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Língua Brasileira

de Sinais (LIBRAS)
Unidade 2
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Gerente Editorial
CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA
Projeto Gráfico
TIAGO DA ROCHA
Autoria
ELTON CASTRO RODRIGUES DOS SANTOS
AUTORIA
Elton Castro Rodrigues dos Santos
Olá a todos! Meu nome é Elton Castro Rodrigues dos Santos, mas
podem me chamar apenas de Elton Castro. Sou Bacharel em Administração
(ICE) e Licenciado em Pedagogia (UFMT), Especialista em Educação
Inclusiva – Libras (IFMT), Mestrado (UFMT) e Doutorado (Unesp) em
Educação. Atualmente, estou no último semestre da Licenciatura em Letras
Libras na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Tenho experiência
docente em há mais de 17 anos na Educação e pude ministrar aulas na
Educação Básica, Educação Profissionalizante, Educação Superior e Pós-
Graduação. Atuei em diferentes instituições, como Secretaria Municipal
de Educação (MT); Senai; UFMT; IFMT; Unemat; UAB; ICEC; Faspec. Sou
apaixonado por estudar e busco sempre compartilhar o conhecimento
da minha experiência de vida com aqueles que estão iniciando em suas
profissões. Por isso fui convidado pela Editora Telesapiens a integrar seu
elenco de autores independentes. Estou muito feliz em poder ajudar você
nesta fase de muito estudo e trabalho. Conte comigo!
ICONOGRÁFICOS
Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda
vez que:

INTRODUÇÃO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimento de se apresentar um
de uma nova com- novo conceito;
petência;

NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram que
vações ou comple- ser priorizadas para
mentações para o você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado ou sobre o tema em
detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e links sidade de chamar a
para aprofundamen- atenção sobre algo
to do seu conheci- a ser refletido ou
mento; discutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso aces- quando for preciso
sar um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das
assistir vídeos, ler últimas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma quando o desen-
atividade de au- volvimento de uma
toaprendizagem for competência for
aplicada; concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
Oralismo comunicação total e bilinguismo........................................... 10

Oralismo................................................................................................................................................10

Comunicação total ....................................................................................................................... 12

Bilinguismo......................................................................................................................................... 14

Ensino-aprendizagem do aluno surdo.........................................................17

Comunicação com pessoas surdas..................................................................................22

Língua Brasileira de Sinais (Libras).............................................................. 26

Alfabeto manual................................................................................................... 35
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 7

02
UNIDADE
8 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

INTRODUÇÃO
Você sabia que existiam correntes de pensamento que acreditavam
que o surdo deveria aprender a falar para ser aceito na sociedade? O
Oralismo foi uma dessas correntes que disseminou, no mundo inteiro,
que a melhor maneira de incluir o surdo era oralizando, igualando-se
aos falantes, e negava-se a língua de sinais. Além do Oralismo, veremos
neste capítulo outros métodos, como Comunicação Total e Bilinguismo.
Apresentaremos aportes teóricos para se refletir sobre o ensino-
aprendizagem do aluno surdo do aluno ouvinte e compreensão da
importância da Língua Brasileira de Sinais (Libras). Ao longo desta unidade
letiva você vai mergulhar neste universo!
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 9

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 2. Nosso objetivo é auxiliar
você no atingimento dos seguintes objetivos de aprendizagem até o
término desta etapa de estudos:

1. Debater sobre Oralismo, Comunicação Total e Bilinguismo,


formulando novos conceitos sobre a Libras;

2. Diferenciar o ensino-aprendizagem do aluno surdo do aluno


ouvinte;

3. Compreender características e conceitos da Língua Brasileira de


Sinais (Libras);

4. Diferenciar os sinais das letras do alfabeto manual.

Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao


conhecimento? Ao trabalho!
10 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

Oralismo comunicação total e


bilinguismo
INTRODUÇÃO:

Ao término deste capítulo você será capaz de conceituar


Oralismo, Comunicação Total e Bilinguismo, bem
como compreender a influência dessas correntes de
pensamentos na educação da pessoa surda, perpetuando
por vezes o Oralismo, o preconceito contra as línguas de
sinais e determinando a oralização como meio de inclusão
social. Motivado para desenvolver esta competência?
Vamos caminhar? Avante!

Essas três metodologias de ensino foram determinantes na história


da educação dos surdos, desde o atraso no processo, com o Oralismo,
até a autonomia do surdo, com o Bilinguismo.

Oralismo
Oralismo é uma abordagem de ensino que foi utilizada como
método para se educar pessoas surdas. Para ter algum direito (no caso
de ser primogênito poderia herdar título e herança) a pessoa não podia
ser “muda”, pois não havia reconhecimento legal de suas capacidades
cognitivas. Dessa forma, “[...] a força do poder financeiro e dos títulos se
constituíram os grandes impulsionadores do Oralismo, na época, pois
era através da fala que o indivíduo tinha representação na sociedade”
(CAVALCANTI, 2010, p. 88).

“Oralismo” foi uma proposta de trabalho com métodos e técnicas


para que o surdo desenvolvesse a língua oral, ou seja, a mesma língua
dos ouvintes. No caso dos surdos brasileiros, o enfoque era que o
surdo aprendesse a língua portuguesa. “O Oralismo pretende fazer uma
reabilitação do surdo, no entendimento de que o normal é não surdez”
(GOLDFELD, 1997, p. 31).
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 11

O Oralismo teve seu auge no II Congresso Mundial, que aconteceu


em Milão (1880). Esse evento marcou o retrocesso da língua de sinais em
todo o mundo, pois estabeleceu que “[...] o método oral puro era ideal
para a educação dos surdos. Essas recomendações foram aceitas por
vários países, como Alemanha, Itália, França, Inglaterra, Suécia e Bélgica”
(PALAZZO; MOREIRA, 2017, p. 18).

Mesmo a França sendo um dos nascedouros da língua de sinais,


acatou a determinação e proibiu seu uso no país. O que mais chama a
atenção é que, no congresso de Milão, “[...] dos 255 participantes, só três
eram surdos” (PALAZZO; MOREIRA, 2017, p. 18).

Figura 1: Não ao Oralismo

Fonte: Freepik

As determinações desse congresso fizeram estagnar os avanços das


línguas de sinais em todo mundo e nenhuma instituição de ensino poderia
utilizá-la. “A oralização passou a ser o principal objetivo da educação das
crianças surdas e, para aprenderem a falar, passavam a maior parte do
seu tempo nas escolas recebendo treinamento oral” (POKER, 2008, p.
3), como leitura labial, treinamentos auditos, e em alguns casos o surdo
recebia um aparelho (AASI) para ampliação do som.

Esse período da história da educação do surdo marcou momentos


de negação não só da língua de sinais, mas de legitimação de “[...] que
apenas a língua oral deveria ser aprendida pelos surdos, sendo a língua de
sinais considerada como prejudicial para o desenvolvimento da criança”
(CAVALCANTI, 2010, p. 89).
12 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

As técnicas para o estímulo da língua oral são muito bem retratadas


no Filme “Seu nome é Jonas” (1979), que mostra a busca de uma família
por abordagens que pudessem contribuir para educação de seu filho. O
Oralismo como método de ensino é destaque nesse filme.

Para Cavalcanti (2010, p. 88), o Congresso de Milão, ao declarar


superioridade do método oral sobre a língua de sinais, gerou “[...] grande
polêmica entre professores ouvintes e surdos (a estes não foi permitido
votar), em defesa do Oralismo e da língua de sinais, sendo esta última
preferida pela grande maioria de professores ouvintes”.

A adoção do Oralismo como modelo educacional proporcionou


o abandono da “[...] cultura e identidade surdas. Desse modo, as ideias
pregadas pelo Oralismo orientavam que os surdos deveriam ter uma
identidade comum com os ouvintes, ou seja, a língua (CAVALCANTI, 2010,
p. 89).

Poker (2008, p. 3) explica que a determinação do II Congresso Milão


perdurou até a década de 1960, “[...] quando William Stokoe publicou um
artigo demonstrando que a língua de sinais se constituía em uma língua
com as mesmas características das línguas orais”. Iniciou-se assim um
novo ciclo na história da língua de sinais, pois houve avanço das pesquisas
sobre como essa língua era importante para a pessoa surda. A mesma
autora enfantiza que foi advindo desse novo momento que surgiu, em
1968, outra proposta para ensino do surdo: a Comunicação Total

Comunicação total
O Oralismo começou a perder forças quando não se podia mais
assegurar sua eficiência como método de ensino para a pessoa surda.
Na década de 1960 “[...] a língua de sinais começou a ser (re)conhecida,
especialmente depois dos trabalhos de William Stokoe, linguista
americano que retomou a questão dos sinais e apresentou a língua de
sinais como legítima, com estrutura própria” (CAVALCANTI, 2010, p. 108).

A Comunicação Total foi um movimento que surgiu como proposta


para o ensino da pessoa surda, após os pesquisadores identificarem que
a metodologia oralista não surtiu efeitos nem possibilitou a comunicação
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 13

com o surdo “[...] de maneira satisfatória e, mesmo com a imposição das


práticas oralistas, as pessoas surdas insistiam em se comunicar por meio
da língua de sinais. Decidiu-se então que os surdos poderiam utilizar toda
e qualquer forma de comunicação” (KALATAI; STREIECHEN, 2014, p. 7).

DEFINIÇÃO:

A Comunicação Total surgiu em 1968 e buscava utilizar


diferentes formas que possibilitassem a comunicação com
o surdo. Incorporava “[...] modelos auditivos, manuais e orais
para assegurar a comunicação eficaz entre as pessoas com
surdez. Tinha como principal preocupação os processos
comunicativos entre surdos e surdos e entre surdos e
ouvintes” (POKER, 2008, p. 6).

Com o método da Comunicação Total, o surdo passou a ter chance


de utilizar diferentes recursos para comunicação e aprendizagem, pois
esse método pressupõe “[...] o uso simultâneo de diferentes códigos como:
a Língua de Sinais, a datilologia, o português sinalizado, etc.” (POKER,
2008, p. 8). Até esse momento não se reconhecia que a linguagem dos
sinais tinha estrutura própria, por isso o método da Comunicação Total
se baseava na estrutura gramatical da língua oral. Esse método esteve
presente no Brasil na década de 1960.

A proposta da Comunicação Total como método “propõe uma


maneira diferente de perceber o surdo, ou seja, como um indivíduo
diferente, não deficiente e, a denominação ‘deficiente auditivo’ usada
pelos oralistas foi substituída por outra: ‘Surdo’” (CAVALCANTI, 2010, p.
108).

Esse deslocamento da língua oral como principal meio de


aprendizagem para o surdo possibilitou, segundo Oliveira (2014, p. 12),
que o “[...] sujeito com surdez deixa de ser visto como portador de uma
‘patologia’ e passa a ser considerado como uma pessoa capaz”. Abriam-se
nesse momento outras possibilidades e meios de se efetivar a educação
para pessoas surdas. Uma dessas possibilidades foi o Bilinguismo.
14 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

Bilinguismo
Para Cavalcanti (2010, p. 109), esse método desloca a língua de
sinais para o primeiro plano e enfoca a necessidade de a pessoa surda
ser “[...] bilíngue, ou seja, ela deve adquirir como língua materna a língua
de sinais, que é considerada a língua natural dos surdos e, como segunda
língua, a língua oficial de seu país na modalidade oral e/ou escrita”.

Para Quadros (1997, p. 47), quando se considera que a língua de


sinais deve ser ensinada primeiramente para o aluno surdo, isso indica
que os conteúdos escolares “[...] devem ser trabalhados por meio dela e
que a língua portuguesa, na modalidade escrita, será ensinada com base
nas habilidades interativas e cognitivas já adquiridas pelas crianças surdas
nas suas experiências com a língua de sinais”.

DEFINIÇÃO:

De acordo com Poker (2008, p. 8), o Bilinguismo “[...] parte do


princípio de que o surdo deve adquirir como sua primeira
língua a língua de sinais com a comunidade surda. Isso
facilitaria o desenvolvimento de conceitos e sua relação
com o mundo”.

Dessa forma, pode-se dizer que a maior contribuição do Bilinguismo


foi ofertar a centralidade para a línguas sinais, pois propõe

[...] o uso autônomo e não simultâneo da Língua de Sinais


que deve ser oferecida à criança surda o mais precocemente
possível. A língua portuguesa é ensinada como segunda língua,
na modalidade escrita e, quando possível, na modalidade oral.
Contrapõe-se às propostas da Comunicação Total uma vez
que não privilegia a estrutura da língua oral sobre a Língua de
Sinais. (POKER, 2008, p. 9)
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 15

Uma educação bilíngue possibilita coexistência de duas línguas, no


nosso caso a Libras e a língua portuguesa. “O decreto 5626/05 assinala
que a educação de surdos no Brasil deve ser bilíngue, garantindo o acesso
à educação por meio da língua de sinais e o ensino da língua portuguesa
escrita como segunda língua” (QUADROS; SCHMIEDT, 2006, p. 17).

Nessa concepção a Língua de Sinais Brasileira (Libras) seria a L1 e


a língua portuguesa L2. “A língua portuguesa, portanto, será a segunda
língua da criança surda, sendo significada pela criança na sua forma
escrita com as suas funções sociais representadas no contexto brasileiro”
(QUADROS; SCHMIEDT, 2006, p. 17).

De acordo com Cavalcanti (2010, p. 110), “um dos princípios mais


importantes desse modelo de ensino é que os surdos formam uma
comunidade, com cultura e língua próprias. A língua de sinais deve ser
aprendida em contato com adultos fluentes”.

A pessoa sendo surda ou ouvinte tem os mesmos direitos a


metodologias de ensino que ofertem possibilidade de aprender,
desenvolver competência e habilidades para atuar de maneira dinâmica
no meio em que vive. O Bilinguismo seria uma proposta de ensino que
poderia ofertar crescimento e desenvolvimento ao aluno surdo de maneira
significativa e respeitosa, e tem-se “[...] essa proposta como sendo a mais
adequada para o ensino de crianças surdas, tendo em vista que considera
a língua de sinais como língua natural e parte desse pressuposto para o
ensino da língua escrita” (QUADROS, 1997, p. 27).

Não se pode negar que temos muitas garantias de direitos retratadas


na legislação brasileira, mas ainda não estão efetivadas, por isso temos
que exigir que todas as pessoas sejam tratadas com igualdade. Para isso,
torna-se um dever respeitar as diferenças.
16 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

RESUMINDO:

A negação de que a pessoa surda tem possibilidades de se


comunicar e aprender fez com que o Ouvintismo se tornasse
forte em todo mundo. O surdo era considerado uma pessoa
doente e que necessitava “falar” para se comunicar. Essa
filosofia afeta, até os dias atuais, a comunidade surda, pois
existem surdos que têm dificuldade para aceitar a condição
de não ouvintes e oralizam o máximo que podem para
parecerem “normais”. Isso porque o preconceito contra
a pessoa surda ainda é muito forte e oralizar possibilita o
mascaramento da deficiência. Somente uma educação
bilíngue, por meio da Libras, possibilitará qualidade
educacional e aprendizagem do mundo.
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 17

Ensino-aprendizagem do aluno surdo


INTRODUÇÃO:

Ao término deste capítulo você será capaz de compreender


o contexto envolto no ensino e na aprendizagem da pessoa
surda e poderá fazer um paralelo com as condições
ofertadas ao aluno ouvinte. Poderá também compreender a
dificuldade que os professores enfrentam para proporcionar
meios educacionais para os surdos e a falta de formação
continuada que oferte ferramentas pedagógicas para
o exercício da docência em uma sala com pessoa com
deficiência auditiva e/ou surdez. Motivado para desenvolver
esta competência? Vamos caminhar? Avante!

Muitos desafios ainda deverão ser enfrentados para que o aluno


surdo tenha ao seu dispor professores capacitados na Libras para promoção
efetiva de uma Educação Inclusiva. Isso porque, nas escolas públicas de
ensino regular, são pouco os docentes que sinalizam fluentemente essa
língua. “O novo gera insegurança e instabilidade, exigindo reorganização,
mudança. É comum sermos resistentes ao que nos desestabiliza. Sem
dúvida, as ideias inclusivas causaram muita desestabilidade e resistência”
(MINETTO, 2008, p. 17).

Isso, acrescido ao fato de que o professor não se sente preparado


para atuar em uma sala tão heterogênea, só agrava a situação. São em
média 25 a 40 alunos com processo de desenvolvimento/aprendizagem
diferenciado e ter um aluno surdo compondo essa classe envolve
mais habilidades e competências que o professor deverá desenvolver
para ministrar sua aula. De acordo com Lima (2006, pp. 65-66), o
desenvolvimento do aluno ainda está na sua capacidade de “falar”:

O que se verifica é que, nessas circunstâncias, toda a


responsabilidade pelo sucesso da comunicação passa a depender da
eficiência do aluno surdo em fazer a leitura labial e se expressar por meio
18 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

da fala, o que não só é injusto, devido à omissão da escola, como é uma


exigência bastante difícil para uma criança que se inicia na alfabetização.
Lembremo-nos ainda de que, pela leitura labial, não se apreende tudo o
que é dito pelo interlocutor.

Algumas escolas contam com o apoio de um instrutor e/ou


intérprete que acompanhe o aluno surdo nas aulas e amenize as
dificuldades do professor com a Libras. Ainda não houve expansão
dessa garantia de direitos em todas as escolas com alunos surdos. Nas
instituições de ensino privado, ainda há muita resistência para contratação
desses profissionais e muitos surdos têm que buscar seus direitos por
meio de processos judiciais. Você conhece o intérprete de Libras?

DEFINIÇÃO:

Intérprete é um profissional que “[...] interpreta de uma


língua (língua fonte) para outra (língua alvo) o que foi dito.
[...] Língua é um sistema de signos compartilhado por uma
comunidade linguística comum. A fala ou os sinais são
expressões de diferentes línguas” (BRASIL, 2004, p. 7).

Marcon (2012, p. 238) acrescenta informações importantes sobre


esse profissional dizendo que deve ter uma postura imparcial frente ao
conteúdo que está interpretando. Ele fica “[...] em situação face a face com
o surdo, precisa dar conta de formular todas as informações que estão
sendo discutidas”.

O mesmo autor acrescenta ainda que o intérprete desenvolve um


trabalho que possibilita a comunicação/interação entre duas culturas
diferentes. “Ele possui, assim, a função de intermediar a interação
comunicativa entre o surdo e a pessoa que não usa a Libras” (MARCON,
2012, p. 238).
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 19

Figura 2: Intérprete da Libras

Fonte: Freepik

Silva e Oliveira (2006) ressaltam que Lei nº 12.319, de 1º de setembro


de 2010, regularizou a profissão de intérprete de Libras no ambiente
educacional e que sua função é intermediar as relações estabelecidas
entre os sujeitos participantes da aula (professores, alunos surdos e
ouvintes). O trabalho em sala de aula impõe desafios constantes ao
intérprete de Libras, pois ele “[...] passa a ter um compromisso com a
construção do conhecimento desses alunos, interpondo-se como um
mediador nesse processo, o que traz novos desdobramentos para sua
atuação profissional” (p. 698).

A inclusão na escola deve ocorrer de maneira que a responsabilidade


do ato educativo não fique somente a cargo dos professores que ministram
aulas para alunos surdos nem dos próprios alunos. “Cabe à escola, ao
proceder à inclusão, refletir sobre os argumentos que são usados a
favor e contra ela, verificar quais são as condições que tem a oferecer
e se envolver nesse projeto, viabilizando a presença de professores-
intérpretes” (LIMA, 2006, p. 71).
20 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

SAIBA MAIS:

Para conhecer mais o trabalho do intérprete em sala de


aula acesse: https://bit.ly/36v8wz6

Você pode compreender que ainda há muitas barreiras a serem


transpostas na educação dos surdos. Quadros e Schmiedt (2006, p.
23) constataram em suas pesquisas sobre educação bilíngue que a “[...]
criança surda é colocada em contato com a escrita do português para
ser alfabetizada em português seguindo os mesmos passos e materiais
utilizados nas escolas com as crianças falantes de português”. Não há
uma diferenciação do método de ensino, o que promove o fracasso na
alfabetização dessas crianças.

Vale ressaltar que a educação bilíngue é uma busca, não somente


de qualidade na educação do surdo, mas também o fortalecimento da
identidade da comunidade surda e da Língua Brasileira de Sinais (Libras).

O surdo deve ser alfabetizado e letrado em Libras, pois assim


a “[...] tarefa de ensino da língua portuguesa tornar-se-á possível se o
processo for de alfabetização de segunda língua, sendo a língua de sinais
reconhecida e efetivamente a primeira língua” (QUADROS, SCHMIEDT,
2006, p. 23).

A educação bilíngue ainda é um objetivo a ser alcançado pela


comunidade surda. Atualmente os surdos frequentam a sala de aula
regular com os ouvintes e vêm participando de um processo de ensino-
aprendizagem no qual “[...] aprendem em sua própria língua (português),
enquanto que o aluno surdo necessita de um intérprete para auxiliá-lo no
repasse de conhecimento transmitido e lecionado pelo professor regente
em sala de aula (MOURA; FREIRE; FELIX, 2017, p. 1285).

O intérprete não pode intervir na aula, pois existe, de acordo com


Moura, Freire e Felix (2017, p. 1285), uma “ética trabalhista desse profissional,
o impossibilita fazer qualquer interferência no aprendizado do aluno”.
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 21

Há uma diferença muito grande de desenvolvimento cognitivo


quando o aluno estuda em uma escola bilíngue, pois o que se considera
ideal

[...] é que o aluno surdo inserido em sala de aula de ensino


aprenda com mais eficácia em sua própria língua, todavia,
no caso da inclusão, os conteúdos lhes são repassado por
meio de um intérprete que atua interpretando/traduzindo do
português para Libras e vice/versa, ou seja, ele aprende de
uma forma secundária e não primária como lhe é garantido
por direito na Lei da Acessibilidade 10.098 de 10 de Dezembro
de 2000, a qual determina que o aluno surdo se desenvolva
dentro de suas habilidades linguísticas. (MOURA; FREIRE;
FELIX, 2017, p. 1285)

A escola bilíngue traria igualdade para a pessoa surda, já que se torna


quase impossível para “[...] o ouvinte entender a surdez de outro modo, a
não ser como deficiência. O surdo é visto como alguém incompleto, sob a
perspectiva da maioria dos ouvintes, por isso todos os esforços estão na
tentativa de oferecer o ‘melhor’” (MOURA; VIEIRA, 2011, p. 2).

Almeida (2013, p. 102) afirma que o Bilinguismo pressupõe que a


língua possibilita acesso para que ocorra “o desenvolvimento do surdo
em todas as esferas de conhecimento, propiciando a comunicação do
sujeito com surdez com os seus pares e com os outros sujeitos, dando
suporte ao pensamento e estimulando o desenvolvimento cognitivo e
social”.

O mais crítico da história dos surdos foi que muitos deles se


esforçaram muito para aprender a língua dos ouvintes e isso é uma
grande contradição, pois tentavam “[...] aprender uma língua que não
escutavam, olhando as bocas mexerem, na tentativa de copiá-las, para
saciar os anseios dos ouvintes e compreender o que ocorria a sua volta,
perseguindo o som e a fala sem condições de alcançá-los” (MOURA;
VIEIRA, 2011, p. 5).

Se a criança surda é exposta a um ambiente escolar que utiliza


a língua de sinais para que esta seja apreendida de maneira natural,
22 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

no cotidiano, “[...] sem que sejam necessárias condições especiais de


‘aprendizagem’, tal proposta educacional permite o desenvolvimento
rico e pleno da linguagem, possibilitando ao surdo um desenvolvimento
integral” (LACERDA, 2009, p.83).

Para Moura e Vieira (2011, p. 5), “a muitos foi negado o encontro


com outros surdos, com o receio que se comunicassem por uma língua
diferente da oral-auditiva, compreendida nessa visão como a única capaz
de mobilizar de fato a inteligência da humanidade”.

Comunicação com pessoas surdas


Cada comunidade tem seu modo de ser e de viver, sua cultura e
suas especificidades. A comunidade surda não é diferente das demais, pois
a “surdez traz consigo modos e formas de relacionar-se pautadas numa
comunicação visual. Isso requer conhecê-las, bem como compreender as
necessidades e tecnologias advindas de quem se comunica sem o som”
(MOURA, 2016, p. 16).

Conforme explica Gesser (2009, p. 25), “os surdos foram privados de


se comunicarem em sua língua natural durante séculos. Vários estudos
têm apontado a difícil relação dos surdos com a língua oral majoritária e
com a sociedade ouvinte”.

Temos que buscar nos comunicar com a pessoa surda e não


acreditar que a comunidade ouvinte é superior. “Neste sentido, faz se
necessário levantar um debate social acerca da importância da aquisição
da linguagem de sinais, pois além de facilitar a comunicação entre surdos
e não surdos promove o respeito pelo ser humano e a inclusão social”
(FERRAZ; FERRAZ, 2015, p. 1).

Os ouvintes têm dificuldades para chamar a atenção de uma


pessoa surda, pois esquecem que ele não ouve e começam a gritar e
gesticulam, ou, quando se aproximam, falam bem devagar achando que
ele entenderá. O que as pessoas não sabem é que nem todos os surdos
fazem leitura labial. Para chamar a atenção da pessoa surda, o ideal é o
toque.
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 23

O toque, na cultura surda, não é ofensivo como pode ser


para a cultura ouvinte. Desse modo, tocar o braço ou ombro
de uma pessoa surda pode ser um recurso eficaz quando
o visual estiver voltado para outra direção. Entretanto, se a
pessoa surda estiver de frente, o ideal é acenar com a mão.
A percepção visual dos surdos é mais aguçada do que das
pessoas ouvintes e certamente eles perceberão com maior
facilidade a sua intenção. (MOURA, 2016, p. 16)

Quando um professor está em sala de aula, para chamar a atenção


dos surdos, não adianta ficar acenado. Se não estiver no enquadramento
visual, ele não vai ver. “Em uma sala com um surdo de costas e distante ou
com muitos surdos, a melhor forma de chamar a atenção é acendendo e
apagando a luz por uma ou duas vezes” (MOURA, 2016, p. 17).

Quanto mais cedo a criança surda aprende a Libras, terá mais chance
de se desenvolver como pessoa surda, pois abrem-se possibilidades
de se expressar com “[...] maior rapidez e naturalidade na exposição
de sentimentos, desejos e necessidades. Possibilita a estruturação
do pensamento e da cognição e ainda uma interação social, ativando
consequentemente o desenvolvimento da linguagem (BRASIL, 2006, p.
28).

De acordo com Ferraz e Ferraz (2015, p. 1), “a comunicação é a forma


como as pessoas se relacionam entre si. Consiste numa atividade essencial
para a vida em sociedade, pois é desta forma que nos expressamos,
emocionamos, transmitimos e recebemos informações”.

Para Mussalim e Bentes (2011, p. 26), a língua possibilita ao ser


humano desenvolver suas capacidades e uma delas é a “[...] faculdade
humana de simbolizar. Sendo assim, é pelo exercício da linguagem, pela
utilização da língua, que o homem constrói sua relação com a natureza e
com os outros homens”.

A Libras possibilita que os surdos possam “[...] discutir filosofia,


política, literatura, assuntos cotidianos etc. nessa língua, além de transitar
por diversos gêneros discursivos, criar poesias, fazer apresentações
24 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

acadêmicas, peças teatrais, contar e inventar histórias e piadas, por


exemplo” (STROBEL, 2007, p. 121).

Moura, (2016) apresenta várias tecnologias que contribuem para


facilitar a vida da pessoa surda. São elas:
Tabela 1: Tecnologias para as pessoas surdas

TECNOLOGIA EXPLICAÇÃO

Campainha O toque da campainha é um sinal luminoso


que avisa ao surdo a chegada de um visitante.

Babá eletrônica vibratória A babá eletrônica vibratória emite um alerta


ao menor sinal de choro da criança e os pais
surdos sentem essa vibração e sabem que a
criança está chorando.
Babá eletrônica luminosa Emite um alerta luminoso quando a criança
está chorando.

Relógio vibratório O despertador funciona com dispositivo


de vibração com maior intensidade do que
o celular e pode ser colocado debaixo do
travesseiro da pessoa surda.
Telefone Nele o surdo pode realizar uma ligação para
um ouvinte. A ligação é intermediada por
um telefonista. A pessoa surda escreve o
que deseja que seja dito e o telefonista fala
oralmente com o ouvinte.
Campainha de escola Ao toque do sinal, a luz se acende.
com sinal luminoso

Fonte: O autor

Para Sacks (1998, p. 52), “um ser humano não é desprovido de mente
ou mentalmente deficiente sem uma língua, porém está gravemente
restrito no alcance de seus pensamentos, confinado, de fato, a um mundo
imediato, pequeno”.

Você sabe para que serve uma escola bilíngue destinada a alunos
surdos? Moura, Freire e Felix (2017, p. 1288) respondem a essa pergunta
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 25

dizendo que uma instituição educacional bilíngue faz com que os “[...] alunos
surdos se desenvolvam efetivamente nas escolas. É necessário entender
como eles aprendem, conhecer sua cultura e respeitá-la, apreciar sua
língua e tê-la como principal meio de interação e comunicação”.

A luta é constante para que o surdo tenha “acesso à língua de sinais e


à segunda língua, à identidade pessoal e social, à informação significativa,
ao mundo do trabalho e à cultura dos surdos” (SKLIAR, 1997, p. 53).

Os autores acrescentam, ainda, para que isso aconteça “requer


uma escola de qualidade, que atenda suas necessidades e os capacitem
a uma educação na qual professores e intérpretes sejam profissionais
conhecedores da língua de sinais, sua estrutura e gramática” (MOURA;
FREIRE; FELIX, 2017, p. 1288).

Moura e Vieira (2011, p. 7) explicam que no “Brasil, o Bilinguismo


começa recentemente a se configurar como proposta para a Educação
de Surdos. No entanto, estamos ainda no processo inicial, balizados na lei
e no decreto e em estudos de alguns profissionais da área”.

Já ficou estabelecido no Decreto 5.626, de 22 de dezembro de 2005,


que a pessoa surda é “[...] aquela que, por ter perda auditiva, compreende
e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando
sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais (Libras)”
(BRASIL, 2005, art. 2º). Por isso é necessária uma educação que garanta
esses aspectos e que possa proporcionar a interação do surdo com o
mundo.

RESUMINDO:

Compreendemos, neste capítulo, que o contexto envolto


no ensino e na aprendizagem da pessoa surda faz um
paralelo com as condições ofertadas ao aluno ouvinte.
Entendemos também a dificuldade que os professores
enfrentam para proporcionar meios educacionais para
os surdos e a falta de formação continuada que oferte
ferramentas pedagógicas para o exercício da docência em
uma sala com pessoa com deficiência auditiva e/ou surdez.
Vamos para o próximo capítulo.
26 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

Língua Brasileira de Sinais (Libras)


INTRODUÇÃO:

Ao término deste capítulo você entenderá que a Libras é


uma língua reconhecida por lei, apesar de fazer parte do
conjunto de línguas de sinais espalhadas pelo mundo,
sendo esta especificamente brasileira. Motivado para
desenvolver esta competência? Vamos caminhar? Avante!

Almeida (2013, p. 26) aponta algo muito importante para se


compreender a língua de sinais, dizendo que ainda é incerto o momento
exato de sua criação, “mas consideramos que elas são criadas por homens
que tentam resgatar o funcionamento comunicativo através dos demais
canais, por terem um impedimento sensorial auditivo”. O mesmo autor
acrescenta que existem alguns mitos sobre a Libras.

O primeiro mito é que se apresenta como uma língua universal,


ou seja, a mesma em todos os países. “Porém, as línguas de sinais não
são universais. Cada país apresenta a sua própria língua e, portanto, se
diferencia em cada nacionalidade. No Brasil, ela é chamada de Libras ou
LSB” (ALMEIDA, 2013, 18).

As línguas de sinais, em determinados países, recebem diferentes


configurações de mãos e sinais. Por isso, não se deve acreditar que existe
somente um tipo de língua de sinais, pois a literatura aponta a existência
de um número grande dessas línguas, como: Língua Gestual Portuguesa
(LGP); Sign Language of Netherlands (SLN) – Holanda; American Sign
Language (ASL) – EUA; Lengua de Senas Argentina (LSA) – Argentina;
British Sign Language (BSL) – Inglaterra; Lengua de Senas Chilena (JSL) –
Chile; Langue des Signes Française (LSF) – França; entre outras (ALMEIDA,
2013).

A Libras, de acordo com Fernandes (2011, p. 82), “é uma língua de


modalidade visual espacial que, diferentemente das línguas orais auditivas,
utiliza-se da visão para sua apropriação e de elementos corporais e faciais
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 27

e organizados em movimentos no espaço para constituir unidades de


sentido as palavras ou, como se referem os surdos, os sinais”.
Figura 3: Língua de sinais

Fonte: Freepik

De acordo com Forster (2006), o preconceito sobre a língua de


sinais contribuiu para não aceitação e entendimento dessa língua. O autor
explica:

Não é raro ouvir dizer que as línguas de sinais não são línguas, mas
uma linguagem ou algo afim. Este preconceito acontece até mesmo em
locais privilegiados para o debate sobre este tipo de assunto, como as
faculdades de Letras. Mas, pior que preconceito, a falta de informação, às
vezes, é causa de deficiências linguísticas que poderiam ser evitadas se
os responsáveis por crianças surdas simplesmente soubessem o quanto é
importante dar a elas condições de adquirir uma língua de sinais. (FOSTER,
2006, p. 1)

Nessa perspectiva, entende-se que a valorização da língua de


sinais ainda tem muitas barreiras a serem transpostas e que cabe a cada
estudioso da área e à comunidade surda empunhar essa bandeira de luta.

Forster (2006, p. 5) explica que a Libras, como qualquer outra língua,


sofre variações e por isso “[...] não basta pegar um alfabeto da Libras para
saber Libras, porque as línguas de sinais têm suas próprias palavras, os
28 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

sinais, que, em geral, não têm qualquer relação com as palavras usadas
em línguas orais”.

O segundo mito se refere à terminologia surdo-mudo, que está


impregnada na sociedade. “A terminologia surdo-mudo tem sua raiz na
história, quando a pessoa surda estava condenada à mudez. Ser surdo
significava automaticamente ser mudo, e pior, ser um incapacitado,
desabilitado e impossibilitado” (ALMEIDA, 2013, p. 21).

Não se pode afirmar que uma pessoa surda sempre será


muda. “A surdez não interfere diretamente na condição fisiológica da
oralidade. Muitos deles, por não terem a referência auditiva, acabam não
desenvolvendo naturalmente a oralidade assim como os sujeitos ouvintes”
(ALMEIDA, 2013, p. 21).

As causas que levam a pessoa a ficar surda não estão ligadas às


causas da mudez. Não há relação cientificamente comprovada. A surdez
“[...] se relaciona a problemas que afetam o ouvido interno, principalmente
a cóclea, ou por degeneração nos nervos auditivos, impedindo que os
estímulos sonoros cheguem ao cérebro por meio de estímulos nervosos”
(ALMEIDA, 2013, p. 22).

A confusão da Libras ser língua ou linguagem constitui o terceiro


mito. A Libras, após ser reconhecida e normatizada pela Lei nº 10.436,
de 24 de abril de 2002, e o Decreto nº 5.626/05, “[...] como todas as
outras línguas orais, com estruturas gramaticais próprias, perde o status
de mímica e gesto, passando a não ser considerada como linguagem”
(ALMEIDA, 2013, p. 23), mas sim como língua.

Quarto mito é que a língua de sinais é uma mímica. Isso acontece


porque “[...] muitas pessoas pensam que as línguas de sinais são como
mímica, isto é, gestos imitativos que tentam reproduzir algumas das
propriedades dos objetos a que fazem referência”. A Libras não é uma
mímica, pois, além da legislação que a letigima como língua, possui
gramática própria (FORSTE, 2006, p. 2).
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 29

DEFINIÇÃO:

A Libras é uma “[...] forma de comunicação e expressão,


em que o sistema linguístico de natureza visual-motora,
com estrutura gramatical própria, constituem um sistema
linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de
comunidades de pessoas surdas do Brasil” (BRASIL, 2002,
p. 1).

Sobre o quarto mito, Forster (2006, p. 2) acrescenta que, semelhante


ao que acontece “[...] nas línguas orais, os sinais são parte de um código
que, para ser eficaz, tem de ser compartilhado pela comunidade de
falantes”. Os sinais são pertencentes à gramática da Libras.

Para Almeida (2013, p. 21), “os sinais são os itens lexicais da língua de
sinais, dotados de significado, arbitrários na relação entre o significado e o
significante, de modo visual. Os sinais expressam sentimentos, emoções,
inclusive ideias abstratas”.

A Libras não pode ser considerada “[...] simplesmente uma


linguagem com mímicas e gestos de que seus falantes se utilizam para
se comunicarem” (OLIVEIRA; SILVA, 2014, p. 5). Ao tratar a língua de sinais
como uma pantomima, ou seja, expressar-se por meios de gestos sem
estruturação gramatical, a pessoa perpetua o preconceito com a Libras.
Sendo,

[...] uma visão embasada na anormalidade, segundo a qual o máximo


que o surdo consegue expressar é uma forma pantomímica indecifrável e
somente compreensível entre eles. Não à toa, as nomeações pejorativas:
anormal, deficiente, débil mental, mudo, surdo-mudo, mudinho que têm
sido equivocadamente atribuídas a esses indivíduos. (OLIVEIRA; SILVA,
2014, p. 5)
30 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

São inúmeros os mitos que cercam as línguas de sinais, por isso


priorizamos abordar os quatros que nos parecem mais usuais e que
prejudicam muito o entendimento da língua de sinais. Vale frisar que todos
os mitos são pejorativos e buscam denegrir a Libras, de modo a lançar no
social a crença de que ela continua sendo uma linguagem gestual e que
não consegue dar conta de expressar conteúdos abstratos.

Um mito frequente é de que a Libras não possui variações linguísticas.


Isso não é verdade, pois a variação linguística está “[...] presente nas
línguas humanas, independentemente de ação normativa (gramática). Em
qualquer língua oral e também na Libras é possível identificar variações
oriundas do contexto histórico, geográfico, sociocultural e comunicativo”
(FERREIRA et al. 2011, p. 16).

Não podemos aceitar que o surdo construa uma identidade


flutuante ou uma identidade inconformada, pois “[...] em ambas impera
uma concepção clínico-patológica sobre a surdez, e o ouvintismo
engendra essa percepção sobre si mesmo e seu espaço no mundo”
(MOURA, 2016, p. 14).

Mas o que seriam identidade flutuante e identidade inconformada?


Moura (2016, p. 14) explica esses dois conceitos dizendo que: “Na
identidade flutuante o surdo assume o papel de deficiente e comporta-
se de modo a tentar superar sua perda auditiva, enquanto na identidade
inconformada o surdo sente-se inferior ao ouvinte”.

Existe também a identidade de transição e a identidade híbrida. A


primeira diz respeito ao fato de o surdo não se sentir nem pertencente
à cultura surda nem pertencente à cultura ouvinte. Isso porque ele teve
o contato com a comunidade surda tardiamente e não desenvolveu sua
identidade surda. A identidade híbrida, segundo Moura (2016, p. 14), “é
aquela em que o surdo perdeu audição ao longo da vida e aprendeu a
Língua de Sinais como uma segunda língua. Dessa forma, conserva seu
pensamento pautado na língua oral, mas reconstrói suas relações sociais
amparadas na língua visual”.

Por isso a importância de se estudar a Libras e iniciar uma quebra


de paradigma, pois essa língua fortalece a comunidade surda e mostra
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 31

que é composta de variações como qualquer outra língua. “São línguas


que não se derivaram das línguas orais, mas fluíram de uma necessidade
natural de comunicação entre pessoas que não utilizam o canal auditivo-
oral, mas o canal espaço-visual como modalidade linguística” (QUADROS,
1997, p. 47).

A variação linguística pode ter como base o contexto histórico, em


que as palavras sofrem mudança, dependendo da época e do contexto
social, como também podem ser substituídas por outras. Já no contexto
geográfico “[...] trata das mudanças identificadas em comunidades
usuárias da mesma língua, porém que habitam em regiões distintas”
(FERREIRA et al. 2011, p. 16).

No contexto sociocultural as variações linguísticas estão


relacionadas à identidade de “[...] um grupo, grau de instrução, idade,
gênero ou padrão econômico. O contexto comunicativo se reporta
à situação, mais ou menos formal, à relação estabelecida entre os
interlocutores e ao conteúdo da mensagem” (FERREIRA et al. 2011, p. 1). A
variação linguística

[...] está presente em todas as línguas vivas, em movimento.


É justamente nessas práticas sociais de uso da linguagem
entre surdo/surdo e surdo/ouvinte que é possível enxergar
esse multilinguismo (variedades desprestigiadas em sinais,
em português, em combinação de modalidades), as marcas
da heterogeneidade nos sinais [...], ou seja, as várias línguas
em Libras. (GESSER, 2009, p. 41)

Na Libras, segundo Ferreira (et al. 2011, p. 16) “como a Língua


Portuguesa, apresenta variações linguísticas determinadas pela existência
de um mesmo sinal com significados diferentes (polissemia), ou de sinais
diferentes que remetem um mesmo significado (sinonímia)”.

De acordo com Aragão Neto (2012, p. 208), a “polissemia é a


propriedade que um signo, não necessariamente uma palavra, pois pode
ser também um afixo, tem de possuir mais de um significado relacionados
entre si”.
32 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

A polissemia pode dificultar o entendimento do contexto que


se quer sinalizar, pois “[...] possibilita que com um pequeno número de
sinais tenhamos um grande número de significados. Por outro lado, isso
reforça a ambiguidade e a imprecisão, prejudicando a compreensão,
especialmente no contexto bilíngue Libras-Língua Portuguesa (Ferreira et
al., 2011, p. 20). São exemplos de polissemia:
Figura 4: Polissemia

Fonte: O autor

A sinonímia se configura como “um nexo entre expressões que têm


significados semelhantes: casa e residência são bons exemplos. Mas veja,
eu falei em significados semelhantes, não falei em significados totalmente
idênticos” (ARAGÃO NETO, 2012, p. 224).

De acordo com Costa (2016, p. 51), “as variações entre os sinônimos


podem se efetivar conforme quatro aspectos, que são: variantes regionais
ou geográficas, variantes estilísticas ou discursivas, variantes psicológicas
ou expressivas, e variantes etárias ou históricas”. São exemplos de
sinonímia:
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 33

Figura 5: Sinonímia

Fonte: O autor

Existem também a antonímia, que “[...] ocorre quando duas ou mais


palavras apresentam alguma oposição de significado entre si, a exemplo
de bom e ruim (ARAGÃO NETO, 2012, p. 224). São exemplos de antonímia:
Figura 6 : Antonímia

Fonte: O autor

Há também nos sinais a ocorrência de homonímia. São sinais


iguais e que têm os mesmos parâmetros de Libras. Exemplo: LARANJA e
SÁBADO. No caso desse sinal eles têm movimento semicircular. “Os sinais
podem representar qualquer dado da realidade social, não se reduzindo a
34 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

um simples sistema de gestos naturais, ou mímicas como pensa a maioria


das pessoas” (FERNANDES, 2011, p. 82). São exemplos de homonímia:
Figura 7 : Homonímia

Fonte: O autor

RESUMINDO:

A Libras é uma língua muito interessante e desperta cada


vez mais o interesse dos estudiosos para entendê-la. “Ao
conhecer a Libras e as pessoas surdas, há uma tendência
ao afastamento da compreensão da surdez como falta,
ausência, incapacidade ou doença” (MOURA, 2016, p.13).
Os preconceitos quanto à pessoa surda têm grandes
possibilidades de se dissiparem frente ao conhecimento da
Libras e da comunidade surda.
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 35

Alfabeto manual
INTRODUÇÃO:

Ao término deste capítulo você será capaz de entender as


configurações do alfabeto manual e como ele foi utilizado
na Libras, bem como sua história de criação e que ele
contribui para a comunicação entre pessoas surdas e não
surdas. Motivado para desenvolver esta competência?
Vamos caminhar? Avante!

Schlünzen, Benedetto e Santos (2012), ao estudar a história da pessoa


surda, retratam acontecimentos muito importantes para entendermos
a criação do alfabeto manual. As autoras explicam que “Ponce de Leon
(1510-1584), monge Beneditino, usava sinais para se comunicar por conta
de um voto de silêncio que havia feito na Espanha, sua terra natal”.

Isso fez com que ele fosse precursor dessa língua, mas a descoberta
do Alfabeto Manual, muito utilizado nas línguas de sinais, não tinha ligação
com a audição de palavras e foi criado o Padre Espanhol Juan Pablo Bonet
(1579-1633).

O alfabeto manual, ou alfabeto datilológico, auxilia na comunicação


entre pessoas surdas ou não e está presente em vários sinais da Libras.
Segundo Castro Junior (2014, p. 37), “a datilologia é muito utilizada pelos
falantes de Libras no Brasil. O alfabeto manual ou datilológico é usado
para expressar nomes de pessoas, nomes próprios, de localidades,
empréstimos linguísticos e outros termos que não apresentam um sinal‐
termo correspondente na Libras”.

Lélis (2016, 37) explica que a datilologia se utiliza alfabeto manual


para soletrar palavras. “Às vezes, uma palavra da língua portuguesa que por
empréstimo passou a pertencer à Libras, por ser expressa pelo alfabeto
manual com uma incorporação de movimento próprio dessa língua, será
apresentada pela soletração ou parte da soletração [...]”. Dois exemplos de
palavras emprestadas da língua portuguesa são apresentados pelo autor:
NUNCA e REAIS.
36 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

Figura 8: Alfabeto manual

Fonte: O autor

Acima apresentamos as configurações de mão do alfabeto manual,


mas algumas, para formar as letras, possuem movimento, como: H, J, K, X
e Z. As setas mostram o sentido dos movimentos:
Figura 9: Movimentos do alfabeto manual

Fonte: O autor
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 37

Há também uma configuração que tem movimento, mas que pode


ou não aparecer na tabela: “Ç”. Para fazer essa letra do alfabeto o sinalizante
faz o C com movimento.
Figura 10: Letra C

Fonte: O autor

Alguns estudiosos da educação dos surdos tentaram incorporar o


alfabeto manual nas línguas de sinais para a educação dos filhos surdos
dos nobres, já que esse ofício lhes rendia muito dinheiro. Isso porque
eram raros professores para pessoas surdas. Foi Thomas Braidwood (1715-
1806) que criou o método que utiliza o alfabeto manual com as duas mãos
(SCHLÜNZEN, BENEDETTO E SANTOS, 2012, p. 3).

No método de Thomas Braidwood, “[...] seus estudantes aprendiam


palavras escritas, seu significado, sua pronúncia e a leitura orofacial.
Braidwood fundou a primeira escola para as PS’s na Grã-Bretanha, que
mais tarde foi transferida para a Inglaterra. Um dos estudantes dessa
escola, Kinniburg, multiplicava seu método” (SCHLÜNZEN, BENEDETTO
E SANTOS, 2012, p. 3).

Na prática, podemos observar que com alfabeto manual pode-


se escrever qualquer palavra que esteja na língua portuguesa. Vamos
observar a composição das palavras no quadro abaixo:
38 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

Figura 11: Composição de palavras pelo alfabeto manual

Fonte: O autor

Bisol e Valentini (2011) chamam atenção para alguns equívocos


sobre o alfabeto manual que são disseminados na sociedade. Um deles é
que há quem acredite que a língua de sinais é a soletração das palavras
vindas das línguas orais, neste caso a língua portuguesa, por meio do
alfabeto manual.

Outro equívoco muito comum é afirmar que o alfabeto manual


foi criado pela língua de sinais (Libras). O alfabeto datilológico é um
recurso, segundo Bisol e Valentini (2011, p.1), utilizado em situações como:
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 39

“quando não existe ou se desconhece um equivalente pronto à palavra


ou ao conceito na língua de sinais; para nomes próprios; para títulos de
trabalhos; para explicar o significado de um sinal para um ouvinte que
conheça o alfabeto manual”.

Forster (2006, p. 5) corrobora com a discussão e acrescenta que


“não basta pegar um alfabeto da Libras para saber Libras, porque as
línguas de sinais têm suas próprias palavras, os sinais, que, em geral, não
têm qualquer relação com as palavras usadas em línguas orais”. Somente
aprender o alfabeto manual não vai deixar ninguém fluente na Libras.

Segundo Almeida (2013, p. 13), “A datilologia ou o alfabeto manual


é um sistema de representação, quer simbólica, quer icônica, das letras
dos alfabetos das línguas orais na sua forma escrita, porém, por meio das
mãos”.

O alfabeto manual, assim como a língua de sinais, não é universal,


ou seja, diferencia-se em cada país. Isso é um equívoco que deve ser
sanado, pois, mesmo que alguns carreguem semelhanças, apresentam
“diferenças em suas estruturas manuais”, como nos mostra Almeida (2013,
p. 31-39).

Almeida (2013) apresenta muitos outros modelos de alfabeto manual


existentes em torno do mundo. Isso faz com que tenhamos a reflexão de
que se faz necessário pesquisar um assunto e aprender mais sobre ele
antes de realizar afirmações e acreditar em mitos sobre a língua de sinais.

A língua de sinais em todo mundo é muito rica em variações. No


Brasil, essa variação se apresenta, em muitos casos, de região para região.
Isso mostra a riqueza dessa língua e como ela tem que ser valorizada,
pois pertence um grupo de pessoas com representações em cada parte
do planeta.
40 Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

RESUMINDO:

Agora, para termos certeza de que você realmente


entendeu o tema de estudo deste capítulo, vamos resumir
tudo o que vimos. Você deve ter aprendido a diferenciar
os métodos de ensino Oralismo da Comunicação Total
e do Bilinguismo. Também compreendeu a trajetória da
pessoa surda em busca de seus direitos educacionais e
os principais nomes que contribuíram para pensarmos
o ensino-aprendizagem. Outro conteúdo apresentado
nesta unidade foi referente às características da Língua
Brasileira de Sinais (Libras) e a criação do alfabeto manual,
muito utilizado na Libras. Já estamos na metade da nossa
viagem nos caminhos da Libras. Com certeza, agora você
está preparado para continuarmos nossa viagem rumo aos
sinais da Libras.
Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) 41

REFERÊNCIAS
CAVALCANTI, W. M. A. Fundamentos da educação de surdos. In:
FARIA, E. M. B. de; CAVALCANTE, M. C. B. (org.). Língua portuguesa e libras:
teorias e práticas. 1 ed. João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2010,
v. 1, p. 85-112.

QUADROS, R. M. de; SCHMIEDT, M. L. P. Ideias para ensinar


português para alunos surdos. Brasília: MEC, SEESP, 2006. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/port_surdos.pdf. Acesso
em: 19 jul. 2020.

POKET, R. B. Abordagens de ensino na educação da pessoa com


surdez. 2008. Disponível em: https://bit.ly/3eFHgCs. Acesso em: 19 jul.
2020.

FERNANDES, S. Educação de surdos. 2 ed. Curitiba: Ibpex, 2011.

GESSER, A. Libras? Que língua é essa? Crenças e preconceitos


em torno da língua de sinais e da realidade surda. São Paulo: Parábola
Editorial, 2009.

STROBEL, K. História da educação de surdos. Florianópolis:


Universidade Federal de Santa Catarina, 2009.

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