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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

DEPARTAMENTO DE DIREITO

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

Matheus Henrique Hartmann Piza Duarte

Um levantamento sobre o conceito de segurança ambiental: Os primeiros anos


do Conselho de Segurança da ONU (1946-1953) e o Voto Dissidente do Juiz
Weeramantry na Opinião Consultiva de 8 de julho de 1996 sobre a Legalidade do Uso
ou Ameaça de Uso de Armas Nucleares”.

Florianópolis

2023
Matheus Henrique Hartmann Piza Duarte

Um levantamento sobre o conceito de segurança ambiental: Os primeiros anos


do Conselho de Segurança da ONU (1946-1953) e o Voto Dissidente do Juiz
Weeramantry na Opinião Consultiva de 8 de julho de 1996 sobre a Legalidade do Uso
ou Ameaça de Uso de Armas Nucleares”.

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em


Direito do Centro de Ciências Jurídicas da
Universidade Federal de Santa Catarina como
requisito para a obtenção do título de Bacharel em
Direito.

Orientadora: Profª. Drª. Cristiane Derani.

Florianópolis

2023
Ficha de identificação da obra

Hartmann Piza Duarte, Matheus Henrique


Um levantamento sobre o conceito de segurança: Osprimeiros anos
do Conselho (1946-1953) e o Voto Dissidentedo Juiz Weeramantryna
Opinião Consultiva de19 de julhode 1996 a partir do conceito de
segurança ambiental nosdias de hoje. / Matheus Henrique Hartmann
Piza Duarte ;orientadora, Cristiane Derani, 2023.
122 p.

Trabalho de Conclusão de Curso (graduação) -Universidade


Federal de Santa Catarina, Centro de CiênciasJurídicas, Graduação
em Direito, Florianópolis, 2023.

Inclui referências.

1. Direito. 2. Direito. 3. Segurança Ambiental. 4.Proteção


Ambiental. 5. Conselho de Segurança. I. Derani,Cristiane. II.
Universidade Federal de Santa Catarina.Graduação em Direito.
III. Título.
Matheus Henrique Hartmann Piza Duarte

Um levantamento sobre o conceito de segurança ambiental: Os primeiros anos


do Conselho de Segurança da ONU (1946-1953) e o Voto Dissidente do Juiz
Weeramantry na Opinião Consultiva de 8 de julho de 1996 sobre a Legalidade do Uso
ou Ameaça de Uso de Armas Nucleares”.

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado para obtenção do Título
de Bacharel aprovado em sua forma final pelo Curso de Direito.
Florianópolis, 5 de julho de 2023

_________________________
Prof. Dr. Francisco Quintanilha Veras Neto
Coordenador do Curso

Banca Examinadora:

_________________________
Profª. Drª. Cristiane Derani
Orientadora
Universidade Federal de Santa Catarina

_________________________
Me. Alexandre Zaporoszenko Cavazzani
Avaliador
Universidade Federal de Santa Catarina

_________________________
Mestranda Vitória Emilia Santiago Pastro
Avaliadora
Universidade Federal de Santa Catarina
AGRADECIMENTOS
A Cognição daquilo que estudamos é sempre diferente quando temos alguma
experiência na vida que a corrobore. Eu sempre gostei de imaginar como a sociedade
funcionava, como cada pessoa fazia cada tarefa. Lia revistas de História desde criança e
ficava imaginando tempos pretéritos.
Isso fez com que eu acabasse me preocupando, por exemplo, com aquilo que passa
enquanto a vida passa, o tempo, e aquilo com que o gastamos/usamos. Nada fazemos
sozinhos, em tudo há uma história, às vezes uma imensidão de pessoas que dispenderam suas
vidas para nos proporcionar um objeto, uma refeição, uma casa limpa, um curso de
graduação, nossos sonhos.
Experimentar o quanto precisamos uns dos outros para alcançar nossos objetivos é
uma “descoberta” que vai imprimir para sempre sua figura dentro de mim. Eu tenho muito a
agradecer à mãe de minhas filhas e minha companheira, Amanda e à minha mãe, Jussara,
aquelas que possibilitaram que eu tivesse o que geralmente falta para as pessoas hoje em dia.
Tempo.
Consegui. Apesar das dificuldades, concluo minha graduação com uma satisfação
enorme e não posso deixar passar aquilo que fez parte da minha história desde 2016. Meus
sinceros e profundos agradecimentos à professora Cristiane Derani, que desde a experiência
de Iniciação em Pesquisa Científica desempenhou um papel junto a mim que melhor se
descreve com as palavras“guia”, “mestre”, possibilitando que eu me desenvolvesse
intelectualmente e aprendesse a pesquisar. Sua orientação foi muito importante para este
trabalho acontecer. Obrigado!
Há aqueles que a vida nos leva, vivos ou mortos, e nos deixam aquilo que foram para
nós, apesar do que acabaram sendo para que tenham sido levados. Vocês também são aquilo
que ergue o edifício dessa jornada.
A Universidade Federal de Santa Catarina, seu campus, os dias de sol no inverno,
aquela natureza, os corredores e arredores do CCJ, todos os trabalhadores, os amigos que fiz,
as experiências acadêmicas inestimáveis ali e nos demais centros. A isso que também se
endereça a palavra “formação”. Obrigado.
Finalmente, Olívia, Lílian. Vocês são um novo, e não tão novo assim, capítulo, e não
há em mim sequer um fio de cabelo que queira viver a vida antes de vocês. Penso em vocês
toda vez que penso no mundo e no futuro. De fato, aprendemos mais do que ensinamos
quando temos a graça de ter filhos. Minhas queridas!
RESUMO
O Sexto relatório do IPCC sai ao mesmo tempo que a volta do fantasma de Hiroshima. A
guerra nuclear parece ter voltado a assombrar a humanidade e as tendências catastróficas a
longo prazo que os cientistas apontam há décadas sobre a mudança climática se mantém. Daí
a busca por respostas em Weeramantry e seu voto dissidente na Opinião Consultiva de 1996
sobre a Legalidade do Uso ou Ameaça de Uso de Armas Nucleares, que contém uma forma
muito eficiente de inquirir sobre a existência, ou não, de um direito pré-existente que
evidencie determinada proibição ou permissão. O conceito de Segurança Ambiental, além de
ser a ferramenta conceitual apropriada para abordar a presença de “considerações sobre
proteção ambiental” nos primeiros anos do CSNU, buscando aquilo que lhe é semelhante ou a
si se relaciona, pode ver o debate sobre sua definição ganhar muito em conteúdo ao ser
submetido ao mesmo tipo de exame que a legalidade do uso ou ameaça de uso de armas
nucleares o foi, naquela Opinião Consultiva, quando, por exemplo, Weeramantry faz uma
leitura a contrapelo da história para fundamentar seus argumentos. O Conceito de Segurança
Ambiental vem sendo debatido há pelo menos 30 anos com maior clareza em suas definições,
que costumaram preferir por enquadrá-lo como mais um problema de segurança nacional.
Este trabalho se propõe a uma perspectiva menos focada no aspecto anterior e escolheu como
objeto de pesquisa os primeiros oito anos do CSNU, utilizando duas abordagens. Em primeiro
lugar, buscam-se palavras e expressões previamente escolhidas como water, oil, natural e
natural resources, nos anuários do CSNU entre 1946-1953. Em segundo lugar, as resoluções
propriamente exaradas pelo órgão neste interregno de tempo. A pesquisa encontrou resultados
diretos e indiretos suficientes para afirmar a existência de considerações sobre proteção
ambiental durante as reuniões do CSNU. Os últimos são as diversas menções às palavras
escolhidas durante a análise dos anuários, que remontam ao uso de recursos naturais, por
exemplo, e aos conflitos em que essas palavras foram usadas, seja para descrever a situação
real, durante os acontecimentos, seja em denúncias, reclamos, resoluções, resumos de
resoluções, etc., principalmente se interpretados à luz dos resultados normativos após o
período 1945-1953. Já os resultados diretos são o Acordo de Renville, apesar de sua
brevidade, e o Trusteeship Agreement for the Former Japanese Mandated Islands, pois
possuem considerações explícitas sobre proteção ambiental. O Trusteeship Agreement,
inclusive, conjuga o desenvolvimento social com a regulação do uso de recursos naturais e a
promoção da saúde. Mesmo com essa obrigação, observa-se o ulterior desenvolvimento do
tema sem um precedente legal ou pronunciamento da Corte Internacional de Justiça sobre as
normas específicas celebradas naquele acordo, por mais que a tutela sobre essas ilhas tenha
passado por debates sobre os direitos e obrigações em virtude do uso daquele território para
testes nucleares e também o envenenamento do solo em razão do descarte de ascarel e a
consequente contaminação por PCBs.

Palavras-chave: Proteção Ambiental; Segurança Ambiental; Conselho de Segurança; Jus


Cogens.
ABSTRACT
The Sixth IPCC report comes out at the same time as the ghost of Hiroshima returns.
Nuclear war seems to have come back to haunt humanity and the catastrophic long-term
trends that researchers have pointed out for decades about climate change continue. Hence the
search for answers in Weeramantry and its dissenting vote at the 1996 Advisory Opinion on
the Legality of the Threat or Use of Nuclear Weapons, which contains a very effective way of
inquiring into the existence or not of a pre-existing right that evidences particular prohibition
or permission. The concept of Environmental Security, in addition to being a conceptual tool
aimed at addressing the presence of “environmental protection considerations” in the early
years of the UNSC, considering what is similar or related to it, has had its definition gain
much in content by being subjectedto the same type of examination that the Legality of the
Threat or Use of Nuclear Weapons was in its Advisory Opinion, when, for example,
Weeramantry reads history backwards to substantiate its arguments. The Environmental
Security concept has been debated for at least 30 years with greater clarity in its definitions,
which tends to frame it as another national security problem. This work proposes a
perspective less focused on the previous aspect and chose as research object the first eight
years of the UNSC, using two approaches. First, previously selected words and expressions
such as water, oil, natural and natural resources are sought in the UNSC yearbooks between
1946-1953. Second, the resolutions themselves drawn up by the Council in this period. The
research found sufficient direct and indirect results to affirm the existence of environmental
protection considerations during UNSC meetings. The latter are the various mentions of the
words chosen during the analyses of the yearbooks, which go back to the use of natural
resources, for example, and the conflicts in which these words were used, whether to describe
the real time situation, during the events, or in denunciations, complaints, resolutions,
summaries of resolutions, etc., especially if interpreted in the light of normative results after
the period of 1945-1953. The direct results are the Renville Agreement, despite its brevity,
and the Trusteeship Agreement for the Former Japanese Mandated Islands, as they have
explicit considerations about environmental protection. The Trusteeship Agreement even
combines social development with the regulation of the use of natural resources and the
promotion of health. Even with this obligation, the further development of the theme can be
observed without a legal precedent or a pronouncement by the International Court of Justice
on the specific norms celebrated in that agreement, even though the trusteeship over these
islands has gone through debates on the existingrights and obligations due to the use of that
territory for nuclear tests, also the soil poisoning due to the disposal of askarel, and the
consequent contamination by PCBs.

Keywords: Environmental Protection; Environmental Security; Security Council; Jus


Cogens.
Lista de Siglas.
Biological Weapons Convention (BWC) ou, em português, Convenção para a
Proibição de Desenvolvimento, Produção e Estoque de Armas Bacteriológicas e Tóxicas.
Chemical Weapons Convention (CWC) ou, em português, Convenção Internacional
sobre a Proibição do Desenvolvimento, Produção, Estocagem e Uso de Armas Químicas e
sobre a Destruição das Armas Químicas Existentes no Mundo.
Comissão de Direito Internacional da ONU (CDI)
Comissão mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMED)
Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV)
Conselho de Segurança da ONU (CSNU)
Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (CVDT)
Convenção sobre a Proibição de Uso Militar ou Qualquer Outro Uso Hostil de
Técnicas de Modificação Ambiental (ENMOD)
Convenção sobre zonas úmidas de importância internacional (RAMSAR)
Corte Internacional de Justiça (CIJ)
Direito Internacional (DI)
Direito Internacional Ambiental (DIA)
Direito Internacional Humanitário (DIH ou Jus in Bello)
Direito Internacional Público (DIP)
Opinião Consultiva (OC)
Organização das Nações Unidas (ONU)
PG-1925 (PG-1925)
Protocolo Adicional I de 1977 à Convenção de Genebra de 1949 (PA I)
Protocolo Adicional II de 1977 à Convenção de Genebra de 1949 (PA II)
Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP)
Trust Territory of the Pacific Islands (TTPI)
Trusteeship Agreement for the Former Japanese Mandated Islands (TAFJMI)
World Heritage Convention (WHC) ou, em português, Convenção para a Proteção
do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural
Sumário
1 Introdução ............................................................................. 14
1.1 Justificativa do Tema ....................................................................................... 14

1.2 Objeto de Pesquisa........................................................................................... 16

1.3 O resumo para policymakers do Relatório de 2022 do IPCC ............................ 18

1.4 Segurança Ambiental ....................................................................................... 19

2 Metodologia........................................................................... 27

3 Referencial Teórico para o conceito de Segurança


Ambiental .............................................................................................. 32
3.1 O Direito Ambiental e os Conflitos Armados nos tempos de hoje .................... 33

3.1.1 Conclusão ............................................................................................ 40

3.2 Jus in Bello, Jus Ad Bellum e Direito Ambiental .............................................. 41

3.2.1 Primeira Perspectiva. ........................................................................... 42

3.2.1.1 Normas Específicas do Jus in Bello ............................................... 42

3.2.1.2 Normas Gerais do Jus in Bello ....................................................... 44

3.2.2 Segunda Perspectiva - Se e como normas ambientais aplicam durante o


conflito armado. ............................................................................................................ 46

3.2.2.1 Primeiro aspecto ............................................................................ 47

3.2.2.2 Segundo aspecto - Respostas específicas advindas de Tratados ...... 49

3.2.2.3 Terceiro aspecto - Articulação entre as normas .............................. 50

3.2.3 Terceira perspectiva ............................................................................. 51

3.2.3.1 Jus ad bellum (Direito da Guerra) .................................................. 53

3.2.3.2 Tratados ambientais e a possibilidade de se evitar a guerra. ........... 55

3.3 Conclusão ........................................................................................................ 58

4 Weeramantry, Método e Marco Temporal. ........................ 58


4.1 Introdução ....................................................................................................... 59
4.1.1 O Voto Dissidente ................................................................................ 59

4.1.2 Introdução ............................................................................................ 59

4.1.3 A Importância Fundamental do assunto perante a corte para


Weeramantry ....................................................................................................................61

4.2 As Certezas Científicas / Os Fatos ................................................................... 64

4.3 Lex Lata........................................................................................................... 66

4.3.1 O impacto da Carta das Nações Unidas e os Direitos Humanos ............ 67

4.3.2 Posição Doutrinária .............................................................................. 70

4.3.3 Tratados e Convenções......................................................................... 71

4.4 Conclusão ........................................................................................................ 73

1 ANUÁRIOS........................................................................... 74
1.1 1º Anuário (15 de janeiro a 17 de julho de 1946).............................................. 75

1.1.1 Life ...................................................................................................... 75

1.1.2 Oil ....................................................................................................... 76

1.2 2º Anuário (16 de julho a 15 de julho de 1947) ................................................ 76

1.2.1 Water – Sea – Seas – Life ..................................................................... 76

1.2.2 Natural resources / Agriculture ............................................................ 77

1.2.3 Health .................................................................................................. 77

1.3 3º Anuário (16 de julho de 1947 a 15 de julho de 1948) ................................... 78

1.3.1 Water / Health / Supply / Food ............................................................. 78

1.3.2 Life ...................................................................................................... 79

1.3.3 Oil ....................................................................................................... 80

1.4 4º Anuário (16 de julho de 1948 a 15 de julho de 1949) ................................... 81

1.4.1 Water / Supply...................................................................................... 81

1.4.2 Life ...................................................................................................... 81

1.4.3 Food / supply ....................................................................................... 82

1.4.4 Oil ....................................................................................................... 82


1.5 5º Anuário (16 de julho de 1949 a 15 de julho de 1950) ................................... 82

1.5.1 Water / Supply...................................................................................... 82

1.5.2 Food .................................................................................................... 84

1.6 6º Anuário (16 de julho de 1950 a 15 de julho de 1951) ................................... 84

1.6.1 Water ................................................................................................... 84

1.6.2 Life ...................................................................................................... 86

1.6.3 Natural Resources................................................................................ 86

1.6.4 Natural ................................................................................................ 87

1.6.5 Food .................................................................................................... 87

1.6.6 Oil ....................................................................................................... 87

1.7 7º Anuário (16 de julho de 1951 a 15 de julho de 1952) ................................... 87

1.7.1 Water / natural..................................................................................... 87

1.7.2 Oil / life / Natural Resources ................................................................ 88

1.7.3 Gas ...................................................................................................... 89

1.7.4 Health .................................................................................................. 90

1.8 8º Anuário (16 de julho de 1952 a 15 de julho de 1953) ................................... 91

1.8.1 Water / supply / food ............................................................................ 91

1.8.2 Life ...................................................................................................... 91

1.8.3 Oil ....................................................................................................... 91

1.9 Resoluções....................................................................................................... 92

1.9.1 1º Anuário (15 de janeiro a 17 de julho de 1946) .................................. 92

1.9.2 2º Anuário (16 de julho a 15 de julho de 1947)..................................... 93

1.9.3 3º Anuário (16 de julho de 1947 a 15 de julho de 1948) ....................... 93

1.9.4 4º Anuário (16 de julho de 1948 a 15 de julho de 1949) ....................... 95

1.9.5 5º Anuário (16 de julho de 1949 a 15 de julho de 1950) ....................... 96

1.9.6 6º Anuário (16 de julho de 1950 a 15 de julho de 1951) ....................... 96

1.9.7 7º Anuário (16 de julho de 1951 a 15 de julho de 1952) ....................... 97


1.9.8 8º Anuário (16 de julho de 1952 a 15 de julho de 1953) ....................... 97

2 Considerações Finais ............................................................ 97


2.1 Considerações sobre os Anuários, as palavras escolhidas e Proteção
ambiental .................................................................................................. 97

2.1.1 A abordagem através das resoluções. ................................................. 100

2.2 As principais normas encontradas .................................................................. 101

2.2.1 Acordo de Tutela, proteção de terras e recursos e o Desenvolvimento


social ......................................................................................................... 101

2.3 Conclusão ...................................................................................................... 107

3 Referências Bibliográficas.................................................. 113


1 Introdução

1.1 Justificativa do Tema

No começo da participação russa oficial, com uma operação anunciada em fevereiro


de 2022 na guerra que se estende desde 2014 na Ucrânia, o discurso das partes envolvidas
escalou para a ameaça de uso de armas nucleares. O Presidente Ucraniano argumentou que
seu país poderia estar livre do Memorando assinado em 1994 que lhe havia retirado o que
chama de “terceiro maior arsenal nuclear” e que precisavam de garantias de segurança que, se
não alcançadas, os fariam verem-se livres daquele instrumento legal1. O presidente russo,
desde o começo do que chamam de “Operação Militar Especial”, colocou as forças nucleares
de deterrência em alerta2. Em novembro de 2022, o Ministro de Relações Exteriores da Rússia
explicou que a doutrina nuclear russa é puramente defensiva e, em entrevista, declarou que
Essas abordagens permitem que a Rússia, hipoteticamente, recorra a armas
nucleares exclusivamente em resposta a uma agressão envolvendo o uso de armas de
destruição em massa ou uma agressão com o uso de armas convencionais quando a
própria existência do Estado está em risco3
Isto remete à opinião consultiva da CIJ sobre o uso ou ameaça de uso de armas
nucleares diretamente e, além disso, as sanções econômicas sofridas pela Rússia, que mais
prejudicaram o ocidente e o terceiro mundo, trazem à tona a discussão sobre sua legalidade,
como escreveu Cristiane Derani: “se as sanções econômicas causarem fome, desrespeitarão o
Direito Internacional” (DERANI, 2022).
Este tema, portanto, suscita dois conceitos, pelo menos. Meio ambiente e Segurança.
A legalidade da ameaça do uso de armas nucleares e a legalidade, ou não, das sanções
econômicas estão dentro do tema da chamada segurança ambiental. A forma de proteção do
meio ambiente e exploração de recursos naturais nas normas do jus in bello e jus ad bellum
são um tema atualíssimo, vivo.
Relembrar a leitura do voto dissidente de Weeramantry é, para este trabalho,
identificar um caminho de como raciocinar para identificar a existência de uma proibição ou

1
Disponível em: https://www.dailywire.com/news/president-zelensky-suggests-ukraine-may-pursue-
nuclear-weapons-to-counter-russia-putin-responds. Acesso em 13/05/2023.
2
Disponível em: https://www.bbc.com/news/world-europe-60547473. Acesso em 13/05/2023.
3
Disponível em: https://edition.cnn.com/europe/live-news/russia-ukraine-war-news-11-02-
22/h_35a9adf8bfd6ed7e7276adccaa43e205. Acesso em 13/05/2023.
14
de uma proteção que,mesmo presente, não seja expressa e clara, nos primeiros oito anos de
Conselho de Segurança.
A ideia de pesquisar os primeiros anos do Conselho de Segurança vem daí, ou seja,
procurar naquele começo algum rastro de proteção ambiental, proibição de sua degradação,
que pudesse servir como epílogo do Direito Ambiental e, hoje em dia, do conceito de
Segurança Ambiental.
Isso se torna ainda mais plausível quando se lê, repetidas vezes na bibliografia
escolhida, a menção ao artigo 23 (g) das convenções de Haia de 1907, na qual se proíbe a
destruição de propriedade sem que ela constitua alvo militar. Não há, observa-se, distinção
entre propriedade civil ou natural, pública ou privada, o que abre à interpretação mais
abrangente de que todos esses aspectos se encontram protegidos pela norma.
Identificado o tema, é preciso justificar sua urgência ou, pelo menos, contextualizá-
la. Pode-se fazê-lo através do IPCC, que é o Painel Intergovernamental sobre Mudança do
Clima, criado em 1988 pelo programa ONU Meio Ambiente. Este órgão conta com uma força
tarefa, isto é, um grupo de trabalho de diversos cientistas que monitoram a mudança climática
e elaboram explicações científicas em extensos relatórios técnicos e resumidos, por exemplo,
para policymakers4.Este órgão se preocupa em informar o poder político da humanidade com
o consenso científico sobre este tema/perigo tão urgente que é a mudança climática.
Por exemplo, o último resumo para tomadores de decisão/fazedores de política
(policymakers) estabelece cenários onde lhes atribui adjetivos/critérios como “very high
confidence”, “high confidence”, “low confidence”, “limited evidence”. Trata-se, portanto, de
um trabalho sério, no qual tendências são identificadas e cenários hipotéticos são construídos
a fim de servir como uma fonte fidedigna de diagnósticos científicos para aqueles que os
necessitam e, também é verdade, para toda a humanidade.
A necessidade de revisitar o conceito de segurança, para lhe adicionar o termo
“ambiental”, não é uma prerrogativa exclusiva deste trabalho, mas algo já trabalhado por
pesquisadores ao redor do mundo e em perfeita sintonia com a preocupação da continuação de
certas tendências de mudança climática, como a temperatura global em ascensão nesta última
década (IPCC, 2023).
Estatuir a proteção ambiental como parte constitutiva daquele conceito parece ser um
corolário de um fato: O Direito Ambiental é direito cogente e, em virtude disso, demanda

4
Os encarregados de criar políticas públicas.
15
respeito e observância por parte da comunidade internacional. O conceito segurança
ambiental, então, passa a ser uma forma de evidenciar aquilo que foi construído pelo menos
desde os últimos cento e vinte anos e, há cerca de 30, desde Weeramantry, que se entende por
direito cogente; e uma forma de evidenciar aquilo que existe no direito aqui e agora.
Não há ideação que busque dar à luz um algo novo para ser implantado no direito
que existe, mas um esforço em identificar e argumentar a existência de proteção ambiental em
períodos de guerra e a relação imbricada entre proteção ambiental e o conceito de segurança.
Mais à frente, ao apresentar brevemente os múltiplos conceitos de Segurança
Ambiental desde o fim dos anos noventa até o começo dos anos dez deste século, a
justificativa do tema também se reforça uma vez que, embora tais conceitos tenham sido
pensados nos últimos trinta anos, considerações sobre proteção ambiental, como se verá, são
décadas mais antigas. Procurar neste lugar longínquo o que há sobre proteção ambiental é, de
certa forma, um caminho para discutir o que é Segurança Ambiental.
Faz-se necessário anotar que, quase em sua totalidade, os documentos em inglês e a
bibliografia em inglês estão traduzidos e a tradução foi feita pelo autor e, desde já, me
responsabilizo pela acuidade da tradução nos seus termos e significados. As palavras ou
termos em inglês, não traduzidos, existem quando a manutenção na língua inglesa é relevante
de alguma forma.

1.2 Objeto de Pesquisa

O Conselho de Segurança da ONU já é objeto de estudo dos pesquisadores


ambientais. Dam-de Jong é um exemplo trazido neste trabalho. Weeramantry aparecer neste
trabalho, tendo o último como objeto os primeiros anos do conselho de segurança é
fundamentar a aproximação do que se pretende estudar, uma vez que ir procurar na história
anterior o fundamento da questão jurídica do presente é algo que o juiz fez em seu voto
dissidente.
Os primeiros anos do conselho enquanto objeto, antes mesmo da efervescência das
discussões sobre direito ambiental, evidenciaram a sua real importância somente após a
própria pesquisa, porque fica a impressão de que ao Conselho da época lhe faltavam termos e
conceitos, para trabalhar o meio ambiente ou, então, tentava-se não tocar nesse assunto. Não é
possível escolher entre um ou outro, afirmar que não se tinha o instrumento conceitual
necessário ou que não se queria fazê-lo e, por isso, recorria-se ao que já se conhecia.
16
Afirmar a limitação ou intenção dos personagens que figuram nestes oito anos é uma
ideação puramente ilustrativa de algo bem mais importante: Desde aquela época os conflitos
em virtude de recursos naturais, da proteção ambiental e do desenvolvimento humano
aparecem, sim, ora como matéria de obrigações de proteção, ora como proibições de dano nas
discussões do Conselho de Segurança e nos acordos que este último deu ensejo.
Os primeiros anos do Conselho viram acusações de guerra biológica (envenenamento
de água e desencadeamento de doenças), uso de recursos naturais como arma de guerra ou,
pelo menos, como a pedra de toque da continuação dos conflitos (caso das águas do Jaipur e
do Rio Jordão) e a propriedade como um conceito que rompeu a esfera cível, das mercadorias
ou bens de consumo, podendo significar a propriedade natural e pública, conjuntamente, o
que conferiria nova substância aos deveres de não destruí-la sem fundada razão militar, com
proporcionalidade, ou mesmo de protegê-la, como no caso do acordo de Renville. Por fim, a
proteção dos recursos naturais e a proteção contra a perda de terras aparecem
concomitantemente ao desenvolvimento social no acordo sobre a tutela das ilhas do pacífico.
Esperava-se encontrar nesses oito anos alguma ligação com o posterior
desenvolvimento do Direito Ambiental e, hoje, com o conceito de segurança, através de
proteção ambiental de forma explícita ou implícita. A escolha do método de pesquisar essa
proteção foi através de palavras, em primeiro lugar, e resoluções, no segundo. A busca por
palavras e expressões se deu nos anuários e pelas resoluções na sessão de resoluções do
website do Conselho de Segurança.
Buscar dessa forma permitiria, na primeira opção, ir até as discussões em segundo
plano, ou seja, as abordagens indireta/implícitas da proteção ambiental. Também permitiu,
por exemplo, identificar as acusações de guerra biológica e de usar a água e seu suprimento
como arma de guerra. O que se transforma em resolução acontece somente mediante voto e
após a fala dos membros do conselho e das demais delegações que lá têm seus conflitos
dirimidos. Essa busca é mais demorada e parece permitir uma abordagem mais hermenêutica
e profunda do tema, o que não é o objetivo deste trabalho.
A segunda abordagem, mais direta, é também mais precisa para com o tema da
proteção ambiental hipoteticamente presente naqueles tempos, e está muito mais afim daquilo
identificado como a maneira/método de Weeramantry de argumentar e raciocinar do que o
tipo de busca da primeira opção.

17
De toda forma, este é o objeto de pesquisa e a forma com que a pesquisa foi feita no
material disponível na internet sobre os anuários e resoluções dos primeiros oito anos de
Conselho de Segurança.

1.3 O resumo para policymakers do Relatório de 2022 do IPCC

O sumário para os formuladores de política do relatório do IPCC de 2023, possui um


documento com afirmações, estatutos gerais, sobre o trabalho e o próprio sumário, mais
extenso, com explicações mais detalhadas.

Consultar o IPCC antes de uma pesquisa sobre Direito Ambiental é uma forma de
fundamentar a urgência da sua proteção e a atualidade desta matéria, bem como sua
concretude. No caso das guerras, elas são poluidoras com efeitos “multidimensionais”
(BISWAS, 2001, p. 1), e até testes de armas de guerra podem deixar consequências por
longuíssimos períodos de tempo, como é o caso dos testes nucleares. Na guerra do Vietnã, por
exemplo, quando se usou o agente laranja, apresenta até hoje contaminação do solo e
problemas de saúde na população atingida. Dessa forma, é impossível não perguntar “até
onde vale, ou vale em sua inteireza, o Direito Ambiental em períodos de guerra?”. Também é
daí que o conceito de Segurança Ambiental aparece neste trabalho.

Para fundamentar a situação climática crítica, foram extraídos alguns dados do


relatório do IPCC julgados imprescindíveis. As emissões de gás carbônico até 2030,
anunciadas em outubro de 2021, constroem o provável cenário de aquecimento acima de
1,5 ºC durante este século. Segundo o relatório, haveria dificuldade em controlar o aumento
da temperatura abaixo dos 2 ºC. (IPCC, 2023, AR¨, Synthesis Report, p. 2).Essa tendência de
aumento, se assim remanescer, também significará um aumento de “perigos múltiplos e
simultâneos” (IPCC, 2023, AR, Synthesis Report, p. 2). No relatório,afirma-se que algumas
mudanças são

“inevitáveis e/ou irreversíveis, mas podem ser limitadas por uma redução profunda,
rápida e sustentada na emissão de gás carbônico que levaria à uma redução notável
no aquecimento global dentro de duas décadas”
(IPCC, 2023, AR¨, Synthesis Report, p. 2).

Nesta avaliação geral do quadro atual de mudança climática, são reconhecidas perdas
irreversíveis em biodiversidade, com a ocorrência de “eventos de mortalidade em massa”
(IPCC, 2023, Summary for Policy Makers, p. 5) em virtude dos picos de temperatura.
18
A probabilidade de mudanças irreversíveis e/ou repentinas aumenta conforme
alcançamos pontos de inflexão, onde o fenômeno graficamente representado sofre mudanças
na concavidade de sua linha. Por exemplo, se chegarmos aos dois ou três graus centígrados, as
calotas polares levariam milênios para se recuperar.

Atingir uma temperatura indesejável de 1,5 ºC e retornar para níveis indicados é um


comportamento chamado pelo IPCC de “overshoot”. Vale lembrar que a extinção de espécies
e a consequente redução de biodiversidade não pode ser reparada com este “retorno” para um
nível desejável de temperatura. Inclusive,

“quanto maior a magnitude e a duração da ultrapassagem [overshoot] mais


ecossistemas e sociedades estarão expostos à mudanças generalizadas devido aos
fatores climáticos” (IPCC, 2023, Summary for Policy Makers, p. 24).

Essa ultrapassagem até 1,5 ºC torna irreversível mudanças em ecossistemas tidos


como frágeis, os ecossistemas costais, polares e de montanha.

Embora haja reconhecimento de algumas contramedidas efetivas, de ações humanas


que mitigam os efeitos e estão na direção correta, generalizadamente se mantiveram as
tendências de aquecimento global. A acidificação do oceano, que ameaça a vida marinha, os
corais, etc., é tida como praticamente certa. A consequente diminuição de oxigênio disponível
possui alta confiança de probabilidade por parte do relatório.

Estamos, enquanto coletivo, em direção a mudanças irreversíveis e capazes de


rearranjar por completo a existência humana no planeta, em situações de extinção em massa
de espécimes. O desequilíbrio aumenta secas e enchentes. Este é o diagnóstico atual. Afetar a
rede de interações físico-químicas da fauna e flora pode levar à sua destruição, à destruição do
meio ambiente.

1.4 Segurança Ambiental

Em 2008, Zurlini e Müller escrevem um artigo onde compilam algumas definições


de Segurança Ambiental, que serão reproduzidas abaixo, adicionando a definição do
Departamento de Estado Americano, publicada em outubro de 2001.
A AC/UNU Millennium Project possui quatro definições na relação apresentada.
Essa instituição se descreve como um Think Thank fundado em 1996 sob o American Council

19
for the United Nations e que se autonomizou em 2009, possuindo 73 grupos ou indivíduos,
por todo o mundo, que a ela se relacionam diretamente5:
– A segurança ambiental é a relativa segurança pública contra os perigos ambientais
causados por processos naturais ou humanos devido à ignorância, acidente, má
gestão ou projeto e originados dentro ou além das fronteiras nacionais.
– A segurança ambiental é o estado da dinâmica humano-ambiente que inclui a
restauração do meio ambiente danificado por ações militares e a melhoria da
escassez de recursos, degradação ambiental e ameaças biológicas que podem levar à
desordem social e ao conflito.
– O termo segurança ambiental refere-se a uma série de preocupações que podem
ser organizadas em três categorias gerais:
1. Preocupações com o impacto adverso das atividades humanas no meio ambiente.
2. Preocupações sobre os efeitos diretos e indiretos de várias formas de mudança
ambiental (especialmente escassez e degradação) que podem ser naturais ou geradas
pelo homem na segurança nacional e regional.
3. Preocupações com a insegurança que indivíduos e grupos (de pequenas
comunidades à humanidade) experimentam devido a mudanças ambientais, como
escassez de água, poluição do ar, aquecimento global e assim por diante.
Combinando isso, podemos concluir que a condição de segurança ambiental é
aquela em que os sistemas sociais interagem com os sistemas ecológicos de maneira
sustentável, todos os indivíduos têm acesso justo e razoável aos bens ambientais e
existem mecanismos para lidar com crises e conflitos ambientais.
– A segurança ambiental é a manutenção da integridade física
entorno da sociedade para suas necessidades, sem diminuir o
estoque natural (ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 3).
O Conceito de J. Barnett, em 1997, num seminário intitulado “Environmental
Security: Now What?”, na Universidade de Keele:
Ao garantir a segurança ambiental, queremos dizer proteger contra a degradação
ambiental, a fim de preservar ou proteger os recursos humanos, materiais e naturais
em escalas que vão do global ao local (ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 3).
Para a Comunidade dos Estados Independentes, (CIS), formada hoje em dia por doze
Estados, tinha como conceito de Segurança Ambiental em 1997, que
A segurança ambiental é o estado de proteção dos interesses vitais do indivíduo, da
sociedade, do meio ambiente natural contra ameaças resultantes de impactos
antrópicos e naturais sobre o meio ambiente (ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 3).
O Programa de Ciência da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), em
1997, conceituava Segurança Ambiental como
Problemas científicos relacionados à segurança ambiental, incluindo a recuperação
de locais militares contaminados, problemas ambientais regionais e desastres
naturais e provocados pelo homem; tecnologias de limpeza acessíveis são de
particular interesse(ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 3).

5
Disponível em: https://www.millennium-project.org/about-us/. Acesso em 12/06/2023.
20
Por fim, a definição dada pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos da
América, em outubro de 2001, que deve ser lida e contraposta pelo leitor aos fatos que serão
apresentados no restante deste trabalho e aos apontamentos sobre o uso pelo Estado do
discurso da segurança nacional, como apontado por J. Barnett, que também será trabalhado
mais a frente:
A segurança ambiental é um elemento de segurança regional e nacional. Abrange a
mitigação e prevenção de ameaças energéticas, incluindo ameaças a fontes e linhas
de abastecimento, riscos ambientais e tensões relacionadas que contribuem
diretamente para a instabilidade política e econômica ou conflito em países
estrangeiros ou regiões importantes para os Estados Unidos. Além disso, trata de
questões de segurança nacional, ambientais e energéticas selecionadas que
representam um conflito direto com a política externa dos Estados Unidos. Embora
as ameaças à segurança ambiental possam não necessariamente prejudicar
diretamente o território dos EUA, elas ainda podem ameaçar a segurança nacional
por causa de danos potenciais aos territórios de aliados dos EUA e outras nações
onde os EUA têm interesses estratégicos ou devido a efeitos adversos indiretos ao
sistema econômico global. As preocupações de segurança ambiental incluem as de
contaminação nuclear, combustível irradiado e resíduos; ameaças aos recursos
energéticos; contaminação, degradação ou esgotamento de recursos ambientais
essenciais; ou problemas ambientais decorrentes de falhas na infraestrutura, pois
podem ameaçar a segurança dos EUA ou minar a estabilidade regional estrangeira
(EUA, Departamento de Estado, 2001).
O Relatório acima ainda cita que, em 1991, o então presidente americano tratou da
segurança ambiental na Estratégia de Segurança Nacional Americana, assim descrevendo-a:
O ‘Relatório de Estratégia de Segurança Nacional 2000’ afirma: ‘As decisões atuais
sobre o meio ambiente e os recursos naturais podem afetar nossa segurança por
gerações’. Ele também enfatiza que ‘responder agressivamente às ameaças
ambientais continua sendo parte da política externa americana
dominante’(EUA, Departamento de Estado, 2001).
Bom, esta exposição, e o que seguir, servirá para situar o conceito de Segurança
Ambiental no Tempo, demonstrando a disputa sobre si no que se refere ao seu significado.
Posteriormente, autores como Dam-de Jong e Dupuy e Viñuales serão trabalhados e serão
eles, de fato, que sedimentarão a compreensão acerca do que é Segurança Ambiental,
principalmente tratando do Direito Internacional e propriamente de seu conteúdo de proteção
ambiental. Posteriormente, fará parte da pesquisa a busca por considerações de proteção
ambiental nos relatórios do Conselho de Segurança.
Para Zurlini e Müller, a discussão de segurança ambiental se deu como um conceito
de política de segurança nacional. Quanto à relação entre mudanças climáticas e conflito
violento, acreditam que a degradação ambiental impacta o comportamento dos
atores envolvidos e pode desempenhar um papel como razão, gatilho, alvo, canal ou
catalisador de conflitos. A diminuição em quantidade e qualidade de recursos,
rápido aumento do crescimento populacional e acesso desigual à recursos são os

21
principais fatores dos aumentos de risco na segurança
ambiental(ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 1).
Zurlini e Müller acreditam se tratar de um fato notável que recursos renováveis são
fatores cruciais em questões de segurança, principalmente quando se trata de migração,
instabilidade interna e entre países, além de que a escassez, conceito muito utilizado pelos
autores, poderia contribuir para a instabilidade.De todo modo, para os autores, são três fatos
que constituem um algo que não se pode deixar de lado, por assim dizer, pois os elencam
como conclusões de “estudos abrangentes”:
– O meio ambiente é a questão mais transnacional e sua segurança é uma dimensão
importante da paz, segurança nacional e direitos humanos;
– Nos próximos 100 anos, um terço da atual cobertura terrestre global será
transformado; portanto, o mundo enfrentará escolhas cada vez mais difíceis entre
consumo, serviços ecossistêmicos, restauração, preservação ou degradação; e
– A segurança ambiental é central para a segurança nacional, compreendendo as
dinâmicas e interconexões entre humanos e recursos
naturais(ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 2).
O que compõe a visão dos autores são conceitos como o da escassez, já mencionado,
de fragilidade e de resiliência. As interações entre a humanidade e o ambiente são chamadas
de sistemas socioecológicos e são estes que acabam por compor, “no mundo geográfico real”
(ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 1), as chamadas paisagens socioecológicas.
De forma breve, definem que a palavra “segurança” pode ser Segurança Humana ou
Segurança Ambiental. Na primeira, “os valores em risco são a sobrevivência dos seres
humanos e sua qualidade de vida” (ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 2) e, na última, tratam-se
das consequências da mudança climática, com foco “nas interações entre humanidade e
ecossistemas”(ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 2), além dos efeitos de tal mudança. Efeitos
naquilo que os autores chamam de “serviços de ecossistema [...] bens ambientais”
(ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 2) e da “crescente demanda social por recursos”
(ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 2).
Essa perspectiva de sistemas socioecológicos que compõem uma determinada
paisagem socioecológica e serviços de ecossistemas possui alguns “princípios gerais”
segundo os autores. Os próprios autores os resumem e a importância para esse trabalho é
continuar a exposição sobre o que se definiu e como foi pensada a Segurança Ambiental, a
partir de quais problemas identificados e com quais ferramentas conceituais. Isso será muito
providencial para, ao final do trabalho, procurar com “os pés” nos dias de hoje, nessa

22
discussão atualizada, o que ela enxerga de si nas discussões do Conselho de Segurança
durante a década de quarenta e cinquenta do século passado.
Para Zurlini e Müller, os princípios da interação humana com o meio ambiente
podem ser resumidos, a fim de definir a Segurança Ambiental, num sentido objetivo, no qual
se procura “avaliar o nível de ameaças para adquirir e sustentar ecovalores em termos de bens
e serviços de ecossistemas em múltiplas escalas” (ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 3). O
sentido subjetivo de Segurança Ambiental seria o “nível de medo de que tais valores sejam
atacados e possivelmente perdidos” (ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 3).
É aqui que o conceito de fragilidade, que os autores também trabalham como
“vulnerabilidade”(ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 2), aparece sob a forma da relação entre a
Segurança Ambiental como acima definida e o “risco ou fragilidade [...] de perder bens e
serviços” (ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 4) providos pelo ecossistema e como tais riscos são
percebidos. Para ser breve, a resiliência, também já citada, seria o inverso da fragilidade, ou
seja, o quanto se consegue resistir a situações de estresse e a forma de resposta a tais
situações. Fundamentalmente, para os autores, “A segurança ambiental é uma abordagem
integrada de avaliação e gerenciamento de riscos.”(ZURLINI; MÜLLER, 2008, p. 4).
Para J. Barnett, a segurança ambiental se divide na discussão do termo “ambiental” e
“segurança”. Sendo a vertente mais importante da última a “segurança nacional”:
Como geógrafos e estudiosos críticos das relações internacionais têm mostrado, o
discurso de segurança nacional é um discurso que fabrica e sustenta tipos de
identidade por meio de construções de diferença. Sua função primária é proteger o
estado-nação justificando instituições disciplinares (BARNETT, 2009, p.1).
Para o autor, após o término da Guerra Fria houve uma tendência em “aprofundar a
escala e alargar o conteúdo de segurança” e o conceito de segurança ambiental é central. As
primeiras formulações que acabaram por preceder este conceito vieram nos anos 1970 e 1980:
[...] uma série de estudiosos da paz e do meio ambiente começaram a destacam a
incapacidade das instituições de segurança nacional, e em particular das forças
armadas, de administrar problemas ambientais comuns que representam ameaças à
segurança internacional estabilidade e bem-estar nacional. Então, em 1987, a
Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento lançou seu relatório
histórico intitulado Our Common Future, que popularizou o conceito de
desenvolvimento sustentável e introduziu o termo “segurança
ambiental” (BARNETT, 2009, pp.1-2).
O autor divide o conceito em seis vertentes e afirma que as últimas três, como na
seguinte ordem, são as mais importantes. Primeira, a Segurança Ambiental, como os impactos
da atividade humana no meio ambiente. Segunda, os impactos do complexo industrial-militar,
inclusive a guerra, no meio ambiente. Terceira, a mudança ambiental vista como um problema

23
de segurança comum à comunidade internacional, o que requer ação coletiva. Quarta, a
mudança ambiental como ameaça à segurança nacional. Quinta, a mudança ambiental como
causa possível de conflitos violentos. Sexta, a mudança climática como um risco à segurança
humana. 6
Sobre a segurança nacional, Barnett afirma que, sem necessariamente o meio
ambiente ser um fator em conflitos violentos, a mudança ambiental pode minar a segurança
nacional, ou seja, os conflitos podem ocorrer devido a mudanças ambientais ou podem
acarretá-las.
É possível relacionar consequências de territórios afetados pela guerra com as
consequências climáticas, ainda na perspectiva daquilo que atinge ou prejudica a segurança
nacional, sendo objeto primário de seu interesse protetivo. O autor cita o acidente de
Chernobyl, os testes nucleares nas Ilhas Marshall e na Polinésia Francesa, as Queimadas na
Indonésia, o aumento de gás carbônico na atmosfera e as consequências danosas aos vizinhos
desses países e, no caso do CO2, o aumento de cânceres de pele nas latitudes mais ao sul. Ele
prossegue:
Parece apropriado chamar tais fluxos transfronteiriços de problemas de segurança
nacional na medida em que seus impactos podem ser igualados, ou maiores em
magnitude do que os impactos associados à guerra (medidos em termo de, por
exemplo, perda efetiva de território, perda de vida, aumento de mortalidade ou
contração econômica) (BARNETT, 2009, p. 2).
No entanto, relacionar de forma direta segurança ambiental com a segurança
nacional, para Barnett, é difícil pela natureza diferente das ameaças comumente identificadas
pela teoria da segurança nacional e sua política e das ameaças ambientais, “geralmente
externalidades econômicas de causa incerta” (BARNETT, 2009, p. 3). O que poderia ser
aproveitado pela “lógica existente de segurança” (BARNETT, 2009, p. 3) nessa correlação é
que as instituições militares aprenderiam a lutar “os assim chamados conflitos induzidos por
causas ambientais” (BARNETT, 2009, p.3) sendo que, segundo outro autor, Simon Dalby,
Barnett afirma que os problemas ambientais
Podem ser apropriados pelo discurso dominante de segurança dessa maneira, já que
sua categorização acrítica do espaço como território nacional está profundamente

6
Escolheu-se “mudança ambiental” no lugar de “mudança climática”, pois o clima é parte do
ambiente, e não o próprio, e acredita-se que, como se poderá ver ao expor os demais conceitos de Segurança
Ambiental, e os próprios tratados ambientais que disciplinam diversas áreas do meio ambiente, faz mais sentido
usar “mudança ambiental” ao tratar do Segurança Ambiental, sendo a “mudança climática” mais um dos fatores,
do que usar “mudança climática”, estritamente, por exemplo, como causa de risco à segurança nacional. A
mudança climática é o motor da mudança ambiental, a longo prazo principalmente, mas se preferiu usar as
mesmas palavras em português que os autores usaram nas línguas em que originalmente escreveram.
24
enraizada, é robusta e adaptável e porque esse discurso serve ao poder estatal
(BARNETT, 2009, p.3).
O Tema do conflito violento e mudança ambiental é exposto sob diversas vertentes.
Citando Homer-Dixon, Barnett comenta que as seguintes características se manifestaram da
pesquisa do autor:
Escassez de recursos renováveis pode, às vezes, levar ao conflito violento e
desestabilização social; consumo desigual de recursos escassos é um fator crítico em
conflitos violentos; conflitos violentos onde a escassez ambiental é um fator são
mais prováveis em sociedades de baixa-renda e dependentes de recursos naturais;
pressão demográfica é um fator contribuinte aos conflitos violentos; quando
mecanismos que permitem a adaptação à escassez ambiental falham, o conflito
violento é mais provável(BARNETT, 2009, p.3).
Por outro lado, alguns estudos mostram que, além da escassez, a abundância de
recursos também pode ensejar conflitos. No entanto, afirma Barnett, tais estudos, que são
qualitativos, não obtiveram êxito em respostas realmente conclusivas, “já que são limitados
pela qualidade dos dados que utilizam [...] São incapazes de demonstrar como ocorrem as
associações que encontraram” (BARNETT, 2009, p. 3).
Outros pesquisadores procuraram encontrar a manutenção e formação da paz durante
a mudança ambiental, ao invés de encará-la como fator promovente de conflitos violentos.
“Esse esforço ainda não chegou num estágio de produção de massa crítica suficiente por onde
resultados claros podem emergir” (BARNETT, 2009, p.4).
Para Barnett, pesquisas de antropólogos, sociólogos e geógrafos, que valem menção
por sua importância no estudo entre meio ambiente e sociedade, destacaram
a importância de resultados desiguais de mudanças ambientais e sociais, incluindo a
distribuição inadequada dos retornos das atividades de extração, declínio na
produção agrícola e acesso desigual à recursos econômicos e políticos. Muitos
desses estudos mostram que comunidades afetadas por atividades de extração
externamente impostas raramente comungam com tais desenvolvimentos sem
exercer resistência (BARNETT, 2009, p.4).
Diferente de outras abordagens, aqui, tais “estudos qualitativos, uma gama de
processos econômicos, políticos e culturais que estruturam a forma institucional e material de
poder são mais importantes do que a escassez em si” (BARNETT, 2009, p. 4). Para Barnett,
aqui há maior poder explanatório e isso sugeriria que mais pesquisas que focassem os efeitos
de mudanças ambientais em contextos locais e seus modos de vida, apesar da existência ou
não de conflitos violentos, poderiam ser mais proveitosas.
Sobre a segurança humana e mudança ambiental, o seguinte parágrafo é muito
explicativo:
É, portanto, o contexto mais amplo da modernidade e suas forças contrapontísticas –
o alívio limitado das restrições ambientais para alguns e a exacerbação dos
25
problemas ambientais para outros, a obtenção de um certo tipo de bem-estar material
e poder para alguns e a exacerbação da pobreza e impotência para os outros – que dá
origem ao problema da mudança ambiental global e como um risco para a segurança
humana. A segurança humana é uma condição variável em que as pessoas e as
comunidades têm a capacidade de gerir as pressões sobre as suas necessidades,
direitos e valores. A mudança ambiental é um problema de segurança humana
quando mina as necessidades, direitos e valores que são importantes para indivíduos
e comunidades (BARNETT, 2009, p. 4).
Por fim, Barnett compreendia, àquela altura, que o conceito de segurança ambiental
foi aceito pela burocracia estatal, principalmente a americana, de maneira que se encaixe na
concepção de segurança nacional, de tal forma que a segurança ambiental se preocuparia mais
com ameaças ao Estado, inclusive problemas ambientais fora das próprias fronteiras, do que
com o meio ambiente em si. De outro modo: “Isso sugere que enquanto a segurança ambiental
pode ter alargado a ideia de segurança, ela foi menos bem-sucedida em mudar a sua escala de
referência” (BARNETT, 2009, p. 5).
O conceito de segurança ambiental, por outro lado, permite conjugar respostas e
instituições locais, regionais e mundiais, estatais, não-governamentais e indivíduos, além de,
na opinião do autor, ser de melhor uso para tratar dos impactos ambientais do que conceitos
como vulnerabilidade ou sustentabilidade. Barnett ressalta, ainda, que há grande valia em
questionar o conceito de segurança, e é muito importante ele escolher a palavra “segurança”, e
não “ambiental” ou “ambiente”, já que pode parecer, em um primeiro olhar, que seu texto e
sua abordagem concisa do assunto, de alguma forma, desautorize ou retire importância da
mudança climática, do conceito de segurança ambiental, etc. Veja-se:
Finalmente, há valor em continuar a contestar a legitimidade do paradigma de
segurança dominante, apontando para a contradição entre as abordagens simples
baseadas no estado e militares para a segurança nacional e a natureza complexa,
multiescalar e transfronteiriça dos fluxos ambientais (BARNETT, 2009, p. 5).
Por fim, usar o conceito de Segurança Ambiental neste trabalho faz parte do que se
propõe de metodologia, uma vez que se buscam no objeto de pesquisa “considerações sobre
proteção ambiental”, uma parte que constitui o conceito, e não ele mesmo. Essa proposta vê
nos primeiros anos do CSNU a oportunidade de pesquisar, “no começo” do órgão próprio
para discutir Segurança, algo que hoje esteja inserido ou faça parte do conceito de Segurança
Ambiental.
Assim como Weeramantry faz uma argumentação que mais parece a gênese da
proibição de armas destrutivas, os primeiros anos do CSNU neste trabalho tem o papel de
ocupar esse locus para ser praticada a pesquisa. Aqui haveria uma “obrigação metodológica”
de buscar esse “lugar”, onde se procuraria “o começo”. O período 1946-1953 também

26
compraz alguns acontecimentos que se esperava produzirem bons resultados, como a Guerra
da Coreia e o começo da ocupação da Palestina. Na primeira, a possibilidade de Guerra
Bacteriológica e, na segunda questão, a água como causa do conflito, uma vez que necessária
para o estabelecimento e funcionamento do Estado de Israel. Esses dois motivos também
ensejaram a escolha deste interregno de tempo específico.
Por último, o começo do CSNU é o começo da Guerra Fria e antecede a crise dos
mísseis de 1962, por exemplo. Este período, até os anos noventa, constituiu um perigo jamais
visto para a existência da espécie humana, com o constante receio de uma guerra nuclear
generalizada que levasse à destruição mútua assegurada não apenas pelos efeitos diretos da
arma nuclear, mas pelo inverno nuclear que seguiria, diminuindo a temperatura global por
anos, levando à extinção de espécies da fauna, flora, escassez de alimento, etc.

2 Metodologia

A seguir, a perspectiva de Van Hoecke sobre direito comparado e o aspecto


hermenêutico da doutrina será exposta para fundamentar o procedimento e a construção da
forma de pesquisar neste trabalho.
Van Hoecke afirma que a perspectiva monista assume pressuposições falsas de
unidade e similaridade das disciplinas científicas, colocando em perigo “o futuro das ciências
humanas em geral; e da doutrina jurídica em particular” (VAN HOECKE, 2011, p. 4). Para o
autor, houve a minimização da hermenêutica quando da tentativa de separar a prática jurídica
do ensino jurídico, a descrição da valoração do direito, ou mesmo comparar a ciência jurídica
com as ciências naturais (VAN HOECKE, 2011, p. 5):
interpretação e argumentação parecem ser mais ou menos os dois lados da mesma
atividade, na qual interpretação é o objetivo e argumentação o meio de sustentar
aquela interpretação. Portanto, se tivesse de escolher, parece ser mais apropriado
descrever a doutrina como uma disciplina hermenêutica (VAN HOECKE, 2011,
p. 6).
O professor cita De Geest para afirmar que o estudo empírico encontra na
jurisprudência seu objeto e dizer que ele acaba por demonstrar que a doutrina é parcialmente
hermenêutica, axiomática e histórica, ou seja, vale-se de “análise de texto [...] lógica”
(VAN HOECKE, 2011, p. 7) e jurisprudência. Para o autor, a doutrina não é
“unidimensional”, mas uma “combinação de muitas disciplinas” (VAN HOECKE, 2011, p.
7).

27
Na sua concepção sobre o estudo doutrinário, a explicação é necessária à
interpretação, a primeira serve à última, e não o contrário, a não ser “nos períodos de grandes
codificações” (VAN HOECKE, 2011, p. 9), o que significa que a doutrina “não pode ser
principalmente uma disciplina explicativa” (VAN HOECKE, 2011, p. 9). Há muita
interpretação na doutrina para que ela seja lógica pura, o que não exclui o fato de a coerência
lógica ser “uma característica da pesquisa científica” (VAN HOECKE, 2011, p. 10).
Na avaliação do autor, a doutrina sob a perspectiva normativa também se posiciona
frente aos valores e interesses em relação ao ordenamento jurídico e, quase sempre, sob a
ideia de aprimorar e de fazer o direito “melhor”. Melhorar a doutrina é melhorá-la a partir de
uma perspectiva exterior ao direito, de outras áreas do conhecimento, o que necessita de
pesquisa empírica:
Isso se refere a elementos que são externos ao direito e à doutrina: filosofia, moral,
história, sociologia, economia e política. Portanto, procurar por ‘melhorar o direito’
pode requerer pesquisa empírica, principalmente quando ‘melhor’ é melhor desde
uma perspectiva econômica ou ponto de vista sociológico, ou quando a referência é
feita à moral e convicções ‘prevalentes’ (VAN HOECKE, p. 10).
Van Hoecke comenta que, por óbvio, a cada perspectiva corresponde uma
metodologia e, se a doutrina fosse interpretada como uma atividade essencialmente
hermenêutica, o seu método seria o seguinte:
Estudiosos do direito coletam dados empíricos (estatutos, casos, etc.), elaboram
hipóteses sobre seu significado e alcance e, usando os cânones da interpretação,
testam-nas. No próximo estágio, constroem teorias [...], testam-nas e dela derivam
novas hipóteses [...]. Descrito desse modo, o estudo doutrinário se encaixa
perfeitamente com a metodologia de outras disciplinas ‘A pesquisa científica, vista
de uma perspectiva ampla, pode-se dizer que apresenta dois aspectos. Um é a
constatação e descoberta de fatos, o outro é a construção de hipóteses e teorias’
(VON WRIGHT apud VAN HOECKE, 2020, p. 11).
Para o autor, três pontos compõem o primeiro estágio da pesquisa e construção
doutrinárias. Aqui, os dados empíricos são assim divididos:
Fontes normativas, como textos estatutários, tratados, princípios gerais do direito,
direito consuetudinário, precedentes vinculantes, e similares
(VAN HOECKE, 2020, p. 11).
Fontes de autoridade, como estudo de jurisprudência – se não forem precedentes
vinculantes- e escritos jurídicos acadêmicos (VAN HOECKE, 2020, p. 11).
Uma mistura de trabalhos jurídicos acadêmicos como uma fonte de autoridade do
direito de um lado e, de outro, a doutrina como a comunidade científica que discute,
aceita ou rejeita posições tomadas por colegas e as teorias que propõem
(VAN HOECKE, 2011, p. 11).
A palavra chave que destrincha os pontos acima é “relevância”, segundo Van
Hoecke (2020, pp. 11-12), na pesquisa empírica no direito. Senão, veja-se:

28
Um texto declarado inconstitucional é irrelevante; Uma súmula vinculante superada
é irrelevante; Uma jurisprudência da suprema corte será mais relevante que outra de
instâncias inferiores; a publicação de um cânone terá maior peso que a de um
pesquisador novo; uma posição bem argumentada tem maior relevância que outra
apenas afirmada (VAN HOECKE, 2011, p. 12).
Para o autor, a observação de dados empíricos é sempre guiada pela teoria. Um dado
problema só pode se formulado dentro de algum contexto teórico e a pesquisa, por sua vez,
vai confirmar, refinar ou falsificar as pressuposições teóricas (VAN HOECKE, 2011, p. 13).
A seleção acerca da relevância dos dados será guiada, para Van Hoecke, por uma “teoria de
fontes jurídicas: quais fontes jurídicas são relevantes nesse sistema, hoje, e quais são suas
relações hierárquicas?” (VAN HOECKE, 2011, p. 13).
Para exemplificar, remonta ao episódio do direito americano onde os restatements,
em 1923, feitos pela American Law Institute, foram descritos como
“uma atividade neutra, apolítica [...] o instituto [...] implicitamente começou da
pressuposição falsa de que ‘é possível descrever o direito como ele é, em termos
neutros’ apontando para a conexão entre descrição e interpretação. ‘que é possível
fazer asserções, com significado, sobre o ordenamento, sem referir-se à sua
racionalidade’ (o objetivo do direito como interpretação de texto), ou ‘sem
referência ao contexto prático de sua operação’ (aplicação concreta como contexto
de interpretação)” (VAN HOECKE, 2020, pp. 13-14).
Quanto à relevância, neste trabalho, procura-se por considerações sobre proteção
ambiental no objeto de pesquisa, com vista em traçar uma relação entre um “começo” e o
conteúdo ambiental do DIH tal qual existe hoje. Também, a relevância, em último caso, das
fontes jurídicas, dar-se-á no quanto serviriam ou não para o apontamento final do trabalho, no
que concerne à possibilidade de encarar as normas ambientais como direito cogente.
A relevância das normas jurídicas do DIH e seu conteúdo ambiental, portanto, na
metodologia deste trabalho, também dependem da existência ou não de considerações sobre
proteção ambiental durante o começo da existência do CSNU.
Não há um estudo propriamente do significado da doutrina e dos textos legais, neste
trabalho, mas um levantamento e uma comparação, sim, de como o significado de
determinadas disposições jurídicas devem ser trabalhados, a partir da maneira com que o juiz
Weeramantry o faz no voto dissidente em relação à Opinião Consultiva sobre a Legalidade do
Uso ou Ameaça de Uso de Armas Nucleares. Neste trabalho, busca-se a existência de
considerações sobre proteção ambiental nos primeiros anos do conselho de segurança, além
da gênese da proteção ambiental que se desenvolveu posteriormente, ou se há alguma desde
aquela época.

29
Então, afirma-se o que há de considerações sobre proteção ambiental, ou mesmo a
criação de proteção ambiental, encontrados à luz da revisão bibliográfica do capítulo 3 e 4,
para estabelecer uma relação entre si e, através da reprodução de argumentos elaborados pelo
juiz, como o de que não há como sustentar um sistema jurídico capaz de atentar contra a
existência da comunidade a que serve, objetiva-se sustentar que os dispositivos aqui
mencionados, trabalhados extensamente por especialistas, poderão vir a fazer parte da
hipótese final lançada na conclusão, sobre a criação de um conceito de jus cogens para o DIA.
Van Hoecke afirma que toda e qualquer descrição do direito inclui uma série de
interpretações e hipóteses, conceitos, pressuposições, etc., que podem ser verificadas e
investigadas cientificamente. A existência desse tipo de pesquisa, dar-se-ia não só ante à
“falta de clareza dos textos, mas também quando o resultado de uma interpretação literal leva
a resultados não razoáveis, não equitativos, ou até mesmo absurdos” (Van Hoecke, 2020, p.
14). O aprimoramento do processo, segundo o autor, acontece no
“confronto desse resultado com o significado dado ao texto. Isso então levará à
feitura de nova hipótese sobre o significado do texto, que será checado com uma
interpretação mais consciente e metodológica, pelo pesquisador”
(VAN HOECKE, 2011, p. 14).
Portanto, vê-se que a unanimidade está sujeita ao tempo, ao desenvolvimento das
hipóteses, ao seu movimento. Van Hoecke traduz o conceito de teoria científica em De Groot
para a doutrina jurídica da seguinte maneira:
“‘Uma teoria no direito é um sistema coerente, sem asserções, visões e conceitos
contraditórios referentes à um ordenamento ou parte dele que, ordenados de
determinada maneira, se torna possível deduzir hipóteses testáveis sobre a existência
(validade) e interpretação de conceitos, regras e princípios jurídicos’”
(DE GROOT apud VAN HOECKE, 2011, p. 15).
Cada período histórico possui os paradigmas históricos que constituem a base na
qual a teorização se erige, na qual é testada e discutida entre os juristas. A força da teoria,
segundo o autor, é a capacidade de cobrir o máximo de campo com a maior simplicidade
possível no uso de conceitos, regras e princípios, além da alta capacidade de gerar hipóteses
testáveis. Um exemplo de construção teórica e aplicação das ideias anteriores, para o autor, é
o seguinte:
“A própria divisão genérica entre ‘móveis’ e ‘imóveis’ usa como critério decisivo a
mobilidade e, portanto, negociabilidade dos objetos. Ao introduzir a distinção entre
matérias ‘corpóreas’ e ‘incorpóreas’, os ‘bens’ como objetos tangíveis são alargados
com ‘direitos’ e outras abstrações que só poderiam ser classificadas como ‘bens’
dentro de um ordenamento jurídico desenvolvido [...] Em outras palavras, por detrás
de tais conceitos e divisões está uma visão de mundo subjacente, escolhas de
valores, interesses e princípios que explicam as teorias que esses conceitos e
divisões abrangem. A realidade é descrita, entendida e ordenada, e na verdade

30
parcialmente criada através de tais conceitos e emaranhados de conceitos que se
traduzem subjacentes à visão de mundo. Conceitos, de fato, não são ferramentas
neutras, são guiados pela teoria e a sua formação está interligada com a teorização.
Como Hempel notou, eles são, na realidade, dois lados da mesma atividade”
(VAN HOECKE, 2011, p. 16).
Para o autor, a criação de teoria combina interpretações de várias fontes do direito
em um novo Todo sistematizado e, na doutrina, a sistematização significa, justamente,
teorizar. Tal movimento, portanto, seria “uma atividade contínua do estudioso do direito
devido à inflação da legislação e jurisprudência” (VAN HOECKE, 2011, p. 17).
Por fim, o autor conclui que a doutrina é um campo do conhecimento científico com
uma metodologia que lembra outros campos e, embora não haja consenso entre os juristas
sobre sua natureza, pode-se considerá-la preponderantemente hermenêutica, empírica,
argumentativa, lógica e normativa. Isto se dá pelo fato de que
“descrever o direito está próximo de sua interpretação e, ao descrevê-lo, o jurista
elabora hipóteses sobre sua existência, validade e significado. O nível conceitual e
sistemático é o nível de teorização na doutrina” (VAN HOECKE, 2011, p. 17).
A escolha de relacionar o voto dissidente do juiz Weeramantry na OC sobre a
Legalidade da Ameaça ou Uso de Armas Nucleares se dá porque há um argumento central
que este trabalho utiliza como referência. O ordenamento jurídico não pode considerar legal
aquilo que atenta contra a suas próprias bases ou que pode extinguir a sociedade a que serve.
A maneira com que Weeramantry argumenta no seu voto dissidente, portanto, pode ser
replicada para o Direito Ambiental se for considerado que, nas últimas consequências, a
mudança ambiental do planeta Terra, impulsionada pela mudança climática, pode levar à
extinção da espécie e/ou pode atentar contra as bases do DI e do DIA. Essa é uma das duas
razões de utilizar Weeramantry como referência para realizar o levantamento do objeto de
pesquisa.
A outra é de razão puramente metodológica, uma vez que o trabalho interpreta que o
voto dissidente do juiz tem em si mesmo uma característica metodológica que se buscará
esclarecer melhor quando o voto dissidente for trabalhado durante a revisão bibliográfica.
Resumidamente, o voto dissidente busca no DI e DIH as proibições da ameaça ou
uso de armas nucleares, estabelecendo a lex lata, isto é, direito existente naquele ano de 1996.
Esse trabalho busca no DIH existente atualmente o seu conteúdo ambiental, estabelecendo
uma referência daquilo que existe hoje sobre proteção ambiental durante conflitos armados.

31
O voto dissidente busca as certezas científicas sobre as consequências do uso de
armas nucleares. Este trabalho utiliza o último relatório do IPCC como a certeza científica
sobre a manutenção das tendências negativas da mudança climática que ocorre atualmente.
O juiz faz uma leitura a contrapelo da história para encontrar na gênese do DIH e nos
documentos mais antigos de outras culturas jurídicas a proteção contra, por exemplo, armas
destrutivas e sofrimento desnecessário. Este trabalho escolheu o começo do CSNU e seus
anuários como o “lugar” onde, hipoteticamente, estaria o “começo” da proteção ambiental do
DIH, procurando, no objeto de pesquisa, o que são chamadas de “considerações sobre
proteção ambiental.
Há, neste voto dissidente, uma discussão implícita sobre se tratar ou não de jus
cogens a proteção defendida pelo juiz. Esta monografia tenta, com a escolha metodológica,
permitir o começo do desenvolvimento de uma outra hipótese, a de que o Direito
Internacional Ambiental, ou melhor, o conteúdo de proteção ambiental do DI, trata-se de jus
cogens, havendo a necessidade de elaborar um conceito sobre direito cogente para o DIA.
Também se poderia reescrever essa hipótese que, frisa-se, não se pretende confirmar ou negar
apenas com este trabalho, como “estabelecer que as últimas consequências da mudança
climática” se trata de uma ilegalidade perante o DI.
Embora o problema do projeto de pesquisa elaborado para esta monografia tenha
sido “O meio ambiente possui uma proteção proibitiva de sua ameaça ou destruição tal qual
as armas nucleares, conforme argumentado por Weeramantry, nos dois momentos históricos
escolhidos?”,no qual os dois momentos históricos seriam a década de noventa e o começo do
CSNU, a dimensão do trabalho necessário fez com que tal problema estivesse contido no
apontamento final do trabalho sobre o jus cogens a que se refere o parágrafo anterior.
No lugar deste problema, uma vez que parecia ser o trabalho necessário para entrar
na questão acima, o problema da monografia passou a ser a existência, ou não, de proteção
ambiental no começo da existência do CSNU e adotou-se como hipótese a resposta afirmativa
de que, sim, existiam considerações sobre proteção ambiental no CSNU entre os anos de 1946
e 1953 e, diga-se de passagem, a proteção ambiental das Convenções de Haia de 1907 e o PG-
1925, os quais contêm normas que produzem o efeito de proteger o meio ambiente, já
estavam vigentes durante o período trabalhado, vinculando ao CSNU.

3 Referencial Teórico para o conceito de Segurança Ambiental

32
O objetivo deste capítulo é estabelecer o estado da arte do que há de proteção
ambiental no DIH. De acordo com o método inspirado em Weeramantry, aqui está a sessão do
trabalho sobre a lex lata, isto é, o direito que existe, preocupando-se em informar o conteúdo
dessa proteção, de forma a também informar o que faria parte do conceito de segurança
ambiental. Ficará claro, portanto, que a segurança nacional não deve ser o principal elemento
da segurança ambiental, e os melhores resultados comentados no capítulo 1 e 2 podem surgir
de iniciativas como esse trabalho e, por óbvio, da bibliografia utilizada que já adota essa
perspectiva de deslocar a interpretação do DIH menos para necessidades estatais, como a
segurança nacional, e mais para o Meio Ambiente. Não poderia ser de outra forma, uma vez
que a bibliografia utilizada se preocupa no conteúdo ambiental do DIH.

3.1 O Direito Ambiental e os Conflitos Armados nos tempos de hoje

A professora Daniëlla Dam-de Jong afirma que a gravidade do conflito pode fazer
variar o grau de interação entre Direitos Humanos e DIA no que se refere ao manejo de
recursos naturais e que a existência de conflitos armados pode alterar a extensão das
obrigações sob esses dois direitos, embora seus núcleos continuem vigendo. As obrigações
advindas têm seu cumprimento e acordo com a capacidade dos Estados em cumpri-las e são
mediatas através de protocolos (DAM-DE JONG, 2013, p. 198).7
A autora afirma que a proteção do meio ambiente em tempos de conflito é ponderada
pelos princípios do uso sustentável do meio ambiente e da prevenção de dano ambiental,
aplicáveis à exploração por um Estado ocupante ou o dono de jure de determinado território e,
“de uma forma geral, pode ser argumentado que a extensão a qual os Direitos
Humanos no Direito Internacional e o Direito Ambiental continuam efetivamente a
regulação do manejo de recursos naturais pelos governos depende da gravidade do
conflito” (DAM-DE JONG, 2013, pp. 199-200).
A autora indica os artigos 35(3) e 55 do Protocolo Adicional I das Convenções de
Genebra como as provisões do Direito Humanitário Internacional que “foram desenhadas
especificamente para proteger o meio ambiente durante os conflitos” (DAM-DE JONG, p.

7
Alguns exemplos da autora:
Convenção da Biodiversidade em relação à conservação biológica in situ (artigo 8) e
ex situ (artigo 9); As provisões na convenção da UNESCO sobre Patrimônio
Mundial (o artigo 5 em particular); A convenção sobre as Zonas Húmidas de
Importância Internacional (Convenção Ramsar), nos artigos 2 e 4, sobre a
conservação de terras úmidas (DAM-DE JONG, 2013, p. 212)”.

33
215). Seu propósito, presente na letra seca da norma, é prevenir “dano extenso, severo e
duradouro” ao meio ambiente, como resultado das hostilidades.
Tais danos, conforme o principal argumento de Weeramantry, que a presente
monografia aponta sobre não atentar contra as bases do próprio direito ou existência da
comunidade a que serve, poderiam estar relacionados em virtude do escopo alargado de
incidência desses dois artigos.
Sendo o único campo do DI que contém obrigações vinculantes em relação a grupos
paraestatais, e possuidor de proteção de recursos naturais e meio ambiente, o DIH também é
aplicável aos Estados interventores e/ou ocupantes de território estrangeiro
(DAM-DE JONG, 2013, p. 202). As principais normas indicadas pela autora estão a seguir.
As Convenções de Haia de 1907 são várias, dentre as quais a convenção IV de 18 de
outubro de 1907 sobre as leis e costumes da guerra.
A seguir, o seu artigo 23 (g):
Art. 23. "Além das proibições previstas em Convenções especiais é especialmente
proibido: (g) Destruir ou apreender a propriedade do inimigo, a menos que tal
destruição ou apreensão, seja imperativamente exigida pelas necessidades da guerra"
(Convenções de Haia, 1907).
E, também, o seu artigo 28:
Art. 28. A pilhagem de uma cidade ou lugar, mesmo quando tomada por assalto é
proibida. (Convenções de Haia, 1907).
A Conferência diplomática para a elaboração de Convenções internacionais
destinadas a proteger as vítimas da guerra produziu quatro convenções. São elas: I)
Convenção para a melhoria da sorte dos feridos e enfermos dos exércitos em campanha; II)
Convenção para a melhoria da sorte dos feridos, enfermos e náufragos das forças armadas no
mar; III) Convenção relativa ao tratamento dos prisioneiros de guerra; IV) Convenção relativa
a proteção dos civis em tempo de guerra. Essas convenções ficaram conhecidas como as
Convenções de Genebra de 1949. A seguir, o artigo 33 Da Convenção De Genebra IV de
1949:
Artigo 33
Nenhuma pessoa protegida pode ser castigada por uma infração que não tenha
cometido pessoalmente. As penas coletivas, assim como todas as medidas de
intimação ou de terrorismo, são proibidas.A pilhagem é proibida.As medidas de
represália contra as pessoas protegidas e seus bens são proibidas
(Convenção de Genebra IV, 1949).
Artigo 4 (2) (g) do PA II:
ARTIGO 4 Garantias Fundamentais

34
2. Sem prejuízo do caráter geral das disposições precedentes são e permanecerão
proibidos em qualquer tempo ou lugar, a respeito das pessoas a que se refere o
parágrafo 1:
g) a pilhagem;”(PA II à Convenção de Genebra, 1977).
Artigo 55 das Regulações de Haia de 1907, sobre o usufruto por parte do ocupante:
O Estado ocupante será considerado apenas como administrador e usufrutuário de
prédios públicos, imóveis, florestas e propriedades agrícolas pertencentes ao Estado
inimigo e situados no país ocupado. Deve salvaguardar o capital dessas propriedades
e administrá-las de acordo com as regras do usufruto (Convenções de Haia, 1907).
Artigo 54 do PA I:
ARTIGO 54
Proteção dos bens indispensáveis a sobrevivência da população civil
1. É proibido, como método de combate, fazer padecer de fome as pessoas civis.
2. É proibido atacar, destruir, remover ou inutilizar os bens indispensáveis a
sobrevivência da população civil, tais como os gêneros alimentícios e as zonas
agrícolas que os produzem, as colheitas, o gado, as instalações e reservas de água
potável e as obras de irrigação, com a deliberada intenção de privar desses bens, por
seu valor como meios para assegurar a subsistência a população civil ou a Parte
adversa, seja qual for o motivo, quer seja para fazer padecer de fome às pessoas
civis ou para provocar seu deslocamento, ou com qualquer outro propósito.
3. As proibições estabelecidas no parágrafo 2 não se aplicarão aos bens nele
mencionados quando uma Parte adversa:
a) utilize tais bens exclusivamente como meios de subsistência para os membros de
suas Forças Armadas; ou
b) os utilize em apoio direto a uma ação militar, com a condição, contudo, de que
em nenhum caso se tomem contra tais bens medidas cujo resultado previsível seja
deixar desprovidas de víveres ou de água a população civil, de tal forma que esta se
veja reduzida a padecer de fome ou obrigada a deslocar-se.
4. Estes bens não serão objeto de represálias.
5. Reconhecendo-se as exigências vitais de qualquer Parte em conflito na defesa de
seu território nacional contra invasão, uma Parte em conflito poderá deixar de
observar as proibições contidas no parágrafo 2 dentro desse território que se
encontre sob seu controle quando o exija uma necessidade militar imperiosa.
(PA I à Convenção de Genebra, 1977).
Artigo 14 do PA II, sobre a proteção de objetos indispensáveis à sobrevivência da
população:
“ARTIGO 14 Proteção dos Bens Indispensáveis à Sobrevivência da População Civil
É proibido utilizar contra os civis a fome como método de combate. É, portanto,
proibido atacar, destruir, subtrair ou inutilizar com esse fim os bens indispensáveis a
sobrevivência da população civil, tais como gêneros alimentícios e as zonas
agrícolas que os produzem, as colheitas, o gado, as instalações e reservas de água
potável e as obras de irrigação.”(PA II à Convenção de Genebra, 1977).
Artigo 35(3) e 55 do PA I, sobre a proteção do meio ambiente:
“ARTIGO 55 Proteção do meio ambiente natural
1. Na realização da guerra se cuidará da proteção do meio ambiente natural contra
danos extensos, de longa duração e graves. Essa proteção inclui a proibição de

35
empregar métodos ou meios de combate que tenham sido concebidos para causar, ou
dos quais se pode prever que causem tais danos ao meio ambiente natural,
comprometendo assim a saúde ou a sobrevivência da população.
2. São proibidos os ataques ao meio ambiente natural como represália.
ARTIGO 35 Normas Fundamentais
3. É proibido o emprego de métodos ou meios de combate que tenham sido
concebidos para causar, ou dos quais se pode prever que causem, danos extensos,
duradouros e graves ao meio ambiente natural.”(PA I à Convenção de Genebra,
1977).
Embora este trabalho não tenha como foco os conflitos armados em si, conceituá-los
é necessário já que nessas situações incide a proteção ambiental. Define-se o conceito de
conflito internacional armado segundo o art. 2 da Convenção de Genebra de 19498, onde, em
resumo, significa o conflito armado entre duas partes contratantes, ainda que o estado de
guerra não seja reconhecido, bem como durante ocupação de território estrangeiro ainda que
sem resistência.O conceito de conflito não-internacional, presente no art. 3 da Convenção
anterior, é qualquer conflito armado não-internacional “que surja no território de uma das
Altas Partes Contratantes” (Convenção de Genebra IV, 1949).
De todo modo, para classificar um fenômeno como “conflito armado”, a professora
utiliza o termo “violência armada prolongada” (DAM-DE JONG, 2013, p. 207), ou seja, deve
se prolongar no tempo o conflito, ou mesmo possuir organizações participantes onde haja
estrutura de comando e operação com algum nível de organização.
Desde os anos noventa, muitas convenções, como a sobre Armas Químicas, de 1993,
e a Convenção Anti-Minas pessoais, de 1997, foram alteradas de forma a abordar conflitos
não internacionais, explica a autora. Dentre outros exemplos dados, um é particularmente
importante, o Protocolo III sobre armas incendiárias, pois “inclui uma proibição expressa
contra fazer ‘florestas ou outros tipos de vegetação o objeto de ataque de armas incendiárias’”
(DAM-DE JONG, 2013, p. 214).

8
A seguir, o art. 2º:
Artigo 2º
Afora as disposições que devem vigorar em tempo de paz, a presente Convenção se
aplicará em caso de guerra declarada ou de qualquer outro conflito armado que surja
entre duas ou várias das Altas Partes Contratantes, mesmo que o estado de guerra
não seja reconhecido por uma delas.
A Convenção se aplicará igualmente, em todos os casos de ocupação da totalidade
ou de parte do território de uma Alta Parte Contratante, mesmo que essa ocupação
não encontre resistência militar. [...] (Convenção de Genebra IV, 1949).

36
Nos últimos anos, a professora afirma, há um aumento no reconhecimento de regras
enquanto direito consuetudinário e a transposição de regras de conflitos internacionais para
não-internacionais. Para ela, isso significa um alargamento da proteção ambiental, passando a
obrigar aos atores não-estatais.
A proibição contra pilhagem seria a mais presente nos tratados internacionais e teria
como objetivo principal impedir o enriquecimento individual. Essas proibições valeriam
também para os conflitos internos. Além dos artigos já citados, o art. 47 das Convenções de
Haia afirma que a “a pilhagem é formalmente proibida”.
Quanto a proteção à propriedade privada, o termo “propriedade” abarca todos os
tipos de recursos naturais, públicos ou privados, extraídos ou que ainda estão na natureza,
bem como direitos de exploração, concessões, etc., e, explica a autora, indicando a palavra
“floresta” do art. 55 citado anteriormente, que é o texto legal que sustenta essa posição
(DAM-DE JONG, 2013, p. 216). Vale lembrar que a expressão agricultural estates também
poderia ser inserida neste argumento.
Durante a ocupação e o conflito, os artigos 53 e 55 da Convenção de Haia permitem
a disposição de propriedade pública e particular móvel ou imóvel. Os imóveis públicos podem
ser usufruídos e, segundo a professora, isto é importante para o direito de ocupante explorar
os recursos naturais do território (DAM-DE JONG, 2013, p. 226).
No entanto, a mitigação desse direito é a “salvaguarda do capital dessas
propriedades” (Convenções de Haia, 1907), ou seja, não se pode
‘exercer seu direito de forma negligente e perdulária e decrescer o valor do estoque e
da planta. Portanto, por exemplo, não se pode cortar uma floresta, a não ser que as
necessidades da guerra a isso compilam’ (L., Oppenheim, 2013, pp. 226-227).
A autora explica que as interpretações da regra consistem em uma proibição do uso
de recursos não-renováveis e outra numa proibição do uso em excesso. A sua própria
perspectiva é a de que
o Direito Internacional Contemporâneo permite ao ocupante explorar os recursos
naturais [...] incluídos os não-renováveis [...] desde que não prejudique as
possibilidades de gerações futuras (DAM-DE JONG, 2013, p. 228).
A proteção dos objetos civis durante os conflitos se dá para resguardá-los quando
indispensáveis à sobrevivência da população, conforme artigos 54 (2) do PA I e 14 do PA II.
Para a professora, são objetos dessa proibição a “água potável, víveres, [...] florestas, lenha,
madeira, plantas medicinais” (DAM-DE JONG, 2013, p.235) e até os recursos naturais que

37
pudessem fazer parte de uma exploração econômica que provesse a renda de subsistência de
uma determinada população (DAM-DE JONG, 2013, p. 236).
Os artigos 35(3) e 55 do Protocolo Adicional I, respectivamente, adereçam à
proibição de danos extensos, duradouros e graves9, como um dever de cuidado para evitar
esse resultado e uma proibição de utilizar métodos de guerra que deles se pretende ou espera
alcançar tais danos. O artigo 55 cita o prejuízo à saúde ou sobrevivência da população como
limite legal dos métodos de guerra. O item 3.2 trabalhará mais esses artigos.
A autora também cita Weeramantry e a interpretação que os artigos acima são
“restrições poderosas aos Estados” (Weeramantry apud DAM-DE JONG, 2013, p. 238). A
professora afirma que o escopo de incidência do art. 55 é maior que o 35(3), pois não se limita
aos métodos de guerra, e “inclui uma obrigação positiva de proteger o meio ambiente”
(DAM-DE JONG, 2013, p. 240).
Este trabalho acredita que a mudança climática, levada às suas últimas
consequências, se encaixaria no escopo dos artigos 35(3) e 55 do PA I e corroboraria a
hipótese lançada ao final deste trabalho. Para tanto, haveria de ser pensada sob um panorama
socioeconômico, físico, biológico, ambiental, sendo que o que novo relatório do IPCC mostra
nada mais é do que a confirmação da tendência histórica de danos, cujos resultados de danos
extensos, duradouros e graves estão positivados nos termos das normas supracitadas.
A arma nuclear, para este trabalho, também é a melhor analogia, além de ser objeto
de disposições jurídicas, e o conflito armado é, pontualmente, uma expressão de toda uma
cadeia, que seria a indústria bélica, o comportamento dos Estados e as consequências de seus
comportamentos em relação ao meio ambiente. É esse panorama que se busca ilustrar a fim de
trabalhar o conceito de segurança ambiental sob uma forma mais enriquecida no que tange a
capacidade do conceito de exprimir proteção ambiental, além dos interesses estatais clássicos.
Assim tanto o é que Dam-de Jong afirma:
“elas não excluem que certos danos causados pela exploração de recursos naturais,
como desmatamento em larga escala e perda de biodiversidade causados em virtude
da extração de madeira ou o envenenamento de lençóis freáticos causado pela
mineração, podem ser incluídos no escopo dessa proibição. Isso se aplica
particularmente se o limiar do dano é interpretado de uma maneira dinâmica e
evolutiva. Pode-se argumentar que uma interpretação correta dessa provisão e o
limiar de dano levariam em conta as visões modernas sobre proteção ambiental,
requerendo a adoção de uma abordagem de Ecossistema [...]” (DAM-DE JONG,
2013, p. 242).

9
Ver tradução no link: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0849.htm. Acesso
em 8 jul. 2023.
38
A Cláusula Martens, que também será discutida no capítulo sobre Weeramantry, é
descrita pela professora como uma forma de incorporar normas externas, neste contexto as
ambientais, ao DIH (DAM-DE JONG, 2013, p. 243). A professora cita que, no Tribunal de
Nuremberg, a intenção direta no uso desta Cláusula foi a proteção da propriedade privada e
somente na OC que contém o voto dissidente utilizado neste trabalho é que a CIJ afirmou que
a proteção de civis também pode vir através da Cláusula.
Para a autora, aquilo que ela diz ser necessário ocorrer na interpretação dos artigos
35(3) e 55 do PA I para que os danos ambientais fossem abarcados foi o que ocorreu para a
proteção dos civis, isto é, uma interpretação dinâmico-evolucionária: “em outras palavras, a
Corte usou a Cláusula Martens para justificar uma interpretação dinâmico-evolucionária dos
dois principais princípios do Direito Internacional Humanitário”
(DAM-DE JONG, 2013, p. 244). Essa afirmação é interessante porque corrobora o intento
metodológico deste trabalho em articular o voto dissidente da OC, os anuários do CSNU e o
conceito de segurança ambiental, tal qual se propõe no Capítulo 1.
De toda forma, os princípios que a autora menciona que foram objeto desta
interpretação dinâmico-evolucionária foram os da distinção entre alvos civis e militares e o da
necessidade. Para ela, o princípio da distinção poderia ser utilizado em situações de omissões
legais para a aplicação do DIH em conjunto com Direitos Humanos. No entanto, a Cláusula
Martens como ferramenta para esse movimento argumentativo e jurídico sofre restrições em
sua concepção, uma vez que o filtro para a inserção de normas ao DIH seria que as normas
que se pretende inserir através da Cláusula tenham caráter humanitário:
“na medida em que o Direito em geral sobre recursos naturais oferece proteção aos
seres humanos onde a lei humanitária internacional não o faz, ele pode ser aplicado
por meio da cláusula Martens. No entanto, em geral, deve-se concluir que a cláusula
Martens não é o mecanismo adequado para a introdução de outras normas que não
sejam de caráter humanitário no direito internacional humanitário.”
(DAM-DE JONG, 2013, p. 248).
Para a professora, que também interpreta o escopo dos artigos 35(3) e 55 do PA I
com um limiar de dano além dos prejuízos da maioria dos casos, a proteção ambiental no DIH
ocorreria de duas formas. A primeira é sobre a ocupação territorial e exploração de recursos.
A segunda é que tais obrigações se estenderiam aos agentes não-estatais e, portanto, o DIH
seria o único campo do DI que foi capaz de estabelecer essa relação (DAM-DE JONG, 2013,
p. 250).
“Primeiro, contém um regime elaborado para a situação de ocupação na qual
explicitamente lida com a exploração de recursos naturais em territórios ocupados.
Segundo, é o único campo do Direito Internacional que contém obrigações
39
vinculantes para grupos armados para-estatais. Conforme tais regras, grupos
armados não podem explorar recursos naturais exceto em casos de imperativa
necessidade militar. Porém, na realidade é difícil imaginar situações onde a
exploração de recursos naturais poderia satisfazer o critério de imperativa
necessidade militar” (DAM-DE JONG, 2013, p. 250).

Ela também argumenta que entende como de difícil validação o critério da


“imperativa necessidade militar” como filtro para permissão da exploração de recursos
naturais, quando se trata de agentes não-estatais. Isso parece ser um resquício da concepção
de segurança mais afim dos problemas clássicos dos estados, nos quais um critério como a
necessidade já existe desde 1907, muito antes de se relacionar segurança nacional com
segurança ambiental. Com isso, trabalhar o conceito de segurança na direção mais do meio
ambiente do que do estado propriamente dito parece ser também uma necessidade de atualizar
o DIH.

Isso pode ser pensado porque a suspeita da professora é justificada. Grupos não-
estatais não tem, via de regra, ou quase nunca, as obrigações legais constituintes, obrigações
de direitos fundamentais, etc. para com seus cidadãos. Não são Estado, logo, não são
encarregados da proteção de tais direitos, portanto a exploração de recursos naturais não pode
ser relacionada à promoção de nenhum direito humano, senão à proibição da pilhagem e
àquilo que Dam-de Jong falou ser seu principal objetivo, o de impedir o enriquecimento de
indivíduos.

A presente monografia adota a posição da autora e acrescenta que tratar da


exploração de recursos naturais sob o paradigma tradicional da segurança parece inócuo para
satisfazer uma norma antiga como a proibição contra a pilhagem, promulgada nas
Convenções de Haia de 1907.

3.1.1 Conclusão

Com este tópico foi possível demonstrar obrigações legais de proteção ambiental
antecessoras ao objeto de pesquisa, como a proibição da pilhagem, além da presença da
palavra “florestas” enquanto propriedade nas Convenções de Haia de 1907.
Por fim, este tópico possibilita com mais clareza a justificativa da hipótese lançada
ao final da monografia a partir do que Dam-de Jong descreve sobre o uso da Cláusula Martens
pela CIJ. Também, a utilidade de relacionar segurança ambiental e Weeramantry começa a ser

40
fundamentada, já que se indica a possibilidade de incluir no limiar de dano dos artigos 35(3) e
55 do PA I danos ambientais em decorrência da exploração de recursos naturais de forma
muito mais direta.
Embora a professora fundamente esta possibilidade de interpretação dinâmico-
evolucionária para as consequências do uso de recursos naturais, a consequência “perda de
biodiversidade” ocorre também e, muito mais generalizada, em virtude da mudança climática.
A mudança climática, portanto, é uma adição à interpretação que este trabalho aponta ser
possível.

3.2 Jus in Bello, Jus Ad Bellum e Direito Ambiental

Os autores Pierre-Marie Dupuy e Jorge E. Viñuales elaboraram um estado da arte da


matéria, separando-a em três perspectivas, e colocando em evidência seus principais
instrumentos jurídicos e limitações. Tais perspectivas são a “cobertura ambiental das normas
de DIH”, “se e como as normas ambientais se aplicam aos conflitos armados” e, ao final, “O
ciclo de vida da regulação de armas enquanto poluentes”.
Isso será trabalhado a fim de complementar, juntamente com o tópico anterior, a
necessidade de estabelecer o direito que existe hoje (necessidade metodológica derivada do
uso do voto dissidente de Weeramantry na OC que é utilizada), elaborar o conteúdo da
proteção ambiental para o conceito de segurança (a necessidade metodológica de estabelecer
o conceito de segurança atualizado como parâmetro e também de justificar o motivo de ele ser
um alvo desta pesquisa). Os intentos da conclusão do tópico anterior estarão melhor
amparados ao final deste capítulo.
O presente trabalho adota que a concepção do relatório Our Common Future da
CMED já indicava a necessidade de revisitar a relação entre o conceito de segurança sob a
relação entre o conceito e o desenvolvimento sustentável, o que também é relacionar
segurança e o meio ambiente.Ou seja, a degradação ambiental pode ser acarretada por
conflitos ou pode fazer parte de suas causas(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p.339). A
“preempção de opções de desenvolvimento” (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p.339) também
estaria relacionada nos mesmos termos que a degradação ambiental.
O que os autores buscam entender também é muito inclinado ao que Jon Barnett
afirma ser de valor ao interpretar segurança mais a fim da natureza dos fluxos ambientais.
Aqui, a vontade dos autores era compreender o que a degradação ambiental, acesso desigual
41
aos recursos naturais “ou o movimento transfronteiriço de substâncias perigosas” poderiam
ocasionar aos conflitos armados.

3.2.1 Primeira Perspectiva.

O seu epicentro são os já citados artigos 35(3) e 55 do PA I. A convenção ENMOD,


surgida justamente por causa da guerra do Vietnã, os dois artigos do Protocolo Adicional I e
algumas normas de direito consuetudinário perfazem o conteúdo desta primeira perspectiva.

3.2.1.1 Normas Específicas do Jus in Bello

Os artigos 35(3) e 55 do PA I seriam proteções específicas, ou expressas, do meio


ambiente no DIH(DUPUY; VIÑUALES, 2015,p. 342). O artigo 35(3) estatui a proibição dos
métodos e meios de guerra dos quais se espera ou queira causar danos extensos, a longo prazo
e severos. Aqui, a partícula “e” é utilizada, conectando todos esses elementos ao mesmo
tempo como o limite do lícito ou ilícito segundo a norma (DUPUY; VIÑUALES, 2015,p.
342).
No artigo 55 e 35(3), os autores explicam que os meios ou métodos “que se espera
ou queira causar tal dano ao meio ambiente” estariam diretamente relacionados com
“comprometendo assim a saúde ou a sobrevivência da população”, estabelecendo saúde e
sobrevivência como um limiar de dano(DUPUY; VIÑUALES, 2015,p. 342).Resumidamente,
então, o artigo 35(3) é uma limitação às formas de levar a guerra a cabo, e o artigo 55 busca
proteger a população da degradação ambiental causada pelo conflito.
A Convenção ENMOD, afirma-se, não é a mesma coisa e não há, por assim dizer,
bis in idem, já que os artigos acima se referem a qualquer arma e a convenção se refere às
técnicas de mudança do meio ambiente enquanto arma (DUPUY; VIÑUALES, 2015,p. 343).
Além disso, no artigo primeiro, o conectivo “ou” é usado entre as palavras severos e outras
duas, widespreade longlasting, traduzidas como “disseminados” e “duradouros” na tradução10
de “danos disseminados, duradouros ou graves [...]” (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 343).
Aqui, há o adjetivo longlasting, diferente de long-term, no inglês, mas traduzido
como duradouro em ambos os casos pelo Brasil. Essa diferença, para os autores, faz com que

10
Ver tradução no link: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/anexo/and225-
91.pdf. Acesso em 08 jul. 2023.
42
o interregno de tempo dos artigos do PA I seja interpretado como muito mais alargado que o
do artigo 1 da ENMOD, o que renderia aos dois primeiros o fardo de quase não oferecem
proteção (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 343).
Os autores utilizam como exemplo o bombardeio da OTAN à Iugoslávia em 1999
com munições de urânio empobrecido, o que causou prejuízos à população e ao meio
ambiente. Neste caso, um comitê para o caso considerou se os artigos incidiriam ou não.
Afirma-se, naquele relatório, que a noção de dano de longo prazo deveria ser medida em
meses ao invés de anos para que se pudesse utilizar os artigos. Portanto, o dano ambiental que
existira não se enquadraria na amplitude das duas normativas. A destruição causada ao Iraque
durante a guerra do Golfo em 1990-91 também é usada como um caso de prejuízo ambiental
inaceitável e evidência da inadequação da amplitude dos artigos já mencionados do Protocolo
Adicional I para proteger o meio ambiente.
Por fim, neste tópico, cabe trazer um estudo da ICRC,em que os autores trabalham
sobre a proteção ambiental pelo direito consuetudinário, no qual ela é afirmada sob três
formas. A primeira, são os princípios gerais aplicáveis à proteção do meio ambiente (aqui está
a distinção entre alvos militares e não-militares, a necessidade militar e a proporcionalidade).
Nenhuma parte do meio ambiente pode ser atacada, a não ser que seja um objetivo militar; A
destruição de qualquer parte do ambiente natural é proibida, a não ser à luz de imperativa
necessidade militar; lançar um ataque contra um objetivo militar do qual se pode esperar
causar um dano excessivo ao meio ambiente em relação à vantagem milita, é proibido.
A segunda forma. A proteção do meio ambiente é um limite aos meios e métodos de
guerra. A Regra 4411 afirma que deve haver um respeito ao meio ambiente no emprego dos
meios e técnicas militares e deve haver precaução a fim de evitar ou minimizar o dano
ambiental, na confecção e planejamento das operações.
Para os autores, a palavra “precaução” presente na regra está relacionada aos
princípios da prevenção e da precaução. A interpretação sobre a incerteza científica vai desde
a incerteza dos tempos de paz sobre os efeitos da guerra até se os efeitos são certamente

11
Regra 44. Métodos e meios de guerra devem ser empregados com o devido respeito à proteção e
preservação do meio ambiente. Na condução de operações militares, todas as precauções factíveis devem ser
feitas para evitar, e em qualquer evento minimizar, danos ao meio ambiente. A falta de certeza científica sobre
os efeitos no meio ambiente de certas operações militares não isenta uma das partes do conflito de tomarem tais
precauções (ICRC apud DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 345).

43
danosos ao meio ambiente. A precaução seria, então, utilizada para aquelas armas em que
realmente se desconhecem os efeitos no meio ambiente, afirmam os autores.
A terceira forma trata-se dos artigos 35(3) e 55(1) do Protocolo Adicional I e o
artigo 1(1) da convenção ENMOD que, segundo a ICRC, transformaram-se em uma regra
consuetudinária que, segundo Dupuy e Viñuales, tornou-se absoluta e, caso houvesse a
incidência de sua eficácia, nem a proporcionalidade ou a necessidade militar poderiam
mitigá-la12.

3.2.1.2 Normas Gerais do Jus in Bello

As normas gerais do DIH seriam os princípios da distinção (arts. 48 e 52 PA I)13,


necessidade militar (art. 23 (g) das Regulações de Haia em 1907) e proporcionalidade
(51(5)(b) e 57(2)(a)(iii) do PA I)14. Em resumo, a relevância destes princípios está no fato de

12
Regra 45. O uso de métodos ou meios de guerra que são destinados, ou que deles se possa esperar
dar causa a danos generalizados, de longo-prazo e graves ao meio ambiente, são proibidos. A destruição do meio
ambiente não pode ser usada como arma (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 346).
13
ARTIGO 48 - Norma Fundamental
A fim de garantir respeito e proteção a população civil e aos bens de caráter civil, as
Partes em conflito deverão sempre fazer distinção entre a população civil e os
combatentes, entre os bens de caráter civil e os objetivos militares e, em
conseqüência, dirigirão suas operações unicamente contra os objetivos militares.
[...]
ARTIGO 52 - Proteção geral dos bens de caráter civil
1. Os bens de caráter civil não serão objeto de ataques nem de represália. São bens
de caráter civil todos os bens que não são objetivos militares como definido no
parágrafo 2.
2. Os ataques limitar-se-ão estritamente aos objetivos militares. No que concerne aos
bens, os objetivos militares se limitam aqueles objetos que por sua natureza,
localização, finalidade ou utilização contribuam eficazmente para a ação militar ou
cuja destruição total ou parcial, captura ou neutralização, ofereça nas circunstâncias
do caso presente uma vantagem militar definida (PA I à Convenção de
Genebra, 1977).

14
ARTIGO 51- Proteção da população civil
5. Considerar-se-ão indiscriminados, entre outros, os seguintes tipos de ataque:
b) os ataques quando se pode prever que causarão incidentalmente mortos e
ferimentos entre a população civil, ou danos a bens de caráter civil, ou ambas as
coisas, e que seriam excessivos em relação a vantagem militar concreta e
diretamente prevista.
ARTIGO 57 - Precauções no ataque
2. Com respeito aos ataques, as seguintes precauções deverão ser tomadas:
44
que consideram a propriedade civil como meio ambiente e a importância deste último para a
sobrevivência dos civis (DUPUY; VIÑUALES, 2015, pp.347-348).
Os autores afirmam que o uso de princípios gerais pode dar abertura para erros,
como no exemplo do chamado “Caso Hostage” (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 348): Um
erro de cálculo do militar (em acreditar que estava sendo perseguido por forças inimigas) foi
admitido para mitigar (destruição de todos os abrigos e meios de subsistência da Noruega) as
proteções ambientais dos tratados sem haver real e, posteriormente, comprovada necessidade
(as forças soviéticas não estavam em perseguição do general alemão, como este pensara ao
tomar a decisão acima). Hoje, no entanto, o direito progrediu até o ponto de não permitir os
danos ocasionados no caso Hostage, mesmo com a necessidade militar:
No caso supracitado da OTAN, o Comitê mencionou, de fato, com referência ao
artigo 52 do Protocolo Adicional I, que: Mesmo quando o alvo for objetivos
militares legítimos, há uma necessidade de evitar danos excessivos e a longo-prazo
ao meio ambiente natural e à infraestrutura econômica, com um consequente efeito
adverso na população civil (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 348).
Os autores comentam como a CIJ abordou a necessidade e a proporcionalidade,
afirmando que os estados devem considerar o respeito ao meio ambiente como critério de
conformidade para com a necessidade e proporcionalidade de uma operação/objetivo militar
(CIJ apud DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 349).Um exemplo desse comando é o caso onde
Uganda teve de ressarcir a República Democrática do Congo:
A Corte concluiu que Uganda, como o poder ocupante do distrito de Ituri, na
República Democrática do Congo, violou sua obrigação de vigilância ‘por não
tomar medidas adequadas para garantir que suas forças militares não engajassem no
saqueio, pilhagem e exploração dos recursos naturais da RDC
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 349).
Dupuy e Viñuales comentam que a Corte utilizou como fundamentação os artigos
15
43 e 47 das Convenções de Haia de 1907, o artigo 33 da IV Convenção de Genebra e um
tratado sobre tempos de paz, o artigo 21 da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos
Povos16, o que se coaduna com o entendimento da CIJ sobre a aplicabilidade de tratados de
Direitos Humanos em tempos de conflito (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 349).

a) aqueles que planejem ou decidam um ataque deverão:


iii) abster-se de decidir de efetuar um ataque quando seja previsível que causará incidentalmente
mortos ou feridos na população civil, danos a bens de caráter civil, ou ambas as coisas, que seriam excessivos
em relação com a vantagem militar concreta e diretamente prevista; (PA I à Convenção de Genebra, 1977).
15
Artigo 43. Tendo a autoridade do Poder passado de facto ao poder ocupante, o último deve tomar
medidas ao seu alcance para restaurar, assegurar o quanto possível a ordem pública e a segurança, enquanto
respeita, salvo impedimento absoluto, as leis vigentes no país (Convenções de Haia, 1907).
16
Artigo 21º 1. Os povos têm a livre disposição das suas riquezas e dos seus recursos naturais. Este
direito exerce-se no interesse exclusivo das populações. Em nenhum caso o povo pode ser privado deste direito.
45
As normas gerais, portanto, tratam da distinção entre alvos civis e militares, da
proteção dos objetos civis e do meio ambiente, e de um dever geral de conduta por parte dos
estados em levar em conta os efeitos ambientais de suas operações de guerra.

3.2.2 Segunda Perspectiva - Se e como normas ambientais aplicam durante o conflito


armado

Sobre a CIJ, os autores afirmam que ela reformulou a questão inicial sobre uso ou
ameaça de uso de armas nucleares. Em vez de responder se os tratados ambientais eram
aplicáveis às situações de conflito armado, passou-se a questionar se as obrigações derivadas
destes tratados eram totalmente restritivas durante o conflito. Tal não seria a conclusão da
Corte, afirmam Dupuy e Viñuales, mas que os Estados deveriam interpretar o direito de
legítima defesa e as obrigações do jus in bello à luz de considerações sobre direito ambiental
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 349).
Para avaliar como tratados ambientais são aplicados em tempos de guerra, os autores
defendem que é necessário avaliar três aspectos. O primeiro é como é afetada continuação da
vigência da operação dos tratados sob três formas (suspensão, retirada ou rescisão); segundo,
se alguma resposta específica de um tratado é ativada (derrogações, flexibilizações, proteção
especial); e terceiro, se há o nascimento de interações complexas entre a proteção ambiental e
outras normas, especialmente do jus in bello. Se há, por exemplo, uso subsidiário dessas
normas.
Essa forma de divisão do tema é justificada pelos autores pois em caso de suspensão
ou fim de tratados internacionais em virtude da guerra, as respostas específicas e muito menos
as interações complexas não existiriam. Em razão desta abordagem, eles acabam por
reformular a pergunta da CIJ “como as normas são aplicadas” e não mais “se” elas são
aplicadas.

2. Em caso de espoliação, o povo espoliado tem direito à legítima recuperação dos seus bens, assim como a uma
indemnização adequada. 3. A livre disposição das riquezas e dos recursos naturais exerce-se sem prejuízo da
obrigação de promover uma cooperação económica internacional baseada no respeito mútuo, na troca equitativa
e nos princípios do direito internacional. 4. Os Estados Partes a presente Carta comprometem-se, tanto individual
como colectivamente, a exercer o direito de livre disposição das suas riquezas e dos seus recursos naturais com
vistas a reforçar a unidade e a solidariedade africanas. 5. Os Estados Partes a presente Carta comprometem-se a
eliminar todas as formas de exploração económica e estrangeira, nomeadamente a que é praticada por
monopólios internacionais, a fim de permitir que a população de cada país se beneficie plenamente das
vantagens provenientes dos seus recursos nacionais (Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, OUA).
46
3.2.2.1 Primeiro aspecto

O art. 73 da CVDT17 é utilizado como ponto de partida no exame da continuidade ou


não dos tratados e, para os autores, a questão permanece em aberto. Dupuy e Viñuales
informam que a CDI da ONU chegou a trabalhar esse tema específico em 2004 e 2011,
formulando os “Artigos Preliminares sobre os Efeitos do Conflito Armado nos Tratados”.
Esse é um trabalho sobre a continuação da operação dos tratados, tema do primeiro aspecto
sobre como as normas de direito ambiental são aplicadas durante o conflito armado.
O sistema dos artigos preliminares possui as quatro seguintes fases. Primeiro18, o
conflito, per si, não dá fim ou suspensão ao tratado, em relação aos beligerantes e a terceiros;
segundo19, se há previsão específica para o contexto de conflito armado, obviamente, são
essas as normas que vigem; e terceiro20, se não há regras como na fase anterior, as regras

17
Artigo 73 - Caso de Sucessão de Estados, de Responsabilidade de um Estado e de Início de
Hostilidades
As disposições da presente Convenção não prejulgarão qualquer questão que possa surgir em relação
a um tratado, em virtude da sucessão de Estados, da responsabilidade internacional de um Estado ou do início de
hostilidades entre Estados (CVDT, 1969).
18
Artigo 3 Princípio geral A existência de um conflito armado não encerra ou suspende ipso facto a
vigência de tratados: (a) entre os Estados partes no conflito; (b) entre um Estado parte no conflito e um Estado
que não o é (CDI, 2011).
19
Artigo 4.º Disposições sobre a aplicação dos tratados Sempre que um tratado contenha disposições
sobre a sua aplicação em situações de conflito armado, essas disposições serão aplicáveis (CDI, 2011).
20
Artigo 5.º Aplicação das regras de interpretação dos tratados
As regras do direito internacional sobre interpretação de tratados devem ser aplicadas para estabelecer
se um tratado é suscetível de rescisão, retirada ou suspensão no caso de um conflito armado.
Artigo 6 Fatores que indicam se um tratado é suscetível de rescisão, retirada ou suspensão A fim de
determinar se um tratado é suscetível de rescisão, retirada ou suspensão no caso de um conflito armado, devem
ser considerados todos os fatores relevantes, incluindo:
(a) a natureza do tratado, em particular seu objeto, seu objeto e finalidade, seu conteúdo e o número de
partes no tratado; e (b) as características do conflito armado, como sua extensão territorial, sua escala e
intensidade, sua duração e, no caso de conflito armado não internacional, também o grau de envolvimento
externo.
Artigo 7.º Vigência continuada de tratados resultantes do seu objeto. Uma lista indicativa de tratados
cujo objeto implique que continuem em vigor, no todo ou em parte, durante um conflito armado, encontra-se no
anexo ao o presente projeto de artigos.
[...]
Anexo - Lista indicativa dos tratados referidos no artigo 7
(a) Tratados sobre o direito dos conflitos armados, incluindo tratados sobre o direito internacional
humanitário;
(b) Tratados que declarem, criem ou regulem um regime ou estatuto permanente ou direitos
permanentes conexos, incluindo tratados que estabeleçam ou modifiquem fronteiras terrestres e marítimas;
(c) Tratados legislativos multilaterais;
(d) Tratados sobre justiça penal internacional;
(e) Tratados de amizade, comércio e navegação e acordos relativos a direitos privados;
(f) Tratados para a proteção internacional dos direitos humanos;
(g) Tratados relativos à proteção internacional do meio ambiente;
(h) Tratados relativos a cursos de água internacionais e instalações e instalações conexas;
47
internacionais sobre interpretação de tratados serão aplicadas para determinar se, como
resultado do conflito armado, aquele será suspenso, posto fim ou denunciado. Aqui, deve-se
considerar algumas provisões que se presume continuarem vigendo, como as sobre corpos
d’água (mares, lagos, reservatórios etc.) e direito ambiental, bem como considerar as
características específicas da raison d’etre daquele determinado
conflito(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 351).
Já a quarta fase, a qual examinaria as possibilidades de denunciação, rescisão ou
suspensão dos tratados, compraz-se do restante dos artigos. Deles se extrai, por exemplo, a
possibilidade de conclusão de um tratado durante o conflito, mas de acordo com o Direito
Internacional (artigo 8) e à obrigação de se manter fiel à obrigação internacional que, presente
no tratado, dele independa para existir (artigo 10)(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 351).
Os autores concluem sobre a quarta fase que a retirada ou suspensão de um tratado
não necessariamente beneficia o agressor e é defesa se o estado concorda expressamente ou
por aquiescência com a continuação do tratado (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 351).
Também apontam que a formalização da intenção é necessária, com a possível existência de
impedimentos os quais levariam os estados à melhor opção disponível, ou seja, resolver
pacificamente suas questões. No que concerne o meio ambiente, afirmam que, a não ser que
determinado tratado determine o contrário, os tratados de direito ambiental seguem vigendo
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 352).
Os autores, em outras palavras, se questionam se esses artigos possuem ou não a
qualidade de direito consuetudinário. A jurisprudência da CIJ estaria de acordo com a não
suspensão automática de tratados em razão do conflito, mas uma comissão da ONU, a Eritrea
Ethiopia Claims Commission, entendeu que se não há intenção expressa de manter a
operação, o tratado está suspenso. Isso, para eles, prescindiu da jurisprudência da CIJ, o que
seria um problema já que a maioria dos tratados de DIA não mencionam expressamente que
continuariam após a deflagração das hostilidades (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 352).

(i) Tratados relativos a aquíferos e instalações e instalações conexas;


(j) Tratados que sejam instrumentos constitutivos de organizações internacionais;
(k) Tratados relativos à solução internacional de controvérsias por meios pacíficos, incluindo o
recurso à conciliação, mediação, arbitragem e solução judicial;
(l) Tratados relativos a relações diplomáticas e consulares. (CDI, 2011).

48
3.2.2.2 Segundo aspecto - Respostas específicas advindas de Tratados

Os autores trazem dois tratados, os quais afirmam se tratar o primeiro sobre


prevenção e o segundo sobre compensação do dano ambiental. Respectivamente, A WHC21 e
a RAMSAR.
Para a WHC, o patrimônio natural significa, dentre os outros dois significados,
monumentos naturais constituídos individual ou conjuntamente por formações físicas e
biológicas com valor universal do ponto de vista da estética ou da ciência 22.
Aqui, o patrimônio natural é protegido de ações danosas e deliberadas, por parte dos
Estados. Os critérios para figurar na lista, por exemplo, são o patrimônio estar em situação de
“degradação acelerada” e ameaçado de desaparecimento.
Vale adicionar que se poderia argumentar, por exemplo, que a ideia de que o que não
está proibido é permitido, no DIA, assim como se evidenciará no capítulo sobre Weeramantry
e este argumento que possui, o patrimônio natural não poderia ser degradado de forma a
adicionar candidatos a figurar na lista de patrimônios protegidos pela humanidade.
Esta ideia possui uma fraqueza, que seria a necessidade de determinado ente possuir
valor estético e científico considerável, mas, de qualquer modo, poder-se-ia responder que em

21
ARTIGO 6.º
3 – Cada um dos Estados parte na presente Convenção compromete-se a não tomar deliberadamente
qualquer medida susceptível de danificar directa ou indirectamente o património cultural e natural referido nos
artigos 1.º e 2.º situado no território de outros Estados parte na presente Convenção.
[...]
ARTIGO 11.º
4 – O Comité deverá estabelecer, actualizar e difundir, sempre que as circunstâncias o exijam, sob o
nome de «lista do património mundial em perigo», uma lista dos bens que figurem na lista do património
mundial para a salvaguarda dos quais sejam necessários grandes trabalhos e para os quais tenha sido pedida
assistência, nos termos da presente Convenção. Tal lista deverá conter uma estimativa do custo das operações.
Apenas poderão figurar nesta lista os bens do patrimônio cultural e natural ameaçados de desaparecimento
devido a uma degradação acelerada, projectos de grandes trabalhos públicos ou privados, rápido
desenvolvimentos urbano e turístico, destruição devida a mudança de utilização ou de propriedade da terra,
alterações profundas devidas a uma causa desconhecida, abandono por um qualquer motivo, conflito armado
surgido ou ameaçando surgir, calamidades e cataclismos, grandes incêndios, sismos, deslocações de terras,
erupções vulcânicas, modificações do nível das águas, inundações e maremotos. O Comité poderá, em qualquer
momento e em caso de urgência, proceder a nova inscrição na lista do património mundial em perigo e dar a tal
inscrição difusão imediata (WHC, 1972).
22
ARTIGO 2.º Para fins da presente Convenção serão considerados como patrimônio natural: Os
monumentos naturais constituídos por formações físicas e biológicas ou por grupos de tais formações com valor
universal excepcional do ponto de vista estético ou científico; As formações geológicas e fisiográficas e as zonas
estritamente delimitadas que constituem habitat de espécies animais e vegetais ameaçadas, com valor universal
excepcional do ponto de vista da ciência ou da conservação; Os locais de interesse naturais ou zonas naturais
estritamente delimitadas, com valor universal excepcional do ponto de vista a ciência, conservação ou beleza
natural (WHC, 1972).
49
um cenário de destruição e/ou modificação generalizadas, o que se achava longe de perigo
pode se transformar repentinamente em algo valoroso, seja do ponto de vista estético, seja
para o ecossistema e/ou a ciência. A extinção de espécies e mudança de tipos de cobertura
vegetal, de paisagens, poderia ser uma ilustração desse argumento.
Na Convenção de Ramsar, os autores citam o artigo 4(2)23 e do texto legal extraem a
diferença entre a convenção anterior, que reside no fato de que, aqui, exige-se apenas a
compensação após a satisfação do critério de “interesse nacional urgente”, ainda que tal
compensação esteja na própria realidade, recriando uma “porção adequada do habitat
original”. Na prática, afirma-se, o responsável pela fiscalização desta convenção mantém uma
lista, como na anterior, e pode intervir para proteger o meio ambiente quando possível
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 354).

3.2.2.3 Terceiro aspecto - Articulação entre as normas

A articulação, sinérgica ou conflituosa, é disciplinada pela CDI. Explicam os autores


que o conflito pode se dar quando duas normas excludentes entre si, para um mesmo caso
concreto, acabam por impedir que determinado Estado cumpra ambas as normas. A outra
forma de conflito, continuam, seria aquela que nasce de autorizações e obrigações, isto é, uma
determinada obrigação de fazer ou não fazer em conflito com uma autorização de fazer ou
não fazer (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 354).
É comum ao DI os princípios de lex superior, lex specialis e lex posterior para
dirimir tais situações, porém, no DIA em relação com o DIH, Dupuy e Viñuales afirmam que
o princípio da lex specialis é o mais utilizado(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 355). A CIJ,
nos casos sobre a Legalidade das Armas Nucleares e A Construção de um muro na Palestina
Ocupada, fundamentou sua jurisprudência na aplicação do DIH respeitando-se o DIA,
levando em consideração o princípio da prevenção (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 355).
Os autores explicam que, se considerado o DIH como lex specialis, as normas
ambientais seriam aplicadas para interpretá-lo de forma subsidiária, complementar. O
entendimento sobre a interpretação se coaduna com o Artigo 31(3)(c) da CVDT

23
Artigo 4
2. Sempre que uma Parte Contratante, no seu interesse nacional urgente, suprimir ou restringir os
limites de uma zona húmida incluída na Lista, deve, na medida do possível, compensar qualquer perda de
recursos da zona húmida e, em particular, deve criar reservas naturais adicionais para aves aquáticas e para a
proteção, na mesma área ou em outro lugar, de uma porção adequada do habitat original. (RAMSAR, 1997)
50
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 355), onde os estados se comprometem a sempre, na
interpretação dos tratados, considerar as normas internacionais aplicáveis.
Já a hipótese de uso subsidiário, afirmam, na maioria das vezes se tratar de
interpretação ou de uma incidência usual da norma para um caso a qual ela se destina,
inexistindo, per si, lex specialis. O exemplo utilizado é a possibilidade da parte se ver
obrigada por norma ambiental a indenizar o refazimento do ambiente após ataque legítimo,
sem danos excessivos, isto é, um ataque lícito (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 356).

3.2.3 Terceira perspectiva

Se o DIH trabalha com os métodos e meios de guerra e o consequente “sofrimento


desnecessário ou[...] efeito excessivo ou indiscriminado em civis, propriedade civil ou meio
ambiente” (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 356), o Direito Internacional sobre o Controle de
Armas trabalha com o ciclo de vida das armas, isto é, sua produção, testagem, estocagem, até
o descarte ou conversão.
Os autores se propõe a evidenciar como a terceira perspectiva “encontrou expressão
legal concreta” e, afirmam, o instrumento legal mais abrangente trata sobre armas químicas, a
CWC, e veio vinte anos após o mais recente dos dois principais tratados sobre armas
biológicas, o PG-1925 e a BWC.
A tentativa de controlar as armas biológicas remonta aos idos das Regulações de
Haia de 1907, afirmam Dupuy e Viñuales, sendo o sistema atual baseado no PG-1925, que
proíbe os gases ou outros materiais análogos líquidos ou dispositivos asfixiantes e venenosos
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 357). O principal instrumento, por sua vez, seria a
Convenção sobre Armas Biológicas, de 1972, que proíbe todo o ciclo de vida da arma24.
As obrigações envolvem também o descarte25 dos estoques existentes ou sua
conversão para fins pacíficos, não transferir as armas biológicas para outros recipientes ou

24
ARTIGO I
Cada Estado parte na Convenção se compromete a nunca, em quaisquer circunstâncias, desenvolver,
produzir, estocar ou por qualquer outro modo adquirir ou conservar em seu poder:
1) agentes microbiológicos ou outros agentes biológicos ou toxinas, quaisquer que sejam sua origem
ou método de produção, de tipos e em quantidades que não se justifiquem para fins profiláticos, de proteção ou
outros fins pacíficos;
2) armas, equipamentos ou vetores destinados à utilização destes agentes ou toxinas para fins hostis
ou em conflitos armados.” (Convenção sobre Armas Biológicas, 1972).
25
Artigo Segundo
51
permitir que Estados ou organizações terceiras sejam assistidas ou encorajadas para
desenvolver agentes ou equipamentos de armas biológicas. Os autores ainda informam que a
fraqueza desta convenção é não haver um sistema de verificação e implementação do mesmo
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 358).
O PG-1925 e a BWC também regulam as armas químicas, embora o principal tratado
seja a CWC. Conceitualmente, armas químicas são consideradas substâncias tóxicas não
vivas, e armas biológicas são as que advêm de toxinas produzidas por organismos vivos, além
de serem armas de destruição em massa (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 359).
A convenção, que é tanto DIH quanto convenção sobre desarmamento, possui nos
seus artigos primeiro e segundo as obrigações gerais e definição de seus critérios com os usos
permitidos, como o uso civil e doméstico, além das quantidades permitidas
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 358).
Os agentes químicos considerados como arma química são os que, segundo o artigo
segundo, possuem “ação química em processos vitais que pode causar morte, incapacidade
temporária ou dano permanente em humanos ou animais”
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 358). Dupuy e Viñuales esclarecem que a vida não-animal
está protegida no preâmbulo da convenção, que reafirma a já existente obrigação, perante a
convenção ENMOD e o PG-1925, de não usar herbicidas como arma de guerra.
Ao contrário da anterior, a fiscalização e implementação desta convenção é
estabelecida e institucionalizada através da Organisation for the Prohibition of Chemical
Weapons, com seu secretariado verificando as declarações anuais dos estados membros sobre
armas químicas, como a eventual posse, etc., além da possibilidade de uma verificação ad hoc
no local da possível estocagem, caso exista suspeita de não cumprimento da Convenção. Essa
convenção também conta com programas específicos para descarte de material, com limites
de tempo para o cumprimento da obrigação (DUPUY; VIÑUALES, 2015, pp. 359-60).
Apesar da OC referida nesta monografia, não há tratado abrangente sobre o
banimento do uso ou de outras fases do ciclo de vida de armas nucleares. Inclusive, para a
CIJ, afirmar que armas nucleares estão banidas é legalmente impreciso, já que seu banimento

Cada Estado Parte nesta Convenção compromete-se a destruir ou a desviar para fins pacíficos, logo
que possível, mas não mais do que nove meses após a entrada em vigor da Convenção, todos os agentes, toxinas,
armas, equipamentos e meios de distribuição especificados no artigo 1º da Convenção, que estejam em sua posse
ou sob sua jurisdição ou controle. Na implementação do disposto neste Artigo, serão observadas todas as
precauções de segurança necessárias para proteger as populações e o meio ambiente. (Convenção sobre Armas
Biológicas, 1972).
52
é, por assim dizer, circunstancial e especificado, ou seja, na AL, no pacífico sul, nos leitos
marinhos, como se verá posteriormente com Weeramantry e, também, como se vê do seguinte
excerto trazido por Dupuy e Viñuales, da OC da CIJ que esta monografia utiliza:
O padrão até agora tem sido as armas de destruição em massa serem declaradas
ilegais por instrumentos específicos... Nas últimas duas décadas, muitas negociações
foram conduzidas em relação a armas nucleares; eles não resultaram em um tratado
de proibição geral do mesmo tipo para armas bacteriológicas e químicas
(CIJ apud DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 360).
No aspecto do ciclo de vida das armas, portanto, a proteção é localizada. No controle
da aquisição, fabrico, etc., as obrigações são individualizadas, como no exemplo da proibição
da Alemanha em adquirir tais armas, ou os Estados não-nucleares, conforme o Acordo de
Não-Proliferação. Os autores afirmam que a proteção da Antártida e do leito marinho quando
da testagem de armas nucleares é mais compreensiva. Para eles, então, quando se trata do jus
in bello, estão num locus diferente de Weeramantry, pois constatam que não há proibição do
uso de armas nucleares ou que, pelo menos, não há proibição expressa, o que, para o juiz, não
significaria diretamente a sua permissão, como se verá posteriormente.
A descrição dos dois autores é importante, pois colhem do campo jurídico o que ele
mesmo, em seus vários atos e atores afirmam e protegem, ou não, sobre o Direito Ambiental.
O juiz se coloca como um ator para afirmar a existência de uma proibição do uso de armas
nucleares. São dois lugares diferentes para observar o Direito Ambiental. O interesse deste
trabalho em Dupuy e Viñuales é o seu levantamento, legítimo para identificar a lex lata e,
também, para ajudar na interpretação de que o conceito de segurança tem como parte
fundamental de si o meio ambiente, protegendo-o, pois se trata de um bem jurídico relevante
e seu constitutivo, uma vez que o meio ambiente é importante ativo econômico, motivo de
guerras e imprescindível para nossa existência. Apesar de haver mudanças desde então, como
a criação de zonas-livres na Ásia (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 362), a situação geral da
proteção ambiental contra armas nucleares não mudou e se compraz, resumem os autores, da
não-proliferação de armas e os chamados Estados-nucleares, além da tentativa de banir a
produção de materiais fósseis – que impediria a produção de armas nucleares.

3.2.3.1 Jus ad bellum (Direito da Guerra)

As já mencionadas considerações sobre danos e impactos ao meio ambiente,


necessárias à avaliação de uma ação hostil, assim entendidas pela CIJ, são critérios para aferir
se tal ação foi necessária e proporcional. Esses, os princípios da necessidade e
53
proporcionalidade, são requisitos da legítima defesa e princípios gerais na condução das
hostilidades. Isto acima é diferente de avaliar se as hostilidades foram conduzidas de forma
legal, o que implica que a infração do jus ad bellum, responsável por afirmar a legalidade ou
ilegalidade do recurso à força, pode levar à responsabilização ambiental sem haver
necessariamente uma infração do DIH aplicado aos Conflitos.
Neste tema, os autores separá-lo-ão em três partes. A primeira, trata do recurso à
força em legítima defesa ou sob a égide do Capítulo VII das Nações Unidas, que são as duas
exceções existentes da proibição de usar da força para dirimir conflitos internacionais. Dupuy
e Viñuales afirmam que, do ponto de vista jurídico, a relevância é a extensão em que a
proteção ambiental se dá sob essas duas exceções.
A segunda parte é sobre as consequências de violar o Direito da Guerra, as
consequências de uma agressão ilegal, por exemplo, em relação aos danos causados ao meio
ambiente durante o interregno das hostilidades. A terceira parte compraz novas ameaças que
podem surgir em razão da degradação da natureza.
Os autores continuam e afirmam que o Conselho de Segurança pode ser vinculado de
forma a se ver obrigado às formas de intervenção possíveis se as ameaças ambientais, ou
mesmo os desastres naturais, forem interpretados como eventos que ameaçam a paz e a
segurança internacionais. Esse tipo de manobra já ocorreu quando o Conselho considerou
fluxo de refugiados, desastres humanitários e violações de direitos humanos como ameaças à
paz e à segurança internacionais (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 365).
Esse envolvimento do Conselho não é um costume estabelecido. É interessante que
os autores diagnostiquem que a China e o G-77 sejam a principal oposição, explicando-a em
causa da menor representação que possuem no Conselho de Segurança, preferindo a
Assembleia da ONU ou o Conselho Econômico e Social da ONU.
Aqui, sua afirmação no contexto das armas nucleares, aliada a como a proibição das
mesmas não está no mesmo nível que aquela das demais armas de destruição em massa,
tratando-se de um paradoxo com origens políticas, ganha novos matizes:
“É claro que isso não é intuitivo, pois as armas nucleares são de longe as armas de
destruição em massa mais perigosas e certamente aquelas com maior impacto no
ambiente natural. No entanto, o direito internacional nem sempre é razoável ou,
mais precisamente, às vezes segue razões peculiares, mas politicamente poderosas.”
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 361).
Ora, essa escolha significa, portanto, não o fato de que o Conselho não é implicado,
ou que considerável parte da comunidade internacional implicitamente assim o entenda, mas

54
uma escolha com razões políticas, pautadas no reconhecimento de que um órgão formado de
poucos países possa ser insuficiente para tratar de todos os temas sobre segurança, de forma
ampla e equitativa.
Também, a posição dos autores, além desse diagnóstico, permite inferir que o tema
da segurança e do meio ambiente pode estar no seio de um conflito entre blocos políticos
internacionais, havendo maior interesse em preservar as próprias agendas do que em
promover a coerência no DI, ou a proteção de um bem jurídico necessário a toda a
Humanidade.
Os autores discutem o caso da Resolução 687, que responsabilizou os iraquianos
pelos danos causados ao Kwait, durante a guerra de 1990-91. Aqui, a diferença entre o jus in
bello e o jus ad bellum aparece mais claramente. Além de afirmarem que as ações da invasão
americana também poderiam ser encaradas na perspectiva da resolução supramencionada,
explicam que todo o dano ambiental causado na guerra foi relacionado ao Iraque como causa
principal, por ter dado início a ela, sem que houvesse, por exemplo, uma avaliação sobre a
imputação daquele país o que, nas palavras dos autores, “teria incluído considerações sobre o
jus in bello e normas ambientais” (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 365).
Não houve análise, segundo as normas estudadas, que poderia ter entendido por
legais as atitudes, se foram tomadas, ou não, de forma proporcional e não excessiva, se
comparadas com a vantagem militar almejada, o que é “permitido pelo jus in belllo enquanto
lex specialis” (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 365). Dos 85 bilhões de dólares apontados
como danos causados pelo Iraque, este ressarciu 5,3 bilhões. Por fim, este caso é ilustrado por
Dupuy e Viñuales como um exemplo da correlação entre proteção ambiental e jus ad bellum,
demonstrando na prática as diferenças entre este último e o jus in bello.

3.2.3.2 Tratados ambientais e a possibilidade de se evitar a guerra.

Como a paz pode ser promovida, prevenindo-se a guerra, através de tratados


ambientais? Com esta pergunta, os autores mudam o foco de seu trabalho, buscando atualizar
o tema da proteção ambiental e da segurança. Segundo dados de 2009 do PNUMA, nos
últimos sessenta anos, quarenta por cento dos conflitos internos dos estados podem ser
associados aos recursos naturais e, ainda, ao menos dezoito conflitos foram fomentados pela
exploração de recursos naturais. (PNUMA apud DUPUY; VIÑUALES, 2015, pp. 366-367)

55
Os autores afirmam que a relação entre proteção ambiental e conflito é bidirecional,
sendo, em uma parte, a extensão na qual o DI protege o meio ambiente das consequências do
conflito armado e, de outra, como a paz pode ser protegida e os conflitos prevenidos de
ameaças ambientais. Utiliza-se o princípio nº 25 da Declaração do Rio, como ilustração: “[...]
paz, desenvolvimento e proteção ambiental são interdependentes e indivisíveis” (Declaração
do Rio apud DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 365).
A comunidade internacional, através da ONU, criou a parceria União Europeia-ONU
sobre Recursos Naturais e Prevenção de Conflitos e uma Divisão de Aviso Prévio e
Avaliação, - em inglês o acrônimo é DEWA - dentro do PNUMA. Quanto ao papel do
conselho de segurança, ele se limitou a discutir as implicações de mudanças climáticas, mas
não tratou dos conflitos derivados de recursos ambientais ou em razão do meio ambiente.
Ainda que haja tratados para situações onde o meio ambiente é a raiz do conflito, não existem,
até hoje, tratados que trabalhem a prevenção dos conflitos através da proteção ambiental.
Sobre a migração em razão de mudanças climáticas, problemas como o aumento dos
níveis da água do mar ou desastres naturais têm promovido a migração em massa de pessoas.
Para Dupuy e Viñuales, o desafio jurídico é a magnitude do fenômeno e a aparente
inadequação do sistema de regras atual.
Os critérios - cenários - utilizados para escolher quais normas incidirão, ou se alguma
chegará a incidir, foram delineados pelo ex-Representante do Secretário Geral da ONU,
Walter Kälin. São cinco: desastres repentinos, como furacões, ciclones, enchentes,
deslizamentos de terra; degradação ambiental lenta, como salinização de lençóis freáticos,
aumento do nível do mar, secas, desertificação; Eventos lentos de degradação que ocasionam
a diminuição do territórios de estados soberanos em pequenas ilhas; designação de áreas
proibidas para o assentamento humano e, finalmente, escassez de recursos ou o estresse de
suas reservas, de forma que desencadeie distúrbios, violência e conflito armado.
O Direito aplicado a esses casos passa por uma discussão com dois lados. Um deles,
possui a preocupação de saber até onde é legalmente possível e sábio tratar da migração em
razão do meio ambiente com tratados sobre refugiados. O Alto-comissariado das Nações
Unidas para os Refugiados, segundo Dupuy e Viñuales, acredita que não. O outro lado da
discussão procura saber quais as melhores alternativas legais para tratar dos refugiados
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 369).

56
A dificuldade de enquadrar essa migração na primeira parte da discussão se encontra
nos critérios para caracterizar o movimento migratório segundo a Convenção sobre os
Refugiados de 1951, como haver perseguição em razão de raça, religião, nacionalidade ou
pertencimento a determinado grupo social ou opinião política. Essas situações não estão
necessariamente conectadas com a migração em razão de problemas ambientais(DUPUY;
VIÑUALES, 2015, p. 369).
Dupuy e Viñuales entendem que os instrumentos da África e da América Latina
sobre refugiados possuem conceitos mais amplos, que abarcariam a situação presente, mas
apenas quando dos desastres repentinos. A tendência contrária a essa interpretação, afirmam,
é o receio em macular uma interpretação e um direito que “tomou muito esforço para ser
estabelecido” (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 369).
A alternativa a isso, portanto, se direcionou para
“quadros jurídicos alternativos, incluindo os instrumentos sobre o direito
internacional humanitário, o direito internacional dos direitos humanos
(principalmente sob a chamada “proteção complementar”), a lei que rege os
deslocados internos [...] e o direito ambiental internacional.”
(DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 370).
A conceituação de pessoas deslocadas abrange o meio ambiente enquanto causa,
como se retira dos Guiding Principles on Internal Displacement, de 199826. Há, portanto, o
reconhecimento da migração em virtude de problemas ambientais, ainda que isso seja
trabalhado em conjunto com normas de Direitos Humanos e o DIH.Além disso, por mais que
esses princípios não sejam normas contratuais entre os estados, eles veiculam noções básicas
de direitos humanos fundamentais. (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 370).
Um tratado em 2009 na Uganda foi criado para lidar com esses deslocados,
utilizando-se do vocabulário dos princípios trabalhados acima. Existe um movimento que
busca avançar no sentido de estabelecer uma proteção e estabelecer no DI e,
consequentemente, reconhecer a existência de refugiados ambientais de uma forma mais
ampla. Cita-se o Appel de Limoges de 2005 como uma dessas tentativas.
Dupuy e Viñuales explicam que há um movimento recente que busca a construção da
paz trabalhando o direito ambiental e o meio ambiente como razão dos conflitos. Não há
tratado estabelecido sobre o tema ainda, e avaliações do impacto ambiental, após os conflitos,

26
pessoas ou grupos de pessoas que foram forçadas ou obrigadas a fugir ou deixar suas casas ou locais
de residência habitual, em particular como resultado ou para evitar os efeitos de ... desastre natural ou de origem
humana, e que tenham não cruzou uma fronteira de Estado reconhecida internacionalmente.1 (DUPUY;
VIÑUALES, 2015, p. 370)
57
já são uma realidade através do Post-Conflict and Disaster Management Branch (PCDMB),
órgão do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Essas avaliações ocorreram em
conflitos como o da Palestina, Balcãs, Afeganistão, Nigéria, RDC e, segundo os autores,
demonstram que considerações sobre proteção ambiental estão cada vez mais presentes nos
acordos de paz e nas atividades que lhes constituem (DUPUY; VIÑUALES, 2015, p. 374).

3.3 Conclusão

Com este capítulo, foi possível identificar que a segurança ambiental caminha hoje
para discussões sobre como prevenir os conflitos armados e considerar a existência de
“refugiados ambientais”, por exemplo. Além disso, alguns dos critérios para decidir sobre a
incidência de normas são a degradação ambiental lenta,o aumento do nível do mar, as secas, a
desertificação e a escassez de recursos ou o estresse de suas reservas.
Os princípios da necessidade e da proporcionalidade são fatos do DI não
contornáveis e que fornecem proteção ambiental. Esse capítulo permitiu ao leitor entender
como o resultado das décadas anteriores e os anuários do CSNU trabalhados funcionarão
como um prólogo da proteção ambiental do DIH hoje.
Pode-se apreender o componente político das incongruências do DI no exemplo mais
nítido da existência das convenções sobre armas biológicas e químicas, mas ausência de uma
convenção sobre armas nucleares com o mesmo ímpeto disciplinar o descarte dos estoques e
desarmamento das potências nucleares.
A proteção da saúde e sobrevivência da população como limiar de dano para
estabelecer a ilegalidade de uma ação militar, a proteção da exploração dos recursos naturais,
somados à centenária conceituação de “florestas” como propriedade desenham uma paisagem
muito detalhada.
Está-se próximo de uma construção mais elaborada que poderá estatuir a
característica obsoleta do conceito de segurança que, na prática ou teoria dos Estados, ignora
seu componente ambiental, passando a pensar o conceito de segurança ambiental a partir das
dinâmicas ambientais, de uso de recursos naturais, seu estresse, e assim por diante.

4 Weeramantry, Método e Marco Temporal.

58
4.1 Introdução

O voto dissidente passa a nítida impressão de que o conceito de segurança é corolário


de proteções mais amplas, de princípios, da carga histórica de construção do Direito
Internacional, jus in bello e jus ad bellum.
O juiz, naquilo a que se refere como o método que desenvolve, procura estabelecer
as posições e declarações das potências nucleares, membros do conselho de segurança,
aquelas que criaram a situação envolvendo as armas nucleares, para então levantar os aspectos
técnicos e fáticos das armas nucleares, avaliar seu impacto e demonstrar o Direito que existe
para fundamentar o voto dissidente.
Este “conceito de segurança em Weeramantry” é a consequência da análise da lex
lata, isto é, o direito que existe. O seu “método”, assim chamado, também compraz uma
análise do estado da arte do jurídico, os seus princípios e sua gênese histórica, para então
contrapô-los às certezas científicas em relação aos fatos do problema, como o escopo da
destruição das armas nucleares, e o que a sociedade, que é a quem serve o direito, tem
demonstrado querer sobre aquele determinado tema.
A importância dessa afirmação é, após demonstrá-la, utilizar-se dela para procurar,
nos anuários do Conselho de Segurança, resquícios do que ensejaria a proteção ambiental, ou
mesmo a própria proteção ambiental, presente em determinado anseio, discussão ou mesmo
resoluções, como se pôde encontrar e se verá no momento oportuno.

4.1.1 O Voto Dissidente

4.1.2 Introdução

No sumário da Opinião Consultiva consta a resposta e o número de votos da


resposta, divididos em seis afirmações da CIJ feitas em resposta à Opinião Consultiva
requerida pela Assembleia Geral da ONU27.

27
Unânime:
A. Não há, no Direito Internacional consuetudinário e nem no convencional,
autorização específica da ameaça ou uso de armas nucleares. (CIJ, 1996, p. 1)
Por onze votos à três:
59
A partir dessas proposições, o autor comenta que “só será preciso que os efeitos de
armas nucleares sejam analisados para concluir que o uso ou ameaça de uso não são
possíveis.” (WEERAMANTRY,1996, p. 6). Além disso, afirma-se que inúmeras
características da arma nuclear seriam flagrantemente contrários ao DI, DIH e à Carta da
ONU (WEERAMANTRY, 1996, p. 6). É importante notar que, dado o contexto jurídico, o
exame das certezas científicas acerca das armas nucleares resultará em sua proibição, na
opinião do autor.
Para o juiz, os pontos positivos da decisão da Corte são os que se referem, em
primeiro lugar, à contradição entre os princípios do DIH e as armas nucleares,“sendo a
primeira visão que expressa essa compreensão de que as armas nucleares são limitadas por
uma variedade de obrigações derivadas de tratados internacionais”
(WEERAMANTRY, 1996, pp. 5-6). Em segundo lugar, ser a primeira decisão que expressa o
princípio de

B. Não há, no Direito Internacional consuetudinário e nem no convencional,


qualquer proibição universal e compreensiva sobre ameaça ou uso de armas
nucleares como tais. (CIJ, 1996, p. 1)
Unânime:
C. A ameaça ou uso de força pelos meios das armas nucleares que é contrária ao
Artigo 2, parágrafo 4, da Carta das Nações Unidas e que falha em preencher os
requisitos do Artigo 51 é antijurídica (CIJ, 1996, p. 1)
Unânime:
D. Uma ameaça ou uso de armas nucleares também deveria ser compatível com os
requisitos do Direito Internacional aplicável aos conflitos armados, particularmente
aqueles princípios e regras do direito internacional humanitário, bem como
compatível com as obrigações específicas sob tratados e outras iniciativas que
expressamente lidam com armas nucleares. (CIJ, 1996, p. 1)
Por sete votos a sete, com o voto de minerva do Presidente:
E. Decorre dos requisitos mencionados acima que a ameaça ou uso de armas
nucleares seriam, em geral, contrários às regras do Direito Internacional aplicável
aos conflitos armados, e em particular aos princípios e regras do Direito
Humanitário.
Porém, em vista do estado atual do Direito Internacional, e dos elementos de fato à
sua disposição, a Corte não pode concluir definitivamente se a ameaça ou uso de
armas nucleares seria legal ou ilegal em uma circunstância extrema de legítima-
defesa [auto-defesa], na qual a própria sobrevivência do Estado estaria em risco
(CIJ, 1996, p. 1)
Unânime:
F. Existe a obrigação de perseguir em boa fé e dar resolução às negociações que
levam ao desarmamento nuclear em todos os seus aspectos sob o estrito e efetivo
controle internacional (CIJ, 1996, p. 1)

60
‘proibição de métodos e meios de guerra que se destinam, ou que se espera
causarem’ dano ambiental generalizado, severo e em longo-prazo, e ‘a proibição de
ataques contra o ambiente natural como meio de represália’
(CIJ, 1996, apud WEERAMANTRY, 1996, p. 6).
Em terceiro lugar, ser uma decisão que
relembra todas as nações de sua obrigação de trazer suas negociações no campo do
desarmamento nuclear à resolução, em todos os seus aspectos, de tal forma a
terminar a continuidade desta ameaça ao Direito Internacional
(WEERAMANTRY, 1996, p. 6).
Referindo-se à Carta das Nações Unidas e as respostas dadas pela CIJ, o juiz estatui
que, a partir daquele momento, é critério de legalidade cumprir com os princípios presentes
naquela (Weeramantry, 1996, p. 6).
A discordância principal do voto dissidente com a parte dispositiva se dá em dois
itens. No item B, afirma-se que há, sim, convenção que proíba o uso da arma nuclear, a
Convenção de Haia em seu artigo 23 (a) e o PG-1925 – Protocolo de Proibição do Uso em
Guerra de Gases Asfixiantes, Venenosos ou Outros, e de Métodos Bacteriológicos de Guerra
(Weeramantry, 1996, p. 7). Abaixo o artigo 23 (a):
Além das proibições previstas em Convenções especiais, é especialmente proibido
(a) Empregar veneno ou armas envenenadas; (Convenções de Haia, 1907).
Já no item E, o juiz entende que a palavra “geralmente” deixa espaço para arguir a
legalidade do uso de armas nucleares ou mesmo a compreensão de que há contradição interna
na CIJ. Por esta razão, elege como propósito do seu voto dissidente estabelecer que armas
nucleares estão sempre contra o DI (Weeramantry, 1996, p 7).

4.1.3 A Importância Fundamental do assunto perante a corte para Weeramantry

O Juiz afirma que o dever da Corte é responder se o DI, aqui e agora, proíbe o uso ou
ameaça de uso de armas nucleares, e não o DI que está por vir. Trata-se de lex lata e não lex
ferenda. Para eventual resposta, existiriam três alternativas perante a CIJ. Na primeira
alternativa,apesar do apelo global e de sua força, se o DI estabelece a ilegalidade do uso ou
ameaça de uso de armas nucleares, a CIJ deve pronunciar-se (Weeramantry, 1996, p. 12).
Segunda, se o Direito é neutro, não pendendo para uma posição afirmativa ou negativa,
permite surgir um estímulo para seu desenvolvimento (Weeramantry, 1996, p. 12). Terceira,se
as regras ou princípios ditarem a ilegalidade da arma nuclear, a Corte assim se pronunciará,
sem se deixar deter “pelas forças colossais” que amparam a visão de legalidade das armas
nucleares (Weeramantry, 1996, p. 12).
61
O juiz, então, comenta que tal colisão com o “colossal” não deve ser obstáculo: “No
entanto, colisões com o colossal não impediram a lei em sua trajetória ascendente em direção
ao conceito de Estado de Direito.” (Weeramantry, 1996, p. 12). Isso é importante, pois se trata
de uma posição muito veemente acerca do componente político dessas questões.
Também, o autor afirma a vontade coletiva dos povos do mundo como a própria
fonte da Carta das Nações Unidas, já que está presente na primeira frase e, por esta razão, a
opinião global teria importante influência nos princípios do DIP(Weeramantry, 1996, pp. 13-
14). Também, do preâmbulo da carta se extra o desejo de evitar a guerra, o que o voto
dissidente diz que poderia apenas ficar ainda mais forte se a carta tivesse sido assinada com o
conhecimento da guerra com armas nucleares.
A Carta é analisada, frase por frase, e classificada como contendo três conceitos
chave, que são:os princípios de humanidade, os ditames da consciência pública e a dignidade
da pessoa humana. A igualdade entre os Estados-membro da ONU, a manutenção de
obrigações derivadas de tratados e outras fontes de DI, o objetivo de promover progresso
social e aumentar os padrões de qualidade de vida, com maior liberdade, o que seria o oposto
de uma arma “capaz de enviar a humanidade para a idade da pedra, se chegar a sobreviver.”
(Weeramantry, 1996, p. 14) são parâmetros para analisar a questão da OC.
O pensamento de Weeramantry apenas vê validade na decisão jurídica que estatui
direitos que não destruam a sociedade e o ecossistema que a sustenta. Por esse motivo, ele
enxerga irracionalidade e um erro ético e moral na apreciação do uso de armas nucleares que
fosse por sua legalidade, sob qualquer forma (Weeramantry, 1996, p. 43). Este é o argumento
cardeal para esta monografia.
Os argumentos do juiz se valem de danos ambientais de todo o tipo, e irreversíveis,
para estabelecer seu ponto. Sendo assim, por analogia, quaisquer outras armas ou atitudes que
produzam os mesmos efeitos são ilegais por definição.
Weeramantry afirma que “toda analogia pode ser feita, aqui, entre o Direito relativo
ao meio ambiente e o Direito relativo à guerra” (Weeramantry, 1996, p. 20). Este é o cerne, o
que liga as duas matérias, as armas nucleares com o direito ambiental e a situação limite em
que este último se propõe a trabalhar para evitar a destruição da sociedade a que serve:
Antes se pensava que a atmosfera, os mares e a superfície terrestre do planeta eram
vastos o suficiente para absorver qualquer grau de poluição e ainda reabilitar-se. O
Direito foi, portanto, muito negligente em sua atitude em relação à poluição. De
qualquer forma, com a realização de que se chegaria logo a uma situação limite,
além da qual o meio ambiente poderia absorver mais nenhuma poluição sem o

62
perigo de colapsar, o direito encontrou-se compelido a reorientar sua atitude em
relação ao meio ambiente (Weeramantry, 1996, p. 20).
Argumenta-se a necessidade de tratar especificamente dos efeitos do uso de tal arma
para poder tratar do problema humanitário respectivo. É uma questão de precisão, de eficácia.
É uma opção metodológica e não discursiva. Citando o TNP, o juiz afirma que proibir o tema
da OC, por parte do DI e da ONU, não é algo novo, próprio da Conferência de revisitação do
tratado, de 1995, mas já existia antes e apenas reiterava o que a Carta das Nações Unidas
afirmava em 1945 (Weeramantry, 1996, p. 103).
Além desta declaração, que veicula uma atitude universal de rejeição às armas
nucleares, há uma vasta maioria de Estados que apoia a proibição de testes nucleares. Em
1961, em Belgrado, Weeramantry comenta que 113 países da Ásia, África, América Latina e
Europa, que compunham o Movimento dos Países Não-Alinhados, pronunciaram-se naquele
sentido (Weeramantry, 1996, p. 103).
O juiz chega a fazer e comentar uma listagem de convenções e declarações
internacionais e suas respectivas votações que manifestam uma vontade global, majoritária,
de impossibilitar o uso, a ameaça de uso ou possibilitar que se evite a guerra nuclear e sua
consequente destruição (Weeramantry, 1996, p. 104) e que, por mais que as declarações e
resoluções não façam Direito, isto é, não sejam a lei que determina a proibição,
quando são reiteradas numa correnteza de resoluções, repetida e definitivamente
como o foram, provêem reforço importante para a perspectiva da impossibilidade da
ameaça ou uso de tais armas ante o direito internacional consuetudinário
(Weeramantry, 1996, p. 104).
Ao digressar sobre a criação de direito consuetudinário, observa-se que os cinco
países detentores de armas nucleares à época não seriam capazes, dada a desigualdade
numérica, de criar costume no sentido de permitir o uso e ameaça de uso das armas. O Estado
da Malásia, por sua vez, afirmou:
Se as leis da humanidade e os ditames da consciência pública demandam a proibição
de tais armas, os cinco países nucleares, por mais poderosos que sejam, não podem
contrariá-las (CR95127, p. 56 apud Weeramantry, 1996, p. 105).
Nem poderia haver, já que existe a igualdade entre os Estados, qualquer nação cujo
interesse prevaleça sobre o outro, ou que de alguma forma seja especial em relação outro país,
uma vez que a natureza do dano da arma nuclear vincularia todos os estados do planeta ao
mesmo nível de interesse e preocupação sobre o assunto (Weeramantry, 1996, pp. 107-108).

63
4.2 As Certezas Científicas / Os Fatos

Parte daquilo que é chamado de método, após estabelecer o direito que existe, deve
ser contraposto às certezas científicas. A radiação poderia envenenar toda a biota terrestre e
aniquilar toda sua superfície, num cenário de mútua destruição assegurada. Sobre as gerações
futuras, o autor explica a impossibilidade de lhe sonegar sobrevivência em virtude dos anseios
da geração atual. Para o juiz, portanto, a CIJ deveria reconhecer o direito das gerações futuras
(Weeramantry, 1996, p. 27).
Armas de destruição em massa tem por característica a impossibilidade de limitar
seus efeitos no tempo e no espaço e aos objetivos militares, segundo o juiz. Por essa razão,
seria consequência inerente uma violação massiva dos direitos humanos e do DI, o que seria
proibido mesmo se não houvesse previsão jurídica explícita nesse sentido
(WEERAMANTRY, 1996, p. 28).
O inverno nuclear 28, seguido após uma troca nuclear extensa, poderia ter o mesmo
efeito de super erupções vulcânicas: queda na temperatura e na colheita. Para efeito de
comparação, as “pequenas” bombas de Hiroshima e Nagasaki atingiram um número próximo
das 135 mil vítimas. Weeramantry afirma que se tivessem atingidos cidades mais populosas,
como Nova Iorque ou Moscou, as vítimas teriam sido em um número muito maior. Esse
exemplo materializaria o “super” efeito das bombas atuais e muitíssimo poderosas
(Weeramantry, 1996, p. 31).
Para fundamentar este argumento, pode ser utilizado o site público de testes
nucleares, o nuclearsecrecy.com/nukemap/ para testar o número de vítimas29. Se utilizarmos a
bomba W-87, carregada pelo míssil Minuteman III, que está no arsenal dos EUA, o número
de vítimas fatais é 290.620 pessoas e 434,480 de feridos, sem contar os efeitos a longo prazo,
a radiação sendo levada pelo vento ou mesmo a troca generalizada, que levaria ao inverno
nuclear etc. Se a detonação desta bomba ocorresse em Nova Iorque, e se a detonação da

28
A fuligem do estouro das bombas subiria para a atmosfera muito além dos ventos e tamparia o
planeta da luz solar, diminuindo sua temperatura drasticamente e ocasionando fome e perdas enormes de
biodiversidade.
29
Os testes em Nova Iorque possuíam um número de pessoas no raio da onda de choque, no caso da
minuteman III e a bomba de Hiroshima com o total de, respectivamente 5,878,536 e1.647.190 de pessoas. Em
Hiroshima, o raio da explosão dessa bomba americana conteria 1.2452.581 de pessoas. Nos testes que fiz, os
parâmetros de análises foram: o raio radioativo imediato da explosão, o raio da bola de fogo formada pela
explosão, o raio de danos moderados da onda de choque, o raio da radiação térmica e o raio dos danos advindos
da luz da explosão. Recomenda-se que o leitor repita o teste, inclusive com outras armas, nas grandes
metrópoles, e inclua alturas diferentes para observar o efeito no fallout radioativo. As bombas de Hidrogênio
apresentam um fallout terrivelmente maior.
64
bomba de Hiroshima fosse estourada na Nova Iorque dos dias de hoje, as vítimas seriam,
respectivamente, 1.039.840 e 263.560 de mortos e 2.024.010e 512.000 feridos.30
O autor chega a elaborar uma lista31 das consequências científicas da troca nuclear
generalizada, o que é muito didático para relacioná-la com o direito existente de modo a
concluir pela proibição do tema da OC em questão.
Nos idos de 1945, não havia total conhecimento das consequências da arma nuclear
e, no Direito, isto é uma situação consideravelmente diferente dos anos noventa, afirma o juiz.
A racionalidade que produz caminhos intelectuais para permitir o uso de armas nucleares,
para Weeramantry, deve ser confrontada com a questão: Hiroshima e Nagasaki são uma
confirmação da possibilidade de sobreviver à guerra nuclear?
A resposta é não. As armas utilizadas em 1945 são muitíssimo menores e foram
usadas no fim da guerra, contra um país não-nuclear. Isso significa certeza de não haver
retaliação e a já mencionada destruição mútua assegurada. As duas cidades atingidas à época
não eram nodos centrais da administração e governo do país atacado, o inverno nuclear
gerado por uma troca entre países nucleares não poderia ter acontecido em Hiroshima e
Nagasaki.
O juiz comenta uma fala de Einstein, um dos precursores da energia nuclear, por sua
vez precursora da bomba nuclear , na qual o cientista afirma que
“para nós parecia claro que essas bombas, e o grande poder de destruição que elas
foram precursoras, poderia facilmente estraçalhar toda e qualquer relação e
instituição humana” (Einstein apud H. G. Wells, 1982, apud Weeramantry, 1996, p.
47).
Daí, argumenta-se que o Direito Internacional, uma de tais instituições humanas, não
poderia permitir-se concluir, após o conhecimento prático e não apenas teórico como o do
cientista alemão, a possibilidade de uso de armas nucleares.

30
O site está disponível no link: https://nuclearsecrecy.com/nukemap/. Acesso em 04 jul 2023
31
(1) causam morte e destruição;(2) induzem cânceres, leucemia, queloides e problemas
relacionados;(3) causam problemas gastrointestinais, cardiovasculares e relacionados;(4) Continuam a induzir
por décadas a fio após o seu uso, os problemas acima mencionados;(5) prejudicam os direitos ambientais das
gerações futuras;(6) causam deformidades congênitas, retardo mental e danos genéticos;(7) carregam o potencial
de causar um inverno nuclear;(8) contaminam e destroem a cadeia de suprimentos alimentares;(9) põem em
perigo o ecossistema;(10) produzem níveis letais de calor e explosão;(11) produzem radiação e fallout
radioativo;(12) produzem um pulso eletromagnético disruptor;(13) produzem a desintegração social;(14) põem
em risco a civilização;(15) ameaçam a sobrevivência humana;(16) desatam a destruição cultural;(17) produzem
seus efeitos por milênios;(18) ameaçam toda a vida no planeta;(19) danificam irreversivelmente os direitos das
gerações futuras;(20) exterminam populações civis;(21) danificam Estados vizinhos;(22) produzem estresse
psicológico e síndromes do medo como nenhuma outra arma (Weeramantry, 1996. p. 44).
65
4.3 Lex Lata

Weeramantry informa que as nações donas de armas nucleares não queriam que a
Assembleia Geral da ONU inquirisse a CIJ sobre a legalidade do uso ou ameaça de uso de
armas nucleares. Além disso, ele cita o criador da Cláusula Martens, numa conferência em
Haia no ano de 1899, onde defendia a necessidade de esclarecer o direito, delimitá-lo, e não
deixar as leis sobre a guerra com conteúdos vagos:
Essa incerteza é vantajosa para o fraco? O fraco se fortalece por causa dos deveres
não determinados do forte? O forte se enfraquece por causa dos direitos
especificamente definidos e limitados do fraco? [...] Deixar a incerteza pairar sobre
essas questões seria necessariamente permitir que os interesses da Força triunfem
sobre os da Humanidade [...] (Martens, 1899, apud Weeramantry, p. 22).
A linguagem utilizada pelos Estados, explica o juiz, troca “Manter a balança de
terror” por “preparação nuclear”, "danos horrendos a civis e outros seres-vivos” por “danos
colaterais”, “cidades indiretamente incineradas” por “dano térmico considerável”, “milhares
de mortes” por “níveis aceitáveis de baixas”, “destruição certa” por “dissuasão”, “devastação
total do meio ambiente” por “danos ambientais”. Tais eufemismos “não deveriam ser
permitidos para esconder as contradições básicas entre a arma nuclear e os fundamentos do
Direito Internacional” (Weeramantry, 1996, p. 24).
Declarações32 da Federação Russa, dos Estados Unidos da América e do Reino
Unido afirmam que a subordinação das armas nucleares ao direito humanitário é mencionada
o que é importante por se tratarem de países nucleares (Weeramantry, 1996, p. 48).

32
Naturalmente, tudo que foi dito acima não significa que o uso de armas nucleares não é limitado.
Mesmo que o uso de armas nucleares seja justificável em princípio – em legítima-defesa individual ou coletiva –
que o uso seja feito no âmbito das limitações impostas pelo direito humanitário com respeito aos meios e
métodos de condução das atividades militares. É importante notar que no que diz respeito às armas nucleares,
essas limitações são limitações sob o direito consuetudinário em vez de tratados.
[...]
Os Estados Unidos, há muito adotam a posição de que vários princípios do direito internacional dos
conflitos armados se aplicariam ao uso de armas nucleares, bem como a outros meios e métodos de guerra. Isso
não significa, porém, que o uso de armas nucleares é proibido pelo direito da guerra. Como se demonstrará, a
questão da legalidade depende precisamente das circunstâncias particularmente envolvidas em qualquer uso da
arma nuclear.
[...]
Conclui-se que o direito aplicável aos conflitos armados, pelo qual a legalidade de qualquer uso de
armas nucleares será julgada, inclui todas as provisões de direito consuetudinário internacional (incluindo
aquelas que foram codificadas no Protocolo Adicional I) e, onde apropriado, do direito convencional, mas
excluídas as provisões do Protocolo Adicional I que incluíram novas regras no Direito (Weeramantry, 1996, p.
48).

66
Sobre o argumento das potências nucleares de que o dano colateral da arma não
possui dolo, o juiz argumenta que as consequências dela são públicas e assumir o risco de
concretizá-las é claramente responsabilizável.
Já sobre a ideia de que o que não é proibido é permitido, questiona-se o uso de armas
de destruição em massa teriam sido legais até a positivação de suas proibições, afirmando que
não (Weeramantry, 1996, p. 64).
Sobre os “Ditames da Consciência Pública”, uma reafirmação sobre o aspecto
universal do repúdio ao uso, ameaça de uso e teste de armas nucleares é feita quando o autor
cita fontes normativas ao longo de todo o texto do TNP, as falas dos representantes dos
estados, as proibições sobre testes em regiões como o Caribe, a América Latina, etc. Essa
longa construção argumentativa termina por erigir a credibilidade e a legitimidade da posição
legal defendida no voto de Weeramantry:
‘O uso de armas nucleares e termo-nucleares é contrário ao espírito, à Carta e aos
objetivos das Nações Unidas e, como tal, uma direta violação da Carta das Nações
Unidas’ (Resolução 1653 XVI de 1961 da Assembleia Geral das Nações Unidas,
apud Weeramantry, 1996, p. 60).
Na contraposição dos fatos ao Direito, aos princípios e àquilo que lhe deu origem,
dá-lhe validade e suporte, questiona-se retoricamente a licitude da concretização das certezas
científicas sobre as consequências da arma nuclear, como os cânceres e doenças,
deformidades genéticas, envenenamento do solo por radiação, etc. (Weeramantry, 1996, p.
61).

4.3.1 O impacto da Carta das Nações Unidas e os Direitos Humanos

À época do autor, a consciência pública e as considerações sobre a humanidade já


haviam avançado o bastante para interpretar qualquer recurso à força, por parte dos Estados,
como ilegal, na forma do art. 2 (4)33 da Carta das Nações Unidas – com a exceção da legítima
defesa, o art. 5134. Ademais, o desenvolvimento dos direitos humanos foi acompanhado pelo

33
Artigo 2. A Organização e seus Membros, para a realização dos propósitos mencionados no Artigo
1, agirão de acordo com os seguintes Princípios:
4. Todos os Membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força
contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado, ou qualquer outra ação
incompatível com os Propósitos das Nações Unidas (Carta das Nações Unidas, 1945).
34
Artigo 51. Nada na presente Carta prejudicará o direito inerente de legítima defesa individual ou
coletiva no caso de ocorrer um ataque armado contra um Membro das Nações Unidas, até que o Conselho de
Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da paz e da segurança internacionais. As
medidas tomadas pelos Membros no exercício desse direito de legítima defesa serão comunicadas imediatamente
ao Conselho de Segurança e não deverão, de modo algum, atingir a autoridade e a responsabilidade que a
67
direito ambiental, o que elevou a consciência pública ambiental aos assuntos atinentes à
matéria:
“Como observado pela Comissão de Direito Internacional na sua consideração sobre
responsabilidade estatal, condutas que coloquem em risco grave a preservação do
ambiente humano violam princípios ‘os quais estão agora profundamente enraizados
na consciência da humanidade como regras particularmente essenciais do Direito
Internacional’” (Anuário da Comissão de Direito Internacional, vol. II, parte II de
1976, apud Weeramantry, 1996, p. 63).

Os princípios mais importantes dos países que reconheceram seu uso para dar limite
às armas nucleares, assim postos no voto dissidente, foram: a proibição contra causar
sofrimento desnecessário35; o princípio da proporcionalidade; o princípio da diferenciação
entre combatentes e não-combatentes36, a obrigação de respeitar a soberania territorial de
Estados não-beligerantes; a proibição contra genocídio e crimes contra a humanidade37; a
proibição contra causar danos severos e permanentes ao meio ambiente38 e direitos humanos
(Weeramantry, 1996, p. 69).
Sobre o princípio do art. 23 (3), o juiz indica o manual de guerra britânico de 1916
como exemplo de limite jurídico à beligerância e cita um militar americano de 1862 que
“aceita a posição de que até a necessidade militar está sujeita ao direito e aos usos de guerra”
(Weeramantry, 1996, p. 70). Aqui não haveria cálculo sobre a destruição causada pela arma
nuclear que não infringiria o artigo/princípio.
A tentativa de estabelecer uma “medida segura” de utilização da arma nuclear
“ignora o raciocínio da norma e seu espírito [...] tal interpretação é um método de
interpretação inapropriado para construir um instrumento jurídico humanitário.”
(Weeramantry, 1996, pp. 70-71).
A seguir, a exposição do juiz sobre a proibição contra o dano ambiental e Direitos
Humanos será vista de forma mais aprofundada.
A Proibição contra o dano ambiental.

presente Carta atribui ao Conselho para levar a efeito, em qualquer tempo, a ação que julgar necessária à
manutenção ou ao restabelecimento da paz e da segurança internacionais (Carta das Nações Unidas, 1945).
35 O artigo 23 (e) das Convenções de Haia de 1907:
Art. 23. Além das proibições previstas em Convenções especiais, é especialmente
proibido
(e) Empregar armas, projéteis ou material calculado para causar sofrimento
desnecessário; (Convenções de Haia, 1907).
36
Artigo 48, 51(5)(b) e 57(2)(a)(iii) do PA I.
37
Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio.
38
Artigos 35(3) e 55 do PA I.
68
Comenta-se Timoshenko que, por sua vez, elege onze princípios, como por exemplo
o da “proibição de agressão ecológica”. Este último, é extraído da ENMOD. Timoshenko
também afirma, segundo Weeramantry, que a lei russa (ex-soviética), considera a modificação
hostil e deliberada do meio ambiente como crime internacional – consideração jurídica vinda
de um país nuclear.
Ainda, a discussão é posta por Al Gore, comenta o juiz, em meio à necessidade de
dar uma resposta à responsabilidade coletiva sobre o meio ambiente, já que, se não for feito,
se não “‘abraçarmos a preservação da terra como nosso novo princípio organizador, a própria
sobrevivência de nossa civilização será posta em dúvida’” (Al Gore, 1992, apud
Weeramantry, 1996, p. 75).
Weeramantry cita Jonathan Schell para dizer que a destruição do meio ambiente e de
nós mesmos se dá nas nossas inadvertências, nos efeitos colaterais das decisões que tomamos,
e passa a impressão de um movimento sutil de infligir-se a destruição total. Há, ao que parece,
uma suspensão da política em virtude da sobrevivência, no caso estrito da calamidade nuclear,
como um ímpeto de sobrevivência – o autor escreve em meio à guerra fria.
O argumento da tradição e direito consuetudinário como fundamentos “apesar” dos
tratados que os positivem, também é colocado quanto aos princípios do direito ambiental. Um
exemplo utilizado é a invasão do Kwait pelo Iraque, condenada pelo Conselho de Segurança
sob o DIA consuetudinário ante os danos causados ao meio ambiente.
Weeramantry afirma que os princípios do direito ambiental valem em tempos de
guerra e paz, são a condição “sine qua non da sobrevivência humana”
(Weeramantry, 1996, p. 76). Por se tratarem de regras gerais, e pela generalidade de suas
proibições, existir proibição específica contra a arma nuclear não é necessário. O juiz escolhe
dois artigos já citados várias vezes, o 35(3) e 55 do PA I, afirmando-os como positivadores de
princípios básicos do direito consuetudinário.
O Princípio da boa vizinhança39, presente na Carta das Nações Unidas, também se
aplicaria neste caso, ainda mais sob o espectro das certezas científicas da destruição mútua
assegurada no caso de uma guerra nuclear.Ademais, a CIJ já havia recepcionado esse
princípio desde seu começo, comenta o juiz, já que afirmou que “é dever de todo Estado não

39
Artigo 74. Os Membros das Nações Unidas concordam também em que a sua política com relação
aos territórios a que se aplica o presente Capítulo deve ser baseada, do mesmo modo que a política seguida nos
respectivos territórios metropolitanos, no princípio geral de boa vizinhança, tendo na devida conta os interesses e
o bem-estar do resto do mundo no que se refere às questões sociais, econômicas e comerciais (Carta das Nações
Unidas, 1945).
69
‘permitir conscientemente que seu território seja usado para atos contrários ao direito de
outros Estados’” (Weeramantry, 1996, p. 78).
Por fim, para Weeramantry, a Declaração Universal dos Direitos Humanos é
infringida quando do uso de armas nucleares, nos seus direitos à dignidade, direito à vida e à
integridade física, direito a ter cuidados médicos, direito ao casamento e à reprodução, direito
à maternidade e à infância e direito à cultura. Respectivamente, esses direitos estão presentes
no Preâmbulo, Artigo 1º, Artigo 3º, Artigo 25 (1), Artigo 25 (1), Artigo 16 (1), Artigo 25 (2),
Artigo 27 (1). Todo esse cabedal, o autor prossegue, advém de um direito básico, descrito por
René Cassin como “o direito dos seres humanos existirem” (Weeramantry, 1996, p. 79).

4.3.2 Posição Doutrinária

Na doutrina, há o entendimento majoritário de que o uso e ameaça de uso das armas


nucleares são ilegais,mas, para descrever sua força, o juiz optou por citar uma resolução
adotada pelo Instituto de Direito Internacional em 1969:
Que o Direito Internacional que existe proíbe, em particular, o uso de armas cujo
efeito destrutivo ‘é tão grande que não pode ser limitado a objetivos militares
específicos ou é de outro modo incontrolável..., bem como armas ‘cegas’
(Weeramantry, 1996, p. 80).
Para o juiz, o PG-1925 é a correta analogia com o tema da arma nuclear, e a
proibição que veicula já estabelece de antemão a desta arma– o autor da opinião dissidente
compara a radiação ao veneno. Para haver a aplicação de tal protocolo às armas nucleares, a
radiação deveria ser assim interpretada, além de haver o contato de materiais envenenados
com o corpo humano.
Se veneno é definido como substância cuja própria força danifica a saúde no contato
ou absorção com/pelo corpo, afirma o juiz, então a aplicabilidade do protocolo estaria na
solução da diferença entre “substância” e “materiais”. Como a radiação é um feixe de
partículas, ou seja, é matéria, Weeramantry defende a aplicação do Protocolo em virtude da
eventual infração do artigo 23 (a) da Convenção de Haia de 1907 pelo uso de armas
nucleares.40

40
Relação direta com o subtópico 3.2.3
70
4.3.3 Tratados e Convenções

A maior parte do espaço acima da superfície planetária, e a superfície em si, além do


leito marinho, são protegidos pelo Direito Internacional e ensejam a proibição das armas
nucleares, a ameaça de uso ou mesmo os testes nucleares. O autor lista os tratados que
promoveram essa realidade (Weeramantry, 1996, p. 106):O Tratado da Antártida de 1959;O
Tratado de Tlatelolco de 1967 sobre a América Latina e o Caribe;O Tratado de Rarotonga de
1985 em relação ao Pacífico Sul;O Tratado do Cairo de 1996 em relação à África;O Tratado
que proíbe armas nucleares na atmosfera e no espaço exterior, de 1968;O Tratado de 1971
sobre a Proibição da Colocação de Armas Nucleares e Outras Armas de Destruição em Massa
no Fundo do Mar e no Fundo do Oceano e em seu Subsolo.
Sobre o conceito de ameaça de força sob a Carta da ONU, Weeramantry começa
estabelecendo que ele determina a ilegalidade do uso da força, por qualquer arma, e a ameaça
do uso de força também. Sendo assim, o emprego de armas nucleares, por óbvio, não seria
legal. Para ilustrar esta realidade jurídica, utiliza-sedo Artigo 2 (4).
No campo dos tratados internacionais e das resoluções da ONU, temos os exemplos a
seguir: Declaração sobre a Inadmissibilidade de Intervenção em Assuntos Domésticos de
Estados e a Proteção de sua Independência e Soberania (Resolução da Assembleia Geral
2131 (XX)), de 1965;Declaração sobre o Aprimoramento do Princípio do Não-uso da Força
(Resolução da Assembleia Geral 42/22, parágrafo segundo), de 1987
(Weeramantry, 1996, p.97); A Declaração de 1949 sobre os aspectos Essenciais sobre a Paz
(Resolução da Assembleia Geral 290 (IV)); A Declaração de 1972 sobre o Fortalecimento da
Segurança Internacional (Resolução 2734 da Assembleia Geral XXV); A Declaração de 1988
sobre a Prevenção e Remoção de Disputas e Situações que Possam Ameaçar a Paz e
Segurança Internacionais e sobre o papel das Nações Unidas Nesse Campo (Resolução 43/51
da Assembleia Geral);Ato Final de Helsinque (1975) e o Pacto de Bogotá (Tratado
Americano de Soluções Pacíficas)41 de 1948.
A Declaração dos Princípios do Direito Internacional sobre Relações Amigáveis,
presente na resolução 2625(XXV) da Assembleia da ONU (Resolução2625 XX, apud
Weeramantry, 1996, p. 97) é citada no seguinte excerto, ippsis litteris:

41
Respectivamente, segundo o juiz, afirmam que: “a) os estados participantes devem evitar a ameaça
ou o uso da força e; b) devem evitar a ameaça ou o uso da força e quaisquer outros meios coercitivos para
resolverem suas controvérsias” (Weeramantry, 1996, p. 97).
71
“Tal ameaça ou uso de força constitui uma violação do Direito Internacional e da
Carta das Nações Unidas e nunca deve ser empregada como um meio de resolver
assuntos internacionais”.
Ao tratar da Igualdade nos textos do jus ad bellum, trabalha-se com a ideia principal
de que reconhecer as desigualdades de facto não é a mesma coisa que consagrar a
desigualdade de jure ao permitir, por exemplo, que o direito da autodefesa seja conferido em
graus diferentes para os Estados-membros da comunidade internacional (Weeramantry, 1996,
p. 99).
Essa diferença é chamada pelo autor de “great conceptual leap” e tal grande passo
conceitual, em sua análise, seria verificado nos argumentos de que, quando os protocolos da
PG-1925 não se pronunciam sobre a proibição do uso de armas nucleares, ou quando existem
tratados que impõe banimentos parciais de armas nucleares, há uma expressão implícita de
sua legalidade, ou devem ser interpretados como aceitação parcial de legalidade do uso de tais
armas (Weeramantry, 1996, p. 99).
Se “uma lei que permitisse que algumas nações sozinhas tivessem o direito de usar
armas químicas ou bacteriológicas em legítima defesa seria inconcebível”
(Weeramantry, 1996, p. 99), a situação das armas nucleares não seria diferente (Weeramantry,
1996, p. 99). Inclusive, o juiz afirma que quando países participam de tratados regionais sobre
não-proliferação, nada mais fazem que asseverar sua vontade neste sentido (Weeramantry,
1996, p. 108), o que é completamente diferente de avalizar a legalidade das armas nucleares
fora da jurisdição desses tratados.
O TNP, nesse sentido, não confere legalidade ao estoque de armas nucleares ou à
situação que remanesce após sua vigência. Weeramantry responde esse padrão argumentativo
de forma simples, direta e poderosa:
A aceitação da inevitabilidade de uma situação não é anuência à essa situação, pois
aceitar a existência de uma situação indesejável que se é impotente para prevenir é
diferente de consentir com ela (Weeramantry, 1996, p. 109).
Um bom exemplo do autor, utilizado como contra-argumento “de dentro”, ou seja,
dos militares, é o de que alguns manuais militares instruem suas forças a interpretarem as
armas nucleares sob as mesmas regras que as armas convencionais, o que reforça a
impossibilidade de um regime que não seja a sua proibição (Weeramantry, 1996, p. 101).

72
4.4 Conclusão

Alguns argumentos contra a concessão de uma opinião consultiva são analisados


brevemente por Weeramantry. Isso pode ser comparado com o intento de lançar a hipótese
final desse trabalho. No caso da OC, argumentara-se que o pronunciamento da CIJ seria
inútil, ao que responde o juiz:
[...] Uma decisão profundamente baseada no direito carregará respeito consigo em
razão da virtude de sua própria autoridade inerente. Assistirá à construção de um
clima de opinião em que o direito é respeitado [...] O esclarecimento da lei é um fim
em si mesmo, e não apenas um meio para um fim. Quando a lei é clara, há maior
chance de cumprimento do que quando está envolvida em obscuridade
(Weeramantry, 1996, p. 122)
Além de dizer que, como no exemplo do Apartheid, o pronunciamento da Corte pôde
promover o clima internacional que ajudou a derrotá-lo, o autor cita Ian Brownlie, para
afirmar que “é melhor defender uma proibição que pode ser evitada numa crise do que acabar
com os padrões completamente” (Brownlie, I. apud Weeramantry, 1996, p. 122). E, na
verdade, qualquer resquício de valor que a posição anterior mantenha, inclusive de valor
racional e realista, deve ser examinado sob a seguinte perspectiva:
Algumas desigualdades estruturais foram, de fato, construídas no sistema
constitucional internacional, mas isso é uma proposição muito diferente de
introduzir desigualdades no corpus substantivo do direito sob o qual todas as nações
são governadas (Weeramantry, 1996, p. 100).
O argumento nevrálgico, sob a perspectiva discursiva dos defensores da licitude do
emprego dessas armas, presente no raciocínio sobre segurança, é o de que armas nucleares
preservariam a paz. Sobre ele, o autor argumenta que não é importante para o Direito, já que a
ilegalidade da ameaça de uso não se invalida pelo terror que promove no outro
(Weeramantry, 1996, p. 123).
De forma eloquente, o juiz argumenta que a comunidade internacional é voluntária, e
sua força não advém de uma posição superior em relação aos demais membros, de tal forma
que, para o DI manter sua autoridade, é necessário que todo elemento constituinte possa ser
testado segundo a igualdade entre as nações (Weeramantry, 1996, p. 100). Todo o direito que
dessa declaração de vontade emana, aos seus membros vincula e, portanto, proíbe ou permite
determinadas condutas. A destruição do meio ambiente não é uma das últimas.
Este capítulo procurou demonstrar de forma sucinta o caminho percorrido até chegar
nessas conclusões de Weeramantry. Essa foi a razão para tratar dos tópicos do voto sobre as

73
certezas científicas da arma nuclear e do estabelecimento da lex lata. Agora, a opção
metodológica do juiz fica devidamente fundamentada.
Já foi justificada a urgência do tema, estabelecido a lex lata do DIH e as certezas
científicas sobre a infração das normas do DIH da mesma forma, ainda que um pouco
diferente do caso das armas nucleares, pois não há necessidade em provar cientificamente a
exploração de recursos naturais por um grupo paraestatal, por exemplo.
No entanto, a discussão sobre o limiar de dano dos artigos 35(3) e 55 do PA I no que
tange o DIH toma emprestado de Weeramantry, por analogia, a questão das consequências
das armas nucleares: a destruição do meio ambiente é uma consequência das armas nucleares,
e é proibida.
Agora, no objeto de pesquisa, o locus “começo”, ou “origem”, será pesquisado, e se
deve ter em mente como Weeramantry trabalha as fontes multiculturais e os exemplos
proibitivos de armas super-destrutivas como justificativa para encarar esses oito primeiros
anos como esse lugar onde se busca a gênese de uma “história” que termina em uma proibição
jurídica mais bem desenvolvida.
O levantamento a seguir também serve para demonstrar algo que já foi exposto, que
é a precedência de proteção ambiental em relação ao CSNU, e que segurança ambiental não
foi uma simples ideação endereçada a ocasionar uma mudança na realidade, mas uma
construção conceitual a partir de fatos e anseios sociais que requereram ao mundo jurídico
uma resposta jurídica.

1 ANUÁRIOS

A pesquisa compreende a abordagem com palavras, buscando os momentos em que


são empregados os termos: meio ambiente, ambiental, segurança ambiental, proteção
ambiental, fauna, flora, água, mar, oceano, vida, vida silvestre, solo. Há um critério implícito
de que a aparição dos termos seja relevante tanto quanto tratem especificamente de meio
ambiente, recursos naturais, economia, etc. Também, além dessas palavras, buscar-se-á pelas
que estão a seguir, pois estão relacionadas ou com a exploração do meio ambiente ou com a
natureza sob uma perspectiva do que seria útil para a humanidade, como as palavras “reservas
naturais” e “minério” que seriam, em inglês, “natural reserves” e “mining”.
Por óbvio, tais palavras são procuradas quando possuidoras do significado a que se
refere este trabalho, ou seja, se “combustíveis” é relatado apenas com o objetivo de retratar a
74
presença de combustíveis em algum incidente diplomático sem que o próprio tema esteja em
jogo, não será levado em consideração. Da mesma forma, a palavra petróleo, no inglês oil,
será levada em conta quando estiver no próprio tema da discussão.
Tais palavras serão pesquisadas em suas traduções na língua inglesa, uma vez que os
anuários são disponibilizados em inglês ou francês somente, portanto, a lista completa de
termos fica: environment, environmental security, environmental, environmental protection,
fauna, flora, water, sea, seas, ocean, wildlife, life, natural resources, resources, natural,
supply chain, supply, agriculture, food, starvation, starving, health, oil, fuel, fuelling, fossil
fuel, gas, natural gas, natural reserves, mining, soil. Alguns termos foram divididos em suas
partes, como a presença de mais de um environmental ou sea e seas, já que tais palavras
podem ser empregadas para falar sobre o mesmo ente.
Os termos resources e life, por sua vez, serão procurados quando significarem,
respectivamente, recursos naturais ou econômicos – em relação direta com o meio ambiente –
e “vida” ou vida econômica – quando relacionada a recursos naturais, indústria, meio
ambiente, etc. O termo supply será comentado quando retratar suprimentos de ordem
econômica ou propriamente a exploração de recursos naturais, em relação direta ou indireta
com a vida civil ou militar.
A palavra fuel aparece quando se trata de energia atômica, por exemplo, e embora a
Comissão sobre o Controle de Energia Nuclear tenha suas discussões em apartado das demais
transcrições dos arquivos de texto dos relatórios, um trabalho somente para essa comissão não
seria necessário já que pouco material relevante aparece durante o período de tempo escolhido
(1946-1953).
A relevância do método acima é pinçar, nos anuários e suas discussões,
considerações sobre proteção ambiental, seja em denúncias, rascunhos de resolução ou meras
declarações.

1.1 1º Anuário (15 de janeiro a 17 de julho de 1946)

1.1.1 Life

As duas primeiras aparições do termo se referem à presença de tropas soviéticas no


Azerbaijão e a interrupção de circulação de mercadorias e pessoas, através de barreiras
artificiais em relação às fronteiras da época, onde o representante do Irã afirmou que a vida
75
econômica do país havia sido perturbada por tal contexto (CSNU, 1º relatório oficial, p. 11-
12).
A palavra life aparece três vezes. A primeira vez e a terceira são em uma
manifestação do representante da então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas,
submetida em 21 de junho de 1946, sobre a presença de tropas britânicas na Grécia, em que a
palavra se remete à disrupção que seria causada na vida do país (CSNU, 1º Relatório Oficial,
p. 11-12).

1.1.2 Oil

Encontrada em uma carta do embaixador soviético ao Secretário-Geral das Nações


Unidas à época, Trygve Lie, no dia 3 de abril de 1946, sobre o estabelecimento de uma
Sociedade Anônima entre URSS e Irã para a exploração de petróleo. A segunda vez, aparece
em uma carta do embaixador iraniano ao secretário-geral, onde informa que não houve acordo
em relação ao Azerbaijão e a exploração de petróleo entre seu país e a URSS.

1.2 2º Anuário (16 de julho a 15 de julho de 1947)

1.2.1 Water – Sea – Seas – Life

Há uma discussão sobre águas territoriais e soberania quando, alegadamente, no dia


22 de outubro de 1946 navios de guerra britânicos violaram águas territoriais da Albânia,
disparando canhões e metralhadores no mar. Aqui, há uma profusão das palavras water, sea e
seas com a menção da palavra life uma vez que, por exemplo, naquele mesmo dia, navios
britânicos sofreram danos em razão de minas antinavio, com perda de vida humana inclusive
(CSNU, 2º Relatório Oficial, p. 65).
Embora a discussão seja principalmente por conceitos relativos ao Estado, como
soberania, território, etc., o fato de haver minas terrestres, disparos e perda de vidas humanas
se relaciona distante e indiretamente com o meio ambiente, num primeiro olhar. Há, com a
palavra life, nova menção à vida econômica da Grécia, quando o representante da China
parabenizou seu par estadunidense pela iniciativa americana em restaurar a “vida econômica”
daquele país (CSNU, 2º Relatório Oficial, p. 65).

76
1.2.2 Natural resources / Agriculture

Na parte três do documento, intitulada “Outros Assuntos Considerados pelo


Conselho de Segurança e por seus Órgãos Subsidiários”, há a discussão sobre o “Acordo de
Tutela Para as Antigas Ilhas Do Mandato Japonês”, ou, em inglês Trusteeship Agreement For
The Former Japanese Mandated Islands.
Tais ilhas consistiram nas ilhas que hoje comprazem as Marianas, Carolinas e
Marshall, e estiveram sob jugo japonês desde 1914 até 1947, quando foi celebrado o acordo
acima, onde tais áreas foram colocadas sob a administração estadunidense (Wilds, 1955).
O termo natural resources que aparece nas discussões é positivado no artigo 6º do
tratado:
No cumprimento das suas obrigações sob o Artigo 76 b da Carta, a Autoridade
Administradora deverá:
(2) Promover o avanço econômico e a auto-suficiência dos habitantes, e para esse
fim deve regular o uso de recursos naturais, encorajar a pesca, agricultura e
indústrias, proteger os habitantes contra a perda de suas terras e recursos, e melhor
os meios de transporte e comunicação (CSNU, 2º Relatório Oficial, p. 104)42.
Aqui, a expressão “recursos naturais” e a palavra “agricultura” se relacionam
diretamente com o manejo econômico da terra e todas as consequências físicas e biológicas de
sua exploração. Trata-se de uma aparição relevantíssima dos termos. No excerto acima, há o
compromisso de desenvolvimento econômico com o compromisso de regular o uso dos
recursos naturais e impedir perda de terras.

1.2.3 Health

No mesmo art. 6º citado anteriormente, o item (3) diz:


No cumprimento das suas obrigações sob o Artigo 76 b da Carta, a Autoridade
Administradora deverá:
(3) Promover o avanço social dos habitantes, e para esse fim deve proteger os
direitos e liberdades fundamentais de todos os elementos da população sem
discriminação, proteger a saúde dos habitantes, controlar o tráfico de armas e
munições, ópio e outras drogas perigosas, e o álcool e outras bebidas espirituosas, e
instituir outras regulações que forem necessárias para proteger os habitantes contra
abusos sociais; (CSNU, 2º Relatório Oficial, p. 105).
A proteção da saúde dos habitantes está descrita no mesmo artigo que prevê o
progresso econômico e a proteção das terras e recursos naturais da população de tal forma
que, aparentemente, este é o primeiro exemplo onde recursos naturais, saúde humana e
42
Disponível em https://digitallibrary.un.org/record/469811. Acesso em 10 jan. 2023.
77
proteção ambiental, ainda que de forma incipiente, aparecem na história registrada do
Conselho de Segurança.
Se tomarmos a perspectiva de Weeramantry, caberia inquirir se os testes nucleares
nas ilhas Marshall, que comprazem os territórios sob o TAFJMI, já não eram proibidos ante o
dever da Autoridade Administradora de proteção da saúde, recursos naturais e progresso
econômico dos habitantes da ilha.

1.3 3º Anuário (16 de julho de 1947 a 15 de julho de 1948)

1.3.1 Water / Health / Supply / Food

As palavras foram encontradas nas discussões sobre a Questão Palestina. O


presidente, que falhou em trazer a “Agência judaica” e o “Alto Comitê Árabe” para um
acordo a respeito da trégua, “em razão das conversas informais entre os membros do
conselho” submeteu o seguinte projeto de resolução, em nome da delegação colombiana:
O Conselho de Segurança
1. Chama a todas as pessoas e organizações na Palestina, e especialmente as que
estão sob a Agência Judaica e o Alto Comitê Árabe, para tomar imediatamente, sem
prejuízo aos seus direitos, reivindicações ou posições, e como contribuição para o
bem-estar e interesse permanente da Palestina, as seguintes medidas:
(e) Cooperar com a Autoridade Mandatária para a manutenção efetiva da lei e da
ordem e de serviços essenciais, particularmente aqueles relacionados ao transporte,
comunicação, saúde e suprimento de comida e água;
(CSNU, 3º Relatório Oficial, p.89).
Ou seja, o Conselho de Segurança discutiu um rascunho de resolução onde se
estabelecia a proteção dos chamados “serviços essenciais” dentre os quais a saúde e o
suprimento de comida e água. Tal proteção, colocando a saúde com alimentação e água,
termina por evidentemente relacionar saúde e recursos naturais.
Há, também, uma passagem onde o representante da Síria lê um telegrama do
governo egípcio sobre uma tentativa de judeus infectarem água-potável utilizada por egípcios
(CSNU, 3º Relatório Oficial, p. 98).
Por fim, o Presidente trouxe ao Conselho de Segurança um telegrama do mediador
da ONU no qual era dito que a trégua na questão Palestina deveria ser prolongada e com o
“entendimento definido de que comida, água e outros suprimentos essenciais não-militares
fossem assegurados para Jerusalém” (CSNU, 3º Relatório Oficial, p. 108).

78
A palavra food aparece numa manifestação do representante da Indonésia onde ele
afirma que a Holanda busca controlar o comércio de seu país e que a continuação do bloqueio
levou à escassez de commodities importantes, como suprimentos médicos e comida
(CSNU, 3º Relatório Oficial, p. 59).

1.3.2 Life

O representante da Holanda afirma que uma das razões da falência da resolução do


cessar-fogo foi a incapacidade das partes em proteger a vida e propriedade. (CSNU, 3º
Relatório Oficial, p. 39). O representante da China, em determinado momento de sua fala,
também pediu às partes que tomassem medidas que protegessem a vida e a propriedade
(CSNU, 3º Relatório Oficial, p. 40). Um projeto de resolução sobre o assunto é montado e,
nele, consta a obrigação de ambas as partes tomarem as medidas necessárias para proteger a
vida e a propriedade (CSNU, 3º Relatório Oficial, p. 46).
Aqui, a ausência de discriminação sobre o escopo do significado da palavra property
pode permitir que a ela se relacione a propriedade quando na forma de recursos naturais,
florestas, etc. A julgar por um dos resultados da Questão da Indonésia ser o acordo de
Renville, que expressamente diz “propriedades de qualquer tipo”, haveria certa razão em
interpretar que a preocupação sobre a perda de propriedade também abarque a propriedade
natural, florestas, bosques, enfim, o meio ambiente no geral.
Se é um objetivo deste trabalho procurar por considerações de proteção ambiental, o
contexto a que se refere acima, ou seja, a Questão da Indonésia, o acordo de Renville e a
existência expressa do termo “propriedades de qualquer tipo”, permitem afirmar que existiu,
nessa questão e no anseio sobre a perda de vidas e propriedade, considerações sobre proteção
ambiental.
Na questão Índia-Paquistão, o representante paquistanês acusou a outra parte de
transformar a vida em um determinado local que estava na disputa em uma “vida intolerável”
(CSNU, 3º Relatório Oficial, p. 68) para os cidadãos. Aqui, o que há é um repúdio e aparente
dever universal de não fazer da vida algo “intolerável”. Essa questão, ao contrário da anterior,
esboça um caminho menos interpretativo e mais descritivo de um impulso próprio do
Conselho e daquele contexto em tratar sobre aquilo que concerne ao meio ambiente, até
mesmo porque é na questão Índia e Paquistão que a mudança de cursos de água, ou a
diminuição na vazão de rios é levantada perante o Conselho de Segurança.
79
1.3.3 Oil

O representante da República Socialista Soviética Ucraniana afirmou que os Good


Offices atuam como entidades de arbitragem que agem segundo os interesses dos árbitros, e
não das partes envolvidas, que a situação na Indonésia era oriunda de intervenção militar, que
havia um plano para prejudicar aquela república que resultava numa comunhão de colonizá-
la, para se aproveitarem dos recursos como borracha, estanho e petróleo
(CSNU, 3º Relatório Oficial, p. 58).
A palavra oil e acusações sobre interesses escusos continuam, mas, agora, na questão
Palestina. Ao discutir o projeto de resolução americano, o representante soviético afirma que
os americanos estavam interessados em sua posição estratégica e em petróleo, apenas.
(CSNU, 3º Relatório Oficial, p. 86).
Os representantes da URSS, da República Socialista Soviética Ucraniana, Síria,
Argentina, Israel e Reino Unido perguntaram sobre, por exemplo, desmilitarização das
refinarias de petróleo (CSNU, 3º Relatório Oficial, p. 110). Depois, a República Socialista
Soviética Ucraniana, numa longa manifestação, afirma que o Reino Unido e os EUA são
responsáveis pelo conflito alongar-se e que, especialmente os EUA, são responsáveis pela
“pressão das grandes companhias de petróleo engajadas em explorá-lo no território dos
estados árabes” (CSNU, 3º Relatório Oficial, p.114), além de afirmar que a desmilitarização
anteriormente mencionada foi feita sob a égide de tais interesses.
(CSNU, 3º Relatório Oficial, p. 114).
Embora acusações políticas não sejam propriamente Direito, o que importa é que o
conflito girou em torno disso, ou pelo menos uma de suas dimensões, e que o combustível
fóssil foi citado várias vezes, ou seja, ele passou a entrar na esfera jurídica, passou a povoar
novos lugares, por assim dizer, o que passaria a implicar num problema/fato cujo Direito
Internacional e o Conselho de Segurança teriam que abordar.
Portanto, sendo a proteção ambiental um dos instrumentos de controle, inclusive para
diminuir conflitos, já que estabelece parâmetros, limites, etc., não há porque não citar a
aparição da palavra oil nessas condições, num debate político dentro do Conselho de
Segurança, até porque, nas acusações, afirmava-se a tentativa de violar/quebrar uma
resolução: “Tal circunstância determinou outra tendência política que estava direcionada a

80
quebrar a resolução da Assembleia Geral de 29 de novembro de 1947” (CSNU, 3º Relatório
Oficial, p. 114).

1.4 4º Anuário (16 de julho de 1948 a 15 de julho de 1949)

1.4.1 Water / Supply

Em uma manifestação do Representante da Síria sobre a Questão Palestina – tratada


no Capítulo 4 do documento – há afirmação do representante do Governo Provisório de Israel
sobre a possibilidade de “tomarem as ações que estimarem necessárias [...] se o [...]
suprimento de água não fosse assegurado pelo mediador [...]” (p. 46) e que a “negação
persistente e forçada de água para Jerusalém foi uma grave violação da trégua” (CSNU, 4º
Relatório Oficial, p. 46).
O representante da Síria respondeu, citando um telegrama do “Mediador”, de que a
obrigação de desmilitarização de Jerusalém por Israel ainda não havia sido cumprida e a
questão da água estaria relacionada com isso (CSNU, 4º Relatório Oficial, p. 46). Há, ainda, a
menção sobre uma comunicação oficial entre o Mediador da questão e o Presidente da
Assembleia sobre a destruição de uma estação de água (CSNU, 4º Relatório Oficial, p. 47).

1.4.2 Life

Na parte II do anuário, discute-se o controle da energia atômica, a redução geral e


regulamentação de armamentos. Nos Trabalhos da Comissão de Armamentos Convencionais,
conforme o plano de trabalho aprovado anteriormente, o projeto de resolução do Reino Unido
foi apresentado e discutido. O conteúdo de seu Art. 5º, que contém a palavra life, é o seguinte:
5. Um sistema de regulação e redução de armamentos e de forças armadas deve
incluir um sistema adequado de salvaguardas, as quais, por incluir um sistema
acordado de supervisão internacional, vai assegurar a observância das provisões do
tratado ou convenção por todas as partes. Um sistema de salvaguardas não pode ser
adequado a não ser que possua as seguintes características:
(c) Cause o mínimo de interferência e imponha o menor fardo, sob qualquer aspecto,
na vida individual das nações (CSNU, 4º Relatório Oficial, p. 77).
No Capítulo 1, sobre A Questão Indonésia, onde se discute a responsabilidade do
conselho de segurança sobre manter a paz e a segurança mundiais, a palavra life aparece na
resolução C de 28 de janeiro de 1949. Em resumo, aqui se tratou da cessação das hostilidades
entre forças holandesas e indonésias.
81
Além disso, life também aparece em uma draft resolution apresentada pelo
representante Cubano, em nome de Cuba, China, Noruega e Estados Unidos. Dentre provisões
como a de uma assembleia constituinte da Indonésia, o comprometimento “Da Comissão em
assistir [...] o restabelecimento da ordem civil [...] o mais cedo possível” (p.24) compraz
“segurança pública e a proteção da vida e da propriedade” (CSNU, 4º Relatório Oficial, p.
24).

1.4.3 Food / supply

As palavras são utilizadas no contexto da Questão da Indonésia, na qual o


representante da Holanda afirmou que as únicas ações que suas tropas ainda tomavam eram
contra quem pusesse em perigo o “suprimento de comida ou outras commodities para a
população” (CSNU, 4º Relatório Oficial, p. 22).
Pelo representante da França, a palavra é usada para se adereçar à responsabilidade
dos países que ocupavam Berlim e a Alemanha em prover alimentos para os setores
ocidentais daquela cidade (CSNU, 4º Relatório Oficial, p. 70).

1.4.4 Oil

Na Questão Palestina, o representante soviético afirmou que a responsabilidade pela


situação daquele país recaía sobre o Reino Unido e os Estados Unidos da América, cujos
interesses e empresas exploradoras de petróleo buscaram revisar uma decisão da Assembleia
Geral tomada anteriormente (CSNU, 4º Relatório Oficial, p. 47).

1.5 5º Anuário (16 de julho de 1949 a 15 de julho de 1950)

1.5.1 Water / Supply

O representante do Paquistão citou um inglês para informar que as nascentes da


Caxemira irrigam três dos principais rios do Paquistão e que a anexação desse estado pela
Índia a colocaria numa posição de controlar tal suprimento de água
(CSNU, 5º Relatório Oficial, p.19). A resposta indiana tratou da questão sobre o corte
ocorrido em 1 de abril de 1948 como um problema paquistanês, no sentido de que não se

82
esforçara para entrar em novo acordo após a expiração do último, sobre o fornecimento de
água (CSNU, 5º Relatório Oficial, p. 21).
O que se destaca desse caso é a possibilidade de corte e/ou modificação do curso
normal de água para um Estado, o que passa a sonegar a própria subsistência àquele que se vê
desprovido de um insumo básico.
Sobre o conflito no Oriente Médio pela água, Benincá escreveu em específico sobre
a Síria e, ao tratar da proteção jurídica da água em conflitos armados, citou os artigos (alguns
já extensamente citados neste trabalho): 35(3), 51 (5) (b), 52, inciso II, 54, 55 e 56 do PA I à
Convenção de Genebra, (Benincá, 2019, p.36); artigos 14 e 15 do PA II à Convenção de
Genebra.
A autora explica que, embora para a ONU Water a “relação entre água e conflito
deve ser colocada dentro do paradigma da segurança humana” (Benincá, 2019, p. 31), o termo
“água como arma” não está inscrito formalmente no DI e seus tratados, ainda que seja
utilizado pela doutrina “para definir ‘um meio de ganhar vantagem estratégica, material ou
mental sobre um adversário dentro de um conflito’” (King, M. D.; apud Benincá, 2019, p. 35).
Em seu trabalho, Benincá destaca o papel da escassez de água no conflito Sírio e
expõe a seca dos anos que o antecederam e suas consequências, como a diminuição de
rebanhos (Benincá, 2019, p. 130), a produção de trigo e cevada (Benincá, 2019, p. 129) e a
capacidade das famílias em satisfazerem suas necessidades básicas (Benincá, 2019, p. 130).
A Guerra na Síria e este conflito resultaram em resoluções que, por exemplo, buscam
resolver os problemas da região do Mediterrâneo através da intensificação de um diálogo de
“‘cooperação econômica, social, cultural e ambiental na região’” (A/RES/68/87 apud
Benincá, p. 224). Ainda, a Assembleia Geral observou
a grande importância no desenvolvimento da legislação de aquíferos
transfronteiriços para as relações entre os estados, e a necessidade de assegurar,
através da cooperação internacional, razoável, e adequada gestão de aquíferos
transfronteiriços, que são um recurso natural de importância vital (A/RES/66/104
apud Benincá, p. 225).
Parece evidente que a resistência para o reconhecimento e consequente inserção do
meio ambiente, de maneira formal no DI durou décadas e, somente nos anos 10 deste século é
que a Assembleia Geral reconheceu a necessidade de legislar propriamente sobre, por
exemplo, a água, mesmo que, não obstante, o Conselho de Segurança já tenha trabalhado com
este recurso natural desde os seus primórdios.

83
1.5.2 Food

A palavra aparece somente na disponibilidade de dois países, Nicarágua e Tailândia,


em entregarem comida e artigos alimentícios para a Coreia
(CSNU, 5º Relatório Oficial, p. 34).

1.6 6º Anuário (16 de julho de 1950 a 15 de julho de 1951)

1.6.1 Water

Quanto à modificação do rio Jordão por parte de Israel, o representante da Síria


afirma que seus nacionais, habitantes da então zona desmilitarizada, protegiam suas terras da
expropriação israelense. Além disso, rejeita o reclamo de soberania de Israel sobre aquelas
terras e dá seis razões pelas quais a Síria é contra as obras de drenagem e, dentre elas, quatro
importam sobremaneira ao presente estudo:
(1) Israel gozaria de vantagem militar; (2) O projeto adicionaria mais refugiados aos
que já esgotavam a Síria; (3) Síria seria obrigada a estabelecer novos postos de
observação militares na área drenada; (4) Aprofundar o leito do rio Jordão tornaria
impossível a irrigação das terras árabes molhadas pelo rio;
(CSNU, 6º Relatório Oficial, p.70).
Em outras palavras, a modificação do ambiente natural aumentaria o número de
refugiados, prejudicaria o abastecimento de água da agricultura e da sociedade e se trataria de
uma manobra com fins militares, prática que, posteriormente, resulta na convenção ENMOD,
após o uso de agente laranja no Vietnã.
Vale trazer outro autor, Gilberto Luciano dos Santos, que escreveu sobre o conflito
árabe-israelense. Ele denuncia e resume o conflito da seguinte maneira:
Para melhor compreensão, e visando tornar-se um material de apoio a futuras
pesquisas nesta esfera, apresenta-se em detalhes de que maneira se constitui o
conjunto hidrográfico em Israel e de que forma a hidrografia da região passou para
controle israelense.
Observar-se-á que a ONU não esteve inerte em face da guerra invisível da água, e
que suas resoluções são fruto de lutas e esforços em favor da manutenção da paz não
somente na Palestina, mas também no cenário internacional
(DOS SANTOS, 2018, p. 75).
O autor remonta ao ano de 1897 e o Congresso Sionista realizado na cidade de
Basileia, informando que a questão hídrica de um futuro Estado naquela área já teria sido
abordada. Líder do movimento Sionista na Inglaterra, Chaim Weizmann escreveu ao premiê
britânico da época, David Lloyd George,
84
delineando o que entendia como o mínimo exigível de água para a criação do Lar
Judeu. Era necessário que o alto Jordão e as águas do rio Yarmouk estivessem
incluídas no futuro Estado (DOS SANTOS, 2018, p. 82).
Vê-se que a água, enquanto recurso natural, fazia parte do imaginário para conceber
um Estado ainda dois anos antes da Conferência de Haia. Ao discorrer sobre a guerra dos seis
dias, o autor expõe o projeto israelense de irrigar o deserto do Neguev através da manipulação
do rio Jordão como uma causa da formação da Organização para a Libertação da
Palestina (OLP) e a Guerra dos Seis dias (DOS SANTOS, 2018, pp. 84-86).
O seguinte excerto, de 1979, é muito ilustrativo para os esforços deste trabalho em
conectar o meio ambiente ao conceito de segurança:
Em 1979, [...] o então presidente egípcio, Sadat, afirmou que o único motivo que
poderia levar este país novamente a uma guerra seria a água (KHADER apud
DOS SANTOS, 2018, p. 76).
Da conclusão do trabalho, extrai-se uma explicação pertinente ao tema da segurança
ambiental, já que contém uma afirmação do autor que é basicamente descritiva do conflito
envolvendo a água e até onde os atores envolvidos estão dispostos a ir para a consecução de
seus interesses estatais apesar do DI:
Diante do exposto neste estudo, constata-se que o ordenamento jurídico israelense
aplicado à Cisjordânia e à Faixa de Gaza não está de acordo com o Direito
Internacional no que tange aos direitos humanos e ao direito humanitário. Israel
afirma reconhecer a autoridade das Conferências de Paz de Haia de 1899 e 1907,
porém, somente aplica aquilo que não entra em conflito com seus interesses
hídricos. Além disso, por mais que os árabes invoquem a Quarta Convenção de
Genebra, de 1949, na luta pela tutela e garantia de seu direito humano de acesso à
água, as autoridades israelenses ignoram esse documento, afirmando que este
tratado deve ser aplicado a territórios ocupados, pertencentes a uma jurisdição
estrangeira. Entretanto, Gaza e Cisjordânia seriam territórios administrados, não
estando mais sob jurisdição egípcia e jordaniana, e as Colinas do Golã, conquistadas
da Síria, sequer são discutidas por Israel, haja vista ser para os judeus um caso
consumado, ou seja, estão inseridas no mapa do Estado israelense (DOS SANTOS,
2018, p. 166).
Ao término da Guerra dos Seis dias, iniciada após a criação do Estado de Israel, em
1948, e cujo conflito hídrico aparece nas resoluções que são objeto deste trabalho, houve o
desfecho de submeter as regiões ocupadas por Israel
“a um regime legislativo militar. A ordem militar n. 92 dispunha que todos os
recursos hídricos dos novos territórios passavam a ser ‘recursos estratégicos sob
controle militar’” (KHADER apud dos Santos, 2018, p. 101).
Também como consequência do conflito, “Israel aumentou seu potencial hídrico em
aproximadamente 50%, sendo constatado o controle de aproximadamente 80% dos aquíferos
da região” (CAOUETTE apud DOS SANTOS, 2018, p. 101). Extraem-se tais excertos porque
são, em si, um argumento: a aparição da palavra água no CSNU e as resoluções sobre a

85
questão palestina são o próprio objeto, vivo, criador de direito e expectativa de direitos,
obrigações, etc. Ademais, o são porque é no resultado posterior, desde a década de sessenta,
que os objetivos militares dos Estados e aquilo que consideram sensível para se travar uma
guerra são evidenciados.
A disputa pelo controle da água é um tema no qual também se cristaliza, por assim
dizer, o conteúdo ambiental relevante para a construção posterior do conceito de segurança.
Como visto na exposição sobre o conceito de segurança, a mudança ambiental e os recursos
naturais enquanto causa de conflitos violentos são já uma realidade do DI, DIA e DIH.

1.6.2 Life

A aparição dessa palavra, a seguir, é importante, pois está no mesmo parágrafo que
as expressões “assegurar a sobrevivência do homem” e a “coexistência pacífica das nações”,
além de figurar como uma parte da expressão ways of life, isto é, modos de vida. O
representante do Equador se adereçava à Guerra Fria e a presença dessa expressão, ways of
life, remete diretamente ao meio ambiente e à proteção ambiental.
Por “modos de vida” se entende, necessariamente, modos de existir nesse planeta, na
biota, e não apenas politicamente, já que, se esse fosse o significado, a manifestação se
preocuparia em utilizar a palavra “política”, ou “visões políticas”, ou “modelos políticos”
(CSNU, 6º Relatório Oficial, p.21). Tal manifestação ocorreu durante a discussão sobre o
reclamo de agressão sobre a República da Coreia.
A palavra volta novamente a aparecer junto da palavra propriedade, na expressão
“perda de vidas e propriedade”, numa fala do representante soviético sobre o ataque
americano à China, no começo da guerra da Coreia (CSNU, 6º Relatório Oficial, p. 49).

1.6.3 Natural Resources

A segunda vez que natural resources aparece no Conselho de Segurança é uma


manifestação do representante Chinês sobre uma condição imposta pela URSS sobre a
exploração dos recursos naturais da Manchúria, no momento do fim da ocupação daquela
região (CSNU, 6º Relatório Oficial, p. 56).

86
1.6.4 Natural

A palavra natural remete à barreira militar natural, ou seja, a um bem do ecossistema


que acaba por ter serventia militar. A mudança do meio ambiente para fins militares, o que já
é tema de tratado, vê sua razão de ser até agora, principalmente na Questão Palestina e, por
exemplo, em uma das razões expostas pela delegação síria: “(1) Drenar o lago Huleh levará os
israelenses ao gozo de uma vantagem militar não igualmente aplicável aos sírios;” (CSNU, 6º
Relatório Oficial, p. 69).

1.6.5 Food

A palavra aparece em uma denúncia soviética de bombardeios estadunidenses


indiscriminados, relatados em comunicações oficiais entre a URSS e a República Popular
Democrática da Coreia. Também, houve a demoção forçada de civis do norte para o sul sem
que as forças estadunidenses os provessem com água, comida ou abrigo, segundo o
representante soviético (CSNU, 6º Relatório Oficial, p. 29).

1.6.6 Oil

A palavra oil aparece no caso sobre a proteção da companhia anglo-iraniana de


petróleo. Há, naquele contexto, a vontade iraniana de nacionalização da exploração
petrolífera, por exemplo (CSNU, 6º Relatório Oficial, p. 102). Para o representante do Reino
Unido, a questão possuía três pontos importantes: a questão legal da liberdade de passagem
pelo canal de Suez, “o bloqueio que impossibilitou o trânsito de cargueiros petrolíferos até a
refinaria de Haifa e continuação de restrições que contribuíam para o estado de tensão no
Oriente Médio” (CSNU, 6º Relatório Oficial, p. 67).

1.7 7º Anuário (16 de julho de 1951 a 15 de julho de 1952)

1.7.1 Water / natural

A palavra water aparece em uma discussão entre o representante israelense e o


egípcio, na qual o primeiro trata, dentre outras, da questão das “águas do Jordão”(p. 9).Em

87
uma reclamação do Reino Hashemita do Jordão, documentos são apresentados e neles há a
informação de que a quantidade de água retida por Israel baixou o nível do rio Jordão,
aumentando sua salinidade e impedindo a irrigação (CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 14).
Aqui, se relacionada com as outras aparições do caso, vê-se que a alteração do leito
do rio, essa retenção de suas águas, tanto significou uma alteração do meio ambiente para fins
militares, quanto um perigo de dano à agricultura e à economia – consequentemente à
possibilidade de existência e ao bem-estar – das populações que se servem desse recurso
natural em específico.

1.7.2 Oil / life / Natural Resources

Novamente, a companhia anglo-iraniana entra em questão. Agora, o Reino Unido


traduz os tais três pontos de uma forma mais elaborada:
Primeiramente, a liberdade de navegação e comércio internacionais era da mais alta
importância para o Reino Unido e para todos os demais países marítimos. Segundo,
a proibição da passagem de cargueiros petrolíferos pelo canal de Suez até a refinaria
de Haifa havia causado grande inconveniente ao Reino Unido, e afetado quase todos
os países da Europa Ocidental. Finalmente, era uma questão de pesar que a situação
política no Oriente Média ainda permanecesse sem resolução
(CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 8).
O representante do Reino Unido apresentou um projeto de resolução após requerer a
inclusão deste item na pauta. No projeto, requeria que medidas provisórias fossem tomadas
ante a atitude iraniana “calculada para causar sérios danos à vida e à propriedade”
(CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 23). O representante soviético afirmou que a nacionalização
de indústrias seria um assunto da jurisdição interna de cada país
(CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 23).
Em seus argumentos, o Irã afirma que, sendo um dos piores padrões de vida do
mundo, a indústria petrolífera deveria ter contribuído mais e melhor para o bem-estar de seus
18 milhões de habitantes na época. Além disso, ela também não havia contribuído para o
progresso técnico e desenvolvimento industrial, mesmo após meio século de exploração por
um país estrangeiro (CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 26).
Aqui, a palavra oil aparece juntamente das expressões well-being, technical progress
e industrial development. Esses aspectos, diretamente ligados à proteção ambiental, não foram
sequer vantagens obtidas pelo país sede da exploração que, no fim, é quem vai arcar com as
consequências daquela exploração da natureza, seja no momento de sua extração, seja depois,

88
como membro do planeta, em virtude das mudanças climáticas. A isso se deve a aparição
dessa discussão no presente trabalho.
Após ser acusado de causar ameaça à paz internacional, ou de ser uma potencial
ameaça, o Irã argumentou que não dispunha de recursos para travar a guerra, ao contrário do
Reino Unido, que havia feito uma demonstração de força para impedi-lo de exercer sua
soberania sobre seus recursos naturais. A expressão natural resources aparece, então, pela
terceira vez no Conselho de Segurança.

1.7.3 Gas

Na primeira vez que a palavra gas aparece no Conselho de Segurança é em uma


discussão sobre armas bacteriológicas e o suposto uso de armas químicas e biológicas na
guerra da Coreia por parte das forças estadunidenses.
O representante soviético, na consideração da proposta de resolução de seu país,
afirma que 48 Estados assinaram o Protocolo de Genebra sobre Armas Bacteriológicas, com
exceção dos Estados Unidos, Japão, Brasil, Nicarágua, El Salvador e Uruguai
(CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 31).
O representante do Brasil afirma que apenas o medo de retaliação impediu o uso de
armas químicas e bacteriológicas na Segunda Guerra Mundial, e que o Protocolo de Genebra
não excluía a armazenagem de tais armas (CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 32). Então, ele
ainda afirma que o esforço internacional deveria ser direcionado à produção de um
instrumento que afastasse o uso de armas de destruição em massa. O termo mass destruction
também aparece, portanto, pela primeira vez nas discussões do Conselho de Segurança
(CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 33).
A discussão prossegue e, de forma secundária, pois está interligada somente com os
escritos de Weeramantry, é importante mencionar que, no que se refere ao uso de tais armas,
o representante soviético argumenta que é somente a certeza de ausência de retaliação que
obstou o uso de armas químicas na Segunda Guerra Mundial, e cita como exemplo o uso de
tais armas na Etiópia.
Se o país africano pudesse ter retaliado, afirma, não teria havido tal uso. O Protocolo
de Genebra, então, não seria a principal razão de impedimento já que, enquanto agressor,
pouco se poderia esperar quanto ao cumprimento de suas obrigações internacionais
(CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 39).
89
Por fim, no dia 11 de agosto de 1951, o ministro de assuntos estrangeiros da
República Popular Democrática da Coreia acusou os Estados Unidos da América de utilizar
bombas com agentes químicos durante o conflito (CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 66).
Essa discussão e a aparição da palavra são importantes, pois, são encima desses fatos
e argumentos que a necessidade de proteção ambiental e de controle de tais armas é
construída. É na contraposição de fatos, argumentos e atitudes de quem argumenta que a valia
de tal ou qual posição pode ser verificada igualmente. Esta última não faz parte dos objetivos
deste estudo, mas, de qualquer forma, não haveria motivo para não retratar o contexto do
primeiro uso da palavra gas no Conselho de Segurança, ainda mais que tais agentes, após
dispersão, não diferenciam a vida humana das demais.

1.7.4 Health

Na 579º reunião do Conselho, foi abordada a questão sobre o pedido de investigação


da alegada guerra bacteriológica (CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 40). A Organização Mundial
da Saúde atuou na parte Sul para diminuir os efeitos do tifo e da peste bubônica que, durante a
guerra, cresceram epidemicamente (CSNU, 7º Relatório Oficial, p.44).
Os debates se politizam ao ponto de os Estados Unidos da América afirmarem que o
caso se trata de uma campanha de mentira e ódio, enquanto URSS e China dizem que se
tratou de guerra bacteriológica. As autoridades norte-coreanas e chinesas proibiram a entrada
do órgão no território do norte (CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 46). A URSS afirmou
categoricamente que recebera as provas do ataque bacteriológico
(CSNU, 7º Relatório Oficial, p. 47) por parte dos chineses e norte-coreanos.
Os norte-coreanos, em um telegrama, informaram ao Conselho que haviam tido
sucesso em controlar a epidemia e desconheciam a autoridade da OMS à época, alegando que
ela não havia sido capaz de perpetrar as tarefas a si designadas e, por isso, a menção ao órgão
era apenas uma forma de os Estados Unidos não firmarem uma posição de proibir armas
bacteriológicas (CSNU, 7º Relatório Oficial, p.47).

90
1.8 8º Anuário (16 de julho de 1952 a 15 de julho de 1953)

1.8.1 Water / supply / food

O representante do Paquistão afirma que a invasão indiana foi analisada, por parte de
seus militares, como uma ameaça que não se poderia deixar passar de determinado ponto,
uma vez que daria uma posição muito vantajosa aos indianos. Além de justificar as ações
militares paquistanesas como defesa, já que não havia obrigação internacional para com a
Índia e que esta nunca havia ocupado o território que alegava a anexação, ou mesmo feito
plebiscito quando possível (CSNU, 8º Relatório Oficial, p. 11).
O suprimento da água, tanto para o restante do Paquistão, quanto para o Punjab
paquistanês foi descrito como a possibilidade de a Índia transformar o Paquistão em um
“deserto” (CSNU, 8º Relatório Oficial, p. 12), motivo pelo qual não queriam hostilidades e
nem estabelecer mecanismos de solução pacífica dos conflitos. A cessação do fluxo já havia
sido feita uma vez pela Índia (CSNU, 8º Relatório Oficial, p. 12).
No Punjab, o desvio de água por parte da Índia havia lhe ocasionado um déficit na
produção de comida, além de um superávit no lado indiano (CSNU, 8º Relatório Oficial, p.
14).

1.8.2 Life

Novamente, a expressão ways of life aparece no Conselho de Segurança. O


representante da União Soviética afirmou o apoio à posição de que
As Nações Unidas deveriam ser uma organização internacional de Estados livres e
soberanos, com diferentes estruturas políticas, ideologias e modos de vida, mas
unida sob um único nobre desejo e ideia – viver conjuntamente em paz e lutar em
conjunto pelo fortalecimento da paz e segurança internacionais na base de relações
livres e igualitárias (CSNU, 8º Relatório Oficial, p. 22).

1.8.3 Oil

A palavra aparece apenas protocolarmente e, mais uma vez, na questão envolvendo a


companhia anglo-iraniana de petróleo.

91
1.9 Resoluções

Após o exame dos relatórios, buscou-se no histórico de resoluções do Conselho de


Segurança uma forma mais direta de pesquisa para descobrir se há ou não considerações sobre
meio ambiente ou proteção ambiental entre 1946 e 1953. Alguns achados importantes são
resoluções que serviram de base para disciplinar conflitos envolvendo a exploração de
recursos naturais, ainda que tal resolução e seu consequente tratado não falem direta e
explicitamente sobre meio ambiente ou proteção ambiental, como no caso do Armistício
Geral assinado entre Jordão e Israel, na questão Palestina, em 1949.
Um caso parecido, mas que resulta numa disciplina legal que aborda diretamente a
exploração de recursos naturais – a água, novamente – é o Inter-Dominion Agreement,
Between the Government of India and the Government of Pakistan, on the Canal Water
Dispute between East and West Punjab. Aqui, a cobrança de taxas pela exploração do recurso
hídrico e a manutenção de seu fornecimento são disciplinados.
Por fim, o achado mais importante é a Resolução 21, de 1947, que estabelece o
Acordo de Tutela sobre Ilhas no Pacífico que estavam, antes do término da Segunda Guerra
Mundial, sob o jugo do Império do Japão. Sem dúvidas, neste acordo, há considerações sobre
meio ambiente e proteção ambiental, culminando, ainda que não com esses termos, no
primeiro dever de proteção ambiental normatizado em razão de uma resolução do Conselho
de Segurança da ONU. A Resolução 70, de 1949, estabelece que o Conselho do Acordo de
Tutela deve submeter ao Conselho de Segurança, por exemplo, suas recomendações sobre
assuntos políticos, econômicos e sociais, tarefa atrelada aos artigos de proteção ambiental da
Resolução 21 de 1947.

1.9.1 1º Anuário (15 de janeiro a 17 de julho de 1946)

Não foi encontrada resolução que abordasse a proteção ambiental, fizesse


considerações sobre ela, ou que tocasse no tema de forma indireta e relevante, através de seus
resultados normativos.

92
1.9.2 2º Anuário (16 de julho a 15 de julho de 1947)

Neste ano, a única resolução, e a mais importante da pesquisa, foi encontrada. A


Resolução 21. Nela, as expressões natural resources e agriculture são encontradas no texto
legal da seguinte forma, sob o Artigo 6 (2) (3) doTAFJMI:
2. Promover a promoção econômica e a autossuficiência dos habitantes, devendo
para este fim regulamentar a utilização dos recursos naturais; encorajar o
desenvolvimento da pesca, agricultura e indústrias; proteger os habitantes contra a
perda de suas terras e recursos; e melhorar os meios de transporte e comunicação;
3. Promover a promoção social dos habitantes e para tal proteger os direitos e
liberdades fundamentais de todos os elementos da população sem discriminação;
proteger a saúde dos habitantes; controlar o tráfico de armas e munições, ópio e
outras drogas perigosas, álcool e outras bebidas espirituosas; e instituir quaisquer
outros regulamentos que possam ser necessários para proteger os habitantes contra
abusos sociais; (S/RES/21, 1947) (Grifo pelo autor).
O desenvolvimento econômico e a autossuficiência dos habitantes nativos dessas
áreas de jurisdição estão submetidos através de certas formas, como o desenvolvimento da
pesca, agricultura e indústria, e estão protegidos os habitantes, como forma de
desenvolvimento econômico e autossuficiência, contra a perda de terras e recursos. O avanço
social dos nativos inclui a proteção de sua saúde, o que significa que a autoridade
administradora deve promover o desenvolvimento econômico, autossuficiência dos habitantes
e o avanço social através da proteção contra a perda de recursos naturais e terras e a proteção
à sua saúde.
Perder recursos naturais não pode significar apenas perder títulos de terras para
habitar ou explorar, pois a proteção contra perda de terras está num termo próprio, ele mesmo,
e a perda de títulos de terras para habitar ou explorar (loss of land) não pode significar uma
proibição que exclui os recursos naturais. Para o presente autor, a norma usou dois termos,
loss of land e natural resources, possibilitando interpretar que se referiu à vida civil humana,
atividade econômica que se apropria da natureza, e seu objeto de apropriação e meio de vida,
natural resources.

1.9.3 3º Anuário (16 de julho de 1947 a 15 de julho de 1948)

Dezesseis resoluções sobre a Palestina existem no terceiro anuário. Embora a questão


da água entre Israel e Jordânia seja resolvida posteriormente, inclusive após o interregno
temporal desta pesquisa, acredita-se que se a Convenção ENMOD, que proíbe a modificação
da natureza como arma de guerra, existisse nessa época, poderia ter sido utilizada ou ter sua
93
aplicação sugerida pelas partes em conflito. Hipóteses não confirmáveis à parte, a Resolução
62 estabeleceu um armistício geral (S/RES/62, 1948) que será utilizado futuramente para
tratar da questão da exploração da água. A Resolução 46 também determinou o
estabelecimento de trégua durante os conflitos na Palestina e criou o item (e) que menciona
suprimentos de água e comida, além de saúde, enquanto uma medida para ser promovida
pelas partes:
(e) Cooperar com as autoridades mandatárias para a manutenção eficaz da lei e da
ordem e dos serviços essenciais, particularmente os relacionados com transporte,
comunicações, saúde e abastecimento de alimentos e água (S/RES/46, 1948).
Na questão Índia e Paquistão, vale citar, novamente, a questão da água, tanto porque
aparece nos relatórios das discussões do Conselho, como também porque um acordo é
celebrado entre as partes, referindo-se ao fornecimento de água e manutenção de seu fluxo. É
este acordo que resultará, em 1960, no acordo sobre as águas hindus43, que trata extensamente
deste recurso natural.
Embora não haja menção explícita nas resoluções sobre essa questão para que haja
um acordo sobre as águas do Punjab, ainda que reclamações sobre o fluxo de água do rio
dessa região existam nos relatórios, a Resolução 38, de 17 de janeiro, determina que os países
devam encontrar um lugar comum (common ground) (S/RES/38, 1948), sem mencionar este
recurso natural. No dia 4 de maio do ano de 1948 foi celebrado o Inter-Dominion Agreement,
Between the Government of India and the Government of Pakistan, on the Canal Water
Dispute between East and West Punjab. Este acordo disciplina a manutenção de fornecimento
de água de uma para a outra parte, até que uma alternativa seja encontrada, bem como a
cobrança de taxas para a outra utilizar a água. Em outros termos, este é um acordo sobre
exploração de recursos naturais num conflito discutido sob o Conselho de Segurança, ainda
em 194844.

43
Sobre esse tratado e o histórico dessa relação da questão Índia-Paquistão com a água, ver o domínio
https://ciaotest.cc.columbia.edu/olj/sa/sa_oct01app01.html.
44
Uma disputa surgiu entre os governos de Punjab Oriental e Ocidental em relação ao fornecimento
de água pelo Punjab Oriental para o Bari Doab Central e os canais Depalpur no Punjab Ocidental. [...]
2. O Governo do Punjab Oriental restabeleceu o fluxo de água para esses canais em certas condições,
duas das quais são contestadas pelo Punjab Ocidental. Uma delas, que decorre do argumento do parágrafo 1, é o
direito à cobrança de taxas de senhoriagem pela água e a outra é a questão do custo de capital da Madhopur
Head Works e dos canais de transporte a serem levados em consideração.
[...]
Sem prejuízo de seus direitos legais no assunto, o Governo do Punjab Oriental assegurou ao Governo
do Punjab Ocidental que não tem nenhuma intenção de reter repentinamente a água do Punjab Ocidental sem lhe
dar tempo para recorrer a fontes alternativas (Inter-Dominion Agreement, 1948).
94
Na questão sobre a Indonésia, a expressão property of any kind aparece para proibir
que sabotagem, intimidação ou represália recaiam sobre qualquer tipo de propriedade, de
qualquer pessoa, bem como proíbe as partes de se utilizarem dos meios dispostos ao seu
comando para tanto. Isso está presente no acordo de Renville, assinado em 17 de janeiro de
1948 entre a República da Indonésia e a Holanda:
7. Que este acordo deve incluir todos os seguintes pontos já acordados em princípio
pelas partes:
(a) Proibir sabotagem, intimidação e represálias e outras atividades de natureza
semelhante contra indivíduos, grupos de indivíduos e propriedade, incluindo a
destruição de propriedade de qualquer tipo e por quem quer que seja, e utilizar todos
os meios ao seu alcance para esse fim (Acordo de Renville, 1948).
A Resolução 67, de 1949, busca promover o acordo de Renville, instituindo o
Committee of Good Offices como a Comissão das Nações Unidas para a Indonésia, dando, por
exemplo, como tarefa para ajudar as partes a implementar o acordo, restaurar a administração
da República da Indonésia observando a proteção da vida e da propriedade (S/RES/67, 1949),
o que já é um dever das partes perante o supracitado acordo.

1.9.4 4º Anuário (16 de julho de 1948 a 15 de julho de 1949)

Não há resolução sobre a questão palestina que se refira ao meio ambiente ou faça
considerações sobre proteção ambiental, ainda que durante as discussões os tópicos tenham
sido abordados sob a forma de denúncia do uso de água como arma de guerra, no caso do
corte de suprimento de água para Jerusalém. O acordo de armistício geral, assinado entre
Israel e Jordânia em Rodes, em 1949, será referenciado pelo Conselho de Segurança em 1951
e servirá para disciplinar questões envolvendo a exploração de recursos naturais, que será
trabalhado posteriormente.
Na questão Indonésia, aparecem os termos economic well-being e economic
measures ao tratar da transferência dos territórios sob a jurisdição holandesa e tutelados pelo
acordo de Renville para a República da Indonésia. A comissão sugere o seguinte:
As recomendações da Comissão podem incluir provisões para as medidas
econômicas necessárias para o bom funcionamento da administração e para o bem-
estar econômico da população das áreas envolvidas em tais transferências
(S/RES/67, 1949, p. 4).
Sobre a questão da tutela das Ilhas do Pacífico, a Resolução 70 menciona a
necessidade de o Conselho de Tutela (Trusteeship Council) entregar relatórios e

95
recomendações ao Conselho de Segurança, dentre outros temas, sobre o desenvolvimento
econômico e social das áreas sob jurisdição dos acordos de tutela (S/RES/70, 1949).

1.9.5 5º Anuário (16 de julho de 1949 a 15 de julho de 1950)

Não foi encontrada resolução que abordasse a proteção ambiental, fizesse


considerações sobre ela, ou que tocasse no tema de forma indireta e relevante, através de seus
resultados normativos.

1.9.6 6º Anuário (16 de julho de 1950 a 15 de julho de 1951)

A implementação do armistício geral é tratada na Resolução 93 de 1951. Esse


contexto é melhor explicado por Rolf Schwarz, que também já trabalhou o tema envolvendo a
questão entre Síria, Jordânia, o rio Jordão e Israel sobre a exploração de água. Neste ano,
Israel começou a drenagem do lago Huleh, prevista dentro do plano de desenvolvimento Plan
All Israel, a fim de promover a irrigação. Isso gerou escaramuças contra os sírios, que
levaram a questão ao CSNU:
O Conselho de Segurança discutiu a questão durante abril e maio de 1951, e
finalmente adotou uma resolução ordenando o retorno dos cidadãos sírios às suas
casas na Zona Desmilitarizada. [...] Israel foi assim autorizado a realizar o programa
de drenagem e recuperação de terras como planejado e concluído em 1956. Israel
conseguiu, assim, a drenagem de 6.000 hectares do Lago Huleh e economizou cerca
de 60 m³ de água que antes se perdia por evaporação. Em setembro de 1953, Israel
iniciou o trabalho em seu projeto de desvio na estrutura de captação do National
Water Carrier (NWC) ao sul de Gesher B'not Ya'akov (Jisr Benat Ya'qoub). As
operações de construção israelenses foram realizadas sob a proteção das forças
israelenses e foram acompanhadas – como em 1951 – por trocas de tiros entre
tanques sírios e israelenses. Os sírios novamente levaram a questão ao Conselho de
Segurança da ONU , no qual foi discutida em outubro de 1953
(Schwarz, 2004, pp. 60-62).45
No ano de 1953, então, decidiu-se que o desvio promovido por Israel ia contra o
Acordo Geral de Armistício, e ao seu governo foi solicitada a paragem dos trabalhos na
margem oeste do rio Jordão na Zona Desmilitarizada (Schwarz, 2004, pp. 62).

45
A unidade, no original em inglês, é mcm, que traduziu-se para m³.
96
1.9.7 7º Anuário (16 de julho de 1951 a 15 de julho de 1952)

Não foi encontrada resolução que abordasse a proteção ambiental, fizesse


considerações sobre ela, ou que tocasse no tema de forma indireta e relevante, através de seus
resultados normativos.

1.9.8 8º Anuário (16 de julho de 1952 a 15 de julho de 1953)

Na questão palestina, o Conselho de Segurança, na Resolução 101, reitera o dever de


cumprimento do armistício assinado em 1949, que serviu como disciplina legal para tratar da
exploração de água. Não há, porém, aqui nem em outra resolução, menção expressa ou
considerações explícitas sobre proteção ambiental.

2 Considerações Finais

2.1 Considerações sobre os Anuários, as palavras escolhidas e Proteção ambiental

A expressão natural resources aparece três vezes em oito anos de Conselho de


Segurança. O resultado mais importante desta pesquisa nos anuários foi o TAFJMI. Esse
tratado possui a regulação de recursos naturais no mesmo artigo que recomenda a proteção da
propriedade. No Artigo 55 das Regulações de Haia também aparece a expressão agricultural
states e, portanto, a aparição da palavra agriculture, ainda que apenas neste tratado
supracitado, é significativa. Ademais, há o dever de promover a saúde da população, por parte
da autoridade administradora. Os testes de armas nucleares e seus efeitos relatados na opinião
consultiva de 1996 são uma violação flagrante do artigo sexto desse tratado internacional por
parte da autoridade administradora, e foram tema conflitos políticos e trabalhos acadêmicos
ao longo das décadas, até o fim do mandato estadunidense sobre esses territórios.

A aparição da palavra life conjugada com property nas aparições da expressão loss of
life and property são importantes em vista do mencionado Artigo 55 das convenções de Haia
de 1907. Se as florestas fazem parte do conceito de propriedade, pode-se dizer que o
Conselho de Segurança tratou, principalmente durante a Guerra da Coreia, sobre a proteção
ou o dever de proteção atingirem a vida humana e a propriedade – dentre as demais, as
florestas.
97
A modificação do ambiente natural para fins beligerantes, como no caso da Questão
Palestina, é flagrante e permite estatuir que o Conselho de Segurança, para tratar da paz
mundial e regional, levou em consideração os danos à irrigação, à agricultura e à
sobrevivência econômica de populações inteiras ao discutir sobre os níveis de água e
drenagem do Rio Jordão, ainda que uma convenção como a ENMOD tenha surgido apenas
anos depois, em virtude do uso do agente Laranja no Vietnã.

Os autores trazidos sobre o tema também demonstram como o conflito por recursos
naturais, a preocupação política com a água na questão da criação do Estado de Israel e todo o
contexto do conflito árabe-israelense estão permeados por considerações sobre o direito de
exploração do recurso, a manutenção da existência dos rios, a manutenção do seu fluxo e a
proteção ambiental, finalmente, quando dos seus ulteriores resultados normativos (que
ultrapassam o lapso temporal desta pesquisa). Também, na Questão Índia-Paquistão, o fluxo
de águas para o Punjab Paquistanês se encaixa nos termos acima. A palavra water teve suas
aparições importantes nesse contexto.

A primeira aparição da palavra water, no caso da violação das águas albanesas pela
marinha inglesa tem sua importância apenas no caso das minas antinavio, presentes na
convenção sobre minas marítimas de contato, positivada durante a Convenção VIII de Haia,
de 18 de outubro de 1907, na qual não há previsão de proteção ambiental.

É interessante notar como a palavra supply sempre aparece com a palavra food ou
water. Isto é óbvio, na verdade, uma vez que a comida e a água devem ser fornecidas à
população e para a agricultura. O Conselho de Segurança, portanto, fala indiretamente em
cadeias de suprimento de bens ínsitos à sobrevivência humana.

O petróleo, por sua vez, possui aparições muito mais restritivas no que diz respeito a
concebê-lo, no discurso, enquanto recurso natural. Discursos políticos, utilidade econômica,
comércio internacional e transnacionais foram as principais fontes de aparição da palavra.
Contudo, não deixa de ser um recurso natural cujo fornecimento é de extrema importância
para o funcionamento da economia global e matéria-prima dos combustíveis fósseis.

A palavra health apareceu nas discussões da Questão Palestina sobre o fornecimento


de água. Sendo assim, há um fio condutor entre a saúde humana, os recursos naturais e as
questões de segurança, mas, nesses anuários, a aparição mais importante da palavra é durante
98
a Guerra da Coreia, quando se trata das denúncias de guerra bacteriológica. Embora esta
denúncia não tenha sido formalizada numa questão realmente trabalhada pelo Conselho de
Segurança, trata-se de um tema regulado pelo PG-1925 e Pelas Convenções de Haia de 1907.

A ligação entre proteção ambiental e segurança, nesta aparição discursiva, encontra-


se no Art. 23 (a) e (e), conjuntamente com o conceito de propriedade enquanto florestas do
Art. 55. Ambos são artigos das Regulações de Haia de 1907 e, com uma análise fática e do
escopo dos prejuízos causados por armas bacteriológicas, venenosas, asfixiantes, etc., em
forma gasosa ou outras formas, elas não diferenciam a vida humana das demais após
dispersão.

No preâmbulo do PG-1925, estabelece-se que tal fora firmado: por “motivos justos
pela opinião geral do mundo civilizado”; que a proibição do tratado foi formulada nos
“tratados dos quais a maioria dos Estados do mundo são Parte” (PG-1925); a fim de tornar
“universalmente conhecida essa proibição como parte do Direito Internacional” (PG-1925).

No seu breve e expressivo texto legal, diz que a proibição dos gases asfixiantes,
tóxicos ou similares se estendem “ao emprego de meios bacteriológicos de Guerra” (PG-
1925). Essa proibição, portanto, vê-se impressa de um caráter geral, semelhante ao caráter que
Weeramantry comenta ao falar dos Princípios da Humanidade e dos Ditados da Consciência
Pública contidos na Carta da ONU.

Conceber o potencial destrutivo conjugado com esses artigos acima parece a forma
correta de argumentação e está de acordo com a forma de Weeramantry em fazê-lo,
afirmando a proibição de atentar contra a existência da comunidade a que determinado
ordenamento jurídico serve. Os Artigos 23 (a) e (e) tratam da proibição de emprego de armas
envenenadas ou com veneno e a proibição de causar sofrimento desnecessário. O
envenenamento de florestas ou os resultados de armas com veneno ou venenosas, bactérias,
etc., que prejudiquem florestas e causem sofrimento desnecessário aos humanos, são
proibidas. Em outras palavras, a proteção ambiental e o direito da guerra estão presentes
desde essas Regulações em Haia e durante essa denúncia.

Então, havendo tal proibição, e o conteúdo “forests” enquanto propriedade, pode-se


afirmar que o Conselho de Segurança estava vinculado a tal cabedal jurídico. Discorrer sobre

99
a denúncia importa em virtude de permitir indicar aquilo que é vinculado ao Conselho. Em
outras palavras, considerações sobre proteção ambiental no Jus in Bello estão presentes desde
essas Regulações em Haia.

2.1.1 A abordagem através das resoluções.

O levantamento dos anuários serve como uma introdução histórica à abordagem da


proteção ambiental pelo DIH. As normas trazidas por Dam-de Jong demonstram até a
anterioridade de algumas proteções e conceitos. O CSNU, por sua vez, já tratava naquela
época sobre proteção ambiental, chegando a regular o uso de recursos naturais, vinculado à
proteção da saúde humana, à proteção da propriedade, etc. – artigo sexto do TAFJMI.
A destruição ambiental é expressamente proibida, como demonstrou Weeramantry,
em sua exegese sobre o uso ou ameaça de uso de armas nucleares, ou armas super-destrutivas.
A pesquisa nas resoluções parece revelar que o Conselho de Segurança não conseguiria
cumprir seu papel sem tratar da proteção ambiental. A tutela das Ilhas do Pacífico, a Questão
Palestina e a Questão Índia-Paquistão são exemplares para mostrar que o conselho teve que
abordar o meio ambiente, e as partes dos conflitos pensaram e se importaram com a proteção
ambiental.
A proteção de qualquer tipo de propriedade, presente no acordo Renville, e o dever
de proteger contra a perda de terras e recursos, presente no TAFJMI, são exemplos de uma
proteção ambiental mais interessada em preservação do meio ambiente como um direito do
habitante (Renville e TAFJMI) e como condição para existência da administração externa
(TAFJMI).
Embora o Conselho de Segurança fale sobre a proteção ambiental sem esse nome, ou
seja, através daquilo que não pode ocorrer sem que haja proteção ao meio ambiente (proteger
qualquer tipo de propriedade, proibir a perda de terras e de recursos, manter o fluxo dos rios,
acabar por permitir ou interromper a consecução dos trabalhos de drenagem do rio Jordão),
ele está a todo momento trabalhando com situações de escassez de água; ouvindo denúncias
de envenenamento de solo e lençóis freáticos; disciplinando zonas desmilitarizadas
importantes para dar seguimento, ou não, à mudança de cursos de água; interrupção da cadeia
de suprimentos de água e comida, de petróleo; sobre proteção à vida, bem-estar da população
e sua sobrevivência.

100
É claro que nos primeiros oito anos de existência do Conselho a proteção ambiental
aparece mais sob seus aspectos fáticos e o que já havia de normas internacionais positivadas,
do que sob um conceito próprio, ou seja, um campo próprio do DI, com conceitos e objetivos
delimitados, além de amplo respaldo científico na averiguação dos fatos a que pretende evitar,
regular ou aquilo que busca promover.
Esse, porém, não poderia ser o objetivo, ou seja, usar argumentos para retroceder
fatos no tempo. A pesquisa possibilitou entender que a proteção ambiental não foi uma
invenção conceitual que buscava implementar ideias no mundo concreto, mas o resultado de
raciocínios desenvolvidos nas discussões do Conselho, os anseios e interesses das partes, as
proibições ou os deveres de fazer, derivados de acordos internacionais anteriores. A proteção
ambiental foi um resultado conceitual da realidade dos conflitos humanos internacionais.
Esse conceito é uma ferramenta para tratar dos conflitos internacionais, os interesses
ali dispostos, sobretudo por parte da população, no seu desenvolvimento social e econômico,
além de ser uma forma de facilitar o trabalho do próprio Direito Internacional que parece,
desde essa época, precisar de mais do que possuía para tratar da questão Palestina, da questão
Índia-Paquistão e, mais ainda, da tutela americana sobre as Ilhas do Pacífico que, mais tarde,
se tornariam palco de testes nucleares.
O uso do voto dissidente de Weeramantry na OC sobre a Legalidade da Ameaça ou
Uso de Armas Nucleares, portanto, mostrou-se uma metodologia adequada para, além de
averiguar as considerações sobre proteção ambiental no objeto de pesquisa, fundamentar uma
interpretação dinâmico-evolucionária do conceito de segurança ambiental ou, pelo menos,
uma forma de captar sua construção durante o tempo, além de possibilitar, após essa tarefa,
lançar uma hipótese que será discutida no Subtópico 6.3.

2.2 As principais normas encontradas

2.2.1 Acordo de Tutela, proteção de terras e recursos e o Desenvolvimento social

Antes de falar sobre este acordo, muito pouco foi possível encontrar sobre o acordo
de Renville, e sua brevidade tem a ver com a escassez de trabalhos sobre ele. Não foi
encontrado nenhum trabalho falando sobre o Artigo 7 (a),mas, sim, sobre os aspectos políticos
e a deflagração do conflito guerrilheiro que levou à expulsão dos Holandeses e seu papel na
história da República da Indonésia. Nada, portanto, que valha a pena ser mencionado.
101
Abordar especificamente esses acordos foi a opção de procurar demonstrar neste trabalho os
desdobramentos dos dois exemplos de presença de considerações ambientais em resultados
normativos, durante os anos de 1945 e 1953 no Conselho de Segurança. O Acordo de Tutela
das Ilhas do Pacífico é, sem dúvidas, o exemplo mais eloquente, inclusive dentre os demais
assuntos tratados, como a questão da água na Palestina ou no Punjab.
A região sob a jurisdição da tutela passou do Império Espanhol ao Império Alemão
e, com o término da Primeira Guerra Mundial, ao Império do Japão. A sua importância
aconteceu na época das navegações a vapor, já que as localidades se encaixavam na
concepção de Alfred Thayer Mahan sobre “teorias de impérios marítimos baseados em
estações de reabastecimento espalhadas pelo mundo” (LEE, 1998, p. 5).
Ademais, afirma-se que o racismo dos europeus ao longo dos séculos fundamentou a
concepção jurídica do Direito Internacional, inclusive até o século XIX, no qual
‘apenas estados europeus eram totalmente soberanos [; e] Estados não-europeus [...]
existiam fora do reino do Direito e, portanto, não poderiam opor legalmente a
vontade soberana dos estados Europeus’ (LAWRENCE, THOMAS., apud LEE,
1998, p. 6).
Para Hyun S. Lee, os acordos de tutela deveriam ter sido os “meios de alcançar a
nobre aspiração de autodeterminação originalmente articulada na Liga das Nações” uma vez
que, em suas palavras, esses acordos podem ser assim descritos:
Os Estados-nação que aceitaram uma Tutela sob a ONU, aceitaram uma confiança
sagrada de promover o bem-estar dos habitantes tutelados. A Carta das Nações
Unidas reconhece que os interesses dos habitantes de Tutelas recém-criados são
‘primordiais’. Isso também requer que os membros das Nações Unidas que aceitem
a responsabilidade do acordo reconheçam a ‘obrigação de confiança sagrada’ cujos
beneficiários são os habitantes dos territórios sob a Tutela (LEE, 1998, p. 8).
Além disso, para Hyun S. Lee, os Artigos 7346,7547 e 7648 da Carta das Nações
Unidas são bastante claros para se poder afirmar que o objetivo do sistema de Tutela é o bem-

46
CAPÍTULO XI DECLARAÇÃO RELATIVA A TERRITÓRIOS SEM GOVERNO PRÓPRIO
ARTIGO 73 - Os Membros das Nações Unidas, que assumiram ou assumam responsabilidades pela
administração de territórios cujos povos não tenham atingido a plena capacidade de se governarem a si mesmos,
reconhecem o princípio de que os interesses dos habitantes desses territórios são da mais alta importância, e
aceitam, como missão sagrada, a obrigação de promover no mais alto grau, dentro do sistema de paz e segurança
internacionais estabelecido na presente Carta, o bem-estar dos habitantes desses territórios e, para tal fim, se
obrigam a:
a) assegurar, com o devido respeito à cultura dos povos interessados, o seu progresso político,
econômico, social e educacional, o seu tratamento equitativo e a sua proteção contra todo abuso;
b) desenvolver sua capacidade de governo próprio, tomar devida nota das aspirações políticas dos
povos e auxiliá-los no desenvolvimento progressivo de suas instituições políticas livres, de acordo com as
circunstâncias peculiares a cada território e seus habitantes e os diferentes graus de seu adiantamento;
c) consolidar a paz e a segurança internacionais;
102
estar e desenvolvimento dos habitantes dos territórios tutelados. É válida a menção do Artigo
7449, pois a “boa vizinhança”, ou good neighbourliness é utilizada, segundo o autor, pela
autoridade administradora americana para fundamentar legalmente a sua iniciativa em limpar
os transformadores elétricos que liberavam ascarel, no lugar de fundamentar esta medida
como uma obrigação legal advinda da Carta da ONU nos seus artigos sobre o sistema de
tutela, ou mesmo o próprio acordo de tutela das Ilhas do Pacífico.
Além disso, o Artigo 8450 da Carta da ONU impingia à autoridade administradora o
dever de usar o território para manter a paz e a segurança mundiais (LEE, 1998, p. 22). O
Artigo 8251, por sua vez, permitia a designação de áreas estratégicas. Trazer essas normas,
além de informar os argumentos de Hyun S. Lee, é uma forma de ilustrar a adição que este
trabalho faz, ao trazer o Artigo 82 no que concerne às armas nucleares, pois é significativo

d) promover medidas construtivas de desenvolvimento, estimular pesquisas, cooperar uns com os


outros e, quando for o caso, com entidades internacionais especializadas, com vistas à realização prática dos
propósitos de ordem social, econômica ou científica enumerados neste Artigo; e
e) transmitir regularmente ao Secretário-Geral, para fins de informação, sujeitas às reservas impostas
por considerações de segurança e de ordem constitucional, informações estatísticas ou de outro caráter técnico,
relativas às condições econômicas, sociais e educacionais dos territórios pelos quais são respectivamente
responsáveis e que não estejam compreendidos entre aqueles a que se referem os Capítulos XII e XIII da Carta
(Carta da ONU, 1945).
47
ARTIGO 75 - As nações Unidas estabelecerão sob sua autoridade um sistema internacional de
tutela para a administração e fiscalização dos territórios que possam ser colocados sob tal sistema em
consequência de futuros acordos individuais. Esses territórios serão, daqui em diante, mencionados como
territórios tutelados (Carta da ONU, 1945).
48
ARTIGO 76 - Os objetivos básicos do sistema de tutela, de acordo com os Propósitos das Nações
Unidas enumerados no Artigo 1 da presente Carta serão:
a) favorecer a paz e a segurança internacionais;
b) fomentar o progresso político, econômico, social e educacional dos habitantes dos territórios
tutelados e o seu desenvolvimento progressivo para alcançar governo próprio ou independência, como mais
convenha às circunstâncias particulares de cada território e de seus habitantes e aos desejos livremente expressos
dos povos interessados e como for previsto nos termos de cada acordo de tutela;
c) estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de
raça, sexo língua ou religião e favorecer o reconhecimento da interdependência de todos os povos; e
d) assegurar igualdade de tratamento nos domínios social, econômico e comercial para todos os
Membros das nações Unidas e seus nacionais e, para estes últimos, igual tratamento na administração da justiça,
sem prejuízo dos objetivos acima expostos e sob reserva das disposições do Artigo 80 (Carta da ONU, 1945).
49
ARTIGO 74 - Os Membros das Nações Unidas concordam também em que a sua política com
relação aos territórios a que se aplica o presente Capítulo deve ser baseada, do mesmo modo que a política
seguida nos respectivos territórios metropolitanos, no princípio geral de boa vizinhança, tendo na devida conta
os interesses e o bem-estar do resto do mundo no que se refere às questões sociais, econômicas e comerciais
(Carta da ONU, 1945).
50
ARTIGO 84 - A autoridade administradora terá o dever de assegurar que o território tutelado preste
sua colaboração à manutenção da paz e da segurança internacionais. Para tal fim, a autoridade administradora
poderá fazer uso de forças voluntárias, de facilidades e da ajuda do território tutelado para o desempenho das
obrigações por ele assumidas a este respeito perante o Conselho de Segurança, assim como para a defesa local e
para a manutenção da lei e da ordem dentro do território tutelado (Carta da ONU, 1945).
51
ARTIGO 82 - Poderão designar-se, em qualquer acordo de tutela, uma ou várias zonas estratégicas,
que compreendam parte ou a totalidade do território tutelado a que o mesmo se aplique, sem prejuízo de
qualquer acordo ou acordos especiais feitos de conformidade com o Artigo 43 (Carta da ONU, 1945).
103
ante o documento submetido pelos nativos, que será demonstrado a seguir, e diante da
conclusão do autor sobre como as autoridades administradoras lidaram com os territórios
tutelados.
Os Marshalleses, nativos daquele país, após os primeiros testes nucleares,
submeteram à autoridade administradora (EUA) um documento a que chamaram de “Reclamo
a respeito da explosão de armas letais dentro de nossas ilhas” (notar que a tradução para
“ilhas” veio da expressão usada, home islands):
Nós, o povo Marshallense, sentimos que devemos seguir os ditames de nossas
consciências para apresentar este apelo urgente às Nações Unidas, que se
comprometeram a salvaguardar a vida, a liberdade e o bem-estar geral do povo do
Território Tutelado, do qual o povo marshallês faz parte.
O povo marshallês não está apenas com medo do perigo para suas pessoas dessas
armas mortais em caso de outro erro de cálculo, mas também está muito preocupado
com o número crescente de pessoas que estão sendo removidas de suas terras.
A terra significa muito para os marshalleses. Significa mais do que apenas um lugar
onde você pode plantar seus alimentos e construir suas casas; ou um lugar onde você
pode enterrar seus mortos. É a própria vida das pessoas. Tire suas terras e seus
espíritos também irão.
As Ilhas Marshall são todas atóis baixos de coral com área de terra agricultável
bastante limitada, mesmo para a população atual de cerca de onze mil pessoas. Mas
a população está crescendo rapidamente; o tempo em que esse número será dobrado
não está longe.
Os japoneses haviam tomado as melhores porções dos seguintes atóis; Jaluit,
Kwajalein, Enewetak, Mills, Malcelap e Wetje para serem fortificados como parte
de sua preparação para a última guerra, a Segunda Guerra Mundial. Até agora,
apenas a Ilha Imedj no Atol de Jaluit foi devolvida aos seus antigos proprietários.
Por motivos de segurança, a Ilha Kawajalein está sendo mantida para uso militar.
Bikini e Enewetak foram levados para testes de bombas atômicas e seus habitantes
foram transferidos para Kili Island e Ujelang Atoll, respectivamente. Como
Rongelab e Uterik agora são radioativos, seus habitantes estão sendo mantidos em
Kwajalein por um período indeterminado de tempo. 'Qual o próximo lugar?' é a
grande questão que paira em todas as nossas mentes (LEE, 1998, pp. 10-11).
Este documento, para o presente trabalho, é uma denúncia de descumprimento
flagrante do artigo sexto do acordo de tutela sobre essas ilhas. As infrações dos testes
nucleares dizem respeito ao compromisso de proteger os habitantes contra a perda de terras,
ao compromisso de promover a saúde e o desenvolvimento social e a encorajar a agricultura e
pesca, regulando o uso de recursos naturais. Ora, desalojados de suas terras, que passaram a
estar contaminadas e assim ficarão por séculos, sem contar a contaminação de PCBs advindos
do descarte de transformadores elétricos, isto é, a partir dessa violação ultrajante e
escandalosa do compromisso havido perante a comunidade internacional, como assegurar os
direitos dos habitantes dessas ilhas?

104
Esta situação levou a uma discussão longa no meio acadêmico americano e, no caso
da contaminação por PCBs, resultou numa ação bilateral que deixou de lado o acordo
internacional e o Direito Internacional. Em entrevista telefônica com uma autoridade
americana envolvida no processo, o autor expõe a racionalidade da autoridade administradora
ao tratar do problema:
Os primeiros e maiores locais de descarte dos transformadores foram limpos pela
Agência Americana de Proteção Ambiental. De acordo com Norm Lovelace da
E.O.A. Região IX, isso foi feito como uma medida de boa fé e não como uma
obrigação legal52 (LEE, 1998, p. 14).
Citando uma representante do governo Marshallês, o autor informa que:
Holly Barker, embaixadora da República das Ilhas Marshall em Washington D.C.,
afirmou que novos transformadores que vazam são descobertos a cada nova grande
tempestade que atinge as ilhas. Uma outra carga de transformadores foi descoberta
recentemente no atol de Kawajalein. Portanto, o problema de contaminação por PCB
ainda existe como uma ameaça muito real ao ambiente humano das Ilhas Marshall
(LEE, 1998, p. 14).
Hyun S. Lee explica que os transformadores foram entregues à ilha para a construção
de uma rede elétrica. Isso significa que essa estrutura básica para a comunicação,
desenvolvimento celebrado no Artigo 6 (2) do acordo de Tutela, não está, a priori, fora das
obrigações do acordo de Tutela, diferentemente dos testes nucleares. Isso não exclui, de todo
modo, a discussão sobre responsabilização, que é o que trata o trabalho de Lee. Além disso, o
autor não sabe dizer quando foram levados os transformadores, mas informa que tal tipo, o
que usa PCB para seu funcionamento, deixou de ser usado e considerado legal nos EUA em
1977 (LEE, 1998, p. 13).
De forma sucinta, PCB significa policloradobifenilo. Conhecido também por
Ascarel, trata-se de uma composição química sintética e, quando incinerado, transforma-se
em dioxinas e furanos, compostos químicos tóxicos. As dioxinas “causam alterações no
desenvolvimento sexual, problemas reprodutivos [...], danos irreversíveis ao sistema imune,
diabetes, [...] danos em uma grande variedade de hormônios” (Bloise, D. M.. 2018, p. 10). Os
furanos são possivelmente cancerígenos – o são com evidências suficientes em animais e
evidências não conclusivas em humanos. Assim são descritos ambos componentes pela Prof.ª
Dra. Denise Martins Bloise, em seu artigo “Dioxinas, Furanos e PCBs na nossa
Alimentação”. O ascarel pode se acumular no organismo humano e causar:
danos ao cérebro, aos sistemas nervoso, endócrino e imunológico, e mudanças no
padrão da fertilidade. A contaminação por PCBs pode ocasionar acne grave,

52
E.P.A é a sigla para Environmental Protection Agency, um órgão americano dedicado à proteção
ambiental.
105
brotoejas, alergias, asma, irritação dos olhos, lesões hepáticas, enfraquecimento do
sistema imunológico, doenças autoimunes, sensibilidade química, obesidade, fadiga,
disfunções no desenvolvimento, determinados tipos de câncer, confusão mental,
doenças neurológicas crônicas, dificuldades cognitivas, fibromialgia, desequilíbrios
hormonais, tremores, transtornos de humor, infecções crônicas bacterianas, fúngicas
e virais (HEALTHMETRI, http://healthmetrix.com.br/exames-healthmetrix-2/pcbs-
bifenil-policlorados-intoxicacoesambientais/) (Bloise, D. M. 2018, p. 19).
Quanto à responsabilização, Lee opina que a sua forma estrita (também se pode
traduzir como responsabilidade objetiva) não se aplica às Ilhas Marshall, uma vez que a
construção daquela rede elétrica com os transformadores não é uma atividade “ultra perigosa”
(LEE, 1998, p.18), não se equiparando à forma de responsabilização absoluta de danos
oriundos de lixo espacial, como é o caso da Convenção Sobre Responsabilidade Internacional
Por Danos Causados Por Objetos Espaciais, de 1972.
Já no modelo de responsabilização por ilicitude, ou wrongfulness liability, o autor
argumenta que à época não se sabia com certeza científica sobre o potencial danoso dos
PCBs, e que é provável que a construção daquela rede elétrica tenha sido percebida como algo
benéfico, o que não se caracterizaria por negligência, não havendo implicação, como explica
o autor, no Artigo 21 do Relatório Brundtland. Isto é, a autoridade administradora não teria
quebrado nenhum acordo internacional sobre o uso de recursos naturais, ou a prevenção de
interferência ambiental (LEE, 1998, p. 18).
Sendo assim, os EUA não seriam responsáveis pela limpeza do ascarel “sob uma
ótica estrita de responsabilização interestatal de danos ambientais transnacionais” (LEE, 1998,
p. 19). Lee afirma que essa relação interestatal não existia, na verdade, já que não havia
soberania reconhecida e, no lugar de relações soberanias interestatais, havia o Acordo de
Tutela e que, em razão desta “relação desigual pode ser argumentado que a obrigação
fiduciária impinge aos Estados Unidos um dever de cuidado de alto padrão e longa duração
sobre os seus tutelados” (LEE, 1998, p. 19). Vale a menção de que, como afirma o autor, não
se sabe quando parou ou desde quando ocorreram os depósitos de transformadores com
ascarel nas Ilhas, o que pode alterar a relevância e aplicabilidade deste argumento.
Para Lee, os EUA estariam vinculados pela responsabilidade fiduciária conforme o
seguinte conteúdo, mas não necessariamente à reabilitação de terras, ainda que, por exemplo,
os testes nucleares tenham sido flagrantes violações:
‘agir pelo benefício do outro enquanto o interesse pessoal daquele lhe estiver
subordinado’. Esse dever obriga que o tutor ‘não exerça pressão sobre o
beneficiário, lidando com o objeto da relação de forma a se beneficiar ou prejudicar
o beneficiário, ou tirar vantagem da relação’. Portanto, os Estados Unidos estavam
vinculados por esse dever fiduciário na sua administração dos Territórios Tutelados

106
das Ilhas do Pacífico. Apesar da permissividade da Carta das Nações Unidas ao
estabelecer tutelas estratégicas, os Estados Unidos estavam nitidamente fora do seu
escopo possível ao detonar bombas de hidrogênio [...]
Entretanto, não é claro se o dever fiduciário se estende até à responsabilização do
administrador pela recuperação do território afetado após o término do acordo de
tutela (LEE, 1998, pp. 26-27).
Por fim, após examinar outros casos de tutela, o autor conclui que a forma de
negociação que existiu entre Administradores e Administrados, incluso o caso das Ilhas
Marshall, isto é, acordos fora das provisões dos acordos de tutela e do sistema internacional
de litigância, derivou do medo de que tais casos fossem levados à litígio, resultando
num precedente legal internacional que oficialmente obrigue o administrador a
tomar responsabilidade por seus atos pretéritos. [...] Entretanto, a verdade do assunto
é bastante aparente. Os antigos administradores estão remediando o dano ecológico
sob sua administração em razão de um senso de apreensão sobre a litigância e o
potencial estabelecimento de um precedente legal. É, então, uma tendência própria,
em si mesma. É uma nova tendência onde a negociação de acordos que
acompanhem essa remediação voluntária está criando um novo costume de antigos
administrados aceitarem alguma responsabilização pelo dano ecológico (LEE, 1998,
p. 38).
O “hoje” a que se refere o excerto acima, esta “nova tendência” é de 1998 e está fora
do escopo do trabalho de 1945-1953, mas serve para ilustrar o fato irreverente de que o
acordo de Tutela das Ilhas do Pacífico teceu considerações sobre proteção ambiental. Aliás,
tão latente foi o conflito acerca do meio ambiente, e de obrigações e direitos que dele
derivam, que as consequências possivelmente litigiosas do acordo dos anos quarenta foram
trabalhadas até os anos noventa, cinquenta anos depois.

2.3 Conclusão

De acordo com os levantamentos dos anuários e a revisão bibliográfica, além da


opção metodológica por Weeramantry, que contém uma proibição contra a ameaça à espécie
humana, tudo aponta para elaborar um conceito de jus cogens para a questão ambiental.
Todavia, um estudo posterior mais aprofundado sobre o conteúdo do jus cogens e sua relação
com o DIA ainda precisaria ser feito.
Se, como indica Brownlie (Brownlie, Ian, 1997, p. 537), um critério é a necessidade
de uma norma de igual hierarquia para modificá-la53, e não haver derrogação por parte dos
estados em relação à norma de Jus Cogens, é necessário que um princípio jurídico

53
A principal característica distintiva de tais regras é a sua não derrogabilidade. São regras de Direito
consuetudinário que não podem ser afastadas por tratado ou aquiescência, mas apenas pela formação de uma
regra consuetudinária subsequente de efeito contrário (BROWNLIE,1997, p. 537).
107
hierarquicamente acima dos ordenamentos positivados seja criado para modificar a situação
jurídica atual, construída no último século, na qual a destruição do meio ambiente e a sua
inutilização enquanto fonte de subsistência para a sociedade, tenham sua proibição mitigada
por outro direito ou outra relação jurídica de igual valor.
Isso parece impossível, já que, como argumenta Weeramantry, um ordenamento
jurídico que atenta mortalmente contra a sociedade a que serve está fadado à destruição e,
diga-se de passagem, é irracional per si. Este é o principal argumento para sustentar essa
hipótese final, identificando, nas normas ambientais, o seu caráter de jus cogens.
Embora a discussão se desenvolva para definir o escopo, o limite e a abrangência de
aplicação das normas ambientais, como as presentes nos Artigos 35(3) e 55 do Protocolo
Adicional I, os limites fáticos, isto é, a não destruição do meio ambiente, etc., já estão sendo
ultrapassados segundo indicadores científicos, organizações científicas especificamente
criadas para monitorar a situação climática do planeta. Sendo assim, a discussão sobre a
abrangência da norma parece ter perdido o compasso, ficado para trás na história. A melhor
pergunta não seria “aonde está o limite?” mas “quando nós o ultrapassamos? Como nos
recuperarmos?”.
A arma nuclear, a destruição completa da humanidade, a erradicação da
possibilidade de subsistência de populações inteiras a partir das últimas consequências da
mudança climática, etc., são fatos verificáveis ou, pelo menos, de resultados previsíveis. É
esse o contexto atual e a discussão jurídica precisa acompanhá-lo. Há de seguir em frente
com a construção que este trabalho tentou demonstrar existir ao longo do tempo.
O meio ambiente é fundamental para o conceito de segurança, uma vez que sua
existência é prescindida pelo raciocínio de utilização da arma nuclear, por exemplo, além da
relação intrínseca entre meio ambiente, recursos naturais e guerra. O que foi apresentado pela
professora Dam-de Jong já demonstra uma inclinação, ainda que tardia, a reconhecer o
aspecto ambiental complexo do conceito de segurança. Pode-se ver, no objeto de pesquisa, a
presença inconteste do meio ambiente, implícita e explícita no trato jurídico dos temas do
CSNU.
Weeramantry, no geral, pode ser espelhado no que tange o problema ambiental.
Aqui, não se trataria da arma nuclear como promovedora da paz ou da destruição, mas do
desenvolvimento como promovedor de bem-estar ou de seu próprio antagônico, já que o

108
desenvolvimento é crescimento ad infinitum numa realidade finita. Essa analogia também
fundamenta a escolha do Weeramantry para compor esta monografia.
Se a inexistência de proibição da arma nuclear não significa sua permissão, do
mesmo modo, a inexistência de proibição do desenvolvimento apesar do meio ambiente não
significa sua legalidade. Portanto, resultados que cassem o “direito dos seres humanos
existirem” não podem se coadunar com a ordem jurídica. Aliás, não existe, legalmente, nem
na biota terrestre, desenvolvimento apesar do meio ambiente. Ele sempre está ali, para ser
cuidado ou destruído.
Por essa razão, arguir o Art. 55 do Protocolo Adicional I de Genebra é, como no caso
do voto dissidente, arguir os demais direitos e proteções pré-existentes e que, por existirem, já
significam um caminho para resolver o problema do alcance da eficácia deste artigo. Há um
engano que consiste em interpretar este artigo como inaplicável, uma vez que possui um
alcance cujo limite nunca foi atingido.
Na verdade, é necessário esclarecer o direito ambiental para o conceito de segurança,
identificando as proibições e direitos já mencionados, por exemplo, dos Artigos 1º, 3º, 25(1),
25(2), 27(1) da Declaração Universal dos Direitos Humanos; dos Artigos 23 (g), 28 e 55 das
Convenções de Haia de 1907; do Artigo 33 (2) da Convenção IV de Genebra, de 1949; dos
Artigos 35(3), 54 e 55 do PA I e dos Artigos 4 (2) (g) e 14 do PA II.
Em outras palavras, a destruição do meio ambiente sonega à humanidade o direito à
vida, à dignidade, aos cuidados médicos, à reprodução, à infância, à cultura, o direito das
gerações futuras, o direito dos não participantes das hostilidades terem respeitadas a sua honra
e pessoa, além de serem tratados com humanidade. A destruição do meio ambiente infringe a
proibição de destruir ou se apropriar-se de propriedade sem que haja necessidade militar, de
pilhagem, de fazer padecer de fome os civis, de destruir bens indispensáveis à sobrevivência
da população civil, de causar danos materiais e perda de vida desnecessários e de causar
danos extensos, duradouros e graves ao meio ambiente.
Isto é o direito que existe. A tendência cientificamente provada em direção à infração
das proibições e prejuízo aos direitos é o teste fundamental das concepções que argumentam,
por exemplo, a inaplicabilidade do Art. 35(3) do Protocolo Adicional I.
Qual o motivo de discutir o escopo, a eficácia, se aquilo que se usa para dizer se
infringe ou não o Artigo 35(3) já aconteceu, ou seja, se aquilo que é necessário acontecer para
afirmar um dano grave, extenso e duradouro já ocorreu no mundo. A não ser que haja como

109
ser mais destrutivo e promovedor do desequilíbrio do que o estágio humano atual, o artigo já
teve seu patamar atingido.
Há certa incongruência nas interpretações que dão suporte à maior amplitude
possível na aplicação dos Artigos 55 e 35(3) do Protocolo Adicional I. Essa assimetria reside
no fato de que são fatos históricos e concretos, que afetaram a vida das pessoas e o seu
cotidiano, fenômenos a que chamamos de tragédias, desastres, etc. São eles que desenvolvem
a vontade, o contexto, as discussões e a necessidade de criação do Direito que, então, dá sua
resposta através de uma norma cuja amplitude de aplicação não se satisfaz com os fatos a que
lhe deram ensejo.
Há, aqui, um esforço em inutilizar o Direito, transformá-lo em um exercício racional
descolado daquilo que lhe deu vida e substância, isto é, aquilo que de fato “aconteceu”. O que
está sendo argumentado é que fatos são geradores de expectativas de direitos que, legisladas
numa proibição, àqueles fatos busca evitar que ocorram novamente, ou continuem ocorrendo.
Não há, por exemplo, nenhum princípio de direito civil que tenha se importado com o que não
acontece, isto é, fatos e acontecimentos relevantes e criadores de Direito, mas tão somente
com a universalização e criação racional de normas que se pretendem universais e úteis ao
cotidiano, para solucionar os problemas que existem, idealizando hipóteses para, no máximo,
dar coerência às últimas consequências de raciocínios jurídicos úteis ao dia-a-dia.
Do contrário, ao tratar do meio ambiente e da sua proteção, por sua vez, o Direito
e/ou o que os Estados dele interpretam, permitiu normatizar casos inalcançáveis senão pela
destruição completa, sendo que, claramente, a destruição completa e abrupta não é a única
forma trágica do fim da vida – causa de criação do Direito – e do meio ambiente. O seu
limite, entretanto, o absurdo, a situação distante e catastrófica, quase literária e fantasiosa, que
a norma busca e buscaria evitar somente desta maneira, enquanto pesadelo estrondoso e
cataclísmico, sem se preocupar em promover um caminho não direcionado a isso,
reconhecendo a vivacidade de sua possibilidade.
Por enquanto, estes artigos cujo limiar de dano é mais alargado terão a faculdade de
meramente anunciar a perdição, no sentido de continuar como inaplicáveis em razão do
reconhecimento deste limiar amplo. Para a hipótese final da necessidade de criar um conceito
de jus cogens para o direito ambiental, os fatos que seriam a pedra de toque da definição mais
nítida da amplitude do artigo já são realidade. Três exemplos são a presente extinção de fauna

110
em massa e a cada vez mais severa contaminação da água dos oceanos e sua consequente
acidificação, além da poluição massiva da atmosfera.
O status de jus cogens do DIA passaria pelos artigos indicados por Ventura (2013),
quais sejam, os Artigos 40, 41 e 48 dos Draft Articles on the Responsibility of States for
Internationally Wrongful Acts (Projetos de Artigos sobre a Responsabilidade dos Estados por
Atos Internacionalmente Ilícitos)54.
O autor afirma que se pode inferir que prejudicar a proteção dos bens condicionantes
da vida pode figurar como violação grave, o que suscita a aplicação das normas acima. Cita-
se, inclusive, que a gravidade de tal prejuízo poderia vir na forma de “atividades ilícitas como,
por exemplo, a poluição massiva da atmosfera e dos oceanos” (VENTURA, 2013, p. 104).
Ele expõe seu argumento da seguinte forma, após mencionar o Artigo 53 do CVDT:
Sendo assim, tem-se a seguinte linha de raciocínio: a poluição massiva da atmosfera
e dos oceanos provoca sérias consequências para as vítimas diretamente afetadas.
Ameaça, portanto, a salvaguarda do ambiente humano e poderia ser considerada
crime ambiental, ou, pelo menos, violação de obrigação internacional de proteger o

54
CAPÍTULO III
VIOLAÇÕES GRAVES DAS OBRIGAÇÕES DE NORMAS PEREMPTÓRIAS DO DIREITO
INTERNACIONAL GERAL
Artigo 40
Aplicação deste capítulo
1. Este capítulo se aplica à responsabilidade internacional decorrente da violação grave por parte de
um Estado de uma obrigação decorrente de uma norma imperativa de direito internacional geral.
2. A violação de tal obrigação é grave se envolver uma falha grave ou sistemática do Estado
responsável em cumprir a obrigação.
Artigo 41
Consequências particulares de uma violação grave de uma obrigação prevista neste capítulo
1. Os Estados devem cooperar para pôr fim, por meios legais, a qualquer infração grave na acepção do
artigo 40.º.
2. Nenhum Estado reconhecerá como lícita uma situação criada por uma violação grave na acepção do
artigo 40.º, nem prestará ajuda ou assistência para manter essa situação.
3. Este artigo não prejudica as outras consequências referidas nesta parte e outras consequências que
uma violação a que este capítulo se aplica possa acarretar sob o direito internacional.
Artigo 48
Invocação de responsabilidade por um Estado que não seja um Estado lesado
1. Qualquer Estado que não seja um Estado lesado tem o direito de invocar a responsabilidade de
outro Estado de acordo com o parágrafo 2 se:
(a) a obrigação violada é devida a um grupo de Estados, incluindo esse Estado, e é estabelecida para a
proteção de um interesse coletivo do grupo; ou
(b) a obrigação violada é devida à comunidade internacional como um todo.
2. Qualquer Estado com direito a invocar a responsabilidade nos termos do parágrafo 1 pode reclamar
do Estado responsável:
(a) cessação do ato internacionalmente ilícito e garantias e garantias de não repetição de acordo com o
Artigo 30; e
(b) cumprimento da obrigação de reparação de acordo com os artigos anteriores, no interesse do
Estado lesado ou dos beneficiários da obrigação descumprida.
3. Os requisitos para a invocação de responsabilidade por um Estado lesado nos termos dos Artigos
43, 44 e 45 aplicam-se a uma invocação de responsabilidade por um Estado habilitado a fazê-lo nos termos do
parágrafo 1 (CDI, 2001).
111
meio ambiente, ensejando, segundo o capítulo 40 dos Projetos de Artigos da CDI,
responsabilização dos Estados infratores, na medida em que ameaça a comunidade
internacional como um todo. Tal raciocínio é defendido, igualmente, por Freeland
(2005, p. 138), para quem seria juridicamente viável enquadrar as agressões
ambientais cometidas no curso de conflitos armados como violações ao Artigo 8º do
Estatuto do TPI (1998) e, portanto, como Crimes (ambientais) de Guerra
(VENTURA, 2013, p. 106).
Por fim, conclui-se que o objeto de pesquisa continha considerações sobre proteção
ambiental e que legislou proteção ambiental no acordo de Renville e no TAFJMI. O voto
dissidente de Weeramantry, utilizado nesta monografia, é uma opção que permitiu a
perspectiva de observar o objeto de pesquisa numa construção histórica que termina nos dias
de hoje, com o conceito de segurança ambiental e as normas de DIA e proteção ambiental no
DIH que foram trabalhadas pela bibliografia. A hipótese final se alimenta de todo esse
movimento, apontando o que estaria por vir, por assim dizer, neste debate.

112
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