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Francisco Xavier de Vargas Neto*

Diferentes autores e INTRODUÇÃO tiva é uma necessidade; um estudo francês


quase a totalidade sobre este tema (Danse e Lambert. em Durand,
dos professores de Este trabalho é uma revisão de literatu- 1988) revela que 95% dos pais está a favor da
educação física ra acompanhada de uma profunda reflexão prática esportiva de seus filhos e 86% pensa
coincidem na sobre o esporte infantil. O autor, que esteve que estas atividades são tão importantes quan-
afirmação de que é por muito tempo envolvido com o ensino e o to as intelectuais. Da mesma forma, em uma
durante as primei- treinamento de crianças e jovens, visando o pesquisa encomendada pelo jornal esportivo
ras etapas do máximo rendimento -e resultados- durante as francês UEquipe, ficou claro que 67% dos
aprendizado espor- competições, como principal objetivo, tem atu- entrevistados são partidários da prática espor-
almente muitas dúvidas a respeito de tal pro- tiva diária na escola.
tivo que se deve
estabelecer as bases cedimento. A questão é bastante polêmica, pois
do futuro rendimen- nela estão envolvidas pessoas com diferentes Em relação a classe médica, a opinião
to, e jamais buscar interesses, os mais variados conhecimentos (as não é diferente das anteriores, se observa que
vezes nenhum) e inclusive os familiares com 99% dos pediatras franceses considera positi-
o rendimento
toda a carga de afetividade que isto represen- va a prática esportiva infantil, reduzindo no
imediato.
ta, ainda que seja necessário ressaltar que mes- entanto esta aceitação para 74% quando a ini-
mo no meio acadêmico e científico, não existe ciação se dá antes dos 7 anos de idade (Mandei
unanimidade sobre as questões apresentadas. e Hennequet, em Durand, 1988).
E lógico que para tratar deste tema de forma
profunda é necessário analisar multidiscipli- Para os médicos e professores de edu-
narmente os aspectos biológicos e fisiológi- cação física, atualmente a prática das ativida-
cos, educativos e pedagógicos como também des físicas e esportivas contribui positivamente
políticos e éticos que envolvem a questão. também no combate a "degeneração hipoci-
Assim sendo é um trabalho que está aberto a nética", entendida como uma carência relati-
novas aportações, teorias e mais amplamente va de movimento. E uma doença caracteriza-
a novos paradigmas que relacionem a criança da pela diminuição da capacidade funcional
e o esporte. Pretende-se apresentar o estado de vários órgãos e sistemas (Lamb, 1985). In-
atual da questão como fundamento básico para felizmente esta enfermidade que até bem pou-
um futuro projeto de pesquisa mais amplo, a co tempo afetava somente aos adultos, está se
ser desenvolvido no Centro de Educação, Ci- estendendo hoje em dia também as crianças,
ências Humanas e Letras - Departamento de como bem assegura Seibold (1974) quando
Educação Física da Universidade Luterana do afirma que a vida em um mundo muito civili-
Brasil - ULBRA em Canoas/RS. zado, que libera a criança dos esforços físicos,
que dá cada vez menos espaço e estímulos aos
jogos livres infantis, toma as crianças pregui-
çosas e cômodas perante o tempo. Neste mo-
ASPECTOS POSITIVOS DA mento é necessário fazer referência aos aspec-
PRÁTICA ESPORTIVA INFANTIL tos negativos da televisão, ao desenvolvimen-
to dos jogos eletrônicos, e a tendência das
Para a maioria dos pais, a prática espor- máquinas e computadores executarem as tare-
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fas cotidianas antes destinadas ao ser huma- 1987) parece ser suficientemente clara quan-
no; influência esta que segundo Toffler (1980) do diz que a aventura esportiva é um enrique-
deverá acentuar-se nos próximos anos. cimento possivelmente insubstituível, porém
afirma que, os caminhos que conduzem aos
Munne e Codina (1992) entendem que pódiums e as marcas deveriam ser traçados
todo este contexto colabora para manter inati- sobre as bases de um patrimônio cultural-es-
vas fisicamente as crianças, ocasionando de- portivo-humanista respeitando ao adolescente
formações da coluna vertebral, aumentando com o fim de nunca esquecer ao menino ou
seus hábitos consumistas e sua passividade menina, futuros homem e mulher que estão por
perante as mensagens subliminares transmiti- trás do esportista.
das pela TV. Porém como diz Scully (1990), Em nossa tese
nossos corpos não estão adaptados a este ní- Diferentes autores e quase a totalidade doutorai que trata
vel de inatividade que a tecnologia do século dos professores de educação física coincidem sobre "Esporte e
XX nos permite desfrutar. na afirmação de que é durante as primeiras eta- Saúde" (VARGAS
pas do aprendizado esportivo que se deve es- NETO, 1995),
Para Cotta (em Hahn, 1988), em geral o tabelecer as bases do futuro rendimento, e ja- fazemos um apelo
esporte fomenta na criança e no adolescente a mais buscar o rendimento imediato. as autoridades
maturidade, o crescimento e o desenvolvimen- políticas e esporti-
to. Porém acrescenta, perigoso só é o esporte Como se pode ver, se trata de aplicar ao vas no sentido de
de alto rendimento específico realizado na ida- menor um modelo de esporte que não busque uma legislação
de infantil. É quase unânime o acordo no mo- o êxito pelo êxito, nem futuro nem imediato, e própria que regule e
mento de recomendar a prática esportiva na que esteja adaptado as necessidades, caracte- controle basicamen-
infância, ainda que muitos entendem que pode rísticas e possibilidades reais de seus pratican- te:
provocar problemas quando esta prática se ini- tes. Assim se pode afirmar que no esporte in- a) o número máxi-
cia muito cedo ou está totalmente voltada para fantil deve prevalecer o objetivo de contribuir mo de horas de
a competição. na formação integral da pessoa humana por treinamento de
meio da atividade esportiva. Ver quadro 1, a crianças;
A afirmação de Thomas (em Personne, seguir. b) a intensidade e os
objetivos deste
Quadro 1. Razões usualmente utilizadas por diferentes profissionais em relação
mesmo treinamen-
aos benefícios das atividades físico-desportivas (incluídos os pais).
to, e
Pais - uma necessidade psicofísica c) a formação e
- novas amizades
qualidade do ensino
- ambiente sadio
- afasta de atividades inadequadas da pessoa responsá-
vel por estas ativi-
Médicos - melhora a saúde de forma geral dades.
- combate a "degeneração hipocinética"
- como prevenção nas doenças cardiovasculares
Nutricionistas - coadjuvante no tratamento da obesidade
- manutenção do peso adequado
Fisioterapeutas - importante elemento rehabilitador nas doenças
do aparelho locomotor
Educadores - fomenta: a maturidade, o crescimento, o desenvolvimento
e a socialização
Psicólogos - elemento preventivo e terapêutico na ansiedade,
no estresse e na depressão
- produz efeitos sobre a cognição, a afetividade e
a agressividade
Professores de - aprendizado esportivo
Ed. Física - desenvolvimento das habilidades motoras
- desenvolvimento da capacidade física ou
condição biológica

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A INICIAÇÃO, A ESPECIALIZAÇÃO Estados Unidos (em DURAND, 1988), verifi-


E A PRECOCIDADE ESPORTIVA cou que em várias atividades o começo se dá
antes dos 5 anos de idade (beisebol, natação,
Devemos começar tentando entender o atletismo e ginástica) e inclusive na natação e
que é iniciação esportiva; desta forma, por "ini- ginástica pode ocorrer aos 3 anos. JEFFERIES
ciação esportiva" (IE) pode-se compreender o citado por DURAND (1988) pesquisou a IE
processo que leva uma pessoa (normalmente na hoje extinta União Soviética e concluiu que
a criança) desde sua chegada a uma escolinha não é diferente dos Estados Unidos; ginástica,
até a prática esportiva competitiva. É lógico natação e patinação começam antes dos 5 anos
que este processo implica um aprendizado e de idade. Alguns atletas se tornaram conheci-
posterior treinamento progressivo, direcionado dos mundialmente exatamente por sua pouca
a melhorar e depois aperfeiçoar os diferentes idade, principalmente na ginástica olímpica
aspectos orgânicos, funcionais, técnicos e tá- isto ocorre com muita freqüência e Nadia
ticos necessários ao ótimo rendimento no es- Comanecci é o exemplo mais significativo da
porte escolhido. frágil menininha que se tornou estrela mundi-
Outra das causas al com pouquíssima idade. Casualmente esta
deste fenômeno, é o A natureza do fenômeno da IE e com- mesma atleta teve graves problemas de saúde
petitiva de crianças é muito mais freqüente do mental posteriormente ao abandono das com-
atual sistema
que se pensa, basicamente por ser a criança petições esportivas.
esportivo infantil -
influenciável e por sua elasticidade e depen-
basicamente com-
dência dos adultos. Este fenômeno se dá com
petitivo- que nâo
muita regularidade nos países de maior
esta de acordo com hegemonia esportiva mundial e principalmen- A CONTROVÉRSIA DESTE TEMA
as autênticas te em algumas modalidades específicas e é
necessidades das bastante tratado na literatura especializada. O fenômeno da IE precoce tem gerado
crianças, pois é
muita controvérsia no mundo da atividade fí-
simplesmente um Para Personne (1987) "iniciação espor- sico-esportiva. Normalmente se encontra pes-
sistema adaptado tiva precoce" (IEP) é a atividade esportiva de- soas que a apoiam totalmente bem como aque-
do modelo adulto. senvolvida antes da puberdade e caracteriza- las que rechaçam antagônica e francamente
da por uma alta dedicação aos treinamentos este processo. Para alguns dirigentes, treina-
(mais de 10 horas semanais) e principalmente dores e monitores esportivos, geralmente pes-
por ter uma finalidade eminentemente compe- soas sem formação universitária, esta prática
titiva. Já Kunz (1994), referindo-se a "treina- é justificada e não existe nenhum inconveni-
mento especializado precoce" (TEP) entende ente em iniciar a criança precocemente nos trei-
que este ocorre quando crianças são introdu- namentos e competições esportivas a nível
zidas antes da fase pubertária a um processo federado. Para outros no entanto, quase sem-
de treinamento planejado e organizado a lon- pre professores com formação acadêmica, esta
go prazo1, que se efetiva em um mínimo de iniciação é um atentado contra a criança e mais
três sessões semanais com o objetivo do gra- amplamente contra toda a infância que deve-
dual aumento do rendimento, além da partici- ria estar proibido ou no mínimo regulamenta-
pação periódica em competições. do.

Duas conclusões podem ser tiradas des- Em nossa tese doutorai que trata sobre
tas citações: em primeiro lugar existe uma certa "Esporte e Saúde" (VARGAS NETO, 1995),
confusão conceituai em referência aos temas fazemos um apelo as autoridades políticas e
IEP e TEP pois ambas definem o mesmo pro- esportivas no sentido de uma legislação pró-
cesso ainda que não signifiquem a mesma coi- pria que regule e controle basicamente:
sa, e em segundo lugar entende-se pelas defi- a) o número máximo de horas de treina-
nições que outros diferentes e importantes as- mento de crianças;
pectos formativos, neste caso, são deixados de b) a intensidade e os objetivos deste mes-
lado ou na melhor das hipóteses são valores mo treinamento, e
secundários. c) a formação e qualidade do ensino da
pessoa responsável por estas atividades.
Martens em 1986, estudando a IE nos Seria igual ao que ocorre no controle
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por parte do estado de outros aspectos saúde de uma criança (Aucune medeille ne vaut
tais como: ingresso de menores no tra- la santé d'un enfant), recolhe um enorme nú-
balho, o número máximo de horas na mero de casos reais nos quais os esportistas -
escola, a segurança dos brinquedos e a todos eles submetidos no presente ou no passa-
higiene dos produtos alimentícios. do ao TEP- apresentam uma infinidade de pro-
blemas psicológicos, de saúde física e de
integração. Outro trabalho excelente é o de Cotta
(em Hahn, 1988) onde se pode verificar dife-
AS RAZÕES QUE TENTAM JUSTIFI- rentes patologias em praticantes de diversas
CAR A ESPECIALIZAÇÃO PRECOCE modalidades esportivas como, halterofilismo,
saltos, remo, natação e outros; todos estes atle-
Alguns pesquisadores tem tentado encon- tas quando crianças haviam sido submetidos ao
trar as razões que buscam justificar a IEP e o TEP. Em um estudo de Mandei e Hennequet
TEP (ou especialização esportiva precoce (em Durand, 1988), 74% dos pediatras consul-
[EEP])2, Hahn (1988) concluiu que o adianta- tados considera não conveniente a prática es-
É normal observar-
mento da idade de máximo rendimento3, prin- portiva competitiva antes do final da puber-
cipalmente em determinados esportes, motiva dade; da mesma maneira no informe elaborado mos atletas de alto
a federações, clubes e treinadores a iniciar este por Delmas (em Personne, 1987), estudo en- nível que adquiri-
processo dirigido ao alto rendimento cada vez carregado pela Academia de Medicina da Fran- ram "automatismos
com maior precocidade. Observa-se que outra ça, é chamada a atenção sobre os efeitos nega- motores extrema-
das causas deste fenômeno, é o atual sistema tivos e portanto prejudiciais da EEP e do TEP. mente rígidos" que
esportivo infantil -basicamente competitivo- que lhes impede de
não está de acordo com as autênticas necessi- Destes trabalhos citados e de outros tan- executar movimen-
dades das crianças, pois é simplesmente um sis- tos já publicados, se pode concluir e entender tos novos e diversifi-
tema adaptado do modelo adulto. Um aspecto alguns dos prejuízos que a prática intensiva de cados.
importante a considerar, é também a busca do um esporte competitivo iniciado precocemente
êxito e vitórias (medalhas) a qualquer preço, na infância pode ocasionar, para facilitar o en-
isto motiva ministérios de esportes, federações tendimento dividimos os possíveis riscos em
nacionais e clubes a estimular a iniciação pre- quatro grandes áreas: riscos de tipo físico, psi-
matura. Um último aspecto decisivo talvez para cológicos, motrizes e riscos de tipo esportivo.
explicar este fenômeno, é a atitude dos pais que
freqüentemente buscam uma compensação, por
meio dos filhos, das vitórias e títulos esporti-
vos não conseguidos por eles mesmos. Riscos de tipo físico

Segundo nossa análise, observa-se que Neste bloco se faz referência aos riscos
de todos estes motivos expostos, nenhum de- que a prática esportiva competitiva iniciada pre-
les se ajusta aos interesses e necessidades re- cocemente pode ocasionar a saúde corporal das
ais das crianças, pois são todos argumentos crianças. Foram detectados problemas ósseos,
extrínsecos ao verdadeiro e principal ator des- articulares, musculares e cardíacos, dependen-
te jogo, a criança. do da especialidade esportiva, sobretudo aque-
las tecnicamente mais complexas que empre-
gam um grande número de repetições de gestos
técnicos visando a automatização e aperfeiçoa-
OS PREJUÍZOS DE UMA mento do movimento. PERSONNE (1987)
ESPECIALIZAÇÃO PRECOCE comprovou que um praticante de ginástica olím-
pica pode realizar ao longo de uma temporada
De outra parte, inúmeros autores tem mais de 8.000 saltos (impacto altamente
apresentado trabalhos que destacam os prejuí- traumatizante para as articulações); um atleta
zos de natureza diversa de um TEP ou da EEP. de saltos ornamentais executa mais de 14.000
O mais importante trabalho nesta área é de um saltos; um arremessador de dardo, 6.000 arre-
francês, professor de educação física, Person- messos por ano. Preocupados com as campa-
ne, a obra datada de 1987 cujo título por si só é nhas que promovem as corridas de rua, nas quais
muito significativo. Nenhuma medalha vale a crianças e adolescentes são estimulados a par-
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ticipar, assusta a pesquisa de FERRANDIS exigida principalmente em algumas modalida-


(1994) na qual verificou que um corredor de des esportivas, que pode chegar a várias horas
maratona durante a prova, executa por volta de ao dia durante todos os dias da semana, acres-
30.000 impactos do calcanhar contra o solo, centando ainda mais a atividade escolar. Kunz
nestes impactos pode chegar a aplicar uma for- (1994) detectou que isto pode provocar uma
ça de até seis vezes o peso de seu corpo. No formação escolar deficiente, e pior, parece ser
voleibol sabemos que um cortador pode chegar que a criança esportista participa menos das
a 150 saltos por partida, nos quais seus pés atin- brincadeiras e jogos do mundo infantil, ativi-
gem uma altura superior a um metro e o impac- dades estas que são indispensáveis ao pleno
to de chegada ao solo pode ser de até dez vezes desenvolvimento de sua personalidade.
o peso de seu corpo. Devemos pensar também
nos anos de preparação, duração e intensidade
do treinamento para chegar a este nível. É uma Riscos de tipo motriz
carga demasiadamente forte para o ombro e ar-
Lembramos que a Aqui serão agrupados os riscos relacio-
ticulações dos membros inferiores. O grande
criança não é um nados com a falta de base poliesportiva que
problema deste tipo de risco reside no impacto
adulto (atleta) em acompanha o TER Efetivamente sabemos que
e na similitude dos gestos, principalmente se
miniatura e que o o TEP busca o rendimento em um aspecto con-
nos referimos a crianças em pleno processo de
treinador ou profes- creto da execução motriz -no modelo compe-
desenvolvimento.
sor além de sua titivo- ignorando geralmente os outros impor-
tantes objetivos educacionais que o esporte
tarefa técnica,
Riscos de tipo psicológico pode oferecer.
também deve ter
responsabilidade
Neste bloco são agrupadas todas as con- Esta "pobreza motriz" ocasionada pelo
pedagógica com o
seqüências negativas do TEP e das competi- TEP (ou pela EEP) está mais presente em al-
futuro -principal- ções que se relacionam com a conduta e o es- guns esportes que em outros, podendo inclu-
mente- do jovem a tado mental dos sujeitos. Em crianças compe- sive impossibilitar a prática futura de um es-
ele confiado. tidoras foram encontrados níveis anormalmen- porte diferente daquele que praticou durante a
te altos de ansiedade, estresse e frustração; são infância (Vargas Neto, 1995). É normal obser-
conhecidos casos de talentos esportivos com varmos atletas de alto nível que adquiriram
futuro promissor que hoje se sentem martiri- "automatismos motores extremamente rígidos"
zados internamente por fracassos e desilusões que lhes impede de executar movimentos no-
resultantes de maus resultados em competi- vos e diversificados; é um paradoxo do espor-
ções. De qualquer forma o fato mais preo- te, a plena e total habilidade em uma modali-
cupante psicologicamente, é o que alguns au- dade esportiva, impedindo neste mesmo indi-
tores chamam de "infância não vivida", por víduo sua disponibilidade motriz generaliza-
culpa da alta dedicação aos treinamentos da (Vazquez, 1989).

Quadro 2. Tipos de riscos à que está exposta a criança quando da prática intensiva de uma
modalidade esportiva.
Riscos de tipo físico - lesões ósseas
- articulares
- musculares
- cardíacas
Riscos de tipo psicológico - níveis altos de ansiedade, estresse e
frustração
- sofrimento psíquico por fracassos e
desilusões
- relatos negativos de "infância não vivida"
e formação escolar deficiente
Riscos de tipo motriz - "pobreza motriz"
- "automatismos motores rígidos"
Riscos de tipo esportivo - a especialização sem as condições exigidas
v
no futuro, pelo esporte escolhido

7íf
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Riscos de tipo esportivo antes do final da puberdade. (ver quadro 2)

Neste bloco se destaca que na prática


esportiva precoce se produz uma iniciação/es-
pecialização as cegas, pois é muito difícil co- EVITANDO OS RISCOS
nhecer com exatidão as características do fu-
turo atleta de elite quando este ainda é muito A adequada prática esportiva e compe-
pequeno. Pode ser que estamos iniciando/es- titiva infantil vai depender de uma infinidade
pecializando a criança para uma prática espor- de fatores entre os quais podemos citar: a for-
tiva para a qual ela não tem as mínimas condi- mação e atuação do professor, os meios e os
ções especiais exigidas. objetivos propostos, a faixa etária das crian-
ças, o tipo de competição no qual ela vai parti-
Parece ser também que a conquista de cipar, a efetiva forma de participação da famí-
importantes títulos ou marcas durante a infân- lia neste contexto e etc. De qualquer modo,
cia não é garantia de sucessos esportivos quan- durante o treinamento infantil é importante que
do este mesmo atleta se torna adulto2. sejam observados os aspectos mostrados a se-
guir, para que se possa evitar dentro do possí-
A seleção de talentos é um campo das vel, os riscos comentados no decorrer de nos-
ciências do esporte que ainda precisa avançar so trabalho. Ungerer (em Hahn, 1988) sugere
muito, ainda que em determinados aspectos que devemos: (ver quadro 3)
correlacionados com o rendimento esportivo,
como por exemplo a antropometria, existem Para concluir, lembramos que a criança
meios bastante fiáveis de predição. No entan- não é um adulto (atleta) em miniatura e que o
to, outros importantes aspectos como "moti- treinador ou professor além de sua tarefa téc-
vação futura", "atitude frente a competição" nica, também deve ter responsabilidade peda-
ou "persistência nos treinamentos", não se gógica com o futuro -principalmente- do jo-
pode hoje em dia efetuar estudos prospectivos vem a ele confiado.
com relativa garantia de sucesso.
Encerramos, apresentando a "Carta dos
De toda nossa exposição anterior, che- direitos da criança no esporte", uma ideologia
gamos a conclusão de que existem muitas dú- psicopedagógica baseada nas noções de res-
vidas quanto a conveniência da IEP ou do TEP peito ao jovem esportista, que diz em seu arti-
bem como da prática esportiva competitiva go primeiro: "toda criança tem direito a prati-

Quadro 3. Recomendações de Ungerer visando evitar os riscos de um trabalho esportivo


inadequado.

1. Durante as cargas elevadas, aumentar os tempos de recuperação;


2. Priorizar o desenvolvimento da resistência aeróbia em lugar do treinamento
da resistência anaeróbia;
3. Evitar as situações onde se bloqueia a respiração (apneias prolongadas);
4. No treinamento de força, evitar as cargas elevadas que incidem sobre a coluna;
5. No treinamento de força, aumentar o trabalho de flexibilidade;
6. Nas tarefas que exigem alta coordenação motora, ter em mente a
limitação do processamento de informação nas crianças;
7. Priorizar os movimentos e as habilidades naturais em lugar dos exercícios elaborados;
8. Valorizar a variedade em lugar da esteriotipação dos gestos técnicos;
9. Para melhor motivação, valorizar o aspecto lúdico das atividades; e,
10. Por ser melhor por sua maior carga motivacional, efetuar o treinamento em grupo
do que individualmente.

7S
car esporte", e termina em seu décimo-primeiro NOTAS
artigo propondo que "toda criança tem direito
a não ser um campeão". 'Entendemos que dificilmente este treinamento é organizado e
planejado a longo prazo; quase sempre ocorre uma falta de pla-
nejamento, e quando este existe, normalmente é a curto prazo e
buscando resultados imediatos.
2
BIBLIOGRAFIA Esta é outra terminologia que se junta as anteriores e que vem
a aumentar a já referida confusão de conceitos que tratam do
mesmo tema.
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