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Enfermagem em Saúde Coletiva II

EVOLUÇÃO DAS POLÍTICAS DE SAÚDE NO BRASIL

Ao longo da história do Brasil, acompanhando a evolução do sistema político, as políticas de


saúde foram sendo modificadas de acordo com as demandas do governo, assim como resposta às
reivindicações de movimentos sociais. A seguir, será apresentada a cronologia destes fatos.
Saúde dos povos indígenas do Brasil colônia
Na carta de Pero Vaz de Caminha foi descrita a admiração portuguesa pela higiene dos
indígenas:
“Eles, porém, com tudo andam muito bem
curados e muito limpos, e naquilo me parece
ainda mais que são como aves ou alimárias
montesas que lhes faz o ar melhor pena e
melhor
cabelo que às mansas, porque os corpos seus
são
tão limpos e tão gordos e tão formosos, que não
pode mais ser (...)”
(Pero Vaz de Caminha)

O contato dos índios com a água era desde cedo e diversas vezes ao dia, fato esse que se
deve principalmente pela abundância de rios e lagos na geografia brasileira. Inclusive prisioneiros
que teriam como destino a antropofagia passavam por um banho por conta do ritual. Foi observado
também que os indígenas delimitavam áreas restritas para necessidades fisiológicas e disposição de
detritos

Brasil colônia
O Brasil inicialmente foi colonizado por exilados e aventureiros e, por servir basicamente
como colônia a ser extraída, não dispunha de nenhum modelo de saúde. Nessa época a atenção à
saúde limitava-se às plantas medicinais, e aos conhecimentos empíricos de curandeiros. A carência
de profissionais médicos era tão grande que há registro de apenas 4 médicos exercendo a profissão
no ano de 1789.
A inexistência de médicos deu espaço para a procura de boticários (farmacêuticos),
caracterizados por profissionais sem aprendizado acadêmico que acompanhavam o serviço de uma
botica, prestavam exame e se aprovados recebiam uma carta de habilitação. Cabiam a eles a
manipulação de fórmulas prescritas pelos médicos, mas na verdade eles próprios tomavam a
iniciativa de indicar o tratamento para as demandas da população.
Responsáveis pelo sustento e tratamento de doentes e “expostos” (recém-nascidos
abandonados), foram instaladas no Brasil as Santas Casas de Misericórdia, sendo a primeira
fundada em Santos (1543). O tratamento basicamente era doutrinado por preceitos cristãos de
auxílio espiritual, sem bases científicas.

Chegada da Família Real Portuguesa (1808)


Os hábitos da população brasileira até então eram
descritos da seguinte forma:
∙ Homens comiam com facas e mãos e, ao
saciarem-se, limpavam as mesmas na toalha.
∙ Mulheres cuspiam no chão à qualquer hora e
qualquer lugar. O dejetos das casas eram
guardados em barris, sendo despejados em
terrenos baldios e no mar à noite pelos
“Tigres” (escravos que, em decorrência de sua
função, acabavam tendo as costas manchadas joomla/images/stories/historia_da_mare/1808a.jpg
Fonte: http://www.museudamare.org.br/
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pela amônia dos detritos provenientes dos barris que porventura caiam em sua pele).

Com a vinda da Família Real Portuguesa, o país passou a ter outros interesses que não somente
o extrativismo. Sentiu-se necessidade maior de estruturação de ruas, saneamento de portos,
construção de hospitais e formação de profissionais médicos.
Em 1808, Dom João VI fundou na Bahia o Colégio Médico cirúrgico e ordenou que fossem
instaladas redes de coleta e escoamento das águas proveniente da chuva (porém somente onde a
aristocracia residia). Também foram abertos os portos do Brasil, e concomitante foram instituídas
regras de controle sanitário dos produtos à serem comercializados, assim como para o controle da
propagação de doenças (principalmente epidêmicas).

Início da República (1889-1930)


Ocorreu no Brasil a proclamação da república, sendo esta uma nova forma de organização
do governo. Passou-se por um período de controle político por parte dos grandes proprietários
(coronelismo) e alianças pelos interesses regionais (política do café-com-leite).
Sem um modelo sanitário, as epidemias imperavam no país (varíola, malária, febre amarela,
peste negra). O Rio de Janeiro apresentava um quadro sanitário tão caótico que acabou gerando
consequências inclusive para o setor econômico (navios estrangeiros espalhavam a notícia de que
não aportariam nas costas “pestilentas” do Brasil).
No período de 1902 a 1906 o então presidente Rodrigues Alves lançou um plano de
reurbanização, saneamento e reforma dos portos com a finalidade de incentivar o turismo, apoiar os
cafeicultores (exportação) e favorecer a imigração (industrialização do país). Para isso, logo no
início do seu mandato nomeou Oswaldo Cruz como diretor geral de saúde pública.
Oswaldo Cruz se propôs a erradicar a
epidemia
de peste bubônica e febre amarela da cidade do
Rio de
Janeiro. Para isto, instituiu uma série de medidas
com
ênfase na repressão e vigilância das policias
sanitárias:
∙ Para combater a peste bubônica,
determinou a caça de ratos (cujas
pulgas
eram responsáveis pela infestação
de
peste). A população recebia uma
quantia
em dinheiro para cada rato que
fosse
entregue ao governo. Porém, com o
tempo alguns indivíduos passaram
a
manter criadouros de ratos como
forma
de falcatrua do sistema implantado;
∙ Foi montado um esquadrão com cerca de
50 homens vacinados que percorriam
becos espalhando raticida, mandando
recolher o lixo entulhado, além de
invadindo as casas para queimar colchões
e roupas;
∙ No caso da febre amarela, foram criadas
as chamadas “Brigadas de mata
mosquitos”, responsáveis por promover a Fonte: http://chc.cienciahoje.uol.com.br/wp
desinfestação das casas com inseticidas, despejar content/uploads/2011/11/cruz4b.jpg
petróleo em alagados, entre outras medidas;
∙ Para o combate da varíola, foi instituída a obrigatoriedade da vacinação. Muitos
médicos estavam descrentes quanto à eficácia dessa vacina, assim como adeptos do
positivismo criticavam a imposição das mesmas, ferindo o direito de escolha do
cidadão em se vacinar ou não.

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O modelo de saúde implantado por Oswaldo Cruz ficou conhecido como Campanhista,
concebido dentro de uma visão militarizada em que os fins justificam os meios. Porém, a invasão
das casas para queima de colchões e roupas, aplicação de inseticidas com vedação das mesmas e a
obrigatoriedade das vacinas acabaram por gerar movimentos sociais contrários à tais imposições, o
que acabou por culminar na Revolta da Vacina.
Apesar das arbitrariedades do modelo campanhista, o mesmo obteve importantes vitórias no
controle de doenças epidêmicas, conseguindo inclusive erradicar a febre amarela na cidade do Rio
de Janeiro. Oswaldo Cruz ainda organizou a diretoria geral de saúde pública, criando uma seção
demográfica (o que possibilitou conhecer a composição e os fatores vitais da população brasileira),
um laboratório bacteriológico, um serviço de engenharia sanitária e o instituto soroterápico federal,
posteriormente transformado no Instituto Oswaldo Cruz (concedendo ao Brasil a possibilidade
de fabricação de produtos profiláticos para uso em massa).
Sucessor de Oswaldo Cruz,
Carlos
Chagas foi responsável, entre outras
ações,
por reestruturar o Departamento
Nacional
de Saúde (ligado ao Ministério da
Justiça).
Como exemplo de sua contribuição,
introduziu a propaganda e a educação
sanitária na técnica rotineira de ação,
inovando o modelo anterior que
possuía
caráter meramente fiscalizatório e policial,
criou órgãos especializados na luta contra
tuberculose, lepra e as doenças venéreas,
além de fundar (em 1923) a primeira escola
de enfermagem do Brasil, a Escola Anna Nery gerado pela cultura de exportação brasileira,
do Rio de Janeiro.
Com o tempo e o acúmulo de capital Fonte: https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/
5/5c/Greve_geral_1917_(s%C3%A3o_paulo).jpg

tornou-se possível o início da industrialização no Brasil. Deu-se preferência à utilização de mão-de


obra imigrante, particularmente pelo fato de já terem conhecimento na área. Porém, não eram
oferecidas condições decentes de trabalho ou qualquer forma de garantia trabalhista.
Junto com a experiência do trabalho em industrias, os imigrantes italianos e portugueses
trouxeram em suas bagagens a história de conquistas dos direitos através de mobilizações e, desta
forma, mobilizaram a classe operária brasileira na luta por melhores condições de trabalho,
culminando em duas grandes greves do movimento operário (1917 e 1919). Em resposta, o
Congresso Nacional aprovou em 24 de Janeiro de 1923 a Lei Eloi Chaves, que propunha a criação
das Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAP):
∙ As CAPs eram fundos administrados pelas empresas e criados somente através
movimentos e reivindicações dos próprios operários (ou seja, não tinha
caráter automático);
∙ O beneficio das CAPs era apenas para operários do meio urbano, e sua
formação era através da contribuição mensal dos funcionários e anual da
empresa (entre outras formas de arrecadação);
∙ Garantiam aos funcionários que às pagassem uma aposentadoria, assim como
auxílio no caso de acometimento de doenças ao trabalhador e família. Eram
garantidos também a compra de medicamentos com preços especiais aos
adeptos deste sistema;
∙ Eram administradas por um conselho composto por representantes da empresa e
representantes dos trabalhadores;

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Getúlio Vargas (1930)
Com a crise mundial de 1929, imobilizou-se temporariamente o setor agrário-exportador.
Entre outros fatos políticos que acometiam a época, foi derrotada a supremacia da política do café
com-leite, dando início ao governo de Getúlio Vargas.
Desta primeira etapa do governo Vargas, podem se destacar a criação dos “Ministério do
Trabalho”, “Ministério da Indústria e do Comércio” e “Ministério da Educação e Saúde Pública” e a
extinção do Departamento Nacional de Saúde, sendo muitas das atividades sanitárias pulverizadas
(fiscalização de alimentos pelo Ministério da Agricultura, higiene e segurança do trabalho pelo
Ministério do Trabalho).
Em 1939 foi regulamentada a justiça do trabalho, sendo em 1943 homologada a
Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que regulamenta as relações individuais e coletivas de
trabalho.
Gradativamente, as antigas CAPs foram substituídas pelos Institutos de Aposentadoria e
Pensão (IAPs), sendo estes muito semelhantes às CAPs, porém organizados por categoria
profissional (bancários, marítimos, comerciários,
industriários, etc.). O primeiro IAP criado foi dos
Marítimos (IAPM - 1933), que previa para seus
segurados aposentadoria, pensão em caso de
morte para os membros da família, assistência
médica e hospitalar e socorros farmacêuticos.
Assim como no caso das CAPs, um
grande montante de capital foi gerado pelos IAPs.
Porém seu uso nem sempre foi direcionado ao
propósito de sua criação, sendo muitas vezes
utilizados para o financiamento da
industrialização e do crescimento econômico do
país.
Outro fator importante é que a saúde ainda era vista
como questão secundária à aposentadoria, sendo Ditadura Militar (1964-1985)
fornecida principalmente através da compra de Fonte: http://brasilescola.uol.com.br/upload/e/ Vargas%20-%
serviços privados. 20Educador.jpg

Diante do cenário político da década de 60, o Brasil acabou sendo acometido pelo golpe
militar, responsável por grandes modificações no que tange a saúde pública. Os IAPs mostraram-se
bastante diferentes em relação à sua capitalização. Enquanto alguns ofertavam uma ampla gama de
opções composta por hospitais e serviços especializados aos seus beneficiários, outros amargavam
com a pouca arrecadação inerente à posição econômica ocupada pela categoria inserida no IAP.
Buscando uma forma de apoio popular para consolidar a legitimidade do regime militar,
voltaram-se os olhares para a Previdência Social. Em posse de dados que formalizavam a
heterogeneidade dos Institutos, foi proposta a unificação em um Instituto Nacional de Previdência
Social (INPS). Este foi criado em 1967 através da unificação dos IAPs (exceto o Instituto de
Pensões e Assistência dos Servidores do Estado), com vistas na oferta de serviços de assistência
previdenciária à toda a população trabalhadora. Sendo assim, todo o trabalhador urbano com
carteira assinada passou automaticamente a ser contribuinte e beneficiário do sistema (o que gerou
um volume grande de recursos financeiros, principalmente em função do pequeno percentual de
aposentadorias e pensões em relação aos contribuintes).

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Com a unificação dos IAPs, o governo militar viu-se obrigado a prover a assistência médica
dos beneficiários, e neste momento as estatísticas não ajudaram. Aumentando o número de
contribuintes, diretamente proporcional era o aumento dos beneficiários. Porém não havia cobertura
para tantos usuários, sendo optado direcioná-los para a iniciativa privada (comprando seus
serviços). Houve grande capitalização do setor médico-hospitalar, acarretando efeito cascata com o
aumento do consumo de equipamentos médicos e medicamentos, o que culminou na necessidade de
criação de um sistema próprio para tratar desta complexidade. Foi então criado o Instituto Nacional
de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS – 1978).
A pouca destinação de
recursos para o Ministério da
Saúde (responsável pela
coordenação da política nacional
de saúde, ações preventivas,
controle de drogas e
medicamentos e pesquisa
médico-sanitárias) acabou
incapacitando o mesmo à
desenvolver ações de saúde
públicas propostas, tornando-o
praticamente um órgão
burocrático-normativo.

Por advento da crise no


modelo econômico proposto pela
Fonte: ditadura militar, acabou culminando na acentuação
http://www.fatosdesconhecidos.com.br/wp-content/uploads/
das diferenças econômicas da população (ricos
2015/03/educ a%C3%A7%C3%B5.jpg
mais ricos,
pobres mais pobres). Com o desemprego, marginalização e aumento das favelas, o modelo de saúde
previdenciário passou a acentuar também as suas dificuldades:
∙ Priorizando a medicina curativa, era incapaz de resolver problemas de
amplitude coletiva, como endemias e epidemias;
∙ Constante aumento da medicina curativa, uma vez que esta tornava-se cada vez
mais especializada;
∙ Diminuição do crescimento econômico e consequente redução na arrecadação;
∙ Desvio das verbas que deveriam ser destinadas à previdência e à saúde;
∙ Não
repasse
da
união
de
verbas
ao
setor

previdenciário;

VIII Conferência Nacional de Saúde


(1986)

Através de discussões emergentes


dos movimentos estudantis, de
profissionais da saúde e da população
organizada, foram discutas na VIII
Conferência Nacional de Saúde a
necessidade de uma reforma sanitária mais
profunda, revendo a legislação no que se
refere às ações de promoção, proteção e
recuperação da saúde, além da posição da
saúde em caráter de direito público e dever
do Estado em provê-la.

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O texto das discussões ocorridas nesta conferência foram de vital importância para a
posterior incorporação da Secção II, referente à saúde, na Constituição Federal Brasileira.

Constituição Federal Brasileira (1988)


Em 1988 foi então realizada a reforma política com a elaboração da Constituição Federal
Brasileira (CF);
Como mencionado anteriormente, foi incorporada à CF parte do que fora discutido na VIII
Conferência Nacional de Saúde, mais precisamente na Secção II – Da Saúde – Art. 196. A saúde é
direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à
redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e
serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Sistema Único de Saúde (1990)


Embora tenha seu texto base sido redigido na Constituição Federal Brasileira, o Sistema
Único de Saúde foi regulamentado somente em 1990, através das Leis Orgânicas 8080/90 e
8142/90.
O SUS foi concebido como um conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos
e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da administração direta e indireta das
fundações mantidas pelo poder público, podendo a inciativa privada participar em caráter
complementar.
Referências Bibliográficas
1. 1. Homens e a Saúde – a construção histórica do conceito de saúde e doença. In: 1º curso de
desenvolvimento profissional de agentes locais de vigilância em saúde. Escola
Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (Org.). Informação e diagnóstico de situação. Guido
Palmeira et. al. Rio de Janeiro: FIOCRUZ/EPSJV/PROFORMAR, 2004.

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HISTÓRIA DA SAÚDE NO BRASIL

1. Como eram descritos os povos indígenas por Pero Vaz de Caminha na época do
descobrimento?
2. No Brasil colonial, como a saúde era exercida? Quais os métodos utilizados nessa época?
3. Quem eram os boticários da época colonial brasileira?
4. Quais medidas sanitárias foram adotadas por Dom João VI na chegada da família Real
Portuguesa ao Brasil?
5. Na época da implantação da República Brasileira, qual importante personagem da saúde
pública brasileira foi nomeado como diretor geral da saúde?
6. Quais as medidas implantadas por Oswaldo Cruz para combater a peste bubônica?
7. Quais as medidas implantadas por Oswaldo Cruz para combater a febre amarela?
8. Quais as medidas implantadas por Oswaldo Cruz para combater a varíola?
9. Como ficou conhecido o modelo de saúde de Oswaldo Cruz? Quais foram as consequências?
10. Qual o motivo da criação da Lei Eloi Chaves?
11. O que eram as CAPs? Quem tinha acesso aos seus benefícios?
12. O que mudou nas CAPs no governo de Getúlio Vargas?
13. O que foi o INAMPS e qual o motivo da criação do mesmo?
14. Quais foram as consequências do modelo burocrático-normativo da Ditadura militar em
relação à saúde da população brasileira?
15. Qual foi a contribuição da VIII Conferência Nacional de Saúde para o Brasil? 16.
Quais artigos da Constituição Federal Brasileira tratam especificamente da saúde? 17.
Em que ano foi concebido o Sistema Único de Saúde?
18. Quais as leis orgânicas que regulamentam o SUS?

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