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Sinopse

Sou um agiota. Quebrar pessoas corre no meu


sangue. Os Haynes deveriam ser um trabalho
simples. Entre e puxe o gatilho duas vezes. Uma bala
para Charlie, uma para sua irmã. Mas quando vi
Valentina, eu a quis. Só que, em nosso mundo,
aqueles que nos devem não têm uma segunda
chance. De jeito nenhum, minha
mãe vai deixá-la viver.
Então, elaborei um plano para mantê-la.

É depravado. É imoral. É duvidoso. É


perfeito. Igual a ela.
1
Valentina

NUNCA CONSIDERO O brilho amarelo de uma lâmpada ou o


piscar interrupto azul da tela da televisão como certos. Procurar por
sinais de vida é um hábito arraigado para pessoas como eu, que
vivem com medo. Já do canto, estico o pescoço para olhar o nosso
andar. Então eu paro. O retângulo da nossa janela me encara. Preto.
Sombrio.
Oh meu Deus.
Charlie!
Minhas palmas ficam úmidas. Limpo-as na minha roupa e corro
escada acima até o segundo andar, quase tropeçando no último
degrau. Um puxão na maçaneta confirma que a porta está trancada.
Graças a Deus. Alguém não invadiu, atacou Charlie e o deixou para
morrer. Eu deixo cair minhas chaves duas vezes antes de colocar elas
na fechadura. De dentro, Puff começa a latir.
O maldito mecanismo de bloqueio resiste. Um dia
desses, o níquel frágil vai quebrar na
porta. Eu forço até a chave
girar. Na minha pressa para
entrar, tropeço em Puff, que corre para me
cumprimentar. Ele sai correndo com um grito e seu rabo
entre as pernas.
A escuridão é ameaçadora. Acender as luzes
não expele o vazio ou a sensação de mal-estar
subindo na minha garganta. Um vazio se instala em
meu peito quando pego a tigela de cereal de arroz
comidos pela metade e o copo de leite sobre a mesa.
— Charlie!
Mesmo que eu saiba o que vou encontrar, corro
para o banheiro.
Ninguém.
— Droga.
Apoiada na parede, cubro meus olhos e me
permito um segundo para reunir forças. Algo
úmido e quente toca minha panturrilha. Puff
me encara com seus olhos tristes e esperançosos, seu rabo
balançando em feliz ignorância.
— Está tudo bem, querido. — Eu acaricio seu pelo crespo,
precisando da garantia de seu corpinho quente mais do que ele
precisa de minhas carícias.
O relâmpago rasga o céu, o som chicoteia um momento
depois. Eu fecho as cortinas. Puff odeia tempestades. Depois de
alimentá-lo, tranco a porta e bato na porta ao lado, mas, como o
nosso, o apartamento de Jerry está escuro.
Maldito seja. Jerry me prometeu.
É um palpite absurdo, mas aposto que Napoli é o ponto de
encontro favorito de Jerry. É o único lugar para onde ele vai.
A estrutura frágil ressoa sob meus tênis enquanto desço os
dois lances de escada. Já passa das oito. Ter um ladrão de carros
como vizinho me mantém protegida até certo ponto, mas apenas de
criminosos inferiores na hierarquia do que Jerry. Existem traficantes
de drogas, máfia e gangues a serem considerados. Eu permaneço
alerta enquanto vou verificando as casas abandonadas, carros
estacionados e becos. Fico sob as luzes da rua, pelo
menos as que não estão quebradas, ando como minha
mãe me ensinou, como se eu não
fosse uma vítima.
A tempestade se dissolve,
levando consigo a chuva que teria lavado o fedor e a
fuligem do bairro vizinho. É verão, mas a fumaça das
fogueiras para cozinhar dá ao ar de Joanesburgo um
cheiro forte e invernal enquanto atravesso de Berea
para Hillbrow. A maioria dos edifícios
em Hillbrow não tem mais eletricidade. Quando o
crime tomou conta, as pessoas que podiam pagar
os serviços municipais se mudaram para os
subúrbios, transformando o centro da cidade em uma
cidade fantasma. Pouco depois, os sem-teto e outros
com objetivos mais sinistros invadiram os arranha-
céus desertos. As portas e os prédios sem janelas
parecem caveiras com órbitas vazias e bocas
abertas. As portas há muito foram usadas como
lenha. O que resta é a carcaça de uma
cidade. Os abutres arrancaram a carne dos
ossos e agora existem apenas os necrófagos que atacam uns aos
outros e, se eu tiver sorte esta noite, não a mim.
A caminhada até o Napoli leva quase quarenta e cinco minutos.
Estou com medo e minhas pernas doem de ficar na clínica veterinária
o dia todo, mas a preocupação com meu irmão supera o medo e a
exaustão. Quando chego ao clube, estou perto de desmaiar. Não é
a primeira vez que Charlie desaparece. Por experiência, sei que a
polícia não vai ajudar. Eles estão ocupados com casos de assassinato
e tantas pessoas desaparecidas que não têm espaço suficiente nas
caixas de leite para postar todos. De qualquer forma, a maioria deles
é corrupta. É mais provável que eu seja estuprada por uma gangue
de oficiais em uma cela de polícia do que obter ajuda. Eu tenho que
encontrar meu irmão sozinha.
Um grupo de adolescentes com coletes sujos cheirando cola na
esquina grita insultos.
O mais alto fica de pé, com a pele brilhando de suor e o branco
dos olhos como pires. — Ei, vadia branca. O que você
está fazendo no meu quarteirão?
— Ei! — Um segurança grandão em uma camiseta
com o logotipo do Napoli os cala com um olhar.
O segurança não me impede
quando empurro a entrada,
mas sinto seus olhos queimarem
na parte de trás da minha cabeça enquanto
caminho pelo corredor pintado de preto para o interior
bem iluminado. Uma música de uma banda local de rave
rock toca em alto-falantes enormes. As paredes estão
cobertas de arte de rua, as cores diurnas saltando
dos tijolos sob as luzes fluorescentes. Há todo tipo de
generalização lá dentro, desde os portugueses
de terno escuro aos negros com correntes de
ouro. Mulheres seminuas fazem a ronda, a maioria
parecendo distraída.
Por favor, deixe-os estar aqui.
Eu passo meu olhar sobre o bar e as mesas de
roleta no fundo. À esquerda, aplausos estridentes
são dirigidos à tela plana, onde uma corrida de
cavalos está acontecendo. Os espectadores
ficam quietos quando me notam. Um dos
homens toca sua fivela e amplia sua postura. Uma placa diz que o
escritório de empréstimo de dinheiro está lá em cima. Há uma fila do
lado de fora da porta. É aí que jogadores e pessoas que não podem
pagar o aluguel ou pagar a máfia perdem suas vidas, garantindo
juros de até cento e cinquenta por cento em empréstimos que
literalmente lhes custarão um braço e uma perna.
Os homens jogando dardos viram suas cabeças quando eu
passo. Merda. Estou ficando cada vez mais ansiosa. Quando o pânico
está prestes a tomar conta de mim, vejo o cabelo afro laranja de Jerry
em um círculo de cabeças em uma das mesas de jogo. Charlie se
senta na cadeira ao lado dele. Quase chorando de alívio, empurro as
pessoas com copos de cerveja de plástico nas mãos para fora do
caminho para alcançar meu irmão. Os cachos de Charlie caem sobre
sua testa e seus olhos estão franzidos em concentração. Ele está
vestindo uma camiseta do Homem-Aranha e calça de pijama de
flanela. O traje o faz parecer vulnerável, apesar de sua idade e corpo
volumoso. Qualquer um pode ver que ele não pertence aqui. Como
o filho da puta doente que dirige esta fossa permite que meu irmão
entre?
— Como você pode? — Eu digo no ouvido de Jerry.
Ele pula e me lança um olhar
assustado. — O que você está
fazendo aqui?
Charlie está estudando as cartas em sua
mão. Ele não me notou, ainda.
Eu pressiono a mão na minha testa e conto até
cinco. — Você disse que cuidaria dele para mim.
— Estou observando-o.
— Ele não deveria estar aqui.
— Ele é um homem adulto.
— Meu irmão não é responsável por suas ações,
e você sabe disso.
Charlie ergue os olhos. — Va–Val! Estou ga-
ganhando.
Por enquanto, meu foco permanece em
Jerry. Álcool e jogos de azar não são seus únicos
vícios. — O que você deu a ele?
— Relaxa. — Ele me dá um encolher de
ombros exasperado. — Suco de laranja, só isso.
— Venha, Charlie.
Pego o braço de meu irmão, mas o crupiê agarra minha mão.
— Ele não vai a lugar nenhum até que sua dívida seja paga.
Minha boca se abre. Como Jerry pôde deixar isso acontecer? Ele
sabe que eu mal consigo pagar as contas. Eu puxo meu braço do
aperto do negociante. — Quanto?
— Quatrocentos.
— Quatrocentos Rands1! — Isso é quase metade do meu salário
semanal.
— Quatrocentos mil.
A força deixa minhas pernas. Soltando Charlie, me seguro com
as palmas das mãos na mesa. Podemos também esculpir mortos em
nossas testas.
— É impossível. — Não consigo processar esse valor. — Em uma
noite?
O crupiê me olha com estranheza. — Charlie é um regular. Ele
está executando uma conta e seu tempo acabou.
— Jerry? — Eu olho para ele em busca de uma explicação, uma
solução, para me dizer que é uma piada, qualquer coisa,
mas ele morde o lábio inferior e desvia o olhar.
Eu bato o punho,
sacudindo as lascas de
plástico. — Olhe para mim!
A mesa fica quieta, mas não por causa da
minha explosão. As cabeças dos homens estão voltadas
para o patamar do andar superior. Quando eu sigo seus
olhares, não posso perder o homem que está sob a luz,
com as mãos segurando o corrimão. Ele veste um
terno escuro, como o português, mas é tudo
menos uma generalização. Ele é nada menos que um
monstro.
Seu corpo é musculoso. Muito grande. Não há
espaço suficiente na sala para ele. Ele afoga tudo em
poder e domínio. Ele não é jovem, mas também não é
velho. Em vez de definir sua idade, seus anos lhe dão
a vantagem distinta de homens com

1 O Rand ou, em uma forma aportuguesada,


rande é a moeda corrente oficial da África do
Sul.
experiência. Cabelo preto espesso cai desordenadamente sobre sua
testa, os fios escovando suas orelhas. Seus traços são rebeldes,
selvagens e intransigentes. As linhas que vão do nariz à boca estão
profundamente gravadas. São o tipo de linha que os homens com
vidas difíceis e duras usam. Uma rede medonha de cicatrizes vai da
sobrancelha esquerda até a bochecha. Sob a colcha de retalhos
desfigurada, sua pele é bronzeada. A rugosidade de sua pele dá a
impressão de estar marcada por balas. Uma barba aparada e bigode
cobrem algumas de suas imperfeições, mas o dano é muito grande
para esconder. É um rosto que você não quer ver no escuro e
definitivamente não em seus sonhos. É um rosto que me encara
diretamente.
Calor do tipo assustador rasteja sobre minha pele. Quando eu
olho em seus olhos, é como se um balde de gelo fosse esvaziado em
minha camisa. Um arrepio indesejado contrai minha pele e meu
medo muda de quente para frio. Suas írises são azuis como os vitrais
distantes que só vi em fotos. Tudo nele parece estranho. Fora de
lugar. Perigoso. Ele é o tipo de mau que está fora do alcance do
Napoli.
— Porra, — murmura Jerry quando ele encontra sua
voz. — Gabriel Louw.
Moro aqui há tempo
suficiente para reconhecer o
nome. Sua família administra o
Napoli. Se Hillbrow é a capital do crime, Gabriel Louw é
o rei dos senhores do dinheiro. Eles o chamam de The
Breaker. Ele é um agiota e já ouvi histórias sobre ele que
fazem meu sangue congelar com sua brutalidade.
A melhor hora para correr é quando seu
oponente está distraído. Se temos alguma chance de
sairmos vivos daqui, é agora, enquanto Gabriel
prende a atenção da sala com uma demanda
inflexível. Puxar Charlie contra sua vontade não
funcionará. Ele pesa duas vezes mais que eu e,
quando fica obstinado, é um peso morto e imóvel.
— Vamos tomar um sorvete, — sussurro em
seu ouvido, — mas você tem que vir em silêncio.
Charlie sabe sobre como ficar quieto. Nós praticamos muitas
vezes quando nos escondemos da máfia, fingindo que não estamos
em casa.
Charlie se levanta como eu silenciosamente rezei para que ele
fizesse e me permite leva-lo até a porta. Fecho os olhos e espero que
alguém grite, nos agarre, atire ou os dois, mas quando olho para trás,
Gabriel levanta a palma da mão e o segurança dá um passo para o
lado para que possamos sair.
Do lado de fora, respiro fundo o ar poluído. Agarrando o braço
do meu irmão, eu o conduzo de volta para o nosso lado dos trilhos, o
que não é muito melhor, mas é tudo o que temos. Ele fala e eu deixo
sua voz me acalmar, tentando não pensar. Quando estivermos em
casa, vou repassar o que aconteceu. Por enquanto, estou muito
preocupada com perigos à espreita.
No Three Sisters, compro para Charlie um cone com sorvete de
baunilha embebido em caramelo, seu favorito. Só quando viramos a
esquina do nosso prédio é que o problema volta a aparecer. Tiny se
inclina na entrada, fumando um baseado. Ao nos ver, ele se
endireita, dá uma última tragada e joga a bituca na
sarjeta.
— Bem, bem. — Ele limpa as
mãos nos dreadlocks e
caminha até nós. — Olá raio de
luz. Tiny estava procurando por você. — Há um tom
áspero em sua voz. — Onde você estava?
— Sor-sorvete, — diz Charlie.
— É mesmo? — Tiny para perto de mim. Ele não é
nigeriano ou zimbabuense como a maioria das
pessoas em nosso quarteirão, mas zambiano. Sua
estrutura magra se eleva sobre mim, sua pele negra
perdida na escuridão da noite, exceto pelo branco de
seus olhos e dentes. — Você tem dinheiro para mimar
seu querido irmão aqui, mas não para os impostos de
Tiny?
Ele se autodenomina o cobrador de
impostos. Ele não é o proprietário, mas cobra
'impostos' sobre o aluguel de todos que moram
em nosso prédio. Ele é um mini mafioso dentro
de uma máfia maior, mas lidar com ele significa
que eu não tenho que lidar com a máfia maior, e ele é o menor de
dois males.
Colocando o nariz no meu cabelo, ele funga. — Você cheira a
fumaça. Fumaça de clube. Com quem você estava?
Tiny finge que é meu dono. Principalmente, ele finge que gosto
dele. Na verdade, ele é um covarde, mas ainda tem o poder de me
machucar. Eu sei disso por causa de um lábio partido e um olho
roxo.
— Você está namorando agora?
— Não é da sua conta. — A chave de Charlie não está no cordão
em seu pescoço. Terei que perguntar a Jerry sobre isso mais
tarde. Pego minha chave na bolsa e a entrego a Charlie. — Suba e
tranque a porta.
Charlie pega a chave, mas não se move.
— Vá em frente, — eu insisto. — Já vou.
— C-Certo. — Charlie dá dois passos e para.
Eu dou a ele um sorriso encorajador. — Rápido. Eu não quero
que você pegue um resfriado.
Tiny agarra meu cabelo. Eu fecho meus olhos. Por
favor, Charlie. Obedeça. Não quero que ele veja
isso. Quando levanto os cílios,
meu irmão está subindo as
escadas na lateral do prédio.
— Está com o dinheiro? — Pequenos puxões
no meu rabo de cavalo.
A hipoteca em nosso apartamento está totalmente
paga. Meus pais pagaram em dinheiro pela propriedade
anos atrás, antes que alguém pudesse prever como o
crime e a dilapidação tornariam seu investimento
sem valor.
— Nós não pagamos aluguel, — respondi. Isso
não significa nada para Tiny, mas preciso tentar. Deus
sabe por que, mas tento sempre.
— Você ainda deve. — Ele sorri, mostrando uma
fileira de dentes retos. — Tiny não pode deixar você
ficar sem pagar impostos. Que exemplo isso será
para os outros? Desista, Valentina.
Eu congelo. — Não diga meu nome.
Ele zomba. — Isso mesmo, porque você é minha vadia. — Ele
puxa meu cabelo. — Não é mesmo, vadia?
— Vá para o inferno.
— Agora, agora. Isso não é jeito de falar com Tiny. — Ele estala
a língua. — Quem vai te proteger se Tiny não estiver por perto?
— Ele inclina a cabeça. — Não vou perguntar de novo. Onde
está o dinheiro de Tiny?
Eu engulo. — Terei até o final do mês.
— Você conhece as regras. O décimo quinto é o dia de
pagamento.
— Por favor, Tiny. — Lágrimas queimam no fundo dos meus
olhos. Um peso frio pressiona meu coração.
No meio da estrada suja, ele me empurra de joelhos no cascalho,
as pedras cravando em minha pele. Seus olhos adquirem um brilho
febril quando ele desamarra o cordão de sua calça de moletom e a
deixa cair até os tornozelos.
— Se você morder de novo, vai sair com mais do que um olho
roxo. Desta vez, vou quebrar seu braço.
Pegando a base de seu pau com uma mão, ele agarra
meu cabelo com a outra e guia minha boca para seu
pau. Nojo brota na minha
garganta.
Ele empurra meus lábios. —
Me chupe, vadia branca.
Eu não faço nada disso. Me afasto do momento e
me torno uma concha vazia. É uma rotina que ele
conhece bem. Ele solta seu pau para pegar meu queixo,
apertando dolorosamente nas juntas até que minha
boca se abra por conta própria. Então ele
simplesmente me usa, bombeando e empurrando até
eu me engasgar. Lágrimas rolam pelo meu rosto. O
salgado das lágrimas em minha boca, se misturando
com o gosto de suor e sujeira. Felizmente, como sempre,
Tiny goza rápido. Nem mesmo um minuto depois, ele
ejacula com um grunhido e atira sua carga na minha
boca. Quando ele puxa, ofegando como um porco,
viro a cabeça para o lado e cuspo.
Ele ri. — Um dia desses você vai engolir.
Limpo minha boca com as costas da mão. — Quando você for
bonito e seus pais forem ricos.
— Vem cá neném. — Ele me puxa pelo braço, seu pau mole
pendurado entre nós. — Dê um beijo em Tiny. Deixe Tiny provar a si
mesmo nessa sua boca inútil, porque você com certeza não sabe
como chupar um pau.
— Solte. — Eu me liberto e pego minha bolsa de onde ela caiu
no chão.
Sua risada me segue pela rua enquanto corro para nosso
apartamento, me odiando tanto quanto eu o odeio.
Jerry se inclina na nossa porta enquanto eu subo as
escadas. Ele desvia o olhar, evitando meus olhos. Deve ter deixado o
Napoli logo depois de nós. Isso significa que passou por mim na rua
enquanto Tiny gozava na minha boca.
— Você é um canalha. — Tento empurrá-lo para o lado, mas ele
não se move.
— Val…
— Você gostou de assistir?
Ele enfia as mãos nos bolsos. — Eu sinto muito.
— Por ser um pervertido ou por arrastar Charlie para
o Napoli?
— Não pude resistir à
tentação. O passe VIP do Napoli
não acontece todos os dias.
— Quatrocentos mil Rands, Jerry.
— Nós vamos resolver isso. Não se preocupe.
— Certo. — A única maneira de resolver isso é
desaparecer e não temos para onde ir. — Há quanto
tempo isso vem acontecendo?
Ele coça a cabeça e tem a decência de parecer
culpado. — Alguns meses.
— Você arrastou Charlie para fora à noite, sem
minha permissão?
— Vamos, Val. — Jerry apoia o ombro na
porta. — Eu disse que sinto muito.
Bato para Charlie abrir. Estou física e
mentalmente exausta demais para lutar agora. —
Tanto faz.
Eu cozinho e limpo para Jerry, para ele ficar de olho em Charlie
enquanto eu trabalho e, embora Jerry seja um ladrão, não é
fisicamente mau, pelo menos não com Charlie.
Depois de um tempo, quando Charlie não abre, Jerry tira a
chave do meu irmão do bolso e a entrega para mim. Puff late
enquanto eu destranco a porta. Ele espera com o rabo abanando.
— Boa noite, Jerry.
— Posso entrar?
— Está tarde. Eu preciso estudar. — Eu uso a desculpa mesmo
sabendo que não há como focar em um livro esta noite, mas é a
maneira mais rápida de me livrar de Jerry. Caso contrário, ele ficará
até as quatro da manhã.
— Oh vamos lá. Só uma hora.
Eu fecho e tranco a porta em seu apelo, esperando até que seus
sapatos se arrastem pelo corredor. Eu escovo os dentes três vezes
antes de preparar ovos mexidos e torradas para Charlie para o jantar,
colocar ele na cama e me sentar no sofá-cama com Puff.
O sono não vem. Penso em Charlie e no lindo garoto de quinze
anos que ele foi. Ele era um daqueles versáteis que eram
bons em esportes e o primeiro em sua classe. Ele era meu
irmão mais velho. Meu herói. Dois
anos mais jovem que Charlie,
eu estava na escola primária
quando ele foi para o ensino médio. Ele me buscava
quando o sino tocava no final do dia, pegava minha
mochila, pegava minha mão e me acompanhava até o
treino de balé. Não contamos aos meus pais que ele fez
um acordo com a dona Paula para trabalhar no
jardim dela para que eu pudesse continuar
dançando. Se soubessem, meu pai teria exigido que
trabalhasse por dinheiro para comprar o necessário,
como bebida e cigarros. Charlie me ajudava a colocar
as sapatilhas de balé que a dona Paula me emprestava
e esperava a hora que durava o treino de dança antes
de me levar para casa para me preparar um
sanduíche. Ele poderia ter saído com seus amigos,
mas não o fazia. Ele cuidava de mim.
Se o acidente não tivesse acontecido, se eu
não quisesse um pedaço estúpido de bolo de
chocolate naquela noite, Charlie teria sido Charles. Meu irmão teria
crescido e se tornado o homem que nasceu para ser. Como todas as
noites, eu choro no meu travesseiro, derramando lágrimas amargas
que não vão ajudar em nada. O dano cerebral é irreparável.

PUFF CHORA NA porta, me avisando que precisa sair. O sol


nasceu, mas mal são cinco. Eu espero lá embaixo no concreto
rachado enquanto ele faz suas necessidades contra uma árvore
morta e jogo um pedaço de pau para ele buscar algumas
vezes. Arrastando o galho ao seu lado com alegria, ele tropeça nas
patas para colocar o galho quebrado aos meus pés. Puff é sempre um
cão feliz. Certa manhã, latidos vindos de uma lata de lixo de jardim
me alertaram. Peguei um cachorrinho faminto, sujo e cheio
de pulgas. Até hoje, Puff tem medo de latas de lixo.
Ele ainda não acabou de
brincar, mas tenho que ligar
para Kris e dizer a ela que não vou
trabalhar hoje. Eu odeio deixá-la em apuros, mas
tenho que descobrir o que fazer. Quatrocentos mil
Rands não vão desaparecer. Talvez eu possa explicar
sobre a condição de Charlie no Napoli. Talvez se Jerry me
apoiar, tenhamos uma chance. Napoli faz parte do
peixe grande. Eles acolhem pequenos criminosos
como Jerry, mas ele é um regular, nada menos com
um passe VIP. Eles se alimentam de pessoas como
ele. Eles precisam de seu negócio.
De volta para meu apartamento, Charlie está de
pé. Ele me oferece um sorriso que parte meu coração,
porque é um sorriso que não cresceu além de seus
quinze anos. Afagando seu cabelo, me viro para a
cozinha para que ele não veja as lágrimas em
meus olhos. Ligo para Kris, mas o telefone dela
vai direto para o correio de voz. Talvez esteja no
banho. Deixo uma mensagem rápida, dizendo a ela que não irei e que
ligo mais tarde para explicar.
— Você não vai trabalhar?
— Hoje não. — Abro os armários e examino o conteúdo. Não há
muito. Charlie come como um cavalo.
— O que há para ca-café da manhã?
Não posso dizer a ele o quanto estou arrependida. Não podemos
ter discussões maduras sobre culpa e penitência. — Que tal cookies?
— As guloseimas simples que o deixam feliz são tudo o que posso
oferecer.
— Cho-chocolate?
Tem farinha, leite em pó, um ovo e cacau. Eu posso inventar
algo. Se eu pudesse, daria o mundo a ele.
Aqueço o forno portátil de dois pratos e deixo que ele misture a
massa. Enquanto os biscoitos assam, tomo banho e me visto antes
de enviar Charlie para fazer sua higiene matinal. Ao mesmo tempo
que o cronômetro do meu telefone apita para o forno, há uma
mensagem de texto de Jerry.
Jerry: Corre.
Um tremor sacode meus ossos. Eu tremo, mesmo
que esteja quente por dentro por
causa do forno. Correndo para
a janela, eu espio. Uma Mercedes
preta está estacionada do outro lado da rua. Uma
mulher está sentada na frente, mas com o brilho do sol
na janela não consigo ver nada além de seu cabelo
escuro. Um homem de terno sai do banco do motorista e
outro do banco de trás. Ele segura a
porta. Um terceiro homem dobrava seu grande corpo
para sair, ajustando as mangas de sua jaqueta
enquanto olhava para cima e para baixo na rua antes
de virar a cabeça na direção de nossa janela.
Gabriel Louw.
Minha respiração fica presa. Eu pulo para trás
antes que ele me veja. Charlie sai do banheiro e
começa a arrumar a cama como ensinei a ele.
— Os bis-biscoitos.
Eles estão queimando. Desligo o forno e uso um pano de prato
para despejar a assadeira em um prato de cortiça, tentando não
entrar em pânico.
Não há porta dos fundos ou janela. A única saída é pela frente.
Estamos presos. Eu me encosto na parede, tremendo e me sentindo
mal.
Por favor, não deixe ele nos matar. Esqueça isso. Melhor deixar
ele nos matar do que nos torturar.
Todos, de Aucklandpark a Bez Valley, sabem o que The Breaker
faz com os devedores que não pagam. Ele tem uma reputação
construída em uma trilha de corpos quebrados e casas
queimadas. Puff, sempre sentindo ansiedade, lambe meus
tornozelos.
Passos batem no patamar. É tarde demais. O instinto de luta
explode em mim. Minha necessidade de proteger meu irmão assume
o controle.
Eu pego a mão de Charlie. — Me escute. — Minha voz é urgente,
mas calma. — Você pode ser corajoso?
— Co-corajoso.
Puff late uma vez.
A batida na porta me
assusta, mesmo eu a
esperando. Eu não consigo me
mover. Deveria ter pegado Charlie e fugido noite
passada. Não, eles teriam nos encontrado. Então teria
sido pior. Você não pode se esconder do Breaker.
Outra batida, mais forte dessa vez. O som é oco
na madeira falsa.
— Fique em pé. — Não demonstre seu medo, eu
quero dizer, mas Charlie não vai entender.
Nenhuma terceira batida vem.
A porta quebra para dentro, madeira prensada
estilhaçando com um som seco e quebradiço. Três
homens passam pela moldura para tornar realidade
meu pior pesadelo. Eles estão carregando
armas. Tez escura, portuguesa, exceto o do
meio. Ele é sul-africano. Ele se move mancando,
a perna direita rígida. Gabriel é ainda mais feio
de perto. À luz do dia, o azul de seus olhos
parece congelado. Eles têm o calor de um iceberg enquanto seu olhar
percorre toda a sala, avaliando a situação nos mínimos detalhes com
um único olhar.
Ele sabe que estamos desprotegidos. Ele sabe que estamos com
medo e gosta disso. Se alimenta disso. Seu peito incha, esticando a
jaqueta sobre seus ombros largos. Ele bate a arma contra a coxa
enquanto sua mão livre fecha e abre em torno do ar vazio.
Toque, toque. Toque, toque.
Essas mãos. Meu Deus, são enormes. A pele é escura e áspera
com veias fortes e uma camada fina de cabelo preto. Essas são mãos
que não têm medo de se sujar. São mãos que podem envolver o
pescoço e esmagar a traqueia com um aperto.
Eu engulo e levanto meu olhar para seu rosto. Ele não está mais
fazendo um balanço da sala. Ele está me avaliando. Seus olhos
percorrem meu corpo como se procurasse pecados em minha
alma. Parece que ele me corta e deixa meus segredos vazarem. Ele
me faz sentir exposta. Vulnerável. Sua presença é tão intensa,
estamos nos comunicando apenas com a energia que vibra ao nosso
redor. Seu olhar atinge profundamente dentro de mim e
filtra meus pensamentos privados para ver a verdade, que
sua autoconfiança cruel desperta
ódio e espanto. É o espanto
que ele tem, como se fosse seu
direito explorar meus sentimentos íntimos, mas ele
o faz de maneira sutil, quase com ternura, executando o
ato invasivo com respeito.
Então ele perde o interesse. Assim que me seca,
deixo de existir. Eu sou o tapete em que ele limpa os
pés. Sua expressão fica entediada enquanto ele fixa
sua atenção em Charlie.
Tomando de volta um pouco de poder, eu digo.
— O que você quer?
Seus lábios se contraem. Ele sabe que estou
blefando. — Você sabe por que estou aqui.
Sua voz é profunda. O som áspero desse tom
escuro ressoa com autoridade e algo mais
perturbador, sensualidade. Ele fala
uniformemente, articulando cada palavra. De
alguma forma, a qualidade musical e o volume
controlado de sua voz fazem a declaração soar dez vezes mais
ameaçadora do que se ele tivesse gritado. Em outras circunstâncias,
eu teria ficado encantada com o timbre rico. Tudo o que sinto agora
é medo, e isso se reflete no rosto de Charlie. Eu odeio que não posso
tirar isso para ele.
— Só vou perguntar uma vez, — diz Gabriel, — e quero
simplesmente uma resposta sim ou não. — Toque, toque. Toque,
toque. — Você está com meu dinheiro?
Respingos de palavras gotejam dos lábios de Charlie. — Eu - eu
- não gosto deles. Não sa-sa-são bons homens.
O homem à esquerda, aquele com olhos verdes, levanta a arma
e aponta para os pés de Charlie. Acontece muito rápido. Antes que
eu possa mover, seu dedo aperta o gatilho. O silenciador amortece o
tiro. Espero o dano, o sangue tingir de branco do tênis de Charlie,
mas em vez disso há um gemido e Puff cai.
Ah não. Por favor. Não. Querido Deus. Não, não, não.
Deve ser um filme de terror, mas o buraco entre os olhos de Puff
é muito real. O sangue escorrendo para o linóleo também. O corpo
sem vida no chão provoca raiva em mim. Ele era apenas
um animal indefeso. A injustiça, a crueldade e minha
própria impotência são o
combustível de meus sentidos
chocados.
Em um ataque de fúria cega, eu ataco o homem
com a arma. — Sua desculpa de homem!
Ele se abaixa, agarrando facilmente meus pulsos
com uma das mãos. Quando aponta a arma para minha
cabeça, Gabriel diz, sua bela voz vibrando como uma
corda de violão bem puxada. — Deixe-a ir.
O homem obedece, me dando um empurrão que
me faz tropeçar. No minuto em que estou livre, vou
para Gabriel, socando meus punhos em seu estômago
e no peito. Quanto mais ele fica lá e leva meus socos,
meu ataque não tendo efeito sobre ele, mais perto eu
chego das lágrimas.
Gabriel me deixa continuar, sem dúvida para
fazer papel de boba, mas não posso
evitar. Continuo até que minha energia se
esgote e tenho que parar em uma derrota
dolorosa. Ficando de joelhos, sinto o peito minúsculo de Puff. Seu
batimento cardíaco se foi. Eu quero abraçar ele contra o meu corpo,
mas Charlie está encolhido no canto, puxando seu cabelo.
Ignorando os homens, eu me endireito e levanto as mãos de
Charlie, puxando-as para longe de sua cabeça. — Lembra do que eu
disse sobre ser corajoso?
— Co-corajoso.
Tanto ódio por Gabriel e seus comparsas me encheu que meu
coração está tão negro quanto um vulcão apagado. Não há espaço
para nada de bom lá. Eu sei que não deveria ceder à escuridão das
sensações percorrendo minha alma, mas é como se a escuridão fosse
uma mancha de tinta que sangra sobre as bordas de uma página. Eu
abraço a raiva. Do contrário, o medo me consumirá.
Gabriel me lança um olhar estranhamente compassivo. — Você
me deve uma resposta.
— Olhe a sua volta. — Eu aceno em nosso apartamento. —
Parece que podemos pagar esse tipo de dinheiro? Você é um homem
louco por dar um empréstimo a uma pessoa com deficiência mental.
Seus olhos se estreitam e rugas surgem nos
cantos. — Você não tem ideia de como estou disposto a
ser louco. — Gabriel agarra
Charlie pela gola de sua
camiseta, puxando-o para mais
perto. — Só para constar, se você não queria que
seu irmão fizesse dívidas, deveria ter declarado ele
incompetente e revogado seu poder de assinatura
financeira.
— Deixe-o em paz!
Pego o braço de Gabriel e seguro com todo o meu
peso, mas não faz diferença. Estou pendurada nele
como um pedaço de roupa em um varal. Ele me
golpeia, me jogando no chão e pressiona o cano de sua
pistola contra a têmpora macia de meu irmão, onde
uma veia pulsa com uma vida inocente que ainda não
viveu.
— Va–Val!
Ele solta a trava de segurança. — Sim ou
não?
— Sim! — Usando a parede nas minhas costas como suporte,
fico de pé. — Eu vou pagar.
Charlie chora baixinho. Gabriel me olha como se não
percebesse mais nada. Seus olhos me fixam no local. Sob seu olhar,
sou um sapo esparramado e pregado a uma tábua, e ele segura o
bisturi na mão.
Ele não abaixa a arma. — Você sabe quanto?
— Sim. — Minha voz não vacila.
— Diga.
— Quatrocentos mil.
— Onde está o dinheiro?
O fantasma de um sorriso está de volta em seu rosto. Por trás
da máscara com cicatrizes está um homem que sabe como machucar
as pessoas para conseguir o que deseja, mas por enquanto ele está
se divertindo. O bastardo acha a situação divertida.
— Eu vou pagar.
Ele inclina a cabeça. — Você vai pagar. — Ele faz parecer que
estou louca.
— Com juros.
— Senhorita Haynes, eu suponho. — Apesar de sua
suposição declarada, ele diz como
se fosse um fato. Tudo nele
grita confiança e arrogância. — Me
diga seu nome.
— Você sabe meu nome. — Homens como ele
sabem os nomes de todos os membros da família antes de
partirem para a matança.
— Eu quero ouvir você dizer.
Eu molhei meus lábios secos. — Valentina.
Ele parece digerir o som como uma pessoa
provaria vinho em sua língua. — Quanto você ganha,
Valentina?
Eu me recuso a me encolher. — Sessenta mil.
Ele abaixa a arma. É um jogo para ele agora. —
Por mês?
— Por ano.
Ele ri baixinho. — O que você faz?
— Eu sou uma assistente. — Eu não
ofereço mais. Basta que ele já saiba meu nome.
Ele me olha com os braços soltos ao lado do corpo. — Nove anos.
Parece ridículo, mas o cálculo rápido que faço na minha cabeça
me garante que não é. São quase cinco mil por mês, incluindo trinta
por cento de juros sobre o montante fixo. Não posso chamá-lo de
injusto. Os agiotas desta vizinhança cobram qualquer coisa
entre cinquenta e cento e cinquenta por cento de juros.
— Nove anos se você pagar com o menor dos juros, — ele
continua confirmando meu cálculo.
Claro, não estou planejando ficar como uma assistente de
veterinário para sempre. É só até eu me qualificar como veterinária
em quatro meses. Até lá, ganharei mais. — Eu pagarei mais rápido
quando conseguir um emprego melhor.
Ele diminui os dois passos entre nós com um andar
irregular. Ele está tão perto que posso sentir o cheiro do sabão de
sua camisa e a fragrância leve e picante de sua pele.
— Você entendeu mal a minha oferta. — Seus olhos perfuram
os meus. — Você trabalhará para mim por nove anos.
Minha respiração fica presa. — Para você?
Ele apenas olha para mim.
— Fazendo o que? — Eu pergunto em um sussurro.
A intensidade nessas
profundidades geladas e azuis
fica mais nítida. — Qualquer dever
que eu achar adequado. Pense com cuidado,
Valentina. Se você aceitar, será uma posição
permanente.
Eu sei o que qualquer dever implica. Ele não é
diferente de Tiny. A aversão me enche.
Gabriel me olha como se estivesse fazendo uma
aposta consigo mesmo. — Ou eu atiro no seu irmão
e você vai embora, ou ele está livre e você paga a
dívida dele.
— Me dê qualquer contrato que eu precise assinar
e eu encontrarei minha própria maneira de pagar você.
Ele ri. — São meus termos ou nenhum.
Que escolha eu tenho? Meus joelhos tremem,
mas dificilmente é hora de ficar fraca.
— Eu vou fazer isso. — Enquanto digo as palavras, uma bola de
gelo afunda em meu estômago.
Por um momento, ele parece surpreso, mas então sua expressão
se torna fechada. — Você tem cinco minutos para fazer as malas.
— Eu tenho uma condição.
A diversão está de volta em seu rosto. Ele bate a arma na coxa
e espera.
— Eu quero a segurança do meu irmão garantido. — Se eu não
estiver por perto, Charlie precisará de proteção. Não quero repetir o
que nos meteu nesta confusão.
— Justo. Ele terá minha proteção.
—Eu preciso chamar alguém para buscar ele. Ele não pode ficar
sozinho.
Ele tira o telefone do bolso, digita um código e o coloca na minha
mão. — Você vai usar o meu até que tenhamos garantido que o seu
não seja comprometido.
Virando as costas para eles, digito o número da minha única
amiga. Enquanto estou discando para Kris, o homem de olhos
escuros vasculha minha bolsa, que está pendurada em
uma cadeira na cozinha. Eu observo os homens com o
canto do olho, minha mão
tremendo enquanto espero
Kris atender a ligação.
— É Valentina, — digo quando ela responde.
Os cães latem ao fundo. — Não reconheci este
número. Você tem um novo telefone? Eu vi que você ligou
mais cedo, mas ainda não ouvi sua mensagem.
— Kris, me escute. Eu preciso que você venha
buscar Charlie. Ele pode ficar com você um pouco?
— O que aconteceu?
— Charlie fez dívidas no Napoli. Estou com o
credor.
— O que? — Ela grita. — Você está com um
agiota? Onde?
— Minha casa. As coisas mudaram. Vou
trabalhar para pagar a dívida de Charlie, mas ele
não pode ficar sozinho. — Minhas bochechas
ficam quentes quando eu acrescento. — É um
trabalho permanente.
— E quanto ao seu trabalho aqui?
— Eu sinto muito. Eu sei o quanto você precisa de mim.
É sempre agitado na clínica e me sinto mal pelo que tenho que
fazer. Kris é uma das melhores veterinárias que conheço. Ela me deu
um emprego quando ninguém mais o faria, e odeio virar as costas
para ela.
Gabriel verifica seu relógio. — Você tem três minutos.
— Eu tenho que ir. Você vai me ligar quando tiver Charlie?
— Estou a caminho.
— Obrigada, Kris. — Eu olho para o corpo de Puff, forçando
minhas lágrimas. — Você terá que...
Gabriel pega o telefone da minha mão. — Olá, Kris. — Ele
mantém seu olhar penetrante treinado em mim. — A porta do
apartamento da Valentina está quebrada, mas não se preocupe. Vou
substitui-la. — Ele corta a ligação. — Dois minutos. Suponho que
você viaje com pouca bagagem.
O estresse me leva enquanto enfio as poucas roupas e produtos
de higiene que tenho em nossa única bolsa de viagem. O que será de
Charlie? Por enquanto, ele está vivo. Eu estou viva. É
nisso que preciso me concentrar.
Os capangas de Gabriel se
servem dos biscoitos que
esfriam na mesa. Gabriel não diz
nada. Apenas seu olhar perturbador me segue
enquanto eu me movo pela sala.
Mal fechei o zíper da minha bolsa quando ele disse.
— Vamos.
A adrenalina do choque me torna forte, forte o
suficiente para caminhar até meu irmão com passos
confiantes e tomar seu rosto coberto de lágrimas em
minhas mãos.
Eu fico na ponta dos pés e beijo sua testa. — Se
lembre do que eu disse sobre ser corajoso. Você pode
fazer isso. — Quero dizer que vou ligar para ele, mas
não quero mentir. — Espere por Kris. Ela estará
aqui em breve.
Gabriel pega minha bolsa e me conduz até a
porta, parando no enquadramento para dizer
ao homem que atirou em Puff. — Fique com o
irmão dela até a mulher chegar e enterrar o cachorro. Conserte a
porta antes de ir.
O homem acena com a cabeça. Ele é mais baixo que Gabriel,
mas não menos musculoso.
Eu olho por cima do ombro e absorvo tudo o que posso - o cabelo
desordenado de Charlie, seus olhos castanhos suaves e a camiseta
desbotada do Homem-Aranha, porque não sei se o verei novamente.
2
Gabriel

A PEQUENA MORENA enrijece quando eu a pego pelo cotovelo


para conduzi-la escada abaixo. Seu rosto está horrivelmente branco
e todo o seu corpo treme, mas ela anda com as costas retas. Arrastei
homens três vezes o seu tamanho, chutando e gritando para um
destino mais domesticado do que aquele que a aguardava. Ela tem
coragem, mas eu já sabia disso ontem à noite.
Na calçada, pego sua mão para ajudá-la a descer o meio-fio. Seu
corpo delicado fica ainda mais rígido, mas ela não resiste. Magda vira
a cabeça para a janela do carro quando nos aproximamos. Ela se
assusta ao ver a mulher que tenho no agarre de ferro dos meus
dedos, e então sua expressão se torna estoica. Minha mãe não está
feliz. Não foi isso que ela pediu. Que azar. Não vai acontecer do jeito
que ela quer hoje, mas tenho algumas explicações a dar.
Magda sai, seus olhos me despedaçando.
— Coloque ela atrás, — digo a Quincy, entregando
Valentina como um pacote.
Magda espera até que
Quincy feche a porta e caminhe
até onde estamos fora do alcance da voz. —
Ela deveria estar morta.
— Eu fiz um acordo.
— Que acordo?
— Nove anos pela dívida de Charlie.
Ela pisca. — Você está levando-a?
Eu cruzo meus braços. — Sim.
— Você quer transar com ela.
Eu não nego. Não há sentido.
— Não é tão simples, Gabriel.
Eu a vi. Eu a queria. Eu a peguei. Sim, é simples
assim.
— Esse não era o plano, — insiste Magda.
— O plano mudou.
Ela joga as mãos para o alto e começa a
andar pela calçada. — O preço era a morte.
— Charlie tem danos cerebrais. — Esse é um preço mais difícil
do que a morte. Para mim, pelo menos. — Não devíamos ter
concedido um empréstimo a ele.
— Bem, nós fizemos. Atraso ou não, mostrar misericórdia é
mostrar aos nossos inimigos que estamos amolecendo.
— Nove anos não são exatamente misericordiosos. — Não com
o que estou planejando para Valentina.
— Ela tem que morrer.
— Eu nunca volto atrás na minha palavra. As pessoas em nossa
empresa confiam em nós porque mantenho minha palavra. Rhett e
Quincy me ouviram fazer o acordo.
As linhas do lápis preto ao redor de seus olhos se enrugam. —
O que você prometeu?
— Um arranjo para morar.
— Arranjo?
— Eu disse que ela poderia pagar a dívida.
Por baixo do exterior controlado de Magda, ela está
fervendo. Uma veia salta em sua têmpora. — Bem. Você quer brincar
de casinha? Se divirta, mas estamos preparando-a para o
fracasso. Quando ela o fizer, estará morta e o irmão
também.
Uma dor aguda
atinge meu quadril
machucado. Eu faço um esforço consciente para
relaxar meu corpo, músculo por músculo.
— Vamos. — Magda já está voltando para o carro. —
Vou descobrir no caminho para casa.
Pela primeira vez, lamento nunca dar a mínima
para a construção de um relacionamento
profissional. Não me importo com o que as pessoas
pensam ou sobre ninguém além da minha filha, mas
Magda sempre lançou a rede bem longe, pegando todos
que ela pode colocar no bolso. Sua rede e influência vão
muito além das minhas. Ela carrega toda a autoridade
nesta organização. Às vezes, tenho a desagradável
suspeita de que o negócio é a única razão pela qual
ela se casou com meu pai, então ela poderia
assumir. Ela era uma agiota muito mais dura
do que ele, e ele era um bastardo assustador.
Eu entro na parte de trás com Valentina enquanto Magda se
senta na frente com Quincy.
— Dirija, — ela diz ao meu guarda-costas.
Quincy e Magda estão calados, acho que por causa da
garota. Uma intensa consciência da mulher ao meu lado e meu poder
sobre ela se espalha pelo meu corpo, me deixando duro.
Porra. Eu a possuo.
Ela é minha.
O pensamento me dá uma adrenalina emocionante. Ela é tão
pequena que parece a boneca com a qual Magda me acusou de querer
brincar. De pé, Valentina mal chega ao meu peito. Seus ossos são
frágeis o suficiente para serem esmagados sob a mais leve pressão.
Se eu a abraçar com muita força, suas costelas podem quebrar. Eu
posso envolver uma mão em volta de seu pescoço esguio. O quão
duro eu escolher fechar meus dedos será o fator de discernimento
entre a vida e a morte. Ainda assim, ela me atacou quando Rhett
atirou em seu cachorro. Ela me deu uma ordem quando me disse
para deixar Charlie Haynes ir. Ela é forte e leal.
Estou fascinado e com ciúme do amor dela pelo
irmão. Ninguém jamais lutou por mim assim, e eu duvido
que alguém o fará. Jogar qualquer
tarefa que eu ache caber no
pacote era um teste. Eu queria ver
o quão longe ela estava disposta a ir por Charlie, não
que sua decisão mudasse alguma coisa. Tomei posse
dela no minuto em que coloquei os olhos nela. Ontem à
noite, eu já sabia que iria levá-la. Independentemente.
Quando o gerente do clube no Napoli ligou para
me avisar que o alvo da minha mãe estava dentro, o
dito alvo sendo Charlie, meu plano era entrar, tirar
Charlie e então sua irmã, que estaria em casa
sozinha. Transformar em exemplos as pessoas que não
pagam é um procedimento padrão. Algumas pessoas
não temem por si mesmas, mas sempre temem por
suas famílias. Pela concepção de Magda, Valentina
teria sido o sacrifício para servir como um lembrete
para nossos devedores enquanto eles devem,
suas famílias não estão seguras.
Então saí do escritório e lá estava ela, toda peito, bunda e
pernas. Nenhuma mulher, exceto as prostitutas, entra de boa
vontade no Napoli. Um nervo aperta entre minhas omoplatas quando
penso no que poderia ter acontecido com ela se eu não
estivesse lá. Ela é extremamente ingênua ou estupidamente
corajosa. Depois desta manhã, suspeito do último.
Pensando bem, não entendo como ela sobreviveu aqui tanto
tempo. De acordo com Jerry, ela mora em Berea há seis anos. A
merda em que ela morava fica no vale das drogas. É uma surpresa
que os senhores das drogas e do sexo não a sequestraram e venderam
ou uma gangue de rua ainda não a estuprou e matou. Existem coisas
infinitamente sombrias que podem acontecer a uma garota bonita e
desprotegida neste bairro.
Eu a observo com o canto do olho. Nos vinte minutos em que
dirigimos, ela não disse uma palavra. Seu cabelo castanho é longo e
ondulado, caindo sobre os ombros. Um cheiro limpo se apega a ela,
como xampu perfumado ou loção corporal. Eu gosto disso. Perfumes
complexos me dão dor de cabeça. No short branco e blusa amarela,
suas pernas tonificadas e seios arredondados estão
expostos para mim. O mesmo acontece com a veia que
pulsa sob a pele dourada de seu
pescoço. Seu medo me
excita. Sua coragem me
intriga. Cílios longos e escuros bloqueiam a
expressão em seus olhos castanhos de mim. Ela está
fingindo olhar pela janela, mas sei que está ciente de mim
e da arma descansando no meu colo.
A arma está fria em minha mão. Já passei da
fase em que minhas palmas ficam suadas antes de
um trabalho. Eu não me importo com a morte. Eu
moro em uma cidade violenta. Apenas os mais
resistentes sobrevivem, e eu sou um sobrevivente. Não
hesitarei em puxar o gatilho se alguém ameaçar ou
prejudicar minha família. Ponha um dedo na minha
propriedade e eu o cortarei. Eu era o tipo de criança
que tinha prazer em quebrar os brinquedos de
outros meninos. Eu ainda estou quebrando.
Principalmente ossos, atualmente. Quando se
trata de corações, eu quebro apenas o que já
está quebrado. Dessa forma, não preciso assumir a responsabilidade
pelos sentimentos de ninguém. Agora, assumi a responsabilidade por
uma pessoa em um nível totalmente diferente. Pelo menos não há
risco de quebrar o coração de Valentina. Ela já me odeia, e com o que
estou planejando para seu corpo, só vai me odiar mais, mas ela vai
precisar de mim com igual intensidade. Disso, vou ter certeza.
Seu olhar se alarga um pouco quando chegamos à nossa
propriedade. É uma mansão de dois andares em um grande terreno
cercado por uma parede de três metros equipada com arame farpado
eletrificado e guardas armados vinte e quatro horas por dia. Nesta
cidade, apenas pessoas com dinheiro estão seguras. Ela mantém o
rosto perfeitamente em branco enquanto passamos pelos portões. O
design original de Frank Emley data do início de 1900 e combina
vários estilos com uma forte influência vitoriana, trabalho em ferro,
paredes de pedra e vitrais art nouveau. É bem no coração
de Parktown, no meio das casas dos banqueiros, negociantes de
diamantes, políticos e todos os outros que podem ser comprados.
Quincy estaciona e abre a porta para Magda primeiro, depois
para mim. Enquanto eu estico minha perna rígida, ele
abre para Valentina e paira com sua bolsa e bolsa de
viagem em frente à fonte.
— Vou levar isso. — Pego
seus pertences e agarro seu braço
para levá-la até os degraus da varanda. Meus dedos
se sobrepõem ao pequeno diâmetro de seu braço. Este é
o ponto em que eu espero que ela chute e grite,
mas permanece estranhamente calma.
Magda nos ultrapassa na escada. — Um
movimento errado, uma palavra errada para alguém,
e Charlie está morto. Entendeu?
Valentina inclina a cabeça para longe de minha
mãe, um tremor percorrendo seu corpo.
Marie, nossa fiel cozinheira, abre a
porta. Seu rosto congela quando seus olhos pousam
na jovem.
— Prepare o quarto de empregada, — diz
Magda. — Vou informá-la mais tarde. — Ela
entra na nossa frente. — Gabriel, traga a garota
para o meu escritório.
Antes que eu possa argumentar, Magda se foi. O olhar de Marie
permanece fixo na mulher ao meu lado. É melhor terminar com a
introdução.
— Esta é Valentina, — eu digo. — Ela é propriedade.
Marie balança a cabeça como se eu trouxesse uma propriedade
para casa todos os dias, mas ela entende. Ela está aqui há bastante
tempo. Ela sai correndo sem me oferecer minha bebida habitual.
Vou com Valentina para o escritório de minha mãe. O que quer
que Magda esteja preparando, eu já não gosto. A visão do guarda-
costas pessoal de minha mãe, Scott, em pé atrás de sua cadeira com
uma pistola em sua mão me faz descansar minha mão na minha
própria arma enfiada na minha cintura. A ameaça é clara. Desafie
Magda e Valentina acabará como seu cachorro, com uma bala entre
seus olhos castanhos.
Magda aborda minha pequena responsabilidade. — Eu entendo
que você trabalhará para nós. — Ela aponta para a cadeira de frente
para sua mesa. — Sente-se.
Solto Valentina. Ela obedece, se equilibrando na borda do
assento. Espelhando a postura de Scott, eu permaneço de
pé, apenas por precaução.
— Quais são suas
habilidades? — Magda
pergunta.
Os cílios de Valentina vibram enquanto ela
levanta os olhos para mim. Eles são grandes para
seu rosto pequeno e assustadoramente tristes, mas
orgulhosos também.
— Responda quando falarem com você, —
Magda diz com a voz de diretora que reservava para
me castigar quando criança.
— Eu sou uma assistente.
A boca de Magda puxa para baixo. — É isso?
— Eu também cozinho e limpo para o meu vizinho.
Magda bate as unhas na mesa. Depois de algum
tempo, ela diz. —Você trabalhará para nós como
empregada doméstica e tudo o mais que Gabriel
espera de você. — Minha mãe me lança um olhar
ácido, como se a visão de mim lhe desse
indigestão. — Você trabalhará de segunda
a sexta-feira até que o jantar seja servido e a cozinha esteja limpa. No
sábado, você está de folga depois das cinco da tarde. Você deve estar
de volta às oito da manhã de segunda-feira. Se tivermos eventos em
casa, esperamos que você trabalhe, independentemente do horário
fora do expediente.
A ideia de empregada me irrita, mas o tempo de folga
desencadeia uma raiva em mim, não que eu tenha um terreno para
pisar. É assunto de Magda e sua dívida a cobrar. Eu sou apenas o
negociador. É melhor meu novo brinquedo não tentar
escapar. Aposto que é isso que Magda está barganhando. Isso vai dar
a ela o motivo de querer eliminar Valentina e encerrar
meu acordo idiota, como ela mesma disse.
— Você vai manter a casa arrumada, — continua Magda, — e
com arrumada, quero dizer impecável. Tudo o que está no interior do
edifício é da sua responsabilidade, menos as refeições. Marie cuida
disso. Se eu precisar que você cozinhe, eu direi. Se você envenenar
qualquer um de nós, você e seu irmão terão uma morte lenta e
dolorosa. Compreende?
Sua garganta se move enquanto ela engole. — Sim.
— Sim, senhora Louw ou senhora.
Aqueles olhos escuros
brilham em desafio, mas ela os
desvia rapidamente. — Sim,
senhora.
— Se você falhar em qualquer uma de suas tarefas,
o negócio é cancelado e você está morta. — Uma luz
sardônica brilha nos olhos de Magda. — Trabalhe bem
por... — Ela olha para mim e espera.
— Nove anos, — eu preencho.
— Trabalhe bem por nove anos, — continua
Magda, — e a dívida de Charlie será paga. Não vamos
pagar a você um salário. O dinheiro que teríamos dado
a você irá para o pagamento de sua dívida. Não permito
que empregados comam de nossa mesa, mas você
pode usar as instalações da cozinha para preparar
suas refeições. Já que você não vai ganhar dinheiro,
meu filho vai pagar uma mesada para comida e
artigos pessoais. Alguma pergunta?
— Existe uma rotina que eu preciso seguir? O que eu faço
exatamente?
Magda se levanta.
— Você vai descobrir. Você começa imediatamente.
Valentina segue o exemplo de Magda, levantando-se da cadeira
com consternação no rosto.
Antes de ir, há uma coisa que ela precisa entender. Eu agarro
seu rosto com uma mão, cavando meus dedos em suas bochechas. —
Fuja de mim e você desejará que tivéssemos atirado em você hoje.
Seu corpo está perto do meu e posso sentir seu cheiro. Eu
preencho a lacuna olfativa que não consegui colocar no
carro. Framboesa. Ela parece uma pomba com as asas amarradas,
mas não vacila sob o meu olhar.
— Estamos entendidos? — Pergunto suavemente. Eu nunca
levanto minha voz. Eu não preciso.
— Sim.
— Bom. — Eu a deixei ir.
Sua mão vai para o queixo, tocando a marca dos meus dedos.
— Marie vai mostrar seu quarto, — diz Magda. —
Você a encontrará na cozinha.
Entrego a bolsa de viagem a
Valentina, mas seguro a bolsa
e permaneço de pé, já que não fui
dispensado.
No minuto em que Valentina vai embora, eu digo.
— Ela não sabe o caminho.
Magda vai ao bar e serve um gole de vodca, que dilui
com suco de laranja. — Deixa ela encontrar seu
próprio caminho é seu primeiro teste.
— Significado?
— As câmeras ocultas gravarão qualquer traço
ou ato característico que ela possa conceber em sua
mente simplória, e você usará isso a seu favor para
quebrá-la. — Magda toma um gole de sua bebida e
volta para a mesa para pegar o telefone interno que
se conecta à cozinha.
Marie atende no primeiro toque com um
profissional. — Sra. Louw? — Que vem pelo
alto-falante.
— Peça uniformes de empregada para Valentina e roupa de
cama para o quarto dela.
— Alguma preferência, senhora?
— Preto.
— O uniforme ou a roupa de cama?
— O uniforme. Peça a roupa de cama... — ela pensa por um
segundo, me dando um sorriso fácil demais, — branca. — Ela desliga
e continua. —Preto e branco. Tem um som bonito, não é? Isso vai
lembrá-la do que ela se tornou, nossa serva e seu brinquedo.
— Ela não vai fugir, — eu digo, um desafio em minha voz. Acabei
de encontrar Valentina. Não vou matá-la no domingo.
Magda sorri, girando seu copo. — Não foi por isso que dei folga
aos domingos.
— Por que você fez isso?
— Para dar a ela a ilusão de liberdade. De justiça. Por enquanto,
vou deixá-la acreditar que tem uma chance. Pessoas sem esperança
não podem ser quebradas. — Minha mãe leva o copo aos lábios. —
Entende? Estou dando a nós dois o que queremos. Você consegue
quebrar ela e eu vou matá-la.
O ódio envolve as palavras de Magda. O fato de eu
querer essa mulher o suficiente
para desafiar minha mãe
provoca o desprezo de Magda. Não
tenho dúvidas de que ela fará Valentina pagar por
me fazer desviar do caminho não tão estreito e reto que
me foi aberto.
No meu silêncio, Magda diz. — Você entende que não
podemos deixá-la cumprir sua parte no trato? Isso
vai parecer fraqueza.
— Eu prometi a ela nove anos.
— Não tenho intenção de deixá-la viver tanto
tempo. — Seu sorriso cresce até invadir todo o seu
rosto. — Ela vai estragar tudo mais cedo ou mais tarde.
Um insight repentino me assusta. Magda está
feliz com a virada dos acontecimentos. Ela quer que
Valentina sofra e está contando com minha
disposição natural para fazer isso acontecer.
Valentina

MINHA GARGANTA DÓI de lágrimas reprimidas quando saio


do escritório da Sra. Louw. Se eu tivesse alguma esperança de que a
mãe de Gabriel teria compaixão e me ajudasse, isso foi erradicado
naquela sala. Ela é pior do que o filho, sua escuridão é muito mais
fria.
Estou enjoada de preocupação com Charlie. Preciso ligar para
Kris e verificar se ele está bem, mas Gabriel me deu minhas roupas
e segurou minha bolsa com meu telefone. Não posso me permitir
pensar sobre esta manhã ou Puff. Ainda não. Por enquanto, preciso
ser forte.
Com o perigo iminente de morte acabado, a realidade desaba
sobre mim. O desespero se infiltra em meus poros. O cálculo é
angustiante. Vou fazer trinta e dois antes de andar livre. Se algum
dia eu andar livre. Não tenho dúvidas de que Gabriel vai me matar
sem piscar. Eu conheço homens como ele. Meu pai era um. A função
de servo não é apenas saldar uma dívida. É um meio de me
degradar. Eu não tenho nenhum problema em tirar o
cabelo de Gabriel do chuveiro ou
esfregar seu banheiro. O que
está me matando é dormir sob
seu teto e comer comida pela qual ele paga. Sou
forçada a permitir que meu inimigo tome conta de
mim. Parece pessoal e errado. A última coisa que quero de
Gabriel é qualquer tipo de cuidado. Vou falar com Kris e
negociar para trabalhar aos domingos. Assim ainda
poderei pagar meus estudos. Não importa o que
aconteça, eu não vou desistir. É minha única
esperança, nossa passagem para fora de Berea. Terei
apenas que colocar meus planos em segundo plano por
nove anos.
Depois de me perder em corredores e muitos
cômodos com sofás e cadeiras. -
De quantas poltronas uma família pode precisar? -
Finalmente localizo a cozinha no extremo leste da
mansão. O tamanho da casa me oprime. Vai
ser um trabalho terrível manter o lugar impecável.
Marie espera por mim em uma cozinha de aparência estéril,
uma expressão hostil no rosto. — É melhor eu mostrar a você.
Sem palavras, fico atrás dela. Passamos pelo térreo com suas
salas de leitura, de estar, de televisão, de entretenimento e de jantar,
e subimos um lance de escadas. Os quartos e banheiros do primeiro
nível são luxuosos e confortáveis. Conforme nos movemos sozinhas,
meu coração afunda mais e mais. É muito.
— Quem está limpando a casa atualmente?
Marie me olha como se eu tivesse pedido uma moeda de ouro. —
Um serviço de limpeza. Presumo que, já que você está aqui, eles serão
demitidos.
Pobre pessoas. Eles vão perder um grande contrato, mas pelo
menos estão livres.
Em uma porta de madeira com uma escultura intrincada, ela
para. — Este é o quarto dele. Ao lado fica o quarto de Senhorita Carly.
A mãe do Sr. Louw está no lado oposto.
Ela bate na porta de Senhorita Carly e a abre sem esperar
resposta.
Uma garota de cerca de dezesseis anos está deitada
de bruços na cama. O quarto é um
dos mais bonitos que já vi. É
decorado em tons de azul com
móveis caiados de branco.
— Carly, — diz Marie, — esta é Valentina. Ela é a
nova moradora.
Carly levanta a cabeça para me olhar de cima a
baixo antes de enterrar o rosto em seu iPad
novamente.
— A filha dele, — diz Marie, fechando a
porta. Ela abaixa a voz. — Ela às vezes mora com a
mãe, mas está principalmente aqui.
Então, a mãe de Carly e Gabriel são separados ou
divorciados.
Exploramos a casa até voltarmos para a
cozinha. Apenas a cozinha é branca cirúrgica. Não é
um cômodo em que os habitantes da casa moram.
Não há copa, livros ou flores, nem um traço de
calor. É uma área funcional equipada para o
pessoal. É aqui que Marie pausa mais tempo para me mostrar a copa
adjacente, onde guardam os eletrodomésticos e uma geladeira para
os funcionários.
— Você pode manter sua comida aqui, — diz Marie. — O da
despensa é só para a família.
Os produtos de limpeza são empilhados ordenadamente nas
prateleiras da parede. Tudo está arrumado e em seu lugar. Pelo
menos há um aspirador de pó e uma máquina de lavar de última
geração para trabalhar.
— Você sabe como operar isso? — Marie aponta para a máquina
de lavar e a secadora.
Eu aceno, mesmo que não saiba. Lavei nossas roupas na
banheira, mas quão difícil pode ser descobrir usar uma máquina de
lavar?
— A roupa tem que ser secada ao sol, — explica Marie, — a
menos que chova. A Sra. Louw não acredita em
desperdiçar eletricidade.
Da copa, uma porta leva aos aposentos das empregadas. É aqui
que vou dormir pelos próximos nove anos. Eu coloquei minha
cabeça em volta do batente. O quarto é pequeno, a cama
de casal ocupa a maior parte do
espaço, mas o carpete creme
está limpo e o colchão parece
novo. A tinta é branca e não há cheiros ruins ou
umidade para escurecer as paredes. Uma porta
comunicante dá acesso a uma pequena banheira com um
chuveiro embutido, uma pia e um vaso sanitário. É muito
melhor do que estou acostumada. Não tem lençóis
nem toalhas, e não trouxe, mas não peço.
— Bem, — Marie limpa as mãos, — vou deixar
você continuar com isso. Seus uniformes chegarão
mais tarde. Por enquanto, você terá que trabalhar
assim. — Ela lança um olhar de desaprovação para
minhas pernas.
— Posso ter meu telefone?
— Você vai ter que perguntar ao
Sr. Louw sobre isso.
Assim que ela sai, uso o banheiro para
jogar água no rosto. A enormidade da situação
pressiona meu peito. Eu não consigo respirar. Precisando de ar, abro
a janela, deixando a brisa na minha bochecha úmida me
refrescar. Daqui, tenho uma vista sobre um pátio fechado. Há um
varal circular no centro e um carrinho de mão encostado na
parede. Pela porta aberta de acesso ao quintal, é visível a água azul
de uma piscina.
Como não sei como fazer meu novo trabalho com o tamanho
enorme da casa, decido mergulhar no fundo do mar e nadar. É uma
abordagem que sempre funciona para mim. Pelas próximas horas,
elaboro um plano de ação à medida que vou começando com a roupa
e o pó, depois passando o aspirador e, por fim, lavando o chão e as
janelas. Minha mente está cheia de Charlie e Puff, e mesmo que eu
não consiga lutar contra minhas lágrimas, posso escondê-las
enquanto curvo minha cabeça sobre o esfregão. Enquanto choro por
Puff, deixo meu ódio por Gabriel e pelo cara que atirou
nele amadurecer. O único raio de esperança neste pesadelo é que
hoje é quarta-feira. No domingo, verei Charlie.

NO FINAL DA TARDE, Gabriel me chama para a sala


de leitura. Ao entrar, fico surpresa
com a presença de um homem
idoso vestido com uma camisa
estilo Mandela e calça jeans.
Gabriel se vira para mim. — Este é o Dr.
Samuel Engelbrecht. Ele vai tirar uma amostra de sangue
e examinar você.
Eu olho entre os homens. — Por quê?
Gabriel ignora minha pergunta. — Você está
tomando contraceptivo?
A implicação da pergunta me deixa sem fôlego,
mesmo que eu esperasse que fosse uma parte
inevitável do acordo que fiz. Se o médico reconhece o
choque em meu rosto, ele não o fez nada.
— Não, — eu forço através dos lábios secos.
O médico me oferece um sorriso impessoal. —
Tire a roupa e se deite no sofá, minha querida.
Eu não consigo me mover. Estou presa no
tapete.
— Quanto tempo você precisa? — Gabriel pergunta.
— Vinte minutos.
— Eu estarei de volta por ela.
No caminho para a porta, ele para na minha frente. — Se ele te
machucar, eu o mato.
O Dr. Engelbrecht ri de sua maleta de médico aberta. — Não é
legal fazer piadas assim.
— Não é brincadeira.
Gabriel diz isso com um sorriso, mas suas palavras enviam um
arrepio na minha espinha. Ele sai da sala, me fechando com o
médico.
— Venha agora, — diz o médico, — não tenho o dia todo.
É constrangedor me despir na frente de um estranho que sabe
que meu patrão vai me foder. Todo o meu corpo cora quando tiro os
tênis, abro o short e tiro a blusa.
Ele deve atender muitos pacientes em casa, porque está bem-
preparado. Um lençol descartável já está espalhado no
sofá. Mantenho meus olhos fixos no teto enquanto me deito,
tentando ir para algum lugar escuro na minha cabeça.
Ele calça um par de luvas cirúrgicas. — Dobre
os joelhos.
— O que você vai fazer?
— Não se preocupe, minha
querida, é apenas um exame Papanicolau. Você
deveria fazer isso todos os anos. Primeira vez?
Eu concordo. Não é como se eu tivesse dinheiro para
consultas médicas.
Ele conversa durante o exame para me deixar à
vontade, mas estou tensa, e quando ele tira a
amostra dói. Ele me deixa me vestir antes de tirar
meu sangue. Ele está quase terminando quando
Gabriel volta para a sala.
Ele caminha até o sofá onde estou sentada com
meu braço no apoio de braço enquanto meu sangue
escorre para um frasco. — Como foi?
É o médico quem responde. — Muito
bem. Terei os resultados amanhã.
Acho que Gabriel quer ter certeza de que estou limpa. Não posso
culpá-lo, vendo de onde venho.
— Dependendo dos resultados do nível de hormônio,
— continua o Dr. Engelbrecht, — vou usar um anticoncepcional
oral. — Ele remove a agulha e me dá um algodão para pressionar o
ferimento. Depois de colocar as amostras em sua bolsa, ele remove
as luvas, aperta a mão de Gabriel e se despede.
Eu fico olhando para Gabriel quando estamos sozinhos, o calor
queimando sob o decote do meu top. — Você poderia ter me avisado.
— Isso teria estressado você desnecessariamente.
— Eu irei julgar isso, —digo, me pondo de pé. — Posso estar
trabalhando para você, mas ainda é meu corpo.
— Não, linda. — Ele me lança um olhar calculado. —
Eu discordo.
Não tenho resposta. Tudo o que posso fazer é passar correndo
por ele, fugindo da situação perturbadora, e por enquanto ele me
deixa.

O ÁRDUO TRABALHO físico é uma válvula de escape


para minha raiva, frustração e até
um pouco do meu
medo. Como não encontro
ninguém enquanto estou limpando, uma falsa
sensação de calma toma conta de mim, mas começo a
me estressar de novo quando percebo que só consigo
controlar o andar térreo no tempo que resta do dia. Pelo
menos a casa está imaculada. Posso começar com o
primeiro andar amanhã. Não vou conseguir, a menos
que trabalhe em rodízio, limpando profundamente
alguns quartos apenas a cada segundo ou terceiro
dia.
Não paro para almoçar e nunca tomei café da
manhã. Quando entro na cozinha ao pôr do sol, estou
faminta, suada e cansada, mas tudo lá embaixo está
absolutamente limpo. Marie está mexendo uma
panela no fogão. A deliciosa fragrância de tomate
e guisado de carne enche minhas narinas. Meu
estômago traiçoeiro ronca. Meu corpo não
entende orgulho ou honra. É governado pelas necessidades simples
de sobrevivência da fome e da sede. Pego um copo do armário, encho
embaixo da torneira e bebo muito.
Marie enxuga as mãos no avental. — Eu guardei um sanduíche
para você. — Ela aponta para um prato sob uma rede mosqueteira
no balcão com um envelope branco ao lado. — Senhor Louw deixou
sua mesada de comida. Ele disse que você não vai sair da
propriedade antes de sábado, mas se escrever o que precisa, vou
encomendar para você. Temos um serviço de entrega que vem todos
os dias.
Claro que sim.
Olhando para o relógio de parede, a governanta continua. —
Estou indo. O jantar está pronto. A Sra. Louw vai sair esta
noite. Ponha a mesa para o Sr. Louw e a Srta. Carly na sala de jantar
informal. Se certifique de que a cozinha está limpa e a mesa posta
para o café da manhã antes de ir para a cama. O
Sr. Louw geralmente cuida de seu próprio café da manhã enquanto
ele come, antes de eu entrar em serviço. Chego às oito.
Um miado suave soa da porta. Eu olho para baixo
em um par de olhos amarelos salpicados de verde. Um
gato cinza, com a cauda e as patas
com pontas brancas, corre
para dentro e se esfrega na minha
perna.
Eu me curvo para acariciar ele. — Olá. Qual o seu
nome?
— Esse é o Oscar, — responde Marie.
Pelo tom dela, deduzo que ela não se importa
muito com ele.
— Ele é o gato da falecida avó do Sr. Louw.
Satisfeito com a atenção, o gato malhado cai de
lado. Ele se estica quando eu coço seu queixo.
— Nada além de um incômodo, — diz Marie com
um estalo de sua língua.
Isso me faz gostar dela ainda menos. Não confio
em pessoas que não gostam de animais. — Ele
parece bastante quieto.
Ela bufa. — Mijos em todos os lugares. Você verá o quanto gosta
dele quando tiver que limpar isso.
— Ele foi castrado? — Levanto a perna de trás para ver
melhor. Sim.
Uma lufada de ar escapa de seus lábios. — Como se eu
soubesse. — Marie pega sua jaqueta e bolsa de um gancho atrás da
porta. — Vejo você amanhã às oito. — Ela fecha a porta dos fundos
atrás dela com um clique firme.
Curiosa, abro o envelope com meu nome e espio dentro. Fico
surpresa ao sacar onze notas de quinhentos Rands, quinhentos a
mais do que meu salário mensal. É muito mais generoso do que eu
esperava. Penso em recusar o dinheiro por princípio, mas não tenho
escolha. Sem uma renda, não posso cuidar de Charlie e pagar meus
estudos. Ou comer. Sentindo minha fome com força total, eu encho
meu copo com água.
Ao som de uma torneira aberta, Oscar contrai os ouvidos.
— Você está com sede? Onde está sua tigela?
Quando eu me movo em direção à porta, ele pula de pé e passa
por mim para a copa. Lá, ao lado da lava-louças, estão duas
tigelas de porcelana, uma com água e outra com
ração. Não demorou muito para
localizar o saco de ração
debaixo da pia. É uma marca
barata, com mais fibras do que valor
nutricional. Normalmente, é fabricado para preencher,
mas não para nutrir. Reponho sua comida, enxáguo a
tigela de água antes de encher novamente com água fresca
e me faço confortável no chão ao lado de Oscar, onde
o alimento com pedaços de presunto e queijo que tiro
do sanduíche. Não é a refeição mais saudável para
ele, mas pelo menos é mais saborosa do que o
papelão que o alimentam. A comida faz de Oscar meu
novo melhor amigo. Enquanto arrumo a mesa e trago a
roupa suja para fora, ele fica ao meu lado, lançando
olhares esperançosos para mim que só posso
recompensar com caricias, pelo menos até eu ter
meus próprios mantimentos.
É tarde, mas estou preocupada em não ter
tempo para pôr em dia todo o trabalho
pendente amanhã, então dobro as roupas que posso e coloco de lado
as camisas e os vestidos para passar. Enquanto espero o ferro
esquentar na copa, ouço sons na cozinha. Imediatamente, meu
estômago aperta. Como, não sei, mas sei que é ele. É como se o ar
engrossasse, dificultando a respiração. Fecho os olhos e prendo a
respiração, esperando que ele vá embora, mas o ferro chia e cospe,
denunciando meu esconderijo.
Com o som, Gabriel enfia a cabeça na esquina. Seus olhos se
fixam em mim e depois em Oscar aos meus pés. É difícil ler ele. Ele
está olhando para mim como se estivesse me avaliando ou tentando
encontrar falhas. Eu acho que ele me faz temer. Eu odeio ainda mais
que ele me deixe curiosa. Tento não olhar, mas as cicatrizes em seu
rosto têm uma influência magnética em meu olhar. Que tipo de arma
cria essas cicatrizes? Que tipo de homem sobrevive a isso? Não
consigo desviar o olhar do desafio em seu olhar.
Finalmente, as linhas ásperas de sua boca suavizam um
pouco. — É melhor você servir o jantar enquanto está quente. — De
repente, ele se vira e sai.
Eu soltei a respiração que estava prendendo, meu
peito murchando conforme sua presença desaparece e o
ar descomprime novamente.
Carly se senta à mesa em
frente ao pai, um smartphone na
mão, quando entro com uma bandeja cheia de
pratos. Ela não levanta os olhos das mensagens de texto
enquanto coloco tudo no centro da mesa. Em contraste,
os olhos de Gabriel me seguem pela sala. Eu me torno
intensamente ciente de minhas roupas e do estado do
meu corpo. Minha pele está brilhante de suor. Eu
preciso de um banho. Para aumentar o meu
desconforto, ele inala audivelmente enquanto eu
passo por ele.
Quando a bandeja é descarregada, ele acena para
mim. — Nos sirva e depois saia.
Eu levanto a tampa da tigela de arroz e levo
para Carly. — Arroz, senhorita? — Tento esconder
meu desconforto enquanto sou forçada a rastejar
e me curvar ao inimigo de meu irmão.
Sem resposta. Sua cabeça permanece inclinada sobre o
telefone, fazendo com que seu cabelo cor de trigo caia em um véu em
torno de seu rosto. Eu fico pairando até que a palma da mão de
Gabriel na mesa faz Carly e eu pularmos. Os talheres e os copos
fazem barulho com a força.
— Guarde o seu telefone, Carly. Se eu vir na mesa de jantar
novamente, vou confiscar.
Ela o encara com um olhar frio e azul. — Então vou jantar na
casa da mamãe.
Um músculo se contrai sob um olho antes de ele estreitar os
dois. —Você é bem-vinda, mas como eu pago sua mesada, seu
telefone fica aqui.
Ela joga o telefone na mesa, e o celular bate na madeira com um
baque surdo. — Bem.
— Valentina te fez uma pergunta.
Ela me olha como se eu fosse o motivo da discussão. — O que?
— Arroz, senhorita? — Eu repito, mantendo meu rosto vazio de
emoção.
— Pelo amor de Deus. — Ela suspira com um revirar
de olhos exagerado. — Me chame de Carly. Eu odeio ser
chamada de senhorita.
— Arroz, Carly? — Eu
digo categoricamente.
Ela olha de relance para o pai e murmura. —
Que seja!
Os nós dos dedos de Gabriel ficam brancos em torno
da haste de seu copo. Não consigo sair de lá rápido o
suficiente. A atmosfera está tão carregada de tensão
que quero sufocar. Volto a passar a roupa e escuto,
mas não há nada além do tilintar dos talheres e do
tilintar dos copos enquanto a refeição avança em
silêncio.
Quando terminam, eu também terminei. Todas as
camisas estão dobradas com perfeição,
uma odiosa maldição pressionada em cada linha
limpa. A sala de jantar está vazia quando eu limpo
a mesa. Música alta vem de cima. Não quero
contemplar as dificuldades do relacionamento
de Gabriel com sua filha. Eu não me importo.
Quando chego ao meu quarto, há toalhas e um monte de roupa
na cama, junto com minha bolsa. No armário, encontro três vestidos
pretos de empregada do meu tamanho. Não há chave na fechadura e
nenhuma cadeira ou outro móvel que eu possa empurrar contra a
porta, não que isso vá me fazer bem. Fiz um trato com um monstro,
e a única maneira de sobreviver é honrando.
A primeira coisa que faço é retirar meu telefone e ligar para Kris.
Ela atende imediatamente. — Me diga que você está bem.
— Estou bem.
— Onde você está?
— Na casa de Gabriel Louw.
— Ele...?
Um rubor sobe pelo meu pescoço. Ele vai, mas não posso contar
a Kris. Ela tem o suficiente em seu prato. — Não. Como está Charlie?
— Ele ficou chateado quando fui buscá-lo, mas está calmo
agora. Ele está assistindo televisão.
— Obrigada, Kris. — Eu pisco para afastar a umidade dos meus
olhos. — Eu não sabia para quem mais ligar.
— Você fez a coisa certa em me ligar. Eu estava
muito preocupada com você.
— Eu sinto muito.
— Tentei seu telefone
várias vezes. Por que você não
respondeu?
— Eu estava trabalhando.
— Fazendo o que?
Eu limpo minha garganta. — Empregada.
— Empregada doméstica ou prostituta?
— Kris, por favor.
— Val, você vale mais do que isso.
— Estou fazendo o que tenho que fazer. — Uma
onda repentina de cansaço toma conta de mim. — Você
pode, por favor, ficar com Charlie até o fim de
semana? É pedir muito, mas não tenho outras
opções. Virei visitar no sábado e podemos conversar.
— Certo. — Ela dá uma risada aliviada. —
Achei que você fosse uma prisioneira ou algo
assim.
— Posso dizer olá para Charlie?
— Claro. Espera.
Ela chama o nome do meu irmão. Um segundo depois, sua doce
voz entra na linha.
— Va–Val?
— Ei, como vai você?
— Ha-hambúrgueres.
— Kris fez hambúrgueres?
— Sim, sim.
— Você vai ficar com Kris por um tempo. Eu tenho um novo
emprego, e isso exige que eu fique.
— Você vai visitar?
— Toda semana.
— Qua - quando?
— Sábado.
— Sa – sábado.
— Não se preocupe com nada. Eu vou cuidar de você.
— To-tome cuidado.
— Eu te vejo no sábado, certo?
— Sa – sábado.
— Eu te amo e lembre de ser corajoso.
— Te-te amo, Mu-muito.
Eu desligo e fico olhando
para o telefone por vários
segundos, lutando para processar a rapidez com
que nossas vidas mudaram. Não adianta chorar por
coisas que não posso mudar. Já passei por situações
ruins antes. Eu posso superar isso.
Exausta, arrumo a cama e tomo um banho
rápido. Tento não pensar no fato de que é
a água dele ou que tenho que dormir na cama que
pertence a ele, entre seus lençóis, sob seu
teto. Cansada demais para secar o cabelo, visto minha
camisola e vou para a cama. Meus pensamentos
residem em Charlie e Puff enquanto minha cabeça
bate no travesseiro. Quero fazer uma prece por eles,
mas estou tão cansada que adormeço no meio dela,
apenas para ser acordada por uma presença
familiar e ameaçadora no quarto.
3
Gabriel

MEU NOVO BRINQUEDO acorda com um suspiro silencioso. De


propósito, eu a deixei adormecer primeiro. Desorientada, suas
defesas estarão baixas. Isso torna mais fácil ver a verdade. Por
enquanto, a única verdade é o medo em seus olhos.
Não é tão fácil ver a verdade em mim mesmo, porque não sei o
que sinto, exceto pelo físico. Seu cheiro inebriante dominou minha
sala de jantar e endureceu meu pau. Não sei o que há nela que traz
à tona minha luxúria. Só sei que a quero como nunca quis uma
mulher.
Me endireitando do batente da porta, vou até a beira da
cama. Ela me observa com seus grandes olhos turvos, seu peito
subindo e descendo ao ritmo dos meus passos. Agarrando o lençol,
puxo para baixo lentamente. Ela se agarra ao tecido, mas depois de
um segundo ela o solta, rendendo ao inevitável.
É a perseguição. Isso é o que quero
dizer a mim mesmo. Não é que
eu precise mentir para mim
mesmo. É difícil encontrar a verdade na
lama fodida que chamo de meu coração. Talvez eu
simplesmente queira as coisas que vislumbrei nela, a
bravura e o amor que a tornaram forte o suficiente para
aceitar isso, o que está acontecendo agora e mais
nove anos disso pelo bem de seu irmão.
Minha mente tende a ficar hiperativa. Ela
raramente desliga, nem mesmo durante o sono, mas
todos os meus pensamentos lógicos param enquanto
eu olho fixamente para o corpo dela. Ela está deitada
rígida e reta no lençol branco, seu cabelo espalhado
sobre o travesseiro. Pego o botão do meu
colarinho. Quando ele sai pela casa do botão, ela
engole. Seus dedos cavam no lençol. Se o corpo
dela ficar mais tenso, vai se quebrar como um
graveto.
Sou muitas coisas, inclusive um assassino. Eu sei que sou um
filho da puta assustador. Tenho espelhos e não tenho medo de olhar
neles. Eu vejo o que ela vê em seus olhos. Eles estão largos e úmidos
à luz que cai da copa. O quarto não está frio, mas ela treme de
camisola. Inexplicavelmente, isso me comove. As mulheres que eu
normalmente fodo não tremem. Para suavizar para ela, eu afasto o
lado marcado do meu rosto quando acendo a luz de seu quarto.
Com o lençol descartado a seus pés, pego a bainha de sua
camisola e a movo sobre seu corpo, expondo suas coxas, calcinha de
algodão e seus seios fartos que, como seus olhos, são grandes demais
para seu corpo. Ela é perfeita. Suas panturrilhas são tonificadas e
seus tornozelos estreitos. Posso ver seu osso púbico sob o humilde
tecido de sua calcinha, e até mesmo a visão do algodão simples
endurece meu pau. Com cuidado para controlar minha luxúria, levo
meu tempo para estudar o inchaço de seu estômago e a maneira
como seus seios se achatam ligeiramente para os lados. Seus
mamilos são rosa escuro, exatamente como eu prefiro. No momento,
esses picos não estão contraídos, mas sei como remediar isso, apesar
de seu medo. Tive parceiras suficientes para ler com precisão
o corpo de uma mulher e dar o que ela precisa.
Para aliviar o aperto no meu
peito, eu abro mais dois
botões, deixando o ar frio descer
pelo meu torso. Quando subo ao pé da cama, o
primeiro som sai dos lábios de Valentina. É algo entre
um soluço e um suspiro. Prefiro muito mais um
gemido. Dobro minhas mãos em torno de seus pés
estreitos. Ela estremece como se eu a tivesse acertado
com uma arma de choque. Lentamente, eu corro
minhas mãos por suas pernas, quadris e
costelas. Arrepios explodem em sua pele. Com
cuidado para não tocar em nenhuma zona erógena,
inverto o caminho, mantendo o toque leve. Meu pau se
contorce nas restrições da minha calça, empurrando
dolorosamente contra o meu zíper, mas isso não é
sobre mim. É sobre deixá-la à vontade e trazer seu
prazer. Depois de muito tempo acariciando-a
assim, ela ainda está rígida, mas seus
músculos estão menos tensos. Com cada
carícia, eu me aproximo cada vez mais de seus seios, até que meus
dedos deslizam a centímetros de seus mamilos. Mesmo quando eles
finalmente se contraem para mim com as pontas se transformando
em pequenos seixos, ela luta contra isso, franzindo os lábios quase
tão forte quanto ela está apertando os joelhos. Ela está se segurando,
observando cada ação minha, tentando contemplar meu próximo
movimento em vez de ceder ao sentimento.
— Feche os olhos, Valentina.
— Você vai me estuprar?
Eu rio. — Não.
— Então o que você está fazendo?
— Conhecendo o seu corpo.
— Você não vai me foder?
— Eventualmente, sim. Quando você me implorar.
Seus olhos brilham como gemas frias de tigre. — Isso nunca vai
acontecer.
— Você fala demais. Feche os olhos e cale a boca, ou serei
forçado a cegar e amordaçar você.
Minhas palavras têm o efeito desejado. Ela sela os
lábios e fecha os olhos com força. Eu refaço meus
movimentos, começando uma
massagem lenta de seus pés
até a parte inferior de seus
braços. Depois de alguns minutos acariciando-a
assim, um rubor se espalha por sua pele, manchando
seu pescoço e a curva superior de seus seios. As zonas
erógenas de seu corpo se enchem de sangue, tornando
seus seios pesados e seu sexo inchado, preparando-
a para a penetração. Esta é a deixa que eu estava
esperando. Desenhando círculos ao redor de seus
seios endurecidos, eu fecho o traço espiralado de
meus dedos até que estou contornando suas
aréolas. Observo seus mamilos se contraírem mais, se
estendendo em pináculos beijáveis que anseio por
sentir em minha língua. Ignorando a fome que faz
minhas bolas ficarem tensas, eu rolo seus mamilos
entre meus polegares e indicadores e sou
recompensado com um suspiro que parece
muito diferente agora. Há um crescendo de
prazer e um tom de vergonha. A mistura é um som inebriante, no
qual tenho um prazer perverso. Quero possuir seus sentimentos,
seus gemidos, seu prazer e sua respiração. Como um sinal, seus
quadris se erguem. Sei o que seu corpo está pedindo e sei que ela
lutará contra isso. Eu preciso de rendição total.
Soltando seus lindos seios, envolvo uma mão em seu pescoço,
aplicando uma pressão suave. O toque é dominador e protetor, e a
maneira como ela reage a isso vai me dizer tudo que preciso saber
sobre como fazê-la feliz na cama. Para minha surpresa, sua cabeça
se levanta ligeiramente, pressionando seu pescoço com mais força na
minha palma. Valentina é uma submissa natural. Meu tipo favorito
de conquista.
Mantendo minha mão no lugar, eu a recompenso com um beijo
em cada mamilo. Seus lábios se abrem em um gemido silencioso e
seus olhos se abrem. Ela pisca para mim surpresa. Ela esperava que
eu a mordesse ou está lutando para processar a
sensação. Segurando seu olhar, eu passo minha língua sobre seu
seio direito, sugando o delicioso mamilo profundamente em minha
boca. Ela arqueia as costas para fora da cama e um grito
suave sai de seus lábios. Ao som disso, ela fica
completamente imóvel. Em vez de
lutar contra sua excitação, ela
se deita como um cadáver, os
olhos fixos em algum lugar no teto. Seus músculos
relaxam, afrouxando sob minhas mãos. Isso não vai
funcionar. Não vou deixá-la se esconder de mim em sua
mente.
— Olhe para mim.
O comando está em conflito direto com o
anterior, mas estou aprendendo a ler e entender suas
reações. Claro, ela me ignora, vagando no vazio que
ela criou em sua cabeça.
— Se você não olhar para mim agora, vamos
começar de novo. Desta vez, vamos praticar na frente
do espelho.
Lentamente, ela volta o olhar na minha direção
até que está me observando por baixo dos cílios.
— Boa menina. Continue me observando e me diga o que você
sente. Se você parar de falar, começaremos do zero.
— O que?
Ela franze as sobrancelhas, mas não dou tempo para outra
pergunta. Eu retomo a tarefa de lamber seu mamilo como se fosse
meu doce favorito. Quando um gemido reprimido escapa de seus
lábios, eu levanto minha cabeça para dar a ela um olhar duro.
— Valentina, não vou te dizer de novo. Como se sente?
Ela lambe os lábios, me observando enquanto eu lavo seus seios
com minha língua.
— Parece... quente. — Ela fica vermelha. — Molhado. Quero
dizer…
— Bom?
Ela morde o lábio inferior.
— Continue. — Eu me movo para seu outro seio.
— Uh... suave. Ah! Duro.
Ela grita enquanto eu a belisco com meus dentes. — Me conte.
— Dolorido. Não. Diferente. Eu não sei!
Eu a chupo implacavelmente, enchendo seu seio em
meu punho e beliscando a ponta dura com meus
lábios. — Seja mais clara.
— Bom! Ah, meu
Deus. Dói... bom.
Ela ofega e se contorce. É bom tê-la no
momento comigo. Eu preciso que ela sinta, porque eu
gozo no prazer dela. Beijo seus seios e acaricio seus
mamilos até que ela esteja quase hiperventilando, jogando
palavras e frases incoerentes para mim.
— Vou fazer você gozar, — digo, — e você não
pode impedir.
Ela fica tensa novamente, seu rosto uma
máscara de prazer agonizante.
— Diga, — eu insisto, beliscando seu mamilo com
força.
Ela grita. — Não posso... pare.
— É isso aí. — Eu chupo seu mamilo. — Deixe
ir.
Ela se contorce. — Eu-Eu não posso.
— Eu não vou parar, Valentina. Vamos passar a noite toda se
for preciso, mas você vai dar para mim.
Ela agarra meus ombros, suas unhas cravando em minha pele,
e soluça de frustração. — Eu não entendo o que você quer de mim.
— Apenas deite e eu vou te mostrar.
Seu aperto em mim aumenta, e seu pescoço se estica, o medo
amortecendo a excitação em seus olhos.
— Meu pau vai ficar nas minhas calças. Deite-se.
Lentamente, os músculos de seu pescoço relaxam enquanto ela
deita a cabeça no travesseiro. Mais uma vez, seu corpo amolece sob
mim, mas desta vez ela está presente. Não há mais contenção. Suas
pernas afrouxam, suas coxas se contraem um centímetro. A lambida
lenta e molhada da minha língua sobre seu mamilo é outra
recompensa, fortalecendo seu bom comportamento. Quando ela
levanta os ombros do colchão, quase perco o controle. Eu chupo seu
mamilo na parte de trás da minha boca, comendo seu seio como
um pedaço de bolo, e ela joga a recompensa de volta para mim,
empurrando mais fundo, me forçando a tomar mais e me dando o
que eu estava esperando. Os gemidos mais doces caem em
meus ouvidos.
Tão sexy. Meus dedos se
apertam involuntariamente
em volta do pescoço, aplicando
mais pressão, mostrando a nós dois a quem ela
pertence. Não há intenção de ferir, e seu subconsciente
sabe disso. Eu lavo seu outro seio com os golpes molhados
de minha língua, dando à curva rechonchuda a mesma
atenção meticulosa de sua gêmea até que ela se
contorce em meu aperto. Afrouxando meu aperto em
seu pescoço, deixei minha palma deslizar por sua
garganta, entre seus seios e sobre seu estômago. Sua
pele está escorregadia por causa dos meus beijos, e a
trilha molhada faz sua barriga estremecer. Mantendo
minha mão em sua barriga, eu beijo um caminho até
seu osso púbico, acariciando sua pele com meu
nariz. O cheiro de seu desejo me deixa louco. Ela
está molhada, e meu lado possessivo se deleita
em saber que sou a causa. Eu sou o mestre de
seu desejo. Eu a trouxe até aqui. Vou levá-la ao limite.
Ela mal está coerente quando engancho meus dedos no elástico
de sua calcinha e a puxo sobre seus quadris e para baixo em suas
pernas. Eu liberto seus tornozelos e descarto a peça de roupa no
chão. Ela está excitada o suficiente para levar isso a um nível mais
áspero. Afasto suas pernas, dando a todos os meus sentidos acesso
ao seu núcleo mais profundo.
Não é nenhum segredo que eu amo foder. Esta é a parte das
mulheres que amo com reverência. Eu amo suas dobras delicadas,
seu sabor, seu cheiro e os sons que elas fazem quando invado seus
corpos. A boceta de Valentina é linda. Os lábios de sua vagina são
rosados e carnudos, brilhando de excitação. Seu clitóris aparece por
entre seus lábios inchados como uma pérola. O buraco de seu rabo
é um botão de rosa, e a tensão me diz que nenhum homem a
reivindicou lá. Não me importo com seus pelos púbicos escuros e
sedosos, mas têm que desaparecer. Eu quero ver sua pele nua
quando eu a separar com meu pau. Eu quero ver seus lábios cor de
pêssego se esticarem o máximo que puderem quando eu a tomar
profundamente, mas pensar no futuro só fode com minha
cabeça e atormenta meu pau dolorido. Eu fecho meus
olhos e me concentro em seu
gosto, em vez disso. Minha
língua varre sua fenda até a ponta
de seu clitóris. Ela estremece violentamente, um
grito doce reverberando nas paredes. Suas mãos cavam
em meus ombros, empurrando e puxando
simultaneamente. Ela parou de falar. Os únicos sons que
saem de seus lábios são os gemidos que eu estava
perseguindo.
— Apenas sinta, — eu sussurro sobre sua
pele. — Você não tem controle, nenhuma escolha.
Ela relaxa e se abre mais, me dando melhor
acesso. Eu lanço minha língua em sua boceta e gemo
quando suas coxas abraçam meu rosto em um torno
macio. Seu mel cobre minha língua, o sabor é um
poderoso afrodisíaco. Eu poderia ficar com minha
cabeça enterrada entre suas pernas para sempre,
mas até minha paciência, a resolução e o
controle de que tenho tanto orgulho, têm
limites. Eu a devoro como um homem faminto, mus dentes pastando
e mordiscando enquanto meus lábios beliscam e sugam. Suas unhas
cravam na minha pele e seus calcanhares chutam no colchão.
Quando eu levanto meus olhos, fico chocado ao ver que ela está
olhando para mim, suas piscinas marrons mergulhadas em desejo.
Respirações suaves e femininas e gemidos me atingem enquanto eu
a chupo com mais força, alimentando meu vício por isso, por tudo
que ela está me dando.
Um pequeno grito de surpresa preenche o ar, e seus quadris
travam. Eu sei o que isso significa. Eu empurro para baixo com a
palma da mão em seu estômago para medir a reação de seu corpo,
mas não é necessário. Eu sei exatamente em que ponto ela goza. Ela
emite uma nota alta e se contrai em volta da minha língua com uma
explosão picante de umidade. Eu quero usar seu orgasmo para
encharcar meu pau, para tornar ele liso para que eu possa afundá-
lo profundamente em seu corpo, o mais profundo que ela puder me
levar, mas por enquanto eu só beijo e lambo seu clitóris, prolongando
as ondas de choque e me divertindo com sua liberação. Apesar da
minha resolução anterior, estou mais do que pronto para
transar com ela, mas algo está me segurando. Por alguma
razão, sinto que é a primeira vez
dela. Uma onda quente de
satisfação e imensa expectativa
toma conta de mim enquanto considero o
impossível.
Valentina é virgem.
E isso me esmaga.
Não posso quebrar algo que é completo e puro.

Valentina

SOU INEXPERIENTE, não sou estúpida. Eu sei


que tive um orgasmo, mas foi o meu primeiro e estou
devastadoramente triste. Envergonhada. Eu cedi ao
homem que ia matar meu irmão, mas aquelas
mãos no meu corpo... eu esperava força e
aspereza. Em vez disso, ele me deu gentileza.
Isso me confundiu profundamente. A maneira como seus dedos
exploraram minha pele me acalmou e, quando desisti do meu medo,
ele me incendiou. Ele sabia exatamente o que fazer. Não há dúvida
de que é um amante habilidoso e intuitivo. Ele me tocou como
nenhum homem jamais fez, de uma forma que fez minha pele voltar
à vida. Ele torceu e preparou meu corpo, tocando-o como um
instrumento até que deu a ele a melodia que queria. Achei que fosse
me estuprar. De certa forma, ele fez. De certa forma, isso é pior. Ele
estuprou meus sentidos, tomou minhas defesas e me deixou
vulnerável, mas não fria. Seus braços se dobram em volta de mim,
puxando minhas costas nuas para seu peito vestido. Lágrimas
quentes e indesejadas escorrem no travesseiro.
Eu cedi
Eu perdi.
Meu corpo me traiu.
Mãos grandes e duras, mãos que torturaram meus mamilos em
pontos doloridos de necessidade, roçam meu quadril. Um braço se
curva sob mim, dedos fortes travando em meu peito, enquanto o
outro acaricia minha coxa suavemente enquanto eu luto
para manter meu choro sob controle.
— Shh, — ele sussurra em
meu ouvido. Repetindo o
mesmo mantra anterior, ele me dá
a absolvição. — Você não teve escolha.
Há muitas coisas que posso suportar, mas não sua
gentileza. Eu preciso odiar ele. Erguendo seus dedos, eu
rolo para a beira da cama e pulo de pé.
— Saia de perto de mim. — Eu puxo minha
camisola pelo meu corpo.
Seus olhos endurecem, mas não
me alcança. Com sua expressão sombria cobrindo as
cicatrizes, ele parece mais assustador do que qualquer
homem que já vi.
Levantando-se em um cotovelo, ele diz. — Você
deveria ter me dito que era sua primeira vez.
Por que não posso me sentir indiferente? A
indiferença não machucará ou cortará tão
profundamente. A dor e a traição não me
deixarão ir. Usando essa dor, eu a moldo em um escudo de ódio.
Repugnância invade meu tom. — Que diferença teria feito?
Há um aviso em sua voz. — Valentina, eu não peguei nada que
você não prometesse dar.
— Exatamente, — eu estalo. — Eu prometi dar, não receber.
Seus lábios se erguem em um canto, dando a ele a mesma
expressão divertida daquela manhã quando ameaçou a vida de
Charlie. — Dar e receber, agora isso é um assunto discutível. A meu
ver, tudo isso foi dado da sua parte. Eu fiz tudo.
Estou fumegando. Eu esperava que ele me usasse, como Tiny
faria. Em vez disso, ele de alguma forma conseguiu me tornar uma
participante em tudo o que executou.
— Você está com raiva porque eu fiz você gozar ou porque você
gostou? — Ele pergunta, acertando o martelo no prego.
Tremendo de fúria, principalmente de mim mesma, envolvo
meus braços em volta do meu corpo. — Há algo mais que você
quer? Qualquer outro serviço de que você precisa?
Ele sorri. — Tudo em bom tempo. — Um estremecimento
substitui seu sorriso arrogante quando ele se levanta. —
Vou tomar meu café da manhã às cinco. Toranja, suco de
laranja, café e omelete com
pimenta. Se certifique de que
esteja pronto.
Ajustando as calças por cima de uma ereção
impossível de perder, ele sai mancando do
quarto. Espero uns bons cinco minutos depois que o
barulho de seus saltos nos azulejos da
cozinha desaparece antes de fechar a porta,
encostada nela com as pernas bambas. Meus ombros
tremem com mais soluços indesejáveis, mas não
consigo pará-los. Demoro alguns minutos para
encontrar meu controle. Eu quero tomar outro banho
para lavar os restos do toque de Gabriel, mas um
vislumbre do meu telefone me diz que já passa da
meia-noite. Tenho que acordar em quatro horas,
então vou para a cama e me entrego à fuga de um
sono superficial e intermitente.
É UMA TORTURA QUANDO meu alarme toca às quatro. Oscar
está estendido ao pé da cama, ronronando como um motor. Ele deve
ter pulado pela janela durante a noite. Só posso dar a ele um abraço
rápido, ou vou me atrasar. Eu tirei a noite passada da minha mente,
tomando uma decisão consciente de não me alongar na memória
vergonhosa. Me torturar com os detalhes não mudará nada. Eu só
vou tornar mais difícil para mim.
Depois do banho, visto o vestido preto mórbido e prendo meu
cabelo em um rabo de cavalo. Sabendo que ficarei de pé o dia todo,
calço os tênis. Meia hora depois, estou na cozinha, picando pimenta
chili para a omelete de Gabriel enquanto o café coa. Cozinhar é fácil
para mim. Alimentei Charlie e a mim desde que tinha quatorze
anos. Eu sinto muito a falta do meu irmão. Nunca nos
separamos. Parece que minha âncora foi deslocada e estou flutuando
sem rumo em um mar escuro e traiçoeiro.
Minhas costas estão voltadas para a porta, mas eu sei no minuto
que Gabriel entra na cozinha. Primeiro o sinto e depois sinto o cheiro
dele. O calor sobe pela minha espinha, me fazendo suar
frio. O ar fica espesso como uma fumaça difícil de
respirar. Meu corpo registra seu
cheiro de onde eu categorizei
em meu cérebro, conectando os
pontos à experiência sensual da noite passada, uma
experiência que prefiro esquecer, mas não posso evitar
a associação poderosa. A fragrância clara e picante de
sua pele desencadeia uma reação indesejada na minha
barriga, contraindo meu útero com um eco vibrante
do meu primeiro orgasmo. Minhas bochechas
queimam com o pensamento. Espero que ele pense
que é do fogão quente.
— Bom dia, Valentina.
Essa voz novamente. Agora que estou menos
assustada, ele deixa uma mistura complexa de
impressões sensoriais em mim, escuro, suave,
agridoce e profundo. Como açúcar queimado. Eu
olho por cima do ombro. Ele está vestido com um
terno escuro com camisa branca e gravata
vermelha. Seu cabelo está úmido e sua barba aparada.
Eu dobro sua omelete, fazendo o meu melhor para não deixar
meus nervos transparecerem. — Bom dia.
Ele chega perto de mim, tão perto que nossos quadris quase se
tocam, e pega duas canecas no armário acima. Enquanto ele
derrama o café com uma mão firme, a minha segurando a espátula
começa a tremer.
— Dormiu bem? — Ele empurra uma das canecas em minha
direção, afastando o lado marcado do rosto.
Claro que não. — Sim, obrigada.
— Você comeu?
— Mais tarde.
— Podemos dividir a omelete.
— Não posso comer tão cedo.
Prefiro morrer de fome a compartilhar sua omelete. É um
pensamento ilógico, já que ele me dá a mesada que paga pela minha
comida, mas eu tenho que me agarrar a todo orgulho que puder
salvar.
— O médico enviou por e-mail os resultados dos seus
exames de sangue. Você está limpa.
Nossos olhos fixam quando
eu involuntariamente viro
minha cabeça em sua
direção. Ambos sabemos o que isso significa. Assim
que o controle de natalidade agir, ele vai me foder. A
menos que use camisinha para fazer isso antes. Antes que
ele possa dizer mais alguma coisa, sirvo sua omelete no
prato que esquentei na gaveta do aquecedor e levo
para a sala de jantar. Aí eu desapareço para começar
minhas obrigações do dia, tentando não pensar no
que ele disse na cozinha ou que eu me tornaria
empregada doméstica com benefícios. Uma prostituta.

EU RAPIDAMENTE ENTENDO a rotina da


casa. Carly se levanta às seis e sai de casa às sete
sem café da manhã. Marie chega às oito, faz os
pedidos de mercearia do dia e começa a
preparar o almoço. Dou a ela minha lista de compras
habitual. Minha dieta básica consiste em macarrão instantâneo e
maçãs. Maçãs são baratas, fartas e nutritivas. O macarrão me dá um
impulso de energia quando meus níveis de açúcar no sangue caem
muito. Preciso da maior parte do dinheiro que economizo para
Charlie e meus estudos.
Enquanto arrumo a cama no quarto de Gabriel, tento não ficar
boquiaberta com seu espaço privado, mas minha curiosidade supera
minhas maneiras. Como ele, o quarto é excessivamente masculino.
Pesadas cortinas cinza-prata cobrem as janelas, e sua mobília é
volumosa, moderna e quadrada. A cama é maior e mais comprida do
que uma cama king-size. As iniciais de monogramas nos
lençóis indicam que são feitos sob medida. O tecido é macio entre
meus dedos. Uma olhada na etiqueta me diz que é um algodão
egípcio de alta qualidade. Existem muitas fotos em preto e branco de
paisagens e edifícios na parede. As fotos são de lugares
e cidades estrangeiras, talvez lugares que ele já visitou.
Um closet conecta seu quarto ao banheiro privativo. O armário
é maior que o meu quarto com ternos organizados por cores
e prateleiras para sapatos e gravatas. Gabriel é
meticulosamente organizado. Não
há roupas sujas ou toalhas no
chão. Todos os produtos de
higiene que ele usa são armazenados nos
armários. Não há nada nas prateleiras, nem mesmo
uma escova de dente. Os ladrilhos do banheiro são pretos
e brancos com uma borda cinza correndo acima das duas
bacias. As torneiras e acessórios são de latão, e é
uma merda poli-los até brilharem. Esfrego até que
minhas unhas fiquem lascadas, mas essa é a parte
fácil. A parte não tão fácil é tentar não sentir a
vergonha da minha reação a ele, pois, mesmo em sua
ausência física, sua presença persistente me provoca e
atormenta, me forçando a lembrar.
Oscar me segue, me fazendo
companhia. Quando as entregas matinais chegam,
estou tremendo de fome. Depois de devorar uma
tigela de macarrão e uma maçã no café da
manhã, me sinto melhor. Entrando no meu
quarto para uma rápida pausa no banheiro, meu olhar cai sobre uma
caixa na beira da pia. Eu pego para ler o rótulo. Pílulas
anticoncepcionais. Meu rosto está em chamas com o calor, mesmo
quando meu estômago vira gelo. Nunca usei controle de
natalidade. Nunca precisei disso. Com a mão trêmula, pego o folheto
e leio as instruções. Parece que estou cruzando a última linha ao
aceitar as pílulas, mas engravidar será um desastre, e por mais louco
que pareça apreciar qualquer gesto do meu captor, agradeço a
Gabriel por sua consideração a esse respeito.

ESTOU PENDURANDO a roupa lavada quando um assobio chama


minha atenção. O motorista de ontem entra pela porta do pátio.
— Bom dia. — Ele me oferece um sorriso incerto, olhando meu
uniforme. — Como você está?
Não sei o que fazer com sua saudação, então simplesmente digo.
—Bem, obrigada.
— Eu sou Quincy.
Eu puxo uma mecha de cabelo atrás da minha
orelha. — Oi.
Quando eu volto a
pendurar a roupa, ele corta a
conversa fiada. —Vim te avisar para não sair antes
de passar pela guarita.
— A guarita?
— Nós moramos em uma casa de funcionários nos
fundos da propriedade. Tem um telefone na
cozinha. Se você discar o botão marcado casa da
guarda, um de nós atenderá.
— Oh.
— Da próxima vez, se a porta estiver aberta, — ele
gesticula no acesso ao jardim, — chame antes de sair.
— Por quê?
— Gabriel mantém um cão de guarda. Ele
patrulha o jardim, e já tivemos um acidente antes.
— Certo.
— Bem, então tenha um bom dia. — Ele
deve perceber que coisa estúpida é dizer isso,
porque suas maçãs do rosto ficam um tom mais escuro. — Até logo.
— Com uma saudação estranha, ele sai correndo.
Pegando a cesta vazia, noto Marie na frente da janela da
cozinha, me observando.

EM ALGUM MOMENTO DURANTE O DIA, Gabriel e Magda devem ter


saído, porque eles se foram quando Carly chega em casa às cinco. A
julgar por sua roupa casual e pela hora tardia de seu retorno, ela
frequenta uma escola particular. As escolas públicas exigem
uniformes e saem antes da hora do almoço. Marie já saiu quando
Carly me encontra passando roupa na copa.
— Valentina, certo? — Ela se inclina na parede e morde
um pêssego.
— Está certo.
— Meu pai não disse que estava contratando uma empregada
doméstica. — Ela me olha por baixo dos cílios. — Você pode assar?
— Sim.
— Você vai me assar um bolo de sobremesa? Marie
fez flan. Eu odeio flan.
Estico o pescoço para
verificar a hora no relógio de
parede da cozinha. Eu preciso terminar mais cedo
esta noite para que eu possa fazer minha lição de casa,
mas posso encaixar algo se não for muito complicado.
— Do que você gosta?
Ela balança a fruta pelo caule. — Qualquer coisa
com coco.
Eu conheço uma receita simples de bolo de mel
e coco que não demora muito. Os ingredientes são
bastante comuns. Há boas chances de encontrar tudo
o que preciso na despensa. Eu desligo o ferro. — Está
bem.
Quando o bolo base sai do forno, coloco a
manteiga derretida, o mel e o coco ralado por cima e
caramelizo até ficar marrom crocante sob a
grelha. Carly se inclina no balcão da cozinha
enquanto eu removo o bolo, seu cabelo loiro
caindo em uma trança nas costas. Ela é uma garota
deslumbrante. Ela não se parece com o pai. A mãe dela deve ser
linda.
Carly cheira apreciativamente. — Isso tem um cheiro bom. Vou
comer uma fatia agora.
Ela não é uma criança, mas digo o que diria a Charlie. — Você
vai estragar seu apetite para o jantar.
— Vamos, Valentina. — Ela faz beicinho. — Minha mãe nunca
me deixa comer doces. É ruim para a minha figura. — Ela aponta
para o corpo em que não há um grama de gordura. — Papai vai
chegar em casa a qualquer minuto e não quero que ele saiba que
estou fazendo um lanche antes das refeições. Nunca vou ouvir o fim
disso.
— Você é uma garota grande. — Eu empurro o bolo em sua
direção. — Não diga que é minha culpa se você não tiver fome de
comida adequada mais tarde.
— Oh, — ela pisca, — Eu não vou. — Ela corta uma fatia
generosa e morde o bolo quente, murmurando sua aprovação. — Oh,
meu Deus, isso é tão bom.
— Estou feliz que você goste. — Volto ao meu
trabalho, feliz por tê-la
agradado. O instinto me diz
que conviver com Carly não será
um mar de rosas.
Vinte minutos depois, estou dobrando a última das
camisas passadas quando a voz estrondosa de Gabriel
irrompe pela casa.
— Valentina!
Oscar pula de cima da secadora onde está
dormindo e foge para o meu quarto. Eu pulo,
queimando meu braço no ferro ainda quente. Um
segundo depois, Gabriel entra na cozinha, quase me
derrubando quando eu saio pela porta da copa.
Ele agarra meu braço, seus dedos cavando em
minha carne. Seu rosto está pálido, fazendo com que
as cicatrizes vermelhas se destaquem mais. — Há
um kit de primeiros socorros na
despensa. Prateleira superior à
esquerda. Pegue e leve para a sala de televisão.
4
Valentina

EU CORRO PARA EXECUTAR o comando, percorrendo todas as


salas do andar térreo com uma grande tela nela até encontrar Gabriel
de joelhos na frente do sofá no que deve ser a sala de televisão. Carly
está deitada no sofá, ofegando com a boca aberta. Sua pele está
manchada e inchada, e as glândulas do pescoço estão inchadas. A
visão me deixa paralisada, mas a voz forte e calma de Gabriel me
comanda.
— Me dê o auto injetor de epinefrina. É uma caixa amarela e
branca. — Ele afrouxa a gravata e coloca uma almofada sob a cabeça
de Carly.
Eu encontro a caixa e entrego a ele com dedos trêmulos. Ao
contrário das minhas mãos trêmulas, as dele estão firmes enquanto
ele abre a caixa e recupera o injetor. Ele tira a tampa cinza e empurra
a ponta vermelha contra a coxa de Carly, depois conta em
voz alta até dez. Quando termina, ele verifica
se a agulha está estendida e a
cobre com a tampa
protetora. Sou uma estudante
veterinária, não uma médica, mas sei para que serve a
epinefrina e reconheço uma reação alérgica severa
quando vejo uma.
Há um pânico oculto na voz firme de Gabriel. — A
ambulância está a caminho, querida.
— Alergia? — Eu forço de uma garganta
apertada.
A única resposta que recebo é seu olhar frio e
assustador. Quero perguntar a que ela é alérgica, mas
o toque de um telefone me interrompe. Um celular vibra
na mesinha de centro. Gabriel estende a palma da
mão em uma instrução silenciosa, seus olhos
voltados para sua filha.
Quando coloco o telefone em sua mão, ele
olha para a tela e atende em um tom neutro. —
A ambulância está a caminho. — Sua
expressão fica dura enquanto ele ouve uma resposta. — Sim, assumo
total responsabilidade se alguma coisa acontecer com ela, e não,
agora não é o momento de me ameaçar com a custódia
exclusiva. Venha se quiser ver por si mesma como ela está ou espere
por nós no hospital, mas pare de ligar a cada dois minutos. Não vai
mudar absolutamente nada. — Ele corta a ligação e joga o telefone
no sofá.
Antes que eu possa me orientar, a campainha toca. Eu corro
para atender, mas a porta se abre para revelar um dos homens de
ontem, aquele que atirou em Puff. Ele conduz dois paramédicos
empurrando uma maca para dentro. Uma ambulância particular
está estacionada na garagem circular.
— Onde? — Um dos homens pergunta laconicamente.
— Me siga.
Eu os levo para a sala de televisão. Os médicos entram e fecham
a porta na minha cara. O assassino de Puff me lança
um olhar severo antes de sair de casa. Enquanto estou andando
pelo corredor, uma mulher bonita como modelo vira a esquina e vem
em minha direção. Seu cabelo loiro está enrolado em um
coque francês. Um terno branco de duas peças se apega
a seu corpo, definindo suas
curvas. Há uma semelhança
impressionante entre ela e Carly.
— Onde eles estão? — Ela pergunta com calma
régia.
Eu indico a porta. — Por aqui.
Ela abre e bate à porta, fazendo-a tremer no
batente. Através da porta, ouço os tons acalorados de
uma discussão, mas não consigo entender as
palavras. A mãe de Carly deve morar perto para
poder chegar aqui tão rápido.
Não tenho certeza se devo esperar ou sair, prefiro
ficar por aqui, caso precisem de mim. Por que Carly não
ligou para mim? Talvez ela tenha feito isso e eu não
ouvi. Não pode ser o bolo. Carly teria me contado se
ela fosse alérgica a ovos ou mel. Pode ser uma
picada de abelha. As portas deslizantes para a
varanda da piscina estão abertas.
Segundos depois, os paramédicos saem, empurrando Carly na
maca. Gabriel e a loira caminham ao lado da maca, o rosto de Gabriel
tenso.
Na porta da frente, os paramédicos param.
— Só um de vocês pode nos acompanhar na ambulância, — diz
o homem mais velho.
— Você vai. — Gabriel passa a mão pelo cabelo. — Eu te
encontro no hospital.
Quando o guarda de Gabriel ajuda os homens a levantar a maca
escada abaixo, a mulher que presumo ser a mãe de Carly se vira para
Gabriel. — Eu espero que você lide com isso.
— Eu vou, — diz ele com firmeza.
Ela olha para mim com o nariz para baixo antes de descer as
escadas para a ambulância que está esperando. No fim, ela joga as
chaves para o assassino de Puff. — Rhett, traga meu carro para o
hospital.
Rhett olha para Gabriel, que dá um pequeno aceno de cabeça. A
mãe de Carly entra na parte de trás da ambulância e a porta é
fechada por dentro. Quando o veículo sai com sirenes
estridentes, Rhett entra em um modelo esportivo da
Mercedes e o segue.
Estamos sozinhos na
entrada agora, Gabriel e eu, e a
fúria substitui a frieza em seus olhos.
— Você tem muito a explicar.
O pânico acelera minha respiração. — O que?
— O bolo.
Dizer que estou tremendo de frio é um
eufemismo. — Oh, não, Gabriel. — Isso não pode
estar acontecendo. — Eu sinto muito.
Seus olhos perfuram os meus. — Por que você
fez isso?
— Eu só queria fazer algo bom para a sobremesa.
— Bom poderia ter matado ela. Ou você sabia o
tempo todo? Como você descobriu?
— Eu juro que não sabia. Eu ainda não sei! Foi
o mel? Os ovos?
— Carly é alérgica a coco.
— O que? — Minha mente está girando. — Ela pediu
especificamente por isso.
Ele olha para mim com uma expressão que faz meu coração
parar antes de enviar ele à aceleração, a batida latejando em meus
ouvidos.
— Se você estiver mentindo, vai pagar caro. — Ele agarra meu
braço com tanta força que dói até os ossos. — Você não quer saber o
que eu faço com as pessoas que ameaçam minha família, quanto
mais tentar matá-los. — Ele me sacode com força. — Da próxima vez,
cumpra o que é esperado de você e deixe o planejamento do menu
para Marie. — Ele me empurra e tira o telefone do bolso.
Estou me abraçando enquanto ele late um comando ao telefone.
Há uma ameaça sombria em suas palavras. — Fique com
Valentina até eu voltar. — Depois de guardar o telefone, ele sibila. —
Fique muito feliz por ela não estar morta e fique ainda mais feliz que
Magda está em um jantar esta noite.
Um guarda vem correndo pela trilha, um rifle automático nas
mãos.
Quando ele chega à varanda, Gabriel diz. — Não a
deixe sair, e se Magda voltar, não a deixe perto de
Valentina.
O guarda acena com a
cabeça, assumindo uma
posição perto da porta.
Tento acalmar minha respiração quando encontro
o olhar lívido de Gabriel. Ele tem todos os motivos do
mundo para estar com raiva, e o fato de não me bater faz
com que eu tenha mais medo dele. Isso significa que
ele tem controle, e homens com controle são os mais
perigosos.
— Vai para dentro. — As palavras soam como
um lago de gelo rachando. — Nem pense em correr. As
janelas e portas são protegidas por um alarme.
Eu mordo minha bochecha para manter meus
dentes parados e faço o que me foi dito. Mal estou
dentro quando ouço os pneus de um carro
atravessando o cascalho. Pela janela da sala, vejo
um Jaguar conversível passar pelos portões.
Estou tremendo quando chego ao meu quarto. Oscar é meu
consolo, me oferecendo afeto enquanto eu afundo na cama e me sento
no escuro até que minha respiração esteja mais normal. Conforme
os minutos se transformam em horas, tento acalmar minha mente
estudando, mas não consigo me concentrar no que leio. Uma hora se
torna duas, depois três, quatro e cinco. Não tenho coragem de tomar
banho ou me trocar. Tudo o que posso fazer é esperar o retorno
de Gabriel e Carly. Não conseguindo mais suportar a tensão, pego
um posto em frente à janela da sala de jantar que dá para a rua da
propriedade.
São quase onze horas quando os faróis de um carro iluminam
os portões. Pode ser Magda, voltando de seu jantar. O alívio toma
conta de mim quando o Jaguar para na porta. Um Gabriel de
aparência abatida sai e manca ao redor do carro para ajudar Carly
do lado do passageiro. Com o braço em volta dos ombros dela, ele a
conduz escada acima.
Preciso encontrar eles na entrada. — Carly! Você está bem?
— Ela vai ficar, — diz Gabriel, passando por mim.
— Eu mantive o jantar quente.
— Não estou com fome, — diz Carly.
— Você precisa de sua força,
querida. Traga para o quarto
de Carly.
Ele não me poupa um olhar enquanto sobem
as escadas. Eu preparo uma bandeja e bato na porta de
Carly antes de entrar.
Gabriel se senta em uma cadeira ao lado da cama, a
mão de Carly agarrada na sua. Ele afasta suas
cicatrizes de mim. — Deixe isso na mesa. Nós nos
serviremos.
Eu obedeço e fujo para a falsa segurança do
meu quarto. Estou petrificada por Gabriel não
acreditar em mim, mas ainda mais apavorada de que
meu erro custará a vida de Charlie. — Um movimento
errado, — disse Magda. Não entendo por que Carly
faria algo assim.
Por mais uma hora, nada
acontece. Eventualmente, meu cansaço vence
minha ansiedade. Tomo um banho rápido e vou para a cama.

Gabriel

NA SOLIDÃO DE MEU escritório, sento-me à escrivaninha para


contemplar minhas opções. É uma decisão difícil. Assisti a uma
reprodução do vídeo de segurança das câmeras da cozinha. A voz de
Carly foi clara quando ela pediu um bolo com coco. Valentina disse
a verdade. Com um suspiro que chega até os ossos, despejo uma
dose de uísque e bebo de uma vez.
Eu não entendo minha filha. Eu falhei com ela. Há um
desfiladeiro tão largo entre nós que temo nunca o
ultrapassar. Quando a rachadura começou, não sei dizer. Foi
durante os anos de bebê de Carly, quando eu sempre estava ausente
de casa, os negócios da família ocupando meus dias e noites? É
porque Sylvia e eu não conseguimos fazer as coisas funcionarem? Se
eu conseguir identificar quando começou, talvez descubra o
motivo. Carly e eu sabemos que há um problema. Não o
reconhecemos, porque é mais fácil pular o drama. Se eu
acreditasse que Carly tem um relacionamento melhor com
a mãe, eu a encorajaria a ficar
com Sylvia, mas ela tem idade
para escolher, e o fato de morar
aqui me diz o suficiente.
Apesar de ser uma escória, tento ser justo. É o
único fragmento de humanidade que fica entre o homem
e o monstro, mas no meu negócio, o justo só se aplica à
família. Colocar qualquer membro da equipe acima
da família, certo ou errado, não será tolerado. Tal ato
poderia causar a morte de tal funcionário. Inocente
ou não, as ações têm consequências e Valentina não
pode deixar de assumir a responsabilidade pelas dela.
Sylvia espera que eu inflija a retribuição adequada. Ela
não vai esquecer ou deixar para lá. Se eu não fizer isso
antes de Magda voltar para casa, Valentina vai
morrer pelo que aconteceu esta noite. Não tenho
vontade de punir Valentina por algo que Carly
deveria pagar, mas não tenho escolha.
Eu encho meu copo e tomo outra dose antes de pegar meu
telefone e discar para Rhett. — Venha para o meu escritório, — digo
quando ele responde.
O fato de que algo acende em mim, me deixando duro, quando
penso no que estou prestes a fazer é a prova do quão longe
estou. Pode ser que o álcool seja o combustível de minhas inibições
enferrujadas. Talvez seja hereditariedade e esteja em
meus genes. Eu não sou um monstro feito. Eu nasci um.
A porta se abre e Rhett entra. — Você ligou para mim, chefe?
— Leve Valentina para a academia.
A contração que torce seus lábios em um sorriso me faz querer
quebrar seu nariz. Acrescento isso ao erro que ele cometeu ao
atirar no cachorro. No fundo, sei que não é culpa de Rhett. Ele nunca
esperou que eu deixasse os Haynes viverem. Ele fez o que achou
certo, mas causou sofrimento a Valentina e terá que pagar. Para sua
sorte, ele sai sem questionar. Eu poderia tomar outra bebida, mas
não vou arriscar. Tenho que estar sóbrio. Vou precisar de controle
total.
A casa está escura e silenciosa enquanto desço as
escadas para o porão. É uma sala sem janelas onde meus
guardas e eu malhamos, mas
também serve como sala de
interrogatório quando surge a
necessidade. Por isso, é à prova de som. Carly
nunca pode saber o que acontece nas profundezas da
casa quando ela está dormindo no andar de cima.
5
Gabriel

Eu acendo as luzes e ando ao redor da sala, tentando conter a


onda de arrependimento que não é poderosa o suficiente para lavar
minha excitação. O tapete de exercício absorve meus passos, não
dando som à aspereza desigual de minhas solas.
O arrependimento me torna fraco. A excitação me torna cruel. A
raiva me torna perigoso. Eu avalio meu estado cuidadosamente. A
raiva não faz parte do meu repertório esta noite. Isso é bom, ou eu
não seria capaz de fazer o que preciso. Seria muito perigoso.
Rhett entra na sala com Valentina, sua mão cruzada em torno
de seu braço. Ela está usando sua camisola, o que expõe suas pernas
tonificadas. Os dedos de Rhett deixam marcas brancas em sua
pele. Isso abala todos os tipos de sentimentos em mim, mas eles são
como pedaços de papel picado. Não consigo entender
nada, exceto que quero cortar sua mão e
arrancar seus olhos.
Com um movimento de
minha cabeça, eu o direciono para a parede
de trás. Ele sabe o que fazer. Seus olhos seguram os
meus enquanto ele a arrasta. O tipo silencioso de raiva
que frequentemente reconheço em mim mesmo faz o
marrom de suas írises chiar com fagulhas. Em
segundos, Valentina é amarrada pelos pulsos a uma
corda presa na parede, de frente para a parede.
— Vá, — eu digo a Rhett.
Ele me lança um olhar questionador. A surpresa
e a decepção em seu rosto ameaçam liberar minha
raiva. Eu nunca o dispensei quando a punição ou
interrogatório são executados, mas este não é um
maldito show para seu entretenimento. Rhett me
conhece bem o suficiente para ler os sinais. Com
um último olhar confuso na direção de Valentina,
ele sai da sala, fechando a porta atrás de si.
Quando somos apenas nós dois, respiro mais fácil. A violência
se dissipa. Se torna algo diferente, algo que transforma meu pau já
ereto em uma haste de aço dura e furiosa. Eu ajusto a corda,
esticando-a suavemente através do suporte no teto até que ela mal
toque no tapete com os dedos dos pés, e prendo a corda no gancho
na parede. Eu não quero que ela lute ou se mova. É mais seguro
assim.
Ela me espia por cima do ombro, os olhos grandes e as
bochechas pálidas. — O que você está fazendo?
Não é uma pergunta fácil. Existem muitas camadas para
isso. Desabotoo primeiro um, depois o outro punho da camisa,
enrolando as mangas para trás enquanto contemplo a resposta. Eu
não minto se puder evitar. Decido contar a verdade simples a ela.
— Castigo, Valentina. — Eu deixei o nome dela rolar na minha
língua, amando o som dele. Um nome tão
bonito. Valentina. Forte. Combina com ela.
Ela se contorce em suas lutas constantes. — Não fiz de
propósito.
Eu chego por trás, agarrando seus braços para
imobilizá-la. — Eu sei.
Ela para de lutar e seu corpo
congela. — Então por que você
está fazendo isso?
Eu coloco seu cabelo sedoso sobre seu ombro
e escovo meus lábios pela curva de seu pescoço. —
Porque eu gosto. — Outra camada de verdade.
Um soluço sai de sua garganta. — Por favor.
Meu pau estremece. Há súplica nessa palavra,
mas também aceitação. Ela sabe que não há como
voltar. Mesmo que não houvesse as expectativas de
Sylvia ou a ameaça da minha mãe, não consigo me
conter. Não mais.
Eu beijo a concha de sua orelha.
— Gabriel…
Ela deveria me chamar de senhor ou Sr. Louw,
mas o som do meu nome em seus lábios é um prazer
que não vou negar a mim mesmo. Já lutando
para carregar seu peso, ela tomba para trás. Eu
a pego pela cintura. Minhas mãos mergulham
sob a bainha de sua camisola, deslizando por suas coxas
macias. Enganchando meus polegares no elástico de sua calcinha,
eu puxo para baixo sobre seus quadris e panturrilhas, deixando-a
em torno de seus tornozelos.
Ela estremece sob minhas mãos, mas sabiamente não fala. Não
há nada que ela possa dizer para impedir isso. Quando eu me afasto,
seu corpo balança para trás. Como uma bailarina, ela dança na
ponta dos pés para recuperar o equilíbrio. Um grito sai de seus lábios
quando agarro a gola da camisola e a rasgo no meio. O tecido fica
solto em seu corpo, me dando um vislumbre de suas costas lisas e a
curva de sua bunda, mas sou ganancioso. Para economizar tempo,
eu uso uma das facas de combate do balcão de armas, cortando o
tecido dos braços para libertá-la das roupas restritivas.
Dou um passo para trás para admirar a vista. Puta que pariu.
Contida, apenas com a calcinha em volta dos tornozelos, ela é uma
imagem erótica que vai assombrar meus sonhos. Seu corpo é um
retrato fluido de linhas em S, desde a curva esguia de seu pescoço
até os lados de seus seios protuberantes e o diâmetro estreito de sua
cintura até o aumento de seus quadris e a elevação de sua
bunda firme. Meus olhos seguem a trilha de suas pernas,
desde suas coxas trêmulas até os
joelhos e desde a expansão
suave de suas panturrilhas até
onde se estreitam até seus tornozelos
delicados. Meus dedos doem para se enterrar nas
bochechas de suas nádegas e na profundidade quente e
úmida de sua boceta. Eu expulso esses pensamentos
quase violentamente, sabendo que não posso entrar
nela. Por enquanto, estou satisfeito por tê-la nua e
amarrada e, para ser honesto, admito que não se
trata de retribuição ou de provar para minha mãe que
não sou fraco. Não se trata nem de salvar a vida de
Valentina. Isso é tudo para mim.
Eu seguro seus seios por trás e procuro a doçura
suave de sua pele, arrastando meus lábios
pela curva elegante de seu pescoço. — Se eu não
fizer isso, Magda vai matar você.
Ela vira a cabeça para o lado, longe da
minha carícia e voz.
Que assim seja. Ela não vai me desafiar por muito mais
tempo. Eu nunca vou me fartar de olhar para ela assim, mas seus
braços não conseguirão segurar seu peso por muito mais tempo
antes de arriscar arrancá-los de suas juntas. Eu agito meus dedos
para relaxá-los e inspiro e expiro algumas vezes para encontrar meu
controle. Vai ser fácil chegar ao limite com ela. Muito fácil. Há algo
nela que destrói cada grama de força de vontade que possuo, uma
nova experiência que não tenho certeza se gosto.
Eu afrouxo minha fivela e puxo o cinto das alças da minha
cintura. Só então ela olha para mim novamente. Finalmente, ela
entende minha intenção. Seus olhos se arregalam e seus lábios se
abrem.
— Olhos na frente. — Não me importo de ver suas lágrimas ou
ódio, mas não quero que ela veja a luxúria nos meus, a escuridão
que me torna o monstro.
Chegando tão perto que posso sentir a fragrância de framboesa
de sua pele, aliso minha mão sobre sua bunda. Quando ela aperta
os músculos, meu pau empurra dolorosamente contra o meu
zíper. Amasso as bochechas de sua bunda, brincando
com a maciez firme de sua carne. Ao separá-las, posso
vislumbrar o belo buraco de sua
bunda. Eu coloco um dedo em
sua fenda, provocando a entrada
escura antes de descer a ponta para testar sua
boceta. Ela está seca. Bom. Adoro o desafio.
Eu dou um passo para longe, alargo meus pés e
encontro minha posição. Puxando meu braço para trás,
eu pratico o controle cuidadoso com minha força,
deixando o couro colidir com sua bunda forte o
suficiente para doer, mas não forte o suficiente para
machucar.
Golpe.
A linha vermelha que marca sua pele dourada faz
meu pau se contorcer. Uma gota de pré-sêmen aquece
a ponta do meu eixo.
Golpe.
Ela grita baixinho e puxa em suas
restrições. Ela está se segurando.
Golpe.
— Me deixe ouvir você, Valentina.
O fogo ferve com lágrimas em seus olhos castanhos enquanto
ela olha para mim. — Vai se foder.
— Muito bem.
O próximo chicote cai sobre suas coxas, logo abaixo da curva de
sua bunda. Ela se contorce e choraminga, rangendo os dentes com
tanta força que posso ouvir. O próximo golpe é mais suave, dirigido
mais alto para aquecer sua boceta.
Seu grito vem involuntariamente. Ela fica tensa enquanto o som
escapa. Eu deixei os golpes subirem, deixando um padrão cruzado
sobre suas costas e ombros. Permitindo que a ponta do couro se
dobre nas laterais de seus seios, eu me mantenho bem longe de seus
mamilos. Meus golpes não são fortes o suficiente para tirar sangue
ou cortar a pele, mas logo ela está lutando para respirar, se movendo
o mais longe que a posição permite, o que não é muito. Eu deixei o
cinto enrolar em sua cintura, deixando-a sentir a mordida em seu
estômago, e volto para sua bunda e coxas.
Dou a ela uma pausa para recuperar o fôlego, usando o tempo
para liberar sua calcinha, abrir as pernas e amarrar cada
tornozelo a uma algema em uma corrente que se estende
da parede. Ela pode mover as
pernas para a frente ou para
trás, mas não pode fechá-las.
Eu ando para a encarar. Agarrando seu
queixo, eu a beijo com força. Ela está chorando em
minha boca, seus lábios indefesos enquanto eu varro
minha língua sobre a dela, devorando-a como um homem
faminto. Me forçando a me afastar, eu roubo um
último e casto beijo antes de tomar meu lugar atrás
dela novamente.
— Pronta?
Eu testo minha força balançando o couro sob a
curva de sua bunda. Quando sua pele dourada é
deixada intacta, eu giro o cinto mais uma vez em volta
da minha mão, deixando um pedaço mais curto no
final, e deixo uma sucessão de golpes suaves, mas
rápidos, chovo entre suas pernas, visando o
couro para aquecer seus lábios e clitóris. Ela
luta primeiro, jogando a cabeça para trás e empurrando os seios para
a frente.
— Me deixe ouvir você.
Eu não parei até que ela finalmente quebrou para mim com um
grito. A respiração que ela estava prendendo escapa, permitindo que
seus ombros subam e desçam com soluços violentos. Com sua
rendição, jogo o cinto de lado e a agarro contra o meu corpo.
Eu a quero. Eu a quero tanto que não consigo pensar. Apesar
de todas as minhas intenções de ser gentil, não posso evitar a
sensação áspera de meus dedos entre suas pernas. Um gemido
fica preso em meu peito quando a encontro molhada. Eu preciso
estar dentro dela. Agora.
Minhas mãos tremem enquanto eu desabotoo minhas calças e
as deixo cair em meus tornozelos para liberar meu pau. Meu eixo dói
de necessidade, a base pulsando quando eu o agarro em meu punho
e o conduzo para a úmida entrada de Valentina. Dobrando meus
joelhos, eu lanço através de suas coxas e arrasto a cabeça do meu
pau por suas dobras. Estremeço em antecipação enquanto sua
umidade me alisa, e o calor que emana de seu núcleo me
convida mais fundo. Impulsionado pela fome primitiva,
coloco a cabeça sensível contra
sua abertura. Meu único
instinto é empalá-la, levá-la o mais
fundo que posso, mas é seu gemido assustado que
me puxa de volta da minha luxúria sombria.
Mal segurando a razão, eu coloco meu pau em mais
de sua excitação antes de deslizar livre entre suas
pernas. Estou muito longe para recuar
completamente, e tanto para minha sanidade quanto
para sua castidade, eu cuidadosamente abro suas
nádegas e enfio meu pau escorregadio entre elas.
— Por favor, — ela implora, arqueando as costas
para longe de mim.
Minha voz é gutural. Não reconheço o som. —
Relaxa. Eu não vou te foder.
Ela se acalma, mas só até eu começar a deslizar
para cima e para baixo, dobrando suas nádegas
em volta do meu pau com as palmas das
mãos. Eu tenho que empurrar o corpo dela
contra a parede em frente para obter apoio. Quando me movo mais
rápido, ela começa a se mexer seriamente, girando para a esquerda
e para a direita.
— Fique quieta, — eu assobio, — ou vou acidentalmente
penetrar o seu rabo.
Mais uma vez, ela afrouxa, me permitindo encontrar minha
liberação moendo meu pau para cima e para baixo na fenda de sua
bunda enrugada. Eu encontro seus seios e a seguro contra mim
enquanto gozo, disparando minha semente por sua coluna, o calor
da minha liberação escorrendo entre nossos corpos. Quando não há
mais nada para dar, eu me solto, dando um passo para trás
tropeçando para olhar para ela. Ela está marcada com a impressão
do meu cinto, e meu esperma correndo entre as bochechas de sua
bunda, sobre sua boceta e desce por suas coxas. Uma satisfação
intensa surge dentro de mim, superando até mesmo a euforia física
de ejacular em sua pele. É a coisa mais linda que já vi, e isso me
assusta, porra.
Voltando aos meus sentidos, eu puxo minhas calças e abro as
algemas em torno de seus tornozelos. Eu solto a corda do
gancho na parede, liberando seus braços. Valentina cai
para trás, mas antes que ela atinja
o chão, eu a pego pela cintura
e uso a mesma faca que usei para
cortar suas roupas e corto a corda em torno de seus
pulsos. Ela está chorando e tremendo, seu corpo mole
em meus braços. Eu uso sua camisola para limpar suas
costas e entre as pernas, me livrando da maior parte do
sêmen, e então a pego em meus braços e a carrego
para seu quarto.
Colocando-a dentro da banheira, eu ligo o
banho frio e a limpo. Ela não se opõe a nada. Seus
lindos olhos estão fechados, mas as lágrimas estão
escapando de seus longos cílios, e tenho que desviar o
olhar. Eu os acho muito atraentes. Ela é como uma
boneca de pano em meus braços quando a enxugo
com a toalha, tomando cuidado para não pressionar
as marcas do meu cinto. Elas irão embora em um
dia, mas ela vai me odiar por muito mais
tempo. Nenhuma marca será deixada em seu corpo, mas nem todo
mundo carrega suas cicatrizes do lado de fora.
Eu a coloco na cama de bruços, nua, e não puxo o lençol sobre
ela. Ela não vai querer que nada toque sua pele por um
tempo. Ficando de joelhos entre suas pernas, eu a faço gozar com
minha boca até que ela me implora para parar. Através dela
implorando, eu torço mais um orgasmo dela antes de estar
satisfeito. Então eu subo na cama ao lado dela e a puxo para o meu
peito para que ela se estique em cima de mim. Beijo sua cabeça e
acaricio seus cabelos, segurando-a até que sua respiração assuma o
ritmo do sono.
Já passa da meia-noite. Magda estará em casa a qualquer
minuto. Valentina não acorda quando eu saio de baixo dela. Olhando
para baixo, para suas costas esguias marcadas por vergões
vermelhos, estou tomado pela afirmação devastadora de que não
posso brincar com um brinquedo novo e perfeito sem quebrar ele.

ESTOU ESPERADO NO meu escritório o retorno de


Magda. Prefiro relatar os eventos
desta noite para ela
pessoalmente, antes que ela ouça
as notícias de Sylvia ou Carly. Ainda posso sentir o
gosto de Valentina em meus lábios. Sua excitação é um
poderoso afrodisíaco que torce minhas bolas em nós duros
como pedra e alimenta minha luxúria. Há paz em saber
que possuo seu prazer e discórdia em não ser capaz
de possui-la. Até que ela não seja mais virgem, não
posso enterrar meu pau em seu corpo macio, e não
quero nada mais do que treiná-la para gozar com
meu pau até que ela fique molhada com a simples
visão de mim. Preciso de tudo que tenho para não voltar
para o quarto dela e foder forte. Eu arrasto minha
língua sobre meu lábio inferior. Saboreando o
perfume feminino de Valentina uma última vez,
despejo um gole e bebo o licor, mergulhando o
perfume de seu corpo no álcool.
Magda fica puta da vida quando faço um breve resumo de como
a noite acabou. É quando garanto que Valentina foi punida, e ela se
acalma quando assiste ao vídeo da Carly pedindo um bolo de coco.
— Você tem trabalho com Carly, — ela diz. — Essa garota tem
problemas.
— Eu sei. — Eu esfrego meus olhos.
— Faça algo a respeito, antes que se torne um desastre que não
possamos consertar. — Ela sai do meu escritório sem dizer boa noite.
Toco a foto de Carly na minha mesa, com muitas perguntas e
nenhuma resposta.

Valentina

PARECE QUE GABRIEL tirou algo de mim. Eu sabia que ele era
perigoso, mas não tinha ideia de como ele é sombrio. O que Tiny fez
comigo foi quase mais suportável, porque nunca me excitou. O que
Gabriel fez comigo ontem à noite me deixou molhada, e isso me deixa
doente. Eu deveria, de todas as pessoas, estar enojada
com a violência. Não foram as chicotadas nas minhas
costas. Era o ritmo intenso do couro
entre minhas pernas. Eu me
ressenti e apreciei que ele cuidou
de mim, tanto emocional quanto sexualmente,
depois da surra. Era algo de que eu precisava
desesperadamente e me odeio por isso.
Querendo ouvir uma voz gentil e segura, ligo para
Kris antes que ela chegue ao consultório e falo com
Charlie, que parece tão feliz quanto só Charlie pode
estar. Isso me acalma o suficiente para
cumprir minhas tarefas matinais de sexta-feira. Meu
corpo está sensível às chicotadas de Gabriel, e cada
toque do linho áspero do meu vestido é abrasivo na
minha pele. Carly está em casa hoje, matando aula
para se recuperar, e faço o possível para não topar
com ela. Só limpo o quarto dela quando ela está do
lado de fora, perto da piscina.
Marie evita meus olhos. Se ela sabe sobre
a noite passada, não diz isso. Ela vem me
procurar na entrada, onde estou limpando e fixa o olhar em um ponto
atrás de mim. — Senhor Louw disse que as toalhas na academia
precisam ser lavadas.
— Certo. — Eu esfrego o chão.
— Você deve levar as limpas. Agora.
Ela sai rigidamente, escondendo seu desconforto por trás de sua
maneira brusca.
Eu pego uma pilha de toalhas limpas no armário de linho e faço
meu caminho pelo corredor. Enquanto desço as escadas para a
academia, meu estômago se contrai e minha garganta se
fecha. Forçando meus pés a avançar, eu paro abruptamente quando
a porta se abre e Rhett sai, com sangue por todo o peito nu. Ele está
pressionando a palma da mão no nariz, a cabeça erguida e quase
esbarra em mim antes que eu tenha tempo de pular para fora do
caminho. O motivo do sangue parece ser um nariz quebrado. A ponte
está inchada e a cartilagem torta. Seu olho direito tem vermelhidão e
a pele da maçã do rosto está aberta. Quando ele me percebe, me
encara e passa correndo, subindo as escadas. Ainda estou olhando
para ele quando Gabriel entra pela porta vestido apenas
com calça de moletom e segurando as pontas de uma
toalha enrolada no pescoço. Seu
rosto e peito brilham de suor.
Meu rosto fica vermelho com
a lembrança da noite passada e minha boca fica
seca. De onde eu venho, tenho visto muitos gângsteres
que treinam duro na academia o dia todo, mas ninguém é
tão duro ou perfeitamente talhado quanto Gabriel. Seus
braços são do tamanho da minha cintura. Linhas
profundas definem seus peitorais e abdominais. Uma
trilha de cabelos escuros começa abaixo do umbigo e
desaparece sob as calças, o V de seus quadris
cortando nitidamente até a virilha. Não é a beleza de
seu corpo que me deixa sem palavras, mas o poder
dele. Mesmo com sua deficiência, ele machucou muito
Rhett, e Rhett é um Hulk. Enquanto ele avança, eu
fico lá como uma idiota com as toalhas em meus
braços, sem palavras.
Um sorriso flerta de seus lábios. —
Treinamento, — diz ele com um encolher de
ombros, pegando uma das toalhas limpas da pilha para limpar o
rosto. Ele me dá seu olhar intenso, ferindo meu rosto. — Como você
está?
— Bem.
— Bom. — Jogando a toalha na cesta ao lado da porta, ele sai
mancando.
É a primeira vez que o vejo em qualquer coisa, exceto uma
camisa social e calças de terno. A largura de seus ombros e a rigidez
de sua nádega não me surpreendem tanto quanto a maneira como o
ver, seminu, faz meu ventre vibrar. Não posso sentir desejo por um
homem que me torturou. Vai me deixar tão maluca quanto ele. Isso
vai me arrastar para um lugar de onde não poderei voltar.
Com raiva da minha reação indesejável, eu entro na academia e
coloco as toalhas limpas na prateleira antes de pegar as sujas do
chão. Eu levo meu tempo para fazer o que não fiz ontem à noite, fazer
um balanço da sala. Há uma seção com pesos livres num canto e um
pequeno banheiro no outro. A julgar pelos anéis de metal
aparafusados ao teto e os ganchos colocados nas paredes, é aqui que
Gabriel tortura seus inimigos. Um arrepio enche minhas
veias e não consigo mais olhar.
Eu corro de volta para cima,
banindo minhas memórias da
noite passada para as
profundezas da academia. Na sala, encontro Carly.
Ela apoia a mão no quadril. — Ei, Valentina.
Não posso ignorá-la sem ser rude. — Como você está
se sentindo?
Ela ergue um ombro. — Eu vou ficar bem.
— Por que você fez isso?
— Para fazer você ser despedida.
Não sei se ela sabe o que seu pai faz para viver,
mas se não sabe, não é minha função desiludi-la. Não
posso dizer a ela que estou aqui contra minha vontade,
especialmente não depois da ameaça de Magda de
matar Charlie e eu por uma palavra errada. Tudo
que posso perguntar é. — Por quê?
— Eu vi a maneira como meu pai olhou para
você no jantar.
— Qual maneira?
— Uma maneira que ele nunca olhou para minha mãe. É o
dinheiro, não é? — Ela me dá um sorriso irônico. — É sempre o
dinheiro. Bem, muitas outras antes de você tentaram, e sempre
termina da mesma maneira. Ele não se casará com você e você não
receberá um centavo, então nos poupe de todos os problemas e faça
as malas agora.
— Sim, é o dinheiro, mas não como você pensa. Não posso
desistir deste trabalho, mesmo que eu queira.
— Você não pertence aqui. Eu quero que você vá embora.
— Tanto que você vai colocar sua vida em perigo? — Eu
pergunto com uma nota de raiva.
— Oh vamos lá. Por que você está tão chateada? Não funcionou,
não é? Você ainda está aqui.
— Tenho todos os motivos para estar chateada. O que você fez
foi tolo e irresponsável.
— Qual é o seu problema? Você está agindo como se fosse você
quem quase morreu.
— Meu problema é que se você tivesse morrido, eu carregaria
sua morte em minha consciência pelo resto da minha
vida. Você já considerou isso?
— Quem você pensa que é
para falar assim comigo?
— É a atenção? Essa é a
única maneira de fazer seus pais mostrarem que
eles se importam?
Ela puxa o braço para trás e ataca. Sua palma se
conecta com minha bochecha, deixando uma picada
ardente. — Você não sabe nada sobre mim.
Naquele momento, sua guarda está baixa, e uma
parte vulnerável espia por baixo de seu verniz de
vadia.
Eu seguro minha bochecha, pressionando a
palma da mão fria na minha pele aquecida. A briga sai
de mim porque só sinto pena da pobre e rica garota
que, no fundo, é apenas uma garota.
Eu suspiro. — Me ouça, Carly. Você é jovem,
bonita, privilegiada e saudável. Você tem todo o
seu futuro pela frente. Pode ter o que quiser. É
mais do que a maioria das pessoas
consegue. Não o desperdice. Mesmo que você não veja agora, seus
pais teriam ficado arrasados se algo acontecesse com você, e
eu nunca teria me perdoado.
— Sim? — Lágrimas brilham em seus olhos. — Como se você
me conhecesse ou minha família. Não se atreva a pregar para
mim. Talvez você gostaria de ser psicóloga, mas não é. Você é
uma empregada doméstica, então mantenha-se no seu lugar. — Seus
olhos ficam duros. —Eu estarei lá fora. Me traga um sanduíche de
peru e limonada. Muito gelo. Quando terminar, você pode limpar
meu banheiro novamente. Você esqueceu um lugar. Então pode
passar meu novo vestido azul. Eu quero usar na escola amanhã.
Quero dizer que não respondo a ela, mas não é verdade. Pelas
regras de nossa espécie, sou mais inferior na hierarquia do que o
gato.

NAQUELA TARDE CARLY não toca em seu almoço. É uma


lasanha de aparência deliciosa, mas ela não se deixa
persuadir a dar uma mordida. Magda e Gabriel a tratam
com luvas de pelica. Gabriel sai de
seu caminho para manter uma
conversa com ela, mas desiste
depois de um tempo.
Depois de limpar a mesa, eu salvo a porção do prato
de Carly e coloco de lado para comer mais tarde. O resto
coloco em um recipiente de plástico que guardo na
geladeira do pessoal para os cães de rua. Odeio
desperdiçar e estou faminta, com fome de algo além
de maçãs e macarrão. Tenho certeza de que ninguém
vai se importar se eu comer uma porção de sobras
que vai para a lata de lixo.
Durante a minha pausa para o almoço, coloco uma
almofada de uma cadeira de pátio nos degraus da
varanda e fico o mais confortável possível na minha
bunda machucada. Então eu começo a comer. A
lasanha é rica em molho branco e queijo, a carne
pingando com tomate fresco e orégano. Eu
fecho meus olhos enquanto mastigo, saboreando cada
mordida. Marie sabe cozinhar.
Estou quase terminando quando um latido chama minha
atenção. Quincy está à beira da piscina com um Boerboel 2
de aparência cruel. A besta está puxando a guia, mostrando os
dentes.
Quincy sacode a corrente. — Quieto!
Os latidos param, mas o cachorro ainda geme para mim, seus
lábios puxados para trás sobre os dentes.
— O que diabos você está fazendo aqui fora? Eu disse para você
ligar. Você não deveria estar no jardim quando o cachorro está fora.
— Quincy dá alguns passos em minha direção, mas para a uma
distância segura. —Eu disse a Marie que o levaria para um passeio.
— Acho que ela se esqueceu de me dizer.
— Vou dar uma palavrinha com ela. — Com um aceno de cabeça
firme, ele continua seu caminho, o cachorro pulando sobre três
pernas.
— O que há de errado com a pata dele? — Eu chamo atrás deles.
Ele faz uma pausa. — Não sei. Vou levar ele ao
veterinário amanhã.
Parece doloroso. Deixo o
prato no degrau e fico de pé.
Quincy parece levemente
surpreso quando eu me aproximo, mas quando
estou quase ao alcance da guia, ele levanta a palma da
mão. —Não se aproxime.
O cachorro fica furioso, latindo e se esforçando na
minha direção.
— Calma, garoto, — eu digo com uma voz
severa.
O cachorro reage imediatamente. Ele para de
latir e se senta.
— Isso é melhor.
Quando pego o cachorro, Quincy parece que vai
ter um ataque cardíaco. — Valentina! Fique...

2 O Boerboel é uma raça de cão de grande


porte originária da África do Sul. Esta raça foi
criada para ser um cão de trabalho de fazenda,
servindo como cão de guarda e boiadeiro.
Suas palavras são interrompidas quando a besta tomba de lado
e fica de costas, com as quatro patas no ar.
Eu fico de cócoras para acariciar sua barriga. — Esse é um bom
menino. Não é educado fazer tanto barulho à toa.
Quincy me encara, boquiaberto. — Como você fez
isso? Ninguém é capaz de tocar ele, exceto eu, e eu treinei com ele
por um ano.
— Eu tenho uma coisa com animais.
— Não me diga.
Sorrindo com a surpresa em seu tom, eu olho para ele. — Qual
o nome dele?
— Bruno.
— Claro que é. Posso dar uma olhada na pata dele?
Ele aperta os olhos para mim. — Se ele permitir.
Pegando a pata ferida em minha mão, estudo os sulcos. Um
espinho quebrado está alojado na carne. O pobre bebê deve estar
sofrendo.
— É um espinho. — Eu aponto para Quincy. — Você tem um
par de pinças?
— Não. — Ele pensa um pouco. — Espera. Talvez
isso sirva. — Ele puxa um canivete
suíço do bolso e desdobra um
pequeno par de pinças.
— Perfeito. — Pego a faca e coço a orelha
de Bruno. — Eu vou fazer isso melhorar.
Demora um segundo para extrair o espinho. A área
ao redor da ferida está inflamada. Devolvendo a faca a
Quincy, pergunto. — Há quanto tempo ele está
assim?
— Ele está mancando a semana toda. Não
consegui marcar uma consulta no veterinário antes.
— Você ainda terá que levar ele. — Eu me
endireito. — Ele precisa de um creme antibacteriano e
anti-inflamatório.
Ele inclina a cabeça. — Como é que você sabe
de tudo isso?
— Uma assistente.
Bruno rola nas patas e lambe meus dedos
dos pés.
— Não me diga. — Quincy me lança um sorriso. — Obrigado
pela ajuda. Ele não me deixou tocar aquela pata.
— Não mencione isso.
— Não tenho certeza se Gabriel vai ficar feliz quando descobrir
que você transformou seu cão de guarda em um cachorrinho babão.
— Será nosso segredo. No que diz respeito ao resto do mundo,
Bruno é um guardião cruel.
Ele assobia entre os dentes. — Vamos, Bruno. É hora de
terminar sua caminhada. — Ele saúda e vai embora com Bruno na
direção do pomar.

MEU DEVER DE CASA está ficando para trás. Tenho uma


redação para terminar antes da sexta-feira da próxima semana, mas
estou exausta demais para ler mais de uma página. Com o que
aconteceu ontem à noite, não dormi muito. Tenho que cumprir meus
prazos de estudo. Eu não vou desistir. Não posso. Não é
só o meu sonho que me mantém motivada, é saber que
terei algo em que voltar quando
estiver livre. Charlie e eu
vamos precisar de uma renda. Não
vamos voltar para Berea. Tenho que construir um
futuro melhor para nós, e Gabriel Louw não vai tirar
isso.
Eu tomo um banho frio, ainda sentindo a picada da
água nas minhas costas e nádega. Já que a única
camisola que eu possuía está destruída, eu visto uma
camiseta e uma calcinha antes de escorregar para a
cama.
Como na primeira noite, Gabriel vem até mim
quando estou dormindo. Não tenho certeza se é
a maneira como ele segura meus seios suavemente ou
o som do meu gemido que me acorda, mas estou
muito cansada para lutar contra isso. Eu
simplesmente o deixo ouvir o que seu toque faz
comigo. Sou recompensada com um beijo na
boca, me deixando totalmente acordada. Não é
nada mais do que um roçar de seus lábios nos meus, mas a
intensidade queima como um fogo, e eu acho... prazeroso. Sua boca
é fria e seca, e seu hálito cheira a menta e álcool, como uísque.
O ar quente sopra em meu ouvido enquanto seus lábios roçam
a concha. — Vire para mim, Valentina.
Ele levanta o lençol para eu me virar mais fácil, mas meus pés
ficam emaranhados no edredom aos pés. Com cuidado, ele libera
cada pé, parando para acariciar o arco antes de dar um beijo na
sola. O ato terno me confunde. Eu esperava que ele me machucasse
como na noite passada, não arrastasse suas mãos suavemente pelo
meu corpo e torcesse meu cabelo em um rabo de cavalo antes de
colocá-lo no travesseiro ao meu lado. Talvez ele vá. Meu corpo fica
tenso. Gabriel é tudo menos previsível. Ele levanta meus braços e,
dobrando-os pelos cotovelos, coloca minhas mãos acima da
cabeça. Uma batida na parte interna da minha coxa me faz levantar
a cabeça para olhar para ele, mas ele segura meu pescoço e, com a
menor pressão, empurra meu rosto de volta no travesseiro. Ele bate
na minha coxa novamente. Compreendendo a deixa, abro minhas
pernas. O colchão cedeu quando ele subiu na cama atrás
de mim. Ele não me despe, mas empurra a camiseta até
meus ombros e puxa a calcinha
para baixo até a curva da
minha bunda.
O calor encharca minha pele enquanto ele se
estica em cima de mim sem tocar nossos corpos
juntos. Mantendo seu peso em seus braços, ele passa
rapidamente a língua sobre um vergão em meu ombro,
fazendo minhas terminações nervosas iluminarem
com eletricidade. Minha pele se arrepia quando ele
sopra a trilha molhada de sua língua. Ele continua
descendo pelo meu corpo, tratando cada vergão com
o mesmo cuidado, até chegar às covinhas da minha
bunda. Enquanto ele lambe e sopra nas bochechas da
minha bunda, a umidade se reúne entre as minhas
pernas. Ele continua por um longo tempo, até que
meu clitóris esteja inchado e pulsando de
necessidade.
A primeira vez que ele coloca as mãos em
mim depois de beijar meus hematomas é para
tirar minha calcinha. Agarrando meus quadris, levanta minha
bunda. Ele demora para me posicionar como quer, se ajoelhando
com minhas pernas abertas e minha testa apoiada no
travesseiro. Com minha bunda e sexo exposto a ele, ele se senta e
observa. Não consigo ver, mas sinto seus olhos no meu corpo,
queimando minhas partes nuas. Suas palmas deslizam sobre
minhas nádegas antes de ele pegar uma bochecha em cada mão, me
separando como uma fruta enquanto corre seu nariz do meu cóccix
para a minha abertura. Um arrepio percorre meus órgãos. Meu corpo
depravado sabe o que está vindo e quer. Sua língua achata no meu
clitóris, quente e úmida. Eu grito quando a superfície áspera e quente
passa pela minha fenda, todo o caminho até o meu traseiro. Em
algum lugar da minha mente há um grito de vergonha, mas
não adianta dar rédea solta ao sentimento. Gabriel fará o que quiser.
Ele continua a me lamber assim até que estou desesperada para
gozar. Incapaz de suportar a lenta tortura por mais tempo, eu gemo
alto no travesseiro. Ele cantarola sua aprovação e finalmente me dá
o que eu quero. Pegando meu clitóris suavemente entre os dentes,
ele passa a língua sobre a protuberância, rápido, mas muito
leve.
Minhas mãos se fecham nos
lençóis. — Ah, meu Deus. Por
favor.
— Por favor, o que?
— Por favor, me faça gozar.
Assim que expresso verbalmente minha necessidade,
ele me abre mais com suas mãos e morde as minhas
dobras, alternando as mordidas suaves com chupar
meu clitóris. Levo segundos para gozar com um
espasmo violento no meu útero. Alfinetes e agulhas
picam meus genitais. Meus dedos do pé enrolam. Eu
não aguento mais.
— Pare. Por favor.
Implorar não ajuda. Ele me chupa até ficar uma
bagunça trêmula, e só então ele empurra minhas
costas para abaixar minha pélvis até a cama. Estou
tremendo e sem ossos. Nunca pensei que
pudesse ser assim. Ele se abaixa sobre mim,
finalmente pressionando nossos corpos juntos,
até que meu tremor pare. Com um beijo no meu pescoço, ele se
levanta da cama. Eu me viro de lado para olhar para ele, alguma
parte de mim precisa ver sua expressão, mas ele vira o rosto.
Ele bate os dedos nas minhas costas. — Volte a dormir.
Então ele se foi.
Por um longo tempo, fiquei deitada no escuro, tentando
entender Gabriel. Eu não entendo. O que ele está fazendo comigo?

Gabriel

NÃO AJUDA QUE Valentina esteja por perto a cada hora do


dia. Eu sou um tesão ambulante, sofrendo de constantes bolas
azuis. Nenhuma quantidade de punhetas é suficiente para aliviar
minha dor. Eu quero estar dentro dela. Profundo. Profundo o
suficiente para doer. O único problema é sua virgindade. É uma
barreira para mim, literal e psicologicamente. Eu não quero ser o
único a quebrá-la dessa maneira. Sua primeira vez precisa ser
especial, não monstruosa. Mesmo eu não sou tão
cruel. Ela merece um rosto bonito e beijos gentis, não um
cheio de cicatrizes que adora foder
com violência.
Nisso reside o
problema. Não posso tirar sua virgindade,
também não posso tolerar a ideia de outra pessoa a
tirando. Eu não vou durar muito mais sem alívio. Penso
em ligar para Helga, mas quando penso em outra mulher,
não consigo ficar excitado. A imagem do corpo
amarrado de Valentina com a calcinha nos tornozelos
assombra minhas noites. Eu gostaria de ter tirado
uma foto para ter algo concreto para bater uma
punheta.
A emergência com Carly está alimentando ainda
mais meus nervos. Não tenho certeza se devo punir ela
ou pedir ajuda profissional. Não sou um grande
exemplo moral. Não tenho base para julgá-la ou
discipliná-la. Se há uma coisa de que tenho
certeza é que Carly não viverá como eu vivo.
Minha mãe nunca me deu escolha. Ela colocou
uma arma na minha mão quando eu tinha doze anos e me disse para
puxar o gatilho. Quando não consegui, ela atirou no meu pé.
Não adianta falar com Sylvia. Sylvia é muito parecida com
Magda. Deus sabe por que pensei que tínhamos uma chance. Eu a
amei. Eu realmente fiz. Achei que ela aprenderia a me amar com o
tempo, mas a única coisa que ficou clara com o tempo foi sua
ambição. O que ela queria era meu dinheiro e proteção, não meu
amor. Ela se casou comigo a mando do pai e saiu o mais rápido que
pôde, assim que produziu o herdeiro que era esperado dela. Seu
sacrifício conseguiu o que ela queria. Como mãe do meu filho, sempre
terá meu dinheiro e proteção. Depois de Carly, ela insistiu em uma
histerectomia, garantindo que não teria mais filhos meus. Sylvia
odiava cada minuto da gravidez. Ela ficou arrasada quando o médico
confirmou os resultados do teste de gravidez. Carly era grande e
deixou cicatrizes em seu corpo. Sylvia nunca me perdoou por
isso. No minuto em que Carly nasceu, Sylvia fez uma dieta e uma
farra de cirurgia plástica, deixando a babá cuidar de nossa
filha. Talvez Carly subconscientemente tenha sentido a rejeição. Ela
era um bebê com cólicas. Ela nunca foi uma criança fácil, mas
é minha filha e o único ser humano que amo neste
mundo. Eu gostaria de saber
como consertar isso.
A voz estridente de Magda e
os saltos rápidos batendo no chão de mármore do
saguão me puxam dos meus problemas. Uma coceira
desce pelas minhas omoplatas.
—É isso aí! Já chega.
Abro a porta para ver Magda correr pelo
corredor com Oscar. Ela o pegou pela pele do
pescoço.
— O que está acontecendo? — Eu mal escondo
a irritação em minha voz.
Ela não para de andar, mas grita por cima do
ombro. — Ele fez xixi no meu sofá Louis
Vuitton. Quincy! Traga sua bunda aqui.
Quincy vira a esquina, uma pergunta em seu
rosto.
— Aqui. — Magda empurra o gato agitado em seus braços. —
Leve ele ao veterinário e faça a eutanásia.
Estou prestes a dizer à minha mãe que ela está exagerando
quando Valentina sai voando da sala com um pano e um frasco de
spray nas mãos.
— Oh, não, por favor, Sra. Louw, você não tem que fazer
isso. Não é culpa dele. Pode ser uma infecção urinária. Tenho certeza
de que os antibióticos vão resolver o problema em um momento.
Magda se vira para Valentina. — O que faz de você a maldita
especialista?
— Ela tem razão, — Quincy diz.
O fato de que ele se coloca entre Valentina e minha mãe não é
esquecido por mim. Eu não gosto disso nem um pouco, porra.
— Estou indo para o veterinário com Bruno, de qualquer
maneira, — Quincy continua. — Eu posso levar Oscar.
— Não vou gastar mais um centavo com essa poluição de
pelos. Ele acabou de assinar sua sentença de morte.
Isso faz sentido. Minha mãe nunca nutriu amor pelo gato acima
do peso da minha falecida avó. Se dependesse dela, ela o
teria abandonado na casa da minha avó após o funeral,
mas Carly insistiu que o
trouxéssemos aqui.
— Vou levar ele, — diz
Valentina rapidamente. — Eu quero dizer, para o
veterinário. Você não tem que pagar nada, eu prometo.
Eu me inclino no batente da porta, gostando da
irritação de Magda. — Era o gato da vovó, afinal, — eu falo
lentamente.
Minha mãe me lança um olhar sujo. — Tudo
bem, — ela diz a Valentina. — Se você tem dinheiro
para desperdiçar, faça o que quiser, mas se ele urinar
na casa mais uma vez, ele está morto.
— Posso levar ele no domingo, quando é meu dia
de folga.
— Hoje ou nunca, — Magda diz, marchando
para seu escritório e batendo a porta.
Valentina olha para mim. Há um apelo em
seu rosto. Não perdi como Oscar a segue ou
como ele dorme em sua cama. Ela adora a bola de pelo.
— Você pode tirar uma hora esta tarde, — eu digo.
Seu rosto se ilumina e um sorriso transforma suas feições em
algo angelical, algo bom demais para mim. Eu pego mesmo assim,
gostando de saber que coloquei aquela expressão em seu rosto,
dando a ela algo mais do que prazer físico.
— Eu levo você, — Quincy diz.
Imediatamente, meu bom humor evapora. Um ciúme sombrio e
sufocante, abafa minha razão. Meu guarda-costas pode fazer o gesto
da maneira mais platônica possível, mas quero quebrar cada uma de
suas costelas. A única coisa que me impede de acabar com a vida
dele é que Valentina não vê a maneira como seus olhos suavizam
quando ele os arrasta sobre ela, porque ela está olhando para
mim. Ela está olhando para mim pedindo permissão. O ato de
submissão me acalma um pouco. Eu não consigo dar mais do que
um aceno de cabeça.
— Obrigada, — ela diz, seu olhar desconfiado, como se estivesse
lendo a mudança em meu temperamento.
Eu assistirei Quincy de agora em diante.

Valentina

A CONTA DO VETERINÁRIO destrói minha


mesada, dinheiro que eu ia usar nos estudos, mas os
exames estão feitos e Oscar tem remédios. É uma infecção
urinária, como pensei. O veterinário me garantiu que ele
voltará ao normal em alguns dias. Era meu plano
levar ele para Kris no fim de semana. Ela o teria
tratado de graça, mas eu não podia arriscar sua vida,
e não duvido por um segundo que Magda o teria
sacrificado. Para me assegurar, eu o tranco em meu
quarto com sua caixa de areia e comida, esperando que
a micção frequente pare.
Quando chego ao meu quarto naquela noite, há
um pacote de seda colorida amarrado com uma fita
na minha cama, e um bilhete embaixo. Curiosa,
pego o pedaço de papel. A letra é limpa e
quadrada.
Raspe sua boceta.
Gabriel é o homem mais pervertido que conheço. Jogando o
bilhete de lado, puxo a fita para revelar sete camisolas em vermelho,
marinho, branco, rosa, azul bebê, preto e ameixa cereja, todas com
enfeites de renda e fita. Ele me comprou camisolas novas porque
destruiu a minha, ou as camisolas pecaminosamente sexys são algo
que o excita?
Eu deveria estar estudando, mas não consigo parar de pensar
no bilhete. Haverá repercussões se eu desobedecer. No chuveiro,
aparo e depilo meus pelos púbicos. É uma tarefa
surpreendentemente longa. Depois de hidratar meu corpo, visto a
camisola azul marinho, que é a menos reveladora, e me sento na
cama para esperar.
Não demora muito para eu ouvir passos na cozinha. Oscar, que
dorme na minha cama, torce as orelhas, mas não se mexe. O corpo
alto de Gabriel aparece na porta. Com a luz de fundo da cozinha, seu
rosto está no escuro. Não consigo distinguir sua expressão. Ele
acende a luz e entra no quarto com passos lentos, mas decididos. Ele
é um homem que sempre sabe o que está fazendo e sempre
tem uma razão para suas ações. Seu olhar desliza sobre
mim de cima para baixo, mas não
há nada da necessidade
luxuriosa de Tiny por uma
solução rápida em seus olhos. Eles estão cheios de
perguntas enquanto passa a ponta dos dedos pelo meu
braço, do meu ombro até a minha mão. Há um momento
louco em que quase confio nele com meu corpo, em
que quase desisto de minha mente. É como estar em
um carro com um bom motorista, sabendo que
chegará em segurança ao seu destino. Eu devo estar
enlouquecendo. São as endorfinas que meu corpo
libera quando ele me toca. Puramente hormonal.
Biológico. Gabriel é um sádico e me transformou em
uma prostituta. Eu nunca poderei confiar nele.
Ele desliza um dedo sob a alça da camisola. —
Fica bem em você.
— Obrigada, — eu digo sem jeito. — Você
não precisava fazer isso.
— Sim, precisava. — Ele levanta Oscar das cobertas e o coloca
em sua cama de gato no canto. — Ele não precisa ver isso.
Não tenho certeza se ele está brincando ou falando sério, mas a
insinuação por trás de suas palavras deixa minha calcinha
úmida. Não quero essa reação, mas sou incapaz de impedir meu
corpo de querer o que ele dá.
Ele tamborila os dedos no meu pulso. O que quer que esteja
passando por sua mente, está pensando
profundamente. Finalmente, ele quebra o silêncio com um único
comando.
— Dispa-se.
Posso lutar e discutir, chorar e implorar, mas não fará
diferença. Isso nunca acontece com homens como ele. Me
endireitando, pego a bainha da camisola e puxo sobre a
cabeça. Minha calcinha vem a seguir. Eu não quero prolongar a
situação. Quanto mais rápido acabarmos com isso, mais rápido
poderei voltar a fingir que não quero que ele me toque assim.
Gabriel não esconde sua excitação de mim. Ele se sente
confortável com isso, assim como com seu corpo e
roupas. Sua ereção se estica sob o tecido da calça, mas
ele não a toca nem tenta abrir o
zíper. Ele enfia meu cabelo
sobre meus ombros com um
escovar suave e continua com seus pedidos.
— De joelhos e abra as pernas.
O calor sobe pelo meu pescoço enquanto eu assumo
a postura que me abre para o seu olhar, mas eu levanto
meu queixo e o encaro diretamente. Não vou me
render à minha vergonha, não com ele no quarto. Por
um longo momento, seus olhos se fixam entre
minhas coxas, parecendo satisfeito por eu ter
obedecido a sua ordem de me depilar.
Ele testa o peso dos meus seios, enviando um
arrepio incontido sobre minha pele. Não consigo evitar
que meus mamilos endureçam.
— Ombros para trás, tetas para frente.
Eu dou a ele o que ele quer e espero.
Um sorriso raro puxa seus lábios. — Você
é tão corajosa, Valentina. — Sem aviso, sua
mão desliza entre minhas pernas. Ele coloca a palma da mão larga
sobre o meu sexo. — Eu amo sua boceta nua. Você sabe o que eu
quero fazer com você?
Ele não espera pela minha resposta, mas bate o dedo indicador
da mão livre para a esquerda e para a direita sobre a ponta do meu
peito. O movimento é firme e rápido, e deixa meu peito já pesado
ainda mais inchado. Enquanto ele está brincando com meu mamilo,
empurra o dedo médio contra a abertura da minha vagina. Ele
não me penetra, mas passa a ponta do dedo para cima e para baixo
na minha fenda. A aspereza da pele de seu dedo parece mais intensa
na minha pele raspada. Estranhamente, seu toque no meu seio ecoa
no meu clitóris. A protuberância entre minhas dobras incha e lateja
com uma necessidade dolorosa. Umidade cobre seu dedo. Eu posso
sentir a umidade enquanto ele alisa as paredes externas da minha
abertura com a minha excitação. Determinada a não dar a ele um
som, no entanto, eu suspiro quando ele agarra meu mamilo entre o
polegar e o indicador com um beliscão.
Satisfação sangra em sua expressão. Por algum motivo, ele está
feliz com minha reação. Ele está feliz por ter esse efeito sobre
mim. Outro suspiro deixa meus lábios enquanto ele
aperta meu mamilo.
— Valentina, — diz ele
com um gemido, — você é tudo
que eu quero.
Alternando entre beliscar e apertar meu mamilo,
ele trabalha meu corpo em um estado de necessidade
desesperada. A pontada de dor seguida pela carícia mais
suave é demais para suportar. Nenhum homem
jamais me tocou assim. Há tanta umidade que sua
mão está coberta. Leva tudo o que tenho para não me
esfregar em sua palma. Eu não preciso. Ele
pressiona a ponta do polegar no meu clitóris,
massageando em movimentos circulares. Seus dedos
hábeis abandonam meu seio atormentado para
começar a trabalhar no outro. Quando ele dá uma
leve palmada na lateral curva, fazendo-o saltar, um
jorro de calor líquido escorre do meu corpo e
cobre seus dedos.
Seus olhos se arregalam e suas pupilas dilatam. — Você gosta
disso.
Meus lábios se abrem e saem sons que não quero que escapem
da minha boca. Terminações nervosas na parte inferior do meu corpo
faíscam com eletricidade, e uma faixa invisível de fogo aperta meu
útero. Ele implode, puxando todas as minhas partes femininas
apertadas em meu núcleo antes de estalar e explodir do meu
clitóris. O tempo todo, eu observo seu rosto. Eu mantenho seus olhos
nos dele tanto quanto ele olha nos meus. Por um breve momento, ele
está exposto, e eu entendo por que está gostando disso. Meu prazer
dá a ele poder.
Com a mão nas minhas costas, ele pressiona a parte superior
do meu corpo em seu peito enquanto segura meu sexo na mão,
aplicando uma pressão suave, mas inflexível no meu clitóris
enquanto os tremores do meu orgasmo destroem meu corpo. Eu
tremo em seu aperto, minha energia gasta e meu prazer é
dele. Somente quando meu corpo fica quieto, ele para de atacar meu
clitóris. Ele mantém a mão entre as minhas pernas ainda enquanto
passa a palma da mão larga no meu cabelo e nas minhas
costas. Seus lábios estão quentes e secos enquanto planta
beijos do arco do meu pescoço até
o meu ombro. Sua respiração
é uma névoa de calor na minha
pele. Sua ereção é uma haste de aço que pressiona
contra meu estômago pela diferença de altura com ele
de pé e eu de joelhos, mas ele não dá a
mínima. Lentamente, ele me empurra de volta no colchão
e endireita minhas pernas. Ajoelhado no chão entre
as minhas pernas, ele beija primeiro meu clitóris e
depois minhas dobras, passando sua língua sobre a
umidade e lambendo-a até que eu esteja apenas
molhada de sua língua, mas não mais lisa.
Quando ele finalmente se levanta, limpa a boca
com as costas da mão. Um rubor queima minhas
bochechas.
Ele sorri e se inclina sobre mim para dar um
beijo firme no canto da minha boca. Meu cheiro é
almiscarado nele. Ele continua a plantar beijos
pelo meu corpo, se tornando mais áspero. Eu
ainda estou subindo do meu orgasmo quando ele começa a beliscar
meus mamilos e beliscar meu clitóris. Ele leva muito tempo para
levar meu corpo a um segundo orgasmo rápido, mas intenso. Sua
aspereza, em contraste com o primeiro orgasmo, parece um castigo,
mas não consigo pensar em um único motivo para isso. A casa dele
está impecável e eu fico longe da cozinha. No momento em que ele
termina comigo, está ofegando tão forte quanto eu. Ele não inclina o
rosto para longe de mim como estou acostumada, mas me puxa para
uma posição sentada na beira da cama enquanto suas mãos vão para
suas calças.
O ar sai dos meus pulmões.
Ele vai foder minha boca.

6
Valentina

VISÕES MINHAS DE JOELHOS no meio da estrada


para qualquer um ver fez minha garganta
apertar. Eu fecho meus olhos,
tentando visualizar um buraco
negro no espaço, qualquer coisa para que
eu possa escapar para um canto escuro da minha
mente.
— Abra seus olhos, — Gabriel comanda.
Eu obedeço. Eu não tenho escolha.
— Me dispa.
Ele abriu o botão da calça. Uma trilha de
cabelos surge sob as abas abertas. Minhas mãos
tremem quando abro o zíper. Estou no nível de visão
com sua virilha, e ele está se elevando sobre mim. A
diferença de força entre nós me sufoca. Ele pode
facilmente me fazer engoli-lo, e não haverá nada que
eu possa fazer.
— Me tome. — Sua voz está baixa e
calma. Não há nada de ameaçador nisso.
Lentamente, eu empurro o elástico de sua cueca para baixo em
seus quadris para liberar sua ereção. Ele é
impossivelmente grande. Livre de suas restrições, seu pau se contrai
e endurece mais. A crista é larga e lisa. As veias viris correm ao longo
do eixo espesso até onde a raiz é amortecida por bolas pesadas.
Ele não agarra meu cabelo e se força em minha boca, mas
simplesmente fica lá, me observando enquanto estudo seu
pau. Nunca vi um de perto. Eu tive Tiny na minha garganta, mas eu
deliberadamente nunca olhei para ele. Gabriel é lindo, uma obra de
arte.
Ele não se opõe quando eu deslizo um dedo sobre seu
comprimento da base até a ponta, então continuo com minha
exploração, acariciando a cabeça aveludada. Sou recompensada com
uma gota de umidade que escorre pela fenda. Em resposta, o calor
líquido se acumula entre minhas pernas, mesmo que eu tenha
acabado de ter dois orgasmos. Quando envolvo meus dedos em
torno dele, ele geme. Alto. Ele não tem medo de me deixar ver o poder
que tenho. As linhas profundas que cortam de seus quadris até sua
virilha me fascinam. Eu abandono seu pau para traçá-las
com meus dedos, surpresa com o quão duro o músculo
está por baixo. Uma cicatriz
branca percorre seu quadril,
cobrindo ossos e carne. Ele range
os dentes quando eu a rastreio, mas não diz
nada. Seu pau empurra quando eu corro minhas mãos
até a parte interna de suas coxas e seguro suas
bolas. Elas são macias e pesadas, se contraindo na minha
palma.
— Valentina, — ele geme, — me chupe logo ou
feche o zíper.
Ele está me dando uma escolha? A emoção
obstrui meu peito. Eu engulo e olho para cima para
pegar sua expressão. Ele está olhando para mim com
algo como esperança e aceitação. Ele vai aceitar tudo
o que estou preparada para dar.
Ele acaricia meu cabelo, sua grande mão
segurando minha nuca. —Leve apenas o que você
quiser.
Na confirmação verbal, meu medo desaparece. Ele vai me deixar
parar. Não vai usar isso contra mim. Eu lambo meus lábios para
umedecê-los, sem saber como proceder. Nunca fiz isso sem força.
— Como você quiser, — ele sussurra. — Não existe maneira
certa ou errada.
Eu me aproximo da beira da cama, segurando seu pau com as
duas mãos. Segurando-o perto da minha boca, eu estico minha
língua para prová-lo. Um grunhido estrangulado escapa quando eu
lambo a crista. Ele tem gosto de terra e mar, uma mistura de solo
fértil e ar salgado, e eu adoro isso. Eu lambo até a base para ver se é
a mesma, e quando eu chupo um testículo em minha boca, o gosto
inebriante se intensifica.
— Porra. Droga.
Ele enfia os dedos no meu cabelo, mas não puxa. Está me
segurando para apoio enquanto eu assumo o controle. O
conhecimento me dá mais poder e me torna mais valente. Percorro
toda a haste com a língua, usando minha saliva como lubrificante
para minhas mãos. Eu agarro sua circunferência com firmeza, uma
mão acima da outra, e movo meus punhos para baixo
enquanto empurro meus lábios sobre ele.
— Ah, porra. — O ar chia por
entre seus dentes. — Sim.
Eu o chupo em minha boca,
esvaziando minhas bochechas e passando minha
língua sobre a cabeça.
Ele enterra os dedos mais profundamente no meu
cabelo. — Sim, linda, assim mesmo. — Quando deslizo
minhas mãos para cima e para baixo em seu
comprimento onde minha boca não alcança, ele fica
ainda mais grosso em minha boca. Seu aperto no
meu cabelo aumenta, e sua bunda endurece. —
Retire se você não quiser engolir.
Não quero renunciar ao meu poder, ainda. Ele está
me deixando fazer o que eu quero com ele, e seu pau
está sacudindo na minha boca. Ele está perto. Eu
quero levá-lo até o fim. Há agonia em seus
olhos. Reconheço o olhar, conheço a
profundidade desse tipo de prazer. Eu senti em
suas mãos, lábios, língua e dentes. Abro minha garganta e o tomo
profundamente, respirando pelo nariz.
Sua mandíbula aperta quando ele grunhe de prazer enquanto
jatos quentes cobrem minha língua. Ele segura minha cabeça no
vício suave de suas palmas enquanto se empurra. Mantendo seus
quadris parados, ele me deixa sugá-lo até secar ao invés de se mover
entre meus lábios. Eu tomo cada gota como se eu merecesse,
bebendo o coquetel estonteante de êxtase masculino e poder
feminino.
Parecendo exausto, ele se inclina e inclina nossas
cabeças juntas enquanto recupera o fôlego. Ainda estou flutuando
em uma nuvem de satisfação calorosa sabendo que agradei um
homem como ele, quando ele inclina minha cabeça e aperta nossos
lábios. Ele me beija ferozmente, enredando nossas línguas e sugando
meu lábio inferior em sua boca. Quando finalmente me solta, estou
sem fôlego.
Seus olhos enrugam nos cantos. — Você tem um gosto bom com
meu esperma na sua língua.
Uma onda de calor sobe pelo meu pescoço e se
espalha pelo meu rosto.
Ele ri e beija minha testa. —
Feche o zíper.
Eu me curvo para puxar sua
cueca e calça. Há mais cicatrizes em sua perna, mas
não fico ali. Por enquanto, estou me concentrando em
ajustar as roupas sobre seu pau. Ele ainda está
semiduro. A sensação aveludada de sua pele quente é
agradavelmente erótica. Ele pega minha mão e a
afasta, terminando a tarefa de fechar o zíper
sozinho. Ele planta um beijo quente e úmido na
minha boca e me empurra para o colchão com uma
mão em volta do meu pescoço. Por um segundo ele fica
assim, me olhando, e então me solta.
— Ainda não, — ele diz, como se para si
mesmo. — Boa noite, Valentina.
Então, como na noite passada, ele se foi.
SÃO DEZ HORAS quando subo ao quarto de Gabriel para fazer
sua cama. Até agora, ele já teria terminado seu treino matinal e
banho. Ele estaria trabalhando em seu escritório. Quando estou
puxando os lençóis do colchão, a porta do banheiro se abre e ele sai
com uma toalha amarrada na cintura, o cabelo molhado e gotas
escorrendo pelo peito.
Eu engulo em seco e quase engasgo com minha saliva. O calor
se acumula na minha calcinha enquanto minha imaginação
completa a imagem escondida sob a toalha. Um lento sorriso se
espalha por seu rosto. Ele torce a cabeça, escondendo as cicatrizes
de mim, e vai até o vestiário.
— Devo fazer a cama? — Eu pergunto em voz baixa.
Ele se vira para me observar, deixando seus olhos deslizarem
pelo meu vestido, me fazendo sentir nua. — A menos que você tenha
outras ideias?
Seu sorriso se alarga quando um rubor aquece minhas
bochechas.
Eu limpo minha garganta. — Eu quis dizer que posso
voltar mais tarde.
Ele deixa cair a toalha, me
mostrando uma frente
completa de seu glorioso corpo nu.
— Não há nada que você não tenha visto, — diz
ele, — então não me deixe te impedir de trabalhar.
Ele está errado. A linha branca em relevo que corre
diagonalmente em seu joelho é nova para mim. Assim
como a marca circular cercada por linhas mais finas,
como uma teia de aranha, em seu pé. Ele parece
um espécime perfeito de Frankenstein, furiosamente
costurado e magnificamente duro. Não há um
centímetro dele que não seja cem por cento homem, de
todas as formas certas e erradas possíveis.
Por um momento totalmente embaraçoso, fico
paralisada, olhando para ele como uma idiota. É
Gabriel quem quebra o feitiço caminhando até uma
prateleira de camisas. Sua bunda parece
esculpida em mármore.
Minha respiração se agita enquanto eu forço meus olhos para
longe e continuo a tarefa de fazer sua cama. O tempo todo, estou
ciente dele. Ele veste uma camisa branca e a abotoa. Em seguida,
segue a cueca, calça preta e gravata prata. Ele se senta em um
banquinho para calçar meias e sapatos que parecem caros. Abre uma
gaveta e escolhe um par de abotoaduras, que encaixa sem
dificuldade.
Nunca vi um homem se arrumando. Há algo de íntimo nisso. É
como um privilégio que ele me deu, me permitindo assistir. Todo
vestido, ele sai do quarto, arrastando a palma da mão sobre minhas
costas ao sair. A carícia é tão leve, talvez eu tenha
imaginado. Sozinha, sem ninguém para ver, afofo seu travesseiro e
coloco meu rosto nele. Eu inalo seu cheiro, lembrando do gosto dele
em minha boca. Como é ser uma mulher de seu mundo, valorizada e
respeitada, e não uma empregada doméstica ou brinquedo
sexual? Estamos em mundos separados e nossos mundos não se
misturam.

PELO RESTO DO DIA, fico de


olho em Oscar. Sua micção
frequente para no final da tarde. É
seguro deixar ele sair do meu quarto. Além disso,
ele não pode ficar aqui o fim de semana todo quando eu
for embora.
Gabriel está fora quando meu turno semanal
termina. Estou nervosa para deixar o terreno, mesmo
que Magda tenha sido clara nas regras, mas também
estou ansiosa para ver Charlie e Kris. Enfio uma
muda de roupa e o recipiente com restos de comida
em uma sacola de supermercado e verifico se Oscar
tem comida suficiente antes de eu ir. Lá fora, encontro
Rhett na varanda.
— Oi. — Eu agarro a bolsa em minhas mãos. —
Estou de folga até segunda-feira.
— Eu sei.
— Vou precisar da nova chave do meu
apartamento.
— Você vai voltar para lá?
— Eu preciso amarrar as pontas soltas.
— Espere aqui. — Ele desaparece dentro e sai um pouco depois
com um molho de chaves que coloca em minha mão. — A grande é
para a fechadura principal e as duas pequenas para os bloqueios
superior e inferior.
— Obrigada.
— Você vai lá agora?
— Provavelmente amanhã. Primeiro vou ver meu irmão. — Eu
também quero visitar o túmulo de Puff. — Onde você enterrou Puff?
— Você não quer saber.
— Eu quero colocar flores em seu túmulo.
— Você não quer colocar merda lá fora. Na verdade, não tenho
certeza se você deve ir a qualquer lugar perto desse bairro.
Pelo olhar que ele me dá, estou com medo de que ele me impeça
de ir embora, então digo rapidamente. — Até segunda-feira.
Ele não responde, mas também não me impede. Quando ele
pressiona um código em seu telefone que abre o portão, eu corro
aliviada. Não há ônibus públicos nesta área, mas se eu
andar longe o suficiente, acabarei pegando a rampa de
saída para a rodovia onde posso
pegar um táxi de minivan. Eu
sinalizo para um após uma
caminhada de cinquenta minutos. Sou a única
garota branca na van e recebo comentários
desagradáveis sobre a cor da minha pele dos outros
passageiros, mas o motorista é gentil e me deixa sentar na
frente até que ele me deixe em Orange Grove.
Uma comunidade judaica povoa principalmente
a área por causa da sinagoga. Na Rocky Street, faço
uma pausa para alimentar os cachorros de rua com
os restos de comida antes de correr os últimos dois
quarteirões até a casa de Kris. Eu entro pela clínica
adjacente. Alguns clientes estão esperando na área de
recepção. Kris dirige um bom consultório, honesto
onde exerce a prática por amor. Ela cobra bem
menos do que deveria, e sei que trata muitos
animais de graça quando os clientes não podem
pagar pelos remédios ou pelas consultas. Ela
mal consegue sobreviver e me sinto mal por sobrecarregá-la com
meus problemas, mas não tenho mais ninguém.
Não há assistente. Ela não me substituiu ainda. Bato na porta
do consultório e abro.
Kris levanta o olhar de um Yorkshire Terrier e me lança um
sorriso. — Me pegue uma vacina enquanto você está aqui, tudo bem?
Eu esfrego minhas mãos na pia e entro na pequena sala dos
fundos onde ela guarda as vacinas. Ela está perdendo a cabeça,
então fico por perto e ajudo onde posso.
Depois das sete, ela dá uma tapinha no meu ombro e empurra
a cabeça em direção à porta. — Vá em frente. Charlie está na
casa. Eu sei que você está ansiosa para vê-lo.
— Obrigada. — Ofereço a ela um sorriso grato e corro pelos
fundos para a casa.
Charlie está sentado na frente da televisão na sala, vestindo
uma camiseta e shorts do Superman, sua franja caindo em seus
olhos.
Quando ele me vê, seus olhos se iluminam. —Va – Val!
Ele pula e me agarra, quase esmagando minhas
costelas. Às vezes, ele esquece sua força.
— Ei. — Eu tiro o cabelo de
seu rosto. — Como você
está? Kris está cuidando bem de
você?
— Ol - olha. — Ele aponta para uma pilha de
revistas em quadrinhos na mesa de centro. — Kris me deu
dinheiro para comprar.
— Isso é ótimo, — eu digo, mesmo que me
preocupe. A loja de quadrinhos fica do outro lado da
rua. Charlie tem que atravessar uma rua muito
movimentada para chegar lá. — Você comeu?
— Kris é uma boa cozinheira. Ela está fazendo
ma-macarrão e quei-queijo hoje à noite.
— Parece bom. — Amarro um avental na cintura
e começo a preparar o jantar e limpar a cozinha. Os
pratos sujos estão empilhados em todas as
superfícies. A lata de lixo precisa de uma boa
limpeza e o chão de uma lavagem. Kris nunca
foi organizada, mas ela passa todos os
segundos livres no consultório. Uma hora depois, a cozinha está
impecável e a sala e os quartos aspirados. Estou ocupada colocando
lençóis limpos nas camas quando Kris entra, parecendo arrasada.
— O jantar está pronto. — Puxo uma cadeira perto da mesinha
da cozinha onde Charlie já está sentado.
Ela olha em volta e balança a cabeça. — Você não precisava.
— Você está de brincadeira? Depois do que está fazendo por
Charlie?
— Sim. — Seus olhos estão sondando. — Precisamos conversar
sobre isso.
Eu olho para meu irmão e dou a ela um olhar penetrante. —
Depois do jantar.
— Certo.
Mais tarde, quando coloco Charlie na cama, pego a roupa limpa
da secadora e começo a dobrar. Kris pega duas cervejas da geladeira,
abre as latas e me entrega uma.
Ela se inclina sobre o balcão e apoia um pé na porta do
armário. —Então, gostaria de me contar sobre esse seu novo
emprego?
Eu tomo um longo gole da cerveja antes de enfrentar
ela. — Não há mais nada a dizer.
Seus olhos se estreitam
em mim. — Quanto tempo.
— Nove.
— Nove meses?
— Anos, — digo por trás da lata de cerveja.
Ela espirra o gole da cerveja que acabou de tomar no
chão limpo. —Jesus, Val. — Ela enfia a mão no bolso
da calça jeans e me encara com a boca aberta.
— Eu sei. Não é como se eu tivesse escolha. —
Não entro em detalhes difíceis.
— Espere. Você está me dizendo que será a
empregada doméstica dele pelos próximos nove anos?
— Sim. — Limpo a cerveja derramada com uma
toalha de papel.
Ela começa a andar de um lado para o outro. —
Como estão os estudos?
— Eu ainda vou continuar.
Ela para. — Você conseguirá?
— Eu vou ter que conseguir.
— É muito estudo. Muito estudo.
— Eu sei.
— Você assinou um contrato?
— Eu não preciso de um contrato. O papel não vale nada para
homens como ele. Sua palavra é suficiente.
— Como funciona este acordo?
— O salário que ele teria me pagado vai para saldar a dívida.
— Como ele poderia aprovar um empréstimo para
Charlie? Quero dizer, é o Charlie. De todas as pessoas. Deve haver
uma lei que impeça as instituições de conceder empréstimos a
pessoas com deficiência.
— Eu nunca declarei Charlie incompetente. Um grande
descuido da minha parte. De qualquer forma, combatê-lo com o
sistema jurídico não funcionará. Você sabe que todo juiz neste país
é corrupto. O homem com mais dinheiro sempre vence.
— Porra, Val, deve haver algo que possamos fazer.
— Olha, eu não posso mudar isso. Tenho que tirar o melhor
proveito que puder.
— Se você está trabalhando para ele por nada, como
você vai pagar seus estudos?
— Ele está me dando uma
mesada. Vai ser o suficiente para
pagar a parte que a bolsa não cobre, e eu meio que
esperava que você me deixasse trabalhar aos domingos.
—Você vai se desdobrar.
— Isso está vindo de você, Srta. Viciada em Trabalho.
Ela sorri. — Você sabe que farei de tudo para
ajudar.
— Eu pagarei pela comida e despesas de
Charlie. Eu não espero que você gaste com essas
despesas.
— Esqueça isso.
— Não está em negociação. — Eu hesito. — Nove
anos é muito tempo.
— Não se preocupe com Charlie. Ele é bem-
vindo aqui pelo tempo que for preciso.
— Obrigada, Kris. — Um grande peso sai de meus ombros. —
Não sei o que teria feito sem você.
— E quanto ao seu apartamento?
— Estou vendendo. Não faz sentido o manter se ele vai ficar
vazio.
— Boa sorte. Você lutará para o dar de graça.
Eu suspiro. — Eu sei. Ouça, sobre Charlie. — Eu torço a ponta
do meu tênis no chão. — Ele me contou sobre a loja de quadrinhos. É
uma estrada movimentada, Kris.
— Eu o ensinei a esperar o sinal verde. Fizemos algumas
rodadas de prática juntos. Você tem que deixar ir um pouco, dar a
ele um pouco de liberdade. Eu sei que você se sente protetora e é
compreensível, mas você tem que pressionar ele a ser o mais
autônomo possível.
— Eu só... — eu engulo. — Eu só não sei. Eu me sinto
responsável.
Ela deixa sua cerveja na mesa e pega meus ombros. — Não é
sua culpa. Foi um acidente. Você tem que deixar para lá.
Limpo as lágrimas indesejáveis em meus olhos e
desvio o olhar. — Eu sei.
— Ei. — Ela limpa meu rosto
com as palmas das mãos. —
Tudo vai ficar bem. Vai
funcionar. Você vai ver.
— Certo. — Só digo isso para acalmar Kris, porque,
uma vez que ela está no topo, não vai parar até acreditar
que me convenceu. Kris é a rainha do pensamento
positivo e, por isso, sou muito grata por ela ter me
dado um emprego e acolhido Charlie.
— Vamos. — Ela passa o braço em volta do meu
e me arrasta para a sala. — Vamos assistir a um
seriado estúpido e rir de nós mesmas como bobas.
—Eu não sei. — Eu me afasto. — Eu tenho que ir
para o apartamento.
— O que, agora? — Ela aponta para a janela. —
Está escuro como breu lá fora. Como vai para
lá? Não vou deixar você sair desta casa esta
noite. Você pode dormir no sofá. A propósito,
limpei sua casa e esvaziei a geladeira.
Lágrimas de gratidão escorrem pelo meu rosto. Eu realmente
preciso colocar uma rolha nele, mas é como se a parede da barragem
tivesse se quebrado.
— Agora. Agora. — Ela me abraça com força. — Amanhã é outro
dia.

EU TRABALHO O DOMINGO todo no consultório e depois de


comprar alguns mantimentos para estocar os armários de Kris, vou
para Berea em um táxi de minivan antes de escurecer. O agente para
quem liguei naquela manhã está me esperando na frente do prédio
quando eu chego. Fico pensando em Jerry, mas já vejo da rua que
suas janelas estão escuras. Quando saímos da escada no meu andar,
meu coração dá um salto. A porta está entreaberta.
— Espere, — diz o senhor idoso, me empurrando para o lado.
Ele tira uma pistola do cós da calça e abre a porta com o sapato.
O caos nos cumprimenta. Cada armário está aberto. A louça
quebrada está espalhada pelo chão. O colchão está
desfiado, a espuma saindo dos cortes no tecido. As
almofadas também foram
destruídas.
Ele abaixa a arma. — Alguma
coisa valiosa se foi?
Eu balancei minha cabeça. Não havia nada, exceto
nossos utensílios de cozinha. — Por que alguém faria
isso?
— Destruição. Eles não precisam de nenhum
outro motivo.
Estudamos a porta juntos. Não está quebrada.
— Os desgraçados arrombaram as fechaduras,
— diz ele, confirmando minha dedução.
Quando começo a varrer o vidro quebrado e a
porcelana, o agente inspeciona o espaço em
ruínas. Ele solta ums e ahs, testando as torneiras e
o botão para dar descarga.
— Tudo parece limpo, — ele finalmente diz,
— mas é difícil vender em Berea atualmente.
Meu coração afunda, mesmo que eu saiba que ninguém em sã
consciência vai comprar um lugar no coração do vale das drogas, e
quem vai arriscar aqui não paga aluguel. Eles simplesmente pegam
ou vandalizam.
— Você pode tentar? Eu realmente preciso do dinheiro.
— Não precisamos todos? E os móveis?
— Estou mandando uma loja de penhores buscar. — Kris me
deu o contato. Eles me ofereceram alguns dólares pelos nossos
pertences.
— Vou manter contato.
Depois que ele sai, me certifico de que a geladeira está vazia e
tomo um banho antes de desligar o gás. Amanhã terei corte de
eletricidade e água. Não preciso me preocupar com as contas
adicionais. O dinheiro irá para Kris para ajudar a pagar a parte de
Charlie nas despesas de manutenção. Esta noite é a última noite que
pretendo passar aqui. Eu nunca mais quero voltar. Quando terminar
de pagar a dívida de Charlie, vou me juntar a Kris em sua clínica e
conseguir um lugar para mim e para Charlie. Kris me prometeu uma
parceria completa quando eu me formar na escola
veterinária.
Demoro algumas horas para
limpar o apartamento, após o
que minha barriga roncando me
lembra que não como desde o almoço. Eu bebo um
copo d'água, mas as dores da fome não vão embora. Não
há nada nos armários. Os ladrões levaram toda a comida
enlatada e seca que sobrou. Tenho dez dólares na bolsa
da mesada que Gabriel me pagou, mas vou precisar
para o táxi. Viro o lado rasgado do colchão sobre a
estrutura da cama e arrumo a cama, tentando não
pensar em comida. Eu verifico se a porta está
trancada. A nova porta é robusta e vem com uma
fechadura no lado de dentro, que eu deslizo no
lugar. Isso me dá uma pequena quantidade de
segurança adicional.
Em algum momento durante a noite, há uma
tempestade. Fico deitada acordada, observando
os relâmpagos correrem pelo céu e ouvindo as
gotas caindo no telhado. Anseio por Charlie e
Puff. Uma segunda parte de mim gostaria que eles estivessem aqui
para que eu pudesse segurá-los em meus braços, enquanto a parte
lógica de mim está feliz por eles estarem livres deste inferno. É um
milagre estar aqui, sem amarras, que, apesar da minha dívida, tenha
um certo grau de liberdade. Isso me dá esperança. Talvez Magda tem
alguma justiça dentro dela. Meus pensamentos vão para Gabriel
enquanto adormeço, e meus sonhos são preenchidos com imagens
eróticas perturbadoras de seu corpo cheio de cicatrizes.

QUANDO O ALARME DO meu telefone toca às cinco, não dormi


muito, mas não posso correr o risco de chegar atrasada para o
trabalho. As gangues e os criminosos atuam principalmente à
noite. Nesse momento, a maioria deles terá desmaiado devido ao uso
de álcool ou drogas. Há poucas chances de encontrar algum
elemento desfavorável na rua. Depois de escovar os dentes e lavar
o rosto, coloco meu vestido limpo. Eu tranco a porta,
arrasto os sacos de lixo com nossas louças quebradas
para baixo e saio para as ruas.
Meus tênis batem
silenciosamente na calçada
enquanto eu evito os buracos cheios de água. O ar
está fresco depois da chuva, com vapor saindo do
asfalto. Há um silêncio após a tempestade, me deixando
em paz e calma, mas minha tranquilidade não dura muito.
Um pouco mais adiante na rua, uma figura alta
e esguia emerge entre dois prédios.
7
Valentina

MEU CORAÇÃO DISPARA no meu peito. Talvez ele não tenha


me visto. Eu agarro a bolsa contra o meu corpo, procurando uma
estrada lateral para entrar, mas é tarde demais. O homem vem direto
para mim. Eu conheço esse passo. Seus joelhos dobram ligeiramente
e seus braços estão bem abertos. Minha respiração acelera e meu
corpo começa a suar, mas eu levanto meu queixo e dou a ele um
olhar desafiador quando ele para na minha frente.
— Bem, agora, — diz Tiny, — se não é a Chapeuzinho Vermelho.
— Não tenho tempo para seus jogos.
Tento passar por ele, mas ele agarra meu braço.
— Sem tempo para Tiny? Nossa, você é uma burra arrogante
agora?
— Ao contrário de você, eu trabalho. Me deixe ir ou
vou chegar atrasada.
— Alta e poderosa, hein? Tiny ouviu
que você saiu. Tiny estava
vigiando seu apartamento,
esperando por você.
Suas palavras me abalam. Não o encontrei por
acaso. Ele esperou por mim.
— Tiny... — Eu quero que soe como um aviso, mas
há um chiado na minha voz.
— Você ainda deve a Tiny. Você sempre deve a
Tiny. Tiny já esperou o suficiente.
Ele começa a me arrastar pelo braço em direção
a um beco. Eu o chuto com meus pés e tento forçar
seus dedos abertos, mas seu aperto é como aço. O
pânico leva o melhor de mim. Desta vez é diferente. Se
ele fosse foder minha boca, o teria feito na rua, como
sempre.
— Tiny, não!
— Você pode gritar o quanto
quiser. Ninguém dá a mínima.
Ele me empurra pelo beco fedorento até o fim, onde a saída é
bloqueada por latas de lixo transbordando e arranca o saco plástico
de minhas mãos. Olhando para dentro, ele tira minha bolsa, a deixa
cair no chão a seus pés e joga o resto no monte de lixo.
— Venha aqui, vadia branca. — Ele assume uma postura ampla
e tateia sob meu vestido, arrastando as palmas das mãos suadas
sobre meu quadril e estômago.
Oh, Deus, vou ficar doente. — Não faça isso.
— Ou o que?
Meu estado indefeso me enfurece. A raiva transborda. Eu me
afasto e dou um soco na mandíbula dele o mais forte que posso. Por
um segundo ele perde o equilíbrio, mas antes que eu dê um passo
para longe, ele agarra meu braço e me joga contra a parede. Minhas
costas batem nos tijolos com um baque. Ele me dá um tapa com
tanta força que meus ouvidos zumbem.
— Puta.
Eu grito e arranho, meus dedos indo em direção aos olhos dele
enquanto meu joelho aponta para sua virilha, mas ele segura meus
pulsos acima da minha cabeça e pressiona meu corpo
contra a parede com seu peso.
— Quer lutar? — Ele sibila, o
ar repugnante de sua boca
soprando em meu rosto.
— Me deixe ir!
Ele ri e se mexe, me segurando com uma mão para
enfiar a outra na frente da minha calcinha. — O que você
fez com essa boceta, hein? — Seus dedos arrastam sobre
meu clitóris, separando minhas dobras.
Eu pressiono meus joelhos juntos, mas não
adianta. Ele mexe seu punho até que esteja alojado
entre as minhas pernas, forçando minhas coxas a se
abrirem.
Ele lambe meu pescoço, provocando um arrepio de
repulsa.
— Tiny vai te foder tão forte que
você vai esquecer seu nome.
Seu corpo superior me esmaga. Eu quase
suspiro de alívio quando ele puxa sua mão da
minha calcinha, apenas para gritar em
desespero quando ele empurra suas calças para baixo em seus
quadris.
Por favor não. Isso não.
Ele bate meus dedos na parede, mas quase não sinto a dor. Eu
preciso lutar. Eu luto como uma louca, o que só o faz rir. No
momento em que ele tira o pau da cueca e meu vestido está preso até
a cintura, já estou ofegante com a tentativa de lutar contra ele,
enquanto ele nem sequer começou a suar.
— Tiny. — O apelo cai dos meus lábios enquanto as lágrimas
escorrem pelo meu rosto.
— Sim, diga meu nome, vadia.
Quando ele se esfrega contra mim, eu mordo meu lábio com
tanta força que sinto o gosto de sangue. O medo que lutei
durante toda a minha vida finalmente me atinge, fazendo minha
garganta apertar e meu coração bater com batidas furiosas. É difícil
respirar. Acontece tudo de novo, o homem que me estuprou. Luto
contra as imagens que passam em minha mente, mas estou de volta
ao bar onde os homens me arrastaram, de costas na mesa de sinuca
enquanto o de voz profunda abre o zíper e os demais
assistem. Estou em uma zona onde não quero estar, mas
não posso voltar. A mão de
Tiny está em torno de seu pau
flácido, bombeando-o para a vida,
mas eu já sinto o rasgo no meu corpo e o sangue
escorrendo pelas minhas pernas.
— Tire suas mãos dela.
A voz que falou não faz parte da memória. Os homens
o aplaudiram. Eles não lhe disseram para remover as
mãos. Eles estavam filmando, rindo enquanto eu
chorava.
— Agora.
A calma mortal na voz de barítono é perigosa. É
como se esta manhã fosse tranquila antes da
tempestade. Tiny congela, trazendo minha atenção de
volta para ele, para o presente. Ele deixa cair o pênis
e levanta as mãos, olhando por cima do ombro
enquanto dá um passo para trás.
— Calma, cara, — ele diz em uma voz fina. — Você está
interrompendo nossa diversão.
— Diversão? — A figura alta e larga no escuro dá um passo à
frente, uma arma apontada para Tiny.
Seu rosto está nas sombras, mas sei que é ele. Eu conheço sua
voz, sua forma, seu cheiro, sua própria presença.
— Não parece que ela está se divertindo, — diz Gabriel.
— Uau. — Tiny ri nervosamente. — Você entendeu tudo errado,
aqui. Tiny não está fazendo nada de errado. Ela é a cadela de
Tiny. Não é, querida? Vamos, amor. — Ele sacode a cabeça na
direção de Gabriel. —Diga a ele.
Gabriel se move tão rápido que eu não o vejo chegando. No
primeiro minuto ele está parado na entrada do beco e no próximo ele
está na frente de Tiny, acertando-o no estômago com um soco que o
faz voar e cair na água da sarjeta. Gabriel passa por cima dele,
apontando a arma para sua cabeça.
— Oh, porra. — Tiny levanta as mãos. — Sinto muito, mano. Eu
não te reconheci.
Gabriel inclina o pescoço, estalando um osso. —
Peça desculpas.
— Sinto muito, Sr. Louw,
realmente sinto.
— Para ela, não para mim,
seu idiota.
Tiny lambe os lábios e olha para mim brevemente
antes de voltar seu olhar para a arma. — Desculpa. Tiny
não sabia que você e o Sr. Louw são amigos.
— Amigos? — Gabriel solta uma risada fria que
desaparece tão rapidamente quanto começou. — Ela
é propriedade.
Tiny engole em seco e começa a chorar. —
Porra, cara.
Estou tremendo em meu vestido, me sentindo
presa em um sonho muito ruim.
— Valentina. — A forma firme com que Gabriel
diz meu nome chama minha atenção. — Caminhe
até a rua e espere na esquina.
— Não, — Tiny diz, sacudindo o dreadlocks, catarro escorrendo
de seu nariz. — Por favor, porra. Não.
Gabriel vai atirar nele.
— Gabriel, por favor... — Dou um passo em direção a ele. Eu
preciso encontrar uma conexão com ele, argumentar com ele. — Por
favor, olhe para mim.
Ele não desvia o olhar de Tiny.
— Eu não vou te dizer novamente. Saia do beco e espere na
esquina.
Eu mesma começo a chorar, tocando o braço de Gabriel. — Ele
não vale a pena. Não.
Não posso viver comigo mesma sabendo que sou a razão da
morte de outro homem. Meu pai é o suficiente.
Gabriel segura minha nuca e me arrasta para mais perto, me
pressionando com força contra seu corpo sem mover sua mira de
Tiny. Ele beija minha têmpora com o olhar fixo no homem no chão e
fala baixinho em meu ouvido.
— Vai. Agora.
No mundo de Gabriel, há vingança e violência. A
violência pode ser dissuadida, mas nunca a vingança. Eu
sei como funciona. Se ele não
atirar em Tiny, Tiny terá que
matá-lo ou olhar por cima do
ombro para sempre. Eu não quero isso para
Gabriel. Eu não quero que ele carregue outra vida em
sua consciência, especialmente não por minha causa.
— Gabriel...
Quincy vem correndo pelo beco. Ele para em
seu caminho quando vê a cena.
Aproveitando, Gabriel me empurra na direção
de Quincy. — Leve ela para o carro.
Quincy não hesita. Ele me arrasta chutando e
gritando pelo beco, todo o caminho até o carro onde
Rhett espera. Ele me empurra para o banco de trás e
passa a mão no rosto. Rhett me lança um olhar
sombrio pelo espelho retrovisor. Eu me encolho no
canto, incapaz de controlar meu tremor. Espero
um tiro, mas não ouço nada. Gabriel usaria um
silenciador. Alguns segundos depois, ele sai do
beco, ajustando os punhos e caminhando a passos rápidos para o
carro, minha bolsa em suas mãos.
Assim que ele entra, Rhett dá o fora. Ninguém diz uma palavra
no caminho para casa. Gabriel coloca seu braço em volta de mim, me
segurando com força, e eu fecho meus olhos e choro baixinho pelo
ato terrível que ele cometeu por mim.

Gabriel

A ESSA HORA TODOS EM casa estão dormindo. Estacionamos


na parte de trás para que eu possa carregar Valentina para o quarto
dela sem ter que atravessar a casa inteira. Ela se opõe quando eu a
levanto em meus braços, mas eu não dou atenção a ela. Rhett e
Quincy voltarão para lidar com o corpo. Eles sabem o que fazer. Já
que aquele filho da puta do Tiny não estava conectado a nenhuma
gangue, não há logística ou recompensa para
resolver. Minha prioridade é Valentina.
Oscar pula da secadora e corre
à minha frente para o quarto
de Valentina para ficar de
guarda no parapeito da janela. Deito-a na cama e
tiro seus tênis antes de tirar o vestido. Vai para a lata de
lixo. Não quero que nada
daquele zambiano imundo toque em sua pele. Enfim, o
vestido está surrado.
Percorrendo as prateleiras de seu armário,
encontro uma camiseta, uma regata, um jeans que já
viu dias melhores e um short. Essas são todas as
roupas que ela possui? Faço uma nota mental para
examinar seus pertences mais tarde e pego a camiseta.
Ajudando-a a se sentar, eu a visto. Depois do que
aconteceu, não quero que ela se sinta vulnerável, e a
nudez fará isso.
— Que horas são? — Ela pergunta.
— Quase seis.
— Eu preciso me preparar para o trabalho.
Ela tenta se levantar, mas eu a empurro para baixo.
— Fique.
— Estou bem. — Ela olha para mim através de seus cílios
molhados, seus lábios tremendo.
Sim. Ela parece tudo menos que está bem, mas é obstinada e
preocupada em falhar em seu trabalho e, portanto, levar um tiro.
— Não se mova, — eu digo com autoridade suficiente para fazê-
la obedecer quando eu saio do quarto.
Na cozinha, sirvo uma dose forte de uísque e pego um sedativo
suave do kit de remédios. O remédio é natural e não terá efeitos
adversos com o álcool.
Sentado na beira da cama de Valentina, levanto sua cabeça,
coloco o comprimido em sua boca e coloco o copo em seus lábios. —
Beba.
Ela não discute. Sua obediência cega aquece meu interior. É um
grande passo, e não acho que ela perceba quanta confiança está me
dando.
Depositando o copo vazio no chão, pego sua mão na
minha. Seus ossos são delicados e finos em minha palma,
quebráveis. Há arranhões nos nós dos dedos, mas não
são profundos. Podemos nos
preocupar com isso mais
tarde. A visão dessas marcas
libera o monstro em mim, no entanto, e é preciso
algum esforço para me acalmar o suficiente para
perguntar. — Você quer falar sobre isso? — Sim, mas não
vou forçar. Não agora, pelo menos.
Ela põe a mão na testa. — Eu-Eu não me sinto
muito bem.
Meu corpo fica tenso, todos os
músculos ensinados. — O que há de errado?
— Eu não sei. Eu me sinto estranha.
— Me diga o que você sente.
— Tonta. O mundo está girando.
O álcool está fazendo efeito, mas em vez de
relaxar, está deixando-a bêbada.
— Quando foi a última vez que você comeu?
— Eu pergunto com cautela.
Ela levanta os olhos para o teto enquanto pensa. — Almoço.
Tento manter minha voz normal. — Ontem?
Ela agarra minha mão como se uma correnteza estivesse prestes
a nos separar. — Gabriel?
—É só o uísque que te dei para relaxar. Você precisa de
comida. Vou pegar algo para você comer.
— Você não precisa. Eu posso... — Há uma ligeira espessura em
sua fala.
— Eu sei que você pode, linda.
Eu abro seus dedos suavemente e volto para a cozinha para
vasculhar a geladeira. Buscando o máximo de carboidratos, gordura
e proteína que consigo encontrar, empilhei um prato com as sobras
de espaguete Carbonara e bacon e adicionei muito queijo. Enquanto
a comida está esquentando no micro-ondas, pego um garfo e um
guardanapo de papel. De volta ao quarto dela, eu a apoio contra os
travesseiros e torço a massa em volta do garfo. Quando eu levo para
sua boca, ela solta um protesto fraco.
— Abra, — eu digo.
Novamente, ela obedece.
Eu a alimento até que o prato esteja vazio antes de
puxá-la para o meu colo. — Você
deve dormir agora.
Ela balança a cabeça,
roçando a bochecha no meu peito. — Não
posso. Tenho trabalho a fazer.
— É uma ordem, não um pedido.
Suas pálpebras já estão pesadas. — Obrigada por me
salvar.
— De nada.
— Por que você estava lá?
Eu corro meu olhar sobre seu rosto, absorvendo
seus traços bonitos enquanto a verdade é registrada
em sua expressão.
— Você me seguiu? — Ela pergunta com
descrença, uma pitada de mágoa lançada na
mistura.
— Seu telefone, — respondi
categoricamente. — Eu plantei um rastreador
antes de devolver a você.
— Por quê? Você não confia em mim? Você acha que vou fugir?
Se ela souber a intensidade da minha obsessão, vai expor a
única fraqueza que não posso pagar. Vou perder meu poder sobre
ela, e isso não é algo que estou disposto a abrir mão, nunca, então
dou a ela uma versão distorcida.
— Você vale muito dinheiro para mim, Valentina. Estou
protegendo meus interesses.
A mágoa brilha em seus olhos e se arrasta para o sorriso
trêmulo que ela me dá. — Claro. Como eu poderia
esquecer? Quatrocentos mil Rands.
Eu deixei uma nota de advertência infundir meu tom. — Você
escolheu. Eu nunca forcei você.
— Você está certo. — Uma única lágrima escapa e corre por sua
bochecha. — Eu sinto muito.
Seu pedido de desculpas me pega desprevenido. — Sobre o que?
— O que aconteceu esta manhã.
Pego a gota com o polegar e coloco na boca, sentindo o gosto de
sua tristeza. — Não foi sua culpa. — Hesito, escolhendo minhas
palavras com cuidado. Não quero contradizer o que acabei
de dizer, fazendo ela se sentir responsável pelo que
aconteceu. — O que você estava
fazendo no seu apartamento?
—Tentando vender.
Só pode haver um motivo pelo qual ela se
arriscaria a fazer uma venda. O estado de seu armário
quase vazio me dá uma dica. — Você precisa tanto do
dinheiro?
Ela desvia o olhar. — Não faz sentido ficar vazio
no lugar se nem eu nem Charlie vamos morar lá.
Essa não é a questão. A questão é que ninguém
vai comprar um apartamento de solteiro em
Berea. Sem-teto e bandidos podem se mudar, mas não
vão pagar um centavo. Eu entendo, no entanto. Ela é
orgulhosa. Não quer me dizer por que quer o miserável
dinheiro que vale o apartamento. Dou dinheiro a ela
mais do que suficiente para alimentar e vesti-
la, sobrando muito para cuidar de seu
irmão. Não é que ela deva a ninguém. Verifiquei
com os senhores do dinheiro. Existe algo mais.
— Quanto você espera receber? — Eu pergunto.
— Dez, vinte mil, talvez?
Se isso faz parte de um esquema para me pagar mais rápido,
vou jogar agora. Com o tempo, ela vai entender que não vou deixá-la
ir. De qualquer forma, ela não vai ganhar um maldito dólar pelo
lugar. Se ela quiser vinte mil, dou a ela.
— Eu cuido da venda para você. — Ela não precisa saber que
eu vou comprar. — Você nunca vai voltar para aquela área. Está
entendendo?
— Ah não. — Seus olhos se arregalam. — Não estou tornando
meu problema seu. Eu posso fazer isso.
— Eu sei que você pode fazer isso, mas eu disse que vou lidar
com o agente. Fim de discussão. Existem muitos outros como o Tiny
por aí.
Ela fica quieta com a menção do nome do filho da puta. Muito
bem, Louw. Por que você não esfrega o rosto dela nele?
— Você atirou nele, não foi? — Ela pergunta em voz baixa.
Eu a abraço com mais força. — Ele nunca mais vai incomodar
você. — Tenho medo de perguntar, mas preciso saber se
devo chamar um médico. — Ele te machucou?
— Um pouco.
Eu fico frio, a fúria de
antes revivendo em minhas
veias. — Como?
— Quando ele me deu um tapa. Minhas mãos.
Isso explica os hematomas nos nós dos dedos. —
Algo mais?
— Não assim.
O alívio me fez fechar os olhos brevemente. —
Não foi a primeira vez que ele incomodou você. — Eu,
entre todas as pessoas, sei quando um homem é
proprietário, e Tiny agia como se ela fosse um território.
— Ele recolhia taxas para o nosso edifício. Não
importa agora.
É verdade. Só posso imaginar como ele a fez
pagar. O pensamento causa uma contração nervosa
na parte de trás do meu olho, fazendo meu globo
ocular pular na órbita.
— O que ele fez para você?
— Nada.
— Não parecia nada.
— Nem sempre foi assim. Hoje foi diferente.
A lâmpada acende na minha cabeça. — Ele fez você dar boquete,
— afirmo com naturalidade, mantendo a raiva agonizante da minha
voz, porque eu preciso saber.
— Eu não dei nada, — ela diz. — Ele usou minha boca, mas
eu não dei a ele uma única maldita coisa.
Aquele filho da puta desgraçado. Eu gostaria de ter mais
controle naquele beco, o suficiente para evitar atirar nele
imediatamente. Eu deveria ter torturado ele até a morte, começando
por cortar seu pau. A ironia da situação não passou
despercebida. Estou condenando um homem já morto a uma morte
lenta e dolorosa por algo que sou culpado por mim mesmo. Eu a
peguei e decidi ficar com ela. Eu como sua boceta todas as noites e
gozo em seu clímax. Enfiei meu pau em sua boca e empurrei minha
carga em sua garganta. Sim, não sou melhor do que o homem que
matei por ela hoje, mas ela é minha. Tiny não tinha o direito de
colocar as mãos sobre ela.
Virando minhas cicatrizes em direção às sombras,
abaixo minha cabeça e roço
nossos lábios. Eu quero
limpar a marca do pau e de todos
os outros homens de seus lábios. Eu pressiono
meus lábios na boca que aquele filho da puta do Tiny
abusou Deus sabe quantas vezes.
— Pronto. — Apesar do meu humor sombrio, tento
manter as coisas leves. — Beijos sempre melhoram.
Um sorriso curva seus lábios. Ela parece
tão inocente olhando para mim assim. Depois do que
aconteceu com ela, a enormidade do sexo oral pesa
sobre meus ombros. Ela é minha como nenhuma outra
pessoa foi, nem mesmo minha ex-mulher. Quando
tomei posse de seu corpo, também me comprometi a
tomar conhecimento de seus sentimentos. Estou
treinando o corpo dela para me querer, porque Deus
sabe que sou muito feio para inspirar desejo
espontâneo em uma mulher, muito menos
amor, mas ela precisa entender que chupar meu pau não é
obrigatório.
Eu aliso minha mão sobre seu cabelo. — Você nunca mais terá
que fazer isso. Para ninguém. Nem mesmo para mim.
Ela levanta a cabeça para olhar para mim, seus olhos castanhos
suaves e arregalados. — Não era a mesma coisa. Com você, eu
queria.
O álcool solta sua língua, mas também a faz falar a verdade. Um
sentimento estranho esmaga meu peito. Gratidão. É a primeira vez
na minha vida que sinto gratidão por alguém.
Sem saber o que fazer com a emoção, eu a embalo em meus
braços até que ela adormeça. Por muito tempo eu a abraço, até que
Marie está prestes a chegar. Colocando seu corpo mole no colchão,
eu a cubro com o edredom e coloco Oscar na cama para lhe fazer
companhia. Vou direto para o meu escritório para ligar para o meu
investigador particular. Prefiro fazer ligações confidenciais em uma
sala onde não há escutas todos os dias.
Anton atende no primeiro toque. — Gabriel, — diz ele
jovialmente, —o que posso fazer por você?
— Preciso de um relatório detalhado sobre a
atividade financeira de Valentina
Haynes e tudo o que puder
sobre a história dela.
— Filha de Marvin Haynes?
— O primeiro e único.
— Eu estou trabalhando nisso. Quando você precisa
disso?
— Ontem.
— Não sei por que ainda pergunto.
Estou prestes a tomar um banho quando Rhett
volta.
— O apartamento foi arrombado, — diz ele. —
Falei com o agente que a Valentina encontrou
lá. Aparentemente, o lugar estava virado de cabeça
para baixo.
Por que diabos alguém roubaria a casa dela
quando está sob nossa proteção? É um ato
estúpido que só um idiota em uma missão
suicida arriscaria.
— Alguma pista? — Eu pergunto com força.
— Não. Deve ser uma invasão aleatória, talvez um ladrão que é
novo no bairro e não sabe nada sobre a hierarquia.
Verdade. Existem milhares de assassinos e ladrões por aí. Nem
todo mundo conhece as famílias ou como operamos. Mesmo assim,
sinto cheiro de rato e não gosto disso.
Dou uma tapinha no ombro dele. — Descanse um pouco.
Ele ficou comigo a noite toda. Se a reunião de negócios no
sábado não tivesse passado da hora, eu estaria em casa antes de
Valentina sair para o fim de semana. Fiquei irritado por não poder
vê-la antes de ela sair por duas noites e um dia. Eu a rastreei
por telefone até Orange Grove e, quando ela voltou para Berea,
passamos a noite em frente ao apartamento dela, estacionado em
uma rua próxima. Tive sorte de verificar o rastreador quando o fiz,
ou não teria notado que ela estava se movendo, sendo atacada em
um beco sujo por aquele zambiano imundo. Eu não esperava que ela
fosse embora tão cedo. Meus guarda-costas devem pensar que sou
louco, mas são muito sábios para comentar. Eu poderia ter
arrombado sua nova porta novamente e arrastado ela
para um lugar seguro em casa, mas quero que Valentina
tenha uma ilusão de liberdade.
Magda quer que ela tenha
esperança, mas eu quero que ela
seja feliz. De repente e inexplicavelmente, é
importante para mim.

Valentina

JÁ PASSA DO MEIO-DIA quando eu acordo


assustada. O gelo enche minhas veias quando a
memória desta manhã inunda minha mente. Gabriel
atirou em um homem por minha causa. Eu sei que não
é o primeiro homem que ele mata, e não será o último,
mas eu não queria ser responsável. Se vou funcionar
hoje, não posso pensar nisso. Empurrando a
memória sombria da minha mente, coloco um
uniforme e faço uma trança no cabelo.
Marie ergue os olhos quando entro na cozinha, seu rosto
franzido em uma carranca.
— Senhor Louw disse que você está doente. Aparentemente,
Carly também. Deve ser uma virose passando pela casa. Arrumei as
camas, mas é melhor você cuidar da roupa.
Pego a cesta de roupas e passo por ela para pegar as roupas
sujas dos quartos. Antes de chegar ao quarto de Carly, vozes
acaloradas vindo pela porta aberta me param no meio do caminho.
— Pai, vamos lá, eu tenho idade suficiente para ir a um
encontro.
— Não com um menino que não conheço de Adam.
— Você quer conhecer cada garoto que me convida para
sair? Jesus, pai, eles estão com muito medo de você para vir à nossa
casa. Posso muito bem me tornar uma freira agora e acabar com isso.
— Cuidado com a língua, mocinha.
— Todas as meninas da minha classe vão em encontros. É
apenas um filme.
— Eu disse não.
— Vou parecer uma idiota se for sozinha. Todo
mundo vai pensar que eu não consegui um encontro.
— Se essa é sua única
motivação para querer ir com
ele, você não está fazendo isso pelo
motivo certo.
— Papai!
— Se for realmente tão importante, vou chamar
o garoto dos Hills para ir com você.
— Você é mau e cruel! Eu não gosto de Anthony
Hill. Eu gosto de Sebastian.
— Eu não dou a mínima. Não confio em um
homem que não conheço e não conheço Sebastian.
— Você está arruinando minha vida! — Carly sai
furiosa do quarto, os olhos cheios de lágrimas. — Te
odeio!
Ela desce correndo as escadas, seus soluços
audíveis até a porta da frente bater atrás
dela. Quando eu olho ao redor da porta, Gabriel
está no meio do quarto, seus olhos fechados e
sua cabeça voltada para o teto.
— O que você está fazendo? — Magda diz atrás de mim, me
fazendo pular. — Espionagem?
— Lavanderia. — Eu levanto a cesta.
— Vá em frente, então.
Saio do caminho dela e carrego a máquina de lavar, mas não
consigo parar de pensar em Carly. Em alguns aspectos, ela é uma
pirralha, mas eu sinto por ela. Me lembro de como foi quando meu
pai me disse com quem eu me casaria e que nunca teria permissão
para sair com outros meninos. Na época, parecia que meu mundo
havia terminado.
Mais tarde, quando lavo as janelas, vejo Carly sentada à beira
da piscina, com o rosto coberto de lágrimas. Sirvo um copo de
limonada e levo para fora.
Deixando-o na mesa ao lado dela, eu disse. — Lamento que você
esteja chateada.
Ela cruza os braços. — Eu tenho certeza de que você sente.
— Ele está apenas sendo protetor.
— Ele é um pé no saco.
Minha mãe sempre abriu o caminho para mim com
meu pai. — Por que você não pede a sua mãe para falar
com ele?
Ela bufa. — Como se
ela fosse ajudar. Ela é dez vezes
pior.
— Quando é esta grande noite?
— Sexta-feira.
— Talvez ele mude de ideia.
— Se é isso que você pensa, você não conhece
meu pai.
Olho fixamente em seu rosto infeliz, me vendo
mais jovem, quando já sabia que nunca teria amor,
não o tipo de amor pelo qual as pessoas se
casam. Talvez seja a futilidade da minha vida, da minha
própria existência infeliz que me faz deixar escapar. —
Você quer que eu fale com ele?
Ela levanta a cabeça, os lábios entreabertos. —
Você poderia?
— Não posso garantir que ele vai ouvir,
mas posso tentar.
Ela vira o rosto para a piscina, olhando para a água azul com
olhos vazios. — Eu acho que você é minha única chance. Ninguém
mais vai tentar.
— Tudo bem. Agora se anime. O mau humor te dá rugas.
Um sorriso quase passa por seus lábios.

Gabriel

ESTOU DEBRUÇADO SOBRE as informações que Anton enviou


sobre Valentina, as coisas gerais que são fáceis de encontrar, quando
o objeto de minha pesquisa entra em meu escritório.
— Com licença, você tem um minuto?
Baixando o relatório, eu a examino. Ela está pálida. — Se
sentindo melhor?
— Sim. — Ela fixa o olhar no tapete e mexe os pés. — Obrigada.
Ela está nervosa. — O que é, Valentina?
— Mais cedo, lá atrás, — ela aponta para uma
direção geral, — não pude deixar de
ouvir a discussão.
Eu me inclino para trás na
minha cadeira e estreito meu olhar. —Com Carly?
— Não é da minha conta, mas...
— Certo, não é. — Carly é minha filha, e quaisquer
problemas que eu tenha como pai são privados. Ao meu
tom, seus olhos se arregalam. Eu posso praticamente
ver o medo sangrando neles. Fazendo um esforço
consciente para suavizar meu tom, digo. — O que
quer que você queira dizer, tenho certeza de que tem
boas intenções, mas sua opinião é indesejada. — Eu
viro meu rosto para a tela do computador, não a
dispensando, mas mostrando que ela não tem mais
minha atenção total.
Por um momento, ela não diz nada. Eu acredito
que ela vai fugir, mas então ela levanta o queixo
e olha para mim de sua escassa altura.
— Gabriel.
Tudo que eu quero é jogá-la sobre a mesa e transar com ela,
mas nisso, eu tenho que mostrar a ela o lugar dela.
— É senhor quando eu não estou em cima de você.
Suas bochechas ficam rosadas, mas ela se mantém firme, sua
coragem linda me deixando quente em volta do meu colarinho e duro
em minhas calças.
— Senhor, eu prometi a Carly que falaria com você. Você pode
fazer o que quiser comigo, ouvir ou não, mas não vou quebrar minha
promessa.
A cadeira raspa no chão quando eu a empurro para trás e fico
de pé. — Eu não vou te dizer de novo, mantenha seu nariz fora
do meu negócio.
A bainha de seu vestido treme, seus joelhos devem estar
tremendo, mas ela não recua. — Você está cometendo um erro.
Dou a volta na mesa e paro na frente dela. — Estou, agora?
— Você deve deixar Carly decidir com quem ela quer sair.
— Você saberia.
— Sim.
— Você não é mãe. Até que seja, guarde sua opinião
para si mesma.
Ela estica o pescoço para me
olhar nos olhos. — Não, eu
não sou uma mãe, mas eu estive
lá. Eu sei como é.
A parte zangada de mim se acalma quando a
imagino como uma jovem mulher pedindo permissão ao
pai para sair em um encontro. Pelo relatório que acabei de
ler, sei que ela tinha apenas treze anos quando ele
morreu, jovem demais para namorar, mas estou
curioso.
— Meu pai decidiu com quem eu ia casar
quando fiz dez anos. Não importava o que eu queria ou
como me sentia. Minha mãe já estava juntando um
enxoval para o dia em que eu faria dezoito anos. Meu
pai faleceu cedo, me salvando daquele destino, mas
se ele ainda estivesse vivo, eu estaria muito, muito
longe daqui.
Não há nenhum lugar longe o suficiente
que ela pudesse ter corrido. Marvin a teria
encontrado. Ele era um pequeno peixe em um grande lago, mas fazia
parte da turba. Cada homem no negócio estaria procurando por ela.
Minha curiosidade aumentou ainda mais, perguntei. — Com quem
você deveria se casar?
— Lambert Roos.
Faz sentido. Teria fortalecido as conexões de Marvin, mas ouvi-
la dizer isso não me parece bem. Lambert é um velho idiota. Sinto
vontade de matar ele agora só porque uma vez ele considerou se casar
com ela. O que levanta as questões sobre as quais venho pensando
há uma hora. Por que ninguém da família acolheu os órfãos
Haynes? Agora eu quero saber, por que a família Roos não levou
Valentina e Charles quando sua mãe morreu? A família de Lambert
deveria ter reivindicado eles e criado Valentina até ela atingir a idade
de se casar. Muitas coisas sobre Valentina não batem.
Ela me observa com seus olhos grandes. — Não a afaste. Dê a
ela motivos para confiar em você, não para fazer as coisas pelas suas
costas. Carly é sua própria pessoa. Ela merece fazer suas próprias
escolhas, mesmo que sejam erros.
Tudo o que ela diz é verdade, mas meu lado protetor
é muito forte.
— É apenas um encontro, —
ela continua. — Você não pode
trancá-la em uma gaiola de vidro
para sempre. Ela tem que encontrar o próprio
caminho na vida.
— Não tenho certeza se posso.
— Claro que você pode. Pelo menos conheça o garoto
antes de julgar. Convide ele. Dessa forma, você pode
decidir se ela está segura com ele.
Eu considero suas palavras. Não sou o melhor
pai do mundo, mas quero o melhor para Carly.
— Você sempre pode matá-lo se ele se comportar
mal, — ela diz com uma sugestão de sorriso.
É a maneira dela me dizer que aceitou o que
aconteceu esta manhã, não que eu precise de sua
aceitação. Não estou preocupado com ela me
delatando também, porque sei o quão
desesperadamente ela quer manter seu
irmão vivo. De qualquer forma, isso não fará nenhum bem a ela.
Magda praticamente é dona da polícia.
Eu suspiro e passo a mão no rosto. — Eu tenho que discutir
isso com a mãe dela.
A esperança ilumina as profundezas sombrias de seus olhos. —
Posso dizer a ela que você vai pensar sobre isso?
— Bem. — Enfio as mãos nos bolsos. — Vou pensar sobre isso
e eu mesmo contarei a ela.
— Obrigada, — ela diz, como se eu apenas tivesse concedido a
ela liberdade para namorar, o que me traz outra questão incômoda,
a virgindade de Valentina.
Não vou conseguir segurar muito mais tempo. Em algum ponto,
meu controle vai quebrar. Só de pensar nisso fico dilacerado, mas
logo terei de enfrentar a decisão que estou adiando há muito tempo.

QUANDO VALENTINA ESTÁ limpando as escadas


mando Marie fazer compras com Quincy e vou até o
quarto de Valentina. Exceto por
algumas peças de roupa, um
par de chinelos e uma muda de
calcinha branca simples, há xampu com aroma de
framboesa, loção corporal, desodorante e absorventes
internos em seu armário. Não há cosméticos, joias ou
sapatos, nem mesmo um grampo de cabelo.
Na prateleira de baixo, encontro uma pilha de
textos e cadernos. Pelos títulos, deduzo que eles
tratam da ciência veterinária. Será que Valentina é
uma estudante universitária? Isso deveria ter me
ocorrido antes. Ela é inteligente, determinada e
ambiciosa. Faz sentido que queira continuar seus
estudos. Enquanto estou olhando para sua letra
elegante, sou atingido por outra emoção estranha.
Orgulho.
O orgulho que sinto por Carly é seu direito
de nascença, mas isso é diferente. Esse orgulho
é conquistado. Um pedaço da frieza sempre
presente em mim abre caminho para uma agradável onda de calor.
Valentina quer ser veterinária. Ela será uma médica veterinária
brilhante e linda. É por isso que ela precisa do dinheiro. Concluí um
MBA depois do colégio e sei o quanto é difícil. Ela não vai continuar
com este trabalho e seus estudos. Não por muito tempo. A parte de
mim que quer que ela seja feliz quer que ela tenha isso, mas vou ter
que encontrar um jeito de contornar Magda.
Estou gostando demais da sensação de calor em meu peito para
deixá-la ir, mas quando meu olhar varre seus pertences, um novo
sentimento amortece meu orgulho. Demoro um pouco para
identificar isso.
Porra. Eu sinto compaixão. Grande compaixão
empática. Sempre soube que Valentina iria destruir meu corpo, mas
o que diabos ela está fazendo com meu coração?

Valentina

— QUAL? — Carly mostra um


vestido rosa sem alças e um
azul com um corpete justo.
Eu paro de passar a ferro para considerar as
opções. — O rosa. — Gabriel com certeza se oporá se ela
exibir muito de sua figura.
Ela coloca o rosa na pilha de engomar e ergue o
cabelo no topo da cabeça. — Para cima ou para
baixo?
— Você tem um pescoço bonito. Eu diria para
cima.
Ela praticamente salta da copa, me deixando com
um sorriso. Estou feliz que Gabriel finalmente
concordou em deixá-la sair depois de conhecer
Sebastian e seus pais. Não era preciso ser um
neurocirurgião para ver que Carly estava
apaixonada pelo menino. Ele tem todas as
qualidades para enfraquecer os joelhos de uma
estudante, incluindo jogar no time de rúgbi da escola.
Termino de passar a toalha da mesa, escondendo um bocejo
atrás da minha mão. Estou exausta. É uma batalha manter meus
olhos abertos depois das onze. Todas as noites, Gabriel vem até
mim. Meu corpo aprendeu não apenas a responder a ele, mas
também a precisar do prazer que ele me dá como eu preciso de
comida e água. Quando meu corpo atinge o colchão, começa a
desejá-lo. Estou molhada e dolorida antes mesmo de ele entrar pela
minha porta. No momento em que ele me acaricia e beija, estou
implorando por libertação. Às vezes, ele me permite retribuir o
favor. É sempre a mesma rotina. Quando sou eu o fazendo gozar, ele
deixa tudo comigo. Eu encontro conforto e poder nisso, também acho
que preciso de mais. Tenho vergonha de admitir que quero mais de
Gabriel do que sexo oral. Estou fantasiando em tê-lo dentro do meu
corpo, o sentindo comandar um ritmo dentro de mim com seu
pau. Eu não deveria querer isso, não dele entre todas as pessoas. Eu
anseio pelo que ele faz ao meu corpo, mas o odeio por ter esse efeito
em mim. Eu nunca quis um homem antes ou tive sonhos eróticos,
mas agora acordo encharcada e necessitada todas
as manhãs, meus sentidos superconscientes dele
enquanto ele se move pela
casa. Ontem à noite, eu estava
prestes a pedir a ele para me foder,
mas meu orgulho não permite. Talvez me controlar
com orgasmos poderosos seja o suficiente para ele, mas
não é o suficiente para mim. Ele não apenas me fez uma
prostituta, ele me tornou uma gananciosa.
— Reunião na cozinha, — diz Marie,
interrompendo minha linha de pensamento.
Eu deixei meu cabelo cair em volta do meu rosto
para esconder minhas bochechas vermelhas. —
Estou indo.
Magda está esperando por nós com uma prancheta
na mão. Como de costume, ela salta direto para o
negócio. — É o aniversário do meu filho daqui a
quatro meses, e vamos dar uma festa em
casa. Estou contratando fornecedores e
servidores, mas a ajuda de todos é
necessária. Se certifique de estar disponível no
sábado e domingo, 10 e 11 de março. Vai acabar tarde, então, Marie,
você vai ter que dormir aqui. Você pode dividir o quarto de
Valentina. Alguma pergunta?
Marie e eu balançamos a cabeça.
— Bom. Vou te dar mais detalhes mais perto da hora.
Quando ela sai, tentando parecer casual, pergunto. — Quantos
anos ele tem?
— Trinta e seis.
— Ele teve Carly jovem.
— Ele se casou com a Sra. Louw quando os dois tinham apenas
dezenove anos. Eles tiveram Carly no ano seguinte.
— Foi um casamento arranjado?
Marie deixa suas costas retas. — Você não deve fazer perguntas
sobre assuntos que não lhe dizem respeito.
Ela está certa, mas tenho uma curiosidade insaciável sobre meu
guardião. Estou arrasada em admitir que quero saber tudo o que há
para saber sobre ele.
— A mesa precisa ser limpa, — ela diz asperamente.
Eu arrumo a sala de jantar e levo a comida intocada
para o meu quarto. Na minha folga, carrego a torta de
carne para fora e fico confortável
no muro baixo que separa o
jardim da piscina.

Gabriel

ANTES DA CHAGADA DE Valentina eu nunca


ficava na cozinha. Nunca tive motivo para
isso. Agora, eu gravito para essa parte da casa com
frequência crescente. O desejo de ver Valentina me
leva até lá, mas ela não está em lugar nenhum. Marie
não consegue esconder seu choque com a minha
presença, ainda mais quando ligo a chaleira e eu pego
uma caneca do armário.
— Posso fazer alguma coisa, Sr. Louw?
— Eu cuido disso.
Ela me olha com cautela enquanto coloco
um saquinho de chá na caneca.
— Posso preparar uma bandeja para você, — diz ela, — ou pedir
que Valentina a leve para o seu escritório.
— Onde está Valentina?
— Pausa para o almoço. — O jeito como ela franze o nariz me
diz que nossa empregada não é uma de suas favoritas. Qualquer
ressentimento que ela tenha deve ser dirigido a mim. A empregada
veio voluntariamente, mas apenas porque me certifiquei de que não
havia outra escolha. — Devo chamá-la? — Marie pergunta, me
olhando com olhos de falcão.
— Não. — Valentina precisa descansar. Suas costas estão
dobradas sob os fardos que Magda empilha sobre ela.
— Como quiser. — Seu desânimo é risível. Se ela não fosse uma
funcionária leal, eu a teria chutado na hora.
Como se sentisse minha discórdia, ela se afasta rapidamente,
se ocupando em cortar vegetais. Eu realmente não quero o maldito
chá, mas se eu abandonar a tarefa, Marie saberá meu motivo oculto
para entrar na cozinha.
Eu ando até a janela enquanto espero a água ferver e paro de
repente. Valentina está sentada na parede com um
prato nas mãos.
Eu fico mais frio que o
necrotério.
Bruno está fora. Quincy me
disse dez minutos atrás que o estava deixando
correr livre para fazer exercícios.
— Valentina! — Minha voz atravessa a janela, porque
ela levanta a cabeça com uma carranca.
Saltando para a ação, corro o mais rápido que
posso mancando até a porta dos fundos, meu corpo
em modo de luta. Saio da casa em velocidade recorde,
mas minha voz não atraiu apenas a atenção de
Valentina. O cão Boerboel vira a esquina, suas orelhas
puxadas para trás em alerta. Meu coração para. Meus
pulmões entram em colapso, tornando impossível
respirar.
— Quincy! — Onde diabos ele está? —
Valentina!
Não tenho tempo para elaborar meu
aviso. O cachorro a vê e ataca.
8
Gabriel

As chances são a favor de Bruno para chegar até Valentina


antes de mim, e não estou com a minha arma. Eu coloco meu peso
acima de meu esforço, mas minha deficiência me torna muito lento.
Mais um segundo e Bruno está próximo ao muro. Visões
horríveis surgem em minha mente. Estendo o braço para Valentina,
tento me colocar entre ela e o cachorro, mas Bruno está aos pés dela,
com o queixo enorme indo direto para o tornozelo delicado
dela. Estou prestes a atacar e estrangular o animal quando o fato de
que ele está lambendo sua perna em vez de rasgá-la se registra em
minha mente frenética. Eu mal consigo me impedir de me chocar de
frente com os dois. Minhas mãos estão tremendo e minha pele está
úmida. A poderosa descarga de adrenalina cai tão rapidamente
quanto explodiu, me fazendo sentir fisicamente doente. Eu engulo
várias vezes para suprimir a vontade de vomitar. Enquanto
estou lutando para segurar minhas entranhas, Bruno
baba em cima dela.
Valentina me lança um
olhar confuso, a incerteza
rastejando em seus olhos. Ela coloca na
parede um prato com uma porção meio comida de torta
de carne e empurra para longe dela, como se a comida
fosse a causa da minha reação. Bruno coloca as patas
dianteiras na parede e se alonga. Quando ela coça
atrás de sua orelha, ele fecha os olhos e inclina a
cabeça ao toque dela.
— Está tudo bem? — Ela sussurra em voz baixa.
Devo parecer como me sinto, um maldito louco.
Quincy vem correndo da parte de trás, correndo
quando me vê. Ele para com as mãos na cintura,
olhando entre Valentina e eu. — O que está
acontecendo?
Eu não posso olhar para ele agora. A raiva é
tão grande que posso arrancar sua cabeça de seu
corpo. Em vez disso, eu travo o olhar com Valentina.
— Que porra você está fazendo aqui fora quando o cachorro está
solto?
Ela para de acariciar Bruno e abaixa a mão. — Ele não se
importa comigo.
— Ele é um cão de guarda, não um cãozinho de estimação.
A raposa se atreve a me desafiar. — Ele parece amigável o
suficiente para mim.
— Ela está certa, — Quincy acrescenta rapidamente. — Bruno
gosta dela. Ele não vai atacar.
— Você, — eu me viro para ele com gelo no meu tom, — deve
verificar se ninguém está fora antes de você deixar ele solto.
— Não é culpa de Quincy, — ela diz. — Eu não disse a ele que
estava saindo.
Ela está encobrindo Quincy? Com o rescaldo da adrenalina
ainda queimando em minhas veias e minha perna doendo como uma
cadela de tanto esforço, isso é o máximo que posso aguentar.
Eu agarro seu braço e a puxo da parede, pegando-a pela cintura
antes que ela caia. — Dentro.
Seu rosto empalidece com o meu tom, mesmo que o
comando não tenha sido mais alto
do que um sussurro.
Quincy levanta as palmas
das mãos. — Gabriel, pega leve.
— Você está me dando uma ordem?
Ele recua. — Claro que não.
— Da próxima vez, siga as instruções, — eu rosno.
Não me importo que Marie pare para olhar para
nós enquanto arrasto Valentina atrás de mim pela
cozinha. Eu não paro até chegar à academia.
Empurrando-a para dentro, eu tranco a porta e me
viro para encará-la. Ela envolve os braços em volta de
si mesma, me olhando com calma, mas há cautela em
seus olhos.
Por um momento, eu apenas olho para ela. O
pensamento de qualquer coisa acontecendo com ela
deixa um gosto ácido, amargo e horrível na minha
boca. A intensidade da ideia me choca
profundamente. Eu a odeio por isso. Eu a odeio
pela angústia paralisante que sofri por ela. É uma sensação
malditamente doentia e me deixa muito fraco. Gosto do meu sexo
selvagem e adoro as lágrimas de uma mulher, e é por isso que durmo
com mulheres que podem ter meu dinheiro o suficiente para levar o
que vem ao fazer sexo comigo. Mas Valentina? Eu nunca quis
machucar ela até este momento. Quando a castiguei com o cinto, foi
para evitar que Magda a matasse. Sim, me excitou, mas me
arrependi. Agora, eu quero bater até que ela grite. Eu quero puni-la
pelo que sinto.
Eu abro os botões dos punhos da minha camisa e os dobro para
trás duas vezes. Seus olhos seguem o movimento, mas ela não diz
nada. Só quando vou até o banco de peso e me sento é que ela
encontra sua voz.
— Gabriel, por favor.
— Venha aqui.
Ela não se move.
— Se eu tiver que ir te buscar, você vai sofrer o dobro do que
planejei para você.
Lentamente, ela se move para mim, seus olhos
passando rapidamente entre meu rosto e meu colo.
Eu aponto para meus
joelhos. — Curve-se.
— Gabriel... — Seu lábio
começa a tremer.
— Você colocou sua vida em perigo, e sua vida é
minha, o que significa que você colocou minha
propriedade em risco.
— Nada aconteceu.
— Não me faça dizer de novo.
Ela se aproxima até que seus joelhos roçam
minhas coxas.
— Curve sobre meu colo e pressione as palmas
das mãos e os pés bem plantados no chão. Mantenha
as pernas abertas.
Ela se abaixa no meu colo de forma que sua
cabeça pende para um lado das minhas coxas e suas
pernas para o outro. O banco é baixo o suficiente
para que suas mãos e pés toquem o chão.
Eu puxo seu vestido até a cintura e movo sua calcinha para
baixo em suas coxas. — Se você se mover, sua punição será
triplicada.
Sua bunda lisa e dourada e sua boceta gordinha e rosa estão
expostas para mim. Eu aproveito meu tempo para admirar seu corpo
perfeito, sua beleza imaculada e inocência imaculada. Meu pau se
agita e fica impossivelmente duro. Eu levanto minha mão e miro.
Smack.
Minha palma pousa na curva dura de sua nádega esquerda. Ela
se sacode no meu colo, empurrando sua barriga no meu pau duro.
Smack.
A segunda marca sua outra bochecha. Ela respira fundo, mas
não cede a mim. Seu silêncio é seu desafio. Não dando a ela tempo
para respirar novamente, eu dou uma sucessão de golpes firmes em
sua bunda até encontrar meu ritmo. Eu o mantenho leve o suficiente
para não machucar, mas forte o suficiente para colorir a pele
dela. Ela se contorce e choraminga, mas não quebra sua
postura. Sua bunda aperta com cada tapa. Eu continuo até que
nenhum pedaço de sua pele fique sem marcas. Quando
começo a repetir o padrão em sua pele vermelha, ela
finalmente quebra. Um grito alto
escapa de sua garganta. Eu
continuo impiedosamente, não lhe
dando alívio até que seu corpo afrouxe.
Conforme ela relaxa sob meu toque, seus gritos se
tornam diferentes. Os choramingos se transformam em
gemidos. Ela murmura meu nome e esfrega seu corpo no
meu pau. Eu a recompenso parando os golpes e
alcançando entre suas pernas para segurar seu
sexo. Ela está encharcada. Meu pau sobe de
satisfação contra a restrição do meu zíper. Não
planejei levar aqui, mas não consigo evitar. A luta saiu
completamente de mim. Tudo o que resta é a luxúria
corrosiva. Eu acaricio suas dobras por um tempo,
revelando como elas incham ao meu toque, antes de
esfregar meu dedo médio em movimentos circulares
sobre seu clitóris. Eu gosto do ponto de vista que
tenho sobre ela. Quando curvo minha cabeça,
sua boceta está tão perto que posso sentir o
cheiro de sua excitação. Isso me deixa louco. Suas belas partes
femininas se contraem e a parte inferior de seu corpo treme. Suas
coxas e braços tremem enquanto ela grita seu orgasmo. Eu a deixei
ficar com isso e muito mais. Continuo esfregando e beliscando seu
clitóris até que ela me implora para parar, mas não desisto até ter
certeza de que ela não aguenta mais. Só então ajusto suas roupas,
ajudo-a a se levantar e a puxo em meus braços com sua cabeça
aninhada contra meu peito. Enquanto ela está soluçando, eu acaricio
sua bochecha, enxugando as lágrimas enquanto elas
caem. Cada molécula do meu corpo está ciente dela. Estou
intoxicado com a mulher que seguro em meus braços, a mulher que
eventualmente terei que matar. É então que reconheço a verdade. Eu
não vou matá-la. Eu nunca iria. Ela está destinada a ser minha.
Quando ela para de chorar, seco suas lágrimas com as palmas
das mãos. — Nunca mais faça isso comigo.
Ela pisca. Está confusa. Inferno, eu também estou. Bater nela
me deixa quente. Segurar ela me faz esquecer porque eu bati nela em
primeiro lugar. Com seus braços em volta do meu pescoço ou sua
bunda amortecendo meu pau, não consigo pensar
direito. Tudo o que sei é que não posso perdê-la.
— De agora em diante, quero
que Quincy treine você com
Bruno.
Ela levanta a cabeça para olhar para mim.
— Você não tem permissão para sair se ele estiver
solto, a menos que me dê uma demonstração que prova
que você pode lidar com ele.
— Ele não vai me atacar.
— Ele mordeu um invasor antes. Porra,
Valentina. — Eu passo a mão pelo meu cabelo. —
Nem mesmo Magda arrisca, a menos que ele esteja
fechado nos fundos.
— Por que você mantém um cachorro se ele é tão
perigoso, mesmo para sua própria família?
— Proteção. As pessoas que querem entrar com
força o suficiente acabarão encontrando uma
maneira.
— Pessoas más também envenenam um
cachorro.
— Ele é treinado para não comer nada além do que Quincy dá.
— Eu estudo seus olhos marejados. — O que você fez com ele? Como
você o fez ficar mole?
— Eu removi um espinho de sua pata.
—Só isso?
—Não é nada difícil. Você apenas tem que mostrar a ele quem
tem autoridade. Você não pode ter medo. Os animais sentem medo.
Parece muito comigo. Sem surpresas aí. Sou um animal, na
melhor das hipóteses. Eu escovo meus lábios sobre seu cabelo,
inalando seu doce perfume de framboesa. — Minha lição foi clara o
suficiente para você ou você precisa que eu repita?
— Não, — ela diz rapidamente. — Entendi.
— Você tem medo de mim?
— Por quê? Você sente isso?
— Sim, — eu digo gravemente. Eu quero, e vou encorajar isso,
mesmo que seja apenas para usar seu medo como uma coleira,
segurando-a perto de mim. Eu a coloco de pé. — Vou dizer a Quincy
para reservar algum tempo mais tarde hoje.
Ela põe o cabelo atrás da orelha.
— Você precisa de um momento?
Ela dá um aceno
agradecido. — Por favor.
Eu dou a ela a privacidade de
que precisa para se recompor. Depois de
providenciar o treinamento de cães com Quincy, eu me
distraio pondo em dia os negócios e então acesso os
registros financeiros que Anton me enviou por e-
mail. Valentina ganhava um salário na Clínica
Veterinária da Rocky Street. Quando ela disse que
era assistente, presumi que fosse
do tipo secretaria. Isso explica a roupa branca da
primeira noite no Napoli. Os pedidos de débito saíram
de sua conta de água e eletricidade, que ela interrompeu
ontem. Os extratos de seu cartão de crédito mostram
as despesas normais com alimentação e itens
essenciais. Além disso, Valentina não é uma
gastadora. Não que ela tivesse meios. Não há
luxos, nada das coisas que as mulheres
gostam, nem mesmo um tubo de batom. Todos
os meses, ela retira uma quantia substancial em dinheiro, e é sempre
a mesma quantia, até o último centavo.
Eu ligo para meu banqueiro privado e ordeno que vinte mil seja
transferido para a conta dela. Em seguida, coloco o agente na linha
e ofereço a ele uma comissão de cinco mil Rands para transferir a
propriedade de Berea para o meu nome. Ele está feliz em
obedecer. Em primeiro lugar, ele sabe quem eu sou. Em segundo
lugar, ele sabe que, de outra forma, não receberá um centavo pelo
apartamento. Eu providencio para que os documentos de
transferência de propriedade necessários sejam entregues. Pelo bem
de Valentina, a venda deve parecer autêntica.
Com as finanças em ordem, ligo para o gerente do clube Napoli.
Gostaria de falar com o ex-vizinho de Valentina sobre o roubo, e Jerry
não voltou para casa desde que a levamos com seu irmão. O gerente
me garantiu que Jerry não voltou, então avisei que estou procurando
por ele. Quem destruiu o apartamento de Valentina vai pagar. Deixo
a tarefa mais desagradável para o final, ligando para
Lambert Roos. O telefone toca por um longo tempo sem ir para o
correio de voz. Parece que vou ter que fazer uma visita ao
Lambert.
Só quando fico mais
acomodado de novo e reflito
sobre o episódio desta tarde é que
me lembro do almoço que Valentina nunca
terminou. Por ordem estrita de Magda, Marie não vai
servir a comida que prepara para a equipe. Valentina está
comendo nossas sobras? Maldição. Uma emoção
desconfortável se lança em meu coração. O aperto no
meu peito não cessa. Pego nossos registros de
pedidos de supermercado. Valentina está vivendo de
maçãs Granny Smith e macarrão instantâneo
barato. Sinto muitas coisas para distinguir um do
outro. Sinto pena, preocupação e raiva de mim mesmo
por não descobrir a verdade antes. Ela está morrendo
de fome bem debaixo do meu nariz.
Isso não vai funcionar. Eu preciso dela
saudável. Ajusto o pedido e eu mando um bilhete
para Marie. A partir de agora, Valentina vai
comer o que eu decidir.
Valentina

HÁ UMA CAIXA COM meu nome na cozinha quando eu chego


da lavagem do pátio.
— Isso é para você, — diz Marie, secando as mãos em um pano
de prato.
— Para mim? — Eu levanto as abas para olhar para dentro.
Existem carnes, queijos, ovos, vegetais, frutas, água
engarrafada e sucos. Em uma caixa menor, encontro uma variedade
de delicatessens, incluindo azeitonas, nozes, óleo de cozinha
prensado a frio e chocolate amargo. Deve haver algum engano.
— Eu não pedi isso.
— É do Sr. Louw. — Ela me examina. — O que quer que você
tenha feito, ele ficou muito feliz.
Eu não deveria me sentir culpada, mas um rubor aquece
minhas bochechas. Tenho vergonha da minha pobreza. Sempre
tive. O gesto de Gabriel apenas me lembra da diferença
entre nós. A gentileza me deixa irracionalmente triste e
inexplicavelmente zangada. Não sou
um caso de caridade de
ninguém. Vou devolver tudo,
mas, por enquanto, desembrulho na geladeira
para evitar que a comida cara estrague.
Quando Gabriel chega ao meu quarto, luto contra o
orgasmo que ele me força, fazendo tudo ao meu alcance
para não gozar, mas é uma batalha perdida.
Eventualmente, o prazer assume. Meu corpo cede e
entrega o que ele quer. Seu poder sobre a parte física
de mim é completo. Ele tirou minhas defesas. Não
posso permitir que ele tire meu orgulho de mim.
Depois, ele me puxa para seus braços. Sua voz é
gentil, mas severa. — O que há de errado?
— Nada.
— Quanto mais você lutar contra mim, mais
forte vou empurrar.
Eu abaixo meus olhos. — A comida... não
aprecio o gesto.
— Ah. — Ele diz isso como se de repente entendesse tudo o que
está acontecendo na minha cabeça. — Olhe para mim.
Eu obedeço. De má vontade.
— O que você é para mim, Valentina?
— Um investimento, — eu mordi.
— O que eu faço com meus investimentos?
— Cuida deles.
Ele passa o polegar na minha bochecha. — Eu gosto de cuidar
de você. Isso é tão ruim?
Sim, droga. Quero ser mais do que o investimento de alguém. —
Você não pode me forçar a comer.
—Sim eu posso. Você pode comer o que eu digo ou ser
alimentada à força. A escolha é sua, mas vou me agradar se você
aceitar sem discutir.
Fico chocada com o quanto quero agradar a ele. O que diabos
está errado comigo?
— Tudo o que você precisar, — ele continua, — quero que me
diga.
Só posso ficar olhando para ele, não é o que está
mudando entre nós, mas o equilíbrio está mudando.
Ele passa o dedo indicador
nos meus lábios. — Há algo
que você gostaria de me dizer
agora? — O ar de expectativa que paira em torno
dele o faz parecer vulnerável, como se tivesse mais a
perder do que eu nesse estranho jogo que estava
acontecendo entre nós.
— Não, — eu resmungo, sem saber o que ele
quer de mim.
Como eu esperava, minha resposta o desaponta,
mas ele não insiste no assunto. Simplesmente me
beija até que meu desejo cresça novamente antes que
ele se levante e desabotoe o cinto.

Gabriel
O QUE EU ESPERAVA de Valentina? Que se abrisse
comigo? Por que é importante para mim que ela me fale sobre seus
estudos por conta própria, de livre vontade? Eu não tenho uma
resposta. Eu só sei que quero ouvir isso dela. Até que ela admita, não
direi que descobri a verdade.
Além de ficar de olho nos hábitos alimentares de Valentina, a
preocupação com o encontro de Carly domina o resto da minha
semana. Na sexta à noite, coloquei homens em volta do
cinema. Discretamente, é claro. Mesmo assim, não relaxo até que
minha filha esteja em casa sã e salva, mais borbulhante do que
nunca. Se Sebastian colocasse um dedo nela, meus homens teriam
agido, e estou feliz que não tenha chegado a esse ponto. Carly vem
ao meu escritório para dizer boa noite. Ela me surpreende com um
beijo atípico na minha bochecha e um abraço.
Quando a casa fica quieta, vou até o quarto de Valentina. É uma
rotina pela qual anseio, um ato no qual já estou viciado. Meus passos
batem desigualmente no chão da cozinha. Meu mancar está mais
pesado esta noite. Há chuva no ar. A umidade faz minhas juntas
doerem.
Minha respiração para quando eu abro a porta
dela. Ela está espalhada na cama,
nua. Sua pele dourada é
impecável, exceto pela minúscula
mancha sob o seio esquerdo. A pequena marca de
imperfeição só aumenta seu fascínio. Em seu sono, ela
parece mais vulnerável e inocente do que quando me olha
com seus olhos grandes e assustados. Suas dobras já
brilham com a excitação que a condicionei a ter.
Caminhando para a cama, eu fico olhando para
ela. Normalmente, minha presença é suficiente para
acordá-la, mas ela está cansada, ultimamente. Muito
cansada. Não ajuda eu roubar uma hora de seu tempo
de sono, mas tenho muito pouco controle no que diz
respeito a Valentina. Aproveito mais um momento
para estudar seu corpo. Gosto de olhar para ela
quando está dormindo. O ato de voyeur é invasivo,
mas me excita e alimenta uma parte sombria de
mim.
Depois de alguns segundos, ela começa a se mexer. Suas
pálpebras tremem e seus cílios se levantam. Eu li sua expressão
quando ela acordou. Primeiro, há reconhecimento e depois
desejo. Não há mais medo ou resistência. Ela está pronta para a
próxima etapa.
Mantendo minhas roupas, eu me estico ao lado dela na cama,
me levantando no cotovelo. Imediatamente, ela abre as pernas. O ato
de submissão me deixa tonto de desejo. Se eu tivesse permanecido
de pé, ela teria se sentado de joelhos para mim, as pernas abertas,
assim como eu ensinei a ela. Eu a recompenso com um beijo suave,
minha língua atravessando seus lábios e acariciando os dela
enquanto estou brincando com seus seios. Eu posso ficar bêbado
com seus gemidos. Eu quero me afogar em sua excitação, mas tenho
outros planos para sua boceta esta noite.
Eu corro minha mão para baixo em seu estômago para seu
sexo. Eu acaricio a ponta do meu dedo médio para cima e para baixo
em sua fenda, trabalhando a umidade em seu clitóris. Quando ela
está encharcada em sua própria umidade, eu aperto minha boca
sobre a dela e coloco o primeiro dedo em seu canal
encharcado. Ela é macia como veludo e molhada pra
caralho. Tão quente. Seus olhos
se abrem e ela se engasga na
minha boca. Eu bebo o som como
um viciado, engolindo avidamente os gemidos que
se seguem quando eu torço meu dedo algumas vezes.
Quando o doutor Engelbrecht a examinou, ele me disse
que não há membrana, não é uma ocorrência incomum
em virgens, então não deveria haver sangramento,
mas droga, ela é apertada. Chupando seus lábios em
minha boca, eu dirijo para casa, enterrando meu
dedo todo o caminho para dentro, e então fico parado
enquanto a estico. Desta vez, ela geme alto em minha
boca. Eu não me importo se ela gritar. O quarto dela é
muito longe para qualquer um na casa ouvir, mas eu
quero beber seus sons de prazer como eu bebo seus
orgasmos. Eu quero engolir sua essência de todas
as formas sensoriais possíveis para carregar ela
dentro de mim. Eu quero que ela seja uma
parte de mim no sentido mais literal.
Ela está ofegando na minha boca, sugando o oxigênio dos meus
pulmões e me abastecendo com respirações rápidas de êxtase. Eu
tomo tanto quanto dou, bebendo seu ar como um vampiro. É uma
batalha de respirações, uma sucção e exalação, um dar e
receber. Colocando minha mão livre em sua testa, eu aliso seu cabelo
para trás em uma carícia calmante, preparando-a para o que está
por vir. Quando ela começa a respirar com mais facilidade pela
minha boca, aceitando apenas o ar que eu escolho dar a ela, eu puxo
meu dedo e empurro de volta. Suas paredes internas tremem ao meu
redor. Eu dirijo para dentro e para fora, encontrando um ritmo que
combina com o subir e descer de seu peito. Meu polegar encontra seu
clitóris, pressionando para baixo enquanto eu enrolo o dedo dentro
para acariciar o ponto macio sob seu osso púbico. Seus quadris
sobem em minha direção, perseguindo meu toque, então eu dou a
ela mais, um pouco mais forte, um pouco mais rápido.
A parte inferior de seu corpo treme. Eu quero fazê-la voar alto
pra caralho. O pensamento faz minhas bolas subirem em meu
corpo. Quando a primeira vibração de um espasmo atinge meu dedo,
eu deslizo minha palma de sua testa sobre seus olhos para
fechar seu nariz com o polegar e o indicador. Antes que
ela tenha tempo de registrar
minha intenção, eu começo a
fodê-la com meu dedo com toda a
seriedade, batendo nela com força o suficiente com
a palma da minha mão para deixar seu clitóris rosa.
Eu sugo a vida de seu corpo com minha boca
enquanto retribuo com minha mão. Suas pernas fazem
uma tesoura. Sua bunda se levanta para fora da
cama e os dedos dos pés enrolam para dentro. Então
ela começa a lutar. Ela tenta torcer a cabeça no meu
aperto enquanto empurra meus ombros. Percebendo
que não é páreo para minha força, ela para. Minha pele
queima deliciosamente onde suas unhas deixam longos
cortes em meu pescoço. Ela morde minha língua. O
gosto metálico de sangue cobre meus lábios e me
deixa selvagem. Mais um segundo e seu corpo
estremecem, como se ela tivesse tomado um
choque de mil volts. Posso possuir sua vida por
mais alguns segundos antes que ela desmaie,
mas não quero ir tão longe. Eu só quero que ela tenha o prazer. Mais
dois segundos e ela cai mole, levando a foda implacável do meu dedo
em sua boceta sem lutar mais. Ela não faz nada além de aproveitar
o prazer que forço para fora dela, me permitindo controlar sua
respiração.
Rendição total.
Eu afasto meu nariz e boca, mantendo nossos lábios separados
por um fio de cabelo. Ela suga o ar frio da noite com um suspiro
rouco, seu pescoço arqueando com a intensidade da ação. Ondas de
choque ondulam por seu abdômen, se dissipando em sua boceta. Eu
mantenho sua boceta no aperto de meu dedo médio, que ainda está
dentro dela, e meu polegar, que está pressionando seu clitóris, até
que os tremores passem. Sua boceta parece rechonchuda e madura
do meu treino. Beijo seus lábios uma última vez, traçando minha
língua sobre um ponto onde ela se mordeu durante a luta, e me
movo para baixo em seu corpo até que minha língua encontre suas
dobras.
Ela estremece quando empurro para dentro para provar seu
clímax. É exclusivamente Valentina. Ela tem um gosto
cru e bem-amado, e eu tenho um desejo chocante de
prová-la com meu esperma em
seu corpo. Estou além de mim
mesmo com a
necessidade. Ela protesta com um gemido manso
quando eu empurro suas coxas largas e empurro
minhas mãos sob sua bunda, cavando meus dedos nos
globos carnudos para abri-la. Eu fico olhando para sua
boceta. Ela é mais do que um prazer. Ela é a comida
de que preciso para sobreviver. Enterro minha
cabeça entre suas pernas e devoro sua carne. Eu a
devoro como um homem faminto, sem desculpas e
sem misericórdia.
— Gabriel, não mais. Por favor.
Eu a ignoro sua súplica. O negócio de encontrar
um homem, um homem bonito, para tirar sua
virgindade me deixa no limite. Eu vou dar a ela um
homem bonito apenas desta vez, mesmo que
pareça como cortar meu coração com uma faca
cega, mas que se foda, eu a possuo. Eu preciso
mostrar a nós dois depois de tudo o que vai acontecer, que ela ainda
será minha. O prazer dela é meu. Tê-la é meu vício.
Eu a faço gozar mais uma vez com minha boca e duas vezes com
minha mão. Quando termino, ela está desossada. Eu nem tenho
certeza se ela está consciente. Me sento ao lado dela e a arrasto
contra meu corpo. Cruzando meus braços ao redor dela, eu a seguro
até cair em um sono assombrado.

Valentina

EU ACORDO COM UM peso na barriga e no peito. Gabriel está


envolto em mim, totalmente vestido, exceto pelos sapatos. É a
primeira vez que ele fica depois de me fazer gozar. Um rubor de corpo
inteiro aquece minha pele quando me lembro do que ele fez na noite
passada. Meus seios ficam pesados e meu clitóris começa a
latejar. Foi carnal. Mortal. Em algum lugar entre o último orgasmo e
Gabriel me acariciando, eu desmaiei, cansada demais
para levantar um olho. Cuidando para não me mover, eu
me deleito com o conforto de estar
em seus braços quentes. O sol
mal nasceu, manchando as
paredes com um brilho dourado. Não tenho que
enfrentar a realidade ainda, que ele é o homem que
detém o poder sobre minha vida. A vida de Charlie. Eu
mordo meu lábio enquanto reconheço a dolorosa
verdade. Eu gostei do que ele fez. Muito. Assim que
superei meu pânico inicial, me entreguei a ele,
confiando que ele me manteria segura, e ele o fez.
Gabriel se move, seu aperto em mim cada vez
mais forte. Sua respiração não muda, mas ele arrasta
o queixo sobre meu queixo e beija minha orelha. Sua
barba irrita minha pele, me tornando ciente de sua
masculinidade de uma forma áspera e agradável.
— Bom dia, linda. — Ele mordisca o lóbulo da
minha orelha e passa a palma da mão sobre os
arrepios que surgem na minha pele. — Café?
Gabriel está me oferecendo café? Eu me viro para encará-lo,
tentando ler sua expressão, mas seu rosto está em branco.
Sem esperar por uma resposta, ele gira as pernas para fora da
cama e fica de pé. Não perco a vacilada que ele tenta esconder
enquanto coloca seu peso na perna machucada. Sua camisa branca
está amarrotada e seu cabelo preto bagunçado pelo sono. Ele está
lindo. Quero dizer a ele o quanto estou grata por não ter me deixado
na noite passada, o quanto eu precisava de seus braços em volta de
mim depois da maneira intensa como ele tratou meu corpo, mas ele
manca até a porta e desaparece antes que eu possa formular as
palavras.
Tenho mais dez minutos antes que meu alarme
toque. Aninhada sob as cobertas, me sinto repleta e estranhamente
feliz. Um pouco depois, Gabriel retorna com uma xícara de café
fumegante, o aroma de boas-vindas enchendo meu quarto.
Eu me apoio nos travesseiros para pegar a xícara dele. —
Obrigada. — Não tenho certeza do que mais dizer. É um ato tão
inesperado.
— Leite, dois açúcares, — diz ele.
Ele sabe como eu bebo meu café? Eu pisco para ele,
não tenho certeza se devo
perguntar, mas ele não me dá
uma chance. Ele limpa o polegar
sobre meu lábio inferior, sobre a marca onde eu me
mordi, e arrasta seus olhos aquecidos até os meus. Pela
maneira como seu pau endurece, ele está pensando sobre
a noite passada.
Ele verifica o relógio e afasta a cabeça de mim. —
Eu estarei fora esta noite. Não vá embora amanhã
sem se despedir.
No minuto em que ele sai do meu quarto, o ar
muda. Um vazio frio se expande em meu
peito. Precisando de um pouco de calor, seguro a xícara
entre minhas mãos. Permito que seu ato de bondade
aqueça meu coração e preencha meus espaços
vazios. Ele é uma contradição de sensações, um tipo
muito ruim de bom.
Gabriel

QUANDO ENTRO EM meu escritório depois do almoço, Helga


está sentada em minha cadeira. Como diabos ela passou pela
segurança?
Eu fecho a porta. — Como é que você entrou?
— Oi para você também. — Ela se inclina para trás na minha
cadeira e cruza os tornozelos na minha mesa. Seu vestido vai até as
coxas, expondo meias-liga pretas. — Calma. Sua mãe me deixou
entrar.
Vou ter que falar com Magda. Pelo bem de Carly, não convido
minhas companheiras de cama para casa. Vê-la me lembra que não
fodi uma mulher há muito tempo, desde que trouxe Valentina.
— Por que você veio? — Me aproximo da mesa, irritado com sua
presença. — Você conhece as regras.
Ela faz beicinho. — Eu sinto sua falta.
— Carly está em casa, pelo amor de Deus.
— Você não ligou. Não é como você.
Eu cruzo meus braços e fico olhando para ela. Não
devo explicações a ela. Nós transamos
quando estamos com
disposição, e pronto.
—Eu preciso de você, garanhão.
—Eu já disse antes, não me chame assim.
Ela descruzou as pernas e coloca um salto de cada
lado da minha mesa. Sem calcinha. Sua boceta está nua,
raspada como eu prefiro. A postura ampla me dá uma
visão privilegiada dos produtos oferecidos.
— Me diga como devo te chamar, garoto feio.
Normalmente, Helga teria minhas bolas em um
nó com esse ato. Agora, eu a teria inclinado sobre
minha mesa. Eu teria batido em seu traseiro antes de
foder sua boca inteligente, mas não hoje. Meu pau não
se mexe. Nem mesmo um tique.
— Estou ocupado.
— Só vai demorar cinco minutos.
Eu sorrio. — Você me conhece melhor que
isso.
— Certo, — ela me dá um sorriso malicioso, — trinta se você
fizer isso uma rapidinha.
— Você tem que sair.
— Está me expulsando?
— Não me obrigue. Não será agradável para nenhum de nós.
Ela estreita os olhos. — Quem você está fodendo?
— Ninguém.
— Vamos. Eu conheço você. Você não pode passar um dia sem
sexo, muito menos semanas.
Não tenho tempo para essa merda. Dou a volta na mesa e paro
ao lado da cadeira, intimidando-a com meu tamanho e altura. — Vou
te pedir com educação uma última vez.
Ela agarra minha gravata e me puxa para baixo ao seu nível. —
Você não me assusta. O que quiser dar, eu aguento.
Uma batida na porta nos interrompe, mas ela não solta nem
interrompe o olhar. Eu vou ser um idiota de primeira classe. Eu dou
a ela um sorriso calculado.
— Você não aguenta.
— Me observe, — eu sussurro.
— Pode ser sua filha.
Carly nunca
bate. Provavelmente é Quincy
ou Rhett. — Entre, — eu chamo
em voz alta.
Os olhos de Helga ficam grandes. Agora, ela deve
saber que eu nunca blefo. Ela junta os joelhos e abaixa o
vestido, mas não antes que o visitante que abre a porta
tenha um vislumbre de sua boceta.
Rio alegremente, viro a cabeça para ver quem é
o sortudo espectador e congelo. Valentina está
parada no batente da porta, uma pilha de envelopes
brancos na mão e choque em seus olhos.
9
Gabriel

— EU SINTO MUITO, — Valentina diz. — Eu não sabia que você


estava ocupado.
Eu liberto minha gravata das mãos de Helga e me endireito, não
perdendo a expressão curiosa de Helga. Tenho que ser cuidadoso.
Helga é perceptiva. Levantando uma sobrancelha para Valentina, eu
a encorajo a continuar.
Ela engole e segura os envelopes. — Sua mãe me mandou trazer
esta correspondência para você.
— Deixe na minha mesa.
Ela se aproxima desviando os olhos e coloca a pilha no
canto. Com um pequeno aceno de cabeça, ela sai correndo da sala.
— Equipe nova? — Helga pergunta. — Você nunca me disse que
tinha uma empregada doméstica. Achei que usasse um
serviço de limpeza.
Eu agarro seu braço e a
coloco de pé.
— O que você está fazendo?
— Me diga por que você está realmente aqui.
Ela lambe os lábios. A fachada finalmente cai. —
Eu preciso de dinheiro.
Sempre deixo dinheiro depois de foder Helga, e
ela se está duas semanas sem bônus. Soltando seu
braço, pego minha carteira e coloco alguns milhares
em sua mão. Ela pisca os cílios quando eu pego seu
pulso e a puxo ao redor da mesa.
— Isso significa que estamos transando?
— Significa que estou acompanhando você. —
Quase a arrasto até a porta da frente, onde Rhett fica
de guarda. — Não a deixe mais entrar.
— Gabriel!
A última coisa que vejo antes de fechar a porta na cara dela é
sua expressão descontente. Acabou. Eu nunca mais quero vê-la
novamente.

Valentina

GABRIEL LOUW TEM UMA reputação, ele é perigoso, e as


mulheres que têm experiência em primeira mão dizem que ele fode
como um cavalo. Porque ver com meus próprios olhos dói tanto que
não consigo entender. Não é como se descobri hoje. O que eu
esperava? Exclusividade? A noite passada foi doce. A
dor surda entre minhas pernas me lembra de como Gabriel me fodeu
com o dedo. É o tipo de dor que me faz sentir bem, até alguns
momentos atrás, antes de eu encontrar uma loira bonita
com suas partes nuas espalhada em sua mesa. É um jogo
para ele. Eu sou seu brinquedo. Quando
ele se cansar de mim, me
deixará de lado. A única coisa
que ele valoriza é a dívida que tenho. Quando
eu estiver livre, não quero deixar um pedaço do meu
coração aqui. Isso vai ser muito irônico. Foi uma boa coisa
eu ter encontrado eles. Não, é uma boa coisa que ele
me permitiu vê-los. Acho que ele queria que eu visse
isso, para me lembrar que não sou especial. Sou uma
de muitas e, no momento, sou conveniente.
Passei o dia trabalhando sem parar. Até meu
cérebro está cansado demais para pensar. Naquela
noite, pela primeira vez, ele não veio até mim. Eu sou
um monte de tremores e necessidade dolorida quando
a manhã chega, amaldiçoando-o e meu corpo. Visões
dele na cama da loira me levam a lágrimas
enlouquecidas. Ele me arruinou para outros
homens. Ele me arruinou até para mim mesma.
Estou ocupada com aspirador de pó na manhã seguinte,
quando ele tropeça pela porta, com Rhett e Quincy a reboque. Seu
cabelo está desgrenhado e há sangue em sua camisa. Seus nós dos
dedos estão sangrando. Meu coração aperta e meu pulso acelera. Ele
olha para mim, mas manca pelo corredor sem uma
saudação. Contemplo o motivo de seu estado o dia todo, me
recusando a reconhecer a preocupação que me atormenta. Me
preocupar significa cuidar, e eu não me importo.
Às cinco, eu tomo um banho e visto meu short e camiseta. Jogo
minha regata na bolsa junto com a comida dos cachorros sem-
teto. Não estou com vontade de enfrentar Gabriel, mas não sou tão
estúpida a ponto de ignorar sua ordem de dizer adeus antes de ir
embora.
Como ontem, ele responde quando bato na porta de seu
escritório. Eu não entro, apenas coloco minha cabeça em volta da
moldura.
— Tenha um bom fim de semana. Estou saindo. — Abaixo a
cabeça, na esperança de escapar com uma saudação rápida, mas não
tenho essa sorte.
— Valentina.
Eu fecho meus olhos e
respiro fundo antes de encarar
ele novamente.
Ele se levanta de trás de sua mesa. Está
vestindo uma camisa azul com calça azul marinho e
uma gravata listrada, parecendo mais gostoso do que
nunca. — Eu te levo.
Tudo o que posso fazer é olhar para ele em
confusão. — O que?
— Eu vou te deixar lá.
Gabriel está me oferecendo uma carona? Não
tenho certeza de como me sinto sobre isso. Eu não
quero que ele seja bom para mim. — Isso não é
necessário. Eu posso encontrar meu próprio caminho.
— Como você fez na semana passada?
— Hum, sim.
— Em uma minivan?
— Sim.
Ele atravessa o chão com passos ameaçadores. — Se você entrar
em uma minivan novamente, vou bater em sua bunda tão forte que
você não vai se sentar por uma semana.
Eu pisco para ele.
— Você tem alguma ideia de como isso é perigoso? — Ele
pergunta.
Para uma garota branca, ele quer dizer. Outras pessoas têm
carros. Ninguém se atreve a andar na rua sozinha. As chances de ser
estuprada, torturada e assassinada são grandes demais. A vida não
tem valor nesta cidade, mas no meu mundo, se você não tem escolha,
apenas tem que arriscar.
— Você vale muito para mim, Valentina. Eu possuo você e
protejo o que é meu.
Ele volta para a cadeira e tira o paletó das costas. Pegando as
chaves da mesa, ele pega minha mão e me leva para a garagem.
Eu me sinto pequena ao lado dele no luxuoso interior de seu
carro. Ele não diz nada enquanto dirige o elegante Jaguar pela
calçada e para o tráfego. Em vez de ir para o leste, ele vai para o
norte. Ele não pergunta para onde estou indo, então fico
de boca fechada até que ele para na frente de uma loja
exclusiva em Sandton. Saio
quando ele dá a volta para
abrir a porta para mim, segurando
minha bolsa contra o peito enquanto me guia para
dentro da loja luxuosa. Não é como nenhuma loja de
departamentos que eu conheço. Não há itens em
exibição. Há apenas um sofá de couro e uma mesa de
vidro repleta de roupas, bolsas e sapatos. Uma linda
jovem nos cumprimenta na porta e acena com o
braço para a mesa.
— Tudo está pronto para você, Sr. Louw.
Ele a reconhece com um breve aceno de cabeça e
me conduz para a frente. — Continue. Escolha o que
quiser.
Estupefata, eu fico boquiaberta.
— Qual é a sua cor, querida? — A mulher
pergunta. — O vermelho ficará bem com a sua
pele. Branco também. Prata para a noite. — Ela
começa a tirar vestidos da pilha e os pendura sobre o sofá.
— Hum, com licença. — Eu limpo minha garganta. — Posso ter
uma conversa com... — Como eu o chamo na frente dela? —
…Senhor Louw.
— Gabriel, — ele corrige.
A mulher olha de mim para Gabriel. Há julgamento em seus
olhos, mesmo que tente esconder. — Vou buscar refrescos. Não
tenha pressa.
Quando ela desaparece em uma porta, eu me viro para
Gabriel. — O que você está fazendo?
— Estou pegando roupas para você.
— Por quê?
— Eu joguei seu vestido azul no lixo.
— Eu não espero que você o substitua.
— Eu disse que gosto de cuidar de você.
Torcendo minhas mãos, eu fecho a distância entre nós. — Não
posso aceitar o seu dinheiro.
Seus olhos escurecem, o azul se tornando tempestuoso. — É
dinheiro legal.
— Não é isso. Simplesmente não parece certo.
— Parece muito bom para
mim. Você está dizendo que
me fazer sentir bem não é certo?
— Não distorça minhas palavras.
Ele me agarra tão de repente que minha respiração
falha. Me segurando pela cintura com um braço, ele
segura meu seio e dá um beliscão suave no meu
mamilo. — Não teste minha paciência.
Imediatamente, o calor inunda meu corpo. Ele
borbulha em minhas veias e envia sangue ao meu
clitóris. Meus mamilos estão duros como seixos.
Quero odiar os sentimentos que passam por mim, mas
não consigo. Enquanto meu corpo expõe minha
excitação, o mesmo calor que sinto reflete em seus
olhos.
A lojista volta com uma jarra de chá gelado e
copos, mas Gabriel não me solta.
Ela observa nossa postura. Depositando a bandeja na mesa, diz
em tom profissional. — Você já escolheu alguma coisa?
Uma hora depois, saio com um vestido novo, jeans de grife,
duas camisetas, um sobretudo casual, um par de sapatilhas
bailarina, cinco conjuntos de roupas íntimas bonitas e um suéter
bonito de ombro aberto. Gabriel me empurrou para pegar mais, mas
isso já é mais do que preciso.
Ele carrega meus pacotes na parte de trás do carro e, quando
nos sentamos, ele se vira para mim. — Para onde, linda?
Tenho certeza de que ele já sabe, mas dou o endereço de Kris. No
caminho, tento descobrir o que aconteceu. No momento em que
paramos em frente ao consultório, ainda estou longe de entender
Gabriel.
Ele desliga o motor. — Seu apartamento foi vendido.
— Uau, tão rápido?
— Eu providenciei para que o dinheiro fosse depositado em sua
conta bancária. Espero que esteja em ordem.
— Gabriel... — Estou sem palavras. — Obrigada. — As palavras
não expressam minha gratidão, mas são tudo que posso
reunir.
— Não precisa me
agradecer. Eu disse que
cuidaria disso.
Ele se estica por cima de mim e abre minha
porta, seu braço roçando meus seios. Antes que eu
possa protestar, ele pega meus pacotes e os leva para a
casa de Kris. Charlie nos encontra na porta, me dando
um abraço de urso.
— Va–Val!
— Ei, irmãozão.
Gabriel estende a mão para Charlie apertar. —
Oi, lembra de mim?
— Você é o ho-homem ma-mal.
Gabriel ri. — Acho que você pode dizer isso, mas
eu prefiro Gabriel.
Charlie dá um passo para trás e me olha com
olhos grandes.
— Está tudo bem, Charlie. Gabriel não vai
nos machucar. Eu trabalho para ele, lembra?
Depois de contemplar minha resposta, as boas maneiras de
Charlie finalmente venceram. — Quer um suco?
— Claro. — Gabriel me mostra um sorriso e se sente em casa
na cozinha de Kris.
Tenho medo de ter ele perto do meu irmão. Eu o observo como
um falcão enquanto ele bate papo com Charlie, mas Charlie
rapidamente se aproxima de Gabriel. Quando ele sai, uma hora
depois, você poderia jurar que eles são melhores amigos. Que jogo
Gabriel está jogando? Ele pode brincar comigo se esse for o preço que
tenho que pagar pela liberdade de Charlie, mas não vou deixá-lo
atrapalhar a vida do meu irmão.

Gabriel

UMA VEZ QUE CARLY ESTÁ na casa da mãe neste fim de


semana, tenho a noite e o dia seguinte para mim. Magda saiu com
amigos. Me assegurei de que nenhuma reunião de
negócios fosse agendada e dei a Rhett e Quincy o fim de
semana de folga. Sirvo um uísque e
me sento em uma poltrona da
sala de leitura com a pasta de
Valentina no colo. Não há muito em sua história
que eu já não saiba. Seu pai, Marvin, estava envolvido
em um sindicato de clonagem de automóveis. Sua
mãe, Julietta, era dona de casa. Valentina cresceu
em Rosettenville, no sul. Quando ela tinha treze
anos, o Chevrolet deles caiu de uma ponte. Marvin foi
morto com o impacto. Valentina sobreviveu e Charlie
sofreu ferimentos graves, resultando em danos
cerebrais. Um ano depois, sua mãe foi morta durante
um assalto armado a um banco. Uma tia cuidou de
Valentina e Charles, se mudando para o apartamento
de seus pais em Berea quando sua casa foi leiloada
para cobrir contas pendentes e despesas de
funeral. A tia morreu após o décimo nono
aniversário de Valentina, deixando-a sozinha
para cuidar de Charlie.
Minha pergunta anterior permanece. Por que ninguém cuidou
de Julietta e seus filhos? No nosso negócio, a família é tudo. Nós
cuidamos dos nossos. Marvin não estava no topo da hierarquia, mas
também não era um ladrão qualquer. Ele tinha influência e apoio
suficientes para garantir a proteção de sua viúva e filhos, um teto
sobre suas cabeças e comida. Em vez disso, eles viveram dos próprios
esforços após sua morte.
Eu coloco o arquivo de lado e passo a mão no rosto. A segunda
pasta contém a atividade bancária de Valentina no dia. Metade do
dinheiro que paguei a ela por seu apartamento foi transferido para a
conta de Kris. A outra metade, ela depositou em uma conta
registrada da UNISA. Seguindo o registro da Universidade da África
do Sul, confirmo minha suposição. Valentina está matriculada em
um curso por correspondência em ciências veterinárias. Usando
meus contatos, tenho um número do mentor de Valentina na
universidade em minutos. Mesmo que seja tarde, eu disco o número.
Não demorou muito para convencer a Senhora Cavendish a tomar
café da manhã comigo amanhã.

ME SENTO EM UMA
MESA ESCONDIDA em um canto
privado no terraço do Hotel Rosebank quando Aletta
Cavendish chega. Ela não é a velha puritana que sua voz
me fez imaginar. A única razão pela qual eu sei que é ela
é porque ela caminha para o terraço na hora exata que
combinamos. A loira alta e platinada está perto dos
trinta. Anel de noivado. Diamante grande. O marido
deve ter um emprego confortável, porque os
professores universitários não ganham muito. Seu
cabelo está solto sobre os ombros e não há nenhum
traço de maquiagem em seu rosto. Mesmo sem a ajuda
de cosméticos, é atraente. Ela usa uma camiseta
branca e saia esvoaçante com estampa indiana com
sandálias de couro. Deve haver vinte pulseiras em
seu braço. O tipo hippie. Por suas costas retas e
ombros alinhados, deduzo que ela tem
confiança. Sua caminhada é fácil e leve. Claramente o tipo que dorme
bem à noite.
Ela dá seu nome ao garçom, e quando ele faz um gesto em
minha direção, ela encontra meus olhos com um olhar neutro e
amigável. Por um momento, há choque em seu rosto quando ela
observa minhas feições, mas seu sorriso não se desfaz. Seus brincos
balançam quando ela se aproxima do meu canto. Estou de pé antes
que ela alcance a mesa.
Ela me cumprimenta com um aperto de mão firme. —
Senhor Louw.
— Gabriel, por favor. — Eu puxo sua cadeira e a sento. —
Obrigado por me encontrar.
Largando uma sacola enorme ao lado de sua cadeira, ela
me lança um olhar escrutinador. — Tenho que admitir, se o aluno
em questão não fosse Valentina, eu não estaria aqui.
— Eu aprecio seu tempo. — Eu aceno para o garçom. — Vamos
pedir?
Enquanto ela estuda o menu, eu a observo. Aletta é inteligente
e não dá rodeios. Eu gosto dela. Ela é apaixonada e
dedicada. Deve ser uma boa professora.
Nós dois pedimos café e ovos
Benedict. Quando o garçom
sai, ela diz. — Você disse ao
telefone que é o novo empregador de Valentina. Eu
não sabia que ela havia mudado de emprego.
— É muito recente.
— O que ela faz por você, exatamente?
— Administração da casa.
Ela inclina a cabeça. — Como uma empregada
doméstica?
Eu sorrio, mantendo minha expressão calma.
— Estou surpresa, — Aletta continua. — Ela
adorava o trabalho na clínica veterinária e era uma boa
experiência.
— Eu fiz uma oferta que ela não poderia
recusar. — Não há mentiras.
O garçom volta para servir nosso café. Aletta
acrescenta um cubo de açúcar e um pouco de
leite. — Nesse caso, deve ser por um dinheiro melhor. Deus sabe o
que ela pode fazer com cada centavo extra.
— Estou preocupado com o bem-estar financeiro dela, por isso
queria te conhecer. Valentina não sabe disso, é claro. Ela é
orgulhosa. Eu apreciaria se pudéssemos manter essa discussão
entre nós.
Ela sopra o café, me observando por cima da borda. — O que
você está me perguntando?
— Quanto ela deve?
— Não é uma pergunta que você deveria fazer a ela?
— Tudo bem. Vou reformular isso. Quanto custa um diploma de
veterinária hoje em dia?
— Você está olhando para cerca de cinquenta mil por ano,
excluindo livros e material.
— Eu sei o quanto ela ganhava antes de começar a
trabalhar para mim. Como ela conseguiu pagar?
— Ela tem bolsa parcial, mas não dá para tudo.
— Ela é uma boa aluna?
— Honestamente? Ela é sem dúvida a melhor que já
tive. Suas notas são excelentes, mas aquela garota tem
um veterinário natural
nela. Nunca vi
animais reagirem a ninguém como
se comportam com ela.
Pode apostar. — Então como é que ela conseguiu
apenas uma bolsa parcial?
— Com o colapso financeiro e a agitação política,
resta muito pouco nos cofres da universidade. Não há
bolsa integral para alunos de veterinária. Estou
doando os livros dela, mas como você disse, ela é
orgulhosa. Felizmente, Valentina também é forte. Se
tornar veterinária é o seu sonho. Ela vai encontrar um
jeito.
A comida chega. O garçom arruma o sal e o suco,
mexendo-o várias vezes antes de colocar os pratos.
Nunca tive que me preocupar com dinheiro. Se
eu quero alguma coisa, eu saio e compro. Não
consigo imaginar como é trabalhar seus dedos
até os ossos e se preocupar em cobrir suas
contas, o que é irônico vindo de um homem que ganha dinheiro
com os problemas financeiros de outras pessoas.
Eu me inclino para trás na minha cadeira. — Se eu for criar
uma bolsa, posso escolher para quem ela vai?
A faca fica parada em sua mão. — Sim. — Ela me olha com leve
surpresa. — Você pode nomear o beneficiário.
— O beneficiário não precisa saber quem é o patrocinador?
Um sorriso aquece seus olhos. — Você pode chamar a bolsa do
jeito que quiser. Não precisa ter seu nome e certamente pode ser
anônimo.
Eu inclino meus cotovelos sobre a mesa e coloco meus dedos
entre eles. — Nesse caso, gostaria de oferecer uma bolsa integral,
com todas as despesas pagas.
Seu sorriso fica dez graus mais quente. — Vou te colocar em
contato com a pessoa certa em finanças.
— Segunda-feira. — Quero pavimentar esse caminho para
Valentina o mais rápido possível.
— Tudo bem. — Ela dá uma mordida, mastiga lentamente e
engole. — Sabe, eu tinha minhas dúvidas sobre você.
— Sim?
— Achei que você fosse me
dizer que os estudos de
Valentina estão interferindo em
seu trabalho.
— Ah não. Nada como isso.
— Estou feliz por estar errada.
Ela não tem ideia.

DEPOIS DO CAFÉ DA MANHÃ eu mando uma


mensagem para meu banqueiro privado e dou
instruções para que a bolsa seja configurada. Então
vou para Rosettenville. Passo pelo endereço em meu
arquivo, a casa em que Valentina cresceu. É a
casa de um humilde mineiro, o tipo barato e
simples que as minas de ouro construíram
para seus trabalhadores e depois venderam a proprietários
privados. Nesta rua, tudo parece igual. É difícil imaginar alguém
como Valentina caminhando pelas ruas desse bairro comum e
monótono. Ela pertence a algum lugar exótico, algum lugar bonito. A
rua principal que abriga a maioria dos estabelecimentos comerciais
é tranquila. As lojas fecham no fim de semana. Na oficina mecânica,
estaciono meu carro e coloco a arma na parte de trás da minha
cintura. Lambert Roos mora em uma casa adjacente à oficina. A
moradia simples tem um muro baixo na frente, um alvo fácil para os
ladrões. Com a queda de Hillbrow e do centro da
cidade, Rosettenville se tornou um bairro perigoso. O fato de ele não
ter erguido a parede e instalado nela arame farpado eletrificado me
diz uma de duas coisas. Ou ele é muito pobre ou poderoso o
suficiente para que os criminosos não mexam com ele. A julgar pela
tinta descascada nas paredes e as telhas faltando, estou apostando
meu dinheiro na primeira opção.
Eu pulo por cima do muro e bato na porta. Passos se arrastam
lá dentro.
— Quem é? — Uma voz masculina chama.
— Gabriel Louw.
Há um momento de
hesitação antes que a porta se
abra em uma fresta. Um homem
baixo e careca, vestindo um colete e uma cueca
samba-canção, me olha com ceticismo. Ele lança um
olhar por cima do meu ombro, seu olhar viajando para
cima e para baixo na rua.
— Estou sozinho, — digo com um sorriso frio.
— Bem, bem, se não é o patinho feio de
Owen. Posso ajudar?
Eu deveria matar ele por esse comentário, mas
preciso de informações. Empurrando por ele, eu faço
meu caminho em sua casa. O lugar cheira a meias
velhas e repolho velho. Os tapetes estão gastos e os
móveis já viram dias melhores. Os negócios devem
estar lentos. Ou talvez não. Sobre a mesa, vários
sacos com pó branco. Coca ou talvez meta-
anfetamina.
Seus olhos seguem os meus. Uma fina camada de suor brilha
em sua testa. — O que posso fazer por você? — Ele pergunta com
uma gíria sem humor. — Quer uma cerveja? — Ele muda seu peso.
Ele é bastante hospitaleiro, mas quer que eu vá embora.
— Se lembra de Marvin Haynes?
Inclinando o pescoço, ele pisca duas vezes. — Sim. Quem não
lembra?
— Você deve ter conhecido ele bem, visto que deveria se casar
com a filha dele.
Seus olhos inchados se estreitam e ele solta uma risada
forçada. —Ele morava na mesma estrada, mas não éramos grudados
um com o outro. Vi sua patroa de vez em quando na farmácia. Por
que você pergunta?
— Se Valentina Haynes foi prometida a você, por que sua família
não a levou com seu irmão depois que a mãe dela morreu?
Ele coça a nuca. — Com o pai dela morto, o negócio estava
cancelado.
— Você não queria honrar o acordo?
— Ela não é meu tipo.
Puta merda. — Ela é uma mulher muito bonita, não
é?
— Sim.
— Você não gosta de mulher
bonita? Ou você não gosta de mulheres?
— Olha, ela não fez isso por mim.
— Você desistiu porque ela não fez isso por você?
— Sim.
Ele está mentindo por entre os dentes tortos e
amarelos.
— Por que você quer saber? — Ele pergunta,
tentando parecer indiferente, mas sua voz falha na
última palavra.
Eu encolho os ombros. — Curiosidade.
Com um aceno de cabeça, volto para o meu
carro. Antes de eu entrar, o idiota está com o
celular na mão, olhando para mim através das
cortinas de renda esfarrapadas enquanto faz uma
ligação. Eu deveria ter grampeado seu telefone
antes da minha visita. Não importa. Eu vou
descobrir. Eu mando uma mensagem para Anton com o nome e
endereço de Lambert, bem como a data e hora, instruindo-o a obter
uma gravação da conversa e enviá-la como uma mensagem
criptografada para minha conta de e-mail privada.

Valentina

QUANDO SAIO DA CASA DE Kris no final da tarde de domingo,


Rhett está esperando do outro lado da rua, ao lado do Mercedes. Ele
abre a porta de trás com uma instrução silenciosa para eu entrar.
Nem uma palavra é trocada durante o trajeto até Parktown. Meu
coração está triste por deixar Charlie. Me sinto culpada por não
poder cuidar dele, mas mais do que isso, sinto falta de sua
presença. Sua alegria é inocente e genuína. Ele é o único
pedaço de veracidade descomplicada nas emoções
distorcidas da minha vida.
Apesar da minha tristeza,
meu corpo começa a zumbir
quando nos aproximamos da casa. Como um
animal condicionado, meu corpo fica excitado ao saber
que logo estará com meu captor, enquanto meu cérebro
condena a reação. Odeio essa divisão entre meus
pensamentos e reações físicas. Estou em guerra
constante comigo mesma.
O próprio Gabriel espera na varanda. Meu
coração dá uma cambalhota indesejada ao ver sua
forma muscular. Ele abre a porta e pega meus pacotes,
as roupas novas ainda empacotadas e as etiquetas de
preço intactas. Rhett desaparece para qualquer
lugar. No minuto em que ele sai, Gabriel roça os
lábios na concha da minha orelha.
— Bem-vinda a casa.
As palavras me irritam. Esta não é minha
casa. Minha casa é com Charlie. O que Gabriel
está fazendo conosco como família está errado. Eu corro para dentro
e faço meu caminho para o meu quarto. Um minuto depois, Gabriel
dá um passo para dentro, parando como uma energia sombria e
ameaçadora aos pés da cama.
— O que há de errado?
— Nada.
— Você não está feliz por ter que passar um tempo com seu
irmão?
Eu dou a ele um olhar duro. — Claro que estou.
Eu começo a desempacotar as roupas, levando meu tempo para
dobrar cada item meticulosamente.
Ele me deixa continuar assim por um tempo antes de tirar a
pilha das minhas mãos e deixar na cama. — Vamos nadar.
Meu queixo cai. Ele está convidando uma empregada doméstica
para um mergulho na piscina?
— O que você me diz, Valentina?
— Eu não tenho maiô.
— Você não precisa de um.
Sem esperar por uma resposta, ele pega meu pulso,
me puxa pela cozinha e sai pela porta dos fundos. Na
varanda, ele começa a tirar as
roupas.
Eu olho ao redor para ter
certeza de que estamos sozinhos. — O que você está
fazendo?
— Nadando pelado com você.
— Você é louco?
— Estamos sozinhos. Magda saiu e Carly não
voltará antes de amanhã.
Gabriel está totalmente nu e duro na minha
frente. Seu corpo cheio de cicatrizes é assustador em
sua beleza brutal. As marcas no pé e no joelho não
diminuem sua perfeição física. Para mim,
eles aumentam seu apelo, tornando-o incrivelmente
perfeito de uma forma quebrada. É a atratividade
distorcida da imperfeição ou uma parte de mim está
apenas atraída por tudo que é escuro e
destrutivo?
Me mostrando sua bunda dura como pedra, ele caminha até a
piscina e mergulha. Água espirra para o lado, o som me lembrando
de feriados e tempos livres de estresse há muito tempo.
— Vamos, — ele chama. — A água está boa.
É tentador. Está um dia quente como o inferno e meu corpo está
pegajoso. Não consigo me lembrar da última vez que nadei.
Meu olhar viaja na direção dos aposentos dos funcionários. —
Rhett...
— Rhett não vai chegar perto da casa a menos que eu dê uma
ordem. Agora estou te dando uma. Entra.
— Tudo bem.
Tirando meus tênis e roupas, vou até a beira da
piscina. No minuto em que nossos olhares se fixam, há uma
mudança nos dele. O gelo em seus olhos abre caminho para uma
aparência de calor derretido. Sem vergonha, ele cobiça meus seios e
mais abaixo. Seu pau fica enorme sob a água. Eu gostaria de não
estar formigando entre minhas pernas ou que meus mamilos não
tivessem endurecido, mas estou tão impotente para a minha reação
quanto estou para seu comando sem palavras quando ele
levanta um dedo para mim. Entrando na água fria na
parte rasa, deixo minha culpa e
julgamento para trás. Não
importa o quanto eu proteste,
Gabriel fará o que quiser. O jogo de poder louco e
desigual me dá uma medida de absolvição.
Quando estou na água até a cintura, ele nada para
mim e agarra um punhado de cabelo. Puxando minha
cabeça para trás para arquear a parte superior do
meu corpo, ele trava em um mamilo e chupa meu seio
profundamente em sua boca. Eu grito quando a dor
ataca a ponta sensível. Imediatamente, ele se afasta
para olhar para mim.
— Você geralmente gosta disso.
Eu seguro a curva dolorida. —É quase essa época
do mês. Eles ficam muito sensíveis.
Ele estuda meus seios com novo interesse,
pegando-os em suas mãos. — Eles estão
maiores. — Ele os sacode, me fazendo gemer de
desconforto. — E mais pesados. — Suas mãos
descem pelos meus lados até meus quadris e sobre minha barriga
inchada. — Quando começa o seu período?
— Amanhã. — Eu tremo um pouco quando digo. Depois disso, o
controle de natalidade será eficaz e nada o impedirá de dar o passo
final.
Ele relaxa então, deixando meu corpo livre. — Talvez a água lhe
faça bem.
É verdade. Nadamos algumas voltas e apenas relaxamos sem
falar. Quando saímos, minha pele está enrugada. Gabriel busca
toalhas na casa da piscina e me cobre com uma em uma
espreguiçadeira. Por alguns momentos de felicidade, esqueço minhas
circunstâncias e simplesmente aprecio os raios do sol poente em meu
rosto. Nunca estive sozinha com ele na casa. Há menos tensão
quando ninguém está por perto.
Quando começa a esfriar, ele me carrega para dentro e me deita
na cama. Como todas as noites que ele veio ao meu quarto ele me faz
gozar. Ele é gentil, evitando meus seios doloridos e abdômen
inchado. Depois disso, ele me deixa levá-lo na boca e fica comigo por
mais uma hora.
Ele segura outras mulheres assim? Ele sai para
foder alguém depois de estar
comigo? Nunca vi outra
mulher em casa, exceto a mulher
em seu escritório, mas isso não significa que seja
celibatário. Talvez ele entretenha suas mulheres em
outro lugar para proteger Carly. Pelo que sei, ele tem
namorada. Talvez seja a mulher que vi. Talvez ele esteja
fodendo seus miolos todas as noites depois que sai do
meu quarto. Nosso silêncio não é mais amável.
Não consigo evitar perguntar. — Você está
dormindo com alguém?
Seu peito vibra contra minhas costas com uma
risada. — Isso importa?
Se a dor em minhas costelas é alguma indicação,
sim, importa, mas eu morreria antes de admitir. —
Apenas me perguntando. — Inferno, eu nem pareço
convincente para mim mesma.
— O nome dela é Helga.
Humph. É como se ele socasse o ar para fora de mim com um
punho no estômago. Eu queria saber e agora me arrependo de
perguntar. Eu especialmente não quero saber o nome dela. A dor se
lança contra mim de todas as direções, me deixando vulnerável. O
ciúme cresce em meu peito.
— Ela é a mulher que você viu no meu escritório. Isso é o que
você realmente está perguntando, não é?
Agora que foi lançado, posso muito bem ir até o fim e me
machucar profundamente. Talvez a dor diminua minha necessidade
por Gabriel. —Você dormiu com ela?
— Sim. — Depois de um momento, ele continua. — Mas eu não
a fodi desde que você chegou.
Algo cede em meu torso, como um elástico que se
estala. Estupidamente acho que vou chorar. Correção, estou com
vontade de chorar. Droga de TPM. — Não importa.
Sua risada é sabida. — Claro que não.
— Por que você não dormiu com ela? — Prendo a respiração por
algo que não consigo nomear.
— Eu não quero.
Mas ele pode. Gabriel é o tipo de homem que pega o
que quer, não à força, mas
fazendo com que seu próprio
corpo te traia, roubando sua
vontade e quebrando cada uma de suas boas
intenções, deixando um buraco que só ele pode
preencher. Onde estou doendo agora, apenas seu pau
pode preencher a sensação de vazio. É distorcido. Ele me
fez desejá-lo, precisar dele, como eu preciso de água,
enquanto ele pode ir embora por capricho, sempre
que não me quiser. Vai chegar um dia que serei a
próxima Helga, um dia que ele não venha ao meu
quarto para me fazer gozar, só porque
não quer mais. Ele é um idiota e me odeio por ser
afetada.
— Você está quieta, — ele reflete. — Se você
estiver cansada, vou deixar você dormir.
Desejando solidão para que eu possa me
enrolar em uma bola, eu deixo a mentira
escorrer de meus lábios. — Isso é gentil de sua parte.
Meu coração afunda quando seu peso é levantado do
colchão. Com um beijo casto na minha testa, ele sai do meu
quarto. Finalmente, tenho a solidão de que exigi, mas estou total e
miseravelmente sozinha.

NA SEGUNDA DE MANHÃ Magda me espera na cozinha com


notícias chocantes. Marie teve um derrame.
— Você vai assumir o planejamento do menu, — diz ela, — e a
cozinha. Passe para mim para aprovação. — Ela aponta para o
computador no canto. — Você encontrará o orçamento e os
supermercados que atendem no sistema.
— Ela vai ficar bem?
— Eu não sei. A filha dela vai me deixar saber. Mas é muito
inconveniente, vendo que temos um jantar formal de negócios em
casa na sexta-feira. Oh, você terá que cuidar do bufê e do
serviço. Vou enviar o menu por e-mail para o computador da
cozinha. Estou esperando apenas dois ou três
convidados. — Ela escreve um código no painel de
mensagens. — Aqui está a senha.
Ela está a meio caminho
da porta antes que eu encontre
coragem para falar. — Eu não tenho certeza se
posso controlar.
Ela se vira para estreitar os olhos para mim. — Você
tem um problema?
— A limpeza e a cozinha… é muito para uma só
pessoa. Não é que eu não esteja disposta, mas é uma
casa grande. Não quero negligenciar nem um nem
outro.
— Então, se certifique de não fazer isso. — Seus
lábios se estreitam em um sorriso. — Sua vida depende
disso.
Eu fico olhando enquanto ela sai da
cozinha. Eu odeio o estalo arrogante de seus saltos
tanto quanto detesto a cor de cone de trânsito de
seu batom. Ela pode me desprezar porque sou
pobre e me tratar como uma escrava porque ela
é dona de nove anos da minha vida, mas quando esses nove anos
acabarem, nunca mais aceitarei ordens dela. Vou levar Charlie e me
mudar para outra cidade, uma cidade onde os Louws não
governam. Permitindo a intenção de fortalecer minha determinação,
eu ligo o computador e espero que ele inicialize para poder fazer o
pedido de supermercado do dia.

SEGUNDA E TERÇA PASSAM em um borrão. Eu crio algum tipo


de programação, passando o aspirador apenas a cada dois dias e
passando a roupa mais tarde à noite. Na terça-feira à noite,
recebemos uma atualização da filha de Marie, informando que ela
não voltará ao trabalho por pelo menos seis meses. Como não
conheço as receitas de Marie, não tenho escolha a não ser mudar o
cardápio. O que sei fazer é mais o estilo mediterrâneo da minha
falecida mãe. Procuro um pequeno produtor local de produtos
frescos, que não são apenas orgânicos, mas também mais baratos.
As frutas e os vegetais não são bonitos, mas são saborosos. Também
peço menos produtos de limpeza. Posso lavar o chão tão
bem com um pouco de vinagre em água do que com um
produto caro que cheira a pomar
de verão, mas foi testado em
animais. O resultado é uma
economia de trinta por cento na conta semanal do
supermercado.
O novo ritmo de trabalho é extenuante. Além disso,
minha menstruação chegou bem na hora. Sempre sofri
com um fluxo intenso que me deixa com uma
sensação de fraqueza. Peço um suplemento de ferro
com minhas entregas pessoais para me ajudar na
grande noite de sexta-feira. A última coisa que quero
é falhar no meu primeiro teste de jantar, quando minha
vida depende disso.
Apesar da minha menstruação, Gabriel ainda
vem até mim à noite, mas em vez de me levar ao
clímax de abalar a terra a que me acostumei, ele
acaricia meu corpo com massagens e toques. É
estranho e fora do personagem para ele, não
que ele seja previsível. Quanto mais Magda me
empurra, mais gentil Gabriel age comigo, o que enfurece Magda. É
um círculo vicioso entre os dois, e estou presa no meio.
Carly é legal, mas não completamente hostil desde que ela
conseguiu sair em seu encontro. Sebastian pode visitá-la em casa
com a supervisão da avó ou do pai, mas como Gabriel está sempre
fora durante o dia, é principalmente Magda que fica de olho nos
pombinhos.
Na quarta-feira, Carly está sozinha na piscina. Quando pego
sua toalha para lavar, noto que ela deixou o iPad do lado de fora
novamente, algo que ela faz com frequência. Eu o pego com
a intenção de guardar ele em casa, mas quando chego às portas de
correr, a voz de Quincy me impede.
— Ei, Val. Olha, Bruno está bem melhor.
Bruno corre na coleira com Quincy, sem mancar. O cachorro
late e abana o rabo furiosamente quando me aproximo. Deixando o
iPad no muro, fico de cócoras e recebo um beijo de cachorro
desleixado.
Eu rio, enxugando meu rosto com as costas da mão. — Fico feliz
em ver que você está de volta à forma, garoto.
— Obrigado novamente.
— Estou feliz por ter ajudado.
— Eu me endireito e olho por
cima do ombro para a casa. — É
melhor eu voltar. Muito a fazer.
— Sim. — Ele parece desconfortável. — Você está
lidando com isso?
— Sim.
— Valentina, — diz Magda da porta, seu olhar
condescendente pousado em Quincy e em mim como
se nos pegasse nos beijando ou algo assim, — se você
terminou de socializar, precisamos conversar sobre o
cardápio de sexta-feira.
— Tchau, Bruno. — Eu acaricio suas costas e
sorrio para Quincy em saudação.
Seus olhos estão duros quando ele os
direciona para a porta onde Magda espera com as
mãos nos quadris, mas eu não penso mais nisso
enquanto corro para dentro.
SÓ NA MANHÃ SEGUINTE, QUANDO Carly faz uma confusão
no café da manhã sobre o desaparecimento do iPad, é que me lembro
de deixá-lo do lado de fora.
Magda me chama para a sala de jantar. No começo, estou no
escuro quando Carly aponta o dedo para mim e exclama. — Ela
pegou. Estava lá ontem à noite e agora se foi.
— Você pegou o iPad da Carly? — Magda pergunta. — Não se
preocupe em mentir, porque eu mesmo irei revistar seu quarto.
Meu interior congela, lembrando onde o deixei. Eles ficam ainda
mais frios quando eu olho para Gabriel. Ele está me olhando com
uma carranca. Ele acredita que eu roubei? Lanças machucam meu
coração. Por que importa o que ele pensa?
— Bem? — Magda pergunta com um movimento de sua
sobrancelha desenhada a lápis.
— Eu pretendia trazer ele ontem à noite, mas me distraí e
esqueci no murinho.
— Distraída com Quincy, — Magda diz maliciosamente.
Uma expressão estrondosa escurece o rosto de
Gabriel. Das três pessoas na sala, claro, estou com mais
medo dele.
— Eu vou buscar, —
ofereço rapidamente, mas Carly já
está de pé, indo para a porta.
Magda cruza as mãos sobre a mesa e me dá uma
única instrução. —Fique.
Eu fico no silêncio desconfortável até que o ruído de
Carly atravesse a porta dos fundos. Tudo dentro de
mim aperta ainda mais.
— Está arruinado! — Carly grita, correndo para
a sala com o iPad. Está pingando água.
O tom de Gabriel é plano. — Em que parede você
deixou, Valentina?
— Aquela à beira da piscina! — Carly atira
punhais em mim com os olhos.
— Os sprinklers chegam lá à noite, — diz
Gabriel quase distante.
— A culpa é sua, — Carly continua histérica. — Você percebe
quantas fotos eu tinha aqui? Sem falar no meu dever de casa!
— Carly. — A voz baixa, mas dura de Gabriel instantaneamente
a cala. — Que essa seja uma lição bem aprendida por deixar seu iPad
do lado de fora. Não é a primeira vez. Estava prestes a acontecer.
— Papai!
Ele levanta a mão, dando a ela um olhar sombrio. — Me deixe
terminar. Você pode recuperar sua lição de casa e fotos do iCloud.
— Eu não ativei!
O tom de Gabriel é intransigente. Nem um lampejo de simpatia
aquece seus olhos. — Lição número dois, bem aprendida. De
agora em diante, você fará um backup como eu disse a você. — Ele
se vira para mim, de repente parecendo cansado. — Eu cuido de você
depois do café da manhã.
— Você vai substituir o iPad de Carly, — diz Magda. — Isso vai
te ensinar a ser menos esquecida no futuro. — Ela sacode o
guardanapo no colo. —Agora, quero comer em paz. Silêncio todos
vocês.
Carly afunda em seu assento, com o rosto vermelho.
Estou trêmula quando volto para a cozinha, me
xingando por minha negligência.
Não posso me dar ao luxo de
substituir o iPad, não sem fazer
mais dívidas.
Não demorou muito para Gabriel vir me
encontrar. As palavras que eu mais temia deixam seus
lábios. — Vá para a academia depois de limpar a mesa.
Descer para o porão é como caminhar até a
forca. Ele já está esperando lá dentro, a gravata
tirada e as mangas da camisa arregaçadas.
— Feche a porta, — diz ele calmamente.
Empurro até ouvir o clique, mas não tenho
coragem de me virar e encará-lo.
— Venha aqui.
Eu mordo minha unha enquanto reúno força
suficiente para obedecer, um passo de cada vez.
Quando eu paro na frente dele, ele puxa
minha mão da minha boca. — Dispa-se.
Meus olhos se erguem para os dele. Não quero implorar, mas
escapou de qualquer maneira. — Por favor...
Ele nem pisca. Não há compaixão, sem misericórdia. — Dispa-
se.
Enquanto tiro os sapatos, o vestido e a calcinha, ele me observa
como um falcão. A esta altura, estou acostumada com seu olhar
perscrutador, e é menos embaraçoso do que nas primeiras vezes, mas
não menos assustador. Uma vez que estou nua, ele bate um dedo
nos lábios, estudando meu rosto. Finalmente, ele deixa cair o braço,
como se tivesse tomado sua decisão, e aponta para o chão.
— Nas suas costas.
Eu engulo enquanto me deito de costas, observando-o buscar
uma barra com um conjunto de algemas em cada extremidade.
— O que você está fazendo? — Eu pergunto enquanto ele prende
meus pulsos em cada extremidade.
Ele reúne minha calcinha e a enfia na minha boca. — Desculpe,
linda, mas não estou com humor para diálogos agora.
Murmuro um protesto quando ele prende meus tornozelos aos
meus pulsos, me abrindo na barra. Ele empurra a
barra até tocar o tapete, levantando meus braços acima
da minha cabeça e minhas pernas
com eles. De costas, minha
bunda e minha boceta estão
expostos da maneira mais vulnerável. Meus tendões
estão pegando fogo. Eu me mexo em um esforço para
aliviar o estiramento desconfortável quando ele pega um
objeto da prateleira de tortura.
Ele retorna com um remo de madeira. balanço
minha cabeça, implorando com meus olhos, mas ele
agarra a barra e me levanta algumas vezes, me dando
uma breve suspensão da posição antes que ele
empurre para baixo e comece a bater o remo na minha
bunda. A primeira pancada na minha bunda foi um
choque. Eu grito atrás do pacote de tecido em minha
boca, mesmo que a picada aqueça minha pele sem
doer. A segunda pancada me faz estremecer, mas
quando percebo que ele está acariciando minha
pele em vez de causar dor, quase desisto. Ele
trabalha seu caminho da esquerda para a
direita na parte carnuda da minha bunda até que minhas
terminações nervosas estão em chamas e meu clitóris é um ponto
pulsante de dor. Minha boceta está inchada. A necessidade de
liberação é severa. Quando eu não estou mais implorando com meus
olhos para que ele pare, estou implorando para que ele me deixe
sentir o remo onde eu mais desejo. Só depois que cada centímetro da
minha pele está zumbindo com faíscas elétricas é que ele finalmente
traz a pá bem no meio da minha boceta, cobrindo minha abertura e
clitóris. Com o tampão dentro de mim, parece que estou cheia. E
bom. Eu me esfrego, desesperada por mais, mas ele muda para um
ritmo mais lento e suave, me provocando impiedosamente com
alguns toques muito suaves nas minhas partes inchadas.
Bem quando eu acho que não aguento mais, ele puxa a calcinha
da minha boca e diz. — Implore.
Eu não hesito. — Por favor, Gabriel.
— Por favor, o que?
— Por favor, por favor, me fode.
Ele fica imóvel. Há uma mistura de choque e descrença em seu
rosto, que é lentamente substituída por satisfação. O
calor escurece seus olhos. Sua mandíbula aperta
enquanto ele olha para o meu
sexo.
— Por favor.
Seu peito está subindo e descendo
rapidamente, sua respiração tão forte quanto a
minha. Se ouve apenas o som das nossas respirações na
sala. Então ele exala com uma respiração longa e
instável. Ele empurra a raquete para baixo no meu
clitóris e começa a massagear com movimentos
circulares. Tudo se contrai quando gozo com um
espasmo violento que estilhaça minha
respiração. Estou sem ar quando ele libera as
restrições e me coloca de joelhos. Na pressa de
desabotoar as calças, seus dedos se atrapalham com
o botão. Eu pego a calça e puxo para baixo em seus
quadris para ajudar, sem me preocupar com o
zíper. Seu pau se projeta para mim, a ponta perto
dos meus lábios. Eu o devoro como uma
mulher louca e faminta, chupando e lambendo
até que ele agarra meu cabelo para se apoiar. Ele aperta sua bunda
com um rugido primitivo e uma maldição enquanto se esvazia em
minha boca. Eu engulo o melhor que posso, tentando respirar pelo
nariz. Eu não quero que ele saia. Eu o quero em mim para sempre.
Depois de um momento, ele agarra meu rosto com suas mãos
gigantes e sai da minha boca. Ele usa meu cabelo para se limpar, um
ato que acho estranho e selvagemente satisfatório. Me puxando para
os meus pés, ele enfia a língua entre os meus lábios, saboreando-
se na minha boca. Ele belisca e suga, morde e lambe. Não estou
ciente de nada além da pele aquecida da minha bunda e da umidade
de sua boca enquanto ele rouba minha razão. Seu gosto é
viciante. Não sei por quanto tempo ele me beija antes de me empurrar
com um movimento suave.
— Se vista, — diz ele com voz rouca. — E saia.
Confusa com a mudança em seu comportamento, obedeço sem
palavras, vazia e insatisfeita, apesar do orgasmo que acabei de
ter. Na porta, suas palavras me fazem parar.
Ele solta cada sílaba como se tivesse que empurrar de sua
garganta. — Ponha um vestido bonito, esta noite. Você
está indo para um encontro.

Gabriel

QUANDO EU PEDI A ELA PARA implorar, eu


esperava que implorasse por libertação. Em vez disso, ela
me implorou para transar com ela.
Ela está pronta.
Eu me regozijo e tremo de pavor, porque a
primeira vez não será comigo. Não importa o quanto
eu queira tirar sua virgindade, fiz uma promessa a
mim mesmo e nunca quebro minhas promessas. Desta
vez, posso ser levado ao meu limite para cumprir essa
promessa, mas já tenho um plano.
Magda espera no meu escritório quando eu
volto da academia. Eu cerro os dentes enquanto
passo por ela.
— Você fez isso?
Eu sei o que ela quer dizer, mas pergunto mesmo assim. —
Fazer o quê?
— Puniu ela.
— Sim. — Sento e abro meu laptop.
— Como?
— Adequadamente.
Carly aprendeu uma lição valiosa. Não havia nada para punir
Valentina. Eu sou um bastardo doente por usar a situação para
alimentar minha própria luxúria.
Magda não se move. — Como?
Eu lanço um olhar incrédulo para ela. — Você quer os detalhes
suculentos?
— O que há nela que te faz pensar com o pau em vez da cabeça?
— Não me insulte, e sua referência ao meu pau é altamente
inadequada.
Seus olhos, do mesmo azul aguado que os meus, escurecem de
raiva. Ela bate as mãos na minha mesa, nos colocando no nível dos
olhos. —Você é igualzinho ao seu pai.
Mantendo minha voz calma e meu olhar indiferente,
digo. — Se você não consegue falar sem se repetir e não
tem nada de novo a dizer, saia do
meu escritório para que eu
possa me concentrar na gestão do
seu negócio.
Suas narinas dilatam. A espessa camada de base
ao redor de seu nariz racha com linhas finas. Os poros são
grandes com pelos brancos eretos em cada folículo. Cada
pequeno detalhe de sua idade chama minha atenção.
— Você não viverá para sempre, Magda.
Ela se endireita e ajusta a jaqueta. — Nem você.
— Um sorriso curva seus lábios. — Quem sabe? Você
pode morrer antes de mim. — Ela se vira, deixando
claro que está deixando meu escritório
em seus termos.
Não há amor perdido entre minha mãe e eu, e
nenhuma quantidade de introspecção para
descobrir onde deu errado vai mudar isso. Nós
somos quem somos.
Eu pego o telefone e saio para fazer o que teria feito quando
entrei pela porta.
Quincy responde com um brilhante. — Sim, chefe?
— Venha para o meu escritório.
Respiro fundo e me preparo. Pouco depois, ele entra. Quero
quebrar a cara dele, mas não é culpa dele estar apaixonado por
Valentina. Tão pouco quanto é dela. Ela é uma mulher linda com um
coração corajoso e uma queda pelos animais. Como ele
não pôde estar sob seu feitiço?
— Se senta. — Aponto para a cadeira em frente à minha mesa.
Ele se senta, sua postura é confortável.
— Eu tenho uma missão para você esta noite.
Ele espera calmamente que eu continue.
— Você vai foder Valentina.
10
Gabriel

EU POSSO MUITO BEM ter encharcado Quincy com um balde


de água gelada.
Ele tosse. — Desculpa?
— Leve ela para um encontro. Em algum lugar legal. Romântico.
Jantar à luz de velas, esse tipo de coisa. — Eu lanço meu cartão de
crédito para ele. — Todas as despesas pagas. Leve dois guardas para
se certificar de que você está seguro.
Seus olhos ficam maiores a cada segundo.
A próxima parte é difícil de dizer. Eu engulo o gosto amargo na
minha boca. — Então pegue um quarto no Westcliff Hotel e transe
com ela.
Sua pele é tão pálida quanto o branco de seus olhos. — Eu não
entendo.
— Não há nada para entender. Use um preservativo e
seja gentil. É a primeira vez dela. Ah, e ela está
menstruando. Esse tipo de coisa não te
desanima, não é?
— Claro que não, mas...
Sem conseguir aguentar mais a
conversa, digo asperamente. — Você está dispensado.
Ele pula de pé, obviamente ansioso para escapar da
minha presença.
— Só mais uma coisa, — digo quando ele chega
à porta, — não quero ver você até amanhã de
manhã. Se certifique de ficar bem longe de mim até o
amanhecer, e então espero um relatório completo.
Ele quase pula pela porta, me deixando sozinho
com uma espécie de agonia que nenhum ser humano
consegue entender.

À TARDE UMA VISITA DE Sylvia me deixa


ainda mais nervoso. Eu a encontrei em meu
escritório. Isso mantém as coisas profissionais. Ela recusa minha
oferta de uma bebida e se senta no canto da minha mesa, a fenda da
saia subindo pela coxa. Em algum momento, eu teria me ajoelhado
aos pés dela e beijado meu caminho descendo por aquela perna, até
os dedos dos pés. Agora, não há desejo para a mulher que se casou
comigo em um lindo vestido branco com um sorriso falso no rosto.
— O que há com a nova dieta de Carly? — Ela pergunta. —Já
discutimos isso. Você não deve mudar seu plano de alimentação sem
me consultar.
Eu luto para controlar minha irritabilidade. — Não estou
ciente de nenhuma dieta.
— Ela é intolerante ao trigo, pelo amor de Deus. Não deveria
comer macarrão. O que há de errado com Marie? Ela está ficando
senil?
— Marie teve um derrame. Valentina está cuidando da cozinha.
— A empregada que tentou matar nossa filha? — Ela grita.
— Ela não fez isso de propósito. Foi mais uma das ações
autodestrutivas e de busca de atenção de Carly.
— Não se atreva a ficar do lado daquela empregada
em vez de nossa filha.
Eu suspiro
profundamente. —
Relaxa. Valentina foi punida. Isso
não vai acontecer de novo.
— Eu não vou relaxar quando Carly está
envolvida. Ela tem um teste de modelo em um mês. Ela
não pode se dar ao luxo de engordar com carboidratos e
molhos cremosos para massas.
— Ela não está fazendo um teste de modelo.
— Não está em discussão.
— Você ligou para o terapeuta?
Ela fica rígida. — Carly não precisa de um
terapeuta. São os hormônios. Problemas normais de
adolescentes.
— Sylvia. — Eu digo o nome dela em
advertência. — Carly nunca superou nosso
divórcio. É hora de enfrentar o fato de que ela
pode ter problemas para os quais não estamos
preparados.
Ela dá uma risadinha. — Isso é ótimo vindo de The Breaker.
— Mantenha o negócio fora disso.
— Como posso? É tudo o que importa na sua vida.
— No entanto, é por isso que você se casou comigo. Segurança
e dinheiro, não se lembra?
— Não seja tão dramático. Por que você sempre tem que trazer
as mesmas velhas acusações? É aborrecido. — Ela se levanta. —
Devo falar com sua empregada?
— Você perdeu o direito de se dirigir à minha equipe quando
saiu.
Ela revira os ombros. — Querido Deus, Gabriel, supere e siga
em frente.
— Eu estou, Sylvia. Você não tem ideia.
— Bom. Isso tornará mais fácil para você seguir em frente. —
Ela caminha até a porta com as costas retas. — Diga a Carly que
passei por aqui.
— Por que você não liga para ela hoje à noite e conta você
mesma?
Ela estreita os olhos. — Vai se foder, Gabriel. Eu
amo minha filha, e ela sabe disso.
— Ela sabe?
Ela abre a porta e a bate
com força suficiente para sacudir
a moldura. Arrastando a mão sobre o rosto, levo um
momento para me acalmar antes de sair para o negócio
do dia que exige o fim da vida de outro canalha.

QUANDO CHEGO EM CASA tomo um banho e


passo um tempo com Carly, ajudando-a com o dever
de matemática. Eu não desço para jantar. Não suporto
olhar para Valentina. Estou com muito medo de mudar
de ideia. Depois de alguns uísques, ligo para Rhett e
digo a ele para me encontrar na academia.
Ele entra preocupado, provavelmente
pensando na última vez que lutamos porque ele
atirou no cachorro de Valentina.
Arrastando um banco da seção de pesos livres até as correntes
de metal presas à parede, me sento. — Me prenda.
Ele leva um momento para encontrar sua voz. — O que?
— Você me ouviu.
Não sendo estúpido o suficiente para me desafiar, ele se
aproxima lentamente. Eu estendo meus pulsos. Ele prende primeiro
um, depois o outro nas algemas de metal.
— Leve a chave com você, — eu digo, — e não dê a ninguém,
não importa o que aconteça.
— A chave das algemas ou da porta?
— Ambos.
Sua cabeça balança para cima e para baixo, como um cachorro
de brinquedo no painel de um carro. — Quando devo voltar?
— Às seis da manhã de amanhã e nem um segundo antes.
Entendido?
Ele engole. — Sim.
— Vai.
Seus olhos dizem que finalmente perdi o controle, mas ele não
discute. A chave estala na fechadura depois que ele fecha
a porta, me tornando um prisioneiro do livre arbítrio.

Valentina

COM O VESTIDO NOVO QUE Gabriel comprou,


roo as unhas enquanto espero na cozinha. Eu nunca
estive em um encontro. Eu deveria estar estudando,
mas estou curiosa para saber o que Gabriel planejou. A
porta se abre pouco depois das oito, mas não é Gabriel
quem entra. É o Quincy.
— Oi, — digo com um sorriso fácil, meio
aliviada e meio estressada, porque agora terei que
passar pela ansiedade de espera novamente.
Há um rubor em suas bochechas quando ele vê o vestido
vermelho. — Você está bonita.
Isso é tão desconfortável. — Obrigada.
— Pronta?
Eu pisco talvez ele esteja me levando a algum lugar para
encontrar Gabriel. — Hum, sim.
— Vamos lá. — Ele me examina. — Pegue uma jaqueta. Vai ficar
frio mais tarde.
Pego meu sobretudo preto e sigo Quincy até o carro. Ele
dirige. Outro carro segue à distância. Eu olho para os faróis no
espelho lateral.
— Eles vão nos seguir a noite toda?
— Proteção, — ele murmura, sua testa franzida em uma
carranca.
— Para onde vamos?
— Eu estava pensando no Thai Hut. Ele tem críticas cinco
estrelas para seus pratos de curry e é chique sem ser tenso. O que
você acha?
Não tenho ideia de onde ou o que é o Thai Hut, mas
meu cérebro está preso em outra coisa.
— Espere, você quer
dizer você e eu
decidimos? Gabriel não vem?
Ele me lança um olhar rápido. — Ah,
caralho. Ele não te contou.
— Me contar o quê?
Ele aperta o volante e olha para a frente. — Isto é...
como posso dizer? Ele nos marcou um encontro.
— Eu e você?
— Ei. — Ele solta uma risadinha irônica. — Eu
sei que não sou o maior gostosão do mundo, mas não
há necessidade de dizer isso como se você não fosse
sair comigo se eu fosse o último homem na terra, o que
você provavelmente não faria, mesmo que fosse
verdade.
Estou tão chocada que tenho que me lembrar
de calar a boca. — Eu não entendo.
— Nem eu. — Ele se mexe na cadeira. — Olha, eu vou ser
honesto com você. Tudo o que sei é que Gabriel me mandou que você
aproveitasse esta noite.
— Ele mandou você? — Quem diabos manda alguém ir a um
encontro? O que eu sou? Um pedaço de carne para leilão? Eu estreito
meus olhos. — O que mais?
Ele rouba outro olhar para mim. — O que você quer dizer com
o que mais?
— Um bom tempo e o que mais?
Ele passa a mão no rosto. — Jantar, velas e...
— E o que?
— Ele quer que eu durma com você.
— Pare o carro.
— Valentina...
— Agora! — Já estou puxando a maçaneta da porta.
Ele para o carro bruscamente na beira da estrada e agarra meu
braço. — Por favor se acalme. Temos seus guardas nos vigiando.
Eu ainda estou em suas palavras. Não posso acreditar que
Gabriel me deu para Quincy. Para sexo. Cubro meu rosto
com as mãos. — Eu estou tão envergonhada.
Ele afasta minhas mãos. —
Não é sua culpa. Você não tem
nada para se envergonhar. Não sei
qual é a ideia de Gabriel com a coisa toda, mas
podemos muito bem sair e nos divertir, já que ele
está bancando. — Ele acrescenta rapidamente. — Não
estou dizendo que você tem que dormir comigo. Vamos
apenas dizer que não funcionou dessa forma. Sei que
você não sente isso por mim e não tenho o hábito de
forçar as mulheres.
— Obrigada. — Eu arrasto uma respiração
instável. —Acho que você está certo. Iremos apenas em
nosso encontro de faz-de-conta e pediremos os pratos
mais caros do menu.
— Bom. — Ele dá uma tapinha na minha
mão. — Agora posso relaxar. Cara, isso estava me
matando. Você não tem ideia.
Eu não posso deixar de rir. —
Desculpa. Eu não queria que você se
estressasse por causa do sexo comigo. Deve ser um pensamento
assustador.
Ele me dá outro sorriso irônico. — Não coloque palavras na
minha boca, agora.
O aperto em meu peito desaparece um pouco, mas não a mágoa
por Gabriel preferir me mandar para ser atendida como uma vaca ou
cavalo do que cuidar de mim sozinho. Preciso mudar de assunto
incômodo.
— Como é que você conseguiu treinar com o Bruno? — Eu
pergunto.
— Eu era o único com mais ou menos medo dele.
— Você deveria tratar ele melhor. Eu vi o que você está dando
para ele. Pode muito bem dar-lhe serragem.
Ele gargalha. — Sim? O que você recomenda?
— Vou lhe dar o nome de uma boa marca, mas você terá que
encomendar ela ao veterinário.
— Isto é um pedido ou uma ordem? — Ele pergunta
zombeteiramente.
— Não é como se Gabriel não pudesse pagar
o melhor.
— Você está certa. — Seu
sorriso é brilhante. — Vamos
tentar.
A Thai Hut é uma pequena casa de madeira
sobre palafitas com luzes coloridas de fadas penduradas
na varanda. O interior tem cheiro de curry e o ambiente é
aconchegante. Apesar de tudo, eu relaxo com as
brincadeiras fáceis de Quincy. Acabamos com uma
garrafa de vinho e, quando pedimos a conta, não
havia mais clientes. Como Quincy ultrapassou o
limite, um dos guardas nos leva de volta. Em casa,
ele me beija na bochecha e vai até a área dos
funcionários.
O guarda noturno me deixa entrar. Após um
segundo de hesitação, subo as escadas para o quarto
de Gabriel. Quero algumas respostas e as quero
agora. Abro a porta, a raiva me tornando
corajosa, mas o quarto está escuro e
vazio. Talvez ele próprio esteja fora, fazendo o
que esperava que eu fizesse com Quincy. Banindo o pensamento da
minha mente, vou para o meu quarto e tento não pensar nele
enquanto adormeço.

Gabriel

AS LÂMPADAS DE TUNGSTÊNIO no teto zumbem Com um


ruído constante. A luz branco-azulada deles lava as sombras com
uma intensidade excessivamente brilhante. Já se passou uma hora
desde que Rhett me deixou na academia. Estou pensando nos
negócios da semana, tentando me concentrar no planejamento e nos
números, mas meus pensamentos continuam indo para Valentina e
Quincy. Onde eles estão? O que eles estão fazendo? O que ela está
vestindo? Seu cabelo está solto nas costas ou ela o prendeu no coque
bagunçado que faz aos domingos? Talvez esteja amarrado no rabo de
cavalo que ela usa para trabalhar, e meu guarda está
puxando o elástico dos fios sedosos agora, deixando ele
espalhar sobre seus seios fartos. Ele
está pressionando os lábios
contra a curva suave e carnuda
de sua boca? A mão dele está entre as pernas
dela?
Eu puxo as algemas, sacudindo as correntes como
uma besta em uma gaiola. Um grito de indignação enche
o espaço. Demoro várias respirações longas
para encontrar alguma semelhança com a calma,
forçando meu cérebro a funcionar racionalmente. Eu
fiz uma promessa. Isso é por Valentina. Isso parte
meu coração em pedaços, mas eu vi a maneira como
eles se olham. Quincy está apaixonado por minha
mulher, e ela gosta dele mais do que jamais
admitirá. Diariamente, sou forçado a testemunhar a
maneira como seus olhos se iluminam quando se
encontram no jardim. Sua gentileza para com ela
é empurrada para baixo em minha garganta. É
um lembrete de que nunca a terei como outro
homem pode tê-la, um homem com um rosto bonito e um sorriso
fácil. Um homem sem escuridão e uma necessidade de machucar ela
e possuí-la. Ela nunca será minha assim, livremente, mas não
importa. Eu nunca vou deixá-la ir. Em troca da eternidade, estou
dando a ela esta noite. Ela merece a beleza com um homem gentil
por cima, oferecendo a ela um rosto bonito para olhar e um corpo
intacto para se segurar.
Ele a encontra molhada?
— Não!
Eu me esforço contra as correntes. Meu rugido soa animalesco,
até mesmo para meus próprios ouvidos. Eu não consigo fazer
isso. Eu não aguento mais. Que se foda minha promessa.
— Rhett! — Minha voz atravessa a sala, levantando o telhado. —
Me deixe sair daqui! Abra a porta!
Grito palavrões e profiro ameaças das quais até Magda se
envergonhará, puxando as algemas até que minha pele fique
em carne viva e corro o risco de arrancar os braços das
articulações. Eu grito até minha voz ficar rouca, mas os sons ficam
presos na sala projetada exatamente para esse propósito.
— Valentina!
Eu luto com uma raiva tão
sombria que a razão foge da
minha mente. Luto com
pensamentos que abrem meu coração e me cegam
na fúria vermelha de meu ciúme possessivo. Eu luto
com nada além do ar, como se pudesse estrangular
aquelas imagens que torturam minha mente e colocá-las
para descansar. Agarrando e chutando, eu torço meu
corpo até o banco cair debaixo de mim. Eu chuto a
madeira com minhas botas, os estilhaços espalhados
de quando se quebra um som satisfatório que
alimenta minha necessidade de violência. A dor sobe
pela minha perna machucada, uma punhalada aguda
no meu joelho. Eu luto até que cada parte de mim
esteja doendo tanto quanto meu coração, até que
não tenha mais energia.
Encharcado de suor e surrado, desabo em
minhas correntes, pendurado pelos fios da
sanidade. A ironia de onde me encontro não é
perdida por mim. Estou acorrentado em minha própria câmara
de tortura, sofrendo uma tortura auto infligida muito pior do que
qualquer coisa que fiz a qualquer inimigo que já teve o desagrado de
cruzar esta porta.
— Valentina.
O nome dela é um coaxar. Minha garganta queima. Eu não
posso mais gritar. Só posso soluçar e ceder à crueldade da minha
imaginação enquanto ela me leva a um tour gráfico da primeira vez
de Valentina.

EM ALGUM MOMENTO DURANTE a madrugada eu encontrei


uma posição de joelhos, meus braços puxados para cima e minha
cabeça pendurada entre meus ombros. Devo ter desmaiado de
exaustão física. Minha garganta e meus olhos estão
desidratados. Ásperos. Tudo dentro de mim está frio. Eu fiz um favor
a ela, mas a parte egoísta de mim é muito grande, a
parte possessiva de mim é muito completa para aceitar
isso com elegância. Eu olho para o
relógio de parede. Está
terminado.
Tarde demais.
A chave gira na fechadura e a porta se abre. Rhett
faz uma pausa quando ele entra na cena.
— Venha me soltar, — eu grito.
Ele hesita, mas finalmente se aproxima
com passos rápidos. Enquanto ele me solta, evita
meus olhos. No minuto em que estou livre, ele se
retira para o outro lado da sala.
— Vá embora, — eu rosno, com medo de
descontar nele.
Ele não me deixa dizer duas vezes. Como uma
flecha de um arco, ele dispara através da porta, seus
passos caindo em uma corrida rápida pelo corredor.
Passo a mão no rosto, a barba por fazer onde
não havia barba, um lembrete de que preciso
tomar um banho e me barbear. Cada grama do
meu corpo está duro. Mais do que tudo, quero caçar Quincy e matá-
lo. Em menos de uma hora, vou enfrentá-lo e ouvir seu relato. Eu
quero cada fodido detalhe para que eu possa fingir que estive lá, parte
de tudo isso. Estou com muito ciúme para me poupar da dor.
Caminhando até o bar que está sempre abastecido com água
mineral e bebidas, torturar pessoas é um trabalho que dá sede, eu
sirvo um uísque e bebo puro. Então outro. E outro. Eu preciso do
álcool se não quiser esmagar a traqueia de Quincy e arrancar seu
pau. Para garantir, tenho um quarto. O álcool queima meu estômago
e alivia o pior da ferida na minha garganta das maldições vis que
proferi a noite toda. Minha pele aquece e meu cérebro fica turvo o
suficiente para embotar minhas emoções, o suficiente para passar a
hora que me aguarda sem cometer um assassinato em minha própria
casa.

Valentina

ÀS CINCO ESTOU ACORDADA como de costume,


mas Gabriel não vem à cozinha para o café. Deixo seu café
da manhã na bandeja quente e
encolho os ombros
internamente. Se ele teve uma
noite difícil, espero que acorde com uma bela
ressaca. Isso vai servir a ele pela façanha que tentou
manipular para mim. Ainda fervendo de aborrecimento,
pego o cesto de roupa suja e saio para recolher a roupa. No
corredor, meu passo diminui quando ninguém menos
que Gabriel vira a esquina, vindo na minha direção.
Ele parece terrível. Seu cabelo está
despenteado, em todas as direções, e a barba por
fazer desfoca a linha bem raspada. Seus olhos estão
injetados e suas roupas, as mesmas roupas da noite
anterior, estão enrugadas. Onde quer que ele esteve,
parece que escorregou para fora da cama de alguma
mulher há um segundo.
Seus olhos se fixam em mim com o tipo de
intensidade que nos isola neste momento. Todo
o resto desaparece quando ele me acerta com
seu olhar de geleira, me fazendo estremecer por dentro. Ele me
mantém presa em restrições invisíveis até que está quase em cima de
mim. Mesmo se eu quiser, não posso me mover. Estou congelada no
lugar.
Ele inclina um braço acima de sua cabeça na parede e cruza um
tornozelo sobre o outro, sua postura relaxada e intimidante enquanto
olha para mim.
— Então, — seus olhos me percorrem de cima a baixo, — como
foi a noite passada?
Há uma mordida em suas palavras que é contraditória ao brilho
de dor em seus olhos. O uísque que amarra sua respiração flutua até
mim no ar. Ele saiu para beber?
Eu quero dizer que ele é um idiota, mas sua masculinidade se
dobra em torno de mim como uma capa, o poder que ele tem sobre
mim é assustador e excitante.
— Ele beijou você? — Ele pergunta com uma fala arrastada,
diversão fria mascarando outra coisa que eu não consigo identificar.
— Em um primeiro encontro? — Eu sou sarcástica. — Alguns
homens são cavalheiros, você sabe.
Primeiro, ele parece surpreso, depois aliviado e
depois com raiva. —Você está me
dizendo que nada aconteceu?
— Como eu disse, Quincy é
um cavalheiro.
A intenção de predador enche seus olhos. Ele se
move tão perto de mim que posso ver suas pupilas
dilatarem. — Então parece que você não precisa de um
cavalheiro.
Eu me coloco em minha altura máxima, meus
seios roçando em seu peito no processo, mas eu não
me importo. — Ora, Gabriel, você parece
desapontado. — Eu pisquei meus cílios fingindo
inocência. — O que você estava esperando?
Ele estende a mão tão rápido que eu pulo de susto
e deixo cair a cesta quando ele agarra meu pulso.
— Eu ofereci a você uma chance de ficar com o
bonito. — Seus lábios se estreitam. — Eu te
ofereci beleza. Você desperdiçou essa chance, e
agora você fica com o duro e o feio. — Ele aperta até doer. — Você
ficou comigo.
Há tanto significado nessas palavras que não consigo parar o
arrepio que sobe pela minha espinha.
Ele me solta com um leve empurrão e diz em voz baixa e
ameaçadora. — Lembre-se, você implorou por isso.
Pegando a cesta, ele a empurra em meus braços e anda ao meu
redor como se eu não fosse nada além de um obstáculo irritante em
seu caminho. Se eu estava furiosa ontem à noite, estou dez vezes
mais furiosa agora.
— Você não pode me passar como um brinquedo para seus
homens, — digo às suas costas, — e você não pode decidir com quem
eu durmo.
Ele para e dá dois passos para trás. Seu sorriso é frio e cruel. —
É aí que você está errada. Você é propriedade, Valentina. Você
concordou com qualquer dever que eu considerasse adequado. Posso
compartilhar você como quiser, mas não precisa se preocupar em ser
um brinquedo para meus homens. Não gosto de compartilhar meus
brinquedos. A noite passada foi um grande presente do
caralho. Não para Quincy. Para você. — Calor e intenção
possessiva escurecem seus olhos,
fazendo ele parecer mais
perigoso do que nunca. — E isso
nunca vai acontecer novamente.
Ele anda mancando pesadamente, me deixando
tremendo de algo além de raiva. A compreensão floresce
em mim. Gabriel queria que minha primeira experiência
fosse com alguém normal. Ele queria que eu tivesse
um gosto de quão doce pode ser antes que ele me
submeta à luxúria escura que sinto nele. Eu apoio
minhas costas contra a parede e respiro fundo
algumas vezes. Não tenho certeza do que é pior, que
acho sua intenção doce ou que anseio pela escuridão
que ele está escondendo de mim.
11
Valentina

ESTA TARDE, GABRIEL sai para um trabalho e não volta para


jantar. Já estou na cama quando ouço seu andar irregular na
cozinha. Sons remexendo vêm da despensa. Se ele está com fome,
deixei sua comida no forno. Não estou pronta para enfrentá-lo, mas
não posso adiar indefinidamente. Melhor agora, que depois.
Entrando na copa, esqueço minha apreensão. Gabriel está
removendo uma camisa ensanguentada da pia, o kit de remédios
equilibrado na beirada.
— Gabriel!
Eu corro para ele, meus olhos fazendo uma avaliação rápida de
seu estado. Há um corte em seu ombro, com sangue escorrendo, e
vários arranhões na barriga e nas costelas.
Ele pressiona a camisa contra o ferimento e abre a torneira. —
Shhh. Onde está Carly?
— Ela foi para a cama depois do jantar. O que
aconteceu? — Pego a camisa dele e jogo na
lata de lixo. Está rasgada e
manchada além de qualquer
salvamento.
— Negócios.
Ele recua quando toco a ferida para avaliar a
profundidade do corte.
— Isso precisa de pontos. Onde estão Rhett e
Quincy?
— Eu os mandei para a cama. Não é tão sério.
— Ele me dá um sorriso divertido. — Mas sua
preocupação é lisonjeira.
— Não é hora para piadas. — Pegando
desinfetante e gazes esterilizadas do kit de remédios,
começo a limpar a ferida.
— Ainda bem que sangue não te deixa enjoada.
Eu não retribuo seu sorriso. Não quero nem
pensar que atividade sinistra lhe rendeu esses
ferimentos.
— Me dê uma agulha e linha, — ele ordena.
Apenas Gabriel manterá agulhas esterilizadas e fio cirúrgico em
seu kit de remédios. Eu localizo os itens e os mostro para ele. Ele
pega um espelho de maquiagem da prateleira e o equilibra no
revestimento. Observo enquanto ele puxa a linha pelo buraco da
agulha, mas quando ele se inclina em direção ao espelho e enfia a
agulha na pele no topo do corte, eu assumo. Ele me permite, me
estudando enquanto trabalho para costurá-lo. Eu não
sou enfermeira. Nem sou veterinária, mas já vi Kris costurar cortes
várias vezes. Ele estremece, mas não diz uma palavra até que o corte
esteja fechado e limpo.
— Obrigado.
— De nada.
Eu descarto os materiais usados e esfrego a pia e minhas mãos
com desinfetante. Quando termino, dou a ele um analgésico e um
anti-inflamatório com um copo d'água. Ele engole os comprimidos
sem protestar. Linhas finas de fadiga marcam seus olhos e os cantos
de sua boca. Suas linhas de expressão permanentes são mais
profundas do que o normal. Pegando sua mão, eu o levo
para o meu banheiro.
— O que você está fazendo?
— Ele pergunta.
— Tirando o sangue de
você. Você deve se preocupar em pegar AIDS.
Ele sorri. — Da próxima vez, usarei luvas
cirúrgicas.
Eu bufo. Ele me deixa despi-lo enquanto a água
esquenta. Tenho que me despir também para que
minhas roupas não fiquem molhadas, mas o chuveiro
na minha banheira é muito pequeno para nós dois
ficarmos em pé confortavelmente. Quando estou com
ele no chuveiro, ele tem que me envolver em seu corpo
ou me segurar em seus braços. Eu angulo a água para
longe de seu ferimento e lavo o resto de seu corpo,
tentando ser gentil em seu abdômen, onde está
machucado. Quando ele está limpo, enrolo uma
toalha em volta de sua cintura e pego outra para
secá-lo. Eu tenho que ficar em pé no vaso para
alcançar seu cabelo. A julgar pelos dentes que
ele mostra para mim, ele acha meu cuidado divertido, mas não
interfere ou assume. Eu seco suas costas, peito e braços, e então me
ajoelho para esfregar a toalha em suas pernas. Existem tantos
músculos nessas pernas. Eles se entrelaçam em linhas rígidas,
definindo a força externa do homem com uma imagem espelhada
precisa do que está dentro de sua alma.
Enquanto estou me levantando, ele me impede com as mãos nos
meus ombros. Eu olho para cima. Ele está me devorando com os
olhos, seu pau esticando a toalha ao nível do meu rosto.
— Valentina.
Há um apelo na maneira como ele diz meu nome. Eu não posso
deixar de querer agradá-lo. Minha resposta à sua pergunta não
formulada é puxar a toalha e deixá-la cair no chão. Eu o pego na
boca e, como sempre, ele me deixa fazer o que eu quero. Eu o chupo
o mais profundamente que posso, comendo-o com fome. Ele geme e
abaixa os joelhos, se entregando a mim. Recebo seu prazer como se
eu o possuísse, como se fosse seu dever desistir para mim. Ele está
respirando com dificuldade quando eu termino, mas eu também
estou. Ele engancha suas mãos sob meus braços para me
colocar de pé, pressionando nossos lábios juntos e
mergulhando sua língua em
minha boca como sempre faz
quando eu engulo sua
semente. Ele rosna profundamente em seu peito
enquanto chupa minha língua. O som primitivo faz o
calor líquido se acumular entre minhas
coxas. Estou impossivelmente escorregadia, meu corpo se
preparando para sua invasão, uma invasão que ainda
está por vir.
Depois de enxugar a água que espirrou em mim
enquanto lavava Gabriel, o levo para a minha cama e
faço com que ele se deite de costas para não pressionar
seu ombro. Eu me enrolo contra seu lado com minha
cabeça no lado ileso de seu peito.
— Por que você fez isso? — Ele pergunta.
— Fazer o que?
— Cuidar de mim.
— Eu não sei. — Bem no fundo, eu
sabia. Fiquei assustada ao vê-lo ferido.
— Não importa. — Ele segura meu sexo, acariciando meu
clitóris com o polegar. — Foi fofo.
Ele enfia um dedo na minha umidade, me provocando e me
torturando até que arrasta um lento e longo orgasmo detonando do
meu corpo.
Mais tarde, quando ele me segura em seus braços, eu digo. —
Gabriel?
— Hmm?
— Você sempre tem medo de morrer?
Ele responde sem hesitação. — Todo dia.
O homem grande e forte ao meu lado de repente parece
vulnerável demais para o meu gosto. — As cicatrizes são de lutas
como hoje?
Ele dá uma risada baixa. — Você não acha que eu
nasci todo feio, não é?
Eu seguro sua bochecha. — Não foi isso que eu disse. Eu
apenas tendo a pensar em você como indestrutível. Intocável.
Ele coloca sua mão sobre a minha e esfrega sua bochecha contra
minha palma. — Não sou intocável, Valentina. Estou
longe disso. — Ele move minha mão em seu peito. —
Eu tenho um coração.
Beijo o disco plano de seu
mamilo e coloco minha orelha em
seu peito, apenas para garantir. A batida é forte e
rítmica. Parece seguro e calmo. Eu tenho que acreditar
que nada vai acontecer com ele. Se ele se for, nosso acordo
de nove anos está cancelado e eu estou morta. Magda não
honrará o acordo. Disso, tenho certeza.
Eu me empurro em um cotovelo para traçar as
linhas em relevo em seu rosto. — Me diga como isso
aconteceu.
Ele pega minha mão. — Não essa noite.
— Nada? — Eu pergunto com um toque de
decepção. Eu quero saber sua história. Eu quero
entender o homem dentro do sádico.
— Tudo que você precisa saber é que me
arrependo delas. — Ele move minha palma para
a tira de curativo que cobre o corte em seu
ombro. — Por essa cicatriz, por outro lado, sou eternamente
grato. Espero que nunca desapareça.
— Por quê?
— Agora é um lembrete de você. — Ele beija minha testa. — Vá
dormir. Está tarde.
O equilíbrio que começou a mudar entre nós a partir do dia em
que ele me comprou comida inclinando um lado da balança, o lado
onde o afeto supera o físico. Não há mais como negar. Estou
começando a cuidar do meu carcereiro. Talvez eu esteja sofrendo de
síndrome de Estocolmo. Não que importe como ou por que isso
aconteceu. O que quer que tenha despertado meus sentimentos, eles
são reais.
Quando eu acordo em algum momento no meio da noite, ele se
foi. Não tenho nem uma cicatriz para passar o dedo, nenhum tecido
saliente na superfície da minha pele que possa me fazer sentir mais
perto dele. Tudo o que tenho são as marcas que ele está deixando no
meu coração.
Meu período acabou. Meus seios e útero não estão mais
sensíveis, mas meu corpo está preparado com uma
poderosa excitação que não vai me dar alívio. Os
orgasmos que Gabriel me dá não
são mais suficientes. Ele me
fez assim, uma viciada patética
que precisa, anseia e sofre, e ainda me nega o
remédio, mesmo quando eu imploro. Eu fico no escuro
por um longo tempo, tentando me fazer gozar. Não são
meus dedos, meu toque, que preciso. Nem é o toque de
Gabriel. Eu o quero dentro de mim. Eu não me
importo se ele me arruinou ou se ele ainda tem minha
vida em suas mãos. Ele me condicionou, e estou no
final de até onde posso ir. Estou à beira de um
abismo escuro e, mesmo que tenha medo do mergulho,
não posso voltar atrás. Saindo da cama, ando descalça
pela casa escura.
Ele ganhou.
Novamente.
Gabriel

DEIXAR VALENTINA EM sua cama está cada vez mais difícil. Eu


a quero ao meu lado a noite toda. É uma noção pouco prática e
perigosa. Se Carly nos vir ou Magda suspeitar que estou indo mais
longe do que o jogo que afirmo, perco minha filha e a mulher que
domina cada minuto das minhas horas de vigília e até mesmo meus
sonhos. O alarme disparou, me tirando dos meus pensamentos.
O ponto vermelho no monitor de cabeceira me avisa sobre
movimento na casa. Nossa segurança é excelente, mas mesmo os
melhores sistemas são violados. Eu verifico as portas e janelas no
monitor. Nenhuma entrada foi comprometida. Pode ser Carly ou
Magda. Ainda assim, não vou arriscar. Quem está passando pela
minha casa está à minha porta. O rangido de uma tábua do chão
confirma as informações na tela.
Eu pego a arma na mesa de cabeceira. Quando a porta se abre
com um balanço silencioso, eu miro. Meu dedo congela no gatilho. É
a forma esguia de Valentina que preenche o batente da porta. Um
choque me percorre pela facilidade com que eu poderia ter
atirado nela. Eu abaixo a arma. A luta deixa meu corpo,
mas meus músculos não
relaxam. Eles estão
tensos com um tipo diferente de
antecipação. Sua camisola branca brilha perolada
ao luar. Ela está olhando para mim, mordendo o lábio.
Colocando a pistola de volta na mesa de cabeceira, eu
acendo a lâmpada para ver melhor.
Eu sei o que ela quer. Nós dois sabemos por que
ela está aqui.
Eu disse a mim mesmo que não poderia fazer
isso, mas nunca quis nada mais. Eu já dei uma surra
nela sem cortar uma molécula em sua pele, mas se eu
a tomar esta noite, não vou quebrar apenas seu corpo
virgem, mas também minha promessa. Pode me
chamar de homem fraco, mas já perdi a batalha na
noite em que Rhett me trancou na academia. Era só
questão de tempo. Esta noite é uma noite para
promessas quebradas.
Eu estendo minha mão. — Venha aqui.
Ela caminha até a cama e rasteja sobre mim. Cada centímetro
da minha pele pega fogo. No momento em que sua boceta está
descansando na minha virilha, eu sou um fio elétrico, pronto para
explodir, mas me contenho, dando a ela o controle, porque ela veio
até mim e é o momento mais doce de toda a minha fodida vida.
Não sou homem de bate papos ou
rodeios. Principalmente quando algo tão sério está para
acontecer. Quando ela não se move por vários segundos, parecendo
incerta sobre para onde ir a partir daqui eu nos viro, prendendo-a
embaixo de mim.
— Se livre das roupas. — Eu dou a ela apenas espaço suficiente
para puxar a camisola sobre sua cabeça.
Impaciente, eu puxo a calcinha para baixo por suas pernas e ela
a chuta para fora. Ela desce a calça do meu pijama sobre meus
quadris até os joelhos. Tenho que levantar primeiro uma e depois a
outra perna para me livrar dela. Esticado em cima dela, nu, faíscas
estáticas detonam em cada célula do meu corpo. Meu pau está
pesado e dolorosamente duro, amortecido entre suas coxas
macias. Minhas bolas doem por causa de muitas semanas
de celibato e falta de mãos e boquetes. A necessidade de
enfiar nela é tão forte que tenho
que cerrar os dentes.
Eu deslizo minha mão por
nossos corpos e mergulho meus dedos entre suas
pernas. Ela não precisa de preliminares. Está toda
molhada. Para mim. As noites de treinamento de seu
corpo para querer e precisar de mim são como um longo e
interminável período de preliminares e, finalmente,
está prestes a explodir. Eu chupei e mexi em seus
seios, comi sua buceta e brinquei com seu clitóris por
semanas. O que resta é dar a ela cada centímetro do
meu pau. Uma vez dentro dela, não há como
voltar. Seu corpo pertence a mim, mas quando eu
terminar de foder, sua alma será minha. Depois que
minha semente derramar em seu ventre, nenhum
outro homem vai tocá-la novamente. Amanhã
não. Não quando seus nove anos
acabarem. Nunca.
Espalhando os lábios de sua boceta com meus dedos, eu
empurro a cabeça do meu pau contra sua entrada. Minha cabeça gira
como se eu estivesse drogado. Eu mantenho meus olhos
abertos. Quero ver seu rosto quando me afundar nela. Eu quero me
lembrar de sua expressão. Eu quero saber como ela fica quando goza
no meu pau e o que ela sente quando a marco por dentro com meu
esperma.
Ela encontra meu olhar de frente, tão bravamente quanto eu
pensei que faria, e pega meu rosto entre as mãos.
— Gabriel... — Ela inala profundamente.
Há hesitação em sua voz. Estou pronto. Ela também, ou não
estaria aqui. A única coisa que me impede de rasgá-la é o ar preso
em seus pulmões junto com suas palavras não ditas.
— Diga, — eu mando, minha necessidade dolorosa.
Acalmando minha libido, eu esfrego seu osso púbico. A ponta
do meu eixo avança, mergulhando no calor escorregadio que
espera. Quase violentamente, eu recuo antes de perder toda a razão
e foder com ela antes que ela fale.
— Eu sei que você acha que eu sou virgem, — ela diz
baixinho, — mas não sou.
Por um momento, fico
chocado com uma
pausa. Como pude estar tão
errado? Meu julgamento a respeito do corpo de uma
mulher está sempre acertado. Todo esse tempo, eu me
puni, me negando a ela, fazendo promessas que não pude
cumprir. E pensar que quase deixei Quincy ficar com
ela. Eu ignoro o pensamento. Não é para onde eu
quero levar minha mente, agora. Quem quer que
fosse seu amante, o idiota não sabia como fazer ela
gozar. Nesse sentido, sou definitivamente o
primeiro. De qualquer forma, não me importa quem foi
o primeiro. Não importa, porque serei o último. Não faz
diferença para mim se ela é uma virgem sagrada ou
uma prostituta.
— Eu não me importo, — eu digo rispidamente,
agarrando meu eixo e direcionando ele para o
lugar que vai me dar acesso a sua alma. É
quando você toma uma mulher, quando você
a faz desmoronar em seus braços, que você vê a nudez de seu coração
e todas as verdades que ela esconde do mundo.
— Isso não importa para você? — Ela pergunta com um toque
de descrença.
— Claro que não. — Eu belisco sua orelha. — Por que
importaria? Eu também não sou virgem.
— Eu só não quero que você fique desapontado.
Desapontado? Ela está louca? — Acredite em mim, nada sobre
isso, — eu esfrego meu pau sobre suas dobras lisas, — pode ser
decepcionante.
Um soluço sai de sua garganta. Isso me pega tão desprevenido
que quase perco o flash de terror que faísca em seus olhos.
— Valentina. — Eu recuo um centímetro. — Se você não estiver
pronta, tem que me dizer agora. — Usei a sedução como minha arma
para atrair ela para a minha cama por um bom motivo. Não há prazer
nisso para mim se for à força.
— É por isso que você esperou? Você pensou que eu não estou
pronta?
— Você sabe por que eu esperei. O que você está
realmente perguntando?
— Você…? — Ela morde o
lábio. — Você me quer? Quero
dizer, você me quer assim?
— Maldição, Valentina. Este não é um ato de
gentileza ou um favor. A razão de você estar aqui
é porque eu te quis desde o momento em que te vi pela
primeira vez, e daqui a um segundo vou te foder como
venho querendo há muito tempo, então é melhor você
me dizer se está tendo dúvidas.
— Não é isso. — Ela parece envergonhada. — Eu
não sei o que fazer.
— Espere... — Se ela não é virgem, como é que
não sabe o que fazer? Uma sensação fria de raiva se
desenrola em meu intestino. A amargura enche minha
boca. A verdade se aloja como uma estaca em meu
coração. — Você foi estuprada.
— Sim, — ela sussurra, — mas foi há muito
tempo.
O ritmo da minha respiração acelera, mudando de direção. Eu
vou de excitado para louco delirante. Malditamente furioso. Vou
matar o filho da puta com minhas próprias mãos, arrancar sua pele
de seu corpo e cortar seus músculos de seus ossos. Forçando minhas
emoções de volta, eu soltei meu pau, relaxando para segurar sua
bochecha.
Calmamente, para não a assustar com a força da minha raiva,
pergunto. — Só uma vez? — Enquanto prendia a respiração para a
resposta.
— Apenas uma vez.
— Quando?
Ela vira a cabeça para o lado.
Eu não vou deixar para lá. Eu preciso saber. — Olhe para mim.
Ela obedece, seus olhos me implorando para não empurrar, mas
quanto mais ela se contém, mais inquieto eu fico.
Eu passo meu polegar sobre sua bochecha. — Quando?
Ela franze os lábios e me encara com olhos arregalados, como
se eu fosse julgá-la. — Eu tinha treze anos.
Quando eu colocar minhas mãos sobre aquele filho
da puta, ele vai sofrer. Só falta fazer uma pergunta. —
Quem?
— Eu não sei.
Ela não está mentindo. Ela
não pisca ou desvia o olhar, e suas pupilas não
dilatam. Ela foi uma vítima aleatória. Vou encontrar ele
e matá-lo por ela. Se ela quiser, vou dar-lhe a arma e
deixar ela atirar nele. Se for a última coisa que eu fizer,
farei o desgraçado pagar.
Eu beijo seus lábios. — Não foi sua culpa.
— Eu sei.
Estou feliz que ela me contou. Isso exigirá uma
habilidade e atitude diferentes. Tecnicamente, ela pode
não ser virgem, mas fisicamente, emocionalmente e
mentalmente ela é virgem e eu terei isso.
Me deitando em seu corpo, seguro seu queixo e
a seguro no lugar para o meu beijo, machucando
nossos lábios. Ela se engasga em minha boca,
mas me deixa assumir o controle. Como ela não
pode mover a mandíbula, sou eu que estou
beliscando, chupando e moldando meus lábios em torno dos dela,
pegando, dando e tornando o momento meu. Depois de um tempo,
ela começa a lutar comigo, envolvendo os braços em volta do meu
pescoço e me puxando para um beijo mais profundo, sua língua se
enredando na minha com uma urgência que me deixa em
chamas. Eu mudo minha palma de sua mandíbula para seu pescoço,
apertando com controle dominante. Ela abraça o toque, se
arqueando em minha mão. Eu a prendo no colchão com aquele
aperto de comando enquanto eu mudo para seus mamilos, iniciando
uma lenta sedução de língua e dentes em cada zona erógena de seu
corpo. Eu belisco o interior de seus cotovelos e mordo a carne onde
sua boceta encontra sua coxa. Eu arrasto minha língua sobre o
interior de suas pernas e cavo meus dedos em sua bunda, separando
a carne curvilínea para que eu possa lamber de sua rachadura até
sua boceta. No momento em que eu beijei meu caminho de seus
pés até seu monte, suas pernas estão em volta de mim, e ela está
deslizando seu sexo molhado sobre meu pau, buscando a fricção que
a trará alívio.
— Eu quero você, — ela sussurra, respirando beleza
em meu quarto. — Eu quero você, Gabriel. Por favor.
Um gemido baixo vibra em
meu peito. Ela
está implorando por mim. Ela me
quer como nenhuma outra mulher me quis antes,
não pelo meu dinheiro ou proteção, mas para aliviar a
necessidade que eu tão cuidadosamente plantei e nutri
dentro dela. O prazer dela é meu, e vou mantê-lo para
sempre.
— Oh, Deus, por favor. — Ela cravou as unhas
nas minhas costas. —Me foda, agora.
Estamos ambos fora de controle. Eu preciso
estar lúcido, ou posso machucá-la, mas
ela me pegou pelas bolas, literalmente, arrastando suas
unhas afiadas do meu saco até minha bunda e me
enviando muito além da sanidade.
Eu agarro meu eixo e aperto a raiz com força,
rezando para que a pontada de dor me mantenha
dentro da razão. Me empurrando em um braço,
eu me puxo do vício de suas coxas e separo
suas pernas com meu joelho. Quando ela está bem aberta, levo
apenas um segundo para apreciar a visão antes de alojar a cabeça
do meu pau em sua boceta. Seus lábios se espalharam ao redor da
minha circunferência, esticando para acomodar tudo de mim. Eu
tenho pouco controle precioso restante.
— Olhe para mim, — exijo.
Ela abre os olhos. Eles estão nebulosos de desejo e fumegantes
de necessidade, mas estão focados em mim. Descanso meus
cotovelos no colchão para que eu possa segurar seu rosto entre
minhas mãos, precisando pegar suas expressões como uma
oração entre minhas palmas. O movimento me empurra mais um
centímetro dentro dela. Ela se engasga e seus olhos se
arregalam. Está apertada e quente, seu canal não utilizado já
empurrando para expelir o objeto estranho alojado em sua entrada.
Eu empurro mais fundo, sentindo-a como um punho de veludo ao
meu redor. Eu sou grande e ela é frágil, pequena. Sua maciez ajuda,
mas é como entrar em uma câmara estreita de lava quente e
derretida. Quanto mais fundo eu vou, mais ela se contorce. Eu vejo
tudo em seu rosto, o choque, a dor, a confiança e a
necessidade que a consume.
O suor goteja na minha linha
e no tronco. Minha pele está
pegando fogo. Sua respiração
explodiu em seu peito.
— Gabriel…
É um pedido de misericórdia. Está se movendo muito
devagar. Posso prolongar o desconforto ou fazer doer forte
e rápido antes de que tudo melhore. Puxando para
trás até que apenas a cabeça do meu pau seja
mantida no lugar pelo alongamento do músculo em
sua abertura, eu seguro seu rosto com força e dirijo
para casa. Rasgando o tecido feminino, eu me enterro
dentro de seu corpo o mais fundo que posso. É o
momento que eu tenho sonhado, em ouvir seus
sons, vendo sua rendição, inalando o cheiro do
nosso sexo e sentindo seu corpo esticar para o meu
pau. Ela está tremendo, seus dedos cavando em
meus quadris.
— Está quase acabando, linda. Não vai doer por muito tempo.
— Eu beijo sua mandíbula e me movo, levando-a
com movimentos longos e cuidadosos até que seu corpo se rende,
assim como sua mente, seu canal apertado abraçando meu pau em
vez de empurrá-lo para fora.
Seus gemidos se tornam ofegantes. É música para meus
ouvidos. Quando ela joga a cabeça para trás, eu solto seu rosto,
segurando apenas seus olhos. Brinco com seu corpo, acariciando
seus seios e clitóris enquanto bato mais fundo e mais rápido, levando
tudo que ela pode dar, tudo que faz de Valentina uma mulher. Eu
amasso e massageio até que ela esteja macia e flexível em meus
braços. Ela se molda como argila úmida sob meu toque, até que
seus quadris comecem a se mover ao ritmo dos meus dedos em seu
clitóris.
E então acabou.
Ela quebra.
Seu corpo me chupa mais profundamente, prendendo meu pau
em uma armadilha de êxtase doloroso. Suas pupilas dilatam como
estrelas cadentes, e seu olhar voa para longe de mim como
um cometa enquanto ela goza e deixa um rastro ardente
em minha alma. Neste momento,
ela pode me pedir qualquer
coisa, corto até minhas bolas para
dar a ela. Vou buscar a lua e as estrelas, se ela
quiser, mas ela apenas diz. — Me segure — e eu dou a
ela o que ela deseja.

Valentina

OS BRAÇOS DE GABRIEL ESTÃO seguros ao meu


redor. Ele me deu orgasmos incontáveis, mas este
era diferente. Este era mais profundo e intenso,
mexendo com as emoções enterradas que não tive
coragem de olhar por muito tempo. Depois do meu
ataque, evitei os homens. O evento me impediu
de explorar minha sexualidade. Tive medo de
seguir por esse caminho com medo de arrancar
tudo o que vivi naquela noite horrível, mas o que compartilhei com
Gabriel não foi nada disso. Era uma necessidade carnal, sem culpa
e necessária. Ele tirou minha liberdade e fez do meu corpo um
escravo dele, mas agora, não há nenhum outro lugar que eu
preferisse estar. Aqui é onde eu pertenço. É aqui
que ele pertence. Tanto quanto ele me tomou, eu tomei uma parte
dele também. Eu peguei algo dele para mim e sempre vou guardar
no meu coração. Me sinto conectada a ele enquanto me deito em seu
abraço, desfrutando do brilho posterior do meu orgasmo. Agora que
o tive dentro de mim, estou mais faminta do que nunca por
mais. Estou faminta por informações que vão além do sexo que
compartilhamos. Eu quero saber por que seu belo físico está
quebrado. Eu quero saber tudo sobre ele.
Deslizo minha mão pelo seu corpo para traçar a cicatriz em seu
joelho. Talvez ele me diga esta noite. — Como isso aconteceu?
— Um tiro na rótula de um de nossos rivais, — diz ele com
naturalidade.
— E isto? — Eu acaricio seu quadril.
— Taco de beisebol.
— E isto? — Quando estou prestes a segurar sua
bochecha, ele pega minha mão.

Estilhaços. Explosão. Um devedor
tentou nos explodir com o prédio onde estava
lavando o dinheiro que roubou de nós.
— Ele sobreviveu?
Ele me dá um sorriso forçado. — O que você acha?
— Você já pensou em consertá-lo? — Eu
pergunto o mais gentilmente que posso.
Ele responde com uma voz fria. —
Isso está consertado.
O horror, não pela feiura, mas pela tristeza, me
invade. Como ele estava antes, se isso é depois?
Ele solta um pequeno suspiro. — Meus ossos
foram esmagados. Sob a pele, há principalmente
metal. O risco de os músculos colapsarem com mais
cirurgias plásticas é muito alto.
Eu envolvo meus braços em volta de sua
cintura, segurando-o com força contra
mim. Dizer que sua máscara de dor não me incomoda só vai soar
frívolo, mesmo que seja verdade.
Eu descanso minha bochecha em seu peito. — Seu pé?
Todos os seus músculos ficam tensos. Ele leva vários segundos
antes de relaxar debaixo de mim novamente. Quando pensei que ele
não ia me contar, ele disse. — Minha mãe atirou em mim.
Eu mal consigo engolir meu suspiro. — Por quê?
Seu tom é neutro. — Quando fiz doze anos, ela me deu uma
arma e me disse para atirar em um homem. Eu não consegui.
Um nó na garganta restringe minha fala. Não consigo imaginar
o tipo de infância que ele teve. Uma parte de mim se relaciona com
isso e entende. Há um acordo silencioso entre nós enquanto nos
abraçamos e confortamos, duas pessoas feridas com cicatrizes
diferentes.

AINDA ESTÁ ESCURO QUANDO Gabriel me acorda


com um beijo na boca. Eu me estico, sentindo a aspereza
de seu amor na ternura entre
minhas pernas, mesmo que ele
seja tão gentil quanto eu acho que
pode ser.
— Bom dia. — Ele morde meu lábio inferior.
Seu pau está duro contra meu quadril, uma
lembrança da noite passada e do que posso ter
novamente.
— Gabriel. — Minha voz está ofegante.
Ele ri. — Se eu não estivesse tão preocupado em
não deixar você dormir o suficiente, eu estaria
enterrado entre suas coxas há uma hora.
Eu tremo com o pensamento, o desejo me deixando
molhada.
Uma sombra surge em seus olhos. — Você tem
que ir. Carly vai subir logo.
É um comentário lógico, mas dói, e isso é
uma surpresa. Talvez seja porque rastejar pelo
corredor escuro como se eu tivesse algo a
esconder, como o que fiz com Gabriel pertencesse às sombras, mata
o surto emocional da noite passada.
— Você está certo. — Eu me sento, segurando o lençol contra
meus seios.
Tateando sob os lençóis, encontro minha camisola e calcinha e
visto. Enquanto eu balanço meus pés para fora da cama, ele agarra
meu braço. Eu paro, mas não olho para ele. Estou com medo de que
ele veja o que sinto em meus olhos. Que eu me importo.
Ele beija meu ombro e escova seus lábios da curva do meu
pescoço até a minha orelha. Quando me solta, tomo isso como minha
deixa para sair. Fecho a porta do quarto silenciosamente atrás de
mim e olho para o corredor para ter certeza de que está limpo antes
de voltar para o meu quarto. O quarto parece vazio e frio. Do nada,
tenho um ataque de solidão inexplicável, seguido por um ataque de
culpa porque Oscar está dormindo sozinho no meu travesseiro.
Eu o pego e o abraço no meu peito. — Pobre bebê. Sinto muito
ter deixado você sozinho na noite passada.
Ele ronrona e esfrega o rosto no meu queixo, não tão perturbado
quanto eu.

Gabriel

NÃO HÁ MUITA
INFORMAÇÃO no país em que Anton não
consegue colocar as mãos, então quando ele me diz
que os registros telefônicos de Lambert Roos foram
apagados, sei que o rato que cheirei é real. Eu ordeno que
Anton investigue a história de Lambert, presente e
passado, e sinalize qualquer coisa suspeita que
apareça, especialmente em relação à família Haynes.
Lambert fez negócios com Marvin. Quero saber por
que ele parou de intermediar o negócio de clonagem de
carros após o acidente dele. Também quero saber quem
é o estuprador de Valentina, mas terei que conseguir
mais informações dela, uma situação delicada pela
qual não espero. Já verifiquei os registros
policiais. A família não denunciou seu estupro.
Minha própria pesquisa não produziu nada
de útil.
O restante do meu tempo é dedicado à preparação do jantar de
reunião desta noite. Apesar de seus protestos, envio Carly para
Sylvia no fim de semana. Não a quero por perto para o jantar, não
com os convidados de Magda. Receberemos o cartel de drogas
Ferreira, Jeremy, o dono, e seu filho e futuro herdeiro, Diogo. Já é
difícil engolir os peões políticos que Magda gosta de entreter. Não
gosto de hospedar traficantes de drogas em nossa casa, mas Magda
está tramando um acordo para abrir uma nova franquia
de financiamento em Westdene, o coração do território de Jeremy.
Desde o minuto em que eles passam pela porta, eu não gosto
deles. Jeremy tem os olhos semiabertos de um crocodilo que finge
estar adormecido para pegar sua presa não suspeita. Ele agarra
minha mão com um aperto jovial, me tratando como seu filho há
muito perdido, enquanto Diogo, um homem simpático e bonito de
quase trinta anos, me lança um olhar meditativo que diz que me acha
muito baixo, não no sentido literal, é claro. Ele pode ser dez anos
mais novo do que eu e abençoado com um corpo inteiro, mas tenho
anos de experiência sobre ele e uma escuridão que ele nem consegue
entender.
Eles beijam a mão de Magda e aceitam os coquetéis
e canapés que ela oferece no
lounge. Seu bate-papo e
fingimento de civilidade me
irritam. Se dependesse de mim, eu teria cortado o
papo furado e chegado ao ponto. Queremos
exclusividade na sua área. Eles querem nosso dinheiro.
Simples. Pagamos uma propina e nenhum outro agiota
entra. Um acordo também garante que não mexamos
com eles e que não matem nossos homens.
Magda navega por toda uma árvore genealógica
de perguntas sobre suas esposas, filhos, avós e
outras coisas antes de finalmente anunciar que o
jantar está servido. O smoking que estou usando para
a ocasião, esses casos sendo sordidamente formais,
está quente demais. Eu coloco um dedo entre meu
pescoço e a gola da minha camisa de noite e puxo. A
gravata borboleta cede um pouco, mas eu só
respiro melhor quando Valentina entra na sala
em seu vestido preto sombrio e cabelo puxado para trás em um coque
elegante na nuca.
Eu a observo descaradamente enquanto ela serve nossas
entradas. A curva de seu pescoço é longa e elegante. Seus dedos são
finos, mas servem com movimentos eficientes e seguros, sem
derramar uma gota da sopa de gaspacho. Um cheiro de framboesa
enche minhas narinas quando ela passa por mim, o tecido de seu
vestido tocando minha cadeira. Ela está presente em todos os meus
sentidos, mesmo em meus pensamentos com a memória de como seu
corpo se rendeu ao meu na noite passada. Meu pau endurece. É uma
boa coisa estarmos sentados.
É difícil tirar minha atenção dela, mas preciso me concentrar na
negociação e nas nuances sutis da conversa. Sou bom em ler a
linguagem corporal. Posso não dizer muito, mas se nossos parceiros
tentarem nos foder, sou sempre o primeiro a ter o palpite. Com
dificuldade volto a atenção para as pessoas sentadas do outro lado
da mesa, mas, ao erguer os olhos, noto o modo como Diogo encara
Valentina. A raiva explode em meu corpo e corre em minhas veias. A
única coisa que me impede de esticar o braço por cima da
mesa e afogá-lo em sua tigela de sopa é que Valentina sai
da sala, interrompendo sua
cobiça. Mal posso esperar que
esta noite acabe.
Na metade da refeição principal, chegamos a
um acordo. No minuto em que apertamos as mãos sobre
o acordo, a tensão de Magda evapora. Ela se tornou a
anfitriã atraente pela qual é conhecida, atraindo Jeremy
para uma discussão amigável sobre os times de rúgbi
adversários que eles apoiam. Diogo pede orientação
para o banheiro e pede licença.
A pele entre minhas omoplatas pinica. Eu
empurro minha cadeira para trás. — Com licença. Vou
verificar a sobremesa.
Magda me lança um olhar, mas não vejo o
aborrecimento em seus olhos. Minhas solas estão
quietas no corredor acarpetado. Na entrada da
cozinha, paro abruptamente. Valentina está com
as costas apoiadas na parede e uma faca de
cozinha apontada para Diogo.
12
Gabriel

A FACA NAS MÃOS DE Valentina me faz ver imagens que me


perseguirão para sempre. Um milhão de cenários surgem na minha
cabeça. A ideia de Valentina magoada ou das mãos de Diogo sobre
ela, me leva da razão à loucura. Num piscar de olhos, bato em Diogo,
jogando-o no chão. Eu bato seu rosto nos ladrilhos e o imobilizo com
meus joelhos, meus punhos batendo em suas costelas. Os sons de
seus grunhidos estrangulados e ossos quebrando não são
suficientes. Eu quero que ele tussa sangue até que seus pulmões se
afoguem nele.
— Gabriel!
A voz de Valentina perfura a bolha feia da minha raiva. O
pedaço de merda embaixo de mim está lutando por sua
vida. Lentamente, volto para a parte distante da humanidade dentro
de mim, o pouco que resta em minha alma. Magda e Jeremy
entram correndo na cozinha, provavelmente alarmados
com o grito de Valentina.
— O que está
acontecendo, em nome de
Deus? — Magda agarra meu braço e tenta me
puxar do homem esparramado no chão.
Eu a afasto, mas são os olhos redondos e medrosos
de Valentina que me chamam para deixar o lixo ir.
Ficando de pé, ajusto minha jaqueta. —
Levante, seu filho da puta.
— O que diabos está acontecendo? — Jeremy
segura Diogo pelos ombros para ajudá-lo a se
levantar.
Puxar ele é uma luta. Parece que ele tem
dificuldade para respirar. Devo ter tirado o fôlego dele e
quebrado algumas costelas. Sua cabeça está
sangrando com o golpe nos ladrilhos.
Magda esvoaçava em volta dele como uma
galinha. — Gabriel! Você está louco?
Aponto o dedo para Diogo. — Se você colocar um dedo nela,
idiota, você está morto.
Magda e Jeremy voltam a cabeça para Valentina. Ainda está
de pé com as costas apoiadas na parede, o corpo tremendo e os olhos
fixos em Diogo.
Pego a faca da mão dela e a deixo no balcão. Abaixando minha
cabeça, eu nos coloco no nível dos olhos. — Olhe para mim. — Assim
que tenho toda a atenção dela, pergunto. — Ele tocou em você?
— Não, — ela sussurra.
Magda começa a falar, mas eu a interrompo. — O que ele fez?
— Ele queria... para...
Ela não tem que dizer isso. Conheço homens como o Diogo. Eu
sei o que eles querem fazer. Me dirijo a Diogo com um cálculo frio. —
Se eu não tivesse entrado aqui, o que você faria?
Ele cospe sangue de um lábio partido no chão. — Me divertiria
um pouco. Ela é apenas uma empregada, pelo amor de Deus.
Minha voz é suave, mas minha raiva está presente em meu
tom. — Isso te dá o direito de atacar as pessoas que vivem sob meu
teto, as pessoas que eu protejo?
— Espere, filho. — Jeremy se coloca entre nós, as
palmas das mãos levantadas. —
Você não vai arriscar nosso
relacionamento recém-formado
por causa de uma empregada, vai?
Dirijo minha vingança contra o velho. — Ela não é
apenas uma empregada. Ela é propriedade.
Jeremy sabe o que isso significa. No mundo dele e no
meu, a propriedade é mais intocável do que a esposa
de um homem. Você pode foder a mulher de outra
pessoa e rezar para não ser pego, mas não encosta
um dedo na propriedade de outro homem sem aceitar
que vai ter sua mão decepada.
— Uau. — Ele solta uma risada nervosa. — Erro
honesto. Diogo não sabia. Estamos acostumados a
nos ajudar, se é que você me entende.
— Você está me insultando ao insinuar que
minha casa é um bordel?
— Jeremy, — Magda pega seu braço, —
seu filho precisa de atenção médica. Vou cobrir
todos os custos, é claro. Peço desculpas por este infeliz mal-
entendido.
É uma maneira sutil de dizer a ele para ir embora. Magda me
conhece muito bem. Sou um lunático e, agora, estou tão estável
quanto um vulcão ativo.
Jeremy libera seu braço. — Vamos, Diogo.
Diogo zomba de mim ao passar, agarrado ao lado do corpo. Ele
deveria ter apenas continuado andando, mas o erro que comete é se
voltar da porta.
— Você sabe qual é o seu problema, querida? — Ele diz a
Valentina. — Você é muito bonita. É uma pena que também seja uma
puritana. Eu acho que você teria gostado se eu te jogasse contra a
parede.
Só assim, meu controle desgastado se desfaz. Magda agarra a
bainha da minha jaqueta enquanto eu salto para a frente e pego o
chupador de pau pelo pescoço. Jeremy está xingando e tentando
puxar meus braços de seu filho, mas nem cem cavalos são suficientes
para me afastar. Eu o arrasto pelo pescoço esquelético até Valentina
e o forço a se ajoelhar aos pés dela. Eu pego um punhado de
seu cabelo perfeitamente penteado e jogo sua cabeça para
trás. Pegando a mesma faca que
Valentina usou para se
defender, eu empurro a ponta
contra seu pescoço de menino bonito, branco como
lírio.
— Peça desculpas.
— Diogo, — Jeremy diz atrás de mim, com um tremor
na voz, — faça o que ele diz.
— Gabriel. — Há consternação no tom de
Magda, mas ela não me toca. A situação é muito
volátil. Sou muito imprevisível. Um movimento do
meu pulso e a vida de Diogo vai sangrar aos pés de
Valentina. Só que não quero o sangue de outro
homem em sua consciência. Ela já se sente
responsável pela morte de Tiny. Diogo não merece a
culpa que ela vai sofrer por ele.
— Sinto muito, — diz Diogo.
Eu puxo seu cabelo com mais força, fazendo ele gritar de dor. —
Diga como se realmente sentisse.
— Eu realmente sinto muito.
Eu coloco a ponta da faca sob sua pele. — Implore. — Um filete
de sangue escorre pelo pescoço sob o colarinho.
— Me perdoe, — diz ele. — Eu te imploro.
Eu olho para Valentina. — Você o perdoa?
Ela me olha com olhos arregalados de coruja. — Sim.
— Você é mais compassiva do que eu. — Eu o puxo pelos
cabelos até que ele encontre seus pés. — Dê o fora da minha casa. O
negócio foi cancelado, e é melhor você rezar para que eu não o
encontre na rua. É melhor você ficar bem longe de mim.
Quando eu o solto, Diogo tropeça no pai. Magda está mais
pálida do que os ladrilhos brancos no chão, silenciosa pela primeira
vez. Jeremy me lança um olhar estreito, mas pega o braço de Diogo e
o acompanha para fora da sala. Você não insulta um homem em sua
própria casa. Jeremy sabe disso. Ele sabe que posso
cortar a garganta de Diogo por isso, e nenhum de seus sócios de
negócios vai retaliar.
Magda esfrega a nuca. — Eu te vejo lá fora. — Ela se
vira para Valentina. — É melhor
você ir para o seu quarto e não
sair até de manhã. Se eu vir seu
rosto antes, posso não ser capaz de suprimir o
desejo de te matar.
Quando somos apenas nós dois na cozinha, eu a
pego em meus braços e dou um abraço nela. — Você está
bem?
Ela concorda. — Eu não queria causar
problemas.
— Você fez a coisa certa. — Eu beijo o nariz
dela. — Estou orgulhoso de você.
— Você colocou sua vida em risco. Eles vão matar
você.
— Podem tentar, mas o mesmo acontece com
todos os outros criminosos e policiais do país. Você
é minha, Valentina, e ninguém toca em você.
O barulho dos saltos de Magda no
corredor me deixa rígido. — Vai para a cama.
— A cozinha...
— Pode esperar até amanhã. Vai.
Ela obedece sem palavras. No momento em que Magda entra
novamente na sala, Valentina está fora de vista.
— No meu escritório. — Magda sai da sala, sem esperar para ver
se estou seguindo.
Ela segura a porta para mim e a bate quando eu passo pela
soleira.
— Você está louco?
— Você sabe que estou, Magda.
— Você tem ideia de como trabalhei duro para garantir esse
acordo? — Ela empurra o dedo na minha cara. — O que te dá o direito
de estragar tudo? Por causa da porra de uma empregada doméstica!
Eu pego seu dedo e o afasto com força. O ato a pega
desprevenida. Ela tropeça um passo para trás e me olha boquiaberta
com uma mistura de descrença e medo.
— Se você empurrar seu dedo na minha cara de novo, vou
quebrá-lo.
— Gabriel, — ela exclama em um suspiro. — Eu sou
sua mãe.
— Você nunca foi uma mãe
para mim. Não reivindique a
designação agora.
— O que deu em você? Você estragou um
negócio multimilionário, pelo amor de Deus! — Ela
endireita as costas, seu medo de repente desaparece. —
Não pense que você está acima da minha punição porque
você é meu filho. Você está levando esse jogo que está
jogando com a garota longe demais. Você teve sua
diversão. Deixe-a escorregar e a mate para que
possamos todos voltar para nossas vidas.
— Vou decidir quando a diversão acabar.
— Faz parte da diversão comprar suas roupas
extravagantes? Brincar com uma boneca não é o
suficiente para você? Você tem que vesti-la também?
— Você está verificando meus extratos
bancários?
— Eu conheço a dona da boutique onde você levou sua escrava
para uma maratona de compras.
— Isso não é da sua conta.
— Você está fodido da cabeça, sabia disso? Assim como seu pai.
— Como posso esquecer quando você está fazendo um trabalho
tão bom em me lembrar?
Ela passa a mão no rosto. — Eu preciso de uma bebida. —
Apoiando as mãos nos quadris, ela me olha por baixo dos cílios. —
Tire ela de seu sistema, Gabriel. Faça o que for
preciso. Eventualmente, você vai ter que matá-la.
— Boa noite, mãe.
Deixo-a sozinha em seu escritório, indo para o meu tomar uma
bebida forte e meditar sobre a noite. Eu deveria ter
quebrado o nariz de Diogo no minuto em que ele pisou na minha
porta. Dessa forma, eu teria me poupado uma noite inteira de sua
presença desagradável. Meus pensamentos não se demoram muito
no chupador de pau. Como sempre, minha atenção está reservada
para Valentina. Não tenho certeza de em que estado emocional ela
estará quando eu for para o quarto dela, mas estarei lá
para ela, de qualquer maneira. Ela deve se sentir segura
sob meu teto, sabendo que não
vou deixar ninguém a
machucar. O tipo de dor que quero
dar a ela é algo totalmente diferente. O tipo de dor
que gosto de infligir é tanto para o prazer dela quanto
para o meu.
Quando eu entro em sua porta, eu não a encontro
enrolada na cama ou encolhida em um canto. Ela
está espalhada na cama, nua, esperando por
mim. Minhas bolas ficam tensas. Meu pau incha.
Não consigo desviar o olhar de seus dedos, que
estão entre suas pernas. — Você brincou com você
mesma?
— Sim.
— Você gozou?
— Não, eu estava guardando isso para você.
— Bom, porque senão eu teria que punir
você. Eu possuo seus orgasmos.
— Você me possui, Gabriel. Todos os meus orgasmos.
Eu engulo a rouquidão na minha garganta. — Me
mostre. Brinque com você mesma.
— Mais tarde. — Ela mexe os quadris. — Eu quero você dentro
de mim.
Puta merda. O que ela faz comigo? Eu tiro minhas roupas e
subo entre suas pernas. Mesmo que ela esteja se oferecendo, eu
quero caçá-la. Eu quero pegá-la na floresta selvagem, intocada e
escura de nossos desejos e conquistar seu corpo. Eu quero domar
sua alma. Eu estou com ela, mas estou com medo de perdê-la. Eu
preciso prender e restringi-la, mantê-la na jaula da luxúria que eu
tão cuidadosamente construí para prendê-la.
Eu coloco minha palma em sua pélvis, mantendo a parte inferior
de seu corpo no lugar enquanto empurro dois dedos dentro de sua
boceta. Ela está molhada. A sucção de seus músculos internos me
acolhe. Eu não posso esperar. Agarro a raiz do meu eixo e coloco em
sua entrada, mas ela balança a cabeça. É preciso de cada grama de
força de vontade que possuo para não ceder ao desejo de amarrá-la
e fazer com que ela faça do meu jeito. É preciso força para
levantar minha mão de seu abdômen e permitir que ela
escape, mas ela não foge do
monstro em sua cama. Ela
abraça a necessidade que está nos
perseguindo, virando sobre as mãos e os
joelhos. Ela olha para mim por cima do ombro,
colocando sua linda boceta em exibição.
— Me leve assim, — ela sussurra.
O animal em mim está à altura da ocasião. Abro
sua boceta com meus polegares, alinho meu pau com
suas dobras lisas e dirijo para casa. Suas costas
arqueiam com a intrusão rápida e dura, mas ela bate
de volta, encontrando minha força com uma urgência
própria. Estou dando tudo de mim, empurrando nossas
virilhas juntas com força suficiente para machucar
sua pele.
— Mais, — ela ofega. — Você está se
segurando.
Estou deixando-a sem fôlego, e ela está
implorando por mais.
— Mais forte, Gabriel. Por favor. Por favor, Deus. Deixe ir. Me
faça esquecer. Me faça esquecer o que aconteceu esta noite.
Eu faço. As paredes da minha restrição se quebram,
desmoronando ao redor dela, e eu a tomo como nunca tinha tomado
uma mulher antes.

Valentina

GABRIEL ESTÁ BATENDO em mim machucando por dentro,


mas preciso de mais. Com ele, sempre vou precisar de mais. Ele
rouba meu fôlego, me dá prazer e possui meus desejos. Estou tão
cheia dele que não aguento mais e, ainda assim, o quero em cada
fenda e canto do meu corpo.
Chegando entre minhas pernas, eu acaricio seus testículos,
sentindo seu balanço carregado quando ele bate sua virilha contra
minha bunda.
— Mais, — eu gemo. — Por favor.
— Se eu te foder mais forte, vou quebrar você.
Quero que ele sangre em minhas células até que
sejamos inseparáveis, até que nosso DNA se enrede e
minha vida seja enxertada com a
dele. Juntos somos
invencíveis. Enquanto ele está
comigo, ninguém mais pode me tocar. Assim, não
há nada feio. Sem Diogo. Nenhum homem como
Tiny. Só o Gabriel que me faz esquecer tudo, até que ele
me possui.
— Me encha, Gabriel. Me encha mais.
— Maldição, Valentina. Você me mata.
Eu olho para ele por cima do ombro. Seu rosto
está enrugado com o desejo reprimido, seus olhos
frios escurecidos pela luxúria e sua mandíbula tensa
com controle. Sem quebrar o ritmo, ele solta meu
quadril para enfiar o dedo indicador na boca. Ele abre
minha bunda com a mão livre e enfia o dedo molhado
na minha entrada escura. Eu caio para frente e pego
meu peso em meus braços. Com a intrusão na
minha bunda, a pressão na minha boceta
aumenta duas vezes.
— Sim, — eu sussurro. — Assim.
Eu me preparo para o impacto. Com as mãos ocupadas de outra
forma, ele não consegue mais sustentar meus quadris. A força é
demais. Meu corpo está indefeso sob suas marteladas brutais. Cada
impulso me desloca mais alto no colchão. Ele me segue,
puxando para fora e empurrando de volta, seu pau e dedo
trabalhando em sincronia. Uma mão se move para a frente do meu
corpo, encontrando meu clitóris. Alguns golpes rápidos e eu gozo,
gritando seu nome. Espero que ele goze comigo, mas não
faz. Enquanto estou surfando na onda incrível da minha libertação,
ele me estica adicionando um segundo dedo ao primeiro nas minhas
costas. Estou cheia, mas não me importo. Estou me contraindo e
chiando, meu corpo uma tela de receptores de prazer. Estou
flutuando em um espaço de felicidade eufórica. Eu não me importo
com o que ele faz ao meu corpo.
Depois de um tempo, ele retira seu pau. Apenas seus dedos
estão punindo minha bunda. Isso também para. Seu toque
desaparece.
— Não se mova.
Exausta, eu derreto nos lençóis. Não irei a lugar
nenhum. A cama afunda e ele vai
embora. Os armários abrem e
fecham na cozinha. O que ele está
fazendo? Tenho minha resposta quando ele volta
com uma garrafa de óleo de cozinha. Ele o coloca no
chão e continua exatamente de onde parou, trabalhando
dois dedos na minha bunda. A sensação é errada e
emocionante. Um tipo de prazer proibido sobe pela
minha espinha. Depois de um momento, ele retira os
dedos e abre minha fresta. O líquido frio esguicha na
minha bunda. Depois do calor, o frio chega como um
choque. Eu me contorço para escapar do ataque, mas
ele me agarra entre as pernas e me segura enquanto
mais daquele líquido escorregadio me enche.
O óleo. Parece quando ele goza dentro de mim, só
que mais frio. Ele espalha a substância ao redor do
anel tenso de músculo e, quando empurra o dedo
para frente, ele desliza para dentro. Eu arqueio
as costas em resposta, precisando de mais
fricção. O segundo dedo se junta ao primeiro e logo um terceiro dedo
me estica. Não dói, mas está muito cheio. Estou prestes a dizer isso
quando sua mão desaparece e uma superfície quente e lisa empurra
contra minha entrada escura. Eu olho por cima do ombro para vê-lo
posicionando seu pau onde seus dedos estiveram.
Tento levantar a parte superior do corpo, mas ele me empurra
para baixo com a mão na parte inferior das costas, trabalhando em
mim alguns centímetros. Isso queima como o inferno. Eu gemo e me
contorço e tento empurrar ele para fora, mas quanto mais forte
aperto meu traseiro, mais forte ele empurra.
— Relaxe, — diz ele em uma voz firme. — Vou ter o seu traseiro
de qualquer maneira.
Eu sei que vai, e eu quero que ele faça. Respiro fundo e tento
deixar a tensão ir, mas quando ele se move mais fundo, eu grito e
mordo o travesseiro para abafar o som.
— Quase lá, — diz ele, esfregando as mãos nas bochechas da
minha bunda.
Deus, isso dói. Não tenho certeza se posso aguentar. — Gabriel.
— Calma, linda. — Ele se abaixa e beija minha
espinha. — Respire fundo.
Ele fala comigo através da
dor, me fazendo inspirar e
expirar até que tenha enterrado
tudo dentro de mim. O último centímetro é o
pior. Eu suspiro e engulo o ar. Quando ele se move, eu
grito, esfregando minha pélvis no colchão para escapar do
toque, mas ele me persegue, me fodendo mais
profundamente. Com cada impulso, ele tira meu
fôlego até que minha voz fique crua, e então ele se
acalma, mantendo seu pau no meu corpo. Eu mal
estou ciente de nada além da dureza invasiva. Com
cuidado, ele desliza dois dedos na minha boceta. A
ponta de seu dedão repousa sobre meu clitóris,
estimulando minha necessidade. Quando meu desejo
começa a subir novamente e meus músculos se
contraem em torno dele, ele se move novamente. Me
leva a um lugar que eu não sabia que existia,
onde o prazer e a dor são uma coisa só, e o
efeito de ter as duas sensações
simultaneamente no meu corpo torna impossível discernir onde uma
começa e a outra termina. Ele ainda está acendendo a maior
necessidade em mim. Estou cheia e realizada. Estou doendo, mas ele
está me acalmando. Eu estou pairando na borda. Se eu cair, posso
não parar de cair, mas não tenho como evitar.
Meu corpo fica tenso. Quando a onda começa a rolar, ele tira os
dedos molhados da minha boceta. Suas mãos se dobram em volta do
meu pescoço, apertando apenas o suficiente para cortar meu fluxo
de ar. Eu preciso lutar, mas estou muito fraca. Não tenho energia
suficiente sobrando. Eu só posso ficar lá com calafrios elétricos
correndo pelo meu clitóris, e o pau de Gabriel enterrado na minha
bunda enquanto manchas brancas começam a dançar em minha
visão e meu pulso martela em meus ouvidos. No minuto em que ele
me devolve o presente do oxigênio, da vida, sinto uma força que
estilhaça meu corpo e minha mente. Milhares de volts de prazer
percorrem meu corpo, puxando cada músculo, dedo a dedo do pé
com tanta força que meu corpo é um grande espasmo. Devo ter caído
dessa borda, porque estou flutuando como uma pena, e tudo ao meu
redor se transforma em uma escuridão confortável onde o
prazer brutal misericordiosamente para.

Gabriel

PORRA. MERDA. É a primeira vez que fodi


uma mulher até a inconsciência. Viro o corpo mole de
Valentina de costas e bato em seu rosto.
— Acorda querida.
Ela não se move. Nem mesmo seus cílios
tremem. A euforia do meu clímax se evapora. Porra,
porra, porra. Eu a pego em meus braços e a carrego
para o chuveiro. Mal posso me espremer dentro com
ela enrolada em mim. Eu ajusto a água para um nível
morno e, inclinando sua cabeça para trás, deixo
escorrer sobre seu rosto e cabelo.
Ela franze a testa e se mexe.
— Essa é minha garota. Vamos, Valentina.
Ela se engasga e tosse. Suas pálpebras se
levantam para revelar pedras preciosas
olhando para mim. — Gabriel.
O alívio toma conta de mim, e o aperto no meu peito expande
ligeiramente. — Estou aqui, linda.
Eu a seguro contra mim, deixando-a encontrar seus pés sem
soltar meu aperto em sua cintura. Permitir que ela desmaiasse não
fazia parte do meu plano. Estou furioso comigo mesmo. Ela merece
coisa melhor do que um sádico que a empurra para o limite do
prazer, até a porra do desmaio. A única maneira que conheço de
consertar é dando conforto a ela. Como ela cuidou de mim na noite
em que fui esfaqueado, eu cuido dela, lavando seu cabelo e seu corpo
do topo da cabeça até a ponta dos pés da melhor maneira que posso
no espaço confinado. Tenho cuidado com a parte sensível entre as
pernas e, principalmente, sua bunda. Depois de secar e vestir ela, a
coloquei na cama. Isso me rasga, mas eu tenho que ir para a minha
própria cama. Estou exausto demais para arriscar ficar com ela. Se
eu adormecer, posso não acordar antes de Carly. Não quero deixá-la
assim, mas devo. Por quanto mais tempo posso manter o fingimento?

DEPOIS DO MEU TREINO matinal com Quincy e


Rhett, encontro Sonny e Lance,
dois proprietários de franquia
minha, sobre uma disputa de
território. Lance tem lançado suas redes no
território de Sonny e, por mais que odeie bancar o
provedor da justiça, prefiro intervir antes que tenhamos
uma guerra em nossas mãos. É um dia glorioso e estamos
tendo nossa discussão à beira da piscina. Minha
perna está me incomodando mais do que o normal
depois da maratona sexual da noite anterior, e o
exercício na água me faz bem. Eu nado algumas
voltas antes de me esticar em uma espreguiçadeira ao
sol, ouvindo a briga entre os homens adultos. Quando
chega perto de uma hora, interrompo a discussão.
— Sem olhos na governanta.
Sonny e Lance trocam olhares, mas a
compreensão surge em seus rostos quando
Valentina sai da cozinha com uma bandeja
cheia de comida nas mãos e caminha em nossa
direção. Sonny olha para o céu enquanto Lance fixa o olhar nos
dedos dos pés.
Sua figura é esguia no vestido escuro. Com fios que escaparam
de seu rabo de cavalo, ela parece feminina e vulnerável. Eu a quero
ao meu lado, em meus braços, não a uma distância aceitável para
uma empregada, não com uma barreira entre nós que me permite
aproveitar o sol enquanto ela está lá em seu traje preto, suando no
sol.
Não há um ponto de ressentimento no sorriso brilhante que ela
me dá. — Posso trazer-lhe alguma coisa para beber?
— Limonada. — Eu me viro para Sonny e Lance, que estão
olhando para qualquer lugar, menos para Valentina. — Cerveja?
— Por favor, — eles dizem em uníssono.
— Algo mais?
De repente, estou incomodado por ela ter que servir a homens
que não são dignos de beijar seus pés. — Não.
Seu sorriso é genuíno e puro, um raio de beleza que não cabe na
sujeira do meu mundo. — Grite se precisar de mim.
Enquanto ela caminha de volta para a cozinha, não
posso deixar de olhar para os frágeis ombros estreitos com
uma emoção que, desta vez, não é
estranha para mim.
Anseio.
Estou consumido pela saudade.

Valentina

NADA É PIOR QUE O desamparo que senti nas


mãos de homens me intimidando e me
agredindo. Tiny levantou a tampa firmemente selada
sobre essas emoções. O que o Diogo tentou fazer me
fez reviver esses sentimentos. Esses sentimentos
proibidos, os que bani para o fundo da minha mente,
me deixam trêmula de vergonha e raiva. Eu odeio
não ser capaz de me defender. Então há Gabriel. As
coisas que sinto quando estou com ele são muito
complicadas para examinar e estou com muito
medo do que vou encontrar. O que eu preciso
não é analisar o que está acontecendo entre mim e meu guardião, eu
não posso mudar isso, de qualquer maneira, mas aprender a me
proteger de pessoas mais fortes do que eu. Talvez eu pudesse
conseguir uma arma e aprender como usar.
Estou varrendo as folhas da calçada, fantasiando sobre minhas
opções, quando Magda aparece.
— Quero todos os sofás de couro tratados com cera de abelha e
polidos para brilhar hoje. Carly reclamou que os armários dela estão
cheios de poeira. Retire tudo e limpe as prateleiras. Seu armário pode
melhorar com uma boa reorganização.
— Sim, senhora.
— Eu quero que o jantar seja servido uma hora antes, esta
noite. Eu tenho um compromisso depois.
— Vou me certificar de que esteja pronto.
— Amanhã você precisa começar a tirar as cortinas e lavá-las.
Comece com os quartos. Você pode fazer isso em uma sala todos os
dias.
— Sim, senhora.
Ela checa o relógio. — Não espere a tarde para varrer
a calçada. Tem que ser feito todas as manhãs às oito. Os
vizinhos devem pensar que somos
porcos vivendo em um
chiqueiro.
— Vou fazer isso às oito.
— Você é boa com uma máquina de costura?
— Eu nunca usei uma.
— Melhor aprender. Você pode ajustar as bainhas
das novas cortinas que comprei para a sala.
A van de entrega para, felizmente me poupando
de mais tarefas que ela possa pensar, pois tenho que
verificar e assinar os produtos.
Pelo resto do dia, corro com minhas tarefas,
pulando a hora do almoço e do chá. É difícil não se
estressar com medo de bagunçar uma tarefa ou deixar
de executar algo quando sua vida está em
perigo. Não durmo o suficiente há semanas e não
estudo há dias. Perdi o prazo de duas tarefas e só
consegui prorrogações por causa de minhas
boas notas, mas não importa o quão rápido eu
trabalhe, sempre há mais trabalho e muito pouco tempo. Minha
mentora me avisou que, se eu perder outro prazo, receberia um zero
pela tarefa. Ela não pode continuar abrindo exceções para mim.

NAS PRÓXIMAS DUAS semanas Gabriel mal está em


casa. Quando ele vem até mim à noite, há rugas em seu rosto. Não
pergunto sobre o negócio dele, mas pelo jeito que ele me leva, duro e
implacável, eu sei pelo estado dele que está tão estressado quanto
eu, então não reclamo. Quando estou na casa de Kris, cozinho,
limpo, ajudo na clínica e passo o máximo de tempo que posso com
Charlie. À noite, tento acompanhar meus projetos pendentes, mas
estou várias semanas atrasada. Durmo entre quatro e cinco horas
por noite, voltando aos meus estudos quando Gabriel me deixa para
voltar para seu quarto. Não me atrevo a confessar para ele com medo
de que ele tire isso de mim, e não posso perder meu sonho. Apesar
do sexo explosivo, ainda sou propriedade. Nada além de um
brinquedo divertido. Gabriel cuida de mim como alguém que cuida
de um carro caro ou de um animal de estimação
fofo. Copiosas quantidades de café me mantêm acordada
e nervosa durante o dia. É apenas
por pura força de vontade que
termino as tarefas que Magda
distribui. Quanto mais ela me empurra, mais
tento. Quanto mais ela exige, mais eu entrego.
É uma bela manhã de dezembro, quando meia
carcaça de kudu3 é deixada na cozinha.
— Um presente de colegas de trabalho que foram
caçar, — diz ela, a respeito do pedaço de carne com
as mãos no quadril.
Não é temporada de caça. — De onde isso vem?
— Um amigo fez alguns abates em uma fazenda
de caça no Norte.

3 Uma das espécies de


antílope.
— O que devo fazer com isso, senhora?
— Marie costumava processar a carne. A perna é boa para
biltong4. Você pode usar as sobras para fazer linguiça.
Nunca cortei meio antílope, mas não vou admitir. Quando ela
vai embora, faço uma pesquisa na Internet e encontro uma página
que dá ilustrações detalhadas sobre como processar uma carcaça. É
muito pesado para eu segurar sozinha, então quando Quincy passa
pela cozinha com Bruno, eu peço a ele para ajudar. Juntos, usamos
o machado de carne para cortar a carne em pedaços menores e mais
manejáveis. Ele me ajuda a montar a serra elétrica e o moedor de
carne no balcão da ilha. Enquanto ele limpa as lâminas para mim,
ordeno os intestinos para fazer a linguiça de um açougueiro local.
— Tudo pronto, — diz ele. — Precisa de ajuda com a moagem?
— Estou bem, obrigada. — Estou orgulhosa de estar
conseguindo.
—Apenas grite. — Com um aceno, ele sai.
Durante a hora seguinte, cortei os pedaços maiores em partes
menores, deixando de lado as tiras para o biltong, enquanto colocava
as sobras em uma solução de vinagre e sal para a linguiça. É
um processo longo e demorado. Estou estressada para
preparar o jantar, mas não posso
cozinhar na cozinha suja. Vou
ter que desinfetar as bancadas
primeiro.
Meu telefone apita enquanto empurro a carne pelas
lâminas para fazer bifes de lombo. Normalmente, não
interrompo meu trabalho para verificar minhas
mensagens, mas o sinal sonoro me diz que é da
minha mentora, Aletta. Eu aperto o botão da serra e
cuidadosamente eu pego o telefone do bolso do
avental entre o polegar e o indicador. A mensagem
me atinge como um martelo entre os olhos.

4 Biltong é uma forma de carne seca e

curada, originária da África do Sul. Diversos


tipos de carne são utilizados para produzir a
iguaria, como carne bovina, de caça e de
avestruz. É normalmente feito a partir de filés
crus de carne cortados em tiras seguindo o
sentido das fibras do músculo.
Venha me ver. Você falhou no seu teste de biologia celular.
Minha mão treme enquanto deixo o telefone no balcão, lendo o
texto sem parar. As repercussões são enormes. As pontuações dos
testes são levadas em consideração no final do ano. Se eu reprovar
em uma matéria, minha bolsa parcial será revogada. Eu teria que
desistir. A devastação cai sobre mim. Quero permanecer positiva,
mas o meu lado realista faz com que minha mente pare para avaliar
os fatos e encarar a verdade.
Eu não vou conseguir.
Há uma finalidade terrível na noção. É como se uma âncora
tivesse sido cortada da minha vida, e agora que não estou mais presa
a um sonho, estou flutuando sem sentido em uma vida cujo único
propósito é manter Charlie vivo. Golpeando a umidade crescendo em
meus olhos, tento deixar meu orgulho me manter forte. Não vou
chorar por isso, mas meu coração não está no mesmo nível da minha
mente. Novas lágrimas borram minha visão quando eu ligo a serra e
começo a passar a carne pelas lâminas. Eu trabalho no piloto
automático, deixando o ritmo das minhas mãos e o ruído da máquina
me entorpecer a um estado de movimentos insensíveis e
automatizados. Libera minha mente para pensar. Não
realizar meu sonho vai doer no
meu coração, mas falhar com
meu irmão vai me destruir, então
eu faço as pazes com desistir do sonho.
No exato momento em que tomo a decisão, uma
sensação de calor explode em minha mão direita e sobe
por meu braço. Eu olho para o fatiador e a carne que
seguro em minhas mãos, mas não consigo entender
a cena imediatamente. Meu cérebro registra o sangue
jorrando do meu polegar muito antes de sentir a dor.
13
Valentina

A PONTA DO MEU POLEGAR SE FOI. Cortei logo acima do osso


metacarpo. Minha mente desacelera e meu corpo entra em modo de
funcionamento automático. Abro a torneira de água fria e coloco
minha mão sob o riacho. O sangue diluído em água escorre pelo
ralo. A primeira coisa a alcançar é um pano de secagem limpo. Eu
fecho a torneira e coloco o pano firmemente em volta da minha mão
para parar o sangramento. Desligo o cortador na parede e, tomando
cuidado com as lâminas, procuro no reservatório até encontrar meu
polegar decepado. Me sinto enjoada e tonta, como se estivesse
prestes a vomitar e desmaiar, mas a adrenalina me faz
continuar. Depois de colocar a ponta do polegar no mini isopor, pego
um saco de gelo do freezer para a minha mão direita. Pego minha
bolsa com minha carteira de identidade e ando pela casa, procurando
por alguém, mas apenas Carly está em seu quarto.
— Meu pai saiu, — ela diz sem tirar os olhos do livro.
Não posso pagar uma ambulância e
não tenho seguro médico. O
seguro privado custa uma
fortuna neste país. Vou me arriscar no
hospital público, mas preciso de uma carona.
Saio pela frente e encontro Rhett na porta. — Eu
preciso de uma carona para o hospital. Você pode me
levar?
Ele dá uma olhada no pano manchado de
sangue em volta da minha mão e tira as chaves do
carro do bolso. Ele abre a porta para mim e me ajuda
a entrar no Mercedes.
— Joburg Gen é o mais próximo, — eu digo.
Ele balança a cabeça e dirige o carro pela estrada
com uma velocidade que provavelmente vai nos
matar antes de chegarmos ao hospital. No caminho,
ele liga para Gabriel em comandos de voz por
meio do kit viva-voz e é direcionado para o correio
de voz.
— É Rhett. Estou levando Valentina ao Joburg Gen. Ela... — Ele
olha para mim.
— Cortei meu dedo, — eu preencho para ele.
— Vou te manter informado. — Ele desliga e disca outro número
para instruir um guarda a assumir seu posto na porta da frente da
residência Louw.
Quando ele desliga, me lança um olhar perdido. — Você está
bem?
— Sim. — Como se fosse uma deixa, a dor se intensifica. Eu me
inclino para trás e franzo os lábios. Minha mão lateja como um
coração gigante.
A entrada de emergência está bloqueada com veículos, então
vamos para o estacionamento subterrâneo. O estado do local é um
choque. O lixo se espalha pela superfície até meus
tornozelos. Pegamos o elevador para o andar de emergência e,
quando saímos, sou parada pelas fileiras de pessoas sentadas no
chão no corredor, todas parecendo dez vezes piores do que eu. Alguns
deles têm feridas abertas, e outros têm doenças invisíveis que não
parecem menos fatais a julgar pelo brilho sem vida de
seus olhos. O corredor fede a vômito e urina. Não vejo o
interior de um hospital desde os
dez anos de idade, quando caí
e precisei de pontos na cabeça.
Isso me fez nunca querer voltar. Passamos por um
homem com uma fratura, o osso atravessando sua
pele. Outro tem um corte tão profundo no braço que posso
ver os tendões. A mulher ao lado dele tem uma garrafa de
cerveja quebrada ainda alojada em sua bochecha.
Violência grita conosco até onde vamos.
Procuro a mão de Rhett com a minha mão boa,
segurando seus dedos enquanto passamos pela
miséria e desespero até a recepção onde uma
enfermeira de aparência entediada levanta os olhos.
— Qual é o seu problema, amor?
Quando eu balanço, Rhett me pega. — Eu
cortei meu dedo.
Ela empurra uma prancheta com um
formulário sobre o balcão. —Preencha isso. —
Ela coça a cabeça com um lápis e aponta para uma área bem
atrás. — A área de espera é ali.
Passamos por uma sala de exames. Um homem nu está deitado
em um colchão. Ele está algemado à coluna de ferro da cama. Uma
enfermeira está lavando o sangue de suas pernas. O chão está sujo
e as paredes manchadas. Não há travesseiros, lençóis ou
divisórias. Nossos olhos se conectam. Desvio o meu rapidamente,
mas sinto que ele está me seguindo até que estejamos fora de vista.
Todos os assentos estão ocupados, mas não quero me arriscar
a sentar no chão infectado por germes. Rhett pega o lápis de mim e
faz as perguntas enquanto eu digo a ele o que escrever.
Pela maneira como o pano está absorvendo o sangue, o
sangramento não parou. Estou começando a sentir o efeito da perda
de sangue, ou talvez seja o choque retardado que está me dando
vontade de desmaiar.
— Venha, — Rhett diz gentilmente, pegando meu braço para me
levar de volta à recepção quando o questionário é concluído.
A enfermeira pega o formulário, mas está conversando com uma
colega e não levanta os olhos para nos reconhecer.
— Quanto tempo ela tem que esperar? — Rhett
pergunta com firmeza.
— O que é isso, amor?
Ele sacode a cabeça em
direção à longa fila de pessoas. — Quanto tempo
mais?
Ela ri. — Está vendo aquele homem ali? — Ela
aponta para aquele com o corte no braço. — Ele está
esperando há doze horas.
Ele abre a boca para discutir, mas não
adianta. Essas pessoas precisam tanto, senão mais,
do que eu.
Toco seu braço e digo baixinho. — Acho que
devemos fazer isso em casa. — Não vou conseguir
segurar o pedaço cortado no lugar e costurar. — Pode
me ajudar?
A atenção da enfermeira já está voltada para a
colega. Eles estão rindo juntas, compartilhando
uma piada.
Ele acena para minha mão. — Me mostre.
Eu desembrulho o pano lentamente para revelar meu polegar. O
sangue jorra do dedo como se borbulhasse de uma fonte subterrânea.
Rhett empalidece. — Jesus Cristo. — Ele me pega nos braços e
começa a andar com passadas largas na direção de onde viemos.
— Rhett! O que você está fazendo?
— Há uma clínica particular em Brixton. São apenas sete
quilômetros daqui.
— Eu não tenho seguro médico. Não posso pagar uma clínica
particular.
— Eu vou pagar. — Ele muda meu peso em seus braços. — Não
se preocupe com o dinheiro, tudo bem? Não vou deixar você neste
lixão nem mais um segundo.
— Podemos fazer em casa, — insisto.
Ele não diz nada, mas a rigidez de sua mandíbula me diz que
ele discorda.
Vinte minutos depois, estamos passando pelo mesmo
procedimento na Garden Clinic, mas a mudança é notável. O prédio
está limpo e esterilizado. Uma enfermeira assume o comando de mim
no minuto em que entramos, e não menos de dez minutos
depois de Rhett deixar o dinheiro para o meu tratamento,
que foi exigido antecipadamente,
estou vestindo um roupão de
hospital, deitada em uma maca
fora da sala de cirurgia. Rhett está andando de um
lado para o outro no corredor, sua figura passando da
esquerda para a direita e de volta na frente da janela da
porta, seu telefone preso ao ouvido. O médico que se
apresenta como cirurgião me diz que a boa notícia é
que ele pode tentar salvar meu polegar, graças à
minha visão de recuperar e trazer o pedaço que
faltava. Quando eles começam a me empurrar em
direção à sala de cirurgia, a porta bate na parede e
Gabriel se precipita para o corredor, com o corpo
mancando pesado e o cabelo curto bagunçado.
— Com licença, — exclama o médico. — Você
não pode invadir aqui.
Ele não olha para o médico. Encontra meus
olhos e os segura. — Ela está comigo.
— Eu não me importo se ela está com a rainha da Inglaterra.
Os olhos azuis de Gabriel endurecem. Seu rosto se transforma
em uma máscara assustadora e, quando se vira para o médico, diz
com uma voz fria. — Vou ficar com ela.
Gabriel alcança minha mão ilesa, mas o médico o interrompe.
— Saia ou removerei você.
Seu olhar se fixa na minha ferida coberta e, como Rhett, ele
empalidece.
— Que bom que você não é sensível, hein? — Eu sorrio para ele,
me sentindo um pouco alta com tudo o que eles injetaram em mim
para matar a dor.
— Chame a segurança, — diz o médico à enfermeira.
Gabriel levanta as palmas das mãos. — Se acalme, porra. Estou
indo embora.
— Acho que ninguém vai comer carne esta noite. — O
pensamento envia uma onda repentina de histeria por mim. — Oh,
meu Deus, Gabriel. O jantar. — Eu tropeço em minhas próprias
palavras, tentando colocar elas para fora. — Foi um acidente
estúpido. Eu não prestei atenção. Eu sinto muito. Por
favor, não deixe Magda me matar.
— Esqueça o maldito jantar,
— diz ele
asperamente. Quando o médico
lhe lança um olhar de advertência, ele continua em
um tom mais suave. — Estou cuidando de tudo.
Ele sustenta meu olhar enquanto a equipe médica
me apressa em direção às portas de vaivém. Quando olho
para trás, para ele, parado sozinho, tenho a estranha
noção de que ele está sozinho no mundo. De repente,
anseio por ele, inexplicavelmente e
completamente. Neste momento assustador, é ele
que quero ao meu lado. Eu o observo, reconhecendo a
expressão indefesa em seu rosto, e então as portas
fecham sua imagem. O frio invade meu corpo e invade
minha alma enquanto o médico coloca uma máscara
em meu rosto e me diz para contar até dez. Eu chego
ao três antes que a memória do rosto de Gabriel
desapareça.
O MÉDICO FICA COMIGO durante a noite e me dá alta no dia
seguinte ao meio-dia. Ele me disse que a operação correu bem e que
me deu uma injeção antitetânica. Um Gabriel tenso e de aparência
cansada entra em meu quarto com um monte de lírios
brancos quando o médico sai depois de me examinar.
— Ei, linda. — Ele beija meus lábios. — Como você está se
sentindo?
— Eu estou bem, obrigada.
— Vamos. — Ele me ajuda a me vestir e, mesmo que eu proteste
quando uma enfermeira empurra uma cadeira de rodas para dentro
do quarto, ele me coloca na cadeira. — É a cadeira ou meus braços.
— Ele me dá um sorriso, mas é fraco. A expressão em seus olhos está
fechada, tornando difícil para eu o ler.
— Eu tenho sua receita médica, — diz ele. — Vamos parar na
farmácia antes de irmos.
Saímos armados com antibióticos e analgésicos da farmácia do
hospital. No caminho para casa, Gabriel agarra meus dedos e,
quando muda de marcha, coloca minha mão enfaixada
em sua coxa.
É só quando pegamos a
rampa de saída
para Parktown que ele fala. —
Nunca mais faça isso comigo.
Sua raiva desperta aborrecimento em mim. É com
dificuldade que mantenho meu temperamento sob
controle. — Foi um acidente.
— Você não tem ideia do que me fez passar.
— Eu posso adivinhar. Você estava preocupado
com o seu investimento.
Ele dá uma guinada e faz o carro parar tão
rapidamente no acostamento que meu corpo é jogado
para a frente e o cinto de segurança atinge meu
peito. Eu solto um grito chocado, mas se perde em sua
boca quando ele agarra meus ombros e pressiona
nossos lábios. Seu beijo é frenético e brutal. Seus
dentes cortam minha língua, e a força de sua
carícia machuca meus lábios. Minha
mandíbula dói quando ele finalmente me
solta. Ambos estamos respirando com dificuldade, nossos peitos
subindo e descendo rapidamente. Eu só posso ficar olhando para ele,
tanto excitada quanto amedrontada.
— Valentina... — Um lampejo de algo aperta seus olhos e faz
suas narinas dilatarem. — Você não tem ideia... — Ele passa a mão
pelo cabelo, bagunçando ainda mais.
Eu engulo a constrição na minha garganta que torna difícil
falar. —Eu disse que sentia muito.
Ele segura minha bochecha e passa o polegar sob meu olho. —
Não sente tanto quanto eu.
Naquele momento, ele me deixa ver sua angústia. Lembro o que
ele disse sobre ter um coração na noite em que perguntei sobre suas
cicatrizes. A compaixão substitui minha irritação.
Eu coloco minha mão sobre a dele. — Vai dar tudo certo.
Um lampejo de sorriso surge em seus lábios. — Eu deveria dizer
isso, caramba.
— Então diga. — Eu o desafio com meus olhos, incitando-o a
deixar ir qualquer escuridão que tomou conta dele.
— Vai ficar tudo bem, Valentina.
— Isso é melhor. — Eu trago a palma da mão dele na
minha boca e dou um beijo nela.
— Eu deveria fazer isso
também, — diz ele com uma
pitada de tristeza.
Silenciosamente ofereço a ele minha palma, mas
ele não beija por dentro. Ele leva minha mão aos lábios e
suga meu dedo indicador na profundidade quente de sua
boca, mordendo suavemente a ponta. O calor inunda
minha calcinha enquanto ele gira sua língua em
torno do dedo. Em seguida, puxa meu dedo molhado
de sua boca e seca em sua camisa. O beijo que ele
deixa no topo da minha mão é o oposto do que ele fez
na minha boca. É doce, terno e cuidadoso. Depois de
segurar meus olhos por mais um segundo, ele coloca
minha mão na mesma posição de antes em sua coxa
e dirige o carro de volta para o tráfego. Quando não
está mudando de marcha, ele brinca com meus
dedos, esfregando o polegar sobre minhas
juntas.
Em casa, Rhett abre a porta e me ajuda a sair do carro. — Se
precisar de ajuda com alguma coisa, basta dizer.
— Obrigada por me levar ontem.
A expressão sombria de Gabriel paralisa Rhett. Não tenho
certeza de qual é o problema de Gabriel com Rhett, mas o guarda
imediatamente se desculpa e sai.
Lá dentro, Quincy e Carly correm para nos cumprimentar.
— Me mostre sua mão, — exclama Carly. — Você poderia ter me
contado.
Eu levanto meu polegar enfaixado. — Não é tão ruim.
— O almoço está no forno, — diz Quincy. — Tivemos que
improvisar, mas é comestível. — Ele se vira para mim, parecendo
culpado. — Eu não deveria ter ido, ontem. Eu deveria ter ficado e
ajudado.
— Não é sua culpa.
— Vamos, papai, — Carly passa o braço em volta de Gabriel. —
Estou faminta.
Ele hesita por um segundo antes de segui-la para a sala de
jantar, seus olhos encontrando os meus por cima do
ombro.
Para ser honesta estou feliz
pelo tempo sozinha. Ainda não
lidei com o choque e quero a
solidão para processar o que aconteceu. Oscar me
cumprimenta na entrada da cozinha, esfregando seu
corpo macio contra minhas pernas.
— Olá querido. — Eu levo um momento para
acariciá-lo e verifico se ele tem comida.
Não há lugar para colocar o enorme buquê de
flores no meu quarto, então pego um vaso
emprestado do armário de cristal e deixo no balcão
da cozinha. Felizmente, Quincy deixou a cozinha
arrumada. Estou proibida de usar minha mão ou
trabalhar por uma semana, mas não vou permitir que
isso dê a Magda um motivo para me matar. Ou
Charlie. Ela está apenas ganhando tempo,
esperando a desculpa certa. Encher a máquina
de lavar louça e fazer algumas tarefas menores,
acho que posso lidar muito bem só com uma
mão, mas Magda a contragosto me diz para levar o resto do dia de
folga. Eu uso esse tempo para descansar, pondo o sono em dia.
Muito depois, Gabriel chega ao meu quarto. Ele cobre cada
centímetro da minha pele com beijos e faz amor comigo suavemente.
Quando ele me segura depois, permito que o calor de seus braços me
acalme. Lágrimas indesejadas correm pelo meu rosto. A dor de
desistir dos estudos e o choque do acidente desabam sobre mim, me
empurrando sob uma onda de tristeza que torna difícil
respirar. Soluços sacodem meus ombros enquanto eu me agarro a
ele, segurando o homem que tirou minha liberdade. No que parece
ser a minha hora mais sombria, ele é tudo o que tenho. É tão
bagunçado. Quanto mais posso aguentar antes que Gabriel me
destrua completamente?
Ele me puxa para seu colo e beija o topo da minha cabeça. —
Calma, linda.
— Gabriel. — Eu enterro meu rosto em seu pescoço, inalando a
fragrância picante de sua pele. — Me liberte, eu imploro.
Ele descansa o queixo na minha cabeça e inala lentamente. —
Você também pode me pedir para cortar meu braço.
Quando adormeço muito tempo depois, sonho que
estou parada em uma
extremidade do corredor de
um hospital e Gabriel na
outra. Entre nós, há fileiras de pessoas
com ferimentos horríveis, o número de pacientes é
grande demais para contar. Estou abrindo caminho entre
os corpos, tentando alcançá-lo, mas quando chego ao
outro lado, ele se foi. Eu acordo com um acesso de
dor, suando e sozinha na minha cama. Tomo um
analgésico e contei cem ovelhas dez vezes antes de
cair no sono novamente.

Gabriel

A PRIMEIRA COISA QUE FAÇO na manhã


seguinte é mandar a serra de carne para a
lixeira. A segunda é fazer um seguro médico
para Valentina. Enquanto eu estiver vivo,
pagarei as contas dela, mas posso não viver tanto quanto gostaria,
especialmente não com meu tipo de negócio. Quase despedi Rhett
por sua estupidez de levá-la ao maldito Gen Joburg. A única coisa
que salvou sua pele é que não pude punir ele por minha negligência.
Eu deveria ter pensado sobre a saúde de Valentina no minuto em que
ela cruzou a minha porta. Eu deveria ter informado minha equipe
que em caso de emergência, ela deve ser tratada como qualquer
membro da família. Todo tipo de coisa ruim poderia ter
acontecido. Ela poderia ter sangrado até a morte. Ela poderia
ter contraído uma infecção. Com toda a sujeira e sangue ao redor
do Gen Joburg, poderia ter contraído AIDS. E pensar que ela
considerou costurar o próprio polegar. O fato de ela não entrar em
pânico me dá um novo nível de respeito por ela. Uma coisa é ela me
costurar, mas outra bem diferente é pegar o polegar do chão e não
agir de modo histérico.
Ela está administrando com uma mão, como sempre faz, mas
não é isso que eu quero para ela. Ela está na minha casa há menos
de um quarto de ano e minha boneca perfeita já está
quebrada. Ameacei ela com o chicote se ela não
descansar. Magda não está feliz com a virada dos
acontecimentos, mas ela só
levanta a questão quando
estamos sozinhos no carro a
caminho de um dos escritórios de empréstimo.
— Por que você fez isso?
Eu olho para ela por cima da borda dos meus óculos
de sol. — Fazer o que?
— Pagar a conta do hospital de Valentina.
— Jesus, Magda, você esperava que eu me
sentasse e a deixasse perder o polegar? De qualquer
forma, Rhett pagou por isso. Eu apenas o reembolsei.
— Você está investindo em carne morta.
— Já passamos por isso tantas vezes.
— Quando você vai deixar ir?
— Quando eu estiver pronto.
— Quando será isso?
Eu dei a ela um olhar duro. — Quando eu
estiver muito bem pronto e nem um segundo
antes.
— Tenho sido tolerante com você, mas minha paciência está se
esgotando. Não me faça escolher uma data.
— Vou escolher uma data, — digo evasivamente, acalmando-a
por enquanto. Manobrando o carro descendo a colina íngreme em
Braamfontein, faço a pergunta que, nas últimas semanas, tem estado
em minha mente. — Por que você a quer morta?
Ela pisca e se afasta. — Eu disse a você, para fazer dela um
exemplo.
— Por que ela?
— Por que não?
— Se for só pelo dinheiro, saldarei a dívida dela.
Ela se vira em seu assento. — Você está disposto a comprar
aquela vagabunda?
A raiva jorra em minhas veias, deixando meu coração
disparado. —Ela é tudo menos uma vagabunda.
Ela dá um bufo cínico. — Talvez você prefira um termo diferente,
mas ela é seu brinquedo de foda e, na minha opinião, isso a torna
uma vagabunda.
— Calma, Magda, — eu digo uniformemente. — Você
está me empurrando longe demais.
— Gabriel, — sua voz assume
um tom mais suave, — você
nunca pode confiar nela. Se você
baixar a guarda, ela vai enfiar uma faca nas suas
costas ou te roubar às cegas.
Não posso dizer com certeza sobre a faca nas minhas
costas. Tenho certeza de que Valentina já me matou
várias vezes. O que eu sei é que ela não é uma ladra.
— Ela administra o orçamento alimentar desde
o derrame de Marie e está economizando muito
dinheiro para nós.
— Isso não diz nada.
— Diz que ela é confiável quando se trata de
dinheiro. Não pense que eu não estou ciente do
dinheiro que Marie embolsou para si mesma com a
propina que recebeu dos fornecedores.
— É pouco dinheiro.
— Não muda o princípio. Roubar é roubar, o que torna Marie
uma ladra. Ainda assim, você nunca a atacou.
— Isso é diferente. Marie é praticamente parte da família. A mãe
dela trabalhava para minha mãe. Sua boneca de merda não é nem
família nem leal. Não me importa quanto dinheiro ela está
economizando, o tempo dela está se esgotando.
— Deixe para lá.
Com a deliberação fria em meu tom, ela vira a cabeça para olhar
pela janela. — De qualquer forma, não estou interessada em vender
ela. Você não vai pagar a dívida dela.
Eu deixei passar, fazendo um esforço para me acalmar. — Liguei
para nossa antiga empresa de serviços de limpeza. Eles ficarão até a
próxima semana.
Minha mãe se endireita. — Você fez o que?
— Valentina está machucada. Você sabe disso.
— Esta é a oportunidade perfeita para deixá-la falhar.
Eu aperto minha mandíbula. — Não me faça repetir.
— Bem. — Ela acena com a mão no ar. — Trate ela como uma
princesa e a envolva em algodão. Isso a fará cair muito
mais forte.
Meus dedos apertam o
volante. Tenho vontade de me
inclinar sobre minha mãe, abrir
sua porta e a empurrar para fora do meu carro e da
minha vida. Continuamos batendo cabeça por isso, e se
ela não consegue aceitar que Valentina faz parte de nossas
vidas para sempre, vai ficar feio.

A SEMANA SE ARRASTA com Valentina retraída


e quieta, ficando em seu quarto. Pelo menos ela tem
tempo para descansar e talvez estudar. Ela ainda não
me contou sobre seus estudos. Não tenho certeza se
está escondendo algo mais de mim, ou se é o efeito
colateral da anestesia que está deixando-a triste,
mas ela não é ela mesma. Suponho que seja normal,
dado o que passou. Tudo o que posso fazer é dar
a ela meu apoio e cuidados até que volte para a
cozinha com seu vestido preto. Não estou feliz
com isso, mas ainda não encontrei uma solução para o dilema, e
Magda não cede.
Além da minha preocupação com Valentina, preciso levantar
uma questão difícil com Carly. Carly normalmente não come de
manhã, mas como Magda não está presente hoje, peço à minha
filha que tome o café da manhã comigo para que possamos conversar
em particular.
Espero até que Valentina nos deixe depois de servir muffins de
aveia antes de dizer. — Sei que você ama sua mãe e nosso divórcio
foi difícil para você. Não discutimos muito sobre isso quando o
rompimento aconteceu. Eu acho que é importante que você tenha
alguém neutro para conversar.
Ela me encara com olhos arregalados. — É um pouco tarde para
isso.
— Nunca é tarde demais.
— Não vai ajudar. — Ela esconde o rosto atrás do cabelo.
— Você não pode dizer a menos que tenha tentado.
Ela empurra a fruta em seu prato.
— Pare de se esconder atrás do seu cabelo e olhe
para mim.
Ela levanta a cabeça, seus
olhos atirando adagas em
mim. — Só há uma coisa que vai
ajudar, se você e a mãe voltarem a ficar juntos.
Eu suspiro profundamente. — Isso não vai
acontecer. Você tem que aceitar.
Ela bate o garfo no prato. — Por que não? Por que
vocês não podem viver juntos como um casal normal?
— Sua mãe e eu não nos amamos mais. Isso não
significa que não te amamos.
— Besteira. — Ela empurra a cadeira para trás
e se levanta de um salto. — Você não sabe o significado
da palavra.
Pegando sua bolsa, ela corre para a porta.
— Carly!
Quero mandar que ela volte e termine o café da
manhã, mas meu bom senso me diz para dar-lhe
espaço até que esfrie. Pensando em meus
problemas parentais, termino meu café da manhã sozinho, mesmo
que não tenha mais apetite.
A voz de Valentina me traz ao presente. — Posso limpar os
pratos?
A nova melancolia que a invadiu torna seus olhos grandes e
tristes mais assustadores do que nunca. Pego meu prato e copo para
levar para a cozinha e volto com a bandeja enquanto Valentina leva
o resto. Sabendo o quanto ela é valente, tento tornar as coisas mais
fáceis para ela sem que seja muito óbvio. Enquanto coloco meu prato
na lava-louças, noto que ela pega o muffin intocado de Carly do
prato, embrulhando com cuidado em um guardanapo de papel. O
resto do meu muffin comido pela metade ela embala em uma vasilha
de sorvete pela metade com ossos, pedaços de carne e vegetais
cozidos, que ela mantém na geladeira dos funcionários. Nunca a vi
limpar a mesa antes, mas é óbvio que tem o hábito de recolher as
sobras. O que ela faz com a comida destinada à compostagem?
Minha teleconferência matinal está marcada, então não penso mais
no assunto, mas saio da cozinha com uma sensação que não consigo
identificar. É como se meu tempo com Carly e Valentina
estivesse se esgotando. Eu não gosto disso. A última vez
que me senti assim foi um pouco
antes de tropeçar em um fio e
ser dado como morto, com metade
do meu rosto estraçalhado.

EU CRONOMETRO MINHAS reuniões para ficar livre


durante os intervalos de almoço de Valentina para ver
como ela está. Antes de sair, passo alguns minutos
sem ser perturbado observando-a pela janela da
cozinha. Adoro olhar para ela assim, quando sua
guarda está baixa. A perversidade em mim gosta de
invadir sua privacidade, roubando uma parte dela que
de outra forma nunca teria. Cheguei a aceitar que
Valentina nunca será cem por cento aberta
comigo. Nosso relacionamento forçado não é o tipo
que nutre um compartilhamento incondicional
da alma.
Como sempre, ela está sentada na mureta perto da
piscina. Bruno está deitado ao lado dela na grama, a cabeça apoiada
nas patas, olhando para ela com olhos amorosos. Suas mãos
envolvem um objeto, como as pétalas que protegem o estigma de uma
flor. Ela as abre para revelar algo redondo e branco. O que ela está
segurando? Parece um guardanapo de papel. Dobrando o
guardanapo com cuidado, ela parte o muffin que está dentro em dois
e dá metade a Bruno enquanto ela come o outro. O cachorro engole
tudo de um só gole e balança o rabo com otimismo, observando para
ver se mais está por vir. Ela come devagar, como uma pessoa que
prova cada mordida.
Tudo dentro de mim paralisa. O que estou testemunhando é
uma cena comum de uma mulher nutrindo seu corpo, mas isso me
estilhaça. Já vi muitos atos atrozes e torturas que farão a maioria
dos homens adultos desmoronar, mas isso, Valentina comendo
nossos restos de comida, isso me faz algo que nem mesmo uma morte
faz. Vou dobrar sua mesada e comprar mais comida. Vou colocar o
irmão dela em um instituto chique. Farei de tudo para que ela nunca
tenha que comer as migalhas da mesa de outra pessoa
novamente. É melhor que essa bolsa chegue logo. Volto
para o meu escritório e ligo para o
meu gerente financeiro, que
garante que agora é questão de
dias. Alguma burocracia na universidade está
retardando o processo.
Quando vou ter com ela naquela noite, decido tocar
no assunto. Eu a deixo nua e conduzo meu pau dentro
dela, mantendo ambos em um precipício de
prazer. Prolongo a situação até que nenhum de nós
possa tolerar mais.
Suas unhas cravam em meus ombros. —
Gabriel, por favor. — Ela balança os quadris contra os
meus, tentando criar mais atrito.
Me retiro quase completamente e paro meus
movimentos. — A quem você pertence?
Ela estremece quando pressiono meu polegar
em seu clitóris. — Você.
— Quem cuida de você?
— Você.
— E como eu cuido de você?
— Como você quiser.
— Malditamente certo. Como diabos eu quiser. — Suas costas
se arqueiam quando eu belisco seu mamilo. — Quem te faz gozar? —
Empurro de volta para ela.
— Você, — ela chora em um suspiro.
— Quem veste você?
— Você.
Eu me movo novamente com toda a seriedade. — Quem te
alimenta?
— Ah, Deus, Gabriel! Você.
— Isso mesmo, linda. — Eu beijo seus lábios. — Eu.
Eu bato nossos corpos juntos com tanta força que tenho que
segurar sua cabeça para evitar que bata na parede. Ela chora meu
nome enquanto goza com um espasmo violento, sua boceta me
chupando mais fundo e me deixando seco. Não há nada mais
satisfatório do que gozar dentro dela. Eu esvazio meu corpo no dela,
fazendo-a tomar cada gota, mas eu não retiro. Suas bochechas estão
vermelhas e seu cabelo gruda na testa úmida.
Enquadro seu rosto entre minhas mãos. —Tudo o
que você precisa, você terá. Você
só precisa dizer a
palavra. Entendido?
Ela fecha os olhos.
— Olhe para mim, Valentina.
Quando ela os abre novamente, eles estão úmidos de
lágrimas. — Por que você está fazendo isso? Não faz parte
do nosso negócio.
Beijo cada pálpebra e depois seu nariz. —
Porque eu sou tudo que você precisa. — A tristeza em
seu olhar se intensifica, alimentando meu medo, o
que em termos estimula minha raiva. — Diga.
Ela lambe os lábios, mas não responde.
Eu envolvo meus dedos em volta do seu pescoço
e aperto. —Diga, porra.
Seu corpo fica tenso, mas ela não luta contra
meu aperto. Em vez disso, seus ombros caem
enquanto ela lentamente solta um suspiro. —
Sim, Gabriel. Você é o meu tudo.
A satisfação aquece minhas bolas, se espalhando por todo o
caminho até minha espinha. Meu pau fica duro dentro dela
novamente. Eu a tenho de todas as maneiras que quero, mas ainda
preciso dela de muitas maneiras. Ficando de joelhos, engancho suas
pernas sobre meus ombros e uso meu esperma para lubrificar sua
bunda. Ela grita quando eu entro lá, mas com meus dedos em sua
boceta e em seu clitóris, ela rapidamente me dá os gemidos de êxtase
que estou procurando. Muito depois de ela ter seu segundo orgasmo,
ainda estou me punindo com um novo prazer. Demora muito antes
do meu segundo lançamento. Com ela, eu posso ir a noite toda, mas
ela precisa descansar, então eu coloco seu corpo contra o meu e a
seguro até que ela adormeça.

Valentina

MINHA MÃE COSTUMAVA dizer que se algo ruim acontecer,


comemore algo positivo. Dessa forma, você nunca ficará
deprimido. Talvez tenha sido assim que ela sobreviveu quando meu
pai morreu e perdemos tudo. Ela nunca saiu de casa sem o
batom vermelho Estee Lauder.
— Se você está triste, Valentina,
— costumava dizer, — ponha
seu batom vermelho.
Pego o tubo que encomendei com meus
suprimentos da bolsa e aplico o batom no espelho. O
vermelho se destaca na minha pele bronzeada. Amasso
meus cachos ao redor do rosto, deixando seu brilho
natural se destacar. Estou usando a camiseta rosa,
jeans e sapatilhas da boutique Sandton. Por fora,
estou bonita. Ninguém saberá como estou quebrada
por dentro. Talvez, um dia, eu consiga apenas olhar
para a parte bonita e esquecer que fui uma prostituta
do assassino mais perigoso da cidade.
Quando me despeço de Gabriel no fim de semana,
ele me olha como se pudesse se opor a que eu saia
de casa com a maquiagem no rosto, mas não sou
filha dele, e agora é a minha vez.
Ele engole enquanto me estuda, balançando as chaves
no bolso. —Eu vou te levar.
Eu não discuto mais. É inútil. No caminho, peço a ele que pare
na padaria da esquina para comprar um bolo Floresta Negra. Eu
poderia ter assado pela metade do preço, mas esse não é o
ponto. Nunca comprei um bolo na minha vida. Seguro o bolo da loja
chique em seu recipiente de plástico no meu colo, as cerejas pretas
brilhando com calda açucarada em cima do chantili.
Gabriel olha para o bolo e depois para mim. — De quem é o
aniversário? Eu sei que não é seu.
— Ninguém. — Eu olho da janela para os carros que passam.
— Qual é a ocasião?
— Nada.
Ele franze os lábios, mas não continua o interrogatório. Perto da
Rocky Street, peço a ele que pare novamente para que eu possa
alimentar os cães famintos. No minuto em que me veem, eles
vêm correndo. Gabriel se inclina novamente contra o carro com os
tornozelos cruzados, me observando enquanto distribuo a comida
entre eles. Limpo o recipiente de plástico com uma toalha
de papel e embrulho em um saco plástico para lavar mais
tarde. A sombra de um sorriso
aparece em seus lábios
quando eu volto para o carro.
— O que?
Ele enfia uma mecha de cabelo atrás da minha
orelha. —Você é todo tipo de boa.
— Não, não sou.
— Para mim você é.
Ele não me dá chance de responder. Abre a
porta e me ajuda a entrar.
Quando ele me deixa do outro lado da rua da
casa de Kris, espero até que seu carro vire a esquina
antes de ir para a casa. Charlie quase me derruba
quando entro pela porta da cozinha.
— Ei. — Eu rio e coloco o bolo no balcão. —
Como você está? — Eu o levo para um grande
abraço. Há mais carne em seus ossos e um pouco
mais em volta da cintura.
—Bo-bolo!
— É para depois do jantar. — Eu aperto seus ombros e me sento
ao lado dele no sofá, desligando a televisão.
Jogamos damas chinesas até Kris encerrar a clínica. Como de
costume, eu cozinho, e ela faz uma pausa muito necessária depois
de passar os primeiros dez minutos pirando por causa do meu
polegar. Quando Charlie está sentado com uma grande fatia de bolo
na frente de seu desenho animado favorito, ela se senta à minha
frente na mesa da cozinha.
— O que há com o bolo? — Ela pergunta através do movimento
de mastigação.
— Estamos comemorando.
— Estamos?
— Sim. — Eu lambo o recheio de chocolate da minha colher.
— Você pode ser um pouco menos reservada?
Eu encolho os ombros. — Estamos comemorando por ter mais
tempo livre e dinheiro. Agora posso pagar a você uma alimentação
adequada para Charlie.
Ela arregala olhos para mim. — Ele deu a você um aumento de
salário? Mais folga?
Eu dou uma grande mordida. Minha boca
está cheia demais para
responder.
— Bem?
Limpo o creme do canto da boca com o polegar
bom e lambo para limpar. — Não exatamente.
— Val. — Kris empurra o prato e cruza os braços
sobre a mesa. — O que está acontecendo?
— Abandonei a universidade.
Estou dizendo como se tivesse acabado de dizer
que está calor hoje, esperando que ela deixe passar,
mas já sei que não é isso.
— Tipo, parou seus estudos? — Ela exclama.
Charlie levanta os olhos da televisão.
— Shhh. — Dou a ela minha melhor carranca
zangada. — Você vai fazê-lo pensar que algo está
errado.
— Algo está errado.
— Kris.
— Por quê?
— Veja as coisas desta forma, eu não tenho mais o peso de pagar
uma enorme conta da universidade, ou me preocupar com exames, e
passar a noite inteira estudando anatomia.
Ela abaixa a cabeça, procurando pelos meus olhos. — Por quê?
Eu suspiro. — A cozinheira teve um derrame. Eu assumi suas
funções.
— Eles vão contratar outro cozinheiro, certo? Você não pode
desistir. Val, já completou mais da metade do curso!
— Não consigo manter o trabalho e os estudos. É muita coisa.
Seus lábios se estreitam. — Você está deixando eles vencerem.
— Eu não tenho escolha, — eu digo com os dentes cerrados. —
Trabalho até o jantar ser servido e a cozinha limpa, o que significa
que tenho sorte se sair às dez. Deus, tenho sorte se vou para a cama
à meia-noite e tenho que acordar às quatro todas as manhãs. — Não
digo que Gabriel ocupa mais uma hora ou mais do meu dia, me
fodendo sem sentido e me dando orgasmos até eu desmaiar.
Emoções brincam em seu rosto. Graças a Deus ela não diz algo
sem sentido como se estivesse arrependida.
— É por Charlie. — Eu baixo minha voz. — Nada vai
importar se ele estiver morto. Ele é tudo o que tenho.
Ela cobre minha mão com a
dela. É uma mão grande e
forte com arranhões de gato e
marcas de mordidas de cachorro, e uma pele calosa
que conta sua própria história. — Você tem a mim,
querida.
O calor se espalha pelo meu peito, fazendo com que
as lágrimas se acumulem atrás dos meus olhos. —
Obrigada.
— Você ainda pode trabalhar aqui. Quero dizer,
depois...
— Eu sei. — Depois de nove anos, não tenho
certeza se ainda terei estômago para esta cidade. —
Coma seu bolo. Paguei muito dinheiro por ele.
— É melhor você esconder o resto ou Charlie vai
devorar ele à noite.
A preocupação me incomoda. — Ele está
ganhando peso.
—Desculpa. Não estou muito aqui, receio, ou o teria levado para
fazer exercícios.
— Eu tenho uma ideia.
— Uh-uh. Quando você tem uma ideia, fico preocupada.
Eu apoio meu pé no assento da minha cadeira, abraçando meu
joelho. — Ele pode passear com os cachorros.
— Você quer dizer eles? — Ela joga o polegar na porta ao lado
da clínica.
— Sim! Ele atravessa a rua sozinho, certo? Podemos tentar
primeiro com um cachorro e ver no que vai dar. Eu posso ir com ele
amanhã.
— Suponho que não faça mal.
— Vai ser bom para ele sair mais, respirar um pouco de ar
fresco.
Ela bufa. — Que ar fresco? Caso você não tenha notado, aqui é
Joburg.
Não estou com o ânimo abalado, não está noite. — Charlie e eu
faremos a primeira caminhada juntos.
— Você é uma boa irmã, Val. Charlie tem sorte de ter
você.
— Não, eu tenho sorte de ter
ele.
Ainda estou confusa com
meus estudos, mas há uma razão para estar fazendo
isso. O motivo é um menino lindo e inocente preso no
corpo de um homem que está sentado no sofá de Kris com
um enorme sorriso no rosto. Tudo o que é preciso para
deixar Charlie feliz é uma fatia de bolo. Eu deveria
aprender com ele.

Gabriel

A TERAPEUTA BATE à minha porta às dez em


ponto, conforme combinado. Dorothy Botha é uma
mulher baixa e atraente de quase quarenta
anos. Ela está vestindo jeans justos e uma
camisa elástica, não o traje que imaginei para
uma psiquiatra. Do jeito que estou pagando pela visita domiciliar,
esperava que ela fosse bem na Dior ou na Gucci.
Ela aperta minha mão e oferece um sorriso. — Senhor Louw.
— Me chame de Gabriel. Obrigado por encontrar Carly em
casa. É mais confortável para ela em seu próprio ambiente. — E há
menos chance de um de nossos inimigos descobrir que minha
filha tem problemas de instabilidade. Eles vão usar tudo o que
puderem contra mim.
Eu mostro a ela a sala de leitura onde Carly está sentada no
sofá, com as pernas dobradas. Minha filha me lança um olhar
cortante quando entramos e não oferece uma saudação a
Dorothy. Cada parte de sua linguagem corporal diz que ela não está
feliz em passar a manhã de domingo com uma psiquiatra.
— Carly, esta é a Sra. Botha. Diga oi.
— Diga oi, — Carly repete como um papagaio.
Estou prestes a perder a calma e dar a ela um sermão sobre
boas maneiras, mas Dorothy pousa a mão no meu braço.
— Você pode me chamar de Dorothy. — Ela pega a cadeira em
frente a Carly e olha para mim com expectativa.
Entendi. Ela quer que eu vá embora. — Café, chá?
— Não, obrigada. — Ela é
agradável, mas firme.
— Tudo bem então. — Fecho
a porta, esperando em Deus que Dorothy realize o
que nem eu nem Sylvia somos capazes, fazer com que
Carly se abra.
Enquanto as mulheres estão falando, ou
esperançosamente conversando, eu limpo a mesa de
nosso último café da manhã e alimento Oscar. Ele
está com uma nova marca de alimentos, igual ao
Bruno. Com o preço na etiqueta, eles devem colocar
flocos de ouro na ração. Mas a marca vale seu peso em
ouro, porque as alergias de Bruno desapareceram, e o
pelo de Oscar é grosso e brilhante. A comida de Bruno
é entregue à nossa porta pelo nosso veterinário
local. Eu pago a conta. Nenhuma comida de gato
está incluída. A comida especial não está
disponível em supermercados. Se Valentina
não pede com nossas compras diárias, de onde vem?
Magda entra na cozinha, vestida com seu terno Chanel preto e
branco. — Onde está Carly? Eu quero convidá-la para almoçar.
Eu cruzo meus braços e me inclino no balcão. — Onde?
— Os McKenzies.
Minhas costas imediatamente ficam rígidas. — Não estou
interessado.
— Vamos, Gabriel. — Ela apoia a bolsa no quadril. — Carly
nunca vai tomar o seu lugar. Ela não tem isso nela. Nossa única
chance é encontrar o marido certo.
— Eu disse não.
Ela avança dois passos, parando perto de mim. — Você tem uma
ideia mais inteligente? E se algo acontecer com você? Ou
comigo? Quem vai assumir o nosso negócio? Não aquela sua ex-
mulher interesseira. Corre o boato de que ela está de olho em
François. Se ela se casar com ele e não pudermos fornecer um
sucessor, aquele rato nojento vai assumir o controle como padrasto
de Carly. É isso que você quer?
O ácido queima minha boca. François é um menino
bonito cinco anos mais novo que Sylvia, mas não é isso
que está me incomodando. É a
ideia de ele bancar o padrasto
de Carly que não consigo digerir.
— Me responda. É isso que você quer?
—É só isso que importa, encontrar um sucessor
para o negócio? E a felicidade de Carly?
— Felicidade? — Ela ri. — Carly é minha neta, mas
por Deus, ela é uma criança mimada. Você a
acostumou com isso. — Ela balança os braços ao
redor da sala. — Você deu a ela tudo o que seu
coração deseja. Você acha que ela vai se contentar
com menos? Acho que não.
— Não projete seus sentimentos sobre Carly.
— Oh, o dinheiro é tão importante para ela
quanto para mim. Vamos encarar, mesmo que ela
não seja uma líder, ela é uma Louw. Cumprirá seu
dever pelo nosso nome.
— Não ouse tratá-la como um peão em seu
negócio. Carly não vai levar a vida que eu vivo.
— A vida que você vive? Você quer viver a vida de um de nossos
devedores? Quer ver como é o lado pobre da cerca? Você sabe o que
acontece com você e sua filha à noite quando você não tem dinheiro
suficiente para um sistema de alarme que os criminosos não
conseguem quebrar?
— Eu sei o que acontece. Eu vi isso.
— Você não sentiu isso. Acredite em mim, você não quer viver
outra vida além desta. — Ela me examina. — Você está ficando mole,
Gabriel. É aquela garota, não é?
Minha raiva aumenta. — Ela não tem nada a ver com isso. Com
Valentina ou sem Valentina, nunca vou casar Carly com Benjamin
Mackenzie.
— Espero, para o seu bem, que esteja ficando cansado de foder
seu brinquedo.
Cada músculo do meu corpo fica tenso. Minha perna ferida
protesta contra a tensão. — O que isso deveria significar?
— Um gato apenas brinca com um rato por um tempo antes de
ir para a matança. Por que ela ainda não está morta?
Meu coração cai como um machado rachando
madeira. — Eu não estou preparado.
— Tenho sido paciente com
você. Eu te dei o brinquedo
que você tanto queria. Fizemos um
acordo. Agora estou lhe dando uma ordem direta.
Mate ela ou eu farei isso por você.
Quase pulo sobre ela. Estou a um fio de cabelo de
seu rosto antes de me impedir. — Você não fará nada por
mim, está me ouvindo?
— Esta é sua última chance. Faça isso mais
cedo ou mais tarde. — Ela sorri docemente. — Você
não tem mais doze anos. Não me faça atirar no seu
pé.
Minha visão fica embaçada. Estou prestes a
estrangular minha própria mãe em nossa cozinha. A
única coisa que me impede de alcançar seu pescoço
esquelético, branco e enrugado é a figura de Carly
que aparece no batente da porta.
Há um arrepio em sua voz. —
Terminamos.
— Eu vou sair para almoçar, Carly querida. Por que você não se
junta a mim?
— Magda vai almoçar com os McKenzies, — eu digo, sabendo o
quanto Carly odeia Benjamin.
— Não, obrigada, vovó. Eu tenho dever de casa. — Ela trota pelo
corredor, fingindo que eu não existo.
Quando Carly está fora do alcance da voz, estreito os olhos. —
Me deixe cuidar dos meus próprios assuntos e deixe Carly fora do
mercado. — Dando as costas para minha mãe, saio da sala, sentindo
a tensão na perna.
— Suavidade vai te matar, Gabriel, — ela grita atrás de mim.
Dorothy espera na sala de leitura.
Fecho a porta e me sento. — Como foi?
Ela enxuga os dedos na testa. — É difícil conversar com
ela. Claro, eu preciso ganhar a confiança dela primeiro. — Ela me
olha por baixo dos cílios. — Eu percebo uma necessidade de
aprovação e aceitação. Você está passando tempo suficiente com ela?
— Não tanto quanto eu gostaria.
— Trabalho exigente?
— Não é isso. Carly prefere passar mais tempo com
seus amigos a com seu pai.
— É normal. Tente
fortalecer sua autoestima
elogiando-a pelo dever de casa bem-feito ou boas
ações, qualquer coisa positiva, mas seja autêntico.
Certifique-se de que ela saiba que você está notando-a e
tendo interesse em sua vida.
— Eu garanto a você, eu estou.
— Eu não duvido disso, ou não estaria
aqui. Apenas certifique-se de mostrar a ela, além de
contar a ela. É claro que ajudará se eu puder ter uma
sessão conjunta com você e sua ex-mulher para chegar
a um acordo sobre uma estratégia consistente que
reforce a autoimagem de sua filha.
— Temo que você não encontrará muita
cooperação de minha ex-mulher.
— Ah bem. — Ela limpa as mãos nas coxas
e as endireita. — Vamos ver como fica depois
de algumas sessões. Tente manter as coisas
normais. Não introduza nenhuma situação nova ou estressante se
puder evitar, pelo menos não por enquanto.
— Tal como?
— Uma madrasta.
— Carly está preocupada com isso?
— Ela mencionou isso. Sei que é uma pergunta pessoal, mas
você está saindo com alguém, talvez uma amiga com quem sua filha
não se dê bem?
— Não. — Não que Carly saiba, pelo menos.
— Então o medo de Carly é infundado. Não é incomum que as
crianças se sintam perdidas após um divórcio. Carly tem medo de
perder você ou a mãe para outra pessoa. Tranquilize ela sobre o seu
afeto sempre que puder.
— Claro.
— Vejo você na próxima semana, na mesma hora.
— Vou te acompanhar até a porta.
Enquanto eu falo, minha mente está vagando para um
pensamento recorrente. Como Carly vai reagir se ela descobrir sobre
Valentina?

Valentina

O ARREPENDIMENTO NÃO é um sentimento


favorável. Mesmo assim, não consigo deixar de sentir isso
quando li a carta dirigida a mim que Gabriel traz para a
cozinha na segunda-feira de manhã. Lendo de costas
para ele, eu enrolo meus dedos em um punho até
minhas unhas cortarem minha pele. Eu quero
chorar, mas ele está pairando na máquina de café.
— Boas notícias?
Eu olho para ele por cima do ombro. Ele está
vestido com um terno escuro com uma camisa azul e
gravata amarela. Ele faz o conjunto parecer
perfeito. As calças sob medida se estendem sobre
seus quadris estreitos, o que enfatiza a largura de
seu peito. Sua fragrância única me atrai, mas
preciso ficar sozinha para lidar com isso.
Eu encolho os ombros.
— Tudo bem. — Ele diz isso como uma ameaça, me fazendo
entender que vai me deixar escapar com a minha desobediência de
não dar uma resposta por agora, mas talvez não mais tarde.
Prendo a respiração até ele sair da sala. Só quando estou
sozinha permito que as emoções explodam dentro de mim. Eu agarro
as bordas do balcão com tanta força que meus braços tremem com a
tensão. A carta se enruga em meu punho. Eu amasso até que seja
uma pequena bola. De todas as piadas de mau gosto do mundo, esta
deve ter o melhor momento. Eu bato meus dedos no balcão, fazendo
as tigelas, facas e colheres tilintarem. Por três segundos, eu me
permito cada emoção destrutiva que se lança em meu coração, e
então eu levanto a tampa da lata de lixo e jogo a carta me informando
sobre minha admissão numa bolsa de estudos totalmente
inclusiva. Quando a tampa cai com um estrondo, algo dentro de mim
deixa de existir. O que resta é o eco vazio de um sonho e nada mais
do que a vontade de sobreviver.

Gabriel

A CARTA QUE CHEGOU da


universidade esta manhã deveria ter deixado
Valentina em êxtase. Há uma mudança nela que não
entendo. Depois de fazer minhas rondas matinais em
nossas franquias na cidade, vou para a casa de sua amiga,
onde Charlie mora. A mulher esperando na recepção
com um Doberman em miniatura se encolhe ao olhar
para o meu rosto. Passando por ela com ignorância
praticada, me aventuro até a seção de alimentos e
levanto meus óculos de sol para ler os rótulos. Pego um
saco da marca de dieta urinária que Valentina comprou
para Oscar da prateleira e levo para o caixa. Poucos
minutos passam antes de uma loira oxigenada em
um sobretudo branco, saia. Linhas duras marcam
seu rosto envelhecido e suas unhas estão
quebradas. Seus olhos não revelam nada
enquanto ela me avalia. Eles voam de mim para o saco de comida
que está no balcão.
— Posso te ajudar?
— Esta é a melhor marca que você tem?
— De longe.
Eu apoio o cotovelo no balcão e verifico o quadro com as taxas
de esterilização e vacinação. — Minha governanta compra para o
meu gato. Não conheço a marca, mas pensei em conseguir a mesma.
Seus olhos brilham por um breve segundo antes que ela os
estreite. — Sua governanta é uma garota inteligente.
— Ela com certeza é, mas deveria ter me dito que está pagando
pela comida do próprio bolso.
— Talvez ela não pudesse, porque ela sabe que você não se
importa muito com seu gato.
A senhora com o Doberman está nos observando, sua cabeça
balançando entre a veterinária e eu.
— É verdade. Eu não ligo para os pelos que ele lança na minha
casa ou o fato de que ele rasgue minhas cortinas em pedaços, mas
minha governanta parece gostar dele, então é
o seguinte. Vou abrir uma conta e mandar um motorista
uma vez por mês para recolher a
comida. — Aponto para a
comida de cachorro de raças
grandes da mesma marca. — Você pode colocar
alguns sacos disso também.
Quase parece que ela vai me recusar, mas o estado
de sua sala de espera me diz que ela precisa do
negócio. Depois de um momento me medindo, ela diz.
— Vou anotar seus dados.
Ela escreve meu endereço e número de telefone
em um livro. Nos dias de hoje, ninguém usa um livro,
nem mesmo o mais simples dos meus tubarões. Ela
tem uma paciente esperando e eu tomando uma boa
parte do seu tempo de consulta. O que ela precisa é de
um computador e de um assistente. Não é à toa que
ela está operando em um prédio degradado,
cobrando taxas mais baixas do que as atuais.
Eu bato meus dedos no balcão enquanto ela rabisca meu
pedido. —Você deveria utilizar eletrônico.
Ela levanta a cabeça para me dar um olhar cortante. — Vou
fazer o upgrade quando puder.
Eu não a culpo por me odiar. O que a torna diferente do resto
do mundo? Em qualquer caso, não pretendo conquistar o amor de
ninguém. Eu posso esquecer de obter informações sobre o estado
emocional de Valentina ultimamente com esta mulher. Ela não vai
me dar um copo d'água nem se eu estiver morrendo.
Ela fecha o livro. — Terminamos?
Eu deixei os óculos escuros caírem sobre meus olhos. — Por
enquanto.
Saudando-a, pego a comida e caminho até a porta. O Doberman
choraminga quando passo por sua dona, que se inclina o mais longe
possível de mim sem cair da cadeira.

Valentina

ESTA LASANHA NÃO PODE FRACASSAR. Esta lasanha não


pode fracassar. Estou tão absorta em
deixar o molho branco
engrossar sem formar caroços
que não noto Rhett até que ele esteja bem perto
de mim. Assustada, deixo cair o batedor. Ele quica no
fogão, rola para fora da borda e atinge o chão. É a primeira
vez que ele põe os pés na cozinha desde que cheguei. Ele
se abaixa para pegar o batedor e o enxágua na
torneira antes de devolver para mim.
— Obrigada. — Uso a mão esquerda para mexer
o molho.
Ele aponta para a bandagem em meu polegar. —
Como está a mão?
— Ótima, obrigada.
Ele dá um sorriso irônico. — Não tive a chance
de me desculpar por ter levado você ao Gen Joburg.
Se eu tivesse alguma ideia de que o lugar era tão
ruim assim, teria ido diretamente à clínica.
— Você fez o que eu pedi.
— Eu não estava pensando direito. Vi o sangue e fiquei meio
apagado.
Eu não posso deixar de sorrir. — Você? É sério?
Ele levanta as mãos em um gesto de rendição. — Não foi tanto
o sangue quanto você. Achei que Gabriel fosse me matar.
— Por quê?
— Aconteceu no meu turno.
— Não foi sua culpa.
— Não teria importado. Eu era o mensageiro.
Eu paro de me mexer para olhar para ele. — Me desculpe se eu
coloquei você em apuros.
Ele sorri. — Não tanto problema quanto os que você se
meteu. Sem mais acidentes na cozinha, tudo bem?
— Vou fazer o meu melhor. — Volto minha atenção para
o molho.
Ele se inclina no balcão e cruza os tornozelos. — Eu estava
pensando em comprar um cachorrinho para você.
— Um cãozinho?
—Eu já esclareci isso com Gabriel. — Ele muda seu
peso ao redor. —Eu posso te dar um daqueles cachorros
fofos que as mulheres gostam. Um
Poodle, Maltês ou algo assim.
— Eu não quero um
cachorro.
Ele parece desapontado. — Por que não?
— Já perdi o suficiente. Eu não quero me preocupar
com outro cachorro.
Ele descruzou os tornozelos e cruzou os braços,
sem encontrar meus olhos.
Quando ele não fala, mas também não sai, tiro
o molho do fogo e me viro para encarar ele de
frente. — Por que você atirou em Puff, Rhett?
Seu peito se expande, como se estivesse respirando
fundo, e quando ele levanta o olhar novamente, me
olha com um olhar fixo. — Eu não queria deixar o
cachorro se virar sozinho nas ruas.
— O que?
— Já vi cães o suficiente para saber que o vira-lata não
sobreviveria sozinho. Deixá-lo significaria uma morte prolongada e
cruel de fome.
— Deixá-lo?
Sua voz adquire um tom tranquilo. — Quando invadimos seu
apartamento naquela manhã, foi com ordens explícitas.
O sangue escorre da minha cabeça, me deixando com uma
sensação confusa. Rhett tinha certeza de que não sairíamos vivos,
nem Charlie nem eu. Oh meu Deus. Gabriel não estava lá apenas por
Charlie. Ele iria nos matar. Guardei a informação no fundo da minha
mente para lidar com ela mais tarde. Sozinha.
— Não sei por que Gabriel mudou de ideia, mas posso garantir
a você, isso nunca aconteceu antes.
Minha risada é forçada. — Minha mãe costumava dizer que eu
tenho um anjo da guarda. Talvez ela estivesse certa.
— Se isso vai fazer você se sentir melhor, Gabriel acabou comigo
por ter matado seu cachorro.
— Naquele dia que você saiu da academia com o nariz quebrado.
— Sim. Olha, vou dormir muito melhor se você me
deixar pegar aquele cachorro para você.
O olhar que ele me dá é tão
arrependido que minha
compaixão vence minha vingança
sobre Puff. Logicamente, eu entendo por que ele fez
isso. Não é certo ou melhor, mas não estou em posição
de negar a redenção a ninguém. Ainda estou perseguindo
a absolvição pelo que aconteceu com Charlie. Limpando
minhas mãos no avental, considero sua proposta.
Outro ser vivo só vai me tornar mais vulnerável do
que já sou, porque é isso que faz ao cuidar de alguém
ou de alguma coisa.
— Eu não quero um cachorro. Eu quero que você
me treine.
Ele me olha como se eu tivesse perdido a
cabeça. — O que?
— Me ensine autodefesa. Podemos praticar na
academia.
— Gabriel vai me matar.
— Não se ele não souber. Podemos fazer isso quando ele estiver
fora.
— É uma ideia maluca, Valentina.
— É? Você já ficou impotente enquanto os homens pegavam o
dinheiro pelo qual você se arrebentou de trabalhar? Você já foi
pressionado e violado, incapaz de fazer uma maldita coisa sobre isso?
Ele desvia os olhos, incapaz de segurar os meus.
— Por favor, Rhett. Não vou usar isso contra ninguém nesta
casa. Eu não sou idiota. Só não quero mais me sentir impotente.
Ele engole. — Me peça qualquer outra coisa. Se Gabriel
descobrir...
— Ele não vai, a menos que você diga a ele.
Ele olha para mim novamente, uma guerra travando em seus
olhos. Finalmente, é sua culpa que vence. — Tudo bem, mas
nenhuma palavra para ninguém, nem mesmo Quincy.
— Tudo bem.
Ele se endireita do balcão, mas seus ombros cedem. — Eu
avisarei você quando a barra estiver limpa.
— Obrigada.
— Nos considere quites. — Há uma pitada de
apreensão e até medo em sua
expressão quando ele sai da
cozinha.

Gabriel

O RELATÓRIO DE ANTON apenas confirma o


que já sei. Ninguém sabe nada sobre o estupro de
Valentina. Eu largo a caneta na minha mesa e esfrego
meus olhos cansados. Não estou surpreso que
Marvin não tenha procurado a polícia. Sua família
ficou envergonhada. A maneira como ele teria lidado
com o crime seria vingar a inocência roubada de sua
filha matando o homem responsável. Já que ele
morreu no mesmo ano em que ela foi agredida, não
tenho certeza se ele chegou a isso. É por isso que
Lambert abandonou sua prometida noiva? Por
que ela estava maculada? Eu irei encontrar
o vilão que a estuprou, mas por enquanto tenho uma prioridade
maior, a ameaça de Magda.
Nunca subestime Magda. Eu sei do que ela é capaz melhor do
que ninguém. Se eu não matar Valentina, ela irá fazer isso, e como
castigo por minha desobediência ela vai fazer isso de uma forma que
vai me machucar. Não tenho vergonha de meus hábitos. Minha mãe
sabe que eu gosto de foder como algumas pessoas se apegam a um
hobby. Ela sabe que sou territorial e o bastardo mais possessivo da
face da terra. Ela me conhece bem para entender que pensar nas
mãos de outro homem em Valentina vai me deixar de joelhos,
principalmente depois do que fiz ao Diogo. A morte de Valentina é
um lugar que eu nem posso ir. Se Magda tiver que terminar o
trabalho para mim, Valentina provavelmente sofrerá estupro coletivo
seguido por uma morte horrenda e lenta de tortura. Tenho que
encontrar uma maneira de mantê-la, mas não há nenhum lugar onde
possa escondê-la onde a rede de parceiros de negócios de Magda não
a encontre. E então há Charlie. O que eu faço com ele? Onde eu o
mantenho seguro? Fiz um trato com a Valentina e, sabendo o quanto
Charlie significa para ela, é um que pretendo
honrar. Todo problema tem uma solução. Eu só tenho
que olhar bem o suficiente.
Vendo que tenho pouco
tempo precioso, deveria estar
procurando um jeito de guardar meu lindo
brinquedo, não batendo a porta do meu escritório, e
percorrendo o corredor como um homem louco, meus
passos me levando onde sempre fazem, o quarto de
Valentina. Está tarde. Magda e Carly já foram para a
cama, mas ainda mantenho um olhar atento.
Apenas alguns minutos. Preciso de uma pausa
para limpar minha mente. Buscar soluções
improváveis para escapar da promessa de Magda me
fez andar em círculos como um cachorro correndo atrás
do próprio rabo. Eu preciso ver, abraçar, provar,
respirar ela, para acalmar o medo de perdê-la.
Quando entro em seu quarto, ela sai do
banheiro, com o cabelo molhado e o corpo
úmido. Ela para no batente da porta. A
bandagem está seca. Bom. A última coisa que quero é mais
preocupação. Eu preciso muito dela.
Por alguns segundos, olhamos fixamente, cada um esperando
que o outro faça um movimento. Há um milhão de coisas que posso
fazer com ela. Eu deveria puni-la pela obstinação desta
manhã quando me deu o tratamento frio, mas não vou tocá-la assim
quando estiver ferida. Ainda não me decidi quando ela diminui a
distância entre nós, colocando seu corpo delicado na minha frente
como um peão branco vulnerável no caminho dos cascos do
garanhão preto. A posição é um lembrete físico da diferença de poder
entre nós. Posso jogá-la na cama e comer sua buceta de dentro para
fora, posso foder cada buraco em seu corpo ou beijá-la até que ela
não consiga respirar. Ela é minha para fazer o que eu quiser.
Compensei minha aparência ao me tornar um mestre do prazer
físico. Não posso dar a ela um rosto bonito, mas posso fazê-la gritar
de orgasmos até que não haja mais ar em seus pulmões.
Suas mãos alcançam minha camisa. Estou curioso. Ela vai me
despir? Ela agarra as bordas do tecido acima do primeiro botão e os
puxa. Que se foda, caramba. Há um som de rasgo e botões
voando por toda parte. Ela fica na ponta dos pés para
empurrar a camisa sobre meus
ombros, mas as mangas ficam
presas em meus
braços. Abandonando seus esforços com a camisa,
ela se concentra em meu cinto, seus dedos se
atrapalhando com a fivela.
Meu coração está batendo como os cascos
daquele garanhão que ela soltou, e estou com medo
de que a besta a esmague quando ele deixar sua
paixão com rédea solta, mas estou fraco demais para
impedi-la. Finalmente conseguindo puxar o couro
das alças da minha cintura, ela o dobra duas vezes e o
empurra na minha mão. Está lá em seus olhos, o que
ela quer que eu faça. O marrom de suas írises está
manchado e turvo, como uma represa após um
deslizamento de terra.
Em circunstâncias normais, eu a amarraria
e daria o que ela quer, espancaria enquanto a
fodo, mas não tem sido uma semana normal.
Quando eu não me movo, ela segura minhas bolas e as espreme
através das minhas calças. Sua língua está quente e úmida na minha
barriga, lambendo uma linha de lava derretida no meu peito. Seus
pequenos dentes travam no meu mamilo. Eu estremeço quando ela
morde. Puta merda. Ela me solta para morder o músculo do meu
peito, então se afasta para estudar as marcas que deixou na minha
pele. Suas mãos serpenteiam ao redor do meu pescoço, me puxando
para seus lábios. O beliscão que ela dá, tira sangue do meu lábio
inferior. Suas unhas cravam em meu couro cabeludo. Ela me beija
como uma louca, gemendo e esfregando seu corpo contra o meu.
Tão de repente quanto me agarrou, ela me soltou, caindo de
costas na cama com as coxas abertas. Sua boceta está madura para
mim, molhada e inchada. Eu sigo como se ela me tivesse em uma
coleira apertada, mas antes que eu pudesse montá-la, ela rola e fica
de joelhos, oferecendo sua bunda e buceta. É uma visão tão atraente
que quase perco a razão. Não movo meus olhos do triângulo bem
barbeado entre suas pernas enquanto tiro os sapatos e quase quebro
o zíper para sair da calça. Não demoro mais do que um segundo para
tirar minhas meias. Agarrando seus quadris com força,
arrasto-a para a beira da cama, a colocando onde preciso
dela.
— Me leve, Gabriel. Me
leve com força. — Estou prestes a
fazer exatamente isso quando ela diz. — Faça
doer. Faça doer muito.
Minha luxúria para. Me excito ao machucá-la, mas
sua dor, em última análise, traz prazer para nós
dois. Estou usando a dor para treinar seu corpo a
precisar de mim, mas não vou permitir que ela use a
dor física para escapar de seus sentimentos. Isso é
reservado para monstros como eu, e não tenho
intenção de transformar ela em um monstro. Eu
preciso dela doce e inocente. Eu preciso dela pelo que
ela é.
Ela me olha por cima do ombro. — Gabriel.
Seu choro é um apelo enquanto seus olhos
estão cheios de medo, medo de que eu não vá
obedecer. Não há nada que eu negue a ela, mas
isso eu não vou dar.
— Gabriel!
Sua mãozinha se dobra em torno do meu eixo. Estou tão duro
que mal sinto a pressão de seus dedos enquanto ela me guia para
seu traseiro. Eu sei como é uma foda sem preparação adequada para
uma mulher. Fiz minhas amantes descreverem cada sensação para
mim em detalhes. O fato de ela querer isso me mostra o quanto está
sofrendo por dentro.
— Me foda já, se você é um homem.
Eu sei o que ela está tentando fazer. — A provocação não vai
funcionar comigo, linda.
Agarrando-a pela cintura com um braço, eu a empurro no
colchão. Quando caio de lado, trago seu corpo comigo, pressionando-
a de volta contra o meu peito.
— Vai se foder, Gabriel!
Ela luta com toda a seriedade, tentando se libertar, mas eu a
aprisiono nas restrições de meus braços.
— Me deixa ir!
Eu a seguro no lugar e planto o mais gentil dos beijos em seu
pescoço.
— Não! Não se atreva.
Beijo sua orelha, seu cabelo e
sua têmpora com um toque
suave de meus lábios. — Você é
tão linda, Valentina. Eu já te disse isso?
Sua voz se quebra. — Por favor, não.
Eu jogo minha perna sobre a dela, confinando suas
pernas enquanto empurro a parte superior de seu corpo
no colchão para beijar sua coluna. Soluços sacodem
seu corpo, mas eu beijo cada vértebra, abrindo
caminho até a curva de sua bunda e subindo.
— Não assim, — ela chora. — Não
suavemente. Não como se você se importasse.
Dou a ela toda a ternura que sou capaz,
acariciando sua bunda firme e entre as pernas,
testando suas dobras. Ela está molhada. Sempre
pronta para mim, assim como eu a treinei. Quando
direciono meu pau para sua entrada, ela começa
a lutar comigo novamente, balançando a parte
superior do corpo e chutando com as
pernas. Tudo que posso fazer é segurar seus ombros para baixo com
meus braços e manter suas pernas presas entre as minhas enquanto
entro em seu corpo escorregadio, centímetro a centímetro, até que
ela tome tudo de mim. Ela é tão quente e apertada que me deixa
tonto. Com suas coxas pressionadas, a fricção é demais. A cada
impulso, corro o risco de gozar como um adolescente inexperiente.
— Te odeio. — Suas palavras são abafadas pelo travesseiro, mas
seu corpo já está balançando com o meu. — Por que você não pode
fazer isso? Por que você não me machuca?
Não vou cortar o ar dela, não vou enterrar meu pau em sua
bunda, e não vou levar meu cinto nela. É minha função entender
suas necessidades, e o que ela precisa agora é ser amada.
— Por que você não me matou, Gabriel?
Eu fico quieto. — Do que você está falando?
Ela vira o rosto para o lado. — Rhett me contou.
Esse filho da puta.
— Foi por isso que ele atirou no meu cachorro, — ela
sussurra. —Não deveríamos sair vivos.
Eu começo a me mover novamente, tentando
acalmá-la com nosso prazer, mas ela não desiste.
Há lágrimas em sua voz. —
Por que Gabriel? Me diga,
maldito seja.
— Porque eu queria você, — eu solto.
Ela empurra sua bunda contra minha virilha. — É
isso? Você precisava de uma foda?
Eu empurrei mais fundo, a fazendo gemer. —
Você sabe por quê.
— Você poupou minha vida para me tornar sua
puta.
— Não minha puta. — Beijo a pele macia e
dourada de seu ombro. —Minha propriedade.
— Qual é a diferença? — Ela pergunta
amargamente.
A diferença é que a propriedade pertence. Eu
encontro seus lábios, beijando-a como se fosse
minha, tentando mostrar a ela que por mais que
eu a treinei para precisar de mim, eu preciso
dela em igual quantidade. Desta vez, ela não
resiste à suavidade do meu toque. Ela me beija de volta, nosso ritmo
lento e reverente. Eu deslizo meu corpo sobre o dela, a maciez da
minha pele úmida de suor tornando o atrito suave. O movimento leva
meu eixo mais fundo. Eu a sinto em cada centímetro de mim. Um
gemido profundo rasga meu peito.
Maldição, isso é o paraíso. Minhas bolas sobem na minha
virilha e agulhas afiadas perfuram a base da minha espinha. Porra,
ainda não. Eu quero durar. Eu ainda luto por um momento para
morder de volta o prazer. Arrasto minhas mãos sobre seus cabelos e
ombros, sobre as curvas suaves onde seus seios estão pressionados
contra o colchão. Ela é suave e resistente e muito feminina. Eu me
deleito em invadir seu corpo, tornando seus segredos e sentimentos
meus. Empurro o mais fundo que posso, até que meu pau atinge
uma barreira. Um pequeno suspiro escapa de seus lábios. Devo estar
empurrando o colo de seu útero. Cuidadosamente, eu recuo e
empurro novamente. Ela joga a cabeça para trás e choraminga, seus
gemidos mudando de sons de desafio para necessidade. Um pouco
mais fundo e tocaria o lugar em seu corpo onde os milagres
acontecem, onde uma criança pode crescer a partir de seu
ventre. A única coisa mais bonita do que uma mulher é
uma mulher grávida. Quando sua
semente se enraíza em seu
ventre e seus seios crescem cheios
com a maravilha de uma nova vida conforme sua
barriga se expande com seu filho, você quer amá-la e
fodê-la com seu filho crescendo entre vocês. Valentina vai
me assustar com a crueza de sua beleza enquanto a
maternidade a transforma.
Meu corpo fica tenso com uma ejaculação
crescente tão poderosa que dói. Quando minha
liberação explode, uma ideia surge em minha mente.
Enquanto me esvazio em seu corpo, encontro a
resposta que procuro. Eu sei como salvá-la
irrevogavelmente.
É depravado e imoral.
É duvidoso.
É perfeito.
14
Gabriel

MEU MÉDICO LEVA um dia para entregar as pílulas


anticoncepcionais de placebo. Enquanto ele está lá, aproveito a
oportunidade para explicar o que preciso para a visita domiciliar da
próxima semana.
A partir do próximo mês, Valentina não estará protegida. Eu sou
um idiota, mas ficar grávida é a sua única esperança. A única linha
que Magda nunca cruzará é matar a mãe de seu neto. Não sou
ingênuo o suficiente para acreditar que Valentina algum dia vai
querer um bebê comigo. Ela nunca poderá saber que tomei a escolha
de suas mãos. Será mais fácil aceitar se ela achar que foi um
acidente.
Estar grávida vai ser difícil para ela. Não tenho ilusões sobre a
psique das mulheres esperando bebê. Sylvia detestava cada minuto
da gravidez. Ela odiava o que a gravidez fazia com seu corpo. Minha
mãe nunca deixa passar a oportunidade de me lembrar
como sofreu para me dar à luz. De acordo
com Magda, a dor de me trazer
a este mundo foi pior do que
uma tortura. Ela se ressentia de não ser
tão ágil ou móvel como o normal. Tinha varizes e dores
nas costas que a deixavam maluca. A única vez que
Magda simpatizou com Sylvia foi quando ela estava
grávida de Carly. Sim, não será um caminho fácil,
especialmente para uma jovem que ainda não
completou seus estudos. Não quero nem pensar na
diferença de idade. Estou seguindo por uma estrada
esburacada e infernal, arrastando uma jovem contra
seu conhecimento e vontade. Você não fica mais
depravado do que isso.
Depois da minha ginástica matinal, tomo um
banho e me fecho no escritório para examinar os
relatórios financeiros. Não estou nem dez
minutos no meu trabalho quando meu telefone
toca. O nome do meu diretor financeiro aparece na tela.
— Harry, o que posso fazer por você?
— Acabei de receber um telefonema da UNISA. Senhorita
Haynes desistiu.
— O que? — Eu o ouvi alto e claro, mas não faz sentido. — Eu
não tenho certeza se entendi.
— Você gostaria de retirar a bolsa ou está disposto a considerar
outro aluno?
— Retornarei para você em breve. — Termino a ligação e coloco
Aletta Cavendish na linha. — Acabei de descobrir que Valentina
abandonou os estudos.
— Oh céus. Achei que ela tivesse contado a você.
Claro que não fez. Ela não sabe que eu sei sobre seus estudos.
— Ela disse por quê?
— Só que as prioridades dela mudaram.
— É tarde demais para reverter o cancelamento?
— Eu posso segurar por um tempo, mas não muito. Suas
tarefas estão atrasadas e os exames começam em menos de duas
semanas. Não ajuda que ela já tenha falhado em um teste.
— Eu sei o quanto ela quer este diploma. Me dê a
chance de falar com ela.
— Espero que você possa
influenciá-la.
— Eu vou.
— Esperarei sua ligação então.
Eu desligo e recosto na minha cadeira. Então, isso é
o que está atormentando Valentina. Rhett me disse que
ela até recusou o cachorro que ele ofereceu. Se ela
conseguir aguentar mais algumas semanas, tudo
mudará.

PELO RESTO DO DIA, EU persigo pistas sobre o


estupro de Valentina, mas as portas se fecham em
meu rosto até onde eu vou. É um esforço inútil que
me deixa agitado e exausto. Quando chego em casa
no final da tarde, estou exaltado a um estado que
deixa Quincy com o lábio sangrando depois de
nosso exercício de luta livre na academia. Uma
tempestade está se formando no horizonte quando eu tomo meu
banho, lançando no céu uma luz roxa ameaçadora com um toque de
ouro onde o sol penetra nas massas escuras. Descendo as escadas
para jantar, Magda avisa que temos um convidado surpresa. Sylvia
está sentada ao lado de Carly, seu cabelo loiro trançado em uma
trança francesa e um vestido branco virginal colado ao corpo como
uma luva. Ela perdeu peso.
— Gabriel. — Ela me reconhece com um aceno de cabeça
apertado e um sorriso frio.
Eu beijo o rosto de minha ex-mulher. — Você está linda como
sempre.
Ela toca seu colar de diamantes, um presente meu no nosso
primeiro aniversário de casamento. — Obrigada.
Eu me sento e começo a servir o vinho. Vou precisar de alguns
copos. — A que devemos a visita?
— Nada. Eu não preciso de um motivo para visitar minha filha,
preciso?
Do outro lado da mesa, nossos olhares se travam em uma
batalha não-verbal. O meu é arrancado do dela quando
Valentina entra com as entradas. O comportamento de
minha empregada é de
profissionalismo enquanto nos
serve, mas não perco o jeito como
Sylvia a encara.
— Vou até Sebastian depois do jantar, — Carly diz,
trazendo minha atenção de volta para ela.
Eu aceno enquanto Valentina paira ao meu lado com
os aspargos. —Não me lembro de você perguntar.
— Eu já disse que sim. — Sylvia colocou o
guardanapo no colo, me desafiando a desafiar ela.
O motivo da visita de Sylvia de repente fica claro.
— Ainda não gosto daquele menino. — Magda
lança um olhar severo para Carly. — Ele não é nosso
tipo.
— Vovó, — Carly geme. —Não é da sua conta.
Estou muito cansado para lidar com isso esta
noite. — Cuidado com a língua, mocinha. Você
não vai falar com sua avó assim.
— Ela começou. — Carly faz beicinho e cruza os braços.
Magda bufa. — O que você pode ganhar com um relacionamento
com ele? Quem são seus pais? Trabalhadores medíocres com um
negócio de têxteis.
— Ela não está sendo pedida em casamento, — diz Sylvia. — De
qualquer forma, ela é minha filha. Você não tem uma palavra a dizer.
— Nossa filha, — eu a lembro.
Magda pega seu garfo. — Não vamos brigar por isso na mesa de
jantar.
— Não vamos, — Sylvia diz docemente. — A decisão já está
tomada.
— Não é sobre o menino, — eu digo. — É sobre agir pelas
minhas costas sem perguntar.
— Como eu disse, — Sylvia acrescenta com força, — ela me
perguntou.
Pela primeira vez, concordo com Magda. Esta não é uma luta
que precisa acontecer aqui. Vou dar uma palavrinha com Sylvia
depois do jantar sobre seus modos de conivência com Carly.
— Bem, — os ombros de Sylvia se endireitaram, —
isso foi resolvido então. — Ela dá uma tapinha na mão de
Carly com mais carinho do que
nunca a vi lidar com nossa
filha.
Algo está acontecendo com Sylvia. Ela odeia a
pobreza tanto quanto Magda, o que coloca Sebastian sob
sua linha de radar de material adequado para namorados.
O resto da refeição é tenso. Fico aliviado quando a
provação acaba. A mãe de Sebastian vem com o filho
buscar Carly e educadamente recusa nossa oferta de
uma bebida. Da varanda, vejo Sylvia dizer adeus a
Carly.
— Esteja de volta às onze, — eu digo, dando a
Sebastian um olhar que diz a ele para não foder comigo.
Quando o carro arranca, Sylvia volta a subir os
degraus e me entrega sua jaqueta para colocar sobre
os ombros. — Boa noite, Gab. Vou deixar você voltar
a foder sua empregada.
Eu agarro seu pulso. — É a última vez que você vai me chamar
assim, e a última vez que você vai fazer um comentário sarcástico
sobre minha empregada.
Tirando o braço do meu aperto, ela sibila. — Vamos ver como o
seu futuro vai funcionar bem para você, — e então caminha para seu
carro esporte com as costas rígidas. Ela acena pela janela antes de
arrancar com pneus barulhentos.
Houve um tempo em que ela me chamou de Gab. Foi uma época
em que confiei nela e acreditei que ela se importava. Ela é uma atriz
muito boa.
— Isso é o que você ganha por se casar com aquela prostituta,
— Magda diz atrás de mim.
Eu olho por cima do ombro para vê-la olhando da porta. — Você
seria sábia se ficar quieta agora.
Ela apenas ri enquanto gira sobre os saltos e desaparece dentro
de casa.
No saguão, sirvo uma bebida forte e espero uma hora. Não posso
ir para a cama antes de Carly chegar em casa. Eu ligo para a cozinha.
A voz de Valentina vem pelo interfone. — Sim?
— Venha para o salão.
Ela entra na sala cinco
minutos depois, olhando para
mim com desconfiança onde estou
sentado na poltrona.
— Venha se sentar comigo. — Eu estendo minha
mão para ela.
Em vez de subir no meu colo como eu gostaria, ela
para na beirada da minha cadeira e se enrola no
tapete aos meus pés. Eu empurro sua cabeça para
baixo na minha coxa, acariciando seu cabelo
sedoso. Assim como ela aceitou minha dor, está
aprendendo a aceitar minha ternura. Estou gostando
de nosso momento tranquilo, mas há duas questões
importantes que devo abordar. Não tenho mais o luxo
de esperar que ela confie em mim. Desisti de esperar
pela confiança dela.
— Por que você abandonou a faculdade?
Seu corpo fica rígido. Ela leva um momento para responder. —
Como você descobriu?
— Isso importa?
— Você está certo, — ela sussurra. — Eu não quero saber.
— Você vai voltar.
Ela levanta a cabeça para olhar para mim. — Não faça isso. Já
lidei com isso. Não quero ir por esse caminho de novo.
Eu fecho minha mão em seu cabelo. — Você vai voltar.
— Gabriel. — Seus olhos se enchem de lágrimas. — Por favor.
— Marie vai voltar. As coisas vão voltar ao normal. — É uma
mentira, mas não posso dizer a ela como estou planejando mudar
suas circunstâncias.
— As coisas nunca serão normais para mim.
É verdade, mas é melhor ela aceitar. Ela vai aceitar tudo o que
eu escolher dar a ela. Minha mão aperta em seu cabelo. — Você
ligará amanhã e retirará seu cancelamento.
— Por quê? — Ela sussurra.
Porque apesar de tudo, ainda quero que ela seja feliz. — Você
vai me obedecer, como você prometeu.
A dor pisca em seus olhos. — Você está me
ameaçando?
— Eu sou a maior ameaça
da sua vida.
Seu lábio inferior começa a tremer. —
Claro. Como eu poderia esquecer?
Minha mão está doendo para avermelhar sua
bunda. Se não fosse por seu ferimento, ela estaria jogada
no meu colo agora, com a calcinha em volta dos
tornozelos.
— Não me pressione, Valentina. Você fará o que
eu digo sem questionar, porque eu sei do que você
precisa e é meu trabalho dar a você.
Essa mesma aceitação, com a qual ela se
submeteu às minhas chicotadas e fodas de merda,
enche sua expressão. Não é tanto uma escolha, mas
um entendimento de que não há escolha.
— Boa menina.
Eu me curvo para beijá-la, saboreando a
doçura de sua submissão enquanto seus lábios
tremem sob os meus. Se eu não me afastar, vou levá-la aqui mesmo
na sala, e ainda tenho muito a dizer.
— Há outra coisa que você vai fazer por mim. — Eu observo seu
rosto com cuidado enquanto escolho minhas próximas palavras. —
Você vai me contar sobre o homem que estuprou você.
O pânico brilha em seus olhos. Suas bochechas ficam pálidas e
seus lábios se abrem. Por um momento, ela apenas me encara. Pela
reação dela, fica claro que nunca falou com ninguém sobre isso, não
no sentido de cura, pelo menos.
— Para quem você contou?
Ela engole. — Foi há muito tempo...
Eu puxo suavemente seu cabelo. — Não foi isso que perguntei.
Para quem você contou?
— Meu... meu... ninguém.
— Me deixe reformular isso para você. Quem sabe ou sabia?
— Minha família.
— Quem na sua família?
— Minha mãe, meu pai e meu irmão.
— Ninguém mais?
Ela balança a cabeça.
— Eles não obrigaram você a
ir ao médico, à polícia, a um
terapeuta?
— Minha mãe me deu a pílula do dia seguinte.
Eu já sei por quê. Sua família teria tentado enterrar
a vergonha. O que preciso são detalhes para rastrear o
filho da puta.
— Comece me dizendo onde você estava quando
tudo aconteceu.
Um soluço escapa de sua garganta. — Eu não
quero voltar lá.
Eu solto meus dedos em seu cabelo e arrasto eles
para baixo nas longas mechas. — Estou aqui por você,
querida. Você não vai passar por isso sozinha.
— Eu não posso fazer isso.
Ela tenta se levantar, mas eu a empurro para
baixo. Se eu pudesse descobrir a verdade sem
colocar ela nisso, eu o faria, mas estou em um
beco sem saída.
— Você não tem que entrar em detalhes. Pense nisso como um
filme. Olhe de fora. Volte para as cenas e me diga onde você estava.
— Gabriel, não. — Ela fica de joelhos e agarra minhas coxas. —
Por favor, eu te imploro.
Eu quase vacilo. Valentina de joelhos na minha frente,
implorando, é mais do que eu posso suportar, mas ela precisa se
curar, ou nunca estará livre. O homem que roubou sua virgindade
sempre possuirá um pedaço dela, contanto que ela o mantenha
engarrafado, e o filho da puta não merece sua paz de espírito ou
dor. Eu pressiono seu rosto no meu colo, correndo meus dedos por
seus cabelos.
Me fortalecendo, digo em uma voz terna. — Comece do início.
Ela esfrega a bochecha na minha coxa. Uma grande lágrima rola
sob seus longos cílios, a umidade penetrando no tecido da minha
calça. Ela lambe os lábios e os abre e fecha duas vezes antes de dizer
uma palavra.
— Mamãe me mandou levar o jantar do papai. Ele estava
trabalhando até tarde.
— Onde?
— Na loja.
— Estava escuro?
Ela pensa um pouco. —
Ainda estava claro. Acho que era
antes das seis, porque era logo depois da novela da
tarde.
— Bom. Continue.
Ela engole novamente. — Um carro parou.
— Que tipo de carro?
Seu corpo inteiro fica rígido. — Não me lembro.
— Não sinta, querida. Apenas me diga quem
dirigia o carro.
— Eu... eu não sei. Eu só sei que eles eram velhos.
Eles? Ela disse que apenas um homem a
estuprou. — Quantos?
— Cinco. Seis. Eu acho que seis. Eu estava
assustada. Não queria olhar para eles. Eu mantive
meus olhos no chão.
— Não sinta. — Eu passo meu polegar sobre as lágrimas que
escorrem por sua bochecha. — O que eles disseram?
— Não consigo me lembrar. Acho que não falaram muito. Um
agarrou meu braço. A caixinha para o papai caiu no chão. Seus
sanduíches caíram. Lembro de pensar como ele ficaria com raiva se
houvesse areia neles.
— Vá em frente, — eu digo quando ela fica quieta, esfregando
minha mão para cima e para baixo em suas costas.
— Eles riram. Eles riram muito.
A raiva ferve em mim. Tenho vontade de quebrar alguma coisa.
— Eles me levaram.
— Onde?
Ela pisca. — Eu não sei.
— Eles te levaram de carro? Eles fizeram você entrar?
— Não. Eles me arrastaram para dentro do prédio. Um bar.
— Você consegue se lembrar do nome?
— Eu não vi.
Se ela andava, não era longe de onde ela morava. — Talvez você
tenha visto quando passou por lá mais tarde.
— Nunca mais andei por aquela estrada.
— Como era o interior?
— Estava
escuro. Fumaça. Cheirava a
fumaça de cigarro. Havia um balcão e bancos de
bar, e um letreiro em néon acima do espelho, eu
acho. Havia uma sala nos fundos com uma mesa de
sinuca.
— Havia outras pessoas dentro?
— Um homem atrás do bar. Lembro dele porque
gritei por socorro, mas ele se afastou.
— Como ele era?
— Gordo. Careca. Isso... isso é tudo que eu
lembro.
— Você está indo bem, querida. Para onde eles te
levaram?
Ela começa a tremer, seu corpo frágil
tremendo entre meus joelhos. — Nos fundos.
— É um filme. Isso não está acontecendo
com você. Você consegue ver?
— Eles arrancaram minhas roupas e me seguraram.
Suficiente. Eu não aguento, mas também não posso deixar para
lá. — Como ele era?
— Eu mantive meus olhos fechados. Não pude ver.
— Só um?
— Sim, — diz ela humildemente.
Eu mordo de volta minha fúria. — O que aconteceu depois?
— Eles me deixaram.
— Como você chegou em casa?
— Eu acordei em um beco. Estava escuro.
— Você acordou?
— Eles me bateram. Devo ter desmaiado.
Deus me ajude, vou arrancar seus membros de seus corpos e
fazer eles engolirem seus pênis antes de esfolá-los vivos.
— Eu tentei andar, mas eu estava machucada e sangrando. Não
fui muito longe. É onde meu irmão me encontrou. Quando não
cheguei em casa, minha mãe ficou preocupada. Ela ligou para meu
pai. Eles começaram a procurar.
— Ele te levou para casa?
Ela acena com a cabeça, exalando uma respiração
instável. — Mamãe tratou minhas
feridas. Fiquei em casa até os
hematomas desaparecerem. Meu
pai disse que encontraria os homens responsáveis.
— Ele fez?
— Eu não sei. Eu não queria lembrar. Eu não queria
perguntar.
— Você consegue se lembrar da data, Valentina?
— Treze de fevereiro.
Dois meses depois, seu pai morreu em um
acidente de carro e seu irmão sofreu danos
cerebrais. A máfia que deveria ser sua família os
rejeitou, e aqui está ela, de joelhos na minha frente. Eu
coloco minhas mãos sob seus braços e a coloco no meu
colo, embalando sua cabeça contra meu peito.
— Eles vão pagar.
A tensão diminui um pouco em seu pequeno
corpo enquanto ela se senta em meus braços,
me permitindo acalmá-la e mantê-la segura.
Eu beijo o topo de sua cabeça. — Eu não vou deixar ninguém te
machucar, de novo.
Pela primeira vez na vida, não tenho desejo além de abraçar e
segurar uma mulher em meus braços. Há uma satisfação maior do
que a sensação do sexo em dar-lhe força e proteção. Melhor ainda é
que ela me permite cuidar dela, ser o homem para ela que ainda não
poderia ser para nenhuma mulher.
Ficamos sentados assim por muito tempo. Meu único desejo é
carregar ela para cima e deitá-la na minha cama, para segurá-la até
o amanhecer, mas são quase onze horas e Carly estará em casa em
breve.
Meu pensamento está quase tranquilo quando a porta da frente
se abre e Carly voa por ela, soluços e lágrimas seguindo em seu rastro
enquanto ela corre pela entrada e sobe as escadas. Valentina se
empurra de meus braços. Ela sai correndo do meu colo tão rápido
quanto estou tentando ficar de pé com minha perna inútil. Ela me
olha com os olhos arregalados, a preocupação gravada em seu rosto.
— Ela não nos viu, — eu digo.
Tenho que deixar Valentina para ir atrás da minha
filha. Se o idiota de um lindo universitário a tocou, ele terá
o que merece. No patamar, ouço
sua porta bater. Meu quadril
dói enquanto corro para o quarto
dela.
— Carly? — Eu chamo, batendo na porta.
— Vá embora.
Eu tento a maçaneta. Está trancada. Seus soluços
me alcançam através da madeira.
— Abra a porta, Carly.
— Eu disse vá embora!
— Se você não abrir esta porta agora, vou
derrubá-la.
— Eu não me importo. Eu não dou a mínima.
— Carly! — Estou mais preocupado do que com
raiva, mas é a raiva que soa na minha voz. — Você
tem três segundos.
— Vá para o inferno.
É isso aí. Dou alguns passos para trás e
fico pronto para atacar. Estou prestes a jogar
meu peso contra a porta quando Valentina vem correndo escada
acima.
— Gabriel! — Ela agarra meu braço. — O que você está fazendo?
— Fique fora disso.
— Você vai assustar ela.
É o apelo em seus olhos que me faz parar. Não quero assustar
Carly, mas meus instintos paternais estão em alta.
Eu arrasto minhas mãos pelo meu cabelo. — Algo está errado.
Minha preocupação está refletida no rosto de Valentina. Talvez
seja o assunto que discutimos antes da entrada turbulenta de Carly,
mas estamos pensando a mesma coisa.
Valentina vai até a porta e bate suavemente nela. — Carly? Você
está bem? Seu pai está realmente preocupado com você. Por favor,
saia e converse com ele antes que ele faça algo estúpido.
Um soluço e uma risada bufada vêm de dentro.
Riso é bom. O que quer que tenha acontecido não pode ser tão
ruim.
— Não estou com vontade de limpar a bagunça que ele está
prestes a fazer, — continua Valentina, — sem falar em
enfrentar sua avó quando ele a acordar com o barulho.
A menção de Magda faz
isso. Passos se aproximam da
porta. A chave gira. A porta se
abre em uma fresta e o rosto coberto de lágrimas de
Carly aparece ao redor da moldura, rímel preto
manchado sob seus olhos e seu cabelo uma
bagunça. Tenho que cerrar os dentes, as mãos e os
músculos para não abrir a porta e marchar para o
quarto dela.
Carly funga e olha entre Valentina e eu. — Não
quero falar sobre isso, pai. Vai para a cama.
— Não até você me dizer o que está errado.
— Nada.
Eu aceno para o rosto dela. — Isso não parece
nada.
— Você não vai entender!
É em horas como essas que odeio Sylvia com
uma ferocidade injusta por nos abandonar. —
Vou tentar o meu melhor.
— Não, obrigada. — Ela acrescenta sarcasticamente. — Posso
dormir agora?
— Bem. Vou ter que dirigir até a casa de Sebastian.
— Papai! — Novas lágrimas surgiram em seus olhos.
Não suporto ver suas lágrimas. Seguindo em frente, eu seguro
meus braços abertos para um abraço, mas ela dá um passo para trás
e começa a fechar a porta. Só quando eu paro no meio do caminho
ela solta a porta.
— Posso falar com você, Valentina?
Valentina me lança um olhar. Eu aceno para ela ir em frente.
Estou desesperado. Vou usar todas as medidas para fazer Carly se
abrir.
— Claro. — Valentina balança a cabeça. — Quer conversar em
seu quarto?
Carly a pega pelo braço e a arrasta para dentro, a porta se
fechando atrás delas.
Por que estou cercado por mulheres que estão empenhadas em
tornar minha vida difícil? Vou para o meu escritório e ativo o sistema
de segurança. Para a segurança da minha família, todos os
cômodos da casa estão equipados com microfones
ocultos. Nunca se sabe. É menos
do que honroso escutar a
conversa de minha filha com
Valentina, mas só um pai vai entender como me
sinto. Sirvo um uísque e me sento atrás da minha mesa.
A voz de Carly vem pelo alto-falante. — Tivemos uma
briga.
— Oh, Carly. Sinto muito, querida. Brigas
acontecem, você sabe.
— Não esse tipo de briga.
— Ele foi mal com você?
— Não exatamente. Na verdade, ele foi muito
educado. Eu simplesmente não entendo. Eu não
entendo caras.
— O que ele fez para te chatear?
— Ele terminou comigo.
— Oh. Eu não sabia que você estava
namorando firme.
— Ele me pediu no nosso primeiro encontro.
— Então ele termina algumas semanas depois?
— Ele conheceu outra pessoa. Me traiu. Ele mentiu para mim.
— Isso deve doer muito.
— Ele diz que eu sou muito feminina para ele. Estou tão
humilhada. Eu o odeio.
— Você não deveria olhar assim. Alguém que não gosta de você
pelo que você é não é nada para se humilhar.
— Ele é um idiota de primeira classe. Ele está namorando
Tammy Marais.
— Não conheço Tammy, mas sei que você é linda e inteligente.
Você também ainda é muito jovem. Há muito tempo para você
conhecer o homem certo.
— Como você sabe que vou encontrar alguém? E se não houver
ninguém lá fora para mim?
— Há muitos homens bons por aí.
— Como posso ter certeza de que eles gostarão de mim?
— Sendo você mesma.
— Você teve muitos namorados? Você tem um
agora?
— Eu não namorei.
— Por que não? Você não
gosta de homens?
— Estava ocupada. Tinha meus estudos e um
emprego.
— Você sente muito agora que está velha?
Valentina ri baixinho. — Eu não sou tão velha.
— Não é? Desculpa?
— Às vezes não adianta chorar por coisas que
não podemos mudar.
— Eu o quero de volta, Valentina. Me diga o que
fazer.
— Você quer minha opinião? Ele não merece ter
você de volta.
— Se você não tem experiência com homens,
como posso saber se posso confiar em seus
conselhos?
— Você não tem que confiar em mim. Confie em si mesma.
Tenho certeza de que você sabe que vale mais do que mentiras e
enganos.
— Você está certa. Eu valho mais do que Tammy Cabelo de Rato.
— E as jovens elegantes não são desagradáveis.
Carly ri. — Você não é engraçada. Eu não posso fofocar com
você.
— Vê? Você já está se sentindo melhor.
— Acho que sim. Obrigada por... uh... colocar as coisas em
perspectiva.
— Não se preocupe. Que tal chocolate quente com
marshmallows?
— Minha mãe não vai aprovar.
— Chocolate quente sem marshmallows?
— Suponho que sim, desde que não me faça ganhar peso.
— Você é magra. Não precisa se preocupar com um chocolate
quente.
— Certo. Você vai trazer para o meu quarto?
— Só se você for dizer boa noite ao seu pai. Ele está
preocupado porque te ama.
— Eu sei. É que... não posso
falar com ele sobre
namorados. Ele vai ficar chateado.
— Diga a ele como você se sente. Se ele
entender, será mais paciente.
— Você vai falar com ele por mim, como fez para eu
sair com Sebastian?
— Eu acho que você pode lidar com ele sozinha.
— Obrigada, Val.
— De nada. Vá ver seu pai. Vou deixar o seu
chocolate na sua mesa de cabeceira.
Cortei o link de segurança e juntei minhas
mãos. Valentina estava certa o tempo todo. Não era
necessário fazer barulho sobre Carly sair com
Sebastian. O problema cuidou de si
mesmo. Valentina foi bem com Carly esta noite. Eu
confiaria minha única filha com ela qualquer dia.
15
Valentina

DEPOIS QUE EU ME ABRI com Gabriel sobre o meu estupro,


ele se tornou mais possessivo do que nunca, mas também tirou um
peso dos meus ombros. O conselho dos meus pais era fingir que
aquele dia nunca aconteceu e, até Gabriel, ninguém sabia
exatamente o que aconteceu. Minha mãe não queria ouvir os
detalhes. Ela queria me poupar da dor de reviver isso. Eu teria
confiado em Charlie, mas não tive chance. Depois do meu ataque,
meus pais fizeram tudo ao seu alcance para me agradar. Quando eu
disse que sentia vontade de comer um bolo de chocolate, meu pai
colocou Charlie e eu no carro, e então aconteceu o acidente que
mudou nossas vidas para sempre.
Gabriel me chama para seu escritório todas as noites depois do
jantar. Sento-me a seus pés com a cabeça em sua coxa enquanto ele
lê e comenta minhas tarefas ou assiste ao noticiário enquanto
acaricia meu cabelo. Depois, ele me leva dependendo de
como interpreta minhas necessidades e
humor. Às vezes é suave e às
vezes, forte. Eu me deleito com
tudo o que ele me dá, precisando de seu
corpo com uma intensidade que não diminui, não
importa quantas vezes por noite ele me faça gozar.
As coisas estão melhorando na minha vida. Desde
que Carly me contou sobre seu rompimento com
Sebastian, nosso relacionamento é mais
amigável. Aletta disse que se eu entregar minhas
tarefas, ela vai segurar meu cancelamento do estudo,
me dando uma segunda chance no meu sonho. Eu
ainda posso ser outra coisa que não uma empregada
doméstica depois de nove anos. Com a bolsa, tenho
mais dinheiro para gastar com Charlie e Kris. Posso
até levá-los para almoçar no domingo. Escolho um
restaurante em Rosebank, perto de El Toro, uma
delicatessen onde Marie comprava chorizo5 espanhol. Magda pediu
que eu fizesse paella6 na segunda-feira, e ela só come essa marca de
linguiça no prato. Já que El Toro não faz entregas, eu lucro pegando
meu pedido enquanto estrago Kris e Charlie.
Pegamos uma mesa no terraço do Roma's e pedimos espaguete
com vieiras em creme de manjericão. Charlie está trabalhando em
seu segundo carro alegórico da Coca Cola. Seus olhos brilham e suas
bochechas têm uma cor saudável. Ele até perdeu um pouco da
flacidez da cintura.
— A mudança nele é notável, Kris.
Ela toma um gole de seu vinho. — Ele é um bom passeador de
cães. Além disso, isso me economiza muito tempo.
— Fico feliz em ver ele assim. Eu gostaria de poder fazer mais.
— Então, o que há com o almoço? — Ela pergunta depois de
comermos, direta como sempre.
— Tenho boas notícias. A universidade me concedeu uma bolsa
integral.
— Achei que você tivesse desistido.
— Sim, mas Gabriel disse que Marie deveria voltar
ao trabalho logo. Terei tempo para estudar novamente e,
com a bolsa integral, não
precisarei me preocupar com o
déficit.
Inclinando para trás, ela cruza os braços. — O
que está acontecendo com ele, Val?
— Nada. — Pego meu guardanapo, arrancando
pequenos pedaços. —Por quê?
Não posso contar a ninguém o que acontece
atrás das portas fechadas da casa de
Gabriel. Principalmente Kris. Ela não vai entender.
Inferno, às vezes eu não entendo.

5 O chouriço ou chouriça é um enchido


preparado com carne, gordura e algumas vezes
sangue de porco, com temperos que variam
consoante a região, havendo alguns que têm
‘Origem Geográfica Protegida.’
6 A paella, é um prato à base de arroz, típico

da gastronomia valenciana — daí que em


Portugal seja comumente conhecido como arroz
à valenciana e no Brasil como paella valenciana
— Ele tem estado no consultório.
Eu paro. — Por quê?
— Para comprar comida de cachorro e gato, aparentemente. Ele
tem uma ordem permanente.
— Ele não me disse.
— Você está dormindo com ele, não é?
Eu levanto minha cabeça e olho para Charlie, mas ele está
absorto em sua bebida. Não posso mentir na cara dela, então não
digo nada.
— Ele é um agiota e você está em dívida com ele por nove anos.
Quer saber o que eu acho? Eu acho que você é seu brinquedo sexual.
Seu brinquedo favorito. No momento, ele veste você, sim, eu vi os
pacotes que carregou para minha casa e ele cobre suas contas. Ei,
eu não estou reclamando. Eu preciso do negócio. Tudo o que estou
dizendo é que não se apaixone por ele.
Desvio o olhar para onde uma mãe e um pai estão almoçando
com uma garotinha fofa. — Não é desse jeito.
— Então, como é? Você está desfilando para ele em uma
fantasia de empregada doméstica francesa? Essa é a
fantasia dele?
Eu dou a ela um olhar
castigador. — Pare com isso.
— Todo garoto eventualmente
se cansa de seus brinquedos, até mesmo de seus
brinquedos favoritos.
— Eu não tenho escolha, — eu digo em voz baixa. —
Ele não é tão ruim, Kris. Acho que ele se esforça muito
para me tratar bem.
Ela se inclina para frente. — Ele é um maldito
assassino. Um criminoso. The Breaker, Val. Você
precisa que eu te lembre de como ele mata pessoas?
— Não.
— Não o adoce porque ele é bom para você. Nunca
se esqueça de quem ele é. Mais importante, nunca se
esqueça de quem você é e o que você é para ele.
— O que eu sou?
— Reembolso da dívida. Você é uma
escrava.
— Chame do que quiser, mas eu fiz um acordo para salvar a
vida de Charlie. Vou ser uma escrava, uma prostituta, arrebentar
minha bunda e trabalhar meus dedos até os ossos para manter ele
seguro.
— E a sua vida?
Kris não conhece minha história. Ela não sabe como Charlie me
pegou na sarjeta, surrada e largada para morrer, e me carregou para
casa por mais de três quilômetros. Ela não sabe que ele se sentou ao
lado da minha cama e segurou minha mão todas as noites depois do
meu ataque, quando eu estava com muito medo de fechar os olhos
para dormir.
— Eu fiz uma escolha, Kris. Fiz uma promessa a Gabriel Louw.
Você não quebra suas promessas a Gabriel. Dá um tempo, sim?
Estou fazendo o melhor que posso.
— Jesus, Val. Se este for o seu melhor, está entrando para um
grupo fodido. Você cortou seu dedo, pelo amor de Deus. — Ela limpa
a testa com a mão. — Como isso vai acabar?
— Depois de nove anos, eu vou embora, arrumo um emprego,
uma bela casa para mim e Charlie, e saio do seu caminho.
— Você não está no meu caminho, garota, mas eu
me preocupo com você.
— Eu sei. — Empurro
minha cadeira para trás,
precisando desesperadamente de ar. — Vou levar
Charlie para dar uma volta.
— Vou pedir a sobremesa. Tiramisu?
— Parece bom. Vamos, Charlie. — Pego o braço de
meu irmão e atravesso a Praça Rosebank para
passear pela passarela que passa pelas fachadas das
lojas. Charlie para e olha para cada janela. Não é
tanto dos objetos que ele gosta quanto das cores.
— Charlie?
Ele aponta para uma bicicleta vermelha na loja de
esportes. — Ol-olha.
— O que? — Eu quero que ele diga. Eu quero
saber o que está acontecendo em sua cabeça.
— Bo-bonita.
— O que é bonito?
— O-olha. — Ele aponta novamente, ficando frustrado.
— A bicicleta?
Ele já moveu, preso na frente de uma prateleira de capacetes de
ciclismo coloridos.
— Go-gosto.
— Qual?
Ele gira os ombros como faz quando fica irritado e segue em
frente no caminho em um ritmo acelerado.
Eu corro para alcançar ele, pegando sua mão. —Você se lembra
de como costumava me levar da escola para casa?
Ele corre em direção à rua. Depois que Charlie está em uma
missão, é difícil distrair ele. Ele joga todo o seu peso em uma tarefa
e não vai parar até que tenha realizado o que se propôs a fazer. Estou
ansiando pela conexão que já tivemos. Estou louca para ter meu
irmão de volta, para devolver ele a si mesmo, mas ele está em seu
próprio mundo e às vezes me pergunto se sou parte dele.
Paramos em frente a uma Ferrari vermelha estacionada no
meio-fio. Isso é o que atraiu sua atenção. Quando ele estende a mão
para tocar a carroceria brilhante, eu pego de volta.
— Não toque no carro. O que eu disse sobre tocar em
coisas que não são nossas?
— Tudo bem, — diz uma
voz masculina.
Eu giro ao redor de onde a voz vem. O homem
à nossa frente tem cabelos loiros e um rosto bronzeado
com olhos verdes amigáveis.
— Você pode tocar se quiser, — ele diz a Charlie. —
É meu.
O homem é tão bonito quanto seu carro. É o tipo
de beleza pecaminosa que fará uma mulher esquecer
seu companheiro em uma festa.
Eu puxo a mão de Charlie. — Nós devemos ir.
— Posso dar uma volta com ele, se quiser.
— Vol-volta.
— Uh, obrigada, — coloco meu cabelo atrás da
orelha, — mas minha amiga está esperando por nós.
— Pena. — Ele estende a mão. — Eu sou
Michael.
Estendo a mão hesitantemente, mas antes que eu possa me
decidir, ele envolve sua palma larga em volta da minha e aperta.
Quando não digo nada, ele me dá um sorriso divertido.
— Seu nome?
— Valentina.
— Isso é bonito. — Ele me solta e aperta a mão de Charlie. —
Você tem bom gosto, hein... — Ele levanta uma sobrancelha e espera.
— Charlie, — eu digo.
— Prazer em conhecê-los. Talvez possamos conversar sobre esse
passeio. Se você me der seu número, posso ligar quando for
conveniente.
— Nossa sobremesa está pronta. — A palavra 'sobremesa' vai
chamar a atenção de Charlie. — Obrigada mesmo assim.
Charlie me deixa levá-lo de volta pela praça até nossa mesa.
— Quem é aquele? — Kris pergunta.
— Eu não sei. Charlie gostou do carro dele.
— Idem. — Ela acena com a colher para o prato na minha
frente. —Coma. É delicioso.

É DIFÍCIL DIZER ADEUS


A Charlie. Pelo menos ele parece
feliz. Eu deixei esse pensamento me acalmar
enquanto atravesso a rua para onde o Jaguar de Gabriel
espera. É Rhett quem sai.
— Oi, — eu digo, surpresa. Gabriel disse que me
buscaria.
— Gabriel está ocupado, — ele diz com uma
piscadela, segurando a porta para mim.
Espero até entrarmos no trânsito para
perguntar. — Onde ele está?
— Negócios.
Um arrepio me percorre. Ele está quebrando os
ossos de alguém? Matando alguém?
Rhett me lança um olhar de soslaio. — É
melhor não perguntar.
— Eu não ia. — Eu olho pela janela para
escapar de seus olhos penetrantes.
— O lado positivo, — continua ele, — podemos treinar.
Eu volto para ele rapidamente. — Mesmo?
— Ele estará ocupado até tarde.
Meu humor melhora. Tenho que aprender a me controlar.
Gabriel não estará lá para me proteger para sempre. Como Kris
disse, ele pode se cansar de seu novo brinquedo mais cedo ou mais
tarde.
Rhett muda de marcha e acelera quando chegamos à rodovia. —
Por que a cara triste? Seu irmão está bem?
— Sim. — Tento sorrir, mas é um esforço fraco.
Não falamos pelo resto do caminho. Em casa, coloco meu short
e camiseta e me encontro com Rhett na academia. É estranho estar
aqui por minha própria vontade. A academia representa um lugar de
dor erótica e prazer profundo para mim. Meu corpo reage com o
pensamento, enviando umidade para minhas dobras. Eu balanço
minha cabeça e sacudo meus dedos, expelindo fisicamente a
excitação indesejável com a memória do que Gabriel faz comigo aqui.
— Pronta? — Rhett anda em volta de mim como um boxeador
medindo seu oponente.
— Me dê o seu pior.
Ele ri. — Você é engraçada.
Eu ataco e dou um soco
no estômago dele. — Gostou
disso?
Meus dedos doem, e ele nem mesmo recua. Antes
que eu saiba o que está acontecendo, ele chuta meus pés
debaixo de mim com um balanço rápido de sua perna, me
fazendo cair de bunda com um zumbido.
— Este movimento é brincadeira de criança,
peitos empinados. Você tem um longo caminho a
percorrer antes que possa lidar com o meu pior.
— Tudo bem, pau curto. — Eu estendo minha
mão para ele me ajudar a levantar.
Ele apenas ri do nome diminutivo. Quando ele
está na metade do movimento de me puxar para
cima, eu o puxo com força, usando o impulso para
derrubá-lo no chão. Ele gira os ombros
graciosamente e vira a perna por cima de mim,
me prendendo de bruços no tapete.
Ele ri. — Você tem espírito, tenho que admitir, peitos
empinados.
— Vai se foder, pau curto.
— Quer ver? Você vai retirar suas palavras.
— Não, obrigada. Chutar suas bolas quando suas calças estão
em volta dos tornozelos não será um jogo justo.
Ele ri novamente. — Sim, você é engraçada. — Ele se levanta e
me puxa pelo braço. — Vamos começar com alguns movimentos
básicos de defesa e, quando você pegar o jeito deles, vou te ensinar
como usar a força de um atacante para derrotar ele.
No minuto em que estou de pé, chuto seus pés como ele fez
comigo, mas ele agarra minha perna, me mantendo presa.
— Você aprende rápido e tem mais coragem do que cérebro, mas
me deixe ensinar. Eu não quero te machucar.
Eu pulo em um pé para manter o equilíbrio. — Vai ser preciso
mais do que isso.
— Como eu disse, mais coragem do que inteligência. Você é
pequena. Tem que aprender a lutar contra o inimigo.
— Tudo bem.
Ele me solta. — Pronta?
Pela próxima hora, ele me
treina. Quando ele termina o
dia, estou suando.
— É melhor você tomar um banho. Gabriel
estará em casa em breve.
— Também quero aprender a usar uma arma.
Ele apoia as mãos nos quadris e me olha por baixo
das sobrancelhas. — Valentina.
— É um mundo grande e ruim lá fora. Não vou
morar aqui para sempre.
Depois de um momento, ele suspira e balança a
cabeça. — Ganhou uma mão e quer um braço.
Estou feliz com meu progresso. Finalmente, estou
saindo da minha bolha vulnerável. Há apenas tempo
suficiente para tomar banho antes de Gabriel entrar
no meu quarto.
Ele se aproxima e para nas minhas
costas. — Como foi o seu final de semana?
— Bom.
Ele empurra meu cabelo de lado e beija meu pescoço. —Vamos
dar um jantar em casa na terça. Vai ser uma noite longa.
— Tudo bem. Você tem um menu em mente?
— Magda irá te informar. É importante para ela. — Ele não
precisa dizer mais nada. Ele me quer no meu melhor
comportamento. — Não se esqueça do seu check-up amanhã.
Eu trato a ferida religiosamente, mas ainda está vermelha e
inchada.
Ele coloca os braços em volta da minha cintura e puxa minhas
costas contra seu peito. — Se curve e coloque as mãos na parede.
Seu tom é cortante, como quando ele está desesperado e mal
pode esperar. Meu corpo fica deliciosamente quente e úmido. Eu
curvo minhas costas e me apoio na parede. Ele levanta minha saia
pela cintura e puxa minha calcinha para baixo. O barulho do metal
de seu cinto soa no quarto, seguido pelo puxão áspero de seu zíper.
Seu pau empurra contra minhas dobras. Sem aviso, ele mergulha
para a frente, me empalando com força. Minhas costas arqueiam com
o atrito.
— Porra, Valentina. — Ele fica parado, ou para dar
tempo ao meu corpo para se esticar ao redor de seu pau
muito grande ou para conseguir
controlar seu corpo.
— Me leve como você quiser,
— eu ofego, incapaz de ficar parada por muito mais
tempo.
— Oh eu vou.
Agarrando meus quadris entre as palmas das mãos,
ele puxa quase todo o caminho e bate de volta. Prazer
ondula pelo meu útero. Ele não perde tempo em me
levar ao clímax, me fodendo forte. Quando eu gozo, é
explosivo, mas sua libertação também. Ele grunhe e
resmunga até que seu pau está muito mole para ficar
dentro de mim. Só quando seu eixo escorrega, ele fica
de joelhos e chupa meu clitóris em sua boca. É
impossível gozar tão cedo, mas ele é implacável. Ele
tem os dentes no meu clitóris e os dedos na minha
boceta e bunda. Nossos sons se misturam até que
haja apenas uma mistura única de nossos
gemidos no quarto. Ele me faz gozar novamente
em sua boca, me levando ao limite do prazer. Minhas pernas não
suportam meu peso. Quando eu desabo, ele me pega pela cintura e
me carrega para a cama. Me segura até que esteja escuro lá fora, e
então ele me fode nas minhas costas e em minhas mãos e joelhos até
minha garganta ficar rouca de tanto gritar. Meu corpo está esgotado.
Não posso dar mais a ele, mas quero mais dele. Eu sou insaciável e
ele é o culpado.
Meu coração dói com algo que não consigo nomear quando ele
me deixa. Eu fico deitada no escuro até não poder mais suportar. Só
há uma coisa a fazer. Eu me esgueiro pela casa escura para o quarto
dele. Ele está parado no batente da porta, esperando, como se
esperasse por mim. Pulo em seus braços, eu me apego a ele. Eu sou
uma estranha para mim mesma, não entendendo esta mulher que
não consegue respirar sem seu captor. Ele envolve seus braços em
volta da minha bunda para me segurar e me beija longa e docemente.
Gentilmente, ele me deita na cama, me puxando contra seu peito. Só
então, segura e feliz, caio no sono exausto.

A CONSULTA DO MÉDICO é
às quatro do dia
seguinte. Enquanto me arrumo,
Gabriel me chama pelo interfone interno e me
chama ao seu quarto. Se não partirmos logo chegaremos
atrasados. Por que ele quer me ver agora? Antes que eu
possa bater, ele abre a porta. Eu congelo com minha mão
no meio do caminho. Um lençol descartável está
estendido sobre a espreguiçadeira e uma maca com
monitores e scanners está ao lado dela. O mesmo
médico de antes, Samuel Engelbrecht, espera no
quarto. Eu olho para Gabriel em busca de respostas,
mas ele não diz nada. Apenas me puxa para dentro e
fecha a porta.
— Tire a roupa e se deite, — diz o médico.
Achei que iria ver o médico que me operou na
clínica, e o que o médico de Gabriel exige não faz
sentido. — Você precisa que eu tire a roupa
para examinar meu dedo?
Gabriel pega minha mão. — Depois do que você me disse, quero
ter certeza de que você está bem. Você pode ter sofrido ferimentos
internos que não conhece.
Um rubor sobe pelo meu pescoço, aquecendo minhas
bochechas. — Por que você não me contou?
— Eu não queria te estressar.
Eu puxo minha mão da dele. — Isso não é necessário.
Seus olhos ficam duros. — Tire suas roupas ou eu vou tirá-las
para você.
Estou tão humilhada que não sei para onde olhar. Não tenho
dúvidas por um minuto que Gabriel executará sua ameaça. Lágrimas
de raiva queimam em meus olhos enquanto eu viro as costas para
eles e tiro meu tênis, uniforme e calcinha. Colocando minhas roupas
no braço da cadeira, me deito na espreguiçadeira.
O médico se aproxima com uma sonda. — Dobre as pernas.
Eu faço isso de má vontade, evitando os olhos de Gabriel. O
médico puxa um preservativo sobre a sonda, lubrifica com gel e o
insere suavemente na minha vagina. O scanner ganha vida. Ele não
diz nada enquanto me examina. Apenas dá um aceno de
cabeça para Gabriel quando ele puxa a sonda. Meu
abdômen é o próximo. Não tenho
certeza do que ele está
procurando, e não consigo
imaginar por que Gabriel quer saber se o estupro
danificou meu corpo. Depois do ultrassom, o médico
mede minha pressão e me pesa. É quando ele traz uma
agulha no meu braço que começo a protestar novamente.
— O que é isso?
Gabriel pega meu pulso, passando o polegar
sobre o local. — É um reforço de vitaminas.
— Eu não preciso disso.
— Já te disse, a sua saúde é da minha
responsabilidade.
Há uma nota de aço em sua voz. Ele vai me
segurar se for preciso. Não tenho escolha a não ser
aceitar a injeção e o que quer que esteja nela.
Terminada a injeção, o médico deixa que eu
me vista e faz eu me sentar na cama para
examinar meu dedo. Seu rosto está em branco, mas ele encara o
ferimento por um longo tempo.
— Vou prescrever um antibiótico mais forte. Eu quero ver você
todos os dias.
— O que há de errado?
— Uma pequena infecção, — diz ele, como se estivesse falando
com uma criança. — Você tem que o manter quieto. Não use a mão.
Fiz um curativo bem apertado quando lutei com Rhett e
tomamos cuidado. Também sou cautelosa com o trabalho doméstico.
O médico olha para Gabriel. — Alguma chance de você manter
ela imóvel por algumas semanas?
A rigidez da mandíbula de Gabriel é suficiente para nos dar a
resposta. Magda nunca vai deixar isso.
— Bem então. — O médico começa a reunir seu equipamento. —
Amanhã à mesma hora?
— Sim, — diz Gabriel.
Quando ele sai, eu reúno coragem para confrontar Gabriel. —
Por quê?
— Não me faça repetir as respostas que já dei a você.
— Ele não vai levar seu aparelho? — Eu aponto para
o carrinho com os monitores.
— Vai ficar aqui por um
tempo.
— O que você está fazendo, Gabriel?
Ele segura minha bochecha. — Cuidando de você.
Quando ele puxa minha cabeça para seu peito, não
consigo resistir. Eu só posso derreter contra ele, deixando
seu batimento cardíaco irregular me seduzir a pensar
que ele realmente se preocupa com mais do que meu
corpo.

PELO CUIDADOSO PLANEJAMENTO do cardápio,


é óbvio que o jantar de terça-feira à noite é importante
para Magda. Ela escolhe uma entrada de mousse de
caviar seguida de crumble de salmão e espinafre
com pastéis doces de sobremesa. Presto atenção
especial à culinária, garantindo que não faço
nada que prejudique nosso negócio. Eu torço
meu cabelo em um coque elegante na nuca e esfrego minhas unhas,
que estão manchadas de laranja por causa do curry com que
costumo cozinhar. A musse acaba de assentar quando Magda toca a
campainha para eu servir. Equilibrando uma bandeja em uma das
mãos, empurro a porta de vaivém da sala de jantar com o
ombro. Olhando para cima, eu congelo no local. O homem sentado
em frente a Gabriel é o de Rosebank, o que estava com a Ferrari. Ao
lado dele está uma linda ruiva com sardas no nariz.
— Valentina! — Michael pula de pé e segura a porta para eu
passar.
Gabriel fica rígido. A boca de Magda desce, seus olhos de Pit
Bull caindo nos cantos.
— Vocês já se conhecem? — Gabriel pergunta, seus olhos azul-
gelo se estreitam em mim.
— Nós nos conhecemos no domingo. — Michael se senta
novamente. — Ela não quis me dar o número dela. — Ele pega a mão
da ruiva e sorri. — Parece que a fada madrinha do destino ainda está
fazendo seu trabalho.
— Valentina não está disponível, — Gabriel responde
friamente. Ele se vira para mim. — Onde exatamente
vocês se conheceram?
Eu limpo minha
garganta. — Em Rosebank.
— O que você estava fazendo lá?
O que eu faço com meu tempo livre não é da conta
dele e sua atitude ciumenta é injustificada e irracional,
mas Magda ainda pode colocar uma bala na minha cabeça
por conversar nos fundos ou deixar cair uma colher,
então eu respondo obedientemente. — Fui ao El
Torro comprar o chouriço.
— Fui ao El Torro comprar uma garrafa do
vinho favorito de Magda, — diz Michael. —
Entende? Intervenção divina.
— Ela está abaixo da sua classe, — diz Magda. —
Nós a pegamos em Berea.
Ando em volta da mesa, servindo às pessoas
que falam de mim como se eu não estivesse na
sala. Eu quero despejar a musse no colo deles.
Charlie. Pense em Charlie.
— Não me importa de onde ela é, — diz a mulher. — Não somos
esnobes assim.
Ela tem uma pedra de diamante em seu dedo anelar. Deve ser a
esposa de Michael. Eles gostam de sexo a três? Não consigo sair da
sala rápido o suficiente. Na cozinha, inspiro e expiro para controlar
minha raiva. Estou farta de ser vista como um pedaço de carne.
Pelo resto do jantar, o estresse aumenta cada vez que entro na
sala de jantar. Michael fica boquiaberto enquanto sua esposa elogia
minha aparência física. Magda está com o rosto vermelho de
aborrecimento. Quem mais me assusta é o Gabriel. Ele está quieto.
Quieto nunca é bom.
Quando sirvo os pastéis na sala, meu estômago dói de tensão.
Minha esperança de escapar é esmagada quando Gabriel me chama
de volta quando estou prestes a sair.
— Valentina. — Há autoridade em sua voz. — Venha aqui.
Quatro pares de olhos estão me observando. Magda se senta em
uma única cadeira ao lado da mesinha de centro. Seu olhar é
desdenhoso e esperançoso. Ela espera que eu desobedeça. As
consequências devem ser divertidas de assistir. Michael
observa com curiosidade aberta enquanto sua esposa tem
um brilho de excitação em seus
olhos. Meu olhar se fixa no de
Gabriel. Em uma instrução
silenciosa, ele pega uma almofada da poltrona e a
joga no chão ao lado de seus pés. Eu não tenho
escolha. Caminho até ele, o aperto no meu estômago
crescendo a cada passo. Como já fiz tantas vezes antes,
me sento ao lado dele. Um sorriso de aprovação
aquece seu rosto. Ele me olha como se não visse mais
ninguém. Ele segura minha bochecha e inclina
minha cabeça para descansar em sua coxa. Então
nosso breve momento privado acabou. Gabriel
continua sua conversa de uma maneira profissional
enquanto brinca distraidamente com meu cabelo.
Magda parece um dragão inchado prestes a
cuspir fogo. Michael e sua esposa obviamente estão
acostumados a esse tipo de comportamento.
Minha postura no chão enquanto Gabriel me
acaricia não ocupa mais a atenção deles, exceto pelo ocasional olhar
de inveja que Michael dá a Gabriel.
Enquanto eles discutem um contrato de aluguel para novas
instalações comerciais, Gabriel me dá goles de champanhe. Quando
a bandeja com os pastéis doces é passada, ele se dá ao trabalho de
estudar a seleção e escolhe um mil-folhas que põe na minha boca.
Seu polegar permanece na minha língua. Depois de mastigar e
engolir, ele limpa a cobertura do canto da minha boca antes de
lamber o dedo para limpar, dando total atenção à ação. Há um
sorriso em seus olhos quando olha para mim. Mais uma vez, estamos
compartilhando um momento do qual as outras três pessoas na sala
não fazem parte.
Depois da sobremesa, ele troca o champanhe por uísque. Eu
não sou uma grande bebedora. Já zumbindo por causa do
champanhe, eu balanço minha cabeça quando ele pressiona o copo
em meus lábios, mas seus dedos apertam meu cabelo, puxando para
trás para arquear meu pescoço. Ele toma um gole do copo e leva sua
boca até a minha. Só entendo sua intenção quando ele espeta meus
lábios com a língua, forçando-os a abrir, e me dá o uísque
direto de sua boca. Eu provo e engulo em uma surpresa
chocada. Ele mantém minha
cabeça no lugar para arrastar
sua língua sobre meu lábio
inferior, lambendo-o para limpar. Só então ele solta
meu cabelo. Meu rosto está vermelho de vergonha. Se o
Sr. e a Sra. Michael acham isso chocante, eles não
demonstram. Apenas Magda se mexe em seu
assento. Quando Gabriel traz o copo aos meus lábios
pela segunda vez, eu abro sem discutir. Ser
alimentada à força na frente de sua mãe e amigos não
é uma experiência que eu gostaria de repetir. É como
se Gabriel estivesse demonstrando sua propriedade
sobre mim.
No final da noite, e três taças de champanhe e um
uísque depois, passei de um torpor para um
sentimento de embriaguez. Estou ciente do que
está acontecendo ao meu redor, mas estou vendo
dobrado e meu nariz está dormente. Também
estou extremamente letárgica. Fico grata quando Michael se levanta
e anuncia sua partida.
Ele caminha até nós. — Posso beijar a senhora, Gabriel?
Gabriel põe a mão larga em meu ombro. — Você não pode.
Ele faz uma cara de decepção fingida. — Compreendo. Eu agiria
da mesma forma se ela fosse minha. Você me faz desejar uma
submissa novamente.
— Ela não é uma submissa, — Magda morde. — Ela é
propriedade.
Michael suspira, mal lançando um olhar para Magda. Seus
olhos encontram os meus. — Melhor ainda.
Sua esposa cruza a sala para encostar a cabeça no ombro de
Michael. — Se você se cansar dela, Gabriel, nos avise. Ficarei feliz em
oferecer a ela uma posição.
— Isso não vai acontecer, — diz Gabriel através de lábios finos.
— Ela é muito valiosa para mim.
— Você quer dizer que a dívida dela é muito alta, — Magda
corrige, seu brilho comunicando algo com Gabriel que eu não
entendo.
Michael dá uma tapinha no ombro de Gabriel. —
Bem, boa noite meu bom
homem. Da próxima vez, o
jantar será em nossa casa. — Ele
me olha. — Você devia trazer a sua...
Propriedade. Brinquedo. Quatrocentos mil Rands
ativos.
— Empregada, — Magda diz.
Gabriel se levanta. — Vou te acompanhar até a
saída. — Ele se dirige a mim com um único
comando. — Fique.
Enquanto Gabriel e Magda se despedem de seus
convidados, permaneço como Gabriel
ordenou. Minha cabeça está girando, e não estou com
humor para punição esta noite. Quando eles voltam,
os ombros de Gabriel estão tensos e a boca de Magda
forma uma linha dura.
— Boa noite, Magda, — diz ele
incisivamente.
Magda não é tão facilmente descartada. — Você me
envergonhou. Não vou tolerar esse tipo de comportamento na frente
de nossos convidados.
Gabriel sorri. — Eles não pareciam envergonhados para mim.
— Vou te lembrar que esta é a minha casa.
— Você insistiu que vivêssemos aqui.
— Por razões de segurança. Há uma centena ou mais de pessoas
que teriam sua cabeça em um prato.
— De acordo. É mais fácil proteger todos nós sob o mesmo
teto. Isso não significa que você pode me dizer o que fazer. Como você
mesmo disse, não tenho mais doze anos.
Suas narinas dilatam. — Você está lidando com o que
conversamos?
— Estou.
— Quanto tempo mais?
— Em breve.
Ela o observa por um momento em silêncio. Estou meio aliviada
quando ela sai da sala. A outra metade de mim fica tensa agora que
estou sozinha com Gabriel. Seu humor está sombrio. Ele
vai me punir? Ele me oferece a mão e me põe de
pé. Minhas pernas estão rígidas
por ficar sentada na mesma
posição por horas, e eu tropeço,
esmagando seu peito.
— Desculpe, — eu murmuro. Oh Deus. Minha
língua está enrolando.
Ele me coloca de pé com as mãos nos quadris,
testando meu equilíbrio antes de me soltar. Quando
consigo ficar de pé sem cair, ele dá um passo para o
lado e aponta para a porta. Interpretando isso como
minha deixa para sair, dou alguns passos, mas tenho
que me segurar nos móveis para andar em linha
reta. Não consigo chegar ao sofá antes que suas mãos
me parem. Com um braço em volta dos meus ombros
e o outro sob os joelhos, ele me pega e me carrega
para as escadas.
— A cozinha, — protesto, apontando na
direção oposta.
Seu peito vibra com sua voz profunda. — A cozinha pode
esperar.
Na frente de seu quarto, ele se atrapalha com a maçaneta.
Quando a porta se abre, ele me carrega para dentro e a fecha com
um chute. O equipamento médico ainda está lá. Eu me pergunto
vagamente quando o médico vai mandar buscar.
Me deitando na cama, ele me despe e depois a si mesmo. Seu
corpo é duro e áspero, as linhas marcadas e profundas cicatrizes
adicionando à sua beleza masculina proibida. Ele sobe em cima de
mim, prendendo meus braços acima da minha cabeça. O álcool
afrouxa minhas inibições. Isso não é uma boa ideia. Posso fazer e
dizer coisas das quais me arrependerei pela manhã.
— Gabriel. — Seu nome saiu como um suspiro de necessidade.
—Acho que estou bêbada.
— Bom. Uma mulher bêbada nunca mente.
Ele se move para baixo e leva meu mamilo em sua boca. Eu me
arqueio, gemendo enquanto o prazer percorre meu corpo.
Ele lambe a ponta de pedra. — Você o acha atraente?
Sua língua rouca envia arrepios na minha pele. Eu
estico meu pescoço para olhar para ele. — O-O quê?
Ele lambe o outro mamilo
antes de sugar ele
profundamente em sua boca.
— Ah, meu Deus! Gabriel. — Eu caio para trás,
ofegante.
— Michael. Você o acha atraente?
Ele agarra meus pulsos com uma mão e move a outra
entre minhas pernas, separando minhas dobras e
acariciando meu clitóris. Meus quadris se levantam
para ele, mas ele remove seu toque.
— Me responda, Valentina.
Eu suspiro quando ele pressiona a ponta do
polegar no meu clitóris. — Sim. Sim, ele é muito bonito.
Seu rosto se contorce em uma mistura de dor e
aceitação, como se ele soubesse a resposta, mas
quisesse se punir ao ouvir. É uma demonstração
incomum de emoção. Ele é um livro aberto
enquanto me encara, talvez porque acredite
que estou incoerente, mas o álcool aguça
minha consciência e meus sentidos. Estranhamente, meu medo
recua para os cantos da minha mente, me deixando perceptiva a tudo
o mais, aos sentimentos que fluem entre nós e especialmente aos
seus dedos enquanto ele me toca e desliza um dedo na minha
umidade, me levando lentamente com seu dedo.
— Você gostaria que ele te fodesse?
Eu franzo a testa, tentando imaginar Michael na posição de
Gabriel. A ideia de qualquer outro homem me tocando me enche de
desgosto. —Não.
— Você pode ser honesta. Eu não vou te punir pela verdade.
Eu aperto meus músculos internos, tentando levar seu dedo
mais fundo, e aperto meu sexo contra sua palma. — Você não
entende o que você fez comigo? Eu quero você, Gabriel.
A dor em seus olhos não diminui. Há alívio, mas a dor ainda
define seu rosto em ângulos rígidos que enfatizam suas feições duras.
As sombras do quarto escondem a cicatriz em sua bochecha, mas
não a luz sombria de seus olhos azul gelo enquanto ele me encara.
Para mim, ele é perfeito. Eu amo as linhas nítidas que definem sua
beleza masculina incomum e até mesmo a tristeza que
está permanentemente gravada em seu rosto. Precisando
tocá-lo, eu puxo sua mão, mas ele
aperta sua agarre.
— Por favor, Gabriel. — Eu
imploro a ele com meus olhos, minha voz e meus
quadris.
Ele geme enquanto giro a parte inferior do meu corpo,
prendendo sua mão entre nós. Lentamente, o aperto de
seus dedos em meus pulsos relaxa, me permitindo
levar minha mão ao seu rosto. Eu seguro sua
bochecha e passo meu polegar sobre o mapa
devastador de cicatrizes. É assustador olhar para
ele, mas quando você encontra coragem para olhar,
para realmente olhar, o poder da beleza que está por
trás da destruição física é cegante. Eu vi a beleza
dentro dele também. Ele é um bom pai para Carly e
me dá muito mais do que recebe, mesmo que eu não
seja nada além de propriedade para ele.
— Eu só quero você, — eu sussurro.
Por um momento, ele se inclina para o meu toque, roçando sua
bochecha com cicatrizes na palma da minha mão, mas então ele vira
a cabeça, virando seu rosto para a escuridão.
— Gabriel. — Eu gemo em protesto.
Ele abre mais minhas pernas, posicionando seu pau na minha
entrada.
— Gabriel.
Digo seu nome, tentando trazê-lo de volta para mim, para
recuperar o momento que perdemos, mas ele se apoia em seus
braços, colocando mais distância entre nós. A única conexão entre
nós é seu pau, que bate violentamente em meu corpo. Uma dor se
espalha dentro de mim. Ele se afasta e faz de novo, me esticando e
queimando com aquela dor surda que me diz que ele está muito
duro. Ele me fode com tanta força que meu corpo se desloca até a
cabeceira da cama. Mais e mais me acerta, e tudo que posso fazer é
envolver minhas pernas e braços ao redor dele, segurando enquanto
dou a ele tudo o que tenho. A cada impulso, ele rosna, mantendo o
rosto longe de mim. Ele nunca me tomou tão brutalmente antes, e
mesmo que doa, meu corpo se deleita em sua posse. Por
enquanto, não me importo se sou propriedade. Não me
importa se sou uma etiqueta de
preço e um corpo vazio. Eu só
quero ser dele.
— Só você, — eu digo.
Ele se lança contra mim com mais força, seus
grunhidos mais altos, me punindo por algo que não
entendo. Quanto mais rude ele me trata, mais suave eu
moldo meu corpo em torno dele.
— Apenas sua.
Ele rosna, me penetrando com tanta força que
estou com medo de que me quebre.
— Maldita seja, Valentina. Não se atreva a
mentir. Não sobre isso.
— Eu quero ser sua.
Ele agarra meu rosto entre as palmas das mãos
e empurra a cabeça em minha direção, colocando
nossos narizes a centímetros de distância, sem
diminuir o ritmo forte de seus quadris. — Olhe
para este rosto. Olhe para mim!
— Estou olhando.
Raiva esconde suas feições em uma máscara de medo. Suas
narinas se dilatam e a umidade transborda de seu corpo. — Pare com
isso.
— Sua.
Ele solta um grito áspero e esfrega sua virilha contra a minha.
Jogando a cabeça para trás, ele cerra os dentes e morde os sons
enquanto o calor líquido enche meu corpo. Ele treme com sua
liberação, seu corpo escorregadio de suor. Eu preciso dele. Ele fez
um buraco no meu coração, e só ele pode consertar. Envolvendo
meus braços em volta do seu pescoço, eu o puxo para um beijo, mas
ele desembaraça meus pulsos e arruma meus braços ao lado do meu
corpo. Ele apenas descansa sua testa contra a minha por um breve
momento antes de se levantar em um cotovelo para olhar para mim.
Nossos olhos permanecem travados enquanto ele deixa seu pau
escorregar livre para preencher o espaço vazio com os dedos. Usando
sua liberação, ele lubrifica meu clitóris e me leva a um orgasmo
rápido, o tempo todo me observando.
Quando os tremores cessam, ele me leva para o
chuveiro e me lava. Muito fraca para ficar de pé, ele se
senta no banco comigo montada
nele, minha cabeça apoiada
em seu peito. A água arde nas
minhas partes íntimas, e estremeço quando ele me
ensaboa lá. Ele nos enxuga com a toalha, me leva
de volta para a cama e depois desaparece no banheiro
novamente. Quando retorna, ele me entrega um copo
d'água e um comprimido.
Eu olho para a pílula branca. — O que é isso?
— Paracetamol. Você vai precisar se não quiser
acordar com uma dor de cabeça.
Ele põe o comprimido na minha língua e me faz
beber toda a água. A cama afunda quando ele se
acomoda atrás de mim, me puxando contra seu peito.
— Eu devo ir, — eu digo sonolenta.
— Defini o alarme para cinco. — Ele beija meu
ombro. — Descanse.
Eu me aconchego mais perto, apreciando
o calor de seu abraço. Mesmo que seja apenas
por algumas horas, vou aceitar o que puder. Estou acostumada a
viver de restos.
Estou quase caindo no sono quando sua voz me puxa de volta
do sono.
— Havia um gato.
Eu fico imóvel, esperando que ele continue.
— Era um filhote. Nada especial. Apenas um gato de rua, mas
para mim ela era linda. Ela tinha uma pele macia, negra como a
noite, e olhos como luas amarelas. A gata apareceu do nada na casa
do meu melhor amigo. Ele a chamou de Blackie. Daquele dia em
diante, Blackie sempre seguiu meu amigo por aí. Ela ficou em seu
quarto e dormiu em sua cama. — Seu peito se expande com uma
respiração. — Eu estava com ciúme dele. Queria que a gata viesse à
minha casa. Eu queria que ela me seguisse, mas ela não o fez, então
contrabandeei pedaços de peixe e bife para a casa dele, atraindo-a
através da janela de seu quarto. Ela comeu a comida, mas ainda não
me seguiu para casa. Um dia, quando meu amigo estava no treino de
rúgbi, fui à casa dele e levei a gata. Eu tranquei Blackie no meu
quarto, escondendo-a de Magda e nossas criadas. Fiz
uma cama para ela no meu armário e a alimentei com
guloseimas que meu amigo nunca
poderia dar a ela. Eu a
mantive fechada por duas
semanas. Naquela época, achei que ela teria
aceitado sua nova e mais luxuosa casa.
— O que aconteceu?
— No dia em que a deixei sair, ela voltou correndo
para a casa do meu amigo. — Ele acaricia meu braço
por um tempo, depois diz baixinho. — Ele achou que
ela tinha fugido, como os vira latas fazem.
— Ela continuou morando com ele?
— Eu não sei. Eu parei de ser amigo dele depois
daquele dia.
— Por quê?
— Eu não suportaria olhar para aquela gata.
O que ele está tentando dizer? Eu me viro em
seus braços para olhar para ele.
Ele beija meus lábios suavemente. — Se você libertar algo, ele
não volta para você, não importa o quão bem você o trate.
Uma profunda sensação de mal-estar se instala em meu
intestino. Ele está me dizendo que não vai me deixar ir?
— Durma. — Ele me beija novamente, o ato gentil em conflito
com a dor dentro do meu corpo que atua como um lembrete de sua
aspereza anterior. — Você vai estar cansada, amanhã.
Eu fecho meus olhos para esconder minhas emoções
turbulentas dele. Sua história me choca. Isso me diz três coisas. Um,
ele vai pegar o que quiser. Dois, ele acredita que não merece amor.
Três, ele vai me manter enquanto meu corpo o servir. O que mais me
choca é que anseio por confiar nele. Enquanto ele tiver Charlie e
minha vida em suas mãos, eu não posso. Pela primeira vez,
considero que ele não honrará nosso acordo. Ele não vai me libertar
como a gatinha preta. Um homem como Gabriel não repete o mesmo
erro duas vezes. Isso é o que ele estava me contando com sua
história. Lágrimas se acumulam atrás de minhas pálpebras
fechadas. Eu viro minhas costas para ele novamente para que eu
possa derramá-las silenciosamente em seu
travesseiro. Ele me deixa sem opção. Se ele não me deixar
ir quando eu pagar a dívida de
Charlie, terei que fugir.
16
Gabriel

EU DESPERTO MUITO antes de o alarme tocar, puxo o corpo


macio e quente de Valentina para mais perto e fico pensando na noite
passada. Deixar Valentina bêbada não foi planejado. É muito cedo
para ela conceber, então eu não estava arriscando-a ou o
desenvolvimento do bem-estar do feto. A ideia surgiu em minha
cabeça enquanto Michael a fodia com os olhos. Sylvia sempre era
brutalmente honesta quando bebia demais. Foi assim que descobri
que ela nunca me amou. Não deveria ser uma surpresa. Eu não teria
sido tão crédulo se não estivesse desesperado por uma mulher que
pudesse chamar de minha.
Sim, a verdade surge quando uma mulher está bêbada e, ao
contrário dos homens, elas não sussurram mentiras em seus
momentos de paixão. Quando uma mulher está a um segundo de
gozar, é quando você vê os verdadeiros sentimentos em seus olhos.
Valentina precisa de mim. Isso é o que eu a treinei para
querer. Como a gatinha, eu a atraí com prazer e
orgasmos, levando-a aos seus limites
e além, garantindo que
nenhum outro homem pudesse
dar a ela o que eu pudesse, porque nenhum
outro homem terá a coragem de machucar ela para fazê-
la gozar mais forte. Então por que estou destruído? As
mulheres me querem pelo meu dinheiro, pelo sexo ou pela
segurança que vem com estar conectada a
mim. Valentina me quer porque eu a projetei. É
demais esperar que ela me queira por mim. Garotas
como ela querem alguém como Michael e Quincy. É
a natureza. Não há absolutamente nada que eu possa
fazer sobre a natureza, exceto torcê-la, forçá-la e dobrá-
la do meu jeito. Se eu precisar torná-la minha cativa
para sempre, que seja. Em breve, ela estará ligada a
mim com sangue. Nosso filho será uma conexão que
ela não pode romper.
Às cinco, acalmo meus pensamentos
amargos, desligo o alarme e começo a triste
tarefa de acordar ela. Se eu pudesse, eu a teria deixado dormindo na
minha cama. Eu amo tê-la entre meus lençóis. Ela geme enquanto
eu passo seu cabelo por cima do ombro para beijar a curva graciosa.
— Acorde, linda.
— Gabriel. — Sua voz está sonolenta.
Com muito pesar, tiro o lençol, deixando o ar fresco da manhã
esfriar nossos corpos. Seus braços ficaram arrepiados. Ela vira-se de
costas, esfrega os olhos e se alonga.
— Que horas são?
Eu acendo a lâmpada da mesinha de cabeceira. — Cinco.
Ela se senta e balança as pernas sobre a cama. Suas costas são
um retrato perfeito de vértebras frágeis cobertas por uma pele
sedosa.
Ela me lança um olhar tímido por cima do ombro. — Posso usar
seu banheiro? Com tudo que bebi ontem à noite, não vou chegar ao
meu.
— Vá em frente. — Eu quero que ela toque em tudo que é meu. O
pensamento de seus dedos percorrendo os objetos que pertencem a
mim faz minha pele se contrair de prazer, como se
ela me tocasse.
Sua mão esguia roça o
colchão quando ela se
levanta. Ela pega minha camisa
da cadeira e a veste. Calor ao vê-la vestindo minhas
roupas enche meu peito. Quando fecha a porta do
banheiro atrás dela, eu me levanto para escolher minhas
roupas para o dia, mas paraliso. Manchas de sangue em
meus lençóis. Não é muito, apenas algumas gotas,
mas o suficiente para me dizer que eu a quebrei
novamente.
Eu tiro um terno de um cabide com uma
carranca. Deus sabe que não mereço nada tão lindo e
perfeito quanto ela, mas não posso deixá-la ir.
A porta se abre e Valentina entra. Suas
bochechas estão pálidas e há círculos escuros sob os
olhos. Ela sorri para mim enquanto atravessa o
chão com pequenos passos. Antes que alcance a
porta, eu a interrompo. Eu a puxo para mim
com meu braço em volta de sua cintura, segurando seu
sexo suavemente com minha mão livre.
— Você está bem?
Ela estremece ao meu toque. — Só cansada.
A fúria dirigida a mim mesmo explode em meu peito. — Vamos
para a cama mais cedo esta noite.
Ela me dá um aceno fraco. — É melhor eu ir antes que Carly ou
Magda acordem.
Relutantemente, retirei meu toque. — Eu machuquei você.
— Você queria.
— Assim não. Você deveria ter me contado.
Seu olhar detém o meu. — Não, Gabriel. Você não queria ouvir
o que eu estava tentando lhe dizer. — Sem outra palavra, ela sai
cautelosamente do meu quarto.
Eu a deixei ir porque não tenho escolha. Abandonando o traje,
coloco minha roupa de exercício, desço para a academia e bato os
punhos no saco de pancadas até sangrar.

VAI NEVAR NO MEIO do


verão. Carly está tomando café
da manhã conosco. Ela está
extraordinariamente tagarela, a ponto de Magda
escapar com o café para o escritório.
— Pai, — diz ela após um relato excepcionalmente
longo de sua semana na escola, — tenho uma coisa para
lhe contar.
Meu intestino gira do avesso. Eu não vou gostar
do que está por vir. Me preparo enquanto espero em
silêncio com um rosto estoico.
— Decidi voltar a morar com a mamãe.
O golpe me atinge bem entre os olhos. Não sei o
que esperava, mas não foi isso. Eu abaixo minha
xícara e respiro longa e profundamente para me
acalmar. As visitas inesperadas de Sylvia e o acordo
fácil para deixar Carly sair em encontros de
repente fazem sentido.
Tenho o cuidado de manter a voz calma. — O que motivou a
decisão repentina?
— Mamãe está com saudades de mim.
A carta da culpa é suja para Sylvia jogar. — Você não tem que
tomar uma decisão precipitada. Por que não pensar um pouco?
— Há muito tempo que penso nisso, já estou pronta. Não é como
se você só me visse a cada segundo fim de semana. Posso visitar
quando quiser.
— Claro. Seu quarto sempre estará aqui.
— Obrigada, pai.
Não adianta discutir com Carly depois que ela toma uma
decisão. Ela me puxou a esse respeito. Eu não confio em Sylvia como
mãe. Ela só me provou que não é capaz para o trabalho, e não gosto
do novo namorado de Sylvia. Tudo o que posso fazer é estar ao lado
de Carly quando ela precisar de mim.
— Você não está bravo? — Ela pergunta.
— Claro que não. — Decepcionado, triste, mas não estou bravo
com minha filha.
— Estou empacotando algumas das minhas coisas
hoje. Mamãe vai me buscar esta noite. Você estará aqui
para se despedir?
Tão cedo? — Claro. — O
dia, que começou ruim, escurece
vários tons. — Me avise se precisar de ajuda.
— Obrigada, mas eu estou bem.
Incapaz de conter minhas emoções, empurro minha
cadeira para trás. — Vou te buscar depois da escola.
— Uh, pai?
Eu paro, esperando que ela fale.
— Eu e algumas garotas da minha classe vamos
ao Mugg & Bean depois da escola.
— Quem está dirigindo?
— Mamãe.
— Vejo você antes de ir, então. — Eu ando até a
porta antes que ela veja a angústia que estou
sentindo em meus olhos.
— Tenha um bom dia, — ela grita atrás de
mim.
Simplesmente assim, minha filha, meu precioso presente de
Sylvia, é arrancado de minha casa.
O que eu preciso é de uma luta. Eu levo Rhett comigo para
dirigir pelo antigo bairro de Valentina. As chances de encontrar o bar
que ela mencionou são mínimas. Muitos dos lugares antigos não
existem mais. O bairro, como tantos outros ao redor, se transformou
em uma fossa de crime. Os edifícios estão em ruínas. Alguns estão
destruídos no chão. Eu solicitei o plano da cidade de doze anos atrás
do município, mas como o resto do governo, eles são um bando de
funcionários corruptos sem instrução. Os registros há muito foram
deslocados com o colapso do sistema. É uma piada que este país
ainda está funcionando. São pessoas como eu e o resto dos bandidos
na rua que puxam os cordões. Os políticos são apenas fantoches.
Existem milhões de maneiras de ir para o inferno, e ganhei todas
elas.
Não sobrou ninguém da velha turma que conhecia o bairro. Os
amigos do meu pai que arrecadavam dinheiro nessa área se foram.
Steven morreu de ataque cardíaco com as calças em volta dos
tornozelos no banheiro. Dawie chutou o balde quando ele
caiu nos degraus da frente e quebrou o pescoço. Barney
saiu à moda antiga, morto a tiros
no jardim da frente. Mickey
faleceu de câncer e Conrad pegou
AIDS com as prostitutas que ele cafetinava. A morte
do meu pai, ocorrendo pacificamente durante o sono, é
a mais suave e tranquila de todas, ao contrário do estilo
de vida violento que levava. Como o meu fim vai
chegar? Eu morrerei pelo negócio, com uma bala no
cérebro ou como meu pai na minha cama?
Rhett estaciona no meio-fio e acena com a
cabeça para a casa escamosa com as telhas
faltando. — Esta?
— Sim. — Eu pego minha arma e a coloco na
minha cintura. —Vamos lá.
Lambert está com a porta aberta antes que eu
esteja passeando pelo mato em seu jardim da frente.
— Gabriel. — Ele dá uma risada nervosa. —
Você vai me dar a ideia errada, me visitando o
tempo todo.
Eu aceno para ele entrar. Rhett e eu o seguimos. O clique firme
da porta quando a fechei deixa Lambert tenso. Sua pele amarela
ganha uma cor pastosa.
— O que posso fazer por você?
Eu odeio sua gíria, mas engulo meus insultos. — Me conte sobre
o bar que costumava ter por aqui.
— O bar? — Seus ombros relaxam visivelmente.
— Sinal de néon, barman careca, mesa de sinuca no fundo.
Ele coça a cabeça e pensa um pouco. — Ah, — diz depois de um
momento, — deve ser o Porto, mas o lugar já não existe. — Ele zomba.
—Não vai encontrar muito mais do que invasores morando lá.
— Quem é o proprietário?
— Jack Bigfoot.
O nome me faz lembrar. Meu pai o mencionou uma ou duas
vezes.
— Onde posso encontrar ele?
— Seis palmos abaixo do chão.
Merda. Outro beco sem saída. — Quem o protegia? — Todos no
bairro tinham proteção de alguém. Você não poderia
sobreviver de outra forma.
— Ele estava com os caras
judeus de Kensington.
— Judaico? Em território
português?
— A esposa dele é judia. O chefão fez um acordo
com os Porras para tirar o Bigfoot da jogada. Por que você
quer saber tudo isso?
— Estou escrevendo um livro de história, — digo
secamente.
Seu nariz se enruga, enterrando seus
minúsculos olhos de porco em camadas de pele. —
Você está me zoando.
O cara é muito estúpido.
— Onde posso encontrar a esposa?
— Você não vai gostar. Sophia tem
Alzheimer. Ela não reconhece uma formiga de uma
mosca.
Isso não ajuda. Eu limpo a mão no rosto.
Lambert parece não saber onde colocar os pés. Ele se move da
esquerda para a direita. — Quer uma cerveja?
— Vamos. — Eu aceno para Rhett e caminho de volta para o
carro.
Lá dentro, meu guarda-costas se volta para mim. — Você se
importa em me dizer o que está acontecendo?
— Eu preciso dos registros telefônicos de Lambert.
— Vou ligar para Anton.
— Eu já fiz. E foi apagado.
— Há quanto tempo?
Dou a ele a data em que visitei pela primeira vez o quase marido
de Valentina.
— Eu conheço um hacker da Vodacom que é discreto. Vou ligar
para ele e ver o que pode fazer.
Enquanto estou dirigindo, ele liga para seu contato. Antes de eu
estacionar em nossa garagem, ele tem um número para
mim. Estaciono e aperto os números que ele lê em voz alta no meu
telefone. Já pelo quarto dígito, sei a quem pertence o
número. Enquanto digito o último dígito, o nome
de Magda aparece na tela.
Eu abro a porta e faço meu
caminho para a casa com
passos largos.
— Gabriel! — Rhett pula do carro e corre atrás
de mim.
— Fique fora disso, — eu chamo de volta.
Encontro Magda em seu escritório.
— Por que Lambert Roos ligou para você?
Ela salta para trás, me observando por cima dos
óculos. — Ele queria saber por que estamos
farejando seu território. — Ela cruza os braços. —Por
que estamos, Gabriel?
— Você conheceu Jack Bigfoot?
— Não pessoalmente, mas todos no ramo sabem
quem era Jack.
— O que você sabe sobre ele?
— O mesmo que você, não muito. Por que
esse interesse repentino no Jack Bigfoot?
— Estou tentando juntar a história de Valentina, mas é tudo
becos sem saída.
— Por quê?
— Estou interessado.
— Não se apegue a ela, Gabriel. Eu já avisei você.
— Avisou mesmo.
— Você está?
— Eu estou o que?
— Ficando apegado?
— Eu não acho que sou capaz de apego.
— Você sempre foi um menino mole, mole demais para o que é
preciso.
— O que é preciso, Magda?
— Fazer seu trabalho.
— Você quer dizer matar ela.
— Conforme combinado.
Não concordo em absoluto, mas chega uma mensagem de Rhett,
informando que o médico chegou. Ordeno que espere lá em cima e vá
em busca de Valentina. Ela está treinando Bruno com
Quincy, e ver eles juntos em brincadeiras amigáveis só
aumenta minha irritabilidade.
— Ei, — ela diz quando
me vê.
Seu sorriso caloroso esfria com meu estado
explosivo.
— O médico está esperando, — eu digo.
Ao meu tom, Quincy murmura uma saudação e se
despede.
— Eu sei. Sugeri que começássemos, mas ele
insistiu em esperar por você, — ela me conta.
— Estou aqui agora, então vamos.
No meu quarto, digo ao médico para repetir os
mesmos testes de ontem. Ontem, queria garantir que
Valentina não tenha sofrido ferimentos internos que
possam impedi-la de ter filhos. Hoje, preciso saber
que não a danifiquei.
— Novamente? — Ele diz, sua voz não
revelando seus pensamentos.
Eu levanto minha sobrancelha em desafio. Eu pago a ele o
suficiente para não fazer perguntas.
Ele se vira para Valentina. — Você sabe o que fazer, minha
querida.
— Eu não entendo.
— Faça isso, Valentina, — eu digo mais duramente do que
pretendia.
Ela estremece com o meu tom, mas obedece. Só relaxo quando
o médico me diz que ela está bem. Eu o instruí a injetar um
tratamento de fertilidade ontem para aumentar suas chances de
engravidar. Ela ovulará em uma semana a partir de hoje, e minha
semente estará nela pela manhã, tarde e noite, até que ela engravide.
Eu estendo seu vestido para ela vestir e abotoar a frente antes
de guiá-la de volta para o sofá-cama. O médico desenrola a
bandagem em seu polegar, expondo uma ferida vermelha e irritada.
Não preciso da confirmação dele para saber que os antibióticos não
estão ajudando. Nem Valentina.
Ela me olha com olhos grandes. — Eu esperava que estivesse
melhor hoje.
O médico me lança um olhar severo. — Ela terá que
ir para a clínica. Agora.
Meu mundo para pela
terceira vez naquele dia. Pego a
mão de Valentina na minha. Sua palma está fria e
úmida. — Existe o risco de ela perder o polegar?
— Eu não sei. Eu não sou um cirurgião. — Ele tira
as luvas médicas e as joga na lata de lixo. — Você precisa
que eu chame uma ambulância?
— Não. — Eu aperto seus dedos. — Vou levá-la.
Peço que Quincy nos leve para que eu possa me
sentar no banco de trás com Valentina, meu braço
em volta dos ombros dela. Seu corpo está tenso, mas
ela se inclina para o meu toque quando aperto seu
queixo para beijar seus lábios. Por espancar ela, eu sei
que seu limiar de dor é baixo. É por isso que ela
estava tão pálida esta manhã. Quero dizer a ela que
tudo ficará bem, mas já existem mentiras
suficientes entre nós e simplesmente não sei.
No caminho para o hospital, ligo para minha corretora de
seguros pessoal e peço que ela providencie uma pré-admissão na
clínica. É o horário de pico do trânsito às cinco, mas Quincy conhece
as estradas secundárias e consegue nos levar lá em pouco mais de
trinta minutos. Com Valentina já cadastrada, vamos direto para uma
sala de exames onde um jovem cirurgião nos espera. Ele dá uma
olhada no dedo dela e ordena que os testes sejam feitos.
— Qual é o curso de ação? — Eu pergunto com força.
— Uma coisa de cada vez. Vamos obter os resultados primeiro.
— Quanto tempo vai demorar?
— Uma hora, talvez noventa minutos. Temos o laboratório no
local e solicitei os exames com prioridade. Posso arranjar-lhe um
quarto privado onde se sinta confortável ou pode esperar no
refeitório.
— Pegue um quarto para nós, por favor. — Não suporto
multidões e não acho que Valentina está a fim de tomar um café de
hospital.
Uma enfermeira nos mostra um quarto com paredes amarelas
brilhantes e uma cama de solteiro com uma colcha
azul. Quincy se posiciona perto da porta enquanto faço
Valentina se sentar na cama. Eu
verifico a hora no meu
telefone. São quase seis
horas. Estou prestes a enfiar ele de volta no bolso
quando toca. O nome de Carly aparece na tela.
— Com licença. — Eu pressiono um beijo na têmpora
de Valentina e caminho até o canto da sala. — Olá
princesa. Onde você está?
— Estou em casa. Onde você está?
— No hospital.
— Algo está errado?
—Tive de trazer a Valentina. A ferida dela está
infeccionada.
— Ah não. Diga a ela que espero que tudo fique
bem. Ouça, mamãe está aqui. Rhett está carregando
minhas coisas no carro.
— Já? — Eu olho para Valentina. — Quando
você vai embora?
— Não podemos esperar muito. Mamãe tem algo. Posso passar
na semana que vem.
Estou dividido em dois. Não quero deixar Carly ir sem me
despedir, mas também não quero deixar Valentina.
Valentina pula da cama e põe a mão no meu ombro. — Carly?
— Ela sussurra.
Eu concordo.
— Vá, — ela diz. — Eu vou ficar bem.
— Me dê um minuto, Carly. — Coloquei a chamada em
espera. — Eu não vou deixar você. Agora não.
— Quincy está aqui. Você ouviu o que o médico disse. Isso pode
levar uma hora ou mais. Vá se despedir de sua filha. Eu sou uma
garota grande. É apenas uma infecção. Vou tomar uma injeção de
um medicamento potente e depois volto.
Eu fico olhando para o rosto dela, seus lábios carnudos e seus
olhos tristes e turvos. Racionalmente, o que ela diz faz sentido, mas
não consigo dizer a Carly que estarei em casa em trinta minutos.
— Vá em frente, — ela insiste. — Sua filha está se mudando de
sua casa. Você não vai deixá-la ir assim, mesmo sem estar lá.
Eu aperto a ponta do meu nariz e levo um segundo
para tomar minha decisão antes
de atender a ligação. — Estarei
em casa em trinta minutos.
— Certo, — diz Carly brilhantemente. — Eu
vou esperar por você.
Eu pressiono um beijo forte nos lábios de
Valentina. Estou na ponta da língua para dizer a ela que
a amo, mas engulo as palavras bem a tempo. Um
arrepio de choque desce pela minha espinha. O que
diabos está acontecendo comigo? O pensamento caiu
em minha mente do nada. Hábito. Deve ser um
hábito. Sempre que tive que deixar Sylvia em uma
situação difícil, sempre precisei tranquilizá-la sobre
meus sentimentos. Vou até a porta e digo. — Volto
mais tarde.
Seu sorriso é caloroso e fácil. É um sorriso
destinado a acalmar. Eu escapei dos sentimentos
caindo sobre mim, deixando-os no
confinamento do quarto do hospital enquanto eu fujo para fora.
— Fique com ela, — digo a Quincy, — e me ligue quando tiver
novidades. Qualquer coisa que ela precisar, qualquer coisa, não
hesite.
— Sim chefe.
— Me dê as chaves do carro. Vou para casa, mas volto assim
que puder.
Ele tira as chaves do bolso e as entrega para mim.
— Não se afaste desta porta. Mantenha ela segura.
Ele joga sua jaqueta de lado, me mostrando a arma que está
enfiada em sua cintura.
Deixo o hospital com sentimentos contraditórios. Se Sylvia fosse
razoável, eu teria pedido a ela para esperar, mas ela não é, e ela será
especialmente difícil no que diz respeito a Valentina.
O trânsito é um pesadelo. Levo mais de quarenta e cinco
minutos para chegar em casa. Sylvia e Carly estão esperando do lado
de fora ao lado do conversível sobrecarregado de Sylvia.
— Papai! — Carly corre para mim quando eu saio do carro. —
Eu sabia que você viria. Eu te disse, mãe.
Ela me deixa abraçá-la, uma ocorrência rara. Eu
olho para as caixas e malas
empilhadas no banco de trás
do Mercedes. — Uau, quando você
acumulou tudo isso?
Ela me dá uma cotovelada nas costelas. — Você
deveria saber. Pagou por isso.
— Você pode usar tudo isso?
— Não são apenas roupas, — ela diz
indignada. — Existem livros também.
— O quê, dez?
Sylvia se aproxima de nós com um terninho rosa
justo com saia lápis. — Temos de ir.
— Carly, se você precisar de alguma coisa...
— Eu vou ligar.
— Não mais do que uma hora no seu telefone
por dia e sem encontros sem minha permissão.
— Gabriel. — Sylvia me lança um olhar
severo. — Eu sou a mãe dela. Sou capaz de
lidar com essas decisões.
— Mas nós os faremos juntos.
Ela se afasta, fazendo o possível para não parecer abrupta na
frente de Carly. — Ela está crescendo. Aceite isso.
Não vou brigar com Sylvia. Hoje não. Eu beijo a bochecha de
Carly. — Eu amo você, Princesa. Você sabe disso, certo?
Ela limpa a palma da mão na bochecha. — Eca, pai! Desde
quando você está todo piegas?
— Já que minha garotinha está crescendo. — Eu ia dizer saindo,
mas não quero que ela se sinta culpada por passar um tempo com a
mãe.
— Pare com isso. — Ela golpeia meu braço. — Você vai me fazer
chorar, e eu não quero que meu rímel escorra.
— Carly. — Sylvia começa a bater o pé.
As duas mulheres vão até o carro e entram. Conforme o veículo
passa pelos portões, um sentimento de desolação se apodera de mim.
A casa está vazia e sem propósito. Sua estrutura parece um grande
elefante branco atrás de mim. A piscina, o jardim, as televisões, tudo
era para a Carly. É como se um pedaço de mim tivesse ficado com
minha filha.
Meu telefone vibra no bolso, chamando minha
atenção de volta para o
presente. Há uma mensagem
de texto do Quincy.
Quincy: Valentina está em cirurgia.
17
Valentina

Eu despertei em uma cama de hospital sem um pedaço de mim.


Não é o fim do mundo perder um dedo. Coisas piores podem
acontecer, mas nunca vou segurar uma agulha e linha novamente.
Para ser um veterinário, você precisa de todos os dedos. Aconteceu
rápido demais para eu processar. Vinte minutos depois que Gabriel
saiu, o médico voltou com a notícia. O dedo que costuraram de volta
não funcionou. Tive gangrena no polegar. Para impedir que a
infecção se propagasse, ele teve que amputar acima da junta. Quinze
minutos depois, fui levada para a sala de cirurgia.
A porta se abre e uma enfermeira entra. — Você está acordada.
— Ela olha o gráfico ao pé da cama e ajusta o gotejamento no meu
braço. —Pronta para visitantes? O Sr. Louw está ansioso para vê-la.
Eu não estou. Quero ficar sozinha para processar o
que aconteceu.
— Aperte o botão se estiver com dor.
— Ela deixa um botão de
chamada ao alcance da minha
mão boa e chama brilhantemente pela porta.
— Você pode vê-la agora.
Quando Gabriel entra, meu coração se
despedaça. Seu cabelo está bagunçado e sua camisa
amassada, como se ele tivesse dormido com ela a
noite toda. A pele sob os olhos é um azul. Ele manca
até a minha cama, seu rosto uma máscara
ilegível. Apesar de seu corpo alto e todos aqueles
músculos, ele parece totalmente vulnerável. Uma
profunda necessidade de acalmar ele me faz estender a
mão, segurando sua bochecha.
— Que horas são?
— Pouco depois das seis. — Ele acrescenta. —
Da manhã.
— Você ficou a noite toda?
— Claro.
— Não precisava.
Ele não diz nada, mas a turbulência de repente torce seu rosto.
— É apenas um polegar, — eu digo.
Ele agarra meus dedos e aperta com tanta força que chega a
doer. Quando eu grito, ele me solta, parecendo sem saber o que fazer
com a minha mão. Finalmente, ele a coloca em cima da colcha.
— Você não é o único que pode se gabar. Eu tenho minha
própria cicatriz, agora.
— Já falei com o médico sobre uma prótese.
— Eu não vou colocar um polegar artificial.
— Por que não? Vai parecer natural.
— Não vai funcionar.
— Não. — Ele evita meus olhos. — Não vai.
— Eu não me importo com minha aparência. — Quando seus
olhos ficam tempestuosos, tento usar o humor. — Droga, nunca
poderei pedir carona.
Um sorriso surge em sua expressão sombria. — Não precisa.
Você me tem.
Não para sempre.
Ele traça um dedo ao longo do meu queixo. — Há
outras coisas. Assistente de
veterinário. Enfermeira.
É como me dizer que existem
outros homens além dele.
— Sim, — eu digo suavemente, — há outras coisas.

O TEMPO VOA NAS PRÓXIMAS semanas. O


Natal vem e vai. Eu compartilhei um almoço
tranquilo com Kris e Charlie. Em vez de comprar
presentes uns para os outros, doamos dinheiro para
uma instituição de caridade para animais
abandonados. Gabriel, Sylvia, Carly e Magda deram
uma festa com suas amigas e amigos. Magda
contratou fornecedores, então minha ajuda não foi
necessária. Gabriel me deu um dia de spa no
Natal que incluía todos os tratamentos de
mimos imagináveis. Meu presente para ele foi
de natureza mais depravada. Ele pediu para me amarrar, surrar, me
foder e filmar tudo. Ele não precisava da minha permissão, mas meu
livre arbítrio era o presente que ele queria. Foi outra forma de torcer
mais submissão de mim, de me fazer cair mais fundo na escuridão
que somos nós. Depois, ele me fez assistir. Como o ser perverso em
que me tornei, isso me excitou, e a recompensa por minha reação foi
uma maratona terna de fazer amor lentamente.
A casa está silenciosa sem Carly. Ela vem visitar a cada segundo
fim de semana por algumas horas. Posso dizer que Gabriel sente falta
dela. Depois do Ano Novo, a casa fica ainda mais silenciosa quando
Magda parte para a Cidade do Cabo. Não sei que tipo de trabalho ela
está fazendo lá, e não pergunto. Gabriel costuma sair a negócios, me
deixando sozinha na mansão. Gabriel, Quincy e Rhett me tratam
como uma inválida, carregando a cesta de roupas e qualquer outra
coisa que eu possa pegar com facilidade. Para algumas tarefas, mudo
para a mão esquerda. Outras dela, eu consigo com quatro dedos.
Marie volta ao trabalho, com a fala prejudicada e a disposição
mais brusca do que antes. Como a viagem entre a casa e o trabalho
se torna excessiva para ela, ela se muda para um quarto da
casa. Tenho uma forte suspeita de que ela fofoca com
Magda. Ela me observa como um
falcão. Por isso, mesmo que
Magda e Carly não estejam
presentes, ainda não passo noites inteiras na cama
de Gabriel. Algumas noites ele vem até mim e outras eu
vou até ele. Quando estamos juntos, sou seu objeto
sexual. Seu animal de estimação. Quando Magda entra
na equação, sou propriedade. Gabriel tem o cuidado
de suavizar o afeto que demonstra por mim em
particular quando Marie ou Magda estão por perto.
Kris é solidária. Ela disse que eu ainda poderia
comprar o consultório, mesmo que ambas saibamos
que nunca poderei pagá-la com o salário de uma
empregada doméstica ou enfermeira veterinária. Aletta
ficou triste quando contei a novidade. Pouco depois,
ela me informou que concederam a bolsa para outro
aluno carente. Charlie se envolveu muito com o
passeio de cachorro. Ele leva a tarefa a sério, e
a responsabilidade parece fazer bem a ele.
Só eu é que não estou bem. Em um nível não físico. Meus
exames são bons. O médico disse que a infecção não se espalhou.
Estou presa na casa do Gabriel, submetida à sua misericórdia, e não
posso dizer que ele está me maltratando. Passei a ansiar por
palmadas e cintadas. Ele compra minha comida e roupas. Tudo o
que eu quiser, só preciso mencionar, e vou encontrar no meu quarto
no dia seguinte. É como se ele estivesse tentando compensar a perda
dos meus sonhos e as necessidades sombrias às quais me submete
com uma compensação material. Seus presentes vão de cosméticos
a livros e até um novo iPhone.
Sexo com Gabriel é sempre explosivo, mesmo quando é gentil.
Ultimamente, há muito gentil. É por isso que não consigo entender
minha crescente tristeza. Quanto mais gentil ele age comigo, mais
triste eu me sinto. Não posso juntar o homem da minha cama com o
homem que tem o futuro de Charlie sobre a minha cabeça. Eu quero
odiar os dois, mas eu sei melhor. Já faz muito tempo que não sentia
apenas desejo por Gabriel. Eu me importo com ele e odeio isso.
Como sempre, Gabriel percebe meu humor. Naquela noite, ele
deita meu corpo nu no colchão para que possa olhar para
mim. Ele segura meu seio suavemente, acariciando meu
mamilo com o polegar.
— Ai! — A sensação é
quase insuportável.
Testando o peso do meu seio, ele me lança um
olhar pensativo. —Você está perto de ter seu período.
Ele quase parece desapontado. Não é como se ele não
tivesse feito amor comigo durante a minha
menstruação. Não entendo seu abatimento
silencioso.
— Sim. — Viro de lado, de frente para a parede,
aliviada por entender o motivo de meus sentimentos
depressivos. É apenas uma forte crise de TPM.
Ele esfrega a palma da mão sobre meu estômago e
pressiona seu pau entre minhas pernas. — Vou ser
gentil. — Sem esperar pelo meu consentimento, ele
me rola sobre meu estômago e se acomoda entre
minhas coxas. — Abra para mim, linda.
Abro minhas pernas, dando a ele a visão
que deseja. Ele me acaricia e provoca por um
longo tempo, até que seus dedos ficam encharcados com a minha
umidade. Só então ele empurra para dentro, lento e fácil. É então que
me ocorre. Desde que eu estive de volta do hospital, ele só me levou
por trás. Como eu poderia ter perdido isso antes? Ele me fodeu
contra a parede, em sua mesa, em sua poltrona, na piscina e em uma
variedade de outros lugares criativos, mas minha bunda estava
sempre pressionada contra sua virilha, meu rosto olhando para longe
dele. Sou eu? Ele me acha pouco atraente? Eu me torço embaixo
dele, começando a me contorcer.
— Valentina.
— Me deixe levantar.
Eu não espero que ele faça isso, mas ele o faz. Ele me observa
com cautela enquanto eu mudo de posição, virando-o nas costas
dele.
— O que você está fazendo?
— Olhando para você.
— Por quê? — Ele diz com uma expressão de dor.
— Porque eu gosto.
Eu me abaixo sobre seu pau, levando-o para as
profundezas do meu corpo. Eu deixo o prazer
transparecer no meu rosto,
deixando ele ver o que faz
comigo enquanto eu
estou subindo, minhas terminações nervosas
ganhando vida para ele.
— Você não precisa, — diz ele.
— Você gosta de olhar para mim?
— Você sabe que eu gosto.
— Então pare de falar e me foda.
É como se uma represa dentro dele se
quebrasse. Ele rosna e agarra meus quadris, me
mantendo no lugar enquanto bate em mim, me levando
até o limite que eu quero ir.
Enquanto meu corpo aperta, ele clama seu
clímax. É o mais rápido que gozamos juntos desde a
semana em que ele começou a me foder. Eu coloco
meu corpo sobre seu peito, segurando-o dentro
de mim. Gostaria de poder continuar assim,
mas não sou ingênua o suficiente para me
permitir acreditar que isso vai durar. Não importa nada para ele. Ele
não tem nenhuma obrigação emocional comigo. Pode foder quem
quiser sem explicação.
— Gabriel?
Ele acaricia minhas costas. — Sim linda?
— Você transa com outra mulher?
Sua mão fica imóvel. — Por quê?
Eu encolho os ombros. — Não preciso de exames para DST?
O carinho recomeça. — Só existe você, Valentina. Eu te disse
antes.
— Foi há muito tempo. Poderia ter mudado.
— Eu direi se isso acontecer.
Meu coração parece que acabou de passar pelo liquidificador.
Isso pode mudar. Eu tinha razão. Engulo minhas lágrimas, com
raiva de meus sentimentos irracionais. Não tenho o direito de esperar
mais dele. É minha própria maldita e estúpida culpa que eu me
apaixonei pelo meu algoz.

TRÊS SEMANAS MAIS


tarde retomei meu treinamento
secreto com Rhett. Meu polegar amputado
cicatrizou o suficiente para fazer exercícios mais
extenuantes. Estou fora de forma, mesmo tentando ficar
em forma usando os aparelhos na academia. Ele me
derruba toda vez, jogando minha bunda no tapete. É
durante nossa sessão na noite de quinta-feira,
quando Gabriel está fora a negócios, que começo a
chorar de frustração.
Rhett olha para mim, horrorizado. — Eu
machuquei você?
— Não. — Eu limpo minhas bochechas. — Estou
apenas emotiva.
Minha maldita menstruação ainda não
começou. Quanto mais cedo isso acontecer,
melhor vou superar esse estado de depressão.
Ele oferece a mão para me puxar para cima. Eu mal estou de pé
quando o jantar da noite empurra de volta na minha garganta. Eu
corro para o banheiro, chegando antes de esvaziar meu estômago.
Rhett corre atrás de mim, parando ao lado do banheiro.
Vômitos secos destroem meu corpo, fazendo meus olhos
lacrimejarem.
— Jesus, Valentina. — Ele pega um monte de toalhas de papel
e as entrega para mim. — Você está bem?
— Estou.
Me sentindo um pouco melhor, enxáguo o rosto e lavo as mãos.
Ele levanta meu braço. — Você está…?
— Não. — Eu balancei minha cabeça. — Não estou doente.
— Eu quis dizer, você está grávida?
Meus lábios se abrem em choque. O sangue cai direto da minha
cabeça aos pés, me deixando com uma sensação de tontura. — Não,
claro que não.
Nunca perdi minha pílula. No entanto, estou um pouco
atrasada. Oh Deus. E se? Gabriel vai me matar.
Impossível.
Tenho sido cuidadosa.
Pego outra toalha do
dispensador e limpo a boca,
percebendo o quanto minhas
mãos estão tremendo. — Acho que vou encerrar a
noite.
— Posso pegar alguma coisa para você?
— Não, obrigada. Eu só preciso dormir cedo.
Ele me observa sair, sem dizer uma palavra.
Me arrasto para a cama depois do banho, mas
não fecho os olhos. É tarde quando Gabriel
retorna. Ele fica nu e sobe na cama ao meu
lado. Estou molhada para ele, mas ele leva seu tempo
para lamber e provocar minhas dobras. Ele não para até
eu gozar duas vezes, e só então me fode. A maneira
como ele ama meu corpo é incrível, mas minha
mente não está lá. Minha mente está buscando
soluções para problemas que ainda não
confirmei.
— Onde você está? — Ele finalmente pergunta, beijando meus
seios.
— Eu sinto muito. Só estou cansada.
Ele cobre meu corpo com beijos, do meu estômago aos meus
pés. Ele é tão gentil que tenho vontade de chorar.
Quando ele beijou o caminho de volta ao meu pescoço, me
abraçou com força e disse. — Vá dormir.

DEPOIS DO CAFÉ DA manhã vou até a unidade de funcionários.


Rhett está sentado na varanda, tomando seu café. Ele se levanta
quando me vê.
— Você está uma merda.
— Obrigada. — Eu dou a ele um sorriso irônico. — Eu preciso
de um favor, por favor.
— Qualquer coisa. — Ele deixa a xícara na grade.
— Eu preciso que você vá à farmácia.
Seu olhar é pesaroso. — Tudo certo.
— Gabriel não pode saber. Você me entende?
— Valentina.
Ele desce as escadas e
estende a mão para mim, mas eu
me afasto.
— Ele não pode saber, Rhett, não até que eu tenha
certeza.
Ele engole e acena com a cabeça. — Eu volto em
breve.

POUCO TEMPO DEPOIS ME sento no assento


do vaso sanitário, olhando para as duas linhas azuis
no palito.
Positivo.
Estou esperando o bebê de Gabriel.
Uma mistura de sentimentos passa por
mim. Estou fraca de admiração. Também estou
doente de medo. Ele vai me culpar? Ficará
furioso. Pior, ele vai pensar que fiz de propósito
para prender ele. Gabriel nunca vai querer um filho com uma mulher
que é propriedade. Não me importo de criar um filho sozinha. Gabriel
não precisa me dar um centavo. Não vou esperar apoio dele, mas e
se ele não quiser que eu tenha esse bebê? E se ele me obrigar a fazer
um aborto? Se ele me levar a uma clínica, não poderei fazer nada
para impedi-lo. Ele ainda é meu dono, e agora ele é dono do bebê
crescendo em mim também.
Só há uma coisa que posso fazer para salvar a pequena vida
dentro de mim. Rapidamente faço uma mala, minhas mãos tremem
tanto que deixo cair meu telefone duas vezes. Eu embrulho o kit de
gravidez em um saco plástico e descarto no lixo do lado de fora, onde
ninguém vai olhar. Só Rhett vai adivinhar, mas quando Gabriel o
confrontar, já terei partido.
No escritório de Gabriel, escrevo uma nota rápida.
Não posso honrar minha promessa. Espero que você me perdoe.
Deixando isso em sua mesa, fecho a porta, sabendo que Marie
não entrará em seu escritório. Depois chamo um táxi particular. Vai
custar um braço e uma perna, mas não posso me dar ao luxo de
pegar uma minivan. Eu preciso desaparecer rápido. Rhett
saiu com Gabriel há pouco tempo, e Quincy está levando
Bruno para passear. Eu passo
pelos guardas no portão com
um aceno, minha bolsa
pendurada no ombro, agindo o mais normal que
posso. Eles só me viram saindo da propriedade a pé uma
vez, mas estou saindo regularmente para que não me
parem.
A um quarteirão da casa, faço uma pausa
para esperar. Dois minutos depois, o táxi para na
esquina do endereço que dei ao motorista. Olhando
por cima do ombro para ter certeza de que ninguém
está me seguindo, pulo para dentro.
— Vá por favor. Rapidamente.
Eu não olho para trás enquanto o motorista se
afasta. Coloco minhas mãos sobre meu estômago e
olho para frente.
Eu tenho que ir.
Pelo meu bebê.
Continua....

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