You are on page 1of 14

A DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS OU DIVIDENDOS NO REGIME DO

LUCRO PRESUMIDO
Wallace Hardy y Martin1

RESUMO

A distribuição de lucros ou dividendos pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro
presumido é o objeto do presente artigo. Dados estatísticos examinados nesse estudo
demonstram que um quantitativo bastante significativo de empresas adota a sistemática do
lucro presumido, que, então, revela-se vantajosa para os contribuintes em comparação com a
tributação com base no lucro real. Em sentido contrário, os dados mostram que a arrecadação
tributária concentra-se nas empresas que se sujeitam a essa última sistemática. Em outro
prisma, o vigente regime legal permite às pessoas jurídicas optantes pela tributação com base
no lucro presumido que distribuam a seus sócios ou acionistas sem a incidência do imposto de
renda, o valor correspondente à diferença entre o lucro efetivo, apurado por meio de
escrituração contábil completa, e o valor da base de cálculo do imposto (o lucro presumido) a
que se sujeitou a pessoa jurídica. Este trabalho procurou demonstrar que isto é uma anomalia
que privilegia de modo extraordinário os beneficiários desses rendimentos; e conclui ser
necessária uma alteração legal para a correção dessa distorção.

Palavras-chave: Lucro presumido. Distribuição de lucros ou dividendos. Escrituração


contábil

INTRODUÇÃO

O lucro presumido é o regime de tributação em que para a determinação da base de


cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido são aplicados
determinados percentuais sobre a receita bruta auferida pelo contribuinte no respectivo
período de apuração. A característica principal dessa forma de tributação é a simplificação,
uma vez que para a apuração dessas exações é prescindível a existência de escrituração
contábil, bastando que o contribuinte, mantenha, entre outras exigências, livro Caixa em que
esteja escriturada toda sua movimentação financeira, inclusive bancária.
Por outro lado, com o objetivo de promover a completa integração entre empresa e seus
sócios quanto à tributação dos lucros e dividendos distribuídos foi estabelecido o regime do
Art. 10, da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, segundo o qual os lucros ou dividendos
distribuídos não sofrem a incidência do imposto de renda na fonte nem integram a base de
cálculo do imposto de renda dos beneficiários, independentemente do regime de tributação
adotado pela pessoa jurídica em que são gerados os lucros ou do tipo de beneficiário.

Esse trabalho procura mostrar que o regime acima atribui aos sócios ou acionistas das
empresas tributadas com base no lucro presumido (ou arbitrado) que apurarem mediante
escrituração contábil completa lucro efetivo superior à base de cálculo do seu imposto de
renda, isto é, o lucro presumido ou o arbitrado, uma vantagem extraordinária, que extrapola os
próprios objetivos desse regime.

Para tanto examinou-se tão resumidamente quanto possível as características da


tributação com base no lucro presumido, alguns dados estatísticos em relação às empresas
1
Bacharel em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Ceará
optantes por esse regime, o contexto em que foram introduzidas as normas contidas no Art.
10, da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995 e os seus objetivos.

1 REGIME DE TRIBUTAÇÃO COM BASE NO LUCRO PRESUMIDO

A tributação com base no lucro presumido possui características bastante específicas o


que a distingue das demais formas de tributação, como se verá a seguir.

1.1 Regimes de tributação

Existem três regimes para a determinação da base de cálculo do imposto de renda das
pessoas jurídicas: o lucro real, o lucro presumido e o lucro arbitrado. Esse último regime, em
geral, somente é utilizado em casos excepcionais, sendo aplicado especialmente pelas
autoridades fiscais quando o contribuinte, sujeito a (ou optante) por uma das outras duas
formas, deixa de escriturar ou de apresentar os livros e documentos a que está obrigado (Art.
530, do Decreto 3.000, de 23 de março de 1999 – RIR/1999).

A tributação com base no lucro real é a regra geral e pode ser adotada por qualquer
contribuinte, já que o lucro real nada mais é que o lucro efetivo (contábil) da empresa,
apurado com a observância da legislação comercial, das normas de contabilidade e dos
princípios contábeis; ajustado pelas adições, exclusões e compensações previstas na legislação
fiscal.

Assim, para a adoção do regime do lucro real é imprescindível que o contribuinte


possua escrituração contábil regular e mantenha em boa guarda e ordem toda a documentação
que embasou seus registros contábeis.

Na tabela abaixo estão discriminadas as pessoas jurídicas que, atualmente, estão


obrigadas à apuração do lucro real, conforme previsto no Art. 14 da Lei 9.718, de 27 de
novembro de 1998:

Tabela 1 – Pessoas jurídicas atualmente obrigadas à determinação do lucro real


Tipo de pessoa jurídica Inciso
As instituições financeiras, intermediários financeiros, empresas de seguros
II
privados e entidades abertas de previdência privada;
As que tiverem lucros, rendimentos ou ganhos de capital oriundos do exterior III
As que, autorizadas pela legislação tributária, usufruam de benefícios fiscais
IV
relativos à isenção ou redução do imposto de renda;
As que explorem as atividades de prestação cumulativa e contínua de serviços
de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção e riscos,
VI
administração de contas a pagar e a receber, compras de direitos creditórios
resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring);
As que explorem as atividades de securitização de créditos imobiliários,
VII
financeiros e do agronegócio.
Fonte: Art. 14 da Lei 9.718/1998.

Prevê ainda inciso I, do Art. 14, da Lei nº 9.718/1998 que estão também obrigados à
apuração do lucro real as empresas cuja receita total no ano-calendário anterior seja superior
ao limite de R$ 78.000.000,00 (setenta e oito milhões de reais)2 ou proporcional ao número de
meses do período, quando inferior a 12 (doze) meses.

Anteriormente à edição da lei sob comento, as situações que determinavam a


obrigatoriedade da adoção do regime de tributação com base no lucro real eram bem mais
abrangentes. Discriminamos na tabela abaixo as pessoas jurídicas obrigadas a esse regime no
período imediatamente anterior à Lei 9.718/1998, segundo previsto no Art. 36, da Lei nº
8.981, de 20 de janeiro de 1995 (conversão da Medida Provisória nº 812/1994):

Tabela 2 – Situações ou atividades sujeitas à adoção do regime do lucro real anteriormente à


edição da Lei nº 9.718/1998
Tipo de pessoa jurídica Inciso
As constituídas sob a forma de sociedade por ações de capital aberto; II
As instituições financeiras, intermediários financeiros, empresas de seguros
III
privados e entidades abertas de previdência privada;
As que se dediquem à compra e à venda, ao loteamento, à incorporação ou à
IV
construção de imóveis e à execução de obras da construção civil;
As que tenham sócio ou acionista residente ou domiciliado no exterior V
As que sejam sociedades controladoras, controladas e coligadas, na forma da
VI
legislação vigente;
As constituídas sob qualquer forma societária, de cujo capital participem
entidades da administração pública, direta ou indireta, federal, estadual ou VII
municipal;
As que sejam filiais, sucursais, agências ou representações, no País, de pessoas
VIII
jurídicas com sede no exterior;
As que, autorizadas pela legislação tributária, queiram usufruir de benefícios
IX
fiscais relativos à isenção ou redução do Imposto de Renda;
As que encerrarem atividades; X
As que tenham sócios ou acionistas pessoas jurídicas; XII
Aquelas cuja receita decorrente da venda de bens importados seja superior a
XIV
cinquenta por cento da receita bruta da atividade;
As que explorem as atividades de prestação cumulativa e contínua de serviços
de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção e riscos,
XV
administração de contas a pagar e a receber, compras de direitos creditórios
resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços (factoring)
As pessoas jurídicas que tenham sido incorporadas, fusionadas ou cindidas Par. único
Fonte: Art. 36, da Lei nº 8.981/1995.

Convém ressaltar que a partir de 2014 deve ocorrer um aumento da quantidade de


empresas que passem a adotar o regime do lucro presumido, em vista da elevação do limite da
receita brutal total que obriga o contribuinte a permanecer na sistemática do lucro real,
determinada pelo Art. 7º da Lei nº 12.814, de 16 de maio de 2013.

Como acima apontado, o lucro presumido é uma forma de tributação simplificada em


que a base de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido são
determinadas pela aplicação sobre a receita bruta 3, deduzida das devoluções e vendas

2
Este limite era de R$ 24.000.000,00 (vinte e quatro milhões de reais), entre 01/01/1999 e 31/12/2002 (redação
original da lei); e passou para R$ 48.000.000,00 (quarenta e oito milhões de reais), de 01/01/2003 a 31/12/2013
(redação dada pela Lei nº 10.637/2002).
canceladas e dos descontos incondicionais concedidos, de percentuais estabelecidos em lei,
segundo o tipo de receita ganha.

Para a determinação do montante do lucro presumido deve-se somar à parcela acima


outros valores, conforme previsto no Art. 122 da IN RFB nº 1.515, de 24 de novembro de
2014 auferidos nos respectivos períodos de apuração4.

O que deve ficar claro até aqui é que o regime de tributação com base no lucro
presumido é sempre uma opção do contribuinte a ser exercida por aqueles que não estão
obrigadas à apuração do lucro real. A sua utilização que, pela simplicidade de cálculo,
prescinde da confecção de escrituração contábil completa, reduz os custos operacionais dos
contribuintes em comparação com o regime do lucro real, que, como já visto, exige a
existência de um complexo e rigoroso sistema de contabilidade.

O aspecto negativo da utilização do regime de apuração do imposto de renda e da


contribuição social sobre o lucro líquido com base no lucro presumido consiste, sem dúvida,
no fato de que a sua utilização pode mitigar a aplicação dos princípios constitucionais da
capacidade contributiva e da isonomia que norteiam o Sistema Tributário Nacional.

Conforme o estudo Dados Setoriais 2008/2012, do Centro de Estudos Tributários e


Aduaneiros da Receita Federal do Brasil (disponível em
http://www.receita.fazenda.gov.br/publico/estudoTributarios/estatisticas/DadosSetoriais2008_
2012.pdf, acesso em 12/01/2015), entre 2009 e 2012, na média, cerca de 150.610 empresas
foram tributadas pelo regime do lucro real (3,18% do total de contribuintes), enquanto
1.010.329 optaram pela sistemática do lucro presumido (21,34% do total).

Levando-se em conta os optantes pelo simples nacional, verifica-se que, neste período,
pelo menos 90% (noventa por cento) do total de contribuintes pertenciam a um desses
regimes simplificados de tributação.

Por outro prisma, conforme o mesmo estudo, quando se analisa a arrecadação tributária
essa proporção se inverte: as empresas tributadas com base no lucro real respondem por pelo
menos 79% (setenta e nove por cento) do total arrecadado, cabendo aos optantes pelos
sistemas simplificados algo em torno de 18% (dezoito por cento) da arrecadação.

1.2 Percentuais de presunção

No Art. 4º da recém editada IN RFB nº 1.515/2014 estão discriminados os percentuais


de presunção aplicáveis à receita bruta para fins de apuração do lucro presumido, conforme a
tabela a seguir5:
Tabela 3 – Percentuais de presunção do lucro segundo a atividade exercida

3
Na receita bruta não se incluem os tributos não cumulativos cobrados destacadamente e incluem-se os tributos
sobre ela incidentes e os valores decorrentes do ajuste a valor presente (§§ 2º e 3º do Art. 3º da IN RFB nº
1.515/2014)
4
O imposto de renda das pessoas jurídicas será determinado com base no lucro real, presumido, ou arbitrado, por
períodos de apuração trimestrais, encerrados nos dias 31 de março, 30 de junho, 30 de setembro e 31 de
dezembro de cada ano-calendário (Art. 1º, da Lei nº 9.430/96).
5
No RIR/99 está matéria está disciplinada nos artigos 518 (cuja base legal é o artigo 15, da Lei nº 9.249/1995 e
os artigos 1º e 25, inciso I, da Lei nº 9.430/1996) e 519.
Atividade Exercida Percentual
Revenda, para consumo, de combustíveis derivados de petróleo, álcool etílico 1,6%
carburante e gás natural
Indústria e comércio; 8%
Prestação de serviços hospitalares e de auxílio diagnóstico e terapia, patologia 8%
clínica, imagenologia, anatomia patológica e citopatologia, medicina nuclear e
análises e patologias clínicas, exames por métodos gráficos, procedimentos
endoscópicos, radioterapia, quimioterapia, diálise e oxigenoterapia hiperbárica
Serviços de transporte de cargas 8%
Atividades imobiliárias relativas a loteamento de terrenos, incorporação 8%
imobiliária, construção de prédios destinados à venda, bem como a venda de
imóveis construídos ou adquiridos para revenda
Atividade de construção por empreitada com emprego de todos os materiais 8%
indispensáveis à sua execução, sendo tais materiais incorporados à obra
Serviços de transporte de passageiros 16%
Serviços de profissionais legalmente habilitados 32%
Intermediação de negócios (corretagem, representação comercial etc.) 32%
Administração, locação ou cessão de bens imóveis, móveis e direitos 32%
Construção por administração ou por empreitada unicamente de mão de obra ou 32%
com emprego parcial de materiais
Construção, recuperação, reforma, ampliação ou melhoramento de 32%
infraestrutura, no caso de contratos de concessão de serviços públicos,
independentemente do emprego parcial ou total de materiais
Prestação de qualquer outra espécie de serviço não mencionada anteriormente 32%
Fonte: Art. 4º, da IN RFB nº 1.515/2014

Conforme disposto no § 2º, Art. 15, da Lei 9.249/1995, no caso do exercício de


atividades diversificadas, será aplicado o percentual correspondente a cada atividade.

Convém destacar ainda que os percentuais de presunção acima listados não sofrem
quaisquer alterações há quase vinte anos, posto que vigoram desde 1996. Antes dessa época
esses percentuais eram constantemente atualizados. Reproduzimos abaixo tabela elaborada
pela Receita Federal do Brasil (disponível em
https://www.receita.fazenda.gov.br/PessoaJuridica/DIPJ/2003/PergResp2003/pr628a668.htm,
acesso em 13/01/2015) em que constam os percentuais de presunção aplicados entre 1992 e
1996:

Tabela 4 – Percentuais de presunção aplicados entre 1992 e 1999


PERCENTUAIS (%)
ATIVIDADES 1993 e A partir
1992 1995
1994 de 1996
Revenda de combustíveis 3,5 3 1 1,6
Fabricação própria 3,5 3,5 5 8
Revenda de mercadorias 3,5 3,5 5 8
Industrialização p/ encomenda 3,5 3,5 5 8
Transporte de cargas 3,5 3,5 10 8
Serviços hospitalares 30 3,5 10 8
Atividade rural 3,5 3,5 5 8
Serv. Transporte/ exceto cargas 30 8 10 16
Administração de consórcios 30 8 10 32
Hotelaria e estacionamento 30 8 10 32
Serv. Profissionais habilitados 30 20 30 32
Representante comercial 30 20 30 32
Administração e locação de imóveis 30 20 30 32
Corretagem em geral 30 20 30 32
Serviços da construção civil 30 8 10 32
Factoring 30 8 - -
Fonte: Receita Federal do Brasil (RFB).

A prolongada falta de revisão desses percentuais, aliada às transformações por que


passou a economia brasileira desde 1996, pode estar causando uma distorção significativa
entre a arrecadação oriunda das empresas optantes pelo lucro presumido vis-à-vis àquela
proveniente das obrigadas ao lucro real, com efeitos negativos no que diz respeito à isonomia,
o estudo Dados Setoriais 2008/2012 da RFB acima referido sinaliza nessa direção.

De todo modo, é racional esperar que as empresas não obrigadas ao regime do lucro real
só optem pela sistemática do lucro presumido se isto lhes trouxer vantagens financeiras
significativas e que esta decisão tem impacto direto na arrecadação tributária.

1.3 Escrituração contábil no lucro presumido

A obrigatoriedade de os empresários e as sociedades empresárias possuírem


escrituração contábil é exigida pelos artigos 176 e 177, da Lei 6.404/1976, no caso das
sociedades por ações e pelo artigo 1.179, da Lei 10.406/2002 (CC), no caso dos demais tipos
societários. O § 2º deste artigo dispensa dessa exigência somente o pequeno empresário
referido no Art. 970 dessa lei. Pode-se afirmar que o exercício regular da atividade
empresarial pressupõe a organização de uma contabilidade e que são três as suas funções:
gerencial, documental e fiscal (Coelho, 2003, págs. 78 e 80).

Por seu turno, o Conselho Federal de Contabilidade (CFC), mediante a Resolução CFC
nº 750/93, de 23 de dezembro de 1993 (alterada Resolução CFC nº 1.282/10, de 28 de maio
de 2010) estabeleceu os Princípios de Contabilidade (PC), cuja observância é obrigatória no
exercício da profissão e constituem condição de legitimidade das Normas Brasileiras de
Contabilidade (NBC).

Assim, e não poderia ser de outra maneira, a escrituração contábil, obrigatória para
qualquer empresa, deve seguir os preceitos da legislação comercial, as Normas Brasileiras de
Contabilidade e os Princípios de Contabilidade.

Ao arrepio dessas determinações, o parágrafo único do Art. 45 da Lei nº 8.981/1995


dispensa as empresas tributadas com base no lucro presumido da manutenção de escrituração
contábil completa, desde que estas possuam livro Caixa em que deve estar escriturada toda a
movimentação financeira, inclusive bancária6.
Atento ao problema, o Deputado Federal Arnaldo Faria de Sá apresentou o Projeto de
Lei nº 4.774/09, para que seja suprimido o parágrafo único do art. 45 da Lei n.º 8.891 de 20 de
janeiro de 1995. Ao justificar sua proposta, o deputado afirma que o previsto no citado
6
Toda empresa tributada com base no lucro presumido deve possuir também Livro Registro de Inventário e
guardar todos os documentos e papéis que embasaram a sua escrituração (incisos II e III, doa Art. 45 da Lei nº
8.981/1995).
parágrafo único está em desacordo com o exigido na Lei 10.406/2002 (CC), além de observar
que as sociedades empresarias que, inadvertidamente, abandonem a obrigação de manter a
escrituração contábil completa expõem-se a vários riscos7.

Outro aspecto importante em relação ao regime de tributação com base no lucro


presumido reside no fato de que, conforme o Art. 20 da Medida Provisória nº 2.158-35, de 24
de agosto de 2001, os contribuintes optantes por esse regime podem, facultativamente ao
regime de competência, adotar o regime de caixa no reconhecimento de suas receitas de
venda, desde que adotem o mesmo critério para o imposto de renda, a CSLL, a contribuição
para o PIS/PASEP e a COFINS8.

Finalmente, convém ressaltar, que, em relação aos fatos contábeis ocorridos a partir de
1º de janeiro de 2014, as pessoas jurídicas tributadas com base no lucro presumido, que
distribuírem, a título de lucros, sem incidência do Imposto sobre a Renda Retido na Fonte
(IRRF), parcela dos lucros ou dividendos superior ao valor da base de cálculo do imposto,
diminuída de todos os impostos e contribuições a que estiver sujeita, estão obrigadas à adoção
da Escrituração Contábil Digital (ECD), conforme o art. 3º da IN RFB nº 1.420/2013.

2 TRIBUTAÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS OU DIVIDENDOS


NO BRASIL

2.1 Breve histórico

Nos sistemas tributários clássicos a tributação dos lucros ocorre tanto nas empresas
quanto nos sócios ou acionistas beneficiários desses lucros. Como sintetiza Almeida (2004,
pág. 7), os lucros das empresas inicialmente são tributados após a sua apuração contábil e
quando são pagos a seus sócios ou acionistas são novamente tributados.

Essa chamada dupla tributação dos lucros sofreu várias críticas a partir da segunda
metade do século XX pois se passou a afirmar que ela desestimula as pessoas a investir seus
recursos nas empresas, restando então a essas como forma de financiamento de novos
empreendimentos o endividamento, que, assim, tenderia a se tornar crescente e insustentável a
longo prazo (Almeida, 2004, págs. 7 e 8).

Deste modo, diversos países do mundo, especialmente os da OCDE, passaram a adotar,


em relação à tributação dos lucros e dividendos, a integração entre pessoa jurídica (fonte
geradora dos lucros) e seus sócios ou acionistas, com o objetivo de eliminar ou mitigar os
efeitos da dupla tributação dos lucros.

No Brasil, ao longo dos anos, foram sendo adotadas diversas medidas legais para
contornar esse problema, o que culminou, na edição das normas contidas no Art. 10, da Lei nº
9.249, de 26 de dezembro de 1995 que, conforme a Exposição de Motivos nº 325/MF, de 31
de agosto de 1995, referente ao Projeto de Lei nº 913/95, assinada pelo então Ministro da
Fazenda, Sr. Pedro Malan, visaram, estabelecer a completa integração entre a pessoa jurídica
geradora de lucros e os seus sócios ou acionistas e estimular o investimento produtivo,
conforme abaixo reproduzido:

7
A escrituração contábil completa é importante meio de prova perante os Poderes Executivo e Judiciário.
8
Sobre a forma de escrituração com base no regime de caixa ver o Art. 129, da IN RFB nº 1.515/2014.
12. Com relação à tributação dos lucros e dividendos, estabelece-se a completa
integração entre a pessoa física e a pessoa jurídica, tributando-se esses rendimentos
exclusivamente na empresa e isentando-os quando do recebimento pelos
beneficiários. Além de simplificar os controles e inibir a evasão, esse procedimento
estimula, em razão da equiparação de tratamento e das alíquotas aplicáveis, o
investimento nas atividades produtivas.

Por sua vez o Art. 10, da Lei nº 9.249/1995 tem a seguinte redação:

Art. 10. Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a
partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas
tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à
incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do
imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou
no exterior.

Como adiante se verá, as normas contidas nesse artigo concedem uma vantagem
desproporcional e injustificada, que ultrapassa o seu próprio escopo, aos sócios ou acionistas
das empresas tributadas com base no lucro presumido (ou arbitrado) que apurem lucros
efetivos (contábeis) superiores à base de cálculo do imposto de renda determinada pela
utilização desses regimes.

Aliás, os críticos da isenção dos rendimentos decorrentes da distribuição de lucros ou


dividendos, afirmam exatamente isto: esta isenção, além de não corrigir o problema do
endividamento das empresas, acarreta, na verdade, ganhos demasiados para seus beneficiários
(Almeida, 2004, pág. 8).

Antes de avançarmos, apresentamos abaixo um quadro resumo que demonstra a


evolução do tratamento tributário da distribuição de lucros ou dividendos para as empresas
tributadas pelo regime do lucro presumido:

Quadro 1 – Tratamento tributário na distribuição de lucros ou dividendos (lucro presumido)


Beneficiários: pessoas físicas ou pessoas jurídicas
Época da
Fundamentos
formação
Tratamento na declaração legais
dos lucros Retenção na distribuição?
de ajuste do beneficiário
RIR/1999,
Até Não. Até o limite da base de cálculo do imposto deduzida do imposto
Isenção art. 663, 664
31/12/1995 correspondente
e 665
RIR/1999,
De
Não. Até o limite da base de cálculo do imposto, diminuída de todos os art. 662
01/01/1996
impostos e contribuições; ou parcela excedente a esse valor até o limite Isenção e Lei nº
a
do lucro contábil 12.973/2014,
31/12/2013
arts. 72 e 119
De Não. Até o limite da base de cálculo do imposto, diminuída de todos os Lei nº
01/01/2014 impostos e contribuições; ou parcela excedente a esse valor até o limite 12.973/2014,
Isenção
a do lucro contábil obtido conforme critérios contábeis vigentes até arts. 75 e
31/12/2014 31/12/2007, ou optante 119, § 1º
Não. Até o limite da base de cálculo do imposto, diminuída de todos os
A partir de RIR/1999,
impostos e contribuições; ou parcela excedente a esse valor até o limite Isenção
01/01/2015 art. 662
do lucro contábil
Fonte: A legislação mencionada.
Ressalte-se que no caso de extrapolação dos limites acima, há regras de tributação
específicas constantes dos artigos do Decreto nº 3.000/1999 (RIR/99) acima mencionados, da
IN RFB nº 1.515/2014, Art. 141, e da IN RFB nº 1.397/2014, art. 28, parágrafo único. Do
mesmo modo, existem regras próprias para a distribuição de lucros ou dividendos no caso de
pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real (RIR/99, Arts. 654 a 661), no lucro
arbitrado (RIR/99, Arts. 666 e 667) ou quando os beneficiários são residentes ou domiciliados
no exterior (RIR/99, Arts. 692 a 700).

Finalmente, convém referir que já houve várias tentativas de supressão ou modificação


das normas sob análise, é o caso do Projeto de Lei nº 377/1999 de autoria do então Deputado
Milton Temer e do Projeto de Lei nº 1.129/2003 de autoria do então Deputado Cláudio
Magrão, ambos rejeitados.

Recentemente, tramitou na Câmara do Deputados o Projeto de Lei nº 3.007/2008 9 de


autoria do Deputado Chico Alencar (na verdade uma reprodução do PL 377/1999) que
pretendeu reintroduzir, pela alteração do Art. 10 da Lei nº 9.249/1995, a tributação dos
rendimentos decorrentes da distribuição de lucros ou dividendos, que passariam a integrar a
base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no
país, ou se sujeitariam à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de 15%, no caso
de beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no exterior.

Os principais argumentos apresentados pelo deputado na justificativa de seu projeto são


o de que a isenção concedida pelo artigo em comento estabeleceu um incentivo sem
precedentes para a remessa de lucros e dividendos ao exterior e que a transferência de
recursos para o estrangeiro aumenta tão rápido quanto os próprios investimentos. Em relação
aos beneficiários domiciliados no país, o deputado sustenta a evidente existência de
capacidade contributiva (PL 3.007/2008, disponível em
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=386673, acesso
em 15/12/2014).

2.2 Reflexos do Art. 10 da Lei nº 9.249/1995 sobre a distribuição de lucros ou dividendos


em relação às pessoas jurídicas tributadas com base no lucro presumido

Para empreender a análise a seguir partimos dos seguintes pressupostos:

1) Sendo a tributação com base no lucro presumido uma opção do contribuinte, as


empresas que a adotam suportam uma carga tributária 10 menor do que aquelas que se sujeitam
à tributação com base no lucro real. Isto é, a adoção desse regime além da simplificação
administrativa implica uma vantagem financeira mais ou menos significativa para a empresa
que a adota.

2) A escrituração contábil que as empresas tributadas com base no lucro presumido


mantêm presta-se, em especial, para demonstrar que o lucro efetivo do negócio é superior à
base de cálculo do imposto de renda utilizada em decorrência da adoção desse regime, além, é
claro, de atender os ditames da legislação comercial e as funções gerencial, documental e
fiscal. Ou seja, a escrituração contábil demonstra que o negócio produziu uma parcela
excedente de lucros em comparação com o lucro presumido (valor da base de cálculo do
imposto de renda) que, pelas próprias características do regime, não sofre a incidência do
imposto de renda e adicional, nem da contribuição social sobre o lucro líquido.

9
Após ser rejeitado pela Comissão de Finanças e Tributação, esse projeto foi arquivado por despacho do
Presidente da Câmara dos Deputados (Diário da Câmara dos Deputados de 28/11/2013, pág. 56513).
10
Levando-se em conta, claro, todos os tributos e contribuições administrados pela RFB (IRPJ e adicional,
CSLL, PIS e COFINS) a que se sujeitam as pessoas jurídicas.
Pois bem. Há quem sustente que o artigo Art. 10 da Lei 9.249/1995 autoriza a não
incidência do imposto de renda sobre a distribuição dos lucros ou dividendos apurados pelas
pessoas jurídicas tributadas seja com base no lucro real, seja com base no presumido ou
arbitrado somente quando esses lucros já tenham sido efetivamente tributados por essas
pessoas jurídicas. É o que se depreende do trecho abaixo:

O sistema tributário deve, além de ter base legal, ser lógico. O sistema tributário
vigente, instituído pela Lei nº 9.249/95 no que diz respeito à distribuição dos lucros,
mostra-se lógico: se a empresa já pagou imposto de renda incidente sobre os lucros,
sua distribuição aos sócios pode ser isenta de tributação, ou esta renda estaria sendo
tributada duas vezes. Ou seja, a isenção para o sócio que recebe os lucros pressupõe
que estes já tenham sido tributados na empresa. Este seria, num sistema lógico e
racional, espírito da lei (mens legis) (Cunha, Albino Joaquim Pimenta da, Evasão
fiscal com abuso de direito – Pessoa física e pessoa jurídica, com isenção quase total
de tributos, disponível em http://www2.unafisco.org.br/institucional/conaf/
conaf2008/CD/download/tese/IV_EvasaoFiscal_AlbinoJoaquim.pdf, acesso em
15/12/2014, grifos do autor).

Vê-se que esta interpretação se harmoniza perfeitamente com a exposição de motivos


que originou o artigo em tela, pois ali, como visto, está dito claramente que, para promover a
completa integração entre a pessoa física e a pessoa jurídica, os lucros seriam tributados
exclusivamente na empresa e não sofreriam a incidência do imposto quando do seu
recebimento pelos beneficiários. Em nenhum momento se alude à distribuição de lucros ou
dividendos sem sua prévia tributação nas pessoas jurídicas em que forem gerados.

Ocorre que, a interpretação acima não foi a adotada pela Receita Federal. Com efeito, a
leitura mais acurada do Art. 10 da Lei nº 9.249/1995 leva a concluir que o texto legal se refere
a lucros ou dividendos calculados com base em resultados apurados pelas pessoas jurídicas e
não a resultados tributados efetivamente nessas pessoas. Esse detalhe, como se verá, é crucial
no tocante às empresas tributadas com base no lucro presumido ou arbitrado.

A IN SRF nº 11/1996, Art. 51, a IN SRF nº 93/1997, Art. 48 e, atualmente, a IN RFB nº


1.515/2014, Art. 141, dispuseram sobre esta matéria, em relação às empresas tributadas com
base no lucro presumido, nos seguintes termos:

Art. 141. Não estão sujeitos ao imposto sobre a renda os lucros e dividendos pagos
ou creditados a sócios, acionistas ou titular de empresa individual, observado o
disposto no Capítulo III da Instrução Normativa RFB nº 1.397, de 16 de setembro de
2013.
§ 1º O disposto neste artigo abrange inclusive os lucros e dividendos atribuídos a
sócios ou acionistas residentes ou domiciliados no exterior.
§ 2º No caso de pessoa jurídica tributada com base no lucro presumido ou
arbitrado, poderá ser distribuído, sem incidência de imposto:
I - o valor da base de cálculo do imposto, diminuída de todos os impostos e
contribuições a que estiver sujeita a pessoa jurídica;
II - a parcela de lucros ou dividendos excedentes ao valor determinado no item I,
desde que a empresa demonstre, através de escrituração contábil feita com
observância da lei comercial, que o lucro efetivo é maior que o determinado
segundo as normas para apuração da base de cálculo do imposto pela qual houver
optado, ou seja, o lucro presumido ou arbitrado. (Grifos de agora).
O lucro efetivo (contábil) é o resultado apurado referido no Art. 10 da Lei nº 9.249/1995
e basta que a distribuição de lucros ou dividendos se limite ao seu valor para que os
rendimentos pagos ou creditados a esse título, relativos à parcela de lucros excedentes referida
no inciso II acima, não se sujeite à incidência do imposto de renda, nem na empresa (fonte
geradora dos lucros), nem nos beneficiários dessa distribuição.

Quanto a essa matéria, tanto o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF),


quanto o Poder Judiciário têm interpretação coincidente com a da Receita Federal (cf. entre
outros o Acórdão nº 106-15.402, de 22/03/2006, da 6ª Câmara, do 1º Conselho de
Contribuintes, DOU de 24.07.2006, e a Apelação Cível nº 2001.71.02.0010135/RS, TRF da 4ª
Região, disponível em
http://www2.trf4.gov.br/trf4/processos/visualizar_documento_gedpro.php?
local=trf4&documento=2876893&hash=67d82cef5141288c88b9432e82261927, acesso em
15/12/2014).

Ou seja, em relação às empresas tributadas com base no lucro presumido ou arbitrado,


que se enquadram na situação acima descrita, o Art. 10 da Lei nº 9.249/1995 que veio com
exclusivo intuito de promover a completa integração entre a pessoa jurídica e seus sócios ou
acionistas criou, na verdade, uma extraordinária benesse fiscal que permite que uma parcela
dos lucros gerados seja distribuída sem qualquer tributação. Comparado ao teor da exposição
de motivos acima estudada, o texto legal foi muito além daquilo que se pretendia,
especialmente quando se atenta para a lógica do sistema tributário.

Saliente-se que em relação às empresas sujeitas à tributação com base no lucro real, as
normas do artigo acima se coadunam perfeitamente com seu objetivo original, isso porque,
nesse caso há identidade entre os resultados apurados (fundamento dos lucros ou dividendos
distribuídos) e a base de cálculo (lucro real) sobre a qual incide o imposto de renda devido
pela empresa.

A própria ciência contábil ao qualificar o lucro líquido apurado na Demonstração do


Resultado do Exercício (DRE) assim se pronúncia:

De fato, o lucro ou prejuízo líquido apurado nessa demonstração é o que se pode


chamar de lucro dos acionistas, pois, além dos itens normais, já́ se deduzem como
despesas o Imposto de Renda e as participações sobre os lucros a outros que não os
acionistas, de forma que o lucro líquido demonstrado é o valor final a ser adicionado
ao patrimônio líquido da empresa que, em última análise, pertence aos acionistas, ou
é distribuído como dividendo. (Iudícibus, 2010, pág. 4).

Isto é, para a ciência contábil, o lucro que pertence aos acionistas (ou sócios) e pode ser
adicionado ao patrimônio líquido da empresa ou distribuído a eles é aquele de que já se
deduziram todas as participações sobre os lucros e a despesa com o Imposto de Renda11,
logicamente incidente sobre a totalidade do lucro apurado antes desse imposto.

Na verdade, no caso das empresas optantes pela tributação com base no lucro presumido
ou arbitrado que distribuem a parcela de “lucros excedentes” acima vista, a combinação de
recolhimento a menor pela empresa (via não tributação da integralidade dos lucros do
negócio) e ausência de qualquer incidência do imposto de renda sobre essa distribuição
introduz uma séria distorção no sistema. Primeiro, porque o recolhimento a menor da empresa
significa que o Estado está perdendo receita e financiando (a fundo perdido!) a atividade
empresarial; segundo porque, neste caso, a distribuição de lucros ou dividendos acarreta
injustificadamente ganhos extraordinários aos sócios ou acionistas dessas empresas.
(Almeida, 2004, pág. 8 e 10).
11
Atualmente no Brasil desconta-se também o Adicional do IRPJ e a CSLL.
Existe também um outro aspecto importante, esse de natureza não tributária, que não
deve ser olvidado: no caso de empresas constituídas sob a forma de sociedades limitadas, em
que as deliberações sociais dependem substancial e exclusivamente da vontade de seus sócios,
os ganhos extras acima apontados podem, em alguns momentos, estimulá-los a superestimar o
montante de lucros distribuídos, colocando em risco a própria continuidade dessas empresas.

Portanto, a distribuição de lucros ou dividendos sem qualquer incidência do imposto de


renda, nos moldes da situação acima descrita, além de, na verdade, resultar num ganho
extraordinário para seus beneficiários, pode não estar estimulando o investimento produtivo,
outro dos objetivos pretendidos pela adoção do regime do Art. 10 da Lei nº 9.249/1995.

2.3 Reflexos para a administração tributária

Outro aspecto relevante referente ao regime fixado pela Lei nº 9.249/1995, no caso de
empresas tributadas com base no lucro presumido possuidoras de parcela de “lucros
excedentes”, diz respeito à verificação pela administração tributária da efetiva existência
desses lucros.

Ocorre que a parcela de “lucros excedentes” para gozar do benefício fiscal em estudo
tem, como antes visto, de ser demonstrada por meio de escrituração contábil completa, e
somente mediante o exame aprofundado dessa escrituração pode-se verificar a sua efetiva
procedência.

Como se sabe, a escrituração contábil fica de posse da empresa. Deste modo, somente
mediante um procedimento administrativo formal a administração tributária poderá analisá-la,
ou seja, não há quaisquer controles internos que de per si possam concluir acerca da
existência e legitimidade dessa parcela de “lucros excedentes” distribuídos sem qualquer
incidência do imposto.

Quando se recorda o número de empresas que optam pelo regime do lucro presumido
(mais de 1.010.000, em média, entre 2009 e 2012) em comparação ao número das que
tributam seus resultados com base no lucro real (pouco mais de 150.000, no mesmo período) e
se relembra que, a partir de 2014 a tendência é a elevação do número de pessoas jurídicas
optantes pela tributação com base no lucro presumido, afere-se a dimensão desse problema.

Por outro lado, é perfeitamente razoável supor que, para usufruir indevidamente do
regime fixado pelo Art. 10 da Lei 9.249/1995, as empresas optantes pela tributação com base
no lucro presumido possam estar distribuindo como se lucros fossem valores que não têm essa
natureza, ou melhor, estas empresas podem estar distribuindo lucros ilícitos ou fictícios,
figuras previstas no art. 1.009 da Lei nº 10.406/2002 (Código Civil) ou dividendos de forma
irregular, conforme previsto nos §§ 1º e 2º, do art. 201 da Lei nº 6.404/1976.

Para que o acima previsto ocorra, basta que a escrituração contábil onde se encontra a
parcela de “lucros excedentes” tenha sido feita, por erro ou mesmo por má fé, sem se levar em
conta a legislação comercial, as normas brasileiras de contabilidade ou os princípios
contábeis. Ressalve-se que há sanções, tanto civis como penais, para aqueles que distribuem,
e, conforme o caso, para aqueles que receberem lucros ou dividendos nas condições previstas
no parágrafo anterior (ANDARADE FILHO, 2013, págs. 172 a 175).
CONCLUSÃO

O presente estudo apresentou brevemente as principais características do regime de


tributação com base no lucro presumido e alguns dados estatísticos acerca desse regime em
comparação com o regime de tributação com base no lucro real.

Em seguida examinaram-se, relativamente à distribuição de lucros ou dividendos, as


consequências do regime de integração entre a pessoa jurídica em que são gerados os lucros e
os seus sócios ou acionistas, introduzido pelo art. 10 da Lei nº 9.249/1995, com especial
interesse para o caso das empresas tributadas com base no lucro presumido (ou arbitrado) que
demonstrem que seu lucro efetivo (contábil) é maior que o determinado segundo as normas
para apuração da base de cálculo do imposto pela qual haja optado, ou seja, o lucro presumido
ou arbitrado.

Especificamente para a situação descrita no parágrafo anterior, concluiu-se que o regime


legal atualmente em vigor acabou por conceder um benefício fiscal excepcional para os
beneficiários dos rendimentos decorrentes daquela distribuição de lucros ou dividendos, que
extrapolou a própria justificativa apresentada para sua introdução e não se harmoniza com a
lógica do sistema tributário vigente.

Para reestabelecer a equidade do sistema em relação a matéria objeto do presente


trabalho conclui-se que é necessária uma alteração legal que limite a distribuição de lucros ou
dividendos sem a incidência do imposto de renda, no caso das empresas tributadas com base
no lucro presumido ou arbitrado, ao valor da base de cálculo do imposto, ou seja o lucro
presumido ou arbitrado, diminuído de todos os impostos e contribuições a que estiver sujeita a
pessoa jurídica e estabeleça que valores distribuídos acima desse limite sejam tributados na
fonte ou considerados rendimentos tributáveis, conforme o caso.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Aloísio Flávio Ferreira de. A Tributação dos Lucros e o Retorno ao


Investimento no Brasil, 2004. Disponível em
<http://www3.tesouro.fazenda.gov.br/Premio_TN/IXPremio/financas/MH2tefpIXPTN/mh2_p
ermio_tefp.pdf>. Acesso em: 07 jan. 2015.

ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Imposto de Renda das Empresas. 10. ed. São Paulo:
Atlas, 2013.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,


DF, Senado, 1988.

BRASIL. Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8981.htm>. Acesso em: 23 out. 2014.

BRASIL. Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9249.htm>. Acesso em: 23 out. 2014.

BRASIL. Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9718.htm>. Acesso em: 23 out. 2014.
BRASIL. Lei nº 12.973, de 13 de maio de 2014. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/Lei/L12973.htm>. Acesso em: 23
out. 2014.

BRASIL. Receita Federal do Brasil (Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros). Dados


Setoriais 2008/2012. Brasília, 2014. Disponível em:
<http://www.receita.fazenda.gov.br/publico/estudoTributarios/estatisticas/DadosSetoriais2008
_2012.pdf>. Acesso em 12 jan. 2015.

BRASIL. Receita Federal do Brasil. Instrução Normativa SRF nº 011, de 21 de fevereiro


de 1996. Disponível em:
<http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/ins/Ant2001/Ant1997/1996/insrf01196.htm>.
Acesso em 23 out. 2014.

BRASIL. Receita Federal do Brasil. Instrução Normativa SRF Nº 93, de 24 de dezembro


de 1997. Disponível em:
<http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/ins/Ant2001/1997/insrf09397.htm>. Acesso
em 23 out. 2014.

BRASIL. Receita Federal do Brasil. Instrução Normativa RFB Nº 1.515, de 24 de


novembro de 2014. Disponível em:
<http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?
visao=anotado&idAto=58604>. Acesso em 27 jan. 2015.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, Volume 1, 6. ed. São Paulo: Saraiva,
2003.

CUNHA, Albino Joaquim Pimenta da. Evasão fiscal com abuso de direito – Pessoa física e
pessoa jurídica, com isenção quase total de tributos. Disponível em
<http://www2.unafisco.org.br/institucional/conaf/conaf2008/CD/download/tese/IV_EvasaoFi
scal_AlbinoJoaquim.pdf>. Acesso em 15 jan. 2015.

IUDÍCIBUS, Sérgio de; MARTINS, Eliseu; GELBCKE, Ernesto Rubens; SANTOS,


Ariovaldo dos. Manual de Contabilidade Societária. São Paulo: Atlas, 2010.

LIMA, Mariana Miranda. A natureza jurídica dos juros sobre o capital próprio e as
convenções para evitar a dupla tributação. São Paulo, USP, 2009. 159p. Dissertação
(Mestrado em Direito). Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, 2009. Disponível
em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2133/tde-20102011-134923/pt-br.php>.
Acesso em: 07 jan. 2015.

You might also like