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GUILHERME SETOGUTI J. PEREIRA IMPUGNACAO DE DELIBERACOES DE ASSEMBLEIA DAS S/A QUARTIER LATIN Guntrerme Serocum Juuo Peneina = 51 Negécio juridice bilateral (contrato) ela nunca ser porque Ihe faltam os dois principais elementos essenciais desses atos juridicos: (i) concurso de vontades de partes diversas (€ nio sujeitos diversos) e (ii) consenso. Ela sera sempre ne- gécio juridico unilateral, pois fruto da declaragao de uma tinica parte: a socie~ dade. Por fim, nao se trata de negécio juridico simples, pois nao é formada pela declaragdo de um sé agente ou varios agentes constituidos em partes contra- postas; trata-se de negécio complexo, resultante de varias vontades paralelas, que se unem € que sao emitidas por sujeitos de uma mesma parte ~ a socieda- de —, regidas pelo principio majoritario. 5. Vicios DOs ATOS JURIDICOS EM GERAL Embora o regime de invalidades do direito societério seja auténomo e distancie-se do regime das nulidades do direito civil (v. item 7 a seguir), aque- le emana deste™ e, assim, nosso estudo deve partir deste. Nao existe uniformidade quanto a classificagiio dos vicios dos atos juri- dicos,'"' mas € possfvel tragar, com certa seguranga, os elementos comuns as varias teorias sobre o assunto. Existente é 0 ato que ostenta todos os e/ementos nucleares que juridicamente 0 constituem como tal. Além de existir no mun- do fitico — pois seria um contrasenso falar-se de um no ato -, existe também no mundo juridico. Se esto presentes todos os elementos nucleares mas 0 ato € inquinado por outro vicio, o suporte fitico concretiza-se no mundo jurfdi- co, porém de forma deficiente: ele existe, mas pode ser invalido ou ineficaz.' judiciais ¢ os drgios de administragdo das sociedades por acGes, como a assembleia geral e 0 conselhio de administragao (ct. eorta general... 38, p. 224). 100 Cf. Angeles Alcala Diaz, La émpugnacion..., p.78. or Parase terums idcia, Caio Mario da Silva Pereira cheye a afirrnar que “a materia é muito obscure- ida, carece de boa espasigio doymatica, ¢ alimenta acentuada desarmonia entre os escritores, no somente no que se refere & fixagio dos conceitos, como ainda no que diz respeito a termi hologia, que € algo desencontrada e imprecisa’ (ef. ustituicdes.., v. 1. p.537). Da mesma forma Antonio Junquelra de Azevedo, para quem a doutrina yer ha muito fazendo alusao a negéclos inexistentes,invilides eineficazes, mas ‘nao se tem conseguicia fixur, com preciso, em que cada situagao se distingue da uuira”. Ainda de acordo com o emninente civilista, ateoria das nulidadesé feconhecida pela douttina como das mais dificeisdo direito, a punta de "Sobre ela, pode-se dizer, sem logue, queo unico panto em que todos estiv de acordo & que nao hd acorda a seu respeito” [cf Neyouta juridico... . 25). Vejarse a resenha da doutrina feita por Junqueira de Azevedo, que demonstra o cavs nao $6 terminoligicu/conceitual come tambem classificatdrio que impera na doutrina das invalidades dus atos jutidicos (pp.27/29), voz Cl. Marcos Bernardes de Mello, Teoria de fate furidica ~ plano da validede, pp. 41/42. 0 autor cita como exemple o contrat de compra e venda, que possui como elementos nucieares @ acordo. devontades, 0 objeto (a culsa) ¢ v praca. Faltanido alum desses elementas, o contrato sera ine- xistente; mas estando todos eles presentes, pode ser que: incida algurn vieio sobre eles, como, por exeinple, 0 acordo de yonuudes nay seja manifestado por pessoas capazes, 0 objeto seja impossivel ou o prego seja fixado em moeda que ndo nacional. Nesses casos, em decorréncia da deficiéneia em elemento nuclear valu & invalide (p.42, note 17). 52 - IMPUGNAGAO DE DELIBERAGOES DE ASSEMBLEIA DAS S/A, Valido é 0 ato perfeito, isto é, de acordo com os requisitos do suporte fatico pre- visto pela norma que o prevé ou que, embora em desacordo com essa moldu- ra, possua defeitos que o sistema repute irrelevantes a ponto de nao lhe impor sangdes como a auséncia de eficdcia. Eficaz, por fim, é 0 ato que possui todos os fatores necessirios para produzir os efeitos a que se destina.1™ Invalidade é a sangao imposta ao ato que, embora existente, foi praticado em desobediéncia aos seus requisitos legais, isto é, que nao possui os requisi- tos necessrios para a sua configuracao objetiva.'® A validade do ato, portan- to, depende de sua sujeicao as exigéncias legais, variando o grau da sangao de ineficdcia proporcionalmente a relevancia que o ordenamento atribui aos re- quisitos desatendidos. Em regra, um ato valido ser4 também eficaz e, um in- valido, ineficaz. Em uma acepeio lata, ineficdcia é empregada para todos os casos em que © ato juridico nao produz efeitos e, portanto, trata~se de género do qual inva- lidade € espécie, pois 0 ato invalido, em regra, sera inapto a produzir os efeitos a que se destina. Em uma acepgao estrita, ineficdcia se opée a invalidade e diz respeito ao ato que, embora possua todos os seus elementos essenciais — isto é, seja valido —, nao produz efeitos por conta de algum elemento externo, como o nao implemento de termo ou de condigao.'® Nessa tiltima perspectiva, exis- tem quatro categorias de atos viciados, em uma escala crescente de ineficacia:!” ineficazes stricto sensu, anulaveis, nulos e inexistentes.1 103 Cf. Marcos Bernardes de Mello, Teoria do fato..., p. 34. No sistema do Cédigo Civil, o negécio ju ridico é valido desde que preencha certos requisitos relacionados a pessoa do agente,-ao objeto darelacdo e a forma da emissio de vontade. O art. 104 do CC alude a agente capaz, objeto licito, possivel, determinado ou determinavel, e forma adequada. 104 Essa éaclassificacdo de Anténio Junqueira de Azevedo, que faz mencio a elementos de existéncia, requisitos de validade e fatores de eficacia (cf. Negécio juridico, p. 30). 105 Cf. Pontes de Miranda, Tratado de direito privado, t. 'V, n. 362, p. 28; Zeno Veloso, Invalidade do negécio juridico - nulidade e anulabilidade, n. 25, p. 146; e José de Oliveira Ascensio, Direito civil: parte geral, v. UI, n. 204, p. 314. 106 Cf, Orlando Gomes, introdugdo..., n.276, p. 471. Também atrelando a invalidade a uma circunstancia ‘interna ea ineficacia a uma circunstancia externa, v. Mario Vaselli, Deliberazioni nulle.., cap. Ml, n. 2, pp. 27/28. 107 Antonio Junqueira de Azevedo criticou essa classificagao, que coloca osatosinexistente c ineficaz a0 lado do nulo e do anulével: "Nao é légico que se continue a colocar, ao lado do nulo e do anuldvel, o negocio dito inexistente, como se tratasse de um fertium genus de invalidade. Nao ha uma gradagao de invalidade entre 0 ato inexistente, 0 nulo e 0 anulavel. Ao negécio inexistente opde-se oato existente (este é que pode sernulo, anulavel, ou valido). A dicotomia ‘negécio exis- tente - negécio inexistente’, de um lado, e a tricotomia ‘negécio valido - negécio nulo~ negéci anulavel’, de outro, estao em planos dferentes, (..) Da mesma forma, o negécio ineficazem sentido estrito também nao é, ao lado do nulo e do anulavel, um tertium genus (ou quartum genus, para os que admitem também a inexisténcia). Ao negécio ineficaz se ope o negécio eficaz” (cf. Negdcio fiaridic0.n CAD. 2, 1.5, p- 63). 108 — OCédigo Civil de 2002, assim como ja o fazia 0 Cédigo Civil de1916, adotou ostermos nulidade e anulabilidade, abandonando a antiga divisio da nulidade em absolutae relativa, que fora acolhida Gunumieeme Strocum Jue Pessiea ~ 53 A ineficacia stricto sensu aplica-se. ao ato para o qual, embora valido, no concorre algum elemento que lhe € alheio e do qual dependem os seus cfei tos. Ja a inenisténcia — categoria originalmente concebida para fundamentar aineficacia absoluta de atos praticados no ambito do direito de familia, como, por exemplo, 0 casamento de pessoas do mesmo, sexo,!” quando este ainda era repelido~ est ligada @ falta de elemento essencial do ato, sem 0 qual este se- quer se perfa juridicamente. O ato foi praticado e existe faticamente, mas nao possui existéncia juridica.™ Trata-se de categoria polémica e que até hoje nio é completamente accita pela doutrina.!¥ Invalidade é considerada género do qual nulidade ¢ anulabilidade sao es- pécies,¥-1 Essa posigio é adotada pelo Cédigo Civil, que intitula 0 Capitulo V do Titulo I do Livro IT] da Parte Geral com a frase “Da invalidade do ne- gécio juridico” ¢ distingue, nos artigos nele contidos, nulidade de anulabilida- de (arts. 166/184). 810 Regulamento n. 737/1850. _ \09 tr ares Alcala Daz, te npugneton... op. 78/79-No mesma setido, Cio mito da ae Pereira conceu inefccia sto eu como “a ecusa de ees quando, obzervados embire a5 requisitos legals, intercorre obsticulo extrinseco, que impede se complete o ciclo de perieicio do ato" (ef Instituigdes... v.1, p. 539) tia) Deacorde com Roxon Korat, a nogio deals Ineistanteternaupido no opnage do séite XIX, no.campo do dete mavimonialfancks, quando, em razio de Vigor reg de que ndo hi tuldade sem expressa cominscGo legal orjouse ums said jurdica pra tocar inecazes certs easamentos que feririama moral da época, como, por exemplo, aqueles entre pessoas do mi sexo (cf Da invalidade no processa civil, pp.154/157). = : 1 Diferentemente do ato nulo, que "reiine os elementos necessirios a sua constiwigao, mas apresenta defeito que a lel considera bastante grave para the recusar validade’, 0 a10 gaa Sequer ches ase formar, porque Ie falta requiitoindtzpensvel a su existence jr” Orlando Gomes, Introd.» n-275, p- 469). Para uma analise da categoria da inexistancia e da sua evolugiohistrica nan apenasno dre process éconsltabrigatoriaabracasetenze civile inesisteme, de Chiara Besso. V., ainda, 0 nosso E possivel a chamade telativizagao da coisa julgodla?,n. 5, p. 62, onde analisamos a esti ee 0 we we a eB iret |, apontou Flivio Yarshell que ‘a doutrina ¢ considera 7H Nopdate do tee os ornate pouca Pega hfeencs eters pera plea de erlériosobjehos eenvereda pia ocarisnc (ef ApSorescdya—jutos ents ests 78,p-241)-Aindasobreo tema. va resenha rious mas elucidativa feita por Edua lamin (cf. Coisa julgada e sua revisao, n. 5.4, pp. 294 es - 13 o Rete nent Tato tN, 363; p. 3 Marcas Bernards de Mell, Tori do fio juridico - plano da validade, p. 35, nota 4; Zeno Veloso, Invalidade....n. 14. pp. 26/29; @ Jose de ‘Diiveira Ascenso, Direito cv... 205, P.315- f : M4 Nulidade ¢o termo utiizado ns mals variados ordenamervos (nul ult nicuigkei exc) io terme anulabildade soffe wuines. No dreto italian se dit onolaiidade no asso em que no fancésseprefere a denominagio nuda relating no alamo impugndva (ct. Angle Alcala Diaz Lrinpugnecon.~ .78}.No Basil uile.0sermas auf eanukbidodee em menor rat, afidade absolut e nulidaderelava, Na doutrina Francesa, como aponta Heitor Sica preferesefalarem nuidadesabsoltas elaivas(cf."Contibubgo a0 estilo dateoria das rnulidades: comparagao.entre osistenva de invalidades no nove Cédigo Civile nodireito process in Impactos processuais do direito civil (coord, Cassio Scarpinella Bueno), p. 184). 54 ~ IMPUGNACAO Dr DeuineeagOks DF Assemsita DAS S/A A nufidade &a sancao imposta a0 ato contra lege isto é,aquele que infringe uma proibigao que, embora nao necessariamente legal, tatelaum interesse pablico ou que suplanta a esfera das partes envolvidas. Costuma-se atreli-la ao desrespei- to 4 ordem publica, ao interesse geral, a moral e aos bons costumes! 6117 — por mais fluidos que sejam tais conceitos. O regime da nulidade curactetiza- S€, por isso, afirma 2 doutrina tradicional, por demandas cujo exercicio nao é submetido a prazos e legitimidades especificas, na medida em que ha um in- teresse geral na identificagao dos vicios. Para essa espécie de vicio vigoram os Seguintes preceitos: (i) a nulidade se opera de pleno direito; (ii) a nulidade pode ser invocada por qualquer interessado, pelo Ministério Puiblico e até de oficio pelo juiz (CC, art. 168); € (iii) o negdcio nulo nao é passivel de confirmacao e, €m regra, nao convalesce pelo decurso do tempo (CC, art. 169). Ademais, diferentemente do anulavel, 0 ato nulo nfo pode ser ratificado (CC, arts, 169 © 172): se as partes querem obter os efeitos juridicos que pretenderam com 0 ato devem pratici-lo novamente, Nessa hipdtese, haverd o perfazimento do ato —nao a sua ratificagao —, e os efeitos derivarao do segundo,” Jaa anulabilidade 6 a sancao 4 violagao a normas ditadas em protegao de interesses de pessoas ou grupos especificos, Existe imperfeigao nao tao gra- ve que a Ici franqueia ao interessado a opgao entre pleitear o reconhecimento de sua ineficacia ou deixar que seus efeitos transcorram normalmente, conva- "5 Ch Enneccurus-Kipp-Wolff Tratado... | v.11, 189, pp. 354 @ seguintes; Von Tuhr, Derecho civit ¥.Il, 1.55, PP-247 seguintes; Zeno Veloso, Invalidade.., 1.16, p.35; €Matio Vasell, Deliberaxiont fuller. cap. Il 9.5, p31. Caio Mario da Siva Pereira apontou que o legislador brasileira despre- zou 0 critério do prejuizo, desconsiderando o velho principio francés de que nao hdmulidcce sem prejurzo (‘pas de nullité sans grief), Preferiu o legislador patrio 0 principio do respoite & urdem publica assentando anulidade nainfragao de normyasque contenham esse carter (ef nstifuicoes. Vv. p. 540). 116 Nao se deve confundir a associagao entre nulidade e violagio ao interesse geral com a violaga0 uma norma cogente ou imperativa, Pode haver Violacao a uma norma dessa espécie sem que baja nulidadle. © critério & 0 nceresse tutlado, Nesse sentido € a seguinte passagem cle Antigono Donati: “non tutte le violazioni di none cogent (proibitive) darmo luogo a nullta, ma quelle soltanto dele norme profbitive poste neltinteresse generale* (Cf. Linvaliiti.. n.24,p. 49), 117, Ha contudo, quem defend a divisio da nulidade em absoluta e elativa: emboraa nulidadeseja ipicamente entendida como aquela em que esta em jogo um interesse geral, e nao particular, “examinando algumas figuras basicas de nulidade, verificamos que ind um, Econtemplado em primeira linha’. Exemplodisso seria, nodireito portugues, ¢ ato simulado seja nulo por expressa disposica legal, a anulacao do ato simulado tutela, antes tle tudo, os particularesinteressados, Por so que “a nulidade relativa é assim aquuolaem que nso ha prioritariamente um sujeito que é tutelado; na nulidade absoluta pode pelo conirario haver ‘irios interessados particularas, masaatutelaé em primeira linha de um interesse geral” Por conta dessa subdivisio, fica de certa forma afetada a distingao entre nulidadle © anulailidade (el. Jose de Oliveira Ascenso, Dircita civil. nn. 207/209, pp. 318/319 & 322/333) 1B No sistema do Cédigo Civil, ato nulo é, alternativamente, o praticade por péssoa absolutamente incapaz, que possui objetoilicito, impossivel ou indeterminivel, que desrespeitaa formacominada ‘para a sua pratica ou que ¢ simutado (CC, arts. 166/167). 19 CE.Silvio Venosa, Dire civil v.1, p.59.4- Gutusteme Srrocunt Juuo Peneira ~55 lidando-se pelo decurso do tempo.'® De tal sorte, as medidas judiciais desti- nadas a0 reconhecimento do vicio em regra sujeitam-se a prazos decadenciais breves e s6 podem ser adotadas pelos sujeitos a favor de quem as normnas fo~ ram estabelecidas.'”! S6 os interessados podem alegar a anulabilidade, nao ca- bendo iniciativa do Ministério Pablico ¢ tampouco pronincia de oficio (CC, art. 177). O ato anulivel, ainda, pode ser confirmada (CC, art. 172) e é sana~ do pelo decurso do tempo. Uma das distingoes entre o ato nulo e o anulavel, como visto, é que, ab initio ¢ de pleno direito, aquele nao produz os efeitos a que se destina (quod nullum est, nullum producit effectum), ao passo em que o segundo produz efei- tos provisdrios que, se nao impugnados adequada e tempestivamente, trasmu- dam-se em definitivos. Em razao disso, para alguns autores o decreto judicial da nulidade gera efeitos exe “unc, pois apenas limitar-se-ia a declarar um estado juridico que, desde 0 momento em que constituido o ato viciado, ja era mar- cado pela ineficaeia, ao passo em que a prontincia sobre a amulabilidade gera~ ria efeitos ex nunc, pois 03 scus efeitos provisérios foram produzidos e s6 sio extirpados do mundo juridico a partir do momento em que sobrevenha uma mudanga na ordem juridica. Em suma, de acordo com a doutrina analisada, no regime geral do direi~ to privado a principal diferenga entre nulidade e anulabilidade é que aquela estiia servigo do “interesse social” — por mais que esse conceito indeterminado seja, repita-se, fluido e dificil de ser definido —e esta diz respeito a interesses privados, Em decorréncia disso, possui legitimidade para suscitar a nulidade qualquer interessado ou 0 Ministério Publico, e, pelos mesmos motivos, ela deve ser pronunciada de oficio. A anulabilidade depende de alegagao de in- teressados e deve ser necessariamente decretada por provimento judicial, ao passo em que a nulidade opera-se de pleno direito ¢ nao requer decisao judi- 120. Existem tes formas pelas quails convalesce o ato anulavel: decurso do tempo, que extingue o direito.& anulagio (decadéncia); confirmagao (CC, arts. 172 e 173); e suprimento da autorizagao, nas hipoteses em que a auséncia desta torna o ato anulivel (CC, art. 176) (cf. Caio Mario da Silva Pereira, Insituicdes... v1, pp. 546/548). Mais genericamente, Silvio Venosa aluide apenas ao de- curso do tempo e ratificacao (cf, Direito civil, v.1, p. Gar), , de fato, a tercelra hipotese indicada pelo primeiro autor é particular a alguns vicios. 12) Cl. Angeles Alcala Diaz, La iempergnercion..» pp. BO € 82; ¢ Jose de Oliveira Ascensio, Direto civil... 11.206, p.316, Também atrelando a nulidade ao interesse social eaanulabilidadeao privado, Silvio Venosa, Direito civil, v.1, pp. 588 € 59v: “Devemas ter em mente que a nulidade repousa sempre em causas de ordem publica, enquanto a anulabitidade tem em visia mals acentuadamente 0 interesse privado’. Da mesma forma Orlando Gomes, latrodugd0.., 0.279, P-A74- 122 Deacorde comZeno Veloso, “normalmente, como regrageral, o negécio nulo nao produe quais- querefeitos juridicos” (cf. Javalidade..., n.25, p. 146).Sobre 0 assunto, v., ainda, Coviello, Doctrino general... n.106, P. 3593 José de Oliveira Ascenso, Direito chit... nn. 205/206, 9p. 336/317: & Horster, A Parte Gert. 1. 347, P. 212. 56 ~ IMPUCNAGAA De DiintRAGOIS DE AssEMAlsiA DAS S/A cial. O que justifica a necessidade de pronunciamento sobre a nulidade ¢ a in- seguran¢a que a divida sobre a validade do ato gera. Os atos anuliveis podem ser ratificados (ou confirmados, para usar a terminologia do Cédigo Civil), ao contrario dos nulos. De toda forma, deve ser considerada a afirmacio de Marcos Bernardes de Mello de que nao € possivel falar, rigorosamente, em caracteristicas da nulidade, na medida em que as caracteristicas que a ela sio comumemente imputadas (imprescritibilidade, alegabilidade por qualquer interessado, ineficicia do ato etc.) nao sao encontradas em todas os atos nulos. Isso parque os sistemas juri- dicos, procurando atender a situagées especiais ¢ particulares, criam excegdes qne impedem sejam feitos enunciados genéricos."*! 6. Vicios DO CONCLAVE, DO VOTO E DA DELIBERAGAO O art. 286 da LSA dispde que “a ago para anular as deliberacées toma~ das em assembléia-geral ou especial, irregularmente convocada ou instalada, violadoras da lei ou do estatuto, ou eivadas de erro, dolo, fraude ou simulagao prescreve em 2 (dois) anos, contados da deliberagio”,'" ao passo que o § 4° do 723 Ct. Teoria do fato juridico - plano da validade, n. 65, p.261: "Por isso & necessirio destacay, bem claramente, que nenhuma daquelas caracteristicas integra essencialmente, de modo absoluto, 0 conceito de nulidade, em face das excecoes. Dai nao ser cientificamente correto afirmar-se que sejam caracteristices essenciais da nulidade, mas, sim, que em geral Ihe sZo pertinentes’. 124 Embora areferido dispositive - no que ¢ seguido por quase toda a doutrina ~ aluda a um prazo prescricional, rata-se, na verdade, de prazo decadencial. Com efeito, em tese de catedra para a cadeira de Direito Civil da Faculdade de Diteito da Universidade de Sao Paulo, Camara Leal bem explicou que, embora haja semelhancasenire decadéncia e prescricao (ambas sdo causasextinti- ‘yas, baseam-se na inércia do titulardo direito € 18m 0 tempo como fator operante), sao institutos diversos porbasicamente tras fatores, O primeiro é que a decadéncia extingue o direito, ao passo em que a prescriczo extingueaagao. Osegundo traco distintitive é que o prazo decaclencial nasee no mesmo momento em que surge direito, ao passo em que a prescrigao pressupde um direlto id existente e553 passa a corer quando este 6 ameagado ou violado, “porque nesse mamento é que nasce wacio, contra a qual a prescrigao se dirige”.O terceiro e dltimo trago de diferenciagio diz espeito a natureza do uireito violado: adecadlencia opera-se sobre um direito que, "ernbora nascido, nao se tomou efetivo pele falta de exercicio’, enquanto que a prescrigio “supde un direito nascido e efetivo, mas que pereceu pela falta de protegao pela agao, contra a viohigao softida” (cf. Da prescricao e dla detiadencia, yn. 72 € 318/323, pp. 100/102 e 397/401). No mesmo sentido, Agnelo Amorim Filho aficmou que, como os direitos potestativos (dando 0 exemplo o ito 4 anulagao do contrata) iio direitas sem pretensdo ou sei presiagao, “36 as agtes conde~ natérias podem prescrever’. Prosseguindy, ciicluiu que “os potestativos s30 0s tinicos direitos que podem estar subordinades a prazoside decadéncia, uma ver que o objeto e efeita desta é, precisamente, a extingio dos direitos nao exercitados dentro dos prazos fixados’, E arrematou, a0 aludir a “manifesta impropriedade da expresso agGes imprescritives” para designar as ages cconstitutivas nao sujeitas a decadéncia, defendendo que se utilize a lacugao agdes perpstuas em substituicao aquela expressao (ci. ‘Critério cientifico para distinguira prestrigaio da decadéncia e para idemificar as agGes imprescritiveis’, R7, ¥.744, PP. 735/736, 738 e 746/747). Firmados estes itérios, parece ser evidente que o prazo firmado no art.286 da LSA é decadencial, pois o direito a impugnagio da deliberagao s6 surge a partic do momento em que ela propria surge, isto 6, 3 partir do momento em que o ato é praticado, e, portanto, o prazo para 0 exercicio dosdireito de Gurerme Seracun Jur PeRtiRs-57 art. 115 da LSA preceitua que “a deliberagio tomada em decorréncia do voto de acionista que tem interesse confiitante com o da companhia é anulavel”. Logo se vé que o legislador misturou tés espécies diferentes de vicios: (i) do conclave (irregularidades relativas 20 procedimento assemblear, como de con- vocacao ¢ instalugao); (ii) da deliberagao (irregularidades materiais, de infraca0 4 lei ov ao estatuto social); ¢ (iii) do voto (irregularidades nas manifestagoes de vontade individuais dos sécios). Nao obstante tenha havido essa confusio, nio 86 esses defeitos sao diversos como importam em consequéncias e disciplinas diversas, como, por exemplo, a legitimidade ad causam para a impugnagio." Quando se tratar de wicia da conclave, isto &, que diga respeito & propria assemblcia, todas as deliberagdes nela tomadas também serao maculadas, pois ha relagao de prejudicialidade: se a deliberagao resulta da convergéncia de von- tades manifestadas em uma reuniao procedimental, viciado esse procedimento igualmente viciado sera, por via de estrita conseguéncia, como anotou Comparato, © seu resultado.' Os vicios dessa espécie mais comuns sio os que resultam de desrespeito as formalidades estabelecidas para a convocagao e instalagao da ‘ago comecaa corer no mesmo momento em quesurgiu o direilo que vai embasar a pedido de tutela jurisdicional. Como reforco do ora defendido, ressalte-se ainda que Camara Leal arrolava entre decadenciais o prazo de minoria anular a madificacao do estatuta social dasfundacoes(nn. 291/292, pp. 374/375), Para uma analise de Leorias que procuram diferenciar os dois institutos, v. Serpa Lopes, Curso de direto civil, v.1, 405, pp. 563/566. Diga-se, por fim, que também Erasmo Valladao Franga afirmou tratar-se de prazo decadencial (cf. nvalidade.., 0.16, p.71, nota 9) 125 Ascarelli atentou para que o fato de que o art. 156 da Decreto n. 2.627/40 ~ cuja redacao foi praticamente replicada pelo art. 286 da LSA - disciplinaya diferentes tipos de vicios (cf. “Vicios das deliberagdes..”, nn. 2 3, pp: 371€ 382/385). Na mesmo sentido, v. Comparato, "Da impres- critibilidade..", p. 218; Erasmo Valladao Franca, “Negitimicade de parte..., p. 387; Javalidade... 1-85 e “Invalidade de deliberacdes conexas da companhia", in Temas... nn. 2/3, Pp. 400/410 Erasmo Valladao Franca e Marcelo von Adamek, ‘Algurias notas sobre o exercicio abusive da acho. de invalidago de deliberag3o assemblea’, in Flivio Luiz Varshell e Guilherme Setoguti). Pereira (coords), Pracessn societdrio, p. 157, nota 2. Renato Ventura Ribeiro corrobora essa elassificagio (ct. Direito de voto nas sociedades andninus, p. 261). Diferenciando os vicios na convocacao e na instalagao eos vicios das deliberagdes, Modesto Carvalhosa anota que os primeirosdizem respeito 2 "farmalidodes preliminares, necessarias e suficientes & instalagio e deliberacdo das assembléias zerais’, ao passo em que 0s tiltimos referem-se ao “mento dessas mesmas deliberacdes” Os pri- meiros vicios dizem respetto 20 procedimento e ossegundos ao contetido (cf. Comentarios. 4°V. ‘Il, p-480).Também evidenciando a distincao entre vicios do voto ou da deliberacao, Pontes de Miranda anotou que ‘a nulidade pode resultar da manifestagao de vontade de um, ou do érgio" (ct. Tratado de direito privado, t.50, 0.5322. 9. 282). 126 Oreferidoautoratenta para"a necessidade logica de se distinguirem asdeliberagdes das reunides ouassembleias durante as quais elessio tomnadas’, pois “a reuniao aparece como 0 quadro jurico, que constitu’ o pressuposto necessério (condicion/o juris) Avalidade:¢ eficacia das deliberagaes’. £ ‘completa:"Nula uma reunizo (por falta de regular convocacao, p. ex.), nulas so, por via de estrita conseqiéacia, todas as deliberacoes nelas tomadas’ (cf. “Eleicao de diretores em companhia aberta. Validade e eficacia de reunides do conselho de administragao de sociedade andnima. ‘Quonum’ deliberative em assembléias gerais de companhia aberta’, in Direto empresarial, n. 1%, pp-189/190). No mesmo sentido, Erasmo Vallada Franca, Invalidade... 0.1914 p. 88} e Modesto Carvalhosa, Comentarios... V.4,1.11,p.488, Colhe-se o entendimentotambem na jurisprudencia: “Sea ussembléia realizada estava inquinada de nulidade, todos osatos porela aprovadossao nulos, pois o que é nuclearmente nulo, resulta sem possibilidade de repercussdes efetivas, senda de 58 ImPUGNAGAG DF DeLineRAgoes DE AsstimpitiA O45 S/A assembleia (LSA, arts. 123/125), mas Erasmo Valladao Franga confere outros exemplos: desrespeito a ordem do dia (LSA, art. 124, capua); recusa de parti- cipagao ao acionista ou a seu representante (LSA, art. 126, §§ te 4°). téncia de quérum legal ou estatutario de deliberagées (LSA, arts. 129 e 136); falta de lavratura da ata; auséncia de prévia publicagao de documentos da ad- ministragao (LSA, art. 133); desrespeito ao procedimento ¢ aos demais requi- sitos firmados no art. 134 da LSA," Quando houver vitia de vote, a delibcragao sé sera afetada se, excluido o computo desse voto, for alterada a maioria que a lei exige. A deliberagao ser vilida, portanto, desde que os votos vilidos sejam suficientes para manté-la." Exemplos de vicios que maculem os votos: incapacidade; vicio de consenti~ mento (erro, dolo, simulagao); voto em conflito de interesses (LSA, art. 115, § 1°); voto de administrador a respeito dos documentos listados no art. 133 da LSA (LSA, art. 134, § 1°); ¢ voto do acionista que, na fusao, pronuncia-se sobre o laudo de avaliacio do patriménio Iiquido de sociedade de que faz par- te (LSA, art. 228, § 2°). Hii quem discorde dessa diferenciagio, defendendo que todos os vicios previstos pelo art, 286 da LSA sao da deliberagao, sob o argumento de que esta € um ato complexo ou procedimental, isto é, um ato final resultando de varios outros atos intermediarios ¢ auténomos, praticados ao longo de um iter procedimental.’” Referida discordancia nao procede, porém. O yoto é uma declaragao de vontade do acionista, 20 passo em que a deliberago resulta dos yotos manifestados na assembleia, que, por sua vez, ¢, a0 mesmo tempo, uma antiga sabenga que quvod nullum est non product efectus” [TISP, Apelagao 144.160-1/4,Rel. Antonio Carlos Munhoz Soares, 2* Camara Civil, j.10.03.1992). 127 Ct invalidiade..., 1.19.1, pp.91/97. 126 Cf. Ascavell,“Vicios das deliberacoes..’,n.3, p.385; Erasmo Valladao Franca, Invalidade....10.3., pp- 113/114; € Nelson Eizirik, A Lei das $/A comentada, v. II, p. 597. £ porisso, alias, que Comparato escreveu que a dectetacao da ineficicia de votos proferidos em violagio a acordo de acionistas “acarretara, por via de consequéncia, a ineficacia das deliberagies tomadas em assembléia com aqueles votos, infirmando-se todosos atos ulteriores praticados pelacompanbhia com base nelas” {ck Validadee eficaciade acordos deacionistas. Execucaaespecifica de suas obrigacdes’, in Navas ensaios ¢ pareceres de direito empresariel, p. 71). E mesmo que os votes viciados nao interfiram no resultado do conclave, nao se pode falar que oacionista nao teria interesse na anulacao, uma ver que referido interesse pode repousar na isencaa de responsabilidade e no exercicio de direitos como o de recesso (cf Renato Ventura Ribeiro, Direita de voto.., p. 262). Nodireito portugues, Pinto. Furtado chega a conclusio diversa, ao sustontar quese 0 voto nio for essencial paraa deliberagao, “no seria ele impugnavel emsimesmo” A isso o juristalusitanochama de provade resisténcia, "pois, nao farfa sentido alimentar um contenciosa judicial relativamentea um voto que, viciado embora, a0 descontar-se & maioria por que foi aprovada a deliberagao, apenas reduziriaa dimensao do seu voto, sem a eliminar” (cf. Deliberagbes... 0. 96, p. 712). Também aludindo & prova de resistencia, Menezes Cordeiro, SA° assembleia geal... 104. p. 228. A jurisprudéncia também acolhe essa felacdo existente entre votos e deliberacao: TIS?, Camara Reservada de Direito Empresarial, Ap. 19007654-10.2010.8.26.0286, Rel, Romeu Ricupero, j.07.02.2012. 129 Cf Luiz Gastdo Paes de Barros Leaes, “Vicios.., p 164. GUILHERME SETOGUTLJUUO PERURA~ 59 reuniao € um érgao da sociedade. Sao, pois, coisas diversas, cujos vicios im- portam em consequéncias igualmente diversas. 7. INVALIDADES NO DIREITO SOCIETARIO BRASILEIRO (LSA, ARTS. 115, § 4° £286) Como apontam sutorizadas vozes, é necessdria e existe — ainda que nado em decorréncia do direito posto brasileiro— uma disciplina prépria das inwali- dades no direite secietdric, com caracteres diversos do regime das inualidades do dinvito civil, marcada pelo principio da estabitidade das atox que busca per mitir a continuidade da atividade empresarial diante de defeitos nos processos de constituigio das sociedades e de formagio da vontade social." 10 Em regra, si estudiosos de direito privado que chegam a essa conclusdo, come Antigone Donat, ‘que defendev aabordagem dotemacom acomunhao de principios do direito privado, do dircito administrative e do diteito processual (cf Linvalidita.., 3, PP. 13/14). Nesse sentido, v,, ainda, Erasmo Valladao Franga, Invalidade..., nn. 5 € 6, pp. 21/27, € ‘Anulagao de assembléia de transfor macao de S/A’, in fernas.... nn. 6/9, pp.265/263; Andrea Pisani Massarmormile, “invalidita delle delibere assembleari Stabilita ed effeni’, Rwista del dirtto commerciale e del dito generale delle obligazion, v, 102, 9.1/3, pp.55 € 57; Angeles Alcala Diaz, La impugnacion ..» 106; Lobo Xavier, Anulocéa... pp.13/3; Francesco Terrusi,Linvalidifo.... An-4.2 €2.1, pp. e 61/63; Waldirio Bulgarelli, “Anulagao de assemblsia eral desociedade andnima’, a7, v. 514, p.60@” Questaoreferentealivros societarios e documentos relativas & presenga e as delibveragdes cas assembléias gerais’, ROM, n. 114, p.255; Carvalho de Mendonga. Tratado..,¥. Il, n. 1.002, pp.372/374; Moitinho de Almeida, Anulagéo..., p.1; Bulhdes Pedreira, "Regime especial de invalidadle dos atos societatios’, in A Ler das S/A, . Il, 697/699; Lamy Filho, “Mudanca de objeto social e incorporacdo de subsidiaia’, in AlLei das 5/A, pp-545/546; José Edwaldo Tavares Borba, Direito sovietaric, pp. 484/485 Modesto Carvalhosa, Comentirias.: 4,1, pp.475/476; Luiz Gastao Paes de Barros Leaes, ‘Vicios.., pp. 162/163; Nelson Eizirik, A Lei dos S/A... v. Il, pp. 580/581 e 501; € Ricardo Tepedino, Direito das companhies, v. |, 0. 261, p.975. Mas também ha processualistas que defenciem a existéncia do regime especial de nulidades societérias: Corrado Ferti,“Le impugnazioni diclelibere assembleari, Profili processuali’, Rivisia trimestrale di dirito e procedure civile, v. 59, 0.1, p. §2; Ada Pellegrini Grinaver, “Realizacao de assembleia sob o regime da execucao provisoria e posterior anulacao’, in Ernane Fidelis dos Santos e outros (coords.), fxecugdo civil: Exudos em homenagem ao Professor Hambecto Thendoro jdiniar, p. 393i José Rogério Cruz e Tucci, "Impugnacao judicial da deliberacio deassembleia societiria ¢ projecdes da coisa julgada’, in Flavio Luiz Yarshell e Guilherme Setogatt J. Pereira (coords), Processa societdrio, p. 471; Luiz Fernando C. Pereira, Medidas urgentes no divelto ‘societério, p. 164; ¢ Francesco Carneluti, “Eccesso di potere..." p. 176, embora esse ultimo autor tenha tido produgao doutringria proficua também fora do direito processual. Esse entendimento ‘ecoa najurisprucléncia: ST), REsp 35.230-0, Rel. Salvio de Figueiredo Teixeira, (/ 20.11.95; eS), REsp 1.046.497, Rel. Joao Otavio de Noronha, DJe 9.11.10. Ainda, reflexo da especialidade do regime denulidades do diretto sacietério, 6a defesa da professora espanhola Sonia Calaza Lopez de um regime especial de limites subjetivos da coisajulgada com base na necessidade de celeridade do trafego processual (cf La.coso juzgoda, cap. IV, 0.7.1.3, P. 175). De acordo com Andrea Pisani Massarmormile, esse principio fundamenta-se nas necessidades de rapide do trifego mercantil, eficiéncia das organizagdes e governo eficaz das empresas (c “invalidita delle..", pp. 57 @ 64), 0 que € corroborado por Franceso Terrusi, Linvaliditit., 2-4 p. 63. De acorda com esse ultimo autor, “la ragione della specialita del regime veniva correlata allesigenza di garantire la stabilita degli atti societari, in considerazione del navero cei soggetti potenzialmente coinvolti: i soci, ma anche, sebberie indirettamente, | terai” (cf. Linvatidlia,.. 1.21., pp. 61/62). Tambémaludindoatal principio, Erasmo Valladao Franca, ‘Apontamentos sobre ainvalidade das deliberacdes canexas das companhias", in Ternas de direito societério, falimentore teoria da empreso, pp. 69 2 seguintes. G0 - IMpucNAcao DF DriineRAcoes oF Assemaceta as S/A, __Defende-se a existéncia deum regime que se afasta do regime comum de nulidades do direito evil —, de fato, diferentes ramos apresertam diferente disciplinas de invalidades!—e que é marcado por (i) maior wlerincia de ane, gressSes aos requisitos para a pritica dos atos, (ji) relativizagao a regra de con- taminagao das nulidades, (ii) prazos decadeneinis mais curtos, (i) lion do rol de legitimados para demandas de impugnasio c (x) preservacio de ef tos. Exemplificativa disso éasfirmayto de Waldemar Ferrcita de que, mest portadora de vito congénite em seu ato constitutivo, a sociedade emprestca, em especial a andnima, organiza-se e age'no mundo juridivco coma se rerulae fosse, na plenitude de sua capacidade de contrair deverese adguini dcitee ™ ___ Abuse desse pensamentoesti o dinamismo exigido pela vida scietara incompativel com a inseguranga e a instabiliade que o sistema tradicional de 132 Reema a ‘so as profundas diferencas existentes entre as nulidades processuais civis eas do Opande accents pric iamenté do citer prvado dented carter pice dao I m4 em processo nao existem nulidades de pleno di aus contre apontade por Dinanarco,fazendo referencia a0 divele procesteal gtk ne, 1 nulidales de pleno deto em nosso campo, porque os ates do ju So provmantt, aes vera, mperatvos, repugnando ao sisiema que possao particular, mediante seu prop faze, jfiularaeficicia do comand recebido" (ct. “Os insiutos fundamentals do dteito processust, Fanamentas de processa cv modero i. 246)-Na mesma linha, ainda navigencia do CPCde decile Chr dehuene Vicigalalertavaparaas dferencas entre osregimentos de nulidades da Ciahgo 1 Codigo de Processo Civil (cf. Da ayaa rescisiria dos julgados, p.25). De'ato, & incoveteatansposigio do tegime de invalidales lo dreto civil para odreito processualcvl. que 10 $6 pertence ao direito publica como se trata de ramo autanomo do direito, com arincigt Tease dierizes prpros. Newe sentido a citeateckla por Roque Komaten, De ogra Bp, 26/28, Remete.se ainda a texto de Heitor Sica, em que o professor das Atcadas carnpars sit mas cle vais do CC de 2002 e do direito processual civil inclusive ahrmarde gue gina ce Hoje se tenha cansciénca de que also da cena juni em rama fae le rica distante e que possui valor menor d é neg z i wore (ck *Contribuigae ao estado... pp.183/202). e eee ey 183 Entende-se que, sendo anulada uma delibera : S u) 38h y la ur cdo assemblear, dio necessariar le em) Sel ree aor delberagies €osatos praticados com base nela. Nessesentidol. 4 Moitinho e 1 que it indica doutrina em sentido invers. doe suspensio... p15 Se ae Ma aN inverso (cf. Anulaciio e suspensdo....p.15). 135. De fato, os modelos de "processos societarios” de Post jursdicional ripida, camo sumarizacdo procedimentl Proeessul (c.Remo Capon, La tutela sommaria nel processosocetarioinproxpeaia curnpes, Rasta restr dito eprocedura citi, 58, n.4, p.1376).Sobre o processosocieliio alone, Ades Proto Pisani, “ineamenti def nuovo processo societasio" Rhsta dil chile, v.49; m 5p 57 azequi Rober Tis u roceclment di cognzione nate soe tac Rite msaledh dito roche, 58, ., pp. 261 & seguintes; Diego Voipino, “Coy decisions nelpracdimerto sect vitonmetmcd dntocpreconte see es $Ze niputes; Giuseppe Tari, “nterogat sl nuovo processo soctetaro’ Riva dian ie cicle ¥58 m3 pp. 649 eseguntes Sergio Menchin,l gudiio sommario prle contravene ipalerle Nranziane e bance’ in tdi dito processuae ce mono dh Ceseppe Tact HBP. 1767 © seguintes:¢ Bruno Sassani, "Sulla riforma del pracesso socitarc” In Stich dita P lecivilein onore di Giuseppe Tara, \. Ml. pp.1 B11 e seguintey, , = Guinterme SerociT Juulo PeKeika ~ 61 invalidades propicia," ou, como disse Galgano, a exigéncia de eficiéneia do aparato produtivo de expansio econdmica,!” Além disso, como para as so~ ciedades por acoes vige a regra de livre sransferéncia das arées,!* j4 que tipicas sociedades de capitais," as suas deliberagdes afetam nao 6 um quadro social 136 Comoapontou Ada Pellegrini Grinover, “a aplicagao ao direito das sociedadles dos principios da nulidade clissica ou civil pode, sem maiores cautelas, produzir efeitos certamente indesejaveis. Nese ramo especifica, em nome da preservacao da dinamica da vica empresarial, constata-se uma cetta ¢ justificada talerincia com transgressdes talvez impensiveis para um civilista, mas que sao proprias @ necestérias para a eletividade e utilidade do direito comercial, © processo, como instrumento que é, deve estar pronto a aceitar ¢ implementar essas diferencas, tornande- -se igualmente mais flexivel e dinamico” (cf, “Realizagao de assembleie...”, p. 393). Chamando a alenigao para a descompasso entre as rogras societirias e as processuais, José Alexandre Tavares Cuerveito, ao tratar do art. 18, § 3° da LSA, escreveu: “A complexidade processual inerente & consecucao do objetivo desejada pela legislacor de 1476 revela © descompasso entre a lei acionaria e ordenamento processval, a sugerire recomendar, além de esforgos da doutrina e da jurisprudéneia, providancias legislstivas capazes de colocar em consondncia os preceites da lei do anonimato € as disposicdes cle ordem pracessual destinadas a toma-las efetivos, numa perspectiva de praticidade e objetividade” (¢f. “Execugao especifica do acorda de acionistas’, RDM, ¥. 41,1981, p. 66). Anecessidade de um regime especial de nulidades no direito societério foi bern resumida em conhecida e acida eritica que Carvalho de Mendonca dirigiu ao sistema de nulidades da constituicao de sociecades: “O systema legal quanto a nullidade da constituigao das socledades anonymas nao resiste 4 mais benigna censura. Derrantaram-se profusamente os casos de nullidade para afungentare fraude. A preoccupagio tomou-se obsecgio, (..) Asocie- dade exerce a sua actividade e explora 0 seu objecto por loagos annos. Celebra contractos que tiveram execucdo, cria relacdes juridicas; de repende se ve ameacada pela accao de nullidade. Anima-se o appetite dos deshonestos; di-se foros de cidade a profissio indecorosa de deman- dista. O portador de uma acgo que seja, sem ter soffride prejuizo directo, desacredita a mais forte sociedade com a demanda perversa, baseada, nao raro, em futilidades, coma esta: 'eu nao assignei os estatutos, nao obstante ter participado da assembléa constituinte, que os approvou, ter recebido dividendos e vendido com agio as acgOes que subscrevi. Compremas de novo na baixa e pretendo annullare sociedade’!(..) A nullidade resolve-se na dissolucao da sociedade & responsabilidade dos fundadores. Todos os actos praticados pela sociedade nao deviamter, em Figor, existencia juridiea, porque foram praticados por quern nao existia; orcem-se, porém, todas as consequencias, emprestando-se vidaao nada, contiapondo o facto ao diveto.(...) Para que esse Figorse temes instituido 0 reyisto do comimercio, no qual as sociedades depositam os seus docu- _mentoslegaes para paderer funccionar? Porque se nao da aos encaregadosdeste registo 0 direito de verificara legalidade dos documentos fundamentaes da organizagav da sociedade,, isto é, se 0 acto constitutive estd conformed lei ese as condigGes exigidas da sociedade foram cumprida? (.) Porque aleindo se limitaa estabelecersérias responsabilidaes civis e penaes contra os fundadores ques infringicem?”. Com tas fundamentos o ilustre comercialista recomendava que “as nullidades devem ser recluzidas as estrictamente necessarias e em todos 0 caso sujeltas ds seguintes regras: 19, a prescripgao da accao deniro do anno da constituigdo da sociedade; 24, ratificagdo pelas assembléas, funceionando com dois tergos. As infraccdes da le, ds quaes nao fosse comminada a pena de nullidade, teriam como sanceao a responsabilidad directa e solicaria dos fundadores para serem osinteressados pelos prejuizos, perdas e damnos que este sofiressem* (cf. Trafado.., VeIll livro 2, n. 1.002, pp. 372/374)-A esse respeito, v. também llaria Pagni, Le aziontn, Ps 594. 137 Ch Larson.» cap. 7,0. 8, p. 324 138 Ci, Waldirio Bulgarelli, Regime juridico da proteyio ds rninovias das S/A, cap. I, 0. 29: “A transmnissi- bilidade das ages tem sido admitida pacificamente pela doutrina, como um direito irevogivel, considerada como da esséncia das sociedades andnimas™ 139 Conquunto criticada por comercialistas de peso - v,, por exemplo, a critica feita por Waldemar Ferreira em Iratada de direito comercial, . 3, pp. 217/216; mais recentemente, v. Erasmo Valladao. Franca e Marcelo Vieira Von Adamek, ao tecerem eriticas ao conceito de affecio societatis em 'Affectio societatis' e conceite de ‘fim social, in Erasmo Valladao Azevedo @ Novaes Franga, Temas de Direito Societirio, Folimentare Teoria da Empreso, pp. 27 ©sS.-, a distingao entre sociedades de 62 = IMPUGNACAO DF DieuneRAcoes DE Assemntiia Das S/A acada instante mutavel, mas também uma esfera muito vasta de terceiros, so- bretudo nas grandes companhias de capital aberto. A aplicagao do regime de invalidades do direito civil, pois, traria prejuizos nao s6 4 propria companhia!® como a terceiros,'#! Por esses motivos, Giorgio Meo noticia a tendéncia recente do ordena- mento italiano de salvaguardar situages substanciais instauradas com base na deliberagao invalida.”” Da mesma forma, Lucas Enriques e Andrea Zorzi anoram que no direito italiano, sobretudo apés a teforma do direito societario de 2003, passou-se a oferecer com maior vigor a tutela ressarcitéria como uma alternativa 4 tutela especifica (desconstituigio da deliberario), procurando-se privilegiar a estahilidade dos atos societarios.' Também por tal razio € que no campo socictirio procura-se diminuir o radicalismo da nulidade absoluta, atribuindo-se efeitos aos atos nulos e inexistentes, de modo que se impega a retroatividade do reconhecimento do vicio e permita-se a retificagao do ato." Parte da doutrina diz, ainda, que outra particularidade da nulidade da deli- beracio assemblear é que 0 ato nfo é ineficaz ab ove. Nesse sentido Bulhoes Pedreira, para quem no regime especial de invalidade dos atos societarios nao prevalece o enunciado de que o ato nulo nao produz nenhum efcito.* Ademais, prazos decadenciais mais curtos do que os da Jei civil caracterizam o regime em analise e encontram fundamento na dinamicidade da atividade empresarial."° ‘capital e de pessoas continua valida para diferenciar caracteristicas das sociedades empres € para solucionar importantes problemas que surgem no dia a dla desses entes juridicos. 140 CE José Rogério Cruz e Tucel, “Impugnacao judicial.” p. 471: "€ até Intuitive que o interesse na esiabilidade das deliberagdes sociais nao se deve apenas ao fate de tais atos poderem repercutir naesfera de diteitas de um circulo considerdvel de pessoas e, sobretudo, nas sociedades andi masde capital aberto, a todo tempo mutavel, mas, de modo particular, aos danos que podlesiam set experimentadas pela ppl gsti de empress se sues &Impuynaciotem praca mute amplo". 141 CF Vaseo da Gama Lobo Xavier, Anulog@0n 0.75 Ps 99. 142 Ch Glieffetin cap, Ih, n-20, pp.201/203. 143. Ci. “Spunti in tema di rimedi rsarcitori contro invalidita delle deliberaziont assembleari’, Rivista del dirito commerciale, v.104, P|. 144 Cf Waldirio Bulgarelli, “Anulagao de assembléia..,p. 62. 145. Ck.*Regime especial.” p.697. 146 Oat. 286 da LSA reduziu 0 prazo do art, 156 do DL.2.627/40, que estipulava a preserigio (rectivs: decadéncia} em tras anos, Sobre relerido prazo, esclarece Carvalhosa que, apesar de a-atval Let das Sociedadles Andnirras ndo mais estipularque o lapso inicia-se coma publicacdo da ata que instrumentaliza a deliberagio, como fazia o art. 156 do diploma de 1940, essa regra continua em vigor, “pelo simples fato dea eficdeia do mesmo jato societario| somente se produzir a partir do seu atqjuivamento © publicacao” (ci, Comentdrios... V. 4, tl, pp..475/476). NO mesmo sentido, Nelson Eizirik, A Lei das.5/A..v. Ml, pp. 588 &593; Marcelo Vieira Von Adamek, Responsabilidade civil dosadministradores deS/Acas acdes carrelatas,n.7-3.3.24., p-37% € Fran Martins, que inclusive da noticia hist6rica do tramite legislativo do projeto que redundaria na Lei 6.404 € afirma que a mencao do dispositive ao prazo contado “da deliheracao” deve ser tratacla como erro legisiativo (cf. Comentarios d let das SA,,, 3, 9.14750 p. 530). Essas manifesagces doutrindrias justificam-se Guitreame Srtouti Juuo Pereia - 63, No Brasil nao ha nenhuma regra ou principio positivades que acolham expressamente referido regime. Embora disponhamos de uma lei de sociedade or acdes reconhecidamente moderna,’ ela quase nada estabelece a respeito da invalidade de deliberagdes societarias. Tanto é que os arts. 115, § 4° e 286 da LSA — tinicos dispositivos que versam sobre 0 assunto— nao contém:sequer uma palavra sobre um regime especial de nulidades, E mesmo 0 Projeto de Lei n.1.572/11 —que tramita na Camara dos Deputados e que, baseado em minuta elaborada por Fabio Ulhoa Coelho, objetiva instituir novo Codigo Comercial brasileiro’ — nao traz qualquer regra a respeito de invalidades de deliberacées. Doutrina e jurisprudéncia, porém, extraem esse regime do art. 286 da LSA - embora a associagao também deva ser feita com o art. 115, § 4° da LSA |, argumentando que ele estabelece apenas 4 anulabilidade das delibera- goes e, pois, silencia sobre a nulidade. Nesse sentido é a ligao de Luiz Gastao Paes de Barros Leaes, para quem a confirmagao da existéncia de um regime de invalidades societérias sai generis adviria de que a legislago do anonimato nao prevé casos de nulidade e, pois, teria reduzido todas as invalidades 4 anu- labilidade, evitando a ineficacia completa do ato ¢ a restituigio das coisas ao estado anterior.'*” Com efeito, comentando o art. 155 do DL 2.627/40 — que tratava da in- validade da constituigiio de companhia ¢ é hoje reproduzido, com algumas al- teragoes,! pelo art. 285 da LSA -, Trajano de Miranda Valverde anotou que no fato de que a publicagao possulfuncao declarativa e eonstituliva da deliberacao (cf. Romano: ~Pavoni, Le deliberazioni... n.31, p.™4)- a7 Provadisso é que, referindo-se a esse diploma legal, Manoel de Queiroz Pereira Calcas disse que existe “o reconhecimento geral da exceléncia do mesmo e da grande importancia que ele teve na consolidagio de um capitalismo saudavel’ {cf “A reforma da Lei das Sociedades por Agdes", Revista da instituto de pesquisas estudos, n.25, p.17). 148 A minuta foi levada a piblico pelo professor da Pontificia Universidade Ca(élica de Sao Paulo No livre O futuro do diteito empresarial, publicado em 2010 (ct. Fabio Ulhoa Coelho, Principios do diceito comercial, parte |, n.9, 22), 149. Luic Gastdo Paes de Barros Ledes, “Viciosemassembleia-geral ordinaia’,in ésiudosepareceres sobre sociedades anénimas, n. 20, pp. 162/163. A particularidade desse reginve ¢ bem exemplificada na seguinte passagem de Bulhdes Pedreira:"Aineficacia do negscio juridico de sociedade e dos atos dos drgaossocietarios nao esta sujeitaan regime comum do diretto civil, masa regime especial no qual a) nao prevalece o principio de que’o que é nulo nao produz nenhumn efeito';(b) os prazos de prescrigao da ago de anulagao dos atos viciados ou defeittiosos s0 curtos; ¢ (c) 0 vicios ou deleitos pociem ser corrigidosa qualquer tempo, mesmo depois de propostaa acao de anulagio do ato’ (cf. "Regime especial... p..697) 150 Modesto Carvalhosa critica redagao doart. 286 da LSA, que teriaempobrecido a redacao do art.156 do DL de 1940: °O artigo ora comentadoapresenta-se empobrecide quanto asua wedagao, vis-dvis do referido art, 156 do diploma de 1940. Usando linguagem telegrafica, suprimiu-se a conjungio alternativa ‘our entre ‘assembldia irregularmente convocada ou instalada’ e ‘violadoras da lei ou do estatuto’ Essa supressio gramatical, ainda que irrelevante sob o ponto de vista interpretativo, demonstra a singeleza de linguagem do legislador de 1976, que trouxe perplexidade & doutsina sobre o real sentido do texto legal (cl. Comentirios anv 4M, 474). 64 IMPUGNAGAO DE DEUpERAGOES DE ASSEMBLEIA DAS S/A © regime comum das nulidades nao se aplica as sociedades, ao menos nao sent graves desvios, pois como € possivel, indagou o autor do anteprojeto que cul- minou naquele Decreto-lei, sustentar que o nulo nfo produz efeito algum se com base nele surgiram ¢ motivaram-se transformagoes juridicas varias, mui- tas vezes impossiveis de serem retroativamente desfeitas? A regra de que as partes envolvidas por um negécio nulo devem ser repostas ao status quo ante encontra sérios abstéculos no contexto das sociedades comerciais, em especial as por agées.' Dai por que, ainda conforme Miranda Valverde, a lei societé- ria optou por um regramento particular, pautado por (i) prazos prescricionais mais curtos, (ii) irretroatividade dos efeitos da invalidacao ¢ (iii) possibilida~ de de convalidagao ratificagao do ato. Pelos mesmos motivos é que, nao obs~ tante ter dirigido a Valverde criticas veementes, Pontes de Miranda asseverou ser esse regime fruto de uma técnica legislativa profetiva, cujo escopo é evitar danos a terceiros e acionistas ¢, assim, atender 4 fungo social que as socieda- des por agdes desempenham na sociedade.'? E apesar de todas essas conside~ ragdes terem sido feitas a respeito do art. 155 do DL 2.627/40, que tratava da invalidade da constituiggo da companhia, aplicam-se também as invalidades das deliberagdes em geral. A propria opeao legislativa por um regime de mera anulabilidade, como visto, € um claro sinal da institui¢ao de um regime particularizado.' Mas, realmente, no ordenamento brasileiro as deliberag6es invalidas limitam-se as anuliveis? 7-1. EXISTEM DELIBERACOES NULAS NO ORDENAMENTO BRASILEIRO? Nao ¢ s6 a legislagao brasileira que prevé apenas a anulabilidade das de- liberagoes societarias. O ordenamento portugués — que trata do tema nos arts. 151 Vejam-se as seguintes passagens: “O regime comum das nulidades dos atos juridicos nao se ajusta, sem graves desvios, aos organisms que, sob a denominagao de sociedades, associacoes, corporagées, fundagdes, surgem por obra de energia dos homens ¢ atuiam, como sujeitos de direito, na vida social. (..) A afirmacdo de que o ato juridico nulo nao existe, 6 um nada — nihil actumest ~ socobra no mar agitado da vida econdmica. (..) Fragit é a maxima de que 0 ato nulo nao produz efeitos - {quod nullum est, nullum producit effectum’ (cf, Sociedades por goes, v. I, ‘nn. 81, B12 @ B15, pp. 97, 99, 100 € 103} 152 Embora tenha citicadoainterpretagio dada por Trajano de Miranda Valverde (ef. Tratado de dircito privado, 1. LI, n.5.358, p. 95). 153. Apeculiaridade desse regime decorre das vicissitudes das normas de direito societario. Para que se afirme a existéncia de tal regime particular, ndo & sequer necessario invocar-se o chamado principio de conservacao, que, de acorclo com Antonio Junqueira de Azevedo, “consiste, pois, em se procurar salvar tudo que é possivel num negécio juridico conereto, tanto no plano da existén- cia, quanto da validade, quanto da eficacia’ (ck Negécio juridico... cap. 2, n. 5, p. 66). A respeito do principio da conservacao, v. Marcos Bernardes de Mello (cf. Teoria do fato furdico - plano da validade,n. 66, p. 262) ¢, tratando especificamente da aplicacao desse principio as deliberacdes assembleares, Gianluca Guerrieri (ef. Lo nullitd,.., cap. Mn. 8, pp. 194/195). Gutnierste Srrocun Juno Pewsiga ~ 65 560/629 do Cédigo das Sociedades Comerciais, de 1986, que se aplica as so- ciedades andnimas, € no art, 46%, § 19 da Lei de 11 de abril de 1901, que se aplica as sociedades por quotas ~ hoje alude # deliberagdes nulas e anuliveis, mas o revogado art. 146 do Cédigo Comercial, de 1882, versava apenas sobre aanulabilidade. No diteito alemio, até 1937, data da edigao da Adtiengesets (AktG, Lei de Sociedades por Agées alema), nao havia previsio de nulidade das deliberagdes, pois a Adtiennovelle, de 1884, preceituava apenas a anulabili- dade. O mesmo ocorreu com 0 direito italiano, que antes da edigao do Cédigo Civil de 1942, isto é, na vigéncia do Codice di Commercio de 1882, estatuia ape- nas a anulabilidade das deliberagdes (art. 163)2%* Hoje 0 Codice Civile esta- belece também a nulidade (arts, 2.377 e 2.379), embora as duas figuras sejam pidximas em indmeros aspectos."** Também as legislagbes suiga, venezuela- na, mexicana, peruana e argentina nao prevéem a nulidade das deliberacdes.'% Porém, apesar da opgio do legislador de seu pais por um regime de mera anulabilidade, Lobo Xavier defende que a tipologia das deliberacdes invalidas nao pode esgotar-se na disciplina dos dispositivos referidos, Para comprovar essa assertiva, emprega argumento ad absuindum: se a impugnagao do vicio s6 pudesse ocorrer por meio de demanda anulatéria a ser proposta por acionista 154 CLAntigono Donati, Linvadlid.. 1.15.59; € Lobo Xavier, AnvlayGo... pp.108/r09. Este titimo, que defendeacategoriadas deliberagoesnulas,atribui a falta de previsao do regime de nulidade a uma deficiencia daqueles sistemas legistativos, que, porém, logo foi suprida pela doutrina & pela jurisprudencia (p. m). Esse mesmo trabalho tera sido, ainda de acordo com Lobo Xavier, desenvolvido pelas doutrinas e jurisprudéncias suica, mexicana, austriaca e venezuelana, paises onde também faltaria a expressa mengio a deliberagdes nulas. Afirma Lobo Xavier, ainda, que "id no Brasil a distingao entre deliberacdes nulas e deliberacGes anuliveis 6 geralmente omitida pelos autores, Entre os nacionais, a vemos mencionade apenas por Aloysio Lopes Pontes, I, 133 €5s.—que, porém, parece ndo atribuira estas duas categorias a fisionomia que normalmente selhes ascinala; e, porseu tumo, Waldemar Ferreira, nslitvicdes de Direito Comercial, 34 ed. Rio de Janeiro-S. Paulo, 1931, p. 365, fala de ‘culidade absoluta’ de deliberacdes sociais, mas apenas 2 propdsito de uma hipatese particular. Nao obteve aparentemente grande ressonancia, no meio 4 que era destinado, o clara e breve estudo que Ascarell publicou durante o seu exilio brasileiro (cl. Problemas das sociedades undnimas, ct, p. 375 es.) onde sustentava serem compativeis com ‘odireito local as categorias das deliberacoes nulas, ineficazes e inexistentes - para além das de- liberacdes impugnaveis nos termos do art. 56° do Dec-Lei n° 2672 de 26 de setembro de 1940" (cf. Anulagdo., p. 113). Vale dizer que Lobo Xavier fez suas consideragGes a luz do revogado art. 146° do Cédigo Comercial Portugués, de 1882. Hoje, quem regeamatériaé, como dito, oCédigo das Sociedades Comerciais, de 1986, em seu art. 59°. 155 Fm2003, os ans. 2.377, 2378 e, especialmente, 2.379 do Codigo Civil italiano sofreram reforma substancial, mediante a Lei 366, de 3.10.01 € 0 Decreto Legislative 6, de 774.03 ~ que alteraram diversos aspectos do Cédigo Civil a respeito de sociedades de copitais e cooperativas. Para uma andlise dareforma do diet societérioitalianoarespeito de delibaracoesassembleares,v. Erasmo Valladao Franca, ‘Lineamentos da reforma do direito societario italiano em materia de invalidade das deliberacées assembleares’, in Temas de deito societiio, falimentar etearia da empresa, pp. 99/118. 156 CL. Lobo Xavier, Anulagao..,N.7,p.109, note ¥8.A edi ter havido alteragées legislativas depois dela, jo dessa obra éde1998 e, portanto, podem 66 - IMPUGNACAO DF DrtjackAGoes DF Assomatcia nas S/A = que no direito portugués deve fizé-lo dentro do exiguo prazo de 30 dias)” = estaria nas maos dos sdcios a escolha de estabilizar todo e qualquer efeito contrério 20 estatuto ou a lei, O mesmo ocorreria em caso de rentincia pelos acionistas do direito 4 anulagao ou, para os que defendem a ilegitimidade do sécio para anular deliberaco para a qual proferiu voto favordvel, de deliberacao aprovada por todos os acionistas.!%8 Alem disso, nao sendo a deliberacao nula passivel de confirmagao, também nio se poderia permitir que ela se convali- dasse pelo tempo, pois o que nao € concedido aos sdcios direramente (confir- magao) também nao pode ser dado pela via obliqua." Admitir a inexisténcia da nulidade, assim, significaria permitir que os sdcios regrassem a vida social ao completo arrepio da ordem juridica, razdo pela qual defendeu Lobo Xavier gue os tipos de deliberacdes invilidas extrapolam a previsio legal podem ser também de nulidade e ineficacia,!™ De forma aniloga, Erasmo Valladao Franga escreveu que 0 argumento de- cisive contra a adogao de um regime de mera anulabilidade no direito brasilei- ro é 0 de que, se todo e qualquer vicio importasse unicamente em sangao com os caracteres préprios da anulabilidade, seria permitido aos acionistas produzir e cristalizar os efeitos juridicos que bem entendessem: passados os dois anos do prazo decadencial do art. 286 da LSA ou havendo remincia 20 direito de impugnagdo, convalidar-se-iam todos os vicios, gerando-se a absurda situacao de que deliberacdes ilegais seriam acobertadas pelo manto da imutabilida~ de, Por isso, de acordo com o renomado comercialista, é inegivel que nao ha como afastar do terreno das deliberagées a aplicagao do regime das nulidades do Cédigo Civil, de tal sorte que a nulidade da deliberagio pode ser alegada por qualquer interessado ou pelo Ministério Publico e deve ser pronunciada de oficio,"' além de ser vedada a sua ratificagao.* 157 Conforme oan.56 do Cédigo das Sociedades Comerciais, de 1986, antes do qual vigorava.v prazo de20 dias, previsto pelo revogado art.146 da Codigo Comercial, de 1882. Lobo Xavier faz mengao a9 prazo do Cadigo Comercial, uma vez que apresentou sua tese em 1973 ea publicou em 1976. 158 Cf Anulucdo... nn. Beg, pp. 123/127, 143 € 146. 159 Ch. Lobo Xavier, Anulagao... n. 9, p- 146. Embora esse autor utilize a patavra convolidacdo como algo que os sécias nao podem fazer diante de uma deliberacao nula, cremos que quis se referir figura da confirmagao. 160 Cl. Anula¢Gid.n 0.8, pp.126/126 161 Emsentido contrario, o seguinte julgado: “nao pode o juiz, de oficio, mesmo nos casos em que ainda nao atingido 0 termo ‘ad quem’ do lapso prescricional, reconhecer e ilegalidade da deli- beragio e declars-la nula” (ST), 42 Turma, RESP n. 35.230-0, Rel. Salvio de Figueiredo Teixeira, DJ 2041.95). 162 Ci. Invatidade.....16, pp.73/75. Farbém Ascarelli(ef.“Vieios das deliberagbes..n.3, pp-374/375 © 385/386), Pontes de Miranda (cf, Iratado de direito privado, t.50, n. 5.322, pp. 288/295)e Ricardo Tepedino (cf. Direito das compantias,v. |, 0. 261, p. 974), pata citar alguns, aclotaram o meso entendimento, Gutnerme Serocun Juuo PeReika ~ 67 ony, faaendo wn contraponto& posig de Valladao Franco, hi quem, poy seileiro, negue as deliberagdes nulas,!® ow as restrinjam x hipéte ep especificas. acreditamos que as deliberagoes assembleares nulas ie fate : ds, Mas discordamos de que nao se sujeitam a decadéncia e onvivem ent ypugnadas sem limite de prazo: Ou seja,as deliberagoes nulas oases lento se aplica o cinone de que podem ser desconstituidlas a TS coments Compartilhamos do entendimento de que a deliberacao Fer cr eotar cubmetida a um prazo decadencial mais alongido do que ae a ae (embora nao a nenhum prazo), mas diante da redagao do art. eu LSA esta € uma posigzo defensivel apenas de /ege pate Na nossa : sdutity= jiacse, tio pode ser disconsiderada =, poucosm- Hee ree hakinasdelberaioye dieito de impugpd-o estar erape ace ao prazo decadencial bienal. ch —_ © art.286 da LSA expressamenteetabelee que ocisito a desconstin- cao da deliberagio invélida esvai-se em dois anos e,apesar de, 20 inept legal, nao estarmos atados A sua literalidade, nao podemos simplesment Fol der palavras da lei." Se esta estabelece X, nfo podemos dela ex- Sas cuen sabe X com algum temperamento, mas nao Y. en menos portato, art. 286 da LSA sinlza~ pars dizer pouco— na dzeio de qu a ordenamento quer que, independentemente da natureza do vicio que o inguina, o.ato se convalide ent dois anos. ay Verdade que vai contra o senso de justiga a ideia de es aelibatgte ae gais tornem-sc imutaveis porque nao impugnadas dentro de certo prazo. no di ges muito espect Apesar disso, : / 10) 6) CL Wa Gado detaos Lees, Nicos et sere geal n.20, pp 162/163: Tae rae ) (iranda Valverde: Socredades por acdes, v1. By), Bize BN, ep mae nye ane ini "Le eresse, possibilidade juridica e coisa julgad Fea iberaces soca navi Lie arshall ecullherme Slog Pereva coords) Proceso Gy Pars Nello Unik 6 se pole eogitar de nulidade absolut diane de disposicao estautéria 1 r iil ontraria slei (ch Ler das $/A.« I pp ZOVSBEC5R0) | sctno canard 165 Arespeitodisso, vestigsnt possitadharicie Weisiitatad sei ead at dad re ak ssconsideracao da coisa julgada, apontamos que’ ao: ae ree Se ren cee eases Seewceido. eninguém parece com es seimportar~ que ha lmitesra aiid erretatnvas malsainda, que esses limites tem uma ezko de se guecade regain sone jetivi julgador®. Na mesma ocasido, tivernos i a ae eee tarteatenar parzofaodequedevehaver umminimo deconformisadeno tte egal pois do cso contain, ena o mesmo que repr inteba onstaa,os Cidgos eos dena diplomas juridicos. € dizer, na medida em ae, ens estar tervien iva, sisternética, conformea Constteicdo et, s¢ desprenda ct > olenuuaey ees de ordenamentssjuridico enquanto conjuinto ardenado de legal, esvazie-se por normas’ (cap. 6.7, pp. 89/90). G8 - ImPucnacAn De DevineracOrs DF ASstAutna DAS S/A outro lado, igualmente injusto seria que elas fossem indefinidamente precérias, eterna espera de que algum interessado pedisse a sua invalidacao, Mesmo os ilcitos penais, salvo poucas excesdes, sujeitam-se A preseri¢ao, por mais gra- ves que sejam. E correto que os prazos prescricionais para a pretensio puni- tiva de crimes graves sto bem mais alongados que o prazo bienal do art, 286 da LSA, mas € também verdade que o direito penal é a wdtima ratio ¢, assim, os bens juridicos por cle tutelados sio, em tese, mais relevantes do que os que podem ser violados por uma deliberagao invalida, Note-se, ademais, que hii outros ordenamentos que nao s6 contam com pracos pura 2 impugnaczo de deliberegao anulivel muito mais curtos do que 08 nossos dois anos, como também fixam prazo para a impugnacio de delibe- ragio nula. E 0 caso, por exemplo, do sistema italiano, que prevé 30 dias para 4 primeira demanda ¢ trés anos para a segunda, ressalvada apenas a delibera- $ao nula que institua objeto social ilicito ou impossivel, hipétese em que nao ha prazo para o exercicio da pretensio (arts. 2.377 e 2.379). E mais. Apesar de o art. 169 do Codigo Civil fixar que 0 nulo nio con- valesce pelo decurso do tempo e, assim, acalher o que-afirmou a doutrina tra~ dicional (quod nuttum est nalle lapsw temporis cornvalevere potest, ou, 0 que é nulo no pode ganhar forga com o decurso do tempo), nomes de peso, com ra740, afirmaram que o nulo esta sujeito a decadéncia. Buzaid, com efeito, alertou que o preceito de que as demandas meramente declaratérias — geralmente as- sociadas 4 impugnagao dos atos nulos — nao estao Sujeitas a lapso temporal é uma regra, que, como tal, comporta excegoes.” Caio Mério da Silva Pereira, por sua'vez, defendeu que a paz social, a favor da qual milita a prescricdo c a decadéncia, deve prevalecer sobre o resguardo da ordem juridica, de maneira que nao haveria direitos imprescritiveis Também Agnelo Amorim Filho, em 166 Emboratambem haja ordenamentosque exemplo, 0 Codigo das Sociedades Co: demanda de anulagao de deliberacao ( de nulidade, 0 que leva a doutrina a d Olavo Cunha, Direito das sociedades cer 167 Sob a vigencia do Cédigo Civil de 1916, Buzaid leu os exemplos da acao de contestacdo de le- siimidade da fllacao (ar. 178, § 3°); aco dos herdeiros do filho para prova da legtimidacle da {lacie (art. 178, § 6°, Xi} € ago do filho natural paraimpunar o reconhecimento(art-178, 9°, VI) (ef. ago declaratéria no direito brasileiro’, pp. 162/166). 168 Nesta diregdo: “Estio, pois, um contra o outro, dois principios de igual relevancia social: o nio- convalescimento do ato nul tracty emporis €0 perpétuo silencio que se estende sobre osefeitor do negscio juridico também zacty tempor clo confront entre estas dues nommas,igualmernte apdiadas no interesse da ordem publica, continuosustentando que nio ha dieos imprescrtivek Cp gtanto, Perante o nove Cédigo, a declaracao de nulidade prescreve am dez anos (art. 206)" (ct “Instituicdes.. v. I, p. 542). Silvio Venosa, que pantlhava dessa posicao no CC/16, delende ue, diante do ar. 169 do CC/o2, 0 ato nulo &sim imprescritivel (cl. Direto cil v1, p. 595). No Greta itallano, Bett jé apontara que a iwvalidagéa do matrimdnio era sujeita a uma panicle disciplinam a questio de forma diversa. Fm Pomugal, por merciais firma o prazo de 30 dias para o aluizamento da (art. 59°), massilenciaa respeita do prazo para ademanda lefender que esta nao esta sujeita a prazo algum (cf, Paulo imerciais, 9. 30.6.3, P. 708), GUILHERME SHOGUTI JULIO PEREIRA ~ 69 texbatho ainda hoje fundamental para o estudo da prescrigao © da decadéncia, jou que existem. demandas que, como a de nulidade de ato subi se- ae ae enas aparentemente declaratorias, ji que na realidade sao constitutivas es pois extirpam 0 ato do mundo juridico. Em reforgo desse entendi- mento, invocon os atos nulos que produzem efeitos permanentes € ue inclu- sive chegan a se convalidar, como ¢ 0 caso do casamento putativo.’” E, pela Ieitura de seu artigo, parece-nos que, se indagado sobre 2 demanda de anuls- gio ou de nulidade de deliberagao assemmblear, esse autor diria que ambas esto sujeitas a decadéncia, pois, como visto anteriormente, em sua teoria as deman- das de nulidade de atos juridicos sto constitutivas (e nao declaratorias). Com pensamento andlogo, Humberto Theodoro Jr. defende que a teoria moderna distingue entre negécios nulos que produziram efeitos conctetos & os gue no: os produziram. Se oato invilido nao foi efetivado, isto é, nao produziu efeitos, deri ser objetada a sua invalidade a qualquer momento, sem que se cogite de decadéncia. Se, contudo, apesar do seu defeito, produziu seus efeitos natu- raise criow situagées para as partes envolvidas,estd sujeito 8 decadéncia, pois a seguranga juridica nao pode ficar indefinidamente em xeque. Se o nulo nao esta a salvo da decadéncia nem no direito civil, 0 que dira no direito socieririo. Nesse sentido, j4 entendeu o STJ que “a teoria das nuli- dades de Direito comum nio sc aplica, de ordinario, em matéria de socieda~ des anénimas, de modo que 0s atos societarios nulos prescrevem nos prazos previstos na lei societéria”” e que “o direito de impugnar as deliberagdes to- madas em assembléia, mesmo aquelas contrarias 4 ordem legal ou estatutéria, sujeita-se a prescrigdo, somente podendo ser exercido no exiguo prazo previs- to na Lei das Sociedades por Agoes”."”* Portanto, a despeito de a lei referir-se apenas a deliberagoes anulaveis, as deliberaces nulas convivem entre nés. Mas também elas estao sujeitas ao pra- zo decadencial do art, 286 da LSA. Essa regra geral apresenta apenas duas ex- cesdes, pois hé dois casos em que, embora nao se posca dizer que nao se aplica © prazo do art. 286 da LSA — porque ele se aplica indistintamente a qualquer situacao —, em termos priticos é obtido o mesmo resultado como se aquele nao forma de caducidade em periados breves (um ou trés meses) (cf. Teoria general. 8. 587, P. 356), ‘em razio das ji tantas vezes referidas particulariclades de tratamento que o direito material dos mais variados dispensava ao casamento.O mesmo raciocinio aplica-se as invalidades societérias. 169 Ch. *Critério cientifico..’, pp. 742/743 © 747/748. 170 Cf, Notas a Orlando Gomes, Introdugio ao direito civil, 286, p. 485. 171 REsp 1.046.497, Rel. Joao Otavio de Noronha, DJ 9.1130. 172 ST), REsp 35.230-0, Rel. Silvio de Figueiredo Teixeira, DJ 20.11.95. 70~ IMPUGNACAO De DILintRACOES DE ASSIMBLEIA DAS S/A se aplicasse. Tais hipdteses so: (i) norma estatutaria nula e (ii) deliberagao mula que viole a lei e cujos efeitos sejam constantemente produzidos. A primeira hipétese € de modificacito do estatuto social por deliberagio nula, da qual sto exemplos a fixacio da “comercializagao de drogas” ou da “prestagao de servigos de assassinato” como objeto social.” A deliberagao que alterou 6 estatuto continua sujeita ao prazo decadencial de dois anos, mas a norma esta~ tutiria poderi ser impugnada sem limite de tempo. Nada impede que se peca também a desconstitui¢io da deliberagao; mas, para tanto, a pretensao esti su- jeita 20 prazo do art, 286, De toda forma, para que se atinja o fim pretendido no mais das vezes bastard anular a norma estatutéria, mesmo que nao se anule deliberagao que the deu origem. A norma estatutéria € um efeito da deliberagio, que se destaca desta. Existe, nos dizeres de Comparato, uma separapao ebje rva entre elas, que sio ontoldgica € cronologicamente diversas. De modo similar ao que ocorre com a lei, que apés o trimite legislativo passa a ter existéncia juridica auténoma, também a norma estatutiria desprende-se da deliberacdo que a criou. Além de haver diferenca on¢o/dgica entre as duas figuras ~ pois a norma é um comando geral ¢ abstrato, dirigido a todos, ao passo que a deliberacao é um ato pontual e dirigido a sujeitos determinados -, ha também diferenga cronolégica: enquan- to a deliberacao é um fato juridico pontual, a norma se protrai no rempo."”* E essa diversidade gera diferenga também no tratamento das invalidades.!* Quando se pede a desconstituigéo de uma norma estatutaria, 0 objeto do provimento nio seré um ato cu relasao juridica em particular, mas sim um enunciado geral e abstrato. A norma invalida insere-se em uma hierarquia nor- mativa e, assim, é como se a violagao seja constantemente renovada. Por isso € que para o reconhecimento da invalidade de norma estatutaria nao hi que se 173. Também Ascarellidefendeu queanulidade do contrato social pode sersempre invocada(cf."Os vicios de constit 1.15, p.367) 174 Ch."Da imprescrtibilidade..., p. 219. Também Nelson Eizirik entende que a iinica hipatese de nulidadeabsolutaéa da disposigdo estatutdria contraria a lei, de modo que, emrazao daestrutura estalonada das normas, “o estatuto integra 0 ordenamento juridico societario de determinada Companhia @ suas regras retiramo seu fundamento de validade das normas superiores contidas na Lei das S.A. Assim, uma disposicao estatutaria conflitante com a Lei das S.A no existe como norma juridica, podendo ser declaradaasua nulidadea qualquer tempo" (CfA Lei das $/Au., . Ml, PP 587/588 © 592). 175 Mais uma vez invoca-se Comparato: “como direito objetivo que é, como sistema normativo, 0 estaluto esta submetido.a regras de validade bem diferentes das que disciplinam osatosjuridicos” (ch."Da imprescritibilidade.., pp. 222/223). a Guntime SeToGUT JULIO PesriRa = 71 falar em decadéncia,”” Mas, repita-se, para toda e qualquer deliberagao, apli- carseo prazo bienal do art.286 da LSA. os ‘A segunda ¢ tltima hipétese em que 2 deliberagao nula pode ser imps adaa qualquer momento € da deliberarao mula que viola a lei e cujesefei * ‘ temente renovaidos no tempo. Eo caso, por exemplo, da deliberagto q rice estrangeiro para administrar empresa jornalistica, em violacao ao art. ee CF 7 og efeitos da deliberacao nao se esgotam no momento em que camprida, todd-9 per cer no cargo. Também nesta situagio nfo é que o prazo do 0 periodo em que o estrangeiro permane- mas perduram por todo o pi eae pas a al oath ad nfio se aplique; ele se aplica, mas como a violagao é constante € hue : ai si ‘ituti é é fan termo @ quo para o exercicio da pretensio desconstitutiva € também cons! temiente renovado. Essas duas excegdes conciliam 0 art. 286 da LSA com a impossibilidade de que se convalidade norma estatutiria nula ou deliberario nula violadora de Ici e cujos efeitos sejam produridos permanentemente. Outra safda talvez seja aceitar e alargar a categoria das deliberacoes juri- dicamente inexistentes, Nesse sentido, em um baie artigo escrito em sree 2 Carnelutti, disse Ascarelli que, embora as consequéncias da inexisténcia e ‘ nulidade possam coincidir, a distingio entre as duas figuras . an bie ie e se evidencia em situagdes em que a lei alude apenas a anuilabilida a térprete nfo vé como encaixar nessa categoria uma hipotese ea - a situagdes em que 2 lei também regula casos de nulidade mas a ee a a permite encaixar 0 caso concrete," Caso este caminho seja ae bupertt desde logo deve ser feito o alerta de que a inexisténcia esta, como ies fe ligada a uma existéncia aparente ou a falta de elementos Se ba ridico™” — que, em regra, diz respeito 20 trindmio sujeito, objeto ‘ dai por qu ¢ fora dessas hipéteses, nao é correto falar em inexisténcia, sobretu- do pragmaticamente, com o intuito de afastar a decadéncia. 176 7 178 79 160 1s fundamentas: a imprescritibi- Comparato 0 faz por eutros fun i canto. de invalidade da norma estatutéria decorre de mas sim da "comunidade para a Embora chegue a mesma esehaan$ i Visa a0 re tre ere ous enjopo rao sao ress peso Guala norma foieditada’ (f."Da imprescritbilidade..”, pp. 224/225) Exemplo colhido em Erasmo Valladao Franga, Involidaden 1.16, P73 CF "Inesistenza e nullta’ in Problemi giurdic,t\,pp-227/228, : simtadtieey: Cf. Trattoto di dirtto comerciale, vi, 1.521, p.253.A fespeito: dante ke enc dadelibaracS Valentino Sanna, “Linesistenza delle selenslon ee lel jae Te ania mencionados - sujeito, objeto e forma, nao € qualquer vicio que seaisto geraruma decisto ualiicével camo fxn” (eh Acco rescsriau» n-78, 245). 72> IMPUGNAGAO DE DILIMERACOES BF ASSEMBLEIA DAS S/A, sempre a via da tutela ressarcitéri Vale lembrar, por fim, que, fechada a porta da tutela especifiea, restart . Essa é, alids, uma tendéncia do direito ita- Tiano, sobretudo apds a reforma de 2003, pela qual, procurando privilegiar a estabilidade dos atos societatios, o legislador evidenciow a tutela ressarcitéria como uma alternativa tutela specifica." Por isso, nem se diga que a posicao ora defendida seria restritiva do direito de acesso 4 Justiga. E como se 0 legis- lador optasse por, em se tratando de litigios societirios, restringir a tutela des- constitutiva e dar prevaléncia a tatela condenatéria (indenizat6ria), na premissa de que © custo econdmico que a pos ‘© contraria representaria é muito gran- de, Opta-se por restringir direitos em prol do caminhar da vida societaria,!® 7-2. INEXISTENCIA, NULIDADE, ANULABILIDADE E INEFICACIA DAS DELIBERACOES A tipologia dos vicios das deliberagdes assembleares, assim como a dos atos juridicos em geral, obedece, antes de tudo, i vontade da lei. Trata-se, por- tanto, de questéo de politica legislativa." Mas, independente disso, também va 182 183 Luca Enriques & Andrea Zor, com efeito, apontam que “la riforma del dirtto da del : {pens angiederesmycimertoem fworde quem sesagou woroxo na dojucl Andrea Pissani Massarmormile, “Invalidita delle delibere assembleari, Stabilita ed ett ee fers commerciale e det dirito generale delle obligazioni, n.102, pp. 55/57): Tam| : m meet epoetan que ‘Nullita © annullabilita della deliberazione non costituiscono a loro volta hee iene nome generali del riegozio giuridico” (ct. ‘Vinteresse sociale del'art, 2441 Cod. Civile, 187 CF. Erasmo Valladao Franga, fnvalidade..., n.19. 74 ~ IMPUGNACAD DE DetineRAGOES DE AssentnLein Das S/A serd visto a seguir, entendemos que no direito societario sio bastante reduzi- das as diferengas entre nulidade ¢ anulabilidade. Também valida € 1 cbserva- fo de Comparato de que é preciso ter em mente que a LSA estabelece uma verdadeira distingao de natureza entre sociedades abertas e fechadas. Naquelas predomina 0 aspecto institucional, pautado por um mimero maior de dispo- sigdes inderrogaveis pelos acionistas, ao passo que nestas predomina carater contratual, marcado por maior liberdade conferida aos acionistas na regulagio dos interesses da companhia, Por isso, ao analisar a hipdtese concreta procu- rando coneluir quanto ao tipo da mécula que contamina a deliberagao, o intér- prete deve verificar se esta diante de sociedade de capital aberto ou fechado, Partindo da distingao entre os trés tipos de vicios que a confusa redacao do art, 286 da LSA misturou, Erasmo Valladao Franga sustenta que no direi- to brasileiro 0 witio no conclave é sancionado com a anulabilidade. Embora 2s normas relativas 4 convocagio, A instalagao ¢ As demais formalidades da as~ sembleia sejam imperativas, como a lei expressamente dispde que 0 conclave é anulavel, assim deve ser. Provavelmente porque o legislador entendeu que esses vicios violam apenas uma assembleia em concreto e, consequentemente, apenas 0s direitos dos que compoem o quadro acionirio naguele momento, que, se qui- screm, deverao tomar a iniciativa de propor a demanda anulatoria.**” Portanto, dei diritti individual e il sistema det viei delle deliberazioni assembleati, in Problem giuridic, |, p.533). V, ainda, Corrado Ferri, “Le impugnazioni di delibere assembleari. Profili processuall’ Rivista trmestrate di dltitio e procedura civil, UX, p. 52; e Francesco Terrusi, invalidity, 0. 51, Po 220, E embora essas observacdes tenham sido claramente feitas com base nas peculiaridades do dircito italiano, aplicam-se, em grande medida, a nossa realidade. 186 Cf. “Anatureza da sociedade andnima e a questao da derrogabilidade das regras lepais de quorum nas assembleias gerais e reunides do conselho de administracao’, in Novos ensafose pareveres de diet ernpresarial, n. 3, p. 19. Citande esse artigo, Erasmo Valladao Franca, Conflito de interesses nas assembléia de SA, cap. In. 4, p48; € Involidade..., 1.19, p. 87, embora o referido autor res- salve que “6 dbvio que a ‘ampla liberdade de estipulagao’, a que se refere Comparata, é muito relativa, pois existem intimeras disposigoes de cardter cogente que se aplicam indistintarnente ambos os tipos desociedades, notadamente no tacante a sua estrutura’, A consideracao entre e natureza aberta ow fechada da companhia é defendida também por Carvalhosa na afericao da conduta do administrador para fins da responsabilizagao prevista pelo art. 158 da LSA. Para esse Jurista, em se tratando de companhias com capital disperso e sem controlador definido, exige-se ainda maior rigor na conduta dos seus administradores, pois estes exercem a dupla funcao de gestores ¢ condutores da politica empresarial (policy makers), ja que nao & possivel identiticar um controlador |ef. Comentariosin 3° ¥ pp. 436/438 ¢ 426). De modo similar, Jaeger apontou, haver radical diferenca entre a sociedade em que os sécios constituem um grupo delimitado ea sociedade dee “grandissime dimension’, que apresenta quadro acionario numeroso e flutuanto, ‘© que, contudo, nao justifica um tratamento diferenciado a respeito da tutela do interesse social (cf. Linteresse sociale, cap. 'V, n.14,p. 163). pp 88/97. Esse mesmo autor, porém, ressalva duas hipoteses: auséncia de convocacio e auséncia de quérum de instalagao. A primeira seria caso de nulidade, poisseo ant 286 dirigeaanulabilidadeaassembléia iregularmente convoceda, ando convocade 56 pode ser nula, Jaa assembléia irregularmente instalada seria apenas anulavel Além disso, Erasmo Valladio Franca aponta outros casos de vicias da assembléia ou do conclave: inobservancia da ordem do dia (ISA, art. 124, caput), recusa de participacdo ao acionista (ISA,

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