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Fundamentos da

Psicologia Humanista

Aspectos Teóricos e Metodológicos da


Abordagem Centrada na Pessoa (ACP)
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Gerente Editorial
CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autoria
SHEILA MARIA PRADO SOMA
JÉSSICA DE ASSIS SILVA
FABIO PEREIRA SOMA
AUTORIA
Jéssica de Assis Silva
Olá! Sou formada em Psicologia pela Universidade Federal do Pará,
com Mestrado em Psicologia pela Universidade Federal de São Carlos
e Doutorado em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo.
Adicionalmente, sou especialista em Terapia Comportamental e Cognitiva
pela USP, sendo docente em cursos de graduação e especialização.
Sendo assim, gostaria de dividir um pouco dessa experiência com você! A
Editora Telesapiens e eu estamos empenhados em acompanhá-lo nessa
jornada! Conte conosco!

Sheila Maria Prado Soma


Olá! Sou Psicóloga há 22 anos, com Mestrado e Doutorado pela
Universidade Federal de São Carlos. Tenho experiência em Psicologia
Clínica e docência no ensino superior. Trabalhei durante todo esse tempo
com a formação de profissionais nessa área, e também na produção
de conteúdos e pesquisas. Psicologia é minha paixão e transmitir essa
experiência profissional e de vida àqueles que estão em formação é um
dos focos do meu trabalho. Por esse motivo fui convidada pela Editora
Telesapiens a integrar seu elenco de autores independentes. Estou muito
feliz em estar com você nesta fase de muito estudo e trabalho. Conte
comigo! Vamos juntos!

Fábio Pereira Soma


Olá! Sou formado em Filosofia e Pedagogia, Mestre em Filosofia
pela Unesp, com uma experiência técnico-profissional na área de
educação de mais de 12 anos. Sou apaixonado pelo que faço e adoro
transmitir minha experiência de vida àqueles que estão iniciando em suas
profissões. Por isso fui convidado pela Editora Telesapiens a integrar seu
elenco de autores independentes. Estou muito feliz em poder ajudar você
nesta fase de muito estudo e trabalho. Conte comigo!
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez
que:

OBJETIVO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimento de de se apresentar um
uma nova compe- novo conceito;
tência;

NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram que
vações ou comple- ser priorizadas para
mentações para o você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado ou sobre o tema em
detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e links sidade de chamar a
para aprofundamen- atenção sobre algo
to do seu conheci- a ser refletido ou dis-
mento; cutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso aces- quando for preciso
sar um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das últi-
assistir vídeos, ler mas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando o desen-
atividade de au- volvimento de uma
toaprendizagem for competência for
aplicada; concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
A Abordagem Centrada na Pessoa (ACP)........................................... 10
História da Abordagem Centrada na Pessoa (ACP)................................................10

O Método Não Diretivo............................................................................................. 12

A Construção do Pensamento de Carl Rogers................................. 22


Compreendendo o Pensamento de Carl Rogers..................................................... 22

Principais Conceitos da Abordagem Centrada na Pessoa ......... 34


A Abordagem Centrada na Pessoa.....................................................................................34

Características da Abordagem Centrada na Pessoa............................................ 36

Cliente e Terapeuta Nascem de um “Nós” Fundamental................37

O Cliente Vem Primeiro........................................................................................... 38

O Terapeuta Está Presente.................................................................................... 40

Conceitos Chave da TCP (Terapia Centrada na Pessoa).................. 41

Construção da Personalidade para Rogers: Self Ideal e Self


Real ...................................................................................................................46
Visão de Homem para a TCP................................................................................................. 46

A Personalidade em Rogers.................................................................................................... 49

O Self Real............................................................................................................................................. 51

O Self Ideal............................................................................................................................................52

Pessoa em Pleno Funcionamento.......................................................................................53

As Condições de Valor e Autoestima. ..............................................................................54


Fundamentos da Psicologia Humanista 7

03
UNIDADE
8 Fundamentos da Psicologia Humanista

INTRODUÇÃO
Olá! Estamos iniciando mais uma importante etapa de estudos para
contribuir com sua formação profissional. Nesta unidade, vamos aprender
sobre a Terapia Centrada na Pessoa (TCP) ou Abordagem Centrada na Pessoa
(ACP), ambas são sinônimos e correspondem a uma importante abordagem
humanista da Psicologia. Ela foi desenvolvida por Carl Rogers na década
de 1940 e é uma das abordagens mais importantes da Psicologia. Você vai
aprender como ela surgiu, seu percurso histórico e como Rogers construiu sua
metodologia. Vai compreender sobre a visão de homem na ACP e também
como se desenvolve a personalidade e o Self nessa abordagem, passando
ainda pelos principais conceitos que regem essa forma de fazer Psicologia.
Ufa! Quanta coisa não? Mas tenho certeza que será um caminho bem gostoso
de se percorrer e certamente te ajudará a estabelecer uma base teórica sobre
essa abordagem humanista para que você se torne um profissional ainda mais
preparado. E então? Preparados? Vamos lá!
Fundamentos da Psicologia Humanista 9

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 3. Nosso objetivo é auxiliar
você no desenvolvimento das seguintes competências profissionais até o
término desta etapa de estudos:

1. Definir o percurso histórico da abordagem centrada na pessoa.

2. Explicar a construção do pensamento de Carl Rogers para a


construção da metodologia da abordagem centrada na pessoa.

3. Descrever os principais conceitos da abordagem centrada na


pessoa.

4. Definir a construção da personalidade para Rogers: Self Ideal e


Self Real.
10 Fundamentos da Psicologia Humanista

A Abordagem Centrada na Pessoa (ACP)


OBJETIVO:
Ao final deste capítulo, você será capaz de entender
como descrever todo o percurso histórico da Abordagem
Centrada na Pessoa (APC), além de compreender toda a
linha do tempo dessa importante abordagem da Psicologia,
suas bases históricas e filosóficas. Tudo com um objetivo
primordial: ajudar você a ser um profissional da Psicologia
com habilidade teórica e técnica. Motivados? Vamos juntos
desenvolver essa competência!.

História da Abordagem Centrada na


Pessoa (ACP)
A Abordagem Centrada na Pessoa (ACP) começou nos Estados
Unidos na década de 1940 com o trabalho de um psicólogo chamado
Carl R. Rogers (1902-1987). Ele estudou Psicologia Clínica na Universidade
de Columbia na década de 1920, quando a Psicologia ainda estava em
sua infância. Na época, a Psiquiatria era apaixonada pela Psicanálise
freudiana e os psicólogos clínicos ansiavam por métodos práticos para
ajudar crianças e adultos com problemas psicológicos, emocionais e
de ajustamento social (APA, 1957; KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005;
KIRSCHENBAUM, 2009).
Figura 1 - Desajustamento emocional

Fonte: Freepik.
Fundamentos da Psicologia Humanista 11

O treinamento de Rogers foi eclético, com exposição à Psicanálise,


teste psicométricos e as técnicas de orientação infantil. Em Columbia,
ele foi particularmente influenciado pelo movimento de educação
progressiva com sua ênfase em ajudar os alunos a se tornarem aprendizes
autônomos e a trabalharem cooperativamente em grupos. De 1928 a 1940,
Rogers trabalhou como diretor do Departamento de Estudos Infantis da
Sociedade Rochester para a Prevenção da Crueldade contra Crianças e,
em seguida, foi diretor do novo Rochester Guidance Center. Esses anos
em Rochester ele trabalhou em um laboratório com milhares de crianças
e adultos problemáticos onde desenvolveu suas próprias ideias sobre
aconselhamento e psicoterapia (APA, 1957; KIRSCHENBAUM; JOURDAN
2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Figura 2 - Desenvolvendo ideias

Fonte: Freepik.

Rogers foi particularmente influenciado por alunos de Otto Rank,


especialmente por Jessie Taft (1933), cuja “terapia de relacionamento”
mudou a ênfase do conteúdo anterior para um foco na autopercepção
e autoaceitação do paciente dentro do relacionamento terapêutico (APA,
1957; KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
12 Fundamentos da Psicologia Humanista

O Método Não Diretivo


Quando Rogers se tornou professor de Psicologia na Universidade
de Ohio em 1940, seus alunos o desafiaram a articular seus próprios
pontos de vista sobre uma psicoterapia eficaz. Ele fez isso em 1942,
em seu livro inovador Aconselhamento e Psicoterapia. Aqui, Rogers
popularizou o termo “cliente” para o destinatário de aconselhamento e
psicoterapia, um primeiro passo para se afastar de um modelo médico de
doença mental. Nesse livro, Rogers também introduziu seu método “não-
diretivo” (MOREIRA, 2010). Ele creditou a outros o trabalho em uma “direção
mais nova” semelhante, mas sua própria descrição de aconselhamento
e psicoterapia foi mais claramente articulada e mais extrema do que
outros modelos, e a chamada direção mais nova na terapia para Rogers
foi baseada em uma hipótese central sobre o crescimento humano e a
mudança de personalidade, que ele resumiu alguns anos depois:
Essa hipótese é que o cliente tem dentro de si a capacidade,
latente senão evidente, de compreender aqueles aspectos
de sua vida e de si mesmo que lhe causam dor, e a
capacidade e a tendência de se reorganizar e sua relação
com a vida na direção de autorrealização e maturidade de
forma a trazer um maior grau de conforto interno. A função
do terapeuta é criar uma atmosfera psicológica que permita
que essa capacidade e essa força se tornem mais eficazes
do que latentes ou potenciais (ROGERS, 1950, p. 443).

Embora outras terapias possam professar uma crença semelhante,


o método de Rogers de criar a atmosfera psicológica terapêutica era
radicalmente diferente de outras abordagens da época. O método não-
diretivo inicial de Rogers evitou totalmente perguntas, interpretações,
sugestões, conselhos ou outras técnicas diretivas (MOREIRA, 2010).
Em vez disso, dependia exclusivamente de um processo de ouvir
atentamente o cliente, aceitando-o como ele ou ela é, refletindo os
sentimentos do cliente. Aceitar o cliente não se estende a violar limites,
refletir os sentimentos do cliente com total aceitação criaria um nível
de segurança para uma exploração mais profunda e um espelho no
qual o cliente poderia compreender e refletir sobre ele ou sua própria
experiência, o que levaria o cliente a mais insights e ações positivas (APA,
1957; KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Fundamentos da Psicologia Humanista 13

Figura 3 - Apoio e aceitação

Fonte: Freepik.

No Estado de Ohio, Rogers e seu aluno de graduação Bernard


Covner começaram a gravar entrevistas de aconselhamento, e em
Aconselhamento e Psicoterapia incluiu a primeira transcrição literal de um
caso de psicoterapia completo. Nos anos subsequentes, no Estado de
Ohio e depois na Universidade de Chicago de 1945 a 1957, onde Rogers
estabeleceu um centro de aconselhamento de renome mundial, ele e
seus alunos gravaram e transcreveram milhares de horas de sessões
de terapia. Isso os capacitou a estudar o processo de aconselhamento
e psicoterapia em detalhes meticulosos (APA, 1957; KIRSCHENBAUM;
JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Figura 4 - Sessão de terapia

Fonte: Freepik.
14 Fundamentos da Psicologia Humanista

Gradualmente, Rogers começou a entender que as atitudes do


terapeuta eram tão importantes quanto as suas técnicas particulares. As
técnicas ou métodos foram a forma de implementar as atitudes facilitadoras
de aceitação e compreensão. Além disso, se essas atitudes do terapeuta
não fossem genuínas, todo o reflexo de sentimentos no mundo não seria
de muita ajuda para o cliente (APA, 1957; KIRSCHENBAUM; JOURDAN,
2005; KIRSCHENBAUM, 2009).

Quando o terapeuta foi capaz de aceitar genuinamente o cliente


no momento, e entrar no quadro de referência dele e transmitir uma
compreensão empática de uma forma receptiva, a terapia tornou-se cada
vez mais poderosa e eficaz. Por causa desse intenso foco na experiência
interior do cliente, Rogers começou a usar o termo “centrado no cliente”
para descrever sua abordagem de aconselhamento e psicoterapia. O livro
dele e de seus colegas, Terapia Centrada no Cliente (1951), exerceu uma
grande influência na Psicologia (APA, 1957; KIRSCHENBAUM; JOURDAN,
2005; KIRSCHENBAUM, 2009).

Ainda mais tarde, Rogers esclareceu que era o relacionamento


terapêutico, que as atitudes ajudaram a criar, o que mais produzia
crescimento, e ele continuou a refinar as três “condições essenciais” no
relacionamento centrado no cliente que gerou uma mudança positiva nos
clientes (KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005).
Quadro 1 - Condições essenciais para o relacionamento centrado no cliente

Consideração positiva
Empatia Congruência
incondicional
Vontade e capacidade
Aceitar o cliente como Ser genuíno e autêntico
de compreender o
ele é. com o cliente.
cliente.
Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

EXEMPLO:

Aceitar o cliente como ele é, significa aceitar como uma pessoa


de valor inerente, que possui sentimentos e impulsos positivos e
negativos. Empatia é compreender os pensamentos, sentimentos e
lutas do cliente do ponto de vista do cliente, adotando seu quadro de
referência. Congruência é ser genuíno, real, autêntico ou congruente no
relacionamento terapêutico.
Fundamentos da Psicologia Humanista 15

É apenas quando [o terapeuta] é, nessa relação, uma


pessoa unificada, com seus sentimentos experimentados,
sua consciência de seus sentimentos e sua expressão
desses sentimentos, todos congruentes ou semelhantes,
que ele é mais capaz de facilitar a terapia (ROGERS, 1950,
p. 199-206).
Figura 5 - A pessoa no centro da terapia

Fonte: Freepik.

Em um de seus ensaios mais importantes, Rogers escreveu que


quando um terapeuta comunica essa congruência, consideração positiva
incondicional e compreensão empática de modo que o cliente os perceba
pelo menos em um grau mínimo, então as condições necessárias e
suficientes para a mudança de personalidade estão presentes. Rogers
argumentou e demonstrou que o cliente tem dentro de si a capacidade
e a tendência de compreender suas necessidades e problemas, de obter
insight, de reorganizar sua personalidade e de realizar ações construtivas.
O que os clientes precisam, segundo ele, não é o julgamento, a
interpretação, o conselho ou a orientação de especialistas e terapeutas
que os ajudem a redescobrir e a confiar em sua própria experiência
interior, alcançar seus próprios insights e definir sua própria direção
(KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
16 Fundamentos da Psicologia Humanista

Rogers e seus colegas afirmaram esses princípios de terapia


não apenas em seus escritos e no ensino, mas em muitas sessões de
aconselhamento com seus clientes, que inclusive estão gravadas e
disponíveis em áudio e vídeo, mas também por meio de pesquisas
empíricas. Ao longo de duas décadas, desde o início dos anos 1940, Rogers
e seus colegas na Universidade de Chicago e, depois na Universidade
de Wisconsin, conduziram mais e mais pesquisas sobre o processo e os
resultados da psicoterapia do que jamais haviam sido realizadas antes
(KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).

Carl R. Rogers e sua equipe desenvolveram e usaram vários


instrumentos para medir as variáveis da
​​ terapia centrada no cliente e
seus resultados, incluindo medir a aceitação, empatia e congruência
do terapeuta; a expressão de sentimentos, percepção, autoconceito,
autoaceitação e ideal próprio do cliente; as ações positivas dos clientes,
maturidade emocional, ajuste social e inúmeras outras variáveis, o que
rendeu a ele, em 1956, seu primeiro Prêmio de Contribuição Científica
concedido pela Associação Americana de Psicologia (APA).

O prêmio foi porque ele desenvolveu um método original para


tornar a descrição e análise do processo psicoterapêutico mais objetiva,
por formular uma teoria da psicoterapia que fosse testável e dar a
possibilidade de medir seus efeitos na personalidade e comportamento,
e também por extensa pesquisa sistemática para exibir o valor do método
e explorar e testar as implicações da teoria. Sua imaginação, persistência
e adaptação flexível do método científico moveram essa área de interesse
psicológico para dentro dos limites da Psicologia científica (APA, 1957;
KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Fundamentos da Psicologia Humanista 17

Figura 6 - Psicologia como Ciência

Fonte: Freepik.

Rogers estava interessado na teoria psicológica e nos efeitos da


terapia na personalidade, bem como no comportamento. Com base
nos movimentos da Gestalt e da Fenomenologia em Psicologia, e no
trabalho de seus alunos Victor Raimy, Donald Snygg e Arthur Combs, ele
desenvolveu uma “teoria do self” da personalidade que ainda está incluída
em muitos livros de Psicologia. A teoria descreve como o conceito de self
de um indivíduo emerge, como o processo de socialização faz com que
os indivíduos desconfiem de seus sentimentos e sentido de self, como
experiências que são inconsistentes com o conceito de self são negadas
e distorcidas, causando sofrimento pessoal e problemas psicológicos, e
como o relacionamento terapêutico pode ajudar o indivíduo a reestruturar
o senso de self, permitindo que experiências previamente negadas
e distorcidas entrem em consciência, levando à redução do estresse
e à abertura para novas experiências e mudanças. (KIRSCHENBAUM;
JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
18 Fundamentos da Psicologia Humanista

Assim, a abordagem centrada no cliente se distinguiu por ter


suporte teórico e de pesquisa para sua descrição em psicoterapia. Mais
tarde, Rogers e seus colegas continuaram a estender a teoria, incluindo:
uma teoria da experiência e do processo de mudança terapêutica. Uma
descrição da “pessoa em pleno funcionamento”, incluindo abertura para
a experiência, confiança no próprio organismo, um locus interno de
avaliação, queda de fachadas, autenticidade na comunicação, criatividade
e abertura para a mudança (ROGERS, 1961); e, finalmente, como a
tendência atualizadora nos indivíduos reflete uma “tendência formativa”
no universo (ROGERS, 1980).

Depois de deixar a academia em 1963, Rogers mudou-se para a


Califórnia e se juntou à equipe do Western Behavioral Sciences Institute
e, em seguida, cocriou o Center for Studies of the Person. Carl R. Rogers
e seus colegas continuaram a desenvolver as aplicações da abordagem
centrada no cliente para diversos campos (KIRSCHENBAUM; JOURDAN,
2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Figura 7 - Campos de atuação da ACP

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).


Fundamentos da Psicologia Humanista 19

Em cada uma dessas áreas, Rogers demonstrou como as condições


facilitadoras de consideração positiva, empatia e congruência poderiam
desencadear o crescimento, a criatividade, o aprendizado e a cura em
crianças, alunos, membros do grupo, pacientes e outros (KIRSCHENBAUM;
JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).

EXEMPLO:

Aplicado à Educação, seu trabalho sobre “aprendizagem centrada no


aluno” ilustrou como uma professora ou, como ele preferia, um “facilitador
de aprendizagem” poderia fornecer a confiança, a compreensão e a
realidade para libertar seus alunos para uma aprendizagem significativa.
Seu trabalho coincidiu e contribuiu para o movimento de “educação
aberta” nos Estados Unidos, Grã-Bretanha e em outros lugares. Seu livro
Freedom to Learn (1969) passou por duas novas edições nos 25 anos
seguintes (KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005).
Figura 8 - Aprendizagem significativa

Fonte: Freepik.

Seu livro sobre casamento (ROGERS, 1972) usou estudos de caso


de casais para explorar novas formas de relacionamento que os jovens
estavam implementando nos anos 1970 e defendeu a importância da
20 Fundamentos da Psicologia Humanista

abertura, comunicação e flexibilidade de papéis nos relacionamentos do


casal. Mas, acima de tudo, durante o final dos anos 1960 e 1970, Rogers
e seus colegas exploraram as aplicações do pensamento centrado no
cliente para grupos e liderança de grupo (KIRSCHENBAUM; JOURDAN,
2005; KIRSCHENBAUM, 2009).

Nas décadas de 1940 e 1950, Carl R. Rogers, Thomas Gordon e


colegas da Universidade de Chicago experimentaram a “liderança centrada
no grupo”, em que a aceitação, compreensão, genuinidade e vontade do
líder de deixar o grupo definir suas próprias direções estimularam muita
energia, criatividade e produtividade entre os membros do grupo. No
final dos anos 1950 e 1960, Gordon, Richard Farson, Rogers e associados
estenderam essa abordagem ao que Rogers (1970) chamou de “grupo
de encontro básico”, uma experiência de grupo não estruturada na qual
os membros do grupo chamados “normais” alcançaram um eu maior –
compreensão, espontaneidade, comunicação aprimorada e genuinidade
nos relacionamentos.

Rogers liderou dezenas de grupos de encontro em ambientes


profissionais, empresariais, religiosos, médicos, acadêmicos, de
crescimento pessoal e organizacionais. Mais tarde, Rogers e seus
colegas usaram a mesma abordagem para facilitar “comunidades”
maiores, incluindo audiências e workshops compostos por centenas de
participantes (KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005).
Fundamentos da Psicologia Humanista 21

RESUMINDO:

E então? Gostou desse capítulo? Agora, vamos apresentar


a você um resumo do que vimos até agora. Vamos lá
relembrar? Nesse capítulo, você deve ter entendido tudo
sobre o percurso histórico de uma das terapias mais
famosas em Psicologia, a Terapia Centrada na Pessoa (TCP),
ou Abordagem Centrada na Pessoa (ACP). Essa abordagem
humanista foi desenvolvida por Carl Rogers, um notório
psicólogo que se debruçou, na década de 1940 a escrever
sobre a relação terapêutica com o cliente como foco, uma
abordagem totalmente diferente e não diretiva, indo na
contramão das abordagens da época. Você leu sobre o
percurso que levou Rogers a estabelecer os conceitos e a
metodologia dessa importante teoria que tem como foco
ouvir atentamente o cliente, refletir e aceitar os sentimentos
dele, a fim de que ele possa compreender e refletir sobre
sua própria experiência, levando assim à melhora dos
sintomas apresentados por ele. E então? Gostou do que
aprendeu? Esperamos que esse capítulo tenha ajudado
você a compreender melhor sobre a metodologia de Carl
R. Rogers. Vamos para os próximos capítulos?
22 Fundamentos da Psicologia Humanista

A Construção do Pensamento de Carl


Rogers

OBJETIVO:
Ao final deste capítulo, você será capaz de explicar
a construção do pensamento de Carl Rogers para o
desenvolvimento da metodologia da Abordagem Centrada
na Pessoa. Motivados? Vamos juntos desenvolver essa
competência!.

Compreendendo o Pensamento de Carl


Rogers
Reconhecendo a aplicabilidade cada vez maior da abordagem
centrada no cliente, no aluno e no grupo, Rogers e seus colegas do Center
for Studies of the Person, cada vez mais usaram um termo mais amplo -
centrado na pessoa - para descrever seu trabalho. Outros achavam que
“centrado na pessoa” era um termo melhor do que “centrado no cliente”
para descrever o relacionamento terapêutico, que, afinal, não é apenas
centrado no cliente, mas é um relacionamento entre duas pessoas.
Contudo, na literatura da área, “centrado na pessoa” e “centrado no
cliente” são frequentemente usados de
​​ forma intercambiável hoje em dia
(KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Figura 9 - Centrado na pessoa

Fonte: Microsoft Office Word.


Fundamentos da Psicologia Humanista 23

À medida que Rogers explorava as aplicações da Abordagem


Centrada na Pessoa para todas as relações humanas, ele reconhecia cada
vez mais suas implicações políticas – políticas não no sentido de política
partidária, mas em como o poder e a influência são distribuídos em todas
as relações humanas. Além de explorar essas implicações em On Personal
Power (1977), nas décadas de 1970 e 1980, Rogers utilizou a Abordagem
Centrada na Pessoa para resolver conflitos intergrupais e internacionais
(KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Figura 10 - Paz

Fonte: Freepik.

Por meio de workshops e grupos de encontro filmados com


populações multiculturais, como católicos e protestantes da Irlanda do
Norte e negros e brancos na África do Sul, Rogers demonstrou como
consideração positiva, empatia e congruência – as mesmas condições de
promoção de crescimento úteis em todas as relações de ajuda – podem
melhorar a comunicação e o entendimento entre grupos antagônicos
(KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
24 Fundamentos da Psicologia Humanista

Ele e seus colegas conduziram workshops para grupos de 100 a


800 participantes em todo o mundo, incluindo Brasil, México, África do Sul,
Hungria, União Soviética (ROGERS, 1987) e outras democracias emergentes.
Eles organizaram uma reunião de líderes internacionais em Rust, Áustria,
sobre a resolução de tensões na América Central - uma experiência que
demonstrou vividamente o potencial da Abordagem Centrada na Pessoa
para resolver conflitos internacionais (ROGERS, 1986). Em reconhecimento
aos seus esforços para trazer compreensão internacional e resolução de
conflitos, embora não tenha sido selecionado, Carl R. Rogers foi nomeado
postumamente em 1987 para o Prêmio Nobel da Paz.

SAIBA MAIS:

Como você viu, Carl Rogers foi um importante defensor das


causas sociais e da cultura de Paz. Suas pesquisas e seu
trabalho no campo da Psicologia foram muito importantes
para resolução de conflitos mundiais, isso lhe rendeu uma
indicação para o Prêmio Nobel da Paz no ano de 1987. Mas,
você sabia que nesse mesmo ano um outro importante
nome foi também indicado para o mesmo prêmio, e foi o
nome vencedor? Essa pessoa foi Madre Tereza de Calcutá,
vejam só como esse ano foi importante! (KIRSCHENBAUM;
JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).

Depoimentos sugeriram que esses esforços de desenvolvimento


profissional e diplomacia cidadã ajudaram a promover a paz e a
democratização em vários países, ensinando a ser democrático e não
autoritário. O trabalho de sua vida demonstrou como condições favoráveis​​
e produtoras de crescimento podem desencadear a cura, a autodireção
responsável e a criatividade em indivíduos e grupos em todas as esferas
da vida. Enquanto os países ao redor do mundo se esforçam para resolver
as tensões intergrupais e a praticar o autogoverno e a autodeterminação,
muitos reconheceram na Abordagem Centrada na Pessoa não apenas
métodos úteis para ajudar os profissionais, mas também uma filosofia
democrática positiva, centrada na pessoa, empoderada e consistente
Fundamentos da Psicologia Humanista 25

com suas aspirações nacionais (KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005;


KIRSCHENBAUM, 2009).
Figura 11 - Pessoa em evolução

Fonte: Freepik.

Indiscutivelmente, a Abordagem Centrada na Pessoa é única


entre as abordagens terapêuticas, por ter implicações políticas claras -
invertendo os papéis profissionais hierárquicos tradicionais com relações
mais igualitárias entre terapeutas e clientes, professores e alunos, líderes e
membros do grupo, e capacitando terapeutas para trabalhar em resolução
de conflitos e mudança social em suas próprias comunidades e no mundo
em geral (KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Figura 12 - Resolução de conflitos

Fonte: Freepik.
26 Fundamentos da Psicologia Humanista

SAIBA MAIS:

Carl Rogers era tido como um revolucionário silencioso, por


suas importantes contribuições e engajamento na política,
e causas humanitárias e sociais. Ele esteve no Brasil e
estamos disponibilizando a vocês um artigo que conta
como foram essas visitas e sua importância também. Que
tal dar uma lida? Para acessar, basta clicar no link aqui.

Nos Estados Unidos, a Abordagem Centrada na Pessoa é ensinada


como uma ferramenta fundamental para todo aconselhamento e terapia,
mas às vezes é vista como ultrapassada ou insuficiente. O centenário
do nascimento de Rogers em 2002, e o número crescente de livros
e materiais sobre a Abordagem Centrada na Pessoa, serviram para
despertar o interesse pela abordagem nos EUA e também em outros
países (KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Figura 13 - Evolução da Ciência

Fonte: Freepik.
Fundamentos da Psicologia Humanista 27

Desde o início de sua carreira, Rogers foi um pesquisador perspicaz,


e essa atividade de pesquisa se expandiu consideravelmente após sua
passagem para o setor universitário, onde estimulou abordagens inovadoras
e vigorosos programas de pesquisa no processo de aconselhamento/
psicoterapia, frequentemente envolvendo outros colegas que passaram
a desenvolver aplicações desta abordagem relacional que incluiu terapia
lúdica, resolução de conflitos, ensino centrado no aluno e liderança e
administração centrada no grupo (KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005;
KIRSCHENBAUM, 2009).

A Terapia Centrada na Pessoa continuou a crescer e se desenvolver


nas décadas intermediárias com o acréscimo de uma ampla gama de
postulados teóricos e clínicos, com o desenvolvimento de diferentes tribos
de prática teórica compartilhando valores comuns e o revigoramento
de pesquisas. O quadro 2 a seguir demonstra claramente as principais
características do trabalho de Rogers (KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005;
KIRSCHENBAUM, 2009).
Quadro 2 - Principais pontos da teoria

Uma motivação inata para crescer e amadurecer


A crença na “tendência de
e realizar seu interesse próprio, especialmente
autorrealização” do cliente.
quando fornecido com um ambiente de apoio.

Caracterizada pelas condições essenciais de


Uma confiança na relação congruência, empatia e consideração positiva
terapêutica incondicional, para o progresso terapêutico. Um
foco contínuo na experiência interna do cliente.

Como perguntas, interpretação, conselho,


Ausência de técnicas diretivas
coaching e semelhantes (exceto para expressões
ou perspectivas introduzidas
relativamente raras de congruência do
pelo terapeuta
terapeuta).

Planos de tratamento e outros métodos


Evitar diagnósticos centrados no terapeuta que reflitam o modelo
médico de doença mental.

Tornar-se uma pessoa com funcionamento mais


completo; portanto, o aconselhamento foca
Uma visão do cliente como uma
não apenas em um problema apresentado, mas
pessoa inteira em processo de
em uma mudança mais holística, para que o
“tornar-se”
cliente possa continuar a crescer e a exercer a
autodireção além do relacionamento terapêutico.

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).


28 Fundamentos da Psicologia Humanista

Pode-se dizer que essas características descrevem aconselhamento


e psicoterapia “tradicionais”, “clássicos” ou “ortodoxos” centrados
no cliente ou na pessoa. Assim, há alguma controvérsia no mundo
centrado na pessoa hoje, sobre se “centrado na pessoa” deve ser usado
exclusivamente para descrever a abordagem tradicional ou clássica
de Rogers para aconselhamento e psicoterapia, ou se há espaço para
“muitas tribos” na pessoa nação centrada (KIRSCHENBAUM; JOURDAN,
2005; KIRSCHENBAUM, 2009).

Após a morte de Rogers em 1987, o movimento centrado na pessoa


continuou a se espalhar pelo mundo. Em alguns países, especialmente na
Europa, a Abordagem Centrada na Pessoa se tornou uma das principais
abordagens para aconselhamento e psicoterapia - com universidades e
institutos de treinamento transformando profissionais centrados na pessoa,
programas de pesquisa robustos, reconhecimento do governo para
licenciamento e reembolso por seguro de empresas (KIRSCHENBAUM;
JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).

Em alguns países, como o Reino Unido, o aconselhamento clássico


centrado na pessoa tem sido o modo predominante; em outros, como a
Alemanha, as suborientações do movimento centrado na pessoa exigiram
maior fidelidade. Existem inúmeras organizações profissionais centradas
nas pessoas em todo o mundo, numerando na casa das centenas aos
milhares. Um estudo (KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005) mostrou que nos
15 anos após a morte de Rogers, houve mais publicações sobre Rogers
e a Abordagem Centrada na Pessoa do que nos 40 anos anteriores. Essa
tendência continuou.
Figura 14 - ACP ganhou o mundo

Fonte: Freepik.
Fundamentos da Psicologia Humanista 29

Para muitos outros profissionais, pesquisadores e acadêmicos


influenciados por essas ideias, o termo centrado na pessoa foi expandido
ou mesmo abandonado. Muitos acreditam que é possível introduzir certas
técnicas para aprofundar a autoexploração do cliente, embora ainda
sejam amplamente descritas pelo termo centrado na pessoa. Assim, por
exemplo, Natalie Rogers, filha de Carl Rogers, desenvolveu a “terapia
expressiva centrada na pessoa” que envolve clientes e membros do grupo
nas artes criativas, e emprega a escuta empática para ajudá-los a explorar
o significado de sua expressão criativa e sua implicação para suas vidas
(KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).

Eugene Gendlin desenvolveu a focalização e a psicoterapia


experiencial orientada para a focalização como um método para ajudar
os clientes a se sintonizarem com sua experiência interior em maior
profundidade, enquanto continua a escuta empática como um método
primário para promover essa exploração.

Leslie Greenberg, Robert Elliott e outros estudiosos desenvolveram


o “processo experiencial”, e depois “terapia focada na emoção”, que
combinou Gestalt e outras técnicas para guiar o processo terapêutico
enquanto ainda estava valorizando a primazia da relação facilitadora.
Outros exemplos de ramificações centradas na pessoa incluiriam
terapia lúdica centrada na criança (por exemplo, Landreth, 1991) e “pré-
terapia” desenvolvida por Gary Prouty (1999). Todas essas abordagens se
identificaram como intimamente relacionadas às concepções clássicas da
Abordagem Centrada na Pessoa e têm seguidores significativos em todo
o mundo (KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).

Embora esta abordagem tenha visto a evolução dos nomes atribuídos


a ela (por exemplo, aconselhamento não-diretivo, terapia centrada no
cliente, terapia centrada na pessoa etc.), a filosofia orientadora essencial
foi baseada em uma profunda confiança na capacidade de cada indivíduo
para resiliência e crescimento no contexto de uma relação de “ajuda” (em
que ambas as pessoas estão em contato psicológico) (KIRSCHENBAUM;
JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
30 Fundamentos da Psicologia Humanista

Figura 15 - Crescimento emocional

Fonte: Freepik.

Tal relacionamento foi caracterizado por elementos atitudinais


particulares do terapeuta (consideração positiva incondicional,
autenticidade e compreensão empática) e os processos psicológicos
do cliente (falta de autenticidade atual causando vulnerabilidade
ou ansiedade e sua percepção das intenções do terapeuta). Rogers
reconheceu a importância da experiência do cliente como uma referência
confiável na mudança e desenvolvimento pessoal. Sua publicação de
vários textos importantes na década de 1950 mostrou-se influente no
campo do aconselhamento e psicoterapia, e ajudou a disseminar a filosofia
central, as ideias teóricas e os resultados de pesquisas emergentes que
emanavam da prática da terapia centrada no cliente (como era então
conhecida). Como uma teoria fundamentada no contexto das relações
interpessoais, Rogers mais tarde expandiu sua construção teórica
para as configurações de relações familiares, educação, pequenos e
grandes grupos de trabalho e para grupos em conflito (KIRSCHENBAUM;
JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Fundamentos da Psicologia Humanista 31

Um número considerável de bons textos em diferentes idiomas


fornece uma visão detalhada do desenvolvimento da Terapia Centrada na
Pessoa desde os primeiros dias de Carl Rogers até o surgimento no século
XXI de diferentes ideias e orientações terapêuticas contidas na “família”
dos centrados na pessoa e psicoterapias experienciais (KIRSCHENBAUM;
JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Quadro 3 - Autores que escrevem sobre as diversas abordagens da TCP

AUTOR ANO DESCRIÇÃO DO TRABALHO


Baseia-se na teoria com seções dedicadas a
Cain 2010
elucidar a prática e citar resultados de pesquisa.
Cooper Aborda a prática terapêutica com grupos de
2013
et al clientes específicos.
Apresentam uma visão geral histórica e de
Lago e
2016 desenvolvimento, e aborda questões de
Charura
diversidade na prática.
É uma apreciação detalhada e matizada das
Barrett-
1998 implicações terapêuticas e mais amplas da
Lennard
abordagem.
Fornecem visões abrangentes e detalhadas das
aplicações clínicas e desenvolvimentos teóricos
Wood 2008
da Abordagem Centrada na Pessoa ao longo da
vida de Rogers.
Descreve as escolas emergentes de terapia
Sanders 2012
relacionadas a esta abordagem.
Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Embora uma exploração mais profunda do trabalho de Rogers


revele sua atenção tanto para o desenvolvimento da personalidade
quanto para a psicopatologia (bem como para o desdobramento do
processo terapêutico), é provavelmente por esse último, que ele se
tornou mais conhecido popularmente. Embora alguns dos dois textos
sejam dedicados à elucidação da teoria e prática da psicoterapia, eles
também incluem seções sobre as aplicações mais amplas dessa filosofia
(KIRSCHENBAUM; JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
32 Fundamentos da Psicologia Humanista

Rogers fundamenta suas afirmações teóricas na premissa da


tendência de atualização como a única força motriz para a mudança
e o desenvolvimento pessoal. Essa é uma manifestação localizada
da tendência formativa do universo, e Rogers afirma que tende para a
manutenção, aprimoramento e bem-estar do organismo experimentador.
Uma gama de termos e influências filosóficas tem sido usada para descrever
a teoria centrada na pessoa, como aponta a figura 16 (KIRSCHENBAUM;
JOURDAN, 2005; KIRSCHENBAUM, 2009).
Figura 16 - Influências filosóficas da TCP

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).


Fundamentos da Psicologia Humanista 33

RESUMINDO:

E então? Gostou do que mostramos? Agora, só para


termos certeza de que você realmente entendeu o tema
de estudo desse capítulo, vamos relembrar aqui um pouco
do que estudamos. Nesse capítulo, compreendemos que
a psicoterapia centrada na pessoa foi a primeira teoria
verdadeiramente americana da psicoterapia e, como
tal, criou uma mudança monumental na prática real da
psicoterapia. Como um dos psicólogos mais influentes
e reverenciados, Carl Rogers desenvolveu esse modelo
enraizado em princípios de democracia e humanismo,
acreditando que as pessoas eram mais bem servidas
quando eram ajudadas a encontrar seu próprio caminho.
Embora Carl Rogers seja sinônimo de Abordagem
Centrada na Pessoa, a teoria evoluiu ao longo do tempo em
resposta às mudanças no campo. Até aqui, apresentamos
claramente a evolução e os componentes essenciais dessa
abordagem central para a prática clínica contemporânea, e
destacamos a extensa pesquisa clínica que apoia a eficácia
da prática centrada na pessoa e fornece exemplos de casos
ilustrativos que retratam esse modelo em ação.
34 Fundamentos da Psicologia Humanista

Principais Conceitos da Abordagem


Centrada na Pessoa
OBJETIVO:
Ao final deste capítulo, esperamos que você possa descrever
os principais conceitos da Abordagem Centrada na Pessoa
(ACP). Conhecer os conceitos é de suma importância para
compreender o funcionamento da abordagem. E então?
Preparados? Vamos juntos?.

A Abordagem Centrada na Pessoa


A Abordagem Centrada na Pessoa foi desenvolvida a partir dos
conceitos da Psicologia humanística. A abordagem humanística “vê as
pessoas como capazes e autônomas, com a capacidade de resolver suas
dificuldades, realizar seu potencial e mudar suas vidas de forma positiva”
(SELIGMAN, 2006). Carl Rogers (um grande contribuidor da abordagem
centrada no cliente) enfatizou a perspectiva humanística, bem como
garantiu que os relacionamentos terapêuticos com os clientes promovem
a autoestima, a autenticidade e a atualização em suas vidas, e os ajudem
a usar seus pontos fortes (SELIGMAN, 2006).
Figura 17 - Relação terapêutica

Fonte: Freepik.
Fundamentos da Psicologia Humanista 35

A Abordagem Centrada na Pessoa foi originalmente focada no


cliente ser o responsável pela terapia, o que levou o cliente a desenvolver
uma maior compreensão de si mesmo, autoexploração e autoconceitos
aprimorados. O foco então mudou para o quadro de referência do cliente
e as condições essenciais necessárias para uma terapia bem-sucedida,
como garantir que o terapeuta demonstre compreensão empática de
uma forma sem julgamentos (SELIGMAN, 2006).

Atualmente, a Abordagem Centrada na Pessoa foca no cliente ser


capaz de desenvolver uma maior compreensão de si mesmo em um
ambiente que permite ao cliente resolver seus próprios problemas sem
intervenção direta do terapeuta. O terapeuta deve manter uma postura
questionadora, aberta a mudanças, bem como demonstrar coragem
para enfrentar o desconhecido. Rogers também enfatizou as atitudes e
características pessoais do terapeuta, e a qualidade da relação cliente-
terapeuta como sendo os determinantes para um processo terapêutico
bem-sucedido (COREY, 2005).
Figura 18 - Características de um processo terapêutico bem-sucedido

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).


36 Fundamentos da Psicologia Humanista

Características da Abordagem Centrada


na Pessoa
O critério de primeira ordem da Abordagem Centrada na Pessoa é a
imagem do ser humano como pessoa. Ele se concentra na pessoa e inclui
todos os outros aspectos, incluindo o foco no eu experiencial, e “pessoa”,
corretamente entendida, e de acordo com a pesquisa, denota um
significado específico do ser humano que é diferente de todas as outras
abordagens, incluindo as terapias experienciais, em sua essência e nas
consequências terapêuticas. Nenhum outro paradigma terapêutico tem
essencialmente a mesma visão do ser humano que é verdadeiramente
caracterizado pelo termo “pessoa” (SCHMID, 2003).

Se essa é a imagem subjacente do ser humano, então as


características distintivas de uma Abordagem Centrada na Pessoa podem
ser expressas nas três frases curtas a seguir:
Figura 19 - Características da ACP

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

No entanto, essas declarações aparentemente simples implicam


uma mudança revolucionária de paradigmas (SCHMID, 2003).
Fundamentos da Psicologia Humanista 37

Cliente e Terapeuta Nascem de um “Nós”


Fundamental
Em suas afirmações básicas, ACP está enraizada na convicção
de que não somos meramente indivíduos a-contextuais, mas existimos
apenas como parte de um “nós”. Rogers começa a descrição da primeira
condição com a frase: “Estou formulando a hipótese de que uma mudança
significativa de personalidade positiva não ocorre, exceto em um
relacionamento” (ROGERS, 1957). As condições começam com “contato”
(1) e terminam com “comunicação” (6).

EXEMPLO:

A palavra latina “communis” significa “ter paredes comuns”


(“munera”) - pense em uma cidade medieval como uma comunidade, uma
comuna. Estamos todos “na mesma cidade”, “no mesmo barco”. Nenhum
de nós veio de fora; todos nasceram dentro e para dentro deste Nós.
Se ignorarmos isso, ignoramos que somos inevitavelmente uma parte
do mundo; ignoramos nossas raízes, nosso passado, presente e futuro
(SCHMID, 2003).
Figura 20 - Cidade Medieval

Fonte: Freepik.
38 Fundamentos da Psicologia Humanista

Isso levaria à visão a-contextual do ser humano que está tão


presente em muitas das chamadas concepções humanistas: um aqui e
agora simplificado. Então, ignoramos (em nossa imagem do ser humano
e na prática terapêutica) nossa limitação, nossa finitude; nós ignoramos
a morte. Então, nunca haverá lugar para a falta parcial de liberdade que
experimentamos, para doenças físicas, transitoriedade, sofrimento e
tristeza etc., em nossa teoria. Em uma palavra: ignoramos a condição
humana (SCHMID, 2003).

O Cliente Vem Primeiro


Dentro deste Nós, o cliente vem em primeiro lugar. Na abordagem
tradicional (objetivando), as perguntas são: o que eu (o terapeuta) vejo? O
que posso observar? O que tem aí? O que eu posso fazer? Como posso
ajudar? Em contraste, a abordagem de Rogers procede exatamente ao
contrário: o que o cliente mostra, revela? O que ele ou ela deseja que seja
compreendido? (SCHMID, 2003).

Isso significa:
Quadro 4 - O cliente em primeiro lugar

O terapeuta E o relacionamento passa


O cliente vem primeiro
responde do mero contato para a
(a abordagem é
a uma presença, da atenção para
“centrada no cliente”).
chamada. a convivência e “estar com”.
Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

EXEMPLO:

O fato de o cliente vir primeiro significa muito: o cliente vem primeiro


porque a terapia é para o cliente. Isso significa que fazemos a pergunta:
‘Qual é a decisão do cliente?’ (E, portanto, a respectiva tarefa é manter
a capacidade de ser surpreendido e tocado). E significa estar presente
(SCHMID, 2003).
Fundamentos da Psicologia Humanista 39

Figura 21 - O cliente vem primeiro

Fonte: Freepik.

Existem três posições possíveis sobre a experiência em psicoterapia


(SCHMID, 2003):

1. O terapeuta é o especialista para os conteúdos e o processo (o


que significa o que a terapia considera, os métodos, os meios, o
procedimento, as habilidades). Esse é um princípio sustentado,
por exemplo, na TCC.

2. O cliente é o especialista para os conteúdos e o terapeuta é (pelo


menos parcialmente) o especialista do processo, o especialista
para o andamento da terapia. Isso pode ser encontrado nas
terapias gestálticas e experienciais.

3. A terceira possibilidade é que o cliente seja o especialista em


ambos - problemas e métodos - e o terapeuta seja um facilitador:
uma postura encontrada apenas na PCT genuína.
40 Fundamentos da Psicologia Humanista

O Terapeuta Está Presente


No contexto pessoal, responder existencialmente significa estar
presente e disponível como pessoa para o cliente. Também poderia ser
formulado, como fez Rogers (1975), que o terapeuta encontra o cliente
pessoa a pessoa. A presença é a forma fundamental de “estar junto” e isso
só é possível da perspectiva do Nós. Presença é:
Figura 22 - O que significa presença?

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Ou seja:

•• Cooperação decorrente da coexistência.

•• Correspondendo (a experiências dadas) fora da coexperienciação.

•• Cocriar a partir (em seus melhores momentos mútuos) do encontro.

EXEMPLO:

Assim, o TCP é a resposta pessoal profissional a essa chamada por


parte de uma pessoa em necessidade – uma chamada que é vista como
um endereço pessoal, ou seja, a chamada de uma pessoa, e não de uma
doença, um problema ou um transtorno. (SCHMID, 2003)
Fundamentos da Psicologia Humanista 41

As declarações fundamentais de caracterização que explicam


uma abordagem genuinamente centrada na pessoa podem ser definidas
(SCHMID, 2003):

1. Cliente e terapeuta cooperam com base em um “nós” fundamental,


que constitui sua relação pessoa a pessoa.

2. O cliente vem em primeiro lugar, porque ele ou ela é o especialista.

3. O terapeuta responde à chamada do cliente estando presente.

Conceitos Chave da TCP (Terapia Centrada na


Pessoa)
Como mencionado anteriormente, a abordagem humanística foi
uma grande influência na Terapia Centrada na Pessoa (SCHMID, 2003). Os
terapeutas centrados na pessoa acreditam que os clientes são capazes e
confiáveis ​​e se concentram na capacidade deles de fazerem mudanças
por si próprios. Alguns conceitos são chave na TCP como demonstrado
na figura 23.
Figura 23 - Conceitos chave da TCP

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).


42 Fundamentos da Psicologia Humanista

Atualização - as pessoas têm a tendência de trabalhar em direção


à autorrealização. Autoatualização refere-se ao desenvolvimento de uma
forma completa. Seligman (2006) ressalta que ocorre ao longo da vida
à medida que o indivíduo trabalha em direção a objetivos intrínsecos,
autorrealização e realização, envolvendo autonomia e autorregulação.

Condições de valor - as condições de valor influenciam a maneira


como o autoconceito de uma pessoa é moldado a partir de pessoas
importantes em sua vida. Condições de valor referem-se a mensagens
críticas e de julgamento de pessoas importantes que influenciam a maneira
como o indivíduo age e reage a certas situações. Quando um indivíduo
tem condições de valor impostas a ele, a autoimagem costuma ser baixa.
Além disso, se o indivíduo é exposto a ambientes superprotetores ou
dominantes, isso também pode ter um impacto negativo na autoimagem
(SELIGMAN, 2006).

A pessoa em pleno funcionamento - a pessoa em pleno


funcionamento é um indivíduo que tem “saúde emocional ideal”
(SELIGMAN, 2006). Geralmente, a pessoa em pleno funcionamento está
aberta à experiência, vive com um senso de significado e propósito, e
confia em si mesma e nos outros. Um dos principais objetivos da Terapia
Centrada na Pessoa é trabalhar no sentido de se tornar “totalmente
funcional”.

Perspectiva fenomenológica - a abordagem fenomenológica se


refere à percepção única de cada indivíduo de seu próprio mundo. O
indivíduo vivencia e percebe o próprio mundo e reage de forma individual.
A Terapia Centrada na Pessoa se concentra na própria experiência do
indivíduo, informando como o tratamento funcionará.
Fundamentos da Psicologia Humanista 43

Figura 24 - Foco na experiência do cliente

Fonte: Freepik

EXEMPLO:

Existem várias ideias gerais sobre o desenvolvimento da


personalidade em relação à Terapia Centrada na Pessoa. Basicamente, a
TCP afirma que a personalidade pode ser totalmente atualizada quando
o indivíduo é exposto a uma consideração positiva incondicional. Uma
pessoa que foi exposta a consideração positiva condicional pode ter
baixa autoestima e baixos sentimentos de valor. Um indivíduo que se
autoatualizou será mais aberto à experiência e menos defensivo, aprenderá
a viver o momento, confiará em suas próprias habilidades de tomada de
decisão, terá mais opções de vida e será mais criativo (SCHMID, 2003).

Em conclusão dessas considerações é que o ponto crucial do TCP


é sua imagem do ser humano, única entre as escolas de psicoterapia
(SCHMID, 2003). É decisivo, porque considera o ser humano como pessoa
e entende a relação terapêutica como um encontro pessoa a pessoa. Isso
inclui duas dimensões:
44 Fundamentos da Psicologia Humanista

Figura 25 - Dimensões da TCP

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

A substancial: a tendência de atualização do “especialista” é levada


a sério; e nada precisa ser “adicionado” ou imposto. E inclui a dimensão
relacional: cliente e o terapeuta está coexperimentando, cooperando e
cocriando com base em seu Nós fundamental; eles não são divididos
entre o terapeuta com sua experiência e o cliente com sua necessidade
de tratamento. É fundamental manter o equilíbrio entre as duas dimensões
(SCHMID, 2003).
Fundamentos da Psicologia Humanista 45

RESUMINDO:

Olha só, chegamos ao fim do capítulo. Espero que você


tenha gostado e tenha aprendido tudinho. Agora, vamos
fazer um breve apanhado geral do que aprendemos?
Nesse capítulo, você aprendeu que Rogers foi um
psicólogo humanista que acreditava que cada pessoa
poderia alcançar seus objetivos, desejos e vontades na vida.
Quando, ou melhor, se o fizeram, ocorreu a autoatualização,
porém, para uma pessoa atingir seu potencial, uma série
de fatores devem ser alcançados. Vimos que ele rejeitou
a natureza determinística tanto da Psicanálise quanto do
Behaviorismo, e sustentou que nos comportamos como
o fazemos por causa da maneira como percebemos
nossa situação. Rogers acreditava que os humanos têm
um motivo básico, que é a tendência de se autoatualizar
- ou seja, cumprir seu potencial e atingir o nível mais alto
de existência humana que pudermos, acreditava que
as pessoas são inerentemente boas e criativas. Rogers
descreve um indivíduo que está se atualizando como
uma pessoa totalmente funcional. Bem, tudo o que você
aprendeu até aqui te ajudará a aprimorar sua concepção
de homem e dar suporte para sua atuação como psicólogo.
46 Fundamentos da Psicologia Humanista

Construção da Personalidade para


Rogers: Self Ideal e Self Real

OBJETIVO:

Ao final neste capítulo, você saberá definir a construção


da personalidade na terapia Rogeriana, importante fator
para compreender a Terapia Centrada na Pessoa. E então?
Vamos juntos aprender um pouco mais sobre a TCP?.

Visão de Homem para a TCP


O que é um ser humano?

Em outros termos mais científicos, uma “imagem” é um conjunto de


crenças, incluindo suposições a respeito de como o ser humano é (qual
é sua natureza, sua essência, sua peculiaridade, seu sentido de vida etc.),
como se desenvolve, como se mete em problemas e como pode ser
ajudado. As questões relacionadas são, por exemplo, se os humanos são
livres ou não (e, portanto, responsáveis ou
​​ não), se são bons ou maus, ou
bons ou maus (SCHMID, 2003).
Figura 26 - Quem é o ser humano?

Fonte: Freepik.
Fundamentos da Psicologia Humanista 47

As imagens do ser humano possuem as seguintes características


(SCHMID, 2003):

•• São modelos (representações de ideias de natureza tipológica).

•• Eles representam, selecionam e constroem a “realidade” (ou seja,


eles não são a própria realidade).

•• Têm uma função heurística (ajudam a encontrar novas perspectivas).

•• Servem como diretrizes para a prática.

•• E, o mais importante, são transempíricas (crenças básicas - não


podem ser provadas).

Portanto, não adianta discutir se uma imagem do ser humano está


certa ou errada. O que faz sentido, entretanto, é investigar paradigmas e
teorias a respeito de sua consistência e de sua conformidade com os fatos
empíricos. Portanto, a imagem é a matriz, a base da ciência, das teorias e
da prática (SCHMID, 2003).

Para o ACP, isso leva à uma conclusão aparentemente simples: uma


abordagem é centrada na pessoa se:

(1) Considera o ser humano como uma pessoa.

(2) Age de acordo: isso é pessoa para pessoa.


Figura 27 - De pessoa para pessoa

Fonte: Freepik.
48 Fundamentos da Psicologia Humanista

Isso torna importante responder à pergunta sobre o que realmente


significa ser uma pessoa. O que é uma imagem do ser humano centrada
na pessoa?

EXEMPLO:

Agora estamos na raiz e, não por acaso, no nome da abordagem.


Se for adequado, o nome fala sobre a essência. O nome de uma ideia
é como o rosto de um ser humano. Se você olhar no rosto de alguém,
você pode ver quem é. Com o nome, você pode entender do que se
trata. (Portanto, os nomes precisam ser escolhidos com cuidado. E isso
é de fato o que aconteceu com a marca registrada “centrado na pessoa”;
o mesmo, a propósito, para nomes “experimentais” e mais próprios de
escolas terapêuticas) (SCHMID, 2003).

DEFINIÇÃO:
De acordo com duas vertentes de significado tradicionais
diferentes, mas dialeticamente ligadas, o ser humano é
caracterizado como uma pessoa se ele ou ela for denotado
em sua individualidade, valor e dignidade únicos (a noção
substancial de ser uma pessoa), também como sua
interconexão, ser-de e ser-para com os outros (concepção
relacional de tornar-se pessoa) (SCHMID, 2003).

Assim, ser pessoa descreve tanto autonomia como solidariedade,


soberania e compromisso. Carl Rogers combinou ambas as visões de uma
maneira única para a psicoterapia quando construiu sua teoria e prática sobre
a tendência de atualização. A personalidade centrada na pessoa e a teoria do
relacionamento entendem a personalização como um processo de se tornar
independente e de desenvolver relacionamentos (SCHMID, 2003).

A teoria da pessoa que sofre (“teoria das desordens”) baseia-se


na incongruência entre o eu e a experiência (que pode ser vista como
deficiências de soberania), bem como na incongruência entre a pessoa e
o contexto, incluindo as outras pessoas dentro da sociedade – deficiências
de relacionamento (SCHMID, 2003).
Fundamentos da Psicologia Humanista 49

Figura 28 - Pessoa sofrendo

Fonte: Freepik.

Consequentemente, a teoria entende a terapia tanto como o


desenvolvimento da personalidade quanto como o encontro pessoa a
pessoa, e a prática é caracterizada pela presença - o que significa uma
não diretividade de princípio e uma consideração empática positiva como
uma forma de estar “com” o cliente, junto com uma posição “contrária”
o cliente, ou seja, um “encontro” comprometido como uma pessoa que
encontra o outro face a face (SCHMID, 2003).

A Personalidade em Rogers
Rogers (1902-1987) foi o pioneiro da psicoterapia humanística e
foi um dos primeiros terapeutas a se concentrar em uma abordagem
“centrada na pessoa” (ROGERS, 1951). O self se tornou o cerne do estudo
da personalidade como vista por Rogers. Portanto, a fim de atualizar,
aprimorar e manter o self, Rogers (1959) acreditava que as pessoas são
encorajadas por uma tendência inata que é o único motivo básico do self.
Toda a sua teoria é, portanto, desenvolvida na atualização da tendência.
50 Fundamentos da Psicologia Humanista

Figura 29 - Personalidade

Fonte: Freepik

A contribuição mais importante de Rogers para a ciência da


personalidade: sua teoria do self. Seu principal foco profissional era o
processo de psicoterapia. Rogers se comprometeu a entender como a
mudança de personalidade pode ocorrer. O processo de mudança ou de
vir a ser foi sua maior preocupação (ISMAIL et al., 2015).

A teoria da personalidade de Rogers concentra-se basicamente na


noção de self ou autoconceito.

DEFINIÇÃO:

O autoconceito é definido de forma ampla como a


tendência do indivíduo em agir de forma a se atualizar,
levar à sua diferenciação e um conjunto de experiências,
portanto, são diferenciadas e simbolizadas na consciência
como experiências de si, a soma de que estabelece o
autoconceito do indivíduo (ISMAIL et al., 2015).

Em termos de sua investigação sobre o conceito de self, é central


para a teoria da terapia e personalidade centrada no cliente. Para Rogers,
Fundamentos da Psicologia Humanista 51

pessoas saudáveis são


​​ indivíduos que podem assimilar experiências em
sua estrutura própria. Os indivíduos estão abertos às experiências: uma
congruência entre o eu e a experiência e, em contraste, os neuróticos
não se encaixam na experiência organísmica; eles estão em posição de
negar a consciência de experiências sensoriais e emocionais significativas.
Existem alguns termos a seguir que Rogers explorou em sua Teoria do
self, o Self real e o Self ideal (ISMAIL et al., 2015).
Figura 30 - Características do self

Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

O Self Real
Inclui a influência de nossa imagem corporal intrinsecamente. Como
nos vemos, o que é muito importante para uma boa saúde psicológica.
Em outras palavras, podemos nos perceber como uma pessoa bonita ou
feia, boa ou má. A autoimagem tem um efeito direto sobre como uma
pessoa se sente, pensa e age no mundo (ISMAIL et al., 2015).

Rogers (1954) identificou que o “eu real” é iniciado pela tendência


de atualização, segue a valorização organísmica, precisa e recebe
consideração e autoestima positivas. É descrito que você terá sucesso
se tudo continuar bem para você. Rogers acreditava que todos nós
possuímos um eu verdadeiro. O verdadeiro eu, é claro, está relacionado
à personalidade interior. É o eu que se sente mais fiel ao que e quem
realmente somos. Pode não ser perfeito, mas é a parte de nós que parece
mais real (ISMAIL et al., 2015).
52 Fundamentos da Psicologia Humanista

O Self Ideal
Ele representa resumidamente nossos esforços para alcançar
nossos objetivos ou ideais. Em outras palavras, são nossas ambições e
objetivos dinâmicos. À medida que nossa sociedade diverge da tendência
de atualização, e somos forçados a viver com condições de valor que
estão em desacordo com a valoração organísmica e recebemos apenas
consideração positiva condicional e autoestima, desenvolvemos em vez
disso um eu ideal (ISMAIL et al., 2015).

DEFINIÇÃO:
Por ideal, Rogers (1961) sugeriu que há algumas coisas
situadas além de nosso alcançável que podem resultar da
lacuna entre o eu real e o eu ideal. Na verdade, esse Eu é
gerado por influências externas a nós.

É o Self que mantém os valores absorvidos dos outros; uma


culminação de todas as coisas que pensamos que deveríamos ser e que
sentimos que os outros pensam que deveríamos ser. Manter os valores
dos outros não é uma decisão consciente, mas sim um processo de
osmose, à medida que Rogers destacou que o livre arbítrio é dominante
em sua teoria da personalidade. Refere que os indivíduos são responsáveis​​
pelo que lhes acontece e param de atribuir suas ações a forças externas
(ISMAIL et al., 2015).
Figura 31 - Livre arbítrio

Fonte: Freepik
Fundamentos da Psicologia Humanista 53

Pessoa em Pleno Funcionamento


Se as pessoas forem capazes de operar seus processos de
valoração plenamente, certamente começariam a experimentar a
automovimentação e o crescimento em direção à realização de seus
potenciais (ISMAIL et al., 2015).
Figura 32 - Automovimentação

Fonte: Freepik

Isso mostra que as pessoas que são capazes de se autorrealizar são


chamadas de pessoas em pleno funcionamento (ROGERS, 1961).

EXEMPLO:

De acordo com a terminologia de Rogers, eles caminharão para se


tornarem pessoas totalmente funcionais. Pessoas plenamente funcionais,
para Rogers, são bem equilibradas, bem ajustadas e interessantes de
se conhecer. Rogers, em seu posterior escritos, estendeu e ampliou
sua visão da pessoa em pleno funcionamento para pessoa emergente
(ISMAIL et al., 2015).
54 Fundamentos da Psicologia Humanista

As Condições de Valor e Autoestima.

DEFINIÇÃO:

Condição que determina a avaliação de um indivíduo de


autopreservação positiva (ISMAIL et al., 2015).

Para Rogers (1959), uma pessoa que possui alta autoestima, enfrenta
os desafios da vida, às vezes tolera fracassos e tristezas, e é aberta com as
pessoas. Um indivíduo com autovalor pode evitar os desafios da vida, não
tolerar que a vida possa ser problemática e angustiante às vezes. Rogers
destacou a importância da experiência da primeira infância pela mãe e
pelo pai, a fim de afetar positivamente os sentimentos de autoestima. A
interação com o ambiente externo terá efeito sobre a autoestima à medida
que a criança cresce (ISMAIL et al., 2015).

Na verdade, a autovalorização é inerente ao ser. Se alguém segue


um sistema conceitual subótimo, então o desenvolvimento do self e a
definição do self seguiriam o mesmo sistema. Em outras palavras, o self
seria definido e medido com base em fatores externos de natureza tênue
e transitória (ISMAIL et al., 2015).

Nessa visão, a identidade é alienada de seu valor inerente. Auto


dentro do sistema conceitual ideal é visto como multidimensional e
autoestima é inerente ao ser de uma pessoa. O self é visto dentro de um
sistema holístico projetado para promover a paz e a harmonia dentro e
entre as pessoas (ISMAIL et al., 2015).

As pessoas que conseguiram vincular sentimentos de valor próprio


associados à parte de si mesmos. As pessoas são mais tolerantes e
aceitam os outros que não ameaçam esse novo senso de identidade.
A autoestima é inata na existência; portanto, “fatores irrelevantes” (por
exemplo, raça, sexo, idade, religião, capacidade física) não têm relevância
na determinação do valor (ISMAIL et al., 2015).
Fundamentos da Psicologia Humanista 55

Figura 33 - Pessoa de valor

Fonte: Freepik

A busca por significado cobre quatro necessidades básicas. Um


deles é a autovalorização, acreditar que se é uma pessoa digna com
características desejáveis. As outras três necessidades básicas são um
senso de propósito na vida, senso de autoeficácia e valor. A autoestima é
a existência dentro de um significado pessoal, ou seja, uma sensação de
realização que o acompanha (ISMAIL et al., 2015).

RESUMINDO:
E então? Gostou do que mostramos? Agora, só para termos
certeza de que você realmente entendeu, vamos relembrar
o que vimos até aqui. Nesse capítulo, aprendemos sobre
a visão de homem, a personalidade e a teoria do self de
Carl Rogers. Aprendemos que existem alguns conceitos
importantes para o desenvolvimento da personalidade e
o foco de Rogers foi a consideração positiva, a autoestima
e a tendência atualizadora. A autoestima é descrita como
condicional e incondicional para enfrentar os desafios da
vida. Todos esses conceitos indicaram que os indivíduos
têm a oportunidade e a vontade de mudar seus estados de
espírito e comportamento. Esperamos que esse capítulo
seja um guia para seus estudos relacionados ao self para
que você se beneficie dessa prática em sua profissão. Até
a próxima!
56 Fundamentos da Psicologia Humanista

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