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DOI: 10.1590/1413-81232018242.

27972016 383

A luta dos povos indígenas por saúde em contextos

ARTIGO ARTICLE
de conflitos ambientais no Brasil (1999-2014)

The struggle of indigenous peoples for health


in environmental conflict contexts in Brazil (1999-2014)

Diogo Ferreira da Rocha 1


Marcelo Firpo de Souza Porto 1
Tania Pacheco 1

Abstract The Brazilian development model, Resumo O modelo de desenvolvimento brasilei-


based on commodities and electro-intensive in- ro, fortemente baseado na produção de commo-
dustries for trade in global markets, generates dities e em indústrias eletrointensivas para trocas
social and environmental inequalities that trigger nos mercados globais, gera desigualdades sociais e
various conflicts between indigenous peoples and ambientais que desencadeiam diversos conflitos
communities and economic groups involving dis- entre povos indígenas e grupos econômicos envol-
putes over territory and common assets in contexts vendo disputas por terra e bens comuns em con-
that influence the health situation of these com- textos que influenciam fortemente a situação de
munities. The objective of this paper is to present saúde dessas comunidades. O objetivo deste artigo
an overview of environmental conflicts involving é apresentar um panorama dos conflitos socioam-
the Brazilian indigenous peoples, their strategies bientais envolvendo os povos indígenas brasileiros,
to ensure the sustainability and demarcation of suas estratégias para garantir o acesso e a quali-
their territories and discuss the forms of pressure dade do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena
of the population on this Subsystem of Indige- (SASI), e alternativas que eles têm proposto para o
nous Healthcare (SASI) or alternatives they have enfrentamento dos problemas gerados. Esta análi-
proposed to tackle the problems generated. This se se baseia em um mapeamento de conflitos am-
analysis is based on a mapping of environmental bientais baseado na revisão bibliográfica de fon-
conflicts based on the bibliographical revision of tes secundárias (do movimento indígena ou seus
secondary sources (by indigenous movements or parceiros) que subsidiaram a construção de relatos
their partners) that supported the construction of sobre os conflitos e a análise das narrativas indí-
reports on conflicts and analysis of the indigenous genas sobre o território onde vivem e suas lutas.
narratives about the territory where they live and A partir da qual concluímos que as estratégias de
their struggles. The conclusion drawn is that the luta pela saúde dos povos indígenas brasileiros são
health control strategies of Brazilian indigenous influenciadas pelas suas disputas socioambientais
peoples are influenced by their socio-environmen- e são parte das mobilizações desses povos pelo re-
tal disputes and are part of the mobilization of conhecimento integral de direitos.
1
Escola Nacional de Saúde these peoples for the full recognition of their rights. Palavras-chave Conflitos ambientais, Povos in-
Pública Sérgio Arouca,
Fiocruz. R. Leopoldo Key words Environmental conflicts, Indigenous dígenas, Saúde indígena
Bulhões 1480, Manguinhos. peoples, Indigenous health
21041-210 Rio de Janeiro
RJ Brasil. diogoferreira@
posgrad.ensp.fiocruz.br
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Rocha DF et al.

Introdução iniciativas pontuais e por campanhas de combate


a doenças nas aldeias, que incluíam os povos in-
Segundo o Censo 20101, atualmente cerca de 817 dígenas como parte da população-alvo, mas sem
mil pessoas se autodeclaram indígenas no Brasil, qualquer contextualização de suas condições de
ou 0,43% da população. Enquanto a popula- vida ou especificidades socioterritoriais7.
ção brasileira cresceu cerca de 30% nos últimos Apesar do Sistema Único de Saúde (SUS) ter
20 anos, a parcela indígena cresceu 177%. Esses sido criado em 1988, e sua Lei Orgânica datar de
dados apontam para uma tendência de reversão 1990, o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena
do decrescimento demográfico que no passado (SASI) só foi criado em 1999. A primeira medida
ameaçava os povos indígenas no Brasil2. nesse sentido foi a criação dos Núcleos Interinsti-
Além do crescimento vegetativo da popu- tucionais de Saúde Indígena (NISI) da Fundação
lação, este fenômeno está associado ao recente Nacional de Saúde (Funasa), propostos desde o I
fortalecimento de articulações sociopolíticas Fórum Nacional de Saúde Indígena (FNSI), rea-
indígenas que catalisaram processos de reemer- lizado em abril de 1993. No mesmo ano ocorreu,
gência étnica verificados em várias partes do País, por pressão do movimento indígena, a II Confe-
principalmente nas regiões Sudeste e Nordes- rência Nacional de Saúde para os Povos Indíge-
te. Muitas comunidades voltaram a reivindicar nas, que delineou as bases para a criação de um
publicamente uma identidade associada às suas subsistema específico para atenção à saúde indí-
raízes ameríndias e a assumir uma posição de gena, organizado a partir dos Distritos Sanitários
enfrentamento em relação aos processos que no Especiais Indígenas (DSEIs) e cujo controle so-
passado as levaram a adotar estratégias de sobre- cial se daria através dos Conselhos Locais e Dis-
vivência pelo ocultamento e indistinção em rela- tritais de Saúde Indígena8.
ção ao restante da população rural3. O SASI foi criado através da Lei 9.836/1999,
Um fenômeno de grande importância, pois do deputado federal Sérgio Arouca, que incluiu
durante parte da história do Brasil os povos que um quinto capítulo na lei 8.080/19909. Porém,
sobreviveram à massacres, epidemias, escravidão, se a luta indígena pela saúde se fortaleceu nesse
esforços de catequização e ou de integração for- contexto, a literatura especializada mostra que há
çada à sociedade nacional, bem como aos impac- fragilidades tanto na efetivação dos seus direitos
tos da expansão econômica sobre seus territórios, sociais e territoriais quanto do direito à saúde.
estiveram submetidos a uma cidadania tutelada Por exemplo, apesar de a Política Nacional de
baseada na tese de uma suposta incapacidade re- Atenção à Saúde Indígena (PNASI) garantir aos
lativa. Dessa forma, com o crescimento do espíri- povos indígenas direito ao “acesso à atenção inte-
to de luta entre esses povos, cresce também a luta gral à saúde, de acordo com os princípios e dire-
por autonomia política e o reconhecimento de trizes do SUS, contemplando a diversidade social,
seus direitos culturais, territoriais e às demandas cultural, geográfica, histórica e política (...) reco-
por políticas públicas que dialoguem com suas nhecendo a eficácia de sua medicina e o direito
especificidades étnicas4,5. desses povos à sua cultura”10, estudos apontam
Uma das principais conquistas do movimen- que os serviços de saúde estruturados no âmbito
to indígena contemporâneo, após a promulgação do SASI em grande parte ainda se baseiam numa
da Constituição de 1988 (CF88), foi o fim do re- perspectiva médico-curativa, que propõem ofe-
gime tutelar e o reconhecimento da plena cidada- recer aos povos indígenas os benefícios da bio-
nia deles, baseada no respeito à sua organização medicina, sem, contudo, estabelecer formas de
social, costumes, tradições, crenças, língua, ma- diálogos interculturais9.
nifestações culturais, tendo no direito originário Assim, enquanto os profissionais de saúde
a seus territórios tradicionais, e no usufruto dos nativos, principalmente os agentes indígenas de
bens comuns, um de seus pilares6. saúde (AIS), são formados dentro da racionalida-
No campo da saúde pública estas manifesta- de biomédica, os profissionais não-indígenas das
ções se fortalecem no final do século XX. Em con- Equipes Multidisciplinares de Saúde Indígena
sonância com a ressignificação do direito à saúde, (EMSIs) não são devidamente preparados para
promovida pela Reforma Sanitária Brasileira, eles compreender as diferenças étnicas e dialogar com
pressionaram por uma política específica para as concepções nativas de saúde, doença, corpo e
a saúde indígena. O marco desta luta foi a rea- cuidado11.
lização da 1ª Conferência Nacional de Proteção A complementaridade entre os DSEIs e as
à Saúde do Índio, em 1986. Até então, a atuação demais redes de atenção do SUS também é pro-
do Estado nesse campo havia sido marcada por blemática. Os Polos-base nas aldeias são estru-
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turados para oferecer apenas atenção primária, sistemas e à manutenção da vida. Contudo, hoje,
referenciando os casos de média e alta complexi- elas estão sendo inviabilizadas pelos efeitos ne-
dade para unidades do SUS localizadas nos perí- gativos dos grandes projetos apresentados pelos
metros urbanos ou em outros municípios. Nesta grupos corporativos e pelo Estado como induto-
‘transição’, diferenças organizacionais, culturais, res do desenvolvimento econômico e social.
linguísticas e fatores sociopolíticos acarretam di- Tal incompatibilidade entre a lógica de in-
ficuldades adicionais para os usuários indígenas, tervenção dos projetos econômicos e o modo de
refletindo negativamente tanto na possibilidade vida dos povos indígenas mobiliza-os a construir
de acesso quanto na qualidade do cuidado ofe- ações coletivas para defesa dos territórios, dos
recido12. bens comuns e da vida. Estas estratégias estão
Todos esses processos contribuem para a na gênese dos conflitos ambientais, definidos
manutenção de situações de saúde desfavoráveis como14:
para a população indígena. De acordo com o I In- Aqueles em que certos sujeitos coletivos alegam
quérito Nacional de Saúde e Nutrição dos Povos que a continuidade das práticas espaciais neces-
Indígenas13, há uma forte relação entre contextos sárias à sua reprodução mostra-se comprometida
socioambientais injustos, processos históricos pelas escolhas técnicas e locacionais de empreendi-
de expropriação, discriminação, ameaças à in- mentos cujos efeitos sobre recursos ambientais não
tegridade dos territórios tradicionais, condições mercantis como o ar, as águas e os sistemas vivos
adversas de vida e desestruturação dos sistemas são tidos por indesejáveis.
nativos de subsistência e autocuidado, que levam Eles são desencadeados ou potencializados
a cenários nos quais diversos desses povos vivem por situações de injustiça ambiental, isto é, por
processos de vulnerabilização e desvantagem em mecanismos sociais, políticos e econômicos que
relação a outros segmentos da população nacio- distribuem os riscos ambientais segundo uma
nal, mesmo quando comparados com as frações lógica que se beneficia das desigualdades socio-
mais pobres da sociedade brasileira. ambientais e assimetrias de poder para destinar
Dessa forma, transformações sociais, cultu- as atividades perigosas ou ambientalmente de-
rais, ambientais e econômicas contribuíram para gradantes aos territórios de grupos socialmente
que problemas de saúde característicos da pobre- vulnerabilizados e discriminados15.
za e da vulnerabilidade social, como as doenças Neste artigo, iremos explorar algumas inter
infectoparasitárias (principalmente tuberculose, -relações entre os processos de organização polí-
malária e parasitas intestinais), anemia e desnutri- tica e mobilização social de alguns povos indíge-
ção, permaneçam importantes no quadro de mor- nas brasileiros para enfrentamento dos processos
bimortalidade, ainda que em muitos desses povos sociais que levam à vulnerabilização socioam-
já tenham iniciado um processo de transição epi- biental associada ao histórico de exclusão socio-
demiológica, no qual as doenças crônicas teriam política e à luta pelo direito à saúde.
maior relevância nas taxas de mortalidade13.
Tais processos são intensificados por políticas
de crescimento econômico baseadas no avanço Métodos
das fronteiras da produção de commodities agrí-
colas e minerais, bem como por programas fe- Baseamo-nos aqui na pesquisa intitulada “Mapa
derais para expansão da infraestrutura de trans- de conflitos envolvendo injustiça ambiental e
portes e geração de energia que desconsideram os saúde no Brasil”16, desenvolvida desde 2008 por
impactos sobre os territórios ocupados pelos po- um grupo de pesquisadores da Fundação Oswal-
vos indígenas. Esta tendência, ao mesmo tempo do Cruz (Fiocruz) articulados com diversos
em que permite a incorporação de novas áreas à movimentos sociais ligados à Rede Brasileira de
economia de mercado global, desestabiliza as or- Justiça Ambiental (RBJA), e com o apoio do Mi-
ganizações sociais preexistentes, afetando o exer- nistério da Saúde.
cício de sua territorialidade e modos de vida, ao Esta pesquisa foi realizada a partir de uma
ameaçar tanto as relações culturais e simbólicas ampla revisão de literatura e análise documen-
estabelecidas com os territórios quanto as formas tal visando o resgate do histórico de mobiliza-
tradicionais de apropriação dos bens comuns. ções associadas a alguns dos conflitos ambientais
Ambas são, muitas vezes, baseadas em regras atualmente em curso no País. Para tanto foram
de uso comum que outrora garantiam reprodu- utilizados como fontes de pesquisa documentos
ção da biodiversidade, da água e de outros ele- e publicações da RBJA, dos Ministérios Públicos
mentos necessários à sustentabilidade dos ecos- e de diversas entidades ou grupos de pesquisa
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acadêmicos que atuam como parceiros técnico- mobilização dos povos indígenas. Como nosso
científicos de povos e comunidades envolvidas principal interesse era analisar como tais situa-
em situações de conflitos. Buscamos identificar ções resultaram em demandas para o SASI, como
as consequências das transformações socioam- eram apresentadas e que tipo de estratégias eram
bientais sobre o modo de vida e a saúde das co- utilizadas, o campo de busca por palavras-chaves
munidades, bem como as estratégias de resistên- do Mapa de Conflitos nos auxiliou na seleção dos
cia para superação dos problemas enfrentados. casos que contivessem termos como “Funasa”,
Foram coletadas tanto informações mais es- “Sesai”, “DSEI”, “Casai”, “Polo-base” e as versões
truturadas sobre os contextos, antecedentes e extensas das siglas. Foram excluídos nessa filtra-
consequências dos conflitos, produzidas no âm- gem aqueles resultados em que o SASI era citado
bito de estudos realizados nas universidades ou apenas como fonte de informações e os casos re-
em unidades técnico-científicas de diversas ins- petidos.
tituições públicas, quanto discursos e narrativas Para análise dos dados foi construída uma
dos atores sociais envolvidos ou de suas organi- matriz na qual organizamos as informações exis-
zações representativas a respeito de cada situação. tentes no Mapa de Conflitos segundo a localiza-
Isso permitiu identificar como o debate público a ção geográfica, os povos envolvidos, as atividades
respeito dos riscos ambientais e das suas consequ- geradoras de injustiça ambiental, as organizações
ências sociais e/ou sobre a saúde, bem como das de representação indígena, os riscos à saúde, as
propostas de alternativas ao modelo de desenvol- demandas encaminhadas ao SASI ou a outras
vimento hegemônico, foram socialmente cons- instituições estatais, as estratégias de luta e as res-
truídos e quais estratégias os agentes utilizaram postas do SASI e das demais instituições.
para defender suas demandas nos diversos cam-
pos sociais nos quais foram obrigados a interagir.
Todas as informações veiculadas no Mapa de Resultados e discussão
Conflitos estão disponíveis em uma página na
internet e foram registradas a partir de um for- Estima-se que atualmente vivam no Brasil pelo
mulário digital construído com tecnologia do menos 246 povos indígenas, falantes de cerca de
Departamento de Informática do SUS (Datasus). 150 línguas17. Segundo dados do IBGE1, cerca de
Até o presente momento este projeto já ma- 78% dessa população está localizada nos estados
peou quase 600 conflitos ambientais por todo o das regiões Norte (37%), Nordeste (25%) e Cen-
Brasil. Cada conflito é classificado segundo sua tro-Oeste (16%), que também contém a maior
localização geográfica, o processo produtivo as- parte das terras indígenas que hoje estão em al-
sociado, o tipo de população afetada (a partir de guma fase do processo administrativo de demar-
uma perspectiva de autoidentificação que leva cação (57%, 12% e 21% respectivamente)18. Da
em consideração a sociodiversidade que pode mesma forma, em nosso estudo, identificamos
existir em uma mesma comunidade, município que essas regiões também concentram a maior
ou região e a possibilidade de um mesmo conflito parte dos conflitos socioambientais envolvendo
abranger territórios de um conjunto de comuni- povos indígenas no Brasil. Dos 160 casos que
dades socialmente diversas), os impactos ou ris- analisamos, a maior concentração de casos se en-
cos ambientais identificados ou denunciados, as contra na região Norte (43%); a seguir estão as
consequências sobre a saúde das populações e as regiões Centro-Oeste (25%) e Nordeste (15%).
articulações que as comunidades constroem para Ao analisarmos esta informação concomi-
enfrentamento dessas situações. tantemente ao levantamento dos principais pro-
Neste artigo iremos explorar apenas os re- cessos produtivos associados a estes conflitos
sultados de uma amostra dos casos existentes fica claro que esta tendência está associada um
no banco de dados. Para seu estabelecimento, o modelo de desenvolvimento regional baseado no
primeiro critério de seleção foi o tipo de popula- avanço do agronegócio por meio das monocul-
ção atingida. Neste caso, selecionamos apenas os turas (32%), madeireiras (23%), pecuária (18%),
conflitos que direta ou indiretamente envolviam pesca industrial e aquicultura (8%).
povos indígenas, num total de 160 casos, utiliza- Tais conflitos ainda são agravados pelas dis-
mos esta amostra para realizar um breve pano- putas em torno do uso, abuso ou controle de
rama de tais conflitos, apresentado na primeira tecnologias perigosas, poluentes ou ainda outras
parte dos resultados deste artigo. cujos riscos para a saúde humana e o meio am-
Em seguida realizamos uma segunda amos- biente incluem um alto grau de incerteza, como
tragem a fim de identificar as estratégias de os agrotóxicos e os transgênicos19.
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A mineração (18%) também gera impor- Teoricamente, uma vez que uma área é iden-
tantes impactos sobre os territórios e as comu- tificada pelo órgão indigenista como terra indí-
nidades indígenas. Apesar do reconhecimento gena, assegurar sua integridade e proteção de-
do direito indígena à terra, o subsolo nacional é veriam ser prioridade nas disputas judiciais em
patrimônio da União, cuja exploração em terras curso, já que são consideradas pela CF88 como
indígenas somente poderia ser realizada após o indisponíveis e inalienáveis23. Mas, inúmeros
expresso consentimento dos povos que as habi- casos apontam que frequentemente o judiciário
tam, mas nem sempre tal direito é respeitado. privilegia a reivindicação de direitos individuais
Outro foco de tensão nesses territórios são por produtores rurais face aos direitos coletivos
as obras de infraestrutura para atendimento às indígenas, o que resulta em desapropriações, vio-
necessidades energéticas e logísticas do setor pro- lência policial e na desestruturação das formas
dutivo: usinas hidreoelétricas (28%) e hidrovias, tradicionais de ocupação do território.
rodovias, minerodutos ou similares (14%) tam- Mesmo quando uma parcela do território
bém geram conflitos ambientais. permanece ocupada pelos povos indígenas, isto
Estes se intensificaram no Brasil a partir de pode se tornar insuficiente, pois áreas importan-
1950, pois a modernização conservadora do tes para sua reprodução cultural e para subsis-
campo permitiu o aumento da produtividade do tência são privatizadas ou degradadas. Em am-
agronegócio, a partir de uma estrutura fundiária bos os casos, práticas tradicionais de manejo dos
historicamente marcada pela violência e pelas de- ecossistemas são inviabilizadas e a concentração
sigualdades. Outros fatores que os potencializam populacional nas áreas remanescentes impacta
são de ordem ideológica, como as disputas entre diretamente no modo de vida das comunidades.
os distintos significados da terra (como merca- Por exemplo, formas tradicionais de resolução
doria x para o trabalho e reprodução do modo dos conflitos, como a cisão das aldeias, são impe-
de vida) ou as disputas políticas em torno da le- didas, o que aumenta as tensões internas dos gru-
gislação que garante os territórios tradicionais pos. As contaminações do solo, do ar e das águas
e impede a transformação dos bens comuns da contribuem para a descontinuidade do regime
natureza e interesse social em mercadorias20 reali- tradicional de uso dos bens comuns.
zada principalmente através da bancada ruralista Além disso, a intensificação das disputas se
no Congresso Nacional, que tem proposto diver- traduz em violência. Em pelo menos 50% dos
sas medidas para flexibilizar a legislação existente casos analisados, um ou mais membros das co-
de forma a garantir a “mercadorização” da terra. munidades envolvidas tiveram suas vidas amea-
No caso específico das terras indígenas, a çadas. Entre 15 a 20% dos casos, estas ameaças
CF88 estabelece que os povos indígenas têm di- se concretizam em coação física, lesões corporais
reito ao seu usufruto exclusivo, e a Convenção ou assassinatos. A violência tem sido prioritaria-
169 da Organização Internacional do Trabalho mente direcionada contra as lideranças, o que
(OIT), que elas não podem ser desapropriadas ou sugere que ela é usada pelos grupos econômicos
exploradas sem o seu consentimento livre, prévio como uma estratégia de desmobilização da orga-
e informado. Muitos povos utilizam a Convenção nização política dos povos envolvidos.
como estratégia de luta contra empreendimentos Esses resultados são consistentes com outros
que colocam em risco seu território, com des- já divulgados sobre conflitos envolvendo povos
taque para o Protocolo de Consulta elaborado indígenas. Por exemplo, na edição de 2013 do seu
pelos Munduruku, criado para orientar o Estado relatório “Violência contra os povos indígenas
quanto à forma de consulta, suas expectativas, no Brasil”, o Conselho Indigenista Missionário
quem deve ser envolvido e o processo decisório. (Cimi) contabilizou pelo menos 53 assassinatos,
Isto modifica o campo de lutas, pois eles passam 29 tentativas de assassinato, 13 homicídios cul-
a estabelecer os termos do processo21. posos e 14 ameaças de morte contra indígenas
Isto é importante se considerarmos que tra- naquele ano24.
mitam no Congresso Nacional diversas Propostas Outro risco importante à saúde indígena nes-
de emendas à Constituição (PECs) com o objeti- ses contextos é a escassez de alimentos relacio-
vo de repassar para o legislativo a demarcação de nada à diminuição ou degradação das áreas de
terras indígenas e a ratificação das já homologa- plantio, da disponibilidade de pescado em rios
das. Englobadas na PEC 215/200022, elas podem, cada vez mais poluídos por agrotóxicos e outros
se aprovadas, permitir a redução ou extinção de dejetos lançados nas bacias hidrográficas pelas
TIs para apropriação das terras pela mineração áreas urbanas próximas ou ainda pela redução
ou pelo agronegócio. das áreas florestais pelo desmatamento. Isso ex-
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plica um elevado número de casos onde foram a falta de infraestrutura leva à morte. Como o
relatadas situações de insegurança alimentar que caso de um idoso Mayoruna que, em fevereiro de
são geradas ou intensificadas pela desapropria- 2013, veio a falecer na aldeia Fruta Pão porque
ção territorial ou pela degradação ambiental. o barco que servia ao DSEI de Atalaia do Norte/
Além disso, pobreza e desigualdades am- AM estava sem combustível16.
bientais aumentam a dependência desses povos Por outro lado, apesar dos territórios indí-
da ajuda do Estado, pressionando-os a recorrer genas serem frequentemente impactados pela
a políticas públicas que desconsideram suas tra- construção de empreendimentos para geração de
dições alimentares. Um estudo identificou que a energia, muitos polos-base sofrem com a falta de
dieta dos Terena do Mato Grosso do Sul tem sido eletricidade. Mesmo quando há geradores, a ins-
determinada pelos itens constantes nas cestas tabilidade no fornecimento de combustível, ou a
básicas que recebem do Governo do Estado uma falta de manutenção adequada, pode levar ao fre-
vez que a caça e coleta nas matas ficaram cada vez quente desligamento dos refrigeradores, afetando
mais raras pela redução territorial25. a continuidade de programas de vacinação ou le-
vando ao desperdício de medicamentos16.
Demandas e estratégias de mobilização Tais situações impõem a discussão a respei-
indígena pela saúde to da urgência de se repensar as formas como os
polos-base são estruturados e a necessidade de
Apesar da extensão dos conflitos ambientais implantar alternativas mais confiáveis e sustentá-
nos quais os povos indígenas brasileiros estão en- veis de fornecimento de energia para esses locais,
volvidos, dos cerca de 160 casos de conflitos am- como a implantação de células fotoelétricas, por
bientais analisados, somente 15 casos atenderam exemplo.
aos critérios de seleção para análise do histórico A precariedade das Casas de Saúde Indígena
de luta pela saúde, a qual apresentamos a partir (Casai) também tem sido objeto de recorrente
de agora. reclamação e demanda por parte dos povos in-
São casos que envolvem comunidades situa- dígenas. Previstas pela PNASI10 como espaços de
das em 12 estados, com povos e contextos econô- permanência de pacientes em tratamento fora de
micos e socioambientais bastante diversos, como suas aldeias, deveriam possuir:
os Galibi, Karipuna e Palikur, no Amapá; diversas Condições de receber, alojar e alimentar pa-
etnias do Vale do Javari/AM; os Tupinambá e os ciente encaminhado e acompanhante, prestar as-
Pataxó na Bahia; os Xakriabá em Minas Gerais; sistência de enfermagem 24 horas por dia, marcar
os Tingui-Botó em Alagoas; os Terena no Mato consultas, exames complementares ou internação
Grosso do Sul; os Bororo no Mato Grosso; e os hospitalar, providenciar o acompanhamento dos
Kaingang no Paraná. pacientes nessas ocasiões e o seu retorno às comu-
Suas principais demandas são por melhorias nidades de origem, acompanhados das informações
na infraestrutura dos DSEIs, que na maioria dos sobre o caso.
casos não contam com uma estrutura eficiente Gomes26 salienta que “embora denominadas
para dar resposta aos problemas de saúde ge- Casas de Saúde Indígena, essas estruturas não
rados ou potencializados pelo contexto socio- executam ações médico-assistenciais”, pois, ape-
ambiental onde vivem. Em suas cartas e docu- sar de algumas vezes contarem com a presença de
mentos, são recorrentes as reclamações quanto à enfermeiros, técnico de enfermagem, auxiliares
precariedade dos prédios, falta de medicamentos, de enfermagem, assistentes sociais, psicólogos,
equipamentos, meios de transporte e de comuni- médicos, farmacêuticos, etc... Estes estão presen-
cação para execução das atividades. Tais narrati- tes apenas para garantir os encaminhamentos
vas exprimem a forma como esses grupos repre- necessários e o bem-estar dos usuários indígenas
sentam suas vivências como usuários do SASI e durante sua estada. A atenção e o cuidado espe-
reformulam-nas como proposições coletivas, seja cializados, ou de maior complexidade, devem ser
cobrando a execução do que já está previsto na realizados pelas unidades de saúde do SUS para
PNASI, seja exigindo a reformulação das práticas onde foram referenciados. As CASAIs foram pre-
que consideram inadequadas. vistas como um ponto de apoio fora das aldeias
Nos D da Amazônia, por exemplo, são recor- que auxiliariam o usuário indígena na transição
rentes as denúncias quanto à indisponibilidade do DSEI para outras instâncias do SUS.
de barcos ou aviões necessários para percorrer A realidade, no entanto, é bastante distinta.
rapidamente as grandes distâncias entre as al- Em Lábrea/AM, por exemplo, os índios Pau-
deias e as unidades de saúde. Em muitos casos, mari denunciavam, em agosto de 2011, que na
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Casai do município não havia alimentos nem organizações indígenas passaram a propor mo-
água há pelo menos dois meses, motivo pelo qual dificações na organização do subsistema e maior
foram buscar apoio na unidade em Porto Velho/ institucionalidade dentro do MS. Após sucessivas
RO. Entretanto, sua permanência ali foi negada mobilizações do movimento indígena, o Gover-
por serem oriundos de área fora da abrangência no Federal criou a Secretaria Especial de Saúde
daquela unidade. Foi necessária a intervenção do Indígena (Sesai)8.
Ministério Público Federal (MPF) para que rece- Após a criação da Sesai, o processo de tercei-
bessem o apoio que buscavam16. rização que caracterizou a gestão da Funasa con-
Além disso, a contratação de profissionais tinuou, mas se tornou mais exigente e concen-
de saúde para composição das EMSIs é outra trado. Hoje, apenas três entidades privadas sem
demanda recorrente. Em pelo menos 11 casos, fins lucrativos estão conveniadas: a Missão Evan-
faltavam médicos e as equipes contavam apenas gélica Caiuá (15 DSEIs), a Associação Paulista
com enfermeiros/as, técnicos/as de enfermagem para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM, 15
ou AISs para o atendimento. Mesmo quando os DSEIs) e o Instituto de Medicina Integral Prof.
médicos existiam, eles visitavam as unidades es- Fernando Figueira (IMIP, 5 DSEIs)9.
poradicamente, o que prejudicava o acompanha- Num cenário como esse, para possibilitar
mento à saúde da população. maior diálogo com o SASI e numa tentativa de
Uma situação que a partir de 2015 começou melhorar o atendimento, muitos povos indígenas
a ser enfrentada pelo MS, que ampliou a oferta têm reivindicado maior participação no processo
de médicos nos DSEIS de 247, em 2011, para 582 de nomeação dos gestores, sendo a substituição
naquele ano. Destes, pelo menos 300 eram estran- destes, quando considerados incapazes ou inade-
geiros ou brasileiros formados no exterior contra- quados para o cargo, uma demanda recorrente de
tados no âmbito do Programa Mais Médicos27. suas associações16.
Tanto as reivindicações indígenas quanto o A participação e o controle social do SASI
programa federal podem ser entendidos como são previstos na PNASI, contudo, alguns estudos
respostas a um problema fundacional do SASI. apontam que eles estão longe de serem efetivos. A
Desde os primeiros anos de atuação da Funasa lógica que orienta as formas de controle social no
como órgão responsável pelo SASI, a principal SASI, por vezes, é contraditória com as organiza-
forma de operacionalização dos DSEIs é através ções sociais e políticas dos povos indígenas e in-
da política de terceirização e do estabelecimen- compatível com o tipo de participação decisória
to de convênios com repasses de recursos para mais direta que muitas delas demandam28.
organizações não-governamentais, prefeituras e Por fim, encontramos uma demanda recor-
associações indígenas para que estas executassem rente cuja resolução, apesar de poder ser compre-
as ações de saúde. endida como um problema para o qual o sistema
A incorporação das organizações sociais já de saúde pode contribuir, não é atribuição direta
presentes nos territórios propiciou o estabele- do SASI. Estamos nos referindo ao enfrentamen-
cimento de “uma rede mínima” de unidades de to da violência característica dos contextos de
saúde e, em alguns casos, permitiu aos povos in- conflito ambiental que pressiona SASI/SUS na
dígenas algum nível de autonomia na execução medida em que as vítimas ou seus parentes de-
das ações de saúde9, servindo como uma forma vem ser tratados e acompanhados em relação às
de “captação” de bens, recursos e serviços neces- sequelas que muitas vezes vão além dos danos fí-
sários à redução das iniquidades em saúde28. Por sicos. Além disso, são demandas que pressionam
outro lado, esse processo também exigiu que es- por uma atuação integrada entre os poderes e
sas organizações incorporassem em suas práticas os diversos setores do Estado, principalmente o
as capacidades técnico-burocráticas necessárias judiciário e as comissões de direitos humanos, e
à gestão e à prestação de conta dos recursos re- cujas raízes estão mais profundamente ligadas ao
passados; frequentemente elas não estavam pre- contexto social e territorial.
paradas para tais exigências, o que resultava em Para pressionar pelo atendimento dessas de-
descontinuidades no repasse de recursos, dificul- mandas, muitas organizações políticas indígenas
dades de manutenção do pessoal e precarização têm se utilizado de diversas estratégias de luta,
da assistência9. que podem ser agrupadas da seguinte forma:
A partir de 2006, diante da intensificação “dos a) denúncias e divulgação de conhecimento
problemas recorrentes de má gestão, autoritaris- construído com as comunidades locais:
mo, uso político e corrupção nas coordenações Neste grupo estão incluídas as numerosas
regionais e instâncias centrais da Funasa”, muitas cartas publicadas pelas entidades representati-
390
Rocha DF et al.

vas das comunidades em seus veículos próprios de ocupação de prédios públicos, a detenção de
de comunicação, de entidades parceiras, redes funcionários dos DSEIs; a apreensão de veículos
de movimentos sociais ou através de entrevistas ou as manifestações públicas. Apesar de rompe-
concedidas à imprensa. rem com os trâmites normais do Estado, o uso da
Através de seus parceiros nos MPs, entidades não-violência nesses momentos garante a efetivi-
de defesa dos direitos humanos ou parlamentares dade da pressão pela abertura de canais de nego-
engajados com a causa indígena, elas frequente- ciação e evita que a força policial seja utilizada.
mente conseguem que tais documentos se cons- Entre os casos analisados, a estratégia de ocu-
tituam como parte de processos administrativos, pação de prédios públicos foi acionada em pelo
judiciais, figurem como pauta de audiências pú- menos sete ocasiões. Em um caso, um grupo de
blicas, ou contribuam para a organização de se- 150 Xakriabás ocupou o polo-base em São João
minários e debates. das Missões/MG, em agosto de 2013, em protesto
Também inclui a divulgação de estudos in- contra a gestora local16. Tais ações frequentemen-
dependentes sobre a situação de saúde dos seus te mobilizam mais de uma etnia, ativando articu-
povos. Por exemplo, a partir de fevereiro de 2010, lações políticas em momentos críticos.
os índios do Vale do Javari passaram a se utilizar Ocupar fisicamente espaços para pressionar
de um diagnóstico da saúde indígena, produzido o Estado também tem sido uma estratégia comu-
pelo Centro de Trabalho Indigenista (CTI) em mente utilizada pelo movimento indígena nas lu-
articulação com o saber acumulado pelas organi- tas socioambientais. A ocupação de terras ou es-
zações indígenas e suas comunidades, para con- critórios da Funai, por exemplo, é um expediente
substanciar suas reivindicações junto à Sesai16. comum nessas situações, numa estratégia para
Tal estratégia é importante, se levarmos em pressionar por avanços no trâmite burocrático e
consideração que há espaços onde o saber dos efetivar direitos já reconhecidos pela legislação.
povos indígenas pode ser deslegitimado face ao
conhecimento produzido cientificamente e tem
sido utilizada com sucesso por comunidades Conclusão
envolvidas em conflitos ambientais em diversas
partes do mundo29. Os casos analisados neste artigo apontam para
b) pressão por vias institucionalizadas: conquistas do movimento indígena brasileiro no
Incluímos neste grupo tanto as estratégias de campo das lutas por reconhecimento de direitos
ocupação e disputa dos espaços de controle so- e pressões pela efetivação de políticas públicas de
cial dentro do SASI quanto o encaminhamento saúde que reconheçam sua diversidade cultural.
de solicitações, documentos ou abaixo-assinados Entretanto, a morosidade e ineficiência da gestão
direcionados ao subsistema ou denúncias às au- ou dos espaços institucionalizados de controle
toridades policiais, MPs e às comissões de direi- social do SASI têm levado os povos indígenas a
tos humanos nacionais e internacionais. recorrer às arenas legislativa e judicial para pres-
Ao analisarmos o tipo de reivindicações que sionar o Estado a assegurar seu direito à saúde.
os povos indígenas encaminham aos MPs e às Na ausência de respostas nesses espaços, eles não
CDHs, percebemos que estas instituições costu- hesitam em utilizar estratégias de ocupação de
mam ser acionadas quando as negociações di- espaços públicos para pressionar por soluções.
retas com o SASI são insuficientes, ou quando a Nos contextos de conflito, os direitos dos
continuidade da violação de determinado direito povos indígenas somente se realizam se garan-
coloca em risco sua integridade física, a sustenta- tidos de forma integral. Nesse sentido, podemos
bilidade dos territórios ou suas organizações so- afirmar que o SASI/SUS precisa estar capacitado
ciais. Há também casos de mobilização dirigida e atento para considerar os contextos socioam-
ao legislativo, como, em 2008, quando a Comis- bientais onde esses povos vivem, os quais fre-
são de Segurança Pública da Assembleia Legisla- quentemente geram impactos significativos à sua
tiva de Minas Gerais coordenou uma audiência saúde coletiva, insegurança alimentar, suicídios
pública para discutir assassinatos relacionados às ou assassinatos e a assumir um papel mais rele-
disputas pelo território Xakriabá16. vante na luta contra a violência, pois esta é a face
c) pressão por vias não institucionalizadas: mais visível da influência dos conflitos sobre suas
Há momentos, contudo, em que as estra- vidas.
tégias de luta das comunidades exigem romper Além disso, é importante que as instituições
com as vias institucionais para pressionar o Esta- do setor enfrentem o desafio de exercer um papel
do. São incluídas nessa classificação as estratégias mais relevante na defesa da saúde e dos direitos
391

Ciência & Saúde Coletiva, 24(2):383-392, 2019


indígenas num momento de acirramento de con- Por isso, concluímos que as estratégias de luta
flitos e mudanças no quadro legislativo-institu- pela saúde dos povos indígenas brasileiros são in-
cional que tendem a vulnerabilizar ainda mais os fluenciadas pelas suas disputas socioambientais e
povos indígenas no Brasil’, devido à tendência de dialogam com as mobilizações desses povos pelo
priorização da exploração predatória dos bens co- reconhecimento integral de seus direitos, pres-
muns30 em detrimento do bem viver31 que orienta sionando o sistema de saúde a atuar de forma
o modo de vida de muitos povos indígenas. mais articulada com os diversos órgãos estatais
envolvidos com as políticas indigenistas.

Colaboradores

DF Rocha organizou os dados, trabalhou na con-


cepção do texto e realizou a elaboração do texto
inicial. MFS Porto e T Pacheco coordenaram a
pesquisa, estabeleceram a metodologia e contri-
buíram para versão final do texto.
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Rocha DF et al.

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