu tenha herdado esse traço dela.
— Você não me ligou quando pousou em Saint Vincent — afirma,
vindo em minha direção.
Não há um “tudo bem, Sum?” ou “como foi a viagem, filha?”. Não,
ela não gastará os poucos minutos que venho até aqui para fazer perguntas
banais. Ela aproveitará todo o tempo para conseguir extrair todas as
informações que puder sobre a minha rotina, minha terapia e até mesmo
meus pesadelos.
Olho de relance para meu pai e percebo que já me encara com as
sobrancelhas arqueadas em uma frase silenciosa, como se dissesse em meu
subconsciente: “ela só está preocupada”.
Tenho vontade de rir, porém, me limito apenas a voltar a atenção
para mamãe que agora está a centímetros de mim, me olhando.
— Vocês me ligaram. Todos os dias! — digo. — E eu passei todo o
meu itinerário, contei sobre tudo o que aconteceu e quando posei em Saint
Vincent, mandei uma mensagem.
— Não foi suficiente, eu queria que viesse direto para casa —
resmunga, me lançando um olhar ressentido.
Para saber se estava inteira ou se tiraram outro pedaço da minha
garotinha.
É a verdadeira resposta que está camuflada por baixo de suas
palavras.
— Eu fui para casa, mãe — digo. — Para a minha casa.
— Sua casa provisória — diz, simplesmente.
— Mãe… — minha voz sai de meus lábios em um tom de aviso.
— Elizabeth! — meu pai intervém, seu tom é calmo, porém posso
sentir a tensão por trás de sua palavra. — Oliver também está aqui.
Mamãe fica quieta, deixando os ombros caírem e olha para meu
falso namorado e estuda a cena com afinco.
— Oh, me desculpe, Oliver — diz, envergonhada. — É difícil ter a
atenção dela.
Sua boca se curva num sorriso fraco. Não é daqueles que me lançou
em Nova York, este é completamente diferente. É como um daqueles que
até mesmo eu treinei por anos, para que ninguém percebesse que estou
escondendo algo. Um sorriso daqueles que outras pessoas nunca saberiam
que é tão falso quanto a minha fachada de filha perfeita.
— Não posso discordar — ele finalmente responde.
— Tudo bem, mãe. — Uma voz doce, falsa e sinfônica ressoa pelo
ambiente e só percebo que é minha quando estou caminhando até onde
minha mãe está e entrelaço seu braço ao meu, tentando não demonstrar que
tudo dentro de mim é uma confusão. — Um passarinho me contou que
você preparou meu prato preferido.
Seu rosto se ilumina com a menção de algo que possuímos um amor
visceral.
Algo que compartilhamos desde que não tínhamos o que temos hoje,
de quando éramos meros cidadãos da Parte Baixa, que se sentavam em uma
sala de jantar com poucos metros quadrados e ríamos sobre nosso dia,
compartilhávamos o amor pela única comida que todos nós esperamos.
O macarrão de mamãe. Ou melhor, o melhor macarrão de todos os
tempos.
— Posso dizer que aprimorei a receita com afinco — conta,
orgulhosa.
Dessa vez, o sorriso que estampa meu rosto é verdadeiro.
— Não tenho dúvidas, você é a melhor!
Não é uma ironia. Elizabeth Miller é a chef de cozinha mais
renomada da atualidade. Consagrada anualmente pelas suas receitas e uma
crítica excelente por conta de sua rede de restaurantes espalhados por todo o
mundo.
— Você gosta de espaguete, Oliver?
Ele me olha, sorrindo, como se também se lembrasse das vezes que
comemos uma versão menos aprimorada, desse mesmo prato em meu
apartamento e na cobertura de seu pai.
— É o meu prato favorito — finalmente responde.
Nós caminhamos até a sala de jantar onde uma mesa já está posta e
nos sentamos. Minha mãe sorri para nós se servindo. Aproveito para
admirá-la, pois o sorriso que está estampado em sua face é raro.
— Me conte como estão meus meninos — ela pede, se sentando ao
lado de papai.
Mesmo que minha mãe não aprove que eu more em um apartamento
quando tenho essa casa, ela é completamente apaixonada pelos meus
amigos. Todos eles, sem nenhuma exceção. Todavia, sei que tem um
sentimento materno em relação a Hazel, por conta de tudo o que minha
amiga passou.
— Logan conseguiu uma vaga em um time grande, mas só assinou o
contrato quando eles aceitaram que se formasse primeiro na SVU — conto,
sorrindo. — Josh conseguiu um estágio em uma empresa de arquitetura. Eu
estou tão animada por eles!
Seu sorriso aumenta.
— E Levi, como ele está?
Cinco palavras. Essa é a contagem de palavras responsáveis pelo
meu sorriso morrer lentamente e o corpo de Oliver enrijecer ao meu lado. E
mamãe não é boba, ela percebe que algo está acontecendo.
— Ele... Ele está bem — digo a verdade na qual eu me agarro.
Está bem longe da minha bagunça, dos meus machucados e
principalmente, de todos os meus cacos.
— Você tem certeza? — sua pergunta sai de seus lábios quase que
em um sussurro.
Não.
— Sim — é a minha resposta.
— Ok. — Maneia a cabeça, me passando uma das taças com vinho.
— E Haz, como minha menina está?
— Focada na faculdade de medicina, apaixonada por Dylan e todas
as outras coisas que te contei da última vez — digo, entre goles.
— Verônica?
— Dançando, amando o Logan e surtando com a coleção que está
montando com a sua mãe. — Levo a taça até meus lábios, apreciando o
gosto. — Você vai fazer um interrogatório de todos os meus amigos?
Ela dá de ombros
— Talvez. — Franzo o cenho, bufando. — E, você, Oliver, como
está?
Oliver inclina a cabeça, pegando sua taça.
— Eu estou bem, Sra. Miller — diz, educadamente. — Obrigada por
perguntar.
Minha mãe ergue uma sobrancelha.
— Me chame de Liz — ela sorri para ele. — É assim que a família
me chama.
Os olhos de Oliver se arregalam.
Por instinto, levo minha mão até a dele, apertando-a.
Quando devolve o aperto, percebo que ele nunca teve isso. Nunca
teve um jantar sem que alguém na mesa esteja desejando algo dele. Percebo
que fora os nossos amigos, Oliver nunca teve alguém para chamar de
família, além de Andrew. E isso trás um aperto em meu coração. Uma fúria
que não compreendo e nem desejo, porque no fundo, se me esforçar, sei que
saberei exatamente o que significa.
— Obrigada, Liz — diz, sorrindo.
— Eu quem agradeço, Oliver — ela murmura me encarando. — Eu
que devo agradecer por trazer a minha menina de volta.
A taça que está em minhas mãos para perto dos meus lábios, igual a
de Oliver.
Ele me encara sobre a borda.
A mentira corrói meu coração.
A dor dilacera a minha alma.
Penso em algo, qualquer coisa, porém nada saí.
— Eu quero conversar com você sobre uma coisa, Boo — a voz de
papai faz com que eu erga meu rosto.
— Sobre o quê? — pergunto, cautelosamente.
Suor escorrega pelas minhas costas.
— Seu aniversário está chegando.
Alívio. Alívio gélido e confortável se abrange pelas minhas veias e
posso sentir meu diafragma soltar o ar que estava preso.
— Eu sei — respondo, levando o copo até minha boca, tentando
disfarçar minha reação às palavras de mamãe.
— Nós estávamos pensando...
Oh, não.
— A resposta é não — digo, erguendo o queixo, para que saibam
que estou falando sério. — Eu não quero uma festa exuberante para
comemorar meu aniversário.
Oliver me encara.
— É seu aniversário? — ele questiona. — Quando?
Não respondo, apenas ergo uma sobrancelha com um quê de
confusão.
Ele deveria estar me ajudando.
— Vinte e um de março — minha mãe responde.
Não. Não. Não.
— Faça uma festa em conjunto com suas amigas, então — meu pai
diz, de repente, não dando tempo para que ninguém dissesse algo. Olho
para ele e vejo seus olhos implorarem para que eu faça algo, para que
comemore o meu aniversário.
Mas, não estou cogitando isso. Não pretendo fazer algo ou contar a
alguém que meus pais querem fazer. Apenas quero passar com meus
amigos, comendo pizza com sabores duvidosos que Levi é apaixonado, na
frente da tv, enquanto meus amigos fazem algo que irá irritar um deles e
todos nós terminaremos com alguma garrafa de destilado em mãos, como
fazemos todos os anos.
— Façam um aniversário unificado. Comemore todas vocês —
minha mãe completa, quando não respondo ao meu pai.
— Mãe — minha voz sai em um murmúrio sofrido. — O
aniversário de Hazel é em julho, o de Verônica em agosto e tenho quase
certeza de que o de Analu é em setembro. Então, uma festa "unificada" está
fora de cogitação.
Ou até mesmo uma festa solo.
Eu não quero comemorar.
Eu não comemoro há anos.
— Então...
— Que tal você fazer aquele bolo incrível com frutas vermelhas e
nós três comemoramos juntos? — digo, sorrindo. — Pronto, esse é o meu
pedido de aniversário.
— Você amava aniversários...
Minha garganta se fecha. O ar começa a me faltar. Posso sentir o
pânico subir pelo meu corpo e as lágrimas se alojarem atrás dos meus olhos.
Pare, mãe. Por favor.
— Mãe... — sussurro.
Olho para Oliver e vejo que ele já está me encarando.
Seu rosto é um aglomerado de dor e incerteza. É algo com que não
desejo lutar. Algo que não posso lidar no momento, principalmente quando
a voz de mamãe irrompe o ambiente:
— Não, Summer! Eu entendo, ok? Mas não vou desistir — ela
arqueja, irritada. Percebo que assim como eu, está à beira das lágrimas. —
Entendo que ele nos machucou, entendo que nunca mais seremos as
mesmas. Mas, por favor, entenda que apenas quero que você volte a ser
como era, antes daquele monstro entrar em nossas vidas. — Ela respira
fundo. — Eu sinto saudades da minha filha. Da filha que conversava
comigo, que sorria, que cozinhava comigo e amava os seus aniversários. Eu
sinto saudades de ver seu brilho, de vê-la feliz e contente. Mesmo que esteja
aqui, eu sinto a sua falta, Summer.
— Liz...
— Não, Gerald, chega! — Minha mãe está se quebrando, jorrando
tudo o que sempre guarda para si. — Eu vi a minha menina se quebrar dia
após dia, precisei assistir tudo e me sentir inútil por não poder tirar a sua
dor, por não poder sofrer em seu lugar. Mas, mesmo depois de anos, ela
ainda é tão aversa a nós que eu não sei mais o que fazer. Não sei como
trazê-la de volta!
— Eu não sou aversa a vocês.
Engulo em seco, sentindo a mão de Oliver se entrelaçar à minha.
É isso que eles acham? Que eu sou aversa a todas as suas iniciativas
de se aproximarem? Que sou tão quebrada que não consigo perceber que
eles lutam diariamente para chegar até mim?
— Nós sabemos, Boo — papai sussurra, cabisbaixo. — Sua mãe
está apenas...
— Falando a verdade — interrompo. — Eu sinto muito que vocês
achem que eu esteja quebrada a esse ponto e sinto mais ainda por arrastá-los
na minha bagunça.
— Não foi isso que eu quis dizer, filha — mamãe soluça, deixando
uma lágrima descer.
— Sum... — Oliver me chama.
— Mas é isso que é, mãe — digo, no mesmo tom que ela, ignorando
Ollie. — Eu não posso mais ser a mesma, eu nunca vou conseguir. Porém,
eu posso tentar ser melhor. Melhor do que fui durante esses anos.
Meu pai se levanta, vindo até onde estou e pega meu rosto entre as
mãos, levantando-o até que nossos olhos estejam nivelados.
— Você é perfeita do jeito que é, Boo.
Há dor ali. Cruel e desumana.
Dor que invade minha alma e se abriga, como um monstro embaixo
da cama.
Dor que, de repente, faz com que meu peito se transforme em brasa
e uma erosão de sentimentos escondidos em meu coração, seja jorrado sem
aviso prévio.
Dor que nunca desejei que Oliver presenciasse, porém, agora sinto
que é tarde demais.
Nunca me permiti chorar na frente deles ou me quebrar, mas, pela
primeira vez, isso acontece.
A primeira lágrima escorrega pela minha bochecha e a salinidade
toca meus lábios. Observo os olhos do meu pai. Olhos quebrados e tristes. E
isso me destrói ainda mais.
Minha visão fica borrada e todo o meu corpo treme. É como se
todos os sentimentos que empurrei para dentro do baú, tivessem se liberado
e trouxesse junto, um pânico que corrói tudo.
Dizem que chorar lava a alma, tudo fica melhor após o choro sair,
todavia, as minhas lágrimas não se encaixam nesse ditado, pois a cada gota
derramada meu coração palpita ainda mais. A agonia em minha mente é
como uma brochura; maleável demais para adentrar sorrateiramente em
meu ser.
Impacta, dói, rasga.
Aquele maldito momento, essas malditas lembranças me tornaram
essa garota amaldiçoada.
É como se o ar me faltasse.
Como se a dor ampliasse e se recusasse a me abandonar.
Mas, por que isso acontece?
Por que volto dia após dia naquela noite?
Por que o universo me odeia tanto para me causar tamanho
desespero?
São tantas perguntas e nenhuma resposta digna.
Sinto Oliver massageando minhas mãos e pisco meio atônita.
Aquilo parece me puxar um pouco mais para a realidade.
— Sum? — a voz de Oliver ao fundo não é suficiente para me fazer
sair de onde me enfiei. — Linda, por favor, olhe para mim...
Eu não posso, nunca vou poder.
Mesmo sentindo-o me pegar no colo, me carregar para algum lugar
e mesmo escutando o choro de mamãe, eu não posso.
Eu quero ficar aqui.
Quero fazer morada em minha escuridão.
Quero abraçar a dor e fazer com que as lembranças sumam.
Eu quero apenas não sentir.
— Ele me machucou, Ollie — finalmente jorro essas frases para
fora após tantos anos. — Eu era apenas uma criança e ele tentou me
machucar e então, machucou a minha mãe.
A maneira como as palavras saem dos meus lábios, e o modo como
a mandíbula dele se trava, faz com que por baixo de toda dor, a minha
corrente sanguínea borbulhe.
Faz com que mais lágrimas desçam pelo meu rosto.
— Eu sinto muito, linda — ele fala por cima do meu choro. — Eu
sinto muito por não ter estado lá, por não ter te protegido.
As lágrimas continuam a descer. Continuam a molhar toda a gola da
minha blusa.
Não é sua culpa. Nunca poderia ser sua culpa, Ollie.
O jantar esquecido já não é mais convidativo. O choro de mamãe em
algum lugar me informa que assim como eu, ela cansou de reprimir sua dor.
Ela se quebrou.
Por minha culpa.
Por minha maldita culpa.
Eu preciso que alguém me diga que está tudo bem deixar que essa
dor saia. Preciso que me segure, preciso de tudo e ao mesmo tempo, preciso
apenas que isso pare.
Mas, acima de tudo, eu preciso de um porto seguro.
Eu preciso delas.
Abro meus lábios, pronta para pedir que Ollie ligue para as únicas
pessoas que preciso ao meu lado no momento. Porque essa dor que envolve
meu peito e me leva a lugares não habitáveis, está me fazendo me afogar
em uma escuridão sem volta, é uma dor que eu nunca poderia curar sozinha.
E por mais que eu tenha Oliver, ele não pode ser o suficiente ainda.
Eu não posso me quebrar para ele, quando ele mesmo tem suas
próprias rachaduras.
— Ligue para minhas amigas. — Solto um longo suspiro, deixando
que mais lágrimas desçam pelo meu rosto. — Eu preciso da Vee, Hazel e
Analu, Ollie, por favor. Apenas digam para virem para cá.
Eu preciso delas.
Preciso das provocações de Hazel a Analu.
Preciso das conversas banais de Vee e de seu olhar compreensivo,
porque ela também esteve quebrada um dia e conseguiu se curar.
Eu preciso delas.
Das minhas melhores amigas.
Porque eu estou prestes a me quebrar e sei que elas me trarão de
volta, que juntarão meus fragmentos quando me estilhaçar.
Elas são meu alicerce.
E eu preciso delas.
Eu estou me afogando, lentamente, e não sei como parar.
Você esteve lutando contra a memória, por conta própria
Nada piora; Nada cresce
Eu sei como se sente estando sozinha na chuva
Todos nós precisamos de alguém para ficar
Someone To Stay | Vancouver Sleep Clinic

Eu nunca achei que seria capaz de correr durante uma tempestade.


Tampouco achei que também que um dia me preocuparia tanto com
alguém como estou nesse momento, preocupado com Summer.
E, talvez, apenas talvez, eu esteja prestes a correr pelas ruas de Saint
Vincent durante essa chuva apenas para que Verônica, Analu e Hazel
cheguem mais rápido.
Apenas para que ajudem a única pessoa que me importa no mundo.
Eu faria qualquer coisa para que isso acontecesse.
Preciso que elas cheguem logo.
Apenas preciso que...
— Que se foda! — xingo, descendo as escadas, prestes a ir em direção
ao meu carro.
— Oliver? — O pai de Summer me chama quando me vê descendo.
Paro abruptamente, olhando por cima do ombro.
— Sim?
— Você está deixando-a? — questiona, preocupado.
Ergo uma sobrancelha.
— Jamais — digo, suspirando fundo. — Estou indo atrás das meninas,
eu preciso que elas cheguem logo, Gerald.
Ele maneia a cabeça, concordando. Gerald Miller sabe que não
conseguirei ficar parado, sendo impotente, quando a única pessoa que me
importa, está lá em cima sofrendo.
Contudo, assim que retiro a chave do meu bolso e começo a atravessar a
sala de estar, a porta é aberta com força e a figura de Vee e suas amigas me
atingem. O rosto das três é um misto de preocupação e dor. Um conjunto
que sei muito bem o que significa, porém, ainda assim, o alívio me
consome.
Sei que elas a ajudarão, que a farão sair do lugar onde se escondeu.
— Onde ela está? — Vee indaga, vindo em minha direção e jogando sua
bolsa no sofá. — Onde, Ollie?
Engulo em seco.
Os olhos de Verônica estão assombrados, uma cópia do de Haz e Analu.
— No quarto dela.
Nenhuma delas dizem mais alguma coisa, apenas passam por mim
rapidamente subindo as escadas em tempo recorde, contudo, quando estão
quase no topo, chamo minha melhor amiga:
— Traga-a de volta para mim, por favor — minha voz é um fio sofrido.
Não é um pedido, nem é uma ordem. É uma súplica.
Mesmo que Verônica saiba toda a verdade agora, ela também sabe de
coisas que nunca contei a ninguém. Summer deixou de ser um acordo. Ela
passou de uma farsa para a pessoa que contém todo o meu coração, mesmo
que ele ainda esteja destruído.
Mesmo que ela não saiba e que mais tarde vá me odiar.
Ela é o meu passado, o meu presente e desejo, firmemente, que seja o
meu futuro.
Porque é isso que Summer Miller se tornou para mim. Ela é a esperança
no final do meu túnel, é a luz em meio a escuridão, a peça que faltava em
meu quebra-cabeça.
Por ela, poderia fazer o impossível, destruiria o mundo se ela me
pedisse. Queimaria tudo e todos. Tomaria sua dor para mim.
Faria qualquer coisa por ela, contanto que me deixasse entrar e confiasse
em mim… Me perdoasse depois que souber tudo.
— Onde está Summer? — uma voz rouca e nervosa ressoa atrás de
mim.
Me viro lentamente, soltando uma respiração.
Meus olhos estudam as roupas molhadas, depois o rosto semicerrado e,
por fim, os olhos apavorados. Olhos escuros que me encaram com todas as
perguntas. Os olhos que a ignoraram, olhos que são o motivo pelo qual ela
caiu em minha vida.
Levi Johnson.
Ele é quem está parado à minha frente agora. Ele que agora tem os
braços cruzados em frente ao corpo e uma expressão preocupada.
Nesse momento, sinto mais que demonstro. Porque todas as vezes que vi
Summer sofrendo, se lastimando por tê-lo machucado, me atingem.
Nunca quis ser como meu pai. Apenas por pensar em machucar alguém
através da violência faz com que inúmeros gatilhos sejam ativados em meu
subconsciente. Contudo, nesse momento, eu poderia socá-lo.
Eu poderia socá-lo por ser um idiota.
Por ser o melhor amigo dela e não estar ao lado de Summer.
Eu poderia fazer qualquer coisa, porém não farei.
Eu nunca conseguiria machucá-lo, nunca faria isso com alguém.
Principalmente quando essa mesma pessoa também teve seu coração
partido.
— Ela está com as meninas — murmuro, por fim.
Ele dá um passo à frente.
E eu dou um em sua direção.
— Saia da minha frente, Wright — grunhe, letal.
Ergo meu queixo, igualando nossos olhos.
— Você não vai subir — afirmo convicto. — Ela não precisa de mais
um problema hoje.
— Você não sabe de nada.
— E você sabe, Johnson? — gotejo, minha voz sai baixa, fria. — Você
sabe alguma maldita coisa sobre o que Summer está passando no momento?
Sabe o por quê ela está machucada e precisando de suas melhores amigas?
Ele me encara.
Os olhos irradiando fúria, idênticos aos meus.
— Não, você não sabe — continuo, quando ele não diz nada. — Você
não sabe por que, desde aquela festa, você nem ao menos olha para ela!
Você não sabe de nada do que está acontecendo na vida dela, porque
preferiu ser uma criança mimada do que ter que enfrentar a porra dos seus
problemas. Ela sacrificou tanto para você não se machucar e você nem ao
menos percebe! — Minha voz sobe um decibel. — Eu não fui justo em me
apaixonar por ela ou em tê-la beijado na sua festa, mas você não foi justo
em abandoná-la, em culpá-la por não conseguir retribuir seus sentimentos.
Minhas palavras o atingem em algum lugar. E me atingem também.
Acabo de confessar algo que nunca imaginei que aconteceria.
A farsa se tornou realidade.
O que eu tanto lutei contra, aconteceu debaixo dos meus olhos.
Agora, eu compreendo.
Eu entreguei todas as partes do meu coração morto a ela.
Eu me apaixonei perdidamente por Summer Miller.
Porra. Porra. Porra.
Levi dá um passo para trás, nunca deixando de me encarar.
— Você não sabe de nada! — exclama, abalado. — Você acabou de
chegar na vida dela. Não tente opinar em algo que não entende. Ela é como
se fosse... a minha irmã.
Sua última palavra sai em um sussurro, entendendo como se a realidade
tivesse lhe dado um tapa. Quando seus olhos encontram os meus, vítreos, eu
sei exatamente o porquê de estarem assim. Eu também tive a mesma reação
quando quase destruí algo que eu amava por ter confundido tudo.
Por mais que eu deseje estar lá em cima, tentando fazer com que ela
volte para mim, respiro fundo e percebo Logan, Dylan e Josh estáticos atrás
de Levi. Eu estou aqui. Em frente ao seu melhor amigo descobrindo que
não há mais volta, não há mais como negar o inevitável.
Estou apaixonado por ela.
— Eu estive lá por oito anos, Levi — conto, minha voz se quebrando.
— Eu conheci Summer antes do que a maioria de vocês. E eu a perdi tão
rápido quanto a conheci. Então, me chame de egoísta, idiota ou qualquer
outra coisa, mas não irei desistir dela. Eu não vou perdê-la novamente.
Levi arregala os olhos.
Logan franze o cenho.
Dylan me encara como se não estivesse me entendendo.
E, Josh, ele apenas maneia a cabeça, como se desconfiasse disso há
algum tempo.
— Vocês já se conheciam? — Levi, pergunta. — E você a ignorou por
oito anos?
Meus ombros murcham, meu coração dói e tenho a plena certeza de que
ele percebe todos esses detalhes. Levi assume a postura de irmão mais
velho de Summer, quando me encara.
Ele finalmente voltou a ser o bom e velho idiota protetor que sempre foi
com suas amigas.
E, que Deus me ajude, mas senti falta disso!
— Eu não me lembrei dela por oito anos, Jonhson — conto, o que
apenas eu e Summer sabemos. — Eu esqueci da melhor coisa que já
aconteceu comigo.
Os olhos de todos se arregalam, menos o de Dylan.
O meu amigo sabe perfeitamente o porquê algumas coisas em minha
vida são apenas uma lembrança perdida.
— Por que, Oliver? Por que você não se lembra dela? — Logan
questiona.
Engulo em seco.
Porque tudo fugiu do controle.
Lembranças daquela noite invadem minha mente.
Lembranças de sangue escorrendo pelas minhas mãos.
Gritos inundando meus pensamentos.
De um rosto que não deveria conter lágrimas, mas que chorava.
Cartas que não deveriam ser perdidas, mas foram.
Do píer que foi esquecido e da dor excruciante que me atingiu após isso.
Ele.
Ele é motivo das minhas perdas. E ele vai pagar por tudo.
Cada. Maldita. Coisa. Tirada. De. Mim.
— Eu ainda não posso dizer, Underwood.
Logan abre a boca para me responder, para dizer qualquer coisa,
todavia, a voz suave de Hazel me chamando faz todos nós olharmos para
cima, onde o olhar assombrado dela se cruza com o meu.
— Summer precisa de você, Ollie.
Vamos ser claros, não vou fechar os meus olhos
E eu sei que posso sobreviver
Andaria no fogo para salvar a minha vida
E eu quero, quero tanto a minha vida (...)
Você não me destruiu
Ainda estou lutando pela paz
Elastic Heart | SIA

Me escoro contra a porcelana fria na banheira e escorrego até todo o


meu cabelo emergir na água morna, deixando apenas meu rosto para fora.
Não há nada de interessante no meu campo de visão, porém, mantenho meu
olhar no pequeno lustre branco.
Às vezes, apenas me sento aqui e me lembro de quando era criança e
sonhava com o momento em que teria coragem para entrar dentro dessa
banheira sozinha. Sem um apoio, sem que minha mãe segurasse meus
braços e me dissesse que deveria ter cuidado, senão me afogaria.
Hoje, enquanto tudo dentro de mim se estilhaça, concluo que se pudesse
voltar àqueles dias, onde seu amor era maior do que tudo, onde ela não me
olharia com culpa, procurando um resquício do que um dia cheguei a ser, eu
aproveitaria. Aproveitaria o zelo e o cuidado com que me tratavam.
Deixaria que me mimasse e me colocassem num pedestal, como se eu fosse
uma princesa em perigo dentro de um enorme castelo, onde apenas eles
poderiam me salvar.
Mas isso não é mais possível.
Nunca mais seria.
Encaro o teto claro e o lustre que ilumina todo o ambiente. Um peso se
aloja em minha garganta e as lágrimas nublam meus olhos, fazendo meu
queixo tremer e as lembranças da primeira vez que me sentei aqui, quando
tinha apenas onze anos, e precisei limpar o sangue da minha própria mãe
em todo o meu corpo. Precisei fazer com que todos os cacos dentro de mim
fossem fortes, resilientes. Precisei repetir para mim mesmo que não
permitiria que ele me quebrasse mais do que havia quebrado a minha
família. Lágrimas rolam pela minha face em enormes gotas, derramando
toda a dor que carrego comigo. Todas as dores que quase nunca me permito
sentir.
Quando se vive uma mentira e repete todos os dias que está bem, que
aquilo não te afetou, isso acaba se tornando sua realidade. E essa é a
realidade na qual me agarro, é a de que eu menti por todos esses anos.
Menti para meus pais, que sei que neste instante estão em algum lugar
da casa, querendo adentrar este ambiente e me proteger de todo o mal que
assola minha alma. Para os meus amigos, que seguraram o mundo quando
eu não era mais capaz.
E, principalmente... menti para mim.
Menti todas as vezes que encarei meu reflexo no espelho, todas as vezes
que sorri quando minha vontade era de chorar, quando gritei para os meus
amigos que eles deveriam confiar em mim, quando nem eu mesma
confiava, quando me escondi através da fachada de perfeição e disse a mim
mesma que não poderia colocar esse peso em suas costas.
Não quando metade deles batalham contra seus próprios demônios.
E eu estou bem com isso, estou bem com tudo o que carrego dentro de
mim e estou bem por mentir para esconder a minha verdade. Porque mentir
sempre foi a coisa mais fácil.
Mentir sempre me trouxe a sensação de que não estou quebrada. Mas, a
quem eu quero enganar? Eu não sou uma pessoa inteira. Sou pedaços,
fragmentos irreparáveis. Alguém que finge a perfeição, que se camufla por
trás dos filmes de super-heróis e dos livros, porque eles me protegeram,
quando ninguém mais era capaz.
Eles me fizeram esquecer que sou quebrada.
Destruída pelo que fizeram com a minha família.
Danificada, porque quem chega perto de mim sempre acaba machucado.
Eu sou a pior das mentirosas.
— Sum?
A voz suave de Oliver me faz piscar, afastando um pouco os
pensamentos que rondam a minha cabeça. Mas, nem mesmo ele pode me
salvar ou consertar algo que não tem conserto. Eu estou fragmentada para
sempre.
Ele se abaixa ao meu lado, enrolando a manga de sua blusa até o
cotovelo, enquanto seus olhos preocupados imploram por uma conexão
com os meus. Conexão que não poderia ter com outra pessoa, nem mesmo
se desejasse.
— Fale comigo, loirinha — sussurra, quando não emito nenhum som.
— Brigue comigo, fale sobre seus malditos filmes ou apenas diga que me
odeia. Mas… apenas fale comigo, linda.
Me sento, puxando minhas pernas até na altura dos meus seios,
tampando a minha nudez e volto a escorar minhas costas na porcelana. Meu
cabelo, agora molhado, se agarra em minha pele enquanto apoio meu
queixo no joelho e deixo com que a dor que cresce dentro do meu peito, se
liberte, na tentativa de transformar-me em mais do que o vazio eminente.
Vá embora, Ollie.
Por favor.
Eu não posso nos salvar.
Eu não posso nem ao menos me salvar.
As frases rodam em minha mente, mas, não há forças para proferi-las,
não a vontade de dizer algo.
Ele percebe, porque Oliver leva a mão até o apoio da banheira e pega
uma pequena esponja, derramando um pouco de sabonete sobre a superfície
aveludada e me encarando por alguns segundos, pedindo permissão para me
tocar, tentando dizer que se eu desejasse, ele sairia daqui. Ainda que sua
vontade fosse me proteger, ele sairia ao som do meu pedido.
Mas ele nunca veio.
Pela primeira vez desde que entrou aqui, viro meu rosto um pouco para
o lado e encaro aqueles lindos olhos verdes. Olhos que reivindicaram cada
pedaço quebrado de mim para si. Olhos que um dia sorriram na minha
direção em inocência e me fizeram acreditar que a Parte Alta podia ser um
local onde se pudesse construir um lar, mas, que agora, me encaram como
se eu fosse o diamante mais quebrado de todo o mundo e estivesse pronto
para lapidá-lo.
Deveria mandá-lo embora e guardar minha escuridão para mim,
entretanto, apenas balanço a cabeça, lhe permitindo me tocar e atravessar
minhas barreiras.
Ollie entende o pequeno movimento e leva a esponja até as minhas
costas, esfregando-as. Ele não diz nada, apenas fica ali me apoiando, sendo
o meu pilar quando nem eu mesmo acredito merecer um.
— Eu assisti mais um daqueles filmes horrendos que ama — conta,
baixinho. — Eu continuo assistindo-os para que sempre tenhamos assuntos,
linda. Eu decorei todos aqueles nomes, sei cada maldito poder que eles
possuem e até mesmo me vestiria como um deles para te fazer sorrir.
Uma lágrima desce pela minha bochecha, Oliver leva sua mão até a
água, retirando o sabão de sua pele e logo após, sinto seu polegar roçar meu
rosto lentamente, em uma carícia, símbolo de uma promessa silenciosa. Ele
me seguraria todas as vezes em que eu estivesse caindo.
— Eu poderia comprar a porra de todos os cinemas do mundo para
você, se isso significar que você será feliz, Sum — ele sussurra, passando a
esponja pelas minhas costas. — Eu faria qualquer coisa por você, loirinha.
Então, por favor, apenas fale comigo. Apenas me deixe entrar, me deixe
ajudar.
E eu quero. Quero tanto poder abraçá-lo e permiti-lo ser para mim
aquilo que sempre desejei. Mas, não posso, não quando estou me afogando
lentamente e não sei como parar.
Por mais que eu deseje e saiba que mereço ser feliz novamente, não
posso arrastá-lo para o meu caos, para a escuridão que habita dentro do meu
peito.
Ele merece mais. Depois de tudo, Oliver merece ser a pessoa que o
mundo sorrirá de volta. Merece tudo o que não posso dar. Porque eu
mereço a solidão. Mereço viver me lastimando pelo que toda a herança dos
meus avós foi capaz de fazer, pelo que quase tiraram de mim.
Por mais que eu saiba que mereça a solidão, existe uma coisa que não te
contam sobre ela: machuca, sangra e no fim, mesmo que seja de forma
cruel, dolorosa, ela alivia.
— Quando eu tinha seis anos — Oliver diz, de repente, quebrando o
silêncio e como se fosse sua última carta na manga, sua última tentativa. —
Acordei com o barulho de gritos e algo se chocando contra a parede.
Naquela época ainda não sabia do que meu pai era capaz, não sabia o
quanto minha mãe sofria em suas mãos, mas, uma parte de mim, mesmo
que inocente, sabia que ele a maltratava… Eu desejava poder protegê-la,
que ela fosse feliz. Mas, nunca sabia como... Até aquele dia. De repente, o
barulho havia cessado… — sua voz morre no meio da frase, porém quando
olho novamente para ele, Ollie está me encarando, perdido em sua própria
memória, enquanto sua mão acaricia minhas costas. — Eu me levantei,
caminhei pela casa e entrei no único lugar onde sabia que encontraria minha
mãe. Ela estava lá, Sum, as lágrimas desciam pelo seu rosto e seu lábio
estava sangrando. Quando ela olhou para cima, para mim, foi como se ela
tivesse visto meu pai.
Os olhos de Oliver se tornaram escuros, perdidos em seus próprios
demônios, deixando pela primeira vez, que alguém saiba o que aconteceu
por trás de suas cicatrizes. Pela necessidade de contar ao mundo sobre a
parte que não sabiam sobre ele, para poder ter a minha confiança e a minha
coragem de falar sobre meus próprios pesadelos vivos.
— V-você não é ele, Ollie — sussurro, minha voz sai tão baixa que,
chego a pensar que ele não está me escutando.
— Mas naquele momento era como se eu fosse, Sum, era como se ela
enxergasse o homem que a destruiu — confessa, deixando seus ombros
caírem. — Ela se encolheu no assento, se protegendo de mim, de mim,
Sum, do seu próprio filho. E então, suspirou fundo, voltou seu olhar para o
piano e dedilhou uma nota, depois outra, como se aquilo a acalmasse. Eu
apenas fiquei lá, parado, segurando um urso de pelúcia que sempre
carregava comigo, enquanto ela me ignorava durante toda a música. Assim
que terminou, seu olhar voltou ao meu rosto, ele não estava mais assustado,
mas sim, sereno, calmo e quando sorriu, me chamando para me sentar ao
seu lado, sabe o que eu fiz?
Nego com a cabeça, sem tirar minha atenção de suas orbes.
— Eu corri até ela, mesmo que soubesse que estava machucada, eu
queria estar ao seu lado, queria protegê-la — continua, quando percebe que
não irei interrompê-lo. — Ela me pegou em seu colo e murmurou um
pedido de desculpas, como se entendesse que eu não tinha culpa das
atitudes do homem que morava na mesma casa que a nossa. — Sua voz
desce um decibel. — Ela nunca deixou que ninguém tocasse em seu piano,
Sum, e pela primeira vez, ela se inclinou comigo e me deixou tocar, ela me
ensinou que toda vez que meus dedos tocassem as teclas daquele
instrumento, o barulho exterior iria se esvair e que lá eu iria ter um minuto
de silêncio, um minuto longe de tudo o que era a nossa realidade.
— Eu sinto muito, Ollie.
Eu não sei se estou dizendo isso pela morte de sua mãe ou por tudo que
se sucedeu após a sua partida. Talvez ambos. Talvez, eu apenas quero que
ele saiba que assim, como ele queria proteger sua mãe, eu também desejo
protegê-lo.
— Depois daquele dia, aprendi a tocar piano. E fiz isso para que pudesse
ter algo que me permitisse ficar perto dela, ter uma paixão em comum que
ninguém poderia tirar. E aquilo virou nossa rotina, todas as noites ela me
esperava sentada em seu piano. — Sua voz se quebra, e apenas desejo
abraçá-lo e tirar sua dor como está tentando tirar a minha. — Todas as
noites, Sum, mesmo quando eu podia ver seu rosto cheio de hematomas, ela
se sentava e me ensinava a tocar. Ela sorria radiante para mim, mesmo que
tudo dentro dela morresse a cada dia. — Ele dá uma pausa e logo após
continua: — Então, um dia, não havia mais música, não havia mais nada,
apenas um banquinho, um piano vazio, paparazzis em nossos portões e uma
verdade mal contada. E, quando tudo isso aconteceu, quando me vi sendo o
alvo e não aquele que tentavam proteger, entendi o porquê ela precisava das
nossas noites, precisava colocar suas dores naquelas melodias delicadas. Eu
entendi, Summer, que não podia protegê-la, mas podia aliviar a escuridão
que a cercava noite após noite, eu podia ser a sua válvula de escape durante
a madrugada, quando durante o dia não podia evitar dela ser machucada por
aquele que deveria protegê-la. Eu fiz isso, Sum, até o dia que eu já não era
mais o suficiente para fazê-la lutar. Até o dia que ela me deixou...
Uma lágrima desce pelo meu rosto, depois outra.
Por mim. Por Ollie. Por todos nós.
E honestamente, não consigo mais segurá-las. Talvez precise disso,
preciso fazer com que elas desçam e me deixe mais leve. Mas, não esperava
que mesmo que sejamos essa bagunça ambulante, ainda quisesse que ele
permaneça ao meu lado, quero que Oliver seja meu por completo.
Sem acordo, segredos ou mentiras.
Eu o quero de corpo e alma, quero que ele se cure, quero que suas
cicatrizes parem de ser seu fardo, quero que ele possa me encarar e sorrir
verdadeiramente.
Eu quero Oliver Wright como nunca quis algo em minha vida.
Eu o quero, mesmo que não me sinta pronta, mesmo danificada.
Ainda assim, eu o desejo.
E para isso acontecer e termos a chance de conseguir sermos um só…
Uma dupla, como nunca imaginei que seríamos, preciso ser sincera com
ele. Comigo.
Levo minha mão molhada até o seu rosto, sentindo a textura macia de
sua pele e vejo a cor dos seus olhos tão próximos aos meus, observo cada
detalhe, enquanto suspiro fundo, me preparando para libertar tudo o que me
machucou.
— Eu tinha onze anos — finalmente digo. — Eu tinha onze anos
quando meu pai recebeu a notícia de que estávamos herdando tudo dos
meus avós maternos, porque eles haviam morrido em um acidente e me
nomeado como a única herdeira. Antes, eles haviam desertado mamãe por
ter rompido um noivado com um homem rico, e engravidado de um de
classe média inferior.
Mordo meu lábio, tentando aplacar a dor. Tentando fazer com que as
palavras saiam dos meus lábios. Que a verdade enfim seja contada.
— Meu pai trabalhou duro para tentar devolver tudo o que ela havia
perdido, por tê-lo escolhido, sabe? — continuo, depois de algum tempo. —
Por isso, não queriam aceitar e muito menos se mudarem para cá. Nós
tínhamos uma boa vida na Parte Baixa. Não precisávamos do dinheiro dos
meus avós... Não até aquele dia.
Oliver me olha, entendendo onde eu estava chegando. Um pequeno
pavor misturado à ódio reflete em suas íris, um sentimento que me lembro
perfeitamente de ver meu pai sentindo, de vê-lo querer machucar todas as
pessoas que entravam em seu caminho.
— Quando as pessoas começaram a saber disso, da nossa herança,
começaram a se afastar e a tecer comentários maldosos, falaram que meu
pai era interesseiro, oportunista, um caçador de herança. Alguns dos
advogados dos meus avós vazaram a informação sobre o valor estimado da
Miller Enterprise e com isso, nós não estávamos mais seguros onde
morávamos — minha voz não passava de um sussurro embargado. — Eles
fizeram de tudo para me proteger, até mesmo aceitaram essa casa, aceitaram
o dinheiro para que pudéssemos sair de lá. O problema era que nós nunca
imaginamos que o golpe viria de alguém que conhecíamos. Que era como
um membro da nossa família.
— Sum… — Oliver murmura, complacente.
Engulo em seco, movendo meu braço e observando a água da banheira
balançar.
— Meu padrinho era melhor amigo do meu pai. Ele era ambicioso, às
vezes dizia algumas coisas inconvenientes sobre o que minha mãe havia
perdido, mas ele cresceu junto com meu pai e até mesmo levou minha mãe
até o altar, quando meus pais se casaram. Nunca imaginaram que a ambição
dele pudesse falar mais alto do que tudo o que compartilharam. — Solto um
sorriso frio. — Mas dizem que os piores monstros estão ao nosso lado, não
é?
— Eu sinto muito, linda... — murmura, acariciando minha pele.
— Ele esperou meu pai viajar para assinar o restante dos papéis sobre a
herança e então, apareceu em uma noite e se sentou na nossa mesa para
jantar conosco. Ele tomou do nosso vinho, riu comigo e no final da noite,
nos apunhalou pelas costas — Mordo meu lábio inferior, segurando as
lágrimas — Eu havia saído para ir ao banheiro e quando voltei ele tinha
uma arma apontada para minha mãe. Meu próprio padrinho colocou uma
maldita arma na cabeça da minha mãe, porque ela se negou a dar a ele tudo
o que era meu, Ollie! Depois ele me segurou pelo braço e disse que se ela
não concordasse, ele me mataria na frente dela. — Aperto a borda da
banheira com força, enquanto sinto tudo o que senti naquela noite. — Para
me salvar, ela fez isso, Ollie. Minha mãe teve uma arma apontada para si e
precisou abdicar de tudo o que tínhamos. Por minha culpa, Ollie. Por minha
culpa, ele a machucou e então, tentou me machucar.
Eu nunca pensei que você era
A pessoa que me esperava
Pois nós éramos apenas crianças
Quando nos apaixonamos
Sem saber o que aquilo significava
Eu não desistirei de você desta vez
Perfect | Ed Sheeran

Oliver me encara sem emitir nenhum som, porém não é necessário.


Eu posso sentir tudo.
Posso ler em seu olhar cada palavra que grita.
Cada sentimento que reflete.
Por isso, por tê-lo ao meu lado, por sentir a sensação de conforto,
compreendo o que Oliver significa para mim. O que ele sempre significou.
Cada momento vivido, cada segundo, nos trouxe aqui. E, que após tudo
isso, a perspectiva do que acreditamos sobre o outro, mudará.
Tenho certeza de que vai ser impossível alguém me encantar tanto
quanto ele está fazendo enquanto me segura, como se me soltar não fosse
uma opção. Será impossível substituí-lo na minha vida, e vai continuar
assim até esse acordo acabar, e talvez até mesmo depois de rompermos,
ainda continue com marcas de tudo o que vivemos.
— Quando ele se distraiu, eu tive a péssima ideia de correr e pedir
ajuda. Eu fiz isso, Ollie, eu corri como se pudesse me salvar e salvá-la. —
Uma lágrima escorre pelo meu rosto e a dor irrompe minha alma. —
Quando estava quase chegando à porta, quando eu quase consegui, ele me
pegou pelos cabelos e me jogou no chão, me fazendo quebrar um dos
pulsos. A dor não era nada comparado ao choro da minha mãe, a maneira
como ela o atacou achando que poderia nos salvar.
Fecho meus olhos, sentindo-o parar o movimento em minha pele.
— Você não precisa continuar, Sum — Ollie sussurra.
— Eu preciso, Ollie — murmuro de volta. — Eu preciso, porque só
assim essa dor irá sair. Eu preciso porque a lembrança do meu padrinho,
aquele que jurou me proteger, perdendo o controle e revelando o monstro
por trás daquela fachada de bom moço, me assombra até hoje — respiro
fundo. — Ele andou até ela e deu um tapa em seu rosto, machucando seu
lábio. Enquanto eu me debatia e gritava para parar, pedia por socorro e
ninguém me escutava, ninguém estava lá para nos salvar. Era doloroso,
Oliver, é a pior sensação ver alguém mais forte e cruel machucando quem
nós amamos. Ele rasgou o vestido dela, a jogou no sofá enquanto dizia que
seria divertido, que mostraria a ela como um homem deveria tratá-la, que
meu pai nunca a mereceu. — A lembrança me atinge como um soco. —
Minha mãe não parou de lutar. Ela foi tão guerreira, tão forte. E eu sabia
que não poderia ficar ali apenas chorando, sabia que não podia vê-la se
machucando e apenas assistir. Eu precisava lutar como ela.
Por um momento, fico em silêncio, me lembrando de como foi ouvir o
grito dela e como clamei por qualquer pessoa e ninguém estava lá por nós.
Tudo isso faz uma nova onda de lágrimas descer pelo meu rosto. Eu me
sinto ainda mais quebrada.
E sem nenhum aviso prévio, como se precisasse me mostrar que estava
aqui por mim e para mim, Oliver se levantou, retirou a camisa e entrou na
banheira, sentando-se à minha frente e me puxando para si, me colocando
no colo e me abraçando, me protegendo, enquanto suas mãos se entrelaçam
nas minhas costas e me embalam, criando um casulo. Me permito
desmoronar e sentir tudo o que sempre anulei e achava que não deveria
sentir.
— Eu achei que fosse forte, Ollie — minha voz falha. — Eu achei que
poderia salvá-la.
O som do meu choro ecoou pelo banheiro. A dor inunda minha alma.
— O que ele fez para você, linda? — sua voz é dolorosa, mas, além
disso, percebo o tom de perigo em cada sílaba.
— Eu peguei um vaso e joguei nele, acertando suas costas — a dor
ondula em cada palavra. — Quando ele se virou e me encarou, eu soube
que havia o irritado, soube que também sofreria nas mãos dele. Quando ele
jogou minha mãe do outro lado da sala, fazendo com que batesse a cabeça,
caminhou até mim, abandonando a arma no caminho, como se não
precisasse dela para me ferir. Ali eu soube que seria meu fim — fungo,
ainda podendo sentir o odor dele em cima de mim.
— Ele... abusou de você? — a pergunta de Oliver vem carregada de
algo que poderia queimar o mundo.
— Não, mas o barulho do zíper dele, da risada e de como me arrastou
até o sofá, me faz ter pesadelos até hoje. Eu não desisti de lutar, Ollie.
Mesmo quando ele se moveu em cima de mim, entre minhas pernas. Eu
nunca parei de lutar — minha voz se quebra, tudo em mim se quebra. — E
no mesmo instante que implorei para que não fizesse aquilo, eu escutei um
grito, depois um barulho de tiro. E então, o sangue dele caiu sobre mim,
sobre todo o meu corpo. Ele não conseguiu o que queria, ele não me
destruiu por completo, mas ele levou um pedaço de mim naquele dia,
Oliver.
— Sum… — a voz de Oliver é perigosa, mas ao mesmo tempo,
quebrada.
— Eu tinha onze anos quando tentaram me machucar, Oliver —
murmurei dolorosamente. — E quando ele caiu, quando tive forças para
correr até minha mãe, eu realmente achei que estava salva. Mas não
estávamos. Ele tirou uma outra arma da cintura e atirou em nossa direção,
na barriga da minha mãe. Eu precisei vê-la sangrar, eu precisei segurá-la
enquanto ele sorria do outro lado como se tivesse ganhado. E quando os
seguranças do condomínio chegaram, segundos depois, e o levaram, achei
que perderia a mulher que deu tudo para me proteger, Ollie.
— Você não a perdeu, linda — ele murmura, contra o meu cabelo. —
Ela está aqui, com você. E ele se foi. Se foi para sempre e nunca mais vai te
machucar, ok?
Fico em silêncio, me lembrando como foi o grito do meu pai quando ele
chegou ao hospital. Da forma como ele me olhou e tentou me abraçar, mas
o toque de qualquer pessoa era insuportável. Eu me fechei após isso. E toda
vez que eu encarava minha mãe, a culpa me invadia.
— Ele morreu, Oliver — choro. — Mas o medo de me machucar, de
que minha mãe possa se machucar outra vez… me acompanha. Ele nunca
some!
Oliver levanta o meu rosto. Chocando seus olhos nos meus.
— Eu te prometo, Summer — diz, seu timbre não falha. Sua voz é
firme, como se realmente estivesse falando sério. — Ninguém toca em
você. Ninguém nunca mais te machuca. Você está segura. E, mesmo que
não acredite, eu destruiria o mundo por você. Eu faço qualquer coisa por
você, amor.
Sinto tudo o que ele diz e deixo com que me segure enquanto
desmorono.
Permito que Oliver seja tudo o que eu preciso no momento.
Porque ele é isso. Ele é o que necessito.
Dele. De seu apoio.
De seu calor entre o meu corpo, me dizendo que tudo ficaria bem. De
seu toque singelo e de seus beijos, que me fazem sentir como se tivéssemos
uma eternidade juntos.
— Ela não pode mais ter filhos, Ollie — sussurro em seu abraço. — Ela
perdeu isso por minha culpa. Por isso, ela é tão protetora comigo.
O silêncio paira entre nós.
— Eu sinto muito, muito mesmo, Sum… — ele sussurra contra meus
cabelos e eu sinto suas próprias lágrimas descendo pelo seu rosto. — Sinto
muito pelo que aconteceu, sinto muito por você se sentir assim, por achar
que não é merecedora do amor.
Não respondo, talvez nunca poderia.
Penso em todas as suas palavras.
Penso em como me anulei para tudo. Como um momento cruel destruiu
todas as minhas expectativas.
Me escondi dos sentimentos e apenas me relacionei com pessoas que
não poderiam me fazer sentir algo, no intuito de aplacar a dor que ele
deixou. Como fiz o possível para superar tudo e voltei a dançar, após uma
noite em um píer, com uma pessoa que não se lembra mais de mim.
— Ollie?
— Sim, linda.
Mordo meu lábio quando o choro se torna abafado.
— Eu não estou quebrada.
Ele me aperta com mais força.
— Não, meu amor, você não está.
Ele deixa um beijo leve em minha cabeça.
— Então, por que eu me sinto como se estivesse?
Ele inclina a cabeça para me encarar.
— Porque as lembranças, às vezes, são mais fortes que a realidade —
ele conta. — Mas, posso te contar um segredo?
— Sim, por favor.
— Eu também não sou inteiro, há partes faltando em mim — sussurra.
— E, mesmo assim, mantenho essas partes em um lugar de destaque.
— Por que você as mantém?
— Porque elas foram feitas para se encaixarem em você, linda — sopra,
baixinho. — Nós dois formamos um quebra-cabeça lindo, amor.
Eu viro meu rosto, o encarando.
— Então, não me trate como se eu fosse algo que pode se quebrar, Ollie,
por favor — digo, baixinho. — Eu lutei por muito tempo, eu precisei de
vários anos para me curar. Precisei de terapias, médicos e coragem para
voltar a minha vida, e precisei observar meus pais se tornarem
superprotetores, até quando lutava para que pudesse finalmente voltar a
viver. Então, mesmo que às vezes eu desmorone, não posso deixar que você
me trate diferente.
Ele me encara por alguns segundos. Todavia, não diz nada.
Preciso que ele entenda, preciso que saiba que eu permiti que ele me
tocasse, que eu prometi a mim mesmo que não ficaria presa na minha
própria cabeça, refém de um monstro que jamais poderia me pegar
novamente e não regrediria, não posso permitir que as pessoas voltem a me
encarar com aqueles olhos penosos e sorrisos de solidariedade.
— Eu nunca faria isso, linda, eu jamais te trataria diferente por conta do
seu passado — ele afirma, tirando uma mecha do meu cabelo molhado do
meu rosto. — Eu vou sempre estar com você, somos um time, eu e você,
lembra?
— Eu e você, um time. — Solto um pequeno sorriso, um no qual
nenhum de nós dois esperava. — Eu gosto disso.
— Eu sei, eu também gosto.
Sim, nós somos isso.
Nós somos uma dupla.
Uma dupla que pode ser o motivo pelo qual o outro se manterá de pé ou
motivo pelo qual cairemos.

Nós ficamos na banheira por mais alguns minutos.


Não nos importamos com o fato de que todos os nossos amigos estão lá
embaixo, nos esperando. Ou que meus pais estejam a ponto de adentrarem
esse ambiente, apenas para terem a certeza de que estou bem.
Nada disso é importante. Nada a não ser nós.
Construímos um universo inteiro nesse pequeno espaço. E como se o
mundo fosse apenas um sussurro comparado à imensidão desse momento.
Todavia, quando Oliver se move, minhas mãos deslizam rapidamente
em suas costas. Em suas cicatrizes. Sinto seu corpo enrijecer e a vergonha
passar pelos seus olhos. Ele precisa de algo para se agarrar, porque acabei
de acertar em uma parte proibida, uma parte que ninguém antes ousou tocar.
Oliver abre a boca, pronto para dizer algo, porém, antes que dissesse,
levo minha mão até seu rosto e o acaricio.
— Não precisa se envergonhar, Ollie — murmuro. — Nunca se
envergonhe do que você é e do que precisou passar para chegar até aqui.
Ele abaixa o rosto, encontrando meu olhar. Suas mãos acariciam minha
pele em círculos, movimentos lentos e cheios de significados.
Suas pupilas ultrapassam meu corpo físico e penetram na minha alma,
onde ficam todos os meus segredos.
Segredos que eu já não escondo dele.
Estamos despidos do colete a prova de balas que protege nossos
corações. E, talvez, por isso, me sento o encarando. Pronta para fazer algo
que ninguém nunca fez por ele. Não me importo com a minha nudez ou
com o fato de que quebrei minhas próprias regras e jorrei meus segredos e
dores.
Nada.
Nada é mais importante que isso.
— Vire-se de costas para mim, Ollie — peço, baixinho.
Ele engole seco. Porque sabe o que isso significa, sabe o quão
vulnerável e exposto estará.
Mas quando não estamos?
A fragilidade está em nós, somos frágeis o tempo inteiro. Mesmo
quando travamos batalhas invencíveis, quando entramos em guerra contra
aquilo que acreditamos. Mesmo assim, não tem como viver sem se sentir
vulnerável em algum momento.
E Oliver sabe disso. Sabe que mesmo que tenha escondido suas dores do
mundo e tenha vergonha das cicatrizes que marcam sua pele, ele pode ser
vulnerável para mim. Ele pode confiar em mim. Porque desejo cada parte
dele, cada átomo.
Eu as quero junto, mesmo que sejam dolorosas. Elas fazem parte dele e
parte de sua história. Elas mostram como enfrentou o mundo para que seu
irmão fosse feliz, como segurou todos quando caíram, como foi a válvula
de escape de seus amigos, mas não foi a dele mesmo.
Elas me mostram quem é ele. Quem é o homem que me protegeu. Me
segurou e me fez sair de um lugar escuro.
E que agora é a minha vez.
A minha vez de mostrar a ele que, diferente do que acredita, ele não está
destruído. Não está sozinho.
— Sum...
— Deixe-me ser para você aquilo que foi para mim, Ollie — sussurro.
— Deixe-me te ajudar. Deixe-me ser seu porto seguro.
Ele para por alguns segundos me encarando, pensando se realmente
deveria fazer o que estou pedindo. E, quando se eleva, segurando os dois
lados da banheira, dando-me a visão do seu abdômen definido que também
contém algumas marcas, uma parte de mim se quebra.
Todavia, nada pode se comparar ao momento em que ele se vira
totalmente, me dando a visão completa de suas costas marcadas.
É como me lembro, mas dessa vez, todo o sentimento é diferente.
Eu não estou assustada, mas sim emocionada pela confiança que ele está
depositando em mim. Desta vez, não quero entender o porquê de elas
estarem ali, quero apenas ajudá-lo a superá-las.
Dessa vez, tudo é diferente.
Não estamos mais em um quarto vago em uma fraternidade. Não
estamos usando um ao outro para aplacar a solidão de uma noite. Não
somos mais os mesmos.
Somos os opostos que se encaixam. Duas almas machucadas que
precisaram de uma guerra de corações para perceberem que se pertencem.
Somos uma galáxia inteira.
E enquanto estamos na minha casa, no lugar onde fui machucada, nós
reescrevemos os nossos destinos, nós fazemos desse ambiente, o nosso
refúgio.
Uma banheira. Uma história. Duas pessoas que tiveram suas chances
tiradas, mas que agora são devolvidas.
— Elas... não são bonitas, Sum — ele diz, assim que se senta.
Levo minhas mãos até seus ombros, massageando-o, fazendo com que
seu corpo relaxe. Mostrando que estou aqui para ele. Sempre por ele.
Dedilho sua pele, calmamente. Inclinando minha cabeça e encarando-o
de relance. Mesmo que eu saiba que não é o melhor momento, posso
constatar que Oliver é lindo além da razão. Seus olhos estão fechados, sua
boca entreaberta e os dedos apertam a borda da banheira. Suas sobrancelhas
são expressivas e a pele lisa é iluminada pela luz que reflete exatamente
nossas figuras. Mordo fortemente meu lábio inferior, o observando,
percebendo como as lembranças o consomem.
Como se meu toque fosse demais para sentir.
E, por um mísero segundo, afasto minha mão a fim de não causar mais
dor a ele. De não machucá-lo mais do que seus próprios pais já o fizeram.
Porém, sua mão alcança a minha que está apoiada em seu ombro,
colocando-a novamente em sua omoplata, em cima da primeira cicatriz.
Solto um suspiro, entrelaçando sua mão a minha e com a outra,
dedilhando cada ondulação na extensão de sua pele, cada marca arroxeada
que desenha suas costas. Cada linha que significa uma lembrança triste,
dolorosa.
Faço isso por tanto tempo que podem, até mesmo, ter se passado horas.
E eu poderia continuar por mais tempo, talvez dias, semanas ou anos.
Não me importaria.
Porém, isso não é o suficiente. Por esse motivo, me inclino levemente,
roçando meus lábios em seus ombros, deixando um beijo leve, casto e
gentil. Ele vira seu rosto para o lado, chocando seus olhos com os meus. E,
posso sentir tudo. Cada maldita emoção que já infligiram nele, no homem
que sorri para todos, que leva a vida com uma leveza que todos apreciam.
Há lágrimas em seu olhar, há um misto de dor e esperança. Há algo,
como se me dissesse que sente nós dois, e finalmente está se libertando de
seu passado, assim como eu me liberto do meu. Estamos superando isso
juntos, cada um superando seu caos, mas ainda juntos.
Não existem palavras suficientes no mundo que definem esse momento.
Não há sentimento maior que este.
Não há nada.
Nada acima ou abaixo de nós.
Somos apenas eu e ele.
Summer e Oliver.
Loirinha e playboyzinho.
Somos um espelho refletindo um no outro, todas as nossas dores.
Tentando nos salvar. Tentando continuar dançando.
— Cada parte de você é linda, Ollie — murmuro, deixando outro beijo
em uma das cicatrizes e me abaixo para beijá-la novamente. — Cada
centímetro. — Outro beijo em outra cicatriz. — É perfeito. — Mais um
beijo. — Você é perfeito, Ollie.
Quando menos espero, ele se afasta e se vira em tempo recorde, me
levantando e colocando sobre seu colo. Minhas pernas serpenteiam sua
cintura, enquanto ele se inclina e me beija.
Nossos lábios colidem em uma explosão de estilhaços.
Ele se inclina para frente, fazendo a água ondular entre nós dois. Mas,
nunca, em hipótese alguma, se distancia de mim. Nós caímos e caímos.
Provamos desse beijo como se ele fosse um elixir da vida. Um antídoto de
um veneno mortal.
Ele me beija como se eu fosse seu fôlego.
Como se fosse única, especial.
Transbordando um sentimento escondido, ardente, entre nós nessa
banheira.
A sensação da sua boca na minha me dilacera em milhões de pedaços
que só podem ser reconstruídos quando sua alma se encaixa na minha.
A urgência punge minhas veias e a necessidade de algo a mais é quase
cegante. Eu quero ele. Eu preciso dele. Porque Oliver Wright é o único
homem que me viu quebrar. O único capaz de reconstruir meus pedaços e
transformar-me no seu sinônimo de paraíso. Algo que eu queria ser, para
sempre.
Então, eu me entrego a nós. Ao nosso caos. Provando ele como o
veneno mais doce que intoxicou a minha alma.
Não me importando em receber esse amor, contanto que ele aceitasse o
meu.
Minhas mãos sobem pelos seus ombros, até chegarem em seu rosto,
acariciando sua bochecha e o trazendo para mais perto, aprofundando o
momento e aceitando o nosso declínio. Não há mais regras, talvez já não
haja nem mesmo um acordo.
Eu o beijo.
O beijo por vários segundos, minutos ou até mesmo horas.
Junto às nossas peças e finalmente montamos o quebra-cabeça.
Cada parte está onde pertence. Enfim, nos tornamos inteiros.
— Eu te disse naquela festa, naquele quarto, que tinha impressão de que
você seria a minha exceção à regra — ele sussurra, contra a minha pele,
deixando um beijo em minha clavícula. — Bem, loirinha, eu estava certo.
Você é a minha exceção por completo.
Solto uma pequena gargalhada.
Um som rico, que ecoa por todo o banheiro. Um som que aquece meu
coração, que faz com que Oliver sorria junto. Porque definitivamente somos
a exceção um do outro. Somos complementares. Somos uma maldita dupla.
Encaro o sorriso lindo de Ollie. E, tenho certeza de que ele reflete o
meu. A sensação de felicidade que emana do meu peito.
Um sorriso que ilumina cada parte escura das nossas almas.
— Faça de novo — pede, acariciando minha cintura.
Encaro-o, franzindo o cenho.
— Sorrir?
— Não — sopra baixinho. — Me mostre que está feliz. Que está feliz
porque eu a faço feliz.
Meu peito salta em minha caixa torácica.
E, sem hesitar, um sorriso se estende pelos meus lábios.
— Caralho — xinga, também sorrindo. — Eu sou completamente louco
por você.
E sei que quando eu precisar, posso contar com você como
Quatro, três, dois E você estará lá
Porque é isso que os amigos devem fazer
Você pode contar comigo porque eu posso contar com você
Count On Me | Bruno Mars

Eu estou completamente apaixonado por Summer Miller.


É um maldito erro, daqueles que sei que não terminará bem. Nada na
minha vida é bom assim, pelo contrário, é um complexo de tragédias e caos.
E, por mais que eu deseje que isso tenha um final alternativo, sei que é
impossível. Principalmente, quando Summer não sabe das malditas
verdades que escondo. Não imagina o que me espera nas próximas
semanas. E o pior de tudo, é que sei que Verônica não guardará isso, ela não
continuará blasé por tanto tempo.
Minha melhor amiga não mentirá para os nossos amigos. Mesmo por
mim, ela não fará. Vee me ama, ela faria o possível e o impossível por mim,
mas, isso não significa que não discordará das minhas atitudes.
E agora, entendo o que ela me disse sobre tudo estar indo longe demais.
Tenho mais a perder do que quando comecei tudo isso.
Eu não posso cogitar a ideia de perder Summer.
Porra, ter o ódio dela não é mais uma opção, nunca mais será.
Não depois que ela me olhou com aqueles olhos brilhantes, quando
beijou cada cicatriz, se abriu e me permitiu ser para ela o que ninguém
nunca foi para mim. Não quando ela me fez sentir merecedor do amor.
Me mostrou que tudo o que me foi ensinado quando criança era só uma
manipulação, uma forma que Brandon encontrou para me fazer de fantoche.
O amor não é uma fraqueza.
Ele é uma força.
Uma que se enraíza na pele e te dá motivação para continuar. Uma força
que te salva quando não há saída e pode te tornar indestrutível.
— Sum — Hazel chama, quando finalmente aparecemos no topo da
escada.
A calça que Liz havia levado para mim, quando Summer decidiu que
estava bem o suficiente para sair do banho, está um pouco larga, mas,
mesmo assim, não me incomoda.
Nós descemos lentamente e no caminho, posso observar cada rosto.
Cada expressão aliviada. Nada importava se Summer estava bem, isso valia
tudo.
Quando nossos pés tocam o último degrau, não me surpreendo pelas
garotas puxarem Sum para um abraço. Vee a abraçou primeiro, envolvendo
seus braços no pescoço da amiga, enquanto a loira fazia o mesmo, assim,
Haz e Analu se juntaram a elas. Se tornando uma bagunça, uma que todos
nós ficamos de lado apreciando.
Aquelas quatro mulheres, com personalidades tão diferentes, são as
melhores amigas que alguém poderia ter.
Elas se seguram quando uma cai.
Elas queimariam o mundo para proteger uma à outra.
Nada, é mais importante que o elo delas.
Nada está acima desse quarteto.
Mesmo que sejamos família, elas são o coração de tudo.
Elas são a razão de Saint Vincent ser tão especial.
Tão única.
— Nunca mais, Summer Miller — Vee diz para ela. — Você está me
ouvindo? Nunca mais.
Nunca mais vão te machucar. É isso que ela está dizendo, é isso que
todos nós afirmamos com o olhar.
Faremos o possível e o impossível para proteger um ao outro.
Nós podemos cair, machucar ou nos queimar. Contudo continuaremos a
ser família. Continuaremos unidos.
— Eu amo você sua loira mimada, mas, não me mate do coração
novamente — Analu murmura, e um sorriso cruza os lábios de Sum. Afinal,
não é novidade que Parker odeia demonstrar sentimentos. — Não ria, ok?
Você realmente me preocupou.
Hazel revira os olhos, mas não diz nada, apenas me encara com aqueles
olhos escuros brilhando. E, de repente, solta um sorriso, daqueles que
iluminam qualquer ambiente. Daqueles que fazem com que Dylan destrua o
mundo para vê-lo no rosto da mulher que ama, desde os seus dezesseis
anos.
Antes que eu consiga entender o que o gesto significa, ela corre em
minha direção, jogando os braços em meu pescoço e me abraçando forte:
— Você é incrível, Ollie — sussurra, em meu ouvido. — Mesmo que
seja irritante às vezes, eu ainda te amo. — Ela me solta, ainda sorrindo. —
Obrigada por ajudá-la.
— Obrigada por terem vindo quando liguei — agradeço, encarando-a.
— E, eu também te amo, Haz.
— Eu sei, você me diz isso a cada olhar.
Ergo uma sobrancelha, enquanto ela se afasta, indo até onde Dylan está.
Ele me encara com um sorriso fraco, quase que imperceptível. Porque
sabe que sua namorada não deixa nada passar em branco, ela é observadora,
sabe de tudo, mesmo que prefira dar sua opinião apenas quando realmente é
necessário.
Sorrio de volta, voltando minha atenção para a loira que está há tempo
demais longe de mim e a encontro abraçada a Levi. Ele a abraça com força,
com saudade e arrependimento. Entendendo o que perdeu nessas semanas e
tentando recuperar o tempo perdido.
E, nesse momento, tenho a convicção de que a parte dela no nosso acordo
está feita, completa. Que está na hora de romper isso. De recomeçar sem
que tudo isso esteja em nosso caminho.
— Crianças — a voz de Liz ressoa na sala e todos nós a encaramos. —
Eu acho que hoje merecemos uma noite de cinema. E de muito macarrão!
Logan solta uma risada rouca.
— Liz, não faça isso — pede, puxando a cintura de Verônica e
escorando seu queixo na cabeça da namorada. — Por favor.
Vee solta uma gargalhada.
— Você não pode estar falando sério — ela murmura para a mãe de
Sum.
— Ela está — Dylan diz, franzindo o cenho. — Nós estamos prestes a
assistir...
— Os Vingadores pela milésima vez — Josh completa, deixando os
ombros caírem.
Uma risada ecoa na sala e quando volto meu olhar para a dona do som,
não me surpreendo por perceber que é de Summer. Ela inclina a cabeça para
o lado, o brilho voltando para seu o rosto, o amor pelos seus amigos
inundando suas feições.
Não há mais aquela dor. Não há mais sombras.
Ela se ergue como uma fênix.
Sum ressurge de seu próprio caos. Mais forte, mais poderosa.
— Definitivamente estamos fazendo isso! — Sum exclama, sorrindo.
E nós fazemos.
Por quase uma noite inteira, nós nos amontoamos na sala de estar dos
Miller e assistimos os filmes favoritos de Summer, rimos com nossos
amigos e tentamos mudar para algum jogo de futebol americano, o que
resultou em Summer, Verônica e Hazel nos batendo, enquanto Levi e Analu
se provocavam com a maldita seleção do estágio do curso deles.
Mesmo em meio a tantas coisas, eu constatei que nunca havia me
sentido assim, em família.
Nunca havia desejado ter uma família.
Não até hoje.
Até eles.

Verônica e Analu acharam que seria uma boa ideia dar uma festa.
Eu, claramente, fui contra essa ideia. Achei que Summer não precisava
de algo assim depois do que passou. Porém, nem ao menos tive como dar
uma opinião, porque a loira sorriu para as amigas quando elas deram a
ideia.
Summer Miller que tanto odeia festas, sorriu e concordou com uma
comemoração!
E, exatamente por isso, uma semana após tudo o que aconteceu, estamos
todos na sala de estar dos Blackwell, com uma música aleatória tocando por
toda mansão e praticamente todos os alunos da SVU espalhados pela casa.
De onde estou, tenho a visão de Vee e Analu no bar improvisado,
virando um shot de tequila. Do outro lado, Summer e Hazel estão descendo
as escadas, conversando animadamente. A loira tem apenas uma garrafa de
água em mãos, o que me indica, que assim como eu, não irá beber hoje.
Solto um suspiro, voltando a me encostar no sofá e olho para frente,
para meus amigos que, assim como eu, desejam estar dormindo ou fazendo
qualquer outra atividade a ter que suportar mais uma festa.
— Você precisa relaxar — Levi incentiva, me encarando. — Ela está
bem. Ela sempre fica bem!
Encaro-o de volta.
— Eu não quero que ela se machuque novamente.
— Ela não vai — afirma. — Summer precisa delas.
Ele aponta com o queixo para onde as quatro estão agora, sorrindo umas
para as outras e se levanta para ir até a cozinha, buscar mais um copo de
cerveja.
Continuo encarando-as, me certificando de que Summer está bem. Vejo
Vee sussurrar algo para ela que franze o cenho e volta a sua atenção para
sua água, enquanto Hazel encara Analu com uma expressão estranha, como
se soubesse de algo, porém não tem coragem de dizer.
— Dá próxima vez, alguém, por favor, proíba Verônica de dar uma festa
— Logan diz, se jogando ao meu lado no sofá.
Solto uma risada nasal.
— Boa sorte com isso, capitão — respondo, levando minha água até
meus lábios.
— Deus, eu odeio universitários! — Josh exclama, expulsando um
calouro do sofá a minha frente e se deitando nele.
— Você não é um? — Dylan questiona, batendo na perna dele, para dar
espaço para que possa se jogar ao seu lado.
— Deixe-me reformular: eu odeio calouros — diz, sorrindo e se
sentando direito. — Eles estavam reclamando da cerveja. A maldita cerveja
que eu tive que comprar!
Logan pende a cabeça para trás soltando uma gargalhada.
— O que está acontecendo? — Levi questiona, quando finalmente volta
a se jogar do meu outro lado.
— Josh está reclamando dos calouros — conto, erguendo uma
sobrancelha. — Por que tem uma marca de batom na sua bochecha? Você
saiu daqui a menos de cinco minutos.
Ele sorri maliciosamente.
— Cheerleards — conta. — Elas são boas pessoas.
Lanço-lhe uma careta.
— Deixe minha namorada sonhar que está mexendo com as garotas da
equipe dela e ela vai chutar a sua bunda — Logan diz, levando o copo até
os lábios. — E eu, definitivamente, não te defenderei, Johnson.
Ele dá de ombros, se escorando no sofá e pegando o celular.
— Oliver? — Josh me chama, fazendo com que eu me vire para ele.
— Sim?
— Quanto você pagou? — ele questiona.
— Pelo quê? — Franzo o cenho.
— Pelo cinema, é claro.
Solto um sorriso condescendente.
— Um.
— Um mil? — Logan pergunta, erguendo uma sobrancelha.
Meu sorriso aumenta.
— Puf! Me respeite, capitão — debocho, umedecendo meus lábios. —
Eu paguei um milhão.
A bebida que Levi havia ingerido salta de sua boca, enquanto ele me
encara com seus olhos arregalados.
— Você pagou um milhão de dólares por um encontro? — questiona,
perplexo.
Franzo o cenho.
— Não, o encontro foi de graça. Quer dizer, ela queria me matar, se isso
conta — confesso, dando de ombros. — O cinema foi só um presente meu
para ela mesmo.
— Você deu um maldito cinema de presente para Summer? — Josh
questiona, perplexo.
Dou de ombros, bebericando minha água.
— Ela ainda não sabe que é dela — conto. — Mas sim, eu dei.
Todos eles me encaram, como se estivessem esperando confissão de que
é apenas uma brincadeira ou que tinha perdido a sanidade.
Josh balança a cabeça, descrente.
Dylan é o único que me encara como se não se importasse. Afinal, o
idiota mimado seria capaz de pagar o dobro desse valor se isso significasse
que Hazel estaria feliz e sorrindo.
— E eu aqui achando que Logan havia exagerado em cantar One
Direction para Verônica em um maldito karaokê — Levi murmura,
gargalhando. — Que Deus nos proteja do próximo que começar um
relacionamento nesse grupo.
— Você pode ser o próximo — aponto para a mancha de batom.
Levi me lança uma careta enojada.
— Nem nos seus melhores sonhos! — exclama.
Solto uma gargalhada, observando o caçula dos Blackwell se aproximar.
— Nós deveríamos criar um grupo como o delas — Ed diz, de repente,
se jogando no sofá ao lado de seu irmão e erguendo o queixo na direção das
garotas que estão focadas em algo que Summer fala.
— Um grupo de cavalheiros abandonados pelas suas amigas? — Levi
debocha, levando a lata de cerveja até os lábios.
— Não, idiota — Logan adverte, revirando. — Acredito que seria mais
como o Clube do Livro dos Homens[25].
Dylan, Levi, Josh e Ed se viram para o capitão do time da SVU,
erguendo as sobrancelhas.
— E o que diabos seria isso? — Josh, questiona.
— É um livro — ele comunica, escorando um de seus cotovelos no
braço do sofá e relaxando as pernas. — Vocês deveriam ler mais, Jesus!
— Um livro? — Levi, questiona, emitindo uma careta.
— Aham, aquele objeto com folhas e palavras — zombo. — Conhece?
Ele me olha de esgueira.
Contudo, quando Levi abre a boca para responder, me distraio, sentindo
alguém atrás de mim, inclinando seu corpo até que uma cortina de cabelos
loiros tampe meu campo de visão e impeça que Levi me lance uma de suas
respostas.
Sorrio quando o cheiro, no qual sou completamente obcecado, invade
minhas narinas e um rosto bastante conhecido invade meu campo de visão:
— Oi, playboyzinho.
Ela sorri.
— Oi, loirinha.
Ela me lança um olhar cheio de significados.
— Você quer fugir daqui? — repete a mesma pergunta que eu havia dito
a ela no baile em Nova York.
— Você não deveria querer ficar até o final? — pergunto, sorrindo.
— Deus, não! — exclama. — Quero ir embora ter uma boa noite de
sono.
Pendo minha cabeça, soltando uma gargalhada no mesmo instante que
uma mão afasta o cabelo de Summer e um rosto entra em nossa bolha sem
ser convidado.
— Você está atrapalhando o papo do Clube dos Homens, Sum — Logan
diz, erguendo uma sobrancelha.
— Clube dos Homens? — ela questiona, confusa.
Levi aparece do meu outro lado sorrindo, acabando com a atenção que
Summer mantinha em mim.
— Céus, Sum, você nunca viu Clube da Luta[26]? — ele questiona,
ofendido. — A primeira regra do Clube da Luta é que você não fala sobre o
Clube da Luta!
— Eu achava que estávamos falando de um livro, não de um filme —
Josh fala ao fundo.
De repente, o som da gargalhada de Ed e Dylan irrompe o ambiente.
Fazendo todos nós os encararmos.
— O que está acontecendo? — Vee pergunta, se sentando no colo de
Logan.
De relance, vejo Hazel fazer o mesmo com Dylan e Analu se sentar ao
lado de Josh, levando uma garrafa de tequila até os lábios.
— Eles acabaram de inventar um clube — Summer conta, franzindo o
cenho. — Um Clube dos Homens.
Analu solta uma risada, enquanto Vee e Hazel inclinam a cabeça,
confusas. Porém não me atento ao restante da conversa. Apenas volto
minha atenção para Summer que faz o mesmo.
— Aquela proposta de ir embora... — começo.
— Sim, por favor — sussurra. — Eu preciso de descanso.
— Você está com fome?
Ela umedece os lábios.
— Por quê? — Sua pergunta tem um quê de segundas intenções.
Solto um sorriso, deixando um beijo em sua bochecha.
— Porque estou prestes a cozinhar para você na minha casa, linda.
Quero ser o rei da sua história
Eu quero saber quem você é
Eu quero que seu coração seja meu
Oh, Eu
Power Over Me | Dermot Kennedy

Nós saímos da casa de Verônica poucos minutos depois.


A ideia de cozinhar a essa hora com certeza é absurda, afinal são duas
horas da manhã. E, pelo amor de Deus, quem cozinha a essa hora?
Contudo, não vi Summer comer nada a tarde, tampouco durante a festa.
E, se conheço bem minha namorada falsa, ela começará a reclamar sobre
estar com fome assim que chegarmos na minha casa.
Por isso, menos de cinco minutos depois, estamos estacionando meu
carro na garagem subterrânea da casa dos meus pais e saindo do automóvel,
rumo à enorme cozinha. Percebo que além do meu carro, apenas o de Andi
está aqui, o que me indica que não há ninguém na casa. Nem mesmo os
poucos funcionários.
— Onde está Andrew? — ela pergunta, de repente, passando por mim e
se escorando no balcão que se estende no meio da cozinha.
Sorrio para ela, indo até a dispensa.
— Ele está em Seattle — conto. — Minha avó pediu para que passasse
alguns dias com ela.
Summer ergue uma sobrancelha.
— Sua avó? — questiona.
— Sim. Ela prefere manter distância dessa cidade. — Solto um sorriso
frio. — Então, talvez, você nunca tenha visto ou falado sobre ela.
Solto um suspiro, fazendo qualquer coisa, menos encará-la.
— Por que... — ela começa a perguntar, o que já esperava. — Por que
ela odeia Saint Vincent?
Só então a encaro, meu rosto é uma máscara de tudo o que nunca gosto
de lembrar, é um misto de nervosismo e tristeza. Meu olhar segue até a
escada, onde a moldura do quadro com a imagem da minha mãe é aparente.
— Porque não é fácil sentir compadecimento pela cidade que apedrejou
sua filha por ter fugido de um casamento abusivo, com o segurança do seu
marido, e abandonado dois filhos. — Minha mandíbula se contrai e para
disfarçar, ando até a geladeira.
Ouço Summer andar até mim. Sua presença faz com que me erga, a
observando sobre meus ombros. Seus olhos não são penosos como o de
todos aqueles que já souberam da história da minha família. Eles são gentis,
complacentes e mensuram cada sentimento que estou transmitindo pelo
meu olhar. É simples, mas ainda assim, aprecio esse gesto.
Todavia, não estou surpreso, tudo o que a envolve, cada partícula do
corpo dela, cada maldita coisa sobre Summer, faz meu dia ficar melhor. Ela
sabe fazer até mesmo a lembrança mais dolorosa, se tornar força. E mesmo
quando está reclamando, indagando ou ofendendo algo que não a agrada,
ela faz com que tudo fique melhor.
Porque Summer é isso para mim, ela é a luz que brilha em minha alma.
— Então, você é viciado em números — murmura, mudando de assunto,
percebendo que não quero estragar nossa noite.
Sorrio levemente.
— Eu não sou viciado, apenas gosto da semântica deles. Gosto da
exatidão e de saber que não há brechas quando se trata da matemática —
Fechando a geladeira, me viro para ficar cara a cara com ela. — Um
resultado sempre será exato se você fizer a conta certa.
— Meu Deus — ela murmura. — Oliver Wright é um nerd!
Summer pende a cabeça para trás soltando uma risada gostosa.
— Sim — confirmo. — Agora venha cá.
Em um movimento rápido, ela se aproxima e ergue o olhar, no mesmo
instante que a puxo, encaixando-a em meu peito. Sentindo seus braços me
serpenteando e um sorriso fraco cruzar seus lábios.
— Estou aqui — sussurra.
— Finalmente — Uma palavra simples, mas que contém vários
significados. Solto um sorriso em sua direção, deixando um beijo casto em
sua testa. — Você tem duas opções.
Encaro-a.
— E quais seriam?
— Você pode escolher o que vamos fazer e então iremos dormir —
murmuro colocando uma mecha de seu cabelo atrás do lóbulo da sua orelha.
— Ou então... cozinho para você e depois, você pode me mandar arrastar
minha bunda até o seu apartamento para deixá-la em segurança.
Ela solta uma risada fraca.
— A escolha é minha?
— Sempre, linda.
Summer inclina a cabeça, pensativa. Contudo, cada parte de suas pupilas
me mostram que sua decisão já está tomada antes mesmo que eu lhe
dissesse quais seriam as opções.
— Certo. — Maneia a cabeça. — Eu quero que faça uma coisa.
Franzo o cenho.
— Qualquer coisa — brinco.
Ela me olha nos olhos e sei que nesse momento seria capaz de cometer
atrocidades para continuar vendo esse brilho em suas pupilas.
— Eu quero que terminemos aquela aula de dança.
A aula da noite na fraternidade.
A nossa primeira dança em um quarto.
O começo do nosso fim.
A noite que pensei que não deveria ter acontecido, mas que agora,
percebo que foi a melhor coisa que já vivenciei em minha vida.
— Você ainda é uma péssima dançarina? — brinco, erguendo uma
sobrancelha e lançando-lhe uma careta zombeteira.
— Você ainda está aproveitando a companhia de uma loira que o odeia
sem motivos? — ela devolve minhas palavras daquele dia.
Sorrio, pegando meu celular rapidamente e procurando uma música.
Assim que encontro, entrelaço minha mão na dela, puxando-a até o centro
da sala e escorando o objeto que começa a emitir a melodia de Power Over
Me de Dermot Kennedy, em cima do piano de minha mãe.
Encaro Summer, observando o brilho que emana de seu olhar. Um
brilho inigualável, que poderia até mesmo ofuscar a maior unidade
astronômica já descoberta.
— Sempre — sussurro, puxando-a contra meu peito e segurando sua
mão no ar, enquanto ela leva sua outra mão até meu ombro. — A
companhia dessa certa loira é a única que almejo em minha vida.
Summer solta uma pequena risada nasal, assim que começo a nos mover
lentamente, deixando que a música guie nossos próprios movimentos.
Deixando que nada mais importe.
Apenas sentimos nossos corpos balançarem, de um lado para o outro, na
enorme sala.
Não nos importamos se os minutos passam ou se estamos presos um no
outro, como se não tivéssemos mais como nos libertar.
Apenas nos movemos e então caímos.
Caímos em uma armadilha feita para aqueles que não entendem a
complexidade desse sentimento, ou não entendem que isso, que nós somos
maiores do que qualquer coisa que possa entrar em nosso caminho.
Caímos como se a queda não fosse tão dolorosa quanto a ideia de
perdemos um ao outro, de que quando chegarmos ao chão, conseguiremos
nos salvar, mesmo sendo impossível.
Impossível porque não somos capazes de salvar o outro sem que nos
salvemos a nós mesmos, sem curarmos nossas próprias feridas. Não
podemos ser aquilo que precisamos ser um para o outro, sem que
superemos nossos passados e foquemos no futuro.
Nós caímos pela última vez em uma queda livre, a quilômetros por
horas, onde temos a plena convicção de quando aterrissarmos, o machucado
será maior do que quando começamos.
Todavia, a adrenalina, a endorfina e o desejo se sobrepõem a qualquer
que seja esses machucados.
Eles nos fazem parar de balançar.
Fazem com que nos observamos.
Faz um fogo queimar em nossas pupilas e o desejo percorrer nossas
veias.
— Summer.
— Oliver — Engulo em seco.
Dou um passo em sua direção e então a puxo para mim, colando nossos
corpos, sentindo a corrente elétrica que emana de nossos corpos. Assim que
ela ergue o rosto para enxergar os meus, estamos, mais uma vez, próximos a
mergulhar em algo desconhecido, algo errado, algo sem volta.
— Eu te falei que quando isso acontecesse — murmuro com
dificuldade. — Nós estaríamos arruinados para outras pessoas. Então, se
você não deseja isso, se você ainda deseja conhecer alguém que não seja tão
fodido como eu, peça-me para parar, linda. Peça-me para deixá-la ir... —
minha voz é apenas um fio, apenas um pingo da sanidade que ainda me
resta. — Porque eu não serei capaz de parar quando começar. Você será
minha, Summer. Cada. Maldita. Parte. Sua. Será. Minha.
Ela não diz nada, apenas me encara com seus grandes olhos castanhos,
como se me enxergasse, como se não quisesse fugir. Summer me encara
como sempre desejei que fizesse. Como se eu fosse importante, digno de
pertencer a algo.
Ela leva uma de suas mãos até meu rosto, acariciando-o. Então, morde o
lábio inferior. Causando em mim uma queimação, uma que faz com que
tudo dentro de mim se eleve, chegando a uma temperatura que poderia até
mesmo se igualar a um vulcão em erupção, e só piora, quando percebo que
suas pupilas queimam com uma sensação perigosa, selvagem e pecaminosa.
— Nós sempre fomos arruinados para outras pessoas, Ollie — ela
murmura, passando a língua pelos lábios, fazendo com que meu pau lateje
em minha calça. — Cada pedaço seu é meu, assim como cada pedaço meu é
seu e…
Sem deixar que pudesse terminar sua frase, eu a beijo.
Não, eu a devoro.
Nossas bocas se chocam em uma demonstração louca de todos os
sentimentos reprimidos. Ataco seus lábios como se eles fossem a minha
perdição, como se estivéssemos tão sedentos por contato que não nos
importamos com a agressividade do momento. Quando suas mãos sobem
até minha nuca, aprofundando ainda mais o momento, perco o controle.
Todo o resto de sanidade se extingue do meu ser.
Eu queimo por ela, clamo por seus gemidos e imploro pelo seu corpo.
Agarro a parte de trás de suas coxas e a levanto, deixando suas pernas se
enrolarem em minha cintura. Enquanto suas mãos se agarram em meu
cabelo e caminho cegamente até a superfície do piano, depositando-a nele
sem nunca deixarmos nossos lábios se desgrudar.
Summer abre um pouco as pernas, me permitindo entrar entre elas, e as
enrola novamente em minha cintura, apertando sua pélvis contra a minha,
sentindo o quão duro estou.
O quanto desejo me enterrar em sua boceta.
Em como quero prová-la até que a exaustão tome conta de nossos
corpos e saborear cada pedaço, cada curva de seu corpo. Então, como
desejo chupar, lamber e me deliciar com sua pele.
— Me diga que você deseja que eu te foda, amor — grunho, arrastando
meus lábios pela extensão de seu pescoço. — Me diga que quer que eu te
coma como sempre prometi. Me diz, linda.
Ela apenas geme, arrastando suas mãos pelo meu pescoço, me puxando
ainda mais para si, querendo que o contato se intensifique.
Quando abre seus olhos, não perco o flash de outro sentimento, de como
ela está tão entregue a mim, desnudando nossas almas ou como estamos nos
tornando apenas um.
— Eu preciso que você diga, loirinha — continuo, quando não diz nada.
Mas, Summer não emite nenhum som, ao contrário, ela me empurra e se
levanta, invertendo nossas posições e assim que franzo o cenho, confuso,
ela solta um sorriso malicioso.
Ela inclina a cabeça para o lado, segurando a barra de sua camiseta e
então, sem nenhum aviso prévio, ela a retira. Logo após, é a vez de sua saia
e por fim os sapatos.
Summer Miller fica na minha frente trajada apenas em uma lingerie
preta. É a porra da oitava maravilha do mundo, a minha perdição e o meu
paraíso. E, quando acho que estou surpreso o suficiente, poderei tocá-la e
fazer qualquer coisa, ela me surpreende se abaixando, ajoelhando-se na
minha frente.
E mesmo de joelhos, Summer Miller é uma maldita rainha.
A minha rainha.
Meu coração martela em minha caixa toráxica, meu sangue queima sob
minha pele e meu pau parece que se torna uma maldita pedra de tão duro.
Summer, percebe isso, porque leva os dedos delicados até meu cinto e me
encara sob os cílios.
Aqueles malditos olhos castanhos brilham em malícia quando solta um
sorrisinho descarado.
— Eu posso, Ollie?
Puta que pariu.
— Porra, sim! — praticamente, rosno.
Então, ela faz.
Com a minha ajuda, Summer me despe em tempo recorde. Quando
estou apenas de cueca, ela me encara novamente, abaixando o tecido
expondo todo meu pau. Ela nunca desvia o olhar e, com isso, não perco o
flash admirado, surpreso e ansioso que vibra de suas íris.
Ela aperta o punho ao redor da base, bombeando lentamente, em uma
tortura deliciosa. Levo uma mão até a parte de trás de seu pescoço e giro
seu cabelo em meus dedos, erguendo seu lindo rosto corado para cima,
fazendo-a me encarar.
Então, é a minha vez de sorrir maliciosamente.
— Você quer meu pau tão fundo em sua garganta, amor? — Com a
minha mão livre, esfrego meu polegar em seu lábio inferior antes de arrastá-
lo até seu pescoço fino e fechar minha mão nele, encaixando perfeitamente.
Seus olhos brilham quando as palavras saltam da minha boca, com isso,
solto seu pescoço, acariciando sua bochecha, aguardando pela resposta.
— Sim — sua voz é tão baixa que quase não escuto.
Sorrio, passando minha língua pelos meus lábios sensualmente,
enquanto puxo seu cabelo com um pouco mais de força e inclino sua cabeça
para frente, em direção ao meu pau.
— Coloque sua língua para fora, linda. — Ela faz o que ordeno, e para
meu deleite, Summer gira a língua na cabeça do meu pau, me retirando um
maldito gemido. — Me diga para parar se for muito, ok?
Ela assente, então, envolve seus lábios ao redor da minha extensão e
chupa lentamente, levando-me até sua garganta. A sensação de sua boca me
envolvendo é tão quente que um arrepio percorre meu corpo e uma série de
palavrões ecoa pela sala, enquanto uma das minhas mãos força sua cabeça e
a outra agarra a borda do piano.
— Porra, linda.
Summer pisca para mim, seus olhos lacrimejando pela força e por conta
do meu tamanho. Contanto, não pede para que eu pare, ao contrário, minha
pequena loira me toma mais fundo. Ela lambe, se delicia e toma um ritmo
próprio que me faz pender a cabeça para trás, grunhindo e clamando pelo
seu nome.
Prendo meus dedos com mais força entre seus cabelos, fazendo com que
me encare ao passo que fodo sua boca. Isso não a intimida, os olhos de
Summer brilham. A porra da minha loirinha se delicia com cada segundo.
Ela lambe, chupa e brinca com minhas bolas, enquanto engole meu
membro.
Mesmo com as bochechas levemente coradas, os fios de cabelos presos
em sua testa e os olhos brilhantes em excitação, com meu pau entre os
lábios, Summer Miller é a porra da oitava maravilha do mundo.
Ela é a minha perdição. Meu veneno e meu antídoto.
— Merda, Sum!
Seus impulsos ficam mais frenéticos, enquanto começo a empurrar mais
forte, mais desorientado, prestes a explodir em sua boca. No momento em
que, ela arrasta sua unha pelas minhas coxas, suavemente, causando um
arrepio em meu corpo, eu me perco.
Sinto o meu orgasmo me atingir fundo, queimando dentro de mim,
selvagem e intenso. Destruindo tudo e quaisquer dúvidas de que, um dia,
Summer Miller pertencerá a qualquer pessoa que não seja eu.
Um sentimento possessivo e regado à luxúria faz com que segure seu
braço, puxando-a para cima e a pegue no colo, sentindo suas pernas
circularem minha cintura, enquanto subo rapidamente as escadas, rumo a
minha suíte.
— Caralho, eu vou te comer com tanta força agora, amor — sussurro em
seu ouvido quando atingimos o corredor. — Eu vou te foder tão bem.
Com isso, abro a porta e adentro com ela, logo após, a fecho e carrego
Summer até minha cama, espalhando-a sobre os lençóis escuros.
Apreciando a sua figura esparramada sobre a minha cama. Aonde ela
pertence, onde sempre deveria ter pertencido.
Porque Summer é minha. Cada fodida parte dela.
Minha.
Minha loirinha.
Minha rainha.
E em breve, minha mulher.
Não tenho controle, é como se toda sanidade tivesse me abandonado.
Apenas o desejo de consumir Summer permanece em meu corpo.
— Ollie... — murmura. — Por favor...
Sorrio, maquiavélico, indo até ela e segurando seu queixo, enquanto me
abaixo e a beijo, provando o meu gosto eu seus lábios.
Levo uma mão até sua calcinha, arrastando-a para o lado e encontrando
sua boceta, sentindo meu dedo criar um caminho pelas suas dobras
escorregadias, amando o quão molhada está.
Com a outra mão, solto seu sutiã, expondo os seios e não penso duas
vezes em me abaixar e tomá-los em minha boca, me deliciando com a
sensação de tê-los para mim. Dou uma atenção demorada em cada um
deles. Chupo, lambo e arrasto minha língua lentamente pelo seu mamilo,
ouvindo-a gemer baixinho, enquanto joga sua cabeça para trás.
— Fique de quatro, linda. — Sua boceta aperta em meu dedo. — Agora.
Suas mãos e joelhos mal têm tempo de baterem no colchão, antes que
me projete atrás dela e me baixe, rasgando o tecido fino da calcinha e
jogando-o em algum lugar do quarto. Então, aplico minha língua contra
seus clitóris, alternando entre lambidas longas e lentas, como se estivesse
com tanta fome. Fome dela. De seu gosto, de tudo o que está disposta a me
dar.
Me deleito a cada instante. A chupo como se estivesse possuído. Minhas
mãos cavam em sua carne e a outra se junta a minha língua, entrando e
saindo dela. Seus gritos ecoam pelo meu quarto.
Gentilmente puxo seu clitóris com os dentes e, logo após, arrasto minha
língua por toda sua fenda encharcada, sentindo-a explodir, cair em mil
estilhaços e seus gritos reverberam pelas paredes.
— Seu gosto, linda, é a melhor coisa que já provei — rosno, lambendo
cada gota enquanto ela treme sob meu toque.
— Deus, Ollie... — Suas mãos apertam o colchão, enquanto me levanto
e inclino, puxando uma camisinha da mesa de cabeceira.
— É bom saber que me considera assim, querida — provoco.
— Oliver… eu preciso de você. Agora! — Summer ordena.
E, eu faço o que me pede. Pois, no momento seguinte, ela grita quando
afundo dentro dela, preenchendo-a num golpe só.
Eu a fodo rápido, com força. Inclinando-me, puxo seu cabelo,
observando suas mãos puxarem o lençol e minha outra mão agarra sua
cintura com força, marcando-a. Todas as vezes que penso em parar, que
diminuo o movimento, Summer grunhe em advertência. Fazendo um sorriso
convencido estampar meu rosto e sentir meu suor descer pelas minhas
costas.
Por isso, quando dou uma estocada, levanto minha mão, descendo um
tapa em sua nádega lisa, apreciando o som de sua pele sendo marcada e de
seus gritos. Defiro outro tapa no mesmo instante que solto seu cabelo,
apenas para observá-la abaixar o rosto e morder o travesseiro enquanto sua
boceta aperta meu pau.
Engolindo-o. Tomando-o para si.
— Ollie... — ela sussurra como uma oração. — Meu Deus, Oliver...
Puxo seus quadris até que sua bunda esteja no ar e então, começo a
entrar dentro dela em um ritmo descontrolado, percebendo que seus
gemidos se tornaram gritos e palavras incompreensíveis, saltam de seus
lábios.
Saio dela rapidamente, me inclinando e lambendo todo o líquido que
escorre de sua fenda, depois me inclino sobre ela, sorrindo perigosamente.
— Você quer parar, linda? — sussurro, segurando sua garganta.
Erguendo-a, colo suas costas em meu peito e lhe dou um beijo duro,
repleto de sentimentos. Quando meus lábios soltam os dela, vejo-a me
lançando um olhar ameaçador.
— Não ouse.
Belisco seu mamilo com força, sorrindo depravadamente.
— Ótimo. Se segure na cama — murmuro, abaixando meu rosto na
curva de seu pescoço e deixando um beijo leve. — Porque estou prestes a te
foder até que entenda que você e essa boceta são minhas, porra.
Quando ela faz o que peço, eu mostro a ela. Mostro como cada sílaba
dessas palavras são a mais pura verdade.
Eu a fodo forte, entrando e saindo. Fazendo-a segurar as barras de
estruturas e manter a cabeça apoiada no travesseiro. Esfrego meu pau para
cima e para baixo, levando meu tempo extra torturando-a, escutando suas
súplicas, seus gritos por conta do clitóris hipersensível.
Assim que estou no meu limite, perdendo o resto do controle, estoco
dentro dela com força, sentindo-a empurrar de volta. Desejando por mais,
me mostrando como quer e como devo satisfazê-la.
— Oliver...
— Solte a cama, Summer! — Satisfação borbulha em mim quando ela
faz o que ordeno.
Puxo-a para cima, fazendo com que fique ajoelhada na minha frente
novamente, e com uma mão, seguro sua garganta ajudando-a a se firmar,
enquanto estoco em sua boceta por trás, sentindo meu pau mover para
dentro e para fora, no mesmo instante que corro minha língua pela extensão
de seu pescoço e aplico uma pressão, deixando uma marca arroxeada.
— É muito, é demais, Ollie! — ela grita, forçando-se contra mim. —
Meu Deus!
Sorrio, mordendo o vão entre seu pescoço e seu ombro novamente.
— Não seja covarde, linda — sussurro no pé do seu ouvido. — Leve-me
até o fim.
Com isso, constato que preciso apreciar seu rosto, preciso ver sua
expressão quando gozar por todo o meu pau. Preciso ter cada resquício do
prazer de Summer.
Sem hesitar, saio de dentro dela, virando-a na cama e jogando uma de
suas pernas em meu ombro, enquanto volto a enterrar dentro dela, com
força. Seus olhos se chocam com os meus e minhas mão se entrelaçam nas
suas em cima de sua cabeça. Suas unhas forçam minha palma com força, a
cada vez que entro nela sem dó. E, não irei me surpreender se estiverem
machucadas quando terminarmos.
Ela está perto, eu estou perto.
Por esse motivo, incito-a ainda mais, faço meu pau bater em sua boceta
com força, enquanto minha mão livre desce até seu clitóris massageando,
ajudando-a chegar em seu ápice.
Quando a ponta do meu pau atinge seu ponto G, sua respiração se
engasga e pela forma como seu rosto se contorce em êxtase, sei que está
chegando, que está prestes a ter outro orgasmo.
— Goze em todo meu pau, linda — murmuro. — Me dê isso.
E ela faz. Summer desmorona em seu próprio orgasmo como se fosse
um furacão de categoria cinco.
Apenas por observá-la, eu me forço ainda mais dentro dela, pois como
se fogo espalhasse por todo o meu corpo, consumindo-me e engolindo-me,
me desfaço tendo espasmos dentro dela e lentamente paro de me mover,
saindo do seu calor aconchegante.
— Nós definitivamente quebramos todas as regras — ela diz, entre
fôlegos.
Solto uma risada, deixando um beijo casto em seus lábios.
— Eu te falei que quebraria todas elas por você, amor!
E por que fico tão nervoso quando olho em seus olhos?
E as borboletas não podem me impedir de me apaixonar por você
E querida, isso é mais do que qualquer coisa que eu senti antes
Você é tudo que eu quero, mas eu não pensei que encontraria
I GUESS I’M IN LOVE | Clinton Kane

Acordei sozinha na cama de Oliver, no dia seguinte.


Mesmo com o ambiente escuro por conta das cortinas fechadas, posso
sentir que não há ninguém. Nenhum resquício do homem que me fodeu
durante a noite toda, até atingirmos a exaustão.
Seu lugar ao meu lado está frio, o que me indica que já faz tempo que se
levantou. Então, sem pensar, levando-me e pego uma camisa preta de
botões que tampa boa parte das minhas coxas e saio para o corredor.
Não me surpreendo quando o silêncio me abraça durante o caminho
rumo ao primeiro andar, onde minhas coisas estão. Todavia, assim que
atinjo o patamar da escada, sou obrigada a parar por conta do barulho de
uma porta sendo aberta e passos emergindo no ambiente.
Inclino minha cabeça para o lado a fim de tentar ver quem é a minha
nova companhia e assim que a figura tranquila de Oliver, caminhando pela
sala, segurando uma bandeja com dois copos do Starbucks e uma sacola de
papelão, entra em meu campo de visão, solto a respiração que estava presa
em minha garganta.
Ele para no centro da sala, retirando os óculos escuros, abandonando as
chaves na mesa de centro e, finalmente, levanta o rosto em minha direção,
sorrindo.
— Bom dia, loirinha.
— Onde você estava? — pergunto, voltando a descer a escada.
Oliver caminha despreocupadamente em minha direção, parando no
último degrau e, assim que o alcanço, deixa um beijo leve, quase como uma
carícia invisível, em meus lábios.
— Buscando o café da manhã para uma certa loira rabugenta — Um
sorrisinho sarcástico cruza seus lábios e rolo meus olhos. — Hum, essa
revirada de olhos é um indício de que posso tomar essa bomba açucarada,
que você chama de bebida?
Seu sorriso se estende no mesmo momento em que meus olhos se
enrugam e meus lábios se tornam uma linha fina.
— Você não ousaria.
Ele inclina a cabeça, convencido.
— Você duvida?
— Com certeza — afirmo em um tom jocoso.
Observo enquanto joga a cabeça para trás, soltando uma pequena risada
e seus braços circulam minha cintura, se aproximando e deixando mais um
beijo em meu rosto.
É uma rotina que poderíamos nos acostumar, como se essa tranquilidade
fizesse parte do nosso dia a dia.
— Para sua informação, não tomaria sua bomba açucarada apenas
porque prefiro mil vezes o meu café preto. — Seu olhar cai para a bandeja
que ainda segura em uma careta engraçada. — Agora, vamos alimentá-la.
Oliver não espera pela resposta. Ele apenas nos puxa rumo à cozinha e
deposita os conteúdos sobre o balcão. Aproveito que me soltou, para dar um
impulso para cima e me sentar contra a superfície gelada.
Ollie percebe a posição que agora estou e não perde tempo, se
colocando entre minhas pernas e apoiando seus braços ao lado do meu
corpo. Seus olhos verdes brilham quando focam nos meus e constato que
nunca o vi desta forma, nunca o observei tão leve e tranquilo. É como se ele
estivesse finalmente se permitindo sentir, permitindo que tudo o que
passamos não estrague a leveza daquilo que estamos construindo.
Oliver apenas se permite ser aquilo que sempre deveria ter sido.
— Você quer saber um pensamento meu? — pergunta, de repente,
passando o dedo pela minha clavícula.
Seus olhos queimam nos meus.
— Talvez?
— Hum... — sussurra. — Eu estou pensando em como você fica gostosa
vestida apenas com a minha camisa. — Se aproxima, deixando um beijo
leve no canto dos meus lábios. — E, que essa imagem me faz querer te
dobrar sobre essa bancada e fodê-la novamente.
Encaro-o sem proferir nenhuma palavra, acho que nem ao menos
conseguiria. Porque a minha atenção agora está totalmente em seus lábios,
na forma como me encara e em como meu interior agora pulsa por isso.
Para ele fazer exatamente o que disse, para me deitar nessa bancada e me
fazer esquecer o dia e tudo o que temos que fazer. Apenas desejo que ele
faça.
— Eu não iria me opor. — Passo a língua pelos meus lábios,
observando-o acompanhar o gesto.
Oliver lambe seu lábio inferior, me encarado e se inclina, beijando meus
lábios. É um beijo lento, que consome cada partícula do meu corpo e ainda
assim me faz ansiar por mais. Me faz querer despi-lo, arrastar minha língua
por todo o seu corpo e por fim, deixá-lo repetir tudo o que fizemos nesta
madrugada.
— Eu adoraria te comer em todas as posições que rondam a minha
mente nesse momento — murmura, contra meu rosto. — Mas, nós temos
aula e você, com certeza, vai querer ir em casa colocar aquelas blusas
horrendas.
Me afasto de seu rosto, puxando meu frappuccino e mostrando a língua
para ele.
— Você é um nerd viciado em números — zombo, levando o canudo à
minha boca. — Não tem mais o direito de julgar minhas roupas.
Ele ri, abaixando o meu copo e dando outro beijo em meus lábios.
— Estou começando a sentir saudades de você me chamando de
playboyzinho. — Mais um beijo é depositado em minha boca. — Jesus!
Você é viciante, Summer Miller. Parece que não consigo manter minhas
mãos e lábios longe de você por mais de dois minutos.
Uma gargalhada involuntária escapa dos meus lábios. Me aproximo e
lhe devolvo o beijo, puxando-o para mim, para seu corpo se agarrar ao meu.
Percebo que assim como Oliver, a tentativa de manter minhas mãos longe
dele, é completamente impossível.
— Eu já lhe disse que é um idiota?
Ele deixa um beijo em meu queixo, sorrindo.
— E eu já lhe disse que é linda?
Minhas bochechas coram.
Jesus.
Eu nunca corei com elogios. Eu nem mesmo me importo com eles, mas
algo no tom de voz de Oliver, faz com que isso aconteça, com que minhas
mãos suem e um frio se aloje em meu estômago.
— Nós deveríamos viajar — diz de repente.
Franzo o cenho, confusa. O observando desviar os olhos e levar a mão
até a bandeja retirando seu enorme café.
— Nós acabamos de voltar de viagem, Oliver — o recordo, levando o
canudo até meus lábios. — E nós temos aula.
Oliver suspira fundo, engolindo em seco. Seu pomo de adão sobe e
desce. É como se ele estivesse se lembrando de algo, de alguma coisa que
não gostaria, mas que ainda assim invade sua mente.
— Está tudo bem? — Ergo minha mão até seu rosto, acariciando.
— Nós realmente deveríamos viajar — repete, focando seus olhos em
mim. — Nós deveríamos desfrutar de toda essa farsa e aproveitar nosso
tempo emprestado, linda. Temos quinze dias.
Uma dor irrompe meu peito.
Quize dias.
Quinze malditos dias com Oliver.
Fingindo, não vivendo.
Porque, por um breve momento, esqueci que isso tudo não é real.
Apenas eu achei que seríamos diferentes.
Mas estava completamente errada.
Tola. Patética.
Somos os mesmos. Apenas um acordo, uma mentira. Somente deixamos
de ser um segredo.
— Eu não posso largar tudo para viajar com você, Oliver — digo,
finalmente.
— Por que não?
Franzo o cenho, abandonado minha bebida ao meu lado.
— Por que diabos você quer tanto nos tirar daqui? — Minha voz sai
irritada.
Ele para por um segundo, encarando-me. Pensando. Tentando achar uma
resposta.
— Porque eu quero aproveitar cada segundo do nosso tempo
emprestado, linda.
Encaro-o, sem emitir nenhum som.
A realidade recai em meus braços. Finalmente entendi a complexidade
do que nos tornamos. E, com isso, por saber o que Oliver agora significa
para mim, compreendo que não posso mais. Não posso continuar com isso.
Não posso mais deixá-lo entrar em meu âmago e dá-lo o poder de destruir
meu coração.
Não posso entregar aquilo que nunca entreguei a ele, sabendo que nunca
desejou ficar, que não somos o ponto final um do outro.
Se continuarmos sendo uma farsa, não podemos mais ultrapassar esses
limites.
— Voltamos às regras então — afirmo, por fim.
O sorriso de Oliver escorrega de seus lábios.
— Regras?
— Eu não sou uma pessoa que aprecia um lance casual, Oliver — digo.
— Não vou continuar em algo que sabemos que tem uma data de validade,
para no fim eu sair machucada.
— Summer — seu tom é confuso, frustrado.
— Você disse que não me machucaria, Oliver. — Uso suas palavras
contra ele. — Você me prometeu. Então, por favor, cumpra com sua
palavra.
Ele fecha os olhos por um instante. Quando volta a me encarar, tenho a
plena certeza de que o fim não é uma opção quando se trata de nós. No
fundo do esverdeado de suas pupilas ele também sabe disso, sabe que
mesmo que deseje, nunca poderia afastá-lo, nunca poderia deixar isso, nós,
ser destruído.
Mas, o problema é que confiar no nosso coração pode ser a coisa mais
arriscada de todas.
— Escute-me, Sum — sua voz sai baixa, cheia de sentimentos
reprimidos. — Você é minha. Não há um dia nesses oito anos que não tenha
sido e mesmo que inconsciente, eu também pertenci a você — Seu rosto se
aproxima do meu, seus olhos travam uma luta contra os meus. — Mas, se
você precisa de um motivo, um pedido, qualquer coisa para entender isso,
eu farei.
— Como o quê?
Oliver sorri.
— Seja minha, loirinha. — Sua voz é apenas uma carícia apaixonada. —
Não por acordo, não por uma mentira e muito menos por um segredo.
Apenas seja minha por completo, não por metades. Seja minha como eu sou
completamente seu.
Fico sem reação por alguns segundos. Não há como, em absoluto, que
Oliver esteja falando a verdade.
— Sua?
— Eu não me importo com meu pai — pontua, sem nunca desviar o
olhar. — Eu não me importo com nada. Eu apenas quero você, Summer. Te
quero como nunca quis algo, te quero desde que coloquei meus olhos em
você naquela lanchonete. Eu quero você, Summer Miller, porque está
completamente em mim.
Um sorriso cruza meus lábios.
— Sem acordos? — pergunto, baixinho.
— Sem nada, amor — ele sorri. — Apenas eu e você. Eu e você
aproveitando cada dia até que você perceba que eu não sou tão perfeito
como imagina.
E nós aproveitamos.
Aproveitamos cada segundo da próxima semana.
Oliver me ensinou a tocar piano. Eu o ensinei a ordem de ler as minhas
HQ’s.
Mostrei a ele como é se sentir em casa e ele me mostrou como é ser a
casa de alguém.
Porém, mesmo vivendo cada um desses momentos, ainda assim, algo
dentro de mim me dizia que o fim estava chegando.

— Você está me assustando!


A voz de Levi irrompe a sala do nosso apartamento.
Olho para cima, para onde ele está em pé, com as mãos no bolso da
frente de sua calça de moletom. A pele escura está tampada por uma camisa
com o brasão da SVU, o seu traje favorito para passar um final de semana.
— E você está em casa… — franzo o cenho. — Em um sábado à noite.
Levi caminha até mim, lançando-me um sorriso torto.
— Segundo meu treinador, eu devo me abster de festas universitárias
por um tempo ou ele vai chutar a minha bunda para a equipe reserva —
dispara, se sentando ao meu lado. — E você, qual a sua desculpa para estar
em casa?
Aponto o queixo para a televisão que tem o primeiro filme dos
Vingadores pausado e, logo após, para o balde de pipoca ao meu lado.
— Descanso.
Ele maneia a cabeça.
— Quer companhia? — pergunta, inseguro.
Meu rosto se vira em sua direção, encontrando seus olhos escuros
focados em meu rosto. Um sentimento fraterno inundando meu peito.
Há algo que sempre senti por ele, mas que agora percebo que é mútuo.
— Sempre.
Levi descansa o braço no sofá e estica as pernas, jogando-a em cima da
mesa de centro, para enfim, roubar o meu balde de pipoca e atacá-lo como
se fosse a sua comida favorita.
— Você não enjoa? — pergunta, de repente.
— Você enjoa de nadar? — devolvo, pegando um punhado de pipoca e
levando a minha boca.
— Jamais.
— Aí está a sua resposta. — Sorrio.
Uma risada ressoa na sala. O som me faz perceber o quanto senti
saudades dela. De saber que é direcionada a mim, assim como quando
éramos uma unidade e funcionávamos de uma forma invejável. Levi e eu
éramos uma equipe, protegendo um ao outro, segurando nossos problemas e
nos apoiando com destreza.
Meu amigo sempre me segurou quando eu não achava necessário.
Sempre me fez companhia até mesmo em momentos como esse. Agora,
entendo que, talvez, eu tenha sido injusta conosco.
Tenha tomado a decisão egoísta achando que não o machucaria. Porém,
na realidade, acabou machucando ambos.
— Acho que precisamos conversar.
Suas mãos estagnam no balde pipoca, no mesmo instante que seu rosto
se ergue em minha direção. Levi estuda meu rosto com afinco, procurando
por qualquer indício do que quero ou do que estar por vir.
— Ok? — sua resposta sai de seus lábios em um tom confuso.
Tento lançar um sorriso em sua direção, porém, a ação gera apenas uma
careta que o faz franzir o cenho.
— Eu não sei por onde começar, Levi — solto. — Apenas sei que
preciso pedir desculpas. Eu não deveria ter te afastado após aquela festa,
não deveria ter escondido os meus verdadeiros sentimentos por ser covarde
e não querer machucá-lo. — Meus ombros murcham enquanto me encosto
no sofá. — Mas... ao mesmo tempo que tenho certeza de que fui uma amiga
de merda, sei que se não tivesse feito tudo o que fiz, isso poderia ter tomado
proporções que não saberíamos lidar depois. Nós teríamos destruído isso
que somos.
Levi imita a minha posição escorando sua nuca no sofá e olhando para
cima, para o teto branco.
— No começo, eu senti raiva, decepção e até mesmo... me senti como se
tivesse sido traído — conta, cabisbaixo. — Você era a minha melhor amiga.
Sempre confiamos um no outro e, de repente, eu estava sendo o último a
saber que se apaixonou por um idiota com um ego maior que o Empire
States[27] — Solto uma risada fraca, por conta da comparação. — Mas,
depois… Depois que todo esse sentimento se foi e comecei a perceber as
coisas, a observar você e Oliver, em como eram uma unidade juntos.
Percebi que não desejava aquilo, não desejava ter um relacionamento
amoroso com você. Eu queria apenas ter alguém que estivesse lá por mim,
que visse meus campeonatos, que vibrasse quando quebrasse meus recordes
ou quando sou o melhor na minha classe de debate. Eu não sei, Sum... eu só
queria o que Dylan e Logan encontraram e por um instante, achei que você
poderia me proporcionar isso.
Voltando o olhar para o rosto dele, o encontro me encarando. Seu rosto é
um quadro inundado de emoções. Consigo ver que por baixo de tudo isso,
meu amigo ainda continua ali. Seu olhar já não é mais machucado, assim
como seu sorriso não é mais falso.
Ele é apenas o Levi, apenas o garoto que me apresentou o Saint Vincent
College no meu primeiro dia de aula. Apenas o amigo que se senta e assiste
aos meus filmes favoritos ao meu lado.
Ele é apenas o meu melhor amigo outra vez.
— O que te fez mudar de ideia?
— A forma como você olhou para Oliver, depois que voltou do seu
primeiro encontro.
— Como eu o olhei? — Meu cenho se franze.
— Como se existisse apenas ele no mundo, como se Oliver fosse um
pedido realizado daquelas estrelas cadentes que você amava quando éramos
adolescentes, Sum. E, Oliver, ele te encara da mesma forma. — Sua mão
encontra a minha, entrelaçando-as. — Ele não precisa dizer, mas está
explícito em todas as vezes que está te observando, nas vezes que compra
sua bebida favorita, lê aqueles romances que gosta e, por Deus, até mesmo
no fato de que ele comprou um cinema para que pudessem ter um encontro.
Uma risada salta dos meus lábios, no mesmo instante que viro meu
corpo em sua direção, então, com um impulso, jogo meus braços sobre seus
ombros o abraçando.
O abraço com tanta saudade que, assim que fecho meus olhos, me
lembro do que muitas pessoas dizem sobre esse ato.
Dizem que quando abraçamos alguém de olhos fechados, significa que a
pessoa é especial, que nos sentimos seguros e confortáveis o suficiente para
fecharmos os nossos olhos e esquecermos o mundo à nossa volta. Pois
estamos concentrados na sensação que o abraço trás, em como o sentimento
de estar em casa envolve nossa alma.
Eu me sinto assim com Levi Johnson, eu me sinto em casa.
Em família.
— Quando disse que desejava que encontrasse alguém que te ame na
mesma proporção, Levi, estava sendo sincera — confesso, apertando sua
mão. — Você merece. Merece viver o amor. Merece tudo isso que achava
que desejava comigo. E, você vai ter.
Seus olhos encontram o meu.
— Espero que sim, Sum.
É a verdade. Mesmo que Jonhson não acredite, ele vai ter tudo aquilo
que presenciou a sua vida toda. Ele vai viver o seu romance como o que
seus pais viveram, vai apresentar a sua namorada para sua irmã mais velha,
que mora em Londres, e vai mostrar a biblioteca escondida na mansão dos
avós dele, que mesmo que não conte a ninguém, é o seu lugar favorito.
Levi vai ter tudo. Não é apenas uma afirmação, é uma promessa. Pois, o
ajudarei a realizar isso, estarei ao seu lado como deveria ter sido desde o
início. Todavia, antes de seguirmos, há algo que ele deve saber, algo que
não posso esconder mais, nem mesmo que quisesse.
— Levi?
— Sim?
— Há outra coisa que você deve saber. — Mordo meu lábio, insegura.
Uma linha aparece entre suas sobrancelhas.
— Em uma escala de zero a dez, qual a chance de isso ser uma merda
grande? — questiona, olhando nos meus olhos. — Tipo, eu te amo e
seguirei o código da amizade de te ajudar a enterrar um corpo se precisar,
mas sempre que um de vocês fala isso... É porque, definitivamente, há uma
merda por trás.
Quase solto uma gargalhada, porém o nervosismo me impede.
— Talvez... oito? — questiono, encolhendo os ombros.
Ele inclina a cabeça para o lado, coçando a barba por fazer e assente de
leve.
— Diga de uma vez, Sum.
Engulo em seco, tomando coragem de lhe dizer o que está por vir,
sabendo que quanto mais ignorar, mais mentirosa estou me tornando.
Por isso, apenas tomo uma respiração profunda e solto:
— Meu relacionamento com Oliver era falso.
Levi me encara, sério, seus olhos se semicerram e apenas maneia a
cabeça, pensativo. Posso escutar o tic tac do relógio, os carros na rua e até
mesmo o barulho dos nossos vizinhos, porém, não escuto nada vindo dele.
Apenas silêncio e um olhar que não consigo compreender.
— Deixe-me ver se entendi — responde, por fim. — Você entrou em um
relacionamento, como naqueles livros que ama, apenas para não me dizer
que não sentia o mesmo por mim?
Faço menção de respondê-lo, porém não emito nenhum som. Apenas o
encaro.
— Achei que fosse a única opção — me defendo, incerta, depois de um
tempo de silêncio.
— Chutar a minha bunda e dizer um belo não na minha cara, já seria o
suficiente, Sum — Levi me lança um sorrisinho prepotente. — Juro, eu
adoro todo esse drama, mas, acho que você foi longe demais para me
afastar.
Eu o olhei como se fosse louco e inclinei minha cabeça, ofendida.
— Eu não queria machucá-lo, Levi. Eu não poderia fazer isso, não
depois que se declarou para mim em uma festa, na frente dos nossos
amigos. E ainda disse a Logan e Josh que não desistiria — pontuo,
levantando uma sobrancelha. — Então, não acho que apenas um não te
pararia, Levi.
— Um homem com orgulho ferido fala algumas coisas sem sentido, às
vezes — afirma, como se fosse o suficiente. — Mas, entendo seu ponto. E,
céus, eu usarei isso em qualquer oportunidade de provocar Oliver.
Ele gargalha e eu faço o mesmo, pendendo minha cabeça para trás.
— Você é um idiota.
— É bom saber que voltamos à mesma página, Sum — brinca, me
puxando para um novo abraço.
Solto outra risada, apertando-o contra mim e pousando meu queixo em
seu ombro.
— Você está bravo comigo? — sussurro.
Sua mão sobe até meu cabelo, o afagando com delicadeza.
— Estou confuso? Sim. — Sua voz é baixa. — Mas, jamais poderia
ficar bravo com você, quando entendo suas razões. Nós já perdemos tempo
demais nisso, Summer. Não quero ficar dando voltas e voltas, para no fim
descobrirmos que somos dois teimosos idiotas. Eu quero a nossa amizade,
nossa cumplicidade e momentos como este de volta. Eu quero ser aquilo
sempre fomos, sem essa complicação de sentimentos.
Uma risada rompe meus lábios.
— Eu gosto disso. — Sorrio.
— Eu sei — afirma. — Todos nós sabemos que você não aguentaria
mais ficar sem o seu único melhor amigo, que maratona esses filmes chatos
e finge gostar deles.
— Não deixe Logan ou Josh ouvirem isso — aconselho, voltando ao
meu lugar e pegando o balde de pipoca.
— Eles sabem que é a verdade.
Ele faz o mesmo, se sentando ao meu lado e puxando a coberta fina.
Solto uma gargalhada leve, daquelas que sabemos que cada som emitido
é um indício que a nossa companhia nos faz bem, nos faz feliz.
— E, Levi?
— Sim?
— Eu amo você.
Seu rosto se ergue em minha direção e os cantos da sua boca se
transformam em um sorriso lindo. Daqueles que sempre estava estampado
em seus lábios antes de toda essa confusão.
Pois Levi Johnson é isso, ele é a alegria do nosso grupo. É o homem que
enfrenta batalhas pelas pessoas que ama e que, mesmo que não conte a
ninguém, reprime seus sentimentos, suas frustrações. Porque para ele,
orgulhar seus pais e devolver tudo o que lhe deram depois da morte precoce
de seu irmão caçula, há anos atrás, sempre será o seu principal objetivo.
— Eu também te amo, Sum.
Te disse que estaria aqui para sempre
Disse que sempre seria sua amiga
Fiz um juramento, eu vou cumprir até o fim
Agora que está chovendo mais do que nunca
Saiba que ainda teremos um ao outro
Umbrella | Rihanna feat JAY-Z

— Qual a chance de sairmos daqui sem que todos percebam?


Sussurro no ouvido de Summer, a obrigando a se inclinar para o meu
lado e abandonar a conversa com as garotas, na mesa que estamos sentados
no Oásis.
Havia sido ideia de Josh uma noite entre amigos antes que todos nós
precisássemos nos transformar nos filhos perfeitos, dos aristocratas da Parte
Alta. Ninguém se opôs, não quando sabíamos que precisaríamos enfrentar
todo aquele glamour, pessoas desonestas e o requinte, que é apenas uma
forma de mascarar quem realmente habita esse lado de Saint Vincent.
— Quase nenhuma — murmura, soltando uma risada nasal.
— Mas, não é impossível — Lanço-lhe uma piscadela.
De relance, observo Logan se escorar contra sua cadeira, encarando Josh
que mostra a ele seu novo projeto de arquitetura. O capitão da SVU
entrelaça sua mão sobre a mesa com a de Verônica, que leva um donut
colorido até os lábios e o morde, encarando Ed que conversa animadamente
com ela.
Do outro lado da mesa, Analu mantém seu rosto virado para Levi, que
sorri abertamente para a loira, a fim de provocá-la. O que já não é mais
surpreendente. Não quando sabemos que isso continuará até o fim do
semestre, quando o resultado do tão esperado estágio sairá.
Porém, de todos eles, é Hazel que me chama atenção, a morena mexe
em seu milk-shake com cuidado, sem nunca olhar para o conteúdo. Apenas
rodeia o canudo pelo copo e encara a paisagem pela janela, como se seu
pensamento a consumisse a ponto de não perceber que está distraída.
Além de mim, percebo que Dylan também a encara com um cenho
franzido e um olhar preocupado, percebendo que aquela aura alegre e
delicada que sempre a acompanha, está longe, quase que imperceptível.
— Haz? — chamo. — Você está bem?
Ela levanta o rosto, balançando de forma suave a cabeça e fixando seu
olhar escuro no meu.
— Claro, Ollie. — Um sorriso falso cruza seus lábios. — Eu estou só
cansada com a faculdade.
Maneio a cabeça, desconfiado. Ao mesmo tempo que os olhos de
Verônica se cruzam com os meus. Ela também sente que algo está errado.
Minha melhor amiga desvia o olhar para encarar Hazel e assim que os olhos
castanhos de Vee encontram com os dela, poderia dizer que, não há dúvidas,
de que se encaram como se pudessem fazer qualquer coisa uma pela outra.
Entretanto, há algo. Algo que irradia dos olhos de Hazel que nos indica
que não nos permitirá ajudá-la, mesmo que tudo dentro de nós implore por
isso.
— Certo, mas eu e você estamos terminando aquela temporada de
Grey’s Anatomy[28]. — Dou um sorriso largo, tentando animá-la. — Eu
preciso saber como Mark e Lexie irão terminar!
De repente, sua risada inunda o ambiente. É calma, singela e aquece
corações. Por um instante, a sensação de saber que a fiz sorrir quando
claramente não estava bem, me faz ficar feliz.
— Você não está roubando minha amiga, Ollie — Vee retruca.
Ergo uma sobrancelha.
— Hazel me ama mais do que a você, Pequena Blackwell. — Me
inclino para frente, roubando uma batata de Logan.
— Ei! — Underwood me lança um olhar feio.
— Summer? — Verônica chama.
Sum leva o frappuccino aos lábios e encara Vee sob os cílios, no mesmo
momento em que passo meu braço por cima de seu ombro e o escoro contra
sua cadeira, entrelaçando sua mão na minha fazendo pequenos círculos em
sua palma.
A sensação de estar fazendo isso porque queremos e não porque estamos
fingindo, incendeia tudo dentro de mim.
É real. Porra.
Eu e Summer somos reais.
— Não. — Sum lança uma careta a Vee. — Eu não estou me colocando
no meio de vocês.
— Traidora. — Ela se vira para Dylan. — Me ajude.
Dylan me encara, balançando a cabeça para não soltar um sorriso e fazer
com que Vee o insulte.
— Não, nem olhe para mim. — Ele desvia o olhar, puxando Hazel para
si. — Ela não está indo ver séries com Oliver e tampouco saindo com você,
Vee. Porque eu e minha namorada estamos indo viajar depois do baile.
Verônica o encara com uma careta engraçada.
— Você é um péssimo irmão.
— Ed não acha isso. — Um sorriso presunçoso estampa os lábios de
Dylan.
— Não me coloque no meio disso — o caçula murmura, zangado. —
Não mesmo!
Solto uma gargalhada, amando essa atmosfera.
As nossas tardes no Oásis, a dinâmica tranquila de volta. Amo que
podemos nos sentar sem que Levi ignore Summer, sem que Verônica brigue
com Logan e sem que sentíssemos a rachadura em nosso grupo.
Eu amo isso pra caralho.
— Vocês sabiam que o relacionamento de Summer e Oliver era falso?
— a voz engraçada de Levi faz com que todos nós o encaremos.
Silêncio.
Todos nos observam como se dissessem que sabiam que este momento
chegaria.
— Deus, Johnson! Você nunca sabe quando calar a boca — Analu
balbucia, revirando os olhos.
Verônica, solta uma respiração rasa e fixa suas íris em nós dois.
— Sim — ela diz, após bebericar sua bebida. — E ainda estou decidindo
se quero socá-los por terem mentido ou rir da situação.
— Realmente era falso? — Hazel, questiona.
Meu Deus!
— Não é bem o que está pensando, Haz — Summer murmura.
A loira ao meu lado engole em seco. Porém, meu olhar se encontra com
o de Verônica que também me encara. Mesmo que esteja puta, ela não
contou a eles. Não. Vee manteve o meu segredo como pedi, mais uma vez
segurou o meu mundo, mesmo que eu tenha certeza de que compartilhou
com Logan.
Pois o capitão apenas dá de ombros e volta a comer a sua batata frita,
me indicando que não deseja se intrometer nesse drama.
— Oh! É exatamente o que estou pensando — Hazel devolve, desviando
o seu olhar para Vee e Analu. — Eu não vou pagar duzentos dólares para
vocês duas.
Ergo uma sobrancelha no mesmo instante que Summer se engasga com
sua bebida.
— Vocês não fizeram isso — Sum acusa.
— O quê? — Vee, batuca as unhas na mesa, no mesmo instante que um
sorriso nasce nos cantos de sua boca. — Apostar?
— Sim!
— Não seria nada novo nesse grupo já que fizeram o mesmo comigo e
Logan. — Os olhos Verônica param onde Josh e Levi estão. — E, por favor,
culpe Josh. Foi ele quem começou com isso.
— Josh! — exclamo.
— O quê? — Seu cenho se franze. — Eu não tenho culpa se vocês dão
um bom entretenimento para este grupo.
Meus ouvidos absorvem suas palavras e quando entendo o que quis
dizer com isso, lanço aos meus amigos uma careta nada amigável.
— Entretenimento? — Umedeço meus lábios. — Alguém pode, por
favor, me colocar a par dessa aposta?
— Ah, vamos lá! — Josh revira os olhos se encostando na sua cadeira.
— Vocês são péssimos em esconder o que sentem um pelo outro. Então, só
juntei o útil ao agradável.
— O seu juntar o útil ao agradável é apostar o relacionamento dos seus
amigos, Brown? — Summer pergunta, ofendida.
Ele solta uma gargalhada, levando seu copo à boca.
— Em minha defesa, eu apostei quanto tempo vocês demorariam para
perceber o quanto se gostavam — conta, dando de ombros. — A ideia de
acrescentar que tinham um relacionamento falso foi de Parker.
Céus.
Summer leva seus olhos para a loira do outro lado da mesa.
— Não me culpe, culpe seu namorado que me deu todas as respostas de
que precisava. — Analu me encara com um sorriso presunçoso no rosto. —
Apenas peguei os detalhes, fiz as perguntas certas e bum... ganhei uma
aposta.
— Isso não é um maldito caso do seu curso, Parker! — Levi exclama,
pegando um anel de cebola. — Mas, não me surpreendo que esteja jogando
sujo.
Parker pende a cabeça para trás, soltando uma gargalhada fria.
— Isso é porque você está perdendo a competição do estágio, querido?
— Eu nunca perco — Levi afirma, convicto.
— Não é o que parece.
— Mas, é o que é, princesa — Ele desdenha, finalmente comendo o
aperitivo. — Será delicioso vê-la lamber os pés dos filhos dos McLaughlin
para conseguir uma vaga na recepção, enquanto estarei entre os Associados
Juniors.
Analu levanta a mão, estudando suas unhas compridas e pintadas de
vermelho, o ignorando por alguns segundos e, então, quando achamos que
não o responderá, ela sorri, diabólica.
— Pelo menos eu não ganharei a vaga por ser a filha mimada do tão
aclamado Juiz Johnson. — Os olhos de Levi se incendeiam em fúria. —
Mas me diga, Levi, qual a sensação de nunca ganhar por mérito próprio,
mas sim, por nepotismo?
Levi passa a língua pelo lábio inferior, inclinando a cabeça e, então, lhe
lança um sorriso perverso.
— Não sei. Me diga você — veneno goteja em suas sílabas. — Qual a
sensação de sempre ser a segunda opção?
O silêncio se instala sobre a mesa.
Analu estagna o copo que estava levantando. E, Verônica, outra vez, me
encara. Nós dois sabemos o que essa frase pode significar para Parker.
Sabemos exatamente como ela odeia a sensação de ser uma segunda opção.
Ela viveu isso desde a sua infância. Analu sempre se considerou
insuficiente e, por esse motivo, sempre preferiu machucar antes de ser
machucada.
E, Levi Johnson, acabou de atacá-la onde não devia.
Porque ter a aversão de Analu Parker sempre será melhor do que ter seu
ódio.

— Você sabe que eles vão notar a nossa falta, certo?


Summer questiona, segurando minha mão e correndo até o
estacionamento do Oásis ao meu lado, após nossos amigos decidirem que
ficariam para o show de bandas amadoras e nos suplicarem para ficar
também.
Claramente, não estávamos ficando para ver universitários bêbados,
fingindo que sabem cantar. Não, quando posso estar em outros lugares ao
lado de Summer. Como no nosso cinema.
— Nós mandamos uma mensagem no grupo depois — digo, abrindo a
porta do meu carro para que possa entrar. — Eles vão estar bêbados em
poucos minutos.
Ela solta uma risada, se abaixando para sentar-se no banco. Assim que
dou volta no automóvel e ocupo o banco do motorista, Summer se inclina
colocando a melodia suave de uma música para ressoar, enquanto dirijo
pelas ruas da cidade.
Há um silêncio confortável. Sum se encosta no seu banco e a mão
descansa em sua coxa, coberta pela saia preta. Sem hesitar, levo uma das
minhas mãos até a sua e entrelaço nossos dedos, sem nunca desviar o olhar
da estrada.
É um gesto simples, mas que traz um formigamento gostoso em meu
corpo. Pelo mero contato, tudo faz sentido. Poderíamos ficar horas assim,
apenas absorvendo o calor da palma da mão um do outro. Aproveitando a
companhia e absorvendo os instantes dessa proximidade.
Nós ficamos em silêncio por um bom tempo, até Summer perceber que
não estou seguindo pelo caminho convencional do seu apartamento, mas
sim, para o bairro comercial da cidade.
Onde está localizado o nosso destino final.
— Por que estamos indo para o cinema?
Encaro-a de relance.
— Porque temos o nosso encontro semanal.
— Você ainda não esqueceu isso? — Uma risada salta de seus lábios.
— Nunca me esqueceria da melhor parte da minha semana, linda.
Summer balança a cabeça, voltando a se encostar em seu banco. Porém,
sua mão ainda continua na minha. Mesmo quando a movo, Sum não a puxa
de volta. Embora não diga em voz alta, eu adoro isso. Adoro a forma como
conseguimos ser tão bons juntos.
Assim que estaciono e saímos do carro, nós seguimos para dentro do
estabelecimento, percebendo que não há tanto movimento como aquele dia,
fazendo com que fique aliviado por isso.
Paramos em frente ao balcão, perto da gerente que me encara com o
cenho franzido, enquanto os outros que estão perto dela me soltam um
sorriso fraco, hesitante.
— Alguma chance de termos uma sala vazia, Joanne? — pergunto,
soltando um sorriso largo.
A mulher de cabelos cacheados, me lança um olhar afiado que me faz
querer sorrir.
Joanne foi a primeira pessoa com quem simpatizei ao comprar o cinema.
Ela não me bajulou quando soube que adquiri o lugar ou tentou uma
promoção. Ao contrário, apenas deu de ombros e voltou a trabalhar como se
não se importasse. Por isso e por saber que era a funcionária mais antiga,
não pensei duas vezes em torná-la gerente do espaço.
— Estamos fechando, Wright!
Solto uma gargalhada fraca.
— Nós trancamos tudo quando sairmos.
Ela ergue uma sobrancelha, me entregando uma chave reserva que o
antigo proprietário havia deixado para casos como esses. Então aponta a
cabeça para a entrada da sala A.
— Você estraga alguma coisa do meu cinema e eu chuto sua bunda. —
Ela sorri friamente. — Estamos estendidos?
— Sem sombras de dúvidas. — Pisco.
— Ótimo.
— Qual filme vocês querem assistir? — Outra funcionária pergunta. —
Posso deixar tudo arrumado antes de sair.
Não preciso me virar para Summer para saber que seus olhos estão
brilhando em antecipação.
— Algo da Marvel — digo, olhando para a funcionária.
— O lançamento?
— Nós já assistimos — Summer responde por mim, sorrindo. — Que tal
Vingadores?
— Qual deles?
— Todos — respondo, e até mesmo me surpreendo. — Pode deixar
todos prontos.
A garota maneia a cabeça, concordando. Logo após some pelos
corredores e volta apenas dez minutos depois. Me explicando como devo
desligar tudo e me instruindo a sair pela porta lateral, que é onde a chave
que Joanne me entregou pertence.
Quando, enfim, estamos sozinhos. Nós apagamos todas as luzes da
entrada e seguimos na sala vazia, onde o primeiro filme já está começando.
Summer, como sempre, não se importou com nada a não ser os
personagens vestidos em fantasias estranhas, que eu jamais teria coragem
de usar. Entretanto, não posso negar que os filmes realmente são
interessantes, tanto que me pego entretido em vários momentos.
Torcendo para que o Capitão-América dê um soco no Homem de Ferro.
Estamos tão concentrados que não percebemos a hora passar. Nós
assistimos aos filmes e nada mais importa. E, quando uma nova versão do
Homem-Aranha aparece na tela, ao lado de Homem de Ferro, soube que
definitivamente Summer havia me estragado. Pois, neste instante percebo
que gosto desses filmes tanto quanto gosto da companhia da loira.
— Por que você comprou esse lugar? — A pergunta de Summer ressoa
de repente no ambiente. — Você não precisa dele. Bastava apenas ter
fechado uma sala para aquele encontro. Não era necessário comprá-lo.
Balanço a cabeça lentamente, refletindo em qual resposta devo dar a ela.
Porém, a verdade basta.
— Porque uma pessoa me contou que era o seu lugar favorito.
Ela me olha, um pouco chateada.
— E você queria possuí-lo? — Há incômodo em seu tom.
Franzo o cenho, lançando-lhe um olhar cético.
— Não. Eu queria dá-lo de presente a você.
Seus olhos castanhos se arregalam e seus lábios se entreabrem, ao
mesmo tempo que se vira totalmente para me encarar, ficando de lado em
sua poltrona.
Porra! Até mesmo descrente, Summer é perfeita.
— Você não está falando sério.
Solto uma risada, tombando minha cabeça para o lado.
— Tão sério quanto o seu amor por esses filmes horríveis, linda.
— Deus, você é louco! — exclama.
Abro a boca para responder, contudo, não tenho tempo. Summer se joga
em meu colo, soltando uma gargalhada tão única que faz meu coração
acelerar e minhas mãos circulem sua cintura, mantendo-a em meu colo.
Seu rosto está pouco iluminado, porém, ainda posso observar cada
detalhe. Cada centímetro que me fez cair por ela e me manteve em uma teia
sem saída.
Posso observar os olhos que possuem a tonalidade da minha cor
favorita, o sorriso lindo e brilhante que me causa borboletas no estômago.
Posso observá-la e me apaixonar ainda mais.
— Por você, linda. Eu sou louco por você.
O seu sorriso se amplia, fazendo com que seus olhos sejam obrigados a
se semicerrar.
Não penso duas vezes, apenas me aproximo e a beijo.
Eu a beijo como se o mundo lá fora não estivesse prestes a colapsar.
Como se esse fosse o nosso último beijo.
Nosso último encontro.
Nos beijamos com tanto fervor que não me surpreendo quando Summer
passa suas pernas por cima das minhas coxas, apoiando-as de cada lado da
minha poltrona e encosta seu peito ao meu, segurando minha nuca e me
puxando para si, aprofundando o momento. Sua língua quente, de textura
aveludada, se choca com a minha.
Criamos uma dança elaborada, uma sintonia.
Nosso beijo para ela é como um elixir. Um antídoto.
Contudo, para mim poderia até mesmo ser considerado veneno.
Veneno mortal e irremediável.
Daqueles que eu não me importaria de morrer. Contanto que minha
última lembrança seja dela, em meus braços. Me tocando como se eu fosse
aquilo que mais deseja no universo.
Uma das minhas mãos sobem até a parte de trás de seu pescoço o
segurando e com a outra, aperto sua cintura. Movendo-a sobre meu pau
semi ereto, fazendo-a cavalgar em meu colo, friccionando nossas
intimidades ainda cobertas pelo tecido.
— Linda... — murmuro, entre beijos. — Se não pararmos, agora. Eu
vou te comer aqui. Nesta sala. No seu lugar imaculado.
Summer se afasta um pouco, passando a língua pelo lábio inferior.
— Eu não espero menos que isso, playboyzinho.
Nossos lábios se roçam levemente, enquanto ela solta uma lufada de ar
que atinge minha bochecha.
— Jesus! Você vai me matar um dia — murmuro contra seus lábios.
Ela solta uma risada e então, volta a me beijar.
Dessa vez, não há nada delicado em nosso beijo. É totalmente duro.
Animalesco. Explosivo.
Enrolo minha mão em sua nuca, a mantendo cativa, enquanto tomo seu
fôlego. Da mesma forma que ela agarra a minha camisa, juntando o tecido
de algodão branco e me puxa para mais perto, até que estejamos tão juntos
um do outro que não há mais certeza de onde eu começo e ela termina.
O filme ainda continua sendo exibido na tela. As vozes dos personagens
ecoando no ambiente. Mas, é como se fosse apenas um sussurro perto do
barulho que fazemos. De como nos fundimos em um. De como
mergulhamos um no outro, a fim de procurar algo que nem sabíamos que
precisávamos.
Um pequeno gemido escapa dos lábios de Summer quando movo seus
quadris, o suficiente para que se esfregue em minha dureza.
— Eu vou arrastar sua calcinha para o lado e eu vou te foder com meus
dedos. Então... — Dou um beijo em seu pescoço ao mesmo tempo que ela
tomba a cabeça para trás. — Eu vou te comer. Eu vou te mostrar que sua
boceta foi feita para mim, linda. Cada parte de você foi feita para mim.
Meu pau endurece ainda mais com a imagem de suas pupilas dilatadas
pelo desejo e seus lábios entreabertos. Summer, impaciente como sempre,
segura a borda da minha camisa, jogando-a para o banco ao nosso lado e
dedilha todo o meu abdômen. Tirando seu tempo para estudar minha pele.
A cada vez que sua unha me arranha, um arrepio corre pelas minhas
veias, terminando diretamente em meu pau. Sem esperar pelo fim de sua
análise, puxo sua camiseta vermelha sobre sua cabeça, observando seu sutiã
branco. Não perco tempo em me abaixar, distribuindo leves beijos pelo seu
pescoço, clavícula e tomando um tempo maior no topo de seu seio.
O canto da boca de Sum se inclina com sua exasperação. Puxo seu sutiã
para baixo, expondo o mamilo eriçado, ao mesmo tempo que desço
lentamente meus dedos, até encontrar o tecido molhado de sua calcinha.
— Sempre tão pronta para mim, loirinha — sussurro, circulando seu
clitóris por cima do tecido.
— Ollie... por favor — sua súplica queima todo o meu corpo.
Sorrindo, arrasto sua calcinha para o lado, empurrando um dedo dentro
dela, enquanto mantenho meu polegar em seu clitóris. O gemido de
Summer é o impulso que preciso para aumentar o movimento, sentindo-a
arquear em minha mão, montando-me.
Beijo o caminho entre seu pescoço e seus seios. Não hesitando em tomá-
los em minha boca. Seus gemidos acompanhados de pequenos gritos,
aumentam quando acrescento outro dedo e chupo, lambo e mordisco seu
peito. O movimento de vai e vem a obriga se arquear ainda mais, me dando
mais de seu corpo, me deixando fodê-la como merece, como se fosse a
minha salvação.
— Deus... Oliver... — O suspiro suave de Summer me faz sorrir contra
seu seio. — Eu preciso de você dentro de mim, Ollie. Por favor. Eu quero
gozar quando você estiver dentro de mim.
— Você está me matando, Sum.
Deus. Ela é perfeita. Incrível.
Levanto-a, pegando minha carteira e retirando um preservativo e
rolando-o sobre meu pau. Encaixando-a novamente sobre mim,
empurrando-me dentro dela, centímetro por centímetro, até preenchê-la por
completo.
Summer parece bem pra caralho em volta do meu pau. Apertada,
molhada, com os cabelos grudando em sua testa. Feita para mim, porra!
Seguro sua cintura, ajudando-a a se mover e então, Summer começa a
tomar seu próprio ritmo. Montando em mim com destreza, fazendo com que
seus gemidos se misturem aos meus.
Minha respiração fica mais acelerada, sentindo-a ir mais rápido. Seus
seios batem contra meu rosto e sua boceta contrai meu pau. Obrigando-me a
apertar sua cintura com força, tendo a certeza de que ficará marcada
amanhã.
— Isso, linda. Bem desse jeito — praticamente rosno quando seu ritmo
aumenta, me obrigando a levantar minha mão e desferir um tapa estalado
em sua bunda que ecoa pela sala de cinema. — Não se segure. Eu quero
ouvir você gritar, amor.
Outro tapa em sua nádega e sinto Summer arquejar em alto e bom som,
a cabeça erguida para cima e os olhos fechados.
Uma fodida deusa.
Um gemido alto salta de seus lábios, ao mesmo tempo que contemplo a
maneira como me encaixo perfeitamente em seu centro.
Cada impulso arranca um pedaço de mim e da minha alma.
Summer toma tudo para si e eu concedo com prazer, desferindo uma
série de tapas em sua bunda quando ela rebola, acompanhando minhas
remetidas.
Porra, ela sobe e desce em meu pau, me obrigando a pender minha
cabeça para trás, amaldiçoando todos as divindades por terem criado
Summer Miller tão perfeitamente.
— Oliver! — grita, completamente desfeita.
Summer é tão linda que não consigo desviar o olhar nem mesmo se
minha vida dependesse disso.
— Isso, amor — Esfrego meu polegar em seu clitóris, ao mesmo tempo
que minha mão sobe até seu pescoço se fechando e puxando seu rosto para
mais perto. — Adoro ouvir você gritar por mim.
Sua boceta se aperta em torno de mim, fazendo com que um orgasmo
ofuscante rasgue através dela com uma força inesperada. Afundo contra ela,
deleitando-me com a sensação de suas curvas e estocando mais algumas
vezes, mais forte, fazendo-a gritar ainda mais.
Summer pressiona o rosto contra meu ombro, mordendo-o, enquanto seu
corpo treme com a liberação silenciosa e o meu próprio ápice chega de
repente, me fazendo apertar sua cintura com força.
Espasmos tomam conta da minha garota que quase não mantém os olhos
abertos, apenas abraço seu corpo, desenhando pequenos círculos em suas
costas, esperando-a se recuperar do seu próprio prazer.
Sexo é ótimo, mas com Summer é espetacular!
Porém, essa parte… A parte onde após acabarmos ela procura pelo meu
abraço, pelo meu beijo na sua testa e o carinho oculto em nossas ações, é o
que me faz desejá-la ainda mais.
— Vamos limpá-la e ir para casa, amor — murmuro, deixando um beijo em
seu cabelo. — Vou fazer o seu macarrão favorito.
Eu sou apenas um homem, sou apenas carne e osso
Eu não posso refazer tudo que eu fiz
E agora não há mais ninguém para amar
Estou acostumado com a escuridão
Used To The Darkness | Des Rocs

Quando criança, sabia que minha mãe tinha uma pianista favorita.
Eu me lembro de cada vez que ela colocou uma de suas partituras sobre
o piano e reproduziu todas aquelas melodias com afinco. Como se perdeu
nelas, de uma forma que pudessem salvá-la.
Essa mesma pianista foi a responsável por ajudá-la cada vez que se
destruía naquela casa.
E, agora, enquanto me sento em seu piano, sozinho na penumbra da
noite, é como se pudesse escutá-la claramente. Sua voz suave invade meu
subconsciente, e me lembra de prometer coisas que nunca poderia realizar.
De como me mandou ser forte quando estava me abandonando, indo em
busca de uma nova vida. Um novo caminho.
Dedilho meus dedos sobre as teclas, sentindo aquela queimação subir
pela minha garganta, ao mesmo tempo que olho para o papel revestido em
sangue em cima do piano. Eu passei anos procurando por ele, passei dias
ignorando a sensação de que sabia onde estava, porém, hoje, horas antes do
baile, tive coragem de finalmente abrir o compartimento escondido no
piano e retirá-lo de lá, para ler as últimas palavras dela. Para tentar entender
o que aconteceu naquele dia, naquela noite que é um vão em minha
memória.
Solto uma lufada de ar, puxando o papel amarelado e relendo novamente
suas palavras. Sinto as dores dela e como são a estaca final. O que precisava
para fazer o mundo ruir sobre a cabeça dos Wright.
Fecho meus olhos lembrando do sorriso da única pessoa que sairá disso
tudo com o coração magoado e um ódio irreversível por mim. Penso em
tudo o que construímos, em como saímos de uma farsa para algo maior.
Algo que nunca serei capaz de mensurar.
Penso em como a destruirei, mesmo não desejando.
Sempre soube que nunca fomos feitos para durar. Contudo desejei que
fossemos. Desejei tudo o que estava disposta a me dar. E aproveitei do
nosso tempo emprestado. Agora sinto como se cada pedaço que havia
sobrado de mim, cada resquício da boa pessoa que tentei ser, está se
diluindo e sumindo junto ao som das teclas do piano.
É o fim.
Sabia que ele chegaria e que quando me alcançasse, seria o pior dia da
minha vida. Mas nunca imaginei que ele se tornaria o dia que eu evitaria
por semanas.
— Você está aqui — uma voz cansada me faz esquecer o piano e
empurrar todos esses pensamentos para outro lugar da minha mente. — Por
que você está aqui?
Olho por cima do meu ombro, soltando um sorriso falso. Observo a
matriarca da família Wright entrar no cômodo que todos nós evitamos.
Lucy Wright tem os cabelos grisalhos amarrados em um coque chique e
traja um conjunto Dior perfeitamente alinhado em seu corpo pequeno e
magro. Ela não possui brilho em seus olhos, que são idênticos ao da minha
mãe quando se despediu.
— Oi, vovó — cumprimento, arrastando meu dedo pela tecla novamente
e abandonando o papel na superfície do instrumento.
Ela caminha até mim, beija minha testa e ergue o rosto para a foto da
mulher pendurada em uma das paredes. Seu suspiro é quase inaudível, mas
ao mesmo tempo entendo o que se passa em sua mente. Ou no porquê dela
estar na cidade, quando todos nós sabemos o que acontecerá em duas
semanas.
— Há uma lacuna entre o seu pensamento e o seu coração, Oliver — ela
diz, caminhando lentamente até onde estou e se senta ao meu lado. — Eu
sinto. Há algo que eu deva saber?
Encaro-a de relance.
— Se você pudesse voltar no tempo e dizer algo a minha mãe, o que
diria? — pergunto sem rodeios.
Ela solta uma risada fraca, se inclinando e começando a tocar uma
música que não compreendo.
— Que ela poderia ter confiado em mim. — Seu rosto não emite
nenhum sentimento, apenas fecha os olhos e continua a tocar. — Sua mãe
não precisava passar pelo que ela passou. Ela não precisava se casar com
seu pai, não precisava fugir com um homem que não tinha onde cair morto
e, também, não precisava esconder de todos nós a verdade.
Suas palavras bastam para que tudo se rompa dentro de mim.
— Eu não caí... Naquela noite, eu não caí da escada — suspiro,
derrotado. — Eu sempre soube, mas é como se as lembranças estivessem
voltando gradualmente. No tempo certo.
— Eu sei, meu querido. Quando cheguei ao hospital e o médico nos
disse que a queda havia infligido uma amnésia dissociativa[29], e, por isso,
você não se lembrava de nada o que havia acontecido naquela noite, a não
ser que estava bebendo em um píer sozinho, soube que algo estava errado.
Brandon estava aliviado demais — Sorri fracamente, ainda focada nas
teclas.
— Eu não me lembro de tudo, vovó — solto o ar com força — Mas eu
me lembro da dor. Da agonia. Me lembro dos gritos. Das lágrimas de vocês.
— As lembranças te faltam, Oliver, mas a força não — sua resposta
balbuciada me faz encará-la, percebendo que abandonou o piano. — Eu não
preciso ler essa carta para saber que ela te manda ser forte. Então, Ollie, a
pergunta que eu desejo saber é: por que você ainda está parado aqui, quando
deveria estar em Nova York acabando com aquele maldito monstro?
Porque eu não estou pronto para machucar Summer.
Estou tentando não magoá-la e não destruir a confiança que depositou
em mim. O pensamento disso tudo e de me afastar, sem que ela saiba que a
amo, dói mais que qualquer cicatriz.
— Do que você tem medo, Oliver?
Ergo meu rosto, encarando-a como se estivesse encarando minha mãe.
— Eu tenho medo de terminar sozinho, vovó.
Ela sorri tristemente.
— Há alguém — Não é uma pergunta, mas o tom penoso em sua voz
destrói algo dentro de mim. — Meu caro menino de ouro, você sabe que
não pode se ter as duas coisas, não é? — Vovó inclina sua cabeça para o
lado e me encara de forma severa. — Você não pode ter o amor quando se
escolhe a vingança, Oliver. Tampouco, ter a vingança quando se escolhe o
amor.
A dor ultrapassa meu rosto.
— Eu perdi tudo por causa dele — sussurro. — Cada pedaço de mim.
Cada memória que compartilhei com minha mãe. Eu não posso desistir.
— Essa pessoa é mais importante do que esse sentimento? — minha avó
indaga. — Ela é mais importante que sua a vingança, Oliver?
Sim.
Mas nunca saberá disso. Summer nunca poderá saber que me têm de
corpo e alma. Nunca poderá saber que eu a amo, como nunca amei nada em
toda a minha vida. Sempre será a minha luz, a minha memória favorita.
O amor que desejo viver, contudo jamais poderei.
Não se pode ter vingança e amor no mesmo jogo.
Não se pode ganhar a batalha estando em trincheiras diferentes.
E, no meio dessa guerra, nós dois perdemos. Nós dois sairemos
quebrados.
Porém, eu sou o responsável por cravar a faca, por fazê-la desistir.
Eu ganharei essa guerra de corações, porém, perderei o meu no
caminho.
— Não, ela não é.

Eu sempre odiei bailes.


Sempre preferi me manter nos bastidores, enquanto meus pais lidavam
com essa parte de nossas vidas. Porém, esse é diferente.
Esse é o primeiro baile onde todos os meus amigos estarão juntos. Onde
verei Logan e Verônica dançarem a tão famosa valsa da família Blackwell,
sendo oficialmente um casal. Onde Analu poderá estar ao nosso lado e não
junto a pessoas que apenas a toleram, por conta de seus pais.
É diferente porque estaremos em família.
Todavia, mesmo que uma parte de mim se alegre por isso, a outra parte
me faz sentir diferente, faz uma sensação de que algo está vindo como uma
avalanche em cima de mim e não estou percebendo, e essa sensação se
instale em meu peito. É uma sensação que causa incômodo e faz com que
todos os cabelos da minha nuca se arrepiem.
— Você está linda — a voz suave de Oliver me faz erguer meu rosto do
espelho onde estou terminando de me arrumar na casa de Verônica. —
Perfeita.
Viro meu corpo em sua direção, arrastando o tecido pesado do vestido,
que Vee e Amber haviam confeccionado apenas para esse baile. Então,
observo Ollie caminhar a passos leves até mim, evitando encontrar os meus
olhos.
Meu cenho se franze em confusão. Oliver nunca evita um olhar, nunca
foge de algo, nunca esconde seus pensamentos.
Não de mim, não de nós.
Ele chega até onde estou em questão de segundos. Percebo que a cada
passo que dá é difícil, como o pensamento de estar perto de chegar até onde
estou, fosse demais para ele.
— O que está acontecendo?
Ele sorri. É falso. Tudo nesse momento parece falso.
— Eu queria vê-la antes do baile — sussurra, tirando uma pequena caixa
de seu smoking. — E queria te dar isso.
Assim que a abre, mostrando o conteúdo, meus olhos se arregalam e
minha mão vai parar em meus lábios.
Pisco na tentativa de entender o que está dentro da caixinha. O presente
nas mãos de Oliver, nada mais é do que um relógio cruciado em oito
pequenos diamantes, envoltos em ouro rosa. As pequenas pedras adornam o
acessório com uma delicadeza que nunca poderia compará-las a nada.
Tudo lapidado de uma forma única, especial.
É lindo.
Delicado.
Perfeito.
— Uau... isso é... eu nem tenho palavras para descrever, Ollie —
sussurro.
Ele dá mais um passo à frente. Colocando a caixinha em minhas mãos,
fechando-a em meus dedos. Observo o esverdeado de suas íris, a primeira
coisa que vi naquele píer no qual, agora, sou completamente apaixonada.
— Eu acho que não teria outra forma para agradecê-la — sua voz sai em
um fio de som.
Franzo o cenho
— Agradecer pelo quê?
— Por ter me dado todos os seus instantes, Summer. — A voz de Oliver
ecoa no quarto vazio, mas a angústia em cada tom é perceptível. — Um dia
lhe disse que tudo o que você acredita, pode mudar em um instante. Sempre
tenha isso em mente, linda.
Permaneço em silêncio, encarando-o. Não permitindo que o significado
velado em suas palavras me atinja. A aproximação basta para que, agora, eu
deseje tocá-lo.
Dou um passo em sua direção, arrastando meu vestido azul e parando a
sua frente, pronta para quebrar a quietude que se formou entre nós.
— Todos os meus instantes são seus, Ollie. — Não consigo evitar sorrir.
— Não acho que haveria outra pessoa no universo que os mereça, a não ser
você.
As mãos de Oliver pegam cada lado do meu rosto e o levanta, nivelando
nossos olhares. Criando uma bolha entre nós e o mundo. Seus lábios
convidativos capturam o meu foco e me fazem desejar um beijo. Por tudo o
que somos capazes de fazermos juntos.
— Não diga isso, linda — avisa, engolindo em seco.
— Quão longe você iria por isso? Por nós, Oliver?
— Muito longe.
— Mesmo sem o acordo?
— Não existe acordo, Summer — confessa, rouco. — Você é minha.
Sem regras ou farsas. Eu só preciso descobrir uma forma de mantê-la a par
disso, mesmo que um dia me odeie.
A expressão que adoto, exala luxúria. Oliver percebe isso. Sabe que não
sairemos daqui até que terminemos o que começamos, e que não me
importo que praticamente todos os convidados estejam no primeiro andar
da casa de Verônica.
Não me importo com nada, a não ser Oliver Wright.
Ele me puxa para si, dissipando o resto de distância entre nós e meu
rosto quase se choca com o dele. Seu hálito quente sopra contra meus lábios
e ele se inclina mais, fazendo meu torso ficar em um ângulo curvo, ao
mesmo tempo que pressiona ainda mais o seu corpo sobre o meu.
— No final desta noite, eu quero que se lembre de tudo o que faremos
aqui, linda — sussurra, baixinho. — E de tudo o que fizemos durante essas
semanas.
Sem me dar tempo para responder, Oliver cobre sua boca com a minha,
me pega no colo e carrega cegamente até a penteadeira, colocando-me
sobre ela e derrubando os poucos itens que ali estavam. Ele enrola meu
vestido até a minha cintura, sorrindo maliciosamente ao avistar a calcinha
de renda da mesma cor que o meu traje.
— Alguém pode entrar, Oliver — falo, sentindo-o passar a língua pelo
meu pescoço, distribuindo pequenas mordidas pela minha pele, ao mesmo
tempo que inclino meu pescoço, dando-lhe mais acesso.
— Então você terá que fazer pouco barulho, amor — sussurra em meu
ouvido. — Você se lembra de quando lhe disse que quando esquecesse
aquelas regras idiotas, eu iria te perguntar, com todas as palavras se
“poderia te comer? Por favor?”
Porra. Suas palavras saem com tanta luxúria, tanta promiscuidade, que
apenas fecho meus olhos, inclino minha cabeça e mordo meus lábios com
força.
— Então, Summer, eu posso te comer? — ofega. — Por favor?
Oliver coloca as mãos em meus quadris, esperando, ansiando pela
minha resposta. Sua boca traça beijos leves em minha pele e entreabro meus
lábios, pronta para lhe responder:
— Sim. — um fio de voz salta dos meus lábios.
O sorriso perverso de Oliver toma conta de seu rosto, ao mesmo tempo
que leva sua mão até minha calcinha, a chegando para o lado e esfregando o
dedo do meio em minha intimidade, num movimento de vai e vem.
Minha cabeça é jogada para trás, sentindo-o se deliciar com a
necessidade que está nos enlouquecendo. Seu dedo aumenta a velocidade,
fazendo-me gemer baixinho, ao mesmo tempo que um farfalhar de sons
invadem o corredor, aumentando a sensação de perigo, de que alguém pode
entrar por aquela porta destrancada a qualquer instante, e nos pegar nesta
situação, com os dedos de Oliver dentro de mim.
— Eu quero te comer com força, amor — Oliver fala, se distanciando e
olhando em meus olhos. — Mas preciso ser rápido. Nós temos um baile
para ir.
Com isso, alcanço os botões de sua calça, abrindo o zíper e abaixando a
boxer. No mesmo segundo que Oliver puxa um preservativo da carteira e
me encara.
Ele me entrega o pequeno embrulho metálico e não perco tempo, retiro
o preservativo e seguro seu pau, bombeando lentamente, antes de arrastar o
látex no mesmo instante que um segundo dedo se junta ao primeiro,
entrando e saindo de mim.
Oliver, retira sua mão, puxando ainda mais a calcinha para o lado e
inclina meu quadril para si. Em um impulso rápido, me preenche, fazendo
um gemido alto escapar dos nossos lábios.
Meu Deus!
Minha boceta engole seu pau com urgência, ao mesmo tempo que ele
empurra em meu interior com destreza, ganhando velocidade.
Minhas pernas circulam sua cintura, minhas mãos seguram seu ombro,
fincando minhas unhas em seu paletó. Nunca desviamos o olhar, nunca
quebramos a conexão. Oliver entra em mim, me reivindicando. Ele me leva
fortemente, estocando até que meus gritos são impossíveis de segurar.
— Deus, Oliver... — Minha frase se perde em outro gemido.
Ele sorri, percebendo minha dificuldade em me controlar, porém,
quando um barulho alto emerge detrás da porta, sua mão tampa minha boca.
— Shh... Por mais que eu ame seus gritos — Ele se inclina, deixando
um beijo em minha testa. — Eu não quero que ninguém escute, amor. Seus
gritos são meus. Eles são apenas meus.
Uma de suas mãos descem até meu clitóris, massageando-o com um
pouco mais de rapidez. Me obrigando a fechar os olhos e pender a cabeça
para trás, sendo consumida pela sensação.
Oliver não me dá descanso, ele investe em mim mais forte, trazendo
meu corpo para frente e para trás rápido. De repente, solta minha boca para
segurar em minhas coxas, marcando-as com a força que segura, e começa a
entrar e sair de mim, em um ritmo descontrolado.
— Eu vou... — praticamente grito.
— Eu sei, linda.
Antes que outro grito saia dos meus lábios, Oliver me beija.
Minhas unhas se arrastam pela sua nuca, quando sua língua ataca a
minha e o orgasmo vem para mim em uma explosão, tomando conta do meu
corpo. Deixando minhas pernas formigando e minha estrutura exausta,
amolecendo nos braços de Oliver, ao mesmo tempo que ele se desequilibra
um pouco, apoiando a mão da beirada da escrivaninha e investe uma última
vez, antes de se desfazer no preservativo.
— Perfeita. Sempre perfeita! — exclama, com os olhos cravados em
mim.
— Nós temos que ir, Ollie. — Olho para o relógio em seu pulso. —
Estamos atrasados.
Ele assente, arrumando seu traje. Desço do móvel, ajeito novamente o
vestido e tento dar um jeito na maquiagem.
— Summer?
— Sim?
— Guarde a sua última dança para mim.
Se transformou em algo maior
Em algum lugar na neblina tenho a sensação de que fui traída
(...)
Essa foi a noite em que quase te perdi
Eu realmente pensei que te perdi
The Great War | Taylor Swift

Nós descemos poucos minutos depois.


Oliver ficou ao meu lado todo o tempo, em nenhum momento me
deixou sozinha. A não ser quando estávamos com nossos amigos. Porém,
assim que avistamos Brandon chegar, soubemos que nosso sossego havia
acabado.
Não me surpreendo quando o pai de Oliver o puxa, com alguma
desculpa sobre apresentá-lo a algumas pessoas, e pelo olhar que ele me
lança, sei que está puto, quase perdendo a paciência com seu progenitor.
Todavia, ele se mantém lá, fingindo ser o filho prodígio e o garoto de
ouro do pai, mesmo que ninguém ali saiba o quão podre Brandon Wright é.
Desvio meu olhar, passando pelo enorme salão da mansão Blackwell,
que é como a nossa segunda casa. Porém, hoje esse lugar parece outro. Não
há nada comparado ao que estamos acostumados. Não há universitários
aglomerados, nem nossos amigos jogados nos sofás ou algo que indique
que não somos herdeiros dos aristocratas, da metrópole de maior
rendimento do país.
Nesse momento, somos exatamente isso; Filhos perfeitos, sorrisos falsos
e uma vontade imensurável de correr em sentido contrário. Para longe de
tudo isso.
— Quanto tempo até que possamos sair daqui? — Josh questiona,
parando ao meu lado junto a Mackenzie. — Chame todos, vamos sair de
fininho. Com certeza o Oásis está aberto.
Quase solto uma gargalhada, levando a taça de champagne aos meus
lábios.
— Impossível. — Beberico minha bebida. — Nossos amigos precisam
de nós.
Aponto o queixo para onde Verônica, Logan, Dylan, Hazel e Ed estão.
Ao lado deles os pais de Vee cumprimentam todos com um sorriso enorme
no rosto, porém, sabemos que é falso, principalmente quando Amber odeia
Jonathan, após tudo o que aconteceu com a família deles anos atrás. Apenas
o suportam por conta da reputação que construíram durante o casamento.
Meu foco recai em Logan, porque pela primeira vez, nós estamos
presenciando o capitão da SVU, usando um fodido smoking. Logan não
sorri ou responde o que algumas pessoas falam. Ele apenas mantém sua
atenção em sua namorada.
Underwood ergue o queixo, aproveitando o movimento para alargar um
pouco a gravata borboleta em seu pescoço e nos lança um olhar entediado,
como se quisesse fugir dali o mais rápido possível.
— O que aconteceu com o capitão? — Mackenzie indaga com uma
sobrancelha erguida.
— Verônica aconteceu — eu e Josh respondemos em uníssono.
— Ele faria qualquer coisa por Vee. Até mesmo ficar ao lado do pai dela
sem socá-lo — Josh complementa, levando seu copo até a boca.
Concordo, voltando meu olhar para minha amiga. As madeixas de
Verônica caem em cascatas pelas costas nuas, o vestido vermelho e longo se
agarra em suas curvas, e quando olha em minha direção, solta um sorriso
fraco, ao mesmo tempo que lança uma piscadela. Então, se aproxima e beija
levemente Logan.
— Definitivamente, o casal de ouro da SVU — Mackenzie brinca.
Maneio a cabeça concordando e olho para Oliver, que agora se aproxima
com uma expressão nervosa. Como se apenas por ser obrigado a
permanecer ao lado de Brandon, o irrite de uma forma que não consegue
suportar.
Assim que seus olhos cruzam com os meus, um sorriso se estende em
seus lábios. Se há algo que entendi sobre Oliver, é que sorrisos como esses,
são raros, exclusivos apenas a nós dois. Quando sua boca se curva, seus
olhos brilham e sua covinha aparece, tudo dentro de mim se agita.
Tudo grita felicidade.
— Você guardou a última dança para mim? — pergunta, parando a
minha frente.
Minhas mãos sobem até seus ombros, circulando seu pescoço e meu
rosto se ergue, encontrando seu olhar em mim.
— Eu guardei todas elas, playboyzinho — murmuro, sorrindo.
Ele se aproxima, pronto para me beijar. Seu rosto se inclinando em uma
velocidade lenta, como passos de tartaruga. Aumentando a necessidade do
toque, da sensação.
Oliver me encara no caminho, nunca desviando a atenção. Não se
importando com o fato de que todos irão nos observar, se irão comentar...
nada. Ele apenas foca em meus lábios, ao mesmo tempo que umedece os
seus próprios.
— Ótimo — Seus dedos afastam uma mecha do meu rosto. — Pois nós
iremos dançar a noite toda a partir de agora, linda.
Meus olhos brilham, assim como os seus.
Deus, eu amo tanto Oliver Wright que é difícil me concentrar em algo
que não seja nele.
Eu o amo.
É isso.
Um amor que nasceu na noite em que fomos salvação um para o outro,
naquele píer. Que floresceu a cada provocação, a cada momento. Eu o amo
desde que comprou aquele cinema para que pudéssemos ter um encontro,
desde que me trouxe a minha bebida favorita, que cozinhou para mim.
Eu o amo desde que dividimos todos os nossos instantes.
— É a valsa dos Blackwell agora.
— Não, loirinha. É a nossa valsa — conta, se afastando e estendendo a
mão em minha direção. — Verônica a cedeu para nós.
Viro meu rosto em direção a minha amiga, que ainda está no mesmo
lugar, e ela apenas me lança outra piscadela, indicando o queixo para
seguirmos até o centro do salão onde há um enorme espaço vago.
Então, fazemos isso. Eu e Oliver caminhamos até lá.
Mesmo sabendo que todos erguem a sobrancelha ou nos encaram com
confusão. Afinal, essa dança deveria ser de Logan e Verônica. Esse é o baile
da família dela. A valsa deveria ser deles.
Mas não é Logan que está no centro do salão, muito menos Dylan ou
Edmund.
É Oliver.
Por um instante, volto meu olhar para meus amigos que agora estão
todos juntos, todos sorrindo para mim.
Logan ergue o dedo polegar para cima, me dando um sinal de positivo.
Uma forma de dizer que todos eles estão ao meu lado. Analu sorri, um ato
tão raro que me faz devolver o gesto. Levi, meu amigo, meu irmão, inclina
a cabeça para o lado e a maneia, me dizendo para fazer isso, para me
permitir viver, ser feliz. Então, há Hazel, a minha doce amiga, que tem um
sorriso tão lindo estampado em seus lábios. Ela segura o braço de Dylan,
que está ao lado de Ed e Josh e me encaram com orgulho, como se
soubessem que eu preciso disso, deles.
— Loirinha — a voz de Oliver é um murmúrio.
— Playboyzinho.
Ele solta uma pequena gargalhada.
— Você está pronta para essa dança? — Percebo que há um certo receio
em seu tom.
Talvez seja medo da rejeição, não sei.
— Duas noites não foram o suficiente?
A lembrança das nossas danças, da noite na fraternidade, de como
aquilo terminou, faz com que os pelos das minhas costas se arrepiem.
Lembro-me também da nossa dança naquela festa, de como caímos a
partir dali.
— Nenhuma noite será suficiente quando se trata de você, Summer.
Com isso, a melodia lenta ressoa pelo salão.
E nós dançamos. Rodopiamos pelo ambiente. Esquecemos tudo o que
nos rodeia. Apenas focamos em nós. No nosso momento.
O mundo poderia até mesmo cair e nós nos manteríamos juntos. Nós
dançamos e nunca deixamos que a nossa conexão se dissipe. Nós somos um
ímã, sempre atraídos um para o outro.
Foi assim naquele píer. Na lanchonete. Na fraternidade e, por fim, aqui.
Oliver e eu somos um complexo de incertezas que, juntos, nos tornamos
a teoria mais improvável já descoberta.
No nosso último giro, olho para o lado, em direção a janela. Gotas finas
descem pelo vidro e sem perceber, um sorriso se estende pelo meu rosto.
— Ollie?
— Sim, linda.
— Está chovendo — Sorrio. — Chovendo, Ollie!
O sorriso que estampa a face de Oliver, quando entende o quero dizer, é
diferente de tudo o que já presenciei. Ele estende sua mão, não se
importando se nós dois estamos trajados com roupas caras ou se todos irão
comentar sobre isso, sobre estarmos abandonando um baile de gala, apenas
porque amo a chuva.
— Você... você quer ir lá fora? — pergunto, segurando sua mão. —
Você iria lá? Tomaria um banho de chuva por mim?
— Eu acho que não entendeu, Sum... — murmura. — Eu iria até o fim
do mundo por você.
A percepção me atinge como um raio.
A verdade por trás dessas palavras.
Dou um passo à frente, fazendo com que o vestido se arraste pelo piso e
então, ergo o rosto.
— E eu enfrentaria qualquer guerra por você, Ollie — sussurro,
erguendo a mão e acariciando seu rosto. — Eu nunca pensei que diria isso,
mas eu não poderia ter escolhido uma dupla melhor para viver todos esses
instantes.
Oliver abaixa sua cabeça colando nossas testas, ao mesmo tempo que
minha mão acaricia seu rosto.
Somos como um encaixe perfeito. Um amontoado de memórias. Um
reflexo do mais puro e verdadeiro amor.
Nós somos únicos. Idênticos.
Porque Oliver Wright e eu carregamos cicatrizes que se enraizaram
sobre as piores ruínas de nossas almas.
Minhas palmas agarram as suas e ele me puxa para fora do salão, rumo a
chuva que cai sobre Saint Vincent, sobre a cidade que nos ensinou tanto,
que se tornou a nossa casa.
Descemos rapidamente os degraus e passamos pelo jardim. Assim que
estamos no píer, no nosso lugar favorito, ele olha para mim. Suas pupilas
me dizem tudo o que preciso saber. Há uma eternidade de sentimentos
envoltos em suas irís. Há algo que me mostra que somos capazes de
encontrar resiliência, até mesmo quando não desejamos.
Oliver olha para mim.
Ele me enxerga.
Me ama.
Perco o fôlego por alguns segundos, desnorteada por sua beleza.
Mesmo com a chuva encharcando nossas roupas, nossos cabelos
molhados, nós sorrimos. Um sorriso que se torna gargalhada e transcende
nossas almas, iluminando cada parte que deixamos no escuro.
— Um dia você me perguntou a minha cor favorita e eu deixei que
acreditasse que não havia nenhuma — Oliver sussurra, de repente, dando
um passo em minha direção. — Mas, eu estava mentindo. A minha cor
favorita, Summer, é a cor dos seus olhos quando brilham na minha direção.
Porque ilumina meus dias, mesmo nos momentos mais sombrios. E é nesse
momento que percebo que posso ter esquecido de quando nos conhecemos,
mas, jamais, esqueci de você, linda. Você é memorável, cada parte de você.
E não há nada, em absoluto, que se compare com isso. Porque você,
Summer Miller, é a única pessoa que me tira do eixo e me coloca lá
novamente. Você é a minha dupla e eu fingiria mil namoros, compraria
todos os cinemas do universo e beberia todo o cardápio do Starbucks, se
isso significasse que te conheceria. Que você fosse tudo o que é hoje para
mim.
Meus olhos se enchem de lágrimas. Não há nada que se possa dizer que
se compararia a isso. Não há algo que eu pudesse dizer, a não ser que amo
ele. Que Oliver Wright é tudo que almejo, que é tudo o que preciso.
— Ollie... — começo a dizer, porém sou interrompida por palmas.
Palmas frias e uma risada calculada.
Viro meu rosto em direção ao som, me deparando com uma silhueta
masculina, envolta a um terno caro e seco.
Diferente de mim e Oliver.
Subo ainda mais o meu olhar e encontro Brandon Wright segurando um
guarda-chuva, enquanto gargalha em nossa direção. Seus olhos estão
repletos de fúria e ao mesmo tempo, emanam um vazio amedrontador.
Um vazio que causa arrepio em meu corpo e faz com que Oliver dê um
passo à frente, se colocando entre mim e seu pai, encarando-o com um ódio
que nunca presenciei.
É algo novo.
Algo que eu deveria ter medo, mas não tenho, pois sei que aquilo é o
reflexo dos sentimentos reprimidos do homem ao meu lado. Sentimentos
que ele nunca deixou que ninguém soubesse que existiam.
— Eu sempre te disse que o amor é uma fraqueza, Ollie — debocha,
dando um passo à frente. — Mas você nunca me escuta, não é?
A mão de Oliver encontra a minha, apertando-a. Ele busca algo ao que
se agarrar, algo que não permita que perca o controle e prontamente me
torno isso para ele.
Eu me torno a sua válvula de escape. Sua âncora.
— Saia daqui, Brandon — Oliver grunhi.
A reação de seu pai é apenas aumentar o sorriso sádico.
E algo dentro de mim se irrita. Algo faz com dê um passo à frente,
fazendo o olhar do patriarca dos Wright me encarar com frieza, desdém.
— Eu aconselho que saia daqui, Brandon — reafirmo a frase de Oliver.
— Antes que eu mesma entre naquele baile e exponha o quão ordinário,
asqueroso e abusivo você é com sua família. E, acredite em mim, Sr.
Wright, você pode ter riquezas, influência, mas nada disso é páreo para o
inferno que eu e meus amigos vamos aprontar em sua vida.
Observo-o dar um passo à frente. Seus olhos são chamas
incandescentes, são como fogo que me queimaria e, por um momento, sei o
que Oliver sente desde seus oito anos.
Entendo o receio, o medo.
Mas por ele, pelo homem atrás de mim, que mantém os olhos em seu pai
e um sorriso frio nos lábios, me mantenho ereta. Inabalável.
— Eu não ousaria dizer outra palavra — Oliver grunhe, calmamente.
Brandon desvia o olhar brevemente, focando suas íris esverdeadas em
Oliver e, logo após, me encara como se eu fosse uma sujeira em seu terno
caro.
— E por que não? Ela acabou de me ofender! — Brandon praticamente
grita, encarando-nos friamente. — Você, melhor do que ninguém, sabe que
não tolero ofensas. Então, Oliver, diga-me o porquê deixaria uma pirralha
me ofender?
— Porque eu estou prestes a ir até aí e quebrar sua cara, como você fez
comigo quando eu tinha quatorze anos. E ameaçar a minha namorada não
está te fazendo ganhar pontos comigo, Brandon — sua voz é suave. Tão
suave que até mesmo seu pai arregala os olhos, surpreso.
Oliver nesse momento é a epítome do perigo. É quem não deveríamos
cogitar a ameaçar.
— Desculpe-me?
Oliver, vagarosamente, coloca uma de suas mãos em minha lombar.
Fazendo com que fiquemos juntos. De relance, posso observá-lo melhor. Há
um brilho selvagem nos seus olhos, quando fixa seu olhar no meu, meu
vestido queima em minha pele, pedindo para que seja retirado e que o
homem a minhas costas, me faça esquecer a presença do imbecil a nossa
frente.
Oliver ergue o rosto, solta um sorriso maquiavélico, passando a língua
nos dentes e solta as palavras que fazem os olhos de seu pai se semicerrar:
— Eu não gosto de repetir, Brandon. E não acredito que preciso.
Por um segundo, quando Brandon se vira, me permito relaxar. Permito
que Oliver passe seu dedo em minha coluna, me acalmando. Porém, o seu
toque, de repente se torna veneno, sua presença se torna minha prisão e uma
dor inesperada toma conta do meu coração. Assim que seu pai vira seu
rosto por cima do ombro e solta um sorriso de escárnio, seguido de palavras
que me ferem, sei que estamos acabados, corrompidos e em ruínas.
— Diga-me, Summer, como Oliver te contou que seus pais estavam no
meu baile, pois estávamos negociando a fusão entre as nossas empresas,
após vocês terminarem a faculdade? — sua pergunta é com uma faca em
meu coração. — Me diga, querida, qual a sensação de saber que o homem
que te faz declarações lindas, é o mesmo que negociou todo esse acordo
com seu pai sem que soubesse?
Com isso, sem esperar pela resposta, Brandon se vira, sumindo pela
escuridão da noite, de volta ao baile.
E eu fico aqui, sentindo meu mundo sendo retirado de minhas mãos
Sentido a traição inundar meu peito.
Mas por que estou tão surpresa?
Por que o fato do acordo dói menos que a mentira por trás dele?
São tantas perguntas que, quando percebo, uma risada histérica salta dos
meus lábios, enquanto encaro aqueles malditos olhos. Olhos que não
deveriam significar nada. Mas que se tornaram tudo. Olhos que guardam
uma alma, na qual cheguei a acreditar que guardava o universo que
poderíamos um dia construir, mas, agora percebo que são apenas pedaços
de vidros estilhaçados, envoltos em mentiras.
Pedaços que me cortam, dilaceram tudo dentro de mim. Pedaços que
nunca percebi, que enquanto eu arquitetava perfeitamente um plano onde
sairíamos juntos, como uma maldita dupla, ele, na verdade, já estava
fazendo o contrário, estava caindo, sem amarras, sem escudos e no trajeto,
me levando junto.
Agora, durante essa queda, percebo que eu não deveria ter aberto meu
coração, deixado que ele adentrasse e fizesse morada.
Eu não deveria ter permitido isso.
Não devia ter acreditado que outra pessoa podia ser confiável.
Não podia.
Não. Não. Não.
Não podia confiar em ninguém além de mim, mas esperei muito de
Oliver.
Porque nós deveríamos ser apenas um acordo.
Mas o que começou com uma mentira, terminou com uma verdade.
E o sorriso que lhe dei quando me virei e fui embora, foi cruel, como um
tapa na cara. Porque éramos tão bons juntos, tão incríveis... mas não
suficiente para ficar.
Acho que não fomos feitos para durar
Eu não posso seguir em frente com isso e
Eu não tenho as palavras
Então vou continuar contando estrelas
In My Room | Chance Peña

Nunca pensei que meu mundo poderia desabar em questões de minutos.


Eu sabia que a avalanche estava chegando. Sabia que nada seria bom.
Porém, nunca imaginei que isso aconteceria quando Summer ainda estava
ao meu lado, quando não tive a chance de me explicar, de dizer a ela o que
realmente aconteceu. O porquê eu menti. O porquê não contei a ela tudo
antes.
Todavia, quando ela saiu praticamente correndo, de volta para festa, não
consegui acompanhá-la, apenas fiquei parado observando-a sair da minha
vida. Apenas passei todas as oportunidade que tive de contar a ela toda a
verdade.
Não consegui. Não tive coragem.
Contudo, após alguns segundos parado na chuva, percebi que não posso
aceitar isso.
Esse não é o fim para nós.
Eu posso consertar as coisas. Sei que posso.
Corro entre as árvores, rumo a festa. Porém, sei que Summer não
voltaria para lá. Não alertaria ninguém que está sofrendo, machucada por
ser malditamente traída pelo namorado a quem confiou.
Agora me arrependo amargamente. Arrependo-me de não tê-la
escolhido sobre essa vingança. De não ter escutado Verônica quando disse
que isso aconteceria. De não ter sido verdadeiro com ela e comigo.
Retiro meu celular, tentando não derrubá-lo das minhas mãos trêmulas
ao mesmo tempo que corro e deslizo até o contato de Verônica, fazendo a
única coisa que fará com que Summer fique bem após a nossa conversa:
itsoliverwright: Acabou. Ela precisa de vocês agora.
A resposta chega segundos depois.
itsverônicablackwell: O que você fez?
itsoliverwright: Estraguei tudo.
itsverônicablackwell: Estamos indo para o apartamento.
Um bolo se aloja em minha garganta.
itsoliverwright: Eu preciso de uma última conversa com ela.
itsverônicablackwell: Não. O que você precisa é ir para casa e me
esperar lá.
Não respondo. Apenas guardo meu celular e corro pela chuva, em
direção a garagem. A fim de pegar meu carro e ir atrás dela, de tentar me
explicar. De fazer algo para que esse não seja o nosso fim.
Porém, assim que chego aos portões, meu coração para em minha caixa
torácica e meus olhos se arregalam.
É como se o ar que corria em minhas vias aéreas ficasse preso,
impossibilitado de sair.
Penso nas vezes que me machucaram e ela não estava lá.
Nas vezes que chorei clamando por ela.
Nas vezes que a ajudei, que fui sua válvula de escape, enquanto ela se
preparava para ir embora.
E em como me sentei naquela escada e esperei por ela.
Usei todas as minhas tentativas com alguém que me desprezou por algo
que nunca tive culpa. Alguém que me destruiu até que tentativa nenhuma
fosse capaz de me fazer sentir digno de algo.
Penso em tudo, mas apenas a dor se destaca.
Dor fria. Cruel. Desumana.
Dor que incendeia meu peito e corrói meu âmago.
Pois na minha frente, vestida em calças jeans e pulôver, com um sorriso
no rosto e olhos brilhantes, diferentes da última vez que a havia visto, está
Abigail Victória Wright, minha mãe.
E, definitivamente, bem viva.
— Oi, meu pequeno super-herói.
A voz não me escapa.
As lembranças me dominam.
E a dor me faz companheira.
Dor por tudo o que venho passado, desde a sua partida.
Dor por tê-la culpado, quando não havia nenhuma culpa.
Dor, porque tudo o que venho acumulando foi o motivo pelo qual perdi
a única pessoa que viu todas as minhas nuances, e mesmo assim
permaneceu, enquanto eu a destruía sem saber.
Agora percebo que o motivo pelo qual eu luto, está vivo.
Vivendo. Sorrindo e sendo feliz.
Enquanto eu e Andrew ficamos aqui.
Enquanto toda a minha inocência foi tirada de mim.
De uma forma que machucou e dilacerou minha cerne.
— Oi, mãe.
Seu sorriso se amplia, no mesmo momento que anda a passos lentos até
mim. Sem pensar, reteio. Reteio, porque mesmo que eu não a culpe, não
posso deixá-la que me machuque. Reteio, pois o machucado em meu
coração é maior que a saudade que cruza todo o meu corpo.
Faço isso e observo-a estagnar, ao perceber que sua aproximação não é
desejada. Que eu não quero que ela encoste em mim.
A chuva caí sobre meu corpo, mas não me importo. Não sinto nada para
me importar. É como se a dor de segundos atrás tivesse aberto um vazio
iminente. Como se as gotas que escorrem pelo meu corpo, fossem apenas
um mero detalhe quando passa a gostar daquilo que pode machucar. Que
pode me deixar doente e ferido.
A chuva, no momento, é o menor dos meus problemas.
Observo-a completamente.
Abigail é a mesma pessoa, todavia, completamente diferente da mulher
que me ensinou a tocar piano, que leu comigo, que me ensinou a ser quem
sou. Essa mulher que decidiu voltar, depois que se curou e eu me quebrei,
pode ser Abigail, mas não pode ser minha mãe.
— Ollie...
— O que você está fazendo aqui?
Seus olhos acinzentados se enchem de lágrimas, no mesmo instante que
morde o lábio inferior e solta uma respiração pelo nariz.
Lágrimas de saudade. Arrependimento. Vergonha.
Lágrimas que nunca desejei que estivessem em seus olhos, pois, são um
lembrete do que sofreu e teve que superar. Ao mesmo tempo, observá-la me
faz regressar em todas as vezes que o cinto do homem com quem se casou,
recaiu sobre minhas costas e me marcou eternamente.
Todas as vezes que ele me fez sentir imponente e fraco.
Todas as vezes que implorei para que parasse, que não me machucasse.
E mesmo com todas as minhas súplicas, ele continuou.
Brandon me destruiu, assim como fez com ela. Assim como a machucou
sempre que podia. Que a quebrou até que nos abandonar fosse... sua
salvação.
Por isso, por saber a verdade por trás de sua fuga, pode entender cada
uma daquelas palavras, não poderia sentir raiva, apenas decepção.
Decepção por ter escolhido se esconder por quatorzes anos e não nos
procurar. Não nos salvar.
Por encará-la, por lembrar de Brandon, da dor nos olhos de Summer. Por
tudo isso, algo se rompe dentro de mim. Algo como uma barreira, como
uma caixa de Pandora sendo aberta e, enfim, exposta ao mundo para a
destruição.
Algo que me machuca e me reconstrói.
Algo como memórias.
Memórias daquela noite.
Memórias do píer.
Da escada.
Do hospital.
Memórias dela.
A dor de recebê-las é tão grande que caio de joelhos no chão, chorando,
sentindo o que nunca achei que sentiria.
Eu me lembro de tudo.
Cada. Maldito. Detalhe. Daquela. Noite.
— Ollie! Por favor, olhe para mim, querido — minha mãe me chama, se
jogando na minha frente. — Eu estou aqui, meu pequeno super-herói. Eu
finalmente estou aqui por você.
O choro dolorido salta dos meus lábios.
É como se tudo estivesse me machucando.
Eu choro pelos machucados em minhas costas.
Choro pelas lembranças que retornam.
Pelas memórias manchadas.
E choro.... por ter perdido Summer.
Por ter perdido a mulher que me fez voltar a me sentir digno de algo
depois de anos.
Que me segurou quando meu mundo desabou.
Que me fez sorrir quando eu não sabia mais o que isso significava.
Que foi tudo o que eu precisava e, ainda assim, consegui destruir.
— Ele me machucou, mãe. — Não sei o porque estou dizendo isso, mas
sei que preciso. — Ele me machucou como fez com você. Ele me bateu. Me
deu cicatrizes que nunca vou esquecer, que estão marcadas em minha pele.
Ele me fez sentir impotente, assim como me sentia quando não conseguia te
salvar, mãe. E então, quando descobri sobre a carta... me jogou de uma
escada.
— Shh. Está tudo bem, Ollie — ela chora. — Está tudo bem, meu
pequeno super-herói.
Não. Não está.
— Eu fui fraco. Eu permiti que ele me quebrasse — minhas palavras,
são apenas um murmúrio contra a chuva. — Eu não consegui me salvar,
mãe… Não consegui cumprir com o que te prometi.
— Shhh. Você foi forte, meu amor. Você é forte. Nós vamos nos vingar,
Ollie. Vamos vingar os quatorze anos que ele nos tirou — murmura, me
abraçando. — As mentiras que ele contou. A forma como negligenciou
Andi. Vamos vingar tudo o que ele te fez, meu pequeno super-herói. Eu vou
te vingar, meu amor.
Mas como ela pode me vingar?
Como ela pode fazer isso, se o seu abandono foi como um massacre
lento, uma onda sufocante de dor que me empurrou para o mais fundo
possível da minha alma?
Como ela pode fazer isso se estamos tão longe de redenção, longe de
tudo, em um lugar em que a luz não vai?
Então, me cabe esse questionando, se realmente poderei depositar
confiança, tempo e perdão em alguém que pode não ter me destruído, mas
me abandonou quando eu mais precisei. E esse abandono, resultou em
feridas que já estão tão profundas e mágoas que já criaram raízes longas.
— Você foi embora. — Fecho meus olhos, por um breve instante. —
Você também me machucou. Você me fez promessas e nunca as cumpriu.
Você, mãe, também me deu cicatrizes. E não posso deixar você machucar,
Andi. Não vou deixar que ninguém o decepcione.
Minha mãe balança a cabeça, concordando.
— Eu nunca machucaria vocês, Ollie.
— Muita coisa aconteceu em quatorze anos, mãe.
— Eu... sinto muito — murmura, cabisbaixa. — Eu sempre vou sentir.
— Às vezes, desculpas não são o suficiente para apagar o dano causado
— Me solto de seu abraço e me levanto. — Às vezes, nem um milhão de
desculpas pode justificar o que foi tirado de nós, quando não tínhamos
culpa.
Dói. Tudo em mim dói quando dou um passo para trás. Passos que junto
a dor que assola minha alma, criam raízes longas. Impossíveis de serem
desfeitas.
Mas o Oliver de oito anos, aquele que esperou a mãe e que se sentou em
uma escada, acreditando que ela voltaria, que usou todos os números,
tentativas e equações a fim de conquistar o amor dos pais, deseja ficar e
entender o seu lado. Deseja ser consolado e amado por ela, nem que seja
por uma única vez.
Porém, mesmo assim, o Oliver desse momento, que viu o lado ruim das
pessoas, que provou do desgosto cedo demais e precisou ser forte, quando a
vontade era apenas chorar, sabe que precisa fazer outra coisa no momento.
Porque a única pessoa que merece e vai ter o último resquício dos meus
sentimentos, é a mulher que me segurou quando eu caí. Que me fez sentir
amado e feliz, mesmo que por um tempo limitado.
Ela é a única pessoa que precisa de um final digno.
Um último adeus. Uma verdade antes de achar que nada disso é real.
Há apenas uma pessoa que merece a minha atenção, porque está
sofrendo por minha culpa.
E mesmo que tudo em mim doa por conta das lembranças que retornam
aonde pertencem, que meu peito seja brasa por causa da enxurrada de
sentimentos não compreendidos, que enfim, me permito sentir e todo o
resto do universo esteja acabando comigo, dou um passo para trás, rumo a
garagem.
— Aonde você vai, Oliver? — grita quando saio correndo, na direção do
meu carro.
— Atrás da mulher que eu amo.

Eu sabia que Summer não iria para o apartamento.


Sabia que ela não voltaria para o lugar onde todos a procurariam.
Summer nunca gostou de ser confortada. De que as pessoas soubessem que
estava machucada. Por isso, enquanto dirigia em uma velocidade que
assustaria até mesmo Logan e Vee, soube que estava desesperado.
Atravessei todos os sinais, corri por ruas que não conhecia, apenas para
chegar mais rápido no único lugar que sei que sentiria segura, confortável.
O seu lugar favorito.
O cinema da cidade.
O nosso lugar.
Estaciono na rua deserta e percebo que tudo está apagado. E, se a
conheço bem, sei que ela conhece outros meios de entrar no
estabelecimento, sem precisar da chave que possuo.
Destranco a porta lateral, seguindo pelos corredores escuros, escutando
apenas um murmúrio baixo de vozes de personagens ecoando de uma das
salas. Paro na porta exclusiva dos funcionários, soltando um suspiro
aliviado, percebendo que um dos filmes do Homem de Ferro passa na
enorme tela.
Ela está aqui.
Não há movimentação que me mostre onde, mas sinto que está. Sinto
como se sua presença me puxasse para si. Como se mesmo que o universo
lute para que fiquemos separados, ainda assim, não consegue destruir a
conexão que temos, que moldamos.
De longe, vejo um amontoado de cabelos loiros e molhados encostados
em uma poltrona. Me aproximo devagar, a fim de não assustá-la. Seus
braços abraçam seu corpo, enquanto sua atenção está focada na tela, mas é
como se não prestasse atenção. Como se estivesse colocado o filme para
não se sentir sozinha.
Quando estou quase perto dela, Summer solta um ruído baixo.
— Você pode, por favor, me deixar em paz? — pergunta, destruída.
Paro no fim da fileira onde está. Não querendo me aproximar, desejando
que ela não se afaste mais do que está afastada.
— Sum… linda.
— Meu pai me apresentou esse lugar — sua voz é baixa, quebrada. —
Quando meu padrinho fez tudo aquilo e eu não conseguia confiar em mais
ninguém, meu pai me trouxe aqui e assistiu filmes comigo. Ele se sentou do
outro lado da fileira, enquanto eu me sentava aqui e via todos os filmes
disponíveis. — Uma lágrima desce pelo seu rosto. — Meu pai foi o meu
melhor amigo, Oliver. Meu pai é um homem bom. Ele sofreu mais do que
qualquer outra pessoa para conseguir tudo o que temos hoje.
— Me deixe explicar, linda...
— Eu confiei em você, sabe? — Um sorriso frio salta de seus lábios. —
Eu confiei em alguém que praticamente me jogou no meio de mentiras.
Confiei em você, Oliver. E isso, é algo que não faço com facilidade. — Seu
rosto se vira, encontrando o meu e me arrependo por ter desejado isso, pois
sua face é o retrato da frieza. — Eu deixei que me segurasse enquanto
contava todos os meus segredos. Contava os segredos da minha família. Eu
te segurei quando você caiu. Eu estive lá, Oliver. Ninguém mais. E mesmo
assim você me traiu. Você usou aquilo que eu mais amo contra mim.
Mesmo sabendo o quanto meus pais já passaram, você deixou que seu pai
os usasse.
A risada que solta quando se levanta, faz todos os meus pelos se
arrepiarem. Porque esta não é uma versão de Summer que estou
acostumado.
— Linda… não chore, por favor. — Engulo em seco.
— E por que caralhos você se importa se eu choro ou não, Oliver? —
Summer praticamente grita.
Meu coração se agita. É como se adrenalina pura tivesse sido injetada
nele. Como se não suportasse mais segurar a verdade sobre meus
sentimentos.
— Porque eu amo você, Summer! — finalmente digo as quatro palavras
que me atormentam e me tiram o oxigênio. — Achei que tivesse ficado
claro para você, mas vejo que não. Porque é isso, Summer, eu te amo. Amo
suas roupas horrendas, seus gostos peculiares para filmes, amo a mania
como você revira os olhos quando está nervosa. Amo o fato de você sorrir
sempre que compro sua bebida favorita. Amo a forma como defende, briga
e se diverte com nossos amigos. Eu apenas amo cada maldita partícula de
você, Summer Miller. Amo tanto que te ver assim faz com que eu queira
destruir o mundo, faz com que eu me torne uma versão de mim, que eu nem
mesmo sabia que existia, e isso me assusta, me assusta pra caralho. Mas eu
amo você, linda. Eu amo tanto que não consigo mais esconder.
Ela sorri. Contudo, não é um sorriso feliz. É machucado, doloroso e
cruel.
Cruel num nível que nunca percebi que poderia chegar.
Cruel num nível que entendo o quão mal fiz para ela.
Cruel que destroça meu coração mesmo sabendo que mereço.
— É uma pena que não tenha me amado o suficiente para não me
machucar, Wright — declara, se levantado.
Sua resposta, me atinge como um tiro vindo a quilômetros de distância.
E sabendo que não posso mais causar isso, causar o seu sofrimento, digo a
única coisa que preciso:
— Nunca foi a minha intenção te destruir.
A confissão queima a minha garganta.
Me faz querer chorar, brigar e mostrar que tudo o que acredita, é uma
mentira, uma ilusão. Mas apenas me limito a ficar quieto, observando-a
sorrir e erguer o queixo em um gesto orgulhoso.
— Quantas vezes você ainda vai quebrar meu coração? — Seus olhos
são vazios, inerentes.
Tudo dói.
Respirar dói.
Encarar Summer dói.
É apenas dor, apenas a mais crua e dolorosa dor.
— Eu sinto muito, Summer.
— Não, você não sente — ela murmura, o tom destruído de sua voz faz
com que tudo dentro de mim rompa. — Mas eu entendo, é um ato de
proteção. Você destrói antes que te destruam.
— Summer...
— Não, Oliver, eu irei terminar essa frase, eu preciso terminar. E então,
eu vou me virar e ir embora — ela continua. — Eu entendo, realmente
entendo que você está se protegendo depois de tudo. Entendo toda a merda
que você passou e acredite em mim: eu sinto muito. Sinto tanto que estava
disposta a enfrentar o mundo ao seu lado. Mas eu entendi no meio tempo
que dirigi até aqui, que não posso salvar outra pessoa. Não posso tirar todos
os seus fantasmas. Não posso ser aquilo que anseia sem antes ser tudo isso
por mim. Por isso, não me importo com suas desculpas, seus motivos e o
seu amor. Nada disso me fará mudar de ideia.
Engolindo em seco, absorvo suas próximas palavras:
— Porque não posso ser responsável pelas minhas e pelas suas dores.
Não posso viver com uma mentira. Eu não posso mais ficar entre você e seu
pai — continua e vejo outra lágrima descer pela sua bochecha. — Não
posso e não vou ser sua válvula de escape. Porque eu também fui
machucada, Oliver. Eu sofri, me quebrei e eu estou me reconstruindo.
Então, se você está se protegendo, se você ousou manipular a minha família
para que seus planos futuros dessem certo, eu não ficarei aqui observando,
eu vou me proteger e protegê-los também. Nesse momento, Oliver... eu
estou me escolhendo acima de qualquer outro sentimento.
— Não é isso que está pensando, Summer — digo, esgotado. — Eu
nunca te machucaria.
— Já machucou, Oliver! — grita, dando um passo à frente. — Você me
machucou como nunca imaginei que faria.
Ela se vira, pronta para sair. Pronta para finalmente arrancar a porra do
meu coração e levá-lo junto dela.
— Summer? — grito. — Eu não queria estragar tudo.
Ela para, me olhando por cima de seu ombro, soltando um sorriso fraco.
Daqueles que não chegam aos olhos, mas destrói corações.
— Mas é isso que você faz, Oliver. Você acha que não merece alguma
coisa e então estraga tudo — Sua voz é suave, tão suave que quase some
antes mesmo de me encontrar.
— Se você se virar e sair por aquela porta, linda, eu não correrei atrás de
você, não poderei fazê-la mudar de ideia. Eu aceitarei sua decisão, mesmo
que me doa, eu aceitarei. — Engulo em seco. — Então... se fizer isso,
estamos acabados, você me entende?
Summer volta a sorrir. Não daquele jeito como sorriu inúmeras vezes,
dessa vez é cruel, sem nenhum pingo de emoção. E suas próximas palavras
me quebram, mais que um dia imaginei ser quebrado.
— Nós nunca oficializamos nada. Então… não temos algo para terminar
— afirma, suavemente, ainda olhando nos fundos dos meus olhos. — Nosso
acordo já acabou há dias, Oliver. Nada mais nos liga. Não somos nada um
para o outro. Nunca fomos.
Você pensou que eu não poderia durar sem você
Mas estou durando
Você pensou que eu morreria sem você
Mas estou vivendo
Pensei que iria falhar sem você
Mas eu estou no topo
Survivor | 2WEI

PASSADO
Eu nunca pensei em suicídio.
Nunca ansiei por tal ato. Sempre amei a vida, as cores e a sensação de
calor.
Sempre amei viver.
Mas então, um dia, a gente acorda se sentindo mal. Péssimo. Como se a
vida pesasse de forma esmagadora sobre nossos ombros. Como se a
verdade sobre a nossa existência fosse um eco, que cada vez que gritamos,
o som é devolvido em uma cacofonia superior.
Percebemos que esse vazio corrosivo desgasta o corpo e a alma.
Desgasta tudo o que nos envolve. Esse vazio vem acompanhado de
memórias dolorosas. Palavras cruéis. Sentimentos desconexos. Esse vazio
vem acompanhado apenas de... vontade de parar de sobreviver. De fingir
que o mundo não desmoronou ao nosso redor.
Nunca pensei em suicídio, até a última surra que meu pai me deu. Até
que entendi o significado das palavras da minha mãe naquela noite. Até que
entendi que o piano não era apenas o nosso lugar, mas também o seu cofre
particular, onde guardou o seu bem mais precioso.
O seu último adeus. E a última pancada em minha vida.
Hesitante, desdobro o papel amarelado em minhas mãos, passando meus
dedos pelas letras delicadas que um dia pertenceram a ela. Em um ato de
coragem, leio suas últimas palavras:
“Meu pequeno super-herói,
Talvez você me odeie quando ler essas palavras. Talvez nem ao menos
irá querer lê-las. Mas quero que saiba, Ollie, que eu te amo. Eu te amei
desde o momento em que soube que crescia dentro de mim. Te amei desde
quando seus olhos se abriram pela primeira vez e você me encarou. Te amei
desde que sorriu para mim, quando deu seus primeiros passos.
Mas foi quando você completou cinco anos e foi à escola pela primeira
vez, que soube que era a minha salvação. Porque quando voltou estava
radiante, Ollie. Falava sobre números, possibilidades e em como adorava
aquele lugar, como queria que todos amassem como você amava. Foi a
primeira vez em dias que sorri de verdade, foi quando percebi que
precisava manter aquele sorriso em seu rosto.
Porque você, aquele sorriso, foi o meu pingo de esperança em um
mundo podre. Foi a minha força em meio ao choro. A minha luz em meio a
escuridão. Você me mostrou que mesmo que todo o nosso mundo ruísse,
você continuaria a me salvar. Me dando um motivo para continuar.
E eu continuei. Por você, por Andi, eu continuei, meu pequeno super-
herói.
Mas, enquanto continuava, não percebi que também falhava com vocês.
Falhava quando dizia para ser forte quando nem mesmo eu era. Falhava
quando te deixava me abraçar, noite após noite, quando eu quem deveria te
abraçar até dormir.
Eu falhei em tantos quesitos, Ollie.
Por isso, por não aguentar mais falhar com você e seu irmão, eu estou
indo embora. Estou indo recomeçar a minha vida. Porque se eu me curar,
se eu voltar a ser feliz, poderei voltar e buscá-los, poderei ser forte por mim
e por vocês. Poderei ser a mãe que merecem. Porque agora, eu não posso,
filho.
Eu não posso mais fingir que não estou definhando. Não posso mais
suportar a dor que essa casa me traz e não posso mais aguentar tudo o que
venho aguentando ao lado do homem no qual me casei. Não posso mais te
abraçar e permitir que você cuide dos meus machucados.
Você, Oliver, é a minha esperança. Porque sei que nunca desistirá como
eu. Que nunca abandonará seu irmão como estou fazendo.
Antes de ir, saiba que meu coração sempre será seu, meu pequeno
super-herói. Eu te amo com cada batida do meu coração.
Além disso, Oliver, quero que preste atenção nas minhas próximas
palavras:
Brandon não é o dono da Wright Enterprise. Você é, Ollie. Você e
Andrew são os herdeiros de tudo o que estou deixando.
Todos os documentos estão no apartamento escondido em Nova York.
Pegue-os. Então, quando tiver a idade certa e achar que a hora chegou,
procure por Jonathan. Diga a ele que está cobrando o que ele me deve.
Diga a ele que Amber o apoiará. E faça o que é necessário, Oliver. Pegue
de volta tudo o que Brandon nos tomou. Tire tudo o que ele valoriza, assim
como ele tirou tudo o que amamos.
E Oliver, as pessoas falarão de mim, vão tecer comentários falsos. Vão
dizer que morri. Mas lembre-se: um artista pode até morrer, mas as suas
obras? Elas serão eternizadas.
Eu te amo.
Amarei até meu último suspiro.
Mamãe.
Lágrimas descem pelo meu rosto, enquanto minha mente é um espiral
de pensamentos e emoções. Não sei o que fazer, não sei o que pensar.
Apenas suspiro fundo, secando as lágrimas e levando a garrafa aos meus
lábios.
E, então, eu bebo. Cada maldita gota do álcool desce queimando pela
minha garganta. Desconto tudo em algo que não fará mal a ninguém, a não
ser a mim mesmo. Faço isso por tanto tempo que quando termino, não sei
bem como poderei caminhar de volta ao baile, a casa de Verônica.
Porém, preciso. Preciso contar a minha amiga o que acabei de descobrir.
Contar a ela o que posso fazer para me livrar do que Brandon faz comigo,
desde que ela foi embora.
Eu preciso fazer isso.
Eu...
Uma movimentação na lateral do píer faz com que eu erga meu rosto,
me deparando com uma silhueta feminina.
— Isso é uma propriedade privada — declaro, sem olhar para ela. —
Sugiro que saia.
Não desejo companhia. Não desejo que ninguém me salve do meu
martírio. Eu preciso sentir cada dor. Preciso sentir tudo enquanto permito,
porque quando tudo isso acabar, não restará nada de bom em mim para
aproveitar.
— Não, não é.
Sua voz é doce, delicada. Porém, há uma tensão. Um medo escondido
em suas sílabas que me obriga a finalmente encará-la.
E me arrependo amargamente.
Porque no instante que faço isso. Encontro a garota mais linda que já
cruzou em meu destino. Os olhos castanhos assustados, o cabelo loiro
amarrado em um rabo de cavalo e a boca entreaberta.
Ela é incrivelmente linda.
Perfeita.
Eu deveria até mesmo dizer que poderia se comparar a uma deusa. Pois,
nesse instante, cada maldito resquício dos meus pensamentos é invadido por
ela.
Seus cílios batem levemente enquanto pisca e inclina a cabeça para o
lado me estudando, me observando, tentando entender quem sou ou o que
estou fazendo.
Prometo a mim mesmo que, mesmo sob a névoa bêbada, ela sempre será
inesquecível, única.
Porque a desconhecida acaba de salvar algo que nem imagina.

Eu não fui para o baile anual dos Blackwell.


Eu não consegui sair daquele píer. Não consegui deixá-la sozinha. Era
como se a sua dor se entrelaçasse na minha e formasse a mais deslumbrante
das artes. Como se todos os segundos tivessem parado, apenas para que
nosso mundo se colidisse naquele mero momento.
A loira desconhecida me fez esquecer de tudo.
Me fez sentir tudo o que não deveria sentir. Porém, desejava.
Assim que adentro a mansão dos meus pais, percebo que todas as luzes
ainda estão apagadas. Nem mesmo Alícia está correndo de um lado para o
outro atrás de Andi.
Decido que vou aproveitar o silêncio para tomar um banho e me livrar
de todo o álcool que ainda circula pelo meu corpo. Porém, assim que estou
no segundo andar, a silhueta de Brandon se destaca mesmo sob a pouca
iluminação.
Ele está parado à minha porta, girando um copo de whiskey em uma das
mãos. O smoking está perfeitamente alinhado em seu corpo e o relógio de
ouro destaca seu pulso.
Tudo nele me enoja!
Cada. Maldita. Parte. Dele.
Brandon se desloca da parede, vindo em minha direção. Carregando
consigo um taco de beisebol que eu não havia visto até agora.
— Eu iria te perguntar onde esteve, para não comparecer ao baile que
deixei claro que deveria estar — sua voz é fria, desprovida de emoções. —
Mas, não acho que seja mais necessário. Apenas o cheiro de álcool que
exala de você e os olhos vermelhos me indicam tudo o que quero saber.
Solto um sorriso debochado, umedecendo meus lábios e erguendo meu
rosto.
— Sentiu minha falta?
Uma de suas sobrancelhas se ergue, ao mesmo tempo que inclina a
cabeça para o lado.
— Meus amigos, sim — conta, lançando-me um olhar cético. — Acho
que já conversamos sobre você não seguir minhas ordens, não é, Oliver?
Uma gargalhada histérica salta dos meus lábios. O som é frio, assim
como o homem à minha frente. O responsável pela ruína da mulher incrível
que merecia o mundo, mas que agora não tem nada disso.
— Sobre você me espancar até que minha pele esteja marcada? Ou
sobre você me fazer suplicar enquanto meu irmão me chamava do outro
lado da porta? — pergunto, meu sorriso se amplifica. — Você é um
abusador de merda, Brandon Wright!
As narinas dele se dilatam, ao mesmo tempo que dá um passo em minha
direção parando a minha frente. Deixo meu olhar vagar pelo seu rosto e
assim que seus olhos se encontram com o meu, percebo a fúria. O deleite
por querer me tocar, me quebrar, como sempre faz quando provoco esta
reação.
— Você quer saber uma coisa, papai? — questiono. — Eu não me
importo. Você quer me socar? Tudo bem, faça isso. Você quer me humilhar?
Não seria a primeira vez — Passo minha língua pelo meu lábio inferior. —
Faça tudo isso, Brandon, mas no final, a sensação de saber que Abigail me
amou mais do que amaria você, se fosse um homem decente, nunca sumirá.
Porque, você sabe, não é? Minha mãe nunca te amou. Nunca o perdoou e
ela morreu tendo nojo de tudo o que representa. Você, Brandon Wright, é a
escória da minha família.
Sua palma atinge meu rosto com destreza cortando meu supercílio.
Contudo, não estou surpreso. Não tanto quanto deveria. Brandon sempre
usou a violência como punição e desta vez não seria diferente.
Meu pensamento é cortado para quando um soco forte atinge meu
estômago, fazendo com que um rugido saia dos meus lábios. Ao mesmo
tempo que dou um impulso para trás, levantando meu braço e socando seu
rosto com maestria, assim como meu professor de autodefesa havia me
instruído poucos dias atrás.
— Interessante — desenha, levando a mão até o queixo, massageando a
região que acertei. — Vai ser mais divertido agora.
Antes que pudesse entender o que realmente queria dizer com isso, o
próximo soco atinge minha bochecha com precisão. Ele desfere vários deles
em diversas partes do meu corpo, ao mesmo tempo que tento me defender e
acertá-lo.
Somos bagunça de socos, tapas, gritos e xingamentos. Descontamos
toda a nossa fúria reprimida um no outro. Nós fazemos isso até que estou
cansado o suficiente, mas ainda assim, consigo empurrá-lo, fazendo com
que suas costas batam em um quadro e o derrube.
— Você. É. Um. Monstro! — grito, não me importando que alguém irá
escutar. — E eu vou fazer você pagar cada maldita vez que me machucou.
Eu vou contar a todos tudo o que fez comigo. Vou tirar tudo de você,
Brandon!
Ele sorri depravadamente, limpando o sangue em seu rosto.
— Você vai? — é uma pergunta sem resposta. — Porque eu acho que
não.
Abro a boca para responder. Para dizer que está errado, que eu irei fazer
tudo o que proferi, porém não tenho tempo, porque um barulho no primeiro
andar, me faz virar meu rosto na procura de quem é o responsável pelo
feito. Todavia, assim que olho para baixo, percebo que estou ao lado da
enorme escada.
Um frio toma conta da minha espinha e o medo emerge em minhas
veias. Porque no instante seguinte, algo atinge minha nuca, algo pesado e
forte, fazendo com que sangue desça pelos meus ombros, molhando minha
roupa.
Meu corpo fica mole e tomba para frente, sentindo as mãos pesadas me
empurrando degraus abaixo.
Então… eu caio.
Caio sentindo meu corpo bater contra a escada e o carmesim escorrer
pelo meu corpo, manchando a escadaria imaculada.
Caio sabendo que ele, aquele que deveria me proteger acabou de me
golpear.
Caio com a sensação de traição invadindo meu peito.
E pouso batendo minha cabeça com força no chão da sala de estar,
escutando o grito de Brandon e Alícia.
Gritos de pavor. Medo. Culpa.
Gritos que me levam em uma escuridão profunda que eu até mesmo
gosto.
Uma escuridão que no meio dela, há apenas uma pessoa.
Ela.
A loira desconhecida.
Perfeita.
Que me salvou quando nem eu mesmo sabia que queria ser salvo. Que
me tirou uma risada sincera depois de anos.
Há ela... e então, há apenas seus olhos castanhos em minha mente
turvando em escuridão.
Por fim, tudo se apaga.
Amigas, juntas até o fim
Te concerto, te ajudo a se dobrar, quando fica difícil
E quando você fica assustada, elas estarão lá
Então se segure nas suas amigas, amigas
Friends | Ella Henderson

Eu afoguei tudo o que estava sentindo em uma garrafa de tequila.


Ou talvez tenham sido duas. Não me lembro bem.
A única coisa que me lembro, é de ter chegado em casa destroçada, com
a maquiagem borrada e o coração em frangalhos. Porém, me recusei a
chorar outra vez, me recusei a deixar que Oliver tivesse tanto poder sobre
mim, que me fizesse sentir fraca, patética.
Bebi até que a lembrança de seus beijos fosse inerente e a sensação de
seu abraço, fosse como espinhos me fincando.
Eu afoguei tudo no álcool.
Cada maldito resquício dos meus sentimentos por ele.
Agora, me arrependo amargamente, enquanto me sento em minha cama,
a sensação de um caminhão ter me atropelado sobrepuja minhas veias, logo
após me jogando de um precipício.
Tudo dói. Cada pedacinho do meu corpo.
Percebo que do outro lado da minha cama, Verônica está dormindo
abraçada a um boneco do Capitão América. Hazel está jogada em um
colchão no meio de várias HQ’s e há outro lugar bagunçado do outro lado
do quarto, porém está vazio.
Ergo minha sobrancelha, tentando entender como paramos aqui ou
como elas parecem mais destruídas do que eu. Mas depois de alguns
segundos encarando-as, concluo que isto é muito para raciocinar com uma
ressaca corroendo meu corpo.
Passo pelo meu vestido destruído, pisando nele e sigo rumo a porta,
atravessando o corredor silencioso em busca de água e um analgésico.
Ninguém nunca está acordado neste horário.
Porém, hoje é diferente. Há alguém acordado e a figura loira do outro
lado da porta, definitivamente não é um dos moradores deste apartamento.
Pela forma como me encara, sei que não está aqui para repetirmos a
bebedeira da noite passada ou para me abraçar.
— Por que ainda não está vestida? — Analu questiona, franzindo o
cenho. — Tenho treino em algumas horas. Não tenho o dia todo, Miller.
Franzo o cenho, ainda mais confusa.
— Nós temos algum compromisso marcado?
— Sim.
— E qual seria?
— Corrida matinal — diz se alongando, e pela primeira vez, abaixo o
olhar pelo seu corpo magro que está tampado com uma roupa quase
idêntica à que estava na primeira vez que corremos. — Você tem dez
minutos para não parecer um zumbi correndo pelas ruas da cidade.
Ela não me dá brecha para responder. Analu passa por mim indo até a
geladeira, tirando uma jarra de água e procurando a caixa de remédios, que
deixamos guardados no armário acima da bancada.
— Eu não disse que aceitava ir.
Parker olha por cima do ombro, sorrindo.
— Eu não estou te dando uma escolha, bobinha.
E ela realmente estava falando sério.
Porque vinte minutos mais tarde, estou trajada com roupas de corrida e
lamentando o momento em que contei a ela que correr me ajudava a colocar
meus pensamentos no lugar.
Assim que volto para a cozinha, Parker não diz nada, da mesma forma
como ontem, quando Hazel tentava me deixar melhor e Verônica fazia o
possível para não sair atrás de Oliver para cometer um assassinato. Analu
apenas se sentou lá e estendeu a garrafa de bebida em minha direção, me
perguntando de que forma poderia matar Oliver ou se precisava de ajuda
para esconder o corpo.
— Tome — Parker estende um comprimido e uma xícara de café em
minha direção. — Não quero que falem que fui responsável por colocá-la
em um hospital. Então, tome isso e coma algo. Saímos em dez minutos.
Sem vontade alguma de desafiá-la, faço o que me instruí.
Como uma barra de cereal, bebo o café e ingiro o tanto de líquido que
seja possível para me hidratar da noite anterior.
— Vamos? — indago, apontando o queixo para a saída.
— Por favor — responde, abandonando seu copo na pia e indo até onde
indiquei.
Paramos na frente dos portões do prédio por alguns minutos para eu
poder me alongar. Então, começamos a caminhar em um ritmo lento, até
que Analu o aumente, nos fazendo correr rápido o bastante para o excesso
de esforço causar o esquecimento da bagunça que ronda a minha mente,
apenas absorvendo o calor da manhã e a leve brisa batendo em nossos
rostos a cada passo aumentado.
Corremos pela vizinhança conhecida, passamos pelos enormes arranha-
céus de Saint Vincent e pela praça central, onde algumas pessoas fazem o
mesmo que nós duas. Me pergunto se, assim como eu, eles também usam
esse meio para extravasar, para suprimir a sensação de se sentir encurralado,
preso por algo invisível, como se fosse um incêndio que queima devagar
dentro do nosso peito, e que doí, doí pra caralho.
Me pergunto também se logo após esse sentimento prevalecer, eles
também param e pensam em quantas vezes esse mesmo incêndio não os
impediram de vivenciar coisas incríveis.
No fundo, acredito que sim, que cada um tenha seu próprio incêndio
para apagar, e que alguns possam ser maiores e mais perigosos que outros,
ainda assim, todos nós, no final do dia, permitimos aguentar mais um
pouquinho, porque se pararmos e deixarmos esse incêndio nos consumir, a
queimadura pode ser fatal.
— Acho que já deixei você pensar demais — a voz de Analu faz todos
meus pensamentos voarem junto ao vento que acaba de bater em meu rosto.
Paro abruptamente, me curvando e colocando minha mão sobre meu
joelho. Inspiro o ar rápido, sentindo o suor escorrer pela minha face e meu
coração bater contra minha caixa torácica.
— Então, esse era o ponto? — questiono. — Me fazer correr até que eu
saia do meu poço de lastimação?
— Não sei. É isso que está fazendo? — devolve, arrumando o rabo de
cavalo que ainda está impecável. Analu me encara com desafio da cabeça
aos pés, implorando para que eu grite com ela e extravase a raiva que
abrange todos os lados do meu coração. — Vamos ser sinceras, Summer,
você não quer ser bajulada. E eu, definitivamente, não bajulo ninguém.
Então, pare de me encarar assim e comece a pensar em como deseja
resolver essa situação. Se embriagar e amaldiçoar Oliver não vai mudar o
fato de que ele te decepcionou.
Tenciono o maxilar, meu olhar se mantém fixo ao dela e por um
instante, realmente cogito a ideia de soltar tudo o que está dentro de mim.
— O que você quer que eu faça? — a pergunta sai tão fria dos meus
lábios, que quase não sou capaz de reconhecer o tom.
— Eu não quero nada, Summer. — Dá de ombros, entediada. — Mas se
você quer algo, diga. Porque, se você deseja alguém para te segurar
enquanto chora, você tem Hazel. Se quer palavras bonitas e motivadoras,
Verônica não pensará duas vezes em fazer isso. Agora, se quer um choque
de realidade, quer gritar e mandar o mundo se foder, bem, apenas me diga e
farei esse trabalho com orgulho.
A lufada de ar que escapa de meus lábios entreabertos é nervosa.
— Eu não preciso de um choque de realidade, Analu — rosno. —
Acredite quando digo que sei exatamente o que esperar dela.
Me levanto, abandonando-a e seguindo um rumo desconhecido. A raiva
paira dentro de mim, como um pavio prestes a queimar, refletindo meu
pequeno inferno e me mostrando como o fogo encontrou moradia em meus
ossos e entre as cinzas do meu ser.
Apenas percebo que caminhei até o lago, quando meus pés se estagnam
na terra macia.
Observo a água calma e cristalina, tentando acalmar tudo de mim.
Diferente do píer da Parte Alta, este tem um enorme espaço, porém, ainda
assim, me sinto como se estivesse pisando no local que foi meu paraíso e
que agora se tornou meu inferno.
— Eu quero que você tenha um choque de realidade! Preciso que você
volte a ser a Summer, que me incluiu em um grupo e se tornou minha
família mais do que a minha própria — Analu fala rápido demais atrás de
mim, como se mostrar um pingo de humanidade fosse um sacrifício no qual
não está acostumada. — Eu não quero que você sinta pena de si mesma,
pena de ter tido seu coração partido.
— Eu não estou fazendo isso, Analu.
Encaro-a, por cima dos ombros, percebendo que caminha até mim e para
ao meu lado.
— Mas você vai! — despeja, convicta. Seus olhos estão machucados e
nublados com lágrimas que não deixa cair e nunca deixará, porque Analu
Parker não chora. — Todos fazem isso quando são machucados, Summer.
Minha mãe fez, ela me machucou quando meu pai preferiu o amor da vida
dele à ela. Meu irmão também tomou esse caminho depois de todas as
humilhações que sofreu do meu pai. Vee fez isso quando Soph morreu.
Todos que eu amo fazem isso. E eu não estou disposta a deixá-la tomar a
mesma atitude.
— Eu não sou eles, Parker! — solto, nervosa. — Mas não preciso que
me lembre que estou machucada, não preciso que corra comigo apenas
porque acha que irei te expulsar. Nunca farei isso.
O brilho quebrado em suas íris faz algo dentro de mim se inflamar.
Esfrego os olhos com o polegar enquanto a observo respirar fundo e engolir
em seco.
— Não estou fazendo isso por mim. Estou fazendo por você, Summer.
Eu não me importo mais com o sabor da solidão, porque já aprendi a ficar
sozinha. Mas... você não — confidência, mordendo o lábio inferior —
Estou fazendo isso porque eu não vou te abraçar enquanto chora, não vou
dizer para lutar ou te encher de frases genéricas. Eu não sou assim. Porém,
eu correrei com você, eu escutarei você reclamar de qualquer assunto, eu
vou te segurar se você cair e esperar seu choro secar para você reclamar da
minha falta de sentimentos. Eu nunca vou te deixar sozinha como um dia
me deixaram.
Suas palavras saem rápido, não me dando tempo de responder ou
raciocinar o que está proferindo e, quando acho que ela terminou, Analu
toma uma respiração e apenas continua, com uma voz rouca que está
tentando esconder o tom embargado:
— E eu vou fazer isso, porque quando eu estava sozinha, quando
ninguém olhava para a vadia insensível da universidade, você e Verônica
me fizeram sentir em casa, acolhida. Vocês me mostraram que eu poderia
ter amigos verdadeiros, que eu podia me tornar membro da família que
construíram. — Mesmo que suas palavras sejam dolorosas, percebo o amor
por detrás delas. — Você se tornou uma das minhas melhores amigas e eu
não posso vê-la entrar em um beco escuro, sem estar ao seu lado para puxá-
la quando não souber o caminho de volta.
Eu não consigo proferir nenhuma sílaba. De todas as pessoas, de todos
os meus amigos, eu não esperava que Analu Parker fizesse isso. Que ela me
deixasse ver um vislumbre do que habita por baixo de tantas máscaras.
Analu é tão quebrada quanto cada um da nossa família e talvez seja isso
que a faça se encaixar perfeitamente entre nós.
— Você é uma das minhas melhores amigas também, Parker — conto
sorrindo. — E eu confio em você para dizer que eu não estou bem, mas que
eu escolhi lutar contra todos esses sentimentos, contra o que sinto por
Oliver.
— Então esta é uma batalha que venceremos juntas! — Ela sorri, uma
felicidade genuína estendendo pela sua face.
Sim, ela está certa.
É uma batalha que venceremos juntas. Porque eu descobri que eu não
preciso lutar sozinha quando tenho um exército que colocaria fogo no
mundo para me proteger.
Quanto mais nós ignorarmos tudo isso, mais nós iremos brigar
Por favor, não desmorone
Eu não posso encarar o seu coração partindo
Eu estou tentando ser corajosa
Love In The Dark | Adele

É estranho como uma coisa pode acontecer tão rápido, mas parecer tão
lento.
Eu não esperava que minha vida se tornaria uma sucessão de desastres
tão bem elaborados, como vem acontecendo desde a última semana. A cada
decisão que tomo, uma nova avalanche me atinge e tudo que planejo,
escorre pelos meus dedos, me levando a um beco sem saída.
Toda essa vingança, fez com que eu perdesse Summer. Meus amigos.
Minha vida.
Agora, enquanto observo as ruas de Nova York passarem pelos meus
olhos, mensuro se realmente valeu a pena. Não sinto a sensação de vitória, a
qual sempre achei que sentiria quando finalmente me libertasse. Apenas
sinto como se tudo dentro de mim estivesse vazio, sem nenhuma
importância.
— O que estamos fazendo aqui? — Andrew questiona assim que o táxi
para em frente a enorme estrutura.
— Você precisa saber de algo antes de voltarmos para casa — Estendo
meu braço, entregando ao taxista o valor cobrado e saio do automóvel. — E
também há alguém que quero que veja antes de tudo acontecer.
Observo junto a Andrew, o enorme prédio espelhado que abriga a
Blackwell Enterprise. A primeira vez que estive aqui, não entendia nada do
que nos esperava quando nos tornaríamos adultos. Porém, enquanto
caminhamos entre as inúmeras pessoas que correm de um lado para o outro,
entendo o porquê Dylan ama isso. Ama a atmosfera competitiva que este
lugar trás.
Sorrio fraco, mesmo que a hesitação queime em minhas veias. Estou
assustado de uma forma que mal consigo disfarçar. Não é como se fosse
fácil destruir um legado e ainda ser feliz. Trair meus antepassados com
afinco e findar o resto que resta minha família, para vingar toda a destruição
causada por alguém que não merecia carregar o mesmo sobrenome que o
meu e de Andrew, carrega um peso que nunca percebi que era esmagador.
Nem isso pertence a Brandon.
Ele se apossou de tudo. Roubou não só tudo o que meus avós
construíram, como também a vida e a felicidade de todos nós. Ele nos fez
reféns de suas falcatruas, de sua ambição e de sua psicopatia.
Agora está na hora dele nos devolver.
Subimos os inúmeros andares e assim que as portas do elevador
privativo se abrem, Amber está nos esperando. O vestido preto sob medida
se ajusta perfeitamente ao seu corpo. E, por um instante, vejo Verônica nela.
Vejo o brilho que poucos têm, a força envolta a dor e a gentileza.
— Oliver. Andi — Maneia a cabeça.
Meu irmão não hesita em dar um passo à frente e abraçá-la, recebendo
um aperto de volta. Amber cuidou do meu irmão após a morte de Sophie.
Ele foi a válvula de escape dela, enquanto ela era a figura materna que
nunca tivemos.
Nunca serei capaz de agradecê-la por isso.
— Oi, tia Amber — cumprimento.
— Jonathan está te esperando, querido — a voz dela sai baixa. — Eu
faço companhia a Andrew enquanto conversam. Os papéis que me pediu
estão prontos, assim que terminarem, basta me procurar na sala de reuniões.
Concordo brevemente. Erguendo a cabeça, me afasto deles, rumo ao
escritório presidencial, no fim do corredor.
É uma sensação estranha, saber que estou prestes a pedir ajuda de
alguém que machucou a minha melhor amiga. Mesmo que ela esteja a par
de tudo e tenha me encorajado a isso, sinto que estou traindo sua amizade
ao me juntar a seu pai.
O secretário de Jonathan abre a porta quando me aproximo e me limito a
balançar a cabeça em agradecimento, já que estou envolvido demais em
meus pensamentos para conseguir proferir qualquer coisa.
— Oliver — a voz rouca me faz olhar em direção a mesa de mogno e
encarar os seus olhos castanhos.
— Jonathan — Respiro fundo.
Jonathan Blackwell é praticamente idêntico a Dylan. Os rostos severos,
a mandíbula marcada e os olhos observadores e perigosos. Todavia,
diferente de Dylan, que mascara bem esse lado, seu pai não se importa em
escondê-lo.
Ele recosta-se em sua poltrona, apontando com queixo para que me
sente à sua frente. Ao seu lado, há um retrato de Verônica, Dylan, Ed e
Sophie. Eles ainda eram crianças, mas o sorriso estampado no rosto deles,
enquanto olham para seus pais, faz com que algo doa em meu peito.
Meu pai nunca se preocupou em ter algo meu e de Andrew. Ele nunca
teve um porta-retratos em sua mesa. Nunca participou de nossas
apresentações, formaturas ou aniversários.
Ele nunca foi um pai.
— Amber disse que precisava da minha ajuda — Jonathan profere,
cruzando os braços na altura do peito. — Você tem certeza de que quer
isso?
— Você me ajudará se eu disser sim?
— Minha filha sairá machucada? — é sua única pergunta.
— Nunca. — Ergo meu queixo, lançando-lhe um olhar convicto. — Eu
nunca machucaria a minha melhor amiga.
Jonathan apenas maneia a cabeça, concordando. Ele leva a mão até a
mandíbula, coçando a barba por fazer e fixa seus orbes em meu rosto.
— Eu devo um favor à sua mãe. Ela nunca me cobrou, mas sinto que
você será a minha forma de pagamento — declara. — Eu vou ajudá-lo a
destruir seu pai, Oliver. Você tem meu apoio e da minha empresa. Tudo o
que é dele, será seu se desejar. E não precisará mais se preocupar com o que
ele fará, porque se Brandon tocar em você ou em Andrew, ele terá que se
preocupar comigo.
— Qual foi o favor que ela te cedeu? — pergunto, curioso. — Para você
não hesitar em me ajudar?
Um sorriso frio cruza seus lábios, ao mesmo tempo que me encara.
— Amber, sua mãe e Theodora eram melhores amigas — declara, dando
de ombros. — Thea me odiava. Mas sua mãe se importava mais com os
sentimentos de Amber. Sabia que ela me amava tanto quanto eu. Sua mãe
era para Amber o que você é para Verônica. Abigail sabia que eu a amava,
então, me ajudou a conquistá-la.
Balanço a cabeça. Decidindo que não me importo com isso. A história
de Jonathan e Amber é mais complexa do que qualquer outra coisa.
— Há outra coisa — digo.
— Diga.
— Eu vou me tornar o CEO da Wright Enterprise.
Eu me tornaria. Reconstruiria o legado dos que vieram antes. Apagaria
Brandon da nossa vida.
— Não espero menos que isso.
— Mas para isso acontecer, eu vou expor todos os crimes de Brandon.
— Os olhos de Jonathan encontram os meus outra vez. — Em todas as
mídias. Quero que o mundo saiba quem ele é de verdade.
Jonathan sabe exatamente o que eu farei e sorri friamente quando
explico que após tudo sair na mídia, o escândalo fará com que as ações da
Wright Enterprise desmoronem. Então, pegarei tudo de volta. Farei com que
o mundo saiba que eu sou o novo proprietário.
Todavia, Jonathan será nomeado CEO temporário até minha formatura.
Ele cuidará de tudo, no mesmo tempo que farei a empresa que meu pai
tanto ama, ser destruída de dentro para fora, onde apenas ele será o culpado.
É a minha vingança final.
O que preparei por anos.
Eu não sou mais um mero peão no tabuleiro de Brandon.
Eu não sou aquele que recebe os socos.
Não é mais meu sangue que mancha os tapetes caros.
Eu sou Oliver Wright.
Herdeiro.
E, logo, dono de tudo o que meu progenitor mais ama.
Mostrarei a ele que desde aquela noite, em que me fez perder uma parte
da memória, ele despertou algo em meu âmago. Me fez perceber que não
deveria usar minhas tentativas para fazê-lo me amar. Mas, sim, para destruí-
lo.
Cada parte dele.
Durou anos, mas finalmente vingarei cada cicatriz em minhas costas.
É o fim do jogo.
E eu sou o vencedor.

Meus passos se tornam razoavelmente mais lentos quando cruzo o


corredor que liga a sala de reuniões, onde Andrew está.
Medo em decepcioná-lo, de achar que este tempo todo estava
enganando-o, rondam em meu pensamento.
Por um minuto, paro em frente a porta. Desejando que tudo o que está
acontecendo finalmente acabe. Que eu não precise mais lidar com tantas
coisas. Que todos os problemas não recaiam sobre minhas costas.
Depois de algum tempo, abro a porta.
— Ollie? — meu irmão, chama.
— Eu quero que conheça uma pessoa, Andi — informo. — Mas, se
você não quiser... Nós vamos sair daqui e ir direto para um hotel, ok?
Sua mandíbula faz um movimento lento, evidenciando que não está
gostando disso.
— Você confia nessa pessoa?
Engulo em seco.
— Eu confio em você.
— Ok — ele murmura, indo até o vidro encarando a cidade abaixo de
nós. — Eu posso lidar com isso.
Concordo brevemente. Nenhuma palavra me fará contrariá-lo.
Abigail perdeu mais da vida dele do que a minha.
Amber também entende isso e leva o celular até o ouvido, balbuciando
palavras que não presto atenção. Não me importo com o que ela profere,
apenas me importo com Andrew. Caminho até onde está, me colocando ao
seu lado. Mostrando que sempre estarei aqui, segurando-o, protegendo-o,
como sempre fizemos.
— Isso tudo está acabando? — ele pergunta, baixinho.
Não existe uma rota fácil. Portanto, arranco o curativo com força.
— Sim, mas talvez pode doer mais do que imaginamos.
— Seremos felizes no final? Sem Brandon e o que ele fez para a nossa
família?
Encaro a vista, pensando na resposta certa.
— Sim. Nós seremos, Andi.
— Então, que se foda a dor, Ollie — Seu rosto se vira em minha
direção. — Eu e você vamos ser felizes!
Solto uma risada anasalada, balançando a cabeça.
Todavia, a risada é interrompida pelo barulho da porta sendo aberta
outra vez.
Andrew congela ao meu lado. Por um minuto inteiro, penso em tirá-lo
daqui, em protegê-lo. Mas, assim que ele se vira, piscando, entendo que ele
também precisa disso.
Ele dá um passo à frente, encarando a mulher do outro lado da sala. É
como se estivessem olhando para um espelho. Embora o cabelo de Andi
seja um pouco mais escuro, os olhos são idênticos. Os lábios e o pequeno
sinal no canto da boca são similares.
Minha mãe sorri para meu irmão, ao mesmo instante que seus olhos
enchem de lágrimas. Por outro lado, Andrew não esbanja nenhuma reação.
Apenas a encara como se fosse um fantasma.
— Olá, Andrew.
Meu irmão olha para mim. Lágrimas enchem a borda de seus olhos.
Tristeza e saudade inundam suas pupilas.
— Mãe? — sua voz é quase inaudível.
— Sou eu, Andi. — Ela sorri entre as lágrimas.
Andrew dá um passo hesitante em sua direção.
Sei que ele deseja que alguém segure sua mão. Que mostre a ele que
pode confiar, pode ir até ela. Entretanto, isso é algo que ele deve fazer
sozinho. Andrew deve ter essa escolha, deve escolher se deseja confiar em
nossa mãe ou se quer afastá-la, entender o que está acontecendo.
Ele merece isso e não irei forçá-lo.
Apenas o ajudarei a seguir seu instinto.
— Se você está viva, isso… isso significa... que você nos deixou? —
sua voz é machucada.
Minha mãe engole em seco.
— Eu fiz o que era melhor para vocês...
Uma pequena risada salta dos lábios de Andrew.
Ele olha de relance para mim, seus olhos brilham. Seu amor é evidente
em cada parte de sua feição.
— Não, mãe. Você não fez. Quem fez foi o meu irmão — murmura,
decepcionado. — Ollie se sentou comigo e me ensinou a desenhar quando
eu disse a ele que gostava. Ele obrigava as nossas babás o levarem nas
minhas apresentações da escola. Meu irmão me aplaudiu de pé em qualquer
oportunidade que tivesse. Ele me ajudou a andar de bicicleta pela primeira
vez. Oliver foi o meu pilar quando ninguém mais foi. Ele me protegeu de
quem poderia me machucar. Me escondeu em sua cama quando tinha medo
de escuro. Ele leu para mim e assistiu desenhos animados comigo, enquanto
eu roubava chocolates sempre que o via triste — Uma lágrima finalmente
desce dos olhos de Andrew. — Ele me mandou para longe, porque tinha
medo de não conseguir mais me proteger, mesmo que ficar longe de mim o
machucasse. Oliver fez o melhor por mim. Ele. Ninguém mais. Meu irmão
sempre entrou na minha frente, mesmo sabendo que eu poderia me
defender.
As lágrimas saltam dos olhos de nossa mãe.
— Você não entende, Andi...
— Não, mãe, eu realmente não entendo — Ele sorri. — Entendo que
meu pai foi um monstro, que ele destruiu tudo à nossa volta. Mas eu quero
que você entenda que não posso dizer que suas ações não nos machucaram,
porque estaria mentindo. Você pode ter feito o que achava que era o melhor,
mas não tínhamos culpa de nada do que estava acontecendo.
A intensidade com que ele diz suas palavras me atinge com força.
Então, eu faço o que preciso, o que meu coração manda. Caminho até onde
meu irmão está e o abraço. Abraço com força, mostrando a ele que faria
qualquer coisa por ele
— Eu te amo, Andi — sussurro apenas para que ele ouça.
— Eu não pude te proteger quando éramos crianças, Ollie. Eu percebia
suas caretas de dor, via os machucados que escondia. Eu escutei seu grito
uma vez e eu não pude fazer nada, a não ser te esperar com aquele
chocolate para assistirmos o nosso desenho favorito. Eu não pude lutar por
você, como lutou por mim... — Sua voz é baixa, quase que um murmúrio.
— Mas agora eu cresci, posso te proteger. Posso lutar por você também,
Ollie.
Engulo em seco.
Sempre fiz o possível e o impossível para que Andrew nunca soubesse
de tudo o que aconteceu. Sempre o protegi. E agora vejo que não consegui,
que fracassei com a única coisa que jamais poderia ter fracassado.
Ele sabia. Andrew sabia das minhas cicatrizes e não demonstrava, pois
percebia que a ideia de que eu o visse sofrendo, me machucava mais do que
qualquer corte em minha pele.
— Sinto muito, Andi. Eu sinto muito — Solto uma lufada de ar.
— Você não precisa sentir, Ollie — sussurra, me apertando. — Nunca
me peça desculpas, quando você fez de tudo para que eu fosse feliz.
Nós ficamos assim por minutos, talvez horas. Não saberia dizer.
Apenas aproveitamos o abraço um do outro. Apenas nos seguramos,
assim como fazíamos quando crianças, quando Andrew se deitava ao meu
lado com uma barra de chocolate e um episódio do nosso desenho favorito.
Nós apenas ficamos ali.
— Ele não vai nos machucar mais, Andi. Eu te prometo.
Os olhos do meu irmão se encontram com o meu.
— Eu sei. Nós vamos destruí-lo.
Solto Andrew, dando um passo para trás. Voltando a encarar minha mãe
que nos observa com os olhos ainda brilhando em lágrimas. Porém, sei que
teremos tempo depois para discutir sobre nossas situações familiares.
No momento, o nosso foco é apenas um:
Vingança.
Amber se vira para mim, segurando uma pasta. Ela caminha até o centro
da sala, depositando o objeto sobre a superfície de vidro e volta a nos
encarar, abrindo-o.
— Há outra pessoa que quero que vejam.
Olho para ela que caminha até a porta e a abre. Do outro lado, um rosto
conhecido entra em meu campo de visão. A bochechas coradas, os olhos
brilhantes e ainda, o jeito simplório de se vestir.
Lauren Campbell caminha para dentro da sala em passos hesitantes.
Seus olhos vão diretamente para onde minha mãe e Andrew estão, e assim
que voltam para mim, solta um sorriso fraco.
— Oi, Oliver.
Tento devolver o sorriso.
— Oi, Lauren.
Ela maneia a cabeça.
Uma vez eu havia dito que Lauren era ingênua por ter se apaixonado por
Brandon, porém o que eu também não percebia na época, era que o amor
pode ser veneno quando injetado de forma errada em nosso peito.
Exatamente isso que havia acontecido. Percebi que este era o caso
quando Brandon me obrigou a ir até a empresa, assim que cheguei em Nova
York para o seu noivado. A mulher que antes olhava para ele como se fosse
o centro do universo, agora o encarava como se enxergasse o monstro por
trás de sua máscara.
— É bom saber que você pensou no que eu te disse. — Ergo queixo
para que se sente à mesa, em frente a mim e Andrew.
— Uma pessoa que destrói os filhos e maltrata a esposa, não é com
quem desejo passar o resto da minha vida.
Lauren solta um sorriso fraco e apenas maneio a cabeça, cruzando meus
braços frente ao corpo e observando-a apoiar sua bolsa e retirar alguns
papéis. Ela engole em seco, entregando-os para Amber que folheia
calmamente, ao mesmo tempo que Jonathan entra na sala, segurando mais
um punhado de papéis.
— Aí estão todas as transações irregulares da Wright Enterprise. Todos
contratos ilícitos e fraudes cometidas pelo seu pai ao longo dos anos. Há
também as senhas de todas as suas contas bancárias secretas em outros
países — Lauren conta, observando Amber e Jonathan folhearem todos eles
com um sorriso no rosto. — Você tem o suficiente para destruí-lo, Oliver.
Solto um sorriso em sua direção.
— Porque você está fazendo isso, Lauren?
— Porque eu não posso me sentar e ver um monstro destruir sua família.
Não posso sorrir para as fotos ou dormir ao lado dele. Ele machucou uma
criança! Talvez fará isso com nossos futuros filhos e poderia ter feito com
Andrew — ela não hesita em responder e olha para onde minha mãe está,
encarando-a. — Brandon não ama ninguém além de si mesmo, mas é
obcecado por você, Abigail.
— Eu sinto muito — minha mãe sussurra.
— Não sinta. Ele vai ter o que merece — Lauren afirma, se levantando.
— Eu nunca quis roubar o seu lugar. Nunca quis tirar o amor de seus filhos
por você. Apenas achei que ele me amava.
Abigail dá um passo à frente, entrelaçando suas mãos em frente ao
corpo e sorri para Lauren.
— O fato de você trazer esses documentos, já é o suficiente para que eu
saiba que ele te manipulou como fez comigo, querida — murmura com
pesar.
Lauren maneia a cabeça, sorrindo fracamente e me encara.
— Faça ele pagar, Ollie.
Sorrio, concordando.
Ela se vira e some pela porta, deixando-nos outra vez sozinhos com
Amber e Jonathan. Eles dão um passo à frente, se sentam à nossa frente e
começam a espalhar todos os documentos que trouxeram para cá e os que
Lauren nos entregou.
— Aqui estão os documentos que garantem o seu direito como herdeiro
primogênito da Wright Enterprise, que Brandon sempre escondeu — Amber
estende um papel em minha direção. — Este, Abigail, é o documento que
te reintegra na sociedade. Anulando todos os documentos sobre sua morte,
que claramente foram falsificados. Você precisará dar uma explicação à
justiça, do porquê fingiu estar morta por tanto tempo.
— Eu posso ser presa? — Minha mãe engole em seco. — Eu acabei de
reencontrá-los, Amb, não posso ser presa. O criminoso é meu ex-marido!
A mãe de Vee, lança a minha mãe um sorriso fraco.
— Nós vamos alegar que estava sob risco de vida. Por isso, a farsa — O
olhar de Amber volta para mim. — Mas, para que isso funcione, nós vamos
precisar do seu depoimento, Oliver. Vamos precisar que conte tudo. Cada
coisa que Brandon fez para você e sua família.
Deslizo meus olhos para longe de todos, os cravando na cidade que
nunca dorme. Contar tudo ao mundo, significa expor todas as cicatrizes.
Expor toda violência que sofri desde criança.
Contar ao mundo, significa estar vulnerável.
Mostrá-las significa...
Cada parte de você é linda, Ollie. Cada centímetro é perfeito. Você é
perfeito, Ollie.
A voz sussurrada de Summer invade meu subconsciente.
Eu desejava que ela estivesse aqui. Que segurasse a minha mão e
enfrentasse isso ao meu lado. Porém, eu destruí tudo. Tudo o que tivemos
de mais lindo e único em minha existência.
Mas, mesmo assim, a mulher no qual sou completamente apaixonado
me ensinou que cada pedaço de nós é perfeito, mesmo envolto de cicatrizes.
Até mesmo as partes quebradas e as que ficam sob a penumbra da escuridão
de nossa alma.
Cada parte de nós é um pedaço de quem somos.
Um resquício do que vivemos.
Escondê-las é apagar a nossa história, não dar um fim para algo que
pode nos transformar em força pura e invencível.
Posso estar machucado, mas isso não significa que parei de dançar.
Nós nunca paramos.
Mesmo quando não há música, continuamos dançando.
— Nós vamos expor tudo para mídia. — É a minha única resposta.
Então, apagaremos Brandon Wright de nossas vidas.
Eu serei o primeiro a dizer que eu estava errado
Oh, eu sei que provavelmente estou muito atrasado
Para tentar me desculpar pelos meus erros
Mas eu só quero que você saiba
When I Was Your Man |Bruno Mars

O aniversário de Summer é dia vinte e um de março.


O mesmo dia que a memória de quando nos conhecemos foi tirada de
mim, sem aviso prévio.
Eu não sabia desse detalhe.
Não até que os acontecimentos daquele dia voltassem para mim como
um raio atingindo uma árvore, a quilômetros por hora. Agora entendo o
porquê ela me odiava. O porquê ela ficou tão decepcionada em achar que a
ignorava por todos esses anos.
Summer me conheceu no dia do seu aniversário e eu a proporcionei uma
noite como nunca tivemos.
Fomos um encaixe perfeito.
Então, Brandon me tirou isso.
Todavia, agora tenho a chance de tomar isso de volta. Em uma semana,
é o aniversário dela. E mesmo que ela chute minha bunda ou que me mande
para o inferno, eu preciso que me escute e compreenda o porquê fiz tudo
aquilo e não contei a ela sobre seus pais.
Eu me explicarei.
Embora, antes disso, preciso fazer outra coisa.
— Você está pronto? — Minha mãe pergunta, parando ao meu lado.
— Você está?
— Não.
— Nem eu. Mas vamos fazer isso.
Um sorriso fraco cruza seus lábios.
— Nós vamos, Ollie.
Caminhamos juntos em direção a entrada do prédio da Blackwell
Enterprise que está lotada de jornalistas. Todos eles estão aqui por um único
fim: presenciar em tempo real a volta de Abigail Wright e
consequentemente, a prisão de Brandon Wright.
Mesmo que ele não saiba o que está vindo para atingi-lo, a sensação não
deixa de ser incrível. É uma paz que irradia do meu peito. Uma sensação de
fim, de que finalmente todo o tormento acabou.
Minha mãe, Andrew e eu saímos juntos do elevador, ao lado de Amber e
Jonathan. E mesmo que eles se odeiem, ninguém pode negar que apenas a
imagem deles juntos, é o suficiente para colocar medo em qualquer pessoa
que cruze seus caminhos.
— Apenas sejam sinceros, ok? — Amber aconselha. — Tudo já está em
posse da justiça. Então, é a hora da verdade de vocês.
Engulo em seco, assentindo.
— Oliver? — minha mãe me chama. — Não tenha medo, meu pequeno
super-herói.
— Eu não vou ter.
Ela sorri, meneando a cabeça e então, segura a mão de Andrew, ao
mesmo tempo que segura a minha, começando a andar pelo saguão, rumo a
porta onde os flashes das câmeras já são visíveis.
Assim que paramos no último degrau, as câmeras são apontadas para
nossos rostos e perguntas começam a ser dirigidas em nossa direção. É um
tumulto que faz com que uma ansiedade ronde meu corpo.
Eu sempre odiei a imprensa. Todas as vezes que meu rosto saía nas
revistas de fofoca ou quando precisava pousar como filho perfeito. Agora
durante esse caos rebelado apenas para que possam ter a melhor manchete,
tenho vontade de correr para longe de tudo isso.
— Senhora Wright? — Uma jornalista grita. — Por que a senhora forjou
a própria morte?
— Como você conseguiu ficar invisível por tanto tempo? — Outra
pergunta.
— O seu marido já sabe que está de volta? — Mais um grita.
Minha mãe olha de relance para mim e Andrew. Ela toma uma
respiração profunda e para os lábios perto do microfone, finalmente
mostrando ao mundo a sua verdade.
— Fingir que estava morta, deixar meus filhos e minha vida, foi a coisa
mais dolorosa que já fiz em minha vida. Entretanto, foi a única saída para
fugir do casamento abusivo onde me encontrava! — Exclama, sua elegância
se faz presente em cada sílaba. — Toda história possui dois lados, duas
versões. Aquela que é contada por pessoas que não a vivenciou e a nossa, a
versão que possui espinhos e machucados. A minha, não é bonita. Ela não é
sobre o que divulgaram. Não existia um segurança. Não existia uma história
de amor proibido. Existia uma mulher fragilizada, machucada. Existia
Abigail Victória Wright, a única herdeira da Wright Enterprise, que foi
espancada, humilhada e estuprada pelo próprio marido, por anos. Vocês
teceram manchetes tendenciosas, manipuladas e falsas sobre o que
realmente aconteceu comigo. Enquanto eu, lutava pela minha vida, depois
de ter presenciado o que ele nunca mostrou a ninguém, sua verdadeira face.
Eu aguentei tudo pelos meus filhos. Eu me segurei até onde consegui, mas
há uma hora que não se pode mais suportar tanta dor. Há uma hora que você
simplesmente quebra.
Sua voz é forte, mas o tom embargado faz com que meu coração doa. A
expressão penosa nos olhos de cada jornalista faz com que minha ansiedade
aumenta, que meu peito doa.
— Oliver? — outro jornalista grita, me tirando dos meus devaneios. —
Como você lidou com tudo isso?
Encaro o responsável pela pergunta.
Palavras se formam em meus lábios, mas não há som.
Não consigo expor minhas fragilidades, não consigo ser vulnerável.
Apenas... não consigo.
De repente, uma mão quente se fecha a minha e encaro quem está ali.
Quem segura minha mão com tanta segurança, como se dissesse que estaria
ao meu lado se decidisse fugir.
Olho para o lado, para a pessoa que me segurou quando tudo isso
aconteceu. Que me encontrou naquele píer chorando, correu para buscar
ajuda e não me abandonou. Ao contrário. Ela me salvou quando estava me
afogando, pulou na água junto comigo, segurou minha mão e nadou comigo
até que eu reaprendesse a nadar sozinho.
Olha para a minha melhor amiga, para Verônica Blackwell, que me
encara com os olhos brilhantes e uma segurança que apenas ela tem.
— Mostre ao mundo quem é Oliver Wright — Verônica diz, sem emitir
nenhum som. — Mostre ao mundo o meu melhor amigo. O garoto forte
daquele píer que se recusou a se quebrar. O adolescente que mesmo sem se
lembrar daquela noite, jurou se vingar. Mostre o homem que se tornou sem
ele. Mostre ao mundo quem você é de verdade, Ollie.
Eu sorrio, concordando com a cabeça.
Então, me viro para os jornalistas ao mesmo tempo que ela me solta e
caminha até onde seus pais estão, se colocando no meio deles.
— Eu não lidei — finalmente digo, em alto e bom som. — Não tive
tempo para lidar, porque enquanto o mundo noticiava a suposta morte da
minha mãe, eu estava me tornando o novo alvo de Brandon — Olho para
Andrew, que maneia a cabeça, indicando para que eu continue. — A
primeira vez que fui espancado, eu tinha oito anos. Eu era uma criança
indefesa. Minha melhor amiga e seu irmão que me ajudaram com os
machucados infligidos por Brandon. E a última vez, eu tinha quatorze e ele
apenas parou, porque perdeu o controle e me jogou pela escada. Os médicos
me diagnosticaram com amnésia dissociativa. Eu não perdi apenas
memórias naquele dia, eu perdi a lembrança de uma pessoa especial. Que
me salvou quando eu nem imaginava que queria ser salvo. Meu pai tirou
mais do que a minha infância, ele tirou toda a minha vida.
O lamento de vários deles, é o suficiente para sabermos que Brandon
estava destruído publicamente. Desta vez, eu não me importei com a
piedade irradiando dos olhares, não me importei com os flashes voltados
para a família, que estamparia as capas de revistas, jornais e sites de fofoca
em algumas horas.
Eu não me importei com nada. Essa foi a minha jogada final. Aquela
que sempre disse que faria quando chegasse a hora.
Mas o meu xeque-mate aconteceu poucos segundos depois, quando
minha mãe se virou e abaixou a alça do vestido, expondo cicatrizes em suas
omoplatas. Cicatrizes como as minhas, que cruzam sua pele em cortes
raivosos, quase brancos, ao mesmo tempo que marcas redondas, que tenho
a plena convicção de que são marcadas pelo charuto que ele amava fumar,
enquanto me agredia, marcam não só seu corpo, mas sua alma também.
E eu faço o mesmo, mostro a cada jornalista as marcas em minhas
costas. Exponho tudo o que ele fez comigo.
Destruo tudo o que ele prezava.
A imagem de empresário perfeito.
De pai amoroso e homem decente.
Com todo o prazer do universo, destruo meu pai como um dia ele fez
comigo.
E não me arrependo em momento algum.

Eu sabia que algo estava errado assim que chegamos ao apartamento


que pertence a minha mãe, após todo o caos do dia. Foram inúmeras
entrevistas, horas com Amber e Jonathan na delegacia, oficializando todas
as denúncias contra Brandon.
Mesmo que sejamos recebidos por um ambiente silencioso, algo está
errado.
Caminho pela sala aconchegante, observando o local. Lembrando que
dias antes eu e Summer estivemos aqui, e o mundo parou nas poucas horas
que fomos únicos.
A saudade dela, do que tínhamos, me atinge tão forte que apenas
caminho até o piano, passando meus dedos pelas teclas. Minha mãe, atrás
de mim, encara tudo como se fosse um regresso ao passado. Seus olhos
varrem cada parte do ambiente, até parar na sua foto pendurada na sala de
estar.
— Sabe, não foi difícil achar esse lugar. Algumas pesquisas e bum...
descubro que minha esposa tem não só um apartamento secreto, mas sim,
três! — Uma voz fria, doentia, ecoa. — Aliás, olá, esposa.
O vislumbre de algo que desconheço cruza o olhar de Brandon, quando
emerge no patamar da escada, descendo lentamente. Arrumando sua gravata
e sorrindo para nós três.
De relance, vejo Andrew digitar algo em seu celular.
— Você ainda continua o mesmo monstro, Brandon — minha mãe
sibila, passando por mim e se colocando a minha frente.
Nunca, em mil anos, poderia imaginar que isso um dia aconteceria. Que
meus pais ficariam cara a cara, em um embate final.
— Você acha que é esperta, não é? — ele umedece os lábios e ri. —
Você se escondeu tão bem. Fez um trabalho genial em fugir sem deixar
rastros. Me obrigando a forjar sua morte e deixar apenas um cadáver
moribundo decompondo em um hotel. Mas não imaginava que seria tão
idiota de voltar.
— Você manipulou nossos filhos! — ela ladra, firmemente. — Deixou
que eles acreditassem que fugi com outro homem e que morri por uma
maldita overdose! Qual o seu problema, Brandon?
— Você sempre foi o meu problema, sua idiota de merda — grita,
descontrolado. — Você deveria me amar mais do que a eles.
— Eles são nossos filhos, seu imbecil! — grita, dando um passo à frente
e se colocando entre nós e ele. — Eles são a minha vida! E você sabia
disso, sabia que eu faria qualquer coisa para protegê-los. Por isso, armou
todas essas histórias.
Brandon não diz nada. Apenas caminha a passos lentos até onde uma
garrafa de whisky repousa em cima de uma mesa e serve uma boa dose,
engolindo de uma só vez. Permito encará-lo por alguns segundos, tentando
entender quem é o homem à minha frente.
Quem é aquele que conseguiu se casar com uma das socialites mais
ricas de Saint Vincent. Porque o homem à minha frente é tão desconhecido
quanto qualquer outra pessoa que passa por mim no dia a dia.
Brandon Wright está além de qualquer redenção. Sua alma podre o
acompanhará em seu purgatório particular a partir de hoje.
— Eu deveria tê-la matado quando tive a chance. — Horror toma conta
das feições de mamãe. — Assim que assinou aquela maldita certidão de
casamento ou quando percebi que estava se preparando para fugir. Porque
se tivesse feito isso, eu não precisaria me importar em consolar dois
merdinhas chorões, pensando que perderam a mãe. Se tivesse feito isso, a
minha vida seria mil maravilhas. Mas fui ingênuo ao ponto de acreditar que
após as mentiras que inventei em seu nome, sobre você ser uma usuária de
drogas e ser uma prostituta que trocou a vida de rainha, por um segurança
medíocre, seria o suficiente para mantê-la longe dos meus filhos, do meu
dinheiro — Brandon solta um sorriso de escárnio. — Esse foi o primeiro
erro, querida. O segundo foi ter espancado Oliver. Eu deveria tê-lo
manipulado mais, para te odiar e deixar, esse merdinha mais novo com
Amber, em Milão.
Para a minha surpresa, minha mãe sorri. Ela joga os cabelos loiros por
cima dos ombros e lhe lança um olhar apático, desinteressado.
— Mas você não podia, não é? — sua língua sai para umedecer os
lábios. — Porque me matar seria voltar para a sarjeta de onde te tirei. Me
matar seria um retrocesso de tudo o que lutou para conseguir. E seria perder
para Jonathan, não é? Porque é isso que você é, Brandon: um invejoso, mau
caráter. Você nunca gostou de ver que seu amigo era melhor que você. Que
se casou com a mulher que amava, enquanto você não conseguia. E
precisou me chantagear para se casar comigo.
Ele ri. Contudo, este sorriso é diferente dos outros. Este é de
desconforto. Demonstra que cada palavra de mamãe é verdade. Que ele é
tudo o que ela diz.
— É uma pena que Jonathan tenha sido um idiota em se perder pelo
amor de sua família. Ele até mesmo foi um dos culpados pela morte da filha
— Seu olhar se ilumina. — Eu não precisei me importar com aquele idiota,
ele mesmo se destruiu.
Dou um passo à frente, por fim, fuzilando-o.
— Por isso todo o acordo de casamento? — o que pergunto o faz exibir
uma careta enojada. — Você queria estragar a minha vida por uma obsessão
pelo seu ex melhor amigo?
Seus ombros sacodem com indiferença.
— Eu fiz isso porque você não tinha culhões para foder a garota
Blackwell. Ela tem uma mina de ouro nas mãos e você se contentando em
apenas ser um amiguinho — delibera. — Você só precisava assinar a porra
do contrato e colocar um filho nela. Infelizmente, isso ficará para o idiota
da Parte Baixa. Mas, não posso ficar surpreso, tal mãe tal filho, não é
mesmo?
Nojo. É isso que sinto por ele.
Nojo por carregar o mesmo sangue.
Nojo por um dia tê-lo chamado de pai.
Apenas nojo.
— Tenha uma péssima vida, Brandon — mamãe, estala a língua no céu
da boca. — Que a prisão te devolva todo o mal que nos fez.
Com isso, ela se vira, pronta para sairmos dali.
Todavia, não deveria achar que conseguiríamos tão fácil, pois no
momento seguinte, a risada sombria de Brandon ecoa pela sala e o barulho
de algo sendo destravado faz com que minhas costas fiquem tensas.
Olho para ele, para sua mão estendida, onde agora existe uma arma,
apontada para nós.
— A propósito, eu nunca, nem um mísero momento, amei qualquer um
de vocês.
A dor deveria me atingir, mas não faz isso.
Nunca esperei tal sentimento vindo dele, depois de tudo o que fez
comigo. Depois que me destruiu de uma forma que achei que não havia
mais como consertar.
Olho para Andrew, que tem os olhos arregalados e o medo envolto em
suas pupilas. Não há nada que eu deseje mais do que tirá-lo daqui. Ele
merece viver. Merece se apaixonar, construir amizades incríveis e
conquistar o mundo.
Por ele, mantenho a atenção de Brandon em mim, indicando para sair,
para correr.
— É recíproco — respondo, por fim, a Brandon, sendo honesto.
— Você não apanhou o suficiente, não é?
Um sorriso cruza meus lábios, ao mesmo tempo que ele esboça uma
risada, levantando a arma em minha direção. Por um momento, acredito que
irá baixá-la e que não fará nada contra nós, seus próprios filhos. Contudo,
isso é uma esperança patética. Brandon não tem mais nada a perder.
Mas sabe que nós temos.
— Apanhei o suficiente para saber que eu nunca desejaria ser seu filho
— Dou mais um passo à frente. Eu não desejo o meu fim, mas se isso
significar que Andrew terá uma vida e que minha mãe vai poder recomeçar,
eu não me importo de morrer. — Acho que ninguém no universo gostaria
de compartilhar seus genes.
Isso é o suficiente.
Ele solta a trava da arma, mirando em mim, no meu peito. Engulo em
seco, permanecendo no lugar, encarando-o. O verde dos seus olhos
contracenando com os dos meus.
Um adeus, um final.
Um fim onde apenas um de nós pode sair vivo deste local.
Então, tudo acontece rápido demais.
Tão rápido que não sou capaz de processar. Há barulho de porta se
abrindo, gritos de policiais e um choro alto. Há um grito. Um frio na boca
do estômago… e a imagem de olhos castanhos invadindo a minha mente.
Olhos castanhos que me mostraram que o amor não é aquilo que me foi
ensinado durante toda a minha vida. Olhos que brilharam para mim, me
enxergaram.
Então, tão rápido quanto o tic tac de um relógio, há um tiro e uma risada
fraca, fora do controle.
Meus olhos se fecham por instinto.
É o fim.
É assim que vai acabar.
Eu vou morrer para que eles possam viver.
E está tudo bem.
Eu só espero que, em outra vida, eu possa encontrar com Summer e ela
possa ser minha. Que possamos, outra vez, ser uma dupla.
Eles estão livres. Nada mais pode machucá-los.
Nós vencemos.
Beijar em carros e bares no centro
Era tudo o que precisávamos
Você desenhou estrelas ao redor das minhas cicatrizes
Cardigan | Taylor Swift

Eu não estou bem.


Não é uma novidade, mas o pior de não estar bem, é continuar fingindo
que estamos. Fingir que as memórias não te sugam a cada minuto e o
mundo te faz lembrar do motivo do seu machucado a todo instante.
É uma droga. Mas é a minha realidade.
Solto uma respiração, descendo as escadas do meu bloco na Saint
Vincent University e caminho em direção ao carro de Analu.
A loira ficou de me dar uma carona até a Parte Alta, onde irei almoçar
com meus pais.
— Ei, sumida — Hazel cumprimenta, parando perto de mim. — Nós
ainda moramos na mesma casa?
Rolo meus olhos, inclinando minha cabeça para o lado.
— Você está sendo dramática.
Hazel coloca a mão no peito, fingindo decepção.
— Onde está minha amiga e o que fez com ela? — brinca, erguendo a
sobrancelha.
— Ela está querendo ir para casa, se afundar em pipoca e filmes de
super-heróis.
— Entediante...
— Não me diga? — Ergo uma sobrancelha. — O que você está fazendo
aqui? Não precisa ir para o hospital?
Minha amiga solta uma lufada de ar, fazendo um coque no cabelo e
prendendo-o com uma caneta.
— Irei daqui a pouco — conta, caminhando comigo. — Queria ver
como você estava.
Meu cenho se franze.
— Eu estou bem.
— Não, você está fingindo que está bem — contraria. — Eu sou sua
amiga há anos, Sum. Te conheço perfeitamente.
— Hazel...
Tento explicar a ela que não, eu não estou bem. Eu me sinto mal toda
vez que me lembro de Oliver e ao mesmo tempo, sinto saudades. Uma
estaca sendo enfiada em meu peito a cada respiração, porque a ideia de que
ele conseguiu mentir para mim, enquanto me fazia confiar nele, destrói o
resto do que sobrou de mim e da minha alma.
Mas, ao mesmo tempo, não posso ficar me lastimando por isso.
Todavia, quando abro a boca para responder, para dizer algo, o barulho
de saltos batendo contra o chão e um ruído preocupado me faz erguer o
rosto sobre meus ombros:
— Você já está sabendo? — Analu pergunta, assim que para a minha
frente.
— Que você está atrasada? — Reviro meus olhos. — Sim, estou.
Ela se aproxima de mim, sustentando o olhar que a direciono. Percebo,
finalmente, que não há sarcasmo, nem nada envolto deles. Ela está
preocupada, com medo e receio.
Algo não está certo.
— Não, Summer — Morde o lábio inferior. — É sobre Ollie.
Meu coração para. Minhas mãos suam.
Sinto a preocupação em meus ossos, mesmo que a decepção ainda
queime em meu peito. A parcela de medo em questioná-la me atinge, como
algo que não espero. Solto uma respiração densa, piscando para aplacar a
enxurrada de sentimentos que ameaçam me apunhalar.
— O que… O que aconteceu com Oliver? — gaguejo, me sentindo
patética.
Analu troca um olhar rápido com Hazel, o silêncio presente entre elas
faz com que algo dentro de mim exploda.
— Alguém pode, por favor, me dizer o que está acontecendo aqui? —
brado.
Parker toma uma respiração profunda, desbloqueando o celular e me
entrega.
— Acho melhor você ler.
Sem pensar duas vezes, faço isso. Puxo o celular de suas mãos,
encarando as várias matérias sobre a família de Oliver, sobre o que ele está
enfrentando desde que saiu de Saint Vincent, cinco dias atrás.
Eu as leio. Uma por uma.
Doí. É como se a cada linha, meu coração fosse dilacerado.
Não impeço as lágrimas de descerem pelo meu rosto, em preocupação
por aquele idiota mimado. Não me importo se estou em um ambiente
repleto de pessoas.
Apenas me importo com o que leio, com a dor e com a vontade
imensurável de entrar no primeiro avião e ir para Nova York. Tudo o que
aconteceu foi apenas um resquício de poeira comparado a dor que irrompe
pelo meu coração.

URGENTE! HERDEIRO DA WRIGHT ENTERPRISE EXPÕE


AGRESSÕES COMETIDAS PELO PAI!
Oliver Wright, herdeiro primogênito da Wright Enterprise, apareceu
ao lado de sua mãe, Abigail Wright — que até ontem o mundo
acreditava estar morta — e expôs todas as agressões que sofreu do
pai durante os anos.

EXCLUSIVO! FAMÍLIA WRIGHT EXPÕE AGRESSÕES


COMETIDAS PELO PATRIARCA!
Oliver Wright, herdeiro e solteiro mais cobiçado de Nova York, expõe
todas as agressões cometidas pelo seu progenitor, Brandon Wright,
durante os anos.

EXCLUSIVO! CEO DA WRIGHT ENTERPRISE É BALEADO


APÓS TENTAR MATAR O PRÓPRIO FILHO!
Empresário tem vida ceifada após tentar assassinar o próprio
herdeiro, por conta do decaimento do valor das ações da Wright
Enterprise na bolsa de valores, após esposa e filho exporem todas as
agressões sofridas ao longo dos anos e documentos comprometedores
vazarem.

MAIS POLÊMICAS! FALECEU BRANDON WRIGHT, CEO


DE UMA DAS MAIORES EMPRESAS DO PAÍS!
CEO é alvejado por policiais em sua própria casa, após tentar matar
o seu filho! O herdeiro, Oliver Wright, felizmente não foi atingido e
segue saudável.
— Summer?
A voz suave de Analu ressoa em meus ouvidos, mas não presto atenção.
Meus olhos estão focados nas manchetes dos maiores jornais do Estado.
Brandon está morto e ele tentou assassinar o próprio filho.
Uma dor visceral tome conta de mim.
A raiva é injetada em minhas veias e a constatação de que mesmo que
eu o odeie, nesse instante, tudo o que está passando, me faz perder o ar e
meu estômago revira com o medo pungente.
— Eu preciso ir embora — minhas cordas vocais vibram com o esforço
para falar. — Eu só... preciso ficar sozinha.
Hazel me encara, preocupada.
— Eu posso te levar — anuncia Analu.
Solto um sorriso falso, que mal se estende meus lábios.
— Eu agradeço. Mas preciso fazer isso sozinha.
Os olhares delas traçam a rota do meu rosto, estudando-me. Noto que
ambas possuem um brilho similar em seus olhos castanhos e a preocupação
evidencia isso. Porém, preciso ficar sozinha agora. Preciso colocar meus
pensamentos em ordem, antes que eu entre no primeiro avião e voe até
Nova York atrás de Oliver.
Fecho meus punhos para amenizar a sensação de ansiedade que causam
palpitações em meu peito.
— Você me liga mais tarde? — Hazel pede, baixinho.
— Claro.
Ela assente de leve, mordendo o lábio inferior.
Assim que me viro, pronta para ir em direção a saída da universidade, o
grito de Analu faz com que eu detenha os passos. Me viro novamente,
encontrando os olhos da loira nos meus, ela suspira fundo, encarando-me
seriamente e então solta suas palavras com firmeza:
— Às vezes, machucamos pessoas incríveis por motivos bobos. Mas, às
vezes, as machucamos porque não encontramos outra saída para protegê-las
— diz e as suas palavras acertam meu estômago, com a força de um soco
impiedoso. — E, quando fazemos isso, quando machucamos o outro por
falta de escolha, nós nos culpamos. Deixamos que essa culpa se enraíze em
nossa alma. Deixamos a mentira fazer morada e o medo se tornar nosso
melhor amigo. Porque viver com esse sentimento, às vezes, é menos
sufocante do que viver se perguntando quantas opções teríamos se
tivéssemos escolhido outro caminho.
— Nem sempre a mentira é a única opção.
Pisco e sua figura alta e determinada dá um passo à frente.
— E nem sempre a verdade vem em uma embalagem bonita, Summer
— conclui, sorrindo friamente para mim. — Então, se pergunte. Apenas, se
pergunte se em algum momento a verdade poderia vir de forma tão fácil,
como desejava. Se o que você desejava era mesmo a realidade ou apenas
uma ilusão do que você criou, para proteger as pessoas que ama.
Com isso, sem esperar pela resposta, Analu se vira e caminha até o seu
carro.
No mesmo tempo que trilho um caminho oposto, tiro meu telefone do
bolso e ligo para única pessoa com que desejo conversar no momento.
O primeiro toque vem.
Depois outro.
E outro.
— Boo?

Não posso mais ficar assim.


Não posso mais desejar algo e ter a sensação de que estou traindo a mim
mesma. De que, quando penso em desejar perdoá-lo pelas mentiras, a
lembrança de que também confiei em alguém que me machucou, inunda
minha mente.
Oliver é alguém que almejo, mas tenho medo de permitir que chegue até
o final. Até onde realmente está meu coração.
Eu o amo, porra, como nunca amei ninguém.
Mas, também não posso me doar de corpo e alma, quando alguém mente
sem pensar duas vezes, bem diante do meu nariz. Quando as circunstâncias
gritam para mim que será inútil, que nós nos destruiremos se permitimos a
queda e seremos uma catástrofe.
Uma explosão, trazendo destruição por todo o universo.
Oliver continua sendo a minha linha fora da curva. Ele continua sendo a
pessoa que penso constantemente; o sorriso dele, a gargalhada que traz paz
a minha alma e desejo a todo instante.
Mas a mentira ainda consegue se destacar mais que tudo isso.
— Boo?
Olho por cima do ombro e sorrio fracamente.
— Oi, mãe — sussurro. — Desculpa te ligar a essa hora.
Mamãe caminha até onde estou sentada no píer de madeira da Parte
Alta.
O lugar favorito de Oliver. O meu novo lugar favorito.
— Você pode me ligar a qualquer instante, Boo — declara, vindo até
onde estou e se sentando ao meu lado.
Minha mãe, mesmo com o vestido elegante, se senta no chão de madeira
ao meu lado, jogando os saltos para o lado e colocando os pés na água.
Olho-a de relance. Para os cabelos loiros, as bochechas afiadas e os olhos
que encaram a paisagem com paz e graciosidade.
— Você já se sentiu como se tivesse as melhores intenções, mas só
cometesse um erro após o outro? — pergunto, balançando meus pés na água
gelada.
Ela solta um sorriso, virando seu rosto para mim.
— Quase todos os dias.
— E o que você faz quando isso acontece?
— Tento outra vez — Seus olhos brilham com amor. — Eu, você, seus
amigos e até mesmo seu pai, iremos errar, Boo. É parte de quem somos. É o
que fazemos. Nós erramos e aprendemos com os nossos erros.
Permaneço em silêncio, absorvendo suas palavras. Permitindo que todos
os acontecimentos dos últimos meses, finalmente se juntem como peças de
um quebra-cabeça em minha mente.
Penso no acordo com Oliver, nos momentos que compartilhamos, em
como ele me segurou quando eu caí. Em como eu o segurei. Penso em todas
essas coisas.
Nas vezes que deixamos o mundo em segundo plano e permitimos que
apenas nós dois existíssemos. Penso em como ele fez todos nossos
encontros valerem a pena, em como ele moldou a farsa da forma como eu
desejava. Nunca pediu mais do que estava disposta a dar. Nunca me
colocou em alguma situação que me comprometesse.
Ele me mostrou seus lugares favoritos. Dançou e tocou para mim.
Cozinhou minha comida favorita e fez Andrew buscar a bebida na qual sou
apaixonada, apenas porque sabia que não estava bem.
Oliver foi... Ele foi tudo o que almejei a minha vida toda.
Ele foi o garoto de quatorze anos que conheci e me fez voltar a dançar.
— Ele mentiu para mim, mãe... — conto, finalmente. — Eu confiei em
Oliver e ele mentiu para mim.
Minha mãe nunca desvia o olhar.
— Seu pai participou de uma reunião com Brandon Wright, poucas
semanas antes de encontrarmos vocês naquele baile — confessa, desviando
a atenção para o lago. — Brandon queria propor uma fusão, seguida de
casamento. Seu pai estranhou, porque não sabia que você estava com
Oliver, muito menos que o sentimento era tão forte para resultar em um
casamento.
Minha mão coça com ansiedade de suas próximas palavras.
— Mesmo assim, ele aceitou comparecer naquele baile. Aceitou se
reunir alguns dias antes — Seus lábios se tornam uma linha fina. — Porém,
Oliver veio até seu pai e entregou alguns documentos, dizendo para ele não
aceitar nada. Para não confiar no pai dele, porque ele queria apenas colocar
as mãos imundas nas nossas empresas. Oliver não participou de nenhum
acordo, ele esteve lá para proteger você e seu pai, Boo. Por isso, participou
de todas as reuniões entre seu pai e o dele.
A minha respiração fica presa em minha garganta.
— Ollie fez isso?
Concorda, maneando a cabeça.
— Há outra coisa que ele fez — Sorri com orgulho.
— O quê? — Leva tudo de mim para não mostrar a ela que estou
ansiosa pela resposta.
— Ele pediu para que você não soubesse de nada disso — suas palavras
são baixas. — Ele deixou claro que se um dia decidisse que se casaria com
ele, não seria por empresa, herança ou fusão. Seria porque você queria isso.
Porque via nele alguém que poderia dividir uma vida. Que o desejava como
um parceiro, uma dupla.
Solto um pequeno sorriso, sabendo exatamente o que uma dupla
significa para nós dois.
— Eu não soube disso até aquela noite. Até depois que saímos do baile
— conta, envergonhada. — E a minha reação não foi das melhores. Mas,
quero que saiba que eu estava assustada. Nunca tinha visto você daquela
forma.
Lentamente, levo minha mão até a sua, apertando-a.
— Não se preocupe com isso, mãe — Solto uma respiração rasa.
— Vocês deveriam conversar. Deveriam acertar tudo — declara calma.
— Algo como o que vocês têm, é difícil de encontrar.
— Acho que estraguei tudo — conto, me sentindo patética. — Eu não
dei o benefício da dúvida para ele, mãe.
Idiota.
Isso é o que sou.
— Depois do que aconteceu conosco, você se fechou. Você não permitiu
que ninguém chegasse até seu coração. — medece os lábios. — Você foi
traída por alguém que amava. Por quem todos nós amávamos. E isso gerou
desconfianças irreversíveis em nós. Mas, Summer, ele está morto. Ele não é
ninguém. É apenas um monstro em nossos pesadelos e uma lembrança que
deve ser superada, querida. Se você deixá-lo te dominar, se o seu medo de
ser machucada ou até mesmo de se permitir amar outra vez, vai te consumir.
Significa que ele ganha.
Seu suspiro é longo.
— Você vai ser machucada, vai chorar, vai se decepcionar e vai
decepcionar outras pessoas. E está tudo bem, Sum — assegura. — Está tudo
bem porque somos humanos, somos passíveis de erros. Ninguém acerta
sempre e você pode errar, querida. Você pode tudo!
Um sorriso ilumina seu rosto.
— Então, vá! Ame Oliver. Ame seus amigos. Ame a vida outra vez — a
voz tênue, suave como brisa fresca, salta de seus lábios. — Deixe o passado
onde ele pertence. Deixe suas cicatrizes se curarem. Permita-se sentir,
porque você é digna disso. Você, melhor do que qualquer pessoa, merece
ser feliz, meu amor.
Eu faço isso.
A abraço, forte.
Deixo com que todos meus fantasmas saiam do armário.
Deixo com que eles não me cause mais medo.
Eu sou imbatível.
O passado não me acorrenta mais.
O amor, a felicidade e o desejo de viver são as únicas sensações em meu
peito.
Finalmente abandono a guerra que travei com meu próprio coração,
anos atrás.
Mesmo quando estivermos por um fio, amor
Mesmo quando for para fazer ou morrer
Nós podemos fazer isso, amor, simples e claro
Porque esse amor é uma coisa certa
Sure Thing | Miguel

Se há dois anos me dissessem que, quando aterrissasse em Saint Vincent


eu me sentiria em paz, em casa, sem dúvidas, riria da cara da pessoa que
disse tal atrocidade. Porém agora, enquanto rolo minha mala pelo aeroporto
aglomerado de pessoas, apenas consigo sorrir.
Não há outro lugar em todo o mundo em que eu deseje estar.
Não há outra cidade que poderia ser considerada minha casa.
Porque Saint Vincent é isso para mim. Meu lar.
— Você está atrasado — a voz rouca me fez parar.
Ergo o rosto, encarando os olhos azuis e desconfiados de Logan
Underwood. Ele sabe que Verônica ficou em Nova York com os pais. Então,
não faz sentido estar aqui.
A não ser que...
O capitão da SVU se desencosta de seu carro, cortando meu pensamento
e vindo até mim, parando a minha frente. Somos quase da mesma altura, o
que faz com que nossos olhos se nivelam e fixem um no outro, à procura de
resposta.
— Você a ama?
— Mais do que qualquer outra coisa na minha vida — respondo, sem
hesitar.
Há uma pausa. Um silêncio profundo corta o ar.
Por fim, a voz grave de Logan faz a pergunta pelo qual nunca hesitaria
em responder.
— Você vai lutar por ela?
— Cada maldito dia da minha vida.
Logan acena em concordância.
— O aniversário dela é amanhã.
— Eu sei — cantarolo convencido. — Tenho a ideia perfeita para
comemorar.
— Conte-me no caminho até a sua casa.
— Então, você não vai chutar minha bunda?
O bostinha arqueia uma sobrancelha, segurando uma risada.
— Eu vou. Em todas as oportunidades que tiver. Porém, eu também sou
seu amigo, Wright — rebate. — Você é importante para nós. Você é família.
E todos nesse grupo são idiotas que cometem erros e precisam de alguém
para ajudar, de vez em quando.
Um sorriso se estende pelo meu rosto.
Não me admira que esta esteja sendo a atitude de Logan. Não quando
Underwood entende todos em nosso grupo. Ele e Verônica são os pilares
dele. São o motivo pelo qual duas realidades paralelas se juntaram e
formaram a família que somos.
Pois quando se trata de todos nós, não existe Parte Alta ou Parte Baixa.
Existe Saint Vincent.
Existe a nossa cidade caótica, que é palco para nossas histórias e nossos
conflitos.
Palcos das nossas amizades, decepções e dos nossos amores.
Amores que nascem em momentos em que não acreditamos sermos
merecedores dele, mas que, quando instalado em nosso coração, é
impossível viver sem.
A cidade que pode, muitas das vezes, nos machucar mas que também é
onde aprendemos a nos salvar, curarmos nossas feridas e angústias.
E que nos ensina a irmos atrás do seu próprio caminho, mesmo que o
trajeto não seja bonito.
— Então... a sua ideia? — Logan indaga, quando já estamos quase
chegando na Parte Alta.
Balanço a cabeça, saindo da minha névoa de pensamentos e sorrio
abertamente para o capitão da SVU.
— Nós estamos dando uma festa.
— Você quer reconquistar Summer em uma festa? — pergunta,
indignado. — Jesus Cristo! Você já teve ideias melhores.
Uma gargalhada se forma em minha garganta.
— Não, seu idiota! — Reviro meus olhos, apoiando meu antebraço na
janela do carro. — Nós estamos dando uma festa temática.
— Não.
— Sim.
— Oliver, eu vou romper a porra da nossa amizade que está começando
agora se você fizer isso — retruca, virando uma esquina. — Eu não vou me
fantasiar de um maldito super-herói.
Minha risada ecoa no carro ao mesmo tempo que a careta de Logan se
faz presente em suas feições. Antes dele decidir me jogar para fora do
automóvel, decido que em vez de respondê-lo, devo comunicar as únicas
pessoas que vão me apoiar nesse assunto. Por isso, sem praguejar, crio um
grupo, deixando apenas Summer e Levi de fora, e envio apenas uma
mensagem simples:

itsoliverwright: Qual a chance de fazermos uma festa com todos


fantasiados de personagens da Marvel, para o aniversário de Sum?
A resposta chega poucos segundos depois.

itsverônicablackwell: MUITAS!!!
itsedmundblackwell: ZERO.
itsanaluparker: Como diabos eu vou decidir qual fantasia usar em um
dia, Oliver?
itshazelsmith: Fico com a Capitã-Marvel. Dylan vai usar a do Homem
de Ferro. Sem discussões!
itsdylanblackwell: Oliver, eu vou te matar!
itsjoshbrown: Como decidiu a sua fantasia tão rápido, Haz?
itshazelsmith: Google. Você encontra todas as fantasias lá, idiota.

itsoliverwright: Não ousem escolher a do Visão ou do Homem-Aranha!

Solto outra risada lendo o resto das mensagens.

itsverônicablackwell: Você não se parece com nenhum deles.


itsanaluparker: Ok. Me vestirei de princesa Clea[30].
itsjoshbrown: Levi vai amar saber que está vestida de princesa.
itsanaluparker: Vá. Para. O. Inferno.

Guardo meu celular, ignorando a conversa deles e volto meu olhar para
Logan, que está prestando atenção na estrada.
A música Do I Wanna Know? do Arctic Monkeys toca no rádio e o vento
entra pelas janelas. O silêncio dentro do automóvel é confortável e é como
se finalmente todas as catástrofes tivessem de fato acabado, e agora apenas
a sensação de paz prevalecesse.
Eu gosto disso. Gosto de não precisar me preocupar com tantos
problemas, segredos e desavenças.
— Você pode me levar até onde Levi está?
Sua cabeça se vira em minha direção.
— Eu devo me preocupar com isso?
— Não.
— Se você entrar em confusão, eu não vou te salvar — retruca,
semicerrando os olhos. — Estamos entendidos?
Reviro meus olhos, concordado.
Vinte minutos depois, estamos parando em frente à enorme mansão dos
Johnson.
A residência parece uma daquelas casas de filmes de comédias
românticas. Porém, não deixa de ser luxuosa e familiar. Toda a estrutura
tem um estilo americano, como as mansões de férias em Hamptons.
Embora, mesmo sendo que toda a fachada grite família, nenhuma outra
palavra poderia definir os Jonhson do que poder.
Eles são referência quando se trata da política da cidade. Sendo que a
Senhora Johnson é candidata a senadora e o Senhor Johnson é o juiz mais
respeitado do estado, tendo uma carreira invejável nos tribunais.
— Aconselho a ir até a piscina. — Logan dá de ombros, desinteressado.
Ele nem ao menos me segue. Apenas vai em direção a casa,
conversando animadamente com uma senhora sentada na sala de estar. Não
é novidade que Underwood têm acesso a casa dele como se fosse membro
da família.
Aceito o conselho, seguindo até a área da piscina e encontro Levi,
dentro da piscina, nadando de um lado para o outro. A estatura de seu corpo
sobe e desce na água. Inerte em tudo o que está acontecendo à sua volta.
Entretanto, quando, enfim, emerge da água, seu olhar se fixa ao meu.
Não me surpreendo quando as pupilas escuras se tornam severas, quase
que com raiva.
Johnson sai da água trajado apenas de uma sunga. A água escorre pela
pele escura e, assim que puxa uma toalha, secando o rosto e a joga por cima
dos ombros, caminhando em minha direção, sinto como se ele estivesse
pronto para começar uma guerra sangrenta.
— O que caralhos você está fazendo aqui? — grunhi, parando a minha
frente.
— Pedindo um favor.
— Vai se foder, Wright! — xinga, fuzilando-me. — Você magoa a
minha melhor amiga e ainda aparece na minha casa, pedindo um favor?
Logan aparece, de repente, segurando um prato com sanduíches e um
copo com suco de laranja. Ele nem ao menos olha em nossa direção, apenas
dá de ombros e se senta em uma das espreguiçadeiras, decidindo não
interferir.
— Eu não quero que faça o favor para mim. — Franzo o cenho. —
Quero que faça para Summer.
Confusão invade suas feições ao mesmo tempo que preciso respirar
fundo.
— Explique-se.
— Quero que use a fantasia de Homem-Aranha, na festa de aniversário
dela.
— Ela odeia festas.
Dou de ombros.
— Mas ama a Marvel — afirmo, convencido. — E o que melhor do que
os melhores amigos comemorarem o aniversário dela, trajados com os seus
personagens favoritos?
— Homem-Aranha é o personagem favorito dela.
— Eu sei.
Ele cruza os braços em frente ao corpo.
— Seria a sua chance de chamar a atenção dela — comenta baixinho. —
Seria a sua chance de ela te perdoar.
— Eu sei, mas vocês merecem mais isso — finalmente digo o
verdadeiro motivo pelo qual estou aqui. — Você merece estar vestido como
o personagem favorito dela, depois de tudo. Depois de quase perderem o
elo que tinham. Eu não quero estar entre vocês, Levi. Eu desejo que Sum
seja feliz e ela te ama. Por isso, sei que te ver vestido como o personagem
favorito dela, vai ser como um dos seus melhores presentes de aniversário.
Johnson finalmente entende o meu ponto.
— Você tem certeza? — a pergunta sai tão suave que até mesmo me
surpreende.
— Sem sombras de dúvidas. — Enfio as mãos nos bolsos da calça. —
Eu prometi não machucá-la, Levi, e quebrei essa promessa.
Os olhos de Levi me encontram.
— Mas você está disposto a tudo para reconquistá-la, não é?
— Sim.
— Seja sincero — aconselha. — Summer não liga para festas, fantasias
ou qualquer outra coisa. Ela se importa com a verdade. Com confiança. De
qualquer modo, apenas seja você. Conte a ela a sua versão.
Sorrio fracamente em sua direção.
— Eu farei isso.
Levi, pela primeira vez desde que eu me lembro, sorri verdadeiramente
em minha direção. Não há aquele rancor, raiva, ciúme sem fundamento.
Superamos nosso desencontro; agora tenho certeza disso.
— Alguma chance dela nos confundir, se eu e você usarmos as mesmas
fantasias?
Balança a cabeça, soltando uma risada nasalada.
— Não. A minha fantasia e a dela são incomparáveis.
Sua sobrancelha se ergue em confusão.
— Como vocês vão se vestir?
Ergo o queixo, orgulhoso. Ansiedade correndo dentro de mim, meu
coração começando a bater descontrolado em meu peito.
— Como uma dupla.

Eu nunca me fantasiei.
Nem ao menos nas festas de Halloween.
Brandon não aceitava, achava que isso era perda de tempo. Porém, hoje
me encaro no espelho como se pudesse fazer isso todos os dias, se Summer
apenas me pedisse. Se ela desejasse, eu usaria esse traje quantas vezes fosse
necessário.
— Você está ridículo — a voz debochada de Andrew ressoa no meu
quarto.
Encaro-o pelo espelho do meu closet, franzindo o cenho.
— Você está vestido como Thor, Andrew. Me respeite! — bufo,
terminando de arrumar meu traje.
— A sua roupa é pior.
— Sim, Deus do Trovão, eu concordo com você — resmungo
sarcasticamente, caminhando até o outro lado do cômodo. — Agora ande
logo, não posso me atrasar.
— Jesus, Summer te transformou em um nerd completo! — Sua
gargalhada ecoa por todo o ambiente.
Paro por um segundo, encarando-o. Depois de tudo o que aconteceu em
Nova York, fiquei com receio de que Andrew ficasse traumatizado ou
machucado pelos acontecimentos. Porém, é como se, após a morte de
Brandon, tudo estivesse mais leve.
Finalmente ele pode ser a versão que éramos quando estávamos só nós
dois.
Andrew pode ter a boa vida que sonhei para ele.
— Ah, Ollie? — o tom hesitante, me faz encará-lo. — Eu quero que ela
te perdoe.
Solto um sorriso fraco.
— Eu também, Andi.
— Mas, se ela não te perdoar, Sum ainda continua sendo a minha
cunhada favorita.
Dou uma passo à frente, pegando o necessário e indicando o queixo para
que começasse a andar até o primeiro andar. Nós estamos atrasados e
pretendo chegar na casa de Verônica antes de Summer.
Quero estar lá para vê-la. Para ver o presente que enviei essa tarde para
casa dela, mesmo que não saiba que fui o remetente.
Quero apenas que seus olhos me encarem mais uma vez.
— Ela será a sua única cunhada, Andi! — exclamo, convicto. —
Ninguém antes ou depois. Summer é inigualável.
Andrew sorri. É um sorriso grande. Alegre.
Um que sempre quis que se mantivesse em seus lábios e que, agora, é
possível.
Após anos posso, enfim, dizer que mesmo isso custando mais do que
estava disposto, valeu a pena.
Valeu a pena, pois Andrew está feliz, minha mãe está bem e eu
finalmente estou livre.
Livre do meu passado. Livre dos segredos. E o principal: livre de
Brandon Wright e tudo o que ele representa.
Finalmente, eu sou o Ollie. O meu próprio super-herói.
O garoto de oito anos que teve seu mundo arrancado do eixo. O
adolescente de quatorze anos que teve a melhor memória roubada, mas que
agora retorna.
Eu sou apenas uma pessoa que fez de suas cicatrizes, um motivo para
voltar a dançar.
E hoje, ressignifico o dia vinte e um de março em minha vida e na vida
de Summer.
Vou enviar um exército para encontrá-lo
No meio da noite mais escura
É verdade, eu vou te resgatar
Eu nunca vou parar de marchar para chegar até você
No meio da luta mais difícil
É verdade, eu vou te resgatar
Rescue | Lauren Daigle

Sempre achei aniversários uma data superestimada, onde apenas usamos


de desculpa para realizar uma festa.
E este ano, não deveria ser diferente. Não pretendia comemorar. Não
pretendia nem ao menos sair de casa. Todavia, quando Verônica apareceu
mais cedo, segurando uma caixa vermelha, com uma fantasia de Feiticeira
Escarlate, soube que não estávamos passando meu aniversário sentadas em
um sofá, comendo besteira.
Na verdade, agora estamos todos adentrando a mansão Blackwell que,
outra vez, voltou a ter a decoração como sempre. Não há nada de idiotas
ricos, filhos perfeitos ou bebidas caras.
Não. Desta vez há universitários fantasiados de personagens da Marvel
– ou tentando se parecer com algum –, há meus amigos segurando uma
garrafa de bebida, enquanto estamos na sala de estar, esperando por algo
que não sei o que é.
De relance, vejo Levi chegar e uma gargalhada saltar dos meus lábios.
Pois, neste instante, o capitão do time de natação, meu melhor amigo, está
trajado como o Homem-Aranha. O macacão vermelho e azul se agarra ao
seu corpo musculoso e uma máscara está apoiada em sua testa. Ao seu lado,
Josh caminha em minha direção, olhando em meu rosto e sorrindo.
— Ei, Feiticeira, eu sou seu irmão gêmeo! — grita, me pegando pela
cintura e girando no ar. — Me chame de Pietro Maximoff!
Jogo minha cabeça para trás, gargalhando, para seu traje cor de gelo, ao
mesmo tempo que me abaixa e lança uma piscadela em minha direção.
— Saia da minha frente seu projeto de The Flash — Levi ordena,
puxando-me para ele em um abraço apertado. — Parabéns, Sum! E largue
de ser teimosa e comece a comemorar seus aniversários.
Devolvo o aperto, passando meus braços pelo seu pescoço e fechando
meus olhos, apreciando o momento.
— Obrigada, Levi — sussurro de volta. — Você é um idiota, mas eu te
amo, ok?
— É impossível não me amar, Sum.
— Não seja egocêntrico. — Enrugo meu nariz. — Ah, e obrigada pela
festa.
Levi franze o cenho, confuso.
— Não foi ideia minha.
Antes que eu possa dizer algo, as figuras de Verônica, vestida de Viúva
Negra, Logan como Capitão América, Hazel de Capitã Marvel e Dylan de
Homem de Ferro, faz com que outra gargalhada salte dos meus lábios. Eles
param ao meu lado, cada um me dá um rápido abraço e então, se jogam no
sofá.
No fundo, posso observar Analu despreocupadamente em um traje da
Princesa Clea. Ela está radiante, ao lado de um jogador de vôlei que não
reconheço. Viro meu rosto em direção a escada, onde meus lábios se
entreabrem para a visão de Edmund Blackwell trajado em roupas do Gavião
Arqueiro. Ele desce as escadas emburrado, chamando a atenção de várias
pessoas que as sobem.
Porém, atrás dele, Melany Underwood vestida quase da mesma forma,
faz com que uma careta confusa estampe minha face. Ela traja uma versão
feminina da fantasia de Ed e, pela sua expressão, não gostou de saber que o
caçula dos Blackwell teve a mesma ideia.
— Eles já brigaram? — pergunto, soltando um sorriso.
Verônica umedece os lábios.
— Provavelmente. Uma hora vão precisar superar essa aversão estranha
que possuem um do outro — Minha amiga revira os olhos. — Então…
vamos ficar bêbados ou não?
Ela se levanta, batendo palmas e puxando Hazel. Contudo, antes que
pudesse sair rumo à cozinha, a voz de Logan nos faz encará-lo.
— Ei, Dylan — o capitão chama, lançando a ele um sorriso sarcástico.
— Grande homem em um traje de armadura. Tire isso, o que é você?
A referência ao filme que tanto assistimos juntos, faz com que minha
gargalhada aumente ao mesmo tempo que Dylan, inclina sua cabeça para o
lado e lança a Logan um sorriso diabólico, fingindo tirar uma sujeira do seu
traje.
— Gênio, bilionário, playboy, filantropo…
Todos ao nosso redor se juntam a mim na gargalhada. Rimos por
minutos que poderiam muito ter se transformado em horas. Fazemos isso,
porque sorrir é um ato que disfarça o sentimento que corrói nossa alma.
Sorrir ameniza a dor e a saudade.
Sorrir apenas faz com que tudo dentro de nós se acalme.
Continuamos até que em algum momento, sinto uma vontade de ir ao
banheiro e mesmo que não deseje me separar deles, caminho rumo ao
segundo andar, em direção ao corredor onde as pessoas não são autorizadas
a entrarem.
Viro o corredor que liga ao quarto de hóspedes, inerte as coisas à minha
volta. Meus pensamentos são uma bagunça que nem ao menos consigo
entender. Porém, quando meus olhos se encontram com a pessoa que nunca
imaginaria que estivesse aqui, é como se meu corpo também o sentisse, pois
meu coração começa a bater desenfreadamente, minhas mãos suam e algo
dentro do meu peito, faz com que lágrimas se agarrem em minha garganta.
São lágrimas de saudade, arrependimento, amor e alívio.
Alívio por perceber que ele está bem.
São tantos sentimentos conflitantes, que não consigo mensurar o quanto
me atingem.
Pois, na minha frente, está Oliver Wright.
Oliver e seu sorriso brilhante. Seus olhos triunfantes e até mesmo um
sorriso ousa se formar em meus lábios, quando percebo que está vestido
como a minha maldita dupla.
Nesse instante, Oliver Wright nada mais é do que o Visão, parceiro da
Wanda.
A referência que me disse uma vez. Então entendo, não foi nenhum dos
meus amigos os responsáveis por essa festa. Foi ele. Apenas ele. Mais uma
vez, Oliver me surpreende.
Neste momento ele é o homem que tem todas as partes da minha alma.
O homem que tem gosto de redenção e que me faz querer permanecer nos
seus braços, me levando ao céu. O homem que me faz perder todo o
controle que desenvolvi até aqui, e me faz desejar entrelaçar nossas mãos
para dançar de novo sobre o furacão que fomos.
Nesse instante, Oliver Wright é tudo o que desejo. Ele é o pedido que fiz
quando assoprei a pequena vela de aniversário mais cedo e o que faço às
estrelas cadentes, quando ninguém está vendo.
Ele me faz querer me permitir ser sua parceira novamente e me entregar
a esse laço tão forte e tão intenso, que meu coração criou pelo playboyzinho
mimado.
— Você está aqui — sussurro.
— Sim.
— E está bem. Vivo. Sem machucados — minha voz sai entrecortada.
— O que está fazendo aqui, Oliver?
— Eu vim para saber se ainda podemos ser uma dupla no crime, loirinha
— seu timbre de voz calmo, baixo. — Como a Wanda tem o Visão.
Dou um passo à frente.
— Talvez eu prefira ser a MJ.
Ele dá outro passo.
— É uma pena que dei a fantasia do Homem-Aranha para o Levi —
murmura, engolindo em seco. — Mas tenho certeza que posso conseguir
uma bem rápido.
Dou mais um passo, quase chegando a ele.
— Neste caso, eu posso ser a Víuva-Negra.
Ele sorri, dando mais um passo. Centímetros nos separam agora.
— Eu posso ser o seu Capitão América.
— E Logan? — Ergo a sobrancelha.
— Ele não se importaria de trocar comigo.
Solto um sorriso, mesmo que sinta lágrimas nublarem meus olhos.
Oliver fecha a nossa distância, nossos rostos agora estão tão perto, tão
unidos que se me aproximar mais um milímetro, poderei sentir seu cheiro
inebriante. Poderei apenas me render a tudo que um dia vivemos.
Então, entrarei mais uma vez no paraíso, me permitindo ser arrastada às
nossas confusões, lutas, feridas e... nosso amor.
O problema é: estou realmente disposta a deixá-lo ficar e me incendiar
de novo, ou apenas me viro e deixo com que a chama entre nós se apague?
— Você é um idiota — sussurro quase que inaudível.
— E você não está bêbada desta vez — devolve, como na vez que
tombamos neste mesmo corredor.
— Ainda assim, um idiota.
A palavra salta de meus lábios em um tom suave, como uma melodia
calma.
— É bom saber que sentiu saudades, loirinha.
Mesmo não desejando, um sorriso cruza meus lábios.
É um sorriso fraco, mas que cruza todas as alamedas do meu coração,
me entorpecendo completamente.
— Eu preciso que venha comigo — murmura.
Encaro-o, franzindo o cenho.
— Para onde?
— Para o nosso lugar favorito, linda.
Eu não sei se deveria tê-lo seguido. Porém, mesmo assim, eu o fiz.
Segurei sua mão, enquanto me puxava entre as árvores, correndo até o
lago. Até o píer. Mesmo que um dia esse lugar tenha sido o nosso lugar
favorito, o lugar onde nos conhecemos, onde voltamos juntos a dançar, é
um lugar manchado por lembranças.
Um lugar que... Oliver reformou.
O píer, que antes era apenas madeira pura, agora se estende até um
pouco mais para dentro do lago. Formando um pequeno deque no final.
Luzes amarelas decoram as laterais, iluminando cada pedacinho desse lugar.
A lua cheia brilha ao fundo, mostrando-nos que também está presente nesse
momento, iluminando cada parte de nós.
Dou um passo à frente, observando tudo. A água calma, as árvores que
se movem calmamente com o vento e o céu estrelado.
O céu que abriga a nossa galáxia.
O céu que, muitas das vezes, comparei com os seus olhos quando me
encaravam.
Eu vejo tudo isso. Tudo o que não estava aqui há oito anos, mas que,
mesmo assim, é uma lembrança daquela noite.
Lembranças de uma noite onde segredos eram inexistentes.
Que viver voltou a significar mais do que sobreviver.
Que qualquer galáxia invejaria a constelação brilhante onde nós
coexistimos.
Uma noite onde Oliver Wright me fez perceber que somos
complementares, somos unificados e um quebra-cabeças onde as peças não
se encaixam, se não forem as que possuímos.
Pois elas são únicas. Únicas como nós dois.
Olho para Oliver que já me encara. Sua feição é como uma brisa de mar
no início do dia, aquela que nos faz respirar com o peito aberto e desejar
que a vida só seja boa e feliz.
Ele é o universo que existe dentro do meu peito. É amor puro e genuíno
que cresceu quando nem ao menos imaginei que ele estava ali, bem
pertinho, se fundindo a minha alma e fazendo morada.
— Você me odeia? — ele pergunta, de repente.
Não.
— Você me machucou — sussurro.
— E eu sinto muito, linda.
Meus olhos o encontram.
— Você sente?
— Com cada maldita célula do meu corpo.
Oliver dá um passo à frente, colocando as duas mãos em minha cintura,
me puxando para si, nunca deixando de me encarar. Percebo que tudo que
compõe Ollie, traz a sensação de que meu corpo entra em êxtase e não
consigo pensar em mais nada, a não ser senti-lo. Porque sentir Oliver, sentir
isso que emana de nós dois, é como perceber que o nosso amor se tornou
meu vício e que não quero ficar sóbria.
Quero me deleitar com a sensação.
Quero fazê-la eterna.
— Você sabe por que amo números? — Ele questiona depois de um
tempo. — Porque eles me lembram o tanto de possibilidades que eu tenho.
Eles me lembram que a cada vez que eu errar, inúmeras outras
oportunidades surgirão. Eu me agarrei nisso, até que um dia usei minhas
possibilidades de fazer alguém me amar com a pessoa errada — Seu dedo
acaricia minha cintura, enquanto sussurra suas palavras. — Então, parei de
usar minhas tentativas. Parei de acreditar que poderia ser amado e que um
dia seria suficiente para fazer alguém ficar. Até você chegar, linda. Até você
conquistar cada parte morta do meu coração. Até que me reivindicou para
outras pessoas. Você com seus filmes ruins, suas blusas estranhas, sua
bebida açucarada. Você por completo. Cada parte de você, Sum — Seu
rosto se aproxima do meu. — Você, linda, é a minha última tentativa. A
minha principal tentativa. Porque eu amo você, com todos os números do
universo. Por todos os livros de romances que me obrigou a ler, te amo
pelas vezes que me ensinou que o amor não é uma fraqueza, mas, sim, uma
força. Eu te amo, Summer Miller, como não ousaria amar nenhuma outra
pessoa. Porque você é a minha dupla, a minha parceira.
Uma única lágrima desce dos meus olhos. Oliver levanta a mão,
secando-a.
— Me pergunte o porquê amo chuvas, Ollie — peço, sussurrando.
Ele ergue uma sobrancelha, porém faz o que peço.
— Por que você ama a chuva, linda?
Um sorriso nasce em meus lábios. Levanto minha mão, colocando em
sua bochecha.
— Porque me faz sentir viva. — Ele sorri, como se me compreendesse.
— E sabe o que mais me faz sentir viva, Ollie?
Ele engole em seco.
— O quê?
— Você, meu amor — Mordo meu lábio inferior. — Você me faz sentir
viva. Me fez sentir assim quando nos conhecemos naquela noite, nesse píer,
e quando dançamos naquele quarto. Fez durante todo o nosso acordo e
todos os dias posteriores a ele — Sorrio, acariciando seu rosto. — Você,
Oliver Wright, é a pessoa que anseio. Que me mostrou que poderia confiar,
amar e viver outra vez. Você me segurou quando o meu mundo caiu e
confiou em mim, quando o seu desabou. Você é o idiota que comprou um
cinema, porque é o meu lugar favorito e assistiu todos os filmes comigo,
que correu comigo mesmo odiando e leu todos meus livros favoritos,
apenas porque estava insegura — Meus olhos se enchem de lágrimas, mais
uma vez. — Eu não me importo com o passado, não me importo com mais
nada. Eu me importo com você, lindo. Com cada parte de você. Porque elas
são as partes que se encaixam em mim. Nós somos um quebra-cabeça
completo. E seremos sempre assim.
Oliver dá um último passo à frente, apertando minha cintura. Fazendo
com que o sorriso volte a nascer em seus lábios.
É lindo.
Perfeito.
É para mim.
— Você me ama? — pergunta, baixinho.
— Tem sido você desde o dia em que te conheci, playboyzinho. —
Devolvo o sorriso. — Eu te amo, Oliver Wright. Eu te amei no passado, te
amo no presente e vou te amar no futuro. Porque é isso que somos, amor.
Nós somos para sempre!
Ele pisca.
O brilho nos olhos de Oliver é uma acumulação das mais lindas
constelações.
É o suficiente.
Nós somos o suficiente.
Somos uma dupla. Assim como Wanda e Visão.
Nós somos o playboyzinho, que ama relógios, e a loirinha, viciada em
filmes da Marvel.
Nós somos únicos.
Eternos.
— Summer?
— Hum?
— Foi muito bom ter caído no seu universo.
Solto uma gargalhada.
— Você está citando Doutor Estranho para mim, playboyzinho?
— Eu vou citar todas as frases dos filmes da Marvel, até o final das
nossas vidas, loirinha.

Fim.
Eu vou dar tudo de mim para você
Você é o meu fim e o meu começo
Mesmo quando eu perco, estou ganhando
Porque eu te dou tudo de mim
All Of Me | John Legend

Alguns anos depois

— Vamos lá, Ollie. Isso vai ser fácil! — Verônica exclama, do outro
lado da sala.
Ok.
É fácil.
Só preciso entrar lá e dizer as palavras. Palavras que estão dentro de
mim desde aquela festa a fantasia, anos atrás. Palavras que apenas vão
concretizar tudo o que vivemos, durante todo esse tempo. Palavras que nem
ao menos imaginava que um dia estaria tão ansioso para proferi-las.
Além disso, programei tudo isso certinho. Nada pode dar errado.
Quer dizer, pode dar errado se Summer disser um belo não na minha
cara.
— Qual a chance dela dizer não? — pergunto nervoso.
Levi, que está do outro lado da sala, rola os olhos, entediado, e leva
o copo até os lábios, bebericando, antes de abandoná-lo na mesa e vir ao
meu encontro. Seus passos são lentos, ao mesmo tempo, alarga a gravata
borboleta.
Assim que para a minha frente, solta um suspiro, cruzando os
braços.
— Você é um dos maiores CEO’s de Saint Vincent e está com medo
de sua namorada? — Solta uma pequena gargalhada. — Vamos, Wright,
não seja um bundão!
Franzo o cenho incomodado.
— Você deveria me ajudar aqui, não atrapalhar.
— Eu estou te ajudando. — Ergue uma sobrancelha. — Faça essa
merda antes que Analu entre aqui, me arraste para aquela cadeira e me
obrigue a ficar lá, assistindo mais um filme dos Vingadores.
Endireito minhas costas, ao mesmo tempo que encontro um par de
olhos brilhando do outro lado da sala. Verônica está sorrindo para mim,
passando a mão pela barriga. Sei que está assim pelos hormônios da
gravidez, já que carrega dois monstrinhos que herdarão os seus genes e os
de Logan.
Atena e Noah nascerão em poucos meses e já estou ansioso para
esse momento. Acho que ver o nosso grupo crescendo, se tornando uma
nova geração, é de fato, algo que anseio. Anseio que eles cresçam longe de
todas as dores e machucados, que precisamos enfrentar para conseguir a
nossa felicidade.
Não apenas os filhos de Vee, mas os meus também. Caso a loira que
sou completamente apaixonado aceite o que irei propor hoje. O que desejo
há muito tempo.
Eu quero uma família com Summer.
Quero pequenos homens-aranhas correndo pela nossa sala.
Quero que Andrew e ela passem horas em nosso cinema.
Quero tudo.
Uma vida e mil e outras coisas.
Minha melhor amiga dá um passo à frente, vindo a nosso encontro.
Seu olhar nunca deixa o meu, assim que para ao lado de Levi, inclina a
cabeça para o lado.
— Você a ama?
É uma pergunta que todos sabem a resposta.
— Com cada átomo do meu corpo.
— Ela te ama? — pergunta mesmo sabendo a resposta.
Porém, mesmo assim, penso em todos os nossos momentos. Como
nos conhecemos anos antes, naquele píer. Como ela me esperou, segurou
nossas memórias, mesmo quando não sabia o que havia acontecido. Penso
em como me apaixonei perdidamente por ela, dia após dia. Em como seu
sorriso iluminou até mesmo as partículas mais escuras da minha alma.
Ela lutou por mim, mesmo quando eu não acreditava que havia
salvação.
Me segurou quando meu mundo desabava.
Me fez sentir que era suficiente.
Digno de amar e merecedor desse sentimento.
Eu penso em nosso acordo.
O acordo que deveria durar apenas meses e se transformou em algo
perpétuo em meu âmago.
Sem hesitar, um sorriso se estende pelo meu rosto.
— Mais do que pensei que um dia mereceria.
Verônica e Levi sorriem para mim, acompanhando o gesto.
— Ótimo, agora vamos lá. Você precisa pedir uma certa marvete em
casamento.

O céu está completamente estrelado.


Não há nada aqui além do píer iluminado. Caminho até onde há um
parapeito de madeira. No meu bolso frontal há algo que minha mãe me
entregou há dias e que, mesmo que desejasse tê-lo dado a Summer logo,
não consegui.
Não porque não desejava. Ao contrário. Todas as formas nas quais
pensei, eram tão frívolas que não fazia sentido. Summer merece mais que
uma declaração em palavras ou que um filme sendo reproduzido no cinema.
Ela merece o mundo todo. E mesmo que não aceite, eu seria capaz
de dar a ela cada resquício dele, até que sobrasse somente poeira
interestelar.
Seguro a proteção do píer com as duas mãos, encarando a água
calma do lago e me perguntando o que caralhos posso fazer para propor a
ela.
Para fazê-la minha. Minha esposa. Minha mulher. Minha por igual.
Um arranhar de garganta faz com que eu me vire, vagarosamente.
Um sorriso escancarado nasce em meus lábios, quando percebo quem é a
minha nova companhia.
Ela está parada perto da pequena escada que liga ao píer. Seus olhos
são brilhantes e o cabelo, agora um pouco mais curto do que antes, destaca
seus lábios pintados de uma cor clara. Uma coisa que nunca mudou. Seus
braços estão cruzados atrás de suas costas, destacando a camiseta horrível
do Homem-Aranha que tanto amo quando usa.
Summer.
A minha loirinha.
Ela é linda. Porra, perfeita!
Dou alguns passos à frente, ansioso para chegar até onde está.
A cada passo até ela, é como se me puxasse ainda mais para si. Um
sorriso cruza seus lábios, ao mesmo tempo que o meu se estende ainda
mais. Não há nada para nos parar, nós somos ímãs, se atraindo um para o
outro mesmo quando todos tentam fazer com que o movimento seja
contrário.
— Oi, playboyzinho.
Percebo que atrás de seu corpo, há algo que está escondendo.
— Oi, loirinha.
Summer morde o lábio inferior, segurando uma risada.
— Você quer saber um segredo meu?
Ergo uma sobrancelha.
— Eu posso te contar um meu também?
— Sempre.
Ela dá um passo à frente. Dou outro. Nossa distância finalmente
sendo quebrada.
Não há nada que nos separe. Somos únicos, suficientes.
Somos um aglomerado de sensações. Sensações que a cada
momento descubro que não desejo, em hipótese alguma, viver sem.
— Eu ainda tenho todos os seus instantes?
Sua pergunta faz com que meu cenho se franze. Encaro-a, confuso.
— Deixei que acreditasse ao contrário?
Medo. Medo sofrido e gélido sobe pela minha espinha. Enquanto
Summer solta uma risada gostosa, que invade cada parte da minha alma.
É contagiosa.
Daquelas que você não sabe que precisava, até que está desejando
mais pela cacofonia melódica que a outra pessoa emite.
— Não. Mas, acho que você precisará dividi-lo com outra pessoa.
Inclino minha cabeça para o lado, tentando entender onde Summer
quer chegar com isso.
— Andrew não precisa deles.
— Não estou falando de Andi — rebate, ainda sorrindo.
— Verônica?
— Jesus, não! — Uma careta nasce em seu rosto. — Ela já está
ocupada demais com a sua gravidez.
Umedeço meus lábios, semicerrando os olhos.
— Quem diabos, além de você, precisaria dos meus instantes, linda?
Summer ergue o rosto, quase colidindo nossos lábios. Seus olhos
encontram os meus.
É uma conexão.
Verde e castanho. Guerra e paz.
De repente, um sorriso se estende pelo seu rosto, que poderia até
mesmo comparar com a mais linda constelação da Via Láctea. Mas acredito
que nem mesmo isso seria suficiente. Summer é como uma estrela cadente,
daquelas que só aparecem a mil anos luz. Que é raridade.
— Peter Miller-Wright — suas palavras são baixas, quase que um
sussurro. — Nosso filho.
Meus olhos se arregalam ao mesmo tempo que suas mãos
finalmente se estendem para frente, me mostrando o pequeno macacão do
Homem-Aranha.
É lindo. Delicado. E pequeno.
Uma pessoinha que precisará de mim. Que conquistará todo o meu
coração. Dividirá todos os meus instantes com a mulher à minha frente, que
sorri para mim com lágrimas nos olhos.
Ele é a minha tentativa final. Não a tentativa de amar, porque esta
foi reivindicada por Summer. Ele será a minha tentativa de mostrar que
posso ser o melhor pai do mundo.
O super-herói de alguém. Que não precisará esperar que alguém
apareça em suas peças da escola, que correrá, brincará e mostrará a ele que
o meu abraço, sempre será o seu porto seguro.
— Você está grávida? — praticamente grito, segurando sua cintura e
sorrindo. — Porra, linda, e eu aqui achado que te pedir em casamento seria
o maior ato do meu dia.
— Esposa, hein? — brinca, segurando um sorriso.
— Alguma dúvida ainda? Porque se você achou que isso aqui —
balanço os dedos apontando entre nós dois. — Não é para sempre, sinto
muito em lhe dizer que estava equivocada.
Uma risada finalmente salta de seus lábios.
— Ah, é mesmo?
Me aproximo, deixando um selinho em seus lábios.
— Sem nenhum pingo de dúvidas. Você está presa a mim para
sempre, loirinha.
— E você a mim, playboyzinho.
— Graças a Deus! Porque não há outra pessoa no mundo que eu
deseje mais do que você, linda.
É a verdade. A mais pura e crua verdade. Summer transformou algo
que não tinha conserto, em uma arte linda, que ainda contém cicatrizes, mas
que não são mais algo que machucam. Elas são parte de quem somos.
Nossas histórias, nossas forças e o motivo pelo qual continuamos dançando.
Nós superamos os monstros em nossos armários. Os medos que nos
prendiam. As amarras do passado.
Nós superamos tudo.
Nada a não ser nós e essa criança que está chegando.
Nada mais importa, pois, vou ter um filho com a mulher que eu amo
e nós somos uma família.
Ela é minha maior fã. Assim como eu sou dela.
Somos Wanda e Visão. Peter e MJ. Natasha e Steve.
Nós somos uma dupla. Uma parceria.
E mal posso esperar para descobrir o que o futuro reserva para nós.
Sorrisos perfeitos e vidas perfeitas
Embora eu saiba que é tudo mentira
Não consigo evitar sentir que deveria mudar
Essa é para os solitários
Aqueles que vão para a cama e pensam que não têm ninguém
Lonely Ones | LOVA

A primeira vez que meu coração foi partido, eu tinha sete anos.
Era natal. Me lembro que nossa casa estava toda decorada para a
ocasião. Havia uma enorme árvore decorada no centro da sala, guirlandas,
pisca-piscas e até mesmo bonecos de neve que Verônica, Dylan, Oliver e eu
havíamos feito no jardim da frente, pela manhã.
Eu amava aquela temporada.
Amava porque era nessa ocasião que todos nós fingíamos ser uma
família feliz. Mamãe abandonava seus saltos e vestidos, substituindo-os por
pulôveres temáticos. Sua maquiagem bem elaborada, dava lugar a uma
suave.
E, mesmo que não fosse amorosa, não poderia dizer que não
continuava linda. Porque Amara Parker era a mulher mais bela do universo.
A mulher que um dia prometi que seria igual. A cópia perfeita.
Todavia, naquele natal, tudo mudou.
Mudou como os segundos correm pelo relógio, quando pedimos
para o tempo ir devagar. Mudou como o estado da água em um dia
ensolarado. Como um estalar de dedos.
Estávamos sentados à mesa, poucos minutos antes da ceia. Papai
sorriu para mim, me lançando uma piscadela. Ele contou como foi o dia
dele na empresa, como o novo clube da cidade daria lucros em breve. Como
seria nossas próximas férias em uma das ilhas paradisíacas que amávamos.
Éramos uma família completa. Com seus defeitos, mas ainda assim, uma
família.
Então, o toque de telefone emergiu na sala e tudo mudou.
Papai levantou, caminhou até onde o aparelho estava e o levou até
seu ouvido, escutando atentamente quem estava na outra linha.
No primeiro momento, senti que algo estava errado. Levantei meus
olhos arrumando o laço em meu cabelo e tentei sorrir, mostrar que tudo
ficaria bem. Porém, no segundo momento, ele olhou para minha mãe com
os olhos vazios. Com decepção irradiando de suas feições.
Mas foi no terceiro momento, que percebi que meu coração seria
quebrado diversas vezes. Que compreendi que estaria sozinha a partir dali. e
precisava ser o suficiente para mim e por mim. Pois ninguém faria isso.
Porque Henrique Parker, meu pai, caminhou até o onde seu casaco
estava, segurou a chave do seu carro e encarou minha mãe.
— Você não deveria ter feito isso — foram suas últimas palavras
antes de sumir, na data mais importante do ano para nós.
Ele sumiu a noite toda. Não houve ceia. Nem história para dormir
naquela noite. Não houve nada. A não ser o choro doloroso de mamãe,
vindo de sua biblioteca. Apenas a maquiagem suave borrada e uma garrafa
de vinho vazia quando entrei no recinto.
Lembro-me que caminhei até onde ela estava e segurei sua mão,
perguntando o que estava acontecendo. O porquê estava tão triste. Todavia,
não esperava que quando seus olhos encontrassem os meus, não houvesse
aquele amor, aquele cuidado e zelo com que sempre tratou.
Havia uma mulher machucada, destruída por alguém que amava. A
casca da mulher de antes.
Havia só uma mulher que acreditava no amor e foi destruída sem
aviso prévio.
— Sabe onde seu pai está no momento? — ela me perguntou,
sarcástica, sem me dar tempo de responder. — Com a outra família dele,
Analu. Ele está com a mulher que é apaixonado desde a adolescência. Está
com os responsáveis que um dia te tirarão tudo, não só o amor do seu pai,
mas, seus amigos, sua casa, sua vida. Você será como a gata borralheira. A
filha não desejada.
Lembro-me também que dei um passo para trás, assustada pelo
sorriso diabólico que se estendeu pelo seu rosto.
— Papai não faria isso.
— Não? E onde ele está agora, querida? — Sua voz era puro
veneno. — Ah, lembrei! Ele está com a família que ama de verdade.
Eu pude escutar o barulho do meu coração sendo quebrado.
Era doloroso.
Cruel.
Eu tinha apenas sete anos.
Era uma criança.
E… ele escolheu outra pessoa a mim.
Nunca descobri quem era a minha meia-irmã. Nem a mulher pelo
qual meu pai era apaixonado. A mulher que foi responsável pela ruína da
minha mãe e por ela ter virado seu rancor contra mim, por não ter sido a
filha favorita.
Eu nunca descobri nada disso.
Até hoje, nesse momento
— Você está me ouvindo, Henrique? — Mamãe grita, mesmo que
seu corpo fraco dificulte seus passos. — Você está ouvindo uma porra das
palavras que estou falando?
Meu pai se vira para ela. Os olhos escuros encaram-a com desdém,
antipatia.
— Estou tentando não fazer tal ato — grunhe. — Mas sua voz
insuportável dificulta isso.
A risada histérica dela rompe a sala de estar onde estão. Não é
novidade para ninguém dentro desta casa que eles apenas brigam. Que se
odeiam. Porém, hoje é como se tudo estivesse por um fio. Como se
ninguém mais suportasse viver em corda bamba.
Por um momento, um sorriso cruza meus lábios.
Este é o fim.
Eles vão se separar. Eu e Theo vamos ser livres disso. Nós vamos ter
paz.
Mas, como sempre, estou enganada.
— Oh! Você está correndo para ir ver a sua garçonete? — A
pergunta de mamãe é frívola. — Diga a ela e aos bastardos que a verdadeira
Senhora Parker está mandando lembranças.
As narinas de papai se dilatam, seus olhos a fuzilam.
— Não. Fale. De. Amanda! — grita pausadamente. — Nunca fale
dela!
Sua risada aumenta, mas, desta vez, é desprovida de emoção.
— Por que não? Eu sou a mulher traída aqui, querido. Eu gerei seus
herdeiros. Eu! — Suas unhas compridas batem contra tecido do terno caro
dele. — No final do dia, eu ainda sou a esposa respeitada, a mulher que sai
ao seu lado nas capas de revistas, a que é convidada para os bailes e
almoços, com outras esposas de aristocratas. Eu, Henrique. Não ela. Ela é
apenas a prostituta que engravidou de um herdeiro milionário, para sair bem
na vida.
Engulo em seco, apertando o parapeito do segundo andar. Nenhum
deles percebeu minha presença. Nenhum deles sabe que escuto toda a
conversa. Até mesmo penso em voltar para meu quarto, mas, é como se
meus pés estivessem fincando raízes no piso e ignorasse meu comando para
sairmos.
— Você é uma hipócrita de merda! — Papai devolve, irritado. —
Você me deu Analu, apenas isso. Todos nós sabemos de quem realmente
Theo é filho.
Não.
Não.
Não.
Theo não.
— Vamos jogar na cara um do outro? Que ótimo! — Sua voz sobe
um decibel. — Vamos lá em cima e dizer a Analu que você também deu a
ela uma irmã fora do casamento. Vamos dizer que a bastarda está sempre
por perto. Que você a colocou no mesmo colégio e na porra da mesma
universidade. No mesmo ciclo de amigos. Vamos lá e contar a nossa filha
que o resultado da sua traição com a prostituta, se senta na mesa dos seus
amigos. Finge ser uma boa garota, depois de roubar o posto dela, de melhor
amiga de Verônica. E namora Dylan Blackwell? Ah, não vamos deixar de
fora que também rouba o papai em todos os natais?
Meu pai dá um passo à frente, encarando-a.
— Analu, querida, venha aqui! — Ela grita, sem se importar com
papai. — Temos uma novidade.
— Ama…
Tudo em mim dói.
Tudo rompe.
Respirar é algo que não consigo.
Hazel.
Hazel, que não gostava da minha presença.
Hazel, que se sentou ao meu lado horas atrás e sorriu.
Hazel, que teve todas as oportunidades de me dizer e nunca disse.
Hazel Grace… Grace como minha avó.
É minha irmã. Minha maldita irmã.
— Chega! — Grito.
O som ressoa pela mansão toda.
Meus pais olham para mim, com os olhos arregalados. Eles não
perceberam que eu estava aqui. Eles nunca olham para mim. Por isso, não
me surpreendo.
— Querida… — Henrique começa.
— Vocês são pais de merda! — exclamo, descendo as escadas. —
Vocês me negligenciaram. Me fizeram ter diversos traumas. Não me deram
suporte. Nem ao menos foram em alguma das minhas partidas, verem como
a filha de vocês é boa no esporte que pratica. Vocês são os piores pais.
Então… não me usem para aplacar a briga idiota de vocês. Nunca. Mais.
Me. Usem.
Não espero pela resposta.
Apenas me viro, batendo meus saltos no chão e seguindo para o
único lugar onde preciso estar. Para o único lugar onde sei que minha raiva
vai ser aplacada.
Chega de fugir dos meus problemas. De mascarar minhas dores.
Chega!
Estou cansada de fazerem isso comigo.
Cansada das pessoas acharem que podem pegar pedaços do meu
coração. Que podem me machucar e sair impunes. Que por ser insensível,
sou ingênua.
Mas, o que poucos sabem, é que por baixo de tudo isso; das
máscaras, das respostas e das atitudes, há uma garotinha que acreditava em
contos de fadas. Eu colocava o mundo na frente dos próprios desejos e me
doava mais do que recebia. Isso nunca me levou a ser a primeira opção,
sempre foi aquela que lembravam apenas quando precisavam.
Tive as primeiras decepções cedo. O primeiro coração partido não
veio de um garoto qualquer, veio do meu próprio pai. Depois vieram
inúmeros outros, porque é isso, quando não encontramos aquele amor em
casa, quando não somos enxergados e queridos no lugar onde chamamos de
lar, nós passamos a personificar isso em qualquer pessoa.
Nessa personificação, eu deixei que tirassem pedaços importantes
demais meus. Deixei que meus pais me odiassem por não ser aquilo que
queriam. Deixei que meu coração se apaixonasse por Mike Burhan, um
idiota que era obcecado na minha melhor amiga. Deixei que destruísse
minha amizade com a única pessoa que segurou meu mundo, apenas porque
meu pai foi ambicioso.
Deixei que o mundo acreditasse que eu era uma vadia sem coração.
Deixei tanto, porque, cada pessoa que um dia valorizei, me doei,
tirou um pedaço de mim, me estilhaçou lentamente, até que só restasse
minhas máscaras.
Então, todos podem me chamar de tudo. Vadia, insensível,
manipuladora… Mas há algo que ninguém poderá me chamar, de fraca.
Nunca, em hipótese alguma. Porque eu lutei uma batalha sozinha, sobrevivi
por mim e sempre me coloquei em primeiro lugar.
Agora, enquanto subo os degraus da mansão Blackwell, estou
fazendo o mesmo.
Estou retribuindo todas as vezes que fui negligenciada, martirizada e
feita como um experimento de um casamento fracassado.
Caminho a passos lentos, quase que parando, pela enorme sala de
estar vazia. Seguindo até a área externa, onde todos estão. Oliver e Summer
estão sentados em uma espreguiçadeira, rindo. Depois de tudo o que
passaram, realmente merecem a tranquilidade que emanam deles.
Do outro lado, Josh, está sorrindo para mim. Meu olhar rola pelo
ambiente, à procura de uma certa pessoa, mas apenas encontro Verônica,
Logan e Ed parados à beira da piscina conversando.
E há Levi. O idiota egocêntrico que havia me atingido em um lugar
bem profundo, quando disse que eu sempre era uma segunda opção. Bem,
ele estava certo.
Eu odeio quando me fazem sentir assim. Sem saída. Sem
escapatória.
Foi o que ele fez. Pela primeira vez, alguém me fez ficar sem
resposta. Sem reação. Tocou em algo inerte em meu peito e eu odeio isso.
Odeio que além de competir comigo, em tudo, ele ainda teve a audácia de
achar que era bom o suficiente para me diminuir.
De relance, a pessoa que estava procurando passa pelas portas
abertas, ao lado de Dylan.
Eu nunca havia reparado em Hazel. Nunca me chamou a atenção de
que ela poderia ser uma traidora de merda. Uma aproveitadora sem
escrúpulos. Mas é isso que acontece quando você abaixa a guarda, quando
permite que as pessoas adentrem seu peito.
Eles te traem. Te machucam e recolhem todas as partes boas.
— Parker? — Summer me chama, erguendo uma sobrancelha.
Olho-a de relance, sorrindo friamente. Oliver, que está ao seu lado,
apenas semicerra os olhos, encarando-me. É como se ele soubesse o que
estou prestes a fazer, como se me dissesse que se isso machucar Summer, o
meu problema será com ele.
Logan, por outro lado, entrelaça sua mão na de Verônica e
caminham rápido até onde estou. O casal de ouro de Saint Vincent sempre
aparece para salvar os amigos, sempre são a válvula de escape.
Percebo, então, que eles sempre foram assim.
Sempre foram família. A família dela. Sempre escolherão Hazel em
vez de mim.
Eu sou a penetra. A indesejada. A segunda opção.
Está com os responsáveis que um dia te tirarão tudo, não só o amor
do seu pai, mas, seus amigos, sua casa, sua vida.
A voz da minha mãe invade meu subconsciente.
Ela estava certa. Eles me tiraram tudo.
Cada coisa que acreditei ser minha.
Encaro Hazel com um sorriso sarcástico no rosto. Seus olhos
grandes e escuros me encaram confusa, mas ao mesmo tempo, é como se
ela soubesse. Dou um passo para trás, jogando meu cabelo por cima do
ombro. Mascarando todas as minhas emoções, até restar apenas frieza em
meu olhar. Apenas ódio por tudo o que passei. Por tudo que me tiraram.
Eu estou sozinha.
Para sempre a segunda opção.
— Hazel, querida, você já contou a eles que você é minha irmãzinha
bastarda?
Quando as primeiras linhas, da história do terceiro livro surgiram,
durante a minha última semana no estágio, num momento em que estava
perdida e com medo, eles me fizeram sorrir. Me fizeram entender que eles
eram os meus próximos protagonistas. E o sorriso que soltei foi maior do
que qualquer outra reação já esboçada, enquanto criava essa série.
Naquele momento compreendi que, sim, eles foram feitos para ficar
juntos.
Analu Parker e Levi Johnson são almas gêmeas. Eles não são fáceis,
não são o casal que todos imaginavam, mas a química foi instantânea e a
história logo nasceu em meu peito.
Por isso, digo que nós nos veremos logo em Saint Vincent 3, com a
história da garota insensível e o capitão do time de natação, que
conquistaram a todos.

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Escrever War of Hearts foi um desafio. Um desafio em que me
perguntei trocentas vezes se valeria a pena, se realmente deveria seguir com
a história de Oliver e Summer. E eu consegui. Consegui fazer com que eles
chegassem até vocês, que pudessem viver e sentirem essa história linda e,
ao mesmo tempo, dolorosa. Uma história que me fez repensar em vários
pontos da minha vida, me fez voltar a acreditar que todos somos
merecedores do amor e que mesmo machucados, podemos ser felizes.
E, para fazer isso, nunca estive sozinha. Tive pessoas incríveis ao meu
lado que surtaram, apoiaram e seguraram a minha mão durante todo o
trajeto. Por isso, por elas, eu estou escrevendo esses agradecimentos agora.
Em primeiro lugar, quero agradecer a minha mãe, meu braço direito, que
me apoiou quando disse que estava largando um emprego para me dedicar à
WOH. Eu te amo, obrigada por ser meu maior apoio, por me lembrar de
dormir e me xingar quando estou ultrapassando meus próprios limites. Você
é gigante, mãe!
À minha irmã, Maria Júlia, que se sentou ao meu lado inúmeras vezes,
me fez companhia, enquanto criava Saint Vincent, e me perguntou se eu
poderia escrever um livro sobre ela. Eu te amo, meu amor, até a lua, ida e
volta.
À minha tia Laisa, que me apoiou e sorriu em todas as minhas
conquistas. Você é incrível e eu te amo para sempre.
À April Jones, que enquanto escrevo essas linhas está criando um dos
meus livros favoritos. Que surtou comigo em cada processo desse livro,
virou noites ao meu lado para que ele chegasse até vocês. Amiga, quando
trocamos uma mensagem na DM pela primeira vez, nunca imaginei que ali
estava conhecendo uma das minhas melhores amigas. Eu te amo. Você é
gigante, merece todo o sucesso do mundo e obrigada por chutar a minha
bunda quando pensei em desistir de WOH, por virar noites comigo
enquanto tagarelava sobre Oliver me tirar do sério, e por sempre me apoiar.
À L. Júpiter, a criadora do meu velho favorito e esposa – não oficial –
do Oliver. Amiga, você chegou de repente na minha vida, mas, foi uma das
melhores amizades que conquistei em 2022. Obrigada por me apoiar, por
surtar e por ser tão incrível. Eu não terminaria WOH sem você e suas
risadas, sem nossos sprints da madrugada e sem que chutasse a minha
bunda todas as vezes que disse que não conseguiria. Eu te amo, Asteca. O
mundo é pequeno para você!
Ao Grupo do Cano (April e Júpiter), que me ensinou que amizades
podem ser construídas quando menos esperamos. Obrigada por
proporcionarem uma amizade como a da Vee e do Ollie. Por serem as
minhas pessoas e estarem dispostas a me ajudar, por terem virado noites e
noites, para que conseguíssemos entregar nossos projetos na data esperada.
Por soltarem pérolas insuperáveis. Obrigada também por salvarem o meu
2022, mesmo com quilômetros de distância nos separando. Conhecer vocês
tornou tudo mais suportável. Vocês me mostraram o significado de amizade
mesmo quando o mundo ruía ao nosso redor. Eu amo vocês por 24h, depois
disso já sabem, né?
À Ketlyn, minha beta e amiga. Quando você chegou na minha vida,
nunca imaginei que se tornaria tão especial. Os seus áudios – ofendendo
minorias e me xingando – tornou a escrita desse livro uma aventura
inigualável. Obrigada por tudo, pelos surtos, pelas mensagens, por ser
responsável pela metade da playlist e por tudo o que representa na minha
vida.
À minha assessora e revisora, Camille Gomes, que enquanto eu escrevia
este livro, lidava com todo o resto. Amiga, você é foi luz para minha vida.
Eu te amo e obrigada por tudo!
À minha equipe de adms do grupo de leitoras: Isabella Martins, Isabela
G., Lari e Lívia. Obrigada por me darem suporte. Vocês são incríveis.
À Pigmalateia, minha segunda revisora, que passou semanas revisando
War of Hearts para que ele chegasse até vocês da forma como imaginei.
Obrigada por ter embarcado nessa loucura que é Saint Vincent ao meu lado
quando gritei por ajuda. Você é incrível!
Ao meu time de betas: Bruna (a nossa marvete, assim como Sum),
Eduarda (que moraria em Saint Vincente, se pudesse), Esther Hadassa (a
memória de Dory que me mandava mensagem surtando com as teorias),
Isabella Martins (que queria guardar todos em um potinho - menos o
Brandon), Maria Eduarda Klazer (a presidente do jurídico do Oliver), Iza
Frazão (a maior fã de Oliver Wright), Ketlyn (que ofendeu dez minorias a
cada aúdio) e Thais (que surtou a cada frase e amou esse livro a cada
capítulo); Obrigada por terem tido paciência quando excluí tudo e comecei
do zero. A ajuda e o apoio de vocês foram essenciais para que Oliver e
Summer nascessem.
À Amanda e Larissa, minhas melhores amigas. Que mesmo que eu
tenha negligenciado a nossa amizade durante esses meses, apareceram na
minha casa e se sentaram ao meu lado, enquanto criava esse mundo, me
apoiaram e se orgulharam por tudo o que construí. Vocês são as melhores
amigas que eu poderia ter.
À Isadora Lacerda, minha leitora crítica e, Isamara Gomes, minha
leitora sensível, obrigada por terem embarcado nesse mundinho que é Saint
Vincent e me ajudado a escrever esse livro de forma responsável.
Às minhas parceiras de lançamento, que criaram conteúdos incríveis,
que fizeram WOH chegar até vocês. Obrigada a cada uma. Vocês foram
incríveis. Obrigada por tudo!
Por último e não menos importante, a todos os meus leitores, que me
acompanharam até aqui. Que são o motivo pelo qual ainda continuo
dançando. O apoio de vocês me incentiva a continuar a criar Saint Vincent.
Mesmo quando tudo o que desejo é correr no sentido contrário, vocês me
mostram o quão gigante a nossa cidade caótica é. Saint Vincent e todas as
histórias presentes nela, só existem por causa de vocês!

Com amor,
Annie Belmont.
SUMÁRIO
WAR OF HEARTS
NOTA DA AUTORA
AVISO DE GATILHO
PLAYLIST
PRÓLOGO
01 | CRIANDO LAÇOS
02 | MEDIDAS DRÁSTICAS
03 | PRIMEIRA FESTA
04 | ARRUINADO POR COMPLETO
05 | PROPOSTA
06 | UM CASAL DE MENTIRA
07 | PROPÓSITOS
08 | ESTAMOS NISSO JUNTOS
09 | LUGAR FAVORITO
10 | OITO ANOS
11 | REGRAS BÁSICAS
12 | INÍCIO DE SEMESTRE
13 | OÁSIS
14 | BEM-VINDO AO JOGO
15 | MALDITO DÉJÀ-VU
16 | ENCONTROS
17 | TEMPO EMPRESTADO – PARTE I
17 | TEMPO EMPRESTADO – PARTE II
18 | DEZ ANOS
19 | VESTIDO PERFEITO
20 | UMA CAMA SÓ
21 | CENTRAL PARK
22 | TODOS OS MEUS INSTANTES
23 | COMPLETAMENTE MALUCO
24 | INIGUALÁVEL
25 | O COMEÇO DO NOSSO DECLÍNIO
26 | EU ESTOU AQUI POR VOCÊ
27 | VOLTAR A DANÇAR
28 | QUATORZE ANOS – PARTE I
29 | VOCÊ É A MINHA DUPLA
30 | PARTE PERDIDA
31 | EU PRECISO DELAS
32 | MOTIVO DAS MINHAS PERDAS
33 | DESTRUÍDOS – PARTE I
34 | DESTRUÍDOS – PARTE II
35 | CLUBE DOS HOMENS
36 | CAÍMOS PELA ÚLTIMA VEZ
37 | QUER COMPANHIA?
38 | ÚLTIMO ENCONTRO
39 | BAILE ANUAL
40 | ÚLTIMA DANÇA
41 | ESTAMOS ACABADOS
42 | QUATORZE ANOS – PARTE II
43 | CORRIDA MATINAL
44 | FIM DE JOGO
45 | NÓS VANCEMOS
46 | VOCÊ PODE TUDO
47 | VINTE E UM DE MARÇO
48 | ÚLTIMA TENTATIVA
EPÍLOGO
BÔNUS: SEGUNDA OPÇÃO
NOTAS FINAIS
AGRADECIMENTOS
SUMÁRIO
[1]
Wall Street é uma rua que corre na região inferior de Manhattan, e é considerada o coração
histórico do atual Distrito Financeiro da cidade de Nova York.
[2]
Obra de Sarah J. Maas, autora de ACOTAR.
[3]
Você deve ser a loirinha?
[4]
Chef renomado, premiado com várias estrelas Michelin e uma estrela da telinha no Reino Unido e
internacionalmente, com programas como Kitchen Nightmares, Hell's Kitchen, Hotel Hell e
MasterChef US.
[5]
Obra da autora Elena Armas.
[6]
Obra da autora Ali Hazelwood.
[7]
Obra da autora Elle Kennedy.
[8]
Obra da autora Shelby Mahurin.
[9]
Obra nacional da autora L. Júpiter, disponível na Amazon e no Kindle Unlimited.
[10]
Obra da autora norte-americana Sarah J. Maas.
[11]
Personagens da série Grey 's Anatomy.
[12]
Lista emitida anualmente pela revista Forbes que destaca os mais brilhantes empreendedores do
mundo todo.

[13]
figura de linguagem que coloca palavras de significados opostos lado a lado, criando um
paradoxo que reforça o significado das palavras combinadas.
[14]
É uma série de filmes de animação da Disney, produzido pela Pixar.
[15]
Filme da franquia Marvel dirigido por Joss Whedon.
[16]
Wanda Maximoff é uma personagem fictícia interpretada por Elizabeth Olsen na franquia de
mídia Universo Cinematográfico Marvel (UCM).
[17]
Ator e produtor de cinema norte-americano.
[18]
Filme norte-americano de 1986, dirigido por Tony Scott, produzido pela Paramount Pictures e
estrelado por Tom Cruise.
[19]
Filme da franquia Marvel dirigido por Cate Shortland e estrelado Scarlett Johansson e Florence
Pugh.
[20]
O brunch recebe esse nome porque é a junção de breakfast e lunch, ou seja, é a junção do café da
manhã e do almoço.
[21]
The Maze Runner ou Maze Runner é uma saga de livros do escritor americano James Dashner
[22]
The Hunger Games é uma trilogia literária de aventura e ficção científica, escrita pela americana
Suzanne Collins.
[23]
Museu mais visitado de Nova York. É o sétimo no mundo, com mais de 6 milhões de visitas por
ano.
[24]
Série de televisão norte-americana de drama adolescente, baseada na série literária da escritora
Cecily von Ziegesar.
[25]
Obra da autora Lyssa Kay Adams.
[26]
Clube da Luta é um filme dirigido por David Fincher com Brad Pitt, Edward Norton.
[27]
O Empire State Building foi o edifício mais alto do mundo de 1931 a 1972. Atualmente é o sexto
prédio mais alto de Nova York.
[28]
Grey’s Anatomy é um drama médico norte-americano exibido no horário nobre da rede
ABC.
[29]
É um tipo de transtorno dissociativo que envolve a incapacidade de recordar importantes
informações pessoais que tipicamente não seriam perdidas pelo esquecimento normal. É geralmente
causada por trauma ou estresse.
[30]
Clea Strange ou somente “Clea” é uma personagem da Marvel Comics que foi criada pelo
famoso escritor Stan Lee e o artista Steve Ditko.

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