You are on page 1of 11
Parte I Introdugio Os niveis de cultura 11° jurado: (levantando-se) “Peso perdido, discutindo..". terrompendo e imitando) “Peco perdo. Porqué essa sua delica- 11° jurado: (Olhando de frente para 0 10° jurado) “Pela mesma razo que 0 senhor no 2 tem: porque fui educado como tal” Reginald Rose, Doze homens em firia Doze homens em fiiria & uma pega de teatro norte-zmericana escrita em 1955, 4que se tornou num famoso filme tendo como protagonista Henry Fonda. A ‘cena passa-se numa sala de deliberacao do jiri de um tribunal de Nova lorque. Doze membros do jtiri que nunca se tinham encontrado antes tinham que decidir por unanimidade sobre a culpabilidade ou inocéncia de um rapaz, proveniente de um bairro pobre da cidade, acusado de homicidio. A citagéo acima faz parte do segundo e tiltimo acto onde as emogdes atingiram 0 ponto de ebuligdo. Trata-se de um confronto entre 0 10° jurado, doo de uma oficina, relojoeiro de origem europeia, prov: iitado com 0 que considera a excessiva delicadez muitos anos num novo pafs, continua a comportar-se em conformidade com 4 forma coino fo} educado. Transporia consigo um indelével-padsio de com- portamento. « ‘Mentes diferentes mas problemas comuns ‘grapos € nacdes, como os nossos doze homens em féria, enfrentam problemas comuns que, para serem sol stem cooperagao. Os problemas de ordem ecol6gica, econdmi téria ¢ meteorolégica nao param 0 nivel das fronteiras naci jonais. Enfrentar ameagas como a ‘guerra nuclear, chavas dcidas, poluigéo dos oceanos, extingao de espécies 7 " Culturas e organizagbes: IDA, ou uma recessto mundial, exige cooperagao entre Ifderes de necessitam do apoio de grupos alargedos de tar as decistes tomadas, as diferengas no modo de pensar, sentir ¢ actuar idores se queremos encontrar solugtes vidveis & sobre cooperasio econémica, tecnolégica, médica ica, tém sido frequentemente consideradas numa perspective mera- mente técnica. Isso explica o porqué de muitas solugtes no fucionarem, ou nfo poderem ser implementades: ignoram-se simplesmente as diferengas no modo de pensar dos parceiros. Compreender tais diferencas tomna-se, no :inimo, to essencial quanto compreender os factores técnicos. objectivo deste livro é ajudar a lidar com diferengas na forma de pensar, sentir e agit dos habitantes do nosso planeta. Demonstraremos que, apesar da enorme diversidade de mentes, podemos encontrar uma estruture que possa servir de ponto de partida para uma compreenséo matua. Cultura e programacio mental Cada um de n6s tcansporta consigo padrdes de pensamento. de sentimentos ¢ AcgaO potencial, que s4o o resultado de uma aprendizagem continua. Uma oa parte foi adquirida.no 1s0 da inflncia, perfodo do.desenvolvimento_ “Dhde somos mais susceptiveis & aprendizagem e assimilacao. Quando certos padres de pensamento, sentimentos e comportamentos se instalam na mente de cada um, torna-se necessério desaprender, antes de aprender algo diferente, e desaprender & mais dificil que aprender pela primeita vez. Por analogia com a forma como os computadores sio programados, utilizare- mos a expressio programacdo mental, para designer esses processes adquiridos. Isto no significa que as pessoas sejam programadas da mesma forma que os. computadares. O comportamento do ser humano € apenas parcialmente predeterminado pelos seus programas mentais: o ser humano tem luma capacidade bésica de se desviar deles © reagir através de formas que sejam novas, criativas, destrutivas ou inesperadas. A “programagdo” & qual este livro faz referéncia, apenas nos indica as reacgOes mais provaveis © compreensfveis em fungio do passado de cada um. Estas programagdes mentais encdntram 2 sua origem nos diversos ambientes, sociais que encontramos no decurso da nossa vida. A programagio i ‘mento de delicadeza ¢ ainda hoje muito valorizado, A maior parte das pessoas, esse ambiente teriam reagido de forma semelhante. O proprietétio da gara- gem, norte-americano, proveniente de um bairro pobre, adquiriu um programa ‘mental completamente diferente. Os programas mentais variam tanto quanto 0s ambientes sociais onde sao adquiridos. _Palavra, acepefo comummente adoptada entre os Ceutturs 2”, © € a acepgio que sera usado ao longo deste livro, das sociedadles humanas, em ‘do as vezes discutidos em termos da promogao de grupos de dange folelérica, Mas a cultura 2 relaciona-se com processos,humanos muito mais fundamen- tais do que a cultara 1, ela lida com as coisas que ferem. A cultura.2.€ sempre um fenémene colectivo, uma vez que é, pelo menos em parte, partilhada por pessoas que vivem no mesmo ambiente social onde & adguirida, Podemos defini-a como a programacdo colectiva da mente que distingue os membros-de. um grupo ou categoria’ de pessoas face a outro’ (A cultura € adquirida, nao het Ela provém do ambiente social do indi- vido, nao dos genes. ve ser distinguida por sua vez, da natureza humana, ¢ da personalidade de cada um (Ver figura 1.1), mesmo se as | mtende-se por grupo um conjunto 6e pessoas em contacto ene si Uma categoria const ‘Os nfveis de cultura Culturas ¢ organizagbes FIGURA 1.1 — Trés niveis de programagéo mental humana. fronteiras exactas entre esses tr€s conceitos sejam objecto de discusséo entre cespecialistas de diferentes ciéncias sociai do professor russo ao aborigene australiano: programa mental de cada um. Herdém 8 analogia com os computadores, const . A. capacidade ieza, necessidade de contacto com os outros, de jogo, de exercicio, a cepacidade de observar 0 meio e falar com outros seres huumanos, pertencem a este nivel de programacio jo entanto, o que cada um faz com estes sentimentos, a forma como ‘8 exprime, como relaciona as suas observacGes, é modificado pela cultura. ‘A natureza humana no é tio “humana” como 0 temo sogere, uma vez que alguns dos seus aspectos so partilhados pelo mundo animal’. A personalidade de um individuo, por outro ado, constitui 0 seu conjunto Unico de programas mentais que nao partilha com nenhum outro ser humano. Bla esta fundada em tracos que so em parte herdados com o cédigo genético Iinico, © em parte adquiridos. Esta “aquisig&o” faz-se através da influéncia da programacao colectiva (cultura) assim como através de experiéncias pestoais. gue Wilson (1975); paca ericas ver Gregory € ai (eds) 5 niveis de cultura lurais sto com frequéncie atribufdas & hereditarieda- fos e eruditos.do passado nao sabiam como explicar ‘vel estabilidade das diferengas de modelos culturais Certas caracteris de, uma vez, que de outra forma a c entre grapos humanos. Subestimavam o impacto da aprendizagem de geracées precedentes e a transmissio as geractes futuras daquilo que cada um apren- deu, O papel da hereditariedade € exagerado pelas pseudo-teorias das racas, Nos EUA, uma acesa discussdo cientffica irrompeu nos finais dos anos 60 sobre se os negros eram geneticamente menos inteligentes que os brancos*, ‘A questio tomou-se menos popular nos anos 70 quando os investigadores como outros grupos ‘oportunidades que 0s brancos. Relativismo cultural (© estado da cultura revela que os grupos humanos ¢ categorias pensam, sentem € agem de forma diferente, mas no existem pardmetros cientificos que permitam considerar um grupo intrinsecamente superior ou inferior a outro. O estudo das diferencas entre grupos e sociedades 56 € possivel através de uma atitude ivismo cultural”. O grande antropélogo francés Claude Lévi-Strauss, expressou esta ideia da segvinte forma: afirma que uma cultura nao tem crtérios absolutos ‘omio ‘pobre’ ou ‘nobre’. No to face as suas proprias actividades uipa vex que os seus observadores™ 0 nome do professor A.R. Jensen est associado Bs tests de infvio bebe 9 eer unccepoes xelativismo cultural néo im para 2 sociedade onde esta a inexistencia de normas para 0 individuo ox 10, Requer simplesments a suspensio de jufzos de valor quando se lida com grupos ou sociedades diferentes da sua. E necessério refloctir duas vezes antes de aplicarmos as normas de um indivfaio, ‘grupo ou sociedade, a outros. 0 jul io devem ser precedidos de informagio sobre a natureza das diferengas culturais entre sociedades, suas raizes, © consequéncias. to quadro expatriado, ou especi matéria de assistEncia a0 desenvolvimento, pode ser tentado a ind gas. Nos tempos ios detinham muitas vezes um poder absoluto sobre as outras sociedades, podendo impor ai as suas regras. Na ‘9s estrangeiros que pretendam mudar alguma coisa noutra Sociedade terdo que negociar as suas intervencGes. Mais uma vez, mais provavel que @ negociagio tenha sucesso, quando as partes envolvidas compreendem as raz6es das diferengas de pontos de vista. Simbolos, herdis, rituais e valores sob a forma de camadas de uma cebola, indicando que os simbolos repre- sentam as manifestagbes mais superficiais da cultura, os valores, as mais profundas, © o$ herdis ¢ rituais uma situag2o intermédia, bolos sho palavras, gestos, figuras ou objectos que transportam um ado particular que é apenas reconhecido pelos que partilham 2 cultura As palavras numa lingua, ou 0 caldo, pertencem a esta categoria, assim como a forma de ilo de. cabelo, Coca Cola, bandeiras, e simbolos de iesmo tempo que os sfio com frequéncia colocados na camada fantasia ou de banda desenhada, como o Batman ou, em contraste, o Snoopy nos BUA, Asterix em Franga, ou Ollie B, Bommel (Mr. Bumble) na Holanda. No nosso mundo dominado pela imagem e pela televisio, a aparéncia exterior tomnou-se muito mais importante na escolha dos herdis que no passado, Imitr respeito 20s outros, ceriménias sociais ou religiosas constituem alguns ‘exemplos. Reunidx motivos apa- server muitas Yezes como meros rituals, como, por ‘exemplo, permitir ao lider a afirmacao da sua autoridade. © reside precisamente e tio s6, na forma como estas priticas Sto lnterpretades pelos sujeitos que pertencem a cultura. FIGURA 1.2 — As “camadas de wna ceb (HF) Como indica a figura 1.2, 0 nicleo da cultura & formado pelos valores. Podemos definir um valor como a tendéncia para se preferir um certo estado de coisas face a outro. E um sentimento orientado, com um lado positive e outro negativo. Os valores definem: ‘mau vs bom sujo vs limpo feio vs bonito contra natura ys natural anormal vs normal paradoxal vs légico irracional vs racional 2B " * Gutturas ¢ organwzacbes Os valores fazem parte das primeiras coisas que as criangas aprendem de ‘que por volta dos 10 anos de idade, a maioria das criangas bésico de valores solidamente adquirido, e que se toma muito dificil modifi- . Pelo facto da sua aquisigo precoce, # maioria dos tes. E-nos assim dificil falar sobre eles, ¢ ndo io exterior. Podem apenas ser deduzidos através wam face a circunstincias vétias. a forma como as pesso: No dominio da investigago, 0 método que consiste em deduzir os valores através do comportamento, torna-se fastidioso e ambiguo. Vérios questionsrios de papel e lépis que apelam para preferéncias face a vitias alternativas apre- sentadas foram desenvolvidos. As respostas néo dever ser tomadas 4 letra [porque o comportamento real desvia-se muitas vezes do comportamento verbal. No entanto, os questionérios formecem informagio util uma vez que evidenciam Giferencas nas respostas ent ‘0u categorias de respondentes. Tomemos, tum exemplo de uma das questdes: “prefere ter mais tempo livre para o lazer, ou ganhat mais dinheiro?”. Uma pessoa que declarou preferir mais tempo de lazer pode, de facto, escolher 0 dinheiro se confrontado com a situago real. Mas, se mais pessoas do grupo A declararem preferir mais tempo de lazer, relativamente a um grupo B, isso indicia uma diferenga cultural entre os dois ‘grupos no que se refere 20 valor relativo do lazer e do dinheito. No momento de interpretar as respostas dos distingdo entre valores desefdveis € desejado: é importante fazer a questées relativas aos formuladas em termo virtude. Pelo contrétio, o desejado é formulado em termos de “voce” ot e trata do que consideramos importante, © que queremos para nés pr incluindo 0$ nossos desejos menos virtuosos. O desejével tem apenas uma pequena semelhanga com 0 comportamento real, mas, se 0 desejado se apro- xima do comportamento real, no coresponde necessariamente 2 atitude ituagbes de escolha concreta seja, 05 padrOes de valores em vigor num grupo ou categoria de pessoas’. No caso do desejével, a norma é absoluta, de ortiem ética, No caso mais com fins pragmiticos. Interpretar os estudos sobre, valores, negligenciando as diferengas entre 0 desejvel e 0 desejado, pode cond evocado mais adiante neste capit Giametralmente opostas neste dois paises deveriam dizer se estavam ou nao de ecordo com a afirmagio seguinte: res da inddstria deveriam participar mais nas decisées tomades Trata-se aqui do domfnio do desejével. Uma outra questio trabalhadores se preferiam um chefe que “consulta habitual- subordinados antes de tomar uma decisdo”. Neste caso estamos desejado. A comparagio das respostas a estas duas questoes revelou que os trabalhadores de pafses onde z consulta pelo chefe era menos popular, estavam mais frequentemente de acordo com a afirmagdo de ordem ; 1984, p. 82). nfveis de programagao mental diferentes, que correspondem de cultura: — um nivel nacional, dependendo do pafs as pessoas que emigram durante a sua vi a se pertence (ou paises para a maioria das nagbes so compostas por grupos do ponto de vista regional e/ou étnico e/ou reli- — tm nivel correspondente & pertenga a um dos dois sexos, mascalino ov feminino; — um nivel de geragio, diferente entre avés, pais e filhos; — um nfvel correspondente & origem social, associado ao nivel de escolari- dade e & profissio exercida; — para squeles que tabalham, um nivel ligado a orpanizasdo cu empresa & a forma como os trabalhadores sto af socializados. ‘98 valores geracionais; os relativos ao género com as préticas organizacionais, por exemplo. Valores em conflito 20 individuo, tomam dificil a antecipagio do seu comportamento em novas situagGes. Diferengas nas culturas nacionais As sociedades humanas existem desde hi mais de 10.000 anos. Os arqueélo- g0s acreditam que os primeitos humanos eram némadas que viviam da colheita ¢ da cage. Apés m Uhares de anos, alguns deles fixaram-se, tomando-se agricultores. Gradualme comunidades agricolas ceram transformando-se em gran + que evolufram para cidades, ¢ finalmente para mod ezal6poles, como a cidade do Mi com mais de 25 milhes de habitantes. Mas as diferentes sociedades humanas néo tiveram 0 mesmo ritmo de desen- volvimento, uma vez que existem ainda hoje populagées que vivem da caca ¢ da colecta. O crescimento da populacéo mundial foi acompankado de uma diversificagio impressionante de respostas 20 problema fundamental da orga- nizago da vida em comum € da forma de estruturago de uma sociedade. Nas zonas férteis do globo, grandes impérios foram construfdos hé varios milhares de anos a partir de conguistas sucessivas. © impét existente na nossa meméria é a China. Embora nao tenhi unificado, a sua 4000 anos. Outros nasceram, desenvolveram-se ¢ desintegraram-se no Sud . Por exemplo: os Estados ago Indonésio tiveram os seus impérios, como 0 mais tarde o Moghul na India e 0 Majapahit em Java; na América Central e do Sul, os impérios Azteca, Maia e Inca deixaram os scus monuimentos. Em Africa, a Bti6pia e 0 Benin so exemplos de estados muito antigos. Proximo do tertit6rio destes grandes impétios, e muitas vezes no seu interior, equenas unidades sobreviveram, sob a forma de independentes, Ainds hoje, na Nova Gui ppequenas tribos relativamenteisoladas, c te integradas na sociedade nacional A invengo das “nages”, unidades polticas de organizagio do planeta, cons- titui wa fenémeno recente da historia da humanidade, Cada ser humano actual € suposto pertencer a uma delas, como é patente no seu passaporte. Anterior mente, existiam estados, mas nem todos pertenciam, ou se ideatificavam com tema das nagdes, foi introduzido apenas em meados do mundial. Segui o sistema colonial que se desenvolveu jos do globo que no eram comandados por nenhuma outra ica. Particularmente em Aftica, as fronteiras nacionais correspon- dem mais & légica dos poderes coloniais, do que &s linbas divisbrias culturais das populagdes locais. Assim, nio podemos confundir nagdes e sociedades. Historicamente, as s0- integradas. ‘As mages que j@ existern hi algum tempo possuem elementos que favorecem uma integracZo crescente: uma Ifngua nacional dominante (em geral), um sistema nacional de educag&o, um exército nacional, um sistema politico nacional, uma representacio naci I de acontecimentos desportivos (portadora de um forte potenci € emocional), um mercado de emprego, produtos ¢ servigos & al. As nagées da actualidade nao atingem 0 grau de homogeneidade interna das sociedades isoladas, normal- mente pouco letradas, estudadas por antropélogos, mas elas slo a fonte de ‘uma forte programacio mental dos seus cidadios®, Por outro lado, permanece a tendéncia para grupos étnicos, lingufsticos religiosos reivindicarem o reconhecimento da sua identidade e mesmo da sua independéncia nacional, Estas reivindicagGes tém vindo a aumentar na segun- da metade do nosso século. Exemplos disso sé0 0s Catélicos na Irlanda do Norte, os Flamengos na Bélgica, 0s Bascos em Bspanhe e Franga, 0s Curdos no Traque, Iraque, Siria e Turquia, e muitos dos grupos étnicos na antiga Unifio Soviética. ‘A nacionalidade, tal como figura no passaporte, deve, pois, ser utilizada com prudéncia num estudo sobre as diferengas culturais. Contudo, constitui o tnico Demonstei que est 60 caso dos grups linguistions da Bélgica (1980, pégs. 335 e seguiates 1984, pigs. 228 e seguims). % ituras e organizacbes nacionais. Na medida em que tal for poss{vel, poder-se-& depois classificar os resultados por grupos regionais, émicos ou linguisticos. ‘Uma boa razdo para recolher dados 10 nivel da napiio é que um dos objectivos desta investigagiio consiste em promover a cooperaso entre nagdes. Como argumentémos no infcio deste capitulo, as mais de duzentas nagdes actualmente no planeta, esto condenadas a sobreviver, ou a ext culturais que separam ou unem as diferentes nagées. Dimensées das culturas nacionais Na primeira metade do século vinte, a antropologia social desenvolveu a conviceio de que todas as sociedades, modemas e tra tadas com os mesmos problemas fundamentais; apenas as Os antropélogos ameticanos, em particular Ruth Bened “Margaret Mead (1901-1978), desempenharam um papel dlesta mensagem para uma vasta audiéncia A etapa légica seguinte consistiu em definir que probl todas as sociedades, apoiando-se no raciocinio conceptual e reflexes a partir de experiéncias de campo, ¢ também através de estudos dois investigadores americanos, o sociélogo Alex Inkl »g0 Daniel Levinson, publicaram um estudo exaustivo da literatura antropolégica em lingua inglesa, Propuseram agrapar em trés categorias os problemas funda- ue se repercutiam no funcionamento das sociedades, sociedades ¢ nos individuos no interior dos grupos. 3. Formas de gerir 0s conflitos, inciuindo 0 controlo da agres. de sentimentos (Inkles € Levinson, 1969, pig. 447 e segui expresso Vinte anos mais tarde tive a oportunidade de estudar um grande conjunto de dados sobre os valores de cidadios de mais de cinquenta pases, repartidos por cinco continentes. Eram pessoas que trabalhavam nas filias locais de uma grande corporagio multinacional, a IBM. A primeira vista poderia parecer “Os niveis de cultura surpreendente que os empregados de uma multinacional — um tipo muito particular de pessoas — tenham sido utilizados como reveladores das diferen- as de valores nacionais. No entanto, de um pais para outro, ostras quase perfeitamente equiparadas: so idénticos em todos (98 aspectos com excepgéo da nacionalidade. A incidéncia da nacionalidade ‘has respostes toma-se entdo particularmente fécil de detectar, ‘Trabalhadotes da IBM, ocupando postos de trabalho idénticos em pafses diferentes, responderam a questées relativas aos seus valores. A anélise esta- tistica das respostas revelou a existéncia de problemas comuns, mas de solugées diferentes segundo o pais, nas seguintes freas: 1. Desigualdade social, incluindo a relago com a autoridade; 2, Relagio entre o individuo e o grupo; 3. Conceitos de masculinidade © feminilidade: as consequéncias sociais de pertencer a um ou outro sexo; 4, Formas de gerit a incerteza, relacionadas com 0 controlo da agressiio ¢ expresso de emogdes. Estes resultados empiricos cobrem de forma surpreendente as categorias iden: les e Levinson vinte anos antes. As conciusoes legitimidade tedrica aos nossos resultados em blemas comuns a todas as sociedades deverao aparecer em estudos di independentemente da abordagem utilizada. O estudo de Inkeles e Levinson no € o tinico cujas conclusdes coincidem com as minhas, mas constitui o que prediz de forma mais aproximada 0 que encontrei no terreno”. ‘As quatro categorias de problemas definidos por Inkeles e Levinson, e encon- trados de forma empirica nos dados da IBM, representam dimensdes das diferentes culturas, ou seja, aspectos dessas calturas que podem ser compara- dos aos de outra cultura, Escolhi para essas dimensdes as seguintes designagdes: | — A distancia hierérquica — 0 grau de individualismo (ou de colectivismo) | — O grau de masculinidade (ou de feminilidade) |\=0 controlo da incerteza pigs. 335-355, para ums arpliopio posterior. B * Culturas ¢ organizacées Estas designagdes jé foram utilizadas nas ciéncias sociais, e parecem dar conta, de forma razoével, dos problemas fundamentals repres quatro dimens6es. © conjunto forma um modelo a quatro. dim das diferengas entre as culturas nacionais. Cada pafs, neste mod za-se por um resultado para cada uma das quatro dimens6es. Cada dimenséo agrupa um conjunto de fenémenos de uma sociedade que se coneluiu, de forma empirica, estarem relacionados, mesmo se a necessidade 1gica da sua relagéo nfo aparega a priori. No entanto, a l6gica das sociedades ‘ou seja, da observa de tendéncias. Nao se trata de ligacé: CCertos aspectos em algumas sociedades poderdo ir contra uma tendéncia geral observada na maioria das sociedades. Uma vez que as dimensGes so encon- ttadas com a ajuda de métodos estatsticos, Wi concretamente a no ser a partir de informacées de paises, pelo menos dez. No quadro do estudo da IBM, tive a sorte de obter dadoe comprtveis sobre 0 valores igados 3 cultura para 50 patses, por um por outro, para 3 regides, agrupando em cada uma varios rnbee Aticn sual © Abies Ocidental). Foi o que permitiu que as dimensoes se destacassera claramente nas diferengas reveladas pelas respostas. ‘Mais recentemente foi identificada uma quinta dimensio sobre diferengas ‘enire culturas nacionais, opondo uma orientagdo a longo-prazo a uma orien- pode atribuir-se aos enviesamentos culturais na mente incluindo eu préprio. Todos partilhdvamos uma forma de per A nova dimensiio foi descoberta quando Michael Harris Bond, um canadiano radicado muitos anos no Extremo Oriente, decidiu estudar os valores de pessoas de diversos paises do mundo a partir de um questionério construfdo influéncia total da cultura: mesmo os investigadores que a estudam, ‘mentalmente progremadas de acordo com 0 seu quadro de referéncia cultural. Os resultados obtidos por cada pafs para uma dimensdo, podem ser repre- sentados graficamente ao longo de uma Osiniveis de cultura ico francés, Emmanuel Todd, que classifica ras familiares tradicionais predominantes numa cultura. Obtém quatro dos quais para a Europa. A tese que Todd defende € a estruturas familiares, preservadas no decurso da hist6ria, explicam 0 sucesso de um tipo particular de ideologia politica em cada pafs (Todd, 1983). nos trabalhos do historiador as cullturas de acordo Se bem que as tipologias sejam mais féceis de compreender que as dimensdes, elas colocam um problema para a investigacZo empitica: os casos concretos Os grupos assim obtidos, formar tipologias em que o estudo da IBM classificou mais de cinquenta paises e ‘grupos, com base nos seus resultados do modelo 4-D'®, Na pritica, os modelo tipol6gicos ¢ dimensionais podem ser considerados como complementares. Os primeiros sio preferiveis para a investigagéo, sendo as tipologias mais adaptadas ao ensino. Utilizaremos uma abordagem de carécter tipol6gico para a apresentagio das cinco dimensées. Para cada dimen- sveremos os dois extremos oposios, que podem ser considerados ideais, Posteriormente, examinaremos as dimensGes duas a duas, , quatro tipos ideais. Mas, os resultados obtidos pelos diferentes pafses para cada uma das dimensies, mostrario que a maioria dos casos cconeretos se situam algures entre os extremos descritos. Diferencas culturais ligadas a regio, religifio, geraco € classe social ea do seu grupo tradicional. Alguns sto te, embora isto possa levar uma ou mais ‘geragdes. Outros continuam ligados aos seus préprios costumes. Os Estados Unidos, como exemplo mais saliente de um povo coraposto de imigrantes, fornece exemplos tanto ado (o “melting pot”) como de conservagio de identidades grupais ao longo de geragdes (um exemplo sio os amish). A lofstede (1980, pég. 334; 1984, pg. 229) mostra 11 grupos entre os 40 patses estudados, © ‘atigo posterior em Hofstede (1983, pég. 346) ampli este a 13 clusters entre 50 pales € 3 regioes 3 Guttufas € organszacoes: discriminagao de acordo com a origem mica, atrasa o processo de assimilagio ¢ constitai um problema em muitos paises. As culturas regionais, étnicas religiosas podem descrever-se nos mesmos termos que as culturas nacionais: basicamente, as mesmas dimens6es que diferenciam as culturas nacionais ‘entre elas, diferenciam igualmente as culturas dentro do mesmo pafs. A filiaglo religiosa tem, em si mesma, menos incidéncia sobre a cultura do ‘ue & primeira vista possa parecer. Se estudarmos a hist6ria religiosa de um. pais, vemos que a religido adoptada pela populacdo (juntamente com a versio dessa religiéo), parece ser tanto o resultado de modelos de valores preexis- tentes como « causa de diferengas culturais. As grandes religiées, em algum momento dz sua bistéria, sofreram profundas divisées. O Crist culturais entre grupos de crentes sempre desempenharam um papel de relevo em tais divisdes. Foi assim no século XVI, 0 movimento reformista no seio da Igreja Cat6lica Romana em toda a Europa. No entanto, em pafses que mil anos antes pertenceram ao Império Romano, uma contra-reforma reinstaurou 2 autoridade da Igreja Romana. No fundo, a contra-reforma s6 teve éxito em paises sem tradigao “romana” sejam na sua maiotia prot nda que hoje, os paises da Europa do Norte tes e 05 da Europa do Sul cat6licos, as suas diferenas culturais ndo dessa separagdo religiosa, mas sim do Império Romano, Isto nfo exclui a possibilidade de que, uma vez adoptada uma religido, ela contribua para reforgar os valores que serviram de base para essa adopgio, convertendo-os em elementos essenciais da sua doutrina, As diferengas devidas a0 sexo nio sio geralmente descritas em termos de calturas; fazé-lo pode ser revelador. De facto, se admitirmos que no seio de uma mesma sociedade existe uma cultura masculina, diferente de uma cultura feminina, ajuda-nos a melhor compreender porque € to dificil modificar os papéis tradicionais de cada sexo. Se as mulheres néo sio consideradas apts para profissbes tradicionalmente exercidas por homens, nio & porque caregam. de capacidade técnica para as desempenhar, mas porque as mulheres niio 0 portadoras dos simbolos, nfo correspondem as figuras de hersis, néo partici- pam nos rituais e nfo adoptain valores dominantes da cultura mascalina; e vice-versa. Os sentimentos ¢ 0s medos face 20s comportamentos do sexo oposto sio da mesma ordem de intensidade que as reacgées as culturas cestrangeiras, As diferencas entre geragdes relativamente a simbolos, herdis,rituais ¢ valores so evidentes na grande maioria das pessoas. Mas elas sao frequentemente sobrestimadas, Foram encontradas em papiros egipcios, que datam do ano 2000 aC., € nos escritos de Hésiode, autor grego dos finais do século VIII a.C., qucixas sobre o abandono, por parte da juventude, dos valores dos mais Os niveis de cultura velhos. Muitas das diferencas de comportamento e de valores entre geragdes sio consequéncias normais da idade e repetem-se em geragGes sucessivas. N&O ‘obstante, os acontecimentos histricos afectam algumas geragdes de forma articular. Os chineses, que se encontravam em idade escolar durante a revolucdo cultural, assim 0 ilustram. O desenvolvimento da tecnologia esta também na origem de diferencas importantes entre geragies. No entanto, nem todos os valores e préticas na sociedade silo afectados pela tecnologia ou seus produtos, Se os jovens turcos bebem Coca Cola, iss0 nfo ‘modifica necessariamente a sua atitide face & autoridade. Em alguns aspectos, ‘0s jovens turcos diferem dos turcos mais idosos; assim como os jovens americanos diferem dos americanos mais idosos. Mas estas diferengas envol- vem sobretudo os dominios relativamente superticiais dos simbolos e dos herdis, da moda e do consumo. No dominio dos valores, ou seja, das atitudes fundamentais face & vida e aos outros, os jovens turcos diferem dos jovens americanos da mesma forma que os turcos mais idosos diferem dos america- nos mais idosos. Nao existe evidéncia de que as culturas das geragées actuais estejam a convergir. E certo que existem culturas diferentes segundo as classes sociais. A cada classe social correspondem oportunidades educativas e ocupactes profissio- nais diferentes; ¢ esse € também 0 caso para os pafses onde os governos se denominam socialistas, pregando uma sociedade sem classes. A educagio © a situagio profissional sao em si mesmas poderosas fontes de aprendizagem da ‘cultura, Nao existe uma definigao padrao de classe social aplicdvel a todos os paises; os habitantes de diferentes paises distinguem tipos e nimeros diferen- tes de classes. Os critérios de afectagio de uma pessoa a uma classe social io muitas vezes culturai olos jogam af um importante papel, como © caso dos acentos 20 falar-se a Mngua nacional, a uilizacéo de certas palavras © manciras. O confronto entre os dois jurados na pega “Doze Homens em Furia” comportam também um elemento de classe. ‘As culturas ligadas & classe social, ao sexo e A geragiio, s6 parcialmente podem ser classificadas através das quatro dimensGes definidas para a cultura nacio- nal. Isto porque se trata de categori de grupos. Os paises ¢ seus grupos étnicos, constituem sistemas sociais integrados. As quatro dimensdes tratam de problemas fundamentais de tais sistemas. As categorias, como 0 sexo, a geragdo, ou a classe social, sao apenas partes do sistema social e por isso nem todas as dimensées se thes aplicam, As culturas ligadas ao sexo, & geragtio ¢ d classe social, deveréo ser descritas nos seus préprios termos, a partir de estudas especiais para esses tips de culturas. a " Gusmuras € organizacoes Culturas organizacionais As culturas organizacionais ou de empresa tém constitufdo um t6pico na moda desde 0 inicio da década de 1980. Nessa altura, a literamra de gestio comegou 4 popularizar a nogio de que a “exceléncia” de uma organizagio estava ‘contida nas formas comuns de pensar, s 3 intangfvel e holistico, ‘com, no entanto, presumiveis consequéncias “duras”, tangfveis. Eo que cu jd chamei de “activos psicol6gicos de uma organizagio, que podem ser usados para prevet 0 que acontecerd 20s seus activos financeiros nos préximos 5 anos”. Os socislogos das organizagdes tém insistido, hé mais de meio século, no Papel do factor “suave” nas organizagdes. Usar a expresso “ct definit a programagio mental comum dos membros de u: ‘constitui uma forma prética de repopularizar as opiniées dos obstante, a cultura organizacional é um fendmeno em si mes ma social de natureza diferente de uma nago, quanto mais jo facto de os membros da organizaczo terem tido alguma influéncia na sua decisio de se juntarem a cla, estarem envolvidos nela apenas durante as horas de trabalho e poderem um dia abandoné-la Os resultados das investigagdes sobre culturas nacionais e suas dimensées, tém demonstrado ser apenas parcialmente tteis para uma boa compreenséo das cul itulo 8 deste livio, que trata das diferencas se baseia nos estudos da IBM mas sim ‘num projecto especial de investigagao levado a cabo pelo IRIC (Instituto de Investigagio sobre Cooperacio Intercultural), em vinte organizagées da Dina~ marca e Pafses Baixos.

You might also like