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Criatividade na BNCC e em pesquisas atinentes a educacaéo literdria: indagacées e desvelamentos! Maria Amélia Dalvi* ee Resumo Problematiza-se 0 tratamento dispen- sado A criatividade no proceso de educagdo escolar, focalizando-se, em seguida, as especificidades da eduea- cdo literdria. As fontes para a pesqui- sa foram a recém oficializada Base Nacional Comum Curricular ¢ pes- quisas contemporaneas desenvolvidas em programas de pos-graduagio bra- sileiros. O que se constata, na andlise do documento oficial, é a redugio da criatividade a uma dimensio instra- mental. Por outro lado, a andlise de pesquisas contempordneas evidencia a coexisténcia de distintas perspectivas no tocante ao papel da criatividade na educagdo literdria, bem como da educagao literaria no desenvolyimen- to da criatividade. Na discussao, 6 retomada a proposta de superagio da crenga na criatividade como algo inato ou espontaneo e, na parte final, discute-se como as atuais perspectivas oficiais para o ensino de literatura na escola podem esvaziar tanto 0 corpo de contetidos historicamente produzi- dos sobre a literatura, quanto, tam- bém, a especificidade do trabalho do professor de literatura, Palavras-chave: Criatividade; Base Nacional Comum Curricular; Eduea- Go Literéria; Ensino de Literatura Contextualizagao? Desde meados dos anos de 1980, ¢ mais particularmente da década de 1990 em diante, havia um sensivel refluxo das correntes pedagégicas criticas, coerente- mente com o momento politico-econdmico mundial: a ascensao de Thatcher, na In- glaterra, em 1979; de Reagan, nos EUA, em 1981; de Kohl, na Alemanha, em 1982; de Collor, no Brasil, em 1989 — que representavam a posi¢ao conservadora nos respectivos paises, sob 0 signo do neoliberalismo/ultraliberalismo. Isso se deu, entre outros fatores, em fungdo da ampla e sistematica disseminagao, no plano ideolégico, de principios econdmicos como o equilibrio fiscal, a desregulagao de mereados, a abertura das economias nacionais e a privatizagao dos servigos publicos. O vetor politico necessario a * Departamento de Linguagens, Cultura e Eéueagio; Programa de Pés-Cradnagio em Letras; Programa de Pés-Graduagio em Edueagao. ‘ata do submisso ab, 2010 Data do aceite ju 2019 tp: dovorg/10.5335/rdes.1529900 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 uma tal reorganizagao do poder foi a des- confianga em relagao as democracias de ‘massa, & regulagao estatal e a viabilidade de direitos amplos da cidadania assegu- rados ao conjunto da populagao em cada pais (ao trabalho, a educagéio, & saxide, a seguranga publica e a previdéncia social). Os efeitos desse processo (ainda) se fazem sentir no presente, em especial nos paises latino-americanos (IBARRA, 2011). O clima cultural de época ficou con- signado como “pés-moderno”, pois, di- ferentemente da condigao tipicamente moderna (como conquista do mundo material), onovo momento teria seu eixo na produgao de simbolos, na simulagao de modelos, nos jogos de linguagem. Dunker (2018, [s. p.]) assim sintetiza 0 “clima’ intelectual de época: Naquela ocasiao, tratava-se de entender principalmente um fendmeno estético, pro- eminente da arquitetura; ele se afigurava como uma desestabilizagao da nogiio de género e das prerrogativas candnicas do modernismo da Bauhaus e Van der Rohe. Na literatura, ele se exprimiu basicamente pela combinagao de certo niilismo com a valorizagéio de narrativas que exprimiam posigies de minorias como em Paul Auster ou David Foster Wallace. Interpretado por te6rieos da literatura, o fendmeno parecia ser uma nova maneira de criticar a forma romance. Lido por filosofos como Lyotard, ele descrevia um novo estilo argumentati- vo, mareado por narrativas comprimidas ¢ por jogos de linguagem. Harvey e Anderson quiseram ver que tal acontecimento indica- va uma nova organizacdo do eapitalismo, que precisava justificar em termos sociais a flexibilizagao de relagdes laborais, a redugao dos vinculos formais ¢ a deslocalizagao da produeao. Guidens desdobrou o problema para a necessidade de identidades flexiveis, e Lévy trouxe a ideia de um novo tipo de organizacio cognitiva trazido pela dissemi- nagio da vida digital. Depois da morte do autor, delineada por Barthes nos anos 60, tinhamos nos anos 80 a morte do sujeito, como critica das filosofias da consciéneia, da soberania ou da representaeao, que nos apresentavam, em nome deste falso univer- sal, variagdes particulares de subjetividades especificas: branea, ocidental, masculina, académiea, economicamente privilegiada Neste contexto, a operacionalizacao e compreensao dos comportamentos, re- funcionalizada, se faria nao pela objetivi dade material e pela integragao dialética entre os planos te6rico e pratico, mas pela produgao de efeitos demonstraveis e mensurdveis, que se apresentariam, de um lado, por critérios de “performance”, e, por outro, de “desempenho” e “efica- cia’; assim, a legitimidade da pesquisa e do ensino se daria pelos seus “efeitos”, pela “produtividade” e, enfim, pelas “competéncias” que fossem capazes de desenvolver e comprovar (GIROTTO, 2014; THIENGO, BIANCHETTI, DE MARI, 2018). Conforme Saviani (2007, p. 426-427): Nesse novo contexto, as ideias pedagégicas sofrem grande inflexdo: passa-se a assumir L...] 0 fracasso da escola publica, justificando sua decadéncia como algo inerente inca- pacidade do Estado de gerir o bem comum. Com isso se advoga, também no ambito da educacdo, a primazia da iniciativa privada regida pelas leis do mercado. O descentramento e a desconstru- ¢ao das ideias pedagégicas criticas de 784 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 décadas anteriores assumem algumas estratégias': o uso de expressdes ou ter- mos teéricos intercambiaveis e volatei o agenciamento pontual de autores e tradigdes de pensamento com ampla aceitagio cientifica, visando a legitimar propostas com finalidades sociais bas- tante diferentes; as conciliagdes teéri- cas que redundam na dificuldade de se reconhecerem as bases filoséficas das propostas educacionais; a anteposigao de prefixos como “pés” ou “neo” como marcagao de uma suposta superagiio ou uma sucessao previsivel. Toda essa “flexibilizagao” axiolégica, epistemolégica e terminoldgica é coe- rente com a reorganizagao das bases de produgao da riqueza neste momento: substituindo 0 Fordismo, 0 Toyotismo opera com trabalhadores polivalentes visando & produgao diversificada para nichos de mercado especificos. Ou seja, nao se tem mais um trabalhador espe- cializado e uma linha de produgdo rigida; anova demanda é por trabalhadores po- livalentes, produtivos e autorregulado: As mudangas teenolégicas e de organizagéo do trabalho por que passam os paises de capitalismo avangado a partir dos meados da década de [19]80 configuram o mundo produtivo com algumas caracteristicas tendenciais: flexibilizacao da produgao e reestruturagao das ocupagGes; integragao de setores da produedo; multifuncionalidade e polivaléncia dos trabalhadores; valorizagio dos trabalhadores nao ligados ao trabalho prescrito ou ao conhecimento formalizado. (RAMOS, 2011, p. 37-38). Para atender a esse projeto, a educa- a0 escolar proporciona um preparo ba- sico, por meio de um curriculo “enxuto”, com foco no contemporaneo e no cotidia- no (e, frequentemente, com valorizagao de praticas “espontaneas” — em geral afins & légica da massificacao cultural; e com ataques de diferentes naturezas contra o conhecimento artistico, cienti- fico e filoséfico elaborado, sistematizado e formalizado). No plano da educagaio literdiria ~ que 60 terreno em que iremos nos situar, mais adiante —, isso 6 visivel: nas criticas a0 “excesso” de conceitos especializados, de contetidos formalizados e de leituras demandadas pela escola; na atengao dis- pensada as praticas leitoras que correm a margem da educagao formal, entendi- das como mais “genuinas” (embora quase completamente reguladas pelas modas induzidas pela industria da cultura) que as praticas “autoritdrias” orientadas pela escola; na defesa da subjetividade e produgo de leituras singulares como critério principal de validagao das ex- periéncias literdrias, em detrimento da importancia de se conhecerem leituras criticas especializadas; na redugao da importancia do profissional especializa- do em favor de vivéncias mediadas por sujeitos em relagées horizontalizadas, que terminam por esvaziar a fungao especifica do professor; ¢, enfim, no mal-estar que causa a prépria ideia de “ensino de literatura” Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 Adimensao obrigatéria dos curriculos para a educagao bisica e superior con- templa apenas conhecimentos gerais a respeito das diferentes areas do conhe- cimento ~ eventualmente aprofundadas com base nos interesses e possibilidades individuais. O objetivo é oferecer funda- mentos minimos para que 0 sujeito se torne capaz de “aprender a aprender”® por conta prépria, vida afora, indepen- dentemente de se assegurarem politi- cas de educagdo escolar e de formagao profissional continuada — de modo que a n&o-empregabilidade seja uma respon- sabilidade individual. Conforme Saviani (2007, p. 429) (.. Trata-se de preparar os individuos para [...] se tornarem cada vez mais empregaveis, visando a escapar da condi¢ao de excluf- dos. [...] A pedagogia da exclusao Thes tera ensinado a introjetar a responsabilidade por essa condi¢ao. ...] Além do emprego formal, acena-se com a possibilidade de sua transformagao em microempresario, com a informalidade, o trabalho por conta prépria, isto €, sua conversio em empresdrio de si mesmo, 0 trabalho voluntario, terceirizado, subsumido em organizagdes ndo-governa- mentais ete. Nesse contexto, termos como “criativi- dade”, “empreendedorismo”, “flexibilida- de” ¢ “inovagao” recebem forte impulso, passando a ser vistos como atributos individuais desejaveis, necessarios aos tempos de esfacelamento do mercado de trabalho com empregos estaveis e com direitos assegurados. A oposigao a uma educagao universal se apresenta com um. sedutor discurso em defesa da liberdade e da autonomia, e minimiza a impor- tancia da educagao escolar e do didlogo entre posigdes antagonicas claramente posicionadas no seio do tecido social no pleno desenvolvimento do psiquismo dos sujeitos’. Assim, ignora-se que, para a maioria das criangas, é na escola que se tem acesso ao conhecimento humano mais elaborado, e que 6 a apropriagdo- -objetivagao desse conhecimento 0 que permitira saltos qualitativos necessarios ao desenvolvimento da consciéncia eriti- ca emancipada: [...] 2 conseiéneia niio pode ser identificada exclusivamente com o mundo das vivencias internas, mas apreendida como ato psiquico experienciado pelo individuo e, ao mesmo tompo, expressiio de suas relagdes com os outros homens e com o mundo (MARTINS, 2013, p. 29). Na légica da educago neoliberal, em vez de desenyolver a consciéncia critica que supera as hegemonias momenta- neas, competiria a educagdo escolar a responsabilidade de preparar os indivi- duos para as exigéncias mercadolégicas do momento contemporaneo, autorre- gulando o proprio processo (ou seja, internalizando a légica do “aprender a aprender”). Assim, esse percurso forma- ria sujeitos aptos a lidar com incertezas e volatilidades no plano profissional, ao mesmo tempo em que sao intensamen- te exigidos resultados demonstraveis e mensuraveis. 286 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 Face a impossibilidade de abordar todos os termos-chave dessa nova légica produtiva e educativa, abordarei, neste trabalho, diferentes modos como a criati- vidade comparece em documentos puibli- cos contemporaneos (particularmente, a Base Nacional Comum Curricular) e em pesquisas dedicadas a edueagao literdria efou ao ensino de literatura. Nogées acerca de criatividade Em estudo dedicado a mapear dife- rentes concepgdes tedricas acerca da criatividade nos wltimos 70 anos, Ne- ves-Pereira (2018, p. 2) sistematiza as seguintes concepgées: a) a “conceitual padrao”, que congrega as nogdes de “novo, original e vitil”, em consonancia com valores funcionais e pragmiticos da psicologia norte-americana, e que compreende a criatividade como um trago pessoal de personalidade e aco; b)a “conceitual-sistémica”, que nao se limita & “utilidade-novidade”, com- preendida como algo individualmente produzido, mas que entende a criati- vidade como operando em um contexto social, na interacao entre sujeito, cul- tura e campo; c) a “socio-histérica”, que deriva particularmente da obra de Vygotsky" e colaboradores, e entende a criatividade como uma fungao psicolé- gica superior (que resulta da interna- lizagao de processos intersubjetivos/ sociais), e como um processo intencio- nalmente desenvolvido, que inclui a brincadeira, a imaginacao e a fantasia, em correlacao com a apropriagao-ob- jetivagao dialética dos conhecimentos historicamente produzidos, organizados e socializados pela humanidade; e d) a “sociocultural”, que tem suas bases em autores dispares como Bakhtin, Dewey, Vygotsky e Valsiner; demonstra interesse especial pela criatividade coti- diana, que se constitui no dia a dia, nos pequenos atos praticados por pessoas © por grupos sociais, e entende a cria- tividade cotidiana como participante do mesmo continuum da criatividade “genial” Nosso estudo se ancora em uma pers- pectiva materialista hist6rica —incompa- tivel, portanto, com: a) o funcionalismo e pragmatismo da abordagem conceitual padro; b) a redugao da nogao de con- texto a légica de um sistema fechado e unitdrio; c) 0 suposto “pluralismo” epis- temoldgico da perspectiva identificada como “sociocultural” ¢ com a ideia de “genialidade” individual, que se assenta, claramente, em uma base liberal. Por isso, faz-se necessdrio avangar um pouco mais, neste momento, na perspectiva socio-hist6rica da criatividade. Como 6 sabido, Vygotsky e seus colaboradores (VYGOTSKY, LURIA, LEONTIEY, 2000) realizaram uma mu- danga significativa na compreensao do desenvolvimento humano (entendido 287 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 agora nao mais como processo evolutivo interno, mas como proceso dialético sécio-histérico; ndo mais como pré-re- quisito, mas como resultado da atividade mediadora dos signos/da linguagem e das praticas sociais). Dessa feita, 0 su- jeito criativo passou a ter uma histéria situada temporal, espacial e ideologi- camente, que articula dialeticamente a dimensao macro & dimensao existencial particular. Vygotsky (2014, 2018) propés uma teoria da criatividade segundo a qual a imaginagao criativa se desenvolve par- tindo da brincadeira da crianga (onde a simbolizagao do que nao existe na imediaticidade tangivel da experiéncia sens6ria adquire importancia funda- mental para a génese do pensamento abstrato, que sera fundamental para a futura capacidade ideativa, aqui entendida como necesséria a atividade criativa intencional). A brincadeira da crianga, nessa perspectiva, 6 um ponto de partida para 0 processo que culmi- nar na formagao do sujeito criativo, e nao a maxima realizagdo da atividade criativa — como eventualmente o senso- -comum apregoa: a crianga como o ser cujo pensamento e produgao seria livre das amarras sociais, e, portanto, seria plenamente criativo. Ainda conforme 0 autor, um novo nivel de criatividade é atingido pelo adolescente, gragas & progressiva in- teracdo regulada entre imaginagao/ fantasia e pensamento conceitual. E somente no adulto a criatividade se torna madura, como fungao mental superior que pode ser conscientemente regulada, entre outros fatores, pela incorporacao e superacao dos conheci- mentos historicamente produzidos pela humanidade, devidamente apropriados e objetivados no curso da educagao formalizada, pois Avida reproduz sempre o velho, produz in- cessantemente 0 novo, a luta entre o velho e onovo penetra em todas as manifestagdes da vida (LUKACS, 1970, p. 203). Ou seja: para a abordagem vygot- skyana, no adulto, emogdes, sentidos cognicao, devidamente situados socio- -historicamente em face da apropriagao ¢ objetivagao dos conhecimentos produzi- dos pela humanidade, sao sintetizados e dao origem a uma criatividade intencio- nal (e, portanto, nao acidental): L...] a imaginagao, base de toda atividade criadora, manifesta-se, sem duvida em to- dos os campos da vida cultural, tornando-se também possivel a criagéo artistica, a cien- tifica e a técnica. Nesse sentido, necessaria- mente, tudo o que nos cerca ¢ foi feito pelas mios do homem, todo o mundo da cultura, diferentemente do mundo da naturera, tudo isso é produto da imaginagdo e da criagéo humana que nela se baseia (VYGOTSKY, 2009, p. 14), Mas, como veremos a seguir, nao parece ser a compreensdo majoritaria, Em alentado estudo dedicado ao assunto, Saccomani (2014, p. 10-11) afirma: 288 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 [...] tornou-se senso comum a concepeao de criatividade como um potencial individual que se manifesta de modo natural ou que se desenvolve a partir de relagdes esponténe- as com 0 mundo da cultura, dispensando a transmissao sistematica de conhecimento ou até mesmo a ela se contrapondo. Ademais [...] a transmissao do conhecimento é com- preendida como autoritaria, impositiva ¢ repressiva, como algo que tolheria a liberda- dee cercearia a criatividade dos individuos. Por meio de uma alentada revisao bibliogrsifica sobre propostas pedagégi- cas para 0 trabalho com contos de fadas, Ferreira (2018) pontuou que a maior parte dos argumentos gravita o tema da criatividade (seu estimulo/cultivo ou seu embotamento) e, a esse respeito, chega a uma conclusao semelhante a de Saccomani (2014) — 0 que nos leva a constatagao de pesquisadores distintos, filiados a instituigdes distintas, traba- Thando com assuntos e recortes distintos, a partir de referenciais teéricos distintos, identificam uma hegemonia no campo especializado no tocante a criatividade. Criatividade nos documentos oficiais Dada a impossibilidade de abordar, neste curto estudo, todos os documen- tos oficiais da educagao nacional que atualmente orientam 0 proceso de esco- larizagao obrigatéria entre os 4 e os 17 anos, optamos por nos restringir ao mais recente deles: a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), No documento dedicado a “Etapa da Educagao Infantil’, a palavra “criativida- de” aparece unicamente no item “Direi- tos de Aprendizagem e Desenvolvimento na Educagao Infantil”: Brincar cotidianamente de diversas for- mas, em diferentes espacos e tempos, com diferentes parceiros (criangas e adultos), ampliando e diversificando seu acesso a produgdes culturais, seus conhecimentos, sua imaginacdo, sua criatividade, suas ex- periéncias emocionais, corporais, sensoriais, expressivas, cognitivas, sociais e relacionais (BRASIL, 2018, [s. p., grifos nossos) J4 no documento dedicado a “Etapa do Ensino Fundamental”, nao comparece nenhuma ocorréncia da palavra “criati- vidade”, nem de cognatos. Por fim, no documento dedicado a “Etapa do Ensino Médio”, ha algumas ocorréneias. Duas no item dedicado as “Finalida- des do Ensino Médio no mundo contem- poraneo”: ..] proporcionar uma cultura favordvel ao desenvolvimento de atitudes, capacidades e valores que promovam 0 empreendedorismo (criatividade, inovagao, organizacdo, plane- jamento, responsabilidade, lideranea, cola- horagao, visao de futuro, assuneao de riscos, resiliéneia e euriosidade cientifiea, entre outros), entendido como competéncia essen- cial ao desenvolvimento pessoal, é cidadania ativa, @ inelusdo social e & empregabilidade (BRASIL, 2018, [s. p., grifos nossos). [A preparacdo bésica para o trabalho e a cidadanial supse 0 desenvolvimento de com- peténcias quo possibilitem nos estudantes inserir-se de forma ativa, eritiea, criativa e responsavel em um mundo do trabatho cada vez mais complexo e imprevisivel, eriando possibilidades para viabilizar seu projeto 289 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 do vida © continuar aprendendo, de modo a ser capazes de se adaptar com flexibilidade amovas condigdes de ocupacao ou aperfeico- amento posteriores (BRASIL, 2018, [s. p.], grifos nossos). Outra ocorréncia no item “As tecno- logias digitais e a computagao”: Sao definidas competéncias e habilidades, nas diferentes areas, que permitem aos estudantes: [...] utilizar, propor e/ou im- plementar solugdes (processos € produtos) envolvendo diferentes tecnologias, para identificar, analisar, modelar e solucionar problemas complexos em diversas dreas da vida cotidiana, explorando de forma efetiva o raciocinio légico, o pensamento computa- cional, o espirito de investigagao ¢ a eriati vidade (BRASIL, 2018, [s. p.], grifos nossos). Outra no item “As juventudes e o ensino médio”: Para formar esses jovens como sujeitos eri- tieos, criativos, autOnomos ¢ responsiveis, cabe as escolas de Ensino Médio propor- cionar experiéncias e processos que Thes garantam as aprendizagens necessdrias para a leitura da realidade, o enfrentamento dos novos desafios da contemporaneidade (sociais, econdmicos ¢ ambientais) ¢ a to- mada de decisdes étieas e fundamentadas, O mundo deve Ihes ser apresentado como campo aberto para investigagao e interven- Go quanto a seus aspects politicos, sociais, produtivos, ambientais e culturais, de modo que se sintam estimulados a equacionar e resolver questdes legadas pelas geracdes anteriores —e que se refletem nos contextos atuais -, abrindo-se criativamente para 0 novo (BRASIL, 2018, [s. p.], grifos nossos). Outra no item “A progressao das aprendizagens essenciais do ensino fun- damental para o ensino médio”: No Ensino Médio, 0 foco da area de Lingua- gens e suas Teenologias est na ampliagio da autonomia, do protagonismo e da autoria nas pratiens de diferentes linguagens; na identificagdo e na critica aos diferentes usos das linguagens, explicitando seu poder no estabelecimento de relagées; na apreciagao ena participacdo em diversas manifesta- ges artisticas e culturais; ¢ no uso criativo das diversas mfdias (BRASIL, 2018, [s. p.l, erifos noss0s). E uma ultima no item “BNCC e iti- nerdrios”: Assim, a oferta de diferentes itinerdrios formativos pelas escolas deve considerar a realidade local, os anseios da comunidade escolar [,..] de forma a propiciar aos estu- dantes possibilidades efetivas para cons- truir e desenvolver seus projetos de vida e se integrar de forma consciente e auténoma na vida cidada e no mundo do trabalho, Para tanto, os itinerarios devem |...] organizar-se em torno de um ou mais dos seguintes eixos I = processos eriativos: supsem o uso € 6 aprofundamento do conhe- cimento cientifico na construgao e eriacao de experimentos, modelos, protétipos para acriacdo de processos ou produtos que aten- dam a demandas para a resolucao de pro- blemas identificados na sociedade (BRASIL, 2018, [s. p.], grifos nossos). Nota-se uma diferenga na compreen- sao da criatividade no documento de- dicado a educagao infantil e ao ensino médio. No primeiro, a criatividade apa- rece citada no item dedicado aos direitos de aprendizagem e desenvolvimento, especificamente no item que trata da importancia do “brincar cotidianamente de diversas formas, em diferentes espa- gos e tempos, com diferentes parceiros (criangas e adultos)”. O que nos chama 20 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 a atengao é a afirmagao de que o brincar cotidianamente permitiria a ampliagao e diversificagaio do acesso da crianga as produgées culturais, aos conhecimen- tos, A imaginagao, a criatividade, as experiéncias. Tem-se aqui uma visdo aparentemente mais préxima daquela que sistematizamos a partir de Vygotsky e colaboradores. Porém, destacamos que a criatividade (bem como a imaginagéio, que Ihe ¢ inerente) é listada como algo dado de antemao, algo a que as criangas teriam acesso — e nao como uma fungiio psicolégica superior que deveria ser pro- gressivamente desenvolvida. Jé no documento dedicado ao ensino médio (EM), fica bastante evidente todo 0 jargao neoliberal ¢ salta aos olhos 0 objetivo de formar subjetividades afins a logica produtiva em voga a partir das transformagdes no mundo do trabalho contemporéneo — reafirmando aquilo que discutimos na contextualizacao inicial deste trabalho. Na primeira ocorréncia, a criativi- dade aparece em paréntese explicativo, consoante as finalidades do EM, que seriam, entre outras, 0 “desenvolvimento de atitudes, capacidades ¢ valores que promovam o empreendedorismo (cria- tividade, inovagao, organizagao, plane- jamento, responsabilidade, lideranga, colaboragéo, viséo de futuro, assungao de riscos, resiliéncia e curiosidade cien- tifica, entre outros)”. Ou seja, 0 foco esti no desenvolvimento de “competéncias ¢ habilidades” que promovam o “empreen- dedorismo”, entendido como “essencial ao desenvolvimento pessoal, 4 cidadania ativa, a incluso social e & empregabi- lidade”. A criatividade nao é abordada como capacidade imaginativa necessdria a0 questionamento e a transformagao da sociedade, mas a sua confirmagio ~ e, portanto, & sua reprodugao. Na segunda ocorréncia, novamente, a criatividade é apresentada como uma das “competéncias” que possibilitam aos estudantes inserir-se no “mundo do trabalho cada vez mais complexo e im- previstvel”, “criando possibilidades para viabilizar seu projeto de vida e continuar aprendendo”. Tudo isso na légiea de que 0s sujeitos sejam “capazes de se adaptar com flexibilidade a novas condigoes de ocupagao ou aperfeigoamento posterio- res” — dimensoes da nova ordem produ- tiva que j4 analisamos anteriormente. Vé-se, nessas duas ocorréncias, a hegemonia, no documento oficial, das pedagogias do “aprender a aprender” em seu atendimento & I6gica econémica vigente, e em sua opgaio por confirmar 0 atual sistema produtivo. Na terceira ocorréncia, reitera-se a opeao pela “pedagogia das competén- cias”, quando se afirma que é um dos objetivos do EM 0 desenvolvimento de “competéncias ¢ habilidades que permi- tem aos estudantes: [...] utilizar, propor e/ou implementar solugoes [...] para iden- tificar, analisar, modelar e solucionar 21 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 problemas complexos em diversas éreas da vida cotidiana, explorando de forma efetiva o raciocinio légico, o pensamento computacional, o espirito de investigacao e acriatividade”. Ou soja: a criatividade (ao lado do raciocinio légico, do pensa- mento computacional e do espirito inves- tigativo) estaria dedicada a identificar, analisar, modelar e solucionar problemas da vida cotidiana. Como se pensar em uma educagao literéria plena, quando os usos previstos para a criatividade estao restritos aos problemas da vida cotidin- na? Como a poténcia questionadora e revolucionaria da imaginagao poderia ter lugar nessa compreensao reducionista da criatividade humana? A quarta ocorréncia é a unica, no documento, que evidencia uma com- preensao da criatividade como desdo- bramento do processo de aprendizagem, pois explica que [...] cabe as escolas de Ensino Médio pro- porcionar experiéncias e processos que lhes [aos jovens] garantam as aprendizagens necessdrias para a leitura da realidade, © enfrentamento dos novos desafios (..] a tomada de decisdes éticas e fundamentadas de problemas identificados na sociedade (BRASIL, 2018, [s. p.). Neste trecho, 0 documento afirma, ainda, que “O mundo deve hes ser apre- sentado como campo aberto para inves- tigagao e intervengao”. Porém, no final do trecho, o entendimento a respeito da criatividade afina-se novamente a légica de formagao de subjetividades que se adaptem e que sejam flexiveis, pois prevé que 0 jovens sejam “estimulados a equa- cionar e resolver questies [...], abrindo-se criativamente para 0 novo” (grifos meus). Ou seja, nao pensando criativamente o novo, néio guestionando criativamente o novo, nao transformando criativamente 0 novo, mas “abrindo-se criativamente” para ele. f a mesma légica que preside a ideia de que a criatividade deva compare- cer “no uso criativo das diversas midias”. As ultimas ocorréncias acontecem na explicitagdio das bases da proposta de “iti- nerérios formativos”, presente na BNCC. A logica dos itinerarios formativos é afim & proposta de redugao do curriculo um minimo comum e a diversificagao de percursos, haseados nos interesses ¢ possibilidades individuais (aspecto que ja discutimos no inicio deste trabalho). Essa légica fica evidente na afirmagao de que “a oferta de diferentes itinerarios formativos pelas escolas deve considerar arealidade local, os anseios da comunida- de escolar” e de que a escolarizagao deve “propiciar aos estudantes possibilidades efetivas para construir e desenvolver seus projetos de vida e se integrar de for- ma consciente e autonoma na vida cidada eno mundo do trabalho”. Mais uma vez, a perspectiva é de responsabilizagao do sujeito e de integragao. Ao apresentar os eixos estruturantes dos “itinerérios”, 0 documento oficial defende que entre eles devem constar 08 “processos criativos”. Tais processos, m2 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 segundo ainda o documento, “supdem © uso e 0 aprofundamento do conheci- mento cientifico na construgao e criagéo de experimentos, modelos, protstipos” —o que parece afim & compreensao de criatividade que vinhamos defenden- do, em consonancia com a perspectiva historico-cultural. Porém, o documento prossegue, esclarecendo que esse uso ¢ aprofundamento do conhecimento serio “para a criagdo de processos ou produ- tos que atendam a demandas para a resolugao de problemas identificados na sociedade”. Ou seja: a criatividade, mais uma ver, direcionada a finalidades prag- miiticas, imediatistas; noutras palavras, entendida como presente apenas quando se demonstra por meio de resultados mensuraveis, controlaveis, a saber, na “criagao de processos e produtos que atendam a demandas”. Face a andlise critica das ocorréncias do termo “criatividade” e seus cognatos na BNCC, parece bastante pertinente concluir que as propostas oficiais hege- ménicas atuais no campo educacional brasileiro visam a confirmagio dos ele- mentos que discutimos na parte inicial deste trabalho. Criatividade em pesquisas contemporaneas Para nao ficarmos restritos aos docu- mentos oficiais, lancamo-nos a investiga- go sobre as ocorréneias do termo “criati- vidade” em resumos de dissertagoes e te- ses defendidas no Brasil (nos programas de pés-graduagao em Educacao, Ensino, Letras e Linguistica), no ano de 2018 (mesmo ano de promulgagao da BNCC), a partir do Banco de Teses e Dissertagdes da Coordenagao de Aperfeigoamento de Pessoal de Nivel Superior (Capes). Ao proceder um levantamento com- binado utilizando os termos-chave “eriatividade” ¢ “literatura” e os crité- rios explicitados no pardgrafo anterior, encontramos 115 trabalhos, que foram filtrados a partir da leitura de titulos e resumos. Dados os limites deste traba- Tho, optamos por demonstrar, a partir de poucos exemplos, que o entendimento de parte da comunidade cientifica em relacdo a criatividade nao opera uma critica consistente daquele ideario que encontramos no documento oficial ana- lisado acima, havendo modalidades de afinamento que vao da adesdo plena, passando pela conciliagao e pelo alhea- mento. Optamos por trazer trabalhos de distintas regides do pais (respectivamen- te, Norte, Sul e Nordeste). No resumo do trabalho de Ferreira (2018), intitulado “O conto de fadas na literatura: articulando praticas de leitura no 7? ano do ensino fun- damental”, defendido na Universidade Federal do Sul e Sudeste do Para (UNI- FESSPA), lemos que: 293 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 Em um mundo quo se mostra em constante evolugdo teenolégiea, os meios de ensino se tornaram obsoletos, 0 que aumentou 0 desinteresse dos alunos. Assim, 0 uso das novas teenologias se tornou um aliado para a modernizagao do meio escolar, entretanto, alguns profissionais ainda néo utilizam estes recursos, muitas vezes por falta de material ‘ou mesmo por alia de interesse do proprio professor que ainda estd preso as formas tra~ dicionais de ensino. O presente trabalho visa pensar o valor dos contos de fadas [..]. Além disso, busca envolver os discentes, utilizando niios6.a releitura dos eontos elassicos Disney bem como dos contos originais e as suas ver- ses cinematograificas modernas [...] contri- buindo com o estimulo a leitura por fruigéo, até a pretensdo de promover os ednones ea produgao de textos do aluno, dispondo de sua criatividade (grifos nossos). Como se vé, nese resumo: a) 08 meios de ensino sao vistos como obsoletos ¢ res- ponsaveis pelo desinteresse dos estudan- tes ~sem qualquer problematizagao sobre avvida social externa a escola: 0 desinteres- se é restrito a um problema metodolégico; b) muitos profissionais nao usam as novas tecnologias por desinteresse e por uma condigao de prisioneiros das formas tradi- cionais — ou seja, por sua indisposigao em e “adaptarem” ou “ajustarem” aos novos tempos; e ¢) a criatividade 6 algo de que se “dispde” — e nao algo que, intencional- mente, se aprende, se desenvolve. Um segundo estudo, de Valeanover (2018), intitulado “Ivabalha e teima, e lima, e sofre, e sua: letramento lite- rério no ensino fundamental”, defen- dido na Universidade Federal do Parana (UFPR), em seu resumo, pontua qu Este trabalho traz. por meio de uma pesaui- sa de natureza qualitativa, do tipo pesqui- saagao, a andlise do proceso de letramento literdrio em trés turmas de 6? ano de uma escola publica de Curitiba. [...] Foram analisados textos de natureza litersria pro- duzidos por alunos-autores, na perspectiva de Ferreiro e Siro, Calkins e Reuter. Para o estudo desses textos, escritos com intengao literdria pelos alunos-autores, foram consi- deradas a escolha de fatores estruturantes: a verossimilhanga, a mimese, a expressi- vidade, a légica e a progressao textual. Os resultados apontam para a eficécia da sequ- éncia didatica expandida como metodologia para construgao ¢ consolidagao do letramen- to literdriona escola, para a importancia da partilha de leituras entre estudantes como forma de incentivo a formagao do leitor. Apontam também que, além do incentivo é criatividade, é necessdrio ensinar ao aluno- -autor modos para explorar a construgéo do ethos discursivo (grifos nossos). Neste trabalho, nao se nota, como no anterior, uma desqualificagao do ensino sistematizado e intencional e nem uma critica direta aos docentes em atividade. No entanto, chama a atengao: a) que os resultados da pesquisa sejam apresen- tados em face & légica de “eficdcia” — em consonancia, mais uma vez, com o que foi discutido ao longo deste nosso trabalho; e b) que a autora polarize criatividade (como algo a ser incentivado) versus ensino. Por fim, para demonstrar que as pesquisas contemporaneas nem sempre endossam a perspectiva oficial em rela- cdo a criatividade, trazemos o resumo do trabalho de Rangel (2018), intitulado “Entre cigarras e formigas: leituras m4 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 e recepgiio de Esopo, La Fontaine, Lobato e Manoel Monteiro no ensino fundamental I”, defendido na Uni- versidade Federal de Campina Grande (UFCQ): Este trabalho apresenta uma proposta de vivéneia com a leitura literaria no ambito da sala de aula, tendo como sujeitos alunos do 5® ano do Ensino Fundamental I, através da leitura da classica fabula A cigarra ea formiga, cuja “origem” é atribuida ao fabu- lista Esopo, e de verstes adaptadas pelos seguintes escritores: La Fontaine (Século XVID, Monteiro Lobato (2010) e Manoel ‘Monteiro (2012). A pesquisa teve como ob- jetivo investigar, por meio da experiéncia de leitura, a recepedo estética das quatro vers6es, observando aspectos como horizon- te de expectativas e repertorio de leitura apresentados pelos ahanos |... Os resultados da pesquisa revelaram que, através da expe- riéneia de leitura literéria desenvolvida, ndo apenas na sala de aula, mas em outros es- pagos da escola [...], conseguimos favorecer um envolvimento ltidico quanto a recepeao das quatro versoes da fabula objeto dese estudb [...]. Verificamos que as estratégias adotadas, por serem sistematizadas, pla- nejadas, prazerosas ¢ pautadas no dialogo ena leitura compartilhada, permitiram 0 encontro dos leitores com os textos, fato que nos faz acreditar na possibilidade dos mediadores de leitura, que podem realizar um trabalho efetivo e afetive com a leitura literdria na escola, levando as criangas a desenvolverem autonomia, criatividade, imaginagdio, reflexiio e sobretudo, humani- zacao (grifos nossos). Chama a atengao que os resulta- dos sejam apresentados em relacaio a0 favorecimento do envolvimento hidico (portanto, do aspecto de brincadeira, fantasia, imaginagao) e que haja uma valorizagao da sistematizagiio, do pla- nejamento e do compartilhamento de leituras, bem como o reconhecimento da atividade dos mediadores de leitura como um trabalho com objetivos clara- mente definidos. Além disso, cumpre destacar que o estudo de Rangel (2018), mesmo partindo de uma fundamentagaio teérico-metodolégica completamente distinta daquela que expusemos neste ensaio, coloca a criatividade como algo a ser desenvolvido, ao lado de outras fin- goes psicoldgicas superiores, tais como a autonomia, a imaginagao, a reflexéio, em suma, a humanizagao — bem entendida como processo de produgao, direta e in- tencional, em cada ser humano singular da humanidade produzida historica- mente e coletivamente pelo conjunto dos homens, como bem nos ensinam, por exemplo, Antonio Candido (1995) e Dermeval Saviani (2003). Consideragoes finais Em acordo com Saccomani (2014) e Galvao e Saccomani (2019), este traba- Tho também entende “criatividade” como transformagao da realidade por meio da atividade humana, ou seja, considera que a criatividade tem sua génese no trabalho, e que, nesse sentido, ultrapas- sa dicotomias presentes em discursos contempordneos no campo do ensino de literatura e/ou da educagao literdria (e, assim, da formagao de leitores literd- ios). Como exemplos, podemos citar a 295 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 naturalizagao da oposigao entre criagao e reprodugao, entre construgao e trans- missao do conhecimento, entre inovagao e conservagao — e, mais especificamente no que diz respeito as relagdes entre li- teratura e educacdo, podemos recuperar como exemplos a defesa de que a escola deveria abdicar da indicagio de obras e textos a serem lidos, do ensino planeja- do de conhecimentos sistematizados no campo dos Estudos Literdrios e, enfim, deveria abdicar da avaliagao sistematica de leituras e escritas literdrias. Vincados, como as autoras, pela dialé- tica materialista ¢ histérica, entendemos o trabalho como atividade que diferencia humanos ¢ animais e como atividade que, ao mesmo tempo, conserva e transforma. a realidade — de modo que a reprodugao nao seja apenas repetigao e conservacao, mas igualmente transformagao. Assim, defendemos 0 ensino-aprendizagem de conhecimentos historicamente pro- duzidos e sistematizados pela cultura humana, bem como o estudo orientado dos classicos literérios (na sua dialética com os novos valores postos pelas obras contemporaneas), como modos privile- giados de cultivo e desenvolvimento da criatividade literaria dos estudantes em processo de escolarizagao. Noutras palavras, contrapusemo-nos a defesa da criatividade como um valor inato a crian- ¢a, que seria “sufocado” pelo processo de educagao formal, ou ao entendimento da criatividade como “competéncia” devota- da a resolugao pragmatiea de problemas da vida contemporanea e imediata. Reiteramos, assim, o que dissemos no Ultimo encontro da Associacao Brasileira de Literatura Comparada, realizado em 2018 na Universidade de Uberlandia, quando pontuamos: FE preciso que nos perguntemos: A quem owa que interessa que nao haja um corpo de conhecimentos passivel de organizacao, sistematizagdo, transmissdo/instrucao, apropriagao ¢ objetivacao no campo do conhecimento da Literatura? (E que, por- tanto, seja possivel reduzir a formagao do professor de literatura a um caldo de in- formagdes mal-ajambradas, insistindo em ‘uma suposta formagao pela e para a pratica esvaziada de adensamento tedrico, critico historiogréfico?) A quem ou que interessa que a Literatura na escola seja reduzida apenas a um momento de deleite, de lazer, de fruigao gratuita — ou, noutra feita, ao rei- no dos equivocos e delirios individuais nao como ponto de partida, mas como ponto de chegada? A quem ou a que interessa que os pobres deste pais ndo tenham acesso ao que de mais elaborado a humanidade produziu em termos de conhecimento, procedimento e atitude literdrias — debatendo, questionan- do e transformando esses conhecimentos, procedimentos e atitudes como forma de preparagao para uma transformagao social mais ampla e de mais radieais proporgbes? LJ Aredueao do ensino de literatura a mera relagio sujeito-texto sem qualquer forma de mediacao consciente, deliberada, planejada e sistematica prestam um enorme servigo mutilagéio da humanidade em cada um de nés e, assim, & reinvengao continua da roda (ou seja, a negacao de que avangamos por superacdo dialética). Prestam, mesmo, de minha perspectiva, um enorme servico A perpetuagio de uma situagdo em que os seres humanos nao se entendem como par- ticipantes de um rico caudal de relagées [..] 26 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 Ou seja, penso que a discussao sobre as praticas de ensino de literatura, no ambito da comunidade académica (e incluo aqui todos os professores de literatura deste pais, sejam os que atuam na educagao basica, se- jam os que atuam no ensino superior) passa pela desfetichizagao do ensino de literatura. [...] Questiono o fetiche que se imiscui em posigdes hoje hegeménicas em nosso campo, que obliteram, desde minha perspectiva, a natureza daquilo que deveria ser a educacao literdria escolar e, assim, fragilizam a Lite- ratura como campo do conhecimento e como disciplina escolar, esvaziando o trabalho do professor, com consequéncias nefastas para sua formagao, sua carreira e sua pritica Se nao ha o que ser ensinado (ou seja, nao 6 necessario transmitir conhecimentos), porque haveria aulas de Literatura? Se qualquer texto vale e se o estudante 6 pre- cisa conhecer o seu mundo imediato, porque seria necesssirio haver bibliotecas e centros culturais de qualidade, diversificados, atua- lizados e com boa curadoria e mediagao? Se 0 trabalho do professor nao tem necessi- dade de selecionar ¢ organizar contetidos € procedimentos didaticos, de avaliar a aprendizagem, por que ainda se gastaria dinheiro publico formando e remunerando pessoas para esse trabalho? Se aquilo que ‘espontaneamente ou no senso-comum sabe- ‘mos sobre a literatura 6 to ou mais legitimo que 0 saber cientifico, filoséfico e artistico acumulado pelas pesquisas ¢ estudos mais avaneados, por que se concederiam licencas e bolsas para a formacao continuada dos profissionais da Educag&o? (DALVI, 2018, Is. p.D. Finalizando, entao, a luz das cons- tatagées sobre a reprodugio, na BNCC, do idedrio afim a atual légica socioeco- nomica ¢ produtiva de cariz neoliberal/ ultraliberal e sobre a adesao total ou parcial das pesquisas de pés-graduagao A perspectiva oficial em relacao a criati- vidade (e, assim, ao projeto de formagao humana ensejado a partir da educagao liter4ria), parece-me que a citagao acima nos convoca como professores € pesquisadores do campo, no momento contemporaneo. Tais me parecem ser os grandes desafios e as grandes questdes a serem respondidos pela area, neste momento, no tocante A criatividade no processo escolar e, assim, no processo de humanizagao dos sujeitos sob nossa responsabilidade profissional — particu- larmente pela via do trabalho docente com a literatura em contexto escolar. Creativity in BNCC and in Literary Education researches: inquiries and disclosures Abstract The treatment of creativity in the school education process is problo- matized, focusing on the specificities of literary education, The sources for the research were Brazilian official documents, as well as contemporary developed in Brazilian postgradua- te programs. What can be seen from the analysis of the official document is the reduction of creativity to an instrumental dimension. On the other hand, the analysis of contemporary research shows the coexistence of dif ferent perspectives about creativity in literary education, as well as concer ning to importance of literary educa tion in the development of creativity. Thus, the proposal to overcome the belief in creativity as something in- nate or spontaneous is reposted and, 27 Revista do Programa de Pés-Groduacio em Laas da Universidade de Paso Fundo, v.15, n. 2, p. 263-300, malofago. 2019 in the final part, it is also discussed how the current official perspectives for the teaching of literature in the school ean empty both the body of historically produced content about the literature, as well as the specifi- City of the literature teacher's work. Keywords: Creativity, Base Nacional Comum Curricular; Literary educa- tion; Teaching of literature. Notas ‘Uma primeira versdo resumida deste trabalho, na forma de recorte parcial e provisério de resultados, foi apresentada como comunicagio sob outro titulo no XVI Congresso Tnternacio- nal da Abralic, realizado na Universidade de Brasilia, em julho de 2019, Esta contextualizacao esta haseada em Saviani (2007) ¢ Frigotto (2010). Nossa eritica a logien das competéncias esta fundada em Chaui, 2014; Frigotto, 2008; Gen- tilie Silva, 1995; Mészéros, 2008; Ramos, 2011. ‘Um dos exemplos do tipo de imprecisio tedrical terminolégica em documentos oficiais pode ser visto em Libdneo, 2006. Uma outra andlise de apropriagio impertinente, que esvazia 0 contexto ¢ 0 sentido social da teoria de base, é feita em relacdo ao pensamento materialista historico-dialético de Vygotsky, em Duarte (2000). Este assunto é mais extensamente desenvolvi- do em Dalvi (2019a, 2019b e 2019). Nossa critica ao “aprender a aprender” se ba- seia em Duarte (2000), A articulagao que fazemos entre educagio escolar universalizada e o desenvolvimento do psiquismo se baseia em Martins (2013). Optamos, neste trabalho, por uniformizar todas as ocorréncias do nome Vygotsky e do adjetivo vygotskyana. No entanto, ¢ importante deixar registrado que os diferentes estudiosos de sua obra, bem como as diferentes edigées optam por grafias muito distintas entre si Referéncias BRASIL. Base Nacional Comum Curricular: educacao 6 a base. Brasilia: Ministério da Edueagao; Conselho Nacional de Secretarios de Educacao; Unido Nacional dos Dirigentes Municipais de Educacao, 2018. Disponivel em: http://basenacionaleomum.mee.gov.br/ images/BNCC_EI_EF_110518_versaofinal_ site.pdf, Acosso em: 15 jul. 2019 CANDIDO, Antonio. “O direito a literatura”. In: Varios Escritos, Sio Paulo: Duas Cidades, 1995. p. 235-263. CHAUI, Marilena. A ideologia da competén- cia. 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