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A consciência como estratégia da vida

Neste capítulo, poderemos notar que a filosofia é geralmente definida como o esforço
que o homem faz para perceber a realidade, no caso, buscando uma compreensão mais
aprofundada. Ela é tida como uma forma de conhecimento ao lado de outras formas de
conhecimento — como o senso comum, o mito, a religião, a arte, a ciência, que também são
outros tantos esforços do homem para compreender essa mesma realidade.

A consciência subjetiva surge no bojo do próprio processo vital...

Sem entrar na especificidade de cada uma dessas formas, o que se pode afirmar com
segurança, com base nos estudos antropológicos, é que os homens têm uma tendência
"espontânea" a "descobrir" o que é o mundo que os circunda, a conhecer, a compreender esse
mundo e a si mesmos nesse mundo, a natureza e a sociedade.
Portanto, para os homens, conhecer é um impulso como que natural e instintivo no
sentido em que ele brota espontaneamente, confundindo-se, na sua origem, com o próprio
impulso da vida. A consciência emerge e se desenvolve como estratégia da vida, integrando o
equipamento de ação do homem com vistas a sua sobrevivência. O pensar surge, assim,
concomitante ao agir, com ele se confundindo. O pensamento não é anterior à ação, pois
surge no próprio fluxo do agir.
Não é, pois, necessário "justificar" o conhecimento, uma vez que isto coincidiria com a
justificação do próprio homem. Mas o homem é, numa abordagem inicial, um puro fato
empírico e histórico e é justamente dessa condição que se impõe partir se quisermos realizar
uma empreitada explicativa de sua existência, num plano racional.

Ora, o que as ciências antropológicas nos revelam? Que o primeiro dado humano
perceptível é a existência de seres humanos vivos, corpos orgânicos, fisicamente constituídos,
inseridos num ambiente natural, com uma necessidade intrínseca fundamental, primordial: a
de manter essa existência material, necessidade que compartilham originariamente com todos
os demais seres vivos. Todo ser vivo tende a se manter vivo, a se conservar, já que a primeira
finalidade da vida é exatamente esta: viver. Mas também se perceberá que nesse esforço de
manutenção da própria vida, os homens revelam uma diferença significativa: eles, ao contrário
dos demais seres vivos, passam a produzir os meios de sua própria existência... Viver, para os
homens, identifica-se com conservar sua existência material individual, produzindo-a ao
produzir os meios de sua conservação e ao garantir a sua reprodução enquanto espécie. A
diferenciação do mundo propriamente humano em relação ao mundo puramente animal se
caracteriza inicialmente por essa capacidade que os humanos têm de prover os meios de sua
existência, relacionando-se então diferenciadamente com a natureza. Os homens esencadeiam
uma forma diversa de agir para sobreviver, criando ou recriando novos meios de existência,
pela reorganização ou modificação dos recursos naturais disponíveis. Essa capacidade é o dado
novo, essa disponibilidade de um equipamento que lhes permite modificar, de acordo com
uma intenção subjetivada, a ordem instrumental mecânica do mundo natural.

Assim, a consciência humana se inaugura como impulso vital originário, como uma
espécie diferenciada de instinto, sem a rigidez de um puro mecanismo. E, nesse nível, a
consciência faz corpo com o agir dos homens que assumem então um papel de sujeitos dessa
ação, subjetividade até então puramente vivenciada, que não se dava ainda conta de si
mesma.

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