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Prefácio e saudação

1 Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos eleitos que são forasteiros da Dispersão no
Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia,
2 eleitos, segundo a presciência de Deus Pai, em santificação do Espírito, para a
obediência e a aspersão do sangue de Jesus Cristo, graça e paz vos sejam
multiplicadas.

Ação de graças
3 Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua muita
misericórdia, nos regenerou para uma viva esperança, mediante a ressurreição de
Jesus Cristo dentre os mortos,
4 para uma herança incorruptível, sem mácula, imarcescível, reservada nos céus para
vós outros
5 que sois guardados pelo poder de Deus, mediante a fé, para a salvação preparada
para revelar-se no último tempo.
6 Nisso exultais, embora, no presente, por breve tempo, se necessário, sejais
contristados por várias provações,
7 para que, uma vez confirmado o valor da vossa fé, muito mais preciosa do que o
ouro perecível, mesmo apurado por fogo, redunde em louvor, glória e honra na
revelação de Jesus Cristo;
8 a quem, não havendo visto, amais; no qual, não vendo agora, mas crendo, exultais
com alegria indizível e cheia de glória,
9 obtendo o fim da vossa fé: a salvação da vossa alma.
10 Foi a respeito desta salvação que os profetas indagaram e inquiriram, os quais
profetizaram acerca da graça a vós outros destinada,
11 investigando, atentamente, qual a ocasião ou quais as circunstâncias oportunas,
indicadas pelo Espírito de Cristo, que neles estava, ao dar de antemão testemunho
sobre os sofrimentos referentes a Cristo e sobre as glórias que os seguiriam.
12 A eles foi revelado que, não para si mesmos, mas para vós outros, ministravam as
coisas que, agora, vos foram anunciadas por aqueles que, pelo Espírito Santo enviado
do céu, vos pregaram o evangelho, coisas essas que anjos anelam perscrutar.

Contexto Geral da Primeira Carta de Pedro


V.1 Para compreender uma carta é importantíssimo saber, quem a escreveu?
Resposta - O apóstolo Pedro quem escreveu e ele está em “Babilônia” (5:13),
que, provavelmente, seja uma maneira de falar da cidade de Roma (ver Ap
14:8; 16:19; 17:5).

e a quem foi dirigida?


Resposta - A Primeira Epístola de Pedro foi escrita para os cristãos que viviam
em cinco províncias romanas que ficavam numa região que hoje faz parte da
Turquia.
Uma carta antiga era escrita na forma de um rolo epistolar.
A assinatura, portanto, não podia ser lida de imediato.
Por isso era costume que o introito da carta já trouxesse a indicação do
remetente, do destinatário e uma palavra de saudação.
Também Pedro segue o estilo epistolar de seu tempo. Pedro, apóstolo de
Jesus Cristo: é assim que o remetente se define.
Pedro significa “rocha”. Esse é o novo nome que o próprio Jesus deu a seu
conhecido discípulo Simão (Jo 1:42; Mt 16:18; para pormenores, veja a
Introdução).
O Senhor deu-lhe a incumbência: apascenta minhas ovelhas (Jo 21:17).
Por isso fortalecer a igreja,
Apascentar o rebanho de Jesus também constitui a intenção
fundamental dessa carta.
O propósito da Carta: Então, fortalecer e apascentar os seus leitores é sua
incumbência. Eles estão enfrentando sofrimentos e perseguições por causa
da sua fé.
Ao procurar animá-los a continuarem firmes na sua dedicação a Jesus
Cristo, o apóstolo mostra que os sofrimentos servem para provar que a fé que
eles têm é verdadeira (1:7).

Exemplo cristocêntrico: Ele cita o exemplo de Cristo, que suportou o


sofrimento e a morte em favor deles;
Aconselha que eles, por sua vez, sigam o exemplo do Mestre (2:21–25).
Recomenda que, acima de tudo, eles vivam uma vida que traga honra e glória
para o nome de Deus (1:15–16).

E o autor faz lembrar de novo aos leitores a razão de eles terem sido salvos:
“Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de
propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes o daquele
que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (2:9).

Esboço do conteúdo:
Prefácio e saudação (1:1–2)
1. Regenerados para uma viva esperança (1:3–12)

2. Conselhos e recomendações aos crentes (1:13–2:10)


a. Chamado a uma vida santa (1:13–2:3)
b. Chamado a aproximar-se da Pedra Viva (2:4–8)
c. Chamado a proclamar as virtudes de Cristo (2:9–10)

3. Exortação à vida cristã exemplar (2:11–4:19)


a. Vivendo como servos de Deus (2:11–25)
b. Vivendo como servos na família (3:1–7)
c. Vivendo como servos na conduta diária (3:8–4:11)
d. Participando nos sofrimentos de Cristo (4:12–19)
4. Recomendações aos anciãos e jovens (5:1–11) Saudações e bênção
(5:12–14)

Pedro designa-se como apóstolo: isso significa mensageiro, emissário.


Um apóstolo de Jesus.

Em primeiro lugar, temos no envelope, por assim dizer, o nome e o título do


remetente.
Em seguida, temos o endereço, ou seja, o autor está enviando sua carta aos
destinatários que vivem em diversas partes da Ásia Menor.
Esse envelope contendo a carta é levado de um lugar para outro.
1 Pedro, um apóstolo de Jesus Cristo, ao povo eleito de Deus, forasteiros no
mundo, dispersos no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia.

a. Nome.
Pedro é breve e direto ao apresentar-se. Ao invés de dizer que é Simão,
filho de Jonas (Mt 16.17), ou Simão, filho de João (Jo 1.42; 21.15–17),
ele usa o nome Pedro.

Esse foi o nome que Jesus lhe deu quando André o apresentou ao
Senhor. Jesus disse: “Tu és Simão, o filho de João.
Tu serás chamado Cefas (que quer dizer Pedro)” (Jo 1.42). Conforme
explica a nota de rodapé da New International Version, “Tanto Cefas
(aramaico) como Pedro (grego) querem dizer rocha”.

O nome que Simão recebeu de Jesus reflete seu caráter, talvez nem
tanto durante os anos de ministério de Jesus, mas certamente depois
que Pedro foi restaurado (Jo 21.15–23). Como líder da igreja de
Jerusalém, Simão passou a ser conhecido como Pedro ou Simão Pedro
(ver, por exemplo, as muitas referências em Atos). Coincidentemente,
apenas duas vezes no Novo Testamento “a forma semítica mais precisa
– Simão – é usada” (no grego, At 15.14; 2Pe 1.1).

b. Título.
Pedro expressa sua autoridade e influência usando o nome que Jesus
lhe deu quando se tornou discípulo de Cristo.

Ele é o único que tem esse nome e é reconhecido como líder da igreja.
Pedro também se autodenomina “apóstolo de Jesus Cristo”. Apesar
de pertencer ao círculo mais íntimo dos 12 discípulos durante o
ministério de Jesus aqui na terra, Pedro se coloca no mesmo nível que
todos os outros discípulos.

De acordo com suas palavras, ele é apenas apóstolo, e não o apóstolo


de Jesus Cristo. Pedro não precisa explicar ou defender seu apostolado,
como, por exemplo, é o caso de Paulo na maior parte de suas epístolas
(ver Gl 1.1). Pedro se refere a si mesmo simplesmente como “apóstolo
de Jesus Cristo”. Junto com os outros apóstolos, Pedro recebeu o
derramamento do Espírito Santo no dia de Pentecoste, e, assim,
proclamou a ressurreição de Jesus (consultar At 2.1–4). Além disso, ele
recebeu o ofício de apóstolo para o resto da vida. E, por fim, ele recebeu
a comissão de Cristo de fazer discípulos de todas as nações, batizando-
os e ensinando-os o evangelho (Mt 28.19,20).

O termo apóstolo tem uma conotação mais ampla do que as palavras


aquele que foi enviado.
Além de ser enviado, um apóstolo recebe plena autoridade de Jesus
Cristo.
Assim, ele não transmite suas próprias idéias sobre a mensagem
daquele que o envia.
Conclui-se, portanto, que, em sua epístola, Pedro escreve com a
autoridade divina que lhe fôra dada por Jesus Cristo. O nome composto
Jesus Cristo aponta primeiro para o ministério de Jesus na terra e, em
segundo lugar, para o chamado, a tarefa e a posição divina de Cristo.

Jesus Cristo comissionou Pedro para servi-lo como apóstolo e escrever


esta epístola geral às igrejas na Ásia Menor, isto é, na Turquia dos dias
de hoje.

c. Destinatários.
Quem são aqueles a receber esta carta?
Antes de Pedro nos dizer onde vivem, ele os descreve espiritual,
social e politicamente.

Escreve sua carta “ao povo eleito de Deus, forasteiros no mundo,


dispersos no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia”. Eleitos de Deus.
No grego, o adjetivo eleito ou escolhido aparece no plural e sem as
palavras de Deus para qualificá-lo. Dentro do contexto da epístola (1.2;
2.4,6,9), o adjetivo significa que Deus escolheu os leitores. Eles são seu
povo, separados do mundo, sentindo o ódio do mundo e suportando
sofrimento e perseguição.
Ainda assim, são os escolhidos a quem Deus favorece e ama. De toda a
raça humana, Deus escolheu seu próprio povo.
“Porque muitos são chamados, mas poucos escolhidos” (Mt 22.14).
Além disso, no contexto mais amplo da epístola, Pedro ensina o
propósito da eleição:
“Mas vocês são um povo escolhido,
Um sacerdócio real,
Uma nação santa,
Um povo pertencente a Deus,
Para que vocês possam proclamar os louvores a ele,
O qual os chamou da escuridão para a sua maravilhosa
luz”(2.9).
Forasteiros no mundo. Os cristãos são moradores estrangeiros deste
mundo (Hb 11.13).
Aqui neste mundo, não estão em seu lar, pois sua estadia na terra é
temporária (1Pe 2.11).
Sua cidadania é do céu (Fp 3.20). Portanto, sendo eleitos de Deus,
vivem aqui na terra como exilados e residentes temporários. Dispersão.

A palavra Dispersão (diáspora) se refere ao exílio e seus resultados. O


povo judeu havia sido expulso de sua terra natal e vivia disperso (ver Jo
7.35). Além do mais, depois da morte de Estêvão, os judeus cristãos
foram espalhados e tiveram que ir morar em outros países (At 8.1;
11.19; Tg 1.1). Pedro está se referindo aos judeus cristãos que,
expulsos de Israel, foram morar na Ásia Menor? Talvez. Ou será que a
expressão deve ser entendida de modo figurativo? A expressão anterior
– forasteiros – é entendida simbolicamente; assim, não devemos ser
literais demais ao interpretar essa parte do texto.

Se considerarmos o texto de maneira figurativa, os leitores não


precisam ser só cristãos judeus; alguns podem ser cristãos gentios
(comparar com 1.18; 2.10,25; 4.3,4).
Os leitores judeus e gentios vivem em cinco regiões da Ásia Menor:
Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia. d. Regiões. Onde ficam as
regiões que Pedro menciona nesta epístola?

Observe que Pedro não menciona algumas regiões. Deixa de fora, por
exemplo, os nomes Lícia, Frígia, Pisídia, Panfília, Licônia e Cilícia, mas
esses nomes são relativos à parte Sul da Ásia Menor. Pedro dirige sua
carta aos leitores nas províncias do Norte, Leste, Oeste e Central.
Supomos que, depois de ter sido libertado da prisão (At 12.1–17), Pedro
tenha levado o evangelho a essas regiões.
Nessa mesma época, Paulo evangelizou partes da Ásia Menor, mas o
Espírito Santo o impediu de pregar na província da Ásia e de entrar na
Bitínia (At 16.6,7). Paulo não pregava em áreas nas quais o evangelho
já era conhecido, pois recusava-se a “edificar sobre fundamento alheio”
(Rm 15.20). Pedro cita as cinco regiões na seguinte ordem: Ponto,
Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia.

A pessoa que entregou a carta, talvez Silas (5.12), foi primeiro a Ponto,
à beira do Mar Negro, então seguindo uma rota tortuosa, para a Galácia
e Capadócia. De lá, viajou para a Ásia e terminou sua viagem na Bitínia.
Por fim, Pedro se refere a regiões, e não a províncias romanas.
Em 64 a.C., Bitínia e Ponto tornaram-se uma única província sob
domínio romano. Apesar de o nome Galácia designar uma província,
também se refere a uma região.

B. Destinatários 1:2

2 que foram escolhidos de acordo com a presciência de Deus o Pai, através


da obra santificadora do Espírito, para a obediência a Jesus Cristo e a
aspersão por seu sangue:
Graça e paz sejam com vocês em abundância. Em três orações separadas,
Pedro descreve três atos do Deus Triúno.
O Pai tem a presciência,
O Espírito santifica
e Jesus Cristo espera obediência daqueles que foram purificados do pecado.
Essas três orações explicam o termo eleito (vs. 1 e 2).
Observe os seguintes pontos: a. Presciência. “De acordo com a presciência de
Deus Pai”.
A maioria dos tradutores prefere ligar a palavra eleito às três orações
preposicionais: De acordo com a presciência de Deus Pai, através da
santificação do Espírito, para a obediência a Jesus Cristo e a aspersão por seu
sangue. Algumas traduções seguem exatamente a ordem das palavras no
grego e não repetem o termo eleitos no início do v.2, mas a frase dirige sua
ênfase para o termo eleitos, pois o conceito de presciência está diretamente
relacionado à eleição.

O que é presciência?
É muito mais do que a habilidade de prever acontecimentos futuros. Ela inclui a
soberania de Deus em determinar e colocar em prática sua decisão de salvar o
ser humano pecador. A palavra presciência é usada no sermão de Pedro em
Pentecoste, no qual ele declara ao seu público judeu que Jesus foi “entregue
pelo determinado desígnio e presciência de Deus” (At 2.23). Pedro deixa
implícito que Deus agiu de acordo com seu plano e propósito soberano, os
quais havia preparado de antemão. Paulo também se refere à presciência em

Romanos 8.29: “Aos que de antemão conheceu, também os predestinou para


serem conformes à imagem de seu Filho”. Paulo indica que os conceitos de
presciência e predestinação andam juntos. A presciência e a predestinação
são atos de Deus antes da criação do mundo (ver Ef 1.4,5). O prefixo – ante na
oração de antemão conheceu… os predestinou (Rm 8.29) denota esse fato.
Voltando à primeira epístola de Pedro, observamos que, ao escrever sobre
Cristo, o apóstolo menciona o ensinamento da eleição quando diz: “Escolhidos
antes da criação do mundo” (1.20). Sem nenhuma dificuldade, Pedro tece a
doutrina da Trindade no pano de sua epístola.

Dentro da comunidade cristã, essa doutrina era aceita e compreendida, de


modo que os autores do Novo Testamento não tinham a necessidade de
apresentá-la, explicá-la ou defendê-la dos possíveis ataques do Judaísmo.
Pedro fala de Deus o Pai, do Espírito e de Jesus Cristo (ver também Ef 1.3–
14). A ordem escolhida por ele é arbitrária, pois ele não está interessado na
seqüência, mas na função que cada pessoa da Trindade desempenha. Deus o
Pai conhece de antemão e escolhe o pecador.

Ao descrever Deus como Pai, Pedro deixa implícito que aqueles que fazem
parte do povo de Deus, ao qual Pedro chama de “eleitos”, são, de fato, filhos
de Deus. São imensamente privilegiados, pois tomam parte na aliança que
Deus fez com seu povo: “Serei vosso Pai, e vós sereis para mim filhos e filhas,
diz o Senhor Todo-Poderoso” [2Co 6.18]
Observe que os escolhidos de Deus foram “eleitos segundo a presciência de
Deus Pai”.
Como se dá essa eleição do ser humano? Ela é efetuada através do poder
do Espírito Santo, que purifica o eleito do pecado.
b. Santificação.
Pedro escreve sua epístola aos eleitos que foram escolhidos “através da obra
santificadora do Espírito”. Quando Pedro fala da obra santificadora do Espírito
Santo, ele determina a diferença entre o Deus Santo e o ser humano pecador.
O Espírito está em ação quando torna o ser humano santo e aceitável aos
olhos de Deus; o ser humano pecador, porém, não pode entrar na presença do
Deus santo a menos que Deus, através de seu Espírito, o santifique. Pedro não
é o único a ensinar a obra santificadora do Espírito.

Paulo escreve praticamente a mesma coisa à igreja de Tessalônica: “Deus vos


escolheu desde o princípio para a salvação, pela santificação do Espírito e fé
na verdade” (2Ts 2.13).

Obs: O original grego indica que a obra santificadora do Espírito é uma


atividade contínua ou um processo, e não um ato que resulta num estado de
santidade perfeita.
Nesse processo, o ser humano não permanece passivo enquanto o Espírito
age.
A pessoa também está profundamente envolvida. Pedro exorta os crentes:
“Mas assim como aquele que chamou vocês são santos, sejam vocês também
santos em tudo o que fizerem; pois está escrito: ‘Sejam santos, porque eu sou
santo’ ” (1.15,16).

c.Obediência e aspersão.
Por que o Espírito santifica os eleitos? Pedro diz que é “para a obediência a
Jesus Cristo e a aspersão por seu sangue”.
Ele repete sua referência à obediência em versículos subseqüentes desse
capítulo: “Como filhos obedientes, não se amoldem aos desejos perversos que
vocês tinham quando viviam na ignorância” (1.14); “Tendo purificado as vossas
almas pela vossa obediência à verdade, tendo em vista o amor fraternal, não
fingido, amai-vos de coração uns aos outros ardentemente” (v. 22).

A tradução “para a obediência a Jesus Cristo e a aspersão por seu sangue” é


fiel ao grego. Com os termos obediência e aspersão, Pedro se refere à
confirmação da aliança que Deus fez com o povo de Israel (ver Êx 24.3–8).
Moisés leu o Livro da Aliança para o povo. “E eles disseram: Tudo o que falou
o Senhor, faremos, e obedeceremos” (v. 7).
Então, Moisés aspergiu sangue sobre o povo e disse: “Eis aqui o sangue da
aliança que o Senhor fez convosco a respeito de todas estas palavras” (v. 8).

O autor da epístola aos Hebreus comenta que Jesus derramou o seu sangue
para tirar o pecado do povo de Deus (9.18–28; 12.24). Pedro declara que, por
meio da morte sacrificial de Jesus na cruz, ele redimiu e comprou os eleitos
(comparar com 1.18,19).

Assim, em resumo, o Deus Triúno deu-lhes três privilégios distintos: Deus o Pai
os conhece de antemão, Deus o Espírito os santifica e Jesus os purifica do
pecado por meio da aspersão de seu sangue. Apesar de Jesus Cristo ter
derramado seu sangue de uma vez por todas, seu significado tem um efeito
duradouro e é um processo contínuo. Jesus Cristo continua nos purificando do
pecado.

d. Saudação.
As palavras “graça e paz sejam com vocês em abundância” também
aparecem em 2 Pedro 1.2 (ver também Jd 2). A saudação é um tanto típica
dos autores do Novo Testamento que escrevem cartas. Com variações,
Paulo, Tiago, João, Judas e o autor aos Hebreus estendem saudações e
bênção no começo ou no final de suas epístolas. O termo graça é
abrangente: ele inclui os conceitos de misericórdia, amor e remissão do
pecado. A graça é aquilo que Deus oferece ao ser humano.

A paz, por outro lado, é um estado interior de felicidade que leva aquele que
a experimenta a expressá-la externamente para seu próximo. Num certo
sentido, os conceitos de graça e paz estão relacionados um ao outro como
causa e efeito, ou seja, o dom da graça de Deus resulta na paz. A expressão
“graça e paz sejam com vocês em abundância” é uma tradução literal.
Considerações doutrinárias em 1.1,2 Pedro, que era um pescador galileu
sem instrução (At 4.13) e havia sido líder da igreja de Jerusalém, escreve
uma carta aos cristãos que viviam na Ásia Menor. No início da epístola,
dirige-se a seus leitores com um discurso no qual ensina verdades
fundamentais do Cristianismo: a doutrina da eleição e a doutrina da
Trindade.
Pedro envia sua epístola aos “eleitos”.
Ele revela que a eleição é obra de Deus, que Deus quer o seu povo para si
e que o Deus Triúno cuida de seus eleitos.
A doutrina da eleição serve de verdadeiro consolo e grande encorajamento
para o povo de Deus. Ao eleger seu povo, Deus exige dele uma resposta de
gratidão. Espera que essas pessoas obedeçam aos seus mandamentos e
façam sua vontade. Apesar disso, ele conhece nossas fraquezas e
fragilidades e está ciente de que, por vezes, caímos em pecado. Assim, ele
colocou a nosso dispor o poder santificador do Espírito e o efeito duradouro
da aspersão do sangue de Cristo.

A. Uma Esperança Viva


1.3 Ao longo de sua epístola, Pedro encoraja seus leitores a terem esperança.
A esperança se baseia numa fé viva em Jesus Cristo. Ela caracteriza o crente
que espera pacientemente a salvação que Deus prometeu ao seu povo. “A
esperança é uma espera disciplinada”.
3 Louvado seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo! Em sua grande
misericórdia ele nos deu um novo nascimento para uma esperança viva por
intermédio da ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos. Transbordando
de bênçãos espirituais que deseja transmitir a seus leitores, Pedro escreve
uma frase longa em grego (vs. 3–9).
Em nossa versão moderna, os tradutores dividiram essa frase extensa. Ainda
assim, a frase em si revela a intensidade do autor e a plenitude de sua
mensagem. Na parte introdutória dessa frase, observamos os seguintes
pontos:
a. “Louvado”. Na verdade, essa é a primeira palavra de uma doxologia, como,
por exemplo, na conclusão de muitos salmos: “Bendito seja o Senhor, Deus de
Israel, de eternidade para a eternidade” (Sl 41.13; e, com variações, 72.18;
89.52; 106.48). A palavra bendito também é comum no Novo Testamento.
Zacarias começa seu cântico irrompendo em louvor: “Bendito seja o Senhor
Deus de Israel, porque visitou e redimiu o seu povo” (Lc 1.68; ver também Rm
1.25b; 9.5).
b. “Deus e Pai”. Dentro da igreja primitiva, os cristãos judeus adaptaram as
bênçãos de seus antepassados de modo a incluir Jesus Cristo. Observe que a
doxologia no versículo 3, “Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo”, é idêntica
às palavras usadas em 2Coríntios 1.3 e Efésios 1.3 (comparar também com
2Co 11.31). Deus se revelou em seu Filho, o Senhor Jesus Cristo. Por meio de
Jesus, todos os eleitos compartilham de sua filiação. Por intermédio dele, os
eleitos chamam Deus de Pai, porque são seus filhos. Com a igreja toda, o
crente confessa as palavras do Credo dos Apóstolos:

c. “Senhor”.
O v. 3 é a única passagem dessa epístola em que Pedro escreve o título e os
nomes Senhor Jesus Cristo. Com o pronome nosso, Pedro se inclui entre os
crentes que confessam o senhorio de Jesus Cristo. “Chamar Jesus de Senhor
é declarar que ele é Deus”. Além disso, na igreja primitiva, os cristãos
confessavam sua fé com a breve declaração Jesus é o Senhor (1Co 12.3).
O nome Jesus compreende o ministério do Filho de Deus na terra e o nome
Cristo se refere a seu chamado messiânico. Nesses três versículos (vs. 1 a 3),
Pedro usa o nome Jesus Cristo quatro vezes.

d.“Misericórdia”.
Pedro descreve nosso relacionamento com Deus o Pai ao dizer: “Em sua
grande misericórdia ele nos deu um novo nascimento”. Lemos quase as
mesmas palavras numa das epístolas de Paulo (“Mas Deus, sendo rico em
misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou… nos deu vida
juntamente com Cristo” [Ef 2.4,5]). Ao que parece, Pedro conhecia as epístolas
de Paulo (ver 2Pe 3.15,16). Assim como outros apóstolos, Pedro apresenta a
doutrina cristã da regeneração (ver, por exemplo, Jo 3.3,5).

e.“Deu um novo nascimento”. Observe que recebemos um novo nascimento


espiritual de Deus o Pai. Pedro escreve que Deus “deu um novo nascimento”
(v. 3) e, mais adiante, continua: “pois fostes regenerados” (v. 23). Assim como
somos passivos em nosso processo de nascimento natural, também somos
passivos no nascimento espiritual, ou seja, Deus é ativo no processo de nos
gerar, pois é ele quem faz com que nasçamos de novo. Com a expressão deu
um novo nascimento, Pedro mostra a diferença entre nosso nascimento natural
e nosso novo nascimento espiritual.

f.“Esperança”.
O que é esperança? É algo pessoal, vivo, ativo e parte de nós. No versículo 3,
não é algo que diz respeito ao futuro (comparar com Cl 1.5; Tt 2.13). Pelo
contrário, ela traz nova vida aos eleitos de Deus que aguardam com paciente
disciplina a revelação de Deus em Jesus Cristo.
g. “Ressurreição”.
Qual é a base para nossa nova vida?
Pedro nos diz que, “por intermédio da ressurreição de Jesus Cristo dentre os
mortos”, Deus nos deu vida e está nos dando esperança viva. Sem a
ressurreição de Cristo, nossa regeneração não seria possível e nossa
esperança não faria nenhum sentido. Ao ressuscitar dentre os mortos, Jesus
Cristo nos deu a segurança de que nós também ressuscitaremos com ele (ver
Rm 6.4).
Por quê? Conforme a pregação de Pedro em Pentecoste, “ao qual, porém,
Deus ressuscitou, rompendo os grilhões da morte; porquanto não era possível
fosse ele retido por ela” (At 2.24). Jesus é o primeiro a quebrar os grilhões da
morte, de modo que, por meio dele, encontramos nossa regeneração e nele
temos vida eterna (1Jo 5.12).
Pedro fala como testemunha ocular, pois teve a experiência singular de
encontrar-se com Jesus depois que ele se ergueu de seu túmulo. Pedro comeu
e bebeu com Jesus e tornou-se testemunha de sua ressurreição (consultar At
10.41).

B. Uma Herança Segura


1.4 E para uma herança que não pode jamais perecer, deteriorar-se ou
desvanecer – reservada no céu para vocês.
A palavra-chave desse versículo é “herança”. Essa palavra em particular nos
faz lembrar a morte de uma pessoa que deixou um testamento de sua
propriedade para parentes e instituições de caridade. O autor aos Hebreus se
expressa de modo sucinto: “Porque onde há testamento, é necessário que
intervenha a morte do testador, pois um testamento só é confirmado no caso
de mortos; visto que de maneira nenhuma tem força de lei enquanto vive o
testador” (9.16,17).
Pedro, porém, insere a palavra herança no contexto da vida. No versículo
anterior (v. 3), ele menciona a ressurreição de Cristo e o novo nascimento que
recebemos por meio dele. Ao invés de morte, há vida.
Por intermédio da ressurreição de Cristo, somos recebedores da herança que
Deus guarda para nós no céu. Paulo escreve: “Somos… herdeiros de Deus e
co-herdeiros com Cristo” (Rm 8.17).
Os israelitas conheciam o significado da palavra herança. Quando viajaram
pelo deserto do Sinai, lembraram-se que Abraão havia recebido a promessa de
herança da terra de Canaã (Gn 15.18; At 7.5; Hb 11.8). Na terra prometida,
todo israelita tinha sua propriedade, sentava-se à sombra de sua própria
figueira e gozava os frutos de sua própria videira (1Rs 4.25). “Nada parecia
mais atraente aos israelitas do que a posse tranqüila, próspera e permanente
dessa terra”.

A herança de Israel, porém, nunca esteve segura e garantida. Saqueadores do


deserto invadiam suas terras e levavam os bens de seus habitantes. No Novo
Testamento, pelo contrário, a palavra herança tem um significado
completamente diferente (Ef 1.14,18; Cl 1.12; 3.24; Hb 9.15). Refere-se à
salvação que os crentes herdam quando deixam este cenário terreno e obtêm
a glória eterna. A herança dos crentes é guardada no céu, onde Deus a
mantém em absoluta segurança até o tempo apropriado em que iremos
recebê-la. O que herdamos? Pedro não é capaz de descrever em termos
positivos essa herança que nos espera. Por ironia, devido ao seu grande valor,
ele só pode descrevê-la em termos negativos. Ele escolhe três adjetivos para
nos dizer o que nossa herança não é e deixa implícito que essas palavras
revelam sua verdadeira natureza.

a. Não perece. Nosso tesouro não está sujeito à morte ou destruição, não
pode jamais ser corrompido. Além disso, não está limitado pelo tempo, mas é
eterno.
b. Não se deteriora. Ele não pode ser estragado, corrompido ou poluído.
Permanece livre de qualquer mácula e é puro (comparar com Ap 21.27).
c. Não se desvanece. Que não pode se apagar. Quando uma flor passa do
auge, a sua beleza se perde. O mesmo jamais pode ser dito da herança que
está guardada para nós no céu. Os bens terrenos estão sujeitos a constantes
variações e mudanças, mas nossa herança eterna é guardada por Deus em
segurança no céu. Pedro declara que não apenas nossa salvação é mantida
segura, como também nós, os donos dessa herança, somos protegidos pelo
poder de Deus.

C. Uma Salvação Exultante 1.5,6


5 Que por meio da fé são guardados pelo poder de Deus até a vinda da
salvação que está pronta para ser revelada no fim dos tempos.
a. “Que por meio da fé são guardados pelo poder de Deus”. Nesse versículo
em particular cada palavra é significativa, porém o termo importante é
“guardados”. No grego, esse verbo é um termo militar que quer dizer “proteger
alguém de perigo” ou “evitar que alguém escape”. Quando Paulo tentou fugir
de Damasco, “o governador… montou guarda na cidade” (2Co 11.32). No
sentido espiritual, “a paz de Deus… guardará os [nossos] corações e as
[nossas] mentes” (Fp 4.7) de modo que o mal não possa nos tocar. Esse é o
significado que Pedro transmite quando escreve que os crentes são guardados
pelo poder de Deus. Estamos sendo guardados durante nossa breve estadia
na terra, pois Deus não permite que Satanás nos faça mal. Somos guardados
pelo poder de Deus pela fé. As imagens usadas por Paulo transmitem essa
mesma verdade: “Embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis
apagar todos os dardos inflamados do maligno” (Ef 6.16). Pedro ensina a
doutrina da providência de Deus. Quando ele fala da fé, menciona tanto o
poder protetor de Deus quanto a responsabilidade humana, ou seja, apesar de
Deus ter prometido nos proteger, devemos usar da nossa fé em nossa luta
contra o maligno. A fé em Deus é tanto objetiva quanto subjetiva. A fé objetiva
significa que “Deus é visto externamente, e não sentido internamente”, mas a
fé também tem um lado subjetivo, conforme demonstram várias referências à fé
em 1 Pedro.
b. Até a vinda da salvação”. Por que Deus nos protege? Nossa salvação, a
qual já temos em princípio, será nossa propriedade de fato, quando passarmos
pelos portais do céu. Deus nos protege para que possamos receber nossa
herança completa que está “para revelar-se no último tempo”. A expressão
salvação é sinônimo de “herança” (v. 4). Pedro “usa uma incrível variedade de
expressões para a salvação vindoura no fim dos tempos” (por exemplo, uma
“esperança viva” [1.3], a “maravilhosa luz” de Deus [2.9], a “graça de vida” [3.7],
“bênção por herança” [3.9], “coroa da glória” [5.4] e “eterna glória” [5.10]).
Estamos na expectativa exultante de tomar posse da nossa salvação. Mesmo
quando experimentamos a bondade de Deus por meio da salvação em
princípio, sabemos que a plenitude de nossa herança será conhecida a seu
tempo (Hb 1.14).
c. “Que está pronta para ser revelada no fim dos tempos”. O termo pronta está
relacionado à salvação, e não ao verbo revelar. Nossa salvação foi preparada
para nós por Cristo por meio de sua obra expiatória. Ela será revelada de uma
só vez no tempo de Deus. Todos verão a herança, mas apenas o cristão
poderá possuí-la. A palavra revelar, no grego, significa “tirar o véu ou
cobertura”. Jesus tirará o véu quando voltar para nos dar salvação gratuita e
plena.

D. Uma Fé Autêntica 1.7


7 Elas sobrevêm para que a sua fé – que é mais valiosa que ouro, que perece
mesmo tendo sido refinado pelo fogo – possa ser declarada autêntica e possa
resultar em louvor, glória e honra quando Jesus Cristo se revelar. Observe
estes aspectos:
a. Teste.
Pedro parece saber de antemão que será feita a pergunta: Por que o crente
precisa passar por provações? Diz: “Para que a sua fé… seja declarada
autêntica” (MLB). Deus testa o crente para saber se sua fé é autêntica. Assim,
ele pede a Abraão que vá ao monte Moriá para sacrificar Isaque (Gn 22.1–19)
e o faz para provar a fé do patriarca. No caso de Jó, Deus permite que Satanás
ataque o crente (Jó 1.6–2.10).

O teste é um processo que requer tempo, mas, depois de passado o tempo e


terminado o processo, o resultado do teste torna-se visível, a saber, uma fé
autêntica. Abraão triunfou em fé quando ouviu o anjo do Senhor dizer: “Agora
sei que temes a Deus” (Gn 22.12). Por causa da fé demonstrada por Jó,
“abençoou o Senhor o último estado de Jó mais do que o primeiro” (Jó 42.12).
Deus, de fato, deu a Jó o dobro de seus bens. Observe que a expressão
provação aparece duas vezes no Novo Testamento, aqui e em Tiago 1.3:
“Vocês sabem que a provação da sua fé desenvolve perseverança”.
Cada autor usou a palavra de acordo com seus propósitos.

b. Persistência.
Enquanto Tiago escreve que “a provação da sua fé… desenvolve
perseverança” (1.3), Pedro compara o teste da fé ao processo pelo qual o ouro
é purificado. Ao longo dos séculos, o ouro é considerado um bem precioso e
estável. “Esse metal altamente valorizado é mencionado 385 vezes na Bíblia,
aparecendo com mais frequência do que qualquer outro metal”. O ouro serve
como referência para determinar transações monetárias (ver também 1Pe
1.18). Pedro afirma que a fé vale mais do que o ouro; a fé excede esse bem
universalmente valorizado, pois tem sua origem no céu e é uma dádiva de
Deus. A fé dura para sempre (1Co 13.13). O ouro, pelo contrário, acaba se
deteriorando com o uso e o desgaste. Esse metal precioso é refinado pelo fogo
para que todas as impurezas sejam removidas e só reste o ouro puro de 24
quilates.
Pedro, porém, observa que, mesmo que o ouro seja purificado pelo fogo, ele se
deteriora. Essa comparação tem como implicação evidente a pergunta: se o
ouro deteriorável é purificado, quanto mais não o deve ser a fé permanente na
vida do cristão? O crente expressa sua fé verdadeira ao confiar completamente
em Deus. Ele sabe que “o [seu] Deus, segundo a sua riqueza em glória, há de
suprir em Cristo Jesus, cada uma das [suas] necessidades” (Fp 4.19).

c. Revelação. Qual o resultado da fé que é testada? Pedro responde que ela


resulta em “louvor, glória e honra quando Jesus Cristo se revelar”. Ele não está
dando essa seqüência de três itens para adornar uma frase. O crente proclama
seu louvor a Deus por meio de oração, salmos e hinos. Seu louvor inclui a
gratidão a Deus pelo divino favor concedido a ele por intermédio de Cristo
Jesus. Os termos glória e honra aparecem em doxologias (consultar 1Tm 1.17;
Ap 4.11). O crente irá compartilhar a glória e honra quando, no fim de sua vida
na terra, entrar na presença de Jesus Cristo. Pedro diz que essas três
qualidades estarão presentes “quando Jesus Cristo se revelar”. Ele não nos diz
quando Jesus voltará, mas se refere a um determinado tempo em que todos os
olhos verão Jesus. Então, todos os crentes no céu e na terra cantarão louvores
e darão honra e glória ao Filho de Deus.

E. Uma Alegria Gloriosa 1.8,9


Pedro volta ao assunto da alegria (ver v. 6) e fé (vs. 5 e 7).
Com efeito, ele está apresentando um resumo dos parágrafos anteriores de
modo que os leitores possam compreender plenamente a importância das
virtudes cristãs: fé, esperança e amor.

Observe que, nos versículos 3 a 9, ele ensina o significado dessas três


virtudes.
8 Apesar de vocês não o terem visto, vocês o amam; e mesmo que vocês não
o vejam agora, crêem nele e estão cheios de uma alegria inexprimível e
gloriosa,
9 pois vocês estão recebendo o objetivo da sua fé, a salvação das suas almas.
Esses dois versículos mostram paralelismo e equilíbrio. Para demonstrar essa
afirmação, coloco as linhas paralelas em colunas separadas: apesar de vocês
não o terem visto, vocês o amam; e são cheios de uma alegria inexprimível e
gloriosa e mesmo que vocês não o vejam agora, vocês crêem nele pois estão
recebendo o objetivo da sua fé, a salvação da sua alma.

a. Crer.
Pedro deixa implícito que viu o Senhor e que os leitores de sua epístola não
tiveram esse privilégio. Observe que Pedro usa a primeira pessoa do plural no
versículo 3: “Nosso Senhor Jesus Cristo que… nos deu um novo nascimento”,
mas no versículo 8 ele usa a terceira pessoa do plural, vocês: “Apesar de
vocês não o terem visto, vocês o amam”. Observe também o tempo passado
“não o terem visto”. Ele contrasta o tempo passado com o tempo presente na
declaração paralela: “Mesmo que vocês não o vejam agora, crêem nele”.
Todos esses pontos deixam implícito que Pedro viu o Senhor, que é
testemunha ocular do ministério de Jesus. Mais adiante na epístola, ele se
chama explicitamente de “testemunha dos sofrimentos de Cristo” (5.1). Devido
ao tempo e à distância, os leitores da carta de Pedro não haviam visto Jesus,
ainda assim, por causa do evangelho, eles o amavam e criam nele. Na
verdade, eram demonstração viva da bem-aventurança que Jesus disse a
Tomé: “Bem-aventurados os que não viram, e creram” (Jo 20.29). Eles
amavam Jesus e depositavam nele sua confiança, mesmo não tendo sido
capazes de vê-lo nesta vida aqui na terra. Os leitores o faziam tomando por
base a mensagem pregada pelos apóstolos (comparar com Jo 17.20). Como
disse Paulo, “Andamos por fé, e não pelo que vemos” (2Co 5.7; ver também
4.18). É possível que os apóstolos, que viram e ouviram Jesus, pensassem que
sua fé no Senhor não fosse tão grande quanto a fé daqueles que viriam a crer
sem ter visto Jesus? Essa possibilidade é real, primeiro porque Pedro estava
presente quando Jesus proferiu a bem-aventurança a Tomé (Jo 20.29). Em
segundo lugar, duas vezes Pedro lança mão de orações concessivas que, na
tradução, deixam subentendido “apesar de”: “não havendo visto” e “não vendo
agora”. Em terceiro lugar, ele enfatiza o advérbio de tempo agora. Em resumo,
Pedro elogia seus leitores por sua fé em Jesus Cristo.

b. Alegria.
“Crêem nele e estão cheios de uma alegria inexprimível e gloriosa”. Já nesta
vida presente, os crentes experimentam alegria indescritível, não precisam
esperar até deixarem o mundo. Mesmo agora, estão repletos de “alegria
inexprimível e gloriosa”. A ênfase nessa parte do versículo está na alegria que
enche o coração dos cristãos. Uma tradução literal transmite o conceito tanto
no verbo como no substantivo “vos alegrais com alegria” (NASB). Essa é a
segunda vez nessa primeira parte da epístola que Pedro trata da alegria. Ele
repete a palavra que usou anteriormente – “exultais” (v. 6). A palavra descreve
gritos de alegria que não podem ser contidos. Além disso, Pedro dá ao
substantivo alegria duas qualidades incomuns: “inexprimível” e “gloriosa”. A
primeira palavra, “inexprimível”, não aparece em nenhuma outra parte do Novo
Testamento. Pedro a utiliza para descrever a atividade de uma pessoa que
possui grande alegria. Essa pessoa não é capaz de expressar sua alegria em
termos humanos. Na verdade, ela não lida apenas com a incapacidade, mas
com a impossibilidade de transmitir a profundidade de sua alegria. A segunda
expressão, “gloriosa”, significa aquilo que foi e continua sendo glorificado. Sua
conotação é da presença de glória divina que caracteriza esse determinado
tipo de alegria (comparar com 2Co 3.10).

c. Receber.
O autor declara a razão dessa alegria. Diz: “recebendo o objetivo da sua fé, a
salvação da sua alma”. Apesar de muitos tradutores optarem pelo verbo
receber para transmitir o sentido do grego, a palavra significa “obter alguma
coisa que é devida à pessoa”. Nesse caso, a palavra significa que, por meio da
obra de Cristo, o crente obtém a salvação. Já nesta vida, o cristão se apropria
da salvação que Cristo oferece (ver 1Co 1.18). O que os crentes obtêm? Pedro
lhes dá uma resposta direta. Ele lhes diz que obterão “o objetivo da [sua] fé”,
conforme a New International Version. O texto, na verdade, diz “o fim da vossa
fé”. Porém, se pararmos nesse ponto, a resposta de Pedro deixa a desejar,
pois precisamos saber qual é o objetivo da fé. Pedro, porém, completa a frase
acrescentando a oração explicativa a salvação das vossas almas. As Escrituras
nos ensinam que a salvação já nos pertence em princípio. Nós nos
apropriaremos plenamente dela quando estivermos com Cristo para toda a
eternidade. As palavras do versículo 9, “a salvação da vossa alma”, estão de
acordo com o ensinamento de diversas passagens do Novo Testamento que
afirmam que nossa salvação em Cristo afeta nossa vida como um todo. Cristo
Jesus salva plenamente, de modo que cada crente pode dizer: Com seu
precioso sangue Ele pagou por todos os meus pecados e me libertou de todo o
domínio do diabo. Agora Ele me protege de tal maneira que, sem a vontade do
meu Pai do céu, não perderei nem um fio de cabelo. Além disto, tudo coopera
para o meu bem

F. Uma Busca Intensa 1.10,11


10 Quanto a essa salvação, os profetas, que falaram da graça que viria a
vocês, examinaram atentamente e com o maior cuidado,
11 procurando descobrir o tempo e as circunstâncias para as quais o Espírito
de Cristo neles estava apontando quando predisseram os sofrimentos de Cristo
e as glórias que viriam depois. O que ensinam esses versículos? Em resumo,
os principais pontos da passagem são estes:
1. Os profetas do Antigo Testamento ensinavam a doutrina da salvação.
2. Eles pesquisaram e investigaram esse assunto.
3. Eles tentaram descobrir o tempo e as circunstâncias para as quais o Espírito
apontava. 4. O Espírito predisse os sofrimentos e a glória de Cristo. Pedro
relaciona o ensinamento da salvação às profecias do Antigo Testamento. Ele
chega à conclusão de que o tema da salvação foi:

a. Profetizado.
“Quanto a essa salvação, os profetas… falaram da graça que viria a vocês”.
Quem são esses profetas? Pedro não cita nomes, mas tem em mente todos os
profetas do Antigo Testamento, de Moisés a Malaquias. Eles são os profetas
aos quais Lucas se refere quando registra o diálogo entre Jesus e os dois
homens no caminho de Emaús: “Porventura não convinha que o Cristo
padecesse e entrasse na sua glória?” E Lucas acrescenta: “E começando por
Moisés, discorrendo por todos os profetas, expunha-lhes o que a seu respeito
constava em todas as Escrituras” (Lc 24.26,27). Guiados pelo Espírito Santo
(2Pe 1.21), esses profetas ensinaram a “graça que viria a vocês”. A expressão
graça é mais abrangente do que seu sinônimo, salvação. Ela inclui o reinado
divino cheio de graça no tocante à redenção do ser humano. Eis dois
exemplos: Jacó, em seu leito de morte, diz: “O cetro não se arredará de Judá e
nem o bastão de entre seus pés, até que venha Siló; e a ele obedecerão os
povos” (Gn 49.10). Daniel, interpretando o sonho de Nabucodonosor, profetiza:
“Mas, nos dias destes reis, o Deus do céu suscitará um reino que não será
jamais destruído… mas ele mesmo subsistirá para sempre” (Dn 2.44). Os
profetas compreendiam o que estavam profetizando? Pedro afirma que eles
“examinaram atentamente e com o maior cuidado”.

b. Examinado. Os profetas recebiam a revelação de Deus, mas nem sempre


compreendiam o que significavam as suas profecias. Todavia, não davam de
ombros quando não conseguiam entender o significado de suas palavras; ao
invés disso, procuravam diligentemente determinar o sentido da Palavra de
Deus (comparar com Is 6.11; Dn 7.15,16; Mt 13.17; Jo 12.41). Os profetas
levavam a sério seu trabalho, pois suas palavras diziam respeito à salvação do
homem. E era sobre essa salvação que queriam saber o máximo possível.
Assim, eles estavam “procurando descobrir o tempo e as circunstâncias” das
quais falava o Espírito Santo.

c. Investigado.
Ao invés do texto “estavam procurando saber qual a ocasião ou quais as
circunstâncias”, algumas traduções trazem: “investigando qual a pessoa ou
ocasião indicadas” (RSV, itálico nosso). Os profetas sabiam que o Messias
viria, mas não tinham conhecimento de quando ele iria aparecer ou quais
seriam as circunstâncias dessa aparição. Assim, indagavam sobre o “quando”
e o “como” da vinda do Messias. Em geral, os estudiosos preferem o texto
ocasião e circunstâncias ao invés de “pessoa ou tempo”. Os profetas haviam,
evidentemente, recebido a revelação de Deus sobre a vinda do Messias. Isaías
profetizou sobre seu nascimento (7.14; 9.6; 11.1), seu ministério (11.2–5; 35.4–
6; 61.1,2) e seu sofrimento e morte (52.13–53.12), e Miquéias previu o lugar de
seu nascimento: Belém (5.2). Quando profetizavam, esses homens estavam
repletos do Espírito de Deus.

d. Previsto.
Não eram os profetas, mas o Espírito Santo, que estava “apontando quando
predisseram os sofrimentos de Cristo e as glórias que viriam depois”. Pedro diz
que era o Espírito de Cristo que estava neles (ver At 16.7). Pedro indica que
Cristo existia antes de vir habitar entre os homens. Por meio de seu Espírito,
Cristo guiou os profetas e, assim, inspirou-os em seus escritos.
As palavras do texto revelam que havia uma constante interatividade entre os
profetas e o Espírito de Cristo, ou seja, os profetas estavam constantemente
investigando o significado de suas profecias, e o Espírito de Cristo, trabalhando
através deles, estava sempre apontando para a ocasião e as circunstâncias
reveladas nessas profecias.
O Espírito, portanto, revelou-lhes por meio de previsões o que Cristo teria que
suportar. Observe que, nessa passagem, sem sombra de dúvida, Pedro ensina
a preexistência de Cristo, quando escreve: “o Espírito de Cristo neles estava
apontando quando predisseram os sofrimentos de Cristo e as glórias que
viriam depois”. No grego, o tempo presente do verbo dar de antemão (como
particípio) indica a repetição dessa atividade. Cristo fez essas previsões
séculos antes de seu cumprimento. Observe que o Espírito de Cristo revela
essas previsões aos profetas na época do Antigo Testamento. Esses profetas
tomam sobre si a tarefa de indagar e inquirir sobre o significado dessas
profecias. Em resumo, chegamos à conclusão de que, nessa passagem, Pedro
ensina a doutrina da inspiração verbal.
O salmista e os profetas revelam os sofrimentos de Cristo (como, por exemplo,
Sl 22.7; Is 53.3). Pedro escreve o termo sofrimentos no plural para enfatizar a
magnitude e a variedade de dores e tristezas que Jesus teria que suportar.
Pedro, porém, contrasta os sofrimentos de Jesus com “as glórias que viriam
depois”. Observe o uso do plural “glórias”. O plural se refere à glória da
ressurreição de Jesus, à glória de sua ascensão e à gloria de sua volta.

G. Uma Revelação Pessoal 1.12


Pedro está prestes a concluir sua discussão sobre a salvação. Ele apresentou
esse tópico ao considerar as três virtudes cristãs: fé, esperança e amor. Além
disso, descreveu a alegria dos crentes, pois são indescritivelmente ricos no que
diz respeito à sua herança espiritual. Lembrou-os também dos ensinamentos
dos profetas do Antigo Testamento. Agora, ele conclui sua referência a esses
profetas e diz:
12 Foi revelado a eles que não estavam servindo a si mesmos, mas a vocês,
quando falaram das coisas que agora lhes foram ditas por aqueles que
pregaram o evangelho a vocês pelo Espírito Santo enviado do céu. Até mesmo
os anjos anseiam por perscrutar essas coisas.

a. “Foi revelado a eles que não estavam servindo a si mesmos, mas a


vocês, quando falaram”. Pedro não especifica como e quando os profetas do
Antigo Testamento receberam a informação de que estavam ministrando a
gerações futuras. Ao usar o tempo passado, ele parece indicar que essa
informação veio de modo geral. Eis alguns exemplos tirados do Antigo e Novo
Testamento: Em sua quarta profecia, Balaão diz: “vê-lo-ei, mas não agora;
contemplá-lo-ei, mas não de perto; uma estrela procederá de Jacó, de Israel
subirá um cetro que ferirá as têmporas de Moabe, e destruirá todos os filhos de
Sete” (Nm 24.17). Moisés diz aos israelitas: “O SENHOR teu Deus te suscitará
um profeta do meio de ti, de teus irmãos, semelhante a mim; a ele ouvirás” (Dt
18.15). Em Pentecoste, Pedro cita um salmo de Davi (Sl 16.8–11) para ilustrar
a ressurreição de Cristo. Pedro chama Davi de profeta e diz: “Prevendo isto,
referiu-se à ressurreição de Cristo” (At 2.31). Em seu sermão, depois de ter
curado o homem coxo, Pedro cita Deuteronômio 18.15, aplica-o a Cristo e
acrescenta: “E todos os profetas, a começar com Samuel, assim como todos
quantos depois falaram, também anunciaram estes dias” (At 3.24). No grego, o
tempo passado do verbo falaram revela que os profetas continuavam a fazê-lo.

b. “As coisas que agora lhes foram ditas”.


Nessa parte do versículo observamos, em primeiro lugar, que a palavra coisas
é a mais importante. Essa palavra se refere aos sofrimentos e glórias de Cristo
(v. 11) e resume o conteúdo do evangelho. A mensagem dos profetas do
Antigo Testamento, conforme falaram sobre a vida, morte e ressurreição de
Cristo, não era para benefício próprio. Pelo contrário, suas profecias continuam
a ministrar às igrejas da época do Novo Testamento. Por isso, observamos em
seguida que Pedro enfatiza a palavra agora. Ele está falando do evangelho que
está sendo pregado em sua época. Pedro liga a mensagem do Antigo
Testamento àquela do Novo Testamento e, assim, ensina, de modo implícito, a
unidade das Escrituras. O apóstolo olha para as profecias messiânicas do
Antigo Testamento à luz de seu cumprimento no Novo Testamento,
confirmando que Jesus cumpriu essas profecias. O comentarista luterano R. C.
H. Lenski observa com perspicácia: “O evangelho todo do Novo Testamento se
baseia no testemunho do Espírito no Antigo Testamento, que se deu através
dos profetas. Se anularmos esse testemunho, removemos a base do
evangelho de Cristo”.

c. “Por aqueles que… pregaram o evangelho”.


Os leitores que vivem na Ásia Menor (Turquia, nos dias de hoje) ouviram o
evangelho de missionários que foram até sua região. A declaração é geral
demais para determinar se o próprio Pedro era um desses missionários. A
oração “pregaram o evangelho” faz alusão às trevas espirituais nas quais os
leitores se encontravam antes da chegada desses missionários.
d. “Pelo Espírito Santo enviado do céu”.
O Espírito inspirou os profetas do tempo do Antigo Testamento. No dia de
Pentecoste, porém, ele desceu dos céus para guiar e dirigir aqueles que
proclamam o evangelho. Assim, o Espírito Santo orientou os apóstolos e seus
ajudantes e deu-lhes poder divino, de modo que sua mensagem não fosse
palavra humana, mas a palavra de Deus (1Ts 2.13). e. “Até mesmo os anjos
anseiam por perscrutar essas coisas”. Os anjos estão ao redor do trono de
Deus, são mensageiros enviados por Deus para servir ao homem que herda a
salvação (Hb 1.14), regozijam-se quando um pecador se arrepende (Lc
15.7,10) e reúnem os eleitos no dia do julgamento (Mt 24.31). Apesar disso,
seu conhecimento sobre a salvação do ser humano é incompleto, pois desejam
perscrutar os mistérios da salvação. O verbo perscrutar no original significa, na
verdade, “olhar com o pescoço esticado” (em sua epístola, Tiago usa o mesmo
verbo com referência a um espelho, supostamente preso a uma mesa. As
pessoas curvavam-se para olhar no espelho [1.23,24]). Os anjos saberão mais
sobre a salvação por meio da igreja. Conforme as palavras de Paulo: “Para
que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus se torne conhecida agora dos
principados e potestades nos lugares celestiais” (Ef 3.10).

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