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INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO

EXERCÍCIOS PARA AS AULAS PRÁTICAS


(ANO LETIVO 2023 / 2024)
ÍNDICE

I - Primeiras Aproximações
II – Conceito, Estrutura, Caracterização e Classificação das Normas Jurídicas
III – Fontes do Direito
IV – A Equidade
V – A Interpretação; A Integração de Lacunas
VI – A Determinação dos Limites Temporais das Normas
VII – Tutela e Responsabilidades Jurídicas
I - PRIMEIRAS APROXIMAÇÕES

A. Noções introdutórias

1. Esclareça o sentido das frases seguintes:


a) A palavra ‘direito’ comporta vários sentidos, dos quais se destacam o direito em sentido
objetivo e o direito em sentido subjetivo;
b) O Direito é uma ordem social diferente de todas as outras;
c) Nem todos os factos produzem efeitos de Direito;
d) A ordem jurídica é essencialmente uma ordem normativa.

2. Identifique factos jurídicos e efeitos jurídicos nos acontecimentos seguintes:


a) Mariana, jovem de 12 anos, pediu aos pais para lhe comprarem uma bicicleta, pedido que foi,
de imediato, aceite;
b) José contratou um jardineiro para tratar do jardim da sua casa em Sintra;
c) A gata persa de Emília teve ontem uma ninhada de quatro gatinhos;
d) João, DJ em casamentos, ainda não entregou a sua declaração periódica de IVA;
e) Júlia, grande fã de Game of Thrones, vê todos os domingos de madrugada, escrupulosamente,
o novo episódio da série House of Dragons.

B. Aproximação à Constituição da República Portuguesa (CRP), à jurisprudência do Tribunal Constitucional e ao


Direito público

3. Esclareça:
a) O que é a CRP;
b) Em que contexto foi adotada;
c) Para que serve;
d) Quantas constituições existiram em Portugal. Quais;
e) Porque se diz ser a CRP a “Lei Fundamental” do Estado Português;
f) Como está estruturada a CRP e quais os fundamentos dessa estrutura;
g) Quantas revisões constitucionais existiram;
h) O que é o Tribunal Constitucional e quais as suas funções.
4. Encontre as seguintes disposições da CRP e indique o artigo e n.º correspondentes:
a) “A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos
na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros
direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.
b) “A Assembleia da República tem o mínimo de cento e oitenta e o máximo de duzentos e
trinta Deputados, nos termos da lei eleitoral”.
c) “A requerimento do Presidente da República, do Provedor de Justiça ou, com fundamento
em violação de direitos das regiões autónomas, dos presidentes das Assembleias Legislativas
das regiões autónomas, o Tribunal Constitucional aprecia e verifica o não cumprimento da
Constituição por omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exequíveis as
normas constitucionais”.

C. Aproximação ao Tratado da União Europeia (TUE,) ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia
(TFUE) e à jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE)

5. Encontre as seguintes disposições do TUE e indique o artigo correspondente:


a) “A União proporciona aos seus cidadãos um espaço de liberdade, segurança e justiça sem
fronteiras internas, em que seja assegurada a livre circulação de pessoas, em conjugação com
medidas adequadas em matéria de controlos na fronteira externa, de asilo e imigração, bem
como de prevenção da criminalidade e combate a este fenómeno”.
b) “A União dispõe de um quadro institucional que visa promover os seus valores, prosseguir
os seus objetivos, servir os seus interesses, os dos seus cidadãos e os dos Estados-Membros,
bem como assegurar a coerência, a eficácia e a continuidade das suas políticas e das suas
ações.
As instituições da União são:
- o Parlamento Europeu,
- o Conselho Europeu,
- o Conselho,
- a Comissão Europeia (adiante designada "Comissão"),
- o Tribunal de Justiça da União Europeia,
- o Banco Central Europeu,
- o Tribunal de Contas.”

D. Aproximação ao Código Civil (CC), à jurisprudência em matéria civil e ao Direito privado


6. Esclareça:
a) O que é o CC;
b) O Direito civil como Direito privado comum;
d) A sistematização germânica do Direito civil e a sua crítica;
e) Defina e distinga os seguintes ramos de Direito civil: Direito das obrigações, Direitos reais,
Direito da família e Direito das sucessões;
f) O que é o Decreto-preambular do CC. Para que serve;
g) De que tratam os primeiros 13 artigos do CC.

7. Encontre as seguintes disposições do CC e indique o artigo e n.º correspondentes:


a) “A incapacidade dos menores é suprida pelo poder paternal e, subsidiariamente, pela tutela,
conforme se dispõe nos lugares respetivos”.
b) “Os esposos podem fixar livremente, em convenção antenupcial, o regime de bens do
casamento, quer escolhendo um dos regimes previstos neste código, quer estipulando o que
a esse respeito lhes aprouver, dentro dos limites da lei”.
c) “Aquele que tiver a direção efetiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no
seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos
provenientes dos riscos próprios do veículo, mesmo que este não se encontre em circulação”.

E. Os ramos do direito

8. Esclareça:
a) Que critérios permitem distinguir o Direito público do Direito privado.
b) Qual a relevância atual da distinção.

9. Que ramos do Direito são aplicáveis às seguintes situações?


a) João foi violentamente agredido por três rapazes no final de uma noite de Santos Populares,
na Graça.
b) Catarina dirigiu-se à Junta de Freguesia para requerer a licença de detenção e circulação da
sua cadela Bull Terrier, mas foi informada de que, primeiro, teria de obter a documentação
legalmente exigida para a posse de cães potencialmente perigosos.
c) O Governo anunciou que vai incluir no Orçamento do Estado para 2023 a possibilidade de
deduzir no IRS juros de créditos à habitação posteriores a 2011.
d) António, proprietário de uma herdade no Alentejo, celebrou um contrato de arrendamento
com a empresa Sol Brilhante, Lda. para instalação de pequenas unidades de produção de
energia elétrica fotovoltaica no seu imóvel.
e) Num processo que corre termos no Tribunal da Comarca de Santarém, o juiz tem dúvidas
quanto à lei aplicável a um casamento celebrado no Brasil, entre um cidadão argentino e uma
cidadã portuguesa.
f) José, Bernardo e Manuel constituíram uma sociedade para se dedicarem à venda de ténis.
g) Fernando foi condenado, por sentença transitada em julgado, a pagar 10000 euros de
indemnização à vizinha Guiomar, porque os seus cães causaram a total destruição do jardim
onde Guiomar cultivava valiosas espécies raras. Fernando considera a sentença injusta e
recusa-se a pagar. Guiomar pretende penhorar os bens de Fernando para obter a quantia
correspondente à indemnização.
h) O Secretário-Geral das Nações Unidas intimou a Rússia a suspender de imediato as suas
operações militares da Ucrânia.

F. As grandes famílias jurídicas


10. Imagine que o Governo da recém-independente República do Sudão do Sul elege a Justiça
como área prioritária de atuação. Neste contexto, de modo a analisar o melhor sistema ou
subsistema de direito a adotar, o referido Governo pede um parecer sobre, respetivamente,
os seguintes sistemas e subsistemas de direito: (i) romanístico; (ii) anglo-americano; (iii)
soviético; e (iv) islâmico.
Realize uma apresentação que inclua uma breve descrição dos respetivos sistemas e
subsistemas de direito, as principais vantagens e inconvenientes que os mesmos apresentam
para um país como a República do Sudão do Sul, bem como, uma sugestão final quanto à
sua adoção ou não.

11. Leia os excertos do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09.09.2010 (proc.


63/10.0YFLSB) e da decisão da Câmara dos Lordes de 26.05.1931 (Donoghue v. Stevenson) e
responda fundamentadamente às seguintes questões:
a) Indique as principais diferenças entre estas decisões judiciais.
b) A que sistema e subsistema jurídicos corresponde cada uma das decisões?
c) Quais as principais semelhanças entre as decisões?
d) Concorda com a afirmação de que as diferenças entre sistemas jurídicos se encontram hoje
esbatidas?
II - CONCEITO, ESTRUTURA, CARACTERIZAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DAS
NORMAS JURÍDICAS

12. Explicite o sentido da referência, por parte de J. OLIVEIRA ASCENSÃO, a «critérios


materiais de solução».

13. Identifique os dois elementos estruturais nas normas correspondentes aos seguintes
enunciados legais:
a) Artigo 13.º, n.º 1, CRP
b) Artigo 483.º, n.º 1, C.C.
c) Artigo 1191.º C.C.
d) Artigo 1649.º C.C.
e) Artigo 194.º, n.º 1, C. Penal
f) Escolha duas normas do ordenamento jurídico português e identifique os respetivos
elementos estruturais.

14. O que especifica um critério geral? E um critério abstrato? A que se contrapõe, no discurso
jurídico, a generalidade? E a abstração?

15. Comente a seguinte afirmação: “… nem a abstração nem a própria generalidade são características
essenciais das normas jurídicas.” (Rui Medeiros)

16. Distinga os seguintes tipos de normas:


a) Normas preceptivas, normas proibitivas e normas permissivas;
b) Normas cogentes e normas dispositivas (normas supletivas e normas interpretativas);
c) Normas gerais e normas excecionais;
d) Normas comuns e normas especiais;
e) Normas inovadoras e normas interpretativas.
f) Escolha cinco normas do ordenamento jurídico português e classifique-as.
g) Classifique as normas dos artigos 883.º, 892.º e 1306.º do Código Civil, tendo por base os
critérios estudados.
h) Comente, atendendo à distinção dos tipos de normas:
Ana e Bernardo casaram-se em 2013, sem terem determinado o regime de bens aplicável ao
seu contrato de casamento. Pretendem agora divorciar-se e estão em desacordo quanto ao
regime de bens aplicável: Catarina considera que será o da comunhão de adquiridos, nos
termos do artigo 1717.º; contrariamente, João entende que, ao abrigo do artigo 1698.º, tem
a possibilidade de fixar um regime distinto, que pretende seja o da separação de bens. Quid
iuris?

17. Classifique as seguintes normas jurídicas:


a) “Ninguém pode ser perguntado por qualquer autoridade acerca das suas convicções ou
prática religiosa, salvo para recolha de dados estatísticos não individualmente identificáveis,
nem ser prejudicado por se recusar a responder”. (artigo 41.º, n.º 3 CRP)
b) “Os pais e avós não podem vender a filhos ou netos, se os outros filhos ou netos não
consentirem na venda (...)” (artigo 877.º C.C.)
c) “Quando houver indícios de que alguém oculta na sua pessoa quaisquer animais, coisas ou
objetos relacionados com um crime ou que possam servir de prova, é ordenada revista.
Quando houver indícios de que os animais, as coisas ou os objetos referidos no número
anterior, ou o arguido ou outra pessoa que deva ser detida, se encontram em lugar reservado
ou não livremente acessível ao público, é ordenada busca” (artigo 174.º, n.º 1 e n.º 2 C. de
Processo Penal)
d) “Em caso de dúvida sobre o sentido da declaração, prevalece, nos negócios gratuitos, o
menos gravoso para o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das
prestações” (artigo 237.º C.C.)
e) “Qualquer pessoa tem capacidade para ser testemunha desde que tenha aptidão mental para
depor sobre os factos que constituam objeto da prova e só pode recusar-se nos casos
previstos na lei” (artigo 131.º n.º 1 C. de Processo Penal)
f) “Se o preço não estiver fixado por entidade pública, e as partes o não determinarem nem
convencionarem o modo de ele ser determinado, vale como preço contratual o que o
vendedor normalmente praticar à data da conclusão do contrato (...)” (artigo 883.º C.C.)

18. Comente a seguinte afirmação:


“A categoria «norma excecional» é equívoca e inútil, devendo ser banida do discurso jurídico,
e o artigo 11.º do Código Civil é ingénuo, inaplicável e/ou injusto.”
In PEDRO FERREIRA MÚRIAS, Exercícios de Introdução
ao Estudo do Direito, p. 124

19. No passado dia 16 de julho de 2020, um incêndio que deflagrou numa zona de mato em
Alvide, no Concelho de Cascais, alastrou-se e atingiu dois prédios próximos, deixando em
estado inabitável 8 apartamentos. Porque lá moravam os seus proprietários e respetivas
famílias, todos eles com sérias necessidades económicas, o Governo fez publicar um decreto-
lei que dizia, essencialmente, o seguinte:
«É concedido um subsídio a fundo perdido, até ao valor de 25.000 euros a cada um, em favor dos proprietários
das frações autónomas dos edifícios de Alvide, em Cascais, atingidos pelo incêndio de 16 de julho, destinado
à reconstrução das mesmas.”
Este D.L. é uma lei?
Como responder se um artigo 3.º daquele diploma dispusesse que «idêntico subsídio será concedido
aos proprietários de edifícios, ou suas frações, situados junto a zonas de mato, que venham a ser severamente
afetados por incêndios.»?

III - FONTES DO DIREITO

20. «Na sequência de recente legislação europeia, tendo por base estudos estatísticos e com vista
a promover o autoconsumo de energia renovável, o Governo aprovou o Decreto-Lei
X/2019.». Identifique, com referência ao trecho anterior, diferentes aceções da expressão
«fontes de direito».

21. Em face do ordenamento jurídico português responda às seguintes questões:


a) Qual o elenco de fontes de direito em sentido técnico-jurídico?
b) Defina e identifique o conjunto de atos normativos, referindo-se à relação hierárquica entre
si.
c) Defina e identifique o conjunto de atos legislativos.
d) Distinga e exemplifique usos e costume, pronunciando-se sobre o respetivo valor como
fonte de direito em face do Código Civil.
e) Distinga fontes de direito em sentido imediato e mediato (ilustre a sua exposição com
exemplos).
f) Indique o(s) sentido(s) que se atribuem ao termo “jurisprudência”. Esclareça o valor da
jurisprudência como fonte de direito no ordenamento jurídico português e,
comparativamente, nos sistemas jurídicos anglo-saxónico e americano.

22. Comente a seguinte afirmação: os princípios fundamentais do direito são «da maior
importância quer na interpretação das leis e das restantes fontes, quer na integração das
lacunas do direito positivo, quer na própria positivação do direito.» (SANTOS JUSTO, op. cit.,
p. 227).

23. Alberto intenta uma ação em tribunal contra Bruna. Na sua defesa, Bruna alega desconhecer
a lei invocada por Alberto, dizendo que o conhecimento de tal lei não lhe é exigível, uma vez
que o número de diplomas diariamente publicados em Diário da República impossibilita até
o cidadão mais diligente do conhecimento de toda a legislação em vigor. Subsidiariamente,
alega que ainda que se considerasse que o cumprimento da dita lei lhe era exigível, o sentido
da mesma não é claro e que, perante a obscuridade da lei, o juiz não pode proferir uma
decisão no caso sub judice. Quid iuris?

24. Atendendo a um surto de legionella, a Assembleia da República decide aprovar a Lei X/2014,
da qual consta a seguinte disposição: «Os estabelecimentos industriais em cujos sistemas de
refrigeração ou aquecimento seja detetada a bactéria legionella pneumophila devem ser
encerrados.». A referida Lei foi publicada em Diário da República no dia 9 de outubro de
2014, tendo sido disponibilizada online no sítio da Internet gerido pela Imprensa Nacional –
Casa da Moeda, S.A. apenas no dia 10 de outubro de 2014, em virtude de uma rara anomalia
no site. Em que data entrou o diploma em vigor?

25. O Decreto-Lei n.º X/2016, publicado em Diário da República a 9 de agosto de 2016, veio
estabelecer o regime jurídico referente à exploração de estabelecimentos de alojamento local,
aplicável aos estabelecimentos que prestem serviços de alojamento temporário a turistas
mediante remuneração. O mencionado Decreto-Lei nada estabelece quanto à sua entrada em
vigor e o seu artigo 5.º dispõe o seguinte: «A comunicação prévia ao Presidente da Câmara
Municipal territorialmente competente é condição necessária para a exploração de
estabelecimentos de alojamento local». Considere que Antónia pretende prestar serviço de
alojamento temporário, mediante remuneração, durante os dias 11 e 12 de agosto de 2016.
Estará Antónia obrigada a realizar a mencionada comunicação prévia?

26. Devido à proliferação de pombos no Município de Cascais e ao aumento de danos nos


monumentos causados pelos pombos, a Câmara Municipal de Cascais publicou, a 5 de março
de2022, um regulamento que determina que alimentar os pombos constitui uma
contraordenação grave, sancionável com coima até 500 euros. Ontem, Maria estava a dar
migalhas de pão aos pombos no Parque da Ribeira do Mocho quando Nuno, polícia
municipal, a advertiu para parar ou levantaria auto de notícia para iniciar o processo
contraordenacional nos termos do mencionado regulamento. Maria respondeu que
continuaria a alimentar os pombos, porque o regulamento é claramente inválido. Maria terá
razão? Justifique.

27. Ontem, no culminar da polémica sobre as touradas, a Assembleia da República aprovou uma
lei impondo a proibição da realização de touradas em Portugal. Porém, para permitir uma
transição mais fácil para o novo regime legal de interdição das touradas, a nova lei só entra
em vigor no dia 1 de janeiro de 2022.
a) Pode o legislador estabelecer uma vacatio legis superior a 1 ano?
b) Suponha que, em dezembro de 2021, é publicada a Lei do Orçamento do Estado para
2022, na qual se determina que as touradas realizadas em Portugal passam a ser tributadas,
em sede de IVA, a uma taxa de 23%. Como se articula a lei ontem publicada com a Lei
do Orçamento do Estado para 2022?

28. A Lei X/2022 proíbe a caça de javalis. A lei foi publicada no dia 2 de janeiro de 2022.
a) Joaquim, acérrimo caçador, gostaria de saber se poderá ir caçar javalis no dia 5 de janeiro
de 2022. Quid iuris?
b) Na aldeia serrana do Talasnal, no Concelho da Lousã, desde tempos idos, sempre que os
javalis atacam os rebanhos, organiza-se uma caçada àqueles animais. Estas iniciativas de
caçar javalis após ataques a rebanhos perduram há vários anos, mesmo depois da entrada
em vigor da sobredita lei. Quid iuris?

29. O Decreto-Lei 15/2001 versa sobre o regime dos contratos de crédito com garantia
hipotecária. O Decreto-Lei 155/2001 versa sobre o funcionamento dos espetáculos de
natureza artística. No dia 2 de março foi publicado o Decreto-Lei X/2018 que versa sobre o
funcionamento dos espetáculos de natureza artística em moldes incompatíveis com os
previstos no Decreto-lei 155/2001. Decorrido um mês, no dia 2 de abril, saiu no DR uma
Declaração de Retificação, determinando que, onde, no Decreto-lei X/2018 se lê “Decreto-lei
15/2001” deve ler-se “Decreto-Lei 155/2001”. Quid iuris?

30. A Lei n.º 45/2005 veio estabelecer o regime jurídico da Reserva Natural da Serra do Alvão.
A Lei n.º 354/2017 revogou a Lei anterior. Suponha que a Lei n.º 67/2019 contém um único
artigo onde se dispõe: “Considera-se revogada a Lei n.º 354/2017.”. Qual é o regime jurídico
aplicável neste momento à Serra do Alvão?
31. Tendo em vista a proteção da população de golfinhos roazes no estuário do Sado, o Decreto-
Lei X/2012 veio proibir a permanência de mais de 3 embarcações num raio de 100 metros
em redor dos golfinhos. Considere que o Decreto-Lei Y/2017, atendendo a condições
ambientais particularmente adversas, dispõe unicamente que: «de fevereiro a outubro de
2017, proíbe-se a permanência de mais de 1 embarcação num raio de 100 metros em redor
dos golfinhos». Qual o regime jurídico aplicável a 4 de outubro de 2019?

32. No seguimento da multiplicação dos ataques terroristas e da necessidade de alargar os


instrumentos de proteção dos cidadãos em geral contra estes graves atentados à dignidade da
pessoa humana, o Governo português, na sequência de iniciativas adotadas por outros
Estados, aprova um Decreto-Lei que, em situações excecionais, e apenas quando estiver em
causa a prática iminente de crimes de terrorismo, admite práticas de tortura, supervisionadas
por um magistrado, sobre arguidos suspeitos de envolvimento nesses atos criminosos
altamente organizados. Quid iuris?

33. Suponha que em 1 de setembro de 2021 entrou em vigor um regulamento da União Europeia
que veio dispor sobre uma matéria até então objeto de lei de fonte interna. Quid iuris?

34. Imagine que Portugal celebrou um Tratado internacional com Espanha nos termos do qual
os dois Estados se comprometem a financiar projetos agrícolas de produtos típicos nacionais
de ambos os países simultaneamente. Alguns meses depois, o Governo aprovou um Decreto-
lei determinando que o Estado português apenas contribuiria para o financiamento de
projetos agrícolas que, desenvolvidos por agricultores de ambos os países, dissessem respeito
ao cultivo de peras. Quid iuris?

35. O Professor Manuel dos Santos Pereira, famoso jurista especializado em Direitos de Autor
escreveu, em janeiro de 2021, um parecer que tratava um complexo problema de
interpretação de uma norma do Código dos Direitos de Autor e Direitos Conexos. O parecer
foi junto aos autos de um processo, que corria no STJ, pelo advogado da parte que o pedira,
mas o Supremo decidiu em sentido contrário. Como fundamentação do acórdão, o
Conselheiro relator escreveu que «o douto parecer do Professor Manuel dos Santos Pereira
propugna solução em tudo oposta à que o ilustre jurista ensinava no seu livro de 2017, “Os
Direitos de Autor e a sua garantia”, e que de há muito nos orientava. Bem se pode ver, porém,
que esta era a boa solução, pelos desenvolvidos fundamentos que ali se encontram. É que
opinio posterior priori non derrogat». O que lhe parece da argumentação do STJ?
Adaptado de PEDRO FERREIRA MÚRIAS, op. cit., p. 19

36. «Perguntar, à luz da lei, qual a relevância do costume, é admitir à partida o que seria necessário
justamente demonstrar: a superioridade da lei, critério único de avaliação das fontes de
direito». (OLIVEIRA ASCENSÃO, op.cit., p. 273).

37. O Governo aprova um regulamento de execução do estado de emergência, dispondo, no


artigo 3.º, que, “diariamente, no período compreendido entre as 23:00 h e as 05:00 h, bem como aos
sábados e aos domingos no período compreendido entre as 13:00 h e as 05:00 h, os cidadãos não podem
circular em espaços e vias públicas, salvo em situações excecionais”. O artigo 16.º acrescenta que “o
presente regulamento entra em vigor às 23:00 h do dia 11 de novembro de 2020”.
Suponha que o regulamento foi disponibilizado no sítio da internet gerido pela Imprensa
Nacional da Casa da Moeda às 00h15 de dia 11 de novembro.
a) António pretende saber se na noite de dia 11 de novembro, em que fez anos, estava
sujeito ao recolher obrigatório, pois foi jantar a casa de uns amigos, onde esteve a
beber copos, e, depois, foi mandado parar pela polícia. Quid iuris?
b) A população da Golegã, invocando a tradição da famosa Feira Nacional do Cavalo,
que ocorre anualmente durante o mês de novembro e, em especial, no dia de São
Martinho (11 de novembro), pretende invocar um tal costume para não cumprir o
regulamento. Quid iuris?

38. Hélder é grande adepto da tradição tauromáquica, em especial das touradas tradicionais de
Barrancos, deslocando-se todos os anos àquela vila para assistir às mesmas. Foi com alguma
surpresa que teve conhecimento do decreto de 1928, que proibia qualquer tipo de touradas
de morte em Portugal. Entretanto, a lei 12/2000 substituiu o decreto de 1928, mas continuou
a proibir os touros de morte em Barrancos. Ora nunca este decreto foi revogado por um
outro, nem há qualquer outra legislação quanto à matéria. Algo contrafeito, mas com o
sentido do dever que o caracterizava, Hélder pergunta-se porque não reagem as autoridades
à prática que há anos se verifica em Barrancos. Quid júris?

39. Alberto, estudante de Direito, conduzia a 200 km/hora, na Autoestrada da Costa do Estoril,
no sentido de Cascais para Lisboa, quando foi surpreendido por dois agentes da brigada de
trânsito da GNR. Perante os agentes, que desde logo invocam a violação do disposto no
artigo 27.º do Código da Estrada, Alberto afirma que tal artigo nada releva para o caso, uma
vez que, em Portugal, é habitual e recorrente as pessoas conduzirem em excesso de
velocidade, sendo seguro concluir que estão preenchidos os pressupostos de um costume
que conduziu à cessação de vigência da mencionada lei. Quid iuris?

40. Sofia e Catarina, estudantes de Direito, encontram-se em passeio pelo Parque Natural dos
Estudantes Motivados, quando se inicia um aceso debate em torno do valor da jurisprudência
enquanto fonte do direito: Sofia considera que a jurisprudência será fonte do direito em
sentido técnico-jurídico no ordenamento jurídico português apenas em casos excecionais,
enquanto que Catarina defende que a jurisprudência é inevitavelmente fonte do direito no
ordenamento jurídico português uma vez que o artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil impõe ao
juiz uma “interpretação e aplicação uniformes do direito”, nos termos do qual se pode
concluir que a jurisprudência proferida em casos análogos tem um valor vinculativo. Quid
iuris?

41. Em face da pandemia de Covid-19, a Assembleia da República aprova a Lei n.º X/2020,
publicada em Diário da República a 19 de novembro de 2020, nos termos da qual estabelece
o regime jurídico aplicado aos estabelecimentos que operam em espaços fechados. Após a
entrada em vigor da Lei n.º X/2020, vários tribunais têm vindo a decidir que não deve ser
vedada a entrada em estabelecimentos que operem em espaços fechados a indivíduos que
registem uma temperatura entre 37.º e 38.º graus. João viu-lhe ser vedada a entrada num
centro comercial por registar 37,5.º graus, pelo que propôs uma ação em tribunal, pedindo
que fosse indemnizado por lhe ter sido vedada a entrada no dito estabelecimento comercial.
Para tal, apresentou como único argumento que os tribunais têm vindo a considerar que
naquele caso lhe devia ter sido permitida a entrada. João está confiante de que irá ganhar o
caso. Quid iuris?

42. Fruto do aumento do número dos casos de doença por COVID-19 em Portugal, entrou em
vigor uma lei que consagra a obrigatoriedade de todos os trabalhadores apresentarem
certificado digital para entrarem no seu local de trabalho. A lei prevê uma coima até 1.500 €
para quem não apresentar certificado digital ao entrar no local de trabalho.
a) Com vista a evitar a propagação do vírus no município, a Câmara Municipal de Lisboa
aprova um regulamento, agravando a coima aplicável para 2.500€ para aqueles que não
apresentem certificado digital à entrada do local de trabalho. Quid iuris?
b) No seguimento da instituição da obrigatoriedade de apresentação do certificado digital
no local de trabalho, os tribunais, convictos de que esta medida é inconstitucional, têm
vindo sistematicamente a desaplicá-la. Podemos considerar que deixou de ser obrigatório
apresentar o certificado digital à entrada do local de trabalho?

43. Segundo o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 11/2015, de 18 de setembro:


«(o) direito de regresso da seguradora contra o condutor que haja abandonado dolosamente
o sinistrado, previsto na parte final da alínea c) do artigo 19.º do DL 522/85, de 31/12, não
está limitado aos danos que tal abandono haja especificamente causado ou agravado,
abrangendo toda a indemnização paga ao lesado com fundamento na responsabilidade civil
resultante do acidente.».
Suponha que, em 3 de março de 2019, foi proferida uma sentença proveniente de um
Tribunal de Primeira Instância, nos termos da qual se decidiu que, segundo uma correta
leitura da alínea c) do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31/12, (i) era de se atribuir o
direito de regresso da seguradora apenas quanto aos danos acrescidos resultantes
especificamente do abandono doloso pelo condutor, (ii) e como tal, a seguradora estaria
obrigada a suportar a demais indemnização devida ao lesado a título de responsabilidade civil.
Poderia o Juiz do Tribunal de Primeira Instância tomar esta decisão?

44. Suponha que, no passado dia 3 de dezembro, foi publicado um decreto-lei que impõe o
pagamento de um imposto ecológico sobre os sacos de plástico utilizados no comércio.
Carlos, intimado a pagar o referido imposto, recusa-se, «alegando não estar vinculado pela
referida “lei”».
Pergunta-se:
a) Em que dia entrou em vigor o mencionado decreto-lei?
b) Estará Carlos obrigado ao pagamento do referido imposto?
c) O juízo sobre a validade do decreto-lei alterar-se-ia se, em vez da criação do imposto
ecológico, estivesse em causa a extinção do referido imposto?

45. Imagine que, no passado dia 15 de janeiro, foi publicado um decreto-lei que criou o crime de
“perturbação de Assembleia-Geral de Instituição Bancária”, punindo-o com uma pena entre cinco e
dez anos. Das várias disposições contidas no referido diploma, existe uma que determina a
entrada em vigor do mesmo no dia da sua publicação em Diário da República.
a) Analise a validade do referido diploma legal e das suas normas.
b) Poderá António ser punido pelos desacatos que provocou na Assembleia Geral de uma
Instituição Bancária que ocorreram no passado dia 20 de janeiro. Fundamente a sua
resposta?
46. O Governo integra todos os anos, na lei do orçamento do Estado, uma verba de 3 milhões
de euros para promoção da atividade desportiva juvenil, a desenvolver no âmbito da
Associação Portuguesa para o Desporto Jovem (APDJ). Este ano, porém, a lei do orçamento
eliminou a referida verba. A Associação pretende invocar um costume para contestar a
validade da referida lei. Quid iuris?

47. A Assembleia da República aprovou, em 6 de julho, uma lei destinada a racionalizar a política
de medicamentos. A lei foi promulgada em 26 de julho, publicada em 8 de Agosto,
estabelecendo uma vacatio legis de 60 dias.
Entretanto, o Conselho de Ministros aprova, em 20 de julho, um decreto-lei sobre a matéria.
O diploma, promulgado em 14 de agosto, é publicado em 1 de Setembro, entrando em vigor
no dia seguinte ao da sua publicação.
Aprecie, do ponto de vista jurídico, a atuação do Governo e esclareça qual é a lei nova para
efeitos de revogação.

48. Amar e Kundan, originários de uma pequena aldeia no norte da Índia, são irmãos, residindo
em Portugal desde o início da década. Querendo seguir a tradição da sua terra natal – segundo
a qual, com vista a preservar o património familiar, dois irmãos podem casar com a mesma
mulher – Amar e Kundan pretendem casar com Indira. Porém, dirigindo-se à competente
Conservatória de Registo Civil em Lisboa foram informados de que, nos termos do artigo
1577º do Código Civil, o casamento só pode ser celebrado entre duas pessoas de sexo
diferente.
Os três nubentes contestam o teor da aludida norma, alegando que a proibição de celebrar o
casamento nos termos pretendidos limita injustificadamente a liberdade de escolha dos
nubentes. Acrescentam ainda que, ainda que assim não fosse, tal norma não deverá prevalecer
em face da longa tradição da sua terra natal, onde a generalidade dos casamentos é celebrado
entre três ou mais nubentes.
Quid iuris?

49. Suponha que o Governo, confrontado com uma grave crise financeira e para fazer face ao
défice do orçamento de estado, aprovou e enviou para promulgação do Presidente da
República um Decreto-Lei em que cria o “Novo Encargo Extraordinário sobre Rendimentos
Declarados” (NEERD). O que deverá fazer o Presidente da República?
50. Alberto e Benjamin estão de relações cortadas há vários anos. No passado dia 5 de outubro,
por ocasião de uma cerimónia oficial nos Paços do Concelho, Benjamin emocionou-se ao
ver o seu antigo amigo e dirigiu-se ao mesmo para o cumprimentar no meio de um grupo de
altas individualidades onde aquele se encontrava. Alberto, de forma acintosa, deixou
Benjamin de mão estendida para surpresa generalizada dos presentes. Benjamin, inconsolado
com o sucedido e ferido na sua honra, pretende intentar uma ação em juízo contra Alberto.
Pergunta-se:
a) A conduta de Alberto será regulada pelo Direito?
b) Supondo que Benjamin perde a ação na primeira instância e tendo passado mais de
um ano sobre a data da decisão, poderá Benjamin interpor recurso para um tribunal
superior?
c) Supondo que haveria sobre esta matéria três decisões dos tribunais superiores
favoráveis à pretensão de Benjamin, estaria o tribunal de recurso vinculado a seguir as
referidas decisões?
d) Suponha agora que Benjamin, perante a atitude de Alberto, perdera a cabeça
desfiando-lhe duas bofetadas. Alberto intenta uma ação contra Benjamin pedindo-lhe
uma indemnização. Benjamin defende-se dizendo que agiu para defesa da honra e que
na terra onde nasceu era assim que estas coisas se resolviam. Quid iuris?

51. Na sequência de uma sondagem expressiva, o Governo aprovou um decreto-lei que proíbe a
utilização, em espaços públicos, de “burkas, véus ou outros símbolos religiosos, atenta a separação entre
o Estado e a Igreja”.
a) Pronuncie-se, fundamentadamente, sobre a validade e legitimidade do referido decreto-
lei.
b) Admita, agora, que, em face das múltiplas dúvidas suscitadas em torno da expressão
“símbolos religiosos”, o Governo clarifica, por Portaria, o sentido e âmbito do conceito em
causa. Esclareça o valor jurídico do referido ato interpretativo.
c) Considere, por último, que é consultado, na qualidade de jurista, e solicitado a emitir uma
opinião jurídica. Esclareça o valor da opinião emitida.

52. Por meio da Lei n.o 27/2008, de 30 de junho, a Assembleia da República estabeleceu as
condições e procedimentos de concessão de asilo. Nos termos do artigo 84o desse diploma,
“os processos de concessão do direito de asilo são gratuitos, quer na fase administrativa, quer na judicial”.
Por seu turno, constitui determinação do seu artigo 89o entrar a referida lei em vigor 60 dias
após a data da sua publicação.
Pertenceu ao Governo, entretanto, no uso de autorização legislativa, aprovar o Regime das
Custas Processuais por meio do Decreto-Lei no 34/2008, de 26 de fevereiro. Segundo pode ler-
se no preâmbulo deste diploma, esta reforma está em linha com os “objetivos de uniformização e
simplificação do sistema de custas processuais’, procurando-se ‘concentrar todas as regras quantitativas e de
procedimento sobre custas devidas em qualquer processo, independentemente da natureza judicial,
administrativa ou fiscal num só diploma - o novo Regime das Custas Processuais”. E, com efeito, de
conformidade com o correspondente artigo 25.o, número 1, “São revogadas as isenções de custas
previstas em qualquer lei, regulamento ou portaria e conferidas a quaisquer entidades públicas ou privadas,
que não estejam previstas no presente Decreto-Lei.” Dispõe, enfim, o artigo 26.o do Decreto-Lei no
34/2008, de 26 de fevereiro: “O presente decreto-lei entra em vigor no dia 1 de Setembro de 2008.”
Havir Dharmesh Pravikant é um cidadão indiano que viu recusado o pedido de protecção
internacional apresentado junto das autoridades portuguesas. Condenado ao pagamento das
competentes custas processuais, Havir decide reagir judicialmente. Sem sucesso, porém.
Fundamentado em que lex posterior derogat (legi) priori, o Tribunal Administrativo de Círculo de
Lisboa faz valer que Havir Dharmesh Pravikant estriba a sua pretensão num preceito que hoje
já não integra a ordem jurídica. Acrescenta que as situações de isenção de custas vêm
expressamente referidas no artigo 4.o do Regime das Custas Processuais e que nesse elenco não
se encontra qualquer situação assimilável à dos autos.
Inconformado, Havir Dharmesh Pravikant admite recorrer da decisão.
a) Em primeiro lugar, Havir tem dúvidas de que o Decreto-Lei no 34/2008, de 26 de
fevereiro, que aprovou o Regime das Custas Processuais, seja, em bom rigor, um
diploma posterior à Lei no 27/2008, de 30 de junho. Pronuncie-se acerca do bem-
fundado desta suposição de Havir.
b) Em segundo lugar, Havir é do entendimento de que, ainda que se considere que o
Decreto-Lei no 34/2008 é posterior, nem por isso procede o ponto de vista segundo
o qual o artigo 84.º da Lei no 27/2008 não mais integra a ordem jurídica portuguesa.
Pronuncie-se acerca do bem-fundado desta suposição de Havir.
c) Enfim, Havir admite a pertinência de apelar ao n.º 2 do artigo 4.º do Regime das Custas
Processuais, o qual prevê um regime de isenção objetiva ditada pela especialidade da
matéria de determinadas acções. Entende justificada, em particular, a consideração do
disposto na sua alínea b), em cujos termos “[f]icam também isentos os processos
administrativos urgentes relativos ao pré-contencioso eleitoral quando se trate de eleições para órgãos
de soberania e órgãos do poder regional ou local e à intimação para protecção de direitos, liberdades e
garantias”. Enquadre este ponto de vista no contexto da actividade interpretative
[considere esta última questão apenas depois de estudado o tema da interpretação]

IV - A EQUIDADE

53. Responda às seguintes questões:


a) O que é a equidade?
b) A equidade é fonte de Direito? Qual o valor reconhecido pelo Direito português à equidade?
Fundamente a sua resposta.
c) Qual o sentido inerente à comparação entre a equidade e a régua dos arquitetos de Lesbos?

54. Um contrato celebrado entre os municípios de Benavente e Salvaterra de Magos, através das
respetivas câmaras, relativo a um aterro sanitário situado no espaço de fronteira entre os dois
concelhos dispõe, entre muitas outras coisas, que:
a) Uma comissão paritária formada por vereadores das duas câmaras municipais pode decidir,
por unanimidade, alterar esse mesmo contrato, quando o interesse público assim o exija;
b) Essa mesma comissão decidirá ex aequo et bono quanto a todos os litígios relativos ao
cumprimento e incumprimento ou à interpretação desse contrato. Explicite os critérios de
decisão ponderados pela comissão.

55. Esclareça os conceitos de equidade usados nos artigos 4.º, 339.º, n.º 2, e 1407.º, n.º 2, do
Código Civil.

56. José vive só na companhia de Pluto, o seu cão de estimação. Carlos, vizinho de José, por não
tolerar o latir de Pluto, costuma, aproveitando a ausência de José, administrar sonífero ao
animal. José, apercebendo-se do estado de permanente sonolência de Pluto, confronta Carlos
que confessa a sua “prática”. José, irado e temendo os seus próprios instintos, encarrega Ana
de guardar o seu revólver, de forma a evitar o pior. Dias depois, Carlos, não conseguindo
trabalhar devido ao ladrar descontrolado de Pluto, volta a administrar-lhe sonífero, mas
engana-se na dose, e o cão acaba por morrer. José, desvairado, dirige-se a Ana, e pede-lhe a
arma com o intuito expresso de a utilizar contra Carlos.
Está Ana obrigada a devolver a arma? Justifique a sua resposta, designadamente, atendendo
ao disposto nos artigos 1187.º, alínea c) e 1192.º do Código Civil.
57. Numa tarde de Domingo, António foi a casa de Bernardo, para uma partida de póquer com
mais dois amigos. Depois de dois jogos em que perdera, António esperava ganhar o
terceiro, confiante de que a sua sorte estava a mudar. Quando, porém, se apercebeu
de que iria perder mais uma vez, António deu um forte murro na mesa, sem reparar que
o prato de porcelana do qual constava a árvore genealógica de Bernardo – peça única e que
tinha sido transmitida a Bernardo pela sua falecida avó – estava próximo da ponta da mesa.
Com a força do murro, a mesa, estremecendo, provocou a queda do prato de porcelana
no chão, que se estilhaçou em mil pedaços. Bernardo propõe uma ação de indemnização
contra António, invocando danos patrimoniais e não patrimoniais. Que critério(s) deve o juiz
ponderar na fixação da indemnização?

58. Em 2012, Mariana e Nuno casados e pais de Óscar, de 2 anos ficaram ambos desempregados
e foram viver para casa de Paula, irmã mais velha de Nuno. Em 2013, o casal conseguiu
emprego num famoso restaurante de Lisboa, trabalhando de quarta a sábado até às 02h00 da
madrugada. Continuaram a viver em casa de Paula, que cuidava do pequeno Óscar. Em 2022,
o casal divorciou-se, tendo Mariana ido viver para o Funchal com o filho. Por estar muito
ofendida com o ex-marido que, entretanto, foi viver para Luanda, Mariana não permite que
Paula visite o sobrinho e nem sequer autoriza o menino a falar ao telefone com a tia. Paula
intentou então uma ação contra Mariana para fazer valer o seu direito de ver e contactar o
sobrinho. Paula fundamenta a sua pretensão no artigo 1887º-A do Código Civil e argumenta
também que se trata de uma questão da mais elementar justiça, pois foi ela quem criou Óscar.
Mariana contesta a ação, alegando que, à luz daquela norma, Paula não tem qualquer direito
e o juiz tem de julgar segundo a lei. Quid iuris?

V - A INTERPRETAÇÃO; A INTEGRAÇÃO DE LACUNAS

59. Esclareça o sentido da frase “Conhecer as fontes não é ainda conhecer as regras”.

60. Esclareça as seguintes questões:


a) O que é interpretar (em sentido restrito)? E o que é a interpretação em sentido
amplo?
b) Quais são os elementos e subelementos interpretativos?
c) Qual é a diferença entre o «contexto da lei» e os «lugares paralelos»?
d) O que separa a interpretação declarativa lata da aplicação analógica? E a
interpretação declarativa restrita da redução teleológica?
e) Qual o alcance da querela entre o subjetivismo e o objetivismo?
f) O que é a interpretação dita enunciativa?
g) E a interpretação ab-rogante lógica? Como se distingue da interpretação abrogante
valorativa?
h) O que é uma lacuna jurídica?
i) Como se distingue a analogia legis da analogia iuris?

61. Para prevenir a propagação da pandemia durante o período do Ano Novo, o Governo
aprovou o Decreto n.º 11-A/2020, de 6 de dezembro, determinando que “os cidadãos não
podem circular para fora do concelho do domicílio no período compreendido entre as 00:00 h do dia 31 de
dezembro de 2020 e as 05:00 h do dia 4 de janeiro de 2021, sem prejuízo das exceções previstas no artigo
11.º do Decreto n.º 9/2020, de 21 de novembro, as quais são aplicáveis, com as necessárias adaptações”.
Entre as exceções previstas no artigo 11.º do Decreto n.º 9/2020, de 21 de novembro,
encontra-se a do "retorno ao domicílio".
Joana, que vive em Lisboa, propõe a dois seus amigos irem passar o ano ao Algarve, saindo
de Lisboa no dia 30 e regressando a Lisboa no domingo, dia 3. A Maria, porém, diz que tal
não é possível, pois o Governo proibiu os festejos de Ano Novo fora do concelho de
residência. O João, por seu turno, não sabe o que dizer. Quid iuris?

62. A lei estabelece que “é proibido dormir nas estações de comboio, sob pena de sujeição à aplicação de uma
coima entre 100 e 250 euros”.
José, que pretende apanhar o último comboio do dia para o Porto, o qual parte de Lisboa
às 23h30, chega à estação do Oriente quando o comboio já se encontra em marcha. Em
qualquer caso, como o próximo comboio é às 4h30 da manhã, José decide esperar. Mas,
embora estivesse a tentar ler um livro, acabou por adormecer.
O polícia que fazia a sua ronda no local pretende autuá-lo. Quid iuris?

63. Com vista a reduzir a reduzir a poluição no centro da cidade e a evitar acidentes, a Câmara
Municipal de Lisboa aprovou um regulamento que estabelece o seguinte: “É proibida a
circulação de automóveis no Bairro Alto”.
a) João pretende atravessar a Rua da Rosa, no Bairro Alto, de motociclo. Quid iuris?
b) E se a disposição tivesse a seguinte redação: “É proibida a circulação de veículos no Bairro
Alto”?
c) Luísa, Leonor e Lourenço foram encontrar-se com uns amigos num bar do Bairro
Alto. A primeira foi de bicicleta, a segunda de trotinete elétrica e o terceiro de skate.
Quid iuris?
d) Mafalda, tetraplégica, tenciona passear no Bairro Alto na sua cadeira de rodas elétrica.
Quid iuris?
e) Deflagrou um incêndio num prédio no Bairro Alto. Os bombeiros dirigiram-se
imediatamente com os seus veículos para o prédio em chamas e, pelo caminho,
atropelaram dois rapazes que se encontravam à porta de um restaurante e destruíram
várias mesas e cadeiras desse mesmo restaurante. Quid iuris?
64. “De acordo com o regulamento municipal publicado no edital n.º 10/2021, de Mafra:
«1. É obrigatório o uso de trela em todos os cães trazidos à rua.
2. A violação do disposto no número anterior é punida com coima de 25 a 500 euros.»
a) Jesuína levava o seu pequinês preso por um laço verde às bolinhas lindíssimo,
impossível de desatar por descuido, feito de papel-super-forte-à-prova-de-puxões-e- rasgões.
Quando saiu à rua com o bicho, porém, o Polícia Implacável veio lembrar-lhe que,
segundo o Dicionário de Cândido de Figueiredo, trela é um “tira de couro com que se
prende o cão de caça”. Quid iuris?
b) João levava o Bobi sem trela dentro de uma caixa de madeira fechada e com rodinhas
quando o Polícia Implacável apareceu. Quid iuris?
c) O João andava a brincar à apanhada com o Bobi, dentro de casa com as portas da rua
bem abertas, quando o Polícia Implacável tocou à campainha. Quid iuris?
d) O cachorro recém-nascido de Joana está adoentado. Joana ia para o veterinário com o
bicho ao colo (rectius, na mão) quando o Polícia Implacável lhe mostrou uma cópia do
regulamento. Quid iuris?
e) O cão de Joel levou um tiro durante uma caçada. Embora andasse, ia perdendo
bastante sangue. Joel levou-o a correr ao veterinário, apesar de não ter nada para o
prender. Quid iuris?
f) João esqueceu-se de fechar a porta de casa quando entrou com o Bobi. Este, já se vê,
escapuliu-se e foi farejar as pernas do Polícia Implacável. Quid iuris?
g) Os cães da pradaria, roedores gregários com cerca de 40 cm, defendem-se com
dentadas profundas quando assustados e sem possibilidade de fugir. Joaquim
domesticou um, que lhe é fiel como um cão. O Polícia Implacável ficou feliz ao vê-los
na rua unidos apenas pela amizade.
h) Certa vez, o João levava o Bobi preso com uma trela de 20 metros. Quid iuris?
i) João estava a brincar com o Bobi o seu jardim, que tem um gradeamento de 2m de
altura, quando viu o Polícia Implacável a espreitar sorridente.
j) O Bobi, antes do almoço, quis brincar com a Jaqueline no jardim desta, cujo muro
estava quase pronto e ficava mesmo ao pé da escola primária.
k) João, farto, abandonou o Bobi longe de casa, com a trela bem presa ao pescoço. O
Bobi, graças ao seu olfato, correu para o Polícia Implacável, que andava a pescar
caçadores sem licença. Quid iuris?
l) Chegado a este ponto, o autor da história cansou-se: o que é interpretar?»
Adaptado de PEDRO FERREIRA MÚRIAS, op. cit., p. 26-27

65. Com o ano de 2022 a aproximar-se, o Governo decide emitir um Regulamento relativo aos
festivais de Verão. Como forma de promoção dos restaurantes-parceiro dos eventos, que
sofreram enormes perdas de faturação durante o período em que estiveram fechados,
estabelece o artigo 6.º do referido Regulamento:
“Artigo 6.º
É proibido entrar no recinto com qualquer tipo de alimentos e bebidas.” Consta
ainda do artigo 7.º:
“Artigo 7.º
É proibida a entrada no recinto com qualquer tipo de objetos que possam ser considerados perigosos,
entre os quais armas e explosivos.”
Em junho de 2022, Francisca e José decidem ir ao festival Paredes do Lima, em Ponte de
Lima, assistir aos concertos de vários dos seus artistas favoritos.
a) Francisca há muito que toma, por recomendação médica, uns remédios naturais,
em forma de rebuçado, para a tensão. Já no interior do recinto, é abordada por um
dos seguranças, que a vê a retirar um dos rebuçados do pacote, uma vez que é
proibido ingerir alimentos que não tenham sido comprados num dos quiosques do
evento. Quid iuris?
b) José utiliza o seu canivete suíço para abrir um pacote de sumo que comprara num
dos quiosques do evento. É imediatamente abordado por um segurança, que o
avisa que deverá entregar-lhe o seu canivete suíço, ou então será obrigado a
abandonar o recinto. Quid iuris?

66. O Decreto-Lei n.º 78-A/2021, de 29 de setembro, veio alterar as medidas excecionais e


temporárias relativas à pandemia de COVID-19, estabelecendo que o uso de máscaras ou de
viseiras passa a ser obrigatório apenas para o acesso ou permanência no interior de
determinados locais fechados, de entre os quais se incluem os “espaços e estabelecimentos
comerciais, incluindo centros comerciais, com área superior a 400m2”.
Joana é proprietária do estabelecimento “Healthy Green”, dedicado à confeção e venda para
consumo no local de refeições saudáveis e à venda de produtos biológicos. O
estabelecimento tem 450m2 e incluí uma zona de restauração e uma pequena loja de
produtos biológicos em open space. Tendo tomado conhecimento deste Decreto-Lei, Joana
pretende saber se se mantém a obrigatoriedade do uso de máscara dentro do seu
estabelecimento. O que diria a Joana?

67. Tendo em vista salvaguardar postos de trabalho no interior do país, sobretudo daqueles
trabalhadores que têm filhos menores, foi publicado no dia 18 de novembro o Decreto-Lei
X/2021, em que se pode ler o seguinte:
“Artigo 5.º
Até ao dia 31 de dezembro de 2022 as entidades patronais com sede ou direção efetiva nos municípios
listados no Anexo 1, que tenham registado lucros em pelo menos dois dos últimos três exercícios,
ficam impedidas de promover o despedimento de trabalhadores que tenham três ou mais filhos.
Artigo 6.º
É punido com pena de prisão até 1 ano ou de multa até 120 dias o despedimento de trabalhadores
em violação do disposto no número anterior.
Artigo 7.º
O presente diploma entra imediatamente em vigor.”
No dia 19 de novembro, uma portaria do Ministério do Trabalho, Solidariedade e
Segurança Social que simplificava as regras de acesso a candidaturas de apoios sociais aos
desempregados do interior, continha uma norma do seguinte teor: “Nos concelhos com
menos de 5.000 habitantes, a proibição de despedimentos a que se refere o artigo 5.º do
Decreto-Lei X/2021, de 18 de Novembro abrange todos os trabalhadores com dois ou
mais filhos em idade escolar”.
Suponha que uma empresa com sede num dos municípios incluídos no Anexo 1 e com
menos de 5.000 habitantes, decidiu descontinuar uma das áreas de negócio que explorava,
por ser inviável economicamente, vendo-se obrigada a despedir os seguintes trabalhadores
afetos a essa área de negócio:
a) António, que prestava serviço na sede da empresa, com três filhos em idade
escolar, recebeu a carta de despedimento no dia 19 de novembro. Quid iuris?
b) Carla, com três filhos em idade escola e Daniel, com dois filhos e um adotado, todos
eles em idade escolar, que prestavam serviço na sede da empresa, receberam a carta
de despedimento no dia 22 de novembro. Quid iuris?
c) Elsa, que prestava serviço na loja da empresa em Lisboa, com três filhos em idade
escolar, recebeu a carta no dia 23 de novembro. Quid iuris?

68. A Leonor, de 20 anos, pretende vender um bem imóvel. Considere que a Lei n.º X/2016
proíbe a administração de bens imóveis por menores de 21 anos. Quid iuris?

69. António, de 17 anos de idade, vendeu a Bernardo um valioso relógio que lhe tinha sido
doado pelo seu Avô. Bernardo solicita-lhe a exibição de um documento de identificação e
António mostra uma carta de condução que o apresenta como tendo 18 anos de idade. Os
pais de António tiveram imediatamente conhecimento do negócio celebrado e pretendem
requerer a sua anulação. Tendo em atenção o disposto no artigo 126.º do CC e os elementos
hermenêuticos de interpretação, considera que o Tribunal deverá anular o negócio celebrado
entre António e Bernardo?

70. Para combater a violência e o assédio contra mulheres, a Lei n.º 83/2015, de 5 de agosto,
veio alterar o Código Penal, alargando e aumentando as penas pela prática de crimes sexuais.
Concretamente, no novo artigo 170.º do Código Penal, em vista a acabar com os “piropos”
às mulheres, passa a considerar-se crime a chamada “importunação sexual”. Assim, “quem
importunar outra pessoa (…), formulando propostas de teor sexual (…), é punido com pena de prisão até
um ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição
legal”.
Em face das reiteradas dúvidas interpretativas relativamente à subsunção dos “piropos” ao
crime previsto no novo artigo 170.º do Código Penal, o Governo veio esclarecer que os
“piropos” sem malícia não estão cobertos pelo crime de “importunação sexual”.
Sofia, notável defensora dos direitos das mulheres, discorda da interpretação firmada pelo
Governo, considerando que a mesma não a vincula. Terá razão?

71. No dia 4 de fevereiro de 2000, António, proprietário e diretor técnico da Farmácia Tomaz,
sita na Rua Professor Abílio Alves de Brito, no lugar de Pousos, em Leiria, requereu ao
INFARMED, nos termos da Portaria nº 936-A/99, de 22 de Outubro de 1999, a
transferência de local da sua farmácia para a Rua das Olhalvas, no lugar das Olhalvas,
também em Leiria, onde adquiriu instalações adequadas ao exercício da respetiva atividade.
O pedido de transferência fundamentou-se, essencialmente, nas deficientes condições de
conservação e salubridade do imóvel em que se encontrava instalada a Farmácia Tomaz e,
por outro lado, na inviabilidade económica desta, dado o reduzido número de doentes que,
no lugar de Pousos, recorriam aos seus serviços.
O INFARMED teve, contudo, dúvidas sobre a decisão a tomar, porque, segundo
informação fornecida pela Sub-Região de Saúde de Leiria, a distância entre o local
pretendido para a nova localização da Farmácia Tomaz e a farmácia mais próxima – a
Farmácia Higiénica – era apenas de 450 metros, quando, segundo a alínea b) do nº 1 do
artigo 2º da Portaria nº 936-A/99, de 22 de outubro, a distância mínima admissível entre
farmácias cifrava-se em 500 metros. Com efeito, a alínea b) do referido artigo 2º, sob a
epigrafe “condições gerais de instalação”, preceituava à data que só se podia instalar uma
nova farmácia se “não se encontrar instalada nenhuma farmácia na área delimitada por
uma circunferência de 250 metros de raio e cujo centro seja o local de instalação da nova
farmácia, não podendo haver sobreposição de áreas”.
O requerente defendeu que o método utilizado pela Sub-Região de Saúde de Leiria para
efetuar a medição da distância entre a Farmácia Higiénica e a nova localização pretendida
para a Farmácia Tomaz – do qual resultou uma distância de 450 metros – não era de todo
correto. Com efeito, a medição não podia ser feita em linha reta, no mapa, mas por
caminhos públicos, como foi realizada pela Câmara Municipal de Leiria – obtendo-se, em
consequência, uma distância de 700 metros.
Tendo em conta a factualidade descrita, pergunta-se qual era a forma correta de efetuar a
medição da distância mínima entre farmácias estabelecida na alínea b) do nº 1 do artigo 2º
da Portaria nº 936-A/99, de 22 de Outubro de 1999.

72. Considere as seguintes normas do direito português no domínio da filiação:


“Presume-se que o Pai é o marido da Mãe”.
“A Mãe é quem tiver dado à luz o filho”.
Imagine que usando as modernas técnicas de reprodução artificial, Maria, casada com Joana,
dá à luz um filho, cujo património genético é parcialmente proveniente de estranhos.
Como atribuiria a filiação na ausência de regulamentação legal para o caso?

73. António, assumindo-se desde a adolescência como transexual, submeteu-se, quando fez
18 anos, a uma operação cirúrgica em Casablanca para mudança de sexo. Posteriormente,
e em conformidade, solicitou na Conservatória de Registo Civil a modificação da inscrição
registal do seu assento de nascimento, requerendo que passasse a constar que é do sexo
feminino e se chama Antónia. Admita que, à altura, o Código de Registo Civil nada previa
nesta matéria. Quid iuris?

74. Analise criticamente o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 22.06.2004


(2518/2004-1), designadamente em face da Lei n.º 7/2011, de 15 de março.

75. O DL 105/99, de 31 de março, diz no seu preâmbulo:


«A situação de greve que se tem verificado em conservatórias do registo comercial tem provocado sérias
perturbações e constrangimentos no regular fluir do comércio jurídico, particularmente no sector empresarial.
(...). Impõe-se, por isso, a adoção de medidas de exceção tendentes a assegurar a normalidade do comércio
jurídico, garantindo-se, simultaneamente, a segurança possível, dadas as circunstâncias atuais.».
Do articulado sobressaem os seguintes trechos:
Artigo 2.º/1: «Enquanto se mantiver a situação de processo de greve nos serviços de registo
comercial, e no período de 60 dias após a sua cessação, a exigência legal, para qualquer efeito, de
apresentação de certidão do registo comercial pode ser substituída por declaração dos factos que a mesma
se destina a comprovar, prestada pelos interessados, sob compromisso de honra.»
Artigo 2.º/2: «Sem prejuízo da declaração a que se refere o número anterior, podem os interessados
juntar prova dos factos sujeitos a registo comercial mediante a apresentação dos documentos que serviriam
de base aos correspondentes registos.».
No dia 15 de abril de 1999 começou uma greve, por tempo indeterminado, dos funcionários
das conservatórias do registo predial. A sua adesão é ligeiramente superior à verificada na
greve anterior. Pergunta-se: Nos atos para que fosse necessária a apresentação de certidões
do registo predial, pode ser invocado o DL 105/99?”
In PEDRO FERREIRA MÚRIAS, op. cit., p. 31

76. Suponha que o Governo aprovou um regime excecional de IRS para os docentes de
universidades públicas, determinando uma redução de 1,5% na taxa máxima de IRS, tendo
em conta o especial perigo em face da pandemia de COVID-19.
a) António, docente de uma universidade pública e de uma universidade privada, pode
beneficiar de tal regime?
b) Bernardo, docente de uma escola pública do ensino secundário, terá direito à
redução de 1,5%?

VI. A DETERMINAÇÃO DOS LIMITES TEMPORAIS DAS NORMAS

77. No passado dia 15 de novembro, foi publicada uma lei que, entre outros aspetos relativos
ao arrendamento urbano para habitação nos centros históricos de Lisboa, impôs aos
senhorios uma renda máxima por metro quadrado de área útil dos imóveis arrendados.
a) Qual o grau de retroatividade desta lei nos seguintes casos:
b) A lei nada dispõe sobre os contratos a que se aplica;
c) A lei estatui que se aplica «aos contratos já celebrados, mas só quanto às rendas
vincendas;
d) A lei determina que se aplica «aos contratos de arrendamento já celebrados,
inclusive quanto às rendas vencidas, mas não pagas;
e) A lei estabelece que se aplica «aos contratos de arrendamento celebrados a partir do
dia 1 de janeiro de 2017, devendo ser restituídas aos inquilinos as rendas pagas em
excesso»;
f) A lei prevê a sua aplicação «aos contratos celebrados desde o dia 1 de janeiro de 2017,
mesmo quanto às rendas já vencidas, devendo ser restituídas aos inquilinos as

[Escreva aqui]
quantias pagas em excesso, mesmo nos casos em que sobre o pagamento ou sobre a
relação das partes haja sido proferida sentença transitada em julgado.
g) Quais os contratos a que a lei nova se aplica, e em que medida, no caso de dela
constar um artigo final dizendo apenas: «Esta lei tem eficácia retroativa»?

78. Atendendo a recentes estudos que sublinham os graves malefícios dos cigarros eletrónicos,
a Lei X/2014, de 28 de dezembro, veio proibir a sua venda, atribuindo eficácia retroativa ao
diploma.
Responda às seguintes questões:
a) A InaloVape, Exclusive Smoking Devices, Lda., tem vendido a Fulgêncio vários
cigarros eletrónicos personalizados: o primeiro já está pago e já foi entregue; o
segundo já foi entregue e encontra-se parcialmente pago; o terceiro foi entregue, mas
ainda não se encontra pago; o quarto foi encomendado pela Inalovape ao
fabricante, que ainda não iniciou a sua produção, não tendo sido ainda efetuado
qualquer pagamento. A quais destes contratos se aplica a Lei X/2014?
b) Pode a InaloVape, Exclusive Smoking Devices, Lda., vender hoje cigarrilhas
eletrónicas sabendo que estas são ainda mais perigosas para a saúde?

79. Admita que no passado mês de outubro entrou em vigor uma lei que alterou as regras pelas
quais se rege a atividade das empresas que gerem e exploram os chamados “bancos de
imagens” para fins publicitários ou de comunicação institucional. Da lei nova consta a
seguinte disposição:
“1. A cedência de fotografias com imagem pessoal confere ao cedente o direito de, a todo o tempo,
manifestar junto do cessionário a sua intenção de que essas fotografias não sejam usadas para
efeitos de comunicação político-partidária, seja de que natureza for, o que o cessionário terá de
respeitar e observar.
2. O exercício, por parte do cedente, do direito a que alude o número anterior em momento
posterior ao da cedência de fotografias, confere por seu turno ao cessionário o direito de exigir do
cedente o reembolso de tudo quanto lhe tenha sido pago como contrapartida pela cedência dos
direitos de imagem, caso as fotografias em causa nunca tenham sido usadas para outro fim”.
Carlos, modelo fotográfico, soube que a empresa a quem cedeu três fotografias suas está a
fechar com sucesso um acordo com um determinado partido político e, por isso, pretende
opor-se a que as suas fotografias sejam usadas no site ou em campanhas eleitorais desse
partido, estando na disposição de reembolsar a empresa do que esta lhe pagou pelas ditas
fotografias. A empresa, porém, disse-lhe que ele cedera as fotografias antes da entrada em
[Escreva aqui]
vigor da nova lei, pelo que esta não se aplica ao caso vertente.

80. O novo Estatuto da Carreira Docente Universitária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
205/2009, de 31 de agosto, vem estabelecer, de forma inovatória, um regime de avaliação
de desempenho. Os docentes universitários passam, assim, a estar sujeitos a um regime de
avaliação de desempenho, relevante para efeitos de alteração do posicionamento
remuneratório. A avaliação do desempenho realiza-se de três em três anos e reporta-se ao
período trienal anterior.
Por outro lado, ao contrário do regime anterior, o novo regime só admite que se apresentem
a concurso para professor catedrático aqueles que tiverem realizado o doutoramento há
mais de cinco anos.
O referido decreto-lei, por força do disposto no seu artigo 22.º, entrou em vigor no dia
seguinte ao da sua publicação.
Esclareça, sucinta e fundamentadamente, as seguintes questões:

a) As novas regras sobre avaliação de desempenho aplicam-se aos atuais docentes


universitários e, em caso afirmativo, em que termos?
b) O Prof. Doutor António Gervásio, doutorado há três anos, e com agregação,
pretende saber quando pode submeter-se a concurso para professor catedrático.
Quid iuris?

81. Beatriz é, desde 2014, proprietária de um apartamento num edifício em propriedade


horizontal. Desde 2016, explora o apartamento em regime de alojamento local. Em 2020 foi
aprovada uma lei que, entre outras disposições, consagra a seguinte:
“No caso de a atividade de alojamento local ser exercida numa fração autónoma de edifício ou
parte de prédio urbano suscetível de utilização independente, a assembleia de condóminos, por
decisão de mais de metade da permilagem do edifício, em deliberação fundamentada, decorrente
da prática reiterada e comprovada de atos que perturbem a normal utilização do prédio, bem
como de atos que causem incómodo e afetem o descanso dos condóminos, pode opor-se ao exercício
da atividade de
alojamento local na referida fração, dando, para o efeito, conhecimento da sua decisão ao
Presidente da Câmara Municipal territorialmente competente.”
Beatriz quer, pois, saber se os demais condóminos podem fazer uso desta disposição,
opondo-se à exploração que até agora vinha fazendo do apartamento, uma vez que a
afetação do imóvel a este tipo de arrendamento é anterior à entrada em vigor da dita lei.
[Escreva aqui]
82. Em 1 de setembro de 2013 foi celebrado um contrato de arrendamento urbano para fins não
habitacionais. O contrato foi celebrado com prazo certo e, mais concretamente, pelo período
de três anos. À luz do regime legal vigente à data da celebração do contrato, o contrato não se
renovava automaticamente, no seu termo, ressalvada a eventualidade de existir uma estipulação em contrário
– o que, no caso concreto, não aconteceu.
Entretanto, desde 2015, estava já em vigor o Novo Regime do Arrendamento Urbano. De
acordo com o novo regime, passou a dispor-se o seguinte: “na falta de estipulação, o contrato
considera-se celebrado com prazo certo, renovando-se automaticamente se o senhorio não o denunciar com
antecedência inferior a 120 dias”. O regime vigente é, nesta medida, distinto do que vigorava à data
da celebração do contrato, em matéria de renovação do contrato de arrendamento. Ou seja,
caso a nova regulamentação seja aplicável ao contrato de arrendamento de 1 de setembro de
2013, ter-se-á de concluir que o mesmo se renovou automaticamente, no seu termo, pois, à
luz da nova lei, o contrato renova- se automaticamente no seu termo, caso não seja
atempadamente deduzida oposição pelo senhorio, com a antecedência mínima de 120 dias. O
senhorio, que não denunciou o contrato, contesta a aplicação da lei nova e sustenta que o
contrato de arrendamento caducou, invocando, para o efeito, que não se pode perder de vista
que quer a norma vigente no momento da celebração do contrato quer a norma em vigor no
momento em que poderia haver denúncia do contrato são normas supletivas, pelo que o
legislador admitia e admite estipulação em contrário, ou seja, que as partes convencionem um
regime diverso. Ora, em rigor, o contrato é omisso.

83. Bernardo e Catarina são proprietários de dois prédios contíguos, sendo que a relação de
vizinhança e os direitos e obrigações dela decorrentes remontam a 1970. Em 20 de Julho de
1986, uma nova lei vem estabelecer que os titulares de prédios contíguos têm direito de
preferência na alienação. Deverá essa lei aplicar-se à relação de vizinhança entre Álvaro e
Berta?

84. Pelo Decreto-Lei n.º 496/77, de 25 de novembro, o cônjuge passou a integrar o rol dos
herdeiros necessários, ditos legitimários, o que não sucedia antes dessa importante alteração
legislativa. Nuno e Manuela, casados desde 1971, com filhos e netos, pretendem saber se
são herdeiros legitimários um do outro.

85. Catarina e Duarte casaram em 2002, sob o regime da comunhão de adquiridos. De acordo

[Escreva aqui]
com o artigo 1724.º do Código Civil, o produto do trabalho dos cônjuges faz parte da
comunhão.
A Lei N/2011 foi publicada a 3 de janeiro de 2011 com a redação que se segue:
«Atendendo às dificuldades de interpretação suscitadas pela redação do artigo 1724.º do
Código Civil, a Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º
da Constituição o seguinte:
Artigo 1.º
O produto do trabalho dos cônjuges não inclui as quantias recebidas a título de direitos de
autor.
Artigo 2.º
A presente Lei entra imediatamente em vigor.»
Catarina é uma famosa escritora de romances policiais. Duarte pretende saber se as quantias
abaixo indicadas, recebidas por este a título de direitos de autor, integram, ou não, a
comunhão de bens do casal.
a) As que Catarina venha a receber, por força do contrato que celebrou hoje de manhã;
b) As referentes a contratos já celebrados que este venha a receber;
c) As que Catarina já recebeu;
d) As que Catarina já deveria ter recebido, mas que, por atraso da editora, ainda não
lhe foram pagas;
e) As que foram penhoradas em 2005, para pagamento de uma dívida da exclusiva
responsabilidade de Duarte, em ação executiva encerrada por sentença já transitada
em julgado.

86. Abel e Beatriz casaram em 2015 com dezoito anos de idade. Embora na altura não tenham
celebrado qualquer convenção antenupcial, estava então em vigor a lei X nos termos da qual
era aplicável, na falta de estipulação em contrário dos nubentes, o regime da comunhão de
adquiridos. Entretanto, em 20 de maio de 2016, no contexto da aprovação dum novo
Código Civil, é publicada a lei Y contendo os seguintes preceitos: 1. O casamento entre
menores é nulo; 2. Para efeitos matrimoniais a maioridade adquire-se aos vinte e um anos;
3. É aplicável aos casamentos o regime da separação de bens, com exclusão de qualquer
outro; 4. A presente lei entra em vigor no prazo de quinze dias após a sua publicação.
a) Pode considerar-se que após a entrada em vigor da Lei Y o casamento de Abel e Beatriz
é nulo?
b) Qual o regime de bens a que está sujeito o casamento de Abel e Beatriz após a entrada
em vigor da Lei Y?
[Escreva aqui]
87. Dois amigos, após um longo período de desemprego, decidiram constituir uma sociedade
onde, para além deles, sócios-gerentes, trabalha, desde agosto de 2016, um funcionário que
celebrou com a sociedade um contrato de trabalho, auferindo uma remuneração mensal de
€ 530 (quinhentos e trinta euros).
Sabendo que o Governo aprovou legislação que fixa o salário mínimo em € 557 (quinhentos
e cinquenta e sete euros), e mesmo não conhecendo o texto do diploma, que ainda não foi
publicado no Diário da República, os sócios não sabem se essa alteração se aplicará ao seu
funcionário.
A sociedade encontra-se com dificuldades de tesouraria devido à pandemia da Covid-19. Um
Decreto-Lei que entrou em vigor no dia 01.01.2021, entre várias medidas de proteção a
microempresas com volume de negócios anual não superior a € 50.000 (cinquenta mil
euros), como é o caso da deles, estabeleceu que o prazo de pagamento das encomendas
feitas pelos clientes não pode ser superior a 60 dias. Foi com muito alívio que receberam
esta notícia, pois que na véspera do Natal de 2020 aceitaram uma encomenda que deverá ser
entregue ao cliente no dia 17.01.2021, tendo ficado acordado um prazo de pagamento de
120 dias contados da data de encomenda.

88. No contexto das medidas de confinamento em vigor desde março de 2020, e para
compensar os lojistas dos centros comerciais entretanto encerrados, o n.º 5 do artigo 168.º-
A da Lei do Orçamento do Estado para 2020, que entrou em vigor no dia 25 de julho,
suprimiu até ao final desse ano a obrigação de pagamento da renda pelos lojistas. A lei e não
contém qualquer disposição transitória especial.
Os proprietários dos centros comerciais pretendem saber se, em relação aos contratos de
utilização de lojas em centros comerciais que estivessem em execução em momento anterior
ao dia 25 de julho de 2020, se mantém a obrigação de pagamento das rendas já vencidas.
Quid iuris?

89. Duarte em dezembro de 2017 herdou de um tio um lindíssimo solar no Minho e a sua
importante biblioteca. Uma das preciosidades da livraria era um raríssimo exemplar da
edição princeps de “Os Lusíadas” (1572), que depois de muita insistência vendeu a Francisco,
conhecido bibliófilo. O contrato foi celebrado a 15 de dezembro, tendo as partes combinado
que o preço seria pago em 12 prestações mensais, por crédito de uma conta bancária de
Duarte e que o livro seria entregue em casa de Francisco, em Lisboa, uma semana depois de
paga a oitava prestação. Dois meses depois de celebrado o negócio, o Governo aprovou um
[Escreva aqui]
diploma que impôs: (i) o direito de preferência da Biblioteca Nacional em todas as compras
e vendas de espécies bibliográficas anteriores ao século XVII; (ii) que o pagamento integral
do preço não podia distar mais de 3 meses a contar da celebração do contrato; e (iii) que os
seus proprietários deviam declarar a propriedade dos livros no Ministério da Cultura para
que fosse mantida uma lista desses tesouros nacionais. Imagine ainda que em março de 2018
entra em vigor o disposto no art.º 773.º do Código Civil.

90. Vasco, por testamento feito em 14 de outubro de 2020, deserdou o seu filho Hermínio, com
fundamento na condenação por tentativa de homicídio do adotante de Vasco, facto que
constituía causa de deserdação segundo a lei vigente em 2012. Admita que em 2 de janeiro
de 2021 entra em vigor uma lei, que, nada dizendo sobre o seu início de vigência, elimina
aquele facto de entre as causas de deserdação. Vasco morre em 8 de janeiro de 2021. Deverá
ser o caso de o testamento ser cumprido e, portanto, de o filho Hermínio ficar afastado da
sucessão? (Sobre a deserdação, ver artigo 2166.º do Código Civil).

91. João explora, desde 2018, um bar na zona do Bairro Alto, em Lisboa, tendo, para o efeito,
contratado um empréstimo junto do Banco AABB nesse mesmo ano, ao abrigo do qual
paga ao Banco uma prestação mensal de € 300,00 no dia 20 de cada mês.
No seguimento do surgimento da pandemia de COVID-19, João viu-se obrigado a fechar
o seu bar a partir de 13 de março de 2020, deixando de auferir rendimentos deste. Por
conseguinte, quando chegou o dia 20 de março, João não conseguiu pagar a prestação
mensal ao Banco.
Com vista a proteger as famílias e empresários portugueses que ficaram impossibilitados de
pagar os seus empréstimos, o Governo aprovou, através de decreto-lei, uma moratória,
prevendo a suspensão do pagamento das prestações de reembolso de empréstimos
concedidos. O Decreto-Lei entrou em vigor no dia 27 de março de 2020 e dispõe o
seguinte: “O presente diploma aplica-se a todas as prestações devidas a partir de 13 de março de 2020,
ficando ressalvadas, contudo, as obrigações já cumpridas”.
João pretende lançar mão desta moratória e, para esse efeito, escreveu uma carta ao Banco
AABB a defender que, a partir de 13 de março de 2020, o pagamento das prestações devidas
ao Banco ao abrigo do contrato ficou suspenso.
a) Terá João razão?
b) E se o Decreto-Lei nada referisse quanto à sua aplicação no tempo, considera que a
moratória se aplicaria ao caso de João?

[Escreva aqui]
92. Guilherme está acusado de um crime de fraude fiscal, previsto e punido pelo art.º 103.º do
Regime Geral das Infrações Tributárias, por ter pretendido auferir vantagens patrimoniais
ilegítimas suscetíveis de causarem diminuição das receitas tributárias em montante de €
16.500,00, tendo julgamento marcado para março de 2022. Imagine que no dia 1 de janeiro
de 2022 entrará em vigor uma alteração do n.º 2 do mencionado preceito, que passará a ler-
se assim: “Os factos previstos nos números anteriores não são puníveis se a vantagem
patrimonial ilegítima for inferior a (euro) 20 000”.

93. Para prevenir o perigo de incêndios, em maio de 2018, foi publicada uma lei que veio punir
com pena de multa a realização de queimadas, o lançamento de foguetes e a realização de
espetáculos pirotécnicos durante os meses de junho a outubro desse ano. Suponha que
Rodrigo fez uma queimada em setembro de 2018 e irá ser julgado em dezembro de 2019.

94. Suponha ter sido hoje publicada uma Lei nos termos da qual “Não podem aceder à profissão de
professor dos graus de ensino básico e secundário, bem como à de educador de infância, quaisquer pessoas
condenadas por crime de pedofilia”.
Se Abel tivesse sido condenado por prática de pedofilia há quinze anos atrás, poderia
candidatar-se à carreira de educador de infância no concurso de ingresso à carreira que
abrisse daqui a um mês?

95. Com o aproximar da época festiva, o Governo, com a devida autorização, veio agravar a
moldura penal para quem viole as proibições de circulação na via pública impostas na
sequência da declaração de estado de emergência. Assim, de acordo com esta alteração,
quem viole as proibições de circulação na via pública passa a ser punido com pena de prisão
até 2 anos ou pena de multa até 240 dias, ao invés de pena de prisão até 1 ano ou pena de
multa até 120 dias previstas no anterior regime.
O diploma do Governo entrou em vigor às 00h00 do dia 21 de dezembro e estabelece o
seguinte: “O presente diploma aplica-se no período compreendido entre 17 de dezembro de 2020 e 4 de
janeiro de 2021”.
Considere as seguintes situações: (i) Álvaro foi mandando parar pela polícia e sumariamente
julgado no dia 18 de dezembro de 2020 por estar a violar a proibição de circulação na via
pública imposta; (ii) Beatriz foi mandada parar pela polícia e sumariamente julgada, pela
mesma razão, no dia 27 de dezembro de 2020; e (iii) Caetano foi mandado parar pela polícia
e sumariamente julgado no dia 6 de janeiro de 2021. Qual seria a moldura penal aplicável a
cada um dos sujeitos pela violação da proibição de circulação na via pública?
[Escreva aqui]
96. António, de 18 anos de idade, e Bento, de 21 anos de idade, celebraram oralmente um
contrato de compra e venda, mediante o qual o primeiro comprou ao segundo um
automóvel usado.
No dia após a conclusão do negócio entrou em vigor a Lei X, a qual procedeu a uma revisão
do Código Civil, tendo alterado entre outros os artigos 122º e 219º do referido Código.
Concretamente, os preceitos em causa passaram a dispor o seguinte:

ARTIGO 122º

É menor quem não tiver ainda completado vinte e um anos de idade.

ARTIGO 219º

A validade da declaração negocial depende da observância da forma escrita, salvo disposição em


contrário.

Em face das normas contidas nestes artigos, António pretende saber, por um lado, quem é o
proprietário do automóvel, por outro lado, se ele deve ser considerado maior ou menor.

97. Suponha que era publicada uma Lei isentando de responsabilidade por crime de emissão de
cheque sem provisão os infratores que paguem, no prazo de seis meses, o respetivo
montante, exceto se o processo já tiver sido instaurado.
Suponha, também, que é excluída a responsabilidade por outras infrações de carácter
económico, desde que os infratores paguem as respetivas multas, no prazo de seis meses.
António, acusado de ter cometido um delito de carácter económico, cujo processo será
julgado proximamente, pretende invocar a isenção de pena. O Ministério Público opõe-se
com o fundamento de já estar o processo instaurado. Quem tem razão?

98. O Código dos Contratos Públicos, que entrou em vigor em 1 de junho de 2008, veio
estabelecer uma nova sanção, dispondo que não pode participar num concurso público
quem, nos últimos três anos, tenha apresentado uma proposta em concurso público com
preços anormalmente baixos e não justificados. A NEWCO, afastada num concurso para a
construção de uma barragem realizado em 2022 por ter apresentado uma proposta com um
preço considerado anormalmente baixo, pretende saber se pode participar no concurso
público para a construção de uma nova ponte sobre o Tejo que será lançado em julho do

[Escreva aqui]
presente ano. Quid iuris?

99. No ano de 2020, Albino, empreiteiro, celebrou vários contratos pelos quais se comprometia
a construir moradias para entregar no prazo de dois anos.
Em 2021, entrou em vigor um decreto-lei, que introduziu uma nova redação do nº 1 do
artigo 1225.º do Código Civil: “Sem prejuízo do disposto nos artigos 1219.° e seguintes, se a
empreitada tiver por objeto a construção, modificação ou reparação de edifícios ou outros imóveis destinados
por sua natureza a longa duração e, no decurso de cinco anos a contar da entrega, ou no decurso do prazo de
garantia convencionado, a obra, por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação, ou por erros na
execução dos trabalhos, ruir total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável pelo
prejuízo causado ao dono da obra ou a terceiro adquirente”.
a) Tomando conhecimento desta alteração ao Código Civil, Albino foi indagar, junto
de um advogado, se estaria sujeito ao novo prazo de garantia da obra. Como deveria
o advogado ter respondido?
b) Mais tarde, desiludido por não ter conseguido enriquecer como empreiteiro, Albino
resolveu mudar de ramo e passar a dedicar-se à venda de falsificações de malas e
calçado de marcas de luxo. Acabou por ser descoberto e julgado pelo crime de fraude
sobre mercadorias. Foi condenado a uma pena de 6 meses de prisão, dos quais já
cumpriu 2. Imagine que entra, hoje, em vigor uma Lei que atribui aos atos de venda
de mercadorias falsificadas natureza contraordenacional. Quid iuris?

100. Luísa, estudante de Belas Artes, está a pensar adquirir junto de Daniel, empresário do sector
automóvel, um automóvel híbrido de última geração.
No test-drive realizado, Luísa assistiu ao seguinte episódio: Marlene, que conduzia o seu
automóvel, foi intercetada por uma operação stop. Na tentativa de fugir, acelerou, tendo,
com isso, perdido o controlo sobre o veículo e vindo a colher Heitor, que atravessava a rua
na passadeira, e que ficou gravemente ferido.
Jerónimo, transeunte, ao verificar o aparato, ato contínuo, arrombou a porta do automóvel
de Ivo, com a finalidade de transportar Heitor para o hospital.
a) Em que responsabilidades jurídicas poderá incorrer Marlene? Identifique, igualmente,
as sanções jurídicas correspondentes.
b) Ivo pretende ser indemnizado por Jerónimo. Este defende-se, alegando que nada tem a
pagar. Quem tem razão?

[Escreva aqui]
101. Nos termos do artigo 1720º do texto inicial do Código Civil de 1966, o casamento celebrado
por quem tenha completado sessenta anos de idade, sendo de sexo masculino, ou cinquenta,
sendo de sexo feminino, era imperativamente contraído no regime de separação de bens.
Com a revisão do Código Civil de novembro de 1977, passou a aplicar-se em geral o regime
supletivo da comunhão de adquiridos até aos sessenta anos, só ficando sujeitos àquele
regime imperativo os casamentos celebrados por quem tenha completado 60 anos de idade,
independentemente do sexo. Aplica-se esta alteração aos casamentos celebrados por uma
mulher com 51 anos antes da sua entrada em vigor?

102. No dia 30 de outubro de 1993, pelas 5h30m, ocorreu um acidente de viação entre um
automóvel que circulava no sentido Vilamoura-Albufeira e um táxi que rodava em sentido
contrário. André, estudante universitário, seguia deitado no banco de trás daquele
automóvel, como passageiro transportado gratuitamente (‘à boleia’). As consequências do
embate foram para si significativas: para além de contusão cervical, fratura da segunda
vértebra e contusão do segundo dedo da mão direita, ficou internado até ao dia 23 de
novembro de 1993 no Hospital Distrital de Faro e até 28 de novembro de 1995 foi a
consultas externas e a tratamentos fisioterapêuticos, com tudo despendendo uma quantia
apreciável.
Em janeiro de 1995, pretendendo compensação pelos prejuízos suportados, André
demandou judicialmente Beatriz, a proprietária e condutora do veículo que o transportara
gratuitamente. Admitindo embora que o embate não resultara de culpa de Beatriz, André fez
valer que a mesma deveria ser responsabilizada pelo risco – mesmo na ausência de culpa,
portanto – , nos termos dos n.ºs 1 e 3 do artigo 504.º do Código Civil1. André recordou ainda
que as soluções inscritas nestas disposições legais, resultado da transposição de uma Diretiva
europeia, visaram integrar no direito interno o princípio da responsabilidade pelo risco do
transportador para com os passageiros transportados gratuitamente.

Beatriz e a sua seguradora contestam a pretensão de André, considerando que à data da


verificação do acidente era vigente uma redação do artigo 504.º Código Civil anterior à
transposição da Diretiva referida. Ora, na parte em que se referia à responsabilidade do
transportador perante passageiros transportados gratuitamente, aquela disposição legal

1 Faz-se referência a uma responsabilidade pelo risco para referir a responsabilidade que dispensa a existência de
qualquer grau de culpa na produção do dano, bastando o simples risco associado à atividade ou à coisa. Aqueles que
tiram vantagem ou proveito de uma atividade ou coisa perigosa respondem, independentemente de culpa, pelos danos
associados a essa atividade ou coisa.
[Escreva aqui]
preceituava, na sua redação anterior, que “o transportador responde apenas ... pelos danos que
culposamente causar”.

Sabendo-se que o acidente não foi determinado por culpa de Beatriz, como decidiria se
estivesse no lugar dos juízes a quem pertenceu julgar a causa?

103. Por contrato lavrado por escritura pública de 8 de outubro de 1999, a sociedade AABB
arrendou à sociedade CCDD o rés-do-chão e a cave de um imóvel situado em Lisboa. O
arrendamento foi celebrado sem duração determinada. Em 22 de fevereiro de 2017, AABB
enviou a CCDD carta com o teor seguinte:
“Assunto: Comunicação de denúncia2 do contrato de arrendamento celebrado em 08-10-99

(...)

Na qualidade de Senhoria, vimos pela presente (...) denunciar o contrato de arrendamento comercial que teve
o seu início no dia 1 de outubro de 1999, celebrado por escritura pública de 08 de outubro de 1999, no
Cartório Notarial (...), sito na Av. Almirante Reis.

A presente denúncia é feita com um aviso-prévio de 2 (dois) anos, conforme estabelece a alínea c) do artigo
1101º do Código Civil, pelo que a mesma produzirá os seus efeitos no dia 1 de março de 2019, data em que
se extingue o referido contrato de arrendamento aqui denunciado.

Assim, na referida data deverão V. Exas. proceder à desocupação do locado de pessoas e bens e à sua entrega
à Senhoria, com todas as respetivas chaves”.

Em 1 de março de 2019, a CCDD não entregou o locado. Fundamentou-se, para o efeito, no


facto de após a comunicação da denúncia e antes do decurso do prazo de dois anos nela
referido, a alínea c) do artigo 1101º do Código Civil ter sido alterada pela Lei nº 13/2019, que
entrou em vigor a 13 de fevereiro de 2019. Por força desta alteração, a alínea c) do artigo
1101º do Código Civil estabelece agora uma antecedência não inferior a cinco anos em lugar
do período de dois anos anteriormente previsto3.

Pergunta-se: assistia razão à CCDD na sua pretensão de que a entrega do local arrendado não
tivesse que ter lugar no dia 1 de março de 2019?

2 A denúncia é uma forma de cessação dos contratos.


3 Ao tempo do envio da carta de denúncia, dispunha como segue o artigo 1101.º, alínea c), do CC: “O
senhorio pode denunciar o contrato de duração indeterminada nos casos seguintes: (...) alínea c) Mediante
comunicação ao arrendatário com antecedência não inferior a dois anos sobre a data em que pretenda a cessação”.
[Escreva aqui]
VII. TUTELA E RESPONSABILIDADES JURÍDICAS

104. Edgar, agricultor, receoso pelos acontecimentos envolvendo as suas propriedades dos quais
resultara o desaparecimento de 150 quilos de fruta, resolve precaver-se de futuros “assaltos”,
munindo-se de uma caçadeira. Na madrugada da passada quinta-feira, Edgar surpreendeu
Filipe, menor, com 7 anos de idade, empoleirado na laranjeira de Edgar, a colher laranjas.
Admita as várias hipóteses:
a) Edgar disparou um tiro de caçadeira na direção de Filipe, vindo a atingi-lo nas costas,
o que veio a determinar uma paralisia total dos seus membros inferiores.
b) Edgar retirou à força as laranjas das mãos de Filipe.
c) Filipe desceu da árvore e começou a correr, levando consigo o saco com as laranjas,
mas foi intercetado por Gustavo que estendeu a perna à sua passagem, evitando que
este conseguisse fugir com os frutos. Filipe caiu em cima de uma rocha e ficou com
uma fratura exposta na perna direita.
Identifique as formas de tutela jurídica e pronuncie-se sobre as responsabilidades jurídicas
suscetíveis de serem efetivadas.

105. Ana passeava por uma zona isolada do Guincho quando repara que dentro de um carro
estacionado se encontra uma pessoa, Abel, em convulsões, a sofrer um ataque de epilepsia. Com
recurso a uma pedra, Ana parte uma janela do carro, força a abertura da porta e transporta Abel
para o hospital. Posteriormente, é contactada pelo dono do carro, Eliseu, que exige a reparação
da janela partida. Ana considera que agiu licitamente, pelo que nunca poderá ser
responsabilizada pela sua atuação. Quid iuris?

106. Hugo, acompanhado por Inês, sua namorada, regressando a casa depois de uma noite “bem
regada” numa discoteca na linha de Cascais, ao tentar fazer uma ultrapassagem na Marginal,
colidiu com um veículo pesado conduzido por João. João seguia na sua faixa de rodagem em
cumprimento escrupuloso das regras de trânsito, incluindo dos limites de velocidade.

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Após a colisão dos veículos, João, que não sofreu qualquer tipo de danos – com exceção do
telemóvel que ficou danificado – arrombou a porta de um restaurante sito num local próximo,
para poder aceder a um telefone e contactar o 112. Nem Hugo, nem Inês tinham consigo
telemóveis ou outros meios de comunicação à distância.
Do acidente veio a resultar a morte de Inês e ferimentos graves em Hugo, que veio a registar
uma taxa de álcool no sangue superior a 1.3 g/l.
a) Identifique as formas de tutela jurídica e pronuncie-se sobre as responsabilidades
jurídicas suscetíveis de serem efetivadas.
b) Suponha, agora, que o proprietário do restaurante pretende ser ressarcido dos danos
causados na porta do estabelecimento. Quem deve ser responsabilizado?
Fundamente a sua resposta.

107. Num certo dia, João passeava na rua quando ouve os gritos de uma senhora idosa: “Acudam!
Aquele rapaz levou a minha mala!”. O dito rapaz, Luís, corria na direção de João. Prontamente,
João intercepta Luís, estendendo a perna à sua passagem e provocando a queda deste último
numa zona rochosa. Assim, João consegue devolver a mala à sua proprietária. Todavia, em
resultado da queda, Luís parte o braço direito e pretende ser ressarcido por João. Após consultar
um amigo, João considera que não é devida qualquer indemnização a Luís, visto ter-se tratado
de um caso de ação direta. Quid iuris?

108. Rodrigo, abastado empresário, apaixonado não correspondido de Sofia, sua contabilista, após
infinitas tentativas frustradas para a impressionar, resolveu raptá-la, com a colaboração do
motorista Tobias. No curso do rapto, Sofia conseguiu lançar mão do enorme vaso de cristal
que decorava um dos corredores da empresa, e com ele agrediu Tobias.
Atendendo a que Tobias sofreu ferimentos consideráveis, Rodrigo ficou sem o seu valioso vaso
de cristal e Sofia conseguiu libertar-se, avalie a responsabilidade jurídica de cada um deles.

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109. Nada melhor do que começar o dia, pela fresquinha, com uma corrida de 6 Km junto ao Tejo.
Era este um hábito diário de dois amigos, Jorge e Luís. Eram 6h20m da manhã e já os atletas
tinham percorrido metade do percurso. Àquela hora, na verdade, poucas são as pessoas que
estão na rua, à beira-rio. Apenas os desportistas impenitentes e os foliões que não gostam de
deixar as discotecas antes do romper do dia… alguns, diga-se, já bastante bebidos.
Normalmente, não há problemas. Mas naquela 2ª feira… andava um grupo de três corpulentos
rapazes, com barras de ferro nas mãos, numa vozearia alarve, a divertir- se com as novas
trotinetes que uma empresa, concertada com a Câmara Municipal de Lisboa, espalhou pela
cidade. Quando o grupo viu os atletas a aproximarem-se num ritmo cadenciado, decidiu ir ao
seu encontro a alta velocidade e com tom algo ameaçador. Com medo de serem atropelados
ou agredidos, Jorge e Luís, desviam-se da trajetória das trotinetes e derrubam-nas… a elas e aos
seus pouco amigáveis tripulantes. Dois deles já não se levantaram, mas um ainda conseguiu
pôr-se de pé, a custo, e antes que pudesse fazer uso da barra de ferro que nunca largou, o Luís
deu-lhe um soco que o deitou por terra. Claro que os três rapazes não gostaram e exigem agora
ser indemnizados… e a empresa proprietária das trotinetes também exige ser ressarcida pelos
danos nelas infligidos.
Quid iuris?

110. Joaquim passeava num jardim quando viu um encapuçado a dirigir-se na sua direção
empunhando uma faca com uma lâmina de consideráveis dimensões. Joaquim, convicto que se
tratava de José o “Estripador”, dispara um tiro na direção do homem que, na verdade, era o seu
amigo Pedro, ator que ensaiava para encarnar o papel do referido assassino num documentário
sobre os “assassinos em série”.
a) Analise a licitude ou ilicitude do comportamento de José.
b) Poderá José ser obrigado a indemnizar Pedro pelos danos causados, mormente pelo
facto de já não poder integrar o elenco do documentário?
c) Quando a polícia encontrar o “verdadeiro” assassino, a que tipo de sanções estará
ele sujeito? Fundamente a sua resposta, indicando e explicando quais as funções
prosseguidas pelas sanções que indicou.

111. No final de uma noite de Carnaval, Abel, já visivelmente embriagado, envolveu-se numa rixa
com dois indivíduos, que veio a resultar na morte de um deles.

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Surpreendido pela polícia, Abel pôs-se em fuga no seu automóvel. Durante a perseguição que
se seguiu, Abel acabou por colidir com automóvel de Catarina, que se encontrava estacionado
na via pública. A colisão causou um incêndio no automóvel conduzido por Abel.
Carlos, estudante de medicina, prestou os primeiros socorros a Abel e apagou o fogo,
utilizando água da fonte camarária existente nas imediações.
Pergunta-se:
a) Em que tipos de responsabilidade jurídica poderá incorrer Abel? Identifique,
igualmente, as sanções jurídicas correspondentes.
b) A Câmara Municipal pretende ser indemnizada por Carlos. Carlos defende-se,
alegando que o seu comportamento foi legítimo. Quem tem razão?

112. No dia 23 de agosto de 2008, António, que pretendia demolir a sua casa para construir uma
nova, convidou os seus amigos para a festa “Trás uma picareta e ajuda-me a demolir a minha casa!”.
Bento, seu vizinho, ao ver os primeiros convidados a chegar e a começarem a destruir casa,
soltou os seus rottweileres em defesa da propriedade do seu vizinho.
Na sequência do ataque, os cães feriram gravemente Carlos, que perdeu uma perna, e Diana,
que ficou desfigurada.
a) Bento entende que agiu em legítima defesa. Terá razão?
b) Carlos e Diana pretendem ser indemnizados por danos morais. Será possível?

113. Alex, jovem estudante francês, está presentemente a estudar em Lisboa ao abrigo do
programa Erasmus. Num intervalo dos seus estudos, decidiu seguir uma recomendação de
colegas e, como turista, meteu-se no elétrico 28 para apreciar as maravilhas da cidade… Na
verdade, ficou maravilhado com tudo quanto viu. Pelo menos, até sentir que lhe estavam a
tirar a carteira do bolso das calças. Não foi suficientemente lesto e não foi a tempo de evitar
o furto. Contudo, ficou com a noção de ainda ter visto o patife a sair do elétrico. A
preocupação de Alex foi grande porque tinha na carteira uma soma avultada de dinheiro,
que levantara para os seus gastos do mês.
Regressava a casa, cabisbaixo e desanimado, quando viu o rapaz que lhe furtara a carteira.
Abordou-o com ar ameaçador e de poucos amigos. Estranhando a abordagem, pela forma
como se lhe estavam a dirigir, o rapaz virou costas e seguiu o seu caminho em passo bem
apressado. Alex, então, para não o deixar fugir, agarrou-o pela camisola, rasgando-a e
causando-lhe uma ligeira escoriação no pescoço. Para se libertar, o rapaz deu-lhe um murro.

[Escreva aqui]
Enquanto isto se passava, um polícia que, entretanto, chegara ao local tomou conta da
ocorrência. O Alex conseguiu recuperar a sua carteira e o dinheiro que lá estava.

Mesmo assim Alex quer responsabilizar o rapaz pelos danos corporais que sofreu e este, por
seu turno, quer ser compensado pelo facto de ter ficado com a camisola estragada e com uma
nódoa negra no pescoço (5 valores).

114. Álvaro é estudante universitário e atleta de alta competição. Depois dos treinos gosta de ir
a pé para casa. Num dessas caminhadas, já tarde, noite cerrada e estranhamente pouco
movimentada, sentiu-se perseguido. Apressou o passo e de imediato deu conta de que a
pessoa que o perseguia começou a correr em sua direção. Antes de ser alcançado, Álvaro
dobrou a esquina de um quarteirão e rasteirou o perseguidor, que caiu inanimado no chão.
Como não conseguisse reanimá-lo, Álvaro fez menção de ligar para o 112, reparando
prontamente que não tinha consigo o telemóvel. Apercebendo-se da gravidade do estado
em que deixara o seu perseguidor, tocou à campainha de um R/C do prédio mais próximo.
Como ninguém lhe abriu a porta, Álvaro partiu o vidro da janela desse apartamento, por
nele ter visto um telefone fixo, de onde ligou ao 112. Quando a ambulância levantou o rapaz
que estava estendido na rua, Álvaro viu que o seu telemóvel estava no bolso das calças do
dito rapaz. A pronta assistência médica permitiu que o rapaz voltasse a si e meio atordoado
disse que não sabia bem o que lhe tinha acontecido. Só se lembrava de ter visto cair o
telemóvel de um rapaz e de ter tentado devolvê-lo.

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